Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0728/15
Data do Acordão:10/12/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:EMBARGOS DE TERCEIRO
CADUCIDADE
CÔNJUGE DO EXECUTADO
Sumário:I - O prazo para deduzir embargos de terceiro é de 30 dias após o conhecimento pelo embargante do acto ofensivo do direito que se pretende defender através dos embargos, mas nunca após a venda (art. 237.º, n.º 3, do CPPT).
II - Esse prazo, estando sujeito às regras de contagem dos prazos processuais, não se suspende senão nas férias judiciais (cfr. 138.º, n.º 1, do art. do CPC, aplicável ex vi do n.º 2 do art. 20.º do CPPT).
III - Perante a penhora de um bem imóvel que se mantinha por partilhar na sequência do divórcio do executado em momento anterior ao da constituição das dívidas exequendas, a circunstância de o ex-cônjuge do executado ter erradamente pedido ao tribunal judicial a separação de bens (ao abrigo do art. 1406.º do CPC, na versão em vigor à data), não permite que, para efeitos do prazo para deduzir embargos de terceiro à penhora, se considere que o prazo esteve suspenso ou que houve justo impedimento (tal como configurado pelo art. 146.º do CPC) pelo período que medeia entre a apresentação de requerimento de inventário para partilha dos bens e o trânsito da decisão judicial que indeferiu liminarmente aquele requerimento.
IV - Isto ainda que o órgão da execução fiscal, que desconhecia o divórcio, tanto mais que o prédio penhorado ainda constava do registo como bem comum do casal cujo casamento há muito fora dissolvido, tenha citado o ex-cônjuge e ora embargante ao abrigo dos arts. 220.º e 239.º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA00069842
Nº do Documento:SA2201610120728
Data de Entrada:06/08/2015
Recorrente:A.....
Recorrido 1:INST DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF ALMADA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CCIV66 ART1688 ART1689.
CPC96 ART1404 ART1406.
CPC13 ART138 N1 ART576 N1 N3.
CPPTRIB99 ART232 ART237 N3 ART239 ART220.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0973/09 DE 2011/05/18.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLIII PAG642-643 VOLI PAG275-276.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de embargos de terceiro com o n.º 267/10.6BEALM

1. RELATÓRIO

1.1 A……… (adiante Embargante ou Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, julgando verificada a excepção de caducidade do direito de acção, absolveu a Exequente da instância nos embargos de terceiro que deduziu contra a penhora de um prédio urbano efectuada em processo de execução fiscal, instaurado contra uma sociedade para cobrança de dívidas à Segurança Social e que reverteu contra o ex-marido da Embargante, com o fundamento que este acto ofende a sua propriedade, uma vez que o prédio anda não foi partilhado pelos ex-cônjuges, bem como também ofende a sua posse sobre aquele imóvel, que, enquanto casa de morada de família, lhe foi atribuído quando do divórcio.

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo e a Recorrente apresentou as alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«1. Os presentes autos de embargos têm a sua origem na citação que foi feita à embargante, nos termos dos artigos 220.º e 239.º, n.º 1 in fine do CPPT, para efeito de requerer a separação de meações, à qual a embargada juntou dois autos de penhora datados de 30.04.2009, um referente ao processo de execução fiscal n.º 1501200601272071 e apensos, e outro referente processo de execução fiscal n.º 1501200601272080 e apensos.

2. A embargante deduziu os embargos em causa nestes autos, face ao auto de penhora elaborado nos processos de execução fiscal n.º 1501200601272071 e apensos (cotizações), sendo que os embargos de terceiro referentes ao processo de execução fiscal n.º 1501200601272080 e apensos (contribuições) deram origem ao Proc. n.º 266/10.8BEALM a correr termos na Unidade Orgânica 2 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada.

3. A embargante foi citada, no âmbito dos processos de execução fiscal movidos pelo IGFSS, nos termos do disposto nos artigos 220.º e 239.º do CPPT, de que dispunha de 30 dias para requerer a separação judicial de bens, sob pena de prosseguirem as execuções sobre o bem penhorado, caso o não fizesse ou negligenciasse a prossecução dos seus termos processuais.

4. A embargante, estando, à data da citação efectuada nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 220.º e 239.º do CPPT, já divorciada do responsável subsidiário, B........., mas mantendo ainda os bens adquiridos na constância do casamento em comum, optou por instaurar, no prazo que lhe foi concedido para o efeito, acção para inventário/partilha de bens, junto do Tribunal de Família e Menores e de Comarca do Seixal, a qual recebeu o n.º 3658/09.1TBSXL e foi distribuída ao 1.º Juízo Cível.

5. A opção da embargante pela acção instaurada, em detrimento do inventário para partilha pós-divórcio, deveu-se ao facto de ter para tal sido citada pela embargada, conduzindo a que até à partilha dos bens os processos de execução fiscal ficassem suspensos e, além disso, com tal acção que conduziria à partilha dos bens tornar-se-iam desnecessários os presentes embargos, porque das duas uma, ou o bem ficava adjudicado à embargante e quanto muito a embargada penhoraria as tornas que o responsável subsidiário tivesse que receber, ou o bem ficava adjudicado ao responsável subsidiário e não haveria qualquer necessidade dos embargos de terceiro por parte da embargante, para efeito de levantamento da penhora sobre o imóvel.

6. Imediatamente após ter instaurado a referida acção informou a requerente por carta datada de 30.06.2009 e enviada sob registo, com aviso de recepção nesse mesmo dia para a embargada, que a recebeu a 1.07.2009, de que na sequência da citação efectuada para o efeito, havia instaurado a acção com vista à separação judicial dos bens, com indicação do respectivo número, tribunal e juízo.

7. Nos referidos autos do processo 3658/09.1TBSXL, foi proferida sentença na qual o Tribunal de Competência Especializada Cível se julgou incompetente para julgar a acção, considerando competente para o efeito o Tribunal de Família, indeferindo, assim, liminarmente o requerimento inicial.

8. Desta decisão interpôs a embargante recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que manteve o indeferimento liminar do requerimento inicial, embora com fundamento diferente, por entender que o processo a instaurar seria o processo de inventário para partilha de bens na sequência do divórcio.

9. O acórdão supra referido, proferido a 12.01.2010, foi notificado à embargante a 15.01.2010. Assim, considerando-se a notificação da decisão efectuada no 3.º dia após o registo, ou seja, no dia 18.01.2010, esta decisão transitou em julgado em 22.02.2010.

10. Todavia, ainda antes do trânsito em julgado da referida decisão, a embargante deu entrada do inventário para partilha de bens na sequência do divórcio e dos presentes embargos de terceiro.

11. A embargante reagiu atempadamente à citação que lhe foi efectuada pela embargada [(Permitimo-nos corrigir o lapso de escrita: escreveu-se embargante onde queira dizer-se embargada.)], após efectivação da penhora, e mediante a qual lhe deu conhecimento da mesma tendo a embargante instaurado a acção que lhe pareceu a mais adequada aos efeitos pretendidos.

12. Antes do trânsito em julgado do acórdão proferido pela Relação de Lisboa, a embargante diligenciou pela instauração de inventário para partilha de bens, nos termos do disposto no artigo 1407.º do CPC na sua anterior redacção, junto do Tribunal de Família e Menores do Seixal, deduzindo então os presentes embargos de terceiro.

13. O prazo de 30 dias estabelecido no artigo 237.º do CPPT, à semelhança do prazo estabelecido no artigo 344.º, n.º 2 do CPC, constitui um prazo de caducidade, de natureza processual e não substantiva.

14. Prescreve o artigo 328.º do C. Civil que o prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei determine, estabelecendo-se o princípio geral da insusceptibilidade de suspensão e de interrupção do prazo de caducidade.

15. Todavia, o princípio referido não tem, no entanto, carácter absoluto, admitindo-se que a lei possa determinar a suspensão ou a interrupção do prazo de caducidade, não resultando, porém, da formulação normativa a exigência de uma declaração expressa da lei, no sentido da aplicabilidade das causas de suspensão ou de interrupção do prazo de caducidade.

16. Essa autorização pode, assim, concluir-se do espírito da lei, ou mesmo do respectivo texto, pese embora a ausência de referência explícita.

17. Nos termos do artigo 321.º do C. Civil, a prescrição suspende-se durante o tempo em que o titular estiver impedido de fazer valer o seu direito, por motivo de força maior, no decurso dos últimos três meses de prazo.

18. Trata-se aqui quer dos impedimentos de facto quer dos impedimentos de natureza jurídica, em particular quando não esteja reunidas, no plano jurídico, as condições necessárias para o exercido do direito, pelo seu titular, tornando inexigível a sua actuação.

19. A embargante viu-se, assim, perante um prazo que lhe foi concedido, de caducidade, no seu entender, uma vez que se não exercesse no prazo de 30 dias o seu direito de acção para efeito da separação judicial dos bens, a execução prosseguiria os seus trâmites sobre o bem penhorado. No entanto estava já em curso, em simultâneo o prazo, também de caducidade, para deduzir embargos de terceiro, conducentes ao levantamento da penhora sobre o bem que também é de sua propriedade.

20. A apelante, porque entendeu que optando por instaurar o processo para separação judicial de bens, que constitui uma reacção à penhora efectuada, não teria seguimento pelo menos de imediato, até que fosse efectuada a partilha, o processo de execução fiscal no qual já se encontrava penhorado um bem que é também de sua propriedade, viu no mesmo a oportunidade de, obstando à venda do bem, definir a sua situação com o responsável subsidiário, partilhando o imóvel penhorados que constituía um bem que é de ambos, e deu conhecimento dessa sua reacção à embargada.

21. A embargante não podia era instaurar acção para separação judicial de bens e embargar de terceiro, até porque existia o risco de as decisões a proferir não estarem em consonância, nomeadamente se o bem ficasse adjudicado ao responsável subsidiário.

22. Pelo que, instaurada a acção para partilha dos bens na sequência da citação que para o efeito lhe foi feita pela embargada, o prazo para instaurar embargos de terceiro ficará suspenso, verificando-se por efeito da mesma um impedimento jurídico à dedução de embargos de terceiro, impedimento que só terminaria com o trânsito em julgado do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, data a partir da qual será possível retomar a contagem do prazo de caducidade para efeito de apresentação de embargos de terceiro.

23. Considerando que a embargante foi citada em 5.06.2010, citação através da qual tomou conhecimento da penhora sobre o imóvel e que deu entrada da acção para inventário/partilha de bens em casos especiais em 29.06.2010,ou seja, 24 dias após a citação, o prazo para efeito de apresentação de embargos, suspende-se na data em que é remetida a acção para o tribunal, o que se impõe por força do disposto nos artigos 328.º, 321.º, n.º 1 [(Permitimo-nos corrigir o manifesto lapso de escrita: a Recorrente deixou por preencher com o dígito o espaço após n.º.)] e 9.º, n.ºs 1 e 3, todos do C. Civil.

24. Considerando também, que foi indeferido liminarmente o requerimento inicial, por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, do qual foi dado conhecimento à embargante por notificação de 15.01.2010, o qual viria a transitar em julgado em 22.02.2010, pelo que se retomaria a contagem do prazo de caducidade para efeito de dedução de embargos de terceiro em 23.02.2010, conclui-se que quando a embargante interpôs os embargos de terceiro aqui em causa faltavam ainda 6 dias para o termo do prazo de caducidade da sua apresentação.

25. Ao decidir no sentido de indeferir, por intempestivos os embargos apresentados violou o tribunal “a quo” as normas dos artigos 328.º, 321.º, n.º 1 [(Idem.)] e 9.º, n.ºs 1 e 3 todos do C. Civil.

26. Uma correcta interpretação e aplicação destes normativos conduziria a que se considerasse os embargos de terceiro tempestivamente apresentados.

27. Por outro lado, entende a embargante existir também com a propositura da acção indicada na alínea I do probatório, um justo impedimento à dedução de embargos de terceiro. Há que verificar então se tem aplicabilidade no âmbito dos presentes autos, o disposto no artigo 140.º do CPC.

28. Ao abrigo do disposto na alínea e) do artigo 2.º do CPPT, são de aplicação supletiva ao procedimento e processo judicial tributário, de acordo com a natureza dos casos omissos, entre outras, as normas do código de processo civil.

29. Considerando o cabal cumprimento, pela embargante, do disposto no n.º 2 do artigo 140.º do CPC, não há como não considerar que os factos por si alegados e provados consubstanciam justo impedimento, ao abrigo no n.º 1 do artigo 140.º, à dedução de embargos de terceiro no prazo previsto no artigo 237.º, n.º 3 do CPPT, considerando-se dessa forma tempestivos os presentes embargos de terceiro.

30. Violando a douta decisão recorrida também o artigo 140.º, n.º 1 do CPC.

Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão proferido e substituindo-se a mesma por outra que julgue tempestivamente apresentados os embargos de terceiro da recorrente, ordenando-se o levantamento da penhora sobre o imóvel penhorado nos autos de execução fiscal».

1.3 O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (IGFSS) apresentou contra-alegações, que rematou com conclusões do seguinte teor:

«A. A Recorrente vem insurgir-se contra a sentença judicial proferida pela Mm.ª Juiz de Direito do Tribunal “a quo”, que julgou extemporâneos os embargos de terceiro.

B. O incidente de embargos de terceiro é o meio processual adequado para quem for ofendido na sua posse por penhora ou qualquer outro acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, reagir contra a ofensa dos seus direitos.

C. Nos autos de execução fiscal, por força da modificação subjectiva da instância, foi penhorado um imóvel cuja titularidade pertence ao revertido e à ora Recorrente.

D. A Recorrente foi citada pelo Recorrido em 05.06.2009, nos termos do art. 220.º e 239.º. in fine do CPPT.

E. A Recorrente veio aos autos de execução fiscal dar conhecimento que havia intentado uma acção de inventário para partilha de bens comuns do casal.

F. Todavia foi rejeitada a p.i. pelo Tribunal de Família e Menores da Comarca do Seixal, tendo sido confirmada a sentença pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.

G. Em 12.02.2010, foi interposta pela Recorrente nova acção de inventário e Partilha.

H. Em 18.02.2010, foi apresentada a petição inicial de embargos de terceiro no Recorrido.

I. O prazo para deduzir os embargos de terceiro encontra-se plasmado no art. 237.º n.º 3 CPPT, e são dias 30 dias, contados a partir do dia em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa.

J. O prazo de dedução dos embargos de terceiro reveste a natureza de prazo processual, peremptório e passível de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final do processo.

K. O decurso do prazo configura uma causa extintiva do direito potestativo de acção, sendo esta excepção de caducidade de conhecimento oficioso pelo Tribunal, desde que o processo contenha elementos de facto que a tal permitam, nos termos do art. 343.º, n.º 2 do C. C.

L. A caducidade do direito de acção foi arguida pelo Recorrido na sua contestação a título de questão prévia.

M. O Tribunal deve proceder, prioritariamente, à análise das excepções que obstem ao conhecimento do mérito da causa, entre elas constando a tempestividade da p.i. de embargos, dado que o despacho liminar que admite os embargos de terceiro apenas assegura o seguimento dos restantes trâmites do processo não formando caso julgado formal relativamente a tal matéria.

N. O Tribunal “a quo” analisou a excepção invocada pelo Recorrido.

O. O decurso do prazo determina que o direito a deduzir os embargos caducou.

P. Claramente está demonstrada a extemporaneidade da petição de embargos de terceiro, uma vez que o prazo para dedução terminou no dia 04 de Julho de 2009 e a petição deu entrada em 18 de Fevereiro de 2010.

Q. Face ao conhecimento desta excepção e à sua verificação, ficou prejudicado o conhecimento quanto ao mérito da acção.

R. No que concerne aos restantes factos invocados pela Recorrente, não existiu qualquer erro na decisão recorrida e, sem sombra de dúvida, as disposições legais que a mesma invoca como violadas não se aplicam à situação em apreço.

S. Contudo, sempre se dirá que, o prazo de suspensão que a Recorrente invoca é o de suspensão da execução fiscal.

T. Assim, não deve existir confusão entre a suspensão da execução fiscal e a suspensão do prazo para deduzir os embargos de terceiro.

U. “In casu” não existiu facto ou causa que influísse no prazo para deduzir embargos, nomeadamente causas de suspensão.

V. No que se reporta ao justo impedimento dir-se-á que a Recorrente não fundamentou o seu pedido legalmente, pelo que o Tribunal não aprecia meras alegações factuais.

W. As normas legais invocadas pela Recorrente para interposição de recurso jurisdicional não se subsumem no caso em apreço.

X. A p.i. de embargos é manifestamente extemporânea.

Y. A caducidade do direito de acção constitui uma excepção dilatória, nos termos do art. 576.º n.º 2 do CPC, que obsta a que o Tribunal conheça do mérito da causa.

Z. A sentença do Tribunal “a quo” fez correcta interpretação da matéria que lhe foi submetida, não existindo erro de julgamento de direito ao decidir como decidiu.

AA. Pelo contrário, o douto acórdão deve confirmar a sentença recorrida.

BB. Termos em que a decisão recorrida deve-se manter no ordenamento jurídico, por forma produzir os efeitos jurídicos nos autos de execução fiscal.

Nestes termos, e nos mais de Direito que Vossas Excelências suprirão, deverá o presente Recurso ser dado como improcedente e mantida a decisão recorrida».

1.4 Neste Supremo Tribunal Administrativo os autos foram com vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, embora salientando que a consequência da excepção peremptória da caducidade do direito de acção é a absolvição do pedido, e não da instância, com a seguinte fundamentação:

«[…] A única questão que se suscita consiste em saber se a decisão recorrida fez incorrecto julgamento ao ter considerado verificada a intempestividade dos embargos de terceiro
Como se alcança da matéria de facto dada como assente na sentença recorrida e que não é posta em causa pela Recorrente, no âmbito da execução fiscal foi penhorado bem que faz parte do património comum, tendo a Recorrente sido citada nos termos dos artigos 220.º e 239.º do CPPT no pressuposto de que ainda se encontrava casada com o executado e para efeitos de, querendo, requerer a separação de bens, uma vez que a dívida em execução era da exclusiva responsabilidade do executado. Nestes casos, se a separação judicial de bens não for requerida no prazo de 30 dias a execução fiscal prosseguirá os seus termos. E se for demonstrado o seu requerimento o processo de execução aguardará o seu resultado – artigo 220.º do CPPT.
Nesses casos, embora a dívida seja da exclusiva responsabilidade do executado, é pois possível a penhora de bens comuns do casal, motivo pelo qual se dá a possibilidade ao cônjuge não responsável pela dívida de pedir a separação de bens e cujo requerimento impede o prosseguimento da execução fiscal nessa parte.
Distinta é a situação em que é penhorado bem que faz parte do património comum de pessoas já divorciadas, caso em que tal penhora é ilegal e contra a qual o titular que não for executado pode deduzir embargos de terceiro, como é o caso dos presentes autos. Sendo ilegal a penhora, por incompatibilidade do acto de apreensão com o direito do titular que não é parte no processo executivo, não se coloca neste caso a faculdade de separação e partilha de bens que é conferida ao cônjuge do executado nos termos do artigo 220.º do CPPT.
Sendo os embargos de terceiro o meio adequado para reagir perante tal acto – artigo 351.º, n.º 1, do anterior Código de Processo Civil –, estes têm que ser deduzidos no prazo de 30 dias a contar da data em que se tomou conhecimento da realização da penhora, atento o disposto no n.º 3 do artigo 237.º do CPPT e artigo 353.º, n.º 2, do anterior Código de Processo Civil.
Resultando da matéria de facto assente na sentença recorrida e que não é contestada pela Recorrente que esta tomou conhecimento da penhora aquando da sua citação em 05/06/2009, o prazo para deduzir embargos terminava a 05/07/2009.
Uma vez que os embargos só foram apresentados em 18/02/2010 é manifesta a sua intempestividade.
Carecem, assim, de qualquer fundamento legal os argumentos esgrimidos pela Recorrente, assim como se mostra impertinente o apelo ao disposto nos artigos 328.º e 329.º do Código Civil, cuja disciplina não tem aplicação neste caso».

1.7 Foi dada vista aos Conselheiros adjuntos.

1.8 Cumpre apreciar e decidir.


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada deu como provados os seguintes factos:

«A. B……… e A………. casaram em 17/08/1991 (cfr. fls. 36).

B. O casamento foi dissolvido por divórcio decretado por sentença de 24/02/1999, transitada em 08/03/1999, proferida pelo Tribunal Judicial de Seixal - 2.º Juízo (cfr. teor de fls. 36).

C. Foi instaurado no Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, o processo de execução fiscal n.º 1501200601272071 e apensos em nome da sociedade C………., Lda., por dívida de cotizações e contribuições de diversos anos no montante total de € 102.442,05 (cfr. fls. 2/6 do processo executivo em apenso).

D. No âmbito do processo de execução fiscal mencionado na alínea anterior, foi proferido despacho de reversão contra B……….., na qualidade de responsável subsidiário pela dívida da sociedade C……….., Lda. (cfr. fls. 33 do apenso).

E. Em 30/04/2009 foi lavrado o auto de penhora do prédio urbano destinado a habitação correspondente à fracção I sito na Rua ……….., ………., …….., inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ……. sob o artigo 2946, com o valor patrimonial de € 46.924,38 (cfr. fls. 92/93 do apenso).

F. Em 12/05/2009 foi efectuado na Conservatória do Registo Predial de Amora o registo da penhora a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social IP da fracção registada sob o n.º 2946/20081114-1 para garantia da quantia exequenda de € 72.143,58 (cfr. teor de fls. 90 do apenso).

G. Em 28/05/2009 (Embora na sentença se tenha deixado escrito Em 28/05/2008 (?), isto porque a data inscrita no ofício remetido para citação é 2008-05-28 (cfr. fls. 94 da cópia do processo executivo em apenso), é manifesto que neste ocorreu lapso de escrita, tendo-se escrito 2008-05-28 onde se queria escrever 2009-05-28, pois é manifesto que a citação não podia anteceder a penhora e, ademais, o documento de fls. 97 do apenso (cópia do aviso de recepção respeitante ao oficio remetido para citação) confirma a recepção em 5 de Junho de 2009-) foi emitida a citação dirigida a A…………. com o seguinte teor:
Assunto: Citação nos termos do Artigo 220.º e 239.º, n.º 1 in fine do CPPT
Responsável Subsidiário: B……….
NIF Responsável subsidiário: ………..
PEF’s: 1501200601272011 e 1501200601272080
Fica V. Exa. notificada que, no âmbito do(s) processo(s) Executivo(s) acima identificado(s), procedeu-se ao registo de penhora, a favor do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, sobre o prédio urbano identificado no(s) auto(s) de penhora que se junta(m). Mais, fica V. Exa citado(a) na qualidade de cônjuge do executado, relativamente aos Processos de Execução Fiscal supra identificados, nos termos e para os efeitos do Artigo 239.º, n.º 1, do CPPT, para no prazo de 30 dias a contar desta citação, requerer a separação judicial de bens, prosseguindo a execução sobre os bens penhorados se esta não for requerida dentro do referido prazo ou se se suspender a instância por inércia ou negligência do requerente em promover os seus termos processuais
(cfr. fls. 94/96 do apenso).

H. A citação referida na alínea anterior foi enviada através de carta registada com aviso de recepção tendo este sido assinado em 05/06/2009 (cfr. fls. 97 do apenso).

I. Em 01/07/2009 deu entrada na Secção de Processos do IGFSS requerimento em nome da ora embargante no qual informa “(…) que intentou em 29/06/2009, junto do Tribunal Judicial da Comarca do Seixal, inventário para separação de bens (...) Mais informa que o processo foi distribuído ao 1.º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca do Seixal e corre termos com o n.º 3658/09.1TBSXL. Mais requer que as execuções fiscais, supra identificadas fiquem suspensas até à partilha” (cfr. teor de fls.98 do apenso).

J. Por Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/01/2010 foi indeferido liminarmente o requerimento referido na alínea anterior com a fundamentação constante de fls. 50/65 dos presentes autos.

K. Em 15/02/2010 deu entrada no Tribunal de Família e Menores e de Comarca do Seixal acção de inventário/partilha de bens em casos especiais sendo requerente A…….. e requerido B………. (cfr. fls. 66/71 dos presentes autos).

L. Em 18/02/2010 deu entrada na Secção de Processos do IGFSS a petição de embargos de fls. 3/10.

M. Sempre que a embargante vem a Lisboa fica na casa de ……… (cfr. depoimento das testemunhas)».


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2.2 DE FACTO E DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

Numa execução fiscal instaurada contra uma sociedade e que reverteu contra B……….., que foi considerado responsável subsidiário pelas dívidas exequendas, provenientes de cotizações dos anos de 2005 e 2006, foi penhorado um bem imóvel, que estava registado em nome do executado por reversão e de A………. – a ora Recorrente –, que tinham adquirido o imóvel na constância do casamento entre ambos, mas que tinha já sido dissolvido por divórcio – decretado por decisão judicial proferida em 1999, e que transitou em julgado –, quando da penhora, que teve lugar em 2009. Em todo o caso, à data da penhora o bem ainda não tinha sido partilhado [após o divórcio deve ser partilhado o património comum, nos termos do disposto no art. 1689.º do Código Civil (CC), cujo n.º 1 dispõe: «Cessando as relações patrimoniais entre os cônjuges, estes ou os seus herdeiros recebem os seus bens próprios e a sua meação no património comum, conferindo cada um deles o que dever a este património»], pelo que continuava a ser um bem comum do dissolvido casal; comum, não no sentido de pertença a um património conjugal comum (com o divórcio deixou de haver bens comuns do casal, pois as relações patrimoniais entre os cônjuges cessam, como prescreve o n.º 1 do art. 1688.º do CC), mas no sentido de ser, até à divisão do património que foi comum do casal, um bem que integra um património autónomo, um bem relativamente ao qual cada um dos ex-cônjuges tem um direito a uma quota ideal (a correspondente à sua meação).
Na verdade, «após o divórcio, o ex-cônjuge passa a deter, relativamente ao património comum um direito a uma quota ideal do valor do conjunto de bens que o integram, a meio caminho juridicamente entre a comunhão hereditária e a compropriedade, sem se poder completamente reconduzir a nenhuma das duas figuras jurídicas» (Cfr. acórdão desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 18 de Maio de 2011, proferido no processo n.º 973/09, publicado no Apêndice ao Diário da República de 6 de Janeiro de 2012 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2011/32220.pdf), págs. 794 a 803, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/fddbc6606542e8f28025789b004d927d,
que faz um exaustivo tratamento do tema.).
Porque assim é, naquelas situações, como a sub judice, em que a execução é instaurada apenas contra um dos ex-cônjuges e é penhorado um bem que foi património do casal mas ainda se não encontra partilhado, devem seguir-se as regras do art. 232.º do CPPT, que regula as formalidades da penhora de bens indivisos (Explicando detalhadamente o regime da penhora de bens indivisos, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, III volume, anotação 2 ao art. 232.º, págs. 642/643.).
No entanto, no caso o órgão da execução fiscal não sabia do divórcio; pelo contrário, o registo predial do prédio penhorado fazia crer que era propriedade do casal constituído pelo Executado e a ora Recorrente.
No desconhecimento do divórcio – que não tinha obrigação de conhecer – e porque as dívidas exequendas são da responsabilidade exclusiva do Executado, chamado à execução como responsável subsidiário, o órgão da execução fiscal procedeu à citação da ora Recorrente, «na qualidade de cônjuge do executado», «para no prazo de 30 dias a contar desta citação, requerer a separação judicial de bens, prosseguindo a execução sobre os bens penhorados se esta não for requerida dentro do referido prazo ou se se suspender a instância por inércia ou negligência do requerente em promover os seus termos processuais».
Aliás, a ora Recorrente nunca afirma (nem faria sentido que afirmasse) que a Exequente andou mal ao proceder à penhora nos termos em que o fez, nem ao citá-la para, querendo, requerer a separação de meações. O que sustenta é que, em face dessa citação, pela qual tomou conhecimento da penhora, foi requerer acção «para inventário/partilha de bens», disso dando conhecimento à Exequente, ao invés de se defender mediante embargos de terceiro; mais afirma que, sendo a decisão final daquele processo de indeferimento liminar do requerimento inicial, se deve considerar que o prazo para deduzir embargos se suspendeu durante o período que mediou entre a apresentação do requerimento inicial e o trânsito em julgado da decisão que o indeferiu liminarmente; mais sustenta que, durante esse mesmo período, deve considerar-se que houve justo impedimento relativamente à dedução dos embargos de terceiro, na medida em que a dedução destes só foi possível após o trânsito em julgado da decisão de indeferimento liminar do requerimento para inventário.
Note-se que a ora Recorrente, apesar de afirmar que apresentou requerimento para a partilha de bens, o que efectivamente fez foi apresentar requerimento para a separação de bens. Foi por isso que foi indeferida a sua pretensão, com o fundamento de que «estando a recorrente já divorciada, não faz sentido requerer a separação de bens mas sim a partilha dos bens», motivo por que «é manifestamente improcedente a sua pretensão de obter a separação de bens nos termo do art. 1406.º do CPC, pois a aplicação deste normativo, ao ter como pressuposto a manutenção da sociedade conjugal, supõe a não sujeição da partilha às normas do direito substantivo que dispões sobre os efeitos patrimoniais do divórcio», de acordo com o acórdão da Relação de Lisboa, com cópia de fls. 51 a 65 (Também disponível em
http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/56cd243a1a795a52802576b800401d01. ). Ou seja, como também aí ficou dito, a Recorrente «não pretende que se proceda à partilha de bens na sequência de divórcio, isto é, não pretende que se proceda a inventário nos termos do art. 1404.º do CPC, antes pretende obter a separação de bens como se, afinal, não tivessem já cessado as relações patrimoniais entre si e o requerido [o aqui Executado]» (Note-se que as referências ao CPC são para a versão em vigor à data. Ulteriormente, as disposições legais aludidas foram revogadas pelo n.º 2 do art. 6.º da Lei n.º 23/2013, de 5 de Março, que aprovou o regime jurídico do processo de inventário. ).
Ulteriormente, em 15 de Fevereiro de 2010, a ora Recorrente instaurou inventário nos termos do art. 1404.º do CPC, ou seja, para partilha de bens após divórcio e em 18 de Fevereiro de 2010 fez dar entrada a petição inicial de embargos, que deu origem ao presente processo.
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, conhecendo a questão da caducidade do direito de deduzir os embargos (Questão que, sendo do conhecimento oficioso, no caso foi expressamente arguida pela Exequente e Embargada na contestação aos embargos.), considerou que a ora Recorrente tomou conhecimento da penhora em 5 de Junho de 2009 e os embargos apenas foram apresentados em 18 de Fevereiro de 2010, ou seja, para além do termo do prazo de trinta dias fixado para o efeito pelo art. 237.º, n.º 3, do CPPT, pelo que julgou os embargos intempestivos, em consequência do que absolveu a Embargada (Embora a sentença diga Fazenda Pública, é manifesto que queria referir-se à Segurança Social.) da instância (Adiante pronunciar-nos-emos quanto ao efeito jurídico da verificação da caducidade do direito de acção.).
A Embargante reagiu contra essa decisão mediante recurso endereçado a este Supremo Tribunal Administrativo. Aceitando as datas fixadas como sendo as do seu conhecimento da penhora e da apresentação da petição inicial de embargos de terceiro e aceitando também que o prazo para dedução dos embargos é de trinta dias a contar do conhecimento do acto ofensivo do direito, considera, no entanto, que no caso o prazo deve ter-se por suspenso ou verificado o justo impedimento relativamente à sua instauração.
Assim, a questão que cumpre apreciar e decidir, em ordem a sindicar o julgamento de caducidade do direito de acção proferido pela sentença recorrida, é a de saber se o prazo para interpor os embargos de terceiro deve ou não ter-se por suspenso pela apresentação do pedido de separação de bens que formulou junto do tribunal comum e se durante o período que mediou entre a apresentação do pedido e o trânsito em julgado da decisão que indeferiu liminarmente o respectivo requerimento se deve considerar que houve justo impedimento susceptível de diferir o termo final do prazo para embargar.

2.2.2 DA TEMPESTIVIDADE DOS EMBARGOS - SUSPENSÃO DO PRAZO PARA EMBARGAR E JUSTO IMPEDIMENTO

Como resulta do que deixámos dito, a tese da Recorrente assenta no pressuposto de que estava impedida de deduzir embargos de terceiro enquanto esteve pendente o processo de inventário para separação de meações.
Mas, não estava, de todo, impedida de deduzir embargos, sendo até que esse era o único meio ao seu dispor para obviar à penhora do prédio e à ofensa do seu direito de meação (Explicando detalhadamente o regime de defesa nestas situações em que é penhorado um bem que pertenceu ao património conjugal, entretanto dissolvido pelo divórcio, nos casos em que a dívida exequenda se constituiu após o divórcio, vide o acórdão referido na nota (4).). Isto sem prejuízo de sempre poder comunicar à Exequente a sua situação de divórcio e o pedido judicial de partilha de bem na sequência de divórcio (e não para separação de meações).
Não pode agora pretender retirar um benefício, qual seja a suspensão ou o diferimento do termo do prazo para embargar – benefício, aliás, não previsto nem autorizado à face da lei e dos princípios jurídicos – do uso que fez de um meio processual inadequado ao fim visado.
E nem diga que esse erro foi provocado ou sequer induzido pelos termos em que a citação lhe foi efectuada (O que lhe permitiria argumentar ao abrigo do art. 37.º, n.º 4, do CPPT, que dispõe: «No caso de o tribunal vier a reconhecer como estando errado o meio de reacção contra o acto notificado indicado na notificação, poderá o meio de reacção adequado ser ainda exercido no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão judicial».). Desde logo, porque a citação não enferma de erro algum: o órgão da execução fiscal não podia saber que o Executado estava divorciado, tanto mais que a questão do seu casamento só se colocou em face das inscrições registais respeitantes ao prédio, das quais este consta como propriedade do casal constituído pelo Executado e pela ora Recorrente.
No entanto, a Recorrente não podia desconhecer que o seu casamento com o Executado estava há muito dissolvido quando da citação, motivo por que lhe cumpria escolher meio de defesa adequado e que, após o divórcio, não mais era o da separação das meações.
Salvo o devido respeito, não faz sentido argumentar com a suspensão do prazo para embargar. Tal prazo, de natureza processual, apenas se pode suspender durante as férias judiciais e porque é de duração inferior a seis meses e não respeita a processo urgente, como decorre do disposto no art. 138.º, n.º 1, do art. do CPC («O prazo processual, estabelecido por lei ou fixado por despacho do juiz, é contínuo, suspendendo-se, no entanto, durante as férias judiciais, salvo se a sua duração for igual ou superior a seis meses ou se tratar de actos a praticar em processos que a lei considere urgentes».), aplicável ex vi do n.º 2 do art. 20.º do CPPT.
Não está prevista a possibilidade da sua suspensão em qualquer outra circunstância.
Por outro lado, sendo que o acto de apresentação dos embargos de terceiro, como todos os actos (Ainda que não sejam, como o é o prazo em causa, de natureza processual Na verdade, como diz JORGE LOPES DE SOUSA, «[e]sta regra do justo impedimento que, como transparece da sua própria designação, é reclamada por exigências evidentes de justiça, deve ser considerada de aplicação generalizada, não só por imperativo constitucional decorrente do princípio da justiça que decorre da ideia de Estado de Direito democrático consignada no art. 2.º da CRP, mas também do próprio princípio do acesso aos tribunais e à justiça (arts. 20.º, n.º 1, e 268º, n.º 4, da CRP) que não pode deixar de exigir para a sua concretização a concessão de uma possibilidade efectiva e não apenas teórica de utilização dos meios contenciosos de defesa de direitos e interesses legalmente protegidos. Aliás deve entender-se que vigora no nosso direito uma regra básica de que não deve perder direitos pelo decurso do tempo quem esteve impossibilitado de exercê-los, regra essa que tem vários afloramentos, um dos quais é a regra do justo impedimento» (Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume I, anotação 7 a) ao art. 20.º, págs. 275).), pode ser pode ser praticado para além do termo do prazo para o efeito em caso de justo impedimento, no caso não se verificam os respectivos requisitos.
Isto porque os factos alegados pela Recorrente em ordem a integrar o justo impedimento são inócuos para a verificação deste instituto. Como deixámos já dito, o excesso do prazo resulta apenas de um erro da Recorrente, que foi negligente na escolha do meio processual adequado à sua defesa, designadamente por ter ignorado o facto de o seu casamento com o Executado há muito ter sido dissolvido por divórcio.
Ora, o justo impedimento «não pode consistir em factos que constituam conduta culposa ou negligente da própria parte ou do seu mandatário» (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. e vol. cit., anotação 7 b) ao art. 20.º, pág. 276.).
Assim, bem andou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada quando julgou os embargos intempestivos.
Haverá apenas de ter-se em conta que, como bem salientou o Procurador-Geral Adjunto, a caducidade do direito de acção determina a absolvição do pedido e não da instância, uma vez que, porque obsta à produção do efeito jurídico dos factos articulados pelo autor, constitui excepção peremptória, nos termos do disposto no art. 576.º, n.ºs 1 e 3, do CPC, aplicáveis ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT.
Consequentemente, negaremos provimento ao recurso.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - O prazo para deduzir embargos de terceiro é de 30 dias após o conhecimento pelo embargante do acto ofensivo do direito que se pretende defender através dos embargos, mas nunca após a venda (art. 237.º, n.º 3, do CPPT).
II - Esse prazo, estando sujeito às regras de contagem dos prazos processuais, não se suspende senão nas férias judiciais (cfr. 138.º, n.º 1, do art. do CPC, aplicável ex vi do n.º 2 do art. 20.º do CPPT).
III - Perante a penhora de um bem imóvel que se mantinha por partilhar na sequência do divórcio do executado em momento anterior ao da constituição das dívidas exequendas, a circunstância de o ex-cônjuge do executado ter erradamente pedido ao tribunal judicial a separação de bens (ao abrigo do art. 1406.º do CPC, na versão em vigor à data), não permite que, para efeitos do prazo para deduzir embargos de terceiro à penhora, se considere que o prazo esteve suspenso ou que houve justo impedimento (tal como configurado pelo art. 146.º do CPC) pelo período que medeia entre a apresentação de requerimento de inventário para partilha dos bens e o trânsito da decisão judicial que indeferiu liminarmente aquele requerimento.
IV - Isto ainda que o órgão da execução fiscal, que desconhecia o divórcio, tanto mais que o prédio penhorado ainda constava do registo como bem comum do casal cujo casamento há muito fora dissolvido, tenha citado o ex-cônjuge e ora embargante ao abrigo dos arts. 220.º e 239.º do CPPT.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.


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Lisboa, 12 de Outubro de 2016. – Francisco Rothes (relator) – Aragão Seia – Casimiro Gonçalves.