Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0294/11
Data do Acordão:09/14/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE TRANSMISSÃO ONEROSA DE IMOVEIS
AVALIAÇÃO
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO
ISENÇÃO DE IMPOSTO
NOTIFICAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:I - Nos termos do art. 35.º do CIMT, conjugado com o art. 45.º, n.º 1, in fine, da LGT, o prazo de caducidade do direito à liquidação do IMT é de oito anos a contar da transmissão ou da data em que a isenção ficou sem efeito.
II - Todavia, no caso de liquidação adicional, por força do disposto no n.º 3 do art. 31.º do CIMT, esse prazo será de quatro anos a contar da liquidação a corrigir.
III - A liquidação de IMT efectuada em consequência de avaliação do imóvel que no acto de transmissão dos bens se mostrava isento desse imposto não é uma liquidação adicional, pois não se destina a corrigir uma liquidação anterior, mas constitui uma primeira liquidação efectuada na sequência da caducidade da isenção.
IV - Assim, apesar de a notificação da liquidação de IMT ter ocorrido mais de quatro anos após a transmissão, mas dentro do prazo dito em I, não pode ser bem sucedida a oposição deduzida à execução fiscal (instaurada para cobrança coerciva do montante liquidado) com o fundamento previsto na alínea e) do art. 204.º, n.º 1, do CPPT.
Nº Convencional:JSTA00067146
Nº do Documento:SA2201109140294
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LOULÉ PER SALTUM
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR FISC - IMT
DIR PROC TRIBUT CONT - OPOSIÇÃO
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART204 N1
LGT98 ART45 N1 ART100
CIMT03 ART31 N3 ART35 ART9
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC909/06 DE 2007/01/17; AC STA PROC153/11 DE 2011/05/18
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 5ED VII PAG359
Aditamento:
Texto Integral: 1. RELATÓRIO
1.1 A Administração tributária (AT) instaurou uma execução fiscal contra A… (adiante Executado, Oponente ou Recorrido) para cobrança de uma dívida de Imposto Municipal sobre Transacções Onerosas de Impostos (IMT).
1.2 O Executado deduziu oposição, invocando as alíneas e) e f) do art. 204.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e pedindo ao Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé a extinção da execução fiscal (Como resulta da parte decisória da sentença recorrida, foi nesse sentido – da extinção da execução fiscal – que a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé interpretou (e, a nosso ver, bem) o pedido formulado pelo Oponente, de que se declare «a nulidade de todos os procedimentos executivos já realizados»). alegando, para além do mais, que não foi notificado da liquidação que deu origem à dívida exequenda no prazo de 4 anos, como prescreve o disposto no art. 45.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT).
1.3 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé julgou a oposição procedente. Para tanto, em síntese, após referir que a liquidação que deu origem à dívida exequenda não é uma liquidação adicional, considerando que o prazo de caducidade do direito à liquidação é de 4 anos e que, desconhecendo-se a data da declaração a que se refere o n.º 2 do art. 19.º do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT), o mesmo deve contar-se da data da transmissão, ou seja, 23 de Abril de 2004 (Apesar de na sentença se referir o dia 23 de Abril de 2008 como sendo a data em que ocorreu a transmissão, é manifesto o lapso de escrita: escreveu-se 2008 onde se queria escrever 2004.), concluiu que «quando o oponente foi notificado da liquidação, em 11 de Agosto de 2008, já tinha decorrido o prazo da caducidade» (As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui e adiante, constituem transcrições)..
1.4 A Fazenda Pública não se conformou com a sentença e dela interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, que foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
1.5 A Recorrente apresentou as alegações de recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor:
«
1. Entende a Meritíssima Juiz [do Tribunal] “a quo” que tendo a transmissão ocorrido em 23 de Abril de 2004, quando o oponente foi notificado da liquidação em 11 de Agosto de 2008 já tinha decorrido o prazo de caducidade.
2. No caso sub judice, o recorrido esteve isento de imposto atento o valor declarado.
3. A liquidação sob crise decorre da avaliação efectuada ao imóvel adquirido.
4. Defende-se no douto aresto que “(…) Se tivesse havido liquidação a liquidação adicional se a houvesse só poderia fazer-se até decorridos quatro anos contados da liquidação a corrigir (como o n.º 3 do art.º 31.º do CIMT determina). Porém, não houve liquidação adicional, pois atento o valor patrimonial declarado do imóvel havia isenção. Assim, não há causa determinante da liquidação adicional pelo que o prazo de 4 anos tem de contar-se a partir da data da declaração a que se refere o n.º 2 do art. 19.º do CIMT. Assim, desconhecendo-se essa data haverá que atender à data em que ocorreu a transmissão, ou seja, 23 de Abril de 2008 (…)”.
5. Ora, o convocado art.º 31.º é aplicável em caso de liquidação adicional, a qual não existiu, conforme resulta da douta sentença.
6. A avaliação do imóvel deu origem à primeira liquidação do imposto que foi notificada em 11 de Agosto de 2008 ao impugnante.
7. Tratando-se de uma liquidação inicial é aplicável o disposto no art.º 35.º do CIMT, cujo prazo de caducidade é de oito anos,
8. Pelo que se conclui não ter ainda decorrido o prazo de caducidade à data em que o recorrido foi notificado da liquidação.
9. Ao decidir como decidiu o tribunal “a quo” fez incorrecta interpretação da lei violando o disposto no art.º 35.º da LGT (É manifesto o lapso de escrita: a Recorrente queria dizer CIMT onde escreveu LGT)..
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação [ (É manifesto o lapso de escrita: a Recorrente queria dizer oposição onde escreveu impugnação). ] improcedente, com as devidas consequências legais.
PORÉM, V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA
JUSTIÇA!».
1.6 O Recorrido contra alegou, pugnando pela manutenção da sentença recorrida mediante alegação que resumiu em conclusões do seguinte teor:
«
1. A decisão do Tribunal a quo não merece qualquer censura.
2. Pois, salvo melhor opinião, a notificação da liquidação deveria ter sido feita imperativa e irrevogavelmente ao Contribuinte, ora Oponente, até 23 de Abril de 2008, sendo que,
3. Não podem restar quaisquer dúvidas de que o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte, no prazo de quatro anos, ex vi n.º 1 do artigo 45.º da Lei Geral Tributária, pelo que,
4. e considerando que a escritura de compra e venda data de 23 de Abril de 2004,
5. o contribuinte teria de ser notificado, validamente, até 23 de Abril de 2008, o que não aconteceu.
6. Pelo que, estão reunidos os pressupostos da alínea e) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT; aliás,
7. Assim, a falta de notificação do acto de liquidação, quando não estiver em causa a caducidade do direito de liquidação – por ainda não ter decorrido o respectivo prazo – constituirá também fundamento de oposição à execução fiscal, por afectar a eficácia do acto e, consequentemente, a exigibilidade da obrigação por ele constituída; só que,
8. tal situação, a verificar-se, não será enquadrável na alínea e), mas sim na alínea f), deste mesmo n.º 1 do artigo 204.º, do CPPT.
9. Posto isto, podemos concluir que as alegações de recurso apresentadas pela Recorrente carecem de qualquer fundamentação legal, devendo ser mantida a decisão do tribunal a quo.
TERMOS EM QUE SE DEVERÁ CONFIRMAR A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA, COM A CONSEQUENTE E NECESSÁRIA IMPROCEDÊNCIA DO PRESENTE RECURSO.
ASSIM DECIDINDO, VOSSAS EXCELÊNCIAS, SENHORES DESEMBARGADORES [ (Pese embora aludir a desembargadores, denominação reservada, nesta jurisdição, para os juízes dos tribunais centrais administrativos, é manifesto que a Recorrente pretende referir-se aos juízes do Supremo Tribunal Administrativo, tribunal a que dirigiu o recurso, que têm o tratamento de conselheiros (cfr. art. 58.º, n.ºs 1 e 2, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro). ], FARÃO, COMO SEMPRE, A COSTUMADA
JUSTIÇA!».
1.7 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público.
1.8 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos.
1.9 A questão suscitada pela Recorrente é a de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento quando considerou que o prazo da caducidade do direito à liquidação aplicável à situação sub judice é de 4 anos, ao invés do prazo de 8 anos consagrado no art. 35.º do CIMT.
* * *
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO
2.1.1 Na sentença recorrida, o julgamento da matéria de facto foi efectuado nos seguintes termos:
«O tribunal deu como provados os seguintes factos:
A) Por escritura pública de compra e venda celebrada em 23 de Abril de 2004, no 1º Cartório Notarial de Faro, o oponente adquiriu metade do prédio urbano sito em Vale Formoso, freguesia de São Clemente, concelho de Loulé, inscrito na matriz predial sob o artº 8878 (informação de fls. 49 dos autos);
B) Como 1ª transmissão originou a entrega da declaração modelo 1 do CIMI (informação de fls. 49 dos autos);
C) O valor do imóvel declarado foi de € 27.000,00 (informação de fls. 49 dos autos);
D) Em 8 de Junho de 2005 foi o oponente notificado do valor da avaliação de € 174.700,00 (informação de fls. 49 dos autos);
E) Em 18 de Julho de 2008 os Serviços de Finanças procederam à liquidação oficiosa de IMT (nº 4045603), na importância de € 4.329,00, que teve por base a informação do notário como se o oponente fosse dono da totalidade do imóvel (informação de fls. 49 dos autos);
F) A data limite do pagamento era em 13 de Setembro de 2009 (informação de fls. 49 dos autos);
G) Não foi efectuado o pagamento (informação de fls. 49 dos autos);
H) O oponente deu entrada com impugnação judicial a que coube o n.º 709/08.0BELLE, na qual foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente o pedido e determinado a anulação da liquidação na parte excedente, ou seja, na importância de € 2.164,50 (fls. 31 a 39 dos autos);
I) O Serviço de Finanças de Loulé 1 procedeu a anulação da liquidação na importância de € 2.164,50 (informação de fls. 49 dos autos);
J) Em 24 de Janeiro de 2010 foi instaurado o processo de execução fiscal nº 108220100105073, para cobrança de IMT (informação de fls. 49 dos autos);
K) Em 30 de Janeiro de 2010 o oponente foi citado (informação de fls. 49 dos autos);
L) Em 2 de Março de 2010 o oponente deu entrada com a presente oposição (carimbo aposto no rosto de fls. 2 dos autos).
[…]
Factos não provados
Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa».
2.1.2 Na sentença foi ainda dado como assente (Note-se, aliás, que o Oponente na petição inicial assume frontalmente que «foi notificado a 11-08-2008» (cfr. item 42 da petição inicial), afirmação que reitera nas contra alegações do presente recurso (cfr. item 42 das contra alegações)., se bem que não no local onde a Juíza se propôs efectuar o julgamento da matéria de facto (É certo que a lei, impondo que o julgamento da matéria de facto seja feito na sentença, designadamente impondo que «[o] juiz discriminará […] a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões» (cf. art. 123.º, n.º 2, do CPPT), designadamente, tomando «em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que […] deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer» (art. 659.º, n.º 3, do CPC), não exige que o mesmo seja feito de forma autonomizada. No entanto, a praxis levou a que se considere de boa técnica que o julgamento de facto seja feito de forma inequívoca, sendo que a tradição é no sentido de que conste mesmo de uma parte perfeitamente delimitada da sentença, a seguir ao relatório (cfr. art. 659.º, n.º 2, do CPC). O que se nos afigura é que, optando o juiz por destacar uma parte da sentença como sendo a que se refere ao julgamento da matéria de facto, deve dela fazer constar todo esse julgamento, não o dispersando por outras partes da sentença sem qualquer chamada de atenção para essa circunstância, a bem da boa compreensão dos motivos por que decidiu)., o seguinte:
«[…] o oponente foi notificado da liquidação em 11 de Agosto de 2008».
*
2.2 DE DIREITO
2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR
Está em causa averiguar se a notificação que foi feita ao Contribuinte da liquidação de IMT que ora lhe está a ser exigido coercivamente o foi antes do termo do prazo da caducidade da liquidação do imposto. Na verdade, entre os fundamentos que podem determinar a procedência da oposição à execução fiscal conta-se a «Falta de notificação da liquidação do tributo no prazo da caducidade», prevista na alínea e) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT e que se refere a «casos em que foi efectuada uma notificação, mas ela foi feita após o decurso do prazo de caducidade» (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 5.ª edição, II volume, anotação 37 ao art. 204.º, pág. 359 e segs. Aí se estabelece com rigor o alcance da norma e, designadamente, se distinguem os casos de notificação efectuada para além do termo do prazo da caducidade do direito à liquidação dos casos de falta de notificação, estes subsumíveis à alínea i) do mesmo preceito legal)..
Na situação sub judice, estando assente que o facto tributário ocorreu em 23 de Abril de 2004 (Como veremos adiante, relevante como dies a quo do prazo é a data da transmissão ou a data em que a isenção ficou sem efeito, motivo por que, salvo o devido respeito, não alcançamos o motivo por que na sentença se aludiu a esse propósito à declaração a que se refere o art. 19.º, n.º 2, do CIMT. Em todo o caso, a considerar-se que era essa declaração que revelava como termo inicial do prazo, sempre deveria indagar-se (ainda que oficiosamente – cfr. art. 99.º, n.º 1, da LGT e art. 13.º, n.º 1, do CPPT) a data em que a mesma foi apresentada, ao invés de se ter invocado o desconhecimento dessa data para justificar a contagem do prazo com início na data da transmissão). e que o ora Recorrido foi notificado da liquidação em 11 de Agosto de 2008, a questão a dirimir (e a sorte do recurso) prende-se apenas com a determinação do prazo da caducidade do direito à liquidação: quatro anos, como decidiu a sentença (se bem que da sua leitura não se alcance ao abrigo de que norma considerou ser esse o prazo aplicável) e como sustenta o Recorrido, que invoca o art. 45.º, n.º 1, da LGT, ou oito anos, como sustenta a Recorrente, louvando-se no art. 35.º do CMIT?
É essa a questão que cumpre apreciar e decidir, sendo que, como procuraremos demonstrar, a resposta à mesma impõe também que se averigúe da natureza da liquidação que deu origem à dívida exequenda: liquidação inicial ou liquidação adicional?
2.2.2 DA CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO
Dispõe o art. 45.º, n.º 1, da LGT: «O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro».
Um dos casos em que a lei fixa outro prazo é o do IMT, dispondo o art. 35.º, n.º 1, do respectivo Código: «Só pode ser liquidado imposto nos oito anos seguintes à transmissão ou à data em que a isenção ficou sem efeito, sem prejuízo do disposto no número seguinte e, quanto ao restante, no artigo 46º da Lei Geral Tributária».
Ou seja, como excepção ao prazo geral de caducidade de quatro anos, a lei fixa, para o IMT, um prazo especial de oito anos, a contar da transmissão ou da data em que a isenção ficou sem efeito. Daí que, salvo o devido respeito, não possa sustentar-se, como o faz o Recorrido, a aplicação ao caso sub judice do prazo de quatro anos previsto no art. 45.º, n.º 1, da LGT.
De tudo isso bem deu conta a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que também salientou que, caso tivesse havido liquidação adicional, «esta só poderia fazer-se até decorridos quatro anos contados da liquidação a corrigir (como o nº 3 do artº 31º do CIMT determina)». Mas, logo advertiu: «Porém no caso não houve liquidação adicional, pois atento o valor patrimonial declarado do imóvel havia isenção». Ou seja, se bem interpretamos a sentença, com essa advertência visava justificar por que, a seu ver, a liquidação que deu origem à dívida exequenda não pode qualificar-se como adicional: não houve liquidação anterior, uma vez que havia isenção do imposto face ao valor tributável (e ao destino (Embora a sentença apenas se refira ao valor declarado para a transmissão, a isenção em causa depende também do destino do imóvel, como resulta do disposto no art. 9.º do CIMT).) declarado.
Assim, e tanto mais que reiterou que «não há causa determinante da liquidação adicional», mal se compreende que tenha concluído, como concluiu, que o prazo de caducidade do direito à liquidação aplicável à situação sub judice é de quatro anos. Na verdade, a aplicação do prazo de quatro anos só poderia encontrar justificação ao abrigo do n.º 3 do art. 31.º do CIMT, que dispõe: «A liquidação só pode fazer-se até decorridos quatro anos contados da liquidação a corrigir, excepto se for por omissão de bens ou valores, caso em que poderá ainda fazer-se posteriormente, ficando ressalvado, em todos os casos, o disposto no artigo 35º». Ou seja, só poderia aplicar-se o prazo de caducidade de quatro anos se a liquidação constituísse uma liquidação adicional (hipótese que a Juíza do Tribunal a quo expressamente afastou), sendo que então o prazo seria a contar da liquidação a corrigir (E sempre respeitando o prazo de oito anos fixado no art. 35.º do CIMT). .
Seja como for, nada permite qualificar como liquidação adicional o acto tributário que deu origem à dívida exequenda. Na verdade, a liquidação adicional pressupõe que tenha havido uma liquidação anterior (relativamente ao mesmo facto tributário, ao mesmo sujeito passivo e ao mesmo período de tempo), que aquela se destina a corrigir ou rectificar porque, por erro de facto ou de direito ou por uma omissão ou inexactidão praticadas nas declarações prestadas para efeitos de liquidação, foi determinada a cobrança de um imposto inferior ao devido. Ou seja, a liquidação adicional não é mais do que a correcção de uma liquidação deficiente em consequência de erros ou omissões, que tanto podem ser da responsabilidade dos serviços como dos contribuintes (Neste sentido, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
– de 17 de Janeiro de 2007, proferido no processo com o n.º 909/06, publicado no Apêndice ao Diário da República de 14 de Fevereiro de 2008 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2007/32210.pdf), págs. 96 a 102, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/da11decbc3b9dabd8025726d003b7579?OpenDocument;
– de 18 de Maio de 2011, proferido no processo com o n.º 153/11, ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/94e29e68a39ec0468025789a0039e45a?OpenDocument..
Ora, a liquidação que deu origem à dívida exequenda não foi efectuada em ordem a corrigir ou rectificar uma liquidação anterior viciada por erro de facto ou de direito ou por omissões ou inexactidões praticadas nas declarações prestadas para efeitos de liquidação. Desde logo porque, como bem salientou a Juíza do Tribunal a quo, a transmissão do imóvel que constitui o facto tributário não havia dado lugar à liquidação do imposto porque, atento o valor e o destino declarados, dele estava isento.
Esse acto constitui, isso sim, uma primeira liquidação, efectuada na sequência da caducidade da isenção que obstara à liquidação previamente à transmissão, caducidade essa resultante do valor que foi atribuído ao prédio em sede de avaliação.
Nem queira invocar-se em favor da natureza adicional da liquidação o disposto no art. 31.º, n.º 2, do CIMT (Como o fez o Representante do Ministério Público junto do Tribunal Central Administrativo Sul, para onde, por lapso, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé remeteu o processo)., que dispõe: «Quando se verificar que nas liquidações se cometeu erro de facto ou de direito, de que resultou prejuízo para o Estado, bem como nos casos em que haja lugar a avaliação, o chefe do serviço de finanças onde tenha sido efectuada a liquidação ou entregue a declaração para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 19.º, promove a competente liquidação adicional».
Na verdade, embora uma interpretação unicamente cingida à letra da lei pudesse inculcar a ideia de que toda e qualquer liquidação efectuada na sequência de avaliação teria a natureza de liquidação adicional, é manifesto que não é assim: a liquidação efectuada na sequência de avaliação só terá tal natureza desde que tenha havido previamente uma liquidação.
Afigura-se-nos, pois, que o recurso merece provimento, motivo por que a sentença deve ser revogada e a oposição à execução fiscal ser julgada improcedente, tudo como decidiremos a final.
Uma breve nota apenas para referir a irrelevância, para os efeitos que ora importa considerar, da anulação judicial da liquidação, na proporção de metade (que decorreu do facto de a AT ter erradamente considerado que o ora Recorrido adquirira a totalidade do imóvel em causa, quando ele apenas adquiriu metade). É que essa decisão judicial não deu origem a nova liquidação, mas apenas a que a AT, em cumprimento da obrigação de reconstituição da legalidade do acto (cfr. art. 100.º da LGT), anulasse a liquidação na parte em que foi declarada ilegal.
2.2.3 CONCLUSÕES
Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - Nos termos do art. 35.º do CIMT, conjugado com o art. 45.º, n.º 1, in fine, da LGT, o prazo de caducidade do direito à liquidação do IMT é de oito anos a contar da transmissão ou da data em que a isenção ficou sem efeito.
II - Todavia, no caso de liquidação adicional, por força do disposto no n.º 3 do art. 31.º do CIMT, esse prazo será de quatro anos a contar da liquidação a corrigir.
III - A liquidação de IMT efectuada em consequência de avaliação do imóvel que no acto de transmissão dos bens se mostrava isento desse imposto não é uma liquidação adicional, pois não se destina a corrigir uma liquidação anterior, mas constitui uma primeira liquidação efectuada na sequência da caducidade da isenção.
IV - Assim, apesar de a notificação da liquidação de IMT ter ocorrido mais de quatro anos após a transmissão, mas dentro do prazo dito em I, não pode ser bem sucedida a oposição deduzida à execução fiscal (instaurada para cobrança coerciva do montante liquidado) com o fundamento previsto na alínea e) do art. 204.º, n.º 1, do CPPT.
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3. DECISÃO
Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a oposição à execução fiscal.
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Custas pelo Recorrido, neste STA e na 1ª instância.
Lisboa, 14 de Setembro de 2011. – Francisco Rothes (relator) – Isabel Marques da Silva – António Calhau.