Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01374/13
Data do Acordão:10/15/2014
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE JULGADOS
OPOSIÇÃO DE JULGADOS
PRINCÍPIO DO APROVEITAMENTO DO ACTO
Sumário:I - O recurso por oposição de acórdãos interposto em processo judicial tributário instaurado após a entrada em vigor do ETAF de 2002 depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais: que se verifique contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
II - Se o acórdão invocado como fundamento ainda não tinha transitado em julgado à data em que foi interposto o recurso por oposição de acórdãos, este não deve ser admitido.
III - Verifica-se o 1.º requisito referido em I se os acórdãos em confronto assentam em situações de facto idênticas nos seus contornos essenciais e está em causa o mesmo fundamento de direito, não tendo havido alteração substancial da regulamentação jurídica pertinente e tendo sido perfilhada solução oposta, por decisões expressas e antagónicas.
IV - A aplicação do princípio do aproveitamento do acto para obstar à anulação de um acto de liquidação efectuado sem prévia audição do destinatário depende de um juízo de prognose póstuma no sentido da inexistência de qualquer possibilidade de a sua intervenção poder influenciar o conteúdo daquele acto.
Nº Convencional:JSTA00068952
Nº do Documento:SAP2014101501374
Data de Entrada:09/04/2013
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:INFARMED, IP
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS
Objecto:AC TCAS PROC1374/13 AC TCAS PROC4567/11 AC STA PROC0928/11.
Decisão:PROVIMENTO PARCIAL.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - OPOSIÇÃO.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART284 N3 N5 ART85 N3 ART59 N1 N2 ART134 N1 N2.
CPC13 ART641 N5.
ETAF02 ART27 B.
CPTA02 ART152.
LGT98 ART60 N2 ART36 N3 ART39 N2 ART81 N1 ART82 N1 ART83 N1 ART84 N1 N3.
CPA91 ART135.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01071/06 2007/02/15.
Referência a Doutrina:DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM RODRIGUES E JORGE DE SOUSA - LEI GERAL TRIBUTÁRIA ANOTADA E COMENTADA 4ED PÁG515.
Aditamento:
Texto Integral: Recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo por oposição de acórdãos

1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade denominada “A………………., Lda.” (adiante Recorrente) veio, ao abrigo do disposto no art. 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão proferido nestes autos em 18 de Setembro de 2012 pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, invocando oposição com o acórdão da mesmo Secção e Tribunal Central de 14 de Junho de 2011, proferido no processo n.º 4567/11, e com o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 29 de Fevereiro de 2012, proferido no processo n.º 928/11.

1.2 Admitido o recurso, e em face das alegações produzidas ao abrigo do disposto no art. 284.º, n.º 3, CPPT, o Juiz Desembargador Relator no Tribunal Central Administrativo Sul entendeu verificar-se a invocada oposição e ordenou a notificação das partes para alegaram nos termos do n.º 5 do mesmo artigo.

1.3 A Recorrente apresentou, então, alegações sobre o mérito do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «

a) Existem no acórdão a quo duas matérias em oposição com decisões do TCA Sul e do STA: (i) a primeira respeita à omissão de audição prévia à liquidação de tributos; (ii) a segunda refere-se à não fundamentação da liquidação de juros compensatórios.

b) Subjacente à decisão do acórdão-recorrido e à decisão do acórdão-fundamento – acórdão do TCA Sul, de 14 de Junho de 2011, proferido no recurso n.º 04567/11 – atinentes à preterição de audição prévia à liquidação de tributos encontra-se exactamente a mesma situação de facto.

c) Com efeito, é o mesmo o tributo em causa, a saber a «taxa sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene pessoal», em ambos os casos as liquidações foram feitas oficiosamente pelo INFARMED com base em elementos que recolheu da contabilidade dos sujeitos passivos, no âmbito de inspecção por este promovida, e, em qualquer dos casos, não foram os ditos sujeitos ouvidos antes das relevantes liquidações oficiosas.

d) Perante esta realidade, e ao abrigo do artigo 60.º da LGT, nos dois acórdãos são analisadas as consequências da preterição de audição prévia à liquidação de tributos assentes na capacidade contributiva, revelada pela contabilidade do sujeito passivo, e a possibilidade da referida preterição se degradar em exigência não essencial.

e) Face à mesmíssima questão de direito e de facto, e não tendo havido quaisquer alterações ao quadro legislativo relevante, foram emitidas, de forma expressa, decisões opostas.

f) Apesar de a Recorrente ter questionado os produtos considerados para o cálculo das liquidações e colocado em causa os valores dos «volumes de vendas» sobre os quais incidiu o tributo em crise, desde logo devido à total falta de fundamentação e à ausência de audição prévia às liquidações do tributo, no acórdão-recorrido foi sufragado o entendimento de que, ainda assim, a falta de audição prévia seria inútil e por isso inoperante.

g) Ao invés, no acórdão-fundamento conclui-se no sentido oposto, ou seja, de que, tendo o sujeito passivo do tributo questionado o valor dos «volumes de vendas» por carência de fundamentação, e nem sequer tendo conhecimento do modo como o INFARMED apurou o respectivo cálculo (designadamente, quais os valores e produtos considerados), a preterição de audição não pode ser degradada em exigência não essencial e devem de ser anuladas as liquidações em causa.

h) Não se pode considerar que exista jurisprudência consolidada do STA no sentido da decisão constante do acórdão-recorrido, muito pelo contrário.

i) Ora, consubstanciando o tributo liquidado pelo INFARMED um verdadeiro imposto (segundo a jurisprudência superior e também segundo o Tribunal a quo), mostra-se de reforçada importância a necessidade de garantir que aos respectivos contribuintes, e no caso em apreço à Recorrente, seja concedida a possibilidade de participarem na decisão que estabelece a matéria colectável do imposto, a qual reflectirá a sua capacidade contributiva.

j) O acórdão-recorrido decidiu mal ao determinar que o facto de a Recorrente ter sido alvo de uma inspecção onde foram recolhidos elementos bastaria para considerar que as liquidações em apreço foram feitas com base em «declaração do contribuinte», assim incorrendo em violação do n.º 2 do artigo 60.º da LGT.

k) Ao invés, bem andou o acórdão-fundamento ao determinar que, não tendo o contribuinte em causa apresentado qualquer declaração de vendas para efeitos da liquidação do tributo em crise – como aconteceu no caso dos Autos –, não podia a sua audição em momento anterior à liquidação ser dispensada, nos termos do artigo 60.º, n.º 2, da LGT.

l) Verdadeiramente, no caso do acórdão-recorrido as liquidações em crise não foram efectuadas com base em qualquer declaração do contribuinte, pelo que a invocação no caso dos Autos do n.º 2 do artigo 60.º da LGT é, desde logo, um erro nos pressupostos de facto...

m) O facto de o INFARMED ter recolhido certos elementos da contabilidade do contribuinte, sem mais, não poderá equiparar-se à apresentação de declaração nos termos do artigo 60.º, n.º 2, da LGT.

n) Por «declaração do contribuinte» não se pode entender qualquer entrega de elementos, dados ou informações, devendo, ao invés, entender-se que estará em causa a declaração, em modelo oficial, prevista e imposta por lei, que tenha por efeitos praticamente substituir o sujeito activo no cálculo do tributo a pagar, situação em que a liquidação se limita à mera acção de processar os dados fácticos e jurídicos decorrentes da declaração do contribuinte.

o) Como afirmou expressamente, e bem, o Tribunal Tributário de Lisboa, na sentença proferida nestes Autos: «sucede que as liquidações em apreço não foram efectuadas com base numa declaração da impugnante, nem foram autoliquidadas, antes resultando de montantes apurados no âmbito de uma acção de inspecção efectuada pelo INFARMED, tendo a liquidação sido efectuada por este» – cfr. sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, p. 22, a fls. 477 dos Autos (cit.).

p) O entendimento sufragado no acórdão-recorrido acarreta nefastas consequências quanto à protecção do contribuinte, seus direitos e expectativas, ao possibilitar que, pela simples solicitação de elementos contabilísticos aos contribuintes ou pela condução de acções de inspecção – mesmo em casos em que ao contribuinte não seja dado conhecimento do resultado destas, como sucedeu no caso em apreço – a Administração logre afastar a necessidade de audição prévia às liquidações.

q) Mais, o facto de os elementos para a liquidação do tributo em crise terem sido retirados (mais a mais por uma empresa privada contratada para o efeito) da contabilidade da Recorrente não implica, como bem se refere no acórdão-fundamento, que tenha havido uma estabilização da quantificação daquele «volume de vendas» – que constitui a matéria colectável do tributo em crise –, bem pelo contrário!

r) A Recorrente sempre questionou – e se opôs – os montantes dos «volumes de vendas» por referência à total falta de fundamentação dos actos de liquidação e à manifesta ausência de audição ao longo do processo de liquidação, justamente como fez o contribuinte do acórdão-fundamento – cfr. artigos 105 e 106 da petição inicial da ora Recorrente e as conclusões gg) e hh) das suas contra-alegações, a fls. 20 e 599 dos Autos.

s) A Recorrente sempre alegou que o INFARMED nunca identificou quais os produtos que alegadamente se enquadravam na definição legal de «Produto Cosmético e de Higiene Corporal», requisito indispensável para a determinação da matéria colectável e, assim, do montante do tributo a pagar, limitando-se a referir que o «volume de vendas» tinha sido retirado da contabilidade da empresa – cfr. fls. 19 dos Autos.

t) Se a Recorrente (i) desconhece o modo com o INFARMED determinou a matéria colectável do imposto dos Autos, (ii) se essa determinação foi feita oficiosamente e na sequência de elementos recolhidos pelo próprio INFARMED, (iii) se a A…………[desconhece] como o INFARMED apurou o valor do tributo (i.e., quais os produtos considerados), então a quantificação daquela matéria colectável não se pode ter por estabilizada e insusceptível de modificação em sede de audição.

u) Encontramo-nos perante um tributo cuja quantificação assenta necessariamente numa ordem de grandeza que respeita à esfera do particular, pelo que dever-se-á concluir que este deve ser ouvido antes da liquidação, fundamentalmente, no que concerne ao modo e ao montante que tenha sido apurado pelo sujeito activo.

v) No caso dos Autos como no caso o acórdão-fundamento, a validação ou determinação da matéria colectável que foi oficiosamente estabelecida sempre dependeria da participação da Recorrente.

w) O Tribunal a quo não poderia ter considerado que a falta de audição prévia não era essencial por ser aquela inútil e insusceptível de alterar a decisão final, em oposição ao que foi decidido no acórdão-fundamento, posto que: (i) não houve uma estabilização da quantificação daquele «volume de vendas», retirado da contabilidade, e sobre o qual incidiu o tributo em apreço; (ii) a Recorrente sempre questionou – e se opôs – os montantes dos «volumes de vendas» por referência à absoluta falta de fundamentação dos actos de liquidação e à manifesta ausência de audição ao longo do processo de liquidação; (iii) o tributo em causa assenta em realidades e valores não conhecidos pelo INFARMED, mas que a Recorrente poderia confirmar ou negar, se lhe tivesse sido dada a hipótese; desta feita, (iv) não se pode determinar, com certeza, que a realização de audição não conduziria à alteração da decisão do INFARMED, nos termos em que esta foi emitida.

x) Tudo visto, foi o acórdão-fundamento aquele que adoptou a decisão correcta, mediante a interpretação da Lei e dos princípios de direito, cabendo, em consequência, a anulação da decisão ínsita no acórdão-recorrido, por lhe ser oposta.

y) Por outro lado, também no que concerne à decisão sobre a falta de fundamentação das liquidações de juros compensatórios, no acórdão-recorrido e no acórdão-fundamento (acórdão do STA, de 29 de Fevereiro de 2012, proferido no recurso n.º 0928/11) são os mesmos os factos relevantes.

z) Quer num, quer noutro caso a notificação da liquidação do tributo abrangia também a notificação dos juros compensatórios, incluindo-se na mesma apenas a indicação do valor dos juros, e, em parte, do período de liquidação dos mesmos, sem mais.

aa) Deste modo, a questão jurídica relevante prende-se com a verificação se estes elementos bastam a que se possa dizer que as notificações de juros compensatórios se encontram suficientemente fundamentadas.

bb) Quanto a esta questão, o acórdão-recorrido e o acórdão-fundamento adoptaram, de forma expressa e inequívoca, decisões contrárias, tendo o primeiro considerado que, ainda assim, as liquidações de juros se encontravam suficientemente fundamentadas e o segundo aresto entendido precisamente o oposto.

cc) Esta questão prende-se necessariamente com a análise do artigo 35.º da LGT, em especial do seu n.º 9, o qual não sofreu qualquer alteração legislativa.

dd) Também relativamente aos juros compensatórios, não se pode considerar que exista jurisprudência consolidada do STA no sentido da decisão constante do acórdão-recorrido, muito pelo contrário, jurisprudência existe no sentido defendido pela Recorrente, como é o caso do acórdão-fundamento, mas não só.

ee) O acórdão-recorrido olvidou os mais elementares ditames no que concerne à necessidade de fundamentação dos actos tributários em geral e dos actos de liquidação de juros compensatórios em particular.

ff) Relativamente à liquidação de juros compensatórios, estabelece o artigo 35.º, n.º 9, da LGT que a liquidação de juros compensatórios deve sempre evidenciar «claramente o montante principal da prestação e os juros compensatórios, explicando com clareza o respectivo cálculo e distinguindo-os de outras prestações devidas» (cit.).

gg) Por isso, a jurisprudência constante do STA tem sufragado o entendimento de que a mínima fundamentação exigível em matéria de actos de liquidação de juros compensatórios terá de ser constituída pela «indicação da quantia sobre que incidem os juros, o período de tempo considerado para a liquidação e a taxa aplicada, para além da indicação das normas legais em que assenta a liquidação desses juros e que esses elementos devem ser indicados na liquidação, directamente ou por remissão para algum documento anexo» – cfr. acórdão do STA, de 11 de Fevereiro de 2009, proferido no processo n.º 01002/08 (cit.), mas também Acórdão do STA, de 30 de Novembro de 2011, proferido no processo n.º 0619/11.

hh) O INFARMED nunca esclareceu a Recorrente sobre: (i) o montante sobre o qual, incidem os juros; e (ii) a taxa dos mesmos.

ii) Donde, as liquidações de juros compensatórios notificadas à A………… não cumprem o mínimo de fundamentação dos actos de liquidação de juros compensatórios exigida pela Lei e reconhecida pela jurisprudência, o que deveria ter conduzido, como aconteceu na situação do acórdão-fundamento, à anulação das liquidações de juros compensatórios.

jj) Limitando-se o TCA Sul a emitir, inexplicavelmente e fazendo ‘tábua rasa’ dos factos e do direito, um juízo conclusivo no sentido de que as notificações incluíam a quantificação dos juros e a razão da sua aplicação, pelo que se encontravam suficientemente fundamentadas, a decisão do Tribunal a quo incorre na violação das normas ínsitas nos artigos 268.º, n.º 3, da CRP, 77.º, n.º 1, e 35.º, n.º 9, da LGT.

kk) Demonstrando-se que foi o acórdão-fundamento aquele que adoptou a decisão mais acertada face à melhor interpretação da Lei e dos princípios de direito, caberá, deste modo, anular a decisão ínsita no acórdão- recorrido, que se encontra em oposição com aquela.
[…]
Termos em que se requer a V. Excelências que, reconhecendo a oposição entre acórdão-recorrido e os acórdãos-fundamento, considerem o presente recurso procedente por provado, anulando-se o acórdão-recorrido com a consequente anulação dos actos de liquidação do tributo em crise por preterição de audição prévia aos mesmos e dos actos de liquidação de juros compensatórios por manifesta falta de fundamentação, tudo na senda da jurisprudência dos acórdãos-fundamento, e com os demais efeitos legais».

1.4 A Recorrida contra-alegou, tendo formulado conclusões do seguinte teor: «

1.ª O presente recurso foi indevidamente admitido, como oposição de acórdãos, na medida em que não se mostram preenchidos alguns dos requisitos de que depende essa admissibilidade.

2.ª Dado que o despacho de admissão não vincula o tribunal ad quem, importa proceder à rejeição do recurso por falta dos requisitos, como passa a indicar-se.

3.ª Assim e em primeiro lugar, o douto acórdão recorrido assenta em factualidade substancialmente distinta da factualidade considerada assente nos acórdãos fundamento das alegadas questões de audição prévia e de falta de fundamentação dos juros compensatórios.

4.ª Aliás o douto acórdão recorrido, nos aspectos questionados no presente recurso, assenta decisivamente em factos que são diversos dos considerados provados nos acórdãos fundamento.

5.ª Em segundo lugar, à data de interposição do presente recurso – 2 de Outubro de 2012 – o segundo acórdão fundamento ainda não havia transitado em julgado, como se constata pelo facto de em 9 de Janeiro de 2013 e em 14 de Fevereiro de 2013 terem sido no mesmo processo prolatados dois novos acórdãos quanto a pedidos de reforma de acórdão (cfr. Docs. 1 e 2 que se juntam).

6.ª Tanto basta para rejeitar o recurso e negar a alegada oposição de acórdãos.

7.ª Além disso e sem conceder, sempre se dirá que o douto acórdão fundamento decidiu as duas questões em causa neste recurso de modo insusceptível de reparos e consistente com jurisprudência anterior do Tribunal Central Administrativo do Sul proferida em processos similares, bem como consistente com princípios de direito evidentemente aplicáveis ao caso vertente.

8.ª Aliás, a Impugnante/Recorrente procura escamotear diversos factos, considerados provados no douto acórdão recorrido e nos quais este alicerçou as decisões tomadas, que demonstram, à saciedade, a improcedência deste recurso.

9.ª Bem como procura argumentar com a protecção da sua capacidade contributiva, omitindo a natureza do tributo em causa nestes autos – imposto indirecto sobre o consumo e com repercussão sobre o consumidor final – e o facto de o mesmo tributar a capacidade contributiva do consumidor final, revelada na aquisição de produtos cosméticos e não a capacidade contributiva dela Impugnante.

10.ªDeve, face ao que antecede, ser negada a existência de oposição de acórdãos.

Pelo que, Ilustres Conselheiros, não admitindo o recurso ou negando a existência da alegada oposição de acórdãos, V. Exas. farão JUSTIÇA e cumprirão a LEI».

1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo deu-se vista ao Ministério Público, que não emitiu parecer.

1.6 Colheram-se os vistos dos Juízes Conselheiros desta Secção do Contencioso Tributário.

1.7 Cumpre apreciar e decidir, sendo que, antes do mais, há que verificar se estão verificados os pressupostos formais do recurso por oposição de acórdãos, designadamente se, como alega a Recorrida, se exige o trânsito em julgado do acórdão fundamento à data em que foi interposto o recurso e, na afirmativa, se nessa data estava já transitado o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo que a Recorrente invocou como fundamento relativamente à segunda oposição que considera verificada, ou seja, à respeitante à fundamentação dos juros compensatórios.

Depois, haverá que averiguar, relativamente apenas à primeira oposição, se a resposta à primeira questão for negativa, ou relativamente a ambas as oposições invocadas, se pode considerar-se verificada a contradição entre o acórdão recorrido e cada um dos acórdãos fundamento.
Só depois, se essa questão for respondida afirmativamente, se passará a averiguar das infracções imputadas ao acórdão recorrido [cfr. art. 152.º, n.º 3, do CPTA (Embora este preceito legal se refira à «infracção imputada à sentença», é manifesto o lapso, que aliás perpassa também os n.ºs 3, 5 e 6 do mesmo art. 152.º do CPTA, onde se alude a sentença quando se deveria dizer acórdão, que é a denominação legal das decisões dos tribunais colegiais (cfr. art. 156.º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Civil, na versão anterior à aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 36/2013, de 12 de Agosto). Neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume IV, nota de rodapé n.º 3 na anotação 44 c) ao art. 279.º, pág. 402.)].


* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

2.1.1 O acórdão recorrido deu como assente a seguinte matéria de facto: «

1. A ora impugnante, tem como actividade o comércio de perfumes, artigos para cabeleireiros, produtos cosméticos, objectos de adorno e de decoração e actividades similares de higiene e limpeza.

2. A Impugnante exerce a sua actividade desde 1981, tendo ao longo dos anos concentrado a mesma na importação e comércio de produtos cosméticos.

3. Entre 2001 e 2004 a impugnante era importadora de diversos produtos do grupo económico norte-americano Estée Lauder Companies, nomeadamente produtos das marcas Estée Lauder, Clinique, Aramis, Tommy Hilfinger, Bobbi Brown, La Mer, Donna Karan e MAC.

4. Através do oficio n.º 53354 do INFARMED com a referência /GJC/CA/1549.0 datado de 10/12/2004, tendo por assunto “notificação”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi dado conhecimento à ora impugnante que por deliberação de 10/12/2004 do Conselho de Administração do INFARMED fora ordenada uma inspecção externa às instalações da impugnante “com vista à recolha de elementos tendentes à liquidação oficiosa das taxas sobre a comercialização de produtos de saúde devidas pelo exercício da respectiva actividade, nos termos do artigo 72.º da Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril” e para no prazo de 10 dias a impugnante apresentar no INFARMED “os balancetes mensais das contas da Classe 7 do Plano Oficial de Contabilidade, desagregadas até ao 5.º dígito, devidamente certificada pelo Técnico Oficial de Contas, referentes aos exercícios de 2000 a 2003” (cf. fls. 259-261 dos autos e 28-30 do vol. I do PAT).

5. Em 27 de Dezembro de 2004 deu entrada nos serviços do INFARMED um requerimento da impugnante, a mesma pedia ao abrigo dos artigos 77.º da LGT e 24.º, 36.º e 37.º do CPPT, vários elementos, entre os quais, cópia da deliberação do Conselho de Administração do INFARMED que fundamentou a iniciativa inspectiva, indicação dos meios de defesa ao seu dispor e a fundamentação de direito para a exigência de apresentação dos balancetes (cópia do requerimento a fls. 262-267 dos autos e 52-57 do vol. I do PAT).

6. Em 3 de Janeiro de 2005 a impugnante recepcionou o ofício 57411 datado de 29 de Dezembro de 2004, com a referência 2274/GJC/CA/2004 do INFARMED, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e através do qual, além do mais, lhe foi remetida cópia da deliberação do Conselho de Administração do INFARMED de 10 de Dezembro de 2004 (cf. fls. 269-277 dos autos e 83-85 do vol. I do PAT).

7. A ora Impugnante procedeu ao envio dos balancetes mensais que foram recepcionados pelo INFARMED em 13 de Janeiro de 2005 (cf. cópia do requerimento que as acompanhou e A/R a fls. 278 dos autos e fls. 90-137 do vol. I do PAT).

8. Em 13 de Janeiro de 2005, impugnante tomou conhecimento do teor do ofício n.º 1507 datado de 11 de Janeiro de 2005 do INFARMED, tendo por assunto “Recolha de Elementos”, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, através da qual o Conselho de Administração daquele instituto a informou que alguns dos seus técnicos iriam “previsivelmente” deslocar-se às instalações da empresa para recolha de elementos e que a recolha dos elementos, designadamente de balancetes gerais e analíticos mensais, relatórios e contas, declarações Mod. 22 e declaração anual, listagem de existências, de clientes, era efectuada ao abrigo do n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 312/2002, de 20 de Dezembro (cf. fls. 279 dos autos e 66-68 e A/R assinado a fls. 69 do Vol. I do PAT).

9. Em dia 21 de Janeiro de 2005 foi efectuada pelos serviços do INFARMED a recolha da informação documental a que alude o ofício 1507, melhor identificado no ponto anterior, encontrando-se a mesma a fls. 411-5437 do PAT (cf. autos de recolha de documentação a fls. 140-144 do vol I do PAT, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e fls. 280-281 dos autos).

10. Em Setembro de 2005 foi elaborado pela “B……………………” a pedido do INFARMED o “relatório decorrente da análise aos elementos contabilísticos recolhidos no âmbito das acções de inspecção realizadas pelo INFARMED” à ora impugnante, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e no qual se lê, além do mais, o seguinte (cf. relatório e anexos a fls. 157-186 do vol. I do PAT):

(…)
Conclusões Factuais
7. No dia 21 de Janeiro de 2005 procedemos à visita da Entidade A………….., Lda., tendo sido recolhidos os elementos constantes dos Autos de Recolha de Documentação (Anexo 1).
8. Da análise dos diversos elementos recolhidos verificámos que:
8.1. Os montantes anuais sobre os quais deverão incidir as taxas referidas no
Decreto-Lei n.º 312/2002, de 20 de Dezembro e das redacções anteriores são os seguintes (em euros):

Ano
Base
Taxa (2%)
2000
15.841.858,43
316.837,17
2001
18.612.858,30
372.257,17
2002
21.326.662,37
426.533,25
2003
20.485.617,21
409.712,34
2004
18.247.268,18
364.945,36
1.890.285,29

(…)

11. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1768, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Dezembro de 2001, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 55.181,82 e juros compensatórios no montante de EUR 10.607,00, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 61 dos autos e 233-234 do vol. I do PAT).

12. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1769, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Janeiro de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 15.467,22 e juros compensatórios no montante de EUR 2.890,04, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 62 dos autos e 235-236 do vol. I do PAT).

13. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1770, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Fevereiro de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 26.366,39 e juros compensatórios no montante de EUR 4.769,79, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cfr. fls. 63 dos autos e 237-238 do vol. I do PAT).

14. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1771, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Março de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 28.633,18 e juros compensatórios no montante de EUR 5.015,12, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 64 dos autos e 239-240 do vol. I do PAT).

15. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1772, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Abril de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 40.879,13 e juros compensatórios no montante de EUR 6.916,97, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 65 dos autos e 241-242 do vol. I do PAT).

16. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1773, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Maio de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 32.933,28 e juros compensatórios no montante de EUR 5.383,01, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 66 dos autos e 243-244 do vol. I do PAT).

17. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1774, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Junho de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 58.999,37 e juros compensatórios no montante de EUR 9.292,08, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 67 dos autos e 245-246 do vol. I do PAT).

18. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1775, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Julho de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 10.400,00 e juros compensatórios no montante de EUR 1.576,29, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 68 dos autos e 247-248 do vol. I do PAT).

19. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1776, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Agosto de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 17.993,28 e juros compensatórios no montante de EUR 2.623,57, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 69 dos autos e 249-250 do vol. I do PAT).

20. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1777, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Setembro de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 29.752,14 e juros compensatórios no montante de EUR 4.161,22, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 70 dos autos e 251-252 do vol. I do PAT).

21. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMIED com a referência GJC/CA/1778, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Outubro de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 45.201,05 e juros compensatórios no montante de EUR 6.061,89, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 71 dos autos e 253-254 do vol. I do PAT).

22. Em 29 de Dezembro de 2005 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/1779, datado de 27/12/2005, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Novembro de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 68.446,98 e juros compensatórios no montante de EUR 8.772,47, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 72 dos autos e 255-256 do vol. I do PAT).

23. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/494, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Dezembro de 2002, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 51.460,91 e juros compensatórios no montante de EUR 6.289,51, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 73 dos autos e 257-258 do vol. I do PAT).

24. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/495, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Janeiro de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 15.355,35 e juros compensatórios no montante de EUR 1.794,26, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 74 dos autos e 259-260 do vol. I do PAT).

25. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/496, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Fevereiro de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 29.618,68 e juros compensatórios no montante de EUR 3.284,83, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 75 dos autos e 261-262 do vol. I do PAT).

26. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/497, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Março de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 28.127,17 e juros compensatórios no montante de EUR 2.957,59, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 76 dos autos e 263-264 do vol. I do PAT).

27. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/498, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Abril de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 41.631,63 e juros compensatórios no montante de EUR 4.311,44, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 77 dos autos e 265-266 do vol. I do PAT).

28. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/499, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Maio de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 34.429,36 e juros compensatórios no montante de EUR 3.452,37, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 78 dos autos e 267-268 do vol. I do PAT).

29. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/500, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Junho de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 81.676,08 e juros compensatórios no montante de EUR 7.912,51, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 79 dos autos e 269-270 do vol. I do PAT).

30. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/501, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Julho de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 11.833,22 e juros compensatórios no montante de EUR 1.106,16, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 80 dos autos e 271-272 do vol. I do PAT).

31. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/502, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Setembro de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 22.606,77 e juros compensatórios no montante de EUR 24.568,91 e o montante total a pagar de EUR 24.568,91, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 81 dos autos e 273-274 do vol. I do PAT).

32. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/503, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Outubro de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 45.995,45 e juros compensatórios no montante de EUR 49.836,39 e o montante total a pagar de EUR 49.836,39, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 82 dos autos e 275-276 do vol. I do PAT).

33. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/504, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Novembro de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 52.224,93 e juros compensatórios no montante de EUR 49.836,39 e o montante total a pagar de EUR 56.408,65, e um montante total a pagar de EUR 56.408,65 com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 83 dos autos e 277-278 do vol. I do PAT).

34. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/505, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Dezembro de 2003, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 46.213,71 e juros compensatórios no montante de EUR 49.758,87 e o montante total a pagar de EUR 49.758,87, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 84 dos autos e 279-280 do vol. I do PAT).

35. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/506, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Janeiro de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 20.930,39 e juros compensatórios no montante de EUR 1.541,39, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf fls. 85 dos autos e 281-282 do vol. I do PAT).

36. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/507, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Fevereiro de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 23.898,86 e juros compensatórios no montante de EUR 1.676,19, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 86 dos autos e 283-284 do vol. I do PAT).

37. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/508, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Março de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 32.984,12 e juros compensatórios no montante de EUR 2.204,97, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 87 dos autos e 285-286 do vol. I do PAT).

38. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/509, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Abril de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 28.287,93 e juros compensatórios no montante de EUR 1.794,93, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 88 dos autos e 287-288 do vol. I do PAT).

39. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/510, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Maio de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 24.598,84 e juros compensatórios no montante de EUR 1.479,97, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 89 dos autos e 289-290 do vol. I do PAT).

40. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/511, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Junho de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 41.298,01 e juros compensatórios no montante de EUR 2.344,37, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 90 dos autos e 291-292 do vol. I do PAT).

41. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/512, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Julho de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 19.504,65 e juros compensatórios no montante de EUR 1.040,96, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 91 dos autos e 293-294 do vol. I do PAT).

42. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/513, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Agosto de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 4.407,16 e juros compensatórios no montante de EUR 220,72, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 92 dos autos e 295-296 do vol. I do PAT).

43. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/514, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Setembro de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 27.554,87 e juros compensatórios no montante de EUR 1.286,04, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 93 dos autos e 297-298 do vol. I do PAT).

44. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/515, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Outubro de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 37.816,62 e juros compensatórios no montante de EUR 1.641,14, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 94 dos autos e 299-300 do vol. I do PAT).

45. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/516, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Novembro de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 59.441,82 e juros compensatórios no montante de EUR 2.377,67, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 95 dos autos e 301-302 do vol. I do PAT).

46. Em 5 de Janeiro de 2006 a impugnante recepcionou o documento do INFARMED com a referência GJC/CA/517, datado de 03/01/2006, através do qual lhe foi dado conhecimento da liquidação de “taxa” sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal referente ao mês de Dezembro de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual resulta a liquidação do tributo no montante de EUR 44.222,08 e juros compensatórios no montante de EUR 1.618,65, com data limite de pagamento em 31 de Janeiro de 2006 (cf. fls. 96 dos autos e 303-304 do vol. I do PAT).

47. Os ofícios do INFARMED através dos quais foi dado conhecimento à impugnante das liquidações do período compreendido entre Dezembro 2001 e Dezembro de 2002, melhor identificados nos pontos 11 a 23, invocam expressamente como base legal o art. 72.º da Lei n.º 3-B/2000, mais indicando o volume de vendas tido por referência e a taxa aplicada de 2% (cf. fls. indicadas nos pontos 11 a 23).

48. Os ofícios do INFARMED através dos quais foi dado conhecimento à impugnante das liquidações do período compreendido entre Janeiro 2003 e Dezembro de 2004, melhor identificados nos pontos 24 a 46, invocam expressamente como base legal os artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 312/2002, mais indicando o volume de vendas tido por referência e a taxa aplicada de 2% (cf. fls. indicadas nos pontos 24 a 46).

49. Em 23 de Janeiro de 2006 deram entrada nos serviços do INFARMED três requerimentos da ora impugnante através dos quais pedia a emissão de certidão que contivesse os elementos que considerava em falta nas notificações das liquidações da taxa de comercialização de produtos cosméticos referentes aos períodos de Dezembro de 2001 a Dezembro de 2002, Janeiro a Dezembro de 2003 e Janeiro a Dezembro de 2004, respectivamente, designadamente, razões de facto e de direito, critérios e cálculos subjacentes aos montantes apurados, indicação da entidade que praticou os actos e indicação dos meios de defesa e prazos legais (cf. cópia dos requerimentos a fls. 282-284 dos autos e 326, 351, 365 e 388 do vol. I do PAT).

50. Em 30 de Janeiro de 2006 os serviços da impugnante assinaram os A/R que acompanharam os ofícios 6132, 6133, 6134, 6135 e 6136, do INFARMED tendo por assunto “notificação da taxa sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal”, com as referências /GJC/CA/943 a 947, nos quais se refere, além do mais, que os actos de liquidação se consubstanciam nas notificações que contêm toda a fundamentação de facto e de direito exigida por lei, tendo os volumes de vendas sido fornecidos pela impugnante, que o mesmo acontece com a fundamentação da liquidação dos juros compensatórios, que a entidade que praticou cada um dos actos de liquidação se encontra ali indicada, bem como a referência à delegação de competência ao abrigo da qual cada um daqueles actos foi praticado (cf. cópias dos ofícios e dos A/R assinados a fls. 401 a 410 do PAT e fls. 285-286 dos autos).

51. Em 31 de Janeiro de 2006 a ora impugnante procedeu ao pagamento das taxas mensais relativamente aos períodos compreendidos entre Dezembro de 2001 e Dezembro de 2004, no montante total de EUR 1.256.372,77 (cf. cópias dos cheques e do requerimento que acompanhou os mesmos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

52. A petição inicial da presente impugnação judicial deu entrada no Tribunal em 24 de Abril de 2006 (cf. carimbo aposto a fls. 3, dos autos).

Em sede de fundamentação do julgamento da matéria de facto consignou-se, expressamente, na decisão recorrida, que “A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos.”

Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir. Nas conclusões 1) a 7), a recorrente insurge-se contra a decisão da matéria de facto.
A recorrente censura a decisão da matéria de facto da sentença recorrida por insuficiência. Concretamente, afirma que deve ser dada como assente a matéria relativa às notificações das liquidações controvertidas, bem como que a impugnante, na sequência da notificação de 10.12.2004, forneceu ao INFARMED diversos elementos contabilísticos, incluindo balancetes com volumes de vendas da classe 7, certificados pelo TOC, para além de elementos contabilísticos complementares. Assiste razão à recorrente, nesta parte, pelo que se procede aos seguintes aditamentos à matéria de facto, ao abrigo do artigo 712.º/1) /a) do CPC:

A) Em relação a cada um dos tributos em causa nos autos, foi remetido à impugnante ofício do teor seguinte: «Assunto: Produtos Cosméticos e de higiene corporal. Taxa sobre a comercialização. Notificação da liquidação. // Exmos. Srs. // Face à não apresentação das declarações de vendas de produtos cosméticos e de higiene corporal e à não autoliquidação e pagamento a este Instituto da taxa sobre a comercialização dos mesmos produtos, procedeu o INFARMED à liquidação oficiosa da mesma taxa, nos termos do artigo 72.º da Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril. A referida liquidação teve por base as declarações e os elementos contabilísticos obtidos junto de V. Exa(s), ao abrigo, designadamente, do n.º 1 do artigo 31.º e do n.º 1 do artigo 63.º da Lei Geral Tributária. Estas declarações e elementos evidenciam o volume das vendas realizadas que abaixo se indica. // A liquidação que se procede, nos termos do artigo 72.º da Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril, dos artigos 35.º, 60.º, n.º 2, e 77.º da Lei Geral Tributária; do n.º 1 do artigo 559.º do Código Civil e das Portaria n.ºs 263/99, de 12 de Abril, e 291/2003, de 8 de Abril, é a seguinte:
Mês
Ano
Volume de vendas
Taxa
Tributo devido
Juros compensatórios
Janeiro
2002
€ 773.360,79
2%
€ 15.467,22
€ 2.890,04
Ficam V. Exa. (s) devidamente notificados para, atém 31 de Janeiro de 2006, procederem ao pagamento da quantia de € 18.357,25, correspondente à soma do tributo devido com os juros compensatórios decorrentes da não apresentação da declaração, contados dia a dia desde o último dia de prazo para a apresentação da mesma, ou seja, do último dia do mês seguinte àquele a que respeitam as vendas. // A partir do prazo fixado no parágrafo anterior são devidos juros moratórios, nos termos do artigo 44.º da Lei Geral Tributária» - fl.s. 62/96.

B) Em 10.12.2004, através de carta registada com A.R., a impugnante foi notificada de que: «1- Por deliberação de 10 de Dezembro de 2004 do Conselho de Administração deste Instituto, foi ordenada a realização, pelos serviços competentes do INFARMED, de uma inspecção externa às instalações da A………………., Lda., com vista à recolha de elementos tendentes à liquidação oficiosa das taxas sobre a comercialização de produtos de saúde devidas pelo exercício da respectiva actividade, nos termos do artigo 72.º da Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril, mantida em vigor pelo artigo 58.º da Lei n.º 30-C/2000, de 29 de Dezembro, e pelo artigo 55.º da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, e do Decreto-Lei n.º 312/2002, de 20 de Dezembro, e do n.º 1 do artigo 46.º da Lei Geral Tributária, que terá lugar a breve trecho. // II – Para, no prazo de dez dias, apresentar no INFARMED os balancetes mensais das contas da classe 7 do Plano Oficial de Contabilidade, desagregados até ao 5.º dígito, devidamente certificada pelo Técnico Oficial de Contas, referentes ao exercício de 2000 a 2003. // III – Sem prejuízo da liquidação e cobrança das quantias referentes aos anos de 2000 a 2004, por despacho de 10 de Dezembro de 2004, do Presidente do Conselho de Administração deste Instituto, foi ordenada a instauração de processo de contra-ordenação contra a A……………….., Lda., com base nos seguintes fundamentos: // 1. A A………………, Lda., é responsável pela colocação no mercado de produtos cosméticos e de higiene corporal. // 2. A arguida não apresentou no INFARMED as declarações mensais de vendas dos produtos referidos no número anterior referentes aos meses de Janeiro a Dezembro de 2003 e Janeiro a Outubro de 2004. // 3. A mesma arguida não pagou atempadamente ao INFARMED as taxas sobre a comercialização dos mesmos produtos, nos meses de Janeiro a Dezembro de 2003 e Janeiro a Outubro de 2004. // 4. A não apresentação das declarações mensais de vendas dos produtos de saúde em causa constitui contra-ordenação tipificada nos termos do n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 312/2002, de 20 de Dezembro. // 5. O não pagamento atempado das taxas devidas constitui contra-ordenação tipificada nos termos do n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 312/2002, de 20 de Dezembro. // 6. A arguida bem sabia que estava obrigada por lei a apresentar mensalmente no INFARMED as declarações mensais de vendas dos produtos referidos e a pagar atempadamente a taxa de comercialização dos indicados produtos legalmente devida, e bem sabia ainda que, omitindo qualquer daquelas obrigações, violava a lei. Não obstante, prosseguiu com a sua conduta omissiva, conformando-se com a prática reiterada e ininterrupta das correspondentes infracções e agindo livre e deliberadamente. // 7. Os comportamentos supra referidos daquela entidade constituem contra-ordenações puníveis com coima de € 498,80 a € 2.493,99 ou a € 44.891,81, consoante o agente seja pessoa singular ou colectiva, por cada uma das omissões, nos termos do n.º 1 do artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 296/98, de 25 de Setembro, aplicável por força do n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei no 312/2002, de 20 de Dezembro. // 8. A fiscalização do cumprimento do diploma citado compete ao INFARMED e aplicação das coimas ao presidente do seu Conselho de Administração (artigo 26.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 296/98, de 25 de Setembro). // Assim, nos termos e para os efeitos do artigo 50.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 356/89, de 17 de Outubro, pelo Decreto-Lei n.º 244/95, de 14 de Setembro, e pela Lei n.º 109/2001, de 24 de Dezembro, e sem prejuízo do notificado em I e II, fica V. Exa. devidamente notificado para, no prazo de quinze dias úteis, contados da recepção do presente, se pronunciar por escrito sobre os factos supra enunciados, podendo alegar o que tiver por conveniente e oferecer meios de provas. // Independentemente de se pronunciar sobre a situação económica da arguida, nomeadamente, fotocópias da última nota anual de liquidação do IRS ou a última declaração modelo 22 do IRC apresentada no Serviço de Finanças competente, consoante se trate de pessoa singular ou colectiva, bem como a indicação do volume de vendas, o número de empregados e de viaturas ao serviço, renda mensal paga pelo estabelecimento e outros encargos ou rendimentos; // Pronunciar-se sobre benefício económico que a arguida retirou da prática dos citados factos» - fls. 259/261.

C) Em 23.12.2004, a impugnante solicitou ao Presidente do Conselho de Administração do INFARMED a junção dos elementos considerados em falta no que respeita à notificação referida na alínea anterior – fls. 262/268.

D) Por meio do ofício de 29.12.2004, o INFARMED respondeu ao requerimento referido na alínea anterior – fls. 269/277.

E) Em 12.01.2005, a impugnante remeteu ao INFARMED, os balancetes mensais das contas classe 7 do POC, desagregadas até ao 5.º dígito, certificadas pelo TOC, referentes aos exercícios de 2000 e 2003 – fls. 278.

F) Por meio do ofício n.º 1587, de 11.01.2005, o INFARMED deu conta à impugnante de que: «Na sequência da deliberação de 10.12.2004 do INFARMED e da carta-aviso oportunamente notificadas a V. Exa., informamos que previsivelmente no próximo dia 21.01.2005, a partir das 14.30H. se deslocarão às instalações dessa empresa técnicos do Infarmed devidamente credenciados, a fim de, ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 312/2002, e atento o disposto no n.º 5 do mesmo diploma, recolher elementos e informações seguintes: - balancetes e analíticos mensais; relatório e contas dos exercícios objectos de análise (com a respectiva certificação legal); modelo 22 e declaração anual; estatística anual de movimentos por família de produtos, em quantidade e valor, evidenciando saldo final, compra, vendas, regularizações (positivas e negativas) e saldo final; mapa de facturação detalhado por família de produtos; listagem de existências reportada a 31 de Dezembro de cada exercício; Listagem de clientes e fornecedores; plano de contas. // Neste acto de entrega da documentação referida devem estar presentes o legal representante da empresa, o Director Técnico e o Técnico Oficial de Contas» - fls. 279.

G) Em 21.01.2005, os técnicos do INFARMED deslocaram-se à sede da impugnante, tendo procedido à recolha da documentação em causa e lavrado o correspondente auto de recolha de documentação – fls. 280/281.

H) O auto referido na alínea anterior foi subscrito pelo representante legal da impugnante – Ibidem.

I) Em 23.01.2005, a impugnante dirigiu ao Presidente do Conselho de Administração do INFARMED requerimento no qual afirma: «notificada da liquidação da taxa de comercialização de produtos cosméticos respeitantes aos períodos de Dezembro de 2001 a Dezembro de 2002», vem requerer que V. Exa. se digne ordenar a emissão de uma certidão de teor integral que contenha: // i) As razões de facto e de direito que levaram à liquidação da taxas e dos juros compensatórios; // ii) Os critérios e cálculos subjacentes a todos os montantes apurados, incluindo os que dizem respeito à liquidação de juros compensatórios, integrando os relatórios eventualmente elaborados pelo INFARMED que precederam àquela liquidação ou de quaisquer outros elementos donde conste essa fundamentação, incluindo todos e quaisquer anexos que são suporte do(s) relatório(s) que terá justificado o acto e quaisquer outros que sirvam de fundamentação; // iii) A indicação da entidade que praticou o acto e se o fez no uso da delegação ou subdelegação de competência, bem como indicação e remessa da eventual deliberação do Conselho de Administração que o aprovou; // iv) Indicação dos meios de defesa e respectivos prazos legais ao dispor da requerente contra as liquidações de que foi alvo» - fls. 282.

J) Através do ofício n.º 006135, de 26.01.06, sob assunto: “Notificação da taxa sobre comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal” o INFARMED informou a impugnante do seguinte: «1. Os actos de liquidação consubstanciam-se nas notificações remetidas a essa empresa e contêm todas a sucinta fundamentação de facto e de direito exigida por lei, sendo certo que, como neles se refere, os volumes de vendas foram fornecidos por essa empresa a este Instituto. // 2. O mesmo acontece com a fundamentação da liquidação dos juros compensatórios. // 3. A entidade que praticou cada um dos actos de liquidação notificados a essa empresa encontra-se ali perfeitamente indicada, bem como a referência à delegação de competência ao abrigo da qual cada um daqueles actos foi praticado. // 4. No que respeita aos meios de reacção contra as decisões tributárias, a parte final do n.º 1 do art.º 37.º do CPPT apenas exige que a mesma conste da notificação quando assim o determinem as próprias leis tributárias, o que não acontece no caso. Não estava, por isso, o Infarmed obrigado a comunicá-los. // De todo o modo, sempre se dirá que os meios de reacção àquelas liquidações são os meios gerais de impugnação dos tributos, designadamente, a impugnação da liquidação, prevista no Código por V. Exas. invocado sem prejuízo dos prazos legais ali previstos» - fls. 286.

K) Do relatório referido no n.º 10 do probatório consta: “Mapa mensal de apuramento das taxas devidas ao INFARMED, discriminada por Ano/mês, Base e Taxa – fls. 161, do PA, cujo teor se dá por reproduzido».

2.1.2 O acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul indicado como fundamento relativamente à 1.ª questão – proferido em 14 de Junho de 2011 no processo n.º 4567/11 – deu como assente a seguinte matéria de facto: «

1- A impugnante vem impugnar o acto de liquidação oficiosa da taxa incidente sobre a comercialização de produtos de saúde e de produtos cosméticos e de higiene corporal, instituída pelo art. 72.º, da Lei n.º 3-B/2000, de 04.04., mantida em vigor pela Lei n.º 30-C/2000, de 29.12. e pela Lei n.º 109-B/2001, de 27.12., regulamentada pelo Dec-Lei n.º 312/2002, de 20.12., relativo aos meses de Janeiro a Dezembro de 2000 e de 2001, e ainda de Janeiro a Novembro do ano de 2002 e respectivos juros compensatórios, na importância de € 1.594.749,06, efectuada em 27.12.05, e recebida em 04.01.06 – cfr. p.i. de fls. 3 e segs., ofícios de notificação de fls. 141 a 172, dos autos.

2- A liquidação mencionada supra, resultou de uma acção de inspecção efectuada à sociedade impugnante, tendo sido notificada da data de início da acção inspectiva e iniciando­se a mesma em 12.01.05, e recolhido os elementos relativos à contabilidade e documentos de suporte, não foi determinado a conclusão do procedimento e elaborado o relatório final, não tendo sido ouvido o interessado ao longo daquele procedimento – cfr. carta aviso de fls. 100 e 101, e auto de recolha de documentação, de fls. 103 a 107, dos autos.

3- A impugnante procedeu ao pagamento das taxas referentes aos meses de Dezembro de 2002 a Dezembro de 2004 – cfr. requerimento e documento de pagamento de fls. 199 a 202, dos autos».

2.1.3 O acórdão do Supremo Tribunal Administrativo indicado como fundamento relativamente à 2.ª questão – proferido em 29 de Fevereiro de 2012 no processo n.º 928/11 – deu como assente a seguinte matéria de facto: «

A) Em 17/10/2001 foi emitida à Impugnante a liquidação de IRC n.º 2001 642 000 2925, no valor de € 783.772,83 (Esc. 157.132.345$00), sendo o montante de € 602.237,55 (Esc. 120.737.789$00) respeitante a IRC do exercício de 1998, e € 181.535,28 (Esc. 36.394.556$00) respeitante a juros compensatórios (documento de fls. 11 do Processo Administrativo).

B) Quanto aos juros compensatórios na liquidação consta ainda o seguinte “Os juros compensatórios são contados desde o termo do prazo da entrega das retenções respectivas até à data da liquidação” (documento de fls. 11 do Processo Administrativo).

C) Em 07/03/2002 a Impugnante apresentou reclamação graciosa da liquidação mencionada em A) (documento de fls. 2 e ss. do Processo Administrativo).

D) Por despacho de 23/09/2002 da Directora de Finanças Adjunta, a reclamação graciosa foi indeferida (documento de fls. 38 do Processo Administrativo).

E) A p.i. foi apresentada em 16/10/2002 (carimbo aposto na p.i. a fls. 2 dos autos)».

*
2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

Pretende a Recorrente a uniformização da jurisprudência relativamente a duas alegadas questões fundamentais de direito, que considera terem sido decididas no acórdão recorrido em contradição, a primeira, respeitante ao exercício do direito de audição antes da liquidação, com o decidido pelo acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul de 14 de Junho de 2011, proferido no processo n.º 4567/11 (Disponível em
http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/3b070d00be8888f2802578b20034ee76?OpenDocument.), e a segunda, respeitante à fundamentação dos juros compensatórios, com o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 29 de Fevereiro de 2012, proferido no processo n.º 928/11 (Publicado no Apêndice ao Diário da República de 18 de Abril de 2013
(https://dre.pt/application/dir/pdfgratisac/2012/32210.pdf), págs. 575 a 577, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/bdc0e8c094b8f03a80257b0a003c920a?OpenDocument.).
Como deixámos acima referido, antes do mais, há que verificar, relativamente à segunda oposição invocada (respeitante à fundamentação dos juros compensatórios), se, como alega a Recorrida, está verificado um dos requisitos formais da admissibilidade do recurso, qual seja o de saber o acórdão fundamento estava transitado em julgado na data em que foi interposto o recurso. De seguida, haverá que averiguar, relativamente apenas à primeira oposição, se a resposta à primeira questão for negativa, ou, caso contrário, relativamente a ambas as oposições invocadas, se pode considerar-se verificada a contradição entre o acórdão recorrido e cada um dos acórdãos fundamento. Só depois, se esta questão for respondida afirmativamente, se passará a averiguar das infracções imputadas ao acórdão recorrido.

2.2.2 DO TRÂNSITO EM JULGADO DO ACÓRDÃO FUNDAMENTO

A Recorrida, relativamente à 2.ª questão em que se suscitou a oposição de acórdãos arguiu a questão da falta de um dos requisitos formais da admissibilidade do recurso no que se refere: a falta de trânsito em julgado do acórdão fundamento.
Na verdade, o acórdão proferido pela Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em 29 de Fevereiro de 2012 no processo n.º 928/11 – que foi o invocado como fundamento quanto à invocada oposição no que respeita à fundamentação da liquidação dos juros compensatórios –, contrariamente ao que a Recorrente alegou expressamente, ainda não tinha transitado em julgado em 2 de Outubro de 2012, data em que foi interposto o presente recurso por oposição de acórdãos (No sentido de que é com referência a esta data que deve aferir-se a verificação do trânsito em julgado do acórdão fundamento, decidiu já este Supremo Tribunal Administrativo, em Pleno da Secção de Contencioso Tributário, no acórdão de 13 de Abril de 2005, proferido no processo n.º 1243/03, publicado no Apêndice ao Diário da República de 23 de Novembro de 2005 (https://dre.pt/application/dir/pdfgratisac/2005/32420.pdf), págs. 65 a 67, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b92363c068891d7480256fef0046e447?OpenDocument.); e não tinha transitado em julgado porque essa decisão foi objecto de pedido de reforma, que foi decidido por acórdão em 9 de Janeiro de 2013, o qual, por sua vez, ainda foi objecto de uma rectificação quanto a custas, decidida por acórdão de 14 de Fevereiro de 2013 (Ambas as decisões publicadas no Apêndice ao Diário da República de 11 de Março de 2014 (https://dre.pt/application/dir/pdfgratisac/2013/32210.pdf), págs. 17 a 22, também disponíveis em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/bdc0e8c094b8f03a80257b0a003c920a?OpenDocument.) (cfr. também os documentos juntos pela Recorrida com as contra-alegações). O que significa que o acórdão fundamento também não tinha transitado em julgado à data em que o Relator proferiu o despacho a que alude o n.º 5 do art. 284.º do CPPT (A Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em Pleno, admitiu já que se o trânsito se verificar antes dessa data, se deve admitir o recurso, no acórdão de 13 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 728/12, publicado no Apêndice ao Diário da República de 8 de Setembro de 2014,
(https://dre.pt/application/dir/pdfgratisac/2013/32440.pdf), págs. 387 a 392, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3a208c4bbf5ce0e180257c2a0038516d?OpenDocument.).
Ora, um dos requisitos formais para a admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos previsto no art. 284.º do CPPT é que se tenha verificado o trânsito em julgado do acórdão fundamento, o que bem se compreende porque um acórdão não transitado pode vir a ser revogado e decidido noutro sentido (Sobre a questão, vide JORGE LOPES DE SOUSA, ob. e vol. cit., anotação 44 c) ao art. 279.º, pág. 401.).
Não tendo transitado em julgado o acórdão fundamento à data em que cumpria verificar a invocada oposição, falece um dos pressupostos formais essenciais do presente recurso, que foi indevidamente admitido e, porque inadmissível, nos exime de verificar se os pressupostos substanciais se encontram ou não preenchidos.
Note-se ainda que este Supremo Tribunal Administrativo não se encontra vinculado pela decisão de admissão do recurso do Tribunal a quo, art. 641.º, n.º 5, do Código de Processo Civil («A decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior nem pode ser impugnada pelas partes, salvo na situação prevista no n.º 3 do artigo 306.º».(Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 36/2013, de 12 de Agosto.) (CPC), nada obstando a que reaprecie a verificação dos respectivos requisitos, ainda que formais, quando, como no caso, algum destes tenha sido objecto de impugnação pela Recorrida.
Assim, a final, no que se refere à invocada oposição de acórdãos relativamente à questão da falta de fundamentação dos juros compensatórios, não admitiremos o recurso.

2.2.3 DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS

Tendo presente que o recurso apenas prosseguirá quanto à primeira das oposições invocadas, a respeitante à violação do direito de audição prévia à liquidação, passemos então a apreciar se estão verificados os requisitos materiais da sua admissibilidade.

2.2.3.1 O presente processo de impugnação judicial iniciou-se no ano de 2006, pelo que lhe é aplicável o regime legal resultante do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) de 2002, nos termos dos arts. 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 107-D/2003 de 31 de Dezembro, dos quais decorre que a data da entrada em vigor do novo Estatuto ocorreu em 1 de Janeiro de 2004.
Assim, a admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos arts. 27.º, alínea b) do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do CPTA, depende de (i) existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e (ii) a decisão impugnada não estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da Lei de Processo dos Tribunais Administrativos, para detectar a existência de uma contradição, quais sejam:
i. identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, o que pressupõe uma identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais;
ii. que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica, a qual se verifica sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica;
iii. que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta e esta oposição decorra de decisões expressas, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou a invocação de decisões implícitas ou a pronúncia implícita ou consideração colateral tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.

2.2.3.2 Começaremos por apreciar se estão verificados os requisitos da alegada contradição de julgados à luz dos supra referidos princípios, já que a sua inexistência obstará, lógica e necessariamente, ao conhecimento do mérito do recurso.
Vejamos, pois, o que os dois acórdãos em confronto decidiram, no que à invocada oposição se refere.
Em ambos os acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul – o recorrido e o fundamento – se conheceu da questão do vício de forma por violação do direito de audiência (dita audição) prévia à liquidação: no acórdão recorrido, revogando-se a sentença e julgando-se o referido vício improcedente; no acórdão fundamento, revogando-se a sentença e julgando-se esse vício procedente.
Em ambos os processos era pedida a anulação de liquidações da taxa sobre a comercialização de produtos cosméticos e de higiene pessoal, efectuadas pelo INFARMED, oficiosamente, com base em elementos que recolheu da contabilidade da Contribuinte/Impugnante no âmbito de inspecção promovida por aquele Instituto, sendo que um dos vícios imputados àquelas liquidações era a violação do direito de audiência prévia, sendo inequívoco que em ambas as situações apreciadas pelos acórdãos recorrido e fundamento a contribuinte não foi ouvida antes das liquidações daquelas taxas.
Perante esse circunstancialismo fáctico, ambos os acórdãos indagaram da preterição da audiência prévia à liquidação daqueles tributos e deram resposta diversa a essa questão. Vejamos:
No acórdão recorrido, após se tecerem diversos considerandos sobre a natureza e a razão de ser do direito de audiência, considerou-se, em síntese, que não havia lugar à audiência prévia ou, pelo menos, que a preterição dessa formalidade se degradara em não essencial. Na verdade, salvo o devido respeito, fica sem se perceber muito bem qual a razão por que se considerou dispensável o direito de audiência na situação: foi porque, admitindo-se embora que houve preterição da formalidade (a falta da audiência prévia), se considerou que a mesma se degradou em não essencial, em mera irregularidade, porque «independentemente do exercício de tal direito, aquele acto [a liquidação] sempre tivesse de ter aquela natureza e medida»? ou foi porque a liquidação foi efectuada com base na declaração da Contribuinte (aí Impugnante) e, por isso, estava dispensada a audiência prévia nos termos do n.º 2 do art. 60.º da LGT?
Seja como for, considerou-se no acórdão recorrido que «a liquidação oficiosa do tributo em exame foi efectuada com base nas declarações e registos contabilísticos do contribuinte, pelo que a audição prévia à nota de liquidação não permitiria modificar a determinação da matéria colectável, assente no volume de vendas, tal como declarada pelo contribuinte; perante o volume de vendas mensal certificado pelo contribuinte, através dos seus registos, aceite pelo Infarmed e não impugnado através da presente impugnação, não resta outra alternativa à AF [leia-se ao INFARMED] que não seja o cômputo do tributo mensal devido de acordo com o referido volume mensal de vendas, através da aplicação da taxa prevista na lei; trata-se, pois, de um acto de liquidação vinculado, quanto aos seus termos, donde resulta o carácter não essencial ou inoperante da imputada preterição da audição prévia, cuja arguição se oferece como claudicante».
Já no acórdão fundamento considerou-se que a audiência prévia não podia ser dispensada ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 60.º da LGT por a liquidação não ter sido efectuada com base nas declarações da Contribuinte.
Mais se considerou que nunca poderia sequer entender-se que a preterição dessa formalidade essencial se degradara em mera irregularidade, o que «só pode ter lugar para aqueles casos em que se demonstra que, mesmo ela tendo sido cumprida, a decisão final do procedimento não poder deixar de ser a mesma, como nos casos de sisa e hoje de IMT, em que a matéria tributável foi quantificada por acto autónomo, com possibilidade de participação do contribuinte nessa quantificação, e que só depois dela consolidada, é que é efectuada a liquidação (stricto sensu), que acaba por consistir na aplicação de uma taxa, legalmente fixada, a tal quantificação já assim estabilizada, pelo que a participação do contribuinte já teve lugar numa sua fase a montante e onde em regra, ocorrem os maiores conflitos entre o contribuinte e a AT, não se justificando ou perdendo relevo uma segunda participação do mesmo, antes da liquidação assim operada». Ora, prosseguiu o acórdão fundamento, «não é o que acontece no caso dos autos, em que o montante sobre que se foi aplicada a taxa – o volume de vendas de cada produto – ainda que recolhido da contabilidade e demais elementos da escrita da ora recorrida, até à fase da liquidação, não teve a mesma a oportunidade legal de sobre tal quantificação se pronunciar, que assim se não mostra estabilizada […], pelo que não se pode concluir, que se tal formalidade fosse cumprida, o resultado dessas liquidações seria exactamente o mesmo, não sendo assim caso de degradação de tal formalidade legalmente prescrita em formalidade não essencial, com a manutenção das liquidações impugnadas».
Ou seja, em ambos os acórdãos são analisadas, à luz do art. 60.º da LGT, as consequências da preterição de audição prévia à liquidação de tributos assentes na capacidade contributiva, revelada pela contabilidade do sujeito passivo, e a possibilidade da referida preterição se degradar em exigência não essencial.
É certo que parece existir uma divergência factual entre os dois, pois enquanto no acórdão recorrido se afirma que as liquidações foram efectuadas com base nas declarações da Impugnante, no acórdão fundamento afirma-se que as liquidações não foram efectuadas com base nas declarações da Impugnante. No entanto, essa aparente divergência quanto à matéria de facto não traduz senão um diverso entendimento sobre factualidade idêntica.
Na verdade, no acórdão recorrido concluiu-se que as liquidações foram efectuadas com base nas declarações da Contribuinte porque os elementos recolhidos pelo INFARMED em sede de procedimento inspectivo foram obtidos com base em elementos por ela fornecidos ou que constavam da sua contabilidade e, assim, que «a liquidação oficiosa do tributo em exame foi efectuada com base nas declarações e registos contabilísticos do contribuinte, pelo que a audição prévia à nota de liquidação não permitiria modificar a determinação da matéria colectável, assente no volume de vendas, tal como declarada pelo contribuinte». Ou seja, entendeu-se que o exercício do direito de audiência prévia em nada poderia alterar o sentido da decisão, uma vez que o INFARMED apenas se limitou a aplicar a taxa legal ao volume de vendas fornecido pelos elementos da Contribuinte recolhidos no âmbito da acção de inspecção.
Já no acórdão fundamento, aceitando-se também que as liquidações foram efectuadas com base nos elementos fornecidos pela Contribuinte ou que constavam da respectiva contabilidade e que foram recolhidos pelo INFARMED em sede de procedimento inspectivo, entendeu-se que não podia considerar-se que as mesmas tivessem sido efectuadas com base em declarações da Contribuinte. Por isso se deixou aí registado que, sendo certo que o n.º 2 do art. 60.º da LGT dispensava a audiência prévia quando a liquidação resultasse de declaração do contribuinte, essa declaração «no caso não existiu, como se não encontra em causa, e em que a liquidação (oficiosa) teve lugar por acto de inspecção do ora recorrente, onde da contabilidade da mesma recolheu os pertinentes elementos em ordem a tais liquidações, como desde logo das mesmas liquidações se pode colher».

2.2.3.3 Ou seja, face a idênticas situações de facto, a mesma questão de direito foi decidida em sentido oposto, sem que tenho havido qualquer alteração ao quadro legislativo relevante.
Os acórdãos em confronto perfilharam, de forma expressa, soluções opostas sobre a mesma questão fundamental de direito, qual seja a de saber se se impunha a audiência do contribuinte previamente à liquidação, ou se esta pode ser dispensada nos termos do n.º 2 do art. 60.º da LGT, e se a preterição dessa formalidade pode considerar-se degradada em não essencial ou mera irregularidade.
Verificando-se, como acima exposto, a identidade de questões de facto e de direito e, bem assim, a oposição de decisões expressas entre os acórdãos em confronto, encontra-se demonstrada a questão preliminar da oposição de acórdãos, exigida no art. 284.º, n.º 3, do CPPT.

2.2.4 DA VIOLAÇÃO DO DIREITO DE AUDIÊNCIA PRÉVIA

Passemos agora à apreciação do mérito do recurso.
Na situação de facto a que se refere o acórdão recorrido, deve ou não considerar-se que se impunha a audiência da Contribuinte previamente às liquidações?
No acórdão recorrido entendeu-se que não ao abrigo do disposto no n.º 2 do art. 60.º da LGT que, na redacção aplicável à data (À data ainda vigora a redacção inicial do preceito, que veio a ser alterada pela Lei n.º 53-A/2006, de 20 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2007).), dizia: «É dispensada a audição em caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe ser favorável». Isto porque, no entender do acórdão, as liquidações tinham sido efectuadas com base em declarações da Contribuinte.
Como resulta do que deixámos já dito, as liquidações não podem considerar-se efectuadas «com base na declaração do contribuinte» para os efeitos previstos no n.º 2 do art. art. 60.º da LGT.
Desde logo, porque a Contribuinte não apresentou quaisquer declarações para efeitos de autoliquidação do tributo em causa. Aliás, o próprio INFARMED o reconheceu, afirmando textualmente nos ofícios remetidos à ora Recorrente para notificá-la das liquidações que, «[f]ace à não apresentação das declarações de vendas de produtos cosméticos e de higiene corporal e à não autoliquidação e pagamento a este Instituto da taxa sobre a comercialização dos mesmos produtos, procedeu o INFARMED à liquidação oficiosa da mesma taxa» [cfr. alínea A) dos factos provados que foram aditados pelo Tribunal Central Administrativo Sul].
Aliás, se a ora Recorrente tivesse enviado as declarações e procedido à autoliquidação do tributo (taxa de comercialização de produtos de saúde), mal se compreenderia que o INFARMED a tivesse notificado nos termos em que o fez: dando-lhe conhecimento das liquidações oficiosas da taxa de comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal, indicando o volume de vendas tido por referência e a taxa aplicável (Nos termos do disposto no art. 72.º da Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril (Orçamento do Estado para 2000), a taxa sobre a comercialização dos produtos de saúde é de 0,4% para os “produtos farmacêuticos homeopáticos, dispositivos médicos não activos e dispositivos médicos para diagnóstico in vitro” e de 2% para os “cosméticos e produtos de higiene corporal”.) e concedendo-lhe prazo para pagamento [cfr. os factos provados sob os n.ºs 11 a 48].
Por certo, teria o INFARMED optado pela cobrança coerciva das dívidas, extraindo de imediato os pertinentes títulos executivos – certidões de dívida – e com base nos mesmos providenciado por que fosse instaurada execução fiscal para cobrança do montante autoliquidado mas não entregue. Tanto mais que o art. 36.º, n.º 3, da LGT («A administração tributária não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei».) proíbe a concessão de moratórias no pagamento das obrigações tributárias, sendo que a concessão de moratória em casos não autorizados por lei pode mesmo gerar a responsabilidade subsidiária da pessoa que a conceder [cfr. art. 85.º, n.º 3 («A concessão da moratória ou a suspensão da execução fiscal fora dos casos previstos na lei, quando dolosas, são fundamento de responsabilidade tributária subsidiária».), do CPPT].
Na verdade, se tivesse havido declaração (e autoliquidação), como afirma a Recorrida, a dívida seria já certa e exigível, não se vislumbrando motivo para que ela viesse notificar a Contribuinte nos termos em que o fez, que apenas são compatíveis com a prática de liquidações oficiosas, ou seja, de liquidações efectuadas na sequência da verificação em sede inspectiva da omissão do dever declarativo por parte da Contribuinte e sendo a matéria tributável fixada com base nos elementos colhidos na contabilidade desta.
Por outro lado, não podemos acompanhar a tese que equipara um registo contabilístico à declaração. Na verdade, declarar, é sinónimo de «manifestar de modo claro e terminante; patentear, tornar conhecido dar a saber» (Cfr. “declarar”, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2013,
http://www.priberam.pt/dlpo/declarar [consultado em 06-10-2014].) e as declarações, que constituem uma obrigação acessória dos sujeitos passivos [cfr. art. 39.º, n.º 2, da LGT («São obrigações acessórias do sujeito passivo as que visam possibilitar o apuramento da obrigação de imposto, nomeadamente a apresentação de declarações, a exibição de documentos fiscalmente relevantes, incluindo a contabilidade ou escrita, e a prestação de informações».)] e que, em regra, estão na origem do procedimento de liquidação [cfr. art. 59.º, n.º 1, do CPPT («O procedimento de liquidação instaura-se com as declarações dos contribuintes ou, na falta ou vício destas, com base em todos os elementos de que disponha ou venha a obter a entidade competente».)], só relevam para o apuramento da matéria tributável se efectuadas nos termos legais e desde que permitam à AT verificar a regularidade da situação tributária do sujeito passivo [cfr. art. 59.º, n.º 2, do CPPT («O apuramento da matéria tributável far-se-á com base nas declarações dos contribuintes, desde que estes as apresentem nos termos previstos na lei e forneçam à administração tributária os elementos indispensáveis à verificação da sua situação tributária».)].
Não pode, pois, considerar-se como declaração a mera inscrição contabilística (certa ou errada, não releva para este efeito) de determinados montantes a título de volume de vendas. Porque essa inscrição contabilística não foi transcrita para uma declaração e porque a ora Recorrente nunca preencheu e entregou os documentos por que deveria proceder à entrega do tributo ao INFARMED, não pode considerar-se que tenha efectuado a autoliquidação do imposto.
A autoliquidação exigirá sempre uma declaração, que não pode ser dispensada por qualquer registo contabilístico. Se é certo que as declarações devem basear-se nos registos contabilísticos (cfr. art. 59.º, n.º 2, do CPPT), estes não substituem aquelas.
Um conceito de declaração ou de autoliquidação do tributo que se baste com uma mera inscrição contabilística, sem qualquer formalização, exteriorização, declaração, comunicação, divulgação ou transmissão, seja a terceiros seja às próprias autoridades fiscais, não tem, qualquer apoio na letra ou no espírito de qualquer lei fiscal.
O que sucedeu no caso sub judice foi que o INFARMED, tendo verificado a existência de factos tributários não declarados – as vendas de produtos cosméticos e de higiene corporal –, instaurou oficiosamente o procedimento de liquidação, como lhe é imposto pelo n.º 7 do art. 59.º do CPPT («Sempre que a entidade competente tome conhecimento de factos tributários não declarados pelo sujeito passivo e do suporte probatório necessário, o procedimento de liquidação é instaurado oficiosamente pelos serviços competentes».). No âmbito desse procedimento, serviu-se dos registos contabilísticos do sujeito passivo para avaliar a matéria tributável [cfr. art. 81.º, n.º 1 («A matéria tributável é avaliada ou calculada directamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstos na lei».), 82.º, n.º 1 («A competência para a avaliação directa é da administração tributária e, nos casos de autoliquidação, do sujeito passivo».), 83.º, n.º 1 («A avaliação directa visa a determinação do valor real dos rendimentos ou bens sujeitos a tributação».) e 84.º, n.ºs 1 e 3 («1 - A avaliação dos rendimentos ou valores sujeitos a tributação baseia-se em critérios objectivos.
[…]
3 - A fundamentação da avaliação contém obrigatoriamente a indicação dos critérios utilizados e a ponderação dos factores que influenciaram a determinação do seu resultado».), da LGT] e, a final, procedeu à liquidação oficiosa da taxa de comercialização de produtos cosméticos e de higiene corporal que considerou ser devida.
Concluímos, pois, que não estamos perante uma situação de autoliquidação por apresentação da declaração, como sustentou a Recorrida, mas de liquidação oficiosa, o que significa que não pode considerar-se, para efeitos do n.º 2 do art. 60.º da LGT que as liquidações foram efectuadas com base na declaração do contribuinte.
Não será, pois, ao abrigo daquela disposição legal que poderá justificar-se a dispensa da audiência prévia à liquidação.
Mas será que, reconhecendo-se embora a necessidade daquela audiência, se deverá concluir, com o acórdão recorrido, que a omissão dessa formalidade se degradou em não essencial, na medida em que nunca o resultado poderia ser outro? Será que, como afirmou o acórdão recorrido, «a liquidação oficiosa do tributo em exame foi efectuada com base nas declarações e registos contabilísticos do contribuinte, pelo que a audição prévia à nota de liquidação não permitiria modificar a determinação da matéria colectável, assente no volume de vendas, tal como declarada pelo contribuinte; perante o volume de vendas mensal certificado pelo contribuinte, através dos seus registos, aceite pelo Infarmed e não impugnado através da presente impugnação, não resta outra alternativa à AF [leia-se ao INFARMED] que não seja o cômputo do tributo mensal devido de acordo com o referido volume mensal de vendas, através da aplicação da taxa prevista na lei; trata-se, pois, de um acto de liquidação vinculado, quanto aos seus termos, donde resulta o carácter não essencial ou inoperante da imputada preterição da audição prévia, cuja arguição se oferece como claudicante».
Salvo o devido respeito, não podemos concordar.
É certo que a doutrina e a jurisprudência têm vindo a acolher o princípio do aproveitamento do acto, nos termos do qual se admite que a falta de audiência dos interessados, quando obrigatória, possa não conduzir à anulação do acto final do procedimento (in casu a liquidação), que é a sua consequência de acordo com o previsto no art. 135.º do Código do Procedimento Administrativo («São anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção».). Essa omissão nem sempre conduzirá à anulação, «designadamente não a justificando nos casos em que se apure no processo contencioso que, se ela tivesse sido realizada, o interessado não teria possibilidade de apresentar elementos novos nem deixou de pronunciar-se sobre questões relevantes para determinar o conteúdo da decisão final» (DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 15 ao art. 60.º, págs. 515 e segs. ).
No entanto, no caso sub judice não pode afirmar-se que a audiência prévia da ora Recorrente não permitiria modificar a decisão final, nem sequer, contrariamente ao afirmado pelo acórdão recorrido, que não permitiria modificar a matéria colectável. Desde logo, porque, contrariamente ao que parece supor-se no acórdão recorrido, o direito de audiência não tem como única finalidade a possibilidade de participar na fixação da matéria colectável, antes podendo essa participação (que o direito de audiência visa assegurar) assumir muitos outros domínios da formação da decisão final. Mas, ainda que assim não se entenda, a própria fixação da matéria colectável não pode dar-se como estabilizada pelo facto de ter sido efectuada com base em elementos extraídos da contabilidade da Contribuinte (vimos já que o não foi com base em declaração da mesma). Na verdade, só pode falar-se em estabilização da matéria colectável quando esta seja fixada em procedimento autónomo (v.g., os procedimentos de fixação do valor patrimonial tributário de imóveis para efeitos de IMI e de IMT), no qual tenha sido respeitado o direito de audiência, e que fica sujeito a impugnação judicial autónoma [cfr. art. 134.º, n.ºs 1 e 2, do CPPT («1. O actos de fixação dos valores patrimoniais podem ser impugnados, no prazo de 90 dias após a sua notificação ao contribuinte, com fundamento em qualquer ilegalidade.
2. Constitui motivo de ilegalidade, para além da preterição de formalidades legais, o erro de facto ou de direito na fixação».) e art. 86.º, n.º 1, da LGT («A avaliação directa é susceptível, nos termos da lei, de impugnação contenciosa directa».)], o que não é o caso.
Por outro lado, salvo o devido respeito, o argumento de que a liquidação não foi impugnada judicialmente com fundamento em erro na quantificação da matéria colectável em nada releva para efeito de averiguar da degradação da omissão do direito de audiência em formalidade não essencial. Não será pelos fundamentos invocados em sede de impugnação contenciosa do acto que se poderá aferir da relevância ou não do exercício do direito de audiência sobre o conteúdo decisório do acto, mas antes pela sua susceptibilidade de influir sobre o conteúdo decisório do acto, motivo por que aquele direito não poderá deixar de ser assegurado sempre que não seja de afastar a possibilidade de a decisão do procedimento tributário ser influenciada pela intervenção do interessado. Em todo o caso, sempre se dirá que a Recorrente invocou a falta de fundamentação das liquidações no que à quantificação se refere, o que sempre a impediria de impugnar a quantificação da matéria colectável.
Como ficou dito no acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Fevereiro de 2007, proferido no processo n.º 1071/06 (Publicado no Apêndice ao Diário da República de 14 de Fevereiro de 2008
(https://dre.pt/application/dir/pdfgratisac/2007/32210.pdf), págs. 386 a 392, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3d268a41bfe236798025728f0050532e?OpenDocument.), «[à] luz de tal princípio [do aproveitamento do acto], deverá entender-se que não se justifica a anulação, apesar da preterição do direito de audição, nos casos em que se apure no processo contencioso que, se a audiência tivesse sido realizada, o interessado não teria possibilidade de apresentar elementos novos nem de se pronunciar sobre questões relevantes para determinar o conteúdo da decisão final sobre as quais não tivesse já tido oportunidade de se pronunciar. Mas, apenas nessas situações em que não se possam suscitar quaisquer dúvidas sobre a irrelevância do exercício do direito de audiência sobre o conteúdo decisório do acto pode ser efectuada aplicação daquele princípio».
Ora, na situação sub judice, sendo certo que o volume de vendas foi recolhido da contabilidade da ora Recorrente, a verdade é que esta, até à fase da liquidação, poderia pronunciar-se, não só sobre a quantificação da matéria colectável (apurada com referência ao volume de vendas apurado com base na sua contabilidade), como também sobre muitas outras questões de facto e de direito, algumas das quais as suscitadas em sede de impugnação judicial, susceptíveis de influir na decisão do procedimento.
Note-se, finalmente, que apesar da aplicação do princípio do aproveitamento do acto implicar necessariamente um juízo a posteriori, este deve ser um juízo de prognose póstuma, pelo que não pode nem deve ser influenciado pela improcedência dos demais vícios (para além da preterição do direito de audiência) invocados no processo em que o acto foi impugnado, sob pena de esvaziamento do direito de participação e de impossibilidade prática de verificação do vício resultante da preterição desse direito.
Por tudo o que deixámos dito, entendemos que o acórdão recorrido não fez correcto julgamento quanto ao vício de preterição do direito de audiência, pelo que deverá ser revogado no que a esse julgamento respeita.

2.2.5 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:

I - O recurso por oposição de acórdãos interposto em processo judicial tributário instaurado após a entrada em vigor do ETAF de 2002 depende da verificação cumulativa dos seguintes requisitos legais: que se verifique contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

II - Se o acórdão invocado como fundamento ainda não tinha transitado em julgado à data em que foi interposto o recurso por oposição de acórdãos, este não deve ser admitido.

III - Verifica-se o 1.º requisito referido em I se os acórdãos em confronto assentam em situações de facto idênticas nos seus contornos essenciais e está em causa o mesmo fundamento de direito, não tendo havido alteração substancial da regulamentação jurídica pertinente e tendo sido perfilhada solução oposta, por decisões expressas e antagónicas.

IV - A aplicação do princípio do aproveitamento do acto para obstar à anulação de um acto de liquidação efectuado sem prévia audição do destinatário depende de um juízo de prognose póstuma no sentido da inexistência de qualquer possibilidade de a sua intervenção poder influenciar o conteúdo daquele acto.


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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em pleno,

a) não admitir o recurso no que se refere à invocada oposição relativa à questão da fundamentação dos juros compensatórios;

b) quanto à oposição relativa à questão da preterição do direito de audiência, julgando verificada a invocada oposição de acórdãos, dar provimento ao recurso e revogar o acórdão recorrido no que se refere à decisão desse vício, assim confirmando o decidido pela 1.ª instância.


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Custas pela Recorrida.

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Lisboa, 15 de Outubro de 2014. – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes (relator) – Pedro Manuel Dias Delgado – Dulce Manuel da Conceição Neto – Joaquim Casimiro Gonçalves – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – José da Ascensão Nunes Lopes – Ana Paula da Fonseca Lobo – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia.