Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | MARIA DO CÉU SILVA | ||
| Descritores: | LIVRANÇA EM BRANCO PREENCHIMENTO INTERPELAÇÃO DO AVALISTA | ||
| Nº do Documento: | RP202510283526/25.0T8PRT-B.P1 | ||
| Data do Acordão: | 10/28/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - A lei cambiária não impõe, como condição prévia do preenchimento da livrança ou do acionamento do avalista de livrança em branco, a prévia interpelação deste. II - A alegada não notificação do preenchimento da livrança ao avalista é facto irrelevante para a decisão da questão da inexigibilidade da obrigação exequenda. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Processo: 3526/25.0T8PRT-B.P1 Sumário ……………………………… ……………………………… ……………………………… Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto Nos presentes embargos de executado deduzidos por AA na ação executiva que lhe move Banco 1..., S.A., o embargante interpôs recurso do despacho de indeferimento liminar. Na alegação de recurso, o recorrente formulou as seguintes conclusões: «I. Na sentença sub judice o Mmo Juíz a quo, decidiu que: “Nestes termos, vistas as indicadas normas jurídicas e os princípios expostos, indefere-se liminarmente os presentes embargos de executado deduzidos pelo executado AA. II. O Apelante, na Oposição mediante embargos, invocou, além de outros, os seguintes factos: “128. Acresce que: 129. Da notificação do preenchimento da Livrança: 130. O Opoente não recebeu comunicação dando-lhe conta do preenchimento de ambas as livranças. 131. O que as torna inexigiveis perante o Oponente. 132. Nestes termos, deve a presente instância executiva ser extinta, nos termos previstos no art. 729.º e) do CPC, por inexigibilidade da obrigação exequenda.” III. Factos estes que deviam ser considerados controvertidos, depois de contraditório, e se impugnados pela Embargada, pelo que se impunha fosse determinada a notificação da Embargada para, querendo, apresentar Contestação, porque põem em causa a procedência ou não da Oposição, o que a sentença sub judice não determinou - o prosseguimento dos autos. IV. Poderiam vir a ser controvertidos, estes factos, e deviam de ser sujeitos a prova em audiência de discussão e julgamento, o que o Tribunal a quo nem sequer considerou. V. Nestes termos impõe-se a anulação da sentença sub judice e seja determinado que a presente Oposição mediante embargos siga os seus termos com a devida produção de prova, depois de contraditório. VI. A sentença sub judice, é nula, nos termos do disposto no art.º 615.º n.º 1 d) do CPC e viola o disposto no art.º 595.º n.º 1 alínea b) do CPC, os quais são aplicáveis à Oposição mediante embargos, nos termos do disposto no art.º 732.º n.º 2 do CPC. VII. A sentença sub judice viola ainda, o disposto no art.º 732.º n.º 1 à contrário do CPC. VIII. O Apelante alegou que não foi notificado do preenchimento da livrança, e essa invocação tornava, por certo, a relação material controvertida porque influi na decisão final. IX. Impõe-se, seja dada ao Apelante a oportunidade de prova de tais factos, tais como que foi notificado do preenchimento das livranças.» A exequente não respondeu à alegação do recorrente. No despacho de admissão do recurso, o tribunal recorrido pronunciou-se sobre a arguição da nulidade do despacho da seguinte forma: “Não se vislumbra a apontada nulidade por omissão de pronúncia, uma vez que o tribunal apreciou a alegação do embargante, considerando-a irrelevante, independentemente da natureza controvertida da factualidade.” São as seguintes as questões a decidir: - da nulidade do despacho; e - da manifesta improcedência dos embargos. * Na decisão recorrida, foram dados como provados os seguintes factos:«1. A exequente apresentou à execução, como título executivo, a livrança cuja cópia foi junta como documento 1 do requerimento executivo, com o teor que aqui se dá por reproduzido, tendo inscrito, além do mais, a importância de € 80.964,96; a data de emissão de “2024-07-23”; a data de vencimento de “2024-08-07”; no local do subscritor, “A..., S.A.”, com assinaturas; e, no verso, a seguir à expressão “Bom para aval”, assinaturas, uma delas imputada ao aqui embargante. 2. A exequente apresentou à execução, como título executivo, a livrança cuja cópia foi junta como documento 2 do requerimento executivo, com o teor que aqui se dá por reproduzido, tendo inscrito, além do mais, a importância de € 5.249,10; a data de emissão de “2024-09-13”; a data de vencimento de “2024-09-23”; no local do subscritor, “A..., S.A.”, com assinaturas; e, no verso, a seguir à expressão “Bom para aval ao subscritor”, assinaturas, uma delas imputada ao aqui embargante.» * Por força do art. 613º nº 3 do C.P.C., o disposto no art. 615º do C.P.C. é aplicável “com as necessárias adaptações aos despachos”.Nos termos do art. 615º nº 1 al. d) do C.P.C., “é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. Esta causa de nulidade da sentença está diretamente relacionada com o art. 608º nº 2 do C.P.C., segundo o qual “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” Nas conclusões recursivas, o recorrente afirmou que “a sentença sub judice, é nula, nos termos do disposto no art.º 615.º n.º 1 d) do CPC e viola o disposto no art.º 595.º n.º 1 alínea b) do CPC”. Conforme resulta do art. 595º nº 1 al. b) - 1ª parte - do C.P.C., é possível conhecer do mérito da causa no despacho saneador “sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas”. A decisão recorrida não é um despacho saneador, mas um despacho de indeferimento liminar dos embargos. Nos termos do art. 732º nº 1 do C.P.C., “os embargos, …, são liminarmente indeferidos quando: a) Tiverem sido deduzidos fora do prazo; b) O fundamento não se ajustar ao disposto nos artigos 729.º a 731.º; c) Forem manifestamente improcedentes”. Se, havendo alegação de factos relevantes segundo as várias soluções plausíveis de direito, o tribunal recorrido considerou que os embargos são manifestamente improcedentes, haverá erro de julgamento e não nulidade da decisão. Improcede, pois, a arguição da nulidade da decisão recorrida. * Conforme resulta do art. 732º nº 1 do C.P.C., a manifesta improcedência é um dos fundamentos do indeferimento liminar dos embargos.O tribunal recorrido considerou os presentes embargos manifestamente improcedentes por entender que a factualidade alegada era irrelevante para decidir a questão da inexigibilidade da obrigação exequenda suscitada pelo embargante. Nas conclusões recursivas, pode ler-se: “O Apelante alegou que não foi notificado do preenchimento da livrança, e essa invocação tornava, por certo, a relação material controvertida porque influi na decisão final.” O recorrente limita-se a afirmar que “influi na decisão final”, sem nada argumentar em apoio de tal afirmação. Já a posição defendida pelo tribunal recorrido tem apoio na jurisprudência. “A lei cambiária não impõe, como condição prévia do preenchimento da livrança ou do acionamento do avalista de livrança em branco, a prévia interpelação deste (www.dgsi.pt Acórdão do STJ de 25 de maio de 2017, processo 9197/13.9YYLSB-A.L1.S1; de 28 de setembro de 2017, processo 779/14.2TBEVR-B.E1.S1). Essa interpelação só será necessária se tal for convencionado no pacto de preenchimento, facto este que o embargante… não alegou” (www.dgsi.pt Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido a 19 de novembro de 2020, no processo 2304/14.6YYLSB-A.L1-8, relatado pela ora relatora). “… o requisito de exigibilidade da obrigação exequenda, prescrito no artigo 713.º do CPC, reveste a natureza de um pressuposto processual inerente à chamada exequibilidade intrínseca daquela obrigação e contempla as obrigações sujeitas a condição suspensiva ou as obrigações sinalagmáticas dependentes de uma prestação do credor ou de terceiro, como se alcança do disposto no artigo 715.º, n.º 1, do Código. Nem tão pouco a falta de interpelação para efeitos de vencimento da obrigação exequenda se inclui naquela categoria de inexigibilidade, já que fica suprida pela citação do executado, conforme decorre dos artigos 805.º, n.º 1, do CC e 610.º, n.º 2, alínea b), do CPC” (Acórdão do STJ proferido no processo 779/14.2TBEVR-B.E1.S1, acima referido). A alegada não notificação ao avalista do preenchimento da livrança é, pois, facto irrelevante para a decisão da questão da inexigibilidade da obrigação exequenda. Assim, bem andou o tribunal recorrido em indeferir liminarmente os embargos por manifesta improcedência. * Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.Custas do recurso pelo recorrente. Porto, 28 de outubro de 2025 Maria do Céu Silva Ramos Lopes Rodrigues Pires |