Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0731/14
Data do Acordão:04/15/2015
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:RECURSO PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
DECISÃO ARBITRAL
PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE
Sumário:O recurso para o STA de decisão arbitral pressupõe que se verifique, entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão invocado como fundamento, oposição quanto à mesma questão fundamental de direito (n.º 2 do art. 25.º do RJAT), não devendo, ainda, o recurso ser admitido se, não obstante a existência de oposição, a orientação perfilhada no acórdão impugnado estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA (n.º 3 do art. 152.º do CPTA, aplicável ex vi disposto no n.º 3 do art. 25.º do RJAT).
Se não há entre a decisão arbitral recorrida e o invocado acórdão fundamento contradição sobre a mesma questão fundamental de direito, não pode conhecer-se do recurso.
Nº Convencional:JSTA000P18842
Nº do Documento:SAP201504150731
Data de Entrada:06/25/2014
Recorrente:A............, SA
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. 1.1. A…………, S.A., com os demais sinais dos autos, recorre, ao abrigo do disposto nos arts. 25º, n.ºs 2 e 3 e 26º, nº 1, do DL n.º 10/2011 (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária) e 152º do CPTA, da decisão arbitral proferida em 14/5/2014, no processo n.º 208/2013-T instaurado na sequência de pedido de pronúncia arbitral que por aquela fora também apresentado.
Invoca existência de oposição de acórdãos entre a decisão arbitral e o acórdão proferido pelo STA em 14/03/2012, no processo nº 01007/11.

1.2. Termina as alegações do recurso formulando as conclusões seguintes:
1.ª - O presente recurso vem interposto em virtude da evidente oposição entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão-fundamento que havia sido proferido, sobre a mesma questão fundamental de direito, pela 2.ª Secção de Contencioso Tributário do STA, em 14.03.2012, no processo n.º 01007/11;
2.ª - A identidade factual entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão-fundamento resulta da circunstância de em ambos os arestos ter sido apresentado pedido de revisão oficiosa, no prazo de 4 anos, alicerçado em falta de fundamentação, ao abrigo do disposto no artigo 78.º, n.º 1, segunda parte, da LGT;
3.ª - No que respeita aos fundamentos de direito, ambos os arestos são chamados a pronunciar-se sobre a mesma questão jurídica, qual seja, a de saber se a falta de fundamentação se enquadra no conceito de “erro imputável aos serviços” para efeitos de apresentação do pedido de revisão oficiosa, no prazo de 4 anos, ao abrigo do disposto no artigo 78.º, n.º 1, segunda parte, da LGT.
4.ª - Não obstante a identidade da situação fáctico-jurídica vertida e apreciada nos acórdãos em causa, viriam os mesmos a decidir em sentido oposto;
5.ª - No âmbito da decisão arbitral recorrida considerou o Tribunal Arbitral, que a falta de fundamentação não se enquadra no conceito de “erro imputável aos serviços” para efeitos do disposto no artigo 78.º, n.º 1, segunda parte, da LGT;
6.ª - Já no âmbito do acórdão-fundamento, e perante um pedido de revisão oficiosa alicerçado em falta de fundamentação, decidiu o STA pela admissibilidade daquele pedido apresentado, no prazo de 4 anos, ao abrigo do disposto no artigo 78.º, n.º 1, segunda parte, da LGT, isto é, com fundamento em “erro imputável aos serviços”;
7.ª - Deste modo, é pois manifesta a oposição da decisão arbitral recorrida com o acórdão-fundamento;
8.ª - Ora, na verdade, a solução perfilhada pela 2.ª Secção de Contencioso Tributário do STA, em 14.03.2012, no recurso n.º 01007/11, é a que se afigura mais correta;
9.ª - Com efeito, nos termos do artigo 78.º, n.º 1, da LGT, a revisão dos atos tributários pode ser efetuada por iniciativa do contribuinte, no prazo da reclamação administrativa, ou por iniciativa da administração tributária, ainda que desencadeada pelo contribuinte, no prazo de 4 anos ou a todo o tempo se o imposto não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços;
10.ª - Ora, o “erro imputável aos serviços”, para efeitos artigo 78.º, n.º 1, da LGT, só pode referir-se a qualquer ilegalidade do ato tributário não imputável ao contribuinte mas à administração tributária;
11.ª - Entende a Recorrente que o legislador tributário teve por desiderato abranger qualquer ilegalidade do ato tributário imputável à administração tributária, designadamente, a ilegalidade resultante de erro sobre os pressupostos de facto ou de direito e a ilegalidade resultante de vícios formais ou procedimentais (v.g. preterição do direito de audição prévia, falta de fundamentação, incompetência, entre outros);
12.ª - Na verdade, o pedido de revisão oficiosa configura um meio administrativo de correção de ilegalidades dos atos tributários, que é admitido como complemento dos meios de impugnação administrativa e contenciosa, pelo que o conceito de “erro imputável aos serviços” não pode ser objeto de uma interpretação limitativa, sob pena de preterição dos princípios da tutela jurisdicional efetiva e do acesso à justiça pelo contribuinte (cf. artigo 268.º, n.º 4, da CRP];
13.ª - Esta é, com efeito, a interpretação que está em sintonia com a autorização legislativa em que se baseou a aprovação da LGT, a qual refere no seu artigo 1.º, n.º 2, da Lei n.º 41/98, de 4 de agosto, que a LGT visará o “(...) reforço das garantias dos contribuintes (...).”;
14.ª - De facto, configurando o pedido de revisão oficiosa um meio complementar de correção de ilegalidades dos atos tributários, a limitação do pedido de revisão oficiosa, com fundamento em “erro imputável aos serviços”, a apenas situações em que a administração tributária atuou com erro sobre os pressupostos de facto ou de direito, mas já não a situações em que ocorrem vícios de forma ou procedimentais, reconduzir-se-ia, no limite, a uma diminuição das garantias dos contribuintes, os quais veriam assim afastado aquele meio complementar, enquanto último recurso, para obter a correta definição da sua relação jurídica tributária;
15.ª - Assim, é de concluir que o conceito de “erro imputável aos serviços” deve ser interpretado no sentido de incluir qualquer ilegalidade, sob pena de inconstitucionalidade orgânica [cf. artigo 103º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, alínea i) da CRP];
16.ª - Por outro lado, esta é também a interpretação do conceito de “erro imputável aos serviços” que se coaduna com os princípios da justiça, da igualdade e da legalidade, previstos nos artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 55.º da LGT, a que a administração tributária se encontra adstrita;
17.ª - A este entendimento não se pode contrapor a interpretação que vem sendo dada pela jurisprudência ao conceito de “erro imputável aos serviços”, previsto no artigo 43.º, n.º 1, da LGT, uma vez que, não obstante a coincidência de conceitos, ambos os preceitos legais tratam de realidades distintas;
18.ª - Com efeito, enquanto o artigo 43.º, n.º 1, da LGT tem em vista concretizar o direito de indemnização do contribuinte em consequência de uma lesão da situação jurídica, o artigo 78.º, n.º 1, da LGT tem em vista a correção de ilegalidade dos atos tributários, ou seja, visa permitir à administração tributária rever um ato tributário ilegal, após decorridos os prazos de reclamação graciosa e impugnação judicial;
19.ª - Deste modo, regulando ambos os preceitos realidades diferentes não poderão deixar de ser objeto de interpretações distintas e adequadas à realidade que visam regular;
20.ª - Assim, do quanto vem exposto, é inequívoca a conclusão de que o conceito de “erro imputável aos serviços”, previsto no artigo 78.º, n.º 1, segunda parte, da LGT, concretiza qualquer ilegalidade do ato tributário, nomeadamente, a ilegalidade resultante de erro sobre os pressupostos de facto ou de direito e a ilegalidade resultante de vícios formais ou procedimentais (v.g. preterição do direito de audição prévia, falta de fundamentação, incompetência, entre outros);
21.ª - De facto, seria incompreensível uma solução legal que autorizasse a revisão oficiosa pela administração tributária de um ato tributário emitido ao abrigo de errado pressuposto de facto ou de direito, mas que já não a habilitasse a rever o ato tributário emitido ao arrepio das normas com, inclusive, consagração constitucional, a que a administração tributária se encontra vinculada, mais concretamente em violação do dever geral de fundamentação do ato tributário (cf. artigos 268.º, n.º 3, da CRP, 36.º, n.º 2 do CPPT, no artigo 77.º, n.º 2 e 3, da LGT e artigos 124.º e 125.º do Código do Procedimento Administrativo);
22.ª - Pelo que, bem andou o acórdão-fundamento, que perante um pedido de revisão oficiosa alicerçado em falta de fundamentação do ato tributário, decidiu pela admissibilidade do pedido de revisão oficiosa apresentado ao abrigo do disposto no artigo 78.º, n.º 1, segunda parte, da LGT;
23.ª - Assim, não poderá a decisão arbitral recorrida deixar de ser anulada, firmando-se, para efeitos de uniformização de jurisprudência, o entendimento ora prescrito e no acórdão-fundamento e, em consequência, ser determinada a remessa dos autos ao Tribunal Arbitral para apreciação da legalidade das liquidações de IMI supra identificadas.
Termina pedindo que se julgue verificada a invocada oposição entre o acórdão-fundamento e a decisão arbitral recorrida e que, apreciando-se o mérito do recurso, este seja julgado procedente, com a consequente fixação da jurisprudência firmada no acórdão-fundamento, bem como, determinada a remessa dos autos ao Tribunal Arbitral para apreciação da legalidade das liquidações de IMI em crise.

1.3. O recorrido Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou contra-alegações que concluiu da forma seguinte:
A. Serão requisitos de admissibilidade do recurso,
i) a existência de contradição entre uma decisão arbitral e um acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou do Supremo Tribunal Administrativo;
ii) o trânsito em julgado do acórdão fundamento;
iii) a existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito; e,
iv) desconformidade entre a orientação perfilhada no acórdão impugnado e a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
B. Relativamente aquilo em que se deve concretizar a “questão fundamental de direito” afigura-se essencial a existência de identidade da questão de direito sobre a qual se debruçaram os acórdãos em confronto, que tem subjacente a identidade dos respectivos pressupostos de facto ((2) Como se sumariou no acórdão proferido pelo STA, em 23/03/1993, no processo n.º 028258 «I - Para que se possa reconhecer a existência de oposição de julgados é necessário que se reconheça a unidade da questão jurídica nos acórdãos ditos em conflito. II - A unidade da questão jurídica só verdadeiramente se descobre na perspectiva da específica finalidade deste recurso em contencioso administrativo que é, apenas, a uniformização da jurisprudência do Tribunal no sentido de impedir o tratamento desigual de casos iguais e não a uniformidade na interpretação da lei. III - Não é possível determinar a existência de um conflito de decisões sem uma referência bipolar, “simultânea, às questões de direito e às situações da vida…” (disponível em www.dgsi.pt) e, ainda, que a oposição decorra de decisões expressas e não meramente implícitas.
C. O recurso apresentado falha na verificação de qualquer destes pressupostos, não obstante a Recorrente, de forma enviesada, tentar urdir argumentos onde empreende uma pretensão recursiva que assenta numa lógica em que se abstrai em absoluto dos contornos fácticos das situações subjacentes, que tendo embora alguns pontos em comum, apresentam diferenças de relevo.
D. Na decisão arbitral recorrida o que está em causa é, tão somente e apenas, a aplicação do conceito de “erro imputável aos serviços” ínsito no n.º 1 do art. 78.º da LGT in fine a uma questão de alegada falta de fundamentação, onde se estriba exclusivamente a causa de pedir da ora Recorrente.
E. Diversamente, o acórdão, ora apresentado como acórdão fundamento, discute o conceito de “erro imputável aos serviços”, plasmado naquela norma já citada, mas não com fundamento exclusivo em falta de fundamentação, tal como a Recorrente quer fazer passar no seu douto recurso de forma engenhosa e artificiosamente, mas, antes sim, um “erro imputável aos serviços” ao qual subjaz a uma situação em que
«...o sujeito passivo reputa de ilegal – por, na sua perspectiva, ter sido emitido ao abrigo de uma errada interpretação e aplicação do Direito aplicável, com desacertada aplicação aos factos relevantes» negrito sublinhado nossos cit. o acórdão prolatado no processo n.º 01007/11, pela 2.ª Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo e cuja relatora foi a Exma. Juíza Conselheira Dulce Manuel Neto.
F. Este Acórdão, apresentado de forma totalmente descontextualizada pela A…………, reputa-se, não a uma situação em que a causa de pedir e o que sindica se repute exclusivamente ao vício de falta de fundamentação (o que sucede na Decisão arbitral recorrida), mas em que se discute, além da falta de fundamentação, «...uma errada interpretação e aplicação do Direito aplicável, com desacertada aplicação aos factos relevantes...».
G. O entendimento, enviesado, da Recorrente, retirado, forçadamente e sem qualquer correspondência material ao vertido naquele acórdão, não se coaduna com o caso sub judice, relativamente ao amplíssimo conceito de erro imputável aos serviços, retira qualquer certeza e confiança na segurança jurídica, princípios constitucionalmente assentes, na medida em que, assim sendo, a todo o tempo as anulabilidades são invocáveis, não se consolidando na ordem jurídica os respectivos actos que enfermem dessas anulabilidades.
H. A falta de fundamentação é um vício e não um erro sobre os pressupostos de facto ou de direito.
I. Entender-se de maneira diferente, i.e., no sentido que alvitra a Requerente, é violar abertamente o princípio da certeza e da segurança jurídica e retirar qualquer racionalidade à norma ínsita no art.º 78.º da LGT.
J. É incontestado, quer doutrinariamente, quer jurisprudencialmente, que a falta de fundamentação constitui um vício formal e, por conseguinte, insusceptível de preencher o conceito de erro imputável aos serviços, o que também deriva dos próprios princípios gerais do Direito.
K. E tem sido essa a posição firmada e seguida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo – vide no acompanhamento da citação supra acórdão de 02.12.2009, no processo n.º 892/2009, acórdão de 17.03.2010 no processo 0999/2009 e acórdão de 01.10.2008 no processo n.º 244/2008, todos do Supremo Tribunal Administrativo.
L. Como decorre firmemente desta jurisprudência, do Supremo Tribunal Administrativo, a expressão “erro imputável aos serviços” refere-se a “erro” e não a “vício”, o que inculca que quer relevar apenas os erros sobre os pressupostos de facto ou de direito que levaram a Administração a uma ilegal definição da relação jurídica tributária do contribuinte, não considerando os vícios formais ou procedimentais que, ferindo embora, de ilegalidade o acto, não implicam, necessariamente, uma errónea definição daquela relação.
M. O que, por si só, justificaria se considerasse incumprido o disposto no n.º 3 do art.º 152.º do CPTA quando refere que «O recurso não é admitido se a orientação do acórdão impugnado [Decisão arbitral] estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo
N. Assim, é insofismável que a expressão “erro imputável aos serviços” aludido no n.º 1 do art.º 78.º da LGT in fine não compreende todo e qualquer vício” (designadamente vícios de forma ou procedimentais, nos quais se inclui o alegado vício de falta de fundamentação) mas tão só “erros”, e estes abrangem não só o erro material e o erro de facto, como, também, o erro de direito ou erro nos pressupostos de facto e de direito – cfr. a jurisprudência consolidada no Supremo Tribunal Administrativo e que se encontra plasmada, entre outros, nos acórdãos de 06.02.2002, processo n.º 26.690; de 05.06.2002, no processo n.º 392/02; de 12.12.2001, processo n.º 26.233; de 16-01-2002, processo n.º 26.391; de 30.01.2002, no processo n.º 26231; de 12.11.2009, no processo n.º 681/09; de 22.03.2011, no processo n.º 1009/10; de 14.06.2012, no processo n.º 842/11.
O. Ora, em face do exposto é patente e notório que, não obstante a tentativa, infrutífera refira-se, a Recorrente não logrou:
P. Em (1) primeiro lugar, identificar a existência de contradição entre uma Decisão arbitral e um acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou do Supremo Tribunal Administrativo,
Q. Em (2) segundo lugar, identificar, sem o conseguir, pelo que vem supra dito, a existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito inexistente identidade de situações de facto.
R. E por fim, em (3) terceiro lugar, provar e demonstrar inequivocamente a desconformidade entre a orientação perfilhada na Decisão arbitral impugnada e a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, mormente o próprio Acórdão que a Recorrente quer tomar como Acórdão Fundamento
S. A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo vem decidindo, de forma constante, que, a expressão “erro imputável aos serviços” aludida no n.º 1 do art.º 78.º da LGT in fine não compreende todo e qualquer “vício” (designadamente vícios de forma ou procedimentais, nos quais se inclui o alegado vício de falta de fundamentação) mas tão só “erros”, e estes abrangem não só o erro material e o erro de facto, como, também, o erro de direito ou erro nos pressupostos de facto e de direito, em conformidade com os acórdãos de 06-02-2002, processo n.º 26.690; de 05-06/2002, no processo n.º 392/02; de 12/12/2001, processo n.º 26.233; de 16-01-2002, processo n.º 26.391; de 30.01.2002, no processo n.º 26231; de 12.11.2009, no processo n.º 681/09; de 22.03.2011, no processo n.º 1009/10; de 14.06.2012, no processo nº 842/11.
T. De onde se exclui o vício de falta de fundamentação como enquadrável no erro imputável aos serviços referido na parte final do n.º 1 do art. 78.º da LGT,
U. Acresce, por fim, dizer que é a própria Relatora do alegado Acórdão Fundamento, Veneranda Juíza Conselheira Dulce Manuel Neto que, em comentário ao suposto Acórdão Fundamento, num artigo científico-doutrinário divulgado no n.º 4, Ano 5 da Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, publicada pelo Instituto de Direito Económico e Fiscal da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, a páginas 113 e ss., afirma que a
«...revisão oficiosa não pode ter por fundamento qualquer vício ou ilegalidade, nomeadamente vícios de forma, como é o vício de falta de fundamentação, mas tão só, como se viu, erros de facto ou de direito ou erro nos pressupostos de facto e/ou de direito.»
Nestes termos, e nos mais de direito, peticiona-se pela improcedência do pedido apresentado pela Recorrente, desde logo porque se não encontram reunidos os requisitos que permitem a admissão do recurso para efeitos de uniformização de jurisprudência, nos termos do disposto no artigo 145.º do CPTA.

1.4. O MP emite Parecer nos termos seguintes:
«1. Quanto ao recurso para uniformização de jurisprudência é aplicável o previsto no art. 152.º do C.P.T.A., disposição da qual resulta como requisitos de admissibilidade:
- existir contradição entre julgados;
- ser indicada a infração imputada; e
- estar o decidido contra a jurisprudência mais recentemente consolidada.
E quanto a jurisprudência consolidada é de entender aquela em que a questão fundamental de direito foi já apreciada por acórdão do Pleno ou por várias decisões no mesmo sentido obtidas por unanimidade ou maiorias inquebráveis – neste sentido, acórdão do Pleno do S.T.A. de 18-9-08, rec. n.º 212/08.
2. A questão controvertida é relativa ao entendimento a dar ao “erro imputável aos serviços” a que se refere o art. 78.º n.º 1 da L.G.T..
3. O recorrente imputa como infração o vício de falta de fundamento, mas associa o mesmo, nomeadamente, a não ter sido notificada das atualizações de valor feitas aos 270 prédios de acordo com o regime transitório do Código do I.M.I., pretendendo por tudo isso que seja declarada a invalidade parcial das liquidações de I.M.I. de 2008.
4. É certo haver também o entendimento jurisprudencial de que, em face do vício de falta de fundamentação, não é admitir a revisão com base em “erro imputável aos serviços”.
5. No acórdão fundamento, de 14-3-12 proferido no recurso n.º 1007/11, da 2.ª secção do S.T.A., colhe-se que, tendo sido alegado existir falta de fundamentação, se considerou a revisão de acto tributário ainda com base em erro de direito.
6. Há-de convir-se que, em face dos muitos acórdãos do S.T.A. proferidos quanto ao referido “erro imputável aos serviços” – alguns quais, aliás, foram citados em nota de rodapé 2 do acórdão fundamento –, é entendimento consolidado englobar no referido conceito não só o erro de facto como o de direito.
7. No acórdão do S.T.A. de 19-9-12, proferido no recurso 659/12, em www.dgsi.pt, decidiu-se pela anulação de liquidação objeto de impugnação com base em falta de fundamentação, sendo no mesmo entendimento que o conhecimento de tal vício no caso tinha de preceder o da “ilegalidade substancial” de que não se chegou a conhecer ((1) Pode ler-se no referido acórdão: “como tem vindo a reconhecer este Supremo Tribunal Administrativo, o conhecimento do vício de forma há de preceder o conhecimento do vício substancial quando não seja possível apreciar a sua legalidade sem se conhecer a motivação do acto (A este respeito, vide JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume II, anotação 18 b) ao art. 124.º, pág. 341, com indicação de jurisprudência” bem como haver ainda vários acórdãos posteriores no mesmo sentido).
8. Assim, e a entenderem-se estarem reunidos os requisitos para que o processo possa prossiga com a prolação de acórdão para uniformização de jurisprudência, nomeadamente, em face dos referidos entendimentos jurisprudenciais contraditórios, é ainda entendimento doutrinal a que é de aderir aquele segundo o qual para que a revisão seja admitida com base em “erro imputável aos serviços” tem de ocorrer ilegalidade “de ordem substancial” – assim, Casalta Nabais em A Revisão dos Tributários, em Por um Estado Fiscal Suportável, Estudos de Direito Fiscal, vol. III, p. 213 e ss..
9. Tal entendimento o que corresponde a uma adequada composição dos interesses em jogo, nomeadamente, de acesso ao direito em face da estabilização da relação tributária.
10. Concluindo:
Sendo de prosseguir o recurso interposto é de firmar jurisprudência no sentido de ser de englobar no “erro imputável aos serviços” previsto no art. 73.º n.º 1 da L.G.T. a ilegalidade de ordem substancial.
É ainda de julgar o recurso improcedente por, em face do invocado, não haver elementos para concluir pela existência da dita ilegalidade.»

15. Corridos os Vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Na decisão arbitral julgaram-se provados os factos seguintes:
“2.1.1. A Requerente é titular de direitos reais sobre cerca de 270 (duzentos e setenta) prédios, que se encontram listados no art.º 10.º do requerimento de constituição de tribunal arbitral colectivo.
2.1.2. A Requerente, em 2004, foi notificada das liquidações de IMI dos prédios de que era proprietária relativas ao ano de 2003.
2.1.3. Das liquidações de IMI dos prédios de que a Requerente era proprietária relativas ao ano de 2003 consta, para cada um deles, um valor patrimonial diferente do que havia sido pela Requerida considerado no ano anterior em sede de tributação desse mesmo património imobiliário.
2.1.4. Procedeu, pois, a Requerida à actualização do valor patrimonial de cada um dos prédios de que a Requerente era proprietária na sequência da entrada em vigor do Código do IMI, tal como previsto pelo regime transitório estabelecido pela reforma referida em 1.8..
2.1.5. A Requerente depreendeu que a Requerida, relativamente ao IMI de 2003 dos prédios de que era proprietária, havia procedido a uma actualização do respectivo valor patrimonial tributário.
2.1.6. Nunca a Requerida apresentou à Requerente qualquer outro documento em que especificamente constem o método e os critérios que subjazeram ao apuramento dos actualizados valores patrimoniais tributários de cada um dos prédios de que a Requerente era proprietária.
2.1.7. A Requerente foi devidamente notificada das liquidações de IMI dos prédios de que era proprietária relativas aos anos de 2003, 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008.
2.1.8. A Requerente nunca fez uso dos mecanismos que a ordem jurídica coloca à sua disposição para pôr em crise as liquidações de IMI relativas ao ano de 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007.
2.1.9. A Requerente pagou o IMI referente aos anos de 2003 a 2008 de cada um dos prédios de que era proprietária.
2.1.10. No dia 31.12.2012 a Requerente dirigiu à Requerida, mais propriamente à Direcção de Serviços do Imposto Municipal sobre Imóveis, um pedido de revisão oficiosa pelo qual solicita a anulação parcial da liquidação de IMI referente ao exercício de 2008 (doc n.º 1 junto com o pedido de pronúncia arbitral, cujo teor se dá como reproduzido).
2.1.11. A Requerida não apresentou qualquer resposta ao pedido de revisão oficiosa referido em 2.1.10..”


3.1. Como se referiu, o presente recurso vem interposto, ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 25º do DL nº 10/2011, de 20/1 (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária), da decisão arbitral proferida em 14/5/2014, no processo nº 208/2013-T instaurado na sequência de pedido de pronúncia arbitral apresentado por A…………, S.A., invocando a recorrente que existe oposição de acórdãos entre a decisão arbitral e o acórdão proferido pelo STA em 14/03/2012, no processo nº 01007/11.

3.2.1. Nos termos dos disposto no citado nº 2 do art. 25º do RJAT (DL nº 10/2011, de 20/1) a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.
Sendo aplicável (cfr. o nº 3 do mesmo art. 25º) a este recurso, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral.
Ora, se no que respeita aos pressupostos gerais de admissibilidade do recurso (legitimidade da recorrente, tempestividade do recurso, valor da causa e requisitos formais da alegação) parece nada obstar à admissibilidade do recurso, importa, ainda assim, apreciar se existe a invocada oposição entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão do STA, invocado como fundamento daquela oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito. Sendo que o recurso também não deve ser admitido se, não obstante a existência de oposição, a orientação perfilhada na decisão arbitral impugnada estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA (cfr. o nº 3 do art. 152º do CPTA, aplicável “ex vi” do disposto no nº 3 do art. 25º do RJAT).
Vejamos, pois.
3.2.2. Para apurar da existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito (ou de oposição de acórdãos) entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento devem seguir-se os critérios jurisprudenciais firmados na vigência da legislação anterior (ETAF/1984 e LPTA), sendo, pois, exigível para a verificação de contradição relevante, que se trate do mesmo fundamento de direito, que não tenha havido alteração substancial da regulamentação jurídica e que se tenha perfilhado solução oposta nos dois arestos: o que, como parece óbvio, pressupõe a identidade de situações de facto, já que sem ela não tem sentido a discussão dos referidos pressupostos. Sendo que a oposição também deverá decorrer de decisões expressas, que não apenas implícitas.(Cfr., neste sentido, os acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, de 25/3/2009, rec. nº 598/08 e do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo, de 22/10/2009, rec. nº 557/08; bem como: - Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª ed., Coimbra, Almedina, 2010, pp. 1004 e ss.; - e Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. IV, 6ª ed., Áreas Editora, 2011, anotação 44 ao art. 279º pp. 400/403.)

3.3. No caso vertente, afigura-se-nos que, ao invés do alegado pela recorrente, não se verifica, entre a decisão arbitral recorrida e o acórdão fundamento invocado, contradição sobre a mesma questão fundamental de direito.

3.3.1. De acordo com a alegação da recorrente, a questão controvertida é a de saber se a falta de fundamentação do acto tributário pode ser enquadrada no conceito de erro imputável aos serviços a que se alude na segunda parte do nº 1 do art. 78º da LGT.
E a decisão arbitral recorrida, depois de acentuar que cabia em primeiro lugar decidir se deve integrar-se no conceito de “erro imputável aos serviços” o vício de forma de ausência de fundamentação, concluiu o seguinte:
«4.2. A Requerente poderia ter invocado o vício da falta de fundamentação do acto de avaliação, verificado em 2003, a montante, através da apresentação de:
i) Reclamação administrativa
ii) Impugnação judicial
iii) Pedido de revisão
4.3. Não o tendo feito, não pode agora aproveitar o meio de defesa previsto no artigo 78.º da LGT, mesmo relativamente ao acto de liquidação de IMI de 2008, uma vez que o pedido de revisão a apresentar ao abrigo deste artigo implica a verificação de "erro imputável aos serviços".
4.4. E a falta de fundamentação, a existir, não integra o conceito de "erro imputável aos serviços" tratando-se antes de um "vício" ligado ao procedimento tributário com um âmbito e alcance mais restritos que o "vício" correspondente a qualquer ilegalidade.
4.5. Não sendo assim sindicável o acto de liquidação de IMI relativamente ao ano de 2008 com base nas alíneas c) e h) do artigo 89.º do CPTA, aplicável por força do artigo 29.º do RJAT
E para assim concluir, a decisão arbitral recorrida apela, quer ao disposto no art. 78º da LGT, quer à jurisprudência do STA (no sentido de que, tal como a AT pode, por sua iniciativa, proceder à revisão oficiosa do acto tributário, no prazo de 4 anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços, também o contribuinte pode, naquele prazo de revisão oficiosa, pedir esta mesma revisão com fundamento em erro imputável aos serviços), quer, ainda, a jurisprudência do STA e a entendimento do Cons. Jorge Lopes de Sousa, no sentido de que o uso desta expressão "erro imputável aos serviços" (refere-se «erro» e não «vício») inculca que a lei pretende relevar apenas os erros sobre os pressupostos de facto ou de direito que levaram a Administração a uma ilegal definição da relação jurídica tributária do contribuinte, não considerando os vícios formais ou procedimentais que, ferindo, embora, de ilegalidade o acto, não implicam, necessariamente, uma errónea definição daquela relação, quer, finalmente, à jurisprudência firmada no acórdão do STA de 4/11/2009, proc. 0665/2009, que, a propósito da integração do conceito de "erro imputável aos serviços" previsto no art. 43.º n.º 1 da LGT, considera que deverá ter o mesmo alcance que o conceito nominalmente idêntico utilizado pelo n.º 1 do art. 78.º da LGT, que também distingue entre "erro imputável aos serviços" e qualquer outra "ilegalidade".

3.3.2. Por sua vez, o acórdão fundamento apreciou recurso interposto de sentença que fora proferida numa acção administrativa especial de condenação à prática do acto devido e em que se sindicava o acto de indeferimento do pedido de revisão oficiosa (por extemporaneidade da respectiva apresentação) de uma liquidação, tendo a dita acção administrativa especial sido julgada procedente e condenada a entidade demandada a proceder à apreciação do pedido de revisão que fora apresentado pelo contribuinte.

Esse pedido de revisão oficiosa havia sido formulado nos termos da 2ª parte do nº 1 do art. 78º da LGT e a AT tinha-o indeferido com fundamento em extemporaneidade.
A sentença proferida em 1ª instância já considerara que também o contribuinte pode, no prazo de 4 anos referido no nº 1 do art. 78º da LGT, pedir a revisão oficiosa do acto tributário e o acórdão confirmou [por maioria(No acórdão foi exarado voto de vencido, nos termos seguintes: «Na minha opinião, para efeitos do n.º 1 do artigo 78º da LGT o “erro imputável aos serviços” não se pode identificar com “qualquer ilegalidade”, sob pena de não se encontrar qualquer racionalidade da norma. Deste modo, a falta de fundamentação ou a errada interpretação da norma aplicada, são ilegalidades que não se enquadram no conceito de “erro”, como ignorância ou imperfeito conhecimento das regras do Direito, ou das circunstâncias de facto, revelada pela declaração, e não na vontade de quem emitiu o acto. De outra forma corre-se o risco de transformarmos as anulabilidades em nulidades, caso o tributo não tenha sido pago. O erro previsto naquela norma só pode ser o “erro material” ou o “erro obstáculo” que pode ser corrigido a todo o tempo, ou no prazo de quatro anos, conforme o imposto tenha ou não sido pago.»)] tal julgamento, ou seja, concluiu pela tempestividade do pedido de revisão oficiosa apresentado, no caso, pelo contribuinte.
E mais concluiu que a revisão do acto tributário por «iniciativa da administração tributária» pode ser efectuada «a pedido do contribuinte», como resulta do art. 78.º, n.º 7 da LGT e do art. 86.º, n.º 4, al. a), do CPPT, bem como dos princípios da legalidade, justiça, igualdade e imparcialidade - art. 266º, nº 2 da CRP e que o «erro imputável aos serviços» constante do art. 78.º, nº 1, in fine, da LGT, compreende o erro de direito e não apenas o lapso, erro material ou erro de facto, como aliás veio esclarecer o n.º 3 do art. 78.º da LGT, na redacção introduzida pelo art. 40.º da Lei n.º 55-B/04, de 30/12.
Todavia, a respeito da questão de a saber se a falta de fundamentação do acto tributário pode ser enquadrada no conceito de erro imputável aos serviços a que se alude na segunda parte do citado nº 1 do art. 78º da LGT, nada se refere, argumenta ou conclui, ao menos expressamente, neste acórdão fundamento.
Diz-se no acórdão:
«… conclui-se, pois, pela tempestividade do pedido de revisão oficiosa apresentado pela ora autora.
Quanto ao pedido de condenação à prática do acto de deferimento do pedido de revisão formulado pela autora, importa referir que o tribunal não pode substituir-se à administração tributária, uma vez que estamos perante uma situação de amplos poderes discricionários da administração e esta invocou infundadamente a existência de uma questão prévia (a extemporaneidade da pretensão) para se recusar a apreciar a pretensão que lhe foi formulada.
Nestas situações, ao tribunal apenas compete verificar se a questão prévia não existe e, com base em tal verificação, condenar a administração a pronunciar-se sobre o mérito da pretensão em causa e, como a administração também não chegou a exercer os seus poderes de valoração quanto ao mérito da pretensão, o tribunal também não pode pronunciar-se sobre os termos em que se processou tal exercício, para o efeito de estabelecer quaisquer parâmetros a esse respeito (…)
Fundamentação que apoiamos e subscrevemos sem reservas de convicção.
Com efeito, no caso vertente, em que o pedido de revisão teve por objecto um acto de liquidação que o sujeito passivo reputa de ilegal – por, na sua perspectiva, ter sido emitido ao abrigo de uma errada interpretação e aplicação do Direito aplicável, com desacertada aplicação aos factos relevantes (O sublinhado é nosso.) – nada impede que ele possa, no prazo de quatro anos contados da liquidação (ou, caso o tributo não tenha ainda sido pago, a todo o tempo), solicitar à Administração que reveja oficiosamente esse acto, ficando com isso investido de um direito a uma decisão sobre o pedido formulado.
Conforme ficou dito na sentença, é hoje doutrinal e jurisprudencialmente pacífico o entendimento segundo o qual, existindo um erro de direito numa liquidação efectuada pelos serviços da administração tributária, e não decorrendo essa errada aplicação da lei de qualquer informação ou declaração do contribuinte, o erro em questão é imputável aos serviços, pois tanto o n.º 2 do artigo 266° da Constituição como o artigo 55° da Lei Geral Tributária estabelecem a obrigação genérica de a administração tributária actuar em plena conformidade com a lei, razão por que qualquer ilegalidade não resultante de uma actuação do sujeito passivo será imputável à própria Administração. (…)
Em suma, a revisão do acto tributário por «iniciativa da administração tributária» pode ser efectuada «a pedido do contribuinte», como resulta do artigo 78.º, n.º 7 da LGT e do artigo 86.º, n.º 4, alínea a), do CPPT, bem como dos princípios da legalidade, justiça, igualdade e imparcialidade - art. 266º, nº 2 da CRP. E o «erro imputável aos serviços» constante do artigo 78.º, nº 1, in fine, da LGT compreende o erro de direito e não apenas o lapso, erro material ou erro de facto, como aliás veio esclarecer o n.º 3 do artigo 78.º da LGT, na redacção introduzida pelo artigo 40.º da Lei n.º 55-B/04, de 30 de Dezembro.
É esta jurisprudência consolidada e pacífica que aqui, mais uma vez, se acolhe (…) pois que nenhuma razão se descortina para dela divergir.»
Daqui se vê, portanto, que o aresto discorre sobre o conceito de “erro imputável aos serviços” vertido no nº 1 do art. 78º da LGT e aprecia essa problemática, não por referência à falta de fundamentação do acto tributário cuja revisão se pede, mas, antes, por referência a um invocado erro substancial, a um “erro imputável aos serviços” decorrente de «… errada interpretação e aplicação do Direito aplicável, com desacertada aplicação aos factos relevantes…», isto é, o «erro imputável aos serviços» questionado e apreciado no acórdão fundamento não se reporta a situação em que a causa de pedir e o que se controverte se reportem exclusivamente ao “vício de falta de fundamentação” do acto cuja revisão se pretende (como no caso dos autos sucede). Dito de outro modo, a questão da falta de fundamentação do acto tributário poder, ou não, ser enquadrada no conceito de erro imputável aos serviços a que se alude na segunda parte do nº 1 do art. 78º da LGT, não foi objecto de apreciação por parte do acórdão fundamento, onde apenas se afirma que, segundo o que decorre do nº 7 desse mesmo normativo e da al. a) do nº 4 do art. 86º do CPPT, a revisão do acto tributário, por iniciativa da AT, pode ser efectuada «a pedido do contribuinte» e que o «erro imputável aos serviços» constante do segmento final do nº 1 daquele mencionado art 78º da LGT, compreende o erro de direito e não apenas o lapso, erro material ou erro de facto.
Apreciou-se ali, pois, questão diversa daquela que foi apreciada na decisão arbitral recorrida.
Afastadas ficam, assim, a identidade substancial das situações em confronto e a divergência de soluções quanto à mesma questão de direito, não cabendo, portanto, apreciar o mérito da decisão arbitral recorrida, nomeadamente se o conceito de «erro imputável aos serviços» deve ser interpretado no sentido de incluir a falta de fundamentação do acto, sendo que, de todo o modo, apenas seria relevante para fundamentar o presente recurso a oposição entre soluções expressas e que tal oposição deverá existir relativamente às decisões propriamente ditas e não em relação aos seus fundamentos [não bastando, sequer, como supra também já se deixou dito, a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (cfr., além da jurisprudência e doutrina supra referenciadas, Jorge de Sousa e Simas Santos, Recursos Jurisdicionais em Contencioso Fiscal, p. 424; bem como, os acs. do Plenário do STA, de 15/11/2006, rec. nº 387/05, e os acs. do Pleno desta Secção do STA, de 15/9/2010, recs. nºs. 344/2009 e 881/2009)].

3.3.3. Não se mostram, então, reunidos os pressupostos da oposição de acórdãos que é invocada pela recorrente, pelo que, atento o disposto no n.º 4 do art. 152.º do CPTA e no n.º 5 do art. 284.º do CPPT, aplicável subsidiariamente, o recurso deve considerar-se findo.

DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA acordam em não tomar conhecimento deste recurso para uniformização de jurisprudência.
Custas pela recorrente.
Comunique-se ao CAAD.
Lisboa, 15 de Abril de 2015. – Joaquim Casimiro Gonçalves (relator) – Isabel Cristina Mota Marques da SilvaJosé da Ascensão Nunes LopesFrancisco António Pedrosa de Areal RothesPedro Manuel Dias DelgadoAna Paula da Fonseca LoboJosé Maria da Fonseca CarvalhoDulce Manuel da Conceição Neto.