Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0521/13
Data do Acordão:04/30/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA
AUDIÊNCIA PRÉVIA
PROVA
Sumário:I – De acordo com o decidido pelo acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 22/10/2012, em julgamento ampliado, nos termos do disposto no art. 148º do CPTA, no processo nº 708/12, e que deu origem ao acórdão uniformizador de jurisprudência nº 5/2012, «Independentemente do entendimento que se subscreva relativamente à natureza jurídica do acto aqui em causa (indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia) – acto materialmente administrativo praticado no processo de execução fiscal ou acto predominantemente processual – é de concluir que não há, no caso, lugar ao exercício do direito de audiência previsto no art. 60º da LGT».
II – A admitir-se que, quanto ao pedido de dispensa da prestação de garantia possam ser apresentados ou requeridos outros meios de prova, para além da prova documental expressamente prevista no nº 3 do art. 170º do CPPT, se tal for imprescindível à demonstração da factualidade susceptível de integrar os requisitos daquele direito, em regra, essa prova terá de ser logo indicada no requerimento inicial, não podendo sê-lo em momento ulterior.
Nº Convencional:JSTA000P15670
Nº do Documento:SA2201304300521
Data de Entrada:04/08/2013
Recorrente:A... LDA
Recorrido 1:INST DA VINHA E DO VINHO, IP
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A……………………., Lda., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, julgou improcedente a reclamação deduzida, nos termos dos artigos 276º e seguintes do CPPT, contra o acto do Chefe do Serviço de Finanças de Tondela de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia.

1.2. O recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
A. O presente processo respeita a uma reclamação apresentada pela A……………. contra o indeferimento, por parte do Serviço de Finanças de Tondela, de um pedido de dispensa de prestação de garantia em que não foi realizada a audição do contribuinte prévia a esse indeferimento, em violação do disposto nos artigos 267º, nº 5, da CRP, 60º da LGT e 45º do CPPT.
B. A sentença recorrida (acolhendo e transcrevendo o teor do Acórdão deste STA de 26.09.2012) acompanha a corrente que qualifica o acto de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia como um acto de natureza administrativa – cf., em particular, páginas 26 e 28 da sentença aqui posta em crise.
C. Consubstanciando a decisão de indeferimento de um pedido de dispensa de prestação de garantia um acto administrativo em matéria tributária e, como tal, sujeito ao regime previsto na LGT para os procedimentos tributários (e, em particular, ao princípio da participação contido no artigo 60º do mesmo diploma), não se pode aventar, no modesto entendimento da A………………, a possibilidade da sua não observância ou simples dispensa, como acabou por concluir o Tribunal a quo.
D. Não parece ser legalmente admissível recorrer a uma possibilidade de dispensa de audição prévia prevista ou (i) num regime de aplicação supletiva (in casu, o regime previsto no CPA) ou (ii) num regime criado ad hoc (em concreto, um regime resultante da consideração de que o requerimento de dispensa de garantia, por dever ser fundamentado e instruído com prova, consubstancia, em si, a audição prévia do interessado), quando a própria Lei Geral Tributária não se mostra omissa quanto à matéria.
E. A aplicação do Código de Procedimento Administrativo às relações jurídico-tributárias, nos termos do disposto na alínea c) do artigo 2º da LGT, mostra-se de carácter supletivo: é a Lei Geral Tributária que se aplica em primeira linha à solução das questões postas ao intérprete-aplicador, só sendo legítimo o recurso aos restantes diplomas enunciados no artigo 2º da LGT em caso de lacuna da mesma Lei.
F. A Lei Geral Tributária não contém qualquer lacuna quanto ao exercício de audição prévia ao indeferimento de um pedido de dispensa de garantia, que possibilite ou autorize o recurso a regimes especiais previstos em legislação subsidiária ou interpretativamente criados para a situação concreta. Bem pelo contrário: a LGT claramente ordena que previamente ao indeferimento de um pedido apresentado pelo contribuinte à Administração Fiscal – como vem a ser um pedido de dispensa de prestação de garantia – seja aquele ouvido e convidado a participar na formação da decisão final – cf. artigo 60º, nº 1, alínea b), da LGT –, sendo que os nºs. 2 e 3 do mesmo artigo 60º da LGT vêm indicar, peremptoriamente, as situações em que poderá ocorrer a dispensa de audição prévia no âmbito das relações jurídico-tributárias, nos quais não se inclui o indeferimento de um pedido de dispensa de prestação de garantia.
G. Ao fazer-se apelo a um regime previsto no Código de Procedimento Administrativo (ou mesmo a um regime que decorre da interpretação de que a própria petição fundamentada afastará a audição prévia) para justificar a possibilidade de dispensa de audição prévia no caso, está-se, em bom rigor, a revogar semelhante disposição da Lei Geral Tributária, aditando-lhe outras possibilidades de dispensa de audição prévia, que o legislador fiscal manifestamente não consagrou.
H. Ainda que se aceitasse a aplicação subsidiária da possibilidade de dispensa de audiência prévia, prevista no CPA para os casos em que a decisão se mostra urgente, às situações de indeferimento de pedido de dispensa de garantia – no que não se concede –, sempre importará notar que a urgência da decisão invocável para justificar esta dispensa de audiência prévia em procedimentos administrativos «não são razões ligadas com a necessidade de cumprimento do prazo legal de conclusão do processo ou com a necessidade de prevenir o aparecimento de actos tácitos que podem ser invocadas para justificar o preenchimento do pressuposto da urgência da decisão.» - cf. Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e J. Pacheco de Amorim, op cit.
I. Ao contrário do que se verifica na situação dos autos, a urgência da decisão deverá ser justificada e fundamentada por referência à situação material existente, devendo resultar objectivamente do acto e das suas circunstâncias (cf., neste sentido, Ac. STA de 28-05-2002, proc. 048378, disponível em www.dgsi.pt), não já por referência à situação procedimental de cumprimento de determinado prazo estipulado para a conclusão do procedimento ((5) Nas expressivas palavras do Exmo. Senhor Dr. Juiz Conselheiro Lino Ribeiro, em voto de vencido ao entendimento que fez maioria no mencionado Ac. deste STA de 26.09.2012: «O prazo de 10 dias para decidir o dito “procedimento” é assim meramente ordenador ou disciplinador, sem quaisquer consequências negativas para o requerente. Daí que não nos devemos impressionar com a alegação de que tal prazo determina a natureza urgente do procedimento, pois, pelo menos na perspectiva do executado, não há uma correlação necessária entre o prazo de decisão e a urgência na resolução da pretensão. Além disso, a aplicar-se as normas do CPA, seria sempre de exigir um “despacho” a justificar a urgência da decisão».), que vem a ser, afinal, a justificação em que se escuda o Tribunal a quo (acolhendo o teor do mencionado Acórdão deste Venerando STA) para considerar que este regime da dispensa de audiência prévia nas decisões urgentes dos procedimentos administrativos deverá ser aplicado ao pedido de dispensa de prestação de garantia em causa nos autos.
J. Por outro lado, não poderá igualmente colher o entendimento de que o próprio requerimento em que o interessado expõe a sua pretensão, indicando as razões que a justificam e juntando os respectivos elementos de prova documental, acabe por desempenhar a função de audição prévia do contribuinte ou por precludir a necessidade de realização da mesma, no sentido de atenuar «a hipótese de ser surpreendido ou confrontado pela AT com elementos que desconheça» – cf. Ac. STA de 26.9.2012, reproduzido na página 32 da sentença recorrida.
K. Se assim fosse, em todas as situações de apresentação de um pedido ou petição devidamente fundamentados e instruídos com prova documental à Administração Tributária, teria de se aplicar esta interpretação de que semelhante petição inicial daquele procedimento jurídico-tributário precludia a necessidade de realização de audição prévia, pelo que os contribuintes, sempre que apresentassem tais petições devidamente fundamentadas e instruídas com prova documental, não teriam a possibilidade de, previamente ao respectivo indeferimento pela Administração Tributária, virem participar na formação da decisão e, assim, virem obviar a eventuais erros por parte da Administração e contribuir para o cabal esclarecimento dos factos.
L. Por outro lado, apesar de o pedido de dispensa de prestação de garantia dever ser instruído, nos termos legais, com a prova documental necessária (cf. artigo 170º, nº 3, do CPPT), é certo que com esta referência a «prova documental necessária», o legislador não está a excluir outros meios de prova admitidos em Direito, o que redundaria numa restrição materialmente inconstitucional, nas situações em que esses outros meios de prova se mostram imprescindíveis para a demonstração do direito invocado pelo contribuinte no seu pedido de dispensa ((6) «No CPPT, quando se estabelecem restrições probatórias (que têm carácter excepcional, como se infere dos arts. 72º da LGT e 50º e 115º, nº 1, do CPPT), é utilizada uma referência explícita nesse sentido, como se constata nos arts. 146º-B, nº 3, 204º, nº 1, alínea i), e 246º do CPPT» - cf. Jorge Lopes de Sousa, op. cit. -, o que não sucede no caso do pedido de dispensa de prestação de garantia.).
M. São cogitáveis situações em que os factos alegados pelo contribuinte para demonstrar, por exemplo, a falta de culpa na insuficiência de bens para prestar garantia ou o prejuízo irreparável que lhe advirá da prestação de uma garantia, não se alcançam unicamente através de meios documentais, carecendo-se, por exemplo, de prova testemunhal.
N. A prova dos requisitos de que depende a dispensa de prestação de garantia poderá – e muitas vezes, apenas poderá – ser feita por recurso a outros meios de prova que não a documental – em especial tratando-se de prova de um facto negativo –, pelo que não deverá vingar o entendimento de que a petição inicial de dispensa de garantia desempenhe já a função de audição prévia do contribuinte ou precluda automaticamente a necessidade de realização dessa audição prévia, pois terão lugar diligências instrutórias e poderão surgir novos elementos sobre os quais o contribuinte nunca se pronunciou, em violação, inclusivamente, do princípio do contraditório em matéria de procedimento e processo tributário consagrado no artigo 45º do CPPT.
O. O contribuinte tem a possibilidade legal (e constitucional) de, conhecendo a apreciação da Administração Tributária feita sobre as provas apresentadas e/ou produzidas no procedimento de dispensa de prestação de garantia, vir juntar novos elementos e sobre as mesmas se pronunciar.
P. Esta é a solução que se impõe no apuramento da verdade material e cabal esclarecimento dos factos alegados que incumbe à Administração Tributária e, bem assim, a solução que mais se coaduna com o preceituado no nº 5 do artigo 267º da CRP e no artigo 45º do CPPT.
Q. No caso concreto dos autos, a necessidade, razoabilidade e utilidade da realização da audição prévia é manifesta:
• Por um lado, o fundamento apontado, no despacho do OEF que dá causa aos autos, para indeferir o pedido de dispensa de prestação de garantia em causa foi a «falta de produção de prova». Ora, em sede de audição prévia, poderia a A……………… ter obviado, mediante a junção dos elementos de prova que a Administração reputava por necessários ((7) Elementos de prova esses que a Administração, aparentemente, reputava por necessários para a justa decisão da questão, mas que, curiosamente, nem por isso notifica o contribuinte para efectuar a junção desses elementos que tinha por necessários para a instrução do processo, como lhe competiria ao abrigo do disposto no artigo 89º, nº 1, do CPA, por forma ao apuramento da verdade material), a essa decisão tomada com fundamentos meramente formais, que em nada contribui para a realização, administrativa, da justiça e que se revela não adequada e não proporcional.
• Por outro lado, ainda no caso concreto, o argumento que se funda no curto prazo de 10 dias do procedimento para afastar a necessidade ou possibilidade legal de audição prévia a esse indeferimento, é particularmente inexpressivo, pois que o pedido de dispensa de prestação de garantia foi apresentado pela A……………. em 28 de Fevereiro de 2011 (cf. ponto nº 10 da matéria de facto dada como provada) e veio a ser decidido, apenas, por ofício de 28 de Março de 2011, volvido 1 mês da respectiva apresentação (cf. ponto n.º 13 dos factos provados).
R. Se a lei prevê um prazo que, na prática, é meramente ordenador ou disciplinador, e que, no caso dos autos (que é o que aqui nos interessa) foi largamente incumprido, não se aceita que se retire a conclusão de que, in casu, a atribuição do carácter urgente que possibilita, na teoria acolhida na sentença recorrida, a dispensa da audição prévia com uma aplicação subsidiária do CPA encontre, sequer, justificação material.
S. Não se aceitando embora (conforme supra se fez notar) que o prazo estipulado na lei para a apreciação do pedido de dispensa justifique o afastamento do direito de audição prévia do contribuinte, não poderia, de qualquer modo, em face dos elementos de facto dos autos, ter sido decidido que não haveria lugar à audição prévia da A…………………. devido à urgência do procedimento, uma vez que o procedimento em causa demorou um mês a ser decidido.
T. Nos presentes autos, impunha-se determinar a anulação da decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia por preterição ilegal da audição prévia da A…………………., ao invés do que o Tribunal a quo decidiu, violando o disposto nos artigos 267º, nº 5, da CRP, 60º da LGT e 45º do CPPT.
Termina pedindo o provimento do recurso e a revogação da sentença recorrida.

1.3. Contra-alegou o recorrido formulando, a final, as conclusões seguintes:
A. A Recorrente insiste que foi ilegalmente preterido o direito de audição prévia ao indeferimento do pedido de dispensa de prestação previsto no artigo 60º da LGT.
B. O acto de indeferimento do pedido de isenção da prestação de garantia, não obstante praticado por um órgão administrativo, consubstancia um verdadeiro acto processual ou judicial e não um acto meramente procedimental ou administrativo – cfr. Acórdão do STA de 7 de Março de 2012, proferido no processo nº 0185/12, em que foi relator o Juiz Conselheiro Lino Ribeiro.
C. Tendo natureza judicial, aos actos praticados no âmbito dos processos de execução fiscal não são de aplicar as regras do procedimento tributário, designadamente a prevista no artigo 60º da LGT, cuja violação é alegada nos presentes Autos pela Recorrente.
D. Ainda que se defenda uma posição segundo a qual a decisão sobre o pedido de dispensa de prestação de garantia deve qualificar-se como um verdadeiro acto administrativo em matéria a tese da Recorrente não pode proceder.
E. O princípio da participação dos interessados no procedimento administrativo, de que é manifestação o artigo 60º da LGT, comporta necessariamente excepções que se encontram previstas na Lei.
F. O processo de execução fiscal, se não processualmente urgente, deve pelo menos ser considerado como materialmente urgente na medida em que o artigo 177º, do CPPT estipula que este deve extinguir-se no prazo de um ano contado da sua instauração «salvo causas insuperáveis, devidamente justificadas» (cit.).
G. A urgência do processo de execução fiscal, está ainda patente nos curtos prazos definidos no artigo 170º, do CPPT e especificamente no nº 4 daquele preceito onde é imposto um prazo de 10 dias para que seja proferida decisão relativamente ao pedido de dispensa de prestação de garantia.
H. O artigo 103º, nº 1, alínea a) do Código do Procedimento Administrativo, aplicável ex vi do artigo 2º, alínea c) da LGT, prevê que, estando em causa a tomada de uma decisão urgente, a audição prévia do administrado seja afastada, pelo que a preterição da audição prévia no caso concreto, não consubstancia qualquer ilegalidade susceptível de conduzir à anulação da decisão recorrida – cfr. Acórdão deste venerando Tribunal de 23 de Fevereiro de 2012, proferido no processo nº 059/12, no qual foi relatora a Juiz Conselheira Dulce Neto.
I. «Ainda que não se aceite a aplicabilidade da referida norma do CPA, o próprio requerimento em que o interessado expõe a sua pretensão, indicando todas as razões que, no seu entender, a justificam, e ao qual é obrigado a juntar logo todos os elementos de prova, desempenha já a função de audiência prévia, não havendo que chamá-lo novamente a participar na formação da decisão dada a regra geral contida no nº 3, do artigo 60º da LGT, quando aplicada a todos os procedimentos tributários que culminem com um acto final lesivo, seja ele ou não um acto de liquidação» – cfr. Acórdão de 23 de Fevereiro de 2012, proferido no processo nº 059/12, no qual foi relatora a Juiz Conselheira Dulce Neto (cit.).
J. No mesmo sentido do Acórdão citado, vejam-se os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 20 de Junho de 2012, proferido no processo nº 625/12, 9 de Maio de 2012, proferido no processo nº 446/12, de 23 de Maio de 2012, proferido no processo nº 489/12 e de 26 de Setembro de 2012, proferido no processo nº 708/12.
K. Perante os parcos factos colocados à consideração do órgão de execução fiscal – que incluíram somente uma série de considerações genéricas sobre a situação financeira da Recorrente, sem qualquer suporte probatório associado, este limitou-se a aplicar o Direito em vigor...
L. Mesmo que pudesse considerar-se ter havido preterição indevida da audição do contribuinte – o que apenas por dever de patrocínio de concebe, e sem conceder – o acto de indeferimento do pedido de prestação de garantia sempre poderia ser aproveitado.
M. «Um acto tributário inválido por preterição de audição prévia pode ser aproveitado pelo juiz se houve a convicção de que, anulado o acto, virá a ser praticado outro com conteúdo idêntico» – cfr. Acórdão do STA de 12 de Abril de 2012, proferido no processo nº 0896/11, em que foi relator o Juiz Conselheiro Lino Ribeiro (cit.).
N. Como resulta provado nos Autos, a Recorrente é executada em inúmeros processos, todos pendentes no serviço de finanças de Tondela, tendo a Recorrente apresentado, massiva e recorrentemente pedidos de dispensa de prestação de garantia.
O. Em todos esses casos – mesmo naqueles em que o chefe de finanças entendeu ouvir a Recorrente de tomar a decisão final, note-se – os pedidos de dispensa foram instruídos com a mesma prova e indeferidos com base na não demonstração dos pressupostos de que depende essa mesma dispensa, tendo a validade material dos actos de indeferimento sido confirmada pelo TAF de Viseu em primeira instância e pelo TCA Norte em segunda instância.
P. A título de exemplo entre muitos outros possíveis – a Recorrente é executada em dezenas de processos com o mesmo objecto, apresentando pedidos, vejam-se os processos de reclamação judicial nºs. 534/10.9BEVIS, 157/11.5BEVIS, 405/10.9BEVIS e 502/10.0BEVIS, no âmbito dos quais o TAF de Viseu e o TCA Norte, confirmaram a validade material dos actos de indeferimento dos pedidos de dispensa de prestação de garantia apresentados pela ora Recorrente junto do Serviço de Finanças de Tondela.
Q. Atendendo ao volume de processos de natureza semelhante e instruídos de igual forma pela Recorrente que conheceram desfecho idêntico junto do órgão de execução fiscal, do TAF de Viseu e do TCA Norte, com toda a probabilidade, o chefe de finanças de Tondela, confrontado com a anulação do despacho que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia por preterição de audição prévia à decisão subjacente aos presentes Autos, proferiria despacho com idêntico conteúdo após essa mesma audição.
R. À luz dos factos, o acto de indeferimento reclamado deve ser aproveitado ainda que venha a considerar-se ter havido preterição indevida do direito de audição prévia previsto no artigo 60º da LGT.
Termina pedindo a confirmação do julgado recorrido e a manutenção do decidido no que respeita ao indeferimento da pretensão da Recorrente em ver dispensada a prestação de garantia para suspensão do processo de execução fiscal em que é executada, com as devidas consequências legais.

1.4. O MP emite Parecer nos termos seguintes:
«A recorrente à margem identificada vem sindicar a sentença do Tribunal Tributário de Viseu, de 04 de Março de 2013, exarada a fls. 658/697, na parte em que julgou inverificado o alegado vício de forma de preterição do exercício do direito de audição prévia.
A sentença recorrida julgou improcedente a reclamação deduzida do despacho proferido em 28 de Março de 2011, pelo Chefe do SLF de Tondela, que indeferiu pedido de dispensa de prestação de garantia, no entendimento, no caso, nomeadamente, não havia que facultar ao recorrente o exercício do direito de audição prévia.
A recorrente termina as suas alegações com as conclusões de fls. 716/721, que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 684º/3 e 685º-A/1 do CPC, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas para todos os efeitos legais.
O recorrente contra-alegou, tendo concluído nos termos de fls. 744/747 que aqui, também, se dão por inteiramente reproduzidos para todos os efeitos legais.
A nosso ver o recurso não merece provimento.
Nos termos do estatuído no artigo 103º/1 da LGT, o processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da Administração Tributária participar nos actos que não tenham natureza jurisdicional.
Nos termos do número 2 do citado normativo os interessados podem reclamar para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados pelos órgãos da Administração Tributária.
Portando, a Administração Tributária no âmbito do processo de execução fiscal pratica actos materialmente administrativos.
Enquanto processo com natureza judicial, todos os actos praticados na execução fiscal pelos sujeitos processuais estão submetidos às regras processuais que regulam o processo tributário e, subsidiariamente às normas do CPC, ex vi do artigo 2º/e) do CPC.
Só não é assim quando no processo é enxertado um procedimento administrativo (como o da dispensa de prestação de garantia) em que a Administração Tributária actua no exercício da sua função tributária, praticando actos materialmente administrativos em matéria tributária. ((1) Acórdãos do STA de 1012.05.09-P. 0708/12 e de 2012.05.23-P. 0288/13, disponíveis no sítio da Internet www.dgsi.pt)
Só a estes procedimentos haverá que aplicar os princípios gerais regulamentadores da actividade administrativa e as normas da LGT aplicáveis ao procedimento tributário, designadamente a norma constante do artigo 60º (princípio da participação).
Embora a decisão sobre o pedido de dispensa da prestação de garantia seja um verdadeiro acto administrativo em matéria tributária inserido num procedimento administrativo, tendo em conta a sua urgência, evidenciada pelo normativo do artigo 170º do CPPT, deve aplicar-se o estatuído no artigo 103º/1 do CPA, ex vi do artigo 2º/c) da LGT.
Assim, nos termos do disposto no artigo 103º/1 do CPA, atenta a natureza urgente da decisão não há lugar ao exercício do direito de audição prévia.
Aliás, uma vez que o interessado na dispensa da prestação de garantia, nos termos disposto no artigo 170º do CPPT, deve, no respectivo requerimento, indicar todos os fundamentos de facto e de direito e juntar todos os elementos de prova de que disponha, aquele referido requerimento desempenha já a função de audição prévia, pelo que, atento o estatuído no artigo 60.º/3 da LGT não há que ouvir de novo o interessado. ((2) Proferido no recurso nº 059/12 e disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt.)
Se se entender que o acto que indefere a dispensa de prestação de garantia é um acto processual, de trâmite, então é certo que não se aplica, o disposto no artigo 60º da LGT. ((3) Acórdão do STA, de 2012.08.02-P. 0803/12, disponível no sítio da Internet www.dgsi.pt)
De qualquer modo, a jurisprudência actual do STA vai reiteradamente no sentido de não haver lugar à audição prévia, independentemente da natureza do acto de indeferimento da prestação de garantia (acto administrativo ou acto processual). ((4) Acórdãos do STA de 2012.09.26-P. 0708/12 e de 2013.03.l3-P. 0288/13, disponíveis no sítio da Internet www.dgsi.pt.)
A sentença recorrida não merece, pois, censura.
Termos em que deve ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional, mantendo-se a sentença recorrida na ordem jurídica

1.5. Com dispensa de vistos dada a natureza urgente do processo, cabe deliberar.


FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
1. Em 19.11.2010 foi instaurado contra a Reclamante, no Serviço de Finanças de Tondela, o processo de execução fiscal nº 2704201001013114, com vista à cobrança coerciva de dívidas relativas à falta de pagamento da taxa de promoção dos meses de Maio e Junho de 2010 devida ao IVV e juros de mora, no valor total de € 70.594,81. – cfr. docs. de fls. 1 e ss. dos autos.
2. A Reclamante foi citada para a execução fiscal referida em 1. em 22.11.2010. – cfr. docs. de fls. 8 e ss. autos.
3. A Reclamante apresentou oposição à execução fiscal referida em 1. supra em 22.12.2010, que corre termos neste Tribunal sob o número de processo 36/11.6BEVIS, admitida liminarmente em 18.1.2011. – factos de que o Tribunal tem conhecimento no exercício das suas funções por consulta ao SITAF.
4. Na oposição referida no ponto anterior a Reclamante requereu ao Tribunal a dispensa da prestação de garantia. - factos de que o Tribunal tem conhecimento no exercício das suas funções por consulta ao SITAF.
5. Em 10.1.2011 a Reclamante instaurou impugnação judicial versando a liquidação da taxa de promoção devida ao IVV relativa ao mês de Maio de 2010, que corre termos neste Tribunal sob o número de processo 330/10.3BEVIS. – factos de que o Tribunal tem conhecimento no exercício das suas funções.
6. Na mesma data a Reclamante instaurou impugnação judicial versando a liquidação da taxa de promoção devida ao IVV relativa ao mês de Junho de 2010, que corre termos neste Tribunal sob o número de processo 458/10.0BEVIS. – factos de que o Tribunal tem conhecimento no exercício das suas funções.
7. Em 13.1.2011 a Reclamante foi notificada pelo Serviço de Finanças de Tondela para no prazo de 15 dias prestar garantia, com vista à suspensão do processo de execução fiscal, no valor de € 91.101,51. – cfr. docs. de fls. 14 dos autos.
8. Em 21.1.2011 a Reclamante requereu ao Serviço de Finanças de Tondela fosse dado sem efeito o ofício a que se refere o ponto anterior. - cfr. doc. de fls. 15 e ss. dos autos.
9. Por despacho de 11.2.2011 o Chefe do Serviço de Finanças de Tondela indeferiu o requerimento referido no ponto anterior e reiterando o ofício referido em 7. supra. - cfr. doc. de fls. 19 dos autos.
10. Em 28.2.2011 a Reclamante remeteu ao Serviço de Finanças de Tondela pedido de dispensa de prestação de garantia, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, alegando, em síntese,
a. Que a prestação de garantia lhe causará um prejuízo irreparável, pois,
• O acesso ao crédito bancário encontra-se atualmente muito difícil e mais caro, acrescendo que a solicitação de uma garantia bancária enfraquece sua posição perante a Banca;
• A Reclamante encontra-se a ser executada em diversos processos de execução fiscal, cujo montante global ascende a € 29.517.726,21, tendo já prestado garantias no valor de € 4.056.467,44;
• A exigência de mais garantias bancárias causa prejuízos para o desenvolvimento da sua atividade, podendo conduzir a uma situação de insolvência;
• A sua situação patrimonial não lhe permite obter garantias, já que: tem um ativo bruto real de € 83.503.213,72, em contrapartida de um passivo exigível de € 83.934.383,10, resultando num ativo líquido real de – € 431.170,10; do lado do ativo as mercadorias estão avaliadas a um preço de mercado de € 24.250.715,36, mas cujos preços cairão para metade se a empresa entrar em insolvência; em tal situação, os créditos dos clientes, que somam os montantes de € 55.205.458,13 e € 3.173.881,28, denotariam também um decréscimo de 50% (ratio de liquidez); do lado do passivo, a atrofia financeira poderá precipitar os credores na exigência dos seus créditos, pelo que a Reclamante se veria confrontada com o pagamento de um passivo de € 83.934.383,10, a que acresce o valor de € 29.517.726,21 em execução fiscal, a que terá de fazer face com um ativo depreciado de € 51.681.857,25; com o crédito arruinado, não poderia recorrer a capitais alheios; apresenta um rácio de autonomia financeira (capital próprio/ativo líquido) de 8%, o que denota elevada dependência de créditos e financiamento externo; e um rácio de solvabilidade total (fundos próprios/findos alheios) abaixo dos 50%; (vi) o elevado valor dos montantes em dívida (€ 29.517.726,21) demonstra por si o prejuízo irreparável;
b. Não tem responsabilidade na insuficiência ou inexistência de bens para a prestação de garantia, já que a mesma não resultou de dissipação de património, mas tão só do valor diminuto dos bens do seu património e das circunstâncias excecionais para a obtenção de crédito;
c. Acresce que o penhor sobre os ativos da empresa, constituídos por depósitos destinados à armazenagem de vinhos, equipamentos de manuseamento de vinhos e stock de vinhos, levaria à paralisação da empresa, acrescendo que a Reclamante necessita dos créditos detidos sobre clientes para obter fundo de maneio para a sua atividade corrente;
d. Os encargos financeiros decorrentes da prestação de mais uma garantia, seja garantia bancária, seja penhor sobre vinho ou sobre créditos de clientes, impossibilita a Reclamante de fazer face aos compromisso de que depende a manutenção e desenvolvimento da sua atividade económica, o que configura prejuízo irreparável
- cfr. doc. de fls. 23 e ss. dos autos.
11. Em anexo ao requerimento referido no ponto anterior juntou os seguintes documentos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido:
a. Certidão da qual constam: as dívidas em nome da Reclamante cobradas coercivamente em processos de execução fiscal, totalizando a quantia exequenda € 29.517.726,21, juros de mora de € 5.251.654,61 e custas de € 303.657,038; garantias prestadas nos processos de execução fiscal, incluindo duas garantias bancárias, uma no valor de € 93.574,82 (execução fiscal n.º 2704200701014617) e outra no valor de € 3.131.919,55 (execução fiscal n.º 2704200701014625), e outras garantias no valor de € 152.878,29 (execução fiscal n.º 2704200401002570), € 670.000,00 (execução fiscal n.º 2704200501017586) e € 2.094,78 (execução fiscal n.º 2704200801001949);
b. Garantia bancária autónoma da Caixa Geral de Depósitos, no valor de € 3.131.919,55, emitida em 1.2.2008, tendo como beneficiário o Serviço de Finanças de Tondela e ordenante a Reclamante, para garantir o valor em cobrança no processo de execução fiscal n.º 2704200701014625;
c. Balanço provisório reportado a 31.12.2009 do qual consta, entre o mais,





- cfr. docs. de fls. 35 e ss. dos autos.
12. Em 25.3.2011 o Serviço de Finanças de Tondela proferiu informação com o seguinte teor,

- cfr. doc. de fls. 57 dos autos.
13. Na sequência da informação referida no ponto anterior, em 28.3.2011 o Chefe do Serviço de Finanças de Tondela proferiu o seguinte despacho,



- cfr. doc. de fls. 58 e ss. dos autos.
14. Em 31.3.2011 a Reclamante foi notificada do despacho referido no ponto anterior. - cfr. docs. de fls. 60 e ss. dos autos.
15. Em 11.4.2011 a Reclamante remeteu, por via postal registada, a presente reclamação para o Serviço de Finanças de Tondela. - cfr. docs. de fls. 63 e ss. dos autos.
Mais se provou que,
16. Por escritura pública de compra e venda realizada em 11.8.2005 a Reclamante declarou vender à B…………………, S.A., que por sua vez aceitou a venda, pelo preço total já recebido de € 900.000,00 o prédio misto, composto por casa térrea e parte de andar, onde se encontra instalada uma fábrica de saboaria, cortes de gado, terreno lavradio junto, com videiras, árvores de fruto, poço e mais pertenças, sito nos ……………., freguesia de Pedroso, concelho de Vila Nova de Gaia, inscrito na matriz sob os artigos 845 (urbano), 2503 e 3192 (rústico), com o valor patrimonial de € 8.174,85. – cfr. doc. de fls. 428 e as. dos autos.
17. Na mesma data entre a Reclamante e a B………………, S.A., foi celebrado um acordo escrito denominado de «Acordo de Compensação de Créditos», no qual a primeira declarou ser «titular de um crédito no montante de 900.000,000 €» sobre a segunda «resultante de empréstimo de acionista de igual valor que detém sobre a mesma» e a segunda declarou «ser credora da representada dos primeiros outorgantes por igual valor de 900.000,000 € (novecentos mil euros) da venda que lhe fez hoje do prédio misto (...)», acordando «compensar entre si os créditos resultantes do empréstimo acionista e da compra e venda do prédio aludidos nas cláusulas anteriores, dando mútua quitação.». - cfr. docs. de fls. 592 e ss. dos autos.
18. Por escritura pública realizada em 28.12.2005 a Reclamante declarou vender à C…………………., S.A., que por sua vez aceitou a venda, pelo preço total já recebido de € 1.915.000,00 os seguintes imóveis: prédio rústico correspondente ao artigo matricial 5365, sito na freguesia de Lageosa do Dão, Tondela, com o valor patrimonial para efeitos de IMT de € 1.128,90, pelo valor de € 360.000,00; prédio urbano, composto de três casas para armazém e atividade industrial e logradouro, correspondente aos artigos matriciais 1554, 1555 e 1556, sito na freguesia de Olhaívo, Alenquer, com o valor patrimonial global para efeitos de IMT de € 271.074,70, pelo valor de € 1.499.000,00; prédio rústico correspondente ao artigo matricial 19 – secção M, sito na freguesia de Aldeia Gavinha, Alenquer, com o valor patrimonial para efeitos de IMT de € 379,99, pelo valor de € 56.000,00. – cfr. doc. de fls. 417 e ss. dos autos.
19. Por escritura pública de doação e compra e venda realizada em 14.3.2006: D……………………. e E………………. declararam doar à Reclamante a parcela de terreno com 24,90 m2, do prédio rústico omisso mas atualmente inscrito na matriz urbana sob o artigo 9910, atribuindo-lhe o valor de € 249,00; a Reclamante declarou vender à C………………., S.A., que por sua vez aceitou a venda, pelo preço total já recebido de € 860.000,00, o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 2179, com o valor patrimonial de € 144.000,00, após a anexação da parcela a ser constituído por edifício de cave, rés do chão, primeiro andar e logradouro destinado a escritórios e laboratórios, com a superfície coberta de 531 m2 e a descoberta a 1089,40 m2. - cfr. doc. de fls. 422 e ss. dos autos.
20. Em 31.7.2006 a C………………….., S.A. procedeu à transferência, de uma conta de que é titular numa instituição bancária, das quantias de € 860.000,000 e € 1.915.000,00, para uma conta titulada pela Reclamante. - cfr. docs. de fls. 588 e ss. dos autos.
21. As alienações referidas em 16., 18. e 19. supra ocorreram no âmbito de um processo de reestruturação do grupo de empresas em que a Reclamante se insere.
22. As alienações referidas no ponto anterior deram-se posteriormente à decisão de não pagar as taxas de promoção ao IVV.
23. Em 1.2.2008 no âmbito do processo de execução fiscal n.º 2704200701014625 a Reclamante prestou garantia bancária no valor de € 3.131.919,55. – cfr. doc. de fls. 143 dos autos.
24. Em 29.2.2008 D………………. e esposa constituíram hipoteca a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. sobre os imóveis m.i. a fls. 408 e ss. dos autos para garantia do capital máximo de € 3.750.000,00, juros, sobretaxa e despesas, emergentes do contrato de prestação de garantia bancária, a favor do Serviço de Finanças de Tondela, até ao valor de € 3.131.919,55 e € 93.574,82, celebrado entre esta instituição bancária e a Reclamante. - cfr. doc. de fls. 406 e ss. dos autos.
25. Em 16.3.2010 a F…………… celebrou contrato de abertura de crédito – mútuo com hipoteca com a Caixa de Crédito Agrícola Mútuo Terras de Viriato, CRL, pelo qual esta instituição bancária lhe concedeu um crédito até à quantia de € 1.500.000,00, no âmbito para garantia do qual a G…………………, S.A. constituiu uma hipoteca sobre o imóvel m.i. a fls. 380 dos autos. - cfr. docs. de fls. 377 e ss. dos autos.
26. Em 16.9.2010 a F…………… celebrou contrato de abertura de crédito com aval e hipoteca autónoma com a Caixa Central – Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, CRL, pelo qual esta instituição bancária lhe concedeu um crédito até à quantia de € 2.400.000,00, titulado por uma livrança em branco subscrita pela F…………… e avalizada por D………….., no âmbito e para garantia do qual a H…………….., S.A. constituiu uma hipoteca sobre o imóvel m.i. a fls. 386 dos autos.. - cfr. docs. de fls. 385 e ss. dos autos.
27. Em finais de 2010, na sequência do conhecimento de uma dívida que rondava os 5 milhões de euros da Reclamante ao IVV e IFAP, em execução fiscal, a Reclamante e as empresas do seu grupo começaram a ser pressionadas pela Banca para garantirem os créditos da Reclamante nas instituições financeiras.
28. Em 19.1.2011 a A. tinha pendentes vários processos de execução fiscal, nos quais é cobrado coercivamente o valor total de €35.073.038,61, correspondente a € 29.517.726,21 a quantia exequenda, € 5.251.654,61 a juros de mora e € 303.657,038 de custas. - cfr. docs. de fls. 126 e ss. dos autos.
29. No âmbito desses processos de execução fiscal a Reclamante prestou as seguintes garantias: garantia bancária no valor de € 93.574,82 (execução fiscal n.º 2704200701014617); garantia bancária no valor de € 3.131.919,55 (execução fiscal n.º 2704200701014625; outras garantias no valor de € 152.878,29 (execução fiscal n.º 2704200401002570), € 670.000,00 (execução fiscal n.º 2704200501017586) e € 2.094,78 (execução fiscal n.º 2704200801001949). - cfr. docs. de fls. 126 e ss. dos autos.
30. Em reunião da assembleia geral da F…………….., S.A. (doravante F…………) de 25.1.2011 foi deliberado por unanimidade aprovar a proposta de obtenção de financiamento junto do Banco Comercial Português, S.A. no valor de € 9.650.000,00 destinado a amortizar o valor do papel comercial e empréstimos lançados a descoberto na conta de depósitos à ordem da Reclamante e afetação de um depósito à ordem no valor de 7.000.000,00 USD de que a F………….. é titular naquele Banco para garantia do montante de € 4.800.000,00 de que a Reclamante é devedora àquele Banco, acrescido ao financiamento de € 6.500.000,00 que a F…………… obteve junto da CCCCCAM para garantir as responsabilidades da Reclamante junto daquela entidade, para o qual a F................. “terá de recorrer à constituição de hipotecas por parte das suas participadas B……………, S.A., H………….., S.A. e G…………, S.A. sobre imóveis propriedade destas” e, em contrapartida da qual, a Reclamante “obrigou-se e terá de obrigar-se perante a sociedade a reembolsá-la de tudo quanto esta desembolse em capital, juros, remuneratórios ou moratórios, comissões e despesas e, para garantia do cumprimento de tais obrigações, a constituir a seu favor e das suas mencionadas participadas, B……………, S.A., H…………., S.A. e G……………, S.A., penhor mercantil sobre o seu património mobiliário, nomeadamente equipamentos e existências de vinhos”. - cfr. doc. de fls. 302 e ss. dos autos.
31. Em 10.2.2011 a F……………., S.A. (doravante F………….) constituiu a favor do Banco Comercial Português, S.A. (doravante BCP) penhor sobre o depósito a prazo de que é titular naquele Banco, no valor de 7.000.000,00 USD, para garantia do cumprimento das responsabilidades assumidas pela F……………. perante o Banco até ao limite de € 5.280.000,00. – cfr. doc. de fls. 305 e 306 dos autos.
32. Na mesma data a F……………… e o BCP celebraram contrato de empréstimo pelo qual aquele Banco concedeu à F…………… um financiamento no montante de € 9.200.000,00 destinado a liquidar as responsabilidades enquanto avalista da Reclamante. - cfr. doc. de fls. 362 e ss. dos autos.
33. Para garantia do contrato referido no ponto anterior a F.................... subscreveu uma livrança em branco avalizada por D………………. e D…………………… e esposa e B…………….., S.A. constituíram a favor do BCP hipoteca sobre os imóveis m.i. a fls. 345 e ss. dos autos. - cfr. docs. de fls. 344 e ss. dos autos.
34. Em 15.2.2011 a Reclamante constituiu a favor de F…………………, S.A., H………………, S.A., B……………….., S.A. e G………………….., S.A., penhor mercantil sobre os bens m.i. a fls. 308 e ss. dos autos, a saber, stocks de vinho e equipamentos, com os valores totais, respetivamente, de € 23.256.049,36 e € 931.725,10, estabelecendo-se, entre o mais, que,



[…]”
- cfr. docs. de fls. 274 e ss. dos autos.
35. Em 11.4.2011 a Reclamante reforçou a garantia prestada no âmbito de contrato de abertura de crédito em conta corrente e entrega para cobrança de cheques pré-datados, celebrado em 1.12.2007, com a Caixa Geral de Depósitos no valor reforçado de € 12.000.000,00, mediante penhor de crédito no valor de € 3.250.000,00 sobre conta de depósito a prazo naquele Banco da F……………... - cfr. doc. de fls. 412 e ss. dos autos.
36. Em 13.4.2011 a F…………….. celebrou contrato de abertura de crédito – mútuo com hipoteca com a Caixa Geral de Depósitos, pelo qual esta instituição bancária lhe concedeu empréstimo até ao montante de € 3.250.000,00, pelo prazo de 6 meses, no âmbito do qual a C………………., S A. constituiu uma hipoteca sobre os imóveis m.i. a fls. 310 e ss. dos autos, com o valor de € 3.650.000,00 para garantia do capital mutuado, juros e despesas, e titulado por uma livrança em branco subscrita pela F…………….. e avalizada por D…………………. - cfr. docs. de fls. 308 e ss. dos autos.
37. Atualmente, e pelo menos desde fins de 2010, por força da conjuntura económica, o acesso ao crédito bancário revela-se mais difícil e mais caro, com menor abertura das instituições financeiras à concessão de novos créditos e a estipulação de maiores encargos e exigências contratuais.
38. A Reclamante necessita de recorrer ao mercado bancário para o financiamento da sua atividade e giro comercial, designadamente para prestar garantias para as compras de mercadorias aos seus fornecedores espanhóis.
39. A rubrica de edifícios e construções do balanço da Reclamante abrange balões, maquinaria de armazém, um direito de superfície de um imóvel e benfeitorias feitas no armazém.
40. Antes de 2010 as imobilizações corpóreas da Reclamante estavam valorizadas ao preço de aquisição e ascendiam a € 5.000.000,00, tendo passado para valores que rondam os € 800.000,00 nos anos de 2010 e 2011 em resultado da sua depreciação e amortização.
41. Em 2010 a Reclamante apresentou um ativo no montante de € 73.178.259,14 e um passivo que ascendeu a € 68.410.038,50, mostrando um resultado líquido negativo do exercício de – € 1.204.801,47.
42. Em Novembro de 2011 a Reclamante tinha os salários dos funcionários de Agosto, Setembro e Outubro em atraso.
43. As vendas da Reclamante têm vindo a cair desde há cerca de 10 (dez) anos, tendo-se agravado há 2 anos.
44. A Reclamante é detida pela F…………….. e está integrada num grupo de sociedades, operando na área dos vinhos e englobando sociedades imobiliárias.

3.1. Tendo o OEF indeferido um pedido (efectuado na sequência de oposição à execução fiscal, pela executada e ora recorrente) de dispensa de prestação de garantia para suspensão do processo de execução fiscal, aquela reclamou de tal decisão (de indeferimento) para o Mmo. Juiz do TAF de Viseu, invocando, entre outros fundamentos, que foi omitida a formalidade essencial de audição prévia antes do indeferimento do pedido.
O Mmo. Juiz julgou a reclamação improcedente, considerando, no que ora releva, que não havia que conceder à executada a possibilidade de, em sede de audiência prévia, se pronunciar sobre o projecto de decisão sobre o pedido de dispensa de garantia.
Discordando do assim decidido, a recorrente alega, em síntese, que a sentença enferma de erro de julgamento, dado que a lei não permite dispensar o exercício do direito de audiência, sendo até que, na sequência da notificação a efectuar para esse efeito, poderia apresentar outros meios de prova.
A questão a decidir é, portanto, a de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento quando considerou que não havia que facultar à executada o exercício do direito de audiência previamente à decisão de indeferimento do pedido de dispensa da prestação de garantia e se, não lhe tendo sido facultado o exercício desse direito, tal decisão enferma de vício por preterição de formalidade essencial, a determinar a sua anulação.

3.2. Sobre idêntica questão (sendo idênticos os sujeitos processuais e semelhantes também os pressuposto de facto), se debruçaram já os arestos desta secção do STA, no rec. nº 288/13, de 13/3/2013, e nos recs. nºs. 520/13 e 522/13, ambos de 23/4/2013, num dos quais o presente relator interveio como adjunto.
E porque não vemos razões para divergir do entendimento ali afirmado, acompanharemos, com a devida vénia, a argumentação jurídica aí aduzida, visto, igualmente, o disposto no art. 8º nº 3 do CCivil).
Aliás, esta questão de saber se em caso de pedido de dispensa de prestação de garantia, há lugar ao direito de audiência, veio, após controvérsia jurisprudencial, a ser objecto do acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 26/9/2012, proferido no processo nº 708/12, em julgamento ampliado nos termos do art. 148º do CPTA, publicado no DR nº 204, I Série, de 22/10/2012, pp. 5955 a 5971, que consagrou a seguinte doutrina constante do respectivo sumário:
«Independentemente do entendimento que se subscreva relativamente à natureza jurídica do acto aqui em causa (indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia) – acto materialmente administrativo praticado no processo de execução fiscal ou acto predominantemente processual – é de concluir que não há, no caso, lugar ao exercício do direito de audiência previsto no art. 60º da LGT».
Ora, como se salienta no citado acórdão de 23/4/2013 no proc. nº 520/13, como «resulta do texto do acórdão e das declarações de voto nele lavradas, bem como da anterior jurisprudência deste Supremo Tribunal, a divergência entre os Conselheiros actualmente em exercício de funções nesta Secção do Contencioso Tributário tem por base diferentes concepções quanto à natureza do acto de dispensa de prestação de garantia e respeita somente aos fundamentos por que não se impõe conceder ao executado a possibilidade de exercer o direito de audiência prévia à decisão de indeferimento do pedido de dispensa, existindo unanimidade, porém, de que a norma do art. 60º da LGT não tem aplicação nesse caso, qualquer que seja a natureza daquele acto.
De tal modo que o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, nas suas mais recentes decisões, tem vindo a recusar o conhecimento dos recursos por oposição de acórdãos que tenham decidido nesse sentido, com o fundamento de que constitui jurisprudência consolidada na Secção que não se verifica, relativamente ao pedido de dispensa de prestação de garantia, a obrigatoriedade legal de cumprir o disposto no artigo 60º da LGT» (cfr. os acs. do Pleno desta Secção, de 12/12/2012, proc. nº 944/12; de 23/1/2013, proc. nº 945/12; e de 20/2/2013, proc. nº 974/12).
Acolhendo-se e reiterando-se, pois, o sentido de tal jurisprudência e não existindo razões para alterar tal entendimento, até porque nenhuma mudança legislativa ocorreu que a tal conduza, é de concluir que não há, no caso, lugar ao exercício do direito de audiência previsto no art. 60º da LGT e que, assim sendo, não pode, quanto a este fundamento, o recurso lograr provimento.

3.3. Nas Conclusões O e seguintes a recorrente invoca, igualmente, que «conhecendo a apreciação da Administração Tributária feita sobre as provas apresentadas e/ou produzidas no procedimento de dispensa de prestação de garantia», teria a possibilidade legal e constitucional de «vir juntar novos elementos e sobre as mesmas se pronunciar» e, tanto mais seria assim, quanto «o fundamento apontado, no despacho do OEF que dá causa aos autos, para indeferir o pedido de dispensa de prestação de garantia em causa foi a «falta de produção de prova»», motivo por que «em sede de audição prévia, poderia a F……………… ter obviado, mediante a junção dos elementos de prova que a Administração reputava por necessários».
Ora, é certo que a redacção do nº 3 do art. 170º do CPPT – que estipula que o pedido a dirigir ao órgão de execução fiscal «deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária» – não é inequívoca, ficando a dúvida se o legislador pretendeu restringir os meios de prova admissíveis à prova documental ou pretendeu apenas fixar o momento em que deverá ser apresentada a prova documental.
Todavia, como a este respeito pondera o Cons. Jorge Lopes de Sousa, «Esta exigência de instrução do pedido com prova documental parece ter o alcance de restringir os meios de prova à documental, o que se justificaria por o prazo para decisão ser apenas de 10 dias e, por isso, pouco adequado à realização de diligências entre o momento da apresentação do pedido e a decisão.
No entanto, essa conclusão sobre a restrição dos meios probatórios não se pode retirar com segurança, pois no CPPT, quando se estabelecem restrições probatórias (que têm carácter excepcional, como se infere dos arts. 72º da LGT e 50º e 115º, nº 1, do CPPT), é utilizada uma referência explícita nesse sentido, como se constata nos arts. 146º-B, nº 3, 204º, nº 1, alínea i), e 246º do CPPT.
Assim, poderá aventar-se que aquela referência à instrução do pedido com prova documental deverá ser entendida como proibindo a apresentação de prova documental em momento posterior, designadamente que no requerimento se peça prazo para junção de documentos posteriormente, mas não a apresentação de outros meios de prova, nomeadamente testemunhal.
De qualquer forma, a entender-se que se pretendeu restringir aquela referência à exigência de prova documental como obstando à apresentação de outros meios de prova, essa restrição será materialmente inconstitucional, nos casos em que outros meios sejam imprescindíveis para a demonstração do direito invocado pelo requerente da dispensa.
A entender-se que há esta possibilidade de apresentação de prova não documental, o prazo de 10 dias para decisão deverá contar-se da data em que a prova requerida for produzida, pois esse prazo foi fixado no pressuposto de que com a apresentação do pedido de dispensa de prestação de garantia ficaram reunidos todos os elementos necessários para a decisão». (Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, Áreas Editora, 6ª edição, vol. III, nota 4 b) ao art. 170º, p. 232.)
De todo o modo, ainda que se entenda ser também admissível prova de outra natureza, isto é, que o requerente da dispensa de prestação de garantia possa requerer outros meios de prova, para além da prova documental expressamente prevista no nº 3 do art. 170º do CPPT, quando tal se mostre imprescindível à demonstração da factualidade susceptível de integrar os requisitos daquele direito, a mesma terá também de ser logo indicada no pedido. Ao invés do alegado pela recorrente, não poderia indicar prova testemunhal na sequência da audição prévia, se a ela houvesse lugar.
Neste contexto e sem necessidade de mais considerações, concluímos pelo não provimento do recurso.

DECISÃO
Nestes termos acorda-se, em conferência, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 30 de Abril de 2013. – Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco Rothes – Fernanda Maçãs.