Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0415/12.1BEBJA 01361/17
Data do Acordão:06/08/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:OPOSIÇÃO
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
TÉCNICOS OFICIAIS DE CONTAS
ESTATUTO
ORDEM DOS REVISORES OFICIAIS DE CONTAS
ÓNUS DE PROVA
Sumário: I – No artº.24º, nº.3, da L.G.T., na redacção decorrente da Lei nº 60-A/2005, de 30/12 - ESTATUTO DA ORDEM DOS TÉCNICOS OFICIAIS DE CONTAS – consagra-se a atribuição de uma responsabilidade subsidiária aos contabilistas certificados, a qual esteada fundamentalmente na violação da legis artis.
II - Essa responsabilidade assenta na verificação cumulativa dos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil, que são o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o prejuízo ou dano e o nexo de causalidade entre este e o dano.
III - A responsabilidade assim instituída pressupõe que o contabilista certificado é responsável pela regularidade contabilística do sujeito passivo e que em casos de falha no cumprimento desse dever, deve assumir a correspondente responsabilidade pelas dívidas deixadas de cobrar, por efeito de tal violação dos precisos deveres do ofício listados por esta disposição.
IV – Os meros erros técnicos não envolvem a responsabilidade do contabilista a qual só deve ser activada quando as falhas assentem numa violação tão profunda do normativo contabilístico que ponha em causa a própria função de que a contabilidade foi investida pelo ordenamento fiscal.
V - O nomeado regime não traduz - contrariamente ao que a alteração legislativa que eliminou a expressão “violação dolosa” e a introduzida pela Lei n.º 7/2021 de 26 de Fevereiro que a reintroduziu parece pressupor - uma verdadeira modalidade de responsabilidade objectiva. A responsabilidade continua a ser, ainda, subjectiva: o requisito da culpa continua a ser objecto de consideração pela hipótese legal.
VI - Deve considerar-se que a nova redacção conferida ao n.º 3 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária pela Lei nº 7/2021, de 26.02, possui cariz inovador e não interpretativo, uma vez que a solução do direito anterior não era controversa, sendo clara a intenção do legislador em contemplar as situações de actuações dolosa e negligente.
VII - A aplicação retroactiva da LN mais favorável (aqui sob a forma de eliminação de “infracção” anteriormente “punível”, a que se reporta o invocado artigo 2.º, n.º 2, do Código Penal) apenas deve ser reconhecida em relação à responsabilidade sancionatória propriamente dita (crimes e contra-ordenações fiscais), mas já não quanto à responsabilidade subsidiária de que se trata nos autos – e na medida em que só a primeira é equiparável à responsabilidade criminal, sendo por isso susceptível de beneficiar do regime emergente das citadas disposições da Constituição e do Código Penal. Logo, o princípio da aplicação da lei penal mais favorável não tem evidente aplicação em matéria de responsabilidade dos contabilistas certificados, pois nos encontramos num domínio “sancionatório” que não se confunde com o da responsabilidade criminal.
VIII - A culpa de que se fala é determinada não por referência ao incumprimento da obrigação fiscal, mas por referência ao incumprimento dos deveres que impendem sobre o contabilista, quanto à organização e regularidade da contabilidade do sujeito passivo.
IX - Isto significa que o contabilista certificado deverá ao menos alertar expressamente o sujeito passivo para a impossibilidade de cumprir as suas tarefas legais, sempre que este último impeça, obstaculize ou dificulte o cumprimento por aquele das tarefas que lhe são legalmente incumbidas, ou usando outras fórmulas que demonstrem a diligência e zelo no cumprimento da lex artis para que a sua culpa seja afastada (não ser imputável), deste modo o eximindo da respectiva responsabilidade fiscal.
X – Assim, a efectivação da responsabilidade subsidiária dos Técnicos Oficias de Contas/TOC pelas dívidas tributárias da sociedade devedora originária (cfr. artigo 24.º/3, da LGT) depende da alegação e prova pela AT de que é imputável ao agente o facto ilícito e de que existe nexo de causalidade entre este e os danos ocasionados.
XI - É exigível a comprovação da ocorrência de condutas violadoras dos deveres funcionais que sejam imputáveis ao TOC, a título de negligência ou dolo.
XII - Impõe-se, ainda, a verificação de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do técnico oficial de contas e o incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o TOC exerce as suas funções profissionais.
XIII - Não resultando, no caso posto, demonstrada a ocorrência de condutas ilícitas por parte do revertido, não há lugar à responsabilidade subsidiária.
XIV -Concomitantemente, ocorre a falta dos requisitos para decretar a reversão da execução fiscal, nos termos estabelecidos no artigo 24.º, n.º 3 da LGT, o que acarreta a ilegitimidade do Oponente para a mesma determinante da extinção do processo de execução fiscal.
Nº Convencional:JSTA00071476
Nº do Documento:SA2202206080415/12
Data de Entrada:05/21/2019
Recorrente:A............
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Legislação Nacional:Art. 24.º, n.º 3, da LGT
Art. 05.º, n.º 3, do CPC/2013
Arts. 12.º, 13.º, 350.º e 351.º do CCiv/66
Art. 02.º do CP
Art. 29.º, n.º 4, da CRP
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1 – Relatório

Vem interposto recurso de revista excepcional, ao abrigo do disposto no artigo 150.º do CPTA, por A............, com os sinais dos autos, do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, exarado em 12/07/2017, que concedeu provimento ao recurso deduzido pela Fazenda Pública, da sentença do TAF de Beja que, por sua vez, julgara procedente a oposição por aquele intentada, da execução fiscal instaurada pelo Serviço de Finanças de Sines contra a sociedade “B............ Unipessoal, Lda.” e contra si revertida por dívidas de IVA e respectivos juros compensatórios, no montante de €1.123.929,02, relativas ao período compreendido entre Janeiro e Setembro de 2011.

Irresignado, nas suas alegações, formulou o recorrente A............ as seguintes conclusões:

I) Começando pela questão “A) DA ADMISSIBILIDADE DA REVISTA EXCEPCIONAL”, o presente recurso preenche todos os requisitos do n.º 1 do artigo 150.º do CPTA segundo a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Administrativo, na medida em que o Acórdão recorrido configura um verdadeiro Acórdão Doutrinário sobre a efectivação da responsabilidade subsidiária dos Técnicos Oficiais de Contas/Contabilistas Certificados prevista no artigo 24.º/3 da LGT.

II) O Acórdão em crise foi publicado no www.dgsi.pt e é a única decisão de tribunais superiores da jurisdição administrativa e fiscal que se conhece sobre a efectivação da responsabilidade subsidiária dos Técnicos Oficiais de Contas/Contabilistas Certificados e, por isso, do artigo 24.º/3 da LGT.

III) As próprias instâncias percorridas por esta Decisão demonstram a necessidade de uniformização do Direito nesta matéria da responsabilidade tributária subsidiária do Contabilista, ao ponto de, na 1.ª instância, o Recorrente ter tido pleno ganho de causa e de, na 2.ª instância, tal Decisão ter sido absolutamente revogada e julgada improcedente a sua Oposição ao despacho de Reversão.

IV) Assim, configurando matéria obviamente importante – note-se que o Recorrente, um jovem contabilista com trinta anos, viu para si revertida uma dívida de um milhão e duzentos mil euros, o que lhe arruína por completo a vida em matéria económica, profissional e pessoal – facto é que a matéria da reversão para o Contabilista foi nestes autos tratada pelas instâncias de forma contraditória, pelos vistos ainda (conforme se lê no Acórdão), “O Digno Magistrado do M.P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (fls. 2324/2326), no sentido da improcedência do recurso.” interposto pela Fazenda Pública, tratamento contraditório fruto da incerteza e instabilidade na sua resolução, que assim demanda a intervenção do STA para dissipar dúvidas,

V) sendo que, in casu, e ainda que assim não fosse, o Acórdão em crise, irrecorrível via ordinária para este STA nos termos da Apelação previstos no CPPT (pese embora contraditório com a Sentença da 1.ª Instância), tratou a matéria sub iudice de forma ostensivamente errada e juridicamente insustentável, num claro juízo moralista de, no preenchimento do conceito jurídico de “responsabilidade pela regularidade técnica (…) Com base nos elementos disponibilizados pelos contribuintes (…), tendo por suporte os documentos e as informações fornecidos pelo órgão de gestão ou pelo empresário.” (transcrição do art. 6.º do então em vigor Estatuto dos TOCs, talqualmente o art. 10.º do actual Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados (Lei n.º 139/2015, de 7 de setembro), querer impor ao Contabilista a ciência, os meios (cruzamento de informação) e o dever de actuar qual inspector tributário, mesmo dando como assente ter sido ele a comunicar a situação da devedora originária à Ordem dos Contabilistas/Autoridade Tributária,

VI) para além de querer perpassar a errónea lógica de o Contabilista poder gerir a facturação e a tesouraria das empresas e o modo como elas trabalham, indo ao ponto de dar como assente estar-se perante facturas falsas quando dos autos não decorre sequer qual o destino do processo-crime instaurado por tal matéria e de este ter sequer passado do Inquérito, com a agravante de o aqui Recorrente nem arguido ser da responsabilidade tributária subsidiária do Contabilista Certificado.

VII) E tudo isto contra a assertividade e clarividência do PARECER DA ORDEM DOS TÉCNICOS OFICIAIS DE CONTAS (Doc. n.º 6 da Oposição), que expressamente se pronunciando sobre os fundamentos do Despacho de Reversão contra o aqui Oponente, neste quid aventou o transcrito na Alegação 15.ª) supra, que aqui se dá por integralmente reproduzida.

VIII) A inovação jurisprudencial do Acórdão recorrido sobre a matéria assenta, para além da sua fundamentação a que infra nos referiremos, desde logo em todos os pontos do seu sumário, conforme as Alegações 17.ª a 39.º supra, que aqui se dão por integralmente reproduzidas.

IX) Falamos aqui da articulação entre o art. 24.º n.º 3 da LGT e do artigo 6.º do (então em vigor) Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas (OTCO), que – talqualmente o prevê o art. 10.º do actual Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados (Lei n.º 139/2015, de 7 de setembro), por isso, falamos do preenchimento do conceito jurídico de “responsabilidade pela regularidade técnica (…) Com base nos elementos disponibilizados pelos contribuintes (…), tendo por suporte os documentos e as informações fornecidos pelo órgão de gestão ou pelo empresário”, citando o transcrito normativo estatutário dos Tocs.

X) Relembra-se que está em causa, de forma pioneira, a doutrinação do regime da efectivação da responsabilidade tributária subsidiária do Contabilista Certificado e, por isso, do instituto da reversão, destarte, não para os gerentes/administradores (questão perfeitamente tratada na Jurisprudência e na Doutrina), mas sim para um interveniente sem deveres de direcção da empresa devedora originária e cuja intervenção, por isso, no próprio incumprimento fiscal, é meramente técnica e acessória da do gestor.

XI) Não obstante 17 anos volvidos, não existe um Acórdão de tribunais superiores sobre a matéria, com excepção do aresto aqui em crise, relembrando-se que está em causa toda uma classe profissional, a dos Contabilistas Certificados, e também a dos Revisores Oficiais de Contas e membros dos órgãos de fiscalização pela integração sistemática entre os números 2 e 3 do art. 24.º da LGT, que comungam da denominada responsabilidade funcional.

XII) Acresce que o Acórdão não se pronuncia sobre a própria articulação entre o art. 24.º n.º 3 da LGT e o (não raras vezes esquecido) Código Comercial, conforme as Alegações 42.º a 51.º supra, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, sendo mister uniformizar, atendendo aos factos que resultem provados nas instâncias aquando de uma efectivação da responsabilidade tributária subsidiária do Contabilista, até que ponto não é, à luz do 38.º Cód. Comercial e do artigo 6.º do (então em vigor) Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas (OTCOC) e actual art. 10.º do actual Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados (Lei n.º 139/2015, de 7 de setembro), o próprio Comerciante o responsável pela informação que carreia para que a pessoa por ele autorizada, o Contabilista, para que este lhe dê tratamento em termos de escrituração mercantil prevista no art. 35.º Cód. Comercial.

XIII) Mais se aduz que do Acórdão em crise resulta “O Digno Magistrado do MP junto deste STA emitiu douto parecer (fls. 2324/2326), no sentido da improcedência do recurso.” Interposto pela Fazenda Pública, o que consubstanciou surpresa para o Recorrente já que nunca lhe foi notificado tal douto parecer do MP, o qual poderá aduzir fundamentos fáctico-jurídicos relevantes para a boa decisão da causa e sobre os quais o recorrente tinha o direito de se pronunciar.

XIV) Por outro lado, o TCA, ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC entendeu aditar oficiosamente os factos Z), AA), BB) e CC) (transcritos na alegação 54.º) supra, sem que desse direito ao contraditório ao aqui Recorrente, violando o art. 3.º n.º 3 do CPC, princípio basilar de todo o Processo Civil (Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 26-6-2014, processo 07378/14, in www.dgsi.pt.), não lhe foi dito que estava projectado o aditamento oficioso de factos ao probatório e, por isso, sobre tais factos aditados o recorrente nunca teve oportunidade de se pronunciar, designadamente contra o seu teor e contra o próprio aditamento.

XV) Pelo que, também por estas duas questões processuais civis, necessário se torna pronunciar-se este STA, em sede de Revista Excepcional, sobre se o Acórdão em crise constitui ou não uma decisão surpresa com violação do princípio do contraditório, de modo a ser decidido se deverá ser declarado nulo o Acórdão do TCA e, em consequência, determinado que se dê cumprimento ao princípio do contraditório e, após, se determine o prosseguimento dos autos conforme for entendido de Direito.

XVI) É de admitir o recurso de revista excepcional por estas questões mas ainda por aquelas a que infra nos referiremos, em matérias de preterição de formalidades essenciais do despacho de reversão, debalde invocadas na Oposição ao Despacho de Reversão, e que seguidamente se explanarão.

XVII) Passando ao capítulo “B) DOS VÍCIOS IMPUTADOS AO ACÓRDÃO RECORRIDO (art. 144° n.° 2 do CPTA) o primeiro que se lhe assaca é justamente “B.1. Da Nulidade do Acórdão recorrido por falta de direito ao contraditório do Parecer do M.P. e dos factos oficiosamente aditados no Acórdão, dando-se por reproduzido que se acabou de dizer e as Alegações 6 a 65 supra.

XVIII) Passando ao capítulo “B.2.) Do vício do Acórdão recorrido quanto a o Despacho de Reversão não apreciar os factos novos alegados no Direito de Audição Prévia”, o Acórdão do TCA Sul não decidiu pela declaração de nulidade do Despacho de reversão, decidindo inclusivamente contra o aresto do mesmo datado de 30-05-2006 proferido no processo n.º 01188/06 (in www.dgsi.pt) “II — E, na decisão final, a AT tem de tomar posição expressa sobre as alegações do contribuinte em sede de exercício do direito de audiência prévia, conforme obriga o disposto no artigo 60°, n.° 7 da LGT.”

XIX) Para tal basta ver que às questões suscitadas na Audiência Prévia a AT não se dignou a tomar posição expressa na Decisão final, conforme descrito nas Alegações 73ª) a 82ª) e Alegações 85ª) a 90ª supra, que se dão por reproduzidas, paradigmaticamente destacando-se o alegado no art. 55º da nossa Oposição à Execução quanto aos fundamentos invocados na Audiência Prévia e exuberante documentação aí junta, descritos na Alegação 73ª) supra que se dá por reproduzida, sendo por isso o Despacho (final) de Reversão NULO por violação n.º 7 do Artigo 60.º da LGT porquanto padece do vício formal da falta de apreciação dos factos novos alegados pelo revertido aquando do direito de audição do projecto de reversão, o que deveria ter sido declarado pelo TCA mas que o não foi, pelo que deverá o mesmo ser revogado e substituído por decisão que o declare.

XX) Passando ao capítulo “B.3) Do vício do Acórdão recorrido quanto ao Despacho de reversão não “c) Fundamentar a Inexistência/Insuficiência do Património da devedora originária e excussão prévia o Acórdão recorrendo indeferiu-o, todavia, sem razão, inclusivamente contrariando Jurisprudência dos Tribunais Superiores.

XXI) O TCA decidiu nos presentes autos tal questão no ponto “2.2.7. No que respeita ao juízo sobre a fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal”, considerando ser suficiente que, “No caso em exame, do despacho de reversão consta a referência às diligências realizadas [18], as quais comprovam a insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal, pelo que não assiste razão ao oponente ao invocar o vício em apreço”, quando, na realidade, a nota de rodapé [18] tem como conteúdo somente a referência às “Alíneas BB) e CC), do probatório”, as quais dimanam apenas o seguinte: “BB) O despacho para audição de reversão de 20.08.2012, referido em P), contém a referência às diligências de fls. 42; CC) As diligências referidas na alínea anterior constam de fls. 42 a 63 do pef. e confirmam a asserção de que os valores susceptíveis de penhora em nome da executada correspondem a contas bancárias com saldos de montantes reduzidos.”

XXII) Assim, o Acórdão recorrendo considerou, em matéria de fundamentar a Inexistência/Insuficiência do Património da devedora originária e excussão prévia, ser suficiente que, nem sequer do Despacho de reversão mas sim do Despacho para audição de reversão, conste uma remissão para as diligências de penhora realizadas no âmbito da execução fiscal e não que conste provado quais as diligências de penhora encetadas e qual o resultado concreto das mesmas,

XXIII) contrariando assim (para além da ratio da própria norma da LGT) o Acórdão do TCA Sul de 12-07-2017 proferido no Processo 1305/14.9BELRA (relator Dr. JOAQUIM CONDESSO, em particular no ponto 2. do seu sumário (citado na Alegação 98° que aqui se dá por reproduzida): “(...) cabendo-lhe, por isso, demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes. Só no caso de a Fazenda Pública fazer a prova do preenchimento desses pressupostos, passará a competir ao responsável subsidiário demonstrar a existência de bens, suficientes, no património da sociedade de que aquela não teve conhecimento, fazendo, assim, a prova da ilegalidade do acto de reversão.”

XXIV) Em parte alguma do Despacho de reversão e/ou do Acórdão recorrendo foi dado como provado que “não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes” (nas palavras do ora citado aresto).

XXV) Apercebendo-se da existência da preterição desta formalidade essencial o Acórdão recorrendo tentou emendar o Despacho em crise, aditando oficiosamente aos factos provados as “Alíneas BB) e CC), do probatório”, mas, na realidade, das mesmas alíneas não resulta a prova de que “não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes” (nas palavras do ora citado aresto);

XXVI) dessas alíneas decorre somente que “BB) O despacho para audição de reversão de 20.08.2012, referido em P), contém a referência às diligências de fls. 42”, e nem sequer que o Despacho (final) de Reversão contém tal referência, nem que diligências são essas e os seus concretos resultados, na certeza, porém, que a referência a tais “diligências” não é o mesmo que dar como provada a insuficiência de bens da devedora originária através de factos concretos, como, por exemplo, dando como provado que diligências foram feitas, o resultado das mesmas, quanto foi penhorado de saldos bancários, quantos imóveis (in)existiam, quantos automóveis (in)existiam, quantos imóveis (in)existiam, o que se passou com a penhora de créditos à cliente C............, etc.

XXVII) O Acórdão recorrendo está em oposição também com o Acórdão da 2ª Secção - Contencioso Tributário do TCA Norte de 14-03-2012 proferido no âmbito do Processo 00027/10.4BEMDL (in www.dgsi.pt) cujo sumário está todo transcrito na Alegação 106 que aqui se dá por reproduzida, destacando-se “II — Não cumpre tais exigências de fundamentação o despacho do órgão de execução fiscal que se limita a constatar a inexistência de bens da devedora originária e a remeter para certidão da conservatória na qual o oponente figura como gerente.”

XXVIII) Termos em que, o Despacho de Reversão padece do vício formal de não fundamentar a Inexistência/lnsuficiência do Património da devedora originária e excussão prévia, o que deveria ter sido declarado nos presentes autos pelo TCA mas que o não foi, contrariando inclusivamente a citada Jurisprudência superior neste quid, mas que aqui deverá ser declarado.

XXIX) Passando ao capítulo “B.4) Do vício de Intromissão do Acórdão recorrido na actividade da Administração”, e conexo com o ponto anterior “B.3) Do vício de não “c) Fundamentar a Inexistência/Insuficiência do Património da devedora originária e excussão prévia”, mas mais grave ainda, é o Acórdão recorrendo considerar que, em matéria de fundamentar a Inexistência/Insuficiência do Património da devedora originária e excussão prévia, ser suficiente que, nem sequer seja do Despacho de reversão propriamente dito, mas sim do Despacho para audição de reversão, que conste uma remissão para as diligências de penhora realizadas no âmbito da execução fiscal, o que manifestamente configura uma Intromissão do Acórdão recorrendo na actividade da Administração.

XXX) A dita “asserção” é um facto, já que, se o não fosse, nem o TCA Sul lhe teria dado o tratamento de facto aditado oficiosamente, e, como facto que é, necessariamente tinha que constar do Despacho de Reversão e não ser aditado ex officio em fase judicial, em clara violação do princípio da não Intromissão do Acórdão na actividade da Administração, princípio inter alias tratado no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 14-06-2011, Processo 04505/11 (in www.dgsi.pt) parcialmente transcrito na Alegação 111ª) que se dá por reproduzida, bem como no Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 20/12/2012, parcialmente transcrito na Alegação 112ª), que se dá por reproduzida.

XXXI) Ao não constarem do Despacho de Reversão e terem sido aditados ex officio em fase judicial (na 2ª Instância!), o Acórdão recorrendo violou o princípio da não Intromissão na actividade da Administração, o que configura ilegal intromissão do TCA Sul na actividade administrativa e uma intolerável restrição dos direitos do administrado aqui Recorrente, claramente substituindo-se à Administração Fiscal na fundamentação do Despacho que determinou que a execução fiscal revertesse contra o aqui Recorrente, ilegalidade do Acórdão que deverá ser declarada por V Exas., com as legais consequências.

XXXII) Passando ao capítulo “B.5) Do vício do Acórdão recorrido quanto a o Despacho de Reversão não “d) Formular o (necessário) juízo de culpa do aqui Oponente pela falta de pagamento” o TCA Sul decidiu nos presentes autos tal questão no ponto “2.2.8”, na parte transcrita na Alegação 116ª) que se dá por reproduzida, destacando-se a passagem em que diz que “No caso em exame, verifica-se que a indicação do regime de imputação de responsabilidade subsidiária do revertido e a asserção do nexo de imputação pelo incumprimento fiscal da devedora originária constam do despacho de reversão [24].”, quando, consultando a dita nota de rodapé [24], constata-se ser mera remissão para as “Alíneas P), Q) e R) do probatório”,

XXXIII) alíneas em que apenas a R), e somente após o ponto 28., se refere ao aqui Recorrente (Técnico Oficial de Contas) sendo que, do ponto 34. a 37., não tem relevância para a causa porquanto se refere ao ficheiro informático SAF-T, cuja imputação injustamente feita pela AT ao aqui Recorrente no Despacho de Reversão foi absolutamente contrariada pelos factos dados como provados nessa matéria pela 1ª instância e confirmados na 2ª Instância, na certeza de que, analisando os pontos 28. a 33. e 37. a 43. da alínea R) do probatório (já que, portanto, o demais das Alíneas P), Q) e R) do probatório não é referente ou sequer se aplica ao Técnico Oficial de Contas aqui Recorrente), resulta que tal probatório apenas se dedica a mencionar as declarações fiscais que foram e as que não foram apresentadas!

XXXIV) Assim, delas não resulta a menção do juízo de culpa do revertido em relação à falta de pagamento das dívidas exequendas pela devedora originária ou em relação à insuficiência patrimonial da devedora originária para fazer face às mesmas dívidas.

XXXV) É evidente que o Acórdão recorrido quis forçar uma situação que não se verifica, pois é notório ab initio, desde o Despacho do Sr. Desembargador Relator a notificar o Recorrente para PRONUNCIAR-SE nos termos do art. 665º n.º 3 do CPC, que a vontade era responsabilizar o Recorrente Contabilista pelas dívidas da devedora originária, na senda, aliás, de todos os arestos conhecidos relatados pelo mesmo Sr. Desembargador Relator, no sentido de julgar improcedentes as oposições às reversões por parte dos responsáveis subsidiários gerentes/administradores,

XXXVI) entendimento do Acórdão recorrendo que contraria o teor (mais do que propriamente o Sumário) do Acórdão do CT - 2.° Juízo do TCA Sul de 14-06-2011 proferido no Processo 04505/11 (in www.dgsi.pt) parcialmente transcrito na Alegação 122°) que se dá por reproduzida, da qual destaca o seguinte: “In casu”, da análise da matéria de facto provada conclui-se que o projecto de reversão do processo de execução fiscal n°. 1112-2004/100170.1 contra o opoente, o qual foi ordenado em 3/2/2005 (cfr. nº 5 da matéria de facto provada), se baseou na ausência de bens penhoráveis existentes em nome da sociedade executada originária “B.., - Equipamentos de Informática, Unipessoal, Lda.” (cfr. n°.32 da matéria de facto provada). Por sua vez, o despacho de reversão teve a seguinte fundamentação: “… prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra A… , na qualidade de responsável subsidiário…, sendo os fundamentos da reversão a inexistência de bens penhoráveis ao originário devedor “B…- Equipamentos de Informática, Unipessoal, Lda.”...” (cfr. n°. 33 da matéria de facto provada). É em face desta declaração que cumpre aferir da suficiência da fundamentação do despacho de reversão. Ora, face à factualidade provada a questão da falta de fundamentação deve colocar-se.

XXXVII) Daqui se conclui que o Acórdão recorrendo não tem razão de ser, querendo forçar os factos de modo a servir o propósito de responsabilização tributária do Contabilista, entrando inclusivamente em oposição com o citado Acórdão do TCA Sul de 14-06-2011 proferido no Processo 04505/11, pelo que padece de falta de fundamentação, tendo como consequência a sua revogação por outra Decisão que declare a anulação do despacho de reversão em apreço nestes autos (cfr.art°.153, n°.2, do novo C.P.A.).

XXXVIII) Passando ao capítulo “B.5) Do vício do Acórdão recorrido quanto ao juízo de imputação ao revertido pelo dano causado ao Estado” uma vez mais no sentido de forçar os factos, de modo a (tentar) preencher os requisitos exigidos pelo art. 24º n.º 3 da LGT, o Acórdão recorrido segue o ínvio caminho de tentar misturar, sob uma capa de alternatividade, duas realidades diferentes: a dissipação do património da Sociedade Devedora Originária (SDO) e o incumprimento das dívidas exequendas por parte desta, e para tentar expender algumas considerações que seriam a suposta fundamentação do juízo de imputação ao revertido pelo dano causado ao Estado, o que se constata é que o Acórdão recorrido se descentra dessa questão para novamente se centrar no juízo da culpa, ao invés de se centrar no nexo causal entre o facto e o dano, conforme decorre do introito do ponto 2.2.9. do Acórdão e é explanado supra nas Alegações 126ª a, que se dão por reproduzidas.

XXXIX) Neste quid, em 1° lugar não se alcança em que parte do probatório é que assenta a conclusão do “conhecimento da situação de irregularidade contabilística e fiscal ca que se encontravam as três sociedades, até porque o Acórdão não o diz, limitando-se a fazer uma referência genérica ao probatório, que torna ininteligível a fundamentação que, neste ponto, se exigia e exige.

XL) Em segundo lugar, o Acórdão mal-entendeu o próprio probatório, já que é falso que o Recorrente “continuou a assinar e apresentar as declarações periódicas perante o Fisco, no decurso dos três primeiros trimestres de 2011”, porquanto o Recorrente iniciou as suas funções como TOC da Devedora Originária, não desde a sua constituição, mas apenas nesse ano de 2011, resumindo-se a sua intervenção a tais 3 declarações periódicas de IVA.

XLI) Em terceiro lugar, o Acórdão dita que “sabia (ou devia saber) que não tinham aderência à realidade” quando não se alcança em que factos do dito “probatório” o Acórdão assenta para o poder concluir; então o Recorrente “sabia” ou, por outro lado, “não sabia mas tinha obrigação de saber”, que tais declarações periódicas de IVA não tinham aderência à realidade?

XLII) Uma decisão judicial “condenatória” (lato sensu, pois advém de um contencioso impugnatório) não se pode bastar, para efeitos de juízo de imputação ao revertido, com afirmar que “sabia (ou devia saber) que não tinham aderência à realidade”.

XLIII) É pacífico que não há presunção de culpa do Contabilista e que por isso incumbe à AT o ónus da prova da violação culposa dos deveres de regularidade técnica, por isso um Acórdão que declare a efectivação da responsabilidade tributária de um Contabilista tem que ter suficientes factos apurados para, sem margem para dúvidas, poder peremptoriamente afirmar que o Contabilista sabia que tais declarações fiscais não tinham aderência à realidade ou que não sabia mas tinha obrigação de saber.

XLIV) Termos em que o Acórdão em crise, ao doutrinar a existência de uma verdadeira “obrigação de saber” por parte do Contabilista e ao bastar-se com a sua (suposta) verificação para efeitos de efectivação da responsabilidade subsidiária tributária do TOC, violou frontalmente as regras do onus probandi que à AT compete para efeitos do n.º 3 do art. 24º da LGT, ónus que decorre da expressão “desde que demonstre” mas também do dever de fundamentação dos actos da administração quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos, consagrado no art. 268° n.º 3 da CRP e ainda no art. 77º n.º 1 da LGT e, mais não fosse, das regras do ónus da prova emanadas do a 342° n.º 1 do Código Civil, o que deverá ser declarado.

XLV) Em quarto lugar o Acórdão prossegue a sua tentativa de fundamentação do nexo entre o facto e o dano dizendo “(...) sem que retirasse ou substituísse as mesmas, como lhe competia [28].”, sendo que essa nota de rodapé [28] é referente à “Alínea r), ponto 41”, ponto do probatório em que é apenas dito que foi o Recorrente quem assinou as 3 declarações fiscais de 2011, o que nunca foi contestado, sendo que o Acórdão lavra em profundo desconhecimento nesta última tentativa de justificação do seu juízo de censura, já que é impossível ao Contabilista substituir declarações fiscais se o legal representante da Devedora Originária não as assinar igualmente, sendo que, por isso, a dita substituição é um facto que não depende do Contabilista!

XLVI) Se ao Contabilista fosse possível proceder conforme é indicado pelo Acórdão recorrido, ou seja, se de uma forma unilateral o Oponente pudesse substituir as declarações fiscais, este sim violaria (Decreto-Lei n.º 452/99, de 5 de outubro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 310/2009, de 26 de outubro) de forma flagrante o disposto do n° 1 do “Artigo 6.º - Funções” do Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas em vigor à data, talqualmente o art. 10º do actual Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados (Lei n.º 139/2015, de 7 de setembro), que abaixo se transcreve para melhor compreensão: ”c) Assinar, conjuntamente com o representante legal das entidades referidas na alínea a), as respectivas demonstrações financeiras e declarações fiscais, fazendo prova da sua qualidade, nos termos e condições definidos pela Ordem, sem prejuízo da competência e das responsabilidades cometidas pela lei comercial e fiscal aos respectivos órgãos;”; ou seja, o próprio Acórdão do TCA Sul afirma que a solução para sanar aquela que parece ser uma “presunção de culpa do TOC”, passaria pela concretização da própria violação das funções do TOC previstas no Estatuto da OTOC (Assinar, conjuntamente com o representante legal das entidades) neste caso, excluindo o TOC de forma deliberada e premeditada o representante legal da Empresa (SDO) da assinatura das suas próprias Declarações Fiscais.

XLVII) Não obstante, quanto a estes pontos cumpre notar que o Acórdão se está a centrar na questão do juízo da culpa e não na do nexo causal entre o facto e o dano.

XLVIII) Isto posto — e até porque, até aqui, nada foi fundamentado quanto a este ponto do juízo de imputação ao revertido pelo dano causado ao Estado, o Acórdão prossegue, dizendo “Tal significa que o mesmo aceitou o resultado do incumprimento fiscal e a posterior situação de insuficiência patrimonial da SDO, quando confrontada com a falta de veracidade das deduções de IVA efectuadas e as consequentes correcções às declarações fiscais apresentadas.”.

XLIX) Alto! Ponto de ordem! Este salto lógico o Acórdão nunca poderia ter feito para tentar justificar o injustificável! É que o Acórdão vinha discorrendo sobre a culpa para, qual passe de mágica, extrapolar tais considerações para a imputação ao Contabilista da “posterior situação de insuficiência patrimonial da SDO”!

L) Como resulta daqui provado o nexo causal entre o facto e o dano? Não resulta! Com o devido respeito pelos autores do Acórdão em crise mas com o dever que o patrocínio exige, a lacuna jurídica de que padece é de direito civil e de direito processual civil, concretamente de prova do nexo de causalidade, já que, mesmo quando exista presunção de culpa do lesante — o que, como é pacífico para efeitos do n.º 3 do art. 24º da LGT, não existe! -, a presunção de culpa não dispensa o lesado do ónus de provar de nexo de causalidade entre a infracção e o dano, não se presumindo o nexo de causalidade, conforme escreve Luís Filipe Pires de Sousa na Alegação 155ª) (In Prova por Presunção no Direito Civil, 2012, Almedina, Págs. 271 e 272.), referindo o Acórdão do STJ de 26-02-2009 (relatora: Dra. Maria Beleza, processo 09B0071) e Acórdão do STJ de 06-05-2008 (relator: Dr. Urbano Dias, processo 08ª1279).

LI) Ora, nenhum facto existiu alguma vez provado nos presentes autos a demonstrar a prova do nexo de causalidade entre o facto (alegadamente) praticado pelo Contabilista e o dano do Estado, nem tal foi alegado ou sequer um tema de prova, e por isso Paulo Marques in “Responsabilidade Tributária dos Gestores e dos Técnicos Oficiais de Contas — A Reversão do Processo de Execução Fiscal” (Coimbra Editora, Págs. 42 a 44.), acompanhando outro autor, escreve que:

“Na observação de JÓNATAS MACHADO “a imposição de uma responsabilidade subsidiária aos TOC’s deve ser interpretada restritivamente, estando a sua aplicação pela administração tributária sujeita a um ónus especialmente agravado de fundamentação. […] O responsável subsidiário deve ter culposamente dissipado ou maltratado o património social” (62). (JÓNATAS E. M. MACHADO in A responsabilidade subsidiária dos TOC ‘s (Algumas considerações constitucionais a propósito do art. 24º/3 da LGT), Fiscalidade n° 30, Instituto Superior de Gestão, Lisboa, Abril-Junho 2007, p. 12.) Em face da exigência de culpa (63) (imputação subjectiva) na conduta do técnico oficial de contas, parece ser de exigir igualmente a verificação de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do técnico oficial de contas e o incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o técnico oficial de contas exerce as suas funções profissionais (64), sendo este então um instrumento necessário ao incumprimento fiscal, pelo que pode falar-se em comparticipação na mesma causa.”

LII) Assim, também a Doutrina é unânime em exigir a verificação de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do técnico oficial de contas e o incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o técnico oficial de contas exerce as suas funções profissionais, o qual tem necessariamente de ter agido de forma a tornar a prestação impossível por parte do executado originário: uma relação de causalidade entre uma acção ou omissão culposa do responsável subsidiário relativamente à obrigação tributária e o seu não pagamento através do património do devedor principal.

LIII) Portanto, do despacho de reversão não consta a alegação/indicação dos pressupostos de facto em que assenta a decisão de reversão, nem consta um juízo sobre a culpa do Revertido e o necessário nexo causal, consequentemente, e conforme se invocou na Oposição, o Despacho de Reversão é nulo por falta de indicação dos pressupostos de facto em que assenta a decisão de reversão e ainda por falta de formulação do (necessário) juízo de culpa do aqui Oponente pela falta de pagamento, carecendo, por isso, de qualquer fundamentação, a conclusão que seguidamente o Acórdão recorrido tira, em afirmar que “De onde se impõe concluir que dos autos resultam demonstrados, quer o nexo de imputação dos factos ao recorrido, quer o nexo de causalidade entre estes e o prejuízo causado ao Estado.”, porquanto inexiste nos autos a prova de qualquer facto que demonstre tal nexo causal (que, claramente, não se presume in casu).

LIV) Refere-se no Acórdão em crise que “A falta de controlo dos movimentos contabilístico da SDO, a par da falta de conciliação bancária dos lançamentos efetuados na contabilidade das sociedades alegadas fornecedoras das SDO, determinou não apenas a evasão fiscal, como a dissipação do património destas últimas”, afirmação genérica que tenta criar um nexo de causalidade entre a alegada falta de organização da contabilidade e a dissipação do património que não existe nem foi provada.

LV) Desde logo porque, em termos gerais, a dissipação do património não resulta da má organização da contabilidade mas de uma atitude deliberada dos órgãos de gestão; com efeito, pode haver boa organização contabilística e fiscal e haver dissipação do património, ou o seu contrário, haver, por qualquer razão, uma má organização contabilística e fiscal e não haver qualquer indício de dissipação do património.

LVI) Ora, exigia-se a prova de que a falta de meios financeiros se deveu à conduta do contabilista certificado, conforme também a melhor doutrina entende: “é necessária a verificação de um nexo de causalidade entre a mesma conduta e a determinação e incumprimento de uma dívida tributária e a insuficiência do património do devedor-principal. (...) A não ser assim, iria o TOC responder por dívidas cuja origem e o montante seriam totalmente alheios à sua conduta, em clara violação dos princípios da igualdade tributária e dos seus corolários de igualdade perante os encargos públicos e da tributação de acordo com a capacidade contributiva.”. (JÓNATAS E. M. MACHADO / VERA C. RAPOSO, A responsabilidade subsidiária dos TOC (Algumas Considerações Constitucionais a propósito do Art. 24.º/3 da LGT) Revista Fiscalidade n.° 30)) - dito isto, nem a AT nem o acórdão em crise fazem qualquer prova de que tenha havido dissipação do património da “B............”, devedora principal no processo de execução fiscal, em resultado da conduta do contabilista certificado.

LVII) Ou seja, é defendido no Acórdão recorrido — com toda a moralidade de quem faz prognósticos póstumos, que o contabilista não deveria ter enviado as declarações fiscais da SDO porque “sabia (ou devia saber) que não tinham aderência à realidade” ou então devia tê-las substituído, todavia, a prova que a jurisprudência do STA e a doutrina supra citada exigem é que o TOC tem necessariamente de ter agido de forma a tornar a prestação impossível por parte do executado originário.

LVIII) Diga-se, a este propósito, que a invocação da existência de contas de disponibilidade de caixa e banco superiores a € 3.000.000,00 não prova que existissem estes meios mas apenas que estavam registados na contabilidade (e já anteriormente à entrada em funções como TOC do Recorrente) e, ademais, caberia ainda provar que a dissipação do património resulta da ação do contabilista certificado.

LIX) No acórdão recorrido defende-se que o TOC não devia ter entregado as declarações fiscais ou deveria tê-las substituído (“...sem que retirasse ou substituísse as mesmas, como lhe competia.”), mas o que cumpre perguntar é se, deste comportamento resultaria diretamente a não dissipação do património? Porventura esse comportamento tornaria o devedor principal num contribuinte diligente e cumpridor? Obviamente que não!

LX) Do exposto, só resta a conclusão evidente de que, conforme se exige, não foi provado um nexo de causalidade entre a conduta do TOC e o facto de o devedor principal não pagar o imposto, incumprimento deste ónus pela AT que cria uma flagrante injustiça ao imputar ao TOC uma responsabilidade de terceiros apenas porque, qual “pecado original”, entregou três declarações fiscais, sustentadas nos documentos e informações prestadas pelo seu próprio cliente.

LXI) Qual o facto provado que permite ao Acórdão recorrendo afirmar que o Recorrente “aceitou o resultado do incumprimento fiscal e a posterior situação de insuficiência patrimonial da SDO”? E “aceitar (...) a posterior situação de insuficiência patrimonial da SDO” é o mesmo que criar tal insuficiência? Porventura provou-se que a devedora originária B............ tinha bens para entregar ao Estado e dissipou-os por actuação do Contabilista?

LXII) Obviamente que não, já que não é para situações como aquela aqui em apreço que a reversão foi criada quanto ao Contabilista, pretendendo o Acórdão “forçar”, sem factos e sem que do Despacho de reversão constem os elementos obrigatórios, para que pudesse proceder à reversão contra o aqui Recorrente.

LXIII) Das “diligências” que o Acórdão em crise fez questão de, oficiosamente e sem direito a contraditório pelo recorrente, aditar sob factos “BB)” e “CC)”, o que na realidade decorre é que a C............, cliente da devedora originária, pagou 4 milhões e seiscentos mil euros até ao final de 2011 — é o que resulta dos docs. do Processo de Execução Fiscal (pef).

LXIV) Os documentos aportados nas diligências de ARRESTO efectuadas pela AT (docs do Processo de Execução Fiscal) não identificam, em qualquer momento, que os valores recebidos pela B............ no período compreendido de 06/10/2011 a 01/12/2011, os quais ascendem ao valor de 4.604.472,44 €, e posteriores retiradas pela B............, tiveram qualquer intervenção por parte do Oponente, no seu recebimento e/ou retirada posterior (o que era impossível, conforme seguidamente se demonstrará), quando tal valor de 4.604.472,44 € era mais que suficiente para resolver qualquer pagamento fiscal pendente da devedora originária!

LXV) Muito menos se encontra provado (art. 162.° da nossa Oposição à Execução, DOC 97-18/49) que foram contabilizados sequer pelo Oponente os referidos movimentos de recebimento e/ou saída bancária da empresa B............, no período em causa, pois, conforme poderá ainda ser verificado pelos documentos existentes, a última data de registo contabilístico na B............ que foi efetuada pelo Recorrente foi na data de 04/10/2011, com a contabilização da fatura de serviços n° 11025 da B............ à sua cliente C............, pois o órgão de gestão da empresa não remeteu mais documentos à entidade patronal do Recorrente posteriores a essa data - cfr. Alegação 190ª, que se dá por reproduzida, e Página 62 do processo de execução fiscal, esta para a qual remetem os factos aditados oficiosamente pelo TCA mas que é a prova de que inexiste nexo de causalidade entre o facto e o dano, na certeza de que, conforme dimana inter alias do Acórdão do TCA Norte de 20-12-2012 (Processo 00400/10.8BEPNF, in www.dgsi.pt, transcrito na Alegação 192ª), é a AT quem tem que provar que o património da B............ se tornou insuficiente para o pagamento da dívida exequenda, e que por culpa do TOC o mesmo se dissipou, o que obviamente não se verifica.

LXVI) Conclui-se, sim, que a conduta da B............ é totalmente independente e autónoma do TOC, e trata-se de uma atitude exclusiva e deliberada dos órgãos de gestão dessa empresa.

LXVII) Assim, se era exigível que fosse dado como provado que o património da Sociedade Devedora Originária se tornou insuficiente para o pagamento da dívida exequenda e que se dissipou por culpa do revertido, tal não tem qualquer reflexo no probatório, pelo que o Acórdão em crise contrariou assim, para além da ratio da própria norma da LGT e da Jurisprudência assente do Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que o nexo causal não se presume (Acórdão do STJ de 26-02-2009 (relatora: Dra. Maria Beleza, processo 09B0071) e Acórdão do STJ de 06-05-2008 (relator: Dr. Urbano Dias, processo 8ª1279), entre outros.), ainda o supra-citado Acórdão da 2ª Secção - Contencioso Tributário do TCA Norte de 20-12-2012 (processo 00400/10.8BEPNF, in www.dgsi.pt e o Acórdão da 2ª Secção do STA de 11-07-2012 proferido no Processo 0824/11 (disponível em www.dgsi.pt transcrito na Alegação 199ª).

LXVIII) Termos em que, deverão o Acórdão recorrido e o Despacho de Reversão ser revogados quanto ao juízo de imputação ao revertido do dano causado ao Estado, porquanto dos autos não resulta provado que o património da Sociedade Devedora Originária se tornou insuficiente para o pagamento da dívida exequenda e que se dissipou por qualquer conduta culposa do revertido, seu Contabilista durante aquele tão curto hiato temporal das suas funções.

LXIX) Passando ao capítulo “B.6) Do tratamento da matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável pelo Acórdão recorrido — do facto ilícito e culposo”, o Acórdão em crise foi publicado no www.dgsi.pt e é a única decisão de tribunais superiores da jurisdição administrativa e fiscal que se conhece sobre a efectivação da responsabilidade subsidiária dos Técnicos Oficiais de Contas/Contabilistas Certificados e, por isso, do artigo 24.º/3 da LGT.

LXX) In casu, e ainda que assim não fosse — o Acórdão em crise, irrecorrível via ordinária para este STA nos termos da Apelação previstos no CPPT (pese embora contraditório com a Sentença da 1ª Instância), tratou a matéria sub iudice de forma ostensivamente errada e juridicamente insustentável, num claro juízo moralista de, no preenchimento do conceito jurídico de “responsabilidade pela regularidade técnica (...) Com base nos elementos disponibilizados pelos contribuintes (...), tendo por suporte os documentos e as informações fornecidos pelo órgão de gestão ou pelo empresário.” (transcrição do art. 6º do então em vigor Estatuto dos TOCs, e art. 10º do actual Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados (Lei n.º 139/2015, de 7 de setembro), querer impor ao Contabilista a ciência, os meios (cruzamento de informação) e o dever de actuar qual inspector tributário mas sem os meios de que este tipo de profissional dispõe enquanto autoridade, mesmo dando como assente ter sido o próprio Recorrente a comunicar a situação da devedora originária à Ordem dos Contabilistas/Autoridade Tributária, para além de o Acórdão querer perpassar a errónea lógica de o Contabilista poder gerir a facturação e a tesouraria das empresas e o modo como elas trabalham, indo ao ponto de dar como assente estar-se perante facturas falsas quando dos autos não decorre sequer qual o destino do processo-crime instaurado por tal matéria e de este ter sequer passado do Inquérito, com a agravante de o aqui Recorrente nem arguido ser em tais autos criminais fiscais.

LXXI) Quanto ao ponto que concretamente estamos agora a tratar, é entendimento da OTOC o seguinte (cfr. Parecer junto sob Doc. n.º 6 da Oposição): “1. O alegado nos pontos 33 e 34 quanto à emissão das facturas da D............, Lda. apenas após o apuramento do imposto B............ não pode configurar a violação dolosa ou negligente do exercício da atividade do TOC já que não cabe nas funções do TOC a emissão de facturas, conforme se constata pela leitura do artigo 6.º do Estatuto. Ou seja, ainda que tal se venha a provar, a autoria material destes factos poderá ter relevância noutra sede mas nunca ao nível da responsabilidade subsidiária do TOC porque, se praticados, não o foram no âmbito do exercício da actividade de TOC.”

LXXII) Ao TOC compete o cumprimento das obrigações declarativas fiscais dos seus clientes e o dever de fiscalização compete à Administração Fiscal, não ao Opoente, para quem a relação tributária entre a Administração Fiscal e o cliente é absolutamente alheia ao TOC excepto naquilo que lhe for cognoscível da gestão da empresa cliente.

LXXIII) A AT, processando as declarações fiscais dos contribuintes em apreço, não foi averiguar atempadamente a veracidade das operações que mais tarde veio a alegar serem simuladas, mas que alegou não sem antes, para além da informação que o TOC detinha e que prontamente lhe forneceu ao abrigo do princípio da colaboração, a AT ter feito deslocações ao local dos trabalhos, ter intimado pessoas a prestar depoimentos, etc, tudo ao abrigo de prorrogativas que ao TOC não assistem por não ser uma autoridade nem um inspector.

LXXIV) E note-se que, mesmo investigando para além do que os “papéis” lhe deram a conhecer (e que o TOC conhece), a AT não é peremptória em afirmar a simulação das operações cujo custo desconsiderou à B............, conforme decorre do Relatório de Inspecção, cujos extractos relevantes se transcreveram nas Alegações 216ª) a 219ª), que aqui se dão por reproduzidas, de que ressalta que foi com base em “deduções” e em dúvidas resultantes de supostos “contornos” que a AT não logrou tornar “claros”, e não em certezas e provas, que foi imputada a essas empresas a prática de operações simuladas — cfr. Fls. 3/9 do Doc. n.º 2 da Oposição.

LXXV) Ora, se nem a autoridade AT conseguiu ultrapassar o limiar das aparências e das presunções para qualificar como simuladas as operações tituladas pelas facturas cujo IVA ora reverte contra o TOC aqui Opoente, muito menos tinha o TOC elementos para tal e justamente por isso o Opoente disse na Audiência Prévia, e reiterou na Oposição, que, primordialmente, “O papel do TOC perante a Autoridade Tributária e Aduaneira e o sujeito passivo é de um mero interlocutor, sendo evidentemente limitados os seus poderes-deveres de fiscalização face aos poderes atribuídos por lei aos Serviços da Inspeção Tributária. No entanto, durante todo o processo de recolha de documentos e averiguações por parte dos V/ Serviços de Inspeção, sempre me encontrei disponível, com diligência e transparência para com os mesmos, nos termos previstos do Artigo 59.º da LGT (conforme exemplo em anexo, doc. 36).” — cfr. Doc. n.º 4 que se juntou na oposição e Doc. 36 da Audiência Prévia.

LXXVI) À data dos factos, a profissão de TOC estava regulamentada no Estatuto da Ordem do Técnicos Oficiais de Contas e respetivo Código Deontológico, decorrendo dos termos do n.º 1 do artigo 6.º do Estatuto, em primeiro lugar, que a regularidade técnica da contabilidade tem por base os documentos e informações fornecidos pelo órgão de gestão.

LXXVII) O técnico oficial de contas não é responsável pela atividade desenvolvida pela empresa, nem teria capacidade para estar, in loco, a fiscalizar se o seu cliente vendeu, comprou, prestou um serviço ou não, pelo que não é admissível, por isso, que se exija ao técnico oficial de contas que garanta a “materialidade” dos documentos apresentados pelo cliente.

LXXVIII) Esta obrigação é do responsável, gerente ou administrador da entidade, porquanto, à luz do 38.° Cód. Comercial e do artigo 6° do (então em vigor) Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas (OTOC)/art. 10º do actual Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados (Lei n.º 139/ 2015, de 7 de setembro), é o próprio Comerciante o responsável pela informação que carreia para que a pessoa por ele autorizada, o Contabilista, para que este lhe dê tratamento em termos de escrituração mercantil prevista no art. 35º Cód. Comercial, já que é consabido que não existe Escrituração mercantil e Escrituração Fiscal, sendo a segunda o mero cumprimento do dever (declarativo) de declarar a primeira, com excepção das correcções a serem feitas no Quadro 07 do Modelo 22 de IRC (que se destina ao apuramento do lucro tributável e corresponderá ao Resultado Líquido do Exercício, apurado na contabilidade, eventualmente corrigido nos termos do CIRC e outras disposições legais aplicáveis).

LXXIX) Não descuramos, no entanto, que o papel do técnico oficial de contas é mais do que o cumprimento formal de normas técnicas, pois, conforme refere a Doutrina, deve atuar com a diligência de um bonus pater familiae, com a observância das disposições legais aplicáveis à profissão, o que é manifestamente diferente de o Acórdão recorrendo propugnar que, face aos requisitos legais de prova, o técnico oficial de contas “devia saber” que as faturas não correspondiam a operações materiais.

LXXX) Tal não é fazer prova de que técnico oficial de contas sabia.... No caso, a prova que se exige é: i) Quais as regras técnicas que foram violadas? ii) O esquema de fraude fiscal foi dado como provado no respectivo processo-crime instaurado? iii) Havia indícios suficientes da existência de um esquema de fraude fiscal que um profissional contabilístico devia conhecer? iv) Quando é que estes indícios se tornaram claros? v) Perante a existência de indícios, o que deveria ter feito e quando? Nada consta da fundamentação!

LXXXI) Conforme decidiu a Senhora Doutora Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja na douta Sentença dada nos presentes autos, a “Autoridade Tributária não logrou cumprir o ónus da prova da violação culposa ou negligente por banda do oponente dos deveres de regularização técnicas nas áreas contabilísticas e fiscais ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos, mormente que o Oponente podia e devia ter precavido a contabilização das faturas que não tinham operações verdadeiras.”

LXXXII) O despacho de reversão, contra o TOC, tinha apenas um facto que constituía elemento probatório: “as facturas emitidas pela D............, Lda, apenas são emitidas e, consequentemente, registadas, após se proceder ao apuramento do imposto que haveria a pagar pela B............, caso essa fatura não existisse.” (vide ponto 5).

LXXXIII) Ficou, no entanto, provado, em sede de julgamento, que a similitude de datas foi um erro informático, explicado e assumido pela empresa proprietária do software SAGE, devido a um processo interno do programa informático, sem qualquer intervenção do Oponente (pp. 37 a 39 e 48 da Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja), particularidade do programa de contabilidade SAGE Linha que apenas foi resolvida em Outubro de 2012 (quase um ano depois), conforme plenamente demonstrado pelo testemunho de E………… (SAGE) e F…………, bem como, por escrito (Doc. 100) indicado no art. 162.º da Oposição.

LXXXIV) Afastada esta prova, os alegados elementos de prova da violação pelo TOC dos seus deveres de regularidade técnica (p. 35 do Acórdão) não demonstram a violação de qualquer norma ou sequer diligência profissional, pois retirados os pontos 4 a 8 referentes ao erro informático, “reduz-se a pó” a base probatória do despacho de reversão.

LXXXV) Mais, dá-se enfâse ao facto de o circuito financeiro não acompanhar o circuito de faturação, liquidação e pagamento do IVA quando a AT sabe que é o próprio Código do IVA que afasta em absoluto estes dois circuitos: o pagamento ou não dos bens e serviços faturados não é relevante para efeitos de apuramento do imposto.

LXXXVI) Não é, por isso, sério do ponto de vista intelectual insinuar que a inexistência de pagamento dos serviços (lembramos que todos estes movimentos se dão num curto espaço de tempo) é um indício evidente da falta de materialidade dos serviços facturados.

LXXXVII) Naturalmente que a frequência destes movimentos criou a dúvida junto do técnico oficial de contas quanto à verdade das faturas, o que o levou à informar a Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas das suspeitas, mas a lisura, seriedade e diligência do técnico oficial de contas é manifesta, o que coloca em especial evidência a injustiça e falta de fundamentação do Acórdão do TCA.

LXXXVIII) O Opoente/Recorrente dá por reproduzido in totum o alegado na sua Oposição à Execução e exuberante documentação junta aos autos, quer com a Oposição, quer previamente com a Audiência Prévia, quer com o nosso Requerimento de 10-02-2014 (onde mais se aclarou a forma de organização da prova documental anteriormente junta).

LXXXIX) Dos documentos juntos destaca-se o PARECER DA (então) ORDEM DOS TÉCNICOS OFICIAIS DE CONTAS (Doc. n.º 6 da Oposição), que, expressamente pronunciando-se sobre os fundamentos do Despacho de Reversão contra o aqui Opoente, conclui, sem margem para mácula, pela regularidade técnica da conduta do Opoente e, consequentemente, pela falta de fundamento da reversão, conforme transcrito na Alegação 254ª), que se dá por reproduzida.

XC) Analisando os deveres e o comportamento do TOC no caso sub indice, à luz da Doutrina, na recente monografia dedicada ao tema, denominada “Responsabilidade Tributária dos Gestores e dos Técnicos Oficiais de Contas — A Reversão do Processo de Execução Fiscal” (Coimbra Editora, Págs. 42 a 44.), escreve Paulo Marques, Jurista—Inspector Tributário da Direcção-Geral dos Impostos, com extrema relevância para o caso sub iudice, é justamente a supra-referida nota de rodapé n.º 57:

“(57) Estamos com MÁRIO JANUÁRIO quando observa que “Sabemos que o legislador pretende a verdade formal e a verdade material. As duas. Todavia, poderão os TOC garantir a verdade material subjacente aos documentos que contabilizam? Ou melhor: estarão os TOC em condições de perseguir os factos e realidades dos operadores económicos de forma a averiguar-se se os documentos que lhe são presentes para contabilização traduzem essa realidade? A esta pergunta respondemos negativamente. Os TOC não são legalmente inspectores de finanças nem profissionais a quem, a despeito de tudo, os empresários tenham de mostrar a alma. A lei não quer nem impõe tanto, do nosso ponto de vista. As circunstâncias em que a actividade de TOC ainda hoje é exercida, as relações entre os TOC e os operadores económicos, não obstante o princípio da imparcialidade, levam a que sinceramente a resposta tenha de ser negativa” (in A questão subsidiária dos tributos e das penas dentro da responsabilidade tributária subsidiária fiscal, Revista da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas, nº 102, Lisboa, Setembro de 2008, pp. 26-27).

XCI) Diz Paulo Marques que, “Em suma, o que releva é verificar se um técnico oficial de contas normalmente diligente actuaria de modo similar.”, e é a própria OTOC quem atestou que um técnico oficial de contas normalmente diligente actuaria de modo similar, pelo que dúvidas não deverão subsistir, portanto, do cumprimento dos deveres deontológico-tributários do Opoente e da ilegalidade da reversão.

XCII) O Acórdão recorrendo alega que não houve conciliação bancária, o que é falso e nem tão-pouco resulta dos factos provados e que se demonstrou ter sido feita.

XCIII) Por outro lado ainda, note-se que o Acórdão recorrido (página 26) aditou oficiosamente o seguinte Facto Provado Z), que indica que o imposto tem como data limite de pagamento 31/03/2012, data na qual o Recorrente já tinha efetuado a renúncia às funções de TOC na devedora originária B............, renúncia que ocorreu em 01/02/2012, conforme alegado no art. 55° da nossa Oposição à Execução, onde se invocou o seguinte documento junto com a Audiência Prévia: “Doc.26 — Renúncia como Técnico Oficial de Contas no portal das Declarações Eletrónicas da Autoridade Tributária e Aduaneira em 01/02/2012;”

XCIV) Na certeza de que o Recorrente não elaborou qualquer demonstração financeira nem contabilizou qualquer documento posterior a 04/10/2011, pergunta-se com que justiça poderá imputado o pagamento dos referidos impostos ao TOC?!

XCV) Por outro lado, na certeza de que a última declaração de IVA apresentada pelo Recorrente para a B............ foi efetuada a 15/11/2011, e somente em 19 de janeiro de 2012 (decorridos 65 dias depois) é que o PROJETO DO RELATÓRIO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA é finalizado e notificado (e não ao aqui Recorrente), como poderia ele ter, à data da apresentação das declarações de IVA a 15/05/2011, 15/08/2011 e 15/11/2011, ser conhecedor dos factos alegados existentes do relatório de inspeção, o qual só vem a aparecer, portanto, 65 dias depois?!

XCVI) A proceder o entendimento da AT e do Acórdão recorrido, então todos os processos em que seja considerado pela AT existirem operações simuladas, em que compete ao contribuinte (devedor originário) o ónus de contraditar, mas sendo o TOC um responsável tributário que não tem pleno acesso a toda a documentação da empresa, pelo menos quando as suas funções estavam já cessadas no momento de se defender, o TOC é um alvo fácil para a AT reverter as dívidas cuja cobrabilidade da devedora originária e previsivelmente dos seus gerentes/administradores não consiga.

XCVII) É num certo tipo de equívocos propositados que o Despacho de Reversão da AT - convicto que em sede judicial os tribunais não têm capacidade para entender de forma diversa esse tipo de questão contabilística, tendo como praxe dar por reproduzido “em bloco” o Relatório Inspectivo (como as duas Decisões proferidas nestes autos o fizeram) -, tenta buscar uma fundamentação que não existe mas que tenta que passe por verdadeira quando o não é e muito menos os factos onde se fundam tiveram a intervenção do aqui Recorrente!

XCVIII) Veja-se que é lá feita a invocação da existência de contas de disponibilidade de caixa e banco superiores a € 3.000.000,00, o que não prova que existissem estes meios mas apenas que estavam registados na contabilidade, mas, independentemente disso, tal contabilização dos € 3.000.000,00 foi feita pelo anterior TOC e não pelo Recorrente!

XCIX) Quanto a esse suposto saldo de contas de disponibilidade de caixa e banco superiores a € 3.000.000,00, conforme decorre da reconciliação bancária do BANCO ……… à data de 31/12/ 2010, tratava-se de saldo bancário material de 2.431.153,86 €, e fica fora do âmbito da assunção da responsabilidade do Recorrente enquanto TOC, pois a mesma inicia-se a 01 de janeiro de 2011 (cfr. Alegação 283ª).

C) A resolução dessas pendências bancárias anteriores (ano de 2010) só poderiam ser resolvidas no ano de 2011 com base na entrega física dos documentos comprovativos por parte da B............, o que não linha acontecido até à data da finalização da prestação de serviços pela entidade patronal do Recorrente.

CI) Outro equívoco é o Despacho de Reversão afirmar, e as decisões judiciais darem por reproduzido “em bloco”, que o Recorrente, enquanto TOC, não solicitou informações/documentos à B............, quando o que decorre da prova por nós apresentada logo com a Audiência Prévia, em particular a invocada no artigo 55.º da Oposição, demonstra que esse dever foi plenamente cumprido, através dos diversos pedidos escritos e respetivas insistências, em especial para os procedimentos de envio de informação que o cliente deveria cumprir, pedidos reiterados de envio de documentos bancários e informações sobre a vida societária, conforme documentos abaixo indicados, junto, portanto, aquando do exercício do Direito de Audiência Prévia, invocados no Artigo 55.º da nossa Oposição à Execução e explicados discriminadamente nos Artigos 66.º e seguintes da mesma Oposição (cfr. Alegação 285ª).

CII) O Recorrente/Opoente não era TOC interno da cliente B............ nem tão-pouco seu funcionário em dedicação exclusiva e, por outro, o seu relacionamento com a cliente B............ era perfeitamente procedimentalizado e padronizado, ou seja, o de um trabalhador por conta da empresa de contabilidade externa que fazia a Escrita da cliente, nada mais.

CIII) Mais relevante ainda do que tal argumentário foi a explanação fáctica e documental efectuada na Audiência Prévia (a que agora se acabou de transcrever e a que seguidamente se transcreverá), a qual o Despacho de Reversão não se dignou sequer a considerar, conforme era seu dever, em que o Opoente elencou os procedimentos adoptados pelos serviços técnicos da “G............ Assessores Tributários e Financeiros, Lda.” (incluindo a sua pessoa) relativos à sociedade B.............

CIV) Atendendo à exuberância documental (1369 cópias), prova a qual se dá aqui por integralmente reproduzida, o Opoente optou e opta, na oposição e neste recurso, por transcrever o ÍNDICE DE DOCUMENTOS que capeia o anexo que se juntou sob Doc. n.º 5 da Oposição e sob o qual tal documentação é junta, a qual se encontra dividida em capítulos, consoante a matéria que se destina a provar — cfr. Alegação 292ª), que se dá por reproduzida.

CV) Desta panóplia de documentos (que se dão por integralmente reproduzidos) destaca-se a comunicação da sociedade H............ para a D............ com a execução de trabalhos na ……… ………, devidamente assinada e carimbada por ambas as sociedades, acrescendo a reclamação da sociedade D............ em 25/04/2011 aos trabalhos efectuados pela sociedade H............, com respectivo relatório de inspecção técnica da sociedade auditora I............ SLU efectuado na Refinaria …………, em ………, documentos os quais, considerados na sua plenitude, criaram no TOC/Opoente a (legítima) convicção de que existiam e existiram trabalhos efectivamente realizados pela H............, subempreiteira da D............, na antedita obra em que esta era subempreiteira da B.............

CVI) Sob o CAPITULO II do anexo que se juntou sob Doc. n.º 5 da Oposição juntaram-se as Comunicações efetuadas pela sociedade “G............ Assessores Tributários e Financeiros, Lda.” referentes à D............ LDA., de que foi dado conhecimento ao TOC, que provam, nas datas infra discriminadas, o descrito na Alegação 296ª), que se dá por reproduzida.

CVII) Demonstrou-se que todos os movimentos contabilísticos registados na contabilidade da sociedade “B............ UNIP. LDA.” no exercício de 2011, possuíam sempre suporte documental relacionado, remetido pelos serviços da referida sociedade, através de faturas, recibos, avisos bancários e/ou extratos bancários, relatórios de inspeção técnica da sociedade auditora independente I............ SLU Cuja credibilidade poderá ser confirmada através do seu website http://www.I..........com/en/ sobre os trabalhos realizados na OBRA pelas empresas subcontratadas “D............ LDA” e “H............ LDA” (Doc. n.º 5 da Oposição, Anexos n.ºs 25, 34, 42, 46 — referidos no art. 147° da Oposição), pessoal em obra (Doc. n.º 5 da Oposição, Anexo n.º 4 — referido no art. 147° da Oposição), folhas de obra, contratos de obra, cópia de comunicações entre as partes, dessa forma, não se verificando qualquer aceitação “cega” pelo TOC/Opoente dos documentos relevantes para efeitos de apuramento de proveitos e custos, FORMANDO CONVICÇÃO SUFICIENTE NO TOC acerca da NORMALIDADE E REGULARIDADE DAS OPERAÇÕES ENTRE AS SOCIEDADES REFERENCIADAS.

CVIII) E quando os movimentos bancários, em particular, não se encontravam cabalmente documentados (v.g., o extracto bancário não ser claro quanto ao beneficiário/emitente de determinada transferência bancária e/ou cheque) os mesmos eram requeridos prontamente por escrito pelo Opoente aos serviços da sociedade “B............ UNIP. LDA.”, conforme exemplificativamente decorre da prova documental junta com a Audiência Prévia (constante do Processo Administrativo) e descrita na Alegação 301ª), que se dá por reproduzida.

CLX) A Sra. Inspetora Tributária …………, ao efetuar a sua verificação, não observou, eventualmente, que transitava do exercício económico de 2010 (ou seja, fora do âmbito temporal actuação do opoente A………… enquanto Técnico Oficial de Contas) um valor de 1.946.269,26 € (um milhão novecentos e quarenta e seis mil duzentos e sessenta e nove euros e vinte e seis cêntimos) que se encontrava por conciliar na conta bancária n.º ………… do BANCO ……… SA, valor refletido no saldo contabilístico do movimento de abertura do ano, de €2.431.153,86, que consta como primeiro movimento do ano, com o descritivo 01.00.2011 - cfr. Doc. 1, Diário 8, conforme expresso na pág. 10 do Anexo 97 do Doc. n.º 5 da Oposição (vide art. 162º da Oposição), comunicado à AT pelo Opoente em 18/10/2011, com o descritivo de “Balancete analítico e extratos de todas as contas da sociedade B............ LDA do exercício de 2011, conforme doc.96-2/4” (cfr. Alegação 303ª).

CX) A leitura técnica da rubrica contabilística de disponibilidades, nomeadamente da conta contabilística de “BANCOS”, só poderá ser efetuada correctamente pela análise conjunta do extrato contabilístico com o extrato bancário e respetivo mapa de reconciliação bancária à data da verificação, como também, da conta contabilística de “CAIXA” há que verificar a natureza de cada movimento financeiro devedor / credor, pois, da sua leitura acumulada e indiscriminada, resultarão certamente compreensões erróneas e inflacionadas, contrárias à realidade observada, como sucedeu in casu por parte da AT.

CXI) Dessa forma, não se compreende — e por isso o acto tributário em crise padece de fundamentação - a conclusão errónea do Relatório de Inspecção Tributária, na sua página 19, parágrafo segundo, ao indicar que, “...apesar de a contabilidade da empresa não revelar a existência de qualquer problema de tesouraria, muito pelo contrário, as contas de disponibilidades (caixa e bancos) apresentam invariavelmente, saldos superiores a €3.000.000,00.”, compreensão errónea e inflacionada, contrária à realidade e que a AT não curou de aquilatar com a recolha de provas reais (que nem tão-pouco refere), conforme lhe competia ao abrigo do princípio plasmado no art. 58° da LGT, posto que lhe era exigível a realização de todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material.

CXII) Quanto à inexistência dos registos de pagamentos a trabalhadores na contabilidade da D............ e H............ no ano de 2011, a responsabilidade de tais pagamentos é da única e exclusiva responsabilidade da Gerência de cada empresa, sendo que os mesmos não foram remetidos em tempo útil à empresa G............ ASSESSORES TRIBUTÁRIOS LDA (entidade patronal do Oponente) para o seu registo contabilístico;

CXIII) em virtude da falta de envio atempado de documentos, o Oponente dirigiu os respetivos pedidos de escusa de assinatura das declarações fiscais à Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, tal conforme decorre do documento Doc. n.º 11A da Audiência Prévia, referido no art.76° da Oposição, plenamente reconhecido pela OTOC através do Doc. n.º 11B da Audiência Prévia, referido no art.77° da Oposição, e bem assim a comunicação à Autoridade Tributária constante dos Docs. n.ºs 94 e 95 da Oposição, referidos no art. 151° da Oposição.

CXIV) Os trabalhos realizados por estas empresas eram auditados pela empresa externa de supervisão e peritagem de I............ SLU sobre os trabalhos realizados na OBRA pelas empresas subcontratadas “D............ LDA” e “H............ LDA” (Doc. n.º 5 da Oposição, Anexos n.ºs 25, 34, 42, 46 — referidos no art. 147° da Oposição), pessoal em obra (Doc. n.° 5 da Oposição, Anexo n.° 4 — referido no art. 147° da Oposição), folhas de obra, contratos de obra, cópia de comunicações entre as partes, empresa externa esta, pela sua idoneidade apresentada, nomeadamente, observando a sua carteira de clientes conhecidos (entidades públicas e privadas de inegável reputação no mercado), descritas na Alegação 316ª) (Cfr. http://www.I..........com/en/aboutUs/ourClients)

o que criou total convicção no Oponente que os trabalhos eram efectivamente realizados, tal conforme decorre de todos os certificados de inspeção, Anexos n.ºs 25, 34, 42, 46 — referidos no art. 147° da Oposição.

CXV) É por isso insufragável vir a AT, muito posteriormente aos factos, argumentar com inaceitável moralismo não poder aceitar-se como verosímil e verdadeira — pelo menos para o Opoente, aquando da contabilização das respectivas facturas -, a subcontratação efectuada pela B............ para suprir necessidades de mão-de-obra na obra de que era dona a C.............

CXVI) Será totalmente erróneo compreender e concluir, conforme pretende a Autoridade Tributária, que “...a H............ UNIPESSOAL LDA ..., e só tinha proveitos”, pois conforme demonstrados nos Docs. n.ºs 22, 23, 24, 30, 31, 32, 33, 38, 39,40, 41, 44, e 45 da Oposição, referidos no art. 147° da Oposição, a H............ aparentemente efetuava compras regulares de materiais à sociedade comercial J............ SL, bem como à sociedade comercial K............SL, as quais deverão ser consideradas enquanto fatores de produção da atividade operacional da H............ — cfr. Alegação 318ª), que se dá por reproduzida.

CXVII) É errado a AT e o Acórdão recorrido quererem fazer crer que, atenta a sua qualidade de TOC das três sociedades, o oponente não podia desconhecer nenhum destes factos, quando, na realidade, renunciou às funções na D............ no dia 08/07/2011, e comunicou esse facto à Autoridade Tributária, tal conforme decorre dos documentos Doc. n.º 93, 94, 95 da Oposição, referidos no art. 151° da Oposição — cfr. Alegação 319ª), que se dá por reproduzida -,

CXVIII) e, conforme, aliás, é do pleno conhecimento da Autoridade Tributária, pois constará registado no seu sistema informático, o Oponente efetuou o registo da renúncia à nomeação de TOC na H............ em 30/06/2011, para além de que, em 30/05/2011, foi formalmente requerida pelo Opoente a escusa de assinatura da Modelo 22 de 2010 da H............ perante a OTOC, conforme decorre do documento abaixo indicado, junto na fase graciosa com a Audiência Prévia, terminando com a renúncia da nomeação de TOC na empresa — cfr. Doc.. 11A, descrito na Alegação 321ª).

CXIX) Finalmente, compete desmistificar a tese de que, não tendo a devedora originária impugnado os actos de liquidação, os mesmos se tornam verdade na ordem jurídica para um revertido como o é o TOC.

CXX) A este elemento trazido à colação pelo Opoente na Audiência Prévia responde o Despacho de Reversão que “i) Como expresso no ponto 2 do projeto de reversão (anexo), o relatório da Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal - Ordem de Serviço n.º 01201101125, não foi, apesar do seu conhecimento pelo TOC (Doc. 23 1/3), objeto de qualquer contestação tendo, assim, eficácia definitiva e executória.”

CXXI) Será caso para perguntar se a AT estará mesmo a falar a sério?! Quererá ela dizer que um Relatório de Inspecção, caso não seja contestado, torna verdade tudo o que lá se escreveu?? Designadamente, quanto a responsáveis subsidiários como um TOC, que não tem elementos para impugnar uma correcção à matéria tributável, que não é sequer notificado para o efeito e que só aquando da Reversão se vê a braços com a imputação à sua pessoa das liquidações decorrentes da correcção à matéria tributável efectuadas na sequência de acção inspectiva a um (ex) cliente??

CXXII) É ilegal a fundamentação dada neste ponto pelo Despacho de Reversão uma vez que, ao contrário do que propugnam, a falta de contestação às liquidações efectuadas na sequência do Relatório Inspectivo não toma verdade tudo o que se escreveu nesse relatório, mas tão-somente torna definitivos e executórios os actos de liquidação, que não deixam de estar afectados por vícios que tenham ou não a ver com a determinação da matéria colectável ainda que tais vícios não sejam mais atacáveis. Não nos esqueçamos que o Direito Tributário é cada vez mais técnica e cada vez menos ciência, mas não se exagere.

CXXIII) Assim, a convicção possível ao TOC, acerca da materialidade das operações geradas pelas empresas em apreço, foi plenamente reconhecida pela entidade com tutela técnico-deontológica sobre o sector, a (então) ORDEM DOS TÉCNICOS OFICIAIS DE CONTAS (OTOC), no seu douto Parecer de 08/11/2012, que na página 9 que abaixo se transcreve para melhor compreensão, relata que “...de acordo com a vária documentação que o TOC remeteu à OTOC, existiam provas credíveis de que as entidades em causa desenvolviam uma atividade económica” a páginas 10, “... que o TOC A............ ao ter conhecimento destes factos ou indícios, comunicou-os imediatamente à Ordem”.

CXXIV) Correctamente decorre da Sentença da 1ª instância que “Acresce que, no decorrer do exercício de 2011, o Oponente dirigiu-se, por diversas vezes, à competente Ordem dos TOC para solicitar escusa de assinatura de declarações fiscais das sociedades H............, D............ e B............ e, bem assim, para reportar as irregularidades detetadas (alíneas B), C), D, E, F, G do probatório,). Esta atuação apenas pode ser entendida como o desempenho diligente e cauteloso do exercício das suas funções, com respeito pelos normativos legais aplicáveis.”, probatório o qual, diga-se, não foi impugnado em sede recursal.

CXXV) Também propugnado a falta de fundamentação do suposto facto ilícito e culposo segue o PARECER emitido pela OTOC, nesta parte transcrito na Alegação 333ª), que se dá por reproduzida, pelo que não subsiste qualquer fato ilícito ou culposo legitimamente imputado ao TOC, o que deverá ser declarado, conforme o havia feito a 1ª instância, revogando-se o injusto Acórdão recorrido.

CXXVI) Terminando com o capítulo “C) DA INCONSTITUCIONALIDADE DOS N.°S 3 E 1 DO ARTIGO 24.° DA LGT”, pelos fundamentos de constitucionalidade aludidos supra e suportados na Doutrina existente (citada na Alegação 336ª), que se dá por reproduzida), a contrario são inconstitucionais, por violação dos princípios da culpa, da igualdade e da proporcionalidade, as normas dos n.°s 3 e 1 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária, na parte em que se referem à responsabilidade tributária subsidiária dos técnicos oficiais de contas, se para efeitos da sua responsabilização não for exigível à Administração Tributária a alegação e prova de que o TOC culposamente dissipou ou maltratou o património social e da verificação de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do técnico oficial de contas e o incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o técnico oficial de contas exerce as suas funções profissionais.

CXXVII) O Acórdão recorrido tentou, astuciosamente, passar ao lado da inconstitucionalidade imputada, todavia, nela caindo redondamente, pronunciando-se em termos diversos do que lhe foi colocado, e utilizando a fundamentação que deu quanto aos requisitos de efectivação da responsabilidade subsidiária dos TOCs, o que, como vimos, o levou por caminhos ínvios, ao ponto de considerar demonstrada a necessária culpa do TOC com o juízo de que este apresentou 3 declarações de IVA que “sabia (ou devia saber) que não tinham aderência à realidade”,

CXXVIII) doutrinando a existência de uma verdadeira “obrigação de saber” por parte do Contabilista, pelo que, ao bastar-se com a sua (suposta) verificação para efeitos de efectivação da responsabilidade subsidiária tributária do TOC, violou frontalmente as regras do onus probandi que à AT compete para efeitos do n.º 3 do art. 24° da LGT, estabelecendo o nexo causal entre o facto e o dano sem factos que o suportem, i.e., factos que provem que o incumprimento fiscal do contribuinte foi devido ao comportamento (supostamente) ilícito do técnico oficial de contas,

CXXIX) e, finalmente, que foi por culpa do TOC que o património da sociedade se tornou insuficiente para o pagamento da dívida exequenda, conclusão a que o Acórdão recorrido chegou sem qualquer facto que lhe pudesse dar respaldo, tirando a ilação que “o mesmo aceitou o resultado do incumprimento fiscal e a posterior situação de insuficiência patrimonial da SDO”, fazendo desta afirmação “a vez” de uma prova de insuficiência patrimonial gerada pelo TOC, ou seja, a verificação de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do técnico oficial de contas e o incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o técnico oficial de contas exerce as suas funções profissionais, o qual tem necessariamente de ter agido de forma a tornar a prestação impossível por parte do executado originário: uma relação de causalidade entre uma acção ou omissão culposa do responsável subsidiário relativamente à obrigação tributária e o seu não pagamento através do património do devedor principal, que não resulta demonstrado nos autos.

CXXX) Pelo que o Acórdão em crise contrariou assim, para além da ratio da própria norma da LGT e da Jurisprudência assente do Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que o nexo causal não se presume (Acórdão do STJ de 26-02-2009 (relatora: Dra. Maria Beleza, processo 09B0071) e Acórdão do STJ de 06-05-2008 (relator: Dr. Urbano Dias, processo 08ª1279), entre outros.), ainda a Jurisprudência dos Tribunais superiores, inter alias a do Acórdão da 2ª Secção - Contencioso Tributário do TCA Norte de 20-12-2012 (processo 00400/10.8BEPNF, in www.dgsi.pt) pelo que, deverá ser declarada a inconstitucionalidade dos n.°s 3 e 1 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária, na interpretação feita pelo Acórdão recorrido, por violação dos princípios constitucionais da culpa, da igualdade e da proporcionalidade.

Termos em que, deverá o presente Recurso de Revista ser admitido e ser julgado procedente por provado, revogando-se o Acórdão recorrido;

Requer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.°, n.º 7, do RCP, porquanto (tal como se entendeu no Acórdão recorrido), a especialidade da causa, a sua complexidade ou especificidade não justificam a imposição de encargos dissuasores do acesso à justiça;
assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!

Não foram aduzidas contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal, o recurso foi admitido pelo Acórdão de 3 de Abril de 2019 e que se transcreve, na parte que interessa:

“(…) Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do transcrito artigo a excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito – devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.
E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de Abril de 2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.».
O acórdão do TCA Sul do qual o recorrente reclama revista é, até à presente data, o único acórdão de Tribunal Superior da jurisdição que julgou verificados os pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária dos Técnicos Oficiais de Contas prevista no n.º 3 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária (LGT), revogando a decisão de 1.ª instância que os julgou não verificados e contrariando o parecer do Ministério Público junto do TCA.
Trata-se de matéria de inegável relevo social fundamental, sobre a qual este STA nunca se pronunciou, e que, como órgão de cúpula da jurisdição, importa que pronuncie, densificando os pressupostos da responsabilidade tributária aí prevista e relacionando-os quer com os deveres funcionais tidos como violados, quer com o incumprimento dos deveres tributários do devedor originário, tanto na fase da reversão, como no controlo jurisdicional desta.
Admitir-se-á, pois, a revista, dentro dos limites desta, ou seja, dela excluindo o conhecimento das nulidades invocadas e de eventuais erros na apreciação e valoração da prova, que, por disposição legal expressa - cfr. os números 3 e 4 do artigo 150.º do CPTA - não podem ser objecto de revista salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
A revista será, pois, admitida.
Contrariamente ao despacho do Relator no TCA que atribuiu efeito meramente devolutivo ao recurso (fls. 2703 dos autos), atribui-se-lhe efeito suspensivo, ex vi do art. 143.º n.º 1 do CPTA – aplicável aos recursos regulados por aquele Código, como é o caso do recurso excepcional de revista (art. 150.º do CPTA) -, como requerido, ponderando, com o Ministério público junto deste STA, que, atendendo ao valor da causa, o efeito meramente devolutivo do recurso pode causar ao executado “prejuízo de difícil reparação” e perda do efeito útil.
- Decisão -
6 - Termos em que, face ao exposto e nos termos supra indicados, acorda-se em admitir o presente recurso.
Custas a final.”

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de o recurso merecer provimento, sendo de anular o despacho de reversão, por ter sido preterido o pressuposto de inexistência de bens/insuficiência do património da devedora originária.


*

Os autos vêm à conferência satisfeitos os vistos legais.
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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

No acórdão recorrido foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

A) «O Oponente, A............, é Técnico Oficial de Contas (TOC), sendo portador da cédula profissional n.º ……… (cfr. doc. n.º 1 junto com a Petição Inicial – PI);
B) Em 30/05/2011, o Oponente solicitou à Ordem dos TOC escusa da assinatura na declaração fiscal de rendimentos (Modelo 22) do exercício de 2010 da sociedade «H............ – Soldadura de Alta Precisão, Unipessoal, Lda.», com fundamento em limitações de âmbito técnico verificadas por parte da sociedade na fundamentação dos seus gastos e proveitos (cfr. fls. 196 do PEF);
C) Em 30/06/2011, a Ordem dos TOC respondeu ao Oponente remetendo autorização de recusa de assinatura de declarações fiscais (cfr. fls. 212 a 214 do PEF);
D) Em 11/07/2011, o Oponente, em nome da sociedade «G............ – Assessores Tributários e Financeiros, Lda.», remeteu ao Chefe do Serviço de Finanças do Porto 5 um requerimento, nos termos do qual se identifica como TOC da D............ – Construção, Ferros, Máquinas e Utensílios, para a Soldadura de Alta Precisão Unipessoal, Lda. e informa que não foi dado cumprimento à obrigação declarativa prevista na alínea b), n.º 1 do artigo 41.º do Código do IVA, referente ao segundo trimestre de 2011, em virtude de não ter sido atempadamente fornecida toda a documentação de suporte e demais informações necessárias ao cumprimento daquela obrigação fiscal, e que se desvinculou como TOC da sociedade com referência a 08/07/2011 (cfr. fls. 1673 a 1675 dos autos em suporte físico);
E) Com data de 15/07/2011, o Oponente remeteu à Ordem dos TOC carta registada com aviso de receção, por meio da qual informa da possível existência de irregularidades por parte da «H............ – Soldadura de Alta Precisão, Unipessoal Lda.», o que faz com os seguintes fundamentos:
«À eventual ausência de fundamento à geração dos proveitos declarados nos exercícios de 2010 e 2011, pela sociedade aqui referida, nomeadamente, quanto aos factores de produção necessários (mão-de-obra contratada, matérias-primas, subsidiárias e de consumo, etc. …). À presente data, a sociedade possui dívidas conhecidas perante a Direção-Geral de Contribuições e Impostos em sede de IVA por 911.163,59 € e IRC 802.651,94 €, não demonstrando interesse conhecido em regularizar a situação, apesar de devidamente informada (em anexo as respectivas comunicações). De forma conhecida, a sociedade aqui referida possui como cliente único, a sociedade “D............ – Construção, Ferros, Máquinas e Utensílios para Soldadura de Alta Precisão, Unipessoal, Lda.”, com NIF ………, sendo que esta por sua vez, possui como cliente único a sociedade “B............ – UNIPESSOAL, LDA”, com NIF ………, conforme demonstram os balancetes analíticos junto enviados para V/apreciação à data de 31/12/2010 e 31/03/2011» (cfr. fls. 219 do PEF);
F) Em 29/07/2011, a Ordem dos TOC respondeu ao Oponente, comunicando que a situação por este descrita não configura crime público e, como tal, não se enquadra no artigo 58.º do EOTOC (cfr. fls. 231 do PEF);
G) Em 21/12/2011, o Oponente dirigiu à Ordem dos TOC uma carta com o assunto «PARTICIPAÇÃO NOS TERMOS ART.º 58 EOTOC // B............ (NIF ………)», da qual se extrai o seguinte:

«…venho por este meio e para os efeitos que considerarem adequados informar V. Exa(s). relativamente à sociedade “B............ – Unipessoal, Lda.” com NIF ……… no âmbito do projeto de relatório de inspeção tributária, o qual me foi dado conhecimento no passado dia 19/12/2011 conforme correio eletrónico da Sra. ………… (funcionária da sociedade …), é presumida a utilização de faturas que não correspondem a operações reais por parte da sociedade supra referida.
Até ao presente momento, a sociedade em causa não me prestou qualquer esclarecimento verbal, e, ou, escrito sobre a situação relatada no projeto de relatório da inspeção tributária indicado no parágrafo anterior.
Atendendo ao exposto, venho por este meio solicitar a V. Exa(s). autorização para escusa de assinatura na declaração fiscal de rendimentos (Modelo 22), como também, a respetiva declaração anual de informação contabilística e fiscal (IES/DA) do exercício de 2011 e subsequente cancelamento da prestação de serviços.
Informo ainda V. Exa(s). no seguimento das limitações de âmbito praticadas pelas sociedades H............… e D............… e respetiva falta de pagamento de honorários, foi efetuada a denúncia do contrato de prestação de serviços em 28/06/2011 e 08/07/2011 respetivamente. (…)» (cfr. fls. 283 e 284 do PEF);
H) Na sequência de inspeção à escrita da sociedade B............ relativamente aos exercícios de 2010 e 2011, foi, em 29/12/2011, elaborado o relatório de inspeção tributária, de cujas conclusões se extrai o seguinte: // «(…)

II – 3.2 – CONTABILIDADE
A sociedade dispõe de contabilidade regularmente organizada, nos termos da legislação comercial e fiscal, tendo optado pelo recurso a meios informáticos para o apuramento e controlo do lucro tributável.
A responsabilidade pela sua execução recai sobre os seguintes TOC’s:

[IMAGEM]

(…)
II – 3.5 – OBRIGAÇÕES DECLARATIVAS
De acordo com a informação constante em sistema, não se encontram em falta, na presente data, quaisquer declarações. // (…) // II-3.9 – DESCRIÇÃO DOS FACTOS APURADOS
Em 2010.01.05 é constituída a sociedade unipessoal B............ – Unipessoal, Lda. (…).Segundo se apurou durante o decurso da acção, a constituição da mesma, surge no âmbito de concurso lançado para a realização da obra de reestruturação e ampliação da refinaria da ……… em ………, realizando um contrato de subempreitada com a empresa C............ Proyectos M. Industriales SA – Sucursal em Portugal (…) para a execução de uma parte da obra que, por sua vez, foi subcontratada pela sociedade L............ SA, a qual detém o contrato de execução junto da ……… Energia (…). // (…)
ASPECTOS A DESTACAR:
Durante os 3 primeiros trimestres de actividade, a empresa apurou imposto a pagar em montantes bastantes significativos.
A partir do último trimestre de 2010 esta situação inverte-se, apurando nesse trimestre um crédito de imposto no valor de € 1.062,10.
No mesmo período o volume de negócios cresce 275% e o imposto liquidado 183%.
Por outro lado o imposto deduzido relativamente a gastos com Outros Bens e Serviços cresceu em 990%, ou seja, sofreu um crescimento muito mais acentuado e não proporcional ao crescimento das vendas.

(…)
II – 3.10 – VERIFICAÇÕES EXTERNAS
II – 3.10.1 FICHEIROS SAFT – T
Entrou-se em contacto com ambos os técnicos oficiais de contas (já anteriormente identificados) e solicitaram-se os ficheiros SAF-T (contabilidade e facturação) relativos a 2010 e 2011, tendo ambos procedido ao respectivo envio.
Todavia, relativamente ao ficheiro SAF-T da contabilidade do ano 2011, a informação aí constante apenas incluía os saldos de abertura das contas (em 01/01/2011), não evidenciando o registo de qualquer documento. Facto esse que se transmitiu ao TOC (18/10/2011), solicitando a resolução do problema, e o envio, desde logo, de balancete analítico e extratos de todas as contas com movimentos (enviados na mesma data).
Relativamente ao problema com o ficheiro SAF-T (contabilidade) o TOC referiu (telefonicamente) que desconhecia a razão por que tal terá ocorrido, alegando que teria que solicitar a resolução do problema junto da “software hause”.
Apenas em 18/11/2011, procedeu finalmente ao envio do referido ficheiro contendo todos os registos efetuados até essa data.
A importância de que se revestia a análise da informação contida no ficheiro SAF-T, em contraponto com a informação disponibilizada através do balancete analíticos e extratos da conta, prende-se com o facto de através do programa analisador ser possível ter acesso à data efetiva do registo dos documentos, o que no caso em concreto é relevante.
Conforme se descreverá no ponto seguinte do presente relatório, as evidências conduzem à conclusão de que as faturas emitidas pela empresa fornecedora D............, Lda. apenas são emitidas e, consequentemente registadas, após se proceder ao apuramento do imposto que haveria a pagar, caso essa faturação não existisse. Através da data de registo dos documentos na contabilidade seria possível comprovar, sem sombra de dúvida, que tal seria o procedimento adotado.
Procedendo à análise do referido ficheiro, mais concretamente ao registo das diversas faturas emitidas pela referida empresa, constatou-se que no campo “data gravação” consta uma data igual à data do documento.
(…) Consultaram-se diversos movimentos, relativos aos registos em diversas contas, verificando-se sempre o mesmo facto – “data gravação” igual à “data”.
Ao campo “data” deverá corresponder a data de emissão documento e ao campo “data gravação” a data em que o respetivo registo é efetuado no programa de contabilidade.
As duas datas não podem, de todo, ser coincidentes, mesmo porque, no extrato de conta enviado em 18/10/2011 o documento acima identificado ainda não se encontrava registado, como poderia então ter como data de gravação 01/09/2011?!
Pelo que se conclui que o mesmo ficheiro terá sido adulterado, por forma a não evidenciar a data em que os documentos foram efetivamente registados na contabilidade.
II – 3.9.1 VERIFICAÇÃO DOCUMENTAL
(…) // I. Conclusões
Tendo em conta o descrito, conclui-se:
Até Outubro de 2010, a B............ apresentava uma conduta, que se poderá considerar de normal, sem apresentar evidências que pudessem conduzir a dúvidas quanto à possível ocorrência de qualquer irregularidade fiscal.
A partir de Outubro de 2010, a forma de atuação da empresa, no que diz respeito aos seus fornecedores, sofre uma alteração de fundo.
As empresas constituídas, H............ e D............:
- Não possuem qualquer estrutura empresarial;
- Não tem funcionários; Nunca deram entrada nas instalações da obra;
- A descrição das faturas emitidas por estas corresponde a serviços que são executados pela B............, que dispõe, essa sim, dos funcionários necessários para a sua execução.
Os únicos pagamentos efetuados pela B............ à D............ (não registados na contabilidade da B............, mas identificada a saída dos cheques na conta bancária através do respetivo extrato de conta) totalizaram apenas € 225.000,00, valor que fica muito aquém dos serviços que foram faturados (€9.030.202,92 até 2011.09.30), ou seja o circuito económico (faturação), não é acompanhado pelo correspondente circuito financeiro (pagamento), apesar de a contabilidade da empresa não revelar a existência de qualquer problema de tesouraria, muito pelo contrário, as contas de disponibilidades (caixa e bancos) apresentam, invariavelmente, saldos superiores a €3.000.000,00.
O que nos leva à conclusão de que as mesmas faturas não correspondem a operações reais, mas sim, a operações simuladas, sendo a faturação emitida por ambas as empresas falsa.
A constituição da H............ e da D............ parece ter sido apenas como objetivo a dedução de IVA e de custos na B.............
A conduta adotada pelas três empresas (H............, D............ e B............) assim como as relações estabelecidas entre elas (descritas ao longo do presente relatório) permite-nos concluir que estamos perante um esquema montado que tem como único objetivo a fraude e a evasão fiscal:
- A H............ apenas tem proveitos, é declarante, apurando elevados montantes de imposto a entregar (em sede de IVA e IRC) mas não faz entrega nos cofres do estado de qualquer valor. A D............ serve de “tampão”, é declarante e paga os montantes do imposto apurado (em sede de IVA e IRC) que são de valor pouco significativo.
- A B............ é o recetor de faturação falsa, usufruindo da dedução do IVA e do custo em sede de IRC.
Em 22 de Novembro de 2011 foram concluídas pela Direção de Finanças do Porto as ações inspetivas, OI201103348 e OI2011, abertas respetivamente em nome de H............ e da D............, através das notificações dos respetivos relatórios finais.

Conclusões do Relatório Final da Ordem de Serviço OI201103349 aberta em nome da sociedade D............, Unipessoal Lda.
“Nas ações inspetivas à H............ e à D............ verificaram-se diversos factos que indiciam que as faturas emitidas por estas duas empresas não correspondem a operações reais, nomeadamente:
- A H............ não ter qualquer empregado, nem ter contabilizado quaisquer custos de recurso a subcontratação ou de aquisição de materiais;
- Os montantes faturados pela H............ à D............ serem muito elevados (€ 4.186.571,96 entre 28.10.2010 e 31.03.2011), o valor faturado no próprio dia em que estas duas empresas foram constituídas e no dia seguinte perfaz € 1.142.700;
- Existir apenas um recebimento na D............ e na H............, de valor pouco significativo, face aos montantes faturados por estas duas empresas;
- Os únicos custos relevantes contabilizados pela D............ serem as faturas da H............;
- A D............ não ter qualquer empregado, nem ter na sua contabilidade, para além das faturas da H............, quaisquer custos de recurso a subcontratação ou de aquisição de materiais; Não ser conhecida qualquer estrutura nem da H............, nem da D............ (instalações, equipamentos) adequada à prestação de serviços de montantes tão elevados;
- A H............, a D............ e a B............ têm em comum o facto de serem sociedades unipessoais, detidas por indivíduos de nacionalidade espanhola e terem o mesmo técnico oficial de contas (A…………). A H............ e a D............ foram constituídas no mesmo dia e no mesmo local, tendo em ambas as escrituras tido intervenção como intérprete A………...;
- A única sociedade com dívidas é a H............. A D............ apresenta uma situação fiscal aparentemente regular, parecendo funcionar como "ponte" entre a H............ e a B............;
- A constituição da H............ e da D............ parece ter tido apenas como objetivo a dedução de IVA e de custos na empresa B............. "

De acordo com as conclusões acima descritas foi proposta a cessação oficiosa, com efeitos a 30.09.2011, de ambas as sociedades, H............ e a D............, por se considerarem reunidos os pressupostos legais, para efeitos de IVA, nos termos do n.º 2 do art.º 34º do Código do IVA e para efeitos de IRC, nos termos do n.º 6 do art.º 8.º do Código do IRC.
Em conformidade com as conclusões retiradas da análise efetuada, proceder-se-á, no capítulo III do presente relatório, ao apuramento das correspondentes correções, quer em sede de IVA quer em sede de IRC.
A utilização de faturas que não correspondem a operações reais consubstancia a prática do crime de fraude qualificada punível nos termos do n.º 2 do artigo 104.º do RGIT, (…)» // (cfr. fls. 78 a 95 do PEF);
I) Com data de 31/01/2012, o Oponente remeteu à B............ uma carta com o assunto «DENÚNCIA DO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS», da qual resulta que:

«… vimos por este meio informar V. Exa(s). que a falta reiterada de entrega dos documentos, e, ou, entrega tardia dos mesmos, com significância contabilística e respetivos esclarecimentos acessórios, essenciais à elaboração nos termos legais da contabilidade da V/ sociedade (…) confirma uma limitação insuperável de âmbito técnico.//Dessa forma, comunicámos a V. Exa(s). a denúncia do contrato de prestação de serviços celebrado no dia nove de Setembro de dois mil e onze, ao abrigo do parágrafo 2º da Cláusula Oitava do referido contrato, em virtude das sérias limitações de âmbito causadas ao n/Serviço Técnico com efeitos imediatos a partir do dia 01/02/2012» (cfr. fls. 252 a 254 do PEF);
J) Em 05/03/2012, o Oponente remeteu ao Chefe do Serviço de Finanças de Sines uma carta, nos termos da qual, na qualidade de TOC da B............, informava que não ia ser dado cumprimento à obrigação declarativa prevista na alínea c), n.º 1, do Artigo 119.º do Código do IRC referente ao exercício de 2011 (Declaração Modelo 10), porque a referida sociedade não forneceu atempadamente toda a documentação de suporte e demais informações necessárias ao cumprimento daquela obrigação fiscal e, ainda, que se tinha desvinculado das funções de TOC da referida sociedade com efeitos a 01/02/2012 (cfr. fls. 264 a 268 do PEF);
K) Contra a sociedade B............ foi instaurado, em 28/04/2012, o processo de execução fiscal n.º 2259201201006070, pelo Serviço de Finanças de Sines, para cobrança coerciva de dívidas de IVA e juros compensatórios, no montante global de Eur. 1.682.452,70 (cfr. fls. 1 a 17 do PEF);
L) Em 30/04/2012, o Oponente dirigiu ao Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Sines fax com o assunto «Comunicação (Modelo 30 de Janeiro/2012)» e por referência à sociedade B............, da qual resulta que «…não será dado cumprimento à obrigação declarativa prevista no nº 7 do Artigo 119.º do CIRS e Artigo 128º do CIRC referente ao mês de Janeiro de 2012 (Declaração Modelo 30), em virtude da sociedade supra referida não ter fornecido atempadamente toda a documentação de suporte e demais informações necessárias ao cumprimento da referida obrigação fiscal.//Mais informo V.Exa(s)., para o efeito, a sociedade para qual prestava trabalho rescindiu o respectivo contrato de prestação de serviços com a sociedade “B............ UNIPESSOAL LDA” e NIF ……… com efeitos a 01/02/2012, confirmando dessa forma, a minha desvinculação como TOC da sociedade supra à data de 01/02/2012, da qual junto os respectivos documentos» (cfr. fls. 19 do PEF)
M) Em 30/05/2012, foi dirigido à B............, por carta registada com aviso de receção, o ofício “CITAÇÃO”, por meio do qual foi comunicada a instauração do processo de execução fiscal melhor identificado na alínea A) supra, para cobrança coerciva do montante global de Eur. 2.148.588,50 (cfr. fls. 30 a 31 do PEF);
N) Em 05/06/2012, a Ordem dos TOC remeteu ao Oponente um ofício com a referência CR/DJ/Proc. N.º 195/12 e assunto «Reconhecimento de motivo justificado para a recusa de assinatura, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 54.º do EOTOC», comunicando-lhe a autorização de recusa de assinatura das declarações fiscais da B............ relativas ao exercício de 2011 (cfr. fls. 278 a 280 do PEF);
O) Em 05/06/2012, o Oponente remeteu ao Chefe do Serviço de Finanças de Sines uma carta, nos termos da qual, na qualidade de TOC da B............, informava que não ia ser dado cumprimento à obrigação declarativa prevista no n.º 1, do Artigo 120.º do Código do IRC referente ao exercício de 2011 (Declaração Modelo 22), porque a referida sociedade não forneceu atempadamente toda a documentação de suporte e demais informações necessárias ao cumprimento daquela obrigação fiscal e, ainda, que se tinha desvinculado das funções de TOC da referida sociedade com efeitos a 01/02/2012 (cfr. fls. 269 a 273 do PEF);
P) Por despacho de 20/08/2012, o Chefe do Serviço de Finanças de Sines determinou a preparação do processo com vista à reversão contra o ora Oponente, A............ (cfr. fls. 102 do PEF);
Q) Com data de 20/08/2012, foi dirigido ao Oponente o ofício «NOTIFICAÇÃO AUDIÇÃO-PRÉVIA (REVERSÃO)», do qual se extrai como fundamento para a reversão: «Inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício de excussão (art.º 23.º/n.º 2 da LGT); Dos técnicos oficiais de contas, por existir prova da violação dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal, ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos (art. 24.º/n.º 3 LGT), conforme fundamentação em anexo» (cfr. fls. 124 do PEF);
R) Do Anexo que acompanha o ofício melhor identificado na alínea anterior extrai-se o seguinte:
1. A dívida a que se reportam os autos de execução fiscal em epígrafe inclui IVA de janeiro a setembro de 2011, apurado em ação de inspeção inserida no âmbito da Ordem de Serviço n.º OI201101125 dos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal, período em que A............, contribuinte n.º ………, foi responsável pela contabilidade, na qualidade de Técnico Oficial de Contas da executada.
2. O Despacho para Audição (Reversão), a que se reporta o presente Anexo, sustenta a projetada reversão contra o peticionário por existir prova da violação dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal, ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações (financeiras e seus anexos (art.º 24.°, n.º 3 da Lei Geral Tributária [LGT]), sendo a prova resultante do Relatório da Inspeção Tributária de Setúbal - Ordem de Serviço n.º 01201101125, com eficácia definitiva e executória.
3. A referida Ordem de Serviço teve origem numa comunicação da Direção de Finanças do Porto que indiciava o registo de faturas em conta de custos na contabilidade da originária executada B............ Unipessoal, Lda., e que não ofereciam garantia de corresponderem a transmissões efetivas, identificando esquema de potencial crime de evasão e fraude fiscal, que envolve três sociedades unipessoais com sócios de nacionalidade espanhola, duas delas com sede no Porto, a H............ - Soldadura de Alta Precisão Unipessoal, Lda. e D............ - Construção, Ferros, Máq. e Utensílios para Soldadura de Alta Precisão Unipessoal, Lda. e uma com sede em Sines, a B............ Unipessoal, Lda.;
4. Em 2011.11.22 foram concluídas pela Direção de Finanças do Porto as ações inspetivas nºs OI201103348 e OI201103349, abertas respetivamente em nome de H............ e da D............, através das notificações dos respetivos relatórios finais, no seguimento das quais foi aberta a citada Ordem de Serviço nº OI201101125 dos Serviços de Inspeção Tributária de Setúbal;
5. As conclusões do Relatório Final da Ordem de Serviço nº OI201103349, da Direção de Finanças do Porto, aberta em nome da D............ Unipessoal, Lda., foram as seguintes: "Nas ações inspetivas à H............ e à D............ verificaram-se diversos factos que indiciam que as faturas emitidas por estas duas empresas não correspondem a operações reais, nomeadamente:
- A H............ não ter qualquer empregado, nem ter contabilizado quaisquer custos de recurso a subcontratação ou de aquisição de materiais;
- Os montantes faturados pela H............ à D............ serem muito elevados (€ 4.186.571,96 entre 28.10.2010 e 31.03.2011), o valor faturado no próprio dia em que estas duas empresas foram constituídas e no dia seguinte perfaz € 1.142.700;
- Existir apenas um recebimento na D............ e na H............, de valor pouco significativo, face aos montantes faturados por estas duas empresas;
- Os únicos custos relevantes contabilizados pela D............ serem as faturas da H............;
- A D............ não ter qualquer empregado, nem ter na sua contabilidade, para além das faturas da H............, quaisquer custos de recurso a subcontratação ou de aquisição de materiais;
- Não ser conhecida qualquer estrutura nem da H............, nem da D............ (instalações, equipamentos) adequada à prestação de serviços de montantes tão elevados;
- A H............, a D............ e a B............ têm em comum o facto de serem sociedades unipessoais, detidas por indivíduos de nacionalidade espanhola e terem o mesmo técnico oficial de contas (A…………). A H............ e a D............ foram constituídas no mesmo dia e no mesmo local, tendo em ambas as escrituras tido intervenção como intérprete A…………;
- A única sociedade com dívidas é a H............. A D............ apresenta uma situação fiscal aparentemente regular, parecendo funcionar como "ponte" entre a H............ e a B............;
- A constituição da H............ e da D............ parece ter tido apenas como objetivo a dedução de IVA e de custos na empresa B............. "
6. De acordo com as conclusões acima descritas foi proposta a cessação oficiosa, com efeitos a 30.09.2011, de ambas as sociedades, H............ e a D............, por se considerarem reunidos os pressupostos legais, para efeitos de IVA, nos termos do n.º 2 do art.º 34º do Código do IVA e para efeitos de IRC, nos termos do n.º 6 do art.º 8.º do Código do IRC.
7. Resultam da atrás identificada Ordem de Serviço n.º OI201101125 dos Serviços de Inspeção Tributária de Setúbal os seguintes factos:
8. Em 05.01.2010 é constituída a sociedade unipessoal B............ Unipessoal, Lda.;
9. Segundo se apurou durante o decurso da ação de inspeção, a constituição da mesma surge no âmbito de concurso lançado para a realização da obra de reestruturação e ampliação da refinaria da ……… em ………, realizando um contrato de subempreitada com a empresa C............ Proyectos M. Industriales SA Sucursal Portugal, para a execução de uma parte da obra que, por sua vez, foi subcontratada pela sociedade L............ SA (espanhola) a qual detém o contrato de execução junto da ……… Energia;
10. Conforme se pode comprovar pela análise do contrato celebrado pela B............ Unipessoal, Lda, trata-se de uma prestação de serviços sem incorporação de materiais, sendo os mesmos fornecidos pela C............ SA;
11. Foi assinado um primeiro contrato em 21.06.2010 no valor global de 4.740.252 € e uma adenda ao mesmo em 13.07.2010 no valor de 1.000.000 €, sendo os valores aí previstos estimados, podendo sofrer variação;
12. Junto à adenda ao contrato, encontra-se cópia de carta, redigida em espanhol, datada de 2010.01.08, dirigida pela C............ SA à empresa M…………, com sede em Espanha, referindo-se à aceitação de uma proposta que terá sido apresentada por esta última, referente à execução da obra a realizar na refinaria da ……… em ………;
13. Pelo teor desta carta deduz-se que esta empresa espanhola, a M............, está intimamente ligada à criação da empresa B............ Unipessoal, Lda., dedução essa reforçada pelo facto de, como a seguir se descreverá, existirem situações de faturação da primeira à segunda, com posterior anulação com contornos pouco claros;
14. Efetivamente, em Dezembro de 2010 são anuladas faturas de prestação de serviços efetuados ao longo do ano, emitidas pela empresa M............ sediada em Espanha, através de uma Nota de Crédito no valor de 540.000 € com a seguinte descrição: "Fatura Abono";
15. Esta anulação apresenta contornos pouco claros, dado não se entender como é possível anular faturas relativas a serviços já prestados, o que evidencia as relações especiais existentes entre elas, visto que tal situação não seria exequível entre entidades independentes, vindo reforçar a ideia de que será esta empresa que se encontra por trás da constituição, em Portugal, da empresa B............, e por consequência, igualmente da H............ e da D............;
16. De acordo com o esquema a seguir descrito, foram constituídas três empresas, todas unipessoais e de sócios de nacionalidade espanhola e que mais não são que sucursais da sociedade M............ SI, esta sediada em Espanha, e que no seu conjunto só a B............ presta serviços efetivos em território nacional, sendo que a H………… e a D............ apenas foram constituídas para "fabricar" custos na B............ dado que:
- Não possuem qualquer estrutura empresarial;
- Inexistência de pessoal ao seu serviço;
- Os valores faturados não foram pagos;
- A descrição das faturas emitidas por estas corresponde a serviços que são executados pela B............, que dispõe, essa sim, dos funcionários necessários para a sua execução.
- A H............ fatura para a D............, é declarante mas não paga os impostos devidos, estando já classificada como devedor estratégico para efeitos fiscais;
- A D............, que fatura para a B............ com um valor acrescentado mínimo, é declarante e paga os valores apurados que são irrisórios face ao volume de faturação;
Não consta que as empresas H............ e D............ tenham entrado nas instalações da refinaria da ……… em ……… nem qualquer empregado seu;
- Segundo declarações obtidas os serviços faturados à B............ são efetuados por um empregado seu e não por terceiros.
17. O esquema sintetiza-se da seguinte forma:
- A H............ apenas tem proveitos, é declarante, apurando elevados montantes de imposto a entregar em sede de IVA e IRC, mas não faz entrega nos cofres do estado de qualquer valor;
- A D............ serve de "tampão", é declarante e paga os montantes de imposto apurado em sede de IVA e IRC, que são de valor pouco significativo;
- A B............ é o recetor da faturação falsa, usufruindo da dedução do IVA e do custo em sede de IRC;
18. Ambas as empresas H............ e D............ foram constituídas em 27.10.2010, sob a forma de sociedades unipessoais por sócios de nacionalidade espanhola, vindo referido em cada uma das escrituras a intervenção de um intérprete, motivada pelo facto dos respetivos sócios serem de nacionalidade espanhola, que foi o Senhor A............, nomeado Técnico Oficial de Contas de ambas as empresas.
19. Essas empresas têm sede no mesmo edifício localizado no Porto (onde segundo a informação enviada pela Direção de Finanças do Porto não existe qualquer estrutura empresarial), não tendo nenhuma delas funcionários.
20. A H............ emite à D............, durante o primeiro trimestre de 2011, nove faturas num total de 1.626.966,96 €, liquidando IVA no montante de 374.202,40€.
21. Procede à entrega da declaração de IVA mas não efetua a correspondente entrega de imposto nos cofres do estado.
22. A D............ fatura à B............, até 30.09.2011, 9.030.202,92 € (com IVA incluído) dos quais esta lhe paga 225.000 €.
23. Este pagamento está apenas registado na contabilidade da D............, não se verificando o registo de qualquer pagamento na contabilidade da B............, como referido no ponto 40.
24. Desta faturação, apenas declarou e entregou nos cofres do estado o montante de 2.753,40 €.
25. Importa aqui referir que ambas as empresas H............ e da D............ se encontram em situação faltosa em sede de IVA e IRC, não tendo sido entregues as declarações periódicas de IVA dos 2.º e 3.º trimestres de 2011 e a declaração modo 22 de IRC de 2011 embora, tendo por base os elementos recolhidos junto da B............, assim como os valores declarados por esta nas respetivas declarações periódicas entregues, a D............ continua a emitir faturação, que ascende até ao final do 3.º Trimestre de 2011, ao valor global de 7.383.422,60 € de base tributável e a 1.646.780,32 € de IVA liquidado;
26. Em face do explanado, conclui-se que a conduta adotada pelas três empresas teve por objetivo a fraude e evasão fiscal, sendo que no caso da B............ esta utiliza como custo faturas que não correspondem a transações efetivas e consequentemente são falsas, permitindo assim reduzir o IRC e o IVA a pagar;
27. Com a conduta descrita, a originária executada incorre em presumível prática de crime de fraude qualificada, cujo processo corre termos na Direção de Finanças de Setúbal;
28. No que tange, mais detalhadamente, à envolvência e conduta do Técnico Oficial de Contas A............, [há] que tomar em consideração o seguinte:
29. Foi contratado como Técnico Oficial de Contas da B............ Unipessoal, Lda com efeitos a partir de Janeiro de 2011, ficando responsável pela contabilidade para o exercício do ano de 2011.
30. Foram, durante o ano de 2011, registadas faturas em conta de custos na contabilidade da executada B............ Unipessoal Lda. que não correspondiam a transmissões efetivas.
31. A partir de outubro de 2010 e até setembro de 2011 ocorrem diversas situações, aqui descritas, as quais conduzem à “transformação” da executada que, de contribuinte líquido de imposto (IVA), se “transforma” num contribuinte em situação de créditos de imposto ou com entregas de valor pouco significativo.
32. Em consequência da dedução de imposto incluído nas faturas emitidas pela D............, verifica-se que a partir de outubro de 2010 a executada alterou de forma drástica o montante de imposto (IVA) apurado, que passa de montantes bastante significativos (280.296,18€ de total de imposto pago nos primeiros três trimestres de 2010), para valores negativos, ou de imposto a pagar de valor pouco significativo (apenas 2.155,53 € do 4.º trimestre de 2010 ao 3.º de 2011);
33. Estas alterações são resultantes da contabilização como custo de faturação efetuada pela D............, verificando-se que essas faturas correspondem invariavelmente aos documentos lançados em último lugar, em cada mês, pelo que seriam emitidas e contabilizadas apenas no momento de apuramento do IVA para preenchimento da correspondente declaração periódica e de acordo com as "necessidades";
34. Ficou, na verdade, provado, através da análise dos ficheiros informáticos de contabilidade e faturação da B............, SAF- T, que as facturas emitidas pela empresa D............, Lda., apenas são emitidas e, consequentemente, registadas, após se proceder ao apuramento do imposto que haveria a pagar pela B............, caso essa faturação não existisse;
35. Procedendo-se, ainda, à análise do referido ficheiro, mais concretamente ao registo na contabilidade da B............ das diversas facturas emitidas pela D............, Lda., constatou-se que no campo "data gravação" consta uma data igual à data do documento;
36. Consultaram-se diversos movimentos, relativos aos registos em diversas contas, verificando-se sempre o mesmo facto - "data gravação" igual à "data";
37. Ao campo "data" deverá corresponder a data de emissão do documento e ao campo "data gravação" a data em que o respetivo registo é efetuado no programa de contabilidade, pelo que as duas datas não podem, de todo, ser coincidentes, mesmo porque, como exemplo, no extrato de conta enviado aos serviços de inspeção tributária e a seu pedido em 18.10.2011, o documento com o número de arquivo 409015-compras, ainda não se encontrava registado. No entanto, surge com data de gravação de 01.09.2011, pelo que se conclui que o referido ficheiro terá sido adulterado, por forma a não evidenciar a data em que os documentos foram efetivamente registados na contabilidade.
38. Analisados os elementos de escrita da B............, foi verificado que durante os finais de Outubro de 2010 e pelo menos até Setembro de 2011, foram registadas em custos e na conta 52-Subcontratos, bem como na conta 2432-IVA dedutível, diversas faturas emitidas pela D............ Unipessoal, Lda., com indicação de prestação de serviços de valores significativos. Porque estes custos têm um peso relevante na determinação do resultado da atividade e no IVA a entregar nos cofres do Estado, foi aprofundado o circuito das faturas em causa e necessidade dos custos referidos nas mesmas para obtenção dos proveitos;
39. Constatou-se, também, através das reconciliações bancárias, que se verificaram saídas da conta do Banco ……… da executada para as quais não foi apresentado qualquer documento comprovativo,
40. Os únicos pagamentos efetuados pela B............ à D............ (não registados na contabilidade da executada, mas identificada a saída dos cheques na conta bancária através do respetivo extrato de conta) totalizaram apenas 225.000 €, valor que fica muito aquém dos serviços que foram faturados (9.030.202,92€ até 30.09.2011) ou seja, o circuito económico (faturação) não é acompanhado pelo correspondente circuito financeiro (pagamento), apesar de a contabilidade da executada não revelar a existência de quaisquer problemas de tesouraria, muito pelo contrário, as contas de disponibilidades (caixa e bancos) apresentam, invariavelmente, saldos superiores a 3.000.000 € concluindo-se, assim, que as faturas não correspondem a operações reais, mas sim a operações simuladas, sendo a faturação emitida por ambas as empresas falsas;
41. As declarações fiscais relativas ao ano 2011, designadamente as declarações periódicas de IVA dos primeiro, segundo e terceiro trimestres do ano de 2011, foram elaboradas e assinadas, através da utilização da sua senha de acesso, pessoal e intransmissível, ao Portal das Finanças na Internet, pelo Técnico Oficial de Contas A............;
42. Não foram apresentadas as declarações modelo 22 de IRC e a Informação Empresarial Simplificada relativas ao ano de 2011.
43. A quantia exequenda a que se reportam os autos de execução fiscal em epígrafe, relativa ao período de janeiro a setembro do ano de 2011 e resultante da referida ação de inspeção, importa no montante de 1.123.929,02 €, não tendo sido objeto de reclamação ou impugnação. (cfr. fls. 125 a 133 do PEF);
S) Em 24/08/2012, o Oponente remeteu ao Chefe do Serviço de Finanças de Sines uma carta, nos termos da qual, na qualidade de TOC da B............, informava que não ia ser dado cumprimento à obrigação declarativa prevista no artigo 121.º do Código do IRC (Informação Empresarial Simplificada) e n.º 7 do artigo 119 do CIRC (Modelo 30) referente ao exercício de 2011, porque a referida sociedade não forneceu atempadamente toda a documentação de suporte e demais informações necessárias ao cumprimento daquela obrigação fiscal e, ainda, que se tinha desvinculado das funções de TOC da referida sociedade com efeitos a 01/02/2012 (cfr. fls. 274 a 277 do PEF);
T) O Oponente exerceu o seu direito de audição prévia por requerimento entrado no Serviço de Finanças de Sines em 03/09/2012 (cfr. fls. 136 a 150 a 414 do PEF);
U) Em 08/10/2012, o Chefe de Finanças exarou despacho com o seguinte teor:
«Notificado para exercer o direito de audição acerca do projeto de reversão de 20.08.2012, vem A............ exercer, atempadamente, tal direito alegando, em suma:
(…)
Vistas as alegações, cumpre decidir, o que se faz em correlação a cada uma das alíneas em alegação:
a) A responsabilidade assacada tem a sua previsão legal no art.º 24.º, n.º 3 da Lei Geral Tributária (LGT), o qual se reporta a dívidas tributárias, como é o caso do IVA, resultando a legitimidade dos responsáveis subsidiários de ter sido contra eles ordenada a reversão da execução fiscal, de harmonia com o disposto no art.º 9.º, n.º 3, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). O citado RGIT (Regime Geral das Infrações Tributárias) reporta-se a multas ou coimas, o que não é o caso em crise;
b) O papel do TOC perante a Autoridade Tributária e Aduaneira é muito mais do que um mero interlocutor, como pretende o Peticionário, uma vez que, além dos deveres deontológicos, também lhe são imputados os deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos, como dispõe o referido art.º 24.º, n.º 3 da LGT. A disponibilidade a que se refere para com os documentos e averiguações, porque posterior à ocorrência dos factos pelos quais está a ser averiguado, não releva para o procedimento de reversão aqui em causa.
c) O facto de todos os atos por si praticados o terem sido ao serviço da sociedade “G............ Assessores Tributários e Financeiros, Lda, ao abrigo do contrato de prestação de serviços celebrado, nos termos do art.º 51.º, n.º 5 do EOTOC, entre a G............ ATF e a B............ Unipessoal Lda, não o iliba da sua responsabilidade individual, como dispõe o Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas (ECTOC), aprovado pelo D.L. n.º 452/99, de 5 de novembro. Quanto aos princípio e presunção invocados, os mesmos não afastam nem prejudicam os deveres estatutários e deontológicos previstos no referido ECTOC e respetivo Código Deontológico dos Técnicos Oficiais de Contas;
d) Acerca da invocada presunção, remete-se para o apreciado na alínea anterior. Curiosa, no entanto, a menção acerca da “indispensável” dedutibilidade em sede de IVA…;
e) É evidente que cabe aos sujeitos passivos do IVA e IRC o apuramento e determinação dos valores relativos ao exercício da sua atividade e emissão das respetivas faturas. Porém, caberia ao TOC responsável pela escrita da, neste caso, das sociedades, o especial cuidado de verificar a conformidade entre a informação que lhe era fornecida para efeitos de contabilidade pelas sociedades e a realidade patrimonial das mesmas, como previsto nos art.ºs 6.º, n.º 3 e 51.º, n.º 7, ambos do ECTOC, estando-lhe vedado aceitar “cegamente” todos os documentos relevantes para efeitos de apuramento de proveitos e custos que as sociedades lhe faziam chegar, como determinado nos art.ºs 2.º e 3.º, n.º 1, alínea c), ambos do Código Deontológico dos Técnicos Oficiais de Contas.
f) Conforme apurado no Ponto II-3.10.1 FICHEIROS SAF-T, a páginas 8 do relatório de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal – Ordem de Serviço n.º OI201101125, o qual não foi objeto de qualquer contestação, “relativamente ao ficheiro SAF-T da contabilidade do ano de 2011, a informação aí constante apenas incluía os saldos de abertura das contas (em 01.01.2011), não evidenciando o registo de qualquer documento…” e “Apenas em 18.11.2011, procedeu finalmente ao envio do referido ficheiro contendo todos os registos efetuados até essa data”, rematando que “… as evidências conduzem à conclusão de que as faturas emitidas pela empresa fornecedora D............, Lda apenas são emitidas, e consequentemente registadas, após se proceder ao apuramento do imposto que haveria a pagar, caso essa faturação não existisse. Através da data de registo dos documentos na contabilidade seria possível comprovar, sem sombra de dúvida, que tal seria o procedimento adotado. Procedendo à análise do referido ficheiro, mais concretamente ao registo das diversas faturas emitidas pela referida empresa, constatou-se que no campo data gravação consta uma data igual à do documento”.
g) Quanto à responsabilidade pela execução e planeamento dos pagamentos da B............, remete-se para o apreciado na alínea e) anterior.
h) O alegado não prejudica os fundamentos do Projeto de Reversão.
i) Como expresso no ponto 2 do projeto de reversão (anexo), o relatório da Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Setúbal – Ordem de Serviço n.º OI201101125, não foi, apesar do seu conhecimento pelo TOC (Doc. 23 1/3), objeto de qualquer contestação tendo, assim, eficácia definitiva e executória.
j) O alegado não prejudica os fundamentos do Projeto de Reversão.
k) O alegado não prejudica os fundamentos do Projeto de Reversão.
l) Os documentos juntos à petição e tidos em conta na sua apreciação em nada contrariam os fundamentos do Projeto de Reversão.
Pelo exposto, prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra A............, contribuinte n.º ………, na qualidade de responsável subsidiário de B............ Unipessoal, Lda., contribuinte n.º ……….
(…)» (cfr. fls. 415 a 420 do PEF);
V) Por ofício «CITAÇÃO (REVERSÃO)», datado de 09/10/2012, foi comunicada ao Oponente, por carta registada com aviso de receção, a reversão contra si da dívida em cobrança coerciva no processo de execução fiscal identificado na alínea K) supra (cfr. fls. 425 do PEF);
W) A petição inicial da presente oposição foi remetida, por correio eletrónico, em 09/11/2012 no Serviço de Finanças de Sines (cfr. fls. 1 a 86 dos autos);
X) Em 28/12/2012, F………… dirigiu ao Oponente uma carta da qual se extrai o seguinte:
«Após análise do ficheiro Saft-T “……… B............ UNIPESSOAL LDA.», verifica-se que o mesmo foi gerado em 18-11-2011 pela Aplicação “SAGE LINHA 50/Sage Portugal S.A.” Versão 2011.03.05.
Nesta aplicação e nesta versão, a mesma aplicação de contabilidade teria que guardar a informação das datas de introdução e alteração dos movimentos de acordo com a data e hora de sistema da máquina que executa essa operação. Trata-se de uma função interna da aplicação sem qualquer influência do utilizador de dados. Neste caso a aplicação não efectuou qualquer registo adicional para além dos movimentos contabilísticos. // (…) //
Para estes casos, a própria portaria, prevê que não existindo essa informação (…) o sistema deve assumir a data do documento.
A aplicação o que faz é isso, se essa informação não existir, coloca a data do documento como se verifica no ficheiro Saft-T em causa» (cfr. fls. 408 do PEF);
Y) A aplicação Linha Contabilidade da SAGE que criava o ficheiro SAF-T PT não permitia introduzir a data de registo do documento, assumindo, automaticamente, que essa data correspondia à data do documento (depoimento das testemunhas E………… e F…………)»
*
Em sede de fundamentação da matéria de facto, consignou-se:
«A decisão da matéria de facto provada fundou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, nas informações oficiais e documentos constantes dos autos e do processo de execução fiscal, não impugnados, conforme remissão feita a propósito de cada alínea do probatório. // Mais se atentou na prova testemunhal produzida nos presentes autos:
- E…………, responsável pelo suporte a clientes na SAGE, afirmou conhecer o Oponente por contactos telefónicos e por email no âmbito do suporte à aplicação que aquele adquiriu e que gera o ficheiro SAF-T e enquanto cliente da SAGE.

Resultou do depoimento desta testemunha que o Oponente contactou o departamento que chefia, para colocar uma questão relativamente à aplicação SAF-T relativamente ao exercício de 2011 e se prendia com o facto de esta aplicação assumir como data de registo a data do documento, ou seja, do movimento contabilístico. Esta questão respeitava a um problema da própria aplicação que foi corrigido após os contactos encetados pelo Oponente, tendo sido considerado ultrapassado pela SAGE em 09/10/2012. Era uma anomalia da aplicação que não permitia preencher a data do lançamento e que, na ausência desse preenchimento, assumia a data da fatura. Não sabe se houve ou não adulteração do campo, mas a aplicação até Setembro de 2012 não estava a preencher esse campo e assumia a data do documento. A aplicação tinha esta anomalia para todos os clientes SAGE. Nos termos da portaria que regia esta questão, sendo um campo obrigatório, no momento da geração se o programa não conseguisse ler o campo ia buscar a data do documento. A testemunha esclareceu que o campo de data de registo não é de preenchimento facultativo, mas não é editável pelo utilizador, tratava-se de um campo automático interno pela aplicação. Não tiveram queixas de outros clientes, mas a aplicação até à data em que foi corrigida esteve a funcionar para todos desta forma. A data que a aplicação ia buscar era a do próprio documento, campo “data do movimento contabilístico”, que era reproduzido para o campo data de gravação do movimento, que não existia para o utilizador. A data do movimento contabilístico é introduzida pelo utilizador, que diz qual é a data da fatura.
- F…………, técnico de informática, desempenha as funções de distribuidor e técnico sénior da SAGE, especializado em software SAGE. Conhece o Oponente há cerca de 10 anos e por motivos profissionais.

Do depoimento desta testemunha extrai-se o seguinte: em 2011 o Oponente reportou-lhe uma situação relativa a datas de movimento e datas do documento SAF-T. Em termos de contabilidade, a aplicação teria que fazer um movimento interno para gerar o registo, mas naquela versão da aplicação não o fazia. Em face do contacto do Oponente, foi-se verificar o histórico e foi reportado à SAGE. A SAGE respondeu que a aplicação não estava a fazer o registo e que se teria que aplicar o que estava previsto na Portaria, que a data de movimento é igual à data do documento, que era o que sucedia. A data de registo não é editável pelo utilizador. A testemunha comunicou por escrito esta informação ao Oponente. A SAGE ultrapassou esta questão noutras versões desta aplicação, já em 2012. Provavelmente este problema aconteceu em mais clientes durante o mesmo período, porque não dependia do cliente. No caso em concreto, não tem como adulterar o campo de registo, porque não está acessível ao utilizador. A testemunha fez testes com outras bases de dados e o histórico não estava lá e nessas situações reportam à SAGE para analisarem e corrigirem. A Portaria do SAF-T previa que independentemente da data comercial do documento, deve a aplicação guardar a informação de que em dada data alguém gravou aquela informação, ou seja, a data de registo. O programa não estava a registar essa informação, a data de registo do documento. Acontecia também outra situação, com a implementação dos códigos ISO, por vezes essa informação não saía completa no SAF-T, tinha-se que repor as tabelas.
As testemunhas arroladas pelo Oponente depuseram de modo claro, escorreito e objetivo, demonstrando conhecimento direto e imediato da matéria de facto à qual foram inquiridos e, como tal, foram merecedores de credibilidade por este Tribunal.»
*
Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
Z) O imposto em causa tem como data limite de pagamento a de 31.03.2012 – fls. 103, do pef.
AA) A liquidação relativa à quantia exequenda não foi objecto de reclamação ou impugnação – fls. 133 do pef.
BB) O despacho para audição de reversão de 20.08.2012, referido em P), contém a referência face às diligências de fls. 42
CC) As diligências referidas na alínea anterior constam de fls. 42 a 63 do pef. e confirmam a asserção de que os valores susceptíveis de penhora em nome da executada correspondem a contas bancárias com saldos de montantes reduzidos.
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2.2.- Motivação de Direito

No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pelo recorrente, em conformidade com os limites fixados na apreciação liminar da presente revista acima mencionados, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se se julgam verificados os pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária dos Técnicos Oficiais de Contas prevista no n.º 3 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária (LGT).
Com efeito, trata-se de um recurso de revista excepcional de mérito, cuja questão é a responsabilidade tributária subsidiária dos Técnicos Oficiais de Contas, prevista no artigo 24º, nº 3 da LGT, o que, em acatamento do delimitado pelo acórdão que a admitiu, passa pela densificação dos pressupostos da responsabilidade tributária aí prevista e relacionando-os quer com os deveres funcionais tidos como violados, quer com o incumprimento dos deveres tributários do devedor originário, tanto na fase da reversão, como no controlo jurisdicional desta.
Aquilatando.
Como vimos, o recurso de revista para o S.T.A., foi admitido quanto aos pressupostos da responsabilidade subsidiária dos Técnicos Oficiais de Contas (T.O.C.) prevista no n.º 3 do art. 24.º da L.G.T..
Não obstante, no seu douto Parecer, o EPGA sustenta que o conhecimento do recurso deve começar pelo invocado vício de falta de fundamentação que, para além de imputado ao acórdão recorrido, o foi ao despacho de reversão no que se refere à inexistência/insuficiência do património da devedora originária e excussão prévia, sendo do entender de que, reportando-se a falta de fundamentação à validade formal (e não substancial) do acto de reversão e visto que a alegação do recorrente respeita especificamente à menção da inexistência de bens, enquanto requisito do chamamento à execução dos responsáveis subsidiários, o apontado despacho de reversão enferma do ali invocado vício de falta de fundamentação, e que, consequentemente, também a sentença enferma, nesta parte, do alegado erro de julgamento de direito.
O certo é que, a nosso ver e como parece resultar do já acima exposto quanto à delimitação do seu objecto, o vício formal da falta de fundamentação, não está abrangido pela presente revista.
Na verdade e reiterando, a revista foi admitida delimitando o seu objecto do seguinte modo: trata-se de matéria de inegável relevo social fundamental, sobre a qual este STA nunca se pronunciou, e que, como órgão de cúpula da jurisdição, importa que pronuncie, densificando os pressupostos da responsabilidade tributária aí prevista e relacionando-os quer com os deveres funcionais tidos como violados, quer com o incumprimento dos deveres tributários do devedor originário, tanto na fase da reversão, como no controlo jurisdicional desta.
Ora, dúvidas não sobram de que se, porventura, se concordasse com o Ministério Público e se concluísse que a fundamentação utilizada pelo autor do despacho de reversão aqui em causa, era manifestamente insuficiente à decisão ali tomada o que, para todos os efeitos equivaleria à sua falta, procedendo, assim, esse fundamento do presente recurso em análise, e prejudicando o conhecimento das demais questões suscitadas, incluindo as referentes aos pressupostos da reversão previstos no art. 24.º n.º 3 da L.G.T. por violação de deveres tributários dos T.O.C.´s., o que também acarretaria a anulação do despacho de reversão por ter sido preterido o pressuposto de inexistência de bens/insuficiência do património da devedora originária, isso, manifestamente, seria desvirtuar a revista ao não se conhecer da temática da densificação dos pressupostos da responsabilidade tributária que é o seu âmago, tal como o definiu o acórdão da formação do n.º 6 do art. 150.º do CPTA.
Daí que não se tome conhecimento desse fundamento recursório também suscitado pelo Ministério Público no seu douto Parecer e se passe a aferir da verificação em concreto dos pressupostos específicos da responsabilidade do oponente como contabilista revertido.

*
Assim, o objecto do recurso centra-se na verificação dos pressupostos de que depende a reversão contra os técnicos oficiais de contas, prevista no n.º 3 do art.º 24.º da Lei Geral Tributária, por dívidas fiscais da sociedade devedora originária, no caso, reportada ao exercício de 2011.
O n.º1 do artigo 24.º da LGT estatui o seguinte regime de responsabilidade subsidiária dos membros de copos sociais e responsáveis técnicos por dívidas tributárias:
«Os administradores, diretores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração nas sociedades, cooperativas e empresas públicas são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da sociedade se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento».
Antes da entrada em vigor da Lei 60-A/2005, de 30/12, a responsabilidade subsidiária dos Técnicos Oficiais de Contas (TOC) já estava prevista no artº.24, nº.3, da L.G.T., mas era de concretização difícil porquanto se exigia a prova da violação dolosa dos deveres de assunção de responsabilidade e assinatura.
Efectivamente, nos termos do artº.24, nº.3, da L.G.T., na redacção resultante da Lei 60-A/2005, de 30/12 (cfr.artº.57), “a responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos técnicos oficiais de contas desde que se demonstre a violação dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos.”
A Lei 60-A/2005, de 30/12, veio regular a responsabilidade tributária subsidiária dos TOC em termos que possibilitam que a mesma se funde em conduta meramente negligente (negligência consciente ou inconsciente), devendo ser aferida com a aplicação do critério do profissional médio (o que releva é verificar se um técnico oficial de contas normalmente diligente actuaria de modo similar). Alteração ao regime do artº.24, nº.3, da L.G.T., que, sublinhe-se, é apenas aplicável aos pressupostos da responsabilidade subsidiária que se verifiquem após o dia 1/1/2006 (cfr.artº.12, nº.1, da L.G.T.; Paulo Marques, Responsabilidade tributária dos gestores e dos técnicos oficiais de contas, Coimbra Editora, 2011, pág.44 e seg.).
No que toca aos deveres profissionais dos Técnicos Oficiais de Contas / Contabilista Certificado, do Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 452/99, de 5 de Novembro (alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 310/2009, de 26 de Outubro), vigente à data dos factos (2011), resulta do artigo 6.º, nº1, desse estatuto sob a epígrafe “Funções” que constituem funções dos técnicos oficiais de contas as seguintes:
“a) Planificar, organizar e coordenar a execução da contabilidade das entidades que possuam, ou que devam possuir, contabilidade regularmente organizada segundo os planos de contas oficialmente aplicáveis ou o sistema de normalização contabilística, conforme o caso, respeitando as normas legais, os princípios contabilísticos vigentes e as orientações das entidades com competências em matéria de normalização contabilística;
b) Assumir a responsabilidade pela regularidade técnica, nas áreas contabilística e fiscal, das entidades referidas na alínea anterior;
c) Assinar, conjuntamente com o representante legal das entidades referidas na alínea a), as respectivas demonstrações financeiras e declarações fiscais, fazendo prova da sua qualidade, nos termos e condições definidos pela Ordem, sem prejuízo da competência e das responsabilidades cometidas pela lei comercial e fiscal aos respectivos órgãos;
(…)”.
Por seu turno, o artigo 52.º, dispondo sobre os “Deveres gerais”, determina no seu n.º3, que os técnicos oficiais de contas «apenas podem subscrever as declarações fiscais, as demonstrações financeiras e os seus anexos que resultem do exercício directo das suas funções, devendo fazer prova da sua qualidade, nos termos e condições definidos pela Ordem (…)».
Já o artigo 55.º, acerca dos “Deveres para com a administração fiscal”, prevê que, «Nas suas relações com a administração fiscal, constituem deveres dos técnicos oficiais de contas:
“a) Assegurar que as declarações fiscais que assinam estão de acordo com a lei e as normas técnicas em vigor;
b) Acompanhar, quando para tal forem solicitados, o exame aos registos e documentação das entidades a que prestem serviços, bem como os documentos e declarações fiscais com elas relacionados;
c) Abster-se da prática de quaisquer actos que, directa ou indirectamente, conduzam a ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação dos documentos e das declarações fiscais a seu cargo;
d) Assegurar, nos casos em que a lei o preveja, o envio por via electrónica das declarações fiscais dos seus clientes ou entidades patronais».
Do Código Deontológico dos Técnicos Oficiais de Contas, publicado em anexo ao Decreto-Lei n.º 310/2009, de 26 de Outubro, resulta, com interesse para o caso, o seguinte:
Artigo 6.º - “Competência profissional”:
«Para garantir a sua competência profissional e o exercício adequado das suas funções, os técnicos oficiais de contas devem, nomeadamente:
a) Por forma continuada e actualizada desenvolver e incrementar os seus conhecimentos e qualificações técnicas e as dos seus colaboradores;
b) Planear e supervisionar a execução de qualquer serviço por que sejam responsáveis, bem como avaliar a qualidade do trabalho realizado;
c) Utilizar os meios técnicos adequados ao desempenho cabal das suas funções;
d) Recorrer ou sugerir o recurso a assessoria técnica adequada, sempre que tal se revele necessário».
O artigo 7.º, epigrafado “Princípios e normas contabilísticas”, determina, no seu n.º1, que «os técnicos oficiais de contas, no respeito pela lei, devem aplicar os princípios e as normas contabilísticas de modo a obter a verdade da situação financeira e patrimonial das entidades a quem prestam serviços».
Explicitando o seu n.º 2, que «No âmbito das demonstrações financeiras, podem ser adoptados procedimentos que não estejam expressamente previstos na legislação portuguesa, desde que apoiados em normas ou directrizes contabilísticas estabelecidas por entidade competente e reconhecida na matéria».
Esclarece-nos Albano Santos, Responsabilidade Subsidiária do Contabilista Certificado, Formação Segmentada, Ordem dos Contabilistas Certificados, Novembro 2015, p. 13, no tangente ao dever dos técnicos oficiais de contas de garante da regularidade técnica nas áreas contabilísticas e fiscais, que, «quando o contabilista certificado submete uma declaração fiscal, com a sua senha, que traduz a sua assinatura, assume, perante a AT, que os elementos constantes daquela declaração traduzem a verdade da situação contabilística e fiscal daquele sujeito passivo, assente nas informações e documentos por este fornecidos, aos quais foram dados os adequados tratamento técnico e enquadramento legais.
(…).
Tendo em conta a situação de garante fiscal em que o contabilista certificado se encontra legalmente colocado (…), em consequência da natureza pública das suas funções, e considerando que a situação contabilística e fiscal do cliente/empregador transmitida à AT assenta, necessariamente, nas informações, elementos e documentos por este fornecidos, o contabilista certificado terá de ser exigente com o cliente, solicitando-lhe todos os esclarecimentos e informações que julgue relevantes para aferir a verdade contabilística e fiscal (…)».
Ainda segundo o mesmo doutrinador, desta feita na citada Obra p. 66, “Do disposto no artigo 24.º/3, da LGT, resulta que «a AT terá de demonstrar quais os deveres profissionais que o contabilista certificado incumpriu, concretizando-os, nomeadamente, o incumprimento declarativo (…), a contabilização de documentos que não respeitem a forma legal ou a contabilização de valores não suportados documentalmente confiando na sua futura entrega, que não veio a ocorrer, a execução da contabilidade sem observância dos princípios e regras contabilísticas fundamentais”.
Já sobre a apreciação da culpa pelo incumprimento dos deveres estatutários do técnico oficial de contas, no ensinamento de Paulo Marques, Responsabilidade tributária dos gestores e dos técnicos oficiais de contas, Coimbra Editora, 2011, pp. 45/46, é de «utilizar como critério a diligência profissional imposta pelo Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, bem como o Código Deontológico, com vista a concretizar o conceito (…) de «regularidade técnica». Em suma, o que releva é verificar se um técnico oficial de contas normalmente diligente actuaria de modo similar. (…) [A] «regularidade técnica» corresponde à execução da contabilidade, nos termos das disposições previstas nos normativos aplicáveis, tendo por suporte os documentos e as informações pelo órgão de gestão ou pelo empresário, e as decisões do profissional no âmbito contabilístico, com vista à obtenção de uma imagem fiel e verdadeira da realidade patrimonial da empresa, bem como o envio para as entidades públicas competentes, pelos meios legalmente definidos, da informação contabilística e fiscal definida na legislação em vigor».
Sendo que, conforme vincado pelo mesmo autor a pág. 46/47, «a responsabilidade tributária do técnico oficial de contas pressupõe a verificação da inexistência ou pelo menos insuficiência de bens do devedor originário e, por outro lado, a violação culposa dos deveres de regularização técnica no âmbito contabilístico e fiscal. Dito de outra forma, a lei pressupõe a responsabilidade subjectiva desde que fiquem provados dois requisitos: a determinação no incumprimento das dívidas tributárias, bem como a insuficiência patrimonial». É de exigir a comprovação da ocorrência de condutas violadoras dos deveres funcionais que sejam imputáveis ao TOC, a título de negligência ou dolo. É de exigir, igualmente, «a verificação de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do técnico oficial de contas e o incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o técnico oficial de conta exerce as suas funções profissionais, sendo este então um instrumento necessário ao incumprimento fiscal».
Sucede que, após a inscrição do processo em tabela para julgamento, foi o mesmo retirado, e, na sequência, veio o recorrente apresentar a peça processual constante da p. 3086 (SITAF) que catalogou como “Alegações Complementares” em que, no essencial, vem sugerir a ponderação da nova redacção conferida ao n.º 3 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária pela Lei nº 7/2021, de 26.02, considerando a sua relevância para o julgamento pelo STA do recurso de revista excepcional, que, segundo refere, “julgará os pressupostos da responsabilidade dos Técnicos Oficiais de Conta/Contabilistas Certificados prevista no n.º 3 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária”, sustentando que esta norma se deve aplicar retroactivamente às situações ocorridas antes da sua entrada em vigor, em primeiro lugar, porque se trata de lei interpretativa e que veio interpretar restritivamente a asserção “violação” que não especificava a modalidade da culpa e, em segundo lugar, que, tendo a responsabilidade subsidiária uma natureza sancionatória, deve ser aplicado retroactivamente o regime globalmente mais favorável ao infractor, segundo o previsto no artigo 29.º, n.º 4, da CRP.
Foi exercido o contraditório, tendo o Ministério Público tomado posição no sentido de que não colhem os contributos aduzidos pelo recorrente.
Que dizer?
Desde logo, coloca-se a questão de a apresentação da referida peça ser considerada como estranha ao normal prosseguimento da lide por impertinência, um incidente anómalo a exigir o seu desentranhamento com a devida sanção tributária.
Na verdade, na tramitação legalmente definida não estão previstas “Alegações Complementares” num momento em que o processo já estava em fase de elaboração de acórdão, tendo até já sido inscrito para julgamento e daí a sua inadmissibilidade do ponto de vista processual.
Atenta a tramitação dos autos, mais não se pode concluir senão que, no momento em que foi requerida a junção das “Alegações Complementares”, já se encontrava em curso o prazo para a elaboração do projecto de acórdão, nos termos conjugados do artigo 146.º, n.º 3, do CPTA e artigo 657.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA).
Por esse prisma, não deve admitir-se a junção das apodadas “Alegações Complementares”, por não serem legalmente admissíveis, devendo ser desentranhadas e remetidas à procedência com a inerente tributação do acto irregular, o que se determinará no dispositivo.

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Todavia, há que evocar, de novo, as razões aduzidas no acórdão de 03-04-2019 da 2ª Seção que admitiu o presente Recurso de Revista Excepcional, e que determinou que julgará os pressupostos da responsabilidade dos Técnicos Oficiais de Conta/Contabilistas Certificados prevista no n.º 3 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária: Dada a novidade da questão e o seu inegável relevo social fundamental, justifica-se a admissão de revista de acórdão do TCA que julgou verificados os pressupostos da responsabilidade dos Técnicos Oficiais de Contas prevista no n.º 3 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária, de forma a permitir que este STA, órgão de cúpula da jurisdição administrativa e fiscal, emita juízo sobre a melhor interpretação da referida norma e o modo de efectivação de tal responsabilidade”.
Daí que se nos afigure que este tribunal possa (deva) aquilatar da aplicabilidade, ou não, da versão introduzida por aquele inciso legal ao regime da responsabilidade dos Técnicos Oficiais de Contas, pois a aplicação do direito cabe ao tribunal, e se no momento em que o vai aplicar verifica que a lei foi alterada, pode/deve, interpretar a lei tendo em conta essa alteração – se é, ou não, relevante segundo as várias soluções plausíveis de direito.
Na verdade, importa atentar no disposto no artº 5º nº3º do CPC, que, sob a epígrafe ónus de alegação das partes e poderes de cognição do tribunal estatui que «O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito».
A interpretação deste preceito é doutrinal e jurisprudencialmente pacífica, no sentido de que em matéria de direito o tribunal pode e deve substituir-se à parte (artºs 664º, 713º nº2 e 726º), dando por violadas normas que na realidade tenham sido, explícita ou implicitamente invocadas, ou nem tal sequer, desde que efectivamente cogentes para resolução das questões submetidas à sua apreciação, não se encontrando, assim, adstrito à qualificação dos factos efectuada pelas partes desde que se mantenha dentro da causa de pedir por elas invocada, sendo ainda exigível que os termos da decisão, rectius os seus fundamentos, estejam ínsitos ou relacionados com o pedido formulado e se situem dentro do geral e abstractamente permitido pela lei e que de antemão possa e deva ser conhecido ou perspectivado como sendo possível.
Acresce ainda que o princípio do contraditório reporta-se a factos alegados pelas partes e às posições por elas assumidas, e não à interpretação jurídica a efectuar, tendo em atenção a regra iura novit curia reflectida no citado art.5º, nº3, do CPC. A verdade é que não está vedado ao Tribunal, antes lhe sendo legalmente imposto, o seu conhecimento oficioso. Mal seria que os Tribunais não pudessem oficiosamente interpretar e valorar os factos provados para procederem à aplicação do direito ao caso concreto. É mesmo essa a sua nobre função de soberania, a jurisdição [do latim jus(ris) dicere, dizer o Direito a aplicar aos factos apurados e fixados no caso judicando].
Enfim, no que respeita ao julgamento da matéria de direito, o tribunal não fica vinculado pela alegação, nem pelo eventual acordo das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, como resulta inequivocamente do citado n.º 3 do art. 5.º do CPC (que consagra a expressão do princípio jura novit curia, traduzido no brocardo latino da mihi factum, dabo tibi jus.).
Apreciemos, então, tal questão, em ordem a firmar a mais correcta hermenêutica do n.º 3 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária, contribuindo para elucidar e melhor o modo de efectivação de tal responsabilidade no momento em que é proferida esta decisão.
Assim, o legislador de 2021 veio alterar a redacção do n.º 3 do artigo 24º da LGT, repristinando a referência ao dolo como modalidade exigível da culpa do contabilista certificado, como resulta da redacção dada pela Lei nº 7/2021 de 26-02-2021, ao prescrever:
“3 - A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos contabilistas certificados desde que se demonstre a violação dolosa dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos.”
Face a essa nova normação, a primeira questão que se levanta é a de saber se se pode considerar que esta lei tem natureza interpretativa e que veio interpretar restritivamente a asserção “violação” que não especificava a modalidade da culpa.
Existem contributos doutrinários apologéticos dessa tese apontando para que o dolo, embora não conste da letra da lei na redacção anterior a 2021, se encontra subjacente ao espírito da norma e lógica do sistema (Vide Ana Isabel Valente in “A responsabilidade tributária dos Técnicos Oficiais de Contas, publicado na Revista Fiscalia, XXXIII”).
Nesse viés impor-se-ia aferir se lei é interpretativa e retroactiva e, por isso, fica cometido ao intérprete da nova redacção do normativo em causa considerá-la ou não interpretativa, o que seria determinante para a finalidade da presente revista na qual se “julgará os pressupostos da responsabilidade dos Técnicos Oficiais de Conta/Contabilistas Certificados prevista no n.º 3 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária”.
Mas será que, compulsando os pertinentes elementos da hermenêutica jurídica, é viável sustentar o entendimento de que a norma em apreço se deve aplicar retroactivamente às situações ocorridas antes da sua entrada em vigor (como é o caso da do recorrente), por aquela lei revestir natureza interpretativa e que veio interpretar restritivamente a asserção “violação” que não especificava a modalidade da culpa?
Doutrinalmente, a “lei interpretativa” é aquela que intervém para decidir uma questão de direito cuja solução é controvertida ou incerta, consagrando um entendimento a que a jurisprudência, pelos seus próprios meios, poderia ter chegado. (Cfr. P. Lima e A Varela, CC Anot., nota 1 ao artº 13º).
Ora, caso se tratasse de lei interpretativa, não sobrariam dúvidas de que, porque a lei interpretativa se considera integrada na lei interpretada, a mesma retroagiria os seus efeitos até à data da entrada em vigor da antiga lei, tudo ocorrendo como se tivesse sido publicada na data em que o foi a lei interpretada- (P. Lima e A. Varela, Ob. e nota Citadas). Ou seja, se o novo número do artigo 24º da LGT, tivesse natureza interpretativa, tal significava que poderia ser directamente aplicável a factos anteriores -uma vez que a lei interpretativa integra a lei interpretada, produzindo efeitos a partir do início de vigência desta última, com ressalva dos «efeitos já produzidos pelo cumprimento da obrigação, por sentença passada em julgado, por transacção, ainda que não homologada, ou por atos de natureza análoga».
A especificidade da lei “interpretativa” prende-se com a intenção e a força vinculante do próprio acto normativo: por contraposição à lei “inovadora”, aquela visa ou declara pretender fixar apenas o sentido correcto de um acto normativo anterior e não criar direito novo, tendo como exclusivo propósito esclarecer o sentido “correcto” do direito preexistente.
Nas palavras de Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1983, pp. 176 e 177) «O órgão competente que cria uma lei (p. ex. a Assembleia da República) tem também a competência para a interpretar, modificar, suspender ou revogar. (…) Está em causa, afinal, uma manifestação da mesma competência legislativa que é fonte em sentido orgânico do ato interpretando (cfr. idem, ibidem). E, por ser de valor igual a este último, a lei interpretativa determina-lhe o sentido para todos os efeitos, independentemente da correção hermenêutica de tal interpretação. Por isso, a interpretação da lei fixada pelo próprio legislador – a chamada “interpretação autêntica” – «vale com a força inerente à nova manifestação de vontade» do respectivo autor”.
E é por isso que a lei interpretativa se integra na lei interpretada (cfr. o artigo 13.º, n.º 1, do Código Civil) e se pode falar de uma retroactividade meramente formal inerente a toda a lei – tida por “verdadeiramente” ou “genuinamente” – interpretativa: há retroactividade, porque tal lei se aplica a factos e situações anteriores, e a mesma retroactividade é “formal”, visto que a lei, «vindo consagrar e fixar uma das interpretações possíveis da [lei anterior – cujo sentido e alcance não se podiam ter como certos –] com que os interessados podiam e deviam contar, não é susceptível de violar expectativas seguras e legitimamente fundadas» (cfr. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1983, p. 246). Com efeito, «a retroacção (das leis interpretativas) justifica-se, além do mais, por não envolver uma violação de quaisquer expectativas seguras e legítimas dos interessados. Estes podiam contar com a solução da (lei nova) interpretativa, visto ela corresponder a um dos vários sentidos atribuídos já pela doutrina e pela jurisprudência à [lei antiga]»: assim, é «de sua natureza interpretativa a lei que, sobre um ponto em que a regra de direito é incerta ou controvertida, vem consagrar uma solução que a jurisprudência, por si só, poderia ter adoptado» (cfr. BAPTISTA MACHADO, Sobre a Aplicação no Tempo do novo Código Civil, Almedina, Coimbra, 1968, pp. 286-287).
Diversamente, se a lei nova visa aplicar-se a factos e situações jurídicas anteriormente disciplinados por um direito certo, então este último é modificado, violando-se expectativas quanto à sua continuidade, e tal lei, na medida em que inove relativamente ao direito anterior – qualificando-se já não como lei interpretativa, mas sim como lei inovadora –, será substancial ou materialmente retroactiva (cfr. Baptista Machado, Ob. cit., p. 247).
Por esse prisma e por respeito à tutela da confiança dos destinatários do direito, importa salientar que a lei verdadeiramente interpretativa é apenas formalmente retroactiva, na medida em que se limita a declarar o direito preexistente; já a lei qualificada como interpretativa mas que afinal é inovadora tem de considerar-se como material ou substancialmente retroactiva, pois, ao modificar o direito preexistente, constitui direito novo.
O certo é que no tangente ao normativo em apreço, o legislador não declarou ou qualificou expressamente como “interpretativa” certa disposição de uma lei nova, quando essa disposição é claramente inovadora.
Na verdade, como se proclama no proémio, a Lei n.º 7/2021 de 26 de Fevereiro “Reforça as garantias dos contribuintes e a simplificação processual, alterando a Lei Geral Tributária, o Código de Procedimento e de Processo Tributário, o Regime Geral das Infrações Tributárias e outros atos legislativos.”
O artigo 1º, sob a epígrafe Objeto”, declara que “A presente lei procede à alteração: a) À Lei Geral Tributária, aprovada em anexo ao Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro (LGT);” passando a dispor no Artigo 24.º [...] 1 - [...] 2 - [...]” que “3 - A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos contabilistas certificados desde que se demonstre a violação dolosa dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos.”
Quanto à vigência das alterações a referida Lei estabelece no seu Artigo 17.º, nº1 que “A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, sem prejuízo do disposto nos números seguintes”, sendo que relativamente à norma em questão não define quaisquer especificidades de salvaguarda.
Portanto, in casu a lei modificou o direito preexistente, ou seja, estabeleceu direito novo mas o legislador não declarou que o fez sob a capa de “lei interpretativa”, porque criadora de efeitos jurídicos novos para os respectivos destinatários, pelo que não violará forçosamente uma proibição de leis retroactivas que não é consagrada no texto legal.
Assim, a lei não é genuinamente interpretativa, porque nem declara o direito que já vigora e com o qual os respectivos destinatários podem contar, do mesmo modo que toda e qualquer interpretação jurídica, incluindo a feita pelos tribunais, também não pode considerar-se como produtora de efeitos jurídicos novos que frustrem «expectativas seguras e legitimamente fundadas» uma vez que a lei é simplesmente inovadora.
Por outro lado, a admitir, que a ajuizada norma tem a natureza de garantia, se reporta às relações subjectivas materiais que são objecto de cognição do próprio processo e cuja regulação pode ser feita por normas substantivas integradas na LGT ou insertas em outros compêndios legais, há que fazer apelo à letra da lei e aos princípios gerais de aplicação temporal das normas de direito substantivo consagrados no artº 12º do Ccivil.
Preocupado com a tutela da confiança, segurança e estabilidade dos efeitos jurídicos já produzidos pelos factos, o legislador apenas os considera dignos de protecção à luz da lei sob a qual foram produzidos quando deliberadamente seja outra a vontade do legislador expressa na lei nova e conquanto ela não ofenda qualquer princípio constitucional (cfr. artºs. 277º e 204º da Constituição da República).
Segundo a hermenêutica que reputamos mais correcta e perfilhamos, o que o normativo determina é a aplicação do novo pressuposto de responsabilização dos contabilistas constituída após a entrada em vigor da LN (Lei Nova) o que vale dizer às relações subjectivas materiais e não às relações processuais pendentes que sejam objecto de cognição do próprio processo e cuja regulação pode ser feita por normas substantivas insertas em outros compêndios legais.
Tal interpretação é consentânea com os princípios gerais de aplicação da lei no tempo, com o da aplicação imediata mas com respeito pela validade dos actos já praticados, com a letra da lei e com os princípios gerais de aplicação temporal das normas de direito substantivo consagrados no artº 12º do Ccivil.
Na parte final do nº 1 deste preceito consigna-se que «ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular».
Seguindo essa linha de raciocínio, o novo nº 3 do artº 24º da LGT só seria aplicável aos actos constituídos antes da sua entrada em vigor se fosse essa a vontade expressa do legislador.
Essa vontade não está inequivocamente afirmada, devendo resolver-se a dúvida, se a houvesse - e não há, como já vimos- com a ressalva de retroactividade constante do nº 1 do artº 12º do Ccivil.
Coloca-se aqui a questão de saber quando é que se entendem produzidos pelos factos que a lei visa regular os efeitos jurídicos, a que o Prof. J. Baptista Machado dá resposta na sua obra «Sobre a Aplicação no Tempo do Novo Código Civil», pág. 125:
«Um efeito de direito produziu-se sob o domínio da LA quando na vigência desta lei se verificaram o facto ou os factos que, de acordo com a respectiva hipótese legal da LA, o desencadeiam».
Assim, aplicando tal doutrina ao caso dos autos, desde que ocorreu a prática dos actos que é imputada ao oponente, ora recorrente, ficou determinado na ordem jurídica que o mesmo poderia incorrer na responsabilidade de que se cura, sendo inequívoca a vontade do legislador no sentido de que só a partir da vigência da Lei Nova fossem aplicados os novos critérios. Significa que para aqueles factos e na temporalidade apurada, não era aplicável o regime novo.
Em reforço e levando em conta as asserções tecidas por Baptista Machado na citada Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1983, p.246, existem dois requisitos para se considerar a natureza interpretativa da lei, nos termos do disposto no artigo 13.º do Código Civil, “que a solução do direito anterior seja controvertida ou pelo menos incerta; e que a solução definida pela nova lei se situe dentro dos quadros da controvérsia e seja tal que o julgador ou o intérprete a ela poderiam chegar sem ultrapassar os limites normalmente impostos à interpretação e aplicação da lei”.
Quanto a este segmento, importa considerar que o preceito legal, na redacção da Lei n.º 30-G/2000, de 29.12 que vigorou até à entrada em vigor da Lei n.º 60-A/2005, de 30.12, contemplava também a exigência de uma violação dolosa dos deveres, enquanto a redacção vigente à data dos factos, resultante da Lei n.º 60-A/2005, previa:
“A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos técnicos oficiais de contas desde que se demonstre a violação dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos.”
Pelo exposto, importa considerar que a lei nova possui cariz inovador e não interpretativo, uma vez que a solução do direito anterior não era controversa, sendo clara a intenção do legislador em contemplar as situações de actuações dolosa e negligente, sendo esta a interpretação unânime da jurisprudência, podendo citar-se, para além do acórdão recorrido, os acórdãos do TCA Sul de 19.12.2017 (P.1199/11.6BELRS) e de 22.02.2018 (P. 1350/15.7BELRA), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
E também perfilhamos esse entendimento, sendo o mesmo abonável igualmente pelo contributo doutrinal de Gustavo Lopes Courinha in “Manual do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas- 2019, págs. 202 e ss” de que, com a devida vénia, se extracta o seguinte edifício discursivo:
“17.5. Responsabilidade dos Contabilistas Certificados - breves notas
I. Sem prejuízo da nomenclatura indevida - a antiga designação dos contabilistas certificados era a de “técnicos oficiais de contas” - o artigo 24º da LGT estabelece um regime muito especial para estes intervenientes no processo de auto-liquidação.
É a seguinte a redação do nº 3 deste artigo, na redação introduzida pela Lei nº 60-A/2005, de 30 de Dezembro: “A responsabilidade prevista neste artigo aplica-se aos técnicos oficiais de contas desde que se demonstre a violação dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos.”
Estabelece-se, assim, a atribuição de uma responsabilidade subsidiária (E o que a expressão “responsabilidade prevista neste artigo” permite concluir) aos contabilistas certificados, verificadas certas condições legais.
II. Este peculiar regime caracteriza-se, antes do mais, por assentar numa responsabilidade funcional, estribada na violação da legis artis.
A responsabilidade assim estabelecida pressupõe que o contabilista certificado é responsável pela regularidade contabilística do sujeito passivo e que em casos de falha no cumprimento desse dever, deve assumir a correspondente responsabilidade pelas dívidas deixadas de cobrar, por efeito de tal violação dos precisos deveres do ofício elencados por esta disposição.
Julgamos, todavia, que importa colocar aqui uma restrição, atenta a possibilidade (sempre presente) de a decisão contabilística com impacto fiscal ter sido objeto de uma mera interpretação indevida. Tais interpretações do normativo contabilístico que traduzem meros erros técnicos são naturais e não poderiam nunca implicar a responsabilidade do contabilista pela interpretação (errada) por si dada a uma dada norma do SNC, por exemplo.
Esta responsabilidade só deve, assim, ser acionada quando as falhas assentem numa violação tão profunda do normativo contabilístico que ponha em causa a própria função de que a contabilidade foi investida pelo ordenamento fiscal. Tal significa, em nossa opinião, que os casos a que este dispositivo será aplicável tenderão a coincidir apenas com os casos em que ocorra a aplicação de métodos indiretos por “impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria coletável”, regulados pelos artigos 87a/n91/alínea b) e 88- da LGT.
III. Convém sublinhar que, em nossa opinião, o regime não traduz - contrariamente ao que a alteração legislativa que eliminou a expressão “violação dolosa” parece pressupor - uma verdadeira modalidade de responsabilidade objetiva. A responsabilidade continua a ser, ainda, subjetiva: o requisito da culpa continua a ser objeto de consideração pela hipótese legal.
Aquilo que é peculiar nesta culpa, porém, é que ela é determinada não por referência ao incumprimento da obrigação fiscal, mas por referência ao incumprimento dos deveres que impendem sobre o contabilista, quanto à organização e regularidade da contabilidade do sujeito passivo.
Isto significa, estamos em crer, que o contabilista certificado deverá ao menos alertar expressamente o sujeito passivo para a impossibilidade de cumprir as suas tarefas legais, sempre que este último impeça, obstaculize ou dificulte o cumprimento por aquele das tarefas que lhe são legalmente incumbidas. E assim - ou por meio de outras fórmulas que demonstrem a diligência e zelo no cumprimento da lex artis - que a culpa pode ser afastada (não ser imputável) do contabilista, deste modo o eximindo da respetiva responsabilidade fiscal.”
Em conclusão geral e definitiva: dúvidas não sobram de que as opções do legislador a propósito de tal matéria, não são susceptíveis de causar dúvidas interpretativas, independentemente do juízo que se possa formular sobre a desnecessária incerteza jurídica que as mesmas provocam. Terá, pois, de assentar-se que a Lei Nova não atribui eficácia retroactiva às apontada norma como decorre do disposto no nº 1 do artº 12º do Ccivil ao estabelecer que a lei só dispõe para o futuro, salvo se lhe essa eficácia for atribuída pelo legislador caso em que se presumem ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular. E também ao nº 2 do mesmo preceito legal que estatui que quando a lei dispuser sobre os efeitos dos factos, a lei nova só visa, em caso de dúvida, os factos novos.
Portanto e ainda de acordo com Baptista Machado, in ob. cit., págs. 99, 100 e Introdução, pág. 234, a lei nova respeita integralmente as situações jurídicas constituídas « ex lege », por força da verificação de certos factos. Por tal razão, além de acobertada dentro da ressalva da parte final do nº 1, também se acha englobada na previsão do nº 2, primeira parte, do referido artº 12º do C. Civil.
Deve por isso concluir-se que a Lei Nova não tem natureza interpretativa e, ao dispor sobre os efeitos dos factos, apenas visa os factos novos e que, assim, é inaplicável às situações por ele previstas cujos pressupostos, segundo a lei antiga, ocorreram sob o domínio desta lei, só se aplicando aquele às situações que se tenham constituído pela ocorrência dos factos integradores da respectiva previsão legal a partir do início da sua vigência.

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Tendo presente a finalidade da presente revista, entendemos que também se justifica dissecar se a antedita alteração legislativa deve ser aplicada ao revertido por ser lei mais favorável e perspectivando a natureza sancionatória da responsabilidade subsidiária.
Nesse sentido, Tiago Caiado Guerreiro e Ricardo Camossa no seu estudo cognominado “A responsabilidade tributária subsidiária dos TOC’s - alcance do conceito de negligência, Jornal de Contabilidade, 348, Março 2006, 95 ss.” no qual questionam a própria constitucionalidade da norma na sua redacção anterior à actual, atendendo à sua indeterminação, por violação dos princípios da precisão, clareza e determinabilidade das leis, que revestem especial acuidade aquando da tipificação de uma sanção, enquanto subprincípio dos princípios da legalidade tributária e da segurança jurídica e protecção da confiança dos cidadãos, considerando ser indubitável o cariz punitivo e repressivo da responsabilidade subsidiária que exerce uma função preventiva, dissuasora e sancionatória de certas condutas.
Pontificam a respeito ainda as considerações de Jónatas Machado e Vera C. Raposo in “A responsabilidade subsidiária dos TOC’s (algumas considerações constitucionais a propósito do art. 24.º/3 da LGT), publicado online in https://www.isg.pt/wp-ontent/uploads/2021/03/30_1_jonatas_tocs_f30.pdf” ao elucidarem o cariz sancionatório dessa norma, expendendo que, “Não se verificando, na esfera económica dos TOC’s, qualquer facto tributário, a sua responsabilidade pelas dívidas respeitantes a factos tributários ocorridos na esfera jurídica das pessoas colectivas e entes fisicamente equiparados em que exercem a sua actividade, encontra-se ligada, não à verificação de um facto tributário, mas à ocorrência de um facto gerador de responsabilidade: a violação de deveres profissionais de responsabilização pela regularidade técnica, financeira e fiscal, das contas da empresa. É daqui que decorre a natureza sancionatória desta responsabilidade, a que nos referiremos adiante. É deste facto autónomo gerador de responsabilidade que trata o artigo 24º/3 da LGT.”
(…)“Se se partir da natureza sancionatória da responsabilidade subsidiária dos TOC’s, a conclusão mais adequada ao sistema jurídico é aquela que exige o respeito pelo princípio da proibição da inocência, inerente a todo o direito sancionatório. Nas palavras de Isabel Sanchéz Ayuso, que aqui traduzimos, “a presunção da inocência rege sem excepções no ordenamento sancionatório e há-de ser respeitada na imposição de quaisquer sanções, sejam penais, sejam administrativas em geral ou tributárias em particular” (vide Isabel Sanchéz Ayuso in Circunstancias Eximentes y Modificativas de Responsabilidad por Infracciones Tributárias, Madrid, 1996, 35.).
Também na doutrina nacional o Prof. Soares Martínez, em “Direito Fiscal, 10ª Edição, Almedina, 2003, pág. 251”, ensinava que a responsabilidade subsidiária é possuidora de “um fim repressivo, de punição de irregularidades” e o Prof. Saldanha Sanches, no seu Manual de Direito Fiscal, 3ª Edição, Coimbra Editora, 2007, pág. 154, definia-a pelo seu “carácter marcadamente sancionatório”.
Ora, a entender-se que se trata de matéria de direito sancionatório, valerá o princípio constitucional da aplicação do regime globalmente mais favorável ao infractor, que, embora apenas previsto expressamente para as infracções criminais (art. 29.º, n.º 4, da C.R.P.), seria de aplicar analogicamente aos outros direitos sancionatórios, em consonância com o Acórdão do STA de 30-11-2004, relatado pelo Conselheiro Jorge Lopes de Sousa (Processo 01017/04, in www.dgsi.pt), em cujo sumário se plasmou que “II - Em matéria de direito sancionatório, vale o princípio constitucional da aplicação do regime globalmente mais favorável ao infractor que, embora apenas previsto expressamente para as infracções criminais (art. 29.º, n.º 4, da C.R.P.), é de aplicar analogicamente aos outros direitos sancionatórios.”, ali se dando nota de que esse ponto de vista foi sufragado nos “seguintes acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo:– de 19-6-91, proferido no recurso nº 13160, publicado em Apêndice ao Diário da República de 30-9-93, página 746, e em Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, nº 362, página 224; – de 22-5-92, proferido no recurso nº 14170, publicado em Apêndice ao Diário da República de 22-2-95, página 1619;– de 1-7-92, proferido no recurso nº 13546, publicado em Apêndice ao Diário da República de 30-6-95, página 1961; – de 15-7-92, do Pleno, proferido no recurso nº 13156, publicado em Apêndice ao Diário da República de 30-9-94, página 174; – de 30-9-92, proferido no recurso nº 14110, publicado em Apêndice ao Diário da República de 30-6-95, página 2382. – de 25-3-92, do Pleno, proferido no recurso nº 13148, publicado em Apêndice ao Diário da República de 30-9-94, página 54. No mesmo sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do Tribunal Constitucional– n.º 227/92, de 17-6-92, proferido no recurso nº 388/91, publicado no Boletim do Ministério da Justiça nº 418, página 430; e – n.º 150/94, de 8-2-94, proferido no recurso nº 603/93, publicado no Boletim do Ministério da Justiça n.º 434, página 126. No mesmo sentido pronunciam-se J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa Anotada, de 3.ª edição, página 195.” Valendo ainda, a tal respeito, as considerações dos referidos autores Jónatas Machado e Vera Raposo, quando na mesma obra propugnam que “Subjacente a este entendimento está a noção, anteriormente referida, de que os princípios nucleares do direito criminal se aplicam, ainda que com as devidas adaptações, à generalidade do direito sancionatório, com um relevo especial para o direito sancionatório tributário.”
Logo, a entender-se que se trata de matéria de direito sancionatório e que, consequentemente, vale o princípio constitucional da aplicação do regime globalmente mais favorável ao infractor, que, embora apenas previsto expressamente para as infracções criminais (art. 29.º, n.º 4, da C.R.P.), seria de aplicar analogicamente aos outros direitos sancionatório, a nova redacção do n.º 3 do art. 24º da LGT que vem consagrar uma exigência de “dolo” como modalidade da culpa do Contabilista Certificado e, consequentemente, tal exigência deverá aplicar-se a todas as situações ocorridas antes da entrada em vigor desta lei, seja por via da retroactividade decorrente de ser lei interpretativa, quer por se tratar de lei mais favorável.
Em sinopse, é conveniente aquilatar do impacto que a redacção do legislador de 2021 veio trazer à norma para as situações ocorridas antes da sua entrada em vigor e da hipotética inconstitucionalidade de uma interpretação do n.º 3 do art. 24º da LGT por violação do princípio constitucional da aplicação do regime globalmente mais favorável ao infractor, que, embora apenas previsto expressamente para as infracções criminais (art. 29.º, n.º 4, da C.R.P.), poderá ponderar-se a aplicação analógica aos outros direitos sancionatórios, como seria o caso da norma da responsabilidade subsidiária dos Contabilistas Certificados a conceber-se a sua natureza sancionatória e, nessa dimensão.
Quid juris?
Neste conspecto, entende-se que a directriz defendida, invocando regras de responsabilidade profissional, não é consentânea com a figura da responsabilidade subsidiária, embora se afigure que, tal como sustentado no estudo de Jónatas Machado e Vera Raposo, a mesma deverá ser objecto de uma interpretação restritiva, quer quanto aos fundamentos da sua admissibilidade, quer quanto ao modo da sua efectivação, o que impõe à administração tributária um ónus especialmente agravado de fundamentação.
Quanto à aplicação das regras da aplicação da lei penal no tempo à matéria de responsabilidade imputada ao recorrente e em que se fundou a reversão contra si da execução fiscal para pagamento de determinadas quantias, já vimos abundantemente que essa nova exigência do dolo, da qual resulta uma restrição da extensão do âmbito dos factos relevantes em termos de responsabilidade, decorre que as correspondentes condutas que tenham sido praticadas antes dessa lei nova (LN), e anteriormente qualificáveis como condutas meramente negligentes, deixam de ser como tal qualificadas, e, por isso, arredada ficaria a responsabilidade do recorrente, tanto mais que tais condutas já tinham sido objecto de decisão judicial ainda não transitada em julgado – por força do disposto no artigo 29.º, n.º 4, in fine, da Constituição, e no artigo 2.º, n.º 2, do Código Penal.
Porém, essa aplicação retroactiva da LN mais favorável (aqui sob a forma de eliminação de “infracção” anteriormente “punível”, a que se reporta o invocado artigo 2.º, n.º 2, do Código Penal) apenas deve ser reconhecida em relação à responsabilidade sancionatória propriamente dita (crimes e contra-ordenações fiscais), mas já não quanto à responsabilidade subsidiária de que se trata nos autos – e na medida em que só a primeira é equiparável à responsabilidade criminal, sendo por isso susceptível de beneficiar do regime emergente das citadas disposições da Constituição e do Código Penal.
Por seu lado, a responsabilidade subsidiária já terá natureza eminentemente civilista, sendo equiparável à responsabilidade civil, por se fundar, como esta, no princípio do ressarcimento de danos, sendo-lhe por isso aplicável um regime de sucessão de leis no tempo fundado no artigo 12.º do Código Civil (e não no artigo 2.º do Código Penal), de que decorre a aplicação da lei vigente à data dos factos.
Não obstante, a problemática da qualificação da natureza jurídica da responsabilidade subsidiária tributária não tem uma resposta unívoca, pois, ora tem sido identificada como uma fiança legal, como uma figura exclusiva do Direito Fiscal ou como uma forma de responsabilidade extracontratual.
Segundo alguns autores, a figura do responsável subsidiário tributário representa um reforço da cobrança da dívida exequenda e “ (…) pode entender-se por garantia qualquer forma ou modo de assegurar a efectividade do crédito (…)”, “existe também (…) a responsabilidade solidária ou subsidiária dos responsáveis tributários em termos largamente comuns com o Direito Civil”. – cfr. Diogo Leite de Campos e Mónica Horta Neves Leite de Campos, Direito Tributário, 2.ª Edição, reimpressão, Almedina, 2005, pág. 425. Ou seja, exerce uma função análoga à da garantia e nessa medida a sua posição é equivalente à do fiador nas obrigações civis: “O responsável subsidiário (…) é um fiador legal. Logo, é necessário que o Estado, para accionar a sua responsabilidade, tenha excutido os bens do originário devedor.” - Ibid., Ibid., pág. 393.
Nessa senda, a responsabilidade subsidiária tributária, como se considera no Acórdão do STA de 24-04-90, Processo n.º 012123, http://www.dgsi.pt, “tem por fins tornar mais fácil e mais segura a cobrança do imposto exequendo”, mas não pode ser considerada, sem mais, uma fiança legal, isso porque, como decorre da própria natureza da fiança, ao fiador não lhe é exigido o exercício efectivo de um cargo nem um comportamento censurável que tem como consequência a existência de uma dívida tributária ou o seu não pagamento. O fiador responderá sempre pela dívida, independentemente do seu comportamento quanto ao não cumprimento da obrigação por parte do devedor. Mais se aditando que nas obrigações civis o credor pode exigir um reforço da garantia, o que não se verifica quanto ao responsável subsidiário tributário.
Assim, de acordo com esta orientação, à semelhança da figura da fiança geral que constitui uma garantia pessoal com carácter subsidiário, a responsabilidade em apreço tem se equiparada a esta figura por, igualmente, preencher esses requisitos (subsidiariedade e acessoriedade).
Com base nestes requisitos teria de considerar-se ser a questionada responsabilidade categorizada como a figura jurídica da fiança legal na medida em que a responsabilidade tributária representaria um reforço da cobrança da dívida exequenda, o que exerce, enfim, uma função análoga à da garantia.
Certa doutrina, até face aos regimes anteriores, (artigo 16º do Código de Processo das Contribuições e Imposto e art. 13º do Código do Processo Tributário) perfilou-se em qualificar a responsabilidade subsidiária tributária como fiança legal justificando por um lado do carácter subsidiário desta responsabilidade em relação à do devedor originário e por outro lado o facto de o responsável. Apesar de ter uma relação especial com o devedor originário, ser um terceiro no que respeita à relação de constituição da obrigação tributária subsidiária, faria dele um garante de dívida alheia. Ou seja, essa recondução surge, por um lado, por considerar que a responsabilidade tributária representa uma situação de assumir uma dívida alheia, por outro lado, deve-se ao facto de as características de acessoriedade e subsidiariedade serem comuns quer à fiança civil, quer à responsabilidade tributária prevista no art. 24º da LGT.
Cf. Teixeira, António Braz, “Princípios de Direito Fiscal”, 3ª Edição, volume I, Almedina, 1995, e Campos, Diogo Leite de, Direito Tributário, 2ª Edição, Almedina - Coimbra, 2000 (Reimpressão).
Não obstante, o regime da responsabilidade tributária tenha algumas similitudes à figura da fiança nas obrigações civis, conforme acima consignado, existe margem de diferenças.
Desde logo, não pode olvidar-se que a fiança geral normalmente restringe-se a algumas dívidas do devedor, sendo o fiador que assume voluntariamente a dívida perante o credor no caso do incumprimento. O negócio que dá origem à fiança civil tem necessariamente carácter bilateral apesar de a lei não dizer expressamente, resulta sempre de um contrato. O seu carácter de acessoriedade faz com que todas as vicissitudes, quer de carácter material, quer formal, da obrigação afiançada reflectem-se na fiança, ao que ainda acresce que nas obrigações civis o credor pode exigir um reforço da garantia, o que não se verifica quanto ao responsável subsidiário tributário. Já o responsável subsidiário, é não só aquele que tem uma determinada relação com o sujeito passivo do devedor principal mas, sobretudo, aquele que tendo essa relação tem um comportamento censurável, do qual terá resultado directa ou indirectamente, a dívida tributária, pois existem obrigações fiscais que este visa garantir da sociedade que gere ou administra. O fiador responderá sempre pela dívida independentemente da sua conduta em relação ao não cumprimento por parte do devedor originário. Assim verifica-se, que em qualquer das duas figuras estamos perante uma assunção da dívida de outrem por um terceiro, (seja voluntariamente, seja por imposição) e com algumas outras características análogas entre ambas, mas o regime do art. 24º da LGT não se assimila à figura da fiança nas obrigações civis, pois, o que afastará dessa figura molda-se essencialmente na actuação culposa que é exigido aos responsáveis. A exigência da culpa afasta a hipótese dessa responsabilidade ser considerada como uma figura da fiança legal. Ao fiador nunca é exigido um comportamento censurável.

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Outro entendimento é o que perspectiva a responsabilidade subsidiária tributária como uma figura própria do Direito Tributário, assumindo a tipicidade própria deste ramo de Direito (não encontra paralelo noutras figuras de outros ramos de Direito).
Ancora-se tal posição na função preventiva e/ou dissuasora de certos comportamentos que a responsabilidade subsidiária tributária desempenha (ela tem “um fim repressivo, de punição de irregularidades” (Cf. Soares Martínez, Direito Fiscal, 10ª Edição (Reimpressão), Almedina, 2003, pág. 251) “um carácter marcadamente sancionatório” (Cf. J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 2ª Edição, Coimbra Editora, 2002, pág. 152. Cf. Ibid., Ibid., pág. 136).
De facto o responsável subsidiário tributário é alguém que “se encontra obrigado, por estar nessa relação jurídico-tributária, a um determinado comportamento” (Cf. Ibid., Ibid., pág. 136), obrigado a responder pelas dívidas tributárias de outrem, do responsável originário, porque a lei assim o determina; está sujeito a uma responsabilização patrimonial aparentemente ilimitada devido ao interesse juridicamente protegido através do crédito tributário, a sustentação da despesa pública que se faz em larga medida com a receita tributária.
Martínez, Soares, Direito Fiscal, Almedina, 10ª Edição, 2003 (reimpressão). cf. ainda neste sentido, Ana Paula Dourado, “ a responsabilidade tributária dos gerentes: pressupostos, Fisco, nº 53, 1993. Casimiro, Sofia De Vasconcelos, A Responsabilidade Dos Gerentes, Administradores e Directores pela Dívidas Tributárias Das Sociedades Comercias, Almedina, Novembro de 2000.
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Por fim, há Jurisprudência e Doutrina que consideram estarmos perante responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos na medida em que se verifica a reunião dos cinco pressupostos que a caracterizam, geradores da obrigação, por parte do responsável, de reparar o dano, sendo eles: conduta do agente, ilicitude dessa conduta, conduta praticada com dolo ou mera culpa, verificação de um dano e nexo de causalidade entre o dano e a conduta.
Considera-se que a ilicitude está, não na mera falta de pagamento ou na falta ou insuficiência de bens, mas na violação das normas dirigidas à protecção dos credores sociais, entre os quais se inclui o Estado pelo que “a responsabilidade do gerente pela violação das normas que impõem o cumprimento da obrigação fiscal radica na responsabilidade por facto ilícito assente em culpa funcional, isto é, em responsabilidade civil extracontratual, e não em responsabilidade contratual, pelo que o gerente não pode ser responsabilizado pelo facto de não ter exercido as funções de gerente em que se encontrava investido por força do pacto social” (cfr. Acórdão do STA de 9-12-2004, Processo n.º 00028/04, Revista Fiscal, Vida Económica, Fevereiro, 2006, pág.28).
No entanto, têm sido levantadas objecções a esta linha de pensamento designadamente por Pedro Panzina, in A responsabilidade subsidiária tributária, Revista Fiscal, Vida Económica, Maio, 2007, pág. 17, radicadas fundamentalmente em que “na responsabilidade subsidiária tributária estamos perante dívidas e não perante danos, dívidas que continuam a ser do responsável principal, (…) estamos perante uma obrigação de pagar uma dívida, e não uma obrigação de indemnizar”.
Na verdade, inclinamo-nos para o entendimento de que a responsabilidade subsidiária em apreço se aproxima mais o instituto da responsabilidade civil extracontratual, dadas as similitudes dos pressupostos que existe entre ambas.
Não obstante, reconhece-se que a responsabilidade civil extracontratual tem como consequência a obrigação de indemnizar o sujeito lesado, e, por não haver qualquer tipo de relação pré-existente entre o lesado e o lesante, situação que não se verifica com a responsabilidade atribuída aos gerentes e administradores prevista nos termos do art. 24º da LGT, pois, este já é um verdadeiro sujeito passivo apesar de ser não originário, mas também por existir uma relação prévia entre o devedor originário e o responsável. Não haverá no regime da responsabilidade subsidiária a violação de uma obrigação própria, mas sim de uma obrigação alheia.
Mas os pontos de contacto são por demais evidentes, fundamentalmente porque existe entre a responsabilidade subsidiária e responsabilidade civil delitual prevista no art. 483º do Código Civil (CC), a paridade dos pressupostos entre ambas, sem se ignorar, repete-se, que na responsabilidade civil subjectiva apenas temos dois sujeitos, não existe um terceiro e sempre estará em causa um dano e não uma dívida sobretudo alheia, dano que é sempre do lesante, enquanto na responsabilidade tributária subsidiária a dívida continuará a ser do devedor principal, ou seja, de um terceiro.
Assim, a multidisciplinaridade do instituto da responsabilidade subsidiária tributária, revelada pela verificação de que tem pontos de contacto com várias figuras de outros ramos de direito, tais como as figuras da fiança e da responsabilidade civil extracontratual, comprova a sua complexidade e diversidade.
Em todo o caso, é inegável que a responsabilidade subsidiária tributária tem uma estreita ligação com a responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos.
Mas mesmo considerando que a responsabilidade tratada é uma figura típica do Direito Fiscal, cuja propriedade reside na defesa da receita tributária, no combate ao incumprimento de obrigações fiscais (não pagamento de dívidas fiscais) e à dissipação do património social, apresentando-se como um mecanismo de controlo externo das actividades e funções exercidas pelos gestores, como uma medida de combate à fraude e à evasão fiscais (cfr. José Manuel Tomé de Carvalho, Breves Nótulas sobre a natureza jurídica da responsabilidade dos titulares de órgãos sociais das pessoas colectivas, Fiscalidade – Revista de Direito e Gestão Fiscal, 11, Julho, 2002, pág.75 e segs.), no plano que nos ocupa a responsabilidade dos responsáveis tributários tem contornos largamente comuns com o Direito Civil e não com o Direito Penal, pontificando a tal respeito o regime consagrado no artigo 12.º que estabelece os princípios da “Aplicação da lei tributária no tempo”, determinando no seu nº1, em sintonia com o a lei civil já analisada que “1 - As normas tributárias aplicam-se aos factos posteriores à sua entrada em vigor, não podendo ser criados quaisquer tributos retroativos.”
De tudo se extrai a conclusão de que a nova redacção do n.º 3 do artigo 24.º da LGT não terá como consequência a “exclusão da responsabilidade sancionatória imputada ao ora recorrente”, subsistindo a sua eventual responsabilidade nos termos do quadro normativo definido na decisão recorrida, sendo, pois, este entendimento que importa agora sindicar.
Nesse sentido, importa começar por enquadrar correctamente o regime estabelecido nas citadas disposições da Constituição e do Código Penal.
Como salientam J.J. Canotilho e Vital Moreira in Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, 4ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, pp. 495-496, o princípio da aplicação retroactiva da lei penal mais favorável, consagrado no n.º 4 do artigo 29.º da Constituição, apresenta um duplo significado: “ (a) que deixa de ser considerado crime o facto que lei posterior venha despenalizar; e (b) que um crime passa a ser menos severamente punido do que era no momento da sua prática, se lei posterior o sancionar com pena mais leve”.
Do texto constitucional retira ainda aqueles autores o entendimento de que qualquer dessas formas de apresentação de tal princípio (ou seja, quer a despenalização, quer a menor penalização) deve até valer para os casos julgados, impondo aquele nesses casos a reapreciação do anteriormente decidido. E asseveram (Constituição da República Portuguesa Anotada, volume I, 4ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, pp. 495-496) que, não obstante a aparente restrição do preceito constitucional em apreço à lei criminal, deve o conjunto de princípios nele consagrados, entre os quais o da aplicação retroactiva da lei mais favorável, «valer por analogia para os demais domínios sancionatórios», dada a sua relevância enquanto princípios fundamentais para a protecção de direitos e interesses constitucionalmente protegidos (Idem, p. 498).
Em análoga esteira seguem Jorge Miranda e Rui Medeiros em Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, 2.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2010, pp. 674-675., ao analisarem a incidência do princípio da aplicação da lei penal mais favorável numa dupla perspectiva: «lei que viesse estabelecer uma pena menos grave do que a prevista na lei em vigor no momento da prática do crime, ou lei que viesse descriminalizar o facto praticado».
Entendendo também que o texto constitucional impõe a extensão desse princípio a casos em que «a sentença condenatória (com base na lei antiga mais grave) já tiver transitado em julgado», defendem aqueles autores a inconstitucionalidade da parte final da redacção originária do n.º 4 do artigo 2.º do Código Penal (que excepcionava os casos julgados da aplicação da retroactividade favorável).
Assim, na 1.ª edição da obra citada (cfr. Constituição Portuguesa Anotada, tomo I, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, pp. 329-330), a qual reconhecem ter sido sanada por via da nova redacção conferida a essa norma pela Lei n.º 59/2007, de 4/9. E também esses autores defendem a aplicação dos princípios ínsitos no artigo 29.º da Constituição a outros «ramos do chamado direito público sancionatório» (Idem, p. 676).
Cabe ainda destacar que aqueles dois distintos aspectos do mencionado princípio da aplicação retroactiva da lei mais favorável não apresentam, ao nível da lei ordinária, a mesma fonte normativa.
Na verdade, enquanto a retroactividade da lei favorável descriminalizadora se enquadra no n.º 2 do artigo 2.º do Código Penal, já a retroactividade da lei favorável redutora da sanção tem assento no n.º 4 desse mesmo artigo 2.º.
Seja como for, estamos em qualquer dos casos perante incidências de um mesmo princípio, o qual encontra o seu fundamento, como sublinha Taipa de Carvalho, Sucessão de Leis Penais, 2.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 1997, pp. 93-108, nas ideias de «proteção e promoção dos direitos fundamentais da pessoa humana», num contexto de aprofundamento desses direitos no quadro do Estado de Direito material, e de aplicação do «princípio da máxima restrição das normas afetadoras dos direitos e liberdades fundamentais» (ou, dito de outro modo, do princípio da «intervenção mínima do direito penal»).
Do exposto resulta para o caso sub judicio, desde já, uma conclusão relevante: que o princípio da aplicação da lei penal mais favorável não tem evidente aplicação em matéria de responsabilidade dos contabilistas certificados, pois nos encontramos num domínio “sancionatório” que não se confunde com o da responsabilidade criminal.
Já se deixou bem vincada a clara distinção entre a responsabilidade subsidiária dos contabilistas nos termos do nº 3 do artº 24º da LGT e a responsabilidade sancionatória, em particular quanto à finalidade, âmbito e pressupostos, considerando que essas duas modalidades se enquadram na distinção entre a responsabilidade civil e a responsabilidade criminal ou contraordenacional e, ainda admitindo não ser a aquela responsabilidade rigorosamente idêntica à obrigação de indemnização da responsabilidade civil, há que reconhecer uma evidente afinidade existente entre ambos os institutos, na medida em que essa responsabilidade é “reintegratória” pois se traduz na reposição de valores ou de dinheiros que a Fazenda deveria arrecadar e visa, essencialmente, eliminar ou reduzir o dano sofrido pelo Fazenda Pública.
É possível, pois, declarar que a responsabilidade de que se trata tem características que a assimilam indubitavelmente à responsabilidade civil, pelo que, a evidenciada natureza civilística da versada responsabilidade subsidiária postula, necessariamente, a desaplicação do princípio da aplicação retroactiva da lei mais favorável, oriundo do domínio do direito criminal – e isso na medida em que essa responsabilidade se situa, em bom rigor, fora do quadro do direito público sancionatório (ou, pelo menos, do direito sancionatório análogo ou equiparável ao direito criminal).
Em reforço do que vem dito, é de atentar no disposto na primeira parte do n.º 4 do artigo 2º do Código Penal:
«Quando as disposições penais vigentes no momento da prática do facto punível forem diferentes das estabelecidas em leis posteriores, é sempre aplicável o regime que concretamente de mostrar mais favorável ao agente».
Sobre a interpretação deste inciso legal, há que realçar a doutrina plasmada, entre outros, nos acórdãos de 98.05.28, 00.06.15, 03.03.02 e 08.09.03, o primeiro publicado no BMJ, 477,177, o segundo publicado na CJ (STJ), VIII, II, 218, os restantes proferidos nos Processos n.ºs 1539/03 e 2558/08, respectivamente, com destaque para o último onde expressamente se consignou:
«Perante a questão da sucessão de leis penais surge, como consequência teórica e prática mais importante, o princípio segundo o qual a proibição só vale a favor do agente, não contra ele, o que se consubstancia no princípio da lei ou regime mais favorável. Tal regime não se cinge a segmentos: como refere Figueiredo Dias, o juízo complexivo de mais favor não deve resultar apenas, em princípio, da contemplação isolada de um elemento do tipo legal, ou da sanção, mas da totalidade do regime a que o caso se submete, o que significa que devem comparar-se regimes legais – como estabelece o artigo 2º, n.º 4, do CP –, e não normas de um ou outro regime, num delicado jogo de engenharia jurídica».
Assim, em matéria de sucessão de leis no tempo, e para efeitos de responsabilidade nos termos do nº3 do artº 24º da LGT, o regime do artigo 12.º do Código Civil, pois esse regime é assimilável ao da responsabilidade civil extracontratual, e que essa vertente civilista, em sede de aplicação de leis no tempo, nos obriga a observar o disposto no artigo 12.º do Código Civil, e não a lei mais favorável, como em Direito Penal, do artigo 2.º do Código Penal.
Dito de outro modo e reiterando: aplica-se a regra de que a lei dispõe para futuro (cfr. n.º 1 desse artigo 12.º), pelo que a actual redacção do n.º3 do artigo 24.º da LGT, introduzida pela Lei Nova, apenas terá aplicação, em sede de responsabilidade dos contabilistas, a factos praticados posteriormente à entrada em vigor dessa alteração legislativa.
O juízo de adesão à orientação agora acolhida deve ainda ser confrontado com a questão de inconstitucionalidade na medida em que se propugna a aplicação apenas para futuro da nova redacção do n.º 3 do artigo 24º da LGT, com a consequente recusa de aplicação do princípio da retroactividade da lei mais favorável, o que implicaria violação do citado n.º 4 do artigo 29.º da Constituição.
Ora, o nosso sistema de fiscalização de constitucionalidade não comporta a possibilidade de invocação de vício de inconstitucionalidade apenas permite que esse vício se reporte a normas (ou, no limite, à interpretação de normas) – mas, em face da natureza acima sustentada, afigura-se evidente que essa caracterização contém em si mesma a negação de uma eventual inconstitucionalidade. É que a dimensão marcadamente civilística daquela modalidade de responsabilidade coloca-a, no mínimo, fora do âmbito do direito sancionatório análogo ou equiparável ao direito criminal – o que tem, como consequência necessária, não se estar perante matéria relativamente à qual existisse a mínima hipótese de aplicação desse princípio da retroactividade da lei mais favorável. Em bom rigor, não se trata sequer de uma verdadeira recusa de aplicação desse princípio; trata-se, simplesmente, de formular um juízo de qualificação jurídica, que remete para um domínio de que não decorre a incidência do regime da sucessão de leis penais no tempo, antes se aplicando necessariamente a regra civil de que a lei dispõe para futuro, nos termos do artigo 12.º, n.º 1, do Código Civil, resultado idêntico ao que se extrairia da aplicação do artº 13º, nº1, da LGT.

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Recapitulando, no tangente ao dever dos técnicos oficiais de contas de garante da regularidade técnica nas áreas contabilísticas e fiscais, impõe-se assentar que, «quando o contabilista certificado submete uma declaração fiscal, com a sua senha, que traduz a sua assinatura, assume, perante a AT, que os elementos constantes daquela declaração traduzem a verdade da situação contabilística e fiscal daquele sujeito passivo, assente nas informações e documentos por este fornecidos, aos quais foram dados os adequados tratamento técnico e enquadramento legais. (…). // Tendo em conta a situação de garante fiscal em que o contabilista certificado se encontra legalmente colocado (…), em consequência da natureza pública das suas funções, e considerando que a situação contabilística e fiscal do cliente/empregador transmitida à AT assenta, necessariamente, nas informações, elementos e documentos por este fornecidos, o contabilista certificado terá de ser exigente com o cliente, solicitando-lhe todos os esclarecimentos e informações que julgue relevantes para aferir a verdade contabilística e fiscal (…)» - vd. Albano Santos, Responsabilidade Subsidiária do Contabilista Certificado, Formação Segmentada, Ordem dos Contabilistas Certificados, Novembro 2015, p. 13.
Como no próprio acórdão recorrido se afirma, com base na melhor doutrina sobre a matéria, “Do disposto no artigo 24.º/3, da LGT, resulta que «a AT terá de demonstrar quais os deveres profissionais que o contabilista certificado incumpriu, concretizando-os, nomeadamente, o incumprimento declarativo (…), a contabilização de documentos que não respeitem a forma legal ou a contabilização de valores não suportados documentalmente confiando na sua futura entrega, que não veio a ocorrer, a execução da contabilidade sem observância dos princípios e regras contabilísticas fundamentais» [Albano Santos, Responsabilidade Subsidiária…, cit., p. 66].
Na avaliação da culpa pelo incumprimento dos deveres estatutários do técnico oficial de contas, é de «utilizar como critério a diligência profissional imposta pelo Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, bem como o Código Deontológico, com vista a concretizar o conceito (…) de «regularidade técnica». Em suma, o que releva é verificar se um técnico oficial de contas normalmente diligente actuaria de modo similar. (…) [A] «regularidade técnica» corresponde à execução da contabilidade, nos termos das disposições previstas nos normativos aplicáveis, tendo por suporte os documentos e as informações pelo órgão de gestão ou pelo empresário, e as decisões do profissional no âmbito contabilístico, com vista à obtenção de uma imagem fiel e verdadeira da realidade patrimonial da empresa, bem como o envio para as entidades públicas competentes, pelos meios legalmente definidos, da informação contabilística e fiscal definida na legislação em vigor».
(…)«[a] responsabilidade tributária do técnico oficial de contas pressupõe a verificação da inexistência ou pelo menos insuficiência de bens do devedor originário e, por outro lado, a violação culposa dos deveres de regularização técnica no âmbito contabilístico e fiscal. Dito de outra forma, a lei pressupõe a responsabilidade subjectiva desde que fiquem provados dois requisitos: a determinação no incumprimento das dívidas tributárias, bem como a insuficiência patrimonial». É de exigir a comprovação da ocorrência de condutas violadoras dos deveres funcionais que sejam imputáveis ao TOC, a título de negligência ou dolo. É de exigir, igualmente, «a verificação de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do técnico oficial de contas e o incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o técnico oficial de conta exerce as suas funções profissionais, sendo este então um instrumento necessário ao incumprimento fiscal» [Paulo Marques, Responsabilidade tributária…, cit., pp. 46/47.]” (fim de citação).
Do antedito, decorre insofismavelmente que a responsabilidade tributária em apreço tem como pressupostos a verificação da inexistência ou, no mínimo, insuficiência de bens do devedor originário e, ainda, a violação culposa dos deveres de regularização técnica no âmbito contabilístico e fiscal.
Significa que a lei pressupõe a responsabilidade subjectiva desde que fiquem provados dois requisitos: (i) a determinação no incumprimento das dívidas tributárias, e (ii) a insuficiência patrimonial do ente societário.
Assim, torna-se exigível, quer a comprovação da ocorrência de condutas violadoras dos deveres funcionais que sejam imputáveis ao TOC, a título de negligência ou dolo, quer a verificação de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do TOC e o incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o mesmo TOC exerce as suas funções profissionais, erigindo-se este como um instrumento necessário ao incumprimento fiscal, assim podendo falar-se em comparticipação na mesma causa em sede de responsabilidade extra-contratual, conforme previsão do artº.490, do C.Civil, em face da responsabilidade subsidiária prevista no artº.24, nº.1, da L.G.T., quanto à pessoa dos gerentes ou administradores (cfr. Abílio Morgado, Responsabilidade Tributária: Ensaio sobre o regime do artº.24, da Lei Geral Tributária, Ciência e Técnica Fiscal, nº.415, Janeiro/Junho 2005, pág.124 e seg.; Paulo Marques, Responsabilidade tributária dos gestores e dos técnicos oficiais de contas, Coimbra Editora, 2011, pág.44 e seg.).
Do exame destes preceitos legais extrai-se que é indissociável do exercício privado da profissão de TOC um interesse público, ligado à necessidade de transparência e rigor na elaboração das contas das entidades a quem prestam serviços, sendo a mens legislatoris por identidade de razões quanto aos membros dos órgãos de fiscalização e aos revisores oficiais de contas, a de que também os TOC poderiam ser responsabilizados subsidiariamente, desde que demonstrada a violação dos seus deveres de responsabilidade pela regularização técnica, contabilística e fiscal das empresas ou, por outro lado, pela falta de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e anexos.
Assim, o incumprimento das obrigações fiscais deverá, por conseguinte, ser consequente da violação culposa dos deveres que impendem sobre o TOC, recaindo sobre a AT o ónus da prova dos citados pressupostos, com vista à efectivação da responsabilidade através do mecanismo da reversão (cfr. José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.226 e seg.; Paulo Marques, Responsabilidade tributária dos gestores e dos técnicos oficiais de contas, Coimbra Editora, 2011, pág.47).
Operando com a teoria da causalidade adequada que se consagra no nosso ordenamento jurídico, para que a actuação do recorrente se pudesse dizer causa do prejuízo era mister que, em abstracto, aquela fosse adequada a produzi-lo, que o prejuízo fosse uma consequência normal típica daquela. E para se poder dizer que a acção ou omissão do recorrente foi adequada à insuficiência do património da empresa para a satisfação dos créditos fiscais, deve seguir-se o processo lógico da prognose póstuma, ou seja, de um juízo de idoneidade, referido ao momento em que a acção se realiza ou a omissão ocorre, como se a produção do resultado se não tivesse ainda verificado, isto é, de um juízo «ex ante».
A causalidade não se refere ao facto e ao dano isoladamente considerados, mas ao processo factual que, em concreto, conduziu ao dano (insuficiência patrimonial), não existindo aquela relação quando este se verifica apenas por circunstâncias excepcionais e anormais que tivessem intervindo no processo, considerado no seu conjunto e onde não foi determinante a violação culposa, pelo TOC, dos seus deveres de responsabilidade pela regularização técnica, contabilística e fiscal das empresas ou, por outro lado, pela falta de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e anexos.
Enfatizando-se que é imperioso concluir que, à luz do disposto no n.º3 do art.º24.º da LGT, a AT não beneficia de qualquer presunção legal de culpa do TOC no incumprimento de deveres profissionais de que haja resultado o incumprimento de obrigações fiscais, devendo demonstrar tal pressuposto, que não apenas indiciar.
Assim, respeitadas as especificidades do regime ínsito no artº 24º da LGT, essa responsabilidade assenta na verificação cumulativa dos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil (cfr. artigo 483º do Código Civil), a saber:
a) O acto voluntário de um órgão ou seu agente, no exercício das suas funções e por causa delas, que pode revestir a forma de acção ou omissão;
b) A ilicitude, que advém da ofensa, por esse facto, de direitos ou de disposições legais que se destinam a proteger interesses alheios;
c) A culpa, como nexo de imputação ético-jurídico que liga o facto à vontade do agente, que na forma de mera culpa se afere pela diligência que teria naquelas circunstâncias um funcionário ou agente típico. Pressupõe uma censura de ordem jurídica ao comportamento do lesante;
d) O dano, prejuízo de ordem patrimonial ou não patrimonial, produzido na esfera jurídica do lesado. Só havendo direito a indemnização, no caso desta última, quando o dano, pela sua gravidade, avaliada segundo um padrão objectivo e não à luz de factores subjectivos, mereça a tutela do direito (cfr. artigo 496º, nº 1 do Código Civil);
e) O nexo de causalidade entre o facto (acto ou omissão) e o dano, a apurar segundo a teoria da causalidade adequada (cfr. artigo 563º do Código Civil), que pressupõe que os danos se apresentem como consequência normal, provável e típica do facto ilícito.
Donde que o primeiro pressuposto para que exista obrigação de indemnizar é a verificação de um facto ilícito, por acção ou omissão.
A actuação ilícita, em sentido material, é aquela que tenha como consequência a lesão de direitos ou interesses legalmente protegidos de terceiro. Em sentido formal o conceito integra a violação de normas.
Por outro lado, a ilicitude tanto pode resultar de uma acção, como de uma omissão, conforme se retira da primeira parte do n.º 1 do artigo supra transcrito, mas para que haja ilicitude por omissão é necessário que o órgão, funcionário ou agente da pessoa colectiva de direito público tenha o dever de agir.
Portanto, para que fosse imputável ao recorrente a lesão sofrida pela AT, esta, como lesada deve provar os factos de onde resulte que aquele resultado foi causado pelo acto ou omissão do contabilista, que houve violação das legis artis e que o referido resultado se localiza no âmbito dos perigos que o escrupuloso cumprimento das leges artis pretende evitar. Feita essa prova, o contabilista recorrente não responderá civilmente se, não obstante, provar que tal resultado se verificaria ainda que tivessem sido cumpridas as "legis artis" (Ac. STA-CA, de 26-5-10, P. nº 793/09 publicado em www.dgsi.pt).
As legis artis, quando não escritas, são métodos e procedimentos, comprovados pela ciência contabilística, que dão corpo a standards contextualizados de actuação, aplicáveis aos diferentes casos, por serem considerados pela comunidade científica, como os mais adequados e eficazes. E age assim com culpa, violando o dever objectivo de cuidado, o contabilista cujo procedimento fica aquém do standard técnico/científico da actuação exigível ao profissional médio, nas circunstâncias do caso concreto.
Cabe então e desde logo, em face da prova produzida, analisar se o Oponente violou os deveres assumidos pela regularidade técnica em matéria contabilística e fiscal, começando por abordar a questão do ónus da prova da violação desses deveres com a ressalva, tal como acima se referiu em louvação da mais autorizada doutrina sobre a temática em apreço, de que a ajuizada responsabilidade só deve ser accionada quando as falhas assentem numa violação tão profunda do normativo contabilístico que ponha em causa a própria função de que a contabilidade foi investida pelo ordenamento fiscal, ou, dito de outro modo, este dispositivo será tendencialmente aplicável apenas os casos em que ocorra a aplicação de métodos indirectos por “impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria coletável”, regulados pelos artigos 87a/nº1/alínea b) e 88º da LGT, como sucede no caso vertente.
Como prius à questão do ónus probatório, cabe, de novo, frisar, que, opostamente ao que às alterações legislativas que eliminaram e repuseram a expressão “violação dolosa” parecem inculcar, o regime em apreço não exprime uma genuína modalidade de responsabilidade objectiva.
Pelo contrário, a nosso ver, a responsabilidade é sempre de natureza subjectiva, sendo o requisito da culpa o objecto de apreciação como pressuposto legal e determinada não por referência ao incumprimento da obrigação fiscal, mas por referência ao incumprimento dos deveres que impendem sobre o contabilista, quanto à organização e regularidade da contabilidade do sujeito passivo.
Nesse conspecto, seguindo os ensinamentos de Gustavo Courinha supra expostos, “o contabilista certificado deverá ao menos alertar expressamente o sujeito passivo para a impossibilidade de cumprir as suas tarefas legais, sempre que este último impeça, obstaculize ou dificulte o cumprimento por aquele das tarefas que lhe são legalmente incumbidas. E assim - ou por meio de outras fórmulas que demonstrem a diligência e zelo no cumprimento da lex artis - que a culpa pode ser afastada (não ser imputável) do contabilista, deste modo o eximindo da respetiva responsabilidade fiscal.”
Com esta demarcação, retomando a questão do ónus probatório, consonante a regra geral prescrita no artigo 342.º do Código Civil, àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito invocado.
Neste caso, incumbia à Fazenda Pública a alegação e prova, logo em sede de despacho de reversão, de factos consubstanciadores de que a actuação do responsável subsidiário havia sido violadora dos deveres assumidos pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal, não podendo o Tribunal socorrer-se de factos que não estejam alegados no aludido despacho.
Ao que acresce ser necessária a verificação de um nexo de causalidade entre a conduta do contabilista certificado e a insuficiência do património do devedor principal, o que o mesmo é dizer que não se mostra possível responsabilizar estes profissionais especializados por dívidas tributárias cuja origem e montante sejam alheios à sua conduta, cabendo tal ónus da prova à AT, tal como lhe cabe a exigência de fundamentar tal nexo de causalidade.
(cfr. A responsabilidade subsidiária dos TOC’s (algumas considerações constitucionais a propósito do art. 24.º/3 da LGT), disponível em https://www.isg.pt/wp-content/uploads/2021/03/30_1_jonatas_tocs_f30.pdf, junto pelo recorrente.)
A nosso ver, resulta do probatório que a Fazenda Pública não logrou provar cabalmente a violação de tais deveres pelo Oponente, no período a que respeita a dívida exequenda, não constando dos autos qualquer elemento de prova que a demonstre, sendo certo que não basta alegar essa violação ou afirmar que se mostra provada a referida violação.
É que, nos termos daquele preceito legal, à AT cabia demonstrar e provar (art. 74.º, n.º 1 da LGT) uma inequívoca conduta dolosa ou negligente daquele Técnico, ora oponente e recorrente, em violação dos deveres no âmbito da responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilísticas e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos, isso em consonância com a auto-vinculação constante do ofício circulado n.º 60 058, de 17/04/2008, da Direcção Geral dos Impostos, subscrito pelo Subdiretor-Geral, no sentido de que «…a Administração Fiscal deve apurar e demonstrar inequivocamente uma conduta dolosa ou negligente da sua parte, em violação dos deveres no âmbito da responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos. Neste último caso, estamos perante um dever de atestação da verdade e regularidade dos documentos do cliente que é uma resultante do carácter público da própria função, à semelhança do que se passa com os revisores oficiais de contas”.

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Como ficou demonstrado, a efectivação da responsabilidade subsidiária dos Técnicos Oficias de Contas/TOC pelas dívidas tributárias da SDO (artigo 24.º/3, da LGT) depende da alegação e prova pela AT, em primeiro lugar, de que é imputável ao agente um facto ilícito.
Esgrime o recorrente que o Acórdão apelado segue o ínvio caminho de tentar misturar, sob uma capa de alternatividade, duas realidades diferentes: a dissipação do património da Sociedade Devedora Originária (SDO) e o incumprimento das dívidas exequendas por parte desta, e para tentar expender algumas considerações que seriam a suposta fundamentação do juízo de imputação ao revertido pelo dano causado ao Estado, o que se constata é que o Acórdão recorrido se descentra dessa questão para novamente se centrar no juízo da culpa, ao invés de se centrar no nexo causal entre o facto e o dano, conforme decorre do intróito do ponto 2.2.9. do Acórdão.
Na verdade, da análise do probatório não se consegue perscrutar qual a materialidade que permite dar como existente o conhecimento da situação de irregularidade contabilística e fiscal em que se encontravam as três sociedades e o próprio acórdão recorrido não o explicita pois se limita a fazer uma referência genérica ao probatório.
Depois, no acórdão recorrido afirma-se que o Recorrente continuou a assinar e apresentar as declarações periódicas perante o Fisco, no decurso dos três primeiros trimestres de 2011”, quando do probatório brota que o Recorrente iniciou as suas funções como TOC da Devedora Originária, não desde a sua constituição, mas apenas nesse ano de 2011, restringindo-se a sua intervenção a tais 3 declarações periódicas de IVA.
E também assiste razão ao recorrente ao salientar que o Acórdão declara que o recorrente “sabia (ou devia saber) que não tinham aderência à realidade”, mas essa conclusão manifestamente não tem respaldo nos factos elencados no probatório e é imprópria e insuficiente para operar o juízo de imputação pois que, como já demonstrado, recaía sobre a AT o ónus da prova da violação culposa dos deveres de regularidade técnica. Daí que também se entenda que para decretar a efectivação da responsabilidade tributária de um Contabilista o Acórdão tinha de ter suficientes factos fixados para, sem margem para dúvidas, poder peremptoriamente afirmar que o Contabilista sabia que tais declarações fiscais não tinham aderência à realidade ou que não sabia mas tinha obrigação de saber.
É igualmente assertiva a consideração de que é inconsistente a valoração feita no acórdão recorrido ao afirmar que “(...) sem que retirasse ou substituísse as mesmas, como lhe competia [28].”, pois se constata que essa nota de rodapé [28] é referente à “Alínea r), ponto 41”, no qual consta apenas que foi o Recorrente quem assinou as 3 declarações fiscais de 2011, quando é pacífico ser impossível ao Contabilista substituir declarações fiscais se o legal representante da Devedora Originária não as assinar igualmente, o que vale por dizer que tal substituição não dependia do Contabilista.
De facto, este não pode de forma unilateral substituir as declarações fiscais, essa conduta violaria, sim (Decreto-Lei n.º 452/99, de 5 de Outubro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 310/2009, de 26 de Outubro) de forma incontestável, o disposto do n° 1 do “Artigo 6.º - Funções” do Estatuto da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas em vigor à data, talqualmente o art. 10º do actual Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados (Lei n.°139/2015, de 7 de Setembro), que abaixo se transcreve para melhor compreensão: ”c) Assinar, conjuntamente com o representante legal das entidades referidas na alínea a), as respectivas demonstrações financeiras e declarações fiscais, fazendo prova da sua qualidade, nos termos e condições definidos pela Ordem, sem prejuízo da competência e das responsabilidades cometidas pela lei comercial e fiscal aos respectivos órgãos;” ou seja, o próprio Acórdão do TCA Sul afirma que a solução passaria pela concretização da própria violação das funções do TOC previstas no Estatuto da OTOC (Assinar, conjuntamente com o representante legal das entidades) neste caso, excluindo o TOC de forma deliberada e premeditada o representante legal da Empresa (SDO) da assinatura das suas próprias Declarações Fiscais.
Sucede que no plano da imputação ao revertido pelo dano causado ao Estado, o Acórdão afirma que “Tal significa que o mesmo aceitou o resultado do incumprimento fiscal e a posterior situação de insuficiência patrimonial da SDO, quando confrontada com a falta de veracidade das deduções de IVA efectuadas e as consequentes correcções às declarações fiscais apresentadas.”
O certo é que, como diz o recorrente, inexiste qualquer facto provado nos presentes autos de acto ilícito, comissivo ou omissivo, supostamente praticado pelo Contabilista susceptível de produzir o dano ao Estado, valendo aqui os ensinamentos de Paulo Marques in “Responsabilidade Tributária dos Gestores e dos Técnicos Oficiais de Contas — A Reversão do Processo de Execução Fiscal”, Coimbra Editora, Págs. 42 a 44., seguindo outro autor (concretamente JÓNATAS E. M. MACHADO in A responsabilidade subsidiária dos TOC's (Algumas considerações constitucionais a propósito do art. 24º/3 da LGT), Fiscalidade n° 30, Instituto Superior de Gestão, Lisboa, Abril-Junho 2007, p. 12), de acordo com os quais, “Na observação de JÓNATAS MACHADO “a imposição de uma responsabilidade subsidiária aos TOC’s deve ser interpretada restritivamente, estando a sua aplicação pela administração tributária sujeita a um ónus especialmente agravado de fundamentação. […] O responsável subsidiário deve ter culposamente dissipado ou maltratado o património social”. Em face da exigência de culpa (imputação subjectiva) na conduta do técnico oficial de contas, parece ser de exigir igualmente a verificação de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do técnico oficial de contas e o incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o técnico oficial de contas exerce as suas funções profissionais, sendo este então um instrumento necessário ao incumprimento fiscal, pelo que pode falar-se em comparticipação na mesma causa.”
Assim, resulta cristalino que existe consenso na Doutrina no sentido de ser a exigível a verificação de um comportamento ilícito do técnico oficial de contas causador do incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o técnico oficial de contas exerce as suas funções profissionais, o qual tem necessariamente de ter agido de forma a tornar a prestação impossível por parte do executado originário: uma acção ou omissão causal do responsável subsidiário relativamente à obrigação tributária e o seu não pagamento através do património do devedor principal.
Sobre a alegada falta de organização da contabilidade e a dissipação do património, afirma-se no Acórdão sob censura que “A falta de controlo dos movimentos contabilístico da SDO, a par da falta de conciliação bancária dos lançamentos efetuados na contabilidade das sociedades alegadas fornecedoras das SDO, determinou não apenas a evasão fiscal, como a dissipação do património destas últimas”.
Trata-se de uma “presunção”, de uma afirmação genérica, quando é certo que a dissipação do património, não existe nem foi provada ou é, pelo menos, duvidoso que tenha ocorrido.
Depois, num juízo de normalidade e concordando com o recorrente, a dissipação do património não resulta da má organização da contabilidade mas de uma atitude deliberada dos órgãos de gestão já que pode haver boa organização contabilística e fiscal e haver dissipação do património, ou o seu contrário, haver, por qualquer razão, uma má organização contabilística e fiscal e não haver qualquer indício de dissipação do património.
Portanto, impunha-se que a AT provasse que a falta de meios financeiros se deveu à conduta do contabilista certificado, ainda na senda de JÓNATAS E. M. MACHADO/VERA C. RAPOSO, A responsabilidade subsidiária dos TOCs (Algumas Considerações Constitucionais a propósito do Art. 24.º/3 da LGT) Revista Fiscalidade n.° 30): “é necessária a verificação de um nexo de causalidade entre a mesma conduta e a determinação e incumprimento de uma dívida tributária e a insuficiência do património do devedor -principal. (...) A não ser assim, iria o TOC responder por dívidas cuja origem e o montante seriam totalmente alheios à sua conduta, em clara violação dos princípios da igualdade tributária e dos seus corolários de igualdade perante os encargos públicos e da tributação de acordo com a capacidade contributiva.” (sublinhado nosso).
Dúvidas não sobram de que a AT não logrou provar que tenha havido dissipação do património da “B............”, devedora principal no processo de execução fiscal, em resultado da conduta do contabilista certificado, nem nos autos foi carreada qualquer elemento que o comprove, sendo indevida a asserção contida no acórdão de que o contabilista não deveria ter enviado as declarações fiscais da SDO porque “sabia (ou devia saber) que não tinham aderência à realidade” ou então devia tê-las substituído não se objectivando como e em que medida o TOC agiu para tornar a prestação impossível por parte do executado originário.
Efectivamente, nesse âmbito, a mera invocação da existência de contas de disponibilidade de caixa e banco superiores a € 3.000.000,00 não prova que existissem estes meios mas apenas que estavam registados na contabilidade (e já anteriormente à entrada em funções como TOC do Recorrente) e, se tal não bastasse, competiria ainda provar que a dissipação do património resultou da acção do contabilista certificado.
Também não colhe a tese adoptada no acórdão recorrido de que o TOC não devia ter entregado as declarações fiscais ou deveria tê-las substituído (“...sem que retirasse ou substituísse as mesmas, como lhe competia.”), pois, concordando ainda com o recorrente, em termos naturalísticos não ocorre a susceptibilidade de tal comportamento propiciar a não dissipação do património e transmutar o devedor principal num contribuinte diligente e cumpridor.
Tudo aponta para que no acórdão recorrido se operou com “presunções” nas circunstâncias destacadas no alegatório do recorrente, nas conclusões LX) e seguintes, a saber:
- ao imputar ao TOC uma responsabilidade de terceiros apenas porque, entregou três declarações fiscais, sustentadas nos documentos e informações prestadas pelo seu próprio cliente;
-quando, sem indicar qual o facto provado em que se esteia, afirma que o Recorrente “aceitou o resultado do incumprimento fiscal e a posterior situação de insuficiência patrimonial da SDO”, quando é certo, num juízo de normalidade, que “aceitar (...) a posterior situação de insuficiência patrimonial da SDO” não cria a se tal insuficiência, tanto mais que não se assentou no probatório que a devedora originária B............ tinha bens para entregar ao Estado e dissipou-os por actuação do Contabilista.
-das “diligências” que o Acórdão sob censura, oficiosamente, aditou ao probatório sob as alíneas “BB)” e “CC)”, o que na realidade decorre é que a C............, cliente da devedora originária, pagou 4 milhões e seiscentos mil euros até ao final de 2011;
-os documentos aportados nas diligências de ARRESTO efectuadas pela AT (docs do Processo de Execução Fiscal) não identificam, em qualquer momento, que os valores recebidos pela B............ no período compreendido de 06/10/2011 a 01/12/2011, os quais ascendem ao valor de 4.604.472,44 €, e posteriores retiradas pela B............, tiveram qualquer intervenção por parte do Oponente, no seu recebimento e/ou retirada posterior, quando tal valor de 4.604.472,44€ era mais que suficiente para resolver qualquer pagamento fiscal pendente da devedora originária.
-não se encontra provado que foram contabilizados pelo Oponente os referidos movimentos de recebimento e/ou saída bancária da empresa B............, no período em causa, pois, a última data de registo contabilístico na B............ que foi efetuada pelo Recorrente foi na data de 04/10/2011, com a contabilização da factura de serviços n° 11025 da B............ à sua cliente C............, dado que o órgão de gestão da empresa não remeteu mais documentos à entidade patronal do Recorrente posteriores a essa data - cfr. Alegação 190ª, que se dá por reproduzida, e Página 62 do processo de execução fiscal, esta para a qual remetem os factos aditados oficiosamente pelo TCA.
Presunções são as ilações que a lei, ou o julgador, tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, como dispõe a norma do art.º 349.º do C.C.
Conforme a indução ou inferência é feita pela própria lei, que do facto conhecido presume a existência do facto desconhecido, sem dependência de apreciação do juiz, ou é feita por este através das regras da vida (id quod plerumque accidit),a presunção diz-se legal, ou natural (simples ou judicial) - cfr. Anselmo de Castro, Direito Processual Civil, 1960-1961, págs. 485 e 486.
A presunção, de que se fala e que terá sido operada no acórdão recorrido, como já demonstrado, não é uma presunção legal (estabelecida expressa e directamente na lei), mas uma presunção simples, apenas natural ou judicial, que tem por base os dados da experiência comum - e que é admitida só nos casos e nos termos em que é admitida a prova testemunhal, de acordo com o disposto no art.º 351.º do C. C.
Por isso, não vale a regra inserta no n.º 2 do art.º 350.º do C.C., própria para as presunções legais - as quais, para serem destruídas (nos casos em que a lei o permite) têm de ser ilididas mediante prova em contrário.
No caso de presunção natural, não é necessário fazer a prova do contrário do facto presumido. Não é necessário que o oponente, desfavorecido com tal presunção, faça prova do não incumprimento das regras a que estava adstrito como contabilista como causa da insuficiência patrimonial.
Em casos de presunção simples ou natural, basta abalar a convicção resultante da presunção, e não, necessariamente, fazer prova do contrário do facto a que ela conduz, bastava a mera dúvida criada, embora se admita a sua ilisão por qualquer meio de prova, é suficiente a contraprova e não sendo exigível a prova do contrário (cfr. arts. 350.° e 351.° do CC).
Ora, tendo em conta a preponderância no contencioso tributário dos princípios do inquisitório e da livre apreciação da prova e da aplicação processual, não surge aqui um ónus da prova rigorosamente subjectivo, formal ou de produção, antes se revela sobretudo um ónus da prova substancial, objectivo ou material no sentido de que a decisão tem de desfavorecer quem, embora não tenha a incumbência de provar, não consiga ver materialmente provados os factos em que assenta a sua posição.
Por assim ser, um non liquet quanto à prova dos indicados factos determina que a decisão judicial desfavoreça a posição da parte que sairia favorecida com a demonstração da sua ocorrência, no caso, a Fazenda Pública, julgando-se não verificada a ocorrência.
Assim, ao oponente bastava abalar (como abalou) a convicção resultante da presunção, não lhe sendo exigido provar o contrário mas apenas opor contraprova, nos termos do artigo 346.º do Código Civil.
O que vale por dizer que era à AT que incumbia provar que o património da B............ se tornou insuficiente para o pagamento da dívida exequenda, e que por culpa do TOC o mesmo se dissipou, o que obviamente não se verifica ou, pelo menos, é duvidoso que se haja verificado e, assim, tem de admitir-se que que a conduta da B............ foi totalmente independente e autónoma do TOC, e trata-se de uma atitude exclusiva e deliberada dos órgãos de gestão dessa empresa.
Em suma: era exigível que fosse dado como provado que o património da Sociedade Devedora Originária se tornou insuficiente para o pagamento da dívida exequenda e que se dissipou por acção ou omissão do revertido em contravenção do seus deveres incidentes sobre a regularização técnica nas áreas contabilísticas e fiscais ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos e tal não tem qualquer reflexo no probatório, pelo que, como bem refere o recorrente, o Acórdão em crise contrariou assim, a ratio da própria norma da LGT.
Destarte, tem-se por certo que o acórdão errou quanto ao juízo de imputação ao revertido do dano causado ao Estado, porquanto dos autos também não resulta provado que o património da Sociedade Devedora Originária se tornou insuficiente para o pagamento da dívida exequenda e que se dissipou por qualquer conduta culposa do revertido, seu Contabilista durante o intervalo temporal das suas funções.

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Por assim ser, é assertiva a Sentença proferida nos presentes autos, mormente quando afirma que a “Autoridade Tributária não logrou cumprir o ónus da prova da violação culposa ou negligente por banda do oponente dos deveres de regularização técnicas nas áreas contabilísticas e fiscais ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos, mormente que o Oponente podia e devia ter precavido a contabilização das faturas que não tinham operações verdadeiras.”
Assim e à guisa de conclusão, quanto à violação de deveres profissionais, contrariamente ao que se considerou no acórdão recorrido, afigura-se-nos que nada de relevante e decisivo resulta evidenciado dos elementos dos autos juntos pela AT, pois, como bem se reflecte na sentença recorrida, examinado o teor do despacho de reversão dele não se antolha que a AT haja imputado ao Oponente qualquer actuação dolosa ou negligente no cumprimento das suas funções e da qual se extraia a violação de deveres, nos termos enunciados no n.º 3 do artigo 24.º da LGT.
Como bem se salienta na sentença, resulta do despacho de reversão que a Administração Tributária considera que o Oponente aceitou “cegamente” todos os documentos relevantes para efeitos de apuramento de proveitos e custos que as sociedades lhe faziam chegar, o que violaria, se bem se interpreta, o disposto nos artigos 2.º e 3.º, n.º 1, alínea c) do Código Deontológico dos Técnicos Oficiais de Contas e os artigos 6.º, n.º 3 e 51.º, n.º 7 do Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 452/99, de 5/11, na redacção vigente à data dos factos sub judice).
Ora, sufragando a valoração feita na sentença, a mera invocação genérica de normativos legais não é bastante para dizer que, ao actuar de tal forma, violou os seus deveres profissionais e deontológicos, incumbindo à AT demonstrar que o TOC violou de forma directa ou indirecta os seus deveres profissionais, o que não se considera resultar inequivocamente do despacho de reversão ou ter resultado demonstrado nos presentes autos.
Ainda se sufraga a afirmação feita na sentença de que o projecto do despacho de reversão, como da sua mera leitura dimana com meridiana clareza, colocava o seu maior enfoque no registo dos documentos no programa SAF-T-PT e a identidade dos campos “data de gravação” e “data do documento”, o que vem a ser mantido pelo despacho de reversão (alíneas R) e U) do probatório). Todavia, tal circunstância ficou a dever-se a um erro informático, que não é imputável ao Oponente ou à sociedade devedora originária, tal como se comprovou em Tribunal (alínea X) e Y) do probatório).
No tocante à emissão de facturas pela D............, LDA. após se proceder ao apuramento de imposto, não resulta claro qual o dever que o Oponente violou, seja de forma negligente ou dolosa, até porque, como este alega, não é o responsável pela emissão das facturas ou pelo seu pagamento, nem a Administração Tributária alegou ou demonstrou que este tivesse qualquer intervenção nesse sentido.
Além disso, remetendo a AT para os factos que constam do relatório de inspecção tributária elaborado na sequência de ação inspectiva à B............, nele pontifica o facto aí averbado de que a sociedade tinha a contabilidade regularmente organizada, nos termos da legislação comercial e fiscal.
Assim, é patente que, excepcionadas as aludidas questões respeitantes ao ficheiro SAF-T PT, não há vislumbre de quaisquer outros factos que possam ser reconduzidos, de modo cabal, à actuação do Oponente, pelo que não se pode alicerçar neste documento a violação dolosa ou negligente dos deveres no âmbito da responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos (alínea H) do probatório).
Ainda a circunstância de o Oponente ter desempenhado funções de TOC nas três sociedades identificadas pela AT e ter servido de intérprete na escritura de constituição de duas delas, como bem se salienta na sentença, por si só e sem que tenha sido devidamente concatenada com outros factos, não permite concluir que a Administração Tributária cumpriu com o ónus da prova que sobre si impende, até porque nenhuma outra conclusão dali extraiu.
Por fim, mas não menos importante, há que enfatizar que, no decorrer do exercício de 2011, o Oponente dirigiu-se, por diversas vezes, à competente Ordem dos TOC para solicitar escusa de assinatura de declarações fiscais das sociedades H............, D............ e B............ e, bem assim, para reportar as irregularidades detectadas (alíneas B), C), D, E, F, G do probatório), e uma tal actuação só pode ser valorada como o desempenho diligente e cauteloso do exercício das suas funções, com respeito pelos normativos legais aplicáveis.
Ora, no exercício das suas funções de fiscalização o TOC apenas pode responder pela regularidade da contabilidade e escrita, mas não por eventuais omissões (de compras e/ou de vendas) à contabilidade, dito de outro modo, para responder por eventuais fluxos reais ou financeiros da sociedade à margem da contabilidade (e que a AT por via correctiva tenha reintegrado na contabilidade), necessário era, desde logo, que a AT fizesse prova do conhecimento pelo TOC dessas operações económicas levadas a cabo pela SDO à margem da contabilidade, o que não resulta minimamente demonstrado.
É, pois, patente que a AT não conseguiu satisfazer o ónus probatório da violação culposa ou negligente por parte do Oponente e ora recorrente dos deveres no campo da responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos, mormente que o Oponente podia e devia ter precavido a contabilização de facturas que não titulavam operações verdadeiras. Significa que não se verifica provada a existência de facto ilícito consubstanciado em acção e/ou omissão dos deveres que impendiam sobre o oponente atinentes à regularidade técnica traduzido/s na provocação de danos na esfera jurídica da Fazenda.
Ora, resultando não provado o primeiro dos pressupostos para a constituição do direito da AT ao ressarcimento dos prejuízos a que se arroga, atento o regime da responsabilidade subsidiária ex abundantis supra explanado, e atenta a necessidade de verificação cumulativa dos respectivos pressupostos, tanto basta para que se conclua que assiste razão ao recorrente.
Daí que, concomitantemente, ocorra a falta dos requisitos para decretar a reversão da execução fiscal, nos termos estabelecidos no artigo 24.º, n.º 3 da LGT, o que acarreta a ilegitimidade do Oponente para a mesma determinante da extinção do processo de execução fiscal.
E a solução acabada de ditar importa a prejudicialidade do conhecimento dos restantes fundamentos recursórios.
Consequentemente, o recurso merece provimento sendo de revogar o acórdão recorrido, que concluiu pela verificação dos pressupostos da reversão previstos no n.º 3 do art.º 24.º da LGT, pois enferma do apontado erro de julgamento, e de manter a sentença na ordem jurídica.

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3. Decisão

Nesta conformidade, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em:
a) -Ordenar o desentranhamento da peça cognominada “Apelações Complementares” apresentada pelo recorrente, ao qual deve ser devolvida, condenando-se nas custas do incidente a que deu causa em 1,5 UCs.;
b) -Conceder provimento ao recurso, revogar o acórdão recorrido e manter na ordem jurídica a sentença que julgou procedente a oposição determinando a extinção do processo de execução fiscal contra o revertido.
c) As custas do processo são da responsabilidade da Fazenda Pública (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, ex vi do artigo 2.º, alínea e) do CPPT e artigo 6.º, n.º 1 e tabela I do Regulamento das Custas Processuais) mas, nos termos do art. 6.º n.º 7 do R.C.P, dispensa-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça, correspondente ao valor da causa, na parcela excedente a €275.000, atento o grau de complexidade do processado, a conduta dos litigantes e a utilidade económica das pretensões das partes.
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Lisboa, 8 de Junho de 2022. - José Gomes Correia (relator) - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro (voto apenas a decisão).