Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0483/12
Data do Acordão:12/12/2012
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
REQUISITOS
JURISPRUDENCIA RECENTEMENTE CONSOLIDADA
Sumário:No recurso por oposição de acórdãos, a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não relevando, para a existência de oposição, conclusão implícita ou mera consideração colateral que possa retirar-se da decisão.
Se não se verifica identidade substancial das situações fácticas em confronto, nem divergência de soluções quanto à mesma questão de direito, ou, em todo o caso, se a solução perfilhada no acórdão recorrido estiver em consonância com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, deve o recurso ser julgado findo, por falta dos pressupostos desse recurso de oposição de acórdãos, nos termos do disposto no nº 5 do art. 284º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA00068004
Nº do Documento:SAP201212120483
Data de Entrada:05/09/2012
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS
Objecto:AC TCA SUL DE 2001/11/22 - AC TCA SUL PROC6083/01 DE 2012/06/18
Decisão:FINDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - REC JURISDICIONAL
Legislação Nacional:CPPT99 ART284 N5 ART282 N3
ETAF02 ART27 B
CPTA ART152
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC0452/07 DE 2007/09/26; AC STA PROC01149/02 DE 2003/05/07; AC STAPLENO PROC01132/06 DE 2007/02/28; AC STAPLENO PROC0861/08 DE 2008/12/10; AC STA PROC 0709/08 DE 2009/03/11; AC STAPLENO PROC0474/12 DE 2012/11/21
Referência a Doutrina:MÁRIO AROSO DE ALMEIDA E CARLOS CADILHA - COMENTÁRIO AO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS 2ED PAG765-766
LOPES DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO VOLII 2007 PAG814
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública recorre, por oposição de acórdãos, do aresto do Tribunal Central Administrativo Sul que concedeu parcial provimento a um recurso que interpusera da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, a qual, por sua vez, julgara procedente a oposição deduzida por A…… contra a execução fiscal inicialmente instaurada contra a sociedade B……, Lda., para cobrança de dívidas de Contribuição Autárquica e Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas e que contra aquele reverteu.

1.2. Admitido o recurso, a recorrente apresentou, nos termos do disposto no nº 3 do art. 284º do CPPT, alegações tendentes a demonstrar a alegada oposição de julgados (fls. 192).

1.3. Por despacho do Exmo. Relator no Tribunal Central Administrativo Sul, considerou-se existir a invocada oposição de acórdãos e foi ordenada a notificação das partes para deduzirem alegações, nos termos do disposto nos arts. 284º, nº 5 e 282, nº 3, ambos do CPPT (fls. 201).

1.4. A recorrente termina as alegações do recurso formulando as conclusões seguintes:
1) Entre os doutos Acórdãos em causa, o fundamento e o recorrido, existe oposição susceptível de determinar o prosseguimento do presente recurso, encontrando-se preenchido o condicionalismo previsto no art. 284º do CPPT.
2) Deve ser fixada como jurisprudência desse Venerando Tribunal, a constante do douto Acórdão fundamento, isto é, de que, no âmbito do art. 13º do CPT, verificada a gerência de direito presume-se a gerência de facto, presunção legal tantum juris, possível de ser ilidida por prova em contrário, e que essa prova cabe ao oponente, uma vez que lhe cabe fazer a prova da ausência de culpa pela violação das disposições legais destinadas à protecção dos credores sociais de que resulte a insuficiência do património social para o pagamento do crédito daqueles.
3) Na verdade, parece-nos mais adequado concluir, como no Acórdão fundamento, que, conjugando a natureza contratual e pessoal da gerência com a inerência da titularidade do cargo à capacidade de exercício, em sede normativa da responsabilidade subsidiária, das expressões legais, deriva claramente a presunção de que quem tem a titularidade do cargo de gerente leva à prática o seu exercício.
4) Para o art. 13º do CPT, o que releva para o afastamento da responsabilidade subsidiária dos gerentes, reversão, é a prova da não culpa na insuficiência do património da sociedade para satisfazer os créditos fiscais, o que pode, ou não, estar ligado ao exercício da gerência de facto.
Termina pedindo que, decidindo-se no sentido de que existe oposição de julgados, o presente recurso seja julgado procedente, de acordo com a jurisprudência constante do Acórdão fundamento, e se revogue o Acórdão recorrido, com todas as legais consequências.

1.5. O recorrido A…… apresentou contra-alegações, formulando as conclusões seguintes:
1ª. A dívida exequenda reporta-se aos seguintes impostos:
a) CA de 1998
O que o douto Acórdão recorrido declarou prescrito, dando com tal fundamento provimento à oposição do recorrido nos termos da alínea d) do Nº 1 do Art. 204º do CPPT.
b) IRC de 1997
Sobre este, o douto Acórdão recorrido decidiu, que estando provado, no ponto K. da matéria assente, que o recorrido não exercia à data a gerência efectiva, e que o recorrido não constava do titulo executivo, é o mesmo parte ilegítima na execução face à alínea b) do Nº 1 do Art. 204º do CPPT procedendo assim a oposição por ilegitimidade do oponente.
2ª. Ora, como no Acórdão Fundamento do TCAS de 18/6/02 proferido no Procº. 6083/01 invocado pela recorrente, não contém decisão contrária aos fundamentos do Acórdão recorrido, no que tanje,
- à prescrição
- e à responsabilidade do recorrido – revertido quando está assente na matéria provada nos autos, que aquele não exercia a gerência efectiva à data do facto tributário;
é evidente que não se verifica a oposição de Acórdãos.
3ª. E estando assente no ponto K. da matéria provada, que o recorrido não exercia a gerência efectiva, sentido não faz que a recorrente invoque a presunção juris tantum, porque foi afastada pelo recorrido pela prova que fez.
4ª. A Jurisprudência que citámos sobre tal matéria é unânime no sentido que defendemos, e não oferece qualquer dúvida.
5ª. Termos em que deve improceder o presente recurso, decidindo-se que não há oposição de Acórdãos, e ainda que o sentido do Art. 13º do CPT unicamente contém tão só a presunção juris tantum de que quem tem a qualidade jurídica de gerência não implica a qualidade de exercício da gerência efectiva.

1.6. O MP emite parecer no sentido da inexistência da oposição de julgados, nos termos seguintes, além do mais:
«Entende a recorrente que existe oposição de julgados, uma vez que o acórdão fundamento decidiu que a gerência de direito, nos termos do artigo 13º do CPT, faz presumir legalmente a gerência de facto, incumbindo ao revertido o ónus da prova da não gerência de facto, enquanto que o acórdão recorrido decidiu que a gerência de direito, nos termos do artigo 13º do CPT, não faz presumir legalmente, só por si, a gerência de facto, incumbindo à Fazenda Pública o ónus da prova dessa gerência de facto.
São requisitos do prosseguimento do recurso por oposição de julgados:
1. Identidade de situações fácticas;
2.Trânsito em julgado do acórdão fundamento;
3. Quadro legislativo substancialmente idêntico;
4.Acórdãos proferidos em processo diferentes ou incidentes diferentes do mesmo processo.
5.Necessidade de decisões opostas expressas. ((1) Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 2007, II volume, página 808/812, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa.)
A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julgados verifica-se sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinada solução. ((2) Acórdãos do PLENO da SCT-STA, de 1992.06.19 e 2005.05.18, proferidos nos recursos números 19532 e 276/05, respectivamente.)
A oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida não como uma totalidade identidade de factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais. ((3) Obra citada, página 809 e acórdão do STJ de 1995.04.26 proferido no recurso n.º 87156.)
A oposição de soluções exige, ainda, pronúncia expressa sobre a questão, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta. ((4) Acórdão do PLENO SCT-STA, de 2009.05.06, proferido no recurso n.º 617/08.)
A nosso ver e em concordância com o recorrido não se verifica oposição de acórdãos, por inexistência de identidade de situações fácticas.
Na verdade, embora seja certo que nos acórdãos recorrido e fundamento se sustentam as posições antagónicas referidas, o certo é que:
No acórdão recorrido a dívida exequenda reporta-se à CA de 1998 e IRC de 1997.
Quanto à CA de 1998 o TCAS declarou a dívida prescrita, dando provimento à oposição, nessa parte, nos termos do estatuído no artigo 204º/1/d) do CPPT.
No que concerne ao IRC de 1997, o TCAS decidiu que (além do mais), estando provado que o recorrido não exerceu a gerência efectiva da devedora originária, como resulta do ponto K do probatório e que não consta do título executivo é parte ilegítima na execução, nos termos do estatuído no artigo 204º/1/b) do CPPT.
No acórdão fundamento estavam em causa o IVA e o IRC de 1995.
O TCAS negou provimento ao recurso, mantendo a decisão de 1ª instância que havia julgado improcedente a oposição, com os seguintes fundamentos:
- O despacho de reversão nunca é notificado nem carece de o ser porque nesse mesmo despacho se ordena citação do revertido;
- No termos do artigo 13º do CPT a gerência de direito faz presumir a gerência de facto da devedora originária e o oponente não logrou provar a não gerência de facto da sociedade;
- De acordo com o artigo 13º do CPT presume-se a culpa do gerente pela insuficiência do património societário, incumbindo ao mesmo o ónus da prova de que não foi por sua culpa que ocorreu essa insuficiência.
Temos assim que enquanto no acórdão recorrido se decide pela não gerência de facto, (pelo menos também) com base no probatório, onde no ponto K se refere que o oponente não exerceu as funções de gerente da sociedade executada até 26 de Março de 1998, no acórdão fundamento decidiu-se pela gerência de facto do oponente, apenas com base na alegada e pretensa presunção legal.
Inexiste, pois, a nosso ver, oposição de acórdãos.
Mas, se assim não se entendesse, então deveria ser negado provimento ao recurso e manter-se o acórdão recorrido.
De facto, como vem sendo jurisprudência reiterada e pacífica deste STA, após a acórdão do Pleno da SCT, de 28/02/2007 ((5) Acórdãos de 28 de Fevereiro de 2007 (PLENO), de 11 de Março de 2009 e de 2 de Março de 2011, proferidos nos recursos números 01132/06, 0709/08, 045/09 e 0944/10, respectivamente, disponíveis no sítio da Internet www.dgsi.pt.), no regime do CPT referente à responsabilidade subsidiária do gerente pela dívida fiscal da sociedade, a única presunção legal de que a Fazenda Pública beneficia respeita à culpa pela insuficiência do património social.
Inexiste presunção legal que imponha que uma vez provada a gerência de direito se dê como provada a gerência de facto, na ausência de contraprova ou prova do contrário.
Ao contrário da presunção legal a presunção judicial não implica a inversão do ónus da prova.
De facto, competindo à Fazenda Pública o ónus da prova de todos os pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente deve ser valorada contra aquela a falta de prova sobre a gerência de facto
Termos em que deve ser julgar-se por não verificada a oposição de acórdãos e, consequentemente, julgar-se findo o recurso, ou, se assim se não entender, deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se o acórdão recorrido na ordem jurídica.»

1.7. Da questão suscitada pelo Ministério Público foram notificadas as partes que nada vieram dizer.

1.8. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. No acórdão recorrido julgaram-se provados os factos seguintes, tendo o especificado na alínea L) sido aditado pelo acórdão recorrido, ao abrigo do disposto no artigo 712º, nº1, al. a), do CPC (certamente por lapso vem indicado no acórdão o art. 714º):
A. No dia 18/04/1990 foi objecto de registo a constituição da sociedade por quotas “B……), Lda”, matriculada sob o nº 11400 na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa – 3ª secção (fls. 17/30).
B. Por inscrição datada de 14/12/1992, foi averbada a aquisição pelo oponente de uma quota no valor de Esc. 7.500.000$00 e a sua nomeação como gerente da sociedade, juntamente com C…… (fls. 17/30).
C. Por inscrição datada de 06/05/1998, foi averbada a cessação de funções de gerente por parte do oponente, por renúncia do dia 26/03/1998 (fls. 17/30).
D. No dia 30/12/2002, foi instaurada a execução fiscal nº 3433200201067290 contra “B……), Lda.” (doravante executada), por dívida de IRC do ano de 1997, liquidado em 12/04/2002, no valor de € 305.275,03 (fls. 295 do processo de execução fiscal apenso).
E. Nesta execução foi expedida citação da executada no dia 13/03/2003 (fls. 297 do PEF apenso).
F. No dia 16/12/2002, foi instaurada a execução fiscal nº 3433200201548298 contra “B……), Lda.” (doravante executada), por dívida de CA dos anos de 1998 e 1999, inscrita para cobrança em 2001, no valor de € 5.120,29 (fls. 280/294 do processo de execução fiscal apenso).
G. Nesta execução foi expedida citação da executada no dia 23/06/2003 (fls. 288 do PEF apenso).
H. No dia 02/11/2004, as execuções referidas nos pontos D e F foram apensadas ao processo de execução fiscal nº 3433200201050214 (fls. 301 do PEF apenso).
I. No dia 20/03/2007, foi elaborado na execução fiscal o despacho que consta de fls. 251/252 do PEF apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, determinando a reversão da execução contra o oponente quanto às dívidas de IRC de 1997 e CA de 1998, no valor de € 309.859,04 (fls. 251/252 do PEF apenso).
J. O oponente recebeu a citação no dia 25/05/2007 (fls. 253/254 do PEF apenso).
K. Até à cessação indicada no ponto C, o oponente não desempenhou funções de gestão da sociedade executada.
L. Destinada a caucionar a suspensão do processo de execução fiscal referido em H. foi, pelo oponente A……, prestada a garantia bancária constante da cópia de fls. 52 cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido, encontrando-se suspensa a execução fiscal desde 22.6.2007 (cfr. informação de fls. 51).

3.1. O presente recurso vem interposto do acórdão proferido na Secção de Contencioso Tributário do TCA Sul, em 22/11/2011 (fls. 166/175), invocando a recorrente que o mesmo está em oposição com o acórdão proferido na mesma Secção do TCAS, em 18/6/2002, no proc. nº 6083/01.
Como acima se referiu, por despacho proferido em 28/2/2012 (fls. 201) o Exmo. relator julgou verificada a oposição, por entender que existe a apontada contradição entre ambos os arestos, no tocante à mesma questão fundamental de direito, dado que enquanto no acórdão fundamento se considera que a gerência de direito faz presumir o exercício da gerência de facto, cabendo ao oponente a prova do não exercício de facto da gerência, já no acórdão recorrido se considera que a gerência de direito não faz presumir, só por si, a gerência de facto, sendo que compete à Fazenda Pública a prova do requisito da gerência de facto.
Mas porque tal decisão do relator não faz, nesse âmbito, caso julgado, nem impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar - cfr. art. 685º-C, nº 5 do CPC – podendo, se for caso disso, ser julgado findo o respectivo recurso; ( ( ) Cfr. o ac. deste STA, de 7/5/2003, proc. nº 1149/02: «o eventual reconhecimento judicial da alegada oposição de julgados pelo tribunal recorrido, ao abrigo, nos termos e para os efeitos do disposto no referido art. 284° nº 5 do CPPT não só não faz, sobre o ponto, caso julgado, pois apenas releva em sede de tramitação/instrução do respectivo recurso, como, por isso, não obsta a que o Tribunal Superior, ao proceder à reapreciação da necessária verificação dos pressupostos processuais de admissibilidade, prosseguimento e decisão daquele recurso jurisdicional, considere antes que aquela oposição se não verifica e, em consequência, julgue findo o recurso». ) - cfr. também neste sentido Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, volume II, 5ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, p. 814 (nota 15 ao art. 284º), importa, então, averiguar se a alegada oposição de acórdãos se verifica.

3.2. Sendo ao caso aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos arts. 2º, nº 1, e 4º, nº 2, da Lei nº 13/2002, de 19/2, na redacção da Lei nº 107-D/2003, de 31/12, a admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27º, al. b) do ETAF e 152º do CPTA, depende, como se deixou expresso no ac. de 26/9/2007, do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste STA, no processo nº 0452/07, da satisfação dos seguintes requisitos:
«– existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito;
– a decisão impugnada não estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Como já entendeu o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo (( ) Acórdão de 29-3-2006, recurso nº 1065/05), relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição:
– identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
– que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
– que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
– a oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas (( ) Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos da SCA:
– de 29-3-2006, recurso n.º 1065/05;
– de 17-1-2007, recurso n.º 48/06;
– de 6-3-2007, recurso n.º 762/05;
– de 29-3-2007, recurso n.º 1233/06.
No mesmo sentido, pode ver-se MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª edição, páginas 765-766.)».
Por um lado, portanto, a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta e, por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.

3.3. Neste contexto, importa, então, apreciar se se verifica, ou não, a suscitada oposição, no que respeita à questão em apreciação, que, segundo a recorrente, consiste em saber se, no âmbito do art. 13º do CPT, verificada a gerência de direito, se presume a gerência de facto, presunção legal tantum juris, possível de ser ilidida por prova em contrário, cabendo essa prova ao oponente, uma vez que lhe cabe fazer a prova da ausência de culpa pela violação das disposições legais destinadas à protecção dos credores sociais de que resulte a insuficiência do património social para o pagamento do crédito daqueles.
Vejamos, pois.

4.1. Tendo sido interposto, pela Fazenda Pública, recurso da sentença da 1ª instância que julgou prescritas as dívidas exequendas (contribuição autárquica dos anos de 1998 e 1999 e IRC do ano de 1997), o acórdão recorrido confirmou o julgado na parte relativa à prescrição da dívida referente à contribuição autárquica e revogou aquela decisão, na parte relativa à prescrição da dívida referente a IRC.
E em seguida, relativamente a esta dívida de IRC, conhecendo, em substituição, das demais questões suscitadas na oposição e cujo conhecimento a sentença recorrida julgara prejudicado, o acórdão recorrido veio a julgar procedente a oposição com fundamento, em síntese, no seguinte:
«Subsistindo, pois, a dívida de IRC do ano de 1997, importa apurar se o ora recorrido é responsável subsidiário pela mesma, sendo que invocou que nunca exerceu de facto a gerência e que renunciou à gerência da sociedade em 6.2.98.
(…)
Sendo a dívida de 1997, a norma atributiva de responsabilidade subsidiária é a do art. 13 do CPT, donde resulta que cabe sempre ao administrador ou gerente a prova da inexistência de culpa e que o mecanismo da responsabilidade subsidiária dos gerentes só opera perante a verificação da gerência de facto, ou seja, do exercício real e efectivo do cargo.
A questão passa, pois, por se determinar, se o ora recorrido exerceu funções de gerência efectiva no período a que se refere a dívida.
Não sendo controvertida, no período a que se refere a dívida, a gerência de direito por parte do ora recorrido, não se pode, só por si, presumir a gerência de facto dessa gerência de direito, sendo que compete à Fazenda Pública a prova deste requisito (gerência de facto) para se poder responsabilizar o ora recorrido pela dívida em causa, entendimento este que vem sendo seguido na maioria da jurisprudência a partir do Acórdão do STA de 28/02/2007, do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, no recurso n° 01132/06 (…) (cfr., neste sentido, entre outros, os Ac. do STA de 10.12.2008 no recurso 0861/08 e o de 11.3.2009 no proc. 709/08) (…)
Ora, na situação em apreço, da matéria vertida na al. K. se retira que o oponente, ora recorrido, não desempenhou funções de gestão da sociedade executada.
Aliás, a recorrente, além disso, não alegou nem provou a prática de qualquer acto de gestão por parte do ora recorrido no período em que foi gerente de direito na mesma, sendo que se bastou com a alegação na contestação de que da gerência de direito se presumia a gerência de facto. Só resulta, assim, do probatório, que o ora recorrido foi gerente de direito na sociedade executada no período a que se refere a dívida. Do vertido no probatório não se pode, pois, concluir pela gerência de facto ou efectiva, por parte do ora recorrido, no período a que se refere a dívida, sendo que só se provou a gerência de direito e desta não se presume, só por si, a gerência de facto, antes competindo à Fazenda Pública a prova deste requisito (gerência de facto) para se poder responsabilizar o oponente pela dívida em questão.
Se ele exerceu essas funções, isso não consta dos autos sendo que era à Fazenda Pública que competia essa alegação e prova como já se referiu supra. Não tendo a Fazenda Pública feito prova de actos de gerência por parte do ora recorrido e não se podendo inferir isso do conjunto da prova, temos que concluir que não se verifica um pressuposto da responsabilidade do ora recorrido por tais dívidas e que é o da gerência de facto.
Não constando do título executivo e não sendo responsável subsidiário pela dívida é o mesmo parte ilegítima na execução face ao disposto na al. b) do n° l do art. 204 do CPPT.
Procede, pois, a oposição por ilegitimidade do oponente relativamente a tal dívida de IRC de 1997
Ou seja, o acórdão recorrido decidiu, no que aqui releva, que, estando provado que o recorrido não exerceu a gerência efectiva da devedora originária, como resulta do ponto K do probatório e não constando ele do título executivo, é o mesmo parte ilegítima na execução, nos termos do disposto na al. b) do nº 1 do art. 204º do CPPT.

4.2. Por sua vez, no acórdão fundamento (proferido na Secção de Contencioso Tributário do TCAS, em 18/6/2002, no proc. nº 6083/01), negou-se provimento ao respectivo recurso e mantendo-se a decisão de 1ª instância que havia julgado improcedente a oposição, com os seguintes fundamentos, além do mais:
De acordo com o disposto no art. 252º do Código das Sociedades Comerciais, a eleição ou designação de uma pessoa como gerente e a correlativa aceitação originam um contrato entre a sociedade e o gerente, evidenciado para com a sociedade e terceiros pela titularidade da posição contratual decorrente do contrato de gerência na pessoa do designado ou eleito, isto é, pela relação de pertinência do direito subjectivo (poder legalmente conferido à gerência em função dos interesses sociais juridicamente relevantes) ao sujeito investido.
Considerada a capacidade de exercício de direitos como "(..) a idoneidade não só para exercitar direitos ou cumprir obrigações como também para os adquirir ou as assumir, e para fazer tudo isto pessoalmente, por acto próprio e exclusivo da pessoa visada, sem haver lugar à intervenção de um representante legal (designado por outro modo que não pelo próprio representado) ou ser necessário o consentimento de outra pessoa (também não designada por aquela)..." torna-se evidente que a aceitação da titularidade da gerência implica, em juízo de normalidade, a aptidão para produzir efeitos de direito por mera actuação pessoal, quanto mais não seja porque a lei, art. 252º nº 1 do CSC, reflecte aquilo que é do conhecimento comum: que os gerentes devem ser pessoas singulares dotadas de capacidade jurídica plena, isto é, capazes de entender e querer, até porque, para além dos termos gerais de direito, "(..) a relação contratual estabelecida entre a sociedade e o gerente tem, quanto a este, carácter altamente pessoal (..)", sendo este o fundamento jurídico da presunção legal de que quem é gerente exerce, realiza e conclui actos jurídicos próprios a essa titularidade, o mesmo é dizer, próprios ao exercício da gerência, enquanto sujeito do órgão executivo e representativo duma dada sociedade comercial.
Conjugando a natureza contratual e pessoal da gerência com a inerência da titularidade do cargo à capacidade de exercício, é de concluir que, em sede normativa da responsabilidade subsidiária, das expressões legais "período da sua gerência" e "período de exercício do seu cargo" dos arts. 16º do CPCI, 13º nº 1 do CPT e 24º nº 1 a) e b) da LGT deriva claramente a presunção de que quem tem a titularidade do cargo de gerente leva à prática o seu exercício. Ou seja, verificada a gerência de direito, presume-se a gerência de facto, presunção legal tantum juris, passível de ser ilidida por prova em contrário.
E para quem sustente que estamos perante uma presunção judicial, então, nos termos do art. 346º C. Civil,"(..) à prova produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório (o Oponente) pode a parte contrária (a Fazenda Pública) opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos; se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova (..)".
De acordo com o art. 13º do CPT presume-se a culpa do gerente pela insuficiência do património societário, incumbindo ao mesmo o ónus da prova de que não foi por sua culpa que ocorreu essa insuficiência.

4.3. Ora, do exposto, parece claro que, como se salienta no Parecer do MP e nas contra-alegações do recorrido, existe uma relevante diferença entre as situações factuais subjacentes aos acórdãos em confronto.
Com efeito, a solução jurídica aceite no acórdão recorrido assenta, em primeira linha, num contexto factual específico, que o próprio acórdão faz reflectir na factualidade constante da alínea K) do respectivo Probatório que fora fixado na sentença: ou seja [independentemente, do sentido conclusivo da matéria de facto constante dessa alínea K) do Probatório] o que o acórdão acaba por considerar é que, na situação aí em causa, «da matéria vertida na al. K. se retira que o oponente, ora recorrido, não desempenhou funções de gestão da sociedade executada», daí concluindo pela ilegitimidade do oponente e pela consequente procedência da oposição.
E apesar de, em seguida, também considerar que a recorrente, «não alegou nem provou a prática de qualquer acto de gestão por parte do ora recorrido no período em que foi gerente de direito na mesma, sendo que se bastou com a alegação na contestação de que da gerência de direito se presumia a gerência de facto» e que «… só se provou a gerência de direito e desta não se presume, só por si, a gerência de facto, antes competindo à Fazenda Pública a prova deste requisito (gerência de facto) para se poder responsabilizar o oponente pela dívida em questão», esta segunda linha de fundamentação acaba por constituir um reforço argumentativo a acrescer àquela primeira conclusão que o acórdão retirou da matéria constante da dita alínea K) do Probatório, tanto que se afirma que « resulta, assim, do probatório, que o ora recorrido foi gerente de direito na sociedade executada no período a que se refere a dívida. Do vertido no probatório não se pode, pois, concluir pela gerência de facto ou efectiva, por parte do ora recorrido, no período a que se refere a dívida» (sublinhados nossos).
Assim, os arestos em confronto decidiram a mesma questão de forma distinta, não por força de divergência de entendimentos jurídicos, mas, antes, por força de diferentes quadros factuais que julgaram provados. Ou seja, independentemente de quaisquer outras vicissitudes, resulta da análise do julgamento feito no acórdão recorrido e no acórdão fundamento que não existe entre eles divergência e incompatibilidade que justifiquem e sirvam de fundamento ao presente recurso por oposição de acórdãos.
E porque, por um lado, apenas é relevante para fundamentar o recurso por oposição de julgados, a oposição entre soluções expressas, sendo que a oposição deverá existir relativamente às decisões propriamente ditas e não em relação aos seus fundamentos (não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta) - cfr. Jorge de Sousa e Simas Santos, Recursos Jurisdicionais em Contencioso Fiscal, p. 424, acs. do Plenário deste STA, de 15/11/2006, rec. nº 387/05, bem como os acs. do Pleno desta Secção do STA, de 15/9/2010, recs. nºs. 344/2009 e 881/2009 - e, porque, por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, embora esta deva ser entendida não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais, é de concluir que, no caso presente e no contexto factual e jurídico acima referenciado, a diversidade de soluções a que o Tribunal chegou nos dois casos em confronto não determina qualquer oposição de julgados, na medida em que não se verificam nem a alegada identidade substancial das situações fácticas em confronto nem divergência de soluções quanto à mesma questão de direito.
E, assim sendo, por falta dos pressupostos do recurso de oposição de julgados, este deve ser considerado findo, atento o disposto no nº 5 do art. 284º do CPPT.

5. Acresce, de todo o modo, que mesmo que se entendesse que ocorre a apontada oposição de acórdãos, o presente recurso também não poderia prosseguir, pois que sempre faleceria o segundo requisito de que depende a admissibilidade do recurso por oposição de julgados: é que o acórdão recorrido está em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Com efeito, este Supremo Tribunal tem entendido – cfr., o recente acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, de 19/9/2012, proferido no rec. nº 1075/11 – que a existência de uma jurisprudência consolidada deve transparecer ou do facto de a pronúncia respectiva constar de acórdão do Pleno assumido pela generalidade dos Conselheiros em exercício na Secção (consoante prevê o nº 2 do art. 17º do actual ETAF) ou do facto de existir uma sequência ininterrupta de várias decisões no mesmo sentido, obtidas por unanimidade em todas as formações da Secção.
Ora, o acórdão recorrido, no segmento impugnado, adoptou, quanto à aludida questão de saber se, no âmbito do art. 13º do CPT, verificada a gerência de direito, se presume a gerência de facto, presunção legal tantum juris, possível de ser ilidida por prova em contrário, cabendo essa prova ao oponente, a posição assumida, por unanimidade, no Acórdão do Pleno desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 28/2/2007, no proc. nº 01132/06 (referido, aliás, no acórdão recorrido) e reafirmada, igualmente por unanimidade, quer nos acs. da Secção do contencioso Tributário deste STA, de 10/12/2008, rec. nº 861/08 e de 11/3/2009, rec. nº 709/08, quer no recente acórdão do Pleno da mesma secção, de 21/11/2012, no proc. nº 474/12, este com intervenção do (actual) plenário da Secção de Contencioso Tributário.
Na verdade, aí se afirmou o seguinte:
«Quando, em casos como os tratados pelos arestos aqui em apreciação, a Fazenda Pública pretende efectivar a responsabilidade subsidiária do gerente, exigindo o cumprimento coercivo da obrigação na execução fiscal inicialmente instaurada contra a originária devedora, deve, de acordo com as regras de repartição do ónus da prova, provar os factos que legitimam tal exigência.
Mas, no regime do artigo 13º do CPT, porque beneficia da presunção legal de que o gerente agiu culposamente, não tem que provar essa culpa. Ainda assim, nada a dispensa de provar os demais factos, designadamente, que o revertido geriu a sociedade principal devedora. Deste modo, provada que seja a gerência de direito, continua a caber-lhe provar que à designação correspondeu o efectivo exercício da função, posto que a lei se não basta, para responsabilizar o gerente, com a mera designação, desacompanhada de qualquer concretização.
Este efectivo exercício pode o juiz inferi-lo do conjunto da prova, usando as regras da experiência, fazendo juízos de probabilidade, etc. Mas não pode retirá-lo, mecanicamente, do facto de o revertido ter sido designado gerente, na falta de presunção legal.
A regra do artigo 346º do Código Civil, segundo a qual «à prova que for produzida pela parte sobre quem recai o ónus probatório pode a parte contrária opor contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos», sendo então «a questão decidida contra a parte onerada com a prova», não tem o significado que parece atribuir-lhe o acórdão recorrido. Aplicada ao caso, tem este alcance: se a Fazenda Pública produzir prova sobre a gerência e o revertido lograr provar factos que suscitem dúvida sobre o facto, este deve dar-se por não provado. Mas a regra não se aplica se a Fazenda não produzir qualquer prova».
Inexiste, pois, no artigo 13º do CPT qualquer presunção legal no sentido de que a gerência de facto se infira da gerência de direito, pelo que a Administração tributária, para efectivar a responsabilidade subsidiária dos gerentes ou administradores, tem de provar que a designação para o cargo foi acompanhada do efectivo exercício da função, pois que a lei se não basta, para responsabilizar o gerente, com a mera designação, desacompanhada de qualquer concretização
E neste contexto, também por este motivo sempre o recurso teria que julgar-se findo.

DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA em julgar findo o recurso.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 12 de Dezembro de 2012. – Joaquim Casimiro Gonçalves (relator) - Isabel Cristina Mota Marques da Silva – José da Ascensão Lopes - Lino José Batista Rodrigues Ribeiro - Pedro Manuel Dias Delgado – Maria Fernanda dos Santos Maçãs - Dulce Manuel da Conceição Neto - Alfredo Aníbal Bravo Coelho Madureira – João António Valente Torrão.