Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0935/11
Data do Acordão:11/21/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:PEDIDO DE ACLARAÇÃO DE ACORDÃO
Sumário:I - O esclarecimento ou aclaração de uma decisão judicial previsto nos arts. 669.º, n.º 1, alínea a), do CPC, destina-se exclusivamente a esclarecer alguma obscuridade ou ambiguidade que ele contenha, sendo que ele será obscuro se contiver alguma passagem cujo sentido não se compreende e ambíguo quando permita interpretações diferentes.

II - O pedido de aclaração não serve para obter uma nova fundamentação, mais desenvolvida ou pormenorizada, como também não serve para confrontar o tribunal com pretensos erros de julgamento, exprimindo discordância ou inconformismo, mais ou menos velados, perante as soluções que adoptou.

Nº Convencional:JSTA000P14889
Nº do Documento:SA2201211210935
Data de Entrada:10/21/2011
Recorrente:A......
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: 1. RELATÓRIO

1.1 A……… (adiante Recorrente ou Requerente), notificado do acórdão proferido por este Supremo Tribunal Administrativo que negou provimento ao recurso jurisdicional por ele interposto da decisão que, julgando verificada a excepção dilatória inominada decorrente da falta de pagamento da taxa de justiça inicial, absolveu da instância a Fazenda Pública na oposição à execução fiscal por ele deduzida, veio pedir a aclaração daquele aresto, invocando que o mesmo enferma de contradição e obscuridade.

1.2 Notificada do requerimento, a Fazenda Pública não se pronunciou.

1.3 Cumpre apreciar e decidir.


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2. FUNDAMENTOS

2.1 DO PEDIDO DE ACLARAÇÃO

2.1.1 O art. 666.º do Código de Processo Civil (CPC) dispõe que «[p]roferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa» (cfr. n.º 1), sendo que «[é] lícito, porém, ao juiz rectificar erros materiais, suprir nulidades, esclarecer dúvidas existentes na sentença e reformá-la, nos termos dos artigos seguintes» (cfr. n.º 2). A referida norma é aplicável à generalidade das decisões judiciais (cfr. n.º 3 do referido art. 666.º do CPC) e também aos acórdãos dos tribunais superiores (cfr. n.º 2 do art. 716.º e art. 732.º do CPC).
Em conformidade e concretizando a possibilidade de esclarecimento de dúvidas existentes na decisão judicial, o art. 669.º, n.º 1, alínea a), do CPC, permite que qualquer das partes solicite ao tribunal que proferiu a decisão judicial (Embora o artigo refira apenas a sentença, vem-se entendendo que é aplicável a todas as decisões judiciais.) «[o] esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade da decisão ou dos seus fundamentos».
De acordo com os ensinamentos de ALBERTO DOS REIS, «[s]e a sentença contiver alguma obscuridade ou ambiguidade, pode pedir-se a sua aclaração. A sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. É evidente que em última análise a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade. Se determinado passo da sentença é susceptível de duas interpretações diversas, não se sabe ao certo, qual o pensamento do juiz» (Código de Processo Civil Anotado, volume V, pág. 151.).
Como é manifesto, decisivo para averiguar da verificação da obscuridade ou ambiguidade apontadas a uma decisão judicial não será a qualificação feita pelo requerente do pedido de aclaração ou esclarecimento; o que importa é verificar se os vícios ou incorrecções alegados se podem reconduzir àquelas espécies e se o que o requerente pretende é verdadeiramente uma clarificação, uma aclaração, do teor da decisão.

2.1.2 No caso sub judice, o Requerente alega que o acórdão aclarando enferma de contradição e de obscuridade.
Em abstracto, apenas a obscuridade pode servir de fundamento ao pedido de aclaração. Já a contradição, como vício respeitante à estrutura formal do acórdão, apenas poderá integrar a nulidade prevista no art. 125.º, n.º 1, do CPPT, a demandar o respectivo suprimento, se revestir a natureza de «contradição entre os fundamentos e a decisão».
Note-se que, em sede da interpretação e aplicação do direito, não estamos sujeitos à alegação das partes (cf. art. 664.º do CPC), motivo por que nada obsta a (e, pelo contrário, impõe-se) que os argumentos aduzidos pelo Requerente sejam apreciados à luz do enquadramento jurídico tido por correcto, ainda que diverso do que lhe foi dado.
No entanto, se bem atentarmos na alegação do Requerente, a invocada contradição não é entre os fundamentos e a decisão, mas entre os fundamentos utilizados pelo acórdão. Ora, só aquela, e já não esta, pode constituir nulidade, enquanto vício formal do aresto (Neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume II, anotação 9 ao art. 125.º, pág. 362.).
A invocada contradição, se bem interpretamos a alegação do Requerente, resulta numa ambiguidade assacada ao acórdão, na medida em que não permitiria compreender se no discurso fundamentador seguido no mesmo se considerou que a questão da formação do deferimento tácito no que respeita ao pedido de apoio judiciário estava ou não devolvida ao tribunal. O Requerente considera que numa passagem do acórdão se afirma que «a questão da formação do deferimento tácito não estava devolvida ao tribunal» enquanto noutra passagem se diz precisamente o contrário, «que a questão estava devolvida ao tribunal e que este, aliás, se pronunciou sobre a mesma».
Assim, conheceremos do requerimento à luz esta dupla óptica, que se nos afigura ser a do Requerente: que o acórdão enferma de ambiguidade, na medida em que afirma, simultaneamente, que a questão da formação do deferimento tácito do pedido de apoio judiciário estava devolvida ao tribunal (que sobre ela se pronunciou) e que não estava; e que o acórdão enferma de obscuridade, porque não se compreende o motivo por que considerou que aquela questão não estava devolvida ao tribunal.

2.1.3 Salvo o devido respeito, o acórdão não enferma de contradição alguma que dificulte ou impeça a compreensão dos respectivos fundamentos.
Contrariamente ao que sustenta o Requerente, nunca no acórdão se afirmou que a questão da formação do deferimento tácito estava devolvida ao tribunal.
O que se disse no acórdão, designadamente a págs. 12 (na passagem referida pelo Requerente na tentativa de demonstrar a invocada contradição), conhecendo da nulidade por omissão de pronúncia que o Recorrente imputou à sentença recorrida e explicando por que se entendia que essa nulidade não se verificava, foi que «em face da alegação do recorrente (de que, tendo sido devolvida ao Tribunal a questão do deferimento tácito, este tem o poder e o dever de se pronunciar sobre ela, sendo irrelevantes quaisquer pronúncias que a Administração Pública entenda fazer, pois não podem prevalecer sobre o entendimento judicial que sobre a mesma vier a recair), a decisão recorrida considerou, por um lado, que tal acto (tácito) de deferimento pode ser revogado por acto expresso de indeferimento, por parte da entidade administrativa competente e que, no caso, tal sucedeu e, por outro lado, que não tendo sido impugnada judicialmente a decisão de indeferimento (expresso) do pedido de protecção jurídica, não pode, nesta sede de oposição à execução fiscal, o oponente pretender ver apreciado esse acto, por a oposição não ser o meio processual idóneo para obter tal desiderato» e que «esta pronúncia, nos termos que ficaram expressos, tem-se como suficiente e legal para efeitos das exigências decorrentes da al. d) do n.º 1 do art. 668.º do CPC».
Ou seja, em trecho algum do acórdão, designadamente no que vimos de citar (e que foi aquele em que o Requerente se estribou para fundamentar a invocada contradição), se afirmou que tinha sido devolvida ao tribunal a questão do deferimento tácito. O que aí ficou dito foi que o Recorrente alegava que tinha sido devolvida ao tribunal essa questão («em face da alegação do recorrente, de que tendo sido devolvida ao Tribunal a questão do deferimento tácito»), o que é substancialmente diverso: não pode imputar-se ao Tribunal o entendimento que este diz expressamente ser o do Recorrente.
Salvo o devido respeito, a invocada contradição só se compreende em face de uma menos correcta interpretação do acórdão, que, a esse propósito, é bem claro.
Nunca poderia, pois, proceder o pedido de aclaração com este fundamento.

2.1.4 Quanto à invocada obscuridade do acórdão no que respeita à questão de se ter ou não devolvido ao tribunal a apreciação do deferimento tácito do pedido de apoio judiciário, que o Requerente entende ser «o ponto essencial deste processo», sustenta o Requerente que este Supremo Tribunal Administrativo «a ignorou olimpicamente» e “arrumou” «de uma penada», pois «dizer que a autoridade administrativa podia revogar o deferimento tácito anterior, removendo-o da ordem jurídica (o que, além de ser um truísmo jurídico, é apenas válido fora do contexto em que isso sucedeu no caso sub judicio), foi apenas um modo de liquidar a questão, mas que na verdade não respondeu aos fundamentos do recorrente expressos nas conclusões 2ª a 6ª das suas alegações, que se mantêm nos autos, esquecidas e agonizantes».
Como resulta da leitura da alegação do Requerente, a mesma não pode subsumir-se à obscuridade do acórdão. Na verdade, o Requerente não imputa, expressa ou implicitamente, a qualquer passagem do acórdão ininteligibilidade ou susceptibilidade de interpretação em sentidos diferentes; o Requerente não invoca qualquer dúvida motivada pelo teor do acórdão, relativamente ao qual não aponta qualquer passagem, qualquer expressão, nem sequer qualquer palavra que não se entenda (ininteligível ou obscura) ou que permita interpretações em sentidos diversos (ambígua).
Ora, como deixámos já dito, a obscuridade apenas poderia resultar da ininteligibilidade de alguma passagem do acórdão.
O que o Recorrente parece esgrimir é a nulidade do acórdão por falta de fundamentação [cfr. art. 125.º, n.º 1, do CPPT e art. 668.º, n.º 1, alínea b) do CPC], como resulta da sua alegação de que «o ponto essencial do processo», «[o] Supremo Tribunal vem afinal a “arrumá-lo” de uma penada».
Mas, se assim fosse, sempre haveríamos de concluir pela não verificação da nulidade. A falta de fundamentação que pode erigir-se em nulidade é a falta absoluta de fundamentação. Como ensina ALBERTO DOS REIS, «[h]á que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade» (Código de Processo Civil Anotado, volume V, pág. 140.).
Manifestamente, a situação dos autos não é de nulidade por falta de fundamentação. No acórdão disse-se por que se considerava que a questão do deferimento tácito não estava devolvida ao tribunal. Recordemos aqui o que aí ficou dito:

«[…] Como se disse, o recorrente entende que, por ter havido deferimento tácito, o ISS, IP., já não podia indeferir expressamente o pedido de apoio judiciário, sendo o acto de revogação (do acto tácito) nulo, por usurpação de poder judicial - art. 133º, nº 2, al. a), do CPA.
Vejamos.
[…]
Dispõe o art. 25º da Lei nº 34/2004, de 29/7:
«1 - O prazo para a conclusão do procedimento administrativo e decisão sobre o pedido de protecção jurídica é de 30 dias (…).
2 - Decorrido o prazo referido no número anterior sem que tenha sido proferida uma decisão, considera-se tacitamente deferido e concedido o pedido de protecção jurídica.
3 - No caso previsto no número anterior é suficiente a menção em tribunal da formação do acto tácito (…)»
[…] Confrontando o disposto neste normativo com o regime previsto no CPA para os actos tácitos, decorre, desde logo, uma especialidade face ao regime regra constante deste último compêndio: este fixa, como regime regra, o prazo de 90 dias para prolação de decisão do procedimento administrativo e para a consequente presunção do deferimento (nº 2 do art. 108º do CPA) ou do indeferimento (art. 109º do CPA) tácito, caso não tenha sido proferida decisão naquele prazo.
Mas, para além desta especialidade quanto ao prazo em que se pode formar o deferimento tácito relativamente ao pedido de apoio judiciário, nenhum outro regime especial resulta da Lei nº 34/2004 que, nesta matéria, afaste as demais regras previstas no CPA. Nomeadamente as que prevêem a possibilidade de prolação de acto expresso de indeferimento por parte da entidade administrativa sobre a pretensão formulada pelo interessado, revogando o deferimento tácito (cfr. arts. 135º, 136º, 138º, 139º, 140º, 141º, 142º, 143º, 144º, 145º todos do CPA), aplicáveis por força do disposto no art. 37º da Lei nº 34/04. Como apontam Mário Esteves de Oliveira et al. (Código do Procedimento Administrativo, Anotado, Vol. I, Almedina, 1993, comentário X ao art. 108º, p. 556) o interessado pode «exigir do órgão requerido - e de terceiros - o respeito pelo acto tácito praticado ou produzido, ou seja, os efeitos jurídicos consequentes dessa aprovação ou autorização: (…) Por outro lado, se o órgão requerido quiser indeferir a pretensão formulada, depois de decorrido o prazo do nº 2, tal acto é uma revogação de um anterior acto (tácito) constitutivo - pelo menos, nos casos de procedimentos particulares -, só podendo, portanto, ocorrer com fundamento em ilegalidade e dentro do prazo previsto por lei para o efeito.»
Volvendo aos autos, foi isso precisamente que sucedeu: o ISS, IP., procedeu à revogação expressa da pretensão (pedido de protecção jurídica) que o recorrente havia formulado.
Ora, a revogação de actos administrativos é, aliás, permitida nos termos dos arts. 140º e 141º do CPA, sendo que mesmo os actos revogatórios de actos constitutivos de direitos são válidos, desde que proferidos dentro do prazo de um ano e com fundamento em ilegalidade, acrescendo, ainda, no caso, que também o disposto no nº 3 do art. 10º e no art. 26º da Lei 34/2004, apontam para a possibilidade dessa revogação.
Em suma, tendo sido proferido acto expresso de indeferimento do pedido de apoio judiciário, o acto tácito de deferimento deixou de ser invocável, por ter desaparecido da ordem jurídica, subsistindo apenas o acto expresso de indeferimento [daí que seja também irrelevante, para o caso, a questão de saber se chegou, ou não, a formar-se o acto tácito de deferimento (veja-se que na comunicação remetida pelo ISS, IP., de 10/5/2010 – fls. 39 a 41 [que correspondem, no presente processo, a fls. 67 a 70] – se refere que «O prazo de produção do deferimento tácito do pedido … encontra-se suspenso, nos termos do nº 3 do art. 1º da Portaria nº 1085-A/2004, de 31 de Agosto», norma regulamentar que o oponente alega, aliás, ter sido revogada – cfr. requerimento de fls. 47 [que corresponde, no presente processo, a fls. 73])].
O que, no entanto, não significa que este acto expresso não possa ser ilegal e que, portanto, o acto tácito esteja afastado definitivamente da ordem jurídica.
Todavia, se, por assim o entender, o interessado (no caso o oponente) pretendesse anular este acto de indeferimento expresso, deveria, então, tê-lo impugnado, em sede própria (e não na presente oposição, como bem se diz na decisão recorrida), invocando a respectiva invalidade, nomeadamente, se fosse esse o caso, por ter sido proferido para além do prazo de um ano ou por não se verificar a ilegalidade imputada ao acto revogado.
Daí que, ao contrário do alegado pelo recorrente (cfr. Conclusões 20ª e 21ª) também não possa, neste âmbito, invocar-se vício de nulidade (por usurpação de poder judicial – al. a) do nº 2 do art. 133º do CPA) ao acto expresso de indeferimento praticado pelo ISS, IP. Por um lado, a questão da formação do deferimento tácito não estava devolvida ao tribunal e, por outro lado, perante a revogação expressa do pedido de apoio judiciário (que afecta necessariamente o anterior acto tácito de deferimento) e perante a constatação desse facto em sede da presente oposição (processo onde o recorrente juntara, com a respectiva petição inicial, o documento comprovativo da apresentação do pedido de concessão de apoio judiciário – cfr. nº 2 do art. 24º da Lei nº 34/2004, de 29/7 e o nº 3 do art. 467º do CPC) aqui apenas se impunha notificar o recorrente para proceder ao pagamento da taxa de justiça inicial devida, como decorre do disposto no nº 3 do mesmo art. 24º – cfr. também o disposto no nº 4 do art. 29º da mesma Lei.
Neste contexto e dado que, como vem provado, o recorrente/oponente não pagou, depois de notificado, a taxa de justiça inicial devida e cujo pagamento deveria ter sido efectuado no prazo de 10 dias a contar da notificação da decisão de indeferimento do pedido de apoio judiciário que formulara (cfr. o nº 3 do art. 24º da citada Lei nº 34/2004, de 29/7 e o nº 5 do art. 467º do CPC), a decisão recorrida, ao julgar procedente a excepção dilatória inominada suscitada pelo MP e ao, consequentemente, determinar a absolvição da Fazenda Pública da presente instância, à luz do disposto na al. e) do art. 288º e no nº 5 do citado art. 467º, ambos do CPC, decidiu de acordo com a lei aplicável e não enferma, portanto, do erro de julgamento que o recorrente lhe imputa».
Em todo o caso, porque os articulados devem ser interpretados com o sentido mais favorável aos interesses das partes, vamos considerar que o Requerente alega que a fundamentação não permite compreender por que motivo este Supremo Tribunal Administrativo entendeu que a questão do deferimento tácito do pedido de apoio judiciário não se tinha devolvido ao tribunal.
Mas, ainda assim, não podemos concordar com o Requerente. A nosso ver, ficou bem claro o motivo por que entendíamos – e continuamos a entender – que a referida questão não se tinha devolvido ao tribunal: é que o Instituto da Segurança Social, I.P. (ISS, I.P.) indeferiu expressamente o pedido de apoio judiciário, motivo por que o acto tácito deixou de ser invocável, por ter desaparecido da ordem jurídica, sendo que apenas o acto de indeferimento expresso poderia ter sido atacado na sede própria, que não na presente oposição à execução fiscal; por isso, não pode falar-se em usurpação do poder judicial pelo ISS, I.P.
A nosso ver, e salvo o devido respeito, é bem claro o motivo por que entendemos que a questão não se devolveu ao tribunal, sendo que o pedido de aclaração não serve para obter uma nova fundamentação, nem sequer para obter uma fundamentação mais desenvolvida ou pormenorizada.
Se bem interpretamos a alegação aduzida pelo Requerente, o que sucede é que ele discorda da solução adoptada no acórdão relativamente a essa questão. Mas, como resulta do que deixámos já dito, o pedido de aclaração não serve para «confrontar o tribunal com pretensos erros de julgamento, exprimindo assim a sua discordância ou inconformismo – mais ou menos velados – perante as soluções que adoptou» (Cf. o acórdão da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, de 3 de Março de 2004, proferido no recurso com o n.º 385/03, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Dezembro de 2004 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2004/32113.pdf), págs. 1677 a 1679, com texto integral também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/e7067dd7e528ac6a80256e54005303e5?OpenDocument.). O pedido de esclarecimento e dúvidas, impressivamente denominado aclaração, destina-se a «iluminar algum ponto obscuro da decisão, através dela [aclaração] apenas se pode corrigir a forma de expressão e não modificar o seu alcance ou o seu conteúdo» (FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 8.ª edição, pág. 50.).
Ou seja, porque o requerimento de aclaração/esclarecimento só pode ser atendido no caso de se constatar a existência de um vício que prejudique a compreensão do acórdão (Cfr. o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 5 de Julho 2012, proferido no processo n.º 327/10, ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/2c1acbb69c231a7680257a3a003a06ba?OpenDocument. ) , o pedido de aclaração também não pode proceder com este fundamento.

2.2 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - O esclarecimento ou aclaração de uma decisão judicial previsto nos arts. 669.º, n.º 1, alínea a), do CPC, destina-se exclusivamente a esclarecer alguma obscuridade ou ambiguidade que ele contenha, sendo que ele será obscuro se contiver alguma passagem cujo sentido não se compreende e ambíguo quando permita interpretações diferentes.
II - O pedido de aclaração não serve para obter uma nova fundamentação, mais desenvolvida ou pormenorizada, como também não serve para confrontar o tribunal com pretensos erros de julgamento, exprimindo discordância ou inconformismo, mais ou menos velados, perante as soluções que adoptou.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência (como o impõe o n.º 2 do art. 719.º do CPC), indeferir o pedido de aclaração do acórdão.

Custas pelo Requerente.


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Lisboa, 21 de Novembro de 2012. - Francisco Rothes (relator) - Fernanda Maçãs - Casimiro Gonçalves.