Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0415/12.1BEBJA 01361/17
Data do Acordão:06/08/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:OPOSIÇÃO
RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
TÉCNICOS OFICIAIS DE CONTAS
ESTATUTO
ORDEM DOS REVISORES OFICIAIS DE CONTAS
ÓNUS DE PROVA
Sumário: I – No artº.24º, nº.3, da L.G.T., na redacção decorrente da Lei nº 60-A/2005, de 30/12 - ESTATUTO DA ORDEM DOS TÉCNICOS OFICIAIS DE CONTAS – consagra-se a atribuição de uma responsabilidade subsidiária aos contabilistas certificados, a qual esteada fundamentalmente na violação da legis artis.
II - Essa responsabilidade assenta na verificação cumulativa dos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil, que são o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o prejuízo ou dano e o nexo de causalidade entre este e o dano.
III - A responsabilidade assim instituída pressupõe que o contabilista certificado é responsável pela regularidade contabilística do sujeito passivo e que em casos de falha no cumprimento desse dever, deve assumir a correspondente responsabilidade pelas dívidas deixadas de cobrar, por efeito de tal violação dos precisos deveres do ofício listados por esta disposição.
IV – Os meros erros técnicos não envolvem a responsabilidade do contabilista a qual só deve ser activada quando as falhas assentem numa violação tão profunda do normativo contabilístico que ponha em causa a própria função de que a contabilidade foi investida pelo ordenamento fiscal.
V - O nomeado regime não traduz - contrariamente ao que a alteração legislativa que eliminou a expressão “violação dolosa” e a introduzida pela Lei n.º 7/2021 de 26 de Fevereiro que a reintroduziu parece pressupor - uma verdadeira modalidade de responsabilidade objectiva. A responsabilidade continua a ser, ainda, subjectiva: o requisito da culpa continua a ser objecto de consideração pela hipótese legal.
VI - Deve considerar-se que a nova redacção conferida ao n.º 3 do artigo 24.º da Lei Geral Tributária pela Lei nº 7/2021, de 26.02, possui cariz inovador e não interpretativo, uma vez que a solução do direito anterior não era controversa, sendo clara a intenção do legislador em contemplar as situações de actuações dolosa e negligente.
VII - A aplicação retroactiva da LN mais favorável (aqui sob a forma de eliminação de “infracção” anteriormente “punível”, a que se reporta o invocado artigo 2.º, n.º 2, do Código Penal) apenas deve ser reconhecida em relação à responsabilidade sancionatória propriamente dita (crimes e contra-ordenações fiscais), mas já não quanto à responsabilidade subsidiária de que se trata nos autos – e na medida em que só a primeira é equiparável à responsabilidade criminal, sendo por isso susceptível de beneficiar do regime emergente das citadas disposições da Constituição e do Código Penal. Logo, o princípio da aplicação da lei penal mais favorável não tem evidente aplicação em matéria de responsabilidade dos contabilistas certificados, pois nos encontramos num domínio “sancionatório” que não se confunde com o da responsabilidade criminal.
VIII - A culpa de que se fala é determinada não por referência ao incumprimento da obrigação fiscal, mas por referência ao incumprimento dos deveres que impendem sobre o contabilista, quanto à organização e regularidade da contabilidade do sujeito passivo.
IX - Isto significa que o contabilista certificado deverá ao menos alertar expressamente o sujeito passivo para a impossibilidade de cumprir as suas tarefas legais, sempre que este último impeça, obstaculize ou dificulte o cumprimento por aquele das tarefas que lhe são legalmente incumbidas, ou usando outras fórmulas que demonstrem a diligência e zelo no cumprimento da lex artis para que a sua culpa seja afastada (não ser imputável), deste modo o eximindo da respectiva responsabilidade fiscal.
X – Assim, a efectivação da responsabilidade subsidiária dos Técnicos Oficias de Contas/TOC pelas dívidas tributárias da sociedade devedora originária (cfr. artigo 24.º/3, da LGT) depende da alegação e prova pela AT de que é imputável ao agente o facto ilícito e de que existe nexo de causalidade entre este e os danos ocasionados.
XI - É exigível a comprovação da ocorrência de condutas violadoras dos deveres funcionais que sejam imputáveis ao TOC, a título de negligência ou dolo.
XII - Impõe-se, ainda, a verificação de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento ilícito do técnico oficial de contas e o incumprimento fiscal do contribuinte em relação ao qual o TOC exerce as suas funções profissionais.
XIII - Não resultando, no caso posto, demonstrada a ocorrência de condutas ilícitas por parte do revertido, não há lugar à responsabilidade subsidiária.
XIV -Concomitantemente, ocorre a falta dos requisitos para decretar a reversão da execução fiscal, nos termos estabelecidos no artigo 24.º, n.º 3 da LGT, o que acarreta a ilegitimidade do Oponente para a mesma determinante da extinção do processo de execução fiscal.
Nº Convencional:JSTA00071476
Nº do Documento:SA2202206080415/12
Data de Entrada:05/21/2019
Recorrente:A............
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Legislação Nacional:Art. 24.º, n.º 3, da LGT
Art. 05.º, n.º 3, do CPC/2013
Arts. 12.º, 13.º, 350.º e 351.º do CCiv/66
Art. 02.º do CP
Art. 29.º, n.º 4, da CRP
Aditamento: