Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | TERESA FONSECA | ||
Descritores: | PROCESSO DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO DE MENOR MEDIDA DE ACOLHIMENTO RESIDENCIAL ADOPÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RP20221214327/22.0T8OBR.P1 | ||
Data do Acordão: | 12/14/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | RECURO IMPROCEDENTE/DECISÃO CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 5. ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - A mãe que, colocada perante a hipótese de ficar com a filha, de dois meses, numa casa abrigo, para dela não ter que se separar, declina tal possibilidade, que muda a sua residência para local a cerca de 200 km da instituição onde a filha se encontra, sem comprovar motivos razoáveis para tal, que não a acompanha em internamento, que a visita com intervalos que chegam a exceder três meses, não age de molde a criar vínculos afetivos com a bebé. II - O pai cuja única proposta para a manutenção da filha no seio da família biológica consiste em fazê-la residir com os avós, quando daqui a alguns anos estes reúnam condições para tal, não apresenta um projeto de vida compatível com o interesse daquela. III - Estando a criança institucionalizada desde os dois meses na sequência de incidente de violência doméstica entre os pais, que nunca reuniram condições para a levar de volta para casa, mantendo a menor comportamentos evitativos da mãe, que, irregularmente, a vai visitando, patenteando a progenitora condutas em que não coloca a criança em lugar de destaque nas suas opções de vida, não estão reunidas as condições para que esta lhe seja entregue de imediato. IV - A criança institucionalizada tem direito à desinstitucionalização tão pronta quanto possível e a uma família que dela cuide, colocando-a como prioridade afetiva e gerindo, em função dela, as obrigações do dia-a-dia. V - O tempo da criança exige uma resposta pronta do sistema, devendo aquela, tão brevemente quanto possível, ser integrada numa família que integre os seus cuidados nas prioridades familiares. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Proc. 327/22.0T8OBR.P1 Sumário ………………………………………….... ………………………………………….... …………………………………………… Acordam no Tribunal da Relação do Porto Relatório O Ministério Público instaurou processo de promoção e proteção, em benefício e na defesa do interesse de AA, nascida a .../.../2019, filha de BB e de CC, residente no ... - ..., ... de ... - Rua ..., ... .... No mesmo dia, foi proferido despacho a aplicar à criança uma medida provisória de promoção e proteção de acolhimento residencial pelo período de seis meses. * Após terem sido ouvidos os progenitores da criança e a Sra. Técnica da Segurança Social nos termos do disposto no art.º 107.º n.º 1 e 2 da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, foi declarada encerrada a instrução e realizada conferência com vista à obtenção de acordo de promoção e proteção nos termos do disposto no art.º 112.º do mesmo diploma legal.Perante a impossibilidade de obtenção de acordo de promoção e proteção, por discordância com a medida proposta pela Segurança Social e pelo Ministério Público - a medida de confiança a instituição com vista a futura adoção - foi dado cumprimento ao disposto no art.º 114.º n.º 1 da LPCJP, sendo que apenas a progenitora da criança apresentou, tempestivamente, alegações e prova. Teve lugar debate judicial, com intervenção de juízes sociais. Por acórdão proferido em 28 de Setembro de 2022 decidiu-se: - aplicar à criança AA a medida de promoção e protecção de confiança a instituição com vista a futura adopção, prevista nos artigos 35.º, n.º 1, alínea g) e 38.º-A, da LPCJP e, em consequência, confiá-la à guarda do Centro de Acolhimento ... da ...” e nomear, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 62.º-A, n.º 3, da LPCJP, como curadora provisória da criança a Sra. Directora Técnica de tal instituição; - declarar cessadas as visitas à criança por parte da sua família biológica (artigo 62.º-A, n.º 6, da LPCJP); - declarar CC e BB inibidos do exercício das responsabilidades parentais da filha (artigo 1978.º-A, do Código Civil); - determinar que o presente processo tenha, a partir de agora, natureza secreta por forma a salvaguardar a identidade da pessoa a quem a criança venha a ser confiada. * Inconformada, BB interpôs o presente recurso.Formulou as conclusões que se seguem. 1 - O processo de promoção e protecção no seguimento das prioridades estabelecidas pela convenção Europeia dos direitos e liberdades fundamentais, visa a protecção e a manutenção da família biológica, devendo a intervenção ser orientada de modo a que os pais assumam os seus deveres para com a criança devendo-se sempre em primeira linha dar prevalência à família biológica através de medidas que integrem as crianças e jovens na sua família biológica. 2 - A adopção só pode surgir depois de esgotadas as possibilidades de integração na família biológica. 3 – No caso concreto, não se mostram esgotadas as possibilidades de integração da criança AA na família biológica. 3 - A Recorrente reúne todas as condições para que a sua filha lhe seja entregue/confiada, considerando não ter sido provada a factualidade em que o tribunal assenta a aplicação do disposto no artigo 1978º nº 1 d) e e) do Cód. Civil, relativamente à Recorrente. 4 - Quando foi aplicada à AA a medida de acolhimento residencial, pelo período de seis meses, a Recorrente mostrou-se emprenhada e preocupada com o bem-estar da sua filha. 5 - Decisão que foi tomada porque a Recorrente entendeu que não estavam reunidas as condições para que fosse, também ela, acolhida numa casa abrigo. 6 - Durante o período de internamento da filha, a Recorrente mostrou-se sempre preocupada com o estado de saúde da mesma e com a sua recuperação, contudo, à margem daquilo que foram os tratamentos dados, a Recorrente teve que lidar com a “discriminação” sofrida pelo facto de ter sido rotulada, ainda que de forma sub-reptícia, por uma profissional de saúde, como alcoólatra, o que não corresponde à verdade. 7 - Com efeito, revelaram pouca empatia com o estado psicológico e emocional da Recorrente, confrontada com os graves problemas da sua bebé, associando essa perturbação a problemas relacionados com o consumo de bebidas alcoólicas. 8 - A Recorrente, a pedido dos profissionais de saúde, não visitou a sua filha na fase mais crítica dos tratamentos porque a mesma precisava de calma e tranquilidade. 9 - Nesse período, a menor facilmente se destabilizava, sendo que o tribunal a quo atribuiu à Recorrente o rótulo de elemento perturbador quando, afinal, até o até o simples barulho de uma televisão (cfr. ponto 35 dos factos provados) tinha esse efeito nocivo na menor. 10 - Acreditando que o seu estado emocional era prejudicial à recuperação da sua filha, a Recorrente tomou a decisão mais difícil, enquanto mãe, anuiu ao pedido dos médicos e abdicou de uma presença mais permanente junto da sua filha, para benefício da mesma. 11 - O tribunal a quo não foi sensível ao contexto em que esta decisão foi tomada, não valorizou a explicação dada pela Recorrente e seguiu o caminho mais fácil, interpretando estes factos como mais um sinal de abandono quando, na realidade, eles são demonstrativos do amor que a mesma sente pela sua filha. 12 - A partir do momento em que a AA teve alta médica e ainda preocupada com a recuperação plena da mesma, a Recorrente retomou, paulatinamente, os contactos/visitas, mantendo e revigorando a vinculação que as unia. 13 – Simultaneamente, procurou reunir as condições de vida necessárias e ideais que lhe permitissem recuperar a guarda da criança. 14 - Desejo que nunca ocultou e que transparece, em vários momentos, nas comunicações mantidas com a CPCJ (cfr, a título de exemplo, ponto 78 dos factos provados). 15 - Desde logo, o facto de a Recorrente ter terminado a relação que mantinha com o pai da criança, relação essa algo conflituosa e pautada por alguns episódios de violência doméstica por parte do progenitor, bem como ter alterado a sua residência, em ..., em busca de melhores condições de vida. 16 - É certo que a Recorrente alterou a sua residência para a ..., cidade algo distante do local onde a criança permaneceu institucionalizada (...). 17 - Todavia, esta sua escolha não foi em vão. 18 - O propósito da Recorrente, para si e para as suas filhas, era reorganizar a sua vida, alcançar a paz e a tranquilidade que não tinha quando estava próxima do progenitor e a decisão foi precipitada pelo episódio de violência doméstica que culminou com uma agressão, por parte do progenitor, que causou ferimentos à mesma. 19 - Na cidade ..., residia (e reside) o casal de amigos DD e EE que foi escolhido para serem padrinhos das AA. 20 - Pessoas bastante próximas da Recorrente que sempre proporcionaram e continuam a proporcionar, bastante apoio à mesma e à sua filha FF, sempre que necessário, suprindo a falta de apoio familiar que a mesma tem, porquanto é emigrante e a sua família se encontra no .... 21 - Quando tomou a decisão de rumar à ..., a Recorrente e a filha FF foram acolhidas pelo referido casal até que a primeira reunisse condições para arrendar a sua própria casa. 22 - Sublinhe-se que, em ..., a Recorrente não tinha relações de amizade ou familiares que pudessem servir de apoio, caso assim necessitasse. 23 - Permanecendo a residir em ..., a Recorrente iria sentir-se completamente “abandonada”, juntamente com a sua filha, num lugar onde conheciam poucas pessoas e não possuíam amizades próximas. 24 - Para além disso, a Recorrente sabia que permanecendo a residir em local próximo do progenitor da AA, o mesmo iria continuar a atormentar a sua vida, tal como fez durante muito tempo, das mais variadas formas, não obstante a distância que passou a separá-los. 25 - Não obstante a mudança do local de residência, a Recorrente manteve as visitas frequentes à AA, na instituição, ainda que condicionada pela distância entre localidades, pelas dificuldades económicas e logísticas (ausência de viatura própria, limitação de horários dos transportes públicos – comboio, custo das deslocações, tempo despendido nas viagens) nas deslocações e pelo cumprimento das suas obrigações laborais. 26 - Mantendo, sempre que possível, contactos telefónicos e por videochamada. 27 - A opção da Recorrente por uma localidade mais distante da instituição onde a criança se encontra, não pode, de forma alguma, ser interpretado como sinal de abandono ou indiferença, mas sim um esforço, premeditado, de reunir todas as condições para prover ao seu sustento e estabilidade. 28 – Não pode igualmente ser considerado como sinal de abandono ou indiferença, o facto da Recorrente, ao longo destes anos, ter aceitado as propostas de acordo que lhe foram apresentadas pela CPCJ, no sentido da criança se ir mantendo institucionalizada. 29 - O que não significa que a Recorrente não quisesse ter a sua filha consigo ou que a quisesse deixar ao abandono, mas sim, apenas e tão só, o receio da Recorrente do que pudesse vir a acontecer caso não cooperasse com a CPCJ e se recusasse a celebrar os acordos que foram sendo propostos. 30 - A recorrente, de modo próprio, efectuou exames médicos/laboratoriais na ânsia de demonstrar à CPCJ, ao Ministério Público e ao Tribunal a quo que, contrariamente ao referido nos presentes autos, não padece que qualquer tipo de adição. 31 - Quer no seu requerimento instrutório/prova, quer nas suas alegações, a Recorrente requereu ao Tribunal a quo que ordenasse a realização de exames médicos (físicos e psicológicos) e laboratoriais à mesma, a realizar pelo INML, de modo a apurar se a mesma tinha, ou não, alguma dependência relacionada com o consumo de bebidas alcoólicas. 32 - Tal pedido foi ignorado pelo Tribunal a quo, não obstante às várias referências nos autos a esta temática que tanto a estigmatizou, desde a noite de 08 de dezembro de 2019. 33 - A Recorrente tudo fez na esperança e na expectativa de que, com o passar do tempo e com a reorganização da sua vida (profissional e familiar), a CPCJ percebesse que a mesma reunia todas as condições para que a AA fosse confiada à mãe, em segurança, decidindo nesse sentido. 34 - A Recorrente, pediu por diversas vezes à CPCJ que a sua filha fosse colocada/transferida em instituição mais próxima do lugar de residência da mãe e da irmã. 35 - Estando a criança mais próxima, a Recorrente, juntamente com a sua filha FF (que com ela reside), poderiam visitá-la mais vezes, com todos os benefícios que daí iriam advir para a relação da criança com a Recorrente e com a sua irmã. 36 - Todavia, os pedidos efectuados pela Recorrente foram ignorados, tendo sido feito tábua rasa dos mesmos. 37 - Tendo a criança, de forma incompreensível e injustificada, permanecido institucionalizada a mais de 160 Km de distância do local de residência da sua mãe e da irmã, quando existiam alternativas mais próximas. 38 - O que não impediu que, a Recorrente tivesse mantido as suas visitas presenciais à AA na instituição, algumas vezes acompanhada pela filha FF, irmã da AA, de acordo com os seus horários de trabalho e escolares, assim como, com as restrições impostas pela pandemia Covid19 e com as regras de funcionamento e horários da instituição. 39 - Com efeito, desde o momento da institucionalização (junho de 2020 a 09 de setembro de 2022), a Recorrente efectuou um total de 31 (trinta e uma) visitas que continua a fazer actualmente. 40 – Nos períodos compreendidos entre 04 de novembro de 2020 e 23 de novembro de 2020 e 21 de dezembro e 21 de dezembro não foi possível efectuar visitas devido a isolamento profilático dado casos positivos de algumas crianças da instituição. 41 - Ademais, muito embora não tenha sido tido em consideração pelo tribunal a quo, a Recorrente, à semelhança de todos os portugueses, viu os seus direitos, liberdades e garantias, coartados pelo combate à pandemia de SARS-COV 2 que implementou, em vários momentos e entre outras medidas restritivas, diversos confinamentos obrigatórios, restrições de movimentos entre concelhos e, bem assim, recolher obrigatório, nos anos de 2020 e 2021. 42 - Sempre que se desloca para visitar a AA, a Recorrente percorre, de comboio, cerca de 320 Km. 43 - Suportando a Recorrente todos os custos inerentes a essas viagens. 44 - O que faz em nome do amor e do carinho que nutre pela AA e é revelador de como sempre esteve comprometida em reaver a sua guarda. 45 - As visitas presenciais na instituição apenas não ocorreram durante os vários meses em que Recorrente esteve impedida de fazê-lo, em consequência da crise pandémica criada pelo vírus Covid19. 46 - Situação essa que, deverá ser tida em consideração pelo Tribunal ad quem aquando da ponderação da decisão a tomar nos presentes autos. 47 - As dificuldades que, porventura, possam evidenciar-se em termos de aproximação da criança em relação à Recorrente, devem-se, exclusivamente, ao facto de terem sido impedidas de contactar pessoalmente, durante vários meses, em virtude da referida crise pandémica e, pelo mesmo motivo, durante as visitas, terem sido forçadas a utilizar máscaras cirúrgicas, medida de protecção obrigatória, que, naturalmente, obstaculizou o processo de restabelecimento de laços afectivos. 48 - Não deve ser esquecido que, está em causa uma criança de tenra idade que e por motivos externos impostos pela realidade pandémica, esteve impedida de contactar presencialmente com a sua mãe durante alguns meses. 49 - E que quando os contactos presenciais foram permitidos, não foi possível à criança ver o rosto da sua mãe, durante vários meses, face à obrigatoriedade do uso de máscara nas visitas. 50 - O que levou a uma maior dificuldade na aproximação da criança à Recorrente. 51 - Razão pela qual, alguns dos laços que vinham sendo construídos entre a criança, a mãe e a sua irmã foram, infelizmente, interrompidos em virtude da proibição de visitas e todos os constrangimentos criados durante o período pandémico. 52 - No entanto, assim que foi permitido à Recorrente retomar as visitas presenciais à AA (o que, refira-se, não aconteceu de imediato aquando do levantamento das restrições, na medida em que, durante algum tempo, a instituição continuou a não a permitir as visitas presenciais), a mesma, juntamente com a sua filha FF, de imediato retomaram as visitas, de acordo com a sua disponibilidade e possibilidade. 53 - Acerca do assunto das visitas da Recorrente à sua filha, refira-se que o Tribunal a quo na fundamentação de direito, sustenta que a Recorrente “…justificava as suas faltas na sua entidade patronal com visitas que não realizou, o que evidencia, no mínimo, ter conhecimento que o seu comportamento não era o que deveria ser…”. 54 - Desde logo, importa referir que o Tribunal a quo assenta a sua fundamentação de direito, relativo ao referido no paragrafo anterior a factos (as supostas faltas na entidade patronal) que não constam do elenco de factos considerados provados pelo tribunal. 55 - Verificando-se, salvo melhor opinião, em consequência, um erro grosseiro do Tribunal a quo que baseia a sua a sua fundamentação de direito nesta matéria em factos que não resultam da matéria que deu como provada. 56 - Aliás, nem podia ser dada como provada, pois inexistem nos autos elementos que permitam aferir o número de faltas que foram dadas pela Recorrente, qual a entidade patronal a que o Tribunal a quo se refere (na sua fundamentação), os dias em que essas, supostas, faltas ocorreram e o necessário contraponto com as visitas efectuadas pela Recorrente à filha. 57 - Para além dos contatos presencias da Recorrente à filha, de sublinhar que a mesma manteve, igualmente, contactos regulares por telefone e por videochamadas. 58 - Entre os dias 10 de dezembro de 2019 e 13 de setembro de 2022, a Recorrente efectuou 236 (duzentos e trinta e seis) telefonemas para a instituição. 59 - No período de 05 de maio de 2020 e 28 de outubro de 2021, a Recorrente efectuou um total de 50 (cinquenta) videochamadas para a instituição. 60 - Perfazendo um total de 286 (duzentos e oitenta e seis) contactos à distância efectuados pela Recorrente. 61 - Não tendo sido contabilizados os contactos/visitas estabelecidos pela progenitora desde o dia 09 de setembro de 2022 até à presente data. 62 - Mais, se tivermos em consideração o período de, pelo menos, três meses que antecedeu o pedido de confiança por parte do Ministério Público, esses números são, ainda mais, reveladores. 63 - Nesse espaço de tempo, conforme resulta dos autos, a Recorrente efectuou um total de 7 (sete) visitas à menor e 21 (vinte uma) chamadas telefónicas. 64 - A objectividade dos números apresentados e as contingências externas decorrentes da pandemia à qual não fomos alheios, contendem com a subjectividade da apreciação do tribunal a quo, designadamente no que concerne ao alegado perigo para a o desenvolvimento da criança por não receber a afeição adequada e necessária por parte da Recorrente. 65 - De igual modo, discordamos da leitura feita, no que ao impedimento da criação de uma qualquer vinculação da criança com a Recorrente, quanto mais uma vinculação segura necessária ao seu desenvolvimento adequado. 66 - Rejeitamos, igualmente, a conclusão, por parte do tribunal a quo, de que ocorreu, da parte da Recorrente, um manifesto desinteresse pela filha, em termos de comprometer seriamente a qualidade e continuidade dos vínculos afectivos. 67 - Os números apresentados supra (relativos às visitas e aos contactos telefónicos) são demonstrativos da importância que a criança tem para a Recorrente e como esta a prioriza, contrariamente ao que o Tribunal a quo pretende fazer crer. 68 - Sendo falso que a criança não tenha desenvolvido com a Recorrente qualquer vinculação ao longo dos quase três anos de acolhimento. 69 - A este respeito, refira-se que, actualmente, a AA reconhece e trata a Recorrente como “mamã/mãe” e a sua irmã FF como “mana”, demonstrativo da ligação afectiva existente, sendo ainda de realçar o enorme sentimento de cumplicidade e de amor presente nos momentos vividos, aquando das visitas na instituição. 70 - O que foi validado, em sede de debate judicial, pela Directora Técnica da instituição que, no seu depoimento (ficheiro 0220913112959_4156547_2870285, minutos 20:11, 21:11, 21:35, 22:06, 22:38, 38:30 e 38:52), referiu que a mãe/Recorrente tem feito um esforço/investimento para “conquistar” a menor, confirmou uma manifesta evolução nas interações, tendo constatado evidências dessa maior aproximação, tais como permitir um maior contacto físico e, por outro lado, reconhecer a Recorrente como sua mãe. 71 - O supra exposto é visualmente contextualizado, pelas fotografias juntas pela Recorrente aos presentes autos, através de requerimento de 27 de maio de 2022, nas quais é possível verificar diversos momentos de afecto entre a menor, a mãe e a irmã. 72 - Contrariada a tese perfilhada pelo tribunal a quo, que vai em sentido contrário às evidências, realce-se o esforço da Recorrente e da filha FF para reunir as condições logísticas necessárias para que a AA possa ir viver com elas, sua família biológica, o mais rapidamente possível. 73 - Com efeito, a Recorrente encontra-se inserida a nível profissional, familiar e social. 74 - A Recorrente reside juntamente com a irmã da AA numa habitação de tipologia T3, dotada de excelentes condições, sita no lugar de ..., concelho ..., desde Maio de 2021, imóvel para onde foi residir com o intuito de proporcionar às sua filhas FF e AA as melhores condições possíveis. 75 - Dispondo a referida habitação de um quarto para a AA, devidamente mobilado e equipado para uma criança da sua idade (cfr. fotos juntas aos autos com requerimento de 27-05-2022). 76 - A Recorrente entende dispor de todas as condições materiais e humanas para que a sua filha lhe seja confiada. 77 - Encontrando-se a mesma, juntamente com a filha FF, desejosa para ter a AA junto de ambas, mãe e irmã que tanto a amam. 78 - A AA tem uma mãe e uma irmã que sofrem diariamente com a sua ausência e lutam, com todas as suas forças, para que regresse, o mais rápido possível, para junto delas. 79 - A AA tem à sua espera, junto da mãe e da irmã, um ambiente de paz e de tranquilidade, onde reina o amor e não existe conflitualidade ou violência. 80 - Facto confirmado por todas as testemunhas arroladas pela Recorrente, em particular as declarações emotivas da mãe e da irmã da criança, apesar de terem sido descredibilizadas pelo tribunal a quo sem motivo justificativo. 81 - A Recorrente não pode aceitar que a conotação negativa atribuída à ausência de rectaguarda familiar no local onde reside, como fundamento para que a guarda da sua filha não lhe seja confiada. 82 - Levantando-se a questão de quantos pais e mães são obrigados a emigrar sozinhos com os seus filhos, para países onde não têm quaisquer familiares ou amigos. Ou mesmo dentro do nosso próprio país, pais e mães que se deslocam, sozinhos, das suas terras de origem para outras cidades (por exemplo do interior para o litoral), levando os seus filhos, em busca de melhores condições de vida ou por questões profissionais, sem que tenham familiares nos locais para onde vão. 83 - Numa sociedade, como a nossa, que tem promovido, ao longo de décadas o desenraizamento das famílias, veja-se o caso da famigerada litoralização e desertificação do interior, de modo algum se pode sustentar que tal consequência seja sinónimo de falta de capacidade para exercer a parentalidade na sua plenitude. O que fazer nestes casos?! Serão estas pessoas maus pais?! Deverão os filhos ser-lhes retirados por esta razão?! Parece-nos que não, o mesmo se aplicando ao caso concreto. 84 - In casu, tal ausência de rectaguarda não se verifica pois, como já foi atrás referido, a Recorrente reside a apenas 5 km do casal do casal que foi escolhido padrinhos da AA, pessoas essas que, sempre lhe prestaram bastante apoio e com quem a Recorrente viveu durante algum tempo, juntamente com a sua filha FF. 86 - Ademais, a FF, irmã da AA que reside com a Recorrente, vai completar 18 anos de idade, em Setembro de 2023 e, nesse momento, poderá, atingindo a maioridade, constituir uma mais valia no que concerne a temática da, suposta, falta de assistência familiar. 87 - Alega o Tribunal a quo, na sua fundamentação de direito que a Recorrente “apresenta fragilidades ao nível das suas competências parentais também relativamente à sua filha FF”. 88 - O Tribunal a quo subdivide esta problemática em três partes dispares. 89 - Na primeira refere que a Recorrente desconhece “o nome da mãe da amiga da filha em casa de quem (FF) pernoitava”. 90 - Analisada a matéria da facto dada como provada, é possível verificar que inexiste qualquer referência a esta matéria no que à Recorrente se refere, sendo que a única referencia que existe no que tange ao desconhecimento dos pais de uma suposta amiga da FF diz respeito ao pai desta última (cfr. ponto 20 dos factos provados). 91 - Desconhece-se como é que o Tribunal a quo chegou a tal conclusão, uma vez mais, em desfavor do caracter, personalidade e competências parentais da Recorrente. 92 - No segundo momento, o Tribunal a quo aponta o dedo à falta de “supervisão (…) e envolvimento no seu percurso escolar…” (cfr. pg 46 do douto acórdão). 93 - A FF veio para Portugal com a Recorrente quando tinha 14 anos de idade. 94 - Tendo ingressado no 9º ano de escolaridade. 95 - Em Setembro de 2022, com 16 anos de idade, a FF passou a frequentar o 12º ano de escolaridade. 96 - O que significa que, desde que veio viver para Portugal juntamente com a sua mãe, a FF nunca reprovou. 97 - Trata-se de uma jovem responsável, com bastante maturidade e com uma ligação bastante forte com a Recorrente. 98 - A FF é uma jovem que ajuda a mãe em tudo o que é necessário e que, conforme referido anteriormente, encontra-se desejosa para poder ter a irmã a residir consigo e com a mãe, assim como, para poder ajudar a Recorrente a cuidar da irmã. 99 - Refira-se que, caso a Recorrente não fosse uma mãe atenta e sabedora de cuidar das suas filhas, certamente a filha FF não teria a ligação que tem com a mãe, não teria os resultados escolares que tem e, eventualmente, poderia ter enveredado por maus caminhos. 100 - É o próprio Tribunal a quo que, no ponto 60 e 173 dos factos provados, confirma o sucesso escolar da filha FF. 101 - O que colide com a suposta falta de competências parentais da Recorrente, apenas pelo facto de estar incapacitada, por motivos profissionais, a comparecer a todas as reuniões que são marcadas pela escola. 102 - Mais difícil de compreender é o terceiro argumento aduzido pelo Tribunal a quo (fragilidade competências parentais relativas à Recorrente por exemplo da filha FF) quando refere que a mesma permitiu que a filha FF “tenha estado exposta a violência doméstica e conflitos parentais”. 103 - Se bem entendemos o raciocínio inerente a esta conclusão, então, para o Tribunal a quo, todos os progenitores, vítimas ou envolvidos em contextos de violência doméstica são, para além de vítimas, com todo o sofrimento inerente à situação, são desprovidas das competências mínimas parentais porque não escudam os menores dessa vivência como se isso fosse algo que estivesse no seu controlo. 104 - Será que uma vítima de violência doméstica pode/consegue escolher o momento em que uma agressão, física e psicológica, ocorre? Ou, por outro lado, se sujeita ao momento em que o agressor a escolhe perpetrar? 105 - Ainda que esse facto seja um sinal de fragilidade pelo Tribunal a quo, o que apenas por mera hipótese de raciocínio se admite, refira-se que a Recorrente tomou o controlo possível, nesse tipo de situação, separando-se e afastando-se geograficamente do agressor, pai da AA, o que foi corroborado pelas testemunhas da Recorrente, em sede de debate judicial. 106 - Assim, resulta que, contrariamente ao alegado no relatório da Segurança Social, apesar de grande parte da sua família se encontrar distante, a Recorrente tem o apoio de pessoas amigas, assim como, da sua filha que, em Setembro de 2023, irá atingir a maioridade. 107 - Pelo que, não faltarão pessoas para dar apoio à Recorrente no que for necessário, relativamente à criança. 108 - Sendo intenção da Recorrente e da filha FF, terem a AA a viver com elas o mais rapidamente e proporcionar-lhe o amor e a tranquilidade familiar que tanto merece, que não tem actualmente e que nunca terá caso seja entregue para adopção. 109 - Amor esse que, fazem questão de transmitir à AA nos diversos contactos que mantêm regularmente. 110 - Sendo que, em cada uma dessas visitas, é visível a relação que vai crescendo entre as duas irmãs, assim como, o carinho que as une. 111 - Num profundo vínculo entre irmãs que, de forma alguma, deverá ser destruído. 112 - Encontrando-se reunidas todas as condições para que a AA seja confiada à Recorrente e passe a residir com a mesma e com a irmã. 113 - Em pleno ambiente de amor e tranquilidade familiar que qualquer criança merece viver. 114 - Sendo enorme o sofrimento sentido pela Recorrente e pela irmã da AA, pelo facto de estar a ser equacionada a possibilidade da adopção. 115 – Possibilidade essa que, por tudo o que foi referido, não poderão aceitar. 116 - Pois, para além de nada ter justificado que a AA tivesse sido retirada à mãe e institucionalizada, não existem motivos na actualidade para que a mesma não regresse aos braços da Recorrente e, ao invés, seja “abandonada” à sua sorte, numa instituição, aguardando uma adopção que pode nunca vir a acontecer ou, acontecendo, que termine com a sua “devolução” como tantas vezes acontece. 1117 - Enquanto esteve ao cuidado da mãe, a segurança da criança nunca foi colocada em risco, nem mesmo na noite em que ocorreram os factos que despoletaram a institucionalização da AA. 118 - Nessa noite, a criança não foi agredida por nenhum dos progenitores, nem sequer a sua segurança alguma vez esteve em risco. 119 - A Recorrente quer cuidar dela, reunindo a mesma todas as condições para o fazer, encontrando-se desse modo assegurados toda a segurança, cuidados e amor à AA. 120 - Não faz qualquer sentido entregar esta criança para adopção quando a mesma tem a mãe e a irmã que querem cuidar dela e que, para além disso, reúnem todas as condições para o fazer. 121 - Não se verificando nenhum fundamento para que a criança permaneça institucionalizada e muito menos para que se equacione a adopção. 122 - Consagra o artigo 36.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa (CRP) consagra o direito/dever dos pais referente à educação e manutenção dos filhos. 123 - O n.º 6 desse mesmo preceito, estipula um regime regra de não separação entre filhos e pais, salvo quando estes últimos não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial. 124 - O artigo 67.º, n.º 1 da CRP estabelece a família como elemento fundamental da sociedade, motivo pela qual é merecedora de protecção da sociedade e do Estado e à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros. 125 - O nº 2 do art.º 67º da CRP estabelece as orientações a seguir nessa protecção conferida pelo Estado, a saber: promover a independência social e económica dos agregados familiares (al.a)), promover a criação e garantir o acesso a uma rede nacional das creches e de outros equipamentos sociais de apoio à família (al.b)) e cooperar com os pais na educação dos filhos (al.c)). 126 - O disposto no artigo 68.º, n.º 1 da CRP que confere aos pais e mães o direito à protecção da sociedade e do Estado na realização da sua insubstituível acção em relação aos filhos nomeadamente quanto à sua educação, com garantia de realização profissional e de participação na vida cívica do país. 127 - Resulta do nº 2 do mesmo artigo a acção primordial dos pais como valores sociais eminentes. 128 - Já no que diz respeito à Infância, dispõe o artigo 69.º, n.º 1 da CRP que as crianças têm direito à protecção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições. 129 - Com o propósito de garantir um desenvolvimento integral da criança, o n.º 2 prescreve que o Estado assegura especial protecção às crianças órfãs, abandonadas ou por qualquer forma privadas de um ambiente familiar normal. 130 - Estes direitos têm como finalidade, para Jorge Miranda, a realização da pessoa ou o desenvolvimento da personalidade nas condições concretas em que se tem de mover. 131 - A Declaração Universal dos Direitos do Homem consagra os princípios estruturantes desta temática, destacando-se o artigo 16.º, n.º 3 que elege a família como o elemento natural e fundamental da sociedade, com direito à protecção desta e do Estado. 132 - Da conjugação destes princípios resulta que ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada e na sua família (cfr. artigo 12.º) e a maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais (cfr. art.º 25.º, n.º 2). 133 - A Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, concretamente no seu artigo 8.º, n.º 1 e 2, na parte mais relevante, dispõe que qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, não podendo haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a protecção dos direitos e liberdades de terceiros. 134 - A Jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem sobre a protecção dos menores em perigo à luz da Convenção tem vindo a deliberar no sentido que a legitimidade da ingerência obriga a uma necessidade social imperiosa e proporcional ao fim que se procura. 135 - Essa necessidade afere-se de acordo com a análise do caso concreto, das suas e aferindo se os fundamentos invocados são pertinentes e suficientes para os fins almejados. 136 - Assim, segundo a jurisprudência do TEDH, os princípios fundamentais que deverão nortear o intérprete na decisão, são os seguintes: - O convívio natural entre pais e filhos constitui um fundamental aspecto da vida familiar; - A retirada dos filhos aos pais é considerada uma interferência demasiado séria na família, apenas sendo justificada num quadro de urgente necessidade e de protecção do interesse da criança; - O interesse da criança determina que apenas circunstâncias excepcionais possam conduzir a uma ruptura do vínculo familiar e que tudo seja feito para manter as relações pessoais e, sendo caso disso, na altura apropriada, reconstituir a família; - A carência económica dos pais e o facto de a criança poder beneficiar de um melhor ambiente familiar não justifica, como fundamentos autónomos e isolados, a medida de retirada aos pais biológicos; - Incumbe ao Estado o cumprimento de obrigações positivas traduzidas na execução de sérios e sustentáveis esforços para facilitar a reunião entre a criança e os seus pais naturais. 137 - A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, no âmbito do Direito da União Europeia, determina no art.º 7.º que todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua vida privada e familiar, pelo seu domicílio e pelas suas comunicações, sendo que, de forma inovadora, incluiu um artigo (24.º) específico sobre o Direito das Crianças que dispõe o seguinte: 1. As crianças têm direito à protecção e aos cuidados necessários ao seu bem-estar. (…) 2. Todos os actos relativos às crianças, quer praticados por entidades públicas, quer por instituições privadas, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança. 3. Todas as crianças têm o direito de manter regularmente relações pessoais e contactos directos com ambos os progenitores, excepto se isso for contrário aos seus interesses. 138 - Defende Rosa Cândido Martins que a consagração de um artigo dedicado aos específicos “direitos das crianças” bem como os direitos que aqui lhe são conferidos radicam na hodierna percepção da criança, não já como “objecto de protecção” nem como “sujeito de direitos”, mas sim como “sujeito igual e privilegiado”. 139 - Acrescenta a mesma, que a Carta acolheu o novo entendimento da criança como ser humano em desenvolvimento, especialmente vulnerável mas dotado de uma capacidade progressiva, carecido de especial protecção mas também sujeito activo na construção do seu futuro ao qual devem ser reconhecidos direitos específicos. 140 - O preâmbulo da Convenção sobre os Direitos da Criança, adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20.11.19894, refere “a família, elemento natural e fundamental da sociedade, e meio natural para o crescimento e bem-estar de todos os seus membros, e em particular das crianças, deve receber a protecção e assistência necessárias para desempenhar plenamente o seu papel na comunidade.” 141 - O nº 1 do artigo 3.º da referida Convenção impõe que todas as decisões relativas a crianças adoptada pelas diversas instituições devem primacialmente ter em conta o interesse superior da criança. 142 - Já o artigo 9.º declara que “os Estados Partes garantem que a criança não é separada de seus pais contra a vontade destes, salvo se as autoridades competentes decidirem, sem prejuízo da revisão judicial e de harmonia com a legislação e o processo aplicáveis, que essa separação é necessária no interesse superior da criança. Tal decisão pode mostrar-se necessária no caso de, por exemplo, os pais maltratarem ou negligenciarem a criança ou no caso de os pais viverem separados e uma decisão sobre o lugar da residência da criança tiver de ser tomada”. 143 - Prescreve o art.º 8.º, n.º 2 da nossa Lei Fundamental que “As normas constantes de convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas vigoram na ordem interna após a sua publicação oficial e enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português.”. 144 - Ora, da conjugação destes normativos, nacionais e internacionais, resulta que a paternidade e maternidade são considerados valores essenciais eminentes da família. 145 - A determinação da importância crucial da família na sociedade obriga, naturalmente, à protecção do Estado relativamente aos pais, para que possam exercer, na sua plenitude, os seus direitos/deveres a que estão vinculados pela relação filial. 146 - Qualquer ingerência no seio familiar é impedida, salvo se se verificarem situações que comprometam o desenvolvimento integral do menor comprovadamente em grave risco. 147 - Pelo exposto, uma limitação dos direitos fundamentais dos pais e da criança só poderá ser admitida em obediência aos princípios da proporcionalidade e da necessidade, previstos no art.º 18.º, n.º 2 da CRP. 148 - Determina o artigo 1878.º, n.º 1 do Código Civil que compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los e administrar os seus bens. 149 - Já sobre a educação, o artigo 1885.º, n.º 1 do C.Civil impõe aos pais promover, de acordo com as suas possibilidades, o desenvolvimento físico, intelectual e moral dos filhos. 150 - A Lei n.º 147/99 de 01/095 (LPCJP) tem como objectivo a promoção dos direitos e a protecção das crianças e jovens em perigo, estabelecendo que a intervenção tem lugar quando os “pais (…) ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento (...)”. (cfr. arts. 1.º e 3.º, n.º 1) 151 - Nos termos do art. 3º nº 2 desse diploma, a criança ou o jovem estão em perigo quando designadamente está abandonada ou vive entregue a si própria (al. a)), sofre maus tratos físicos ou psíquicos ou é vítima de abusos sexuais (al. b)), não recebe os cuidados ou a afeição adequados à sua idade e situação pessoal (al. c)); estar sujeita, de forma directa ou indirecta, a comportamentos que afectem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional (al. e)). 152 - Segundo Tomé d´Almeida Ramião, o conceito de abandono resulta de uma situação em que a criança ou o jovem foi abandonado à sua sorte, está completamente desamparada, desprotegida, não revelando os pais, o seu representante legal ou quem detiver a sua guarda de facto, qualquer interesse pelo seu destino. Pressupõe uma atitude voluntária e consciente por parte do abandonante e tem de ser manifesto. 153 - Os casos referidos na alínea c), aplicam-se à falta de higiene, alimentação desadequada, ausência ou deficiente investimento afectivo, falta de cuidados especiais de saúde, entre outros. 154 - Segundo o disposto no artigo 4º, a intervenção para a protecção da criança em perigo deve obedecer aos princípios aí elencados, destacando-se, em primeiro lugar, o interesse superior da criança (definido como defesa prioritária dos direitos e interesses da criança sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes), e com interesse para o caso sub judice, a proporcionalidade e actualidade da intervenção, a responsabilidade parental (a intervenção deve ser efectuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança), e a prevalência da família (prevalência das medidas que integrem a criança na sua família biológica). 155 - As finalidades das medidas de protecção das crianças visam afastar o perigo em que se encontram, oferecendo condições que permitam a salvaguarda da sua segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvimento integral e garantir a recuperação física e psicológica das crianças vítimas de qualquer forma de exploração ou abuso (cfr. art.º 34.º, als. a) a c) da LPCJP). 156 - O elenco dessas medidas, tipificado no artigo 35.º, por ordem decrescente de prevalência, sendo que a medida de confiança a pessoa seleccionada para adopção ou a instituição com vista a futura adopção será sempre a ultima ratio. 157 - Segundo o art.º 38.º-A da LPCJP esta medida só poderá ser aplicada quando se verifique alguma das situações previstas no artigo 1978.º do C.Civil. 158 - Ora, dispõe o n.º 1 do art.º 1978.º do Código Civil que o tribunal, no âmbito de um processo de promoção e protecção, pode confiar a criança com vista a futura adopção, quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afectivos próprios da filiação, pela verificação objectiva de qualquer das seguintes situações: a) se a criança for filha de pais incógnitos ou falecidos; b) se tiver havido consentimento prévio para adopção; c) se os pais tiverem abandonado a criança; d) se os pais, por acção ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança; e) se os pais da criança acolhida por um particular, por uma instituição ou por família de acolhimento tiverem revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos, durante, pelo menos, os três meses que precederam o pedido de confiança”. 159 - O n.º 2 do referido artigo prescreve que, “na verificação das situações previstas no número anterior o tribunal deve atender prioritariamente aos direitos e interesses da criança” e o n.º 3 estabelece que “considera-se que a criança se encontra em perigo quando se verificar alguma das situações assim qualificadas pela legislação relativa à protecção e à promoção dos direitos das crianças”. 160 - Aplicada a medida de promoção e protecção de confiança com vista a futura adopção, ficam os pais inibidos do exercício das responsabilidades parentais. 161 - Segundo Tomé Ramião, deverá ser dada preferência a medidas a executar no meio natural de vida (apoio junto dos pais, apoio junto de outro familiar, confiança a pessoa idónea, apoio para a autonomia de vida e confiança a pessoa selecionada para adopção, pela respectiva ordem) sobre as medidas executadas em regime de colocação (acolhimento familiar, acolhimento em instituição e confiança a instituição com vista a futura adopção). 162 - No que concerne à medida de confiança com vista a futura adopção, Tomé Ramião clarifica, de acordo com o princípio orientador de intervenção, a prevalência da família biológica (que, actualmente, conforme infra se dirá já não tem este conteúdo e significado) deverá ser adoptada sempre que esteja afastada a possibilidade de retorno da criança ou do jovem à sua família natural, para além da verificação concreta de alguma das situações referidas no art.º 1978.º do Código Civil, prevalecendo, sempre, o superior interesse da criança. 163 - Neste sentido, refira-se o disposto no douto Acordão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, 2ª Secção, no âmbito do Proc. Nº 466/19.5T8OBR.P1, datado de 09 de Fevereiro de 2021. 164 - Consequentemente, no caso concreto, torna-se imperiosa uma subsunção da factualidade dada como provada às situações objectivas, previstas nas citadas alíneas d) e e), sendo exigível a conclusão de que não existem ou se encontram seriamente comprometidos os vínculos afectivos próprios da filiação. 165 - A alínea d) (se os pais, por acção ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança) conjugada com o n.º 3 do art.º 1978.º do C.Civil, determina que se tenha em atenção a noção de perigo constante do 3.º da LPCJP, enumerando o n.º 2, a título exemplificativo várias situações. 166 - As únicas situações de perigo aí previstas, susceptíveis de se ajustar ao presente caso, são as descritas nas seguintes alíneas: d) Se os pais, por ação ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança; e) Se os pais da criança acolhida por um particular, por uma instituição ou por família de acolhimento tiverem revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos, durante, pelo menos, os três meses que precederam o pedido de confiança. 167 - Relativamente à alínea d), para além de ocorrer um manifesto desinteresse dos pais pelo filho nesse período, a lei exige ainda o preenchimento do segundo pressuposto, ou seja, que esse desinteresse (que não oferece quaisquer dúvidas) comprometa seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos de filiação. 168 - Perante a factualidade dada como provada, e no que concerne ao disposto na alínea d) é possível verificar que a Recorrente, em momento algum, colocou em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da sua filha. 169 - O que aconteceu na noite de 08 de dezembro 2019 foi um acto isolado, num contexto de violência doméstica, assente numa discussão entre o casal, tendo o progenitor decidido ir buscar a filha à cama e pegar nela ao colo, enquanto discutia com a Recorrente, contra a sua vontade. 170 - Dos autos resulta a verificação de um pequeno arranhão no nariz da menor, não se podendo determinar, para além da dúvida razoável, o que esteve na sua origem e se a mesma resultou desse episódio ou se já era pré-existente. 171 - Inexiste nos autos qualquer evidência de subdesenvolvimento por parte da menor, sendo que a própria Directora Técnica da instituição onde a mesma se encontra acolhida, confirmou em sede de debate judicial que, a menor ao longo deste período de acolhimento, teve um desenvolvimento normal para uma criança da sua idade, pelo que, podemos concluir que a formação, educação e desenvolvimento da AA nunca esteve em risco, tendo a Recorrente, apesar da distância, sempre se mantido presente na vida da sua filha. 172 - Já no que se refere aos pressupostos da alínea e), no caso concreto, é possível distinguir dois momentos díspares. 173 - No primeiro, como já foi referido previamente, a Recorrente, em nome do bem estar de saúde da sua filha, aceitou o pedido efectuado pelo Hospital 2... e não acompanhou, de forma tão próxima, a filha no internamento para evitar que a mesma ficasse demasiado agitada, relembrando que a menor era especialmente sensível nesta matéria, reagindo negativamente até ao simples funcionamento de uma televisão, quanto mais à presença da mãe. 174 - Ainda assim, a recorrente nunca deixou de visitar a sua filha e de manter o acompanhamento possível nessas circunstâncias. 175 - No segundo momento, a partir da alta médica e subsequente institucionalização, a Recorrente, por diversos motivos já aduzidos supra e que se prendem com a necessidade de afastamento do progenitor em busca de maior tranquilidade para a sua família e melhoria da sua condição económica, optou por fixar residência na área ... e, posteriormente, ..., em ..., que distam cerca de 160 km de ..., onde a filha se encontra institucionalizada. 176 - Não obstante manteve a filha como prioridade na sua vida e acompanhou-a, presencialmente, sempre que possível, e através de numerosos telefonemas e videochamadas. 177 - Sublinhe-se que, nessa tarefa, a Recorrente enfrentou inúmeras dificuldades que condicionariam qualquer pessoa nas suas circunstâncias e que o Tribunal a quo entendeu não considerar como atenuante, pelo contrário conferiu uma carga negativa que só revela desconhecimento da realidade. 188 - Concretizando, uma vez mais, a Recorrente reside a cerca de 160km ..., onde a filha se encontra institucionalizada, como não tem viatura própria tem de utilizar transportes públicos, nomeadamente comboio, onde gasta cerca de 4h40m nas deslocações de ida/volta, tendo de suportar os custos das viagens, acrescendo a este tempo o da visita propriamente dita, o que não é de somenos importância considerando que a Recorrente trabalha, por turnos, cinco dias por semana e tem de cumprir com as suas obrigações laborais, sob pena de ver comprometida a sua fonte rendimentos principal. 189 - A tudo isto acresceu, de forma impactante, a crise pandémica que acarretou inúmeros constrangimentos, inclusive aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, recorde-se a imposição de confinamentos, recolher obrigatório, proibições de visitas a instituições desta natureza, limitações de movimentos entre concelhos, obrigatoriedade de uso de máscara nas interacções com a menor (especialmente relevante tendo em conta a sua tenra idade, obstaculizando a consolidação de laços afectivos). 190 - Apesar de todos estes condicionalismos, a Recorrente contabilizou, desde o momento da institucionalização (junho de 2020 a 09 de setembro de 2022), um total de 31 (trinta e uma) visitas que continua a fazer actualmente. Mais, entre os dias 10 de dezembro de 2019 e 13 de setembro de 2022, a Recorrente efectuou 236 (duzentos e trinta e seis) telefonemas para a instituição e no período de 05 de maio de 2020 e 28 de outubro de 2021, um total de 50 (cinquenta) videochamadas para a instituição. 191 - Mais, se tivermos em consideração o período de, pelo menos, três meses que antecedeu o pedido de confiança por parte do Ministério Público, esses números são, ainda mais, reveladores. Nesse espaço de tempo, conforme resulta dos autos, a Recorrente efectuou um total de 7 (sete) visitas à menor e 21 (vinte uma) chamadas telefónicas. 192 - Não se compreende, salvo o devido respeito, que seja criticada por não ter visitado a filha na mencionada instituição, localizada a cerca de 320 quilómetros (... –... –...) e a mais de quatro horas de distância (ida e volta) com os custos económicos advenientes dessas deslocações, dificilmente suportáveis para quem não vive de forma abastada. 193 - Entendemos que estes factos são reveladores de que a Recorrente, contrariamente ao que o Tribunal a quo defende, nunca deixou de priorizar a sua filha, sendo reconhecida por quem a acompanha diariamente, um investimento, ao longo do tempo que se traduziu numa evolução positiva na relação com a filha, em contraponto com a análise, remota, feita pela técnica da segurança social que nem se deslocou à instituição para assistir a uma única visita da Recorrente à filha, de forma a poder aferir a relação existente entre ambas, sendo evidente a evolução que se se verificou na relação mãe/filha, sendo que, actualmente, a menor reconhece a Recorrente como “mãe”/figura maternal e a irmã FF como “mana”. 194 - Perante os factos apurados, não é possível concluir que a Recorrente, ao contrário do progenitor, abandonou a filha, pôs alguma vez em perigo grave a segurança, saúde, formação ou a educação da menor ou revelou manifesto desinteresse por ela (requisitos previstos no art.º 1978.º, n.º 1, als. d) e e) do C.Civil). 195 - A factualidade descrita revela, em primeira linha, que a Recorrente, desde o nascimento da filha até à presente data, sempre demonstrou vontade, afecto e interesse em cuidar e educar da mesma. 196 - Desde sempre, a preocupação da Recorrente foi em organizar a sua vida, arranjar um emprego (tendo sido bem sucedida) por forma a viver em paz e tranquilidade, juntamente com as suas filhas (FF e AA), proporcionando-lhes as condições de vida que qualquer criança merece. 197 - Nessa linha de actuação, refez a sua vida profissional e encontra-se a residir com a filha FF numa habitação com condições para acolher, de forma satisfatória, a sua filha AA. 198 - Os amigos da Recorrente disponibilizaram-se em apoiar a mesma em tudo o que a mesma necessite, incluindo suprir as dificuldades decorrentes do seu trabalho por turnos. 199 - A irmã FF está na iminência de atingir a maioridade podendo, nesse momento, ser ainda mais uma referência e importante apoio na vida da irmã AA. 200 - Não há dúvida que não foi proporcionada a esta mãe, dadas as circunstâncias, a possibilidade de contactar e conviver com a sua filha, transferindo-a, com esse desiderato, para uma instituição localizada próxima da sua residência. 201 - Em suma, desde os dois meses de idade da filha, a Recorrente não teve oportunidade de ser mãe, ou seja, de demonstrar que efectivamente tem capacidade (ou não) para lhe assegurar laços afectivos e educacionais, a que o mesmo tem direito. 202 - A Recorrente, já conseguiu pôr em prática o seu desejo de assumir completamente a maternidade e de provar a sua disposição séria de se comprometer em proporcionar um desenvolvimento harmonioso à sua filha, transmitindo-lhe valores e afecto que lhe criem segurança emocional e satisfazendo as suas necessidades. 203 - A Recorrente, ao ter criado a sua filha FF, já demonstrou ter competências para tratar de uma criança. 204 - A jurisprudência do TEDH é muito clara no sentido de que a retirada dos filhos aos pais é considerada uma interferência tão séria na família que só pode ser justificada num quadro de urgente necessidade e de protecção do interesse da criança, o que manifestamente não sucede no caso em apreço. 205 - Acrescentando, como orientação fundamental nesta matéria, que o interesse da criança determina que apenas circunstâncias excepcionais possam conduzir a uma ruptura do vínculo familiar e que tudo seja feito para manter as relações pessoais e sendo caso disso, na altura apropriada, reconstituir a família. 206 - Do quadro legal acima descrito, resulta que os progenitores devem receber do Estado todos os apoios, em vigor na ordem jurídica, destinados a prestar-lhes a protecção e assistência necessárias para desempenhar plenamente o seu papel na comunidade. 207 - No voto concordante do Acórdão de 16/02/2016 do TEDH12 (caso Soares de Melo) a respeito da interpretação do interesse superior da criança escreveu-se que na origem da compreensão unilateral a absolutista dessa noção está o desconhecimento da necessidade de a interpretar de modo harmonioso com os outros direitos fundamentais. 208 - Essa assistência efectiva, em vários aspectos, é considerada ainda mais necessária no caso em apreço, face à ausência de suporte familiar e à necessidade que a Recorrente teve de procurar um novo começo longe da influência perturbadora do progenitor da AA. 209 - A este respeito, cumpre novamente frisar que o TEDH tem reiteradamente declarado que a carência económica dos pais, a falta de apoio familiar ou o facto de a criança poder beneficiar de um melhor ambiente familiar não justifica, como fundamentos autónomos e isolados, a medida de retirada aos pais biológicos. 210 - Não consta dos autos qualquer recente avaliação psicológica sobre a maturidade e capacidade da Recorrente no que respeita ao exercício responsável da maternidade. 211 - A legitimidade da intervenção estatal na protecção do menor, como medida de ingerência no seio da família, advém do cumprimento dos princípios da proporcionalidade e da necessidade que o caso em concreto exige, de forma a alcançar um equilíbrio entre os valores essenciais da paternidade e maternidade e o interesse supremo da criança. 212 - Não deve sere esquecido o direito da AA, de crescer no seio da sua família biológica, constituída pela sua mãe e pela sua irmã FF, com quem já mantém vínculos afectivos fortes. 213 - Vínculos esses que poderão vir a ser ainda mais reforçados, através de um contacto mais próximo entre as três, sem os constrangimentos inerentes a qualquer visita numa instituição, na presença de terceiros (funcionárias da instituição) que, obviamente, condicionam o comportamento da criança porquanto estão com a criança diariamente. 214 - Refira-se que, na hipótese de adopção, que só se refere por mera hipótese de raciocínio, jamais a criança estabelecerá, com quaisquer outras pessoas, vínculos da mesma natureza. 215 - Retirar esta criança à mãe, sem que previamente tenha sido concedido à Recorrente o apoio necessário para possibilitar um desenvolvimento feliz e harmonioso da filha no seio da família biológica, aquela que é tida como a mais capaz de proporcionar à criança o necessário ambiente de amor, aceitação e bem-estar, será, salvo o devido respeito, um acto “bárbaro”, “atroz”. 216 - A medida de entrega da criança para adopção, não é uma medida legítima, adequada, proporcional e actual; pelo contrário, é uma medida violadora de todos os princípios legais vigentes. 217 - Nada nos autos demonstra que a ora Recorrente, tenha de alguma maneira comprometido de forma séria e irreversível os laços afectivos próprios da filiação. 2218 - Nem tão pouco se pode dizer que tenha tido um comportamento de tal modo indigno que possa fundamentar a ruptura definitiva e irreversível dos laços familiares. 219 - A medida de confiança a instituição tendo em vista a adopção, deve por isso revestir carácter de actualidade e proporcionalidade, cessando quando o perigo deixa de existir e adequando-se a medida a aplicar quando estão reunidas as condições para a reintegração no seio familiar, ainda que sob regime de prova. 220 - Tal medida deverá ser afastada, na medida em que, tal como a lei consagra, tal deverá ser sempre a ultima ratio. 221 - Nesta conformidade, a harmonia entre os direitos fundamentais em causa determina que a menor seja acolhida pela Recorrente mediante a aplicação da medida de apoio junto à mesma, prevista nos arts. 35.º, n.º 1, al.a) e 39.º da LPCJP. 222 - Esta medida implica que os técnicos se empenhem realmente em prestar o apoio (psicopedagógico e social) que a Recorrente necessita para o desempenho equilibrado e responsável das suas funções parentais, sendo a mesma supervisionada em conformidade estrita com o plano de intervenção, a estabelecer em acordo promovido pelo tribunal, com a participação da Recorrente. 223 - Pelo exposto, requer-se que a medida aplicada seja revista, dando a possibilidade de se aferir com grau de certeza a alegada incapacidade da progenitora, da qual se discorda. 224 - A medida aplicada pelo Tribunal a quo deverá ser revogada optando por uma medida de Apoio junto do Progenitor, ora Recorrente, ainda que a título provisório, e mediante regime de prova, ao abrigo do art. 39.º da Lei 147/99, de 01 de Setembro. * O Digno Magistrado do Ministério Público contra-alegou, pugnando pela manutenção da medida decretada e tecendo as seguintes conclusões: 1. O douto acórdão proferido não violou as normas dos artigos 4.º, alíneas d), e) e g) e 35.º da LPCJP; 2. O Tribunal a quo, ao aplicar a medida de promoção e protecção de confiança a instituição com vista a futura adopção respeitou, integralmente, os princípios da intervenção mínima, da proporcionalidade e da prevalência da família, orientadores da intervenção para a promoção e protecção dos direitos da menor e teve em consideração o superior interesse da criança e mostra-se devidamente fundamentado de facto e de direito; 3. A AA encontra-se acolhida em Instituição desde os dois meses de idade, e ao logo destes quase três anos não recebe a afeição adequada por parte dos seus progenitores, tendo sido votada a uma completa negligência por parte dos mesmos ao nível psicoafectivo; 4. A criança não criou qualquer vinculação com os progenitores, muito menos uma vinculação segura, encontrando-se, assim, comprometido a o seu desenvolvimento adequado ao nível emocional e da saúde mental no futuro. 5. A falta de vinculação entre a criança e os progenitores é o resultado do manifesto desinteresse destes na filha, após o seu acolhimento, por falta de visitas frequentes e regulares dos mesmos, visitas estas que se mostravam absolutamente essenciais e cruciais para o estabelecimento de tal vinculação, considerando, essencialmente, a tenra idade da criança. 6. Ao logo destes quase três anos, os pais não cumpriram o plano de visitas acordado e poderiam tê-lo feito. 7. A criança esteve internada no hospital até 4 de Maio de 2020 e a progenitora tomou a opção de estar longe da sua filha durante mais de três meses, limitando-se a questionar sobre o estado de saúde da mesma. 8. Após a alta da AA e de, em Junho de 2020, serem informados de que poderiam visitar a filha pessoalmente na instituição, os progenitores visitaram-na no dia 24 de Junho de 2020, estando, de seguida, três meses sem visitar a mesma. 9. A progenitora apenas voltou a visitar a filha no dia 15 de Outubro de 2020 e depois no dia 11 de Dezembro de 2020. 10. Com efeito, a progenitora apenas voltou a visitar a filha no dia 15 de Outubro de 2020 e depois no dia 11 de Dezembro de 2020. 11. A progenitora, não obstante na visita de 11 de Dezembro de 2020 ter percebido que a filha não a reconhecia, apenas voltou a visitá-la uma vez por mês de Janeiro de 2021 a Abril de 2021. 12. Nos meses de Maio, Julho e Agosto de 2021 a progenitora não fez qualquer visita à criança e nos mesmos de Setembro e Outubro de 2021 apenas fez uma visita; nos meses de Novembro de 2021 a Fevereiro de 2022 apenas fez duas visitas e em Março de 2022 voltou a não fazer quaisquer visitas; fez duas em Abril de 2022 e apenas uma em Maio de 2022, já após ter tido conhecimento da medida proposta pelo Ministério Público. 13. No mês de Junho de 2022, a progenitora visitou a criança por duas vezes e em Julho do mesmo ano, apenas uma; em Agosto e Setembro de 2022, até ao debate judicial a progenitora realizou três visitas. 14. Durante o último internamento da criança (Outubro de 2021), a mãe, perante as dificuldades sentidas na prestação de cuidados à filha, delegou na instituição o acompanhamento da mesma. 15. A progenitora, por opção própria, não realizou convívios consistentes com a criança, ao longo destes três anos, que permitisse construir um vínculo afectivo próprio da filiação. 16. A criança não apresenta qualquer vinculação com os seus progenitores, suportando apenas agora a presença da progenitora nas visitas, desde que com a presença de uma técnica da instituição de acolhimento; 17. O pai não visita a filha desde 1 de Outubro de 2021 e desde 8 de Dezembro de 2021 que não se preocupou de saber nada da mesma. 18. Os avós paternos da criança nunca visitaram a criança, sempre tiveram conhecimento do acolhimento da neta e da proposta de encaminhamento para adopção e nunca agiram para que a criança lhes fosse entregue. 19. A mãe optou por não visitar a filha durante meses de internamento hospitalar, por alterar a sua residência para longe da instituição onde a filha se encontra acolhida, de visitar a filha um número reduzido de vezes, mesmo depois de ter consciência que a menina não a reconhecia. 20. A mãe decidiu bastar-se por contactar telefonicamente a instituição para perguntar pela filha e nem sequer cumpriu com a periodicidade da realização das videochamadas. 21. Os progenitores nunca priorizaram a filha ao longo destes três anos de vida da mesma, coartando-lhe o direito a uma família, a crescer no seio da mesma. 22. Não existe qualquer membro na família alargada que queira dela cuidar, sendo certo que ninguém cuidou de a visitar ou sequer de a conhecer desde que está na instituição. 23. É urgente a definição de um projecto de vida para esta criança, que não conhece outra realidade que não a vivência em instituição. 24. A medida aplicada é a única medida de promoção e protecção que se mostra, actualmente, suficiente, proporcional e adequada a defender e proteger os interesses da criança. 25. Pelo exposto, entendemos não merecer a decisão a quo, agora posta em crise, qualquer censura. * Questão a decidir - se AA deve ser confiada para adoção. * Fundamentação de facto Na sequência do debate judicial realizado, foi considerada a seguinte matéria de facto: 1. AA nasceu a .../.../2019 e é filha de CC e de BB. 2. A menina nasceu prematura às 33 semanas, necessitou de reanimação com IPPV com recuperação aos 10 minutos e esteve internada durante 15 dias no serviço de neonatologia do Hospital ..., na companhia da mãe. 3. A criança foi sinalizada à CPCJ ..., a 8 de Dezembro de 2019 pela GNR, porquanto, “(…) no horário compreendido entre as 00h00 e as 08h00 do dia 08 de Dezembro de 2019, deslocou-se até este posto a denunciante (progenitora da criança) (…) que se encontrava com um comportamento alterado a gritar que tinha sido agredida pelo seu companheiro e que o mesmo ao tentar agredir esta, atingiu com as unhas a menor. O seu companheiro apareceu de imediato com a filha de ambos ao colo, causando um confronto verbal aceso, trocando acusações com a Sra. BB a acusar o seu companheiro de lhe bater. (…) De seguida e após verificar algumas escoriações em todos os intervenientes, incluindo a criança, este militar fez contacto via 112 para accionar os bombeiros para se deslocarem até este posto. (…) Os bombeiros iniciaram a deslocação com a menor e a mãe para o Hospital com a presença do Guarda GG no interior da ambulância. Chegada ao Hospital pelas 02h35. Posto isto o Sr. CC manteve-se neste Posto, enquanto este militar elaborava o respectivo expediente e informou este que se encontrava acompanhado pela sua companheira e pela sua filha no café/bar ..., sito na Avenida ..., pelas 01h00 e que a sua companheira já se encontrava embriagada. Tendo informado que a mesma quando consome bebidas alcoólicas tende a alterar o seu comportamento e que hoje o agrediu, causando uma escoriação no pescoço. Mais informa que durante as agressões este tinha a sua filha ao colo, que acabou por ser atingida na face. Foram efectuados através do aparelho qualitativo Drager, testes de álcool aos pais da menor, para verificar se os mesmos possuíam álcool, tendo a Sra. BB acusado uma TAS de 0,45g/l e o sr. CC um TAS de 0,67g/l”. 4. Aquando do exame médico objectivo efectuado à criança no Serviço de Urgência, a mesma não apresentava lesões traumáticas visíveis, excepto pequena escoriação no nariz e foi decidido o internamento até decisão da CPCJ. 5. No dia 9 de Dezembro de 2019, a progenitora da criança relatou à CPCJ ... que no Sábado estivera em casa de uma amiga onde bebeu duas cervejas e que voltou para casa e o companheiro já estava alterado, que começaram a discutir e o mesmo saiu de casa e foi para o café e depois telefonou-lhe para ir ter com ele, o que fez, local onde beberam mais umas cervejas. 6. Mais relatou que voltaram a casa e começaram novamente a discutir e que tinha a bebé ao colo e quando o companheiro lhe deu uma bofetada, ela perdeu o controlo e não se lembrar quem acabou por agredir a bebé no colo. 7. Mais relatou que a discussão teve início porque o companheiro lhe disse para ir para casa por volta das 17 horas e quando ele chegou do trabalho começou a implicar consigo e ela foi para o quarto com a bebé perguntando-lhe se não podia ter amigos. 8. Esclareceu que a bebé era alimentada já só com suplemento. 9. Afirmou ainda que já nesse dia e no dia anterior havia falado com o companheiro. 10. Os progenitores da criança conheceram-se em Inglaterra, onde eram amigos e foi em Portugal que decidiram viver juntos. 11. Aquando da sinalização, os progenitores viviam em união de facto há cerca de um ano, ainda que, no início, se tenham desentendido e em Janeiro de 2019 reconciliaram-se e foram para a ... onde residem os avós paternos da criança e regressaram depois ao continente. 12. Aquando do referido de 1. a 3., a irmã uterina da criança, FF, nascida a .../.../2005, estava em casa de uma amiga em .... 13. Aquando da entrevista com a CPCJ referida em 5., a progenitora desconhecia o nome da mãe da amiga da filha em casa de quem a mesma estava. 14. Aquando da sinalização, o pai da criança trabalhava na construção civil e a mãe estava de licença de maternidade. 15. Os progenitores não tinham suporte familiar. 16. A AA era acompanhada no Hospital 1..., em ..., devido a um problema cardíaco (sopro sistólico III/IV) e necessitava de ser operada, aguardando marcação. 17. O progenitor da criança tem uma outra filha, actualmente, com cerca de 16 anos que vive na .... 18. No dia 10 de Dezembro de 2019, a mãe concordou com a deliberação da CPCJ ... em aplicar a criança uma medida de promoção e protecção de acolhimento residencial. 19. No dia 10 de Dezembro de 2019, a pai da criança relatou à CPCJ que no sábado foi trabalhar e regressou a casa pelas 17 horas e que a companheira estivera em casa de uma amiga a beber cerveja e que quando ocorreu a discussão entre ambos, a bebé estava no seu colo e a mãe continuou a agredi-lo, sendo que tinha marcas visíveis de arranhões no pescoço; ser costume a companheira beber cerveja e vinho e que só não o fez durante a gravidez; já ter havido brigas entre o casal na presença de FF; não concordar com as amizades da companheira por serem brasileiras que não têm marido; que um mês e meio antes, a companheira saíra de casa e estivera com amigos brasileiros e pelas 3 horas e 30 minutos da madrugada chegou a casa alcoolizada e que antes de regressar a casa já ele a tinha ido buscar ao bar onde estava com as amigas e pedira-lhe para ir para a casa mas que a mesma não quis, pelo que ele regressou a casa com a bebé e pediu auxílio à GNR que foi falar com a mãe da AA; não ter amigos em ... e muita vezes conviver com os amigos da companheira só para não haver discussões e não ter visitado a filha no Hospital porque a mãe da mesma lhe disse que a menina não podia receber visitas. 20. A irmã uterina da AA, FF, mantinha-se em casa da amiga e o pai da primeira só conhecia, de vista, os pais desta. 21. No dia 10 de Dezembro de 2019, HH, amiga da progenitora há cerca de um ano e meio, relatou à CPCJ que os pais da AA por vezes bebem mas são cuidadosos com as meninas e ter conhecimento que o casal tinha hábitos de discussão constantes e que houve uma altura em que o pai chegou a sair de casa (Setembro), mas que acabavam sempre por reatar a relação. 22. Nos primeiros testes do 1.º período do ano lectivo 2019/2020, a irmã uterina da criança, FF, obtivera classificações negativas às disciplinas de físicoquímica, história, português e matemática. 23. Por acordo de promoção e protecção celebrado na CPCJ ..., a 10 de Dezembro de 2019, foi aplicada à criança AA uma medida de acolhimento residencial pelo período seis meses. 24. No âmbito de tal acordo, os pais comprometeram-se a efectuar visitas regulares à instituição onde a criança se encontrasse acolhida, respeitando as regras e horários impostos pela mesma; a manter contactos telefónicos frequentes com a instituição; a acompanhar a criança nas consultas de especialidade e nas de rotina; a dialogar entre si com vista a superar os conflitos existentes; a evitar o consumo excessivo de álcool de modo a evitar comportamentos que daí pudessem advir; a permitir todas as visitas domiciliárias que os técnicos considerassem necessárias no decurso do acompanhamento; a informar a CPCJ de qualquer alteração em relação à morada e contactos telefónicos e a mãe ainda a solicitar acompanhamento médico de forma a superar o seu problema com o álcool. 25. Mais ficou a constar de tal acordo que “em caso de incumprimento do presente acordo, será comunicado ao Ministério Público para efeitos de instauração do processo judicial de promoção e protecção”. 26. Em execução de tal acordo de promoção e protecção, a criança foi acolhida, a 10 de Dezembro de 2019, no Centro de Acolhimento ...” da ... onde se encontra desde então. 27. Ao invés do acolhimento da filha que obrigava ao afastamento de ambas, a CPCJ propôs à mãe o acolhimento de ambas em casa abrigo, o que a mesma recusou, por não lhe fazer sentido. 28. A bebé era acompanhada em Neonatologia no Hospital ..., na consulta de cardiologia no Hospital 1... e na consulta de Nutrição na Maternidade .... 29. Aquando do acolhimento da AA e após ter sido informada pela instituição que poderia realizar visitas às filhas diariamente de segunda a sexta-feira e contactos telefónicos diários, a mãe acordou visita três vezes por semana. 30. A progenitora em Dezembro de 2019 visitou a filha nos dias 11, 12, 13, 16, 17, 20, 23 e 24 e em Janeiro de 2020, nos dias 2, 3, 7, 8, 9 e 13. 31. A criança foi internada no Hospital 2..., a 17 de Janeiro de 2020, devido a problemas respiratórios. 32. A progenitora foi autorizada a permanecer junto da filha durante o internamento. 33. Não obstante, a mãe estava a causar instabilidade à bebé e foi-lhe pedido que assegurasse um ambiente calmo, o que a mesma não fez, chegando a tirar a máscara de oxigénio e entrando em conflito com a enfermeira. 34. Em virtude do referido em 33., o Hospital 2... decidiu, a 20 de Janeiro de 2020, não autorizar que a mãe acompanhasse a filha no internamento, tendo pedido que fosse uma técnica da instituição a fazê-lo, podendo assim apenas estar com a filha no horário das visitas entre as 15 e as 19 horas. 35. A 21 de Janeiro de 2020, a situação da AA agravou-se e foi colocada num quarto sozinha em frente ao gabinete de enfermagem e, segundo avaliação médica, até o barulho da televisão no quarto parecia causar instabilidade à mesma. 36. A 22 de Janeiro de 2020, o pai fizera visita à filha no Hospital no dia 19 de Janeiro de 2020 e a mãe ainda não a visitara nessa semana alegando, na CPCJ, a 22 de Janeiro de 2020, preferir assim para resguardo da filha, ficar muito exaltada quando vê a filha e transtornada com o estado da mesma e ter intenção de visitar a filha no dia seguinte, dia da sua folga e que iria tentar manter a calma nas próximas visitas. 37. Na mesma data, os pais afirmaram que a sua relação estava estável e sem discussões. 38. A mãe declarou estar a trabalhar, com contrato semanal, numa empresa em ..., por turnos das 8 horas e 30 minutos às 16 horas e 30 minutos; das 15 horas e 30 minutos às 24 horas e das 00 às 08 horas e o pai mantinha o seu emprego em .... 39. A 22 de Janeiro de 2020, a mãe recusou apoio psicológico. 40. A mãe contactou a instituição dizendo que o melhor seria não visitar a filha no hospital porque ela estava mais tranquila com as educadoras e foi-lhe respondido que não estava impedida de fazer visitas, mas a mãe insistiu que preferia assim, pelo que lhe foi dito que a iriam informando da evolução do estado de saúde da filha. 41. No dia 6 de Fevereiro de 2020, a mãe da criança contactou a CPCJ ... informando que aí não poderia comparecer nesse dia, conforme havia solicitado, por estar em ..., no Consulado do Brasil e solicitou atendimento para o dia 12 de Fevereiro de 2020. 42. No dia 12 de Fevereiro de 2020, a progenitora informou a CPCJ que estava a trabalhar no Lar de Idosos de ... porque não tinha boleia para se deslocar para a empresa. 43. O pai visitou a filha no hospital no dia 17 de Fevereiro de 2020. 44. A 19 de Fevereiro de 2020, a criança foi transferida do Hospital 1... para o Hospital ... onde permaneceu até ao final do mês, altura em que foi transferida para o Hospital 2.... 45. Nesse período, o pai telefonou para a instituição dizendo que não queria que a companheira fosse visitar a filha com a amiga que considerava uma má influência. 46. No dia 21 de Fevereiro de 2020, o pai afirmou à CPCJ que no dia anterior, a companheira chegara a casa um pouco “alterada” e a cheirar a cerveja, tendo ocorrido um pequeno desentendimento entre ambos e que o comportamento da companheira se devia à má companhia da amiga desta, II, que acompanhara aquela, no dia anterior, na visita ao hospital. 47. No início de Março de 2020, o enfermeiro JJ que reside em ... disse à Sra. Directora Técnica da instituição conhecer de lá a progenitora e que a mesma normalmente estava no café a beber umas cervejas, o que esta reportou à CPCJ. 48. A 25 de Março de 2020, a criança foi transferida para o Hospital 1... em ... para ser submetida a intervenção cirúrgica cardíaca e, no dia 26 de Março, após contacto para o efeito, a mãe deslocou-se, nesse mesmo dia, a ... para assinar o termo de responsabilidade. 49. A 6 de Abril de 2020, a CPCJ contactou telefonicamente os pais da criança para reforçar o apoio psicológico uma vez que a menina iria ser submetida a intervenção cirúrgica no dia seguinte. 50. No dia 11 de Abril de 2020, o pai da criança informou a CPCJ que já não vivia em união de facto com a companheira porque esta não estava a respeitar o isolamento social e incompatibilizou-se com a mesma, receando pelo regresso da AA a casa após os seis meses de acolhimento porque a mãe poderia por em causa a saúde da filha. 51. A 17 de Abril de 2020, a bebé foi transferida para o Hospital 2.... 52. No dia 20 de Abril de 2020, a mãe questionou a CPCJ se quando a filha tivesse alta clínica poderia ir para junto da família, tendo sido informada que a situação teria que ser avaliada em conjunto com a instituição, CPCJ e progenitores. 53. A 4 de Maio de 2020, a criança teve alta hospitalar e regressou à instituição. 54. Aquando da alta, os contactos familiares na instituição, devido à pandemia Covid-19, estavam condicionados a telefonemas e videochamadas, sendo que foi acordado com a mãe videochamadas duas vezes por semana, nas terças-feiras às 10 horas e 30 minutos e nas quintas-feiras às 18 horas e 30 minutos. 55. Em Junho de 2020, a instituição contactou os progenitores informando-os que poderiam voltar a realizar visitas presenciais à filha na instituição, sendo que a mãe informou que tinha dificuldade em deslocar-se a ... alegando inexistirem transportes públicos por causa da pandemia. 56. A 19 de Junho de 2020, a CPCJ ... deliberou a prorrogação da medida de acolhimento residencial da criança por mais seis meses. 57. A 22 de Junho de 2020, os pais estavam juntos e a mãe trabalhava desde há três semanas num lar em ..., entre as 19 e as 7 horas, com folga nas quartas-feiras e sábados. 58. No mesmo dia, a progenitora declarou à CPCJ que optara por tal horário para que quando a filha regressasse pudessem ter organização familiar para cuidar dela. 59. O pai mantinha-se na mesma empresa. 60. A irmã uterina FF transitara para o 10.º ano de escolaridade. 61. No mesmo dia e perante a possibilidade dada pela CPCJ de a menina passar a poder visitar os pais em casa destes, os mesmos colocaram a possibilidade de utilizar transportes públicos para o efeito e depois de a filha se deslocar de táxi para evitar transportes. 62. Por acordo de promoção e protecção celebrado na CPCJ ..., a 22 de Junho de 2020, foi aplicada à criança AA uma medida de acolhimento residencial pelo período seis meses. 63. No âmbito de tal acordo, os pais comprometeram-se a efectuar visitas regulares à instituição onde a criança se encontrava acolhida, respeitando as regras e horários impostos pela mesma; a respeitar e cumprir com o agendamento das idas da filha a casa, acautelando todas as indicações da instituição no que concerne aos cuidados de alimentação e saúde da criança; a manter contactos telefónicos frequentes com a instituição; a acompanhar a criança nas consultas de especialidade e nas de rotina; a dialogar entre si com vista a superar os conflitos existentes; a evitar o consumo excessivo de álcool de modo a evitar comportamentos que daí pudessem advir; a permitir todas as visitas domiciliárias que os técnicos considerassem necessárias no decurso do acompanhamento; a informar a CPCJ de qualquer alteração em relação à morada e contactos telefónicos e a mãe ainda a solicitar acompanhamento médico de forma a superar o seu problema com o álcool. 64. Mais ficou a constar de tal acordo que “em caso de incumprimento do presente acordo, será comunicado ao Ministério Público para efeitos de instauração do processo judicial de promoção e protecção”. 65. No dia 23 de Junho de 2020, a progenitora compareceu na CPCJ informando que os horários dos autocarros ainda não funcionavam normalmente e, consequentemente, não poderia ir, nesse dia, visitar a filha, tendo efectuado, mais tarde videochamada para ver a filha. 66. Questionada como seriam os fins-de-semana que a filha passaria em casa dos pais, a mãe reiterou que o transporte seria efectuado de táxi e ter um casal amigo (KK) que se disponibilizou para ir buscar e levar a menina em transporte próprio. 67. No mesmo dia, a mãe informou que iria visitar a filha no dia seguinte, às 18 horas e 15 minutos, com o companheiro e que o transporte seria assegurado pelo casal amigo. 68. Após o referido em 53., os pais visitaram a filha na instituição no dia 24 de Junho de 2020. 69. No dia 15 de Julho de 2020, a CPCJ ... recebeu nova sinalização da criança, referindo que “a mãe é uma alcoólatra”. 70. A 20 de Julho de 2020, a habitação onde residia o agregado estava limpa e organizada. 71. Os pais da bebé mantinham-se nos mesmos empregos. 72. Declararam à CPCJ que contactavam a filha por videochamada nas quintas-feiras e justificaram à CPCJ não visitar a filha por falta de transporte para se deslocarem. 73. No dia 20 de Agosto de 2020, o progenitor deslocou-se, por sua iniciativa, à CPCJ ..., informando que discutira com a companheira e que esta lhe partira o telemóvel; que a relação nunca melhorou e que era muito conflituosa; que a companheira nunca parou de consumir álcool; estarem separados há cerca de um mês; que a filha FF da companheira sai de casa e chega à 1 ou 2 horas da manhã; que a sua mãe, residente na ..., tinha condições e queria apoiar a AA; que depois do nascimento da bebé, a companheira deixou-a consigo, quando ainda amamentava e foi para o ... em ... e que cerca da 1 hora e tal estava embriagada e que a GNR também se deslocou ao local e que a companheira só regressou a casa depois das 4 horas da madrugada; não ter a mãe capacidade para cuidar da filha. 74. O pai continuava a residir em ..., na mesma casa, e a trabalhar, desde há cerca de quatro anos, na mesma empresa, auferindo um vencimento médio mensal no montante de cerca de €1200,00/1300,00 (€80,00 por dia). 75. Pagava €250,00 de renda; cerca de €25,00/€30,00 de consumo de electricidade; cerca de €15,00/€20,00 de consumo de água; €35,00 de pacote de tv e €40,00 de telefone. 76. A partir do final de Agosto de 2020, o pai deixou de estar presente nas videochamadas, estando apenas a mãe e a irmã uterina da menina, FF. 77. No dia 10 de Setembro de 2020, a progenitora informou a CPCJ, por email, que se ia ausentar entre esse dia e o dia 14 de Setembro de 2020, para Londres, para tratar de assuntos pessoais e familiares. 78. Em tal email, a progenitora escreveu ainda “como vocês já sabem eu e senhor CC já não estamos juntos, decidimos seguir vidas separados, agora a minha prioridade é recuperar a minha filha AA”. 79. Juntou um relatório datado de 28 de Agosto de 2020, subscrito por um médico radiologista relativo a uma ecografia abdominal com o seguinte teor “fígado com dimensões contornos normais, estrutura homogénea, sem evidência de lesão focal; vias biliares intra e extra-hepáticas não ectasiadas; vesícula biliar sem sinais de litíase ou lesão orgânica e pâncreas e baço sem alterações morfo-estruturais” e o resultado de análises clínicas de uma colheita realizada a 29 de Julho de 2020. 80. No dia 1 de Outubro de 2020, a CPCJ ... enviou um email à progenitora, solicitando informação sobre se já se encontrava em Portugal e a morada actual do seu agregado familiar e estabelecimento de ensino frequentado pela filha FF. 81. No mesmo dia, a progenitora respondeu, por email, com o seguinte teor “como teria dito no email anterior, seria 4 dias em Londres, já estou no território de Portugal sim, e FF já está matriculada na Escola Secundária ..., .... Ano. 10.º D1 directora de turma LL. No momento estamos nesse endereço: Rua ... letra ..., ... ... .... Obrigado”. 82. Após a visita referida em 68., o pai visitou a filha no dia 8 de Outubro de 2020 acompanhado pela namorada. 83. A visita que tem a duração prevista de uma hora, decorreu apenas entre as 10 horas e 10 minutos e as 10 horas e 30 minutos, sendo que pai perguntou se a filha comia bem, interagiu com ela e tirou fotografias. 84. Após a visita referida em 68., a progenitora apenas voltou a visitar a filha no dia 15 de Outubro de 2020. 85. Nessa visita a mãe perguntou pela consulta de cardiologia, tirou fotografias à filha e questionou se tinham fotografias do bolo de aniversário. 86. A 26 de Outubro de 2020, a instituição informou a CPCJ ... que fora realizado o cariótipo da criança e que tudo apontava, segundo a médica, para problemas de desenvolvimento, embora ainda não fosse conhecido o resultado. 87. A bebé mantinha o acompanhamento médico. 88. O pai tinha uma nova companheira. 89. Em Novembro de 2020, a avó paterna da criança telefonou pela primeira vez para a instituição e após se ter apresentado, perguntou se a neta estava bem e de seguida questionou se ela era normal. 90. Perguntada sobre o que pretendia saber, a avó voltou a questionar “se ela é normal e assim… se não é autista” e foi informada que a neta estava a ser acompanhada ao nível da saúde, que tinha sido submetida a uma cirurgia em Abril por CIV subvalvular e que estava bem e relativamente ao futuro não era possível fazer suposições e apenas ir acompanhando o seu desenvolvimento. 91. A avó paterna questionou ainda se a instituição podia enviar-lhe vídeos da neta, tendo-lhe sido dito que não tinham autorização para captar imagens da menina, tendo aquela respondido que quando o filho fosse à visita, ele lhe enviaria. 92. Após a visita referida em 82., o pai voltou a visitar a filha na instituição no dia 2 de Dezembro de 2020 acompanhado pela nova companheira e a visita teve a duração de meia hora e o pai tirou fotografias. 93. Após a visita referida em 84., a progenitora voltou a visitar a filha no dia 11 de Dezembro de 2020 e levou uma chupeta e uma fita de presente para a filha e tirou fotografias. 94. No decurso da visita, a mãe pegou na filha ao colo e esta começou a chorar e a procurar o contacto visual com a educadora, tendo havido necessidade de contacto físico com a mesma para serenar. 95. A mãe efectuou mais duas tentativas, mas a bebé mostrou sempre o seu desagrado através do choro, sendo que a mãe começou também a chorar. 96. A 18 de Dezembro de 2020, a progenitora contactou a CPCJ ... a fim de perceber o que iriam fazer uma vez que o acordo de promoção e protecção terminava no dia 22 de Dezembro de 2020. 97. No mesmo dia, a mãe declarou à CPCJ que visitava a filha todas as semanas no dia de folga do seu trabalho e todas as quintas-feiras fazia videochamada para instituição. 98. Mais informou viver perto dos futuros padrinhos da filha e trabalhar na Santa Casa da Misericórdia ... e que a filha FF se adaptou muito bem e até melhorou bastante o aproveitamento. 99. Mais declarou que mantinha contactos frequentes com a avó paterna da criança e que tentara, várias vezes, falar com o pai desta mas que existiam alguns atritos causados pela então companheira deste. 100. A 21 de Dezembro de 2020, a AA tinha as rotinas interiorizadas relativamente à alimentação, higiene e sono. 101. Solicitava contacto visual e corporal, identificava as figuras cuidadoras, nomeadamente pela quais tinha preferência e reagia ao estranho. 102. Contestava, com choro, o desconforto e a procura de colo. 103. A 21 de Dezembro de 2020, o pai, nos três meses anteriores, telefonou para a instituição nos dias 8, 11, 13 e 25 de Setembro sendo que, neste dia, deu os parabéns à filha que tinha efeito anos no dia anterior. 104. Voltou a telefonar nos dias 6 e 10 de Outubro e 25 de Novembro de 2020. 105. A 7 de Janeiro de 2021, a CPCJ ... deliberou prorrogar a medida de acolhimento residencial por um ano. 106. No dia 26 de Janeiro de 2021, a progenitora enviou um email à CPCJ ... a informar que iria mudar de residência no fim-de-semana, devido à colocação à venda do anterior apartamento, e a indicar como novo endereço, a Rua ..., na .... 107. No dia 3 de Fevereiro de 2021, o pai continuava a viver em ... e afirmou na CPCJ ... não ter condições para cuidar da filha por ter de trabalhar e teria de pagar a uma ama para ficar com a filha. 108. No mesmo dia, o pai apontou como solução para a filha que a mesma ficasse com os avós paternos na ... até à entrada no ...... ciclo da escola e que nessa altura poderia ficar com a filha. 109. Mais declarou que mantinha contacto com a mãe da filha, sem qualquer atrito e pensar que “a mãe está melhor”, não tem consumido álcool e que até a FF está melhor. 110. Por acordo de promoção e protecção celebrado pela CPCJ ..., a 3 de Fevereiro de 2021, foi a medida de acolhimento residencial aplicada à criança prorrogada por um ano. 111. No âmbito de tal acordo os progenitores comprometeram-se a efectuar visitas regulares à instituição onde a criança estava acolhida, respeitando as regras e horários impostos pela mesma; a respeitar e cumprir com o agendamento das idas da criança a casa, acautelando todas as indicações da instituição no que concerne aos cuidados de alimentação e saúde da criança; a manter contactos telefónicos frequentes com a instituição; a acompanhar a criança nas consultas da especialidade e nas de rotina; a dialogar entre si com vista a superar os conflitos existentes; a evitar o consumo excessivo de álcool, de modo a evitar comportamentos que daí pudessem advir; a permitir todas as visitas domiciliárias que os técnicos considerassem necessárias no decurso do acompanhamento e a informar a CPCJ de qualquer alteração em relação à morada e contactos telefónicos. 112. Os progenitores reconciliaram-se em Março de 2021 e o pai integrou o agregado da mãe da AA na .... 113. Em Março de 2021, o cardiologista pediátrico solicitou uma consulta de genética no Hospital 3... por suspeita de algum síndrome. 114. Em Maio de 2021, o agregado dos progenitores da criança alterou a sua residência para a Rua ..., em ..., .... 115. A 7 de Julho de 2021, a AA teve consulta de endocrinologia no Hospital 2..., na sequência de, na consulta de Março, a médica ter constatado um inchaço mamário anormal para a idade. 116. A 30 de Julho de 2021, a progenitora declarava trabalhar, por conta própria, nas limpezas e o pai era mestre de obras, sendo o agregado familiar também composto pela filha daquela, FF. 117. O agregado mantinha-se a residir na morada indicada a 114. 118. Trata-se de um apartamento T3 duplex com excelentes condições habitacionais, composta por cozinha totalmente equipada e uma marquise anexa à mesma, uma sala ampla, duas casas de banho e três quartos, um destinado ao casal, outro a FF e outro à AA. 119. Todas as divisões da habitação dispõem de luz natural e a habitação, aquando da realização da visita domiciliária, com aviso prévio, a 30 de Julho de 2021, estava devidamente higienizada e organizada. 120. Nessa ocasião, a mãe declarou à comissária da CPCJ ... que, desde o início do mês de Maio se colectara e trabalhava, por conta própria, na área das limpezas, auferindo um valor diário de cerca de €40,00 e o pai auferia um vencimento médio mensal no montante de cerca de €1.200,00. 121. Na mesma ocasião, a progenitora declarou que visitavam a filha duas vezes por mês e, sempre que possível faziam videochamada, mantendo sempre um contacto próximo com a filha. 122. Quando questionada sobre o motivo da mudança do ... para o concelho ..., a mãe declarou que onde viviam não tinham família, nem ninguém próximo pelo que decidiram mudar-se para junto dos padrinhos da AA que residem na .... 123. A renda do apartamento importa na quantia mensal de €450,00. 124. A jovem FF transitara para o 11.º ano de escolaridade. 125. Na sequência de um pedido efectuado pela progenitora nesse sentido, foi autorizado, a 16 de Agosto de 2021, que a irmã uterina, FF, a visitasse na instituição. 126. Em Setembro de 2021, a AA integrou a creche e fez uma boa adaptação, embora inicialmente tenha mostrado alguma resistência no estabelecimento de relações com os adultos. 127. Na consulta de rotina dos dois anos, a 23 de Setembro de 2021, a bebé apresentava um bom desenvolvimento para a sua idade. 128. A 30 de Setembro de 2021, a criança teve alta clínica da consulta de neonatologia. 129. A 27 de Setembro de 2021, contactada telefonicamente a mãe, a mesma informou a CPCJ que não existiam conflitos entre o casal. 130. Até 1 de Outubro de 2021, a criança reagia às visitas dos pais e da irmã FF com desconforto e não os reconhecendo como figuras de referência com as quais tivesse relação. 131. Chorava quando entrava para a sala e recusava sair do colo da educadora, sendo necessário para que se acalmasse que a mesma permanecesse na sala durante o tempo da visita e apesar das tentativas da mãe para se aproximar a AA protestava, chorando e recusando a aproximação da mesma. 132. A 7 de Outubro de 2021, a CPCJ ... deliberou a transferência do processo para a CPCJ .... 133. A 12 de Outubro de 2021, o pai contactou telefonicamente a CPCJ informando que até ao final do mês iria sair de casa; que a mãe da filha continuava a ter consumos de álcool, ausentando-se de casa durante todo o fim de semana e o mesmo não estava a conseguir suportar tal situação e considerar que o melhor para a filha seria permanecer na instituição. 134. A 18 de Outubro de 2021, a AA foi observada no serviço de urgência devido a tosse e febre, tendo-lhe sido diagnosticada uma infecção respiratória com vírus VSR, tendo sido internada por hipoxemia e para realização de antibioterapia endovenosa até ao dia 21 de Outubro de 2021. 135. Aquando do internamento, a instituição telefonou à mãe a informá-la e a questioná-la se pretendia ficar como acompanhante da filha durante o internamento, o que a mesma se disponibilizou. 136. No dia 19 de Outubro de 2021, a mãe foi substituir a técnica que acompanhava a criança, não tendo havido qualquer contacto físico entre mãe e filha no momento da sua chegada. 137. Entretanto, a criança adormeceu e a técnica saiu, ficando a mãe com a criança. 138. Antes da saída da técnica a mãe perguntou-lhe se poderia telefonar caso precisasse de alguma coisa, tendo-lhe sido dito que sim. 139. Decorridos cerca de 15 minutos, uma enfermeira entrou em contacto com a instituição referindo que a criança acordara e que estava a chorar compulsivamente não conseguindo a mãe acalmá-la e solicitando que fossem fazer o acompanhamento da criança, sendo que a mãe também contactou a instituição a efectuar o mesmo pedido porque a filha não parava de chorar e não aceitava a sua aproximação. 140. A GNR ... sinalizou a jovem FF à CPCJ ... por exposição da violência doméstica entre a mãe e o companheiro desta, pai da AA. 141. No dia 4 de Novembro de 2021, a progenitora da criança declarou à CPCJ ... estar separado do companheiro desde meados de Outubro de 2021 e ser uma decisão definitiva; que o mesmo apresentava um comportamento violento e tem hábitos alcoólicos e de consumo de drogas; negou consumo de álcool em excesso e trabalhar por conta própria na área das limpezas. 142. Na ocasião, a jovem FF confirmou à CPCJ ir para casa do namorado nos fins-de-semana, em ... e negou consumo de drogas. 143. O pai da criança regressou a ... após a separação. 144. A 8 de Novembro de 2021, o pai da criança confirmou ter saído de casa e estar a viver em .... 145. À CPCJ ... declarou que a mãe da filha continuava a beber em excesso e não reunir condições para receber a filha e que a melhor alternativa para o futuro da filha são os seus pais que residem na .... 146. A CPCJ tinha agendado com a progenitora visita domiciliária para o dia 12 de Dezembro de 2021. 147. No próprio dia, a mãe informou a CPCJ não ter disponibilidade para os receber porque aparecera um trabalho de limpeza que iria aproveitar. 148. No dia 15 de Dezembro de 2021, o pai contactou telefonicamente a CPCJ ... solicitando informação sobre o estado do processo, continuando a considerar que a mãe da criança não reunia condições para receber a filha, uma vez que continuava a ingerir bebidas alcoólicas em excesso. 149. Na ocasião, afirmou ter conhecimento que a ex-companheira visitava as amigas em ... e que passavam tardes nos cafés a “despejar grades de cerveja” e estar disposto a assinar novo acordo de promoção e protecção para que a filha permanecesse mais dois ou três anos na instituição para depois ser acolhida pelos avós paternos na .... 150. Quando questionado sobre o porquê de inexistir disponibilidade nesse momento, justificou com a idade avançada da sua mãe e quando confrontado com o facto de daí a dois ou três anos ainda ser mais velha, afirmou que o seu pai fora operado a uma hérnia e que a mãe precisava de lhe prestar cuidados. 151. Questionado sobre o que aconteceria à AA se fosse viver com os avós e, entretanto, algum deles adoecesse, respondeu que as irmãs podem ajudar, sendo que ele próprio nada pode fazer dado que vive sozinho e que tem de ir trabalhar todos os dias. 152. No dia 17 de Dezembro de 2021, a CPCJ ... realizou uma visita domiciliária à progenitora, sendo que a habitação mantinha muito boas condições de higiene e estava mobilada e equipada adequadamente. 153. Nesse dia, a mãe declarou que visitava a filha com mais regularidade e que a mesma já a aceitava um pouco melhor e continuar a obter rendimentos da sua actividade como empregada de limpeza, tendo solicitado os serviços de um contabilista para formalização da sua actividade junto das Finanças e da Segurança Social. 154. A 11 de Fevereiro de 2022, a criança estava bem adaptada ao espaço e às rotinas da creche e mantinha uma boa relação com os pares, mostrando-se mais próxima de uma das crianças, sendo que, relativamente aos adultos mostrava-se reservada, mantendo-se mais distante e não tomando iniciativa para a interacção com excepção da educadora e auxiliar da sala. 155. À CPCJ a mãe declarou rendimentos mensais provenientes dos trabalhos de limpeza no montante de cerca de €500,00 e rendimentos provenientes de Inglaterra de um arrendamento também no montante de cerca de €500,00 e ter rendimentos suficientes para pagar a renda da casa no valor mensal de €450,00 e as despesas com consumos de água, electricidade, gás, alimentação, vestuário, educação da filha FF e outras despesas que possam surgir. 156. O pai da criança trabalhava na construção civil. 157. A 24 de Fevereiro de 2022, a criança não reconhecia nenhum dos progenitores, rejeitando qualquer tentativa de aproximação encetada pelos mesmos sendo absolutamente necessária a presença de uma educadora no decurso das visitas, ficando a menina em sofrimento quando entrava na sala de visitas, recusando sair do colo da técnica. 158. A 24 de Março de 2022, a CPCJ ... deliberou a aplicação à criança de uma medida de confiança a instituição com vista a futura adopção. 159. A 5 de Abril de 2021, a progenitora declarou à CPCJ ... ainda não ter regularizado a sua situação profissional e auferir rendimentos de limpezas que faz em habitações e de uma renda de Londres, esta última no valor mensal de €1.200,00. 160. Questionada sobre a possibilidade se de mudar para mais próximo da filha, declarou já ter pensado nisso mas ter receio porque o pai reside próximo. 161. Mais declarou que, ultimamente, visitava a filha quinzenalmente e que a mesma já interage mais consigo, reconhecendo-a como mãe. 162. No dia 13 de Abril de 2022, a CPCJ ... contactou telefonicamente o pai da criança para agendar dia e hora para aí se deslocar, tendo o mesmo dito não ter disponibilidade naquela semana, tendo ficado agendado para o dia 18 de Abril. 163. No dia 18 de Abril de 2022, o pai não compareceu à hora agendada e, mais tarde, contactou telefonicamente, informando que havia falado com a sua família na ... e que não assinaria o acordo de promoção e protecção por não concordar com a continuidade da medida de acolhimento residencial, tendo sido informado que o processo seria remetido ao Ministério Público, do que mostrou ter consciência. 164. Por despacho proferido a 13 de Maio de 2022, foi aplicada à criança uma medida provisória de acolhimento residencial pelo período de seis meses, mantendo-se na instituição onde se encontra e os pais autorizados a visitar a filha na instituição de acordo com os horários e regras definidos por esta para o efeito. 165. Foi ainda determinada a notificação dos progenitores da criança nos termos do disposto no art.º 107.º n.º 3 da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, sendo que o Ministério Público, aquando da instauração do processo requereu logo a aplicação à criança de uma medida de confiança a instituição com vista a futura adopção. 166. A 11 de Abril de 2022, a progenitora da criança celebrou um contrato de trabalho com o Centro Social ..., pelo prazo de seis meses, com início a 11 de Abril de 2022 e termo a 10 de Outubro de 2022, para o exercício das funções de auxiliar de serviços gerais com a remuneração mensal ilíquida no montante de €705,00. 167. Em Junho de 2022, à Sra. Técnica da Segurança Social a progenitora declarou que o pai da AA veio para Portugal passados 7 ou 8 meses após aquela, tendo sido “deportado de Londres e veio para ...” e questionada sobre o motivo da “deportação” respondeu que por furtos e pensar que também por tráfico de estupefacientes e que “em Londres percebi que ele usava e traficava drogas, porque ele namorava com uma colega minha”. 168. Na mesma ocasião, quando questionada sobre o motivo de se ter mudado de ... para a ..., distanciando-se assim da filha, a progenitora declarou que “foi a estabilidade melhor que a gente achou… conforto”, para arranjar trabalho e porque onde viviam não tinham ninguém e na ... tinha pessoas amigas, o casal DD e EE. 169. Mais declarou que a relação com o pai da AA foi-se mantendo, mas sempre com conflitos, violência doméstica e interrupções na relação, até que em Outubro de 2021 a relação terminou. 170. Declarou também que além do emprego no Centro Social ... em ..., em que aufere o salário mínimo nacional, também faz “limpezas de fim de obra” no que aufere €250,00/€300,00 por mês, actividade não formalizada e recebe da filha FF cerca de €100,00 mensais de abono de família. 171. Explicou desejar manter o conforto da vida em ... e não equacionar aproximar-se do local onde a filha se encontra para favorecer uma eventual reunificação familiar. 172. A mãe trabalhava por turnos das 8 às 16 horas, das 16 horas às 00 horas e das 00 horas às 8 horas. sendo muito cumpridora, assídua e pontual, educada e delicada com os utentes. 173. A irmã uterina da criança, FF, frequentava o 11.º ano de escolaridade, revelando concentração nas aprendizagens essenciais e cumprindo, de forma satisfatória, as tarefas solicitadas, sendo, igualmente, cumpridora das regras de convivência em contexto de sala de aula e pontual. 174. Todas as iniciativas de contacto entre a progenitora e o estabelecimento de ensino frequentado pela filha FF partiram da directora de turma desta. 175. Na sequência da reunião de Conselho de Turma do 1.º período, a progenitora foi contactada telefonicamente, tendo sido alertada para o facto de a FF manifestar pouco empenho e muitas faltas, embora justificadas, o que necessariamente comprometia o seu desempenho. 176. A progenitora mostrou-se consciente da situação e declarou que iria efectuar um acompanhamento mais intenso e sistemático da filha. 177. No final de Janeiro de 2022, houve novo contacto telefónico no sentido de averiguar sobre isolamento profiláctico da FF como justificação para não frequentar as aulas online, sendo que a progenitora respondeu que iria averiguar a situação. 178. Todas as faltas de FF foram sendo justificadas pela mãe, à excepção de três faltas injustificadas. 179. A progenitora não esteve presente nas reuniões gerais de encarregados de educação convocadas no início do ano lectivo, no final do 1.º período e no final do 3.º período. 180. A progenitora mantém-se a residir no apartamento T3 duplex sito na Rua ..., em ..., .... 181. Na visita domiciliária realizada a 1 de Junho de 2022, a casa estava asseada e organizada. 182. A irmã uterina da criança, FF, desde o acolhimento e até 7 de Junho de 2022, efectuou cinco visitas e costumava estar presente nas videochamadas realizadas pela mãe. 183. A 7 de Junho de 2022, de um modo geral a AA quase não interagia com a mãe e com a irmã FF, sendo necessária a presença de um adulto da instituição nas visitas para que a menina não chorasse e aceitasse ficar na sala, manifestando a mesma satisfação quando a visita terminava, com excepção da visita de 24 de Maio de 2022 em que após o momento inicial de rejeição à mãe, a criança aceitou a aproximação desta ao perceber que a mãe trazia comida e presentes. 184. A 14 de Junho de 2022, a progenitora declarou, além do mais, neste tribunal, quando questionada porque motivo se mudou para longe da instituição onde a filha se encontra se a sua intenção era recuperá-la, que “lá não tinha ninguém e que aqui tinha os padrinhos da AA, “uma amizade de 15 anos”. 185. E quando questionada porque motivo visitou sempre tão poucas vezes a filha ao ponto de esta não ter criado vínculos consigo, respondeu que “foi um ano de videochamada” por não serem permitidos contactos presenciais e atendendo à idade da menina quando voltou às visitas esta estranhava e questionada sobre quais os períodos em que esteve impedida de visitar presencialmente a filha, respondeu “mesmo no começo da pandemia” e depois só com teste negativo. 186. Mais declarou que sempre trabalhou desde que veio para a ... e que se despediu do emprego que tinha em .... 187. No mesmo dia, o pai da criança declarou, além do mais, a propósito do episódio que motivou o acolhimento da filha que “tínhamos estado a beber em casa” e embriagaram-se em casa e questionado sobre se tal era habitual, respondeu “da minha parte, não era muito habitual, era mais da parte dela, uma vez até a fui buscar a um bar em ... quando tinha de amamentar a filha e estava completamente embriagada e o dono do bar até dizia que ela ia lá com a bebé e tudo, ela tem problemas com o álcool, ela nega, mas eu sei”; que a mãe da filha foi viver para a zona da ... porque o declarante namorava com outra rapariga, “mas depois ela fez-me tanto a cabeça e que era mais fácil recuperarmos a minha filha, que eu deixei a casinha, a rapariga” e esteve com a progenitora a viver em ... durante cerca de 7/8 meses, “a vida dela aí era igual, só farra com as amigas, uma vez fui chamá-la às 2 da manhã e ela mandou-se um copo de cerveja e cortou-me a cara toda, isso está tudo no Tribunal ...” e questionado sobre o que entendia ser melhor para a filha, respondeu “eu tenho o meu trabalho aqui, se fosse para ela vir comigo, eu tinha de pagar a uma ama para a ir buscar e levar à creche, eu já meti um processo para os meus pais e a CPCJ foi lá ver e têm todas as condições, a melhor opção era a menina ir para os meus pais”. 188. A progenitora continua a habitar no mesmo apartamento e a trabalhar no lar e a afirmar fazer também limpezas de casa, no que obtém um rendimento mensal no montante de cerca de €1.100,00, além de um rendimento de um apartamento arrendado em Londres, do tempo em que aí vivia, no montante mensal de €1.000,00. 189. Trabalha num lar por turnos das 16 às 00 horas e das 8 às 16 horas ou das 8 às 13 horas e tem dois dias de folga semanais. 190. Entre 1 de Outubro de 2020 e 17 de Março de 2021, a progenitora trabalhou no lar da Santa Casa da Misericórdia ... e não lhe renovaram o contrato porque a mesma faltava com alguma frequência, alegando que ia ver a filha à instituição. 191. Após a visita referida em 93. e até à data da realização do debate judicial, 13 de Setembro de 2022, a progenitora efectuou as seguintes visitas à filha: . 6 de Janeiro de 2021; . 3 de Fevereiro de 2021: . 3 de Março de 2021: . 16 de Abril de 2021; . 14 e 25 de Junho de 2021; . 24 de Setembro de 2021; . 1 de Outubro de 2021; . 9 e 16 de Novembro de 2021; . 6 e 17 de Dezembro de 2021; . 3 e 17 de Janeiro de 2022; . 16 e 25 de Fevereiro de 2022; . 1 e 22 de Abril de 2022; . 24 de Maio de 2022; . 9 e 17 de Junho de 2022; . 20 de Julho de 2022; . 1, 12 e 19 de Agosto de 2022; . 1, 6 e 9 de Setembro de 2022. 192. Actualmente, a criança já não recusa entrar na sala de visita, mas tem de estar presente uma educadora e quando estava tenta sair da sala, a menina vai logo atrás. 193. A criança já se senta na mesa da sala de visitas e “permite” que a mãe e a irmã uterina estejam ao lado dela e lhe toquem e diz “mãe” quando vai para a visita. 194. Apenas entre os dias 4 e 23 de Novembro de 2020 e 21 e 31 de Dezembro de 2020 não foi possível efectuar visitas presenciais por isolamento profiláctico em virtude de existirem casos positivos em algumas crianças da CAR. 195. Na visita de 9 de Novembro de 2021, a criança quase não interagiu com a mãe, sendo necessária a presença de uma educadora para que a menina não chorasse e manifestou satisfação quando a visita terminou. 196. Na visita de 16 de Novembro de 2021, a criança aceitou alguma interacção com a mãe, mas foi necessária a presença da educadora durante a visita e não revelou protesto no momento da separação. 197. Na visita de 6 de Dezembro de 2021, a criança não aceitou as tentativas de interacção que a mãe foi efectuando durante a visita, aproximando-se apenas da educadora presente na sala e manifestou satisfação com o fim da visita. 198. No dia 17 de Dezembro de 2021, a mãe compareceu na visita com a irmã e um primo da criança, sendo que esta apresentou choro prolongado no início, recusando contacto com a mãe e com a irmã e apenas aceitou o contacto com o primo e não manifestou protesto no momento da separação. 199. A 3 de Janeiro de 2022, a irmã e o primo voltaram a estar presentes na visita da mãe e a criança interagiu muito pouco com eles, sendo que decorridos 15 minutos, vestiu o casaco e dirigiu-se à educadora para sair da sala querendo terminar a visita. 200. Na visita de 17 de Janeiro de 2022, a criança apenas brincou com a educadora e não interagiu com a mãe e apresentou satisfação quando a visita terminou. 201. A progenitora sempre teve conhecimento da necessidade de efectuar muitas visitas à filha para que esta se vinculasse a si e não o fez, não obstante poder fazê-lo. 202. As visitas na instituição podiam ser agendadas de segunda a sexta-feira, diariamente, e, numa fase posterior, também Sábado e Domingo. 203. Desde o acolhimento da filha até 26 de Julho de 2022, a progenitora contactou telefonicamente a instituição, maioritariamente, para saber como se encontra a filha e/ou para agendar ou desmarcar visitas: . 10, 12, 15, 18, 20, 21, 22, 23, 25, 26, 27, 28, 29, 30 e 31 de Dezembro de 2019; . 1, 4, 5, 6, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 22 e 23 de Janeiro de 2020; . 16 e 23 de Março de 2020; . 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 16, 17, 18, 19, 25, 28, 29 e 31 de Maio de 2020; . 2, 3, 6, 12, 14, 17, 18, 21, 23, 30 de Junho de 2020; . 3, 5, 7, 8, 10, 20, 22, 27, 31 de Julho de 2020; . 5, 6, 8, 9, 10, 12, 13, 14, 16, 18, 19, 22, 25, 31 de Agosto de 2020; . 1, 2, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 18, 21, 23, 25 de Setembro de 2020; . 3, 4, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 18, 19, 24 de Outubro de 2020; . 1, 24 e 31 de Novembro de 2020; . 5, 7, 8, 14, 16, 20, 24, 27, 30 de Dezembro de 2020; . 2, 14, 15, 16, 17, 22, 24, 30 e 31 de Janeiro de 2021: . 6, 12, 13, 15, 18, 19, 20, 28 de Fevereiro de 2021; . 1, 15, 23, 27 de Março de 2021; . 5, 7, 13, 21, 22, 23, 28 de Abril de 2021; . 4, 5, 7, 10, 12, 16 de Maio de 2021; . 7, 13, 14, 21, 26, 30 de Junho de 2021; . 7, 10, 14, 15, 20, 31 de Julho de 2021; . 3, 4 e 7 de Agosto de 2021; . 3, 7 e 29 de Setembro de 2021; . 2, 11, 19, 22, 26 de Outubro de 2021; . 6 e 10 de Novembro de 2021; . 1, 2, 11, 13, 16, 18, 27, 31 de Dezembro de 2021; . 2, 7, 24, 25 e 28 de Janeiro de 2022; . 14 e 18 de Fevereiro de 2022; . 3, 7, 13, 16, 17 e 23 de Março de 2022; . 5, 12, 28, 29 de Abril de 2022; . 3, 15, 21 e 24 de Maio de 2022; . 7, 11, 12, 15, 22, 29 de Junho de 2022; . 2, 3, 5, 8, 10, 16, 18, 20 de Julho de 2022. 204. Desde 26 de Julho de 2022 e 13 de Setembro de 2022, a mãe contacta telefonicamente a instituição aproximadamente uma vez por semana para saber da filha e para agendar visitas e não fala com a filha nesses telefonemas. 205. Desde o referido em 54., a progenitora realizou as seguintes videochamadas: . 5, 7, 12, 14, 19, 21, 26, 28 de Maio de 2020; . 2, 4, 9, 18 de Junho de 2020; . 10, 16, 23, 30 de Julho de 2020; . 6, 14, 20, 27 de Agosto de 2020; . 3, 10, 17, 24 de Setembro de 2020: . 1, 8, 22, 29 de Outubro de 2020; . 19 de Novembro de 2020; . 3 e 17 de Dezembro de 2020; . 28 de Janeiro de 2021; . 11, 18, 25 de Fevereiro de 2021; . 4, 11, 25 de Março de 2021; . 1 e 8 de Abril de 2021; . 13 e 27 de Maio de 2021; . 3 de Junho de 2021; . 22 e 29 de Julho de 2021; . 19 de Agosto de 2021; . 29 de Setembro de 2021; . 7, 14 e 28 de Outubro de 2021. 206. A videochamada de 7 de Outubro de 2021, teve a duração de 15 minutos, não se mostrando a criança disponível para a interacção. 207. A videochamada de 14 de Outubro de 2021 teve uma duração de cerca de 3 minutos, porque a criança chorava bastante. 208. No dia 28 de Outubro de 2021, para além da mãe, esteve presente na videochamada a irmã uterina FF, mas teve de ser interrompida porque a criança recusou apresentando protesto prolongado (choro). 209. A partir dessa data não voltaram a ser realizadas videochamadas porque a criança começou a apresentar protesto prolongado, choro persistente não querendo permanecer junto da câmara. 210. Toda a família materna da criança está no .... 211. Nada consta do certificado de registo criminal da progenitora. 212. O pai reside em ..., numa habitação pré-fabricada colocada num terreno pertencente aos seus patrões e junto à casa destes. 213. A habitação está a ser reabilitada e é composta por um quarto, casa de banho e cozinha. 214. A 7 de Junho de 2022, o progenitor não visitava a filha desde 1 de Outubro de 2021 e à Sra. Técnica da Segurança Social justificou tal situação com dificuldades de deslocação e económicas, alegando estar dependente de alguém para o transporte e apontou como solução para a AA ser entregue aos avós paternos. 215. De Janeiro de 2021 até à data da realização do debate judicial – 13 de Setembro de 2022 - , o pai visitou a filha quatro vezes, sempre em conjunto com a mãe da mesma, sendo que tais visitas ocorreram nos dias 3 de Março de 2021, 16 de Abril de 2021, 14 de Junho de 2021 e 1 de Outubro de 2021. 216. Pese embora o pai tenha declarado à Sra. Técnica da Segurança Social, em Junho de 2022 que mantinha contactos telefónicos regulares, a verdade é que, desde Janeiro de 2021 e 13 de Setembro de 2022, efectuou dois contactos telefónicos, a 19 de Outubro de 2021, para saber o que se passava com a filha dado que estava internada no hospital e 8 de Dezembro de 2021 para saber como estava a filha e esteve presente em seis videochamadas efectuadas pela mãe no ano de 2021. 217. O pai tem antecedentes criminais, tendo sido condenado, no ..., por sentença proferida a 30 de Agosto de 2016 e transitada em julgado a 20 de Abril de 2017, pela prática, a 14 de Junho de 2016, de um crime de assédio sexual, na pena de seis meses de prisão, de ofensa, na pena de seis meses de prisão e de resistência e coacção sobre funcionário na pena de um mês de prisão. 218. O inquérito n.º 336/19.7GBBNV do DIAP – 1.ª Secção de ... originado pelo auto de notícia que motivou a sinalização da criança foi arquivado por despacho proferido a 6 de Janeiro de 2020, nos termos do disposto no art.º 277.º n.º 2 do Código de Processo Penal, sendo que ambos os progenitores (aí denunciantes e denunciados) recusaram prestar depoimento. 219. A 3 de Setembro de 2020, a progenitora apresentou queixa por violência doméstica na GNR ... contra o pai da filha AA o que originou o inquérito n.º 322/20.4GAMLD do DIAP – 1.ª Secção de ..., sendo que o mesmo foi arquivado, por despacho proferido a 28 de Junho de 2021, nos termos do disposto no art.º 277.º n.º 2 do Código de 220. O pai não compareceu ao debate judicial nem justificou a sua falta. 221. A irmã uterina da criança, FF, mantém o relacionamento com o namorado em .../... e desloca-se para estar com o mesmo de transportes públicos. 222. Após a cirurgia no Hospital 1..., a criança ficou bem e sem necessidade de terapêutica, mas mantém consultas de acompanhamento. 223. Continua a aguardar a marcação da consulta de genética. 224. A progenitora tem uma outra filha, maior de idade, que reside no ..., sendo que a mesma tinha 9 anos quando a mãe emigrou para Inglaterra, permanecendo aquela no .... 225. Os avós paternos da criança residem na ... e apenas a visitaram aquando do seu nascimento. 226. A 26 de Outubro de 2020, os avós paternos da criança tinham conhecimento de toda a situação deste processo de promoção e protecção da neta AA. 227. O único contacto efectuado pela avó paterna da criança para cuidar de saber da neta foi o referido em 89. 228. Além desse telefonema, a avó paterna efectuou um outro para a instituição em Maio de 2022 para saber o que se passava com o processo da neta porque a mãe desta lhe telefonara a chorar e a dizer que o processo estava no tribunal e questionou se a neta iria para adopção. 229. Em tal telefonema, a avó paterna não perguntou pela neta. 230. Ninguém da família alargada da bebé cuidou de visitá-la ou de dela cuidar de saber desde o seu acolhimento. 231. Inexiste alguém na família alargada que queira cuidar da bebé. B) Factos não Provados: a) O casal escolhido para padrinhos da criança continua a prestar apoio à progenitora e à filha desta, FF. b) Em ..., a progenitora não tinha relações de amizade que pudessem servir de apoio caso assim necessitasse e iria sentir-se completamente abandonada juntamente com a filha, num lugar onde conheciam poucas pessoas e não possuíam amizades próximas. c) Permanecendo a residir em local próximo do progenitor da AA, este iria continuar a atormentar a vida da progenitora. d) A progenitora pediu, por diversas vezes, à CPCJ que transferisse a filha para uma instituição mais próxima da sua residência. e) A progenitora efectuou outras visitas à filha além das referidas em 30., 68., 84., 93. e 191. f) A progenitora esteve vários meses impedida de visitar a filha na instituição, por proibição de o fazer, em consequência da crise pandémica criada pelo vírus Covid-19. * Subsunção jurídica Embora a recorrente ponha em crise matéria tomada em consideração para a prolação de decisão, fá-lo de forma genérica, não especificando que pontos poderão estar em causa. A apelante cinge-se a discordar da medida adotada, tecendo vagas críticas à matéria adquirida. Ora o art.º 640.º do C.P.C. estabelece um ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto. Assim, do seu n.º 1 consta que quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”. O n.º 2 do mesmo art.º 640.º acrescenta: a) quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” Visando o recurso a impugnação da matéria de facto, cabe ao tribunal ad quem proceder a um novo julgamento, limitado à matéria de facto impugnada, para o que deverá reapreciar a prova produzida, considerando os meios de prova indicados no recurso e outros que entenda relevantes. Para tanto, o legislador impõe ao recorrente o cumprimento de regras de conteúdo e forma, de molde a evitar uma completa ou parcial repetição do julgamento. Está excluída a possibilidade de recursos genéricos contra a decisão de facto. Admite a revisão de questões de facto concretas, relativamente às quais o recorrente concretize fundadas divergências. Embora se não exija a transcrição dos excertos da gravação que se considerem importantes, é imperioso que o apelante indique com precisão as passagens da gravação que tem como significativas relevantes para que o tribunal de recurso aprecie a sua pretensão. Deste modo, na motivação de um recurso, para além da alegação da discordância, é outrossim fundamental a alegação do porquê dessa discordância, isto é, torna-se mister evidenciar a razão pelo qual o recorrente entende existir divergência entre o decidido e o que consta dos meios de prova invocados.” O caso presente é exemplar no sentido de que não foram observados quaisquer formalismos atinentes à impugnação, se é que esta efetivamente se verifica, pelo que se passará de imediato à verificação dos pressupostos necessários à aplicação da medida de promoção e proteção de confiança a instituição, com vista a futura adoção. * No que se refere à aplicação do direito aos factos, a apelante, em contrário do preceituado no art.º 639.º/2/a do C.P.C., tão pouco identifica as normas jurídicas violadas pelo tribunal a quo. É certo, porém, que discorda da conclusão a que o tribunal recorrido chegou, no sentido de se mostrarem verificados os pressupostos necessários à aplicação da medida de promoção e proteção de confiança a instituição com vista a futura adoção. Entende que a AA deverá ser apenas beneficiária da medida de promoção e proteção de “apoio junto da mãe”. A medida aplicada a AA esteou-se na consideração de que esta se encontra institucionalizada desde os dois meses, não tendo seus pais, desde então, reunido as condições para que seja levada para junto de si. Por força da separação precoce e da circunstância de os pais terem sido omissos nas visitas e cuidados à menina, nunca teriam sido criados os laços afetivos próprios de pais e filhos, pelo que a reunião familiar não contribuiria para o melhor interesse da criança. O pai não manifesta qualquer interesse pela filha, tendo-se desinteressado do processo. A única solução por si encontrada consiste na entrega da menor aos avós paternos, residentes na ..., assim mesmo só daqui a alguns anos. Inexistindo família nuclear ou alargada capaz de garantir um projeto de vida para a criança, a adoção constituiria o melhor desenlace possível para AA. Esta, em súmula, a tese defendida no acórdão. Vejamos com maior pormenor a que conclusão deve conduzir a subsunção dos factos reportados à legislação vigente. * A Convenção das Nações Unidas referente aos Direitos da Criança de 1989, ratificada por Portugal através da resolução da Assembleia da República n.º 20/90, reconhece à criança e ao jovem a titularidade dos direitos respeitantes à satisfação das suas necessidades básicas e ao acesso a uma vida ativa, digna e participante na sociedade em que se insere. Dispõe o art.º 69.º/1 da Constituição da República Portuguesa que as crianças têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições. Nos termos do n.º 2, o Estado assegura especial proteção às crianças órfãs, abandonadas ou por qualquer forma privadas de um ambiente familiar normal. O art.º 36.º/5 da Lei Fundamental consigna que os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos. E o n.º 6 do mesmo art.º que os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial. Decorre do art.º 3.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo/LPPCJP que a intervenção para promoção dos direitos e proteção das crianças e jovens em perigo tem lugar, desde logo, quando os pais, representante legal ou quem tenha a sua guarda de facto, ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação e desenvolvimento. A intervenção judicial, determinada pelo princípio da subsidiariedade, exige que a criança ou jovem se encontre numa situação de perigo, tal como configurada no n.º 2 do citado artigo 3.º da LPCJP. O perigo pressupõe a verificação de uma situação de facto que ameace a segurança, formação, saúde, educação ou desenvolvimento da criança ou jovem, podendo ter origem em culpa (atuação dolosa ou negligente) dos pais, representante legal ou daquele que tiver a sua guarda de facto, ou através de omissão, manifestada na simples impotência ou incapacidade de fazer cessar a situação. Nos termos do disposto no art.º 3.º/2/a) a f), da LPCJP, uma criança ou um jovem encontra-se em perigo, nomeadamente quando: - Está abandonada ou entregue a si própria; - Sofre maus tratos físicos ou psíquicos; - É vítima de abusos sexuais; - Não recebe os cuidados ou a afeição adequados à sua idade e situação; - É obrigada a atividades ou trabalhos excessivos ou inadequados à sua idade, dignidade e situação pessoal ou prejudiciais à sua formação ou desenvolvimento; - Está sujeita a comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional; - Assume comportamentos ou se entrega a atividades ou consumos que afetem gravemente a saúde, segurança, formação, educação ou desenvolvimento, sem que os pais, representante legal ou quem tenha a guarda de facto se lhes oponham de modo adequado a remover essa situação. A questão que, assim, se coloca reside em efetuar um juízo de prognose relativamente à capacidade dos pais biológicos de educarem e manterem AA. Este juízo, como não poderá deixar de ser, assenta na análise do seu comportamento passado, tal como foi sendo percecionado, primeiro pela autoridade policial, em seguida pela instituição de acolhimento e, derradeiramente, pelo tribunal, bem como na sua situação atual e propósitos manifestados. Assuma-se enquanto pressuposto da decisão a tomar que AA tem direito à desinstitucionalização e à integração numa família, que dela cuide e que a respeite. Atentas as necessidades e dependência inerentes à sua idade, esse direito implica que a família gira o seu dia-a-dia assumindo AA um papel central nos condicionalismos dessa gestão. Tomar-se-ão em linha de conta, assinaladamente, nos termos do art.º 4.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo/LPPCJP, que a intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo obedece aos seguintes princípios: a - Interesse superior da criança e do jovem - a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto; b - Privacidade - a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem deve ser efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada; c - Intervenção precoce - a intervenção deve ser efetuada logo que a situação de perigo seja conhecida; d - Intervenção mínima - a intervenção deve ser exercida exclusivamente pelas entidades e instituições cuja ação seja indispensável à efetiva promoção dos direitos e à proteção da criança e do jovem em perigo e) Proporcionalidade e atualidade - a intervenção deve ser a necessária e a adequada à situação de perigo em que a criança ou o jovem se encontram no momento em que a decisão é tomada e só pode interferir na sua vida e na da sua família na medida do que for estritamente necessário a essa finalidade; f) Responsabilidade parental - a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o jovem; g) Primado da continuidade das relações psicológicas profundas - a intervenção deve respeitar o direito da criança à preservação das relações afetivas estruturantes de grande significado e de referência para o seu saudável e harmónico desenvolvimento, devendo prevalecer as medidas que garantam a continuidade de uma vinculação securizante; h) Prevalência da família - na promoção dos direitos e na proteção da criança e do jovem deve ser dada prevalência às medidas que os integrem em família, quer na sua família biológica, quer promovendo a sua adoção ou outra forma de integração familiar estável. O art.º 1978.º do C.C. - (Confiança com vista a futura adoção) preceitua o seguinte: 1. O tribunal, no âmbito de um processo de promoção e proteção, pode confiar a criança com vista a futura adoção quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação, pela verificação objetiva de qualquer das seguintes situações: a) Se a criança for filha de pais incógnitos ou falecidos; b) Se tiver havido consentimento prévio para a adopção; c) Se os pais tiverem abandonado a criança; d) Se os pais, por ação ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança; e) Se os pais da criança acolhida por um particular, por uma instituição ou por família de acolhimento tiverem revelado manifesto desinteresse pelo filho, em termos de comprometer seriamente a qualidade e a continuidade daqueles vínculos, durante, pelo menos, os três meses que precederam o pedido de confiança. 2. Na verificação das situações previstas no número anterior, o tribunal deve atender prioritariamente aos direitos e interesses da criança. 3. Considera-se que a criança se encontra em perigo quando se verificar alguma das situações assim qualificadas pela legislação relativa à proteção e à promoção dos direitos das crianças. * Não sendo as instituições de acolhimento o local adequado para as crianças crescerem, resta aferir se AA deverá crescer junto da mãe, já que, como se viu, o pai se desinteressou do seu destino, ou junto de uma família de adoção. Tendo em consideração a matéria de facto provada, evidencia-se que AA, filha da recorrente, à data do seu acolhimento residencial, com apenas dois meses de idade, se encontrava numa situação de perigo para a sua segurança e saúde. Recorde-se que AA nasceu em .../.../2019, prematura, aos 33 meses de gestação, e com problemas de saúde. Ficou de imediato 15 dias no hospital. Os factos que desencadearam o seu internamento residencial em .../.../2019 datam de 8-10-2019, quando se encontrava em casa ainda não há dois meses. A Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) propôs à ora recorrente o acolhimento de mãe e filha, a fim de evitar a separação, permanecendo ambas em casa abrigo, o que a mãe declinou. Inicia-se aqui a separação entre mãe e filha, não mais tendo convivido debaixo do mesmo teto. Concedamos, assim, que naquele momento nenhum dos pais evidenciou condições para tomar conta da bebé, tendo-se procurado precaver a situação de perigo em que esta se encontrava através da institucionalização. Por via recursiva, a apelante procura amenizar o ocorrido, considerando que não é possível saber se o arranhão observado na menina teve ou não origem na contenda entre os pais. Ficou, todavia, claro que a criança foi envolvida de forma totalmente desnecessária e irresponsável na discussão entre o casal, não se podendo ter o contexto da contenda como irrelevante ou despiciendo. Nenhum dos pais, aliás, se opôs então à institucionalização. Procurou-se, em seguida, fomentar o contacto com os pais. Este foi ocorrendo ao longo de um período superior a dois anos, de forma mais ou menos esparsa, através de telefonemas para a instituição, de vídeo chamadas e de visitas, mais frequentes por parte da mãe que por parte do pai. Estando a criança doente e carecendo de cuidados médicos especiais, que requereram internamentos, a matéria fáctica é expressiva da incapacidade da mãe de serenar aquela - no facto 33 refere-se desde logo que a mãe causa instabilidade à filha e no facto 36 que a mãe fica exaltada ao ver o estado da mesma; recusa, porém, segundo o facto 39, apoio psicológico. Os factos provados reportam o consumo recorrente de bebidas alcoólicas pela mãe, sendo certo que no dia do incidente que despoletou a situação de proteção, quer o pai, quer a mãe se encontravam alcoolizados, num contexto de prematuridade e doença de uma bebé de dois meses. A própria recorrente não enjeita a sua má relação com o álcool (cf. facto n.º 63), já que se compromete a solicitar acompanhamento médico. O pai assume a sua incapacidade para fazer parte do projeto de vida da filha. Do mesmo passo, reporta sucessivamente condutas inapropriadas da mãe. Recondu-las aos hábitos de consumo excessivo de álcool daquela e ao interessar-se mais por sair com as amigas, para aquele efeito, do que a tomar conta da criança. Em defesa da sua incapacidade para estar com a filha, aduz ter que trabalhar, pelo que só socorrendo-se de terceiros - ama - poderia ter a seu cargo a filha. Insiste em que a única solução que entrevê consiste em que a menina vá viver com seus pais para a .... Numa primeira fase esta mudança poderia ter lugar logo que possível. Mais tarde, retarda-a no tempo, por os pais não deterem, por força de doença do pai, condições para tomarem conta da neta no imediato. A filha teria, pois, que permanecer mais alguns anos institucionalizada, para só depois ir para casa dos avós. O pai é descrito como trabalhando na construção civil, auferindo entre € 1 200, 00 e 1 300, 00 mensais, manter uma relação conflituosa com a progenitora e ter encontrado uma nova companheira. É apodítico que AA não é uma prioridade na sua vida. Escusado será dizer que a generalidade dos pais trabalha e delega, enquanto o faz, não tendo familiares ou amigos disponíveis para o efeito, os cuidados necessários a uma criança de tenra idade em terceiros - ama, creche, infantário, -, suportando o respetivo custo e buscando os apoios sociais disponíveis. Remeter para os pais, para daqui a alguns anos, uma solução de vida para AA, como é evidente, não consubstancia qualquer proposta que seja do interesse desta. Em consonância, aliás, com a sua postura ao longo dos anos de vida da filha, desinteressou-se do processo e não compareceu em tribunal quando para tal foi notificado. Do ponto de vista do contato com a mãe, os cerca de dois anos e meio de vida da AA descritos nos factos elencados retratam que esta não se quis abrigar com esta numa casa a tal destinada, como forma de se manter próxima da bebé e a assunção da sua incapacidade para tranquilizar a criança no contexto da doença. Muito cedo, muda da zona do ... para a ... e depois para a .... A alegação de que não pode visitar a filha mais amiúde por falta de transportes regulares, por ter que trabalhar ou por força da pandemia não é sustentada pelos factos. Apesar de esmiuçada esta questão de mudança para uma região razoavelmente longínqua do país, não resultou minimamente comprovado que tenha correspondido a uma qualquer vantagem substancial para a mãe - por motivos de trabalho, de aumento de remuneração, de fuga a violência por banda do pai -, que o tribunal possa entender. Do ponto de vista da AA, são repetidos os comportamentos evitativos, a preferência pelas educadoras da instituição que a acompanham por confronto com o interesse pela mãe, com fases em que não a reconhece e recusando aproximação. A mãe nunca a deixa de visitar por completo, mas chega a estar períodos superiores a três meses sem a ver. Veja-se que em 10-9-2020, a mãe envia e-mail ao CPCJ dando conta de que irá para Londres entre 10 e 14 de Setembro, que o CPCJ lhe envia e-mail em 1-10-2020 perguntando-lhe se já se encontra em Portugal. A mãe justifica faltas junto da sua entidade patronal com visitas à filha que não realizou (cf. ponto 190 dos factos provados). Em 30 de Julho de 2021, a progenitora afirmou à comissária da CPCJ ... que visitava a filha duas vezes por mês e que faziam videochamadas, sempre que possível, mantendo sempre contacto próximo com a filha (cf. ponto 121. dos factos provados), bem sabendo que tal não correspondia à verdade. Realça-se a visita de 24 de Junho de 2020, com visita subsequente a 15 de Outubro. Decorreram os meses de Julho, Agosto e Setembro sem uma única visita. E se há uma visita em 15 de Outubro, a seguinte ocorre em 11-12-2020. A progenitora, apesar de na visita de 11 de Dezembro de 2020 ter percebido que a filha não a reconhecia, apenas voltou a visitá-la uma vez por mês entre Janeiro de 2021 e Abril de 2021. Não se põe em dúvida as dificuldades inerentes à sobrevivência e à necessidade de trabalhar, aos constrangimentos às deslocações no âmbito da pandemia, mas o comportamento da mãe de AA não pode deixar de ser qualificado como de desinteresse, sendo consistentemente errático. Não está em causa qualquer juízo de censura pela censura, mas sim o procurar aquilatar da real possibilidade, e probabilidade, de BB acompanhar efetivamente a filha, já que não se pode considerar que o tenha feito de forma bastante para as necessidades de AA até ao momento. AA nasceu prematura, doente, com vários internamentos, está sinalizada para uma consulta de genética e não se vinculou à mãe, enquanto tal, nos primeiros anos de vida, como era suposto que o fizesse. É do melhor interesse da criança ir viver com a mãe, ficando previamente sujeita a um regime temporário a fim de aferir se essa vivência é viável num horizonte próximo? BB assevera pretender que a filha viva com ela, mas a sua conduta prévia não é de molde a convencer que reúne a consistência e a disposição de daquela cuidar, colocando-a como prioridade, conformando a vida pessoal, afetiva, laboral, residencial às necessidades daquela. Será razoável sujeitar AA a essa espera e a essa indefinição? A resposta afigura-se-nos que terá que ser negativa. A verdade é que pelo menos desde os dois meses de idade de AA que a mãe fez opções que conduziram a que nunca tenha existido vinculação entre mãe e filha. Optou por não ficar com AA numa casa abrigo. Não a acompanhou na doença. Mesmo invocando que a deslocação para a ... se teria ficado a dever à circunstância de aí poder recorrer à preciosa ajuda de um casal de amigos, a verdade é que nesse momento a filha não estava com ela. Diz ter ido para longe para se proteger do pai da menor, mas a realidade é que este acabou a mudar-se também para a .... A distância afetiva mais foi acentuada pela distância geográfica. BB poucas vezes parece querer aproximar-se da filha. Muitas outras não logra atingir a constância e a coerência que a maternidade de uma criança tão pequena e doente exige, ademais sem praticamente qualquer apoio, já que não se pode ter a expetativa - nem sequer tal seria aconselhável -, de que será a irmã FF a assumir papéis e desempenhos que lhe não cabem. Recorde-se que não existe contacto com os avós paternos, como não existe com qualquer membro da família materna, que se encontra no ..., com exceção da irmã FF. AA não conhece outra realidade praticamente desde o seu nascimento que não a vivência institucional - encontra-se acolhida desde os dois meses de idade. Entretanto, passaram-se quase três anos, permanece acolhida na instituição e não desenvolveu com os progenitores qualquer uma ligação afetiva, íntima e próxima. Nos meses de Maio, Julho e Agosto de 2021 a progenitora não fez qualquer visita à criança e nos meses de Setembro e Outubro de 2021 apenas fez uma visita; nos meses de Novembro de 2021 a Fevereiro de 2022 apenas fez duas visitas e em Março de 2022 voltou a não fazer quaisquer visitas; fez duas em Abril de 2022 e apenas uma em Maio de 2022, já após ter tido conhecimento. No mês de Junho de 2022, a progenitora visitou a criança por duas vezes e em Julho do mesmo ano, apenas uma; em Agosto e Setembro de 2022, até ao debate judicial, a progenitora realizou três visitas. Neste momento, há mais de três anos que AA não vive com os pais, mas num Centro de Acolhimento, tendo pernoitado com eles, desde que nasceu, durante menos de dois meses. Tal deve-se exclusivamente ao facto de aqueles nunca terem reunido condições para que estivessem juntos. A apelante entende que reúne condições para acolher de novo a filha, sem pôr em perigo a sua segurança e desenvolvimento. Não se pode secundar esta tese. Como se lê no voto de vencido do Conselheiro Oliveira Vasconcelos (in ac. do S.T.J. de 5-4-2018, proc. 17/14.8T8FAR.E1.S2, Rosa Ribeiro Coelho, consultável in http://www.dgsi.pt/): (…) o internamento no Centro de Acolhimento não pode ser uma solução definitiva. Não se pode esperar indefinidamente que as famílias biológicas se reestruturem. Tem que ser em tempo útil para a criança. Sendo que a personalidade da criança se constrói nos primeiros tempos de vida. Na verdade, o prolongar da ausência de uma relação familiar cria uma situação de risco grave para o menor. As instituições não substituem uma família. Uma instituição não é uma família. Por outro lado, o tempo de um menor não é o tempo de um adulto. (…) (…) precisa imediatamente de alguém que exerça convenientemente as funções parentais e lhe preste os adequados cuidados e afeto. (…) precisa já de uma família estruturada. Por isso, não se pode adiar a decisão sobre se deve retornar ao ambiente familiar dos pais ou de outrem ou deve ser entregue para adoção em ordem à sua integração numa família a ela candidata, com a precocidade e segurança possíveis, para que o investimento afetivo educacional se faça nas melhores condições. Ora infelizmente - e infelizmente tendo em conta todos os interesses em jogo - não é possível concluirmos que a situação se alterou desde que o AA deixou de conviver com a sua família biológica. Antes, tudo aponta para que a melhor solução para o AA é o corte definitivo das suas relações com essa família e o começar uma vida nova, com a oportunidade de ser criada no seio de uma outra família. Os factos acima enunciados indicam que o retorno do AA a “casa” faria com que ele voltasse à situação de carência passada que se pretende não seja obrigada novamente a sofrer. Não se trata aqui de avaliar a afetividade dos seus pais ou de outros parentes. Nem de questionar a primazia da filiação biológica, uma vez que é inquestionável que a solução ideal para o menor seria viver com os pais biológicos. Trata-se de averiguar se estes conseguiram, durante o tempo em que o seu filho esteve na instituição de acolhimento, reestruturar, modificar, a sua vida em termos de em tempo útil para o menor, o puderem acolher sem pôr em perigo a sua segurança, a sua saúde, a sua formação, a sua educação ou a sua formação. Infelizmente, como acima já se disse, os pais do AA não conseguiram organizar a sua vida em termos de a centrarem no acolhimento do menor, fazendo um esforço acrescido para criarem condições para tal. Mutatis mutandis, estas palavras podem ser aplicadas à situação de AA e de seus pais. A adoção, uma vez verificados os respetivos pressupostos, é uma forma constitucionalmente adequada de proteção dos interesses das crianças privadas de um ambiente familiar normal (art.º 69.º/2 da Constituição), sendo um instituto que a nossa Lei fundamental protege - art.º 36.º/7. A medida defendida pela recorrente equivaleria a protelar a situação, podendo comprometer a possibilidade de adoção. O tempo das crianças não é o dos adultos. AA tem neste momento três anos. Mantê-la institucionalizada por mais tempo é desnecessariamente cruel. * Por tudo o exposto, afigura-se-nos que o acórdão proferido não merece censura.* DispositivoNos termos sobreditos, julga-se a apelação improcedente, mantendo-se as medidas decretadas. * Sem custas, por delas o processo estar isento (art.º 4.º/2/f do Regulamento das Custas Processuais). * Porto, 14/12/2022 Teresa Fonseca Maria José Simões Augusto de Carvalho |