Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:040/13
Data do Acordão:01/30/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
SUSPENSÃO
NOTIFICAÇÃO DO EXECUTADO
MANDATÁRIO JUDICIAL
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
PRESTAÇÃO DE GARANTIA
PRAZO
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:I – A execução fiscal, nos casos em que foi admitida liminarmente a oposição, não deve prosseguir contra o oponente antes de esgotado o prazo que a lei lhe concede para garantir o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, devendo o mesmo ser notificado para o efeito (cfr. art. 169.º, n.ºs 1, 6 e 9 do CPPT).

II – Se o executado/oponente constituiu mandatário judicial quando da apresentação da oposição, a notificação para prestar garantia deve ser efectuada na pessoa deste (cfr. art. 40.º, n.º 1, do CPPT), sendo ineficaz a notificação efectuada exclusivamente na pessoa do próprio executado (cfr. art. 36.º, n.º 1, do CPPT e art. 266.º, n.º 3, da CRP).

III – A ineficácia dessa notificação tem como efeito que não se abriu e, por isso, também não pode considerar-se precludido o prazo para prestação da garantia.

IV – Não estando esgotado o prazo para constituir garantia, e porque se deve considerar temporária e condicionalmente suspensa a execução fiscal até ao termo desse prazo, é ilegal a penhora entretanto efectuada.

V – A reclamação prevista no art. 276.º do CPPT é meio processual adequado para pedir a anulação com fundamento nessa ilegalidade.

Nº Convencional:JSTA00068066
Nº do Documento:SA220130130040
Data de Entrada:01/14/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF DO PORTO
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - / EXEC FISCAL / OPOSIÇÃO
Legislação Nacional:CPPT98 ART125 N1.
CPC ART660 N2 ART668 N1 B.
LGT99 ART97 N3.
CPPT98 ART98 N4 ART36 N1 ART40 N2.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 383/12.0BEPRT

1. RELATÓRIO

1.1 A……….. (a seguir Executado, Reclamante ou Recorrido), invocando o disposto nos arts. 276.º e 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), reclamou junto do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto do acto de penhora por esta diligência ter sido efectuada antes de ser notificado para prestar garantia na sequência da admissão da oposição que deduziu à execução fiscal.
Alegou, em síntese, que na sequência da oposição que deduziu, e em ordem a obter a suspensão do processo executivo, requereu ao órgão da execução fiscal a liquidação do valor a garantir. Sem que o órgão da execução fiscal lhe tenha dado resposta, fez prosseguir a execução fiscal com a penhora, o que não podia fazer sem que antes se pronunciasse sobre aquele requerimento.
O Executado conclui a reclamação formulando o seguinte pedido: «Termos em que deverá ser atendida a presente reclamação, ordenado o levantamento da penhora e o reclamante notificado para prestar garantia e por que valor o deverá fazer».

1.2 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto decidiu nos seguintes termos: «[…] julgo verificada a excepção da inadequação da forma processual e, consequentemente, convolo a petição inicial em requerimento dirigido ao OEF para aí ser apreciada». Para tanto, em resumo,

· começou por definir o objecto da reclamação, afirmando que a mesma «versa, em síntese, sobre o facto de o OEF ter efectuado a penhora de um imóvel ao executado sem previamente se ter pronunciado sobre o seu pedido de suspensão da execução, mediante a prestação de garantia, já que aquela decisão foi notificada directamente ao reclamante e não ao seu mandatário constituído»;
· depois, considerou que a notificação da decisão foi efectuada directamente ao Executado, quando o art. 40.º do CPPT impõe que o tivesse sido ao mandatário, sendo que a omissão desta formalidade constitui uma nulidade processual, nos termos do disposto no art. 201.º do Código de Processo Civil (CPC), uma vez que influencia o exame e decisão da causa;
· finalmente, considerando que essa nulidade não pode ser arguida directamente perante o tribunal e deve sê-lo perante o órgão da execução fiscal, só cabendo reclamação judicial do seu eventual indeferimento, entendeu verificar-se erro na forma de processo adoptada, pelo que, sob invocação do disposto no art. 97.º, n.º 3, da LGT e no art. 98.º, n.º 4, do CPPT, convolou a petição inicial para a forma processual que entendeu adequada, isto é, requerimento dirigido ao órgão da execução fiscal.

1.3 A Fazenda Pública não se conformou com essa sentença e dela interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando com o requerimento de interposição do recurso as respectivas alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor:
«
A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que ordenou a convolação da PI da presente reclamação em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal, no PEF registado sob o n.º 1910201009000593 e apensos, ali a correr termos.

B. Resulta dos autos 8 [8 Mormente da PI e da própria sentença de que ora se recorre] que o reclamante firmou o seu pedido, tão só, na ilegalidade da penhora efectuada pela AT, que recaiu sobre o prédio registado na matriz predial urbana de Mafamude, em Vila nova de Gaia, sob o art. 7099.º - “AM”, porquanto o aqui reclamante deduziu oposição à execução fiscal e não foi, conforme requereu, notificado para prestar garantia para efeitos de suspensão do PEF, nos termos do disposto no art. 169.º do CPPT.

C. A douta sentença de que se recorre concluiu pela convolação da PI dos presentes autos em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal para aí ser apreciada, por entender que “[t]endo o reclamante invocado a nulidade da notificação após penhora, não se verifica a sua sanação, sendo viável a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao OEF”,

D. por considerar que se “verifica (…) um erro na forma de processo adoptada”, porquanto o reclamante deveria ter solicitado a falta da notificação ao mandatário junto do órgão de execução fiscal e só do eventual indeferimento deste pedido, solicitado a intervenção do Tribunal.

E. Ab initio importa salientar que pelo conspecto da douta sentença sob recurso se constata a verificação de um erro material, de escrita, resultante de lapso manifesto, que importa rectificar, em conformidade com o disposto no art. 667.º do CPC, porquanto, a fls. 4 da douta sentença, conclui a Mma juíza do Tribunal a quo que [t]endo o reclamante invocado a nulidade da notificação após penhora, não se verifica a sua sanação9 [9 Sublinhado nosso].

F. Acontece que, pelo conspecto dos elementos tidos nos autos e da própria fundamentação da sentença sob recurso, constata-se não se encontrar em causa qualquer “notificação após penhora”, estando apenas controvertida a notificação para prestação de garantia com vista à suspensão dos autos de execução fiscal.

G. Não obstante a eventual rectificação do invocado erro material, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o sentido da decisão proferida, como a seguir se argumentará e concluirá, perfilhando o entendimento de que não é de proceder a pretensão formulada na presente reclamação, porquanto não padece o acto controvertido (a penhora do imóvel) de qualquer ilegalidade e inexistindo o sentenciado erro na forma de processo.

H. A causa de pedir e o pedido constituem elementos indispensáveis da PI, representando aquela o fundamento da pretensão de tutela jurisdicional formulada, ou seja, o facto jurídico de que emana o efeito pretendido e o pedido o efeito jurídico que se pretende com a interposição da acção.

I. A exacta formulação do pedido mostra-se determinante, na medida em que o Tribunal só conhece o que se lhe pede e na medida do que se lhe pede (cfr. art. 661.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, adiante apenas CPC), devendo a causa de pedir traduzir-se no facto jurídico em que se baseia o pedido, apresentando-se este como a sua consequência ou corolário lógico.

J. Nos presentes autos vem alegada, tão só, como causa de pedir, a ilegalidade da penhora, efectuada no âmbito do PEF, porquanto o reclamante entende que a AT não se pronunciou sobre o seu pedido de prestação de garantia com vista à suspensão dos autos de execução fiscal, uma vez que deduziu oposição, nem sequer liquidou o valor da garantia a prestar, pedindo, a final, que seja “atendida a presente reclamação, ordenado o levantamento da penhora e o reclamante notificado para prestar garantia e por que valor o deverá fazer”.

K. Não obstante, a douta sentença sob recurso decidiu no sentido da convolação da PI em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal, solicitando a nulidade da notificação efectuada na pessoa do aqui reclamante, quando deveria ter sido efectuada na pessoa do seu mandatário.

L. Porém, não resulta da alegação da causa de pedir, nem do pedido, que a notificação para prestar garantia deve ser efectuada na pessoa do seu mandatário e não na sua pessoa, alegação que constará de uma “resposta” à contestação aos presentes autos.

M. Acontece que tal requerimento (“resposta” à contestação) não foi notificado à Fazenda Pública, o que consubstancia uma nulidade processual prevista no n.º 1 do art. 201.º do CPC, uma vez que deveria ter-lhe sido notificada para que sobre a mesma se pronunciasse, querendo, e assim ficar assegurado o princípio do contraditório relativamente a essa matéria.

N. Pela análise do teor da douta sentença recorrida afigura-se que tal requerimento, apresentado pelo reclamante após notificação da contestação da Fazenda Pública não visava responder a qualquer excepção por esta deduzida, nem a qualquer prova oferecida ou questão suscitada cuja solução possa relevar para a decisão dos autos, negando o reclamante, na sua PI, ter sido notificado para prestar garantia, nunca invocando ter sido notificado pessoalmente quando devia ter sido notificado na pessoa do seu mandatário.

O. Tais factos, constantes da alegada “resposta” do reclamante e nunca notificados à Fazenda Pública, foram utilizados para a decisão da causa tal como resulta da fundamentação da sentença proferida pelo Tribunal a quo, tendo a omissão da referida notificação influência na decisão da causa, uma vez que o que foi invocado pelo reclamante na sua “resposta” foi utilizado na tomada da decisão de que ora se recorre sem que, previamente, se tivesse assegurado o princípio do contraditório, não tendo a Fazenda Pública a possibilidade de sobre eles se pronunciar.

P. Verificando-se, assim, a nulidade processual prevista no art. 201.º do CPC, tal implica a anulação dos termos subsequentes a essa omissão, bem como da própria decisão ora controvertida, sendo que a douta decisão da Mma Juíza do Tribunal a quo violou, entre outros, o predito preceito legal, bem como o art. 3.º, n.º 3 do mesmo CPC.

Q. Pelo que vem de ser dito, constata-se que a douta sentença sob recurso padece ainda de nulidade, por excesso de pronúncia, porquanto prolata sobre questão que não devia conhecer, conforme o disposto na 2.ª parte do n.º 2 do art 660.º e na al. d) do n.º 1 do art. 668.º, ambos do mesmo CPC 10 [10 Veja-se o douto acórdão do TCA Sul, de 2011/04/07, processo n.º 04506/11, disponível em www.dgsi.pt], uma vez que conhece de questão enformadora de uma concreta causa de pedir conducente à procedência da acção, que não havia sido articulada na respectiva PI e não é de conhecimento oficioso.

R. Sempre com o devido respeito pelo que assim vem decidido, entende ainda a Fazenda Pública que não pode o Tribunal a quo afirmar, como faz, que “[t]endo o reclamante invocado a nulidade da notificação após penhora, não se verifica a sua sanação, sendo viável a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal11 [11 sublinhado nosso], sem que estabeleça uma relação directa entre tais conclusões e as suas premissas, motivo pelo qual é de concluir que a sentença recorrida padece ainda de nulidade por falta de fundamentação.

Termos em que,

Deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douta decisão recorrida, com as legais consequências» (Porque usamos o itálico na transcrição, as partes que no original estavam em itálico surgem aqui em tipo normal, a fim de se respeitar o destaque que lhes foi concedido pela Recorrente.
As notas de rodapé foram transcritas no próprio texto, entre parêntesis rectos e com respeito pela numeração utilizada no original.).

1.4 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

1.5 Não foram apresentadas contra alegações.

1.6 A Juíza do Tribunal a quo, pronunciando-se sobre as nulidades que a Recorrente assacou à sentença recorrida, sustentou que «[é] a própria AF que alega, em sede de contestação, que houve notificação da decisão ao oponente, tendo o Tribunal apurado que a notificação foi efectuada na pessoa do próprio executado quando este se encontrava representado por advogado», pelo que «[a]pesar de o oponente ter respondido à contestação, a solução seria exactamente a mesma caso não o tivesse feito, ou seja, a convolação em requerimento dirigido ao OEF por se tratar de arguição de nulidade processual da execução», motivo por que «não se cometeu o vício passível de integrar a nulidade invocada».

1.7 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo e dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso.

1.8 Dispensaram-se os vistos dos Juízes adjuntos, atento o carácter urgente do processo.

1.9 As questões suscitadas pela Recorrente são as de saber

· se ocorreu nulidade processual por falta de notificação à ora Recorrente do articulado apresentado pelo Oponente após a contestação (denominado pela Recorrente «“resposta”à contestação» (cfr. conclusões L. a P.);

· se a decisão recorrida enferma de nulidade por excesso de pronúncia, na medida em que entendeu apreciar a questão da falta de notificação para prestar garantia por a notificação não ter sido efectuada na pessoa do mandatário judicial do Executado/Oponente (cf. conclusão Q.), e por falta de fundamentação, na medida em que não estabelece qualquer relação entre as premissas e a conclusão quanto à asserção que faz de que «[t]endo o reclamante invocado a nulidade da notificação após penhora, não se verifica a sua sanação, sendo viável a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal» (cfr. conclusões R. e S.);

· se a decisão recorrida incorreu em erro quando, considerando que o Reclamante invocou a nulidade por falta de notificação, julgou verificado o erro na forma do processo e ordenou a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal (cfr. conclusões H. e L.).


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

Compulsados os autos, há que ter em conta o seguinte circunstancialismo processual com interesse para a decisão a proferir (Note-se que, embora o Supremo Tribunal Administrativo não tenha competência em matéria de facto nos recursos que lhe são submetidos das decisões dos tribunais de 1.ª instância (cfr. art. 26.º, alínea b), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais), não está impedido e, pelo contrário, está obrigado a considerar as ocorrências processuais reveladas pelos autos, apreensíveis por mera percepção e que são do conhecimento oficioso. Neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume IV, anotação 23 h) ao art. 279.º, pág. 369.):

a) Em 29 de Dezembro de 2004 e sob o n.º 1910200401057545, foi instaurada pelo Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 1 execução fiscal contra a sociedade denominada “B………., Lda.”, para cobrança de dívida proveniente de Imposto sobre o Valor Acrescentado (cfr. fls. 1 e 2 do processo de execução fiscal);

b) A essa execução fiscal foi apensada outra, instaurada contra a mesma sociedade para cobrança de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e juros compensatórios (cfr. fls. 19 do processo de execução fiscal);

c) Por despacho do Chefe daquele serviço de finanças, de 29 de Janeiro de 2010, essa execução reverteu contra A…………. (cfr. fls. 25/26 do processo de execução fiscal);

d) Para citação de A……………, o Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 1 remeteu-lhe carta registada com aviso de recepção, que foi assinado por terceira pessoa em 16 de Setembro de 2010 (cfr. fls. 71/72 e cópia do aviso de recepção, entre as fls. 72 e 73, todas do processo de execução fiscal);

e) O Executado por reversão fez dar entrada naquele serviço de finanças petição inicial de oposição à execução fiscal em 18 de Outubro de 2010 (cfr. fls. 78 do processo de execução fiscal e fls. 81 da presente reclamação);

f) A referida peça processual foi subscrita por advogado, ao qual o Executado por reversão passou procuração, que foi junta aos autos (cfr. fls. 92 e 66 desta reclamação);

g) A oposição à execução fiscal foi admitida liminarmente (cfr. fls. 80 a 82 do processo de execução fiscal);

h) Para notificação do Executado por reversão/Oponente para prestar garantia em ordem à suspensão do processo de execução fiscal na sequência da oposição deduzida, o Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 1 remeteu-lhe carta registada com aviso de recepção, que foi assinado por terceira pessoa em 19 de Novembro de 2010 (cfr. fls. 79 do processo de execução fiscal e fls. 24 e 25 da presente reclamação);

i) A notificação para prestação de garantia não foi efectuada na pessoa do mandatário judicial do Executado por reversão (cfr. fls. 66);

j) Em 7 de Dezembro de 2010, e no âmbito do processo de execução fiscal, o Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 1 procedeu à penhora de um imóvel do Executado por reversão (cfr. fls. 52).


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

Numa execução fiscal instaurada contra uma sociedade e que prossegue contra o ora Recorrido na qualidade de responsável subsidiário, este deduziu oposição à execução fiscal.
O órgão de execução fiscal, em ordem ao cumprimento do disposto no art. 169.º, n.ºs 1 a 7, do CPPT, aplicável ex vi do n.º 9 do mesmo artigo, liquidou o montante da garantia a prestar para a suspensão da execução fiscal e, para notificação do Executado por reversão, remeteu-lhe, para a sua própria pessoa, ofício para, em 15 dias, prestar garantia.
Ulteriormente, considerando que a garantia não tinha sido prestada e que estava esgotado o prazo legal concedido para o efeito, procedeu à penhora de um imóvel do Executado por reversão.
Este insurgiu-se contra essa penhora, dela reclamando, ao abrigo do disposto nos arts. 276.º e 278.º do CPPT, para o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, a quem pediu a anulação do acto da penhora – é com esse sentido que interpretamos o pedido de que se ordene o «levantamento da penhora» – e a notificação para prestar garantia. Sustentou, nessa reclamação, que a execução fiscal não podia prosseguir com a penhora sem que antes fosse notificado para prestar garantia, uma vez que deduziu oposição à execução fiscal, oposição que foi admitida.
Na resposta a essa reclamação, a Fazenda Pública alegou que o Reclamante, contrariamente ao que afirma na petição inicial, foi notificado para prestar garantia e que a execução fiscal só prosseguiu porque não foi garantido o pagamento da dívida exequenda e do acrescido.
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto considerou verificada a nulidade por falta de notificação do Executado/Oponente para prestar garantia, uma vez que essa notificação foi efectuada na própria pessoa do Executado e não na do seu mandatário, como o impõe o art. 40.º do CPPT.
No entanto, considerando que essa nulidade só podia ser arguida perante o órgão de execução fiscal, considerou verificado o erro na forma do processo e ordenou a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal.
A Fazenda Pública discordou dessa decisão e dela veio recorrer para este Supremo Tribunal Administrativo. Se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, entende a Fazenda Pública que:
· o processo enferma de nulidade processual por violação do princípio do contraditório, uma vez que não lhe foi notificada a «“resposta” à contestação» apresentada pelo Reclamante e na decisão recorrida foram usados os factos alegados nesse articulado para se considerar que houve nulidade por a notificação para prestação de garantia não ter sido efectuada na pessoa do mandatário judicial;
· a decisão recorrida padece de nulidade por excesso de pronúncia relativamente à questão de não ter sido efectuada na pessoa do mandatário judicial do Executado/Oponente a notificação para prestar garantia;
· a decisão recorrida enferma de nulidade por falta de fundamentação por não estabelecer qualquer relação entre as premissas e a conclusão quanto à asserção que faz de que «[t]endo o reclamante invocado a nulidade da notificação após penhora, não se verifica a sua sanação, sendo viável a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal»;
· a decisão recorrida fez errado julgamento quando, considerando que o Reclamante invocou a nulidade por falta de notificação, julgou verificado o erro na forma do processo e ordenou a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal.
Assim, as questões a apreciar e decidir são as que deixámos enunciadas em 1.9.

2.2.2 DA NULIDADE PROCESSUAL

Sustenta a Recorrente que se verifica uma nulidade decorrente do facto de não ter sido notificada do articulado de fls. 45/46, apresentado pelo Reclamante – e que ela denomina «“resposta” à contestação». Isto, porque a alegação constante dessa peça processual – de que a notificação para prestar garantia foi efectuada na sua própria pessoa, quando deveria tê-lo sido na pessoa do seu mandatário judicial – foi atendida pela decisão recorrida, o que significa que a omissão da notificação daquele articulado, e consequente impossibilidade do exercício do contraditório sobre a questão, influiu na decisão, o que, nos termos do disposto no art. 201.º do CPC, leva a que seja considerada nulidade.
Salvo o devido respeito, não podemos concordar.
Na verdade, a decisão judicial recorrida não se baseou em factualidade relativamente à qual tenha sido cerceada à Fazenda Pública a possibilidade de exercício do direito de contraditório (Princípio consagrado no art. 3.º, n.º 3, do CPC e que é hoje entendido, não na sua dimensão negativa, de direito de defesa, oposição ou resistência à actuação alheia, mas na sua dimensão positiva, de direito de influir activamente, no desenvolvimento e no êxito do processo, como um dos mais elementares princípios que enformam todo o direito adjectivo e também o processo tributário. Para maior desenvolvimento quanto ao princípio do contraditório, designadamente com aprofundados considerandos de natureza doutrinal e citação de jurisprudência, vide o acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 3 de Março de 2010, proferido no processo com o n.º 63/10, publicado no Apêndice ao Diário da República de 24 de Março de 2011 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2010/32210.pdf ), págs. 445 a 451, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/1f4bfa574b6a7515802576e10040e44b?OpenDocument.). Vejamos:
Na petição inicial, o Executado alegou que não foi notificado para prestar garantia.
Na contestação, a Fazenda Pública impugnou essa alegação, afirmando expressamente que o Executado foi notificado para prestar garantia no prazo de 15 dias, em obediência ao disposto no art. 169.º do CPPT, louvando-se na informação prestada pelo órgão de execução fiscal e nos documentos com que a mesma informação foi instruída (cfr. fls. 24 a 26).
O articulado a que a Fazenda Pública se refere como «“resposta” à contestação», não constitui resposta alguma à contestação. Tal articulado foi, isso sim, apresentado pelo Reclamante na sequência da notificação que lhe foi efectuada, a ele e à Fazenda Pública, por ordem da Juíza Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto e com menção expressa ao art. 3.º, n.º 3, do CPC (cfr. despacho de fls. 30), dos referidos documentos juntos e informação prestada pelo Serviço de Finanças de Gaia 1.
Nessa informação, o órgão de execução fiscal afirmava que o Executado por reversão «[e]m 19-11-2010, foi notificado para prestar garantia, nos termos do artigo 169.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, no âmbito da Oposição deduzida, a qual não foi prestada, pelo que a execução não ficou suspensa»; os referidos documentos respeitam ao ofício remetido pelo órgão de execução fiscal ao mesmo Executado, para notificá-lo para prestação da garantia, e ao aviso de recepção respeitante a essa correspondência.
Na sequência da notificação do teor dessa informação e documentos (como se refere no intróito do articulado em causa), o Reclamante veio pronunciar-se sobre os mesmos, salientando que a notificação em causa deveria ter sido efectuada na pessoa do seu mandatário e, porque não foi, houve violação do disposto no art. 40.º, n.º 1, do CPPT. Mais requereu que o órgão de execução fiscal informe nos autos «se notificou o mandatário do executado/oponente e, em caso afirmativo, para juntar o respectivo documento».
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, deferindo o requerido, ordenou ao órgão de execução fiscal que comprovasse a notificação para prestação da garantia na pessoa do mandatário judicial (cfr. fls. 47).
O Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia reiterou a informação de que «a notificação para prestação de garantia para o processo supra referido foi efectuado ao revertido A…………… (Doc. 1)» (fls. 48) e juntou, novamente, cópia do ofício que remeteu ao Executado, para notificá-lo para prestação da garantia, e do respectivo aviso de recepção (fls. 49 e 50).
Essa informação e documentos foram notificados à Fazenda Pública e ao Reclamante, tendo este vindo dizer que o órgão de execução fiscal não tinha respondido ao que lhe foi solicitado e que era se a notificação foi efectuada na pessoa do mandatário; mais disse que, embora da informação se pudesse inferir que não, entendia que «por mera cautela deverá o Serviço de Finanças informar especificamente se notificou o mandatário do oponente/executado do que quer que fosse tendo em vista a prestação da garantia» (cfr. fls. 63).
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto ordenou então que se oficiasse ao órgão de execução fiscal para «informar, de forma expressa, se foi efectuada notificação para prestação de garantia tendo em vista a suspensão do processo de execução fiscal subjacente a estes autos, na pessoa do mandatário do revertido/Oponente» (cfr. fls. 64).
Em resposta a essa solicitação, o Serviço de Finanças de Gaia 1 veio informar que «a notificação para prestação de garantia para o processo supra referido foi efectuada ao revertido/Oponente A…………. e não na pessoa do seu mandatário» (cfr. fls. 66).
Cumprindo ordem expressa da Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (cfr. despacho de fls. 67), essa informação foi notificada quer ao Reclamante quer à Fazenda Pública (cfr., respectivamente, fls. 68 e 69).
Afigura-se-nos, pois, que não pode agora a Fazenda Pública alegar que não lhe foi concedida a possibilidade de exercer o direito de contraditório relativamente à factualidade em causa, ou seja, ao facto de a notificação para prestação de garantia ter sido efectuada na pessoa do Executado por reversão e Oponente e não na pessoa do mandatário judicial por ele constituído. Essa factualidade foi firmada com base em elementos recolhidos pela Juíza e dos quais foi oportunamente dada conta à ora Recorrente, que deles foi notificada.
Nem se diga que a Fazenda Pública, apesar de ter conhecimento dessa factualidade, foi surpreendida pelo enquadramento jurídico que dela fez a decisão sob recurso, relativamente ao qual não lhe foi assegurado o exercício do direito de contraditório.
Dando de barato que o direito de contraditório não se esgota ao nível dos factos relevantes e respectiva prova, exigindo ainda a possibilidade de influir sobre a questão no que respeita à qualificação jurídica dos factos provados, a verdade é que desde a petição inicial a questão se coloca ao nível de saber se o Executado por reversão foi ou não notificado para prestar garantia em ordem à suspensão da execução fiscal na sequência do recebimento da oposição. Essa questão, como é manifesto, passa por indagar se foram ou não cumpridas as regras legais que respeitam à notificação, designadamente, se a notificação para prestar garantia, no caso de o executado ter constituído mandatário judicial, deve ser feita na pessoa do próprio executado ou na pessoa do seu mandatário.
Mas ainda que assim não fosse, nunca a Fazenda Pública se poderia afirmar surpreendida pelo enquadramento jurídico que a decisão recorrida deu à questão, uma vez que, por ordem expressa da Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto lhe foi dado a conhecer o teor do parecer do Ministério Público (cfr. fls. 76 e 78) e neste se considerou que o facto de o mandatário judicial não ter sido notificado constitui uma nulidade processual (cfr. fls. 72 a 74).
Se a Fazenda Pública não se pronunciou sobre a questão foi apenas porque entendeu não fazê-lo e não por falta de oportunidade para o fazer.
Por tudo o que deixámos dito, consideramos que improcede a invocada nulidade decorrente da violação do princípio do contraditório por não ter sido concedida à Fazenda Pública a possibilidade de contraditar o articulado do Reclamante por ela denominado «“resposta” à contestação».

2.2.3 DA NULIDADE DA DECISÃO

2.2.3.1 POR EXCESSO DE PRONÚNCIA

Se bem interpretamos as alegações de recurso, a Fazenda Pública entende que a decisão recorrida incorreu em excesso de pronúncia ao conhecer de nulidade da falta de notificação para prestar garantia com o fundamento de que essa notificação devia ter sido efectuada na pessoa do mandatário judicial.
Como é sabido, impõe-se que haja uma correspondência entre o que é pedido e o que é pronunciado, devendo o juiz pronunciar-se sobre tudo o que for pedido e só sobre o que for pedido. Só em casos excepcionais previstos na lei processual ou na lei substantiva pode o juiz apreciar oficiosamente uma questão que não foi suscitada pelas partes.
Nos termos do art. 125.º, n.º 1, do CPPT, ocorre nulidade da sentença quando o juiz se pronunciar sobre questões de que não deva conhecer (Nulidade também prevista na alínea d) do art. 668.º, n.º 1, do CPC.). Esta nulidade está conexionada com a segunda parte do n.º 2 do art. 660.º do CPC, em que se estabelece que o juiz não pode ocupar-se senão de questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. Com esta norma, pretendeu o legislador proibir o juiz de se ocupar de questões que não tenham sido suscitadas pelas partes, com excepção daquelas que a lei lhe permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso.
Como salienta JORGE LOPES DE SOUSA, «O que se proíbe, naquele art. 660.º, n.º 2, do CPC é que se conheça de «questões» não suscitadas. Não se deve confundir «questões» com «argumentos». Quanto a argumentos o tribunal não está limitado pelos invocados pelas partes, podendo utilizar os que entender, para apreciar questões que tenham sido suscitadas» (Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume II, anotação 12 ao art. 125.º, pág. 366.).
Assim, afigura-se-nos que a decisão recorrida não incorreu na nulidade que a Recorrente lhe assaca, na medida em que se limitou a conhecer de falta de notificação para prestar garantia, que foi invocada pelo Reclamante.
É certo que o fez sob um enquadramento diverso do que lhe foi dado na petição inicial. Na verdade, enquanto o Recorrente esgrimiu a ilegalidade da penhora por considerar que a execução fiscal não podia prosseguir sem que fosse notificado para prestar garantia, na decisão recorrida entendeu-se que a falta de notificação para prestar garantia, porque decorrente do facto de esta ter sido efectuada na própria pessoa do Executado/Oponente e não na pessoa do seu mandatário, constituía uma nulidade a ser invocada na execução fiscal, motivo por que se ordenou a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal.
Poderá a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, eventualmente, ter feito errado julgamento da questão, mas não pode afirmar-se que tenha incorrido em excesso de pronúncia, pelo que improcede a invocada nulidade.

2.2.3.2 POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO

A Recorrente assaca ainda à decisão recorrida outro vício formal: a falta de fundamentação, por não estabelecer qualquer relação entre as premissas e a conclusão quanto à asserção que faz de que «[t]endo o reclamante invocado a nulidade da notificação após penhora, não se verifica a sua sanação, sendo viável a convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal».
Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 125.º do CPPT, constitui causa de nulidade da sentença «a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão». Também na alínea b) do n.º 1 do art. 668.º do CPC se diz que é nula a sentença quando «não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão».
Como vem entendendo uniformemente a doutrina (Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume V, pág. 140.) e a jurisprudência (Vide, entre muitos outros, por mais recente e com numerosa indicação de jurisprudência, o acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de Setembro de 2012, proferido no processo n.º 862/12, ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/e46947495061fff580257a85005669e9?OpenDocument.), tal nulidade só ocorre quando se verifica falta absoluta de fundamentação, e não quando a fundamentação enunciada é insuficiente, medíocre, contraditória ou errada.
Como ensina ALBERTO DOS REIS, na obra citada, «Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto».
Ora, como se viu, a decisão recorrida contém a motivação que levou a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto a proceder à convolação da petição inicial de reclamação judicial em requerimento dirigido à execução fiscal. Se, eventualmente, essa motivação é contraditória e/ou desacertada, estar-se-á perante erro de julgamento e não perante vício formal da decisão (nulidade) por falta de fundamentação.
Improcede, pois, a invocada nulidade por falta de fundamentação.

2.2.4 DO ERRO DE JULGAMENTO

A Recorrente põe também em causa a correcção do julgamento efectuado em 1.ª instância na parte em que decidiu verificar-se o erro na forma do processo e proceder à convolação da petição inicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal.
Afigura-se-nos que a Recorrente tem razão nessa parte.
Na verdade, o Executado por reversão veio a juízo insurgir-se contra a penhora que lhe foi efectuada, alegando que tal acto ofensivo do seu património foi efectuado sem que antes lhe fosse concedida a possibilidade de prestar garantia, a fim de obter a suspensão da execução fiscal em consequência do recebimento da oposição que deduziu à execução fiscal. Assim, pediu «o levantamento da penhora», pedido que, como deixámos já dito, interpretamos como de anulação daquele acto.
A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto decidiu no sentido da verificação do erro na forma do processo por considerar que o facto de a notificação para prestação de garantia ter sido efectuada na pessoa do próprio Executado/Oponente, e não na do seu mandatário judicial, constitui uma nulidade processual, que deve ser arguida perante o órgão de execução fiscal. Por isso, estribando-se no disposto no art. 97.º, n.º 3, da LGT e no art. 98.º, n.º 4, do CPPT, convolou a petição inicial da reclamação judicial em requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal, meio processual que considerou adequado.
Mas, a nosso ver, inexiste razão para considerar verificado o erro na forma do processo e, consequentemente, para proceder à convolação.
Como é sabido, o erro na forma do processo afere-se pela adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado: se o pedido formulado pelo autor não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo (Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume II, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, págs. 288/289. No mesmo sentido, RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, volume I, 3.ª edição, 1999, pág. 262, e ANTUNES VARELA, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 100.º, pág. 378.).
No caso sub judice, o pedido formulado em juízo pelo Reclamante é de anulação da penhora, por a execução se dever encontrar suspensa enquanto não lhe for concedida a possibilidade de garantir o pagamento da dívida exequenda e do acrescido. O meio processual adequado para esse pedido é, a nosso ver, aquele de que o Executado lançou mão: a reclamação prevista no art. 276.º do CPPT. Na verdade, estamos perante um acto praticado pelo órgão de execução fiscal – penhora – indiscutivelmente lesivo dos direitos do Executado. E o pedido de anulação desse acto deve ser, como foi, formulado através desse meio processual.
Entendemos, pois, que não se verifica erro algum na forma de processo escolhida, sendo que a decisão sob recurso, que decidiu em sentido contrário, não pode manter-se.
Resta-nos, pois, averiguar se a penhora enferma ou não da ilegalidade que lhe vem assacada, ou seja, se o órgão de execução fiscal podia proceder à penhora no momento em que efectuou essa diligência ou se, como sustenta o Reclamante, a execução fiscal deveria permanecer suspensa até lhe ser feita a notificação para prestar garantia (rectius, até ao termo do prazo para a prestação da garantia, na sequência da notificação para o efeito).
Como é sabido, a execução fiscal, nos casos em que o executado deduziu oposição, não deve prosseguir antes de ser concedida ao executado a possibilidade de, dentro do prazo de 15 dias, garantir o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, devendo o mesmo ser notificado para o efeito (cfr. art. 169.º, n.ºs 2, 6 e 9 do CPPT).
O Reclamante alegou que a penhora que foi efectuada nos presentes autos de execução fiscal viola o disposto no art. 169.º do CPPT, porque foi efectuada antes dele ter sido notificado – na qualidade de Executado/Oponente – para prestar garantia ao abrigo do disposto nos n.ºs 2, 6 e 9 daquele artigo.
Tenha-se presente que é a AT que tem o ónus de demonstrar que efectuou a notificação de forma correcta, cumprindo os requisitos impostos pelas normas legais que regulam a comunicação dos actos.
Ora, é inquestionável que, como bem decidiu a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, o órgão de execução fiscal não comprovou essa notificação na forma prescrita na lei. Na verdade, porque o Executado constituiu mandatário judicial quando da apresentação da oposição à execução fiscal, a notificação para prestar garantia devia ser efectuada na pessoa desse mandatário (cfr. art. 40.º, n.º 1, do CPPT), sendo que ficou demonstrado que o não foi.
Por outro lado, é ineficaz a notificação efectuada exclusivamente na pessoa do próprio executado (cfr. art. 36.º, n.º 1, do CPPT e art. 266.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa) (Neste sentido, o acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 4 de Maio de 2011, proferido no processo n.º 927/10, publicado no Apêndice ao Diário da República de 6 de Janeiro de 2012 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2011/32220.pdf), págs. 708 a 711, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b45623dd08d86df98025788800490bb0?OpenDocument.).
O executado só deveria ser também notificado na sua própria pessoa caso a notificação fosse para a prática de acto pessoal (v.g., notificação do interessado com vista à participação em diligência), conforme resulta do n.º 2 do referido art. 40.º do CPPT.
Assim, a notificação que no caso foi efectuada na pessoa do ora Recorrido não assume relevância, atento o facto de ter constituído mandatário que o representava no processo de execução fiscal e dado que não nos encontramos perante acto pessoal enquadrável no art. 40.º, n.º 2, do CPPT.
A ineficácia dessa notificação tem como efeito que não se abriu o prazo para prestar garantia e, por isso, também não pode tal prazo considerar-se precludido. Ora, enquanto o Executado estiver em tempo para prestar a garantia, e porque se deve considerar temporária e condicionalmente suspensa a execução fiscal até ao termo desse prazo (JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume III, anotação 4 a) ao art. 169.º, pág. 217.), não pode o órgão de execução fiscal avançar para a fase da penhora.
Assim, a nosso ver é inquestionável a ilegalidade do acto de penhora, pelo que, julgando procedente a reclamação judicial, cumpre anular a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Gaia 1 que ordenou a prossecução da execução fiscal e a penhora ora reclamada.

2.2.5 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - A execução fiscal, nos casos em que foi admitida liminarmente a oposição, não deve prosseguir contra o oponente antes de esgotado o prazo que a lei lhe concede para garantir o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, devendo o mesmo ser notificado para o efeito (cfr. art. 169.º, n.ºs 1, 6 e 9 do CPPT).
II - Se o executado/oponente constituiu mandatário judicial quando da apresentação da oposição, a notificação para prestar garantia deve ser efectuada na pessoa deste (cfr. art. 40.º, n.º 1, do CPPT), sendo ineficaz a notificação efectuada exclusivamente na pessoa do próprio executado (cfr. art. 36.º, n.º 1, do CPPT e art. 266.º, n.º 3, da CRP).
III - A ineficácia dessa notificação tem como efeito que não se abriu e, por isso, também não pode considerar-se precludido o prazo para prestação da garantia.
IV - Não estando esgotado o prazo para constituir garantia, e porque se deve considerar temporária e condicionalmente suspensa a execução fiscal até ao termo desse prazo, é ilegal a penhora entretanto efectuada.
V - A reclamação prevista no art. 276.º do CPPT é meio processual adequado para pedir a anulação com fundamento nessa ilegalidade.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida na parte em que julgou verificado o erro na forma do processo e ordenou a convolação da petição inicial em requerimento dirigido à execução fiscal e, conhecendo em substituição, julgar procedente a reclamação judicial e anular a decisão administrativa que ordenou a penhora.

Custas pela Recorrente, mas apenas em 1.ª instância.


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Lisboa, 30 de Janeiro de 2013. – Francisco Rothes (relator) – Fernanda Maçãs – Casimiro Gonçalves.