Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2424/22.4T8AGD-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: GERMANA FERREIRA LOPES
Descritores: DIREITO À PROVA
PRINCÍPIO DO ACESSO AO DIREITO A TUTELA JURISDICIONAL EFETIVA
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
Nº do Documento: RP202401152424/22.4T8AGD-A.P1
Data do Acordão: 01/15/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE QUANTO AO 1º RECURSO, REVOGAÇÃO DO DESPACHO INTERCALAR, COM ANULAÇÃO DOS ATOS SUBSEQUENTES
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - A prova ou o direito à prova constitui uma vertente do direito à ação e do direito de defesa, direitos esses que colhem proteção a nível constitucional (princípio do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva – artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa) e a nível infraconstitucional no Código de Processo Civil, através do princípio da ação e do contraditório (artigo 3.º, n.ºs 1, 2, 3 deste último diploma legal), sendo que o direito à prova emana da necessidade de se garantir ao cidadão a adequada participação no processo e de assegurar a capacidade de influenciar o contéudo da decisão.
II - O princípio do contraditório é hoje entendido como garantia da participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objeto da causa e em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão.
III – O direito à prova e o princípio do contraditório, ligados ao direito constitucional a um processo equitativo, estão ainda diretamente associados aos deveres de gestão processual e de cooperação para com as partes, também cometidos ao juiz, respetivamente pelos artigos 6.º e 7.º do Código de Processo Civil, não podendo ser criado um excessivo e desproporcionado obstáculo formal para produção de um meio de prova admitido.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação/Processo nº 2424/22.3T8AGD-A.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo do Trabalho de Águeda

Relatora: Germana Ferreira Lopes
1ª Adjunta: Rita Romeira
2º Adjunto: Nelson Nunes Fernandes

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I - RELATÓRIO
Recorrente: AA
Recorrida: A..., Lda.

Por requerimento (início de processo) de 27-10-2022, refª 43704669, assinado pelo ilustre Advogado BB, AA (Autor) apresentou formulário para impulsionar ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra A..., Lda. (Ré), manifestando oposição ao seu despedimento, que refere ter ocorrido em 26/09/2022, juntando cópia de decisão proferida em procedimento disciplinar que lhe foi instaurado [consigna-se que se designa o trabalhador por Autor, tendo em conta que é o mesmo que impulsiona o processo apresentando o formulário com vista a ver declarada a ilicitude ou irregularidade do seu despedimento e, por sua vez, designa-se a entidade empregadora por Ré, uma vez que a mesma, ainda que apresentando o primeiro articulado, contesta o impulso tendente à sobredita declaração]. Com tal requerimento não foi junta procuração.

Nessa sequência foi proferido o despacho refª citius 124213160 com o seguinte teor: “Antes de mais, e na medida em que o formulário foi apresentado através de requerimento subscrito por Advogado, notifique-o e o trabalhador para, em cinco dias, juntarem aos autos procuração forense e declaração de ratificação do processado (nºs 1 e 2 do art. 48º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho. Anote na capa a insira nos alarmes.”
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Notificada a Ré para apresentar articulado de motivação do despedimento, a mesma apresentou em 5-12-2022 tal articulado (refª 44066692), juntando o procedimento disciplinar que instaurou ao Autor e outra documentação. Alegou, em síntese, que o Autor praticou infração(ões) disciplinar(es) que determinaram a perda de confiança por parte da Ré no mesmo, o que motivou a instauração de procedimento disciplinar e no final justificou a aplicação da sanção disciplinar de despedimento;

Na sequência da apresentação do articulado motivador pela Ré, o Autor foi notificado para, no prazo de 15 dias, apresentar contestação, sob pena de se considerarem confessados os factos articulados pelo empregador, sendo logo proferida sentença a julgar a causa conforme for de direito. Na notificação expedida foi consignado que o prazo corria em férias, visto tratar-se de um processo urgente. Tal notificação foi remetida eletronicamente ao ilustre mandatário BB, com data de certificação citius de 7-12-2022 (notificação com a referência de documento 124843697).

Com data de certificação citius de 12-01-2023 (23:33:51 UTC 00:00 Europe/Lisbon) deu entrada o articulado de contestação do Autor, referência 44381406.
Em tal articulado, em primeira linha, foi suscitada a questão do justo impedimento no que respeita à apresentação do articulado de contestação-reconvenção, nos termos que se passam a transcrever:
“I – DO JUSTO IMPEDIMENTO:
1.º
O Autor foi notificado para contestar, referência citius n.º 437134074, expedida no dia 07/12/2022.
2.º
Sucede, porém que, desde o dia 22/12/2022, devido a doença de tal modo súbita, grave e prolongada, o ora Signatário esteve acamado, doente e absolutamente impossibilitado de se levantar, de pedir ajuda e avisar o constituinte da impossibilidade de não poder executar o mandato, o que, atenta a complexidade da causa e de já ter sido a sua pessoa a participar na audição de testemunhas no processo disciplinar, tal não era aconselhável, na legitima e integral defesa do seu constituinte, cfr. atestado médico que ora se junta como Doc. n.º 1-A e B, cujo teor se dá por integralmente reproduzida para todos os devidos e legais efeitos.
3.º
Entretanto, apesar de o signatário ainda se encontrar bastante doente, com fortes e intensas dores e apesar de vivamente aconselhado medicamente a permanecer retido no seu leito, por mais duas semanas, excecionalmente, conseguiu no dia de hoje preparar a defesa do seu constituinte Autor.
4.º
Estes factos supra descritos constituem justo impedimento para o signatário não poder entretanto apresentar a contestação, com Reconvenção, o qual, desde já se invoca para todos os devidos e legais efeitos.
Termos em que deve o presente pedido de
reconhecimento de justo impedimento ser
considerado procedente por provado e, em
consequência, ser admitida contestação, com
reconvenção ora deduzida, com as legais
consequências.
PROVA:
DOCUMENTAL: 1 documento.
TESTEMUNHAL:
• CC, casada, a apresentar;
• Dr. DD, médico ortopedista, a apresentar;
• EE, solteira, maior, a apresentar.”

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Em 11-01-2023 havia sido aberta conclusão com a referência 125295499, sendo que em 13-01-2023 foi proferido despacho referência 1245295513 com o seguinte teor:
Ao preparar-me para proferir sentença, verifico ter dado entrada contestação pelo Trabalhador, com invocação de justo impedimento para a prática do acto em tempo.
Como tal e antes de mais, notifique a Empregadora para, querendo, exercer no prazo de dez dias o contraditório quanto ao justo impedimento (segunda parte do nº 2 do art. 140º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho).”

Na sequência de tal despacho, a Ré foi notificada da junção da Contestação aos presentes autos e, bem assim, para, querendo, exercer no prazo de dez dias o contraditório quanto ao justo impedimento. Tal notificação foi remetida eletronicamente ao ilustre mandatário FF, com data de certificação citius de 16-01-2023 (notificação com a referência de documento 125401109).

A Ré apresentou em 25-01-2023 o requerimento referência 44510710 (14060160), pronunciando-se quanto ao justo impedimento invocado e, bem assim, quanto ao articulado de contestação-reconvenção.
No que respeita ao justo impedimento, a Ré concluiu que o justo impedimento invocado não pode ser admitido, impondo-se a rejeição da contestação junta aos autos, por manifestamente intempestiva, extemporânea e claramente ilegal, devendo ser ordenado o seu desentranhamento, em conformidade, o que requereu. Argumentou que não pode conformar-se com a justificação apresentada, referindo que a mesma se afigura claramente intempestiva, extemporânea e totalmente inverosímil, sendo que o atestado que foi junto, datado de 12/01/2023, não se revela prova suficiente de que o este esteve/estaria doente, quando faz referência a um período anterior (desde 22/12/2022). Referiu que a Ré coloca em crise a declaração do Sr. Médico quando atesta “por sua honra que BB (…) tem estado doente, com crise de ciática, desde 22/12/2022 (…)”, questionando como soube/confirmou o Médico o estado do seu paciente, em data retroactiva (desde 22/12/2022) – isto é, 21 dias antes da emissão do referido atestado. Sustentou que o atestado médico que declara a impossibilidade de exercício da profissão por parte do advogado/mandatário, sem esclarecer a gravidade da doença ou desacompanhado de outros meios de prova que demonstrem essa gravidade, não é suficiente para estabelecer o justo impedimento. Mais argumentou que o motivo de doença indicado pelo Exmo. Mandatário do Autor (dor ciática), não obstará a um esforço mental do mesmo para redacção da peça processual e muito menos o impedirá de contactar telefonicamente um dos Colegas de escritório para assegurar o prazo judicial em curso, sendo que da procuração que foi junta em 31/10/2022 (Requerimento com a Ref. Citius n.º 43728292), datada de 26/10/2022, resulta que o Autor AA constituiu seus bastantes procuradores, os Exmos. Srs. Drs. BB, GG, HH, II, JJ, EE e ainda as Advogadas Estagiárias, Dr.ª KK e Dr.ª CC. Nessa decorrência, concluiu que o Ilustre Mandatário do Autor não teria sequer de substabelecer em qualquer Colega, uma vez que a procuração já era conjunta (aliás com sete outros Ilustres Advogados do mesmo escritório), bastando que qualquer dos outros dos 7 (sete) Ilustres Mandatários a quem o Autor conferiu poderes, acautelasse o prazo judicial para Contestação.

Em 26-01-2023, a Ré apresentou novo requerimento referência 44528375 (14068128), referindo que o fazia em aditamento ao seu anterior requerimento de 25/01/2023 (Ref.ª Citius n.º 44510710) e por ainda estar em tempo para o efeito, no qual volta a pronunciar-se sobre a invocada situação de justo impedimento, no sentido da sua não verificação.

Com data de 27-01-2023, foi proferido o despacho referência citius 125606224 com o seguinte teor:
“Para inquirição das testemunhas arroladas pelo Trabalhador no tocante ao justo impedimento invocado designa-se o próximo dia 31.01.2023, pelas 09h15m, neste Tribunal (data já anteriormente agendada).
Notifique.”
A notificação determinada no identificado despacho foi cumprida por notificações eletrónicas expedidas aos ilustres Mandatários, Dr. BB e Dr. FF, com data de 27-01-2023.

Em 30-01-2023, a Ré apresentou novo requerimento referência 44548526 (14077787), referindo que o fazia ainda no exercício do contraditório, relativamente à notificação de 16/01/2023 (Ref.ª Citius n.º 125401109).
Foi realizada a diligência designada de inquirição de testemunhas, constando da respetiva ata (referência 125685813) o seguinte (teor que se transcreve):
“ATA DE INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS
Processo: 2424/22.3T8AGD
Ação Impugnação Jud. Regul. e Licitude do Despedimento
Trabalhador: AA
Empregadora: A..., Lda
125685813
*
DATA: 31 de janeiro de 2023. ------- HORA: 09:15 horas. ---
MAGISTRADO JUDICIAL: Dr. LL. ---
ESCRIVÃ AUXILIAR: MM. ---
PRESENTES:
- Mandatário do Trabalhador: Dr. BB; ---
- Mandatário da Empregadora: Dr. FF; ---
- Testemunhas:
- CC; ---
- EE; ---
**
*
----- A diligência foi iniciada pelo Sr. Juiz pelas 09:35H, uma vez que o Sr. Dr. BB apenas chegou neste momento. ---
----- Pedida a palavra pelo Ilustre Mandatário do Trabalhador, fez um requerimento, que se encontra gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, tendo o Sr. Juiz determinado que fosse transcrito para efeitos de ata (n.º 5 do art.º 155º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do n.º 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho): ---
----- Foi requerida a inquirição de três testemunhas, sendo uma delas o Dr. DD, médico que efetuou o acompanhamento clínico e que emitiu o atestado médico que foi junto aos autos. ---
----- Contudo, atendendo à proximidade entre a data de notificação do agendamento e do dia desta audiência, aquele não conseguiu desmarcar consultas médicas já previamente agendadas a realizar no Hospital ... no Porto, acrescendo que muitos dos pacientes que têm consulta agendada para a manhã de hoje são residentes das regiões do interior do país. ---
----- Face a tais fundamentos e considerando que o depoimento da indicada testemunha se afigura de enorme relevância para a matéria que se irá discutir hoje, e tendo aquele manifestado disponibilidade para ser ouvido através de telefone ou vídeo-chamada, nomeadamente Whatsapp, requer-se que a sua inquirição seja efetuada por essa via, ou, não sendo tal tecnicamente possível a este Tribunal, requer-se que seja designada nova data para inquirição daquele, caso o Tribunal entenda que este depoimento é relevante para a descoberta da verdade material. ---
----- Início da gravação do requerimento: 09:38:50 horas. ---
----- Fim da gravação do requerimento: 09:59:15 horas. ---
**
----- Dada a palavra ao Ilustre Mandatário da Empregadora, fez um requerimento que se encontra gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, tendo o Sr. Juiz determinado que fosse transcrito para efeitos de ata (n.º 5 do art.º 155º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho):
-------- A Ré, em face do requerimento apresentado pelo Ilustre colega, em resposta diz:
. primeiro, tendo em conta a natureza urgente do processo; ---
. segundo, considerando que o ónus da prova deste incidente impende sobre a
parte que o invoca e, por último, que esta testemunha é a apresentar nos termos
do próprio requerimento da prova a produzir neste incidente pela parte;
--- a Ré entende que deve ser liminarmente indeferido o requerido pelo Autor. ---
----- Início da gravação do requerimento: 09:38:50 horas. ---
----- Fim da gravação do requerimento: 09:59:15 horas. ---
---- De seguida e determinando que fosse transcrito para efeitos de ata (n.º 5 do art.º 155º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do n.º 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho), o Sr. Juiz proferiu o seguinte despacho, que se encontra gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal:
DESPACHO
----- Compreendendo embora as razões invocadas pelo Ilustre Mandatário do Trabalhador relativamente aos afazeres profissionais da testemunha DD e, bem ainda, a proximidade da data agendada para a inquirição das testemunhas, o certo é que nem os fundamentos invocados constituem justificação para a não presença da testemunha em Tribunal, nem a data de hoje foi fixada apenas no despacho que designou a diligência, por já anteriormente estar agendada para a realização da audiência de julgamento. ---
----- Por sua vez, a testemunha em causa, tratando-se de meio de prova indicado no requerimento apresentado e em que foi invocado o justo impedimento, trata-se de testemunha a apresentar. ---
----- Como tal e por tudo o exposto, indefere-se o requerido. ---
----- Notifique. ---
----- Início da gravação do despacho: 09:38:50 horas. ---
----- Fim da gravação do despacho: 09:59:15 horas. ---
*
----- De seguida, foram os presentes notificados do despacho que antecede, do qual disseram ficar ciente. ---
**
*
----- Neste momento foi pedida a palavra pelo Ilustre Mandatário da Empregadora, fez um requerimento, que se encontra gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, tendo o Sr. Juiz determinado que fosse transcrito para efeitos de ata (n.º 5 do art.º 155º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do n.º 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho): ---
----- A Ré, ao abrigo do disposto no n.º 1, al. a) do art. 1º do Código de Processo do Trabalho, conjugados com os arts 411º e 452º a 456º e ainda 604º n.º 3 al. a), estes últimos todos do Código de Processo Civil, vem requerer o depoimento de parte, indicando-se desde já a seguinte matéria alvo deste depoimento, nomeadamente o conteúdo do art. 2º da peça em que se exerce defesa do incidente de justo impedimento, mais concretamente no segmento: "....esteve acamado e absolutamente impossibilitado de se levantar, de pedir ajuda e avisar o constituinte da impossibilidade de não poder executar o mandato, o que, atenta a complexidade da causa e de já ter sido a sua pessoa a participar na audição de testemunhas no processo disciplinar, tal não era aconselhável, ...". ---
----- Assim, ao abrigo dos supracitados dispositivos legais, por se considerar essencial para a descoberta da verdade, assim se requer. ---
----- O requerido depoimento de parte, neste caso sendo a propósito de um incidente de justo impedimento da pessoa do Exmº Mandatário do Autor, traduz-se assim no depoimento do Ilustre Advogado. A Ré entende ainda que tal não contende com o dever de sigilo profissional, uma vez que tal depoimento só pode incidir em matéria já alegada no próprio incidente de justo impedimento. ---
----- Assim se requer. ---
----- Início da gravação do requerimento: 09:38:50 horas. ---
----- Fim da gravação do requerimento: 09:59:15 horas. ---
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----- Dada a palavra ao Ilustre Mandatário do Trabalhador que fez um requerimento, encontrando-se gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, tendo o Sr. Juiz determinado que fosse transcrito para efeitos de ata (n.º 5 do art.º 155º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do n.º 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho): ---
----- No que respeita à pretensão da Ré em ouvir em depoimento o Mandatário do Autor quanto à questão do justo impedimento, nomeadamente quanto à factualidade mencionada, a mesma deverá ser liminarmente indeferida porquanto tal pretensão viola de forma grosseira normas de natureza deontológica aplicáveis aos Advogados. ---
----- Por inúmeras vezes a Ordem dos Advogados já se pronunciou sobre tal questão, tendo concluído sempre da mesma forma, ou seja, o Advogado constituído num processo não pode em caso algum depor como testemunha, ainda que o Advogado viesse a substabelecer, renunciar ou visse revogado o mandato conferido pelo cliente, sendo posição unânime na interpretação da norma deontológica ouvir o Advogado como testemunha de todos os Conselhos Regionais da Ordem dos Advogados nos inúmeros pareceres que já emitiram sobre tal questão. ---
----- Início da gravação do requerimento: 09:59:29 horas. ---
----- Fim da gravação do requerimento: 10:21:26 horas. ---
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----- Seguidamente e determinando que fosse transcrito para efeitos de ata (n.º 5 do art.º 155º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do n.º 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho), o Sr. Juiz proferiu o seguinte despacho, que se encontra gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal:
DESPACHO
----- Compulsados os autos, verifica-se que a Empregadora, em face do requerimento a invocar o justo impedimento apresentado a 12-01-2023, exerceu o seu contraditório por requerimento de 25-01-2023, complementado pelo requerimento de 26-01-2023, a que se seguiu o despacho de 27-01-2023 a designar o dia de hoje para a produção da prova. ---
----- Ulteriormente, por requerimento de 30-01-2023, a Empregadora apresentou novo requerimento exercendo, uma vez mais, o contraditório em face do já referido invocado justo impedimento. ---
----- Pese embora o prazo para o exercício do contraditório e admitindo-se embora que o requerimento de 26-01-2023 haja constituído um complemento do requerimento apresentado no dia anterior, tal não legítima a parte a apresentar novo requerimento no dia de ontem, ainda que dentro do prazo supletivo pois que, repete-se, a diligência se encontrava já agendada, sob pena de desvirtuamento das regras processuais. ---
----- Como tal, não se admite o requerimento de 30-01-2023, determinando-se o respetivo desentranhamento e restituição à parte. ---
----- Custas do incidente a cargo da Empregadora fixando-se a taxa de justiça numa 1,5 UC (nºs 4 e 8 do art. 7º do Regulamento das Custas Processuais). ---
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----- Em nenhum dos requerimentos apresentados pela Empregadora no exercício do contraditório foi requerida a produção de qualquer meio de prova. ---
----- Como tal e por intempestivo, indefere-se o ora requerido. ---
----- Notifique. ---
----- Início da gravação do despacho: 09:59:29 horas. ---
----- Fim da gravação do despacho: 10:21:26 horas. ---
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----- De seguida, foram os presentes notificados do despacho que antecede, do qual disseram ficar ciente. ---
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Foi proferida decisão datada de 3-02-2023 (refª citius 125733490), decidindo o incidente de justo impedimento, nos seguintes termos que se transcrevem (refira-se apenas que as notas de rodapé, por uma questão de facilidade são incluídas no texto):
«Requerimento com a refª 14000676: Veio o Trabalhador AA, por articulado datado de 12.01.2023, requerer a admissão da contestação ao articulado motivador, por tempestiva em função de justo impedimento.
Alegou que o seu Ilustre Mandatário, Dr. BB (Dr. BB), esteve acometido de doença grave e prolongada, impossibilitando-o de se levantar, pedir ajuda e de o avisar da impossibilidade de executar o mandato.
Mais invocou ter sido o Sr. Advogado quem interveio na audição de testemunhas no processo disciplinar, sendo a causa complexa.
Conferido o contraditório, a Empregadora A..., Lda pronunciou-se no sentido da não verificação dos requisitos de que depende a afirmação de um justo impedimento.
Sustentou, muito em síntese, que o atestado médico junto pelo Trabalhador não esclarece a razão de ser fixada a data de início da doença em 22.12.2022; não indica qual a gravidade da invocada doença; do mesmo não resulta uma total impossibilidade de exercício do mandato; bem como que o Trabalhador outorgou procuração a diversos Srs. Advogados, não havendo sequer, por força da doença, necessidade de substabelecer em Colega.
Tendo o Trabalhador sido notificado do articulado motivador em 07.12.2022 e findando o prazo para contestar a 27.12.2022, pugnou pela extemporaneidade da contestação junta aos autos, devendo ser ordenado o respectivo desentranhamento e proferida sentença.
Procedeu-se à inquirição da prova testemunhal arrolada, com observância das formalidades legais, conforme consta a respectiva acta.
Com relevo para a decisão do incidente de justo impedimento encontra-se demonstrada a seguinte factualidade:
1. Por requerimento datado de 27.10.2022 o Trabalhador AA deu entrada de formulário legal, opondo-se ao despedimento promovido pela sua Empregadora A..., Lda em 21.09.2022 – cfr. docs. de fls. 3 e 4, que são dados por integralmente reproduzidos;
2. Com tal requerimento juntou procuração forense outorgada aos Srs. Drs. BB, GG, HH, II, JJ, Advogados, bem como às Srs. Dras. EE, KK e CC, Advogadas- estagiárias, todos com domicílio profissional da Rua ..., r/ch Direito, em Paços de Ferreira, conferindo a faculdade de substabelecer e os mais amplos poderes forenses em direito, incluindo para confessar, desistir e transigir – cfr. doc. de fls. 6 que se dá por integralmente reproduzido;
3. No dia 18.11.2022 foi realizada, no âmbito dos presentes autos, a audiência de partes, em que interveio na qualidade de Advogado do Trabalhador o Sr. Dr. GG;
4. Por requerimento de 05.12.2022 foi apresentado pela Empregadora o articulado motivador e junto aos autos o processo disciplinar;
5. No âmbito do processo disciplinar:
- por procuração datada de 13.06.2022 foi constituída Mandatária do Trabalhador a Sra. Dra. NN – cfr. doc. de fls. 128v, que se dá por integralmente reproduzido;
- por escrito datado de 14.06.2022 o Trabalhador apresentou resposta à nota de culpa, subscrita pela Sra. Dra. NN;
- por email de 09.08.2022, a Sra. Dra. NN declarou ao Sr. Advogado da Empregadora que “após várias conversações com o Colega em que irei substabelecer e de forma a conciliar ambas as agendas, o mesmo deu preferência ao dia 23 de agosto do presente ano para a respectiva produção de prova” – doc. de fls. 146, que se dá por integralmente reproduzido;
- em 23.08.2022 foi junto a esse processo disciplinar substabelecimento outorgado pela Sra. Dra. NN, substabelecendo, com reserva, nos Srs. Drs. BB, GG, HH, II, JJ, Advogados, bem como nas Sras. Dras. EE, KK, CC, Advogadas-estagiárias – cfr. docs. de fls. 146v e 147, que se dá como integralmente reproduzido;
- por email de 23.08.2022 o Sr. Advogado da Empregadora declarou ao Sr. Dr. BB que “conforme acordado, informamos o Distinto Colega que já enviámos os ficheiros áudio, referentes à inquirição das testemunhas arroladas no procedimento disciplinar, via we transfer” – cfr. doc. de fls. 147v., que se dá por integralmente reproduzido;
- por escrito datado de 24.08.2022 foi declarado pelo Sr. Advogado da Empregadora ao Sr. Dr. BB que “conforme acordado, remetemos vias originais da Acta das diligências probatórias ocorridas em 23/08/2022, no âmbito do procedimento disciplinar instaurado pela entidade patronal A..., LDA contra o trabalhador AA, solicitando-se ao colega que nos devolva uma das vias, rubricada e assinada, para este escritório, com a máxima brevidade possível” – cfr. doc. de fls. 148, que se dá por integralmente reproduzido;
- da acta das diligências probatórias realizadas no âmbito do processo disciplinar no dia 23.08.2022 consta como presente o Sr. Dr. BB – cfr. doc. de fls. 149 e ss., que se dá por integralmente reproduzido;
6. O articulado motivador foi notificado à Empregadora por notificação de 07.12.2022;
7. Por articulado datado de 12.01.2023 foi apresentada contestação pelo Trabalhador;
8. Por escrito datado de 12.01.2023, intitulado “atestado médico” e subscrito pelo Sr. Dr. DD foi declarado que “DD, licenciado em Medicina pela Universidade ... (…) atesta por sua honra que BB (…) tem estado doente, com crise ciática, desde 22/12/2022, pelo que tem estado incapacitado nas suas actividades do dia-a-dia, pelo período provável ainda de 2 semanas” – cfr. doc. junto com o requerimento com a refª 14000676, que se dá por integralmente reproduzido;
9. O Sr. Dr. BB, em data em concreto não apurada anterior a 24.12.2022, informou por telefone as Srs. Dras. CC e EE, na sequência de contactos destas, que estava doente, com dores e aconselhado por médico a ficar retido no leito;
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Com relevo para a decisão do presente incidente de justo impedimento, não se mostra demonstrada a seguinte factualidade:
a) O Sr. Dr. BB, desde 22.12.2022, esteve acamado e impossibilitado de se levantar;
b). Bem como de pedir ajuda e declarar ao Trabalhador que estaria impedido de exercer o mandato.
*
*
. Fundamentação da decisão da matéria de facto
Para a decisão da matéria de facto do incidente de justo impedimento, o Tribunal atendeu, desde logo, aos elementos constantes dos autos a fls. 3, 4, 6, 128v., 146 a 147v. e 149 e ss. no que concerne à factualidade constante dos pontos 1 a 5 e 7.
Quanto ao ponto 6, trata-se de matéria que resulta da análise do histórico do processo constante da plataforma Citius.
A matéria do ponto 8 foi dada como provada com base no documento junto pelo Trabalhador com o articulado de contestação.
A matéria do ponto 9 foi dada como provada com base nos depoimentos de CC e de EE, Advogadas-estagiárias que exercem funções no escritório do Ilustre Mandatário do Trabalhador, Dr. BB e que, neste ponto, estiveram entre si em consonância, relatando a factualidade de forma instintiva e objectiva, logrando dar ao Tribunal as explicações que lhes foram solicitadas e sendo tidas, como tal, por verosímeis.
Já no que se refere à matéria de facto dada como não provada, no que tange à al. a) e quanto à data, trata-se de matéria em relação à qual as testemunhas inquiridas não se revelaram bastantes, não logrando, com um mínimo de segurança, clarificar qual a data em que efectuaram os contactos telefónicos com o Sr. Advogado.
Por sua vez, não foi junto documento referente a episódio de urgência junto de instituição de saúde ou comprovativo de consulta médica anterior, bem como exame complementar de diagnóstico (nomeadamente de imagem, mais propriamente ressonância magnética, revelador da causa de compressão e estado do nervo ciático) em que o Sr. Médico se tivesse baseado e que, pela data da respectiva realização, permitissem revelar a data do início da crise ciática e compreender os termos da avaliação da sua provável duração.
E se quanto ao somatizado pelo Sr. Advogado as referidas testemunhas apenas conseguiram informar o que lhes foi relatado por telefone, também aqui por não foi junto meio de prova objectivo cujo teor revelasse quais os concretos sintomas revelados de molde.
Fazendo apelo às regras no normal acontecer, afigura-se estar ao alcance da parte a junção de documento referente a episódio de urgência, comprovativo de consulta médica anterior, exames médicos e mesmo de prescrições médicas (além do mais, de fármacos anti-inflamatórios, relaxantes e analgésicos) ou recibos da aquisição de medicamentos que permitissem concluir no sentido de o Sr. Advogado ter estado necessariamente acamado e impossibilitado de se levantar.
Pela mesma ordem de razões foi dada como não provada a matéria da al. b).
Neste segmento, e para além do já exarado, não pôde o Tribunal deixar de ponderar que pelo menos as duas testemunhas lograram entrar em contacto telefónico com o Sr. Advogado, não se afigurando, sem mais, coadunável com as regras da experiência comum que o Sr. Advogado não tivesse forma de contactar também com o Trabalhador, fosse por via telefónica, fosse por email, ou que, no limite, não conseguisse pedir a terceiro para encetar tal comunicação, ponderados os termos em que por norma os escritórios dos Srs. Advogados se organizam em períodos de férias judiciais e consideradas as consequências da não apresentação do articulado em tempo.
Como tal, a factualidade foi dada como não provada.
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. Do justo impedimento
O art. 146º do Código de Processo Civil na redacção anterior ao Decreto-lei nº 329-A/95 de 12 de Dezembro definia o justo impedimento como o “evento normalmente imprevisível, estranho à vontade da parte, que a impossibilite de praticar o acto, por si ou por mandatário”.
Para o Professor Doutor José Alberto dos Reis (1 - JOSÉ ALBERTO DOS REIS, Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 1945, pág. 70 e ss.; Ac. STJ 07.03.1995, BMJ 445, pág. 390 e ss.), para que houvesse uma situação justo impedimento era necessário o preenchimento de três pressupostos.
Em primeiro lugar, a verificação de evento não passível de previsão pela generalidade das pessoas medianamente capazes e diligentes.
Em segundo lugar, que fosse estranho à vontade da parte, sendo esta entendida tanto o sujeito processual como o seu mandatário, em termos de não poder desculpar-se com o dolo ou a negligência do mandatário nem com a culpa do funcionário do escritório. Por outro lado, era necessário que o interessado não tivesse agido com culpa, negligência ou imprudência, pois que, se tal acontecesse, o evento era-lhe imputável e não se podia considerar estranho à sua vontade.
Por fim, tinha de impossibilitar a parte de praticar o acto, por si ou mandatário, mesmo usando da devida diligência.
Caso o facto fosse previsível e a parte não se tivesse acautelado, teria sido imprevidente; se houvesse culpa da sua parte e o evento lhe fosse imputável a título de culpa, não era estranho à sua vontade.
Com a redacção introduzida pelo Decreto-lei nº 329-A/95 passou a considerar-se “justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do acto”, o que se manteve não obstante as alterações operadas pela Lei nº 41/2013 de 26 de Junho (art. 140º).
O acento tónico passou da previsibilidade para a censurabilidade, ou seja, há que averiguar se o facto obstaculizador da prática do acto é imputável à parte ou ao seu mandatário por ter tido culpa na sua produção: o impedimento é justo se não permitir, em absoluto, que o acto seja praticado a tempo, o que exclui a simples dificuldade de o levar a cabo (2. - JACINTO FERNANDES RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, volume I, 3ª edição, Lisboa, 1999, pág. 215; Ac. RC 06.05.2003, CJ, ano XXVIII, tomo III, pág. 11 e ss.)
Um evento previsível, caso não seja culposo, pode excluir a imputabilidade do atraso ou da omissão (3 - Ac. STJ 13.07.2000, BMJ, pág. 260 e ss..).
In casu, o Trabalhador sustenta ter havido justo impedimento por parte do seu Ilustre Mandatário, fundado em doença.
Alegou, na essência, que:
. o seu Ilustre Advogado esteve afectado de doença súbita, grave e prolongada, acamado
e impossibilitado de se levantar;
. padecendo de fortes e intensas dores, foi aconselhado a permanecer retido no seu leito;
. não ser aconselhável, por ter participado na inquirição de testemunhas no procedimento
disciplinar, pedir ajuda e avisar o Trabalhador, seu constituinte.
Apreciando, desde já se adianta não estarem reunidos os pressupostos de que depende a afirmação de um justo impedimento.
Em primeiro lugar, não se colocando em causa que o Sr. Advogado haja sido acometido de doença, o atestado médico junto aos autos apenas alude a uma incapacidade (seja quanto ao período antecedente, seja quanto ao subsequente) relativa ao exercício das actividades do dia-a-dia, (interpretadas como as actividades básicas habituais, costumeiras, frequentes, que constituem a rotina de todos os dias), não fazendo já referência à actividade profissional.
Ora, no que tange ao justo impedimento em caso de doença dos Srs. Advogados, vem-se entendendo maioritariamente ser necessário que a doença seja impeditiva (não bastando dificultar) do exercício da actividade profissional (4 - Ac. STJ 27.05.2010, www.dgsi.pt; Ac. RG 07.04.2011, www.dgsi.pt; Ac. RG 03.06.2013, www.dgsi.pt; Ac. RP 08.11.2017, www.dgsi.pt; Ac. RC 20.04.2018, www.dgsi.pt; Ac. RP 08.03.2021, www.dgsi.pt; Ac. STJ 13.07.2021, www.dgsi.pt).
De igual jeito, não esclarece o grau de gravidade da patologia, sendo que, como é do conhecimento comum, a crise ciática tem na sua base uma perturbação do nervo ciático, que tem origem na zona lombar e percorre a perna até ao pé, afectando a zona inferior do corpo. Podendo ter sintomatologia e assumir graus diversos, na falta de concretização (nomeadamente esclarecendo se envolveu lombalgia, rigidez da coluna, ou se impossibilitava a locomoção), não se pode inferir que a patologia retirasse ao Sr. Advogado as condições físicas para o exercício da sua actividade profissional e muito menos de estabelecer comunicações com terceiros (5 - Ac. RE 06.11.2018, www.dgsi.pt).
Importa não perder do horizonte que não se tratava de comparecer pessoalmente em diligência, envolvendo uma deslocação física, mas da apresentação de um articulado de contestação, necessariamente através de meios electrónicos (art. 144º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho e Portaria nº 280/2013 de 26 de Agosto), não estando provado e nada revelando que não reunisse as capacidades mínimas para o fazer.
De resto, cumpre notar que, não obstante no atestado médico se indicar um provável prazo de duas acrescidas semanas de incapacidade, o Sr. Advogado apresentou a contestação no dia 12.01.2023, acabando por embater com o prognóstico médico desse mesmo dia.
Em segundo lugar, verifica-se que a procuração constante dos autos foi outorgada pelo Trabalhador a sete outros Srs. Advogados do mesmo escritório (fls. 6), que assim e para além do Ilustre Advogado, foram constituídos Mandatários (art. 43º do Código de Processo Civil e art. 1157º e ss. do Código Civil), sendo que a procuração conjunta, por essência, tem por escopo fazer face a situações de impedimento de um dos mandatários.
Mas mesmo que tivesse ficado provado que o Sr. Advogado esteve acamado e impossibilitado de se levantar desde 22.12.2022, ainda assim não se antolharia, à luz de um critério de diligência mediana, razão para que não houvesse pronta comunicação, fosse por que forma fosse, a algum ou alguns desses Srs. Advogados.
Ainda que nesse mesmo dia se tivesse iniciado o período de férias judiciais (art. 28º da Lei nº 62/2013 de 26 de Agosto), o certo é que presente processo tem natureza urgente (al. a) do nº 1 do art. 26º do Código de Processo do Trabalho), não se suspendendo os respectivos em período de férias judiciais (nº 1 do art. 138º do Código de Processo Civil).
Tendo o articulado motivador sido apresentado em 05.12.2022 e notificado em 07.12.2022, sendo de quinze dias o prazo para contestar (nº 1 do art. 98º-L do Código de Processo do Trabalho), o seu termo era já próximo dessa data, em 27.12.2022 (nº 1 do art. 248º do Código de Processo Civil, aplicável por força do art. 23º do Código de Processo do Trabalho).
Neste contexto, consideradas as graves consequências processuais da não apresentação tempestiva da contestação para o seu constituinte (nº 2 do art. 98º-L do Código de Processo do Trabalho), tudo era de molde a que fosse feita uma pronta comunicação a outro ou outros dos mandatários a fim de logo intervirem por forma a assegurar a apresentação do articulado, ou, pelo menos, de os precaver dessa possibilidade (6 - 6 Ac. RP 09.10.2018, www.dgsi.pt; Ac. RP 22.11.2016, www.dgsi.pt; Ac. RG 13.07.2022, www.dgsi.pt; numa análise à luz da Lei Fundamental, vide Ac. TC nº 178/2014, www.tribunalconstitucional.pt).
Não ignora o Tribunal ter sido invocada a complexidade da causa e a intervenção anterior em sede de procedimento disciplinar, o que se interpreta como tendo em vista concluir que seria inviável o exercício do patrocínio por outro colega.
E reconhece-se que a impugnação de despedimento, pela sensibilidade da matéria e pelos contornos por vezes não bem definidos das razões do despedimento, pode envolver uma complexidade que vem de momento anterior, radicada já no próprio procedimento disciplinar.
O que não se vislumbra é já uma inviabilidade de patrocínio por outro Advogado.
Desde logo e conforme referido, a procuração outorgada foi conjunta, termos em que poderia intervir qualquer dos Mandatários.
Aliás, já em momento anterior interveio nos autos outro Advogado, o Sr. Dr. GG, que esteve presente na audiência de partes (fls. 9 e 10), o que, por natureza, pressupõe o conhecimento e domínio do processo por forma a exercer o mandato (7 - 7 Ac. RP 30.01.2013, www.dgsi.pt).
Acresce que, considerada a já referida proximidade do terminus do prazo para contestar, por apelo às regras da normalidade, tudo permitia que o Sr. Advogado tivesse preparado os termos para apresentação da contestação e deste modo enviar os elementos ao Colega.
E mesmo que o não tivesse, pelo menos estaria ao seu alcance transmitir as indicações necessárias para a elaboração da contestação, não sendo impeditivo o facto de ter sido o próprio a estar presente na inquirição das testemunhas.
De facto, não apenas tinha já sido apresentada a resposta à nota de culpa em sede de processo disciplinar, como a prova produzida se encontrava gravada e lhe tinham sido enviados os respectivos registos áudio.
Em última instância, sempre poderia o Ilustre Advogado comunicar com o Trabalhador seu mandante por forma a permitir-lhe, em tempo, escolher e mandatar outro causídico por forma exercer processualmente os seus direitos (8 - Ac. RG 23.06.2004, www.dgsi.pt; Ac. RP 15.10.2012, www.dgsi.pt; Ac. RE 24.09.2020, www.dgsi.pt.).
Neste sentido o Tribunal Constitucional (9 - Ac. TC 380/1996, www.tribunalconstitucional.pt) já entendeu que “entender que não há justo impedimento, quando o advogado constituído, que adoeceu no decurso do prazo para apresentar uma alegação e que, por via disso, fica impedido de sair de casa, mas não de comunicar com o seu constituinte ou com qualquer outro dos advogados também por este constituídos para o representarem no processo que esteja em condições de fazer a alegação, não conduz, de facto, a privar a parte da assistência de advogado de sua escolha, nem tão-pouco a tornar particularmente onerosa a defesa dos seus direitos. Até porque, sendo o direito de acesso aos tribunais um direito a uma decisão judicial, ditada por um tribunal imparcial e independente num processo justo e leal que decorra sem dilações indevidas, uma tal interpretação do artigo 146º, nº 1, do Código de Processo Civil mostra-se adequada ao desiderato da obtenção de uma tutela judicial efectiva em prazo razoável”.
E nem se diga que a parte ficaria privada da assistência de Advogado de sua escolha.
Isto porque, desde logo, o Trabalhador já anteriormente tinha outorgado procuração a uma Sra. Advogada em sede de procedimento disciplinar – Dra. NN –, que substabeleceu no Sr. Advogado e com reserva, não ficando o respectivo mandato excluído e, como tal, não cessando o contrato de mandato (nº 3 do art. 44º, interpretado a contario sensu, do Código de Processo Civil).
De resto, conforme decidiu o Tribunal da Relação de Lisboa (10 - 10 Ac. RL 09.03.2010, www.dgsi.pt), “ninguém é insubstituível, nem a lei permite a derrogação de qualquer prazo peremptório à espera que um mandatário da parte se restabeleça para que o processo prossiga os seus termos. O acto é da parte, o advogado é apenas representante desta. (…)
O processo não pode ficar indefinidamente parado à espera que o mandatário impedido, por doença, se restabeleça, o que poderia demorar meses ou mesmo anos, com manifesto prejuízo para a justiça e os interesses dos cidadãos envolvidos no respectivo processo e, consequentemente, para a segurança da ordem jurídica globalmente considerada, protelando indefinidamente o trânsito em julgado das decisões proferidas ou ressuscitando causas pressupostamente há muito transitadas em julgado.
Assim e por todo o exposto, por censurável e não se verificar uma situação de justo impedimento, julga-se o acto praticado fora do prazo, termos em que não se admite, por intempestiva, a contestação apresentada, determinando-se o respectivo desentranhamento e restituição ao apresentante (nº 3 do art. 139º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º e nº 1 do art. 98º-L, ambos do Código de Processo do Trabalho).
*
Custas do incidente a cargo do Trabalhador, fixando-se a taxa de justiça em três UC (n.os 1 e 2 do art. 527º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho e n.os 4 e 8 do art. 7º do Regulamento das Custas Processuais).».

Nessa mesma identificada decisão, foi proferida sentença no pressuposto de o Autor não ter deduzido, tempestivamente, contestação, julgando confessada a factualidade alegada pela empregadora nos termos do n.º 2 do artigo 98.º-L do Código de Processo do Trabalho e concluindo à luz da alínea f) do n.º 1 do artigo 128.º, e do n.º 1 e da alínea e) do n.º 2 do artigo 351º, todos do Código doTrabalho, pela licitude e regularidade do despedimento, nos moldes alegados pela Empregadora.
Nessa sentença consta, em sede de saneamento, o seguinte:
«O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo não enferma de nulidades que o invalidem totalmente.
As partes dispõem de personalidade e capacidades judiciárias, sendo legítimas e estando devidamente representadas.
Não há outras nulidades, excepções ou questões prévias a apreciar.»
Tal sentença conclui nos termos do seguinte segmento decisório:
«Por todo o exposto, julga-se a presente acção improcedente, aderindo, nos termos da segunda parte do nº 2 do art. 57º do Código de Processo do Trabalho, ao alegado pela Empregadora A..., Lda e face ao disposto na al. f) do nº 1 do art. 128º e na al. e) do nº 2 do art. 351º, todos do Código do Trabalho, considerando-se lícito e regular o despedimento do Trabalhador AA, sendo a Empregadora absolvida do pedido formulado pelo Trabalhador.
*
*
Custas a cargo do Trabalhador (n.os 1 e 2 do art. 527º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho).
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Fixa-se à presente acção, à falta de outros elementos para o efeito, o valor processual de € 2.000,00 (nº 2 do art. 98º-P do Código de Processo do Trabalho).
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*
Registe e notifique (art. 24º do Código de Processo do Trabalho).»

Em 15-02-2023 (refª 44744370/14168786), o Autor interpôs o primeiro recurso de apelação que incidiu sobre a decisão proferida no dia 31-01-2023 em ata de inquirição de testemunhasato respeitante à produção de prova para apreciação do justo impedimento invocado para apresentar a contestação do Autor ao articulado motivador do despedimento para além do prazo legal -, que indeferiu a requerida designação de nova data para audição da testemunha Dr. DD, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem:
“1) Conforme resulta da ata da sessão de julgamento realizada no dia 31/01/2023, o tribunal a quo decidiu NÃO ouvir a testemunha médico Dr. DD, a propósito do invocado Justo Impedimento alegado pelo Mandatário do Autor, cfr. despacho que se transcreve:
“… Compreendendo embora as razões invocadas pelo Ilustre Mandatário do Trabalhador relativamente aos afazeres profissionais da testemunha DD e, bem ainda, a proximidade da data agendada para a inquirição das testemunhas, o certo é que nem os fundamentos invocados constituem justificação para a não presença da testemunha em Tribunal, nem a data de hoje foi fixada apenas no despacho que designou a diligência, por já anteriormente estar agendada para a realização da audiência de julgamento. ---
----- Por sua vez, a testemunha em causa, tratando-se de meio de prova indicado no requerimento apresentado e em que foi invocado o justo impedimento, trata-se de testemunha a apresentar. ---
----- Como tal e por tudo o exposto, indefere-se o requerido. ---
----- Notifique.”.
2) No que concerne à audição a testemunha, resulta do requerimento do Mandatário da parte os seguintes factos indesmentíveis, a saber:
• Foi o médico ortopedista, Dr. DD, que subscreveu o relatório médico junto aos autos a sustentar o justo impedimento;
• A testemunha foi arrolada a apresentar;
• A data da audiência de discussão e julgamento da impugnação da licitude do
despedimento do Autor foi designada no dia 18/11/2022 para o dia 31/01/2023
• A data da audiência de discussão e julgamento do incidente de Justo impedimento foi designada no dia 27/01/2023;
• A sua audição revele-se fundamental para apurar a verdade material
controvertida quanto ao justo impedimento alegado;
• A parte requereu que a testemunha fosse ouvida no próprio dia da diligência,
através de telefone ou vídeo-chamada, nomeadamente, wathsup;
• Ou, caso não fosse tecnicamente viável ao tribunal, se agendasse nova data para a sua inquirição.
3) O Tribunal violou o prazo para agendamento da audiência de discussão e julgamento do incidente – art.º 598.º “a contrario senso” do CPC;
4) Assim, tendo a testemunha em referência conhecimento direto dos factos, seria até de aplicar ao caso a norma especial do art. 526º, do CPC que exige que a inquirição oficiosa da testemunha quando: a) possa ser inquirida como testemunha; b) e que, tenha conhecimento de factos importantes;
5) Sem esquecer o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 21/10/19, nº 18884/18.4T8PRT-A.P1, disponível em www.direitoemdia.pt: “(…) III - O art. 526º, do CPC, materializando aquele princípio, visa salvaguardar a possibilidade de se inquirir uma pessoa sobre quem se gerou a convicção de o seu depoimento se revelar importante para a boa decisão da causa, por dos autos (dos articulados da causa ou de qualquer meio de prova produzido ao longo do processo e não, meramente, em audiência de julgamento) decorrer a presunção de conhecer os factos em discussão, impondo-se, nesse caso, ao juiz que ordene a sua notificação para depor. IV – Tal imposição é independente e autónoma da posição que as partes tenham tomado quanto à seleção de meios de prova e da possibilidade, que tenha havido, de indicação do concreto meio em causa, bastando que objetivamente se revele necessário à realização dos referidos fins. V - A inobservância do inquisitório, a gerar nulidade processual, nos termos gerais do nº1, do art. 195º, do CPC - porquanto consiste na omissão de um ato que a lei prescreve e a irregularidade cometida pode influir no exame ou na decisão da causa –, pode, validamente, ser suscitada no recurso da decisão interlocutória de não audição, apelação autónoma e imediata da decisão de rejeição de meio de prova (al. d), do nº2, do art. 644º, do CPC).”;
6) Como tal, em face destes factos incontornáveis tem plena aplicação ao caso, SEM SEQUER SE SOCORRER AO PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO, o decidido pelo Acórdão o Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 12/03/2019, disponível in www.dgsi.pt, nos termos do qual: “I. À luz do CPC-2013, e ao contrário do que anteriormente sucedia, a regra é a de as testemunhas serem apresentadas pela parte que as arrola, só sendo notificadas pelo tribunal quando, com a apresentação do rol, haja pedido nesse sentido. II. As normas do CPC que permitem o adiamento da inquirição de testemunha ou a sua substituição aplicam-se independentemente da forma como a testemunha é chamada a juízo (apresentada pela parte ou notificada pelo tribunal)”;
7) E pode ler-se na fundamentação de tal aresto que se transcreve: “….Com efeito, nos termos do disposto no citado n.º 3, al. b) (art.º 508.º do CPC – intercalamos nós), no caso de a parte não prescindir de alguma testemunha faltosa, se a impossibilidade for meramente temporária ou a testemunha tiver mudado de residência depois de oferecida, bem como se não tiver sido notificada, devendo tê‐lo sido, ou se deixar de comparecer por outro impedimento legítimo, a parte pode substituí‐la ou requerer o adiamento da inquirição pelo prazo que se afigure indispensável, nunca excedente a 30 dias. Assim será, seja uma testemunha que o tribunal tenha notificado ou devesse ter notificado, seja uma testemunha cuja apresentação estivesse a cargo da parte, pois a lei não distingue (ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus), e sobre todas as testemunhas, independentemente do tipo de chamamento a juízo, impende o dever de colaborar na descoberta da verdade (um dos contrapontos do direito a uma tutela jurisdicional efetiva).”;
8) E para esta problemática há que considerar também o vertido no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 26/09/2019, disponível no mesmo sítio: “(…) V - O direito à prova não pode ser esgrimido contra toda e qualquer falta das partes a respeito da apresentação dos meios de prova, em rota de colisão com princípios estruturantes do processo civil, como o dispositivo, a igualdade das partes, a independência do tribunal e a imparcialidade do juiz (artigos 20.º e 62.º da CRP).”.
9) Pelo exposto, atentos os fundamentos supra, deve ser revogado o despacho sob censura e substituído por um outro que admita o depoimento da testemunha DD, para efeitos de tomada de decisão no incidente sob censura.
10) O despacho a quo ofendeu, assim, entre outros, o disposto nos artigos os artigos 411.º; 508.º, n.º 3, alínea b); 526.º; 598.º todos do Código Processo Civil e art.ºs 2.º; 3.º; 13.º; 18.º; 20.º e 29.º da CRP.
Termos em que se requer a revogação do douto despacho sob censura, nas duas partes recorridas, de modo a que seja feita inteira e sã justiça!!!”

Em 20-02-2023, o Autor apresentou o requerimento referência 44785270 (14186499) com o seguinte teor:
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A Ré apresentou em 2-03-2023 resposta (44881087/142333049) ao primeiro recurso apresentado pelo Autor (atrás identificado), formulando as seguintes CONCLUSÕES, que igualmente se transcrevem:
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TERMOS EM QUE, POR TUDO EXPOSTO E SEM NECESSIDADE DE MAIS AMPLAS CONSIDERAÇÕES, SEMPRE COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, NÃO DEVE SER DADO QUALQUER PROVIMENTO AO RECURSO APRESENTADO PELO RECORRENTE, DEVENDO AO MESMO SER ATRIBUÍDO EFEITO MERAMENTE DEVOLUTIVO, CONFIRMANDO-SE IN TOTUM A DECISÃO DO TRIBUNAL AD QUO, POR SER A MESMA RESULTADO DE UMA APRECIAÇÃO EXÍMIA DOS FACTOS E DO DIREITO APLICÁVEL.
ASSIM SE FAZENDO A TÃO HABITUAL E ACOSTUMADA JUSTIÇA!”

Em 2-03-2023, a Ré apresentou o requerimento referência 44889787 (14235049), referindo que o fazia ao abrigo do direito ao contraditório que lhe assiste perante o supra identificado requerimento do Autor referência 44785270). O requerimento da Ré tem o seguinte teor (que se transcreve):
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Com data de 7-03-2023 foi proferida a decisão referência citius 126281604, com o teor que se transcreve:
“Requerimento com a refª 14186499: Veio Trabalhador AA invocar a nulidade do mandato conferido pela Empregadora A..., Lda, na medida em que a procuração por que foi outorgado apenas se mostra assinada por dois gerentes, determinando a nulidade de todo o processado.
Exercendo o contraditório, a Empregadora pronunciou-se no sentido da não verificação da invocada nulidade processual, tratando-se, quando muito, de excepção dilatória suprível, que sempre não acarretai a nulidade de todo o processado.
Independentemente da análise dos fundamentos invocados e respectivo enquadramento dogmático, o que se verifica no caso dos autos é ter já sido proferida sentença que conheceu do mérito da causa, julgando a acção improcedente (fls. 283v. e ss.).
Dado que, proferida a sentença, se esgota o poder jurisdicional deste Tribunal, apenas podendo ser modificada em sede de recurso se admissível (nº 1 do art. 613º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho e art. 77º deste último diploma legal) – como sucede in casu (al. a) do art. 79º do Código de Processo do Trabalho) –, nada tem o Tribunal a determinar.
*
Custas do incidente, por patente e manifestamente anómalo, a cargo do Trabalhador, fixando-s a taxa de justiça em duas UC (n.os 4 e 8 do art. 7º do Regulamento das Custas Processuais).
*
Requerimento com a refª 14168786: Por legal, tempestivo e interposto por quem tem legitimidade e interesse em agir (arts. 629º e 631º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho, assim como da al. a) do art. 79º, al. d) do nº 2 do art. 79º-A, nº 2 do art. 80º e do art. 81º do Código de Processo do Trabalho), admito o recurso interposto do despacho de fls. 279 e ss., que é de apelação, a subir em separado e com efeito meramente devolutivo (nº 1 do art. 82º, art. 83º e nº 2 do art. 83º-A do Código de Processo do Trabalho).
*
Extraia certidão de todos os articulados e requerimentos apresentados, bem como da sentença proferida, a fim de instruir o recurso.”

No dia 8-03-2023, o Autor apresentou o requerimento referência 14265214 (44947479), invocando que no dia de ontem, apesar das inúmeras tentativas efetuadas, não conseguiu efetuar o envio da peça processual através da plataforma, em virtude de erro com origem na própria plataforma, e requerendo que não seja tributado o envio da peça processual nesse dia por se julgar verificado o justo impedimento alegado. Juntou dois documentos e arrolou prova testemunhal.

Em 8-03-2023 (refª 44926765/14265215), o Autor (procedendo ao pagamento da multa do 1º dia útil seguinte) interpôs o segundo recurso de apelação, que incide sobre a decisão proferida em 6-02-2023 que apreciou o requerimento de justo impedimento apresentado, em consequência da qual depois considerou intempestiva a apresentação da contestação ao articulado motivador do despedimento passando a proferir sentença, nos termos do artigo 98.º-L, n.º 2, do Código de Processo de Trabalho.
O Autor formulou as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem:
………………………………
………………………………
………………………………
Termos em que se requer a revogação da douta
sentença sob censura de modo que, seja feita
inteira e sã justiça!!!”
A Ré apresentou em 23-03-2023 resposta (45104206/14342015) ao segundo recurso apresentado pelo Autor (atrás identificado), formulando as seguintes CONCLUSÕES, que igualmente se transcrevem:
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TERMOS EM QUE, POR TUDO EXPOSTO E SEM NECESSIDADE DE MAIS AMPLAS CONSIDERAÇÕES, SEMPRE COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, NÃO DEVE SER DADO QUALQUER PROVIMENTO AO RECURSO APRESENTADO PELO RECORRENTE, DEVENDO AO MESMO SER ATRIBUÍDO EFEITO MERAMENTE DEVOLUTIVO, CONFIRMANDO-SE IN TOTUM A DECISÃO DO TRIBUNAL AD QUO, POR SER A MESMA RESULTADO DE UMA APRECIAÇÃO EXÍMIA DOS FACTOS E DO DIREITO APLICÁVEL.
ASSIM SE FAZENDO A TÃO HABITUAL E ACOSTUMADA JUSTIÇA!”

Em 29-03-2023 (refª 45166325/14371937), o Autor interpôs o terceiro recurso de apelação que incidiu sobre a decisão proferida no dia 7-03-2023 referência 126281604 que entendeu ter-se esgotado o poder jurisdicional do tribunal com a prolação da sentença, não podendo conhecer da questão suscitada pelo Autor, arguindo a nulidade/falta de mandato forense do ilustre mandatário da Ré, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem:
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………………………………
………………………………
A Ré apresentou em 13-04-2023 resposta (45281756/14430466) ao terceiro recurso apresentado pelo Autor (atrás identificado), formulando as seguintes CONCLUSÕES, que igualmente se transcrevem:
………………………………
………………………………
………………………………
TERMOS EM QUE, POR TUDO EXPOSTO E SEM NECESSIDADE DE MAIS AMPLAS CONSIDERAÇÕES, SEMPRE COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, NÃO DEVE SER DADO QUALQUER PROVIMENTO AO RECURSO APRESENTADO PELO RECORRENTE, DEVENDO AO MESMO SER ATRIBUÍDO EFEITO MERAMENTE DEVOLUTIVO, CONFIRMANDO-SE IN TOTUM A DECISÃO DO TRIBUNAL AD QUO, POR SER A MESMA RESULTADO DE UMA APRECIAÇÃO EXÍMIA DOS FACTOS E DO DIREITO APLICÁVEL. ASSIM SE FAZENDO A TÃO HABITUAL E ACOSTUMADA JUSTIÇA!”

O Autor apresentou em 18-04-2023 o requerimento com a referência citius 14451242 (45323936), nos termos do qual informou o pagamento da multa de acordo com a guia anexa notificada e, bem assim, requereu o seguinte (que se transcreve):
“2. Pelo que requer, a admissão do recurso interposto, quanto à nulidade decorrente da falta de mandato da Ré e à sentença sobre o justo impedimento, com apreciação da matéria de facto.
3. Atenta a conclusão XI. do recurso interposto referência externa citius nº 44926765, expedido em 08/03/2023, pese embora o tribunal a quo já se tenha pronunciado sobre a invocada nulidade por falta de mandato da Ré, e o Autor já tinha interposto recurso do respetivo despacho, cfr. referência externa citius nº 14371837, expedido em 29/03/2023, ao qual a Ré já respondeu, referência citius nº 14430466, expedido em 13/04/2023, esclarece que mantém interesse na apreciação conjunta, em sede de recurso, a admitir, da matéria alegada quanto à invocada nulidade por falta de mandato, conclusões II. a XI. – art.ºs 631.º, n.º 1, alínea a) e 645.º do CPC.
Pede a V. Exa. deferimento,”

Em 20-04-2023, foi proferido o despacho referência citius 127027375 com o seguinte teor:
“Requerimento com a refª 14451242: Visto.
*
*
Requerimento com a refª 14265215: Antes de mais e de molde a sanar eventuais dúvidas, notifique o Ilustre Mandatário do Trabalhador para, em cinco dias, clarificar se com o requerimento apresentado pretende interpor recurso da sentença que julgou improcedente o incidente de justo impedimento suscitado, assim como interpor recurso da sentença proferida na mesma data e que julgou a acção improcedente, ou só daquela primeira.
*
*
Requerimento com a refª 14371937: Apreciar oportunamente, após pronúncia da parte na sequência do despacho que antecede.”

Em cumprimento de tal despacho foi expedida notificação em 21-04-2023 (127083075) ao Ilustre Mandatário do Autor, nada tendo sido dito.

Foi proferido novo despacho em 17-05-2023 (refª 127411218) com o seguinte teor:
Renovo o despacho que antecede, sendo que, nada informando no lapso temporal concedido, se entenderá que o requerimento de interposição do recurso tem por objecto apenas a decisão que julgou improcedente o invocado justo impedimento.”

Em cumprimento de tal despacho foi expedida nova notificação no dia 18-05-2023 ao Ilustre Mandatário do Autor, nada tendo sido dito.

Com data de 7-06-2023 foi proferido o despacho com a referência citius 127799487 com o seguinte teor:
“Requerimento com a refª 14265215: Por legal, tempestivo e interposto por quem tem legitimidade e interesse em agir (arts. 629º e 631º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho, assim como da al. a) do art. 79º, al. d) do nº 2 do art. 79º-A, n.os 2 e 3 do art. 80º e do art. 81º do Código de Processo do Trabalho), admito o recurso interposto da decisão de fls. 279 e ss. referente à não verificação de justo impedimento, que é de apelação, a subir em separado e com efeito meramente devolutivo (nº 1 do art. 82º, art. 83º e nº 2 do art. 83º-A do Código de Processo do Trabalho).
*
*
Requerimento com a refª 14371937: Por legal, tempestivo e interposto por quem tem legitimidade e interesse em agir (arts. 629º e 631º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho, assim como da al. a) do art. 79º, al. j) do nº 2 do art. 79º-A, nº 3 do art. 80º e do art. 81º do Código de Processo do Trabalho), admito o recurso interposto do despacho de fls. 292, que é de apelação, a subir em separado e com efeito meramente devolutivo (nº 1 do art. 82º, art. 83º e nº 2 do art. 83º-A do Código de Processo do Trabalho).
*
*
Venerandos Juízes Desembargadores
do Tribunal da Relação do Porto
*
*
Pese embora a argumentação do Recorrente, não vislumbramos que ao mesmo assista razão relativamente às nulidades invocadas.
Vossas Excelências, porém, farão a acostumada Justiça.
*
*
Extraia certidão de todos o processado a fim de instruir os recursos (nº 3 do art. 645.º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho).”

Por despacho proferido em 23-06-2023, foi determinado que, em face do disposto no n.º 3 do artigo 645.º do Código de Processo Civil, aplicável por força da alínea a) do n.º 2 do art. 1.º do Código de Processo do Trabalho, fossem organizados num único apenso os recursos de apelação a que se reportavam os apensos A, B e C, após o que o recurso devia subir a este Tribunal ad quem.
Foi cumprido tal despacho, organizando-se num único apenso, o presente processo 2424/23.3T8AGD-A.P1, os três recursos de apelação em separado.

O Exmº Srº Procurador-Geral-Adjunto junto deste Tribunal de recurso emitiu o parecer a que alude o artigo 87º, nº 3, do CPT, pronunciando-se como se segue (transcrição):
«1. Neste processo n.º 2424/22.3T8AGD-A.P1, em que é A., AA e Ré A..., Lda., a fls. …, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente considerando lícito e regular o despedimento do Autor. Considerou ainda que não se verifica a situação de justo impedimento invocado pelo Autor/mandatário, julgou o acto praticado fora de prazo, não admitiu a contestação apresentada ordenando o seu desentranhamento e restituição ao apresentante.
2. O Autor interpôs o presente recurso juntando alegação e formulando conclusões que aqui se dão por reproduzidas, impugnando a decisão sobre o “justo impedimento”, sobre a irregularidade do mandato por a Procuração não estar assinada por um dos sócios-gerentes, ao qual a Ré respondeu.
3. Foi dada vista ao Ministério Público para emitir parecer*, nos termos do disposto no artigo 87º, n.º 3, do CPT.
4. O conceito de justo impedimento, sustenta-se na não imputabilidade do facto obstaculizador da prática atempada do acto ao mandatário ou à parte, precisamente por se evidenciar que não houve culpa na sua produção. Incumbe à parte faltosa a alegação e prova da sua falta de culpa, ou seja, a ocorrência de um evento impeditivo. Se não são mencionadas as circunstâncias especificas que permitam considerar que houve efectivamente um evento não imputável ao Mandatário, o tribunal não poderá avaliar se houve justo impedimento. O atestado médico que declara a impossibilidade de exercício da profissão por parte do advogado/mandatário, sem esclarecer a gravidade da doença ou desacompanhado de outros meios de prova que demonstrem essa gravidade, não é suficiente para estabelecer o justo impedimento, como se refere no Ac. da RL de 24.01.2023, proferido no processo n.º 14966/17.8T8SNT-E.L1-1, www.dgsi.pt. O mesmo foi decidido no acórdão da Relação de Coimbra, no processo n.º 3188/17.8T8LRA-A.C1, de 20.04.2018, www.dgsi.pt.
Na verdade, defende a jurisprudência que só o evento que impeça em absoluto a prática atempada da acto pode ser considerada “justo impedimento”, excluindo-se a simples dificuldade da realização daquele. Não nos parece ter sido o caso neste processo, pelas razões apontadas na douta decisão bem como na resposta ao recurso, que evitando desnecessárias repetições aqui se dão por reproduzidas, desde logo o facto de a procuração ser passada a mais que um advogado. Salvo melhor opinião, não merece censura a decisão neste particular.
*
5. Em processo do trabalho a apelação tem efeito meramente devolutivo, sem necessidade de declaração – art.º 83º, 1, do CPT – nada havendo, assim, a apontar à decisão.
*
6. A falta de procuração e a sua insuficiência ou irregularidade podem, em qualquer altura, ser arguidas pela parte contrária e suscitadas oficiosamente pelo tribunal – art.º 48º, 1, do CPC. O Autor vem agora arguir a insuficiência da procuração pois um dos sócios-gerentes não a assinou, e, aparentemente, não concorda com a instauração do processo disciplinar instaurado ao Autor. Entende-se, assim, que, deveria ser a Ré notificada para suprir estas insuficiências no prazo que lhe fosse fixado, atento o disposto no n.º do mesmo artigo 48º do CPC.
*
7. Pelo que se emite parecer em conformidade.”

O Autor respondeu ao parecer emitido no requerimento com a referência 368445 (46204377), referindo que tal parecer não se debruça sobre o recurso que interpôs sobre o despacho que não admitiu a audição do médico e não se debruçando e tendo o Apelante junto prova testemunhal para corroborar e explicar o teor do relatório médico junto aos autos, a decisão final sobre o justo impedimento não podia nem devia ter o desfecho que teve. Quanto à falta e irregularidade do mandato da Ré, pugna pela declaração de nulidade e sem nenhum efeito de todo o processado concomitante e posterior à junção da procuração junta como documento n.º 4 do articulado da Ré, na medida em que sendo o patrocínio obrigatório verifica-se uma nulidade do mandato de representação da Ré, de conhecimento oficioso, invocável a todo tempo que determina a nulidade de todo o processado concomitante e posterior praticado pelas partes (artigo 195.º do Código de Processo Civil).

Por sua vez, a Ré também respondeu ao referido parecer através do requerimento com a referência 368467 (46209917), manifestando a sua concordância quanto à primeira parte do parecer, concretamente no que respeita à questão do justo impedimento e efeito do recurso. Quanto à segunda parte do parecer, refere não poder perfilhar o mesmo entendimento porquanto inexiste qualquer insuficiência ou irregularidade do mandato conferido aos Mandatários da Recorrida. Conclui no sentido de que deve manter-se intacta, na sua plenitude, a sentença proferida em sede de primeira instância.

Neste Tribunal de recurso, em sede de exame preliminar, foi proferido pelo Relator Exmº Desembargador Jerónimo Joaquim Marques Freitas o despacho referência citius 17230419, que se transcreve:
«1. Em conformidade no artigo 652.º n.º1, al. a) e b), do CPC, cabe ao relator verificar se o efeito atribuído ao recurso e o modo de subida foram os adequados e, ainda, se alguma circunstância obsta ao recebimento do recurso.
No caso vertente estão em causa três recursos autónomos que, por determinação do Senhor Juiz, em cumprimento do disposto do art.º 645.º n.º 3, foram incorporados num único processo para subirem conjuntamente em separado dos autos principais [despacho de 23-06-2023].
Num parêntesis, deve referir-se que a consulta dos mesmos em processo digital não é isenta de dificuldades, sendo até susceptível de equívocos, desde logo, dado as respectivas certidões surgirem em triplicado, integrando as decisões, alegações de recurso, contra-alegações e despacho que admitiu o recurso, respeitantes aos outros recursos.
Justamente por isso, mas também para enquadrar o presente despacho, consigna-se o seguinte:
i) O primeiro recurso interposto pelo A, foi apresentado em 15-02-2023; incide sobre a decisão proferida em acta de inquirição de testemunhas - acto respeitante à produção de prova para apreciação do justo impedimento invocado pelo ilustre mandatário do A. para apresentar a contestação do autor ao articulado motivador do despedimento para além do prazo legal-, no dia 31- 01-2023, indeferindo a requerida designação de nova data para audição da testemunha Dr. DD; a Ré respondeu ao recurso, apresentando as contra-alegações em 02-03-2023, opondo-se ao indicado efeito suspensivo; foi admitido por despacho de 07-03-2023, para subir em separado, com efeito meramente devolutivo.
ii) O segundo recurso interposto pelo A., foi apresentado a 08-03-23, incide sobre a decisão que apreciou o requerimento de justo impedimento apresentado pelo ilustre mandatário daquele, proferida em 06-02-2023, em consequência da qual depois considerou intempestiva a apresentação da contestação ao articulado motivador do despedimento [passando a proferir sentença, nos termos do art.º 98. L, n.2, do CPT]; a Ré contra-alegou em 20-03-2023, opondo-se à admissibilidade do recurso, por extemporâneo e ao indicado efeito suspensivo; o recurso foi admitido por despacho de 07-06-2023, para subir em separado, com efeito meramente devolutivo.
iii) o terceiro recurso do A. foi interposto em 29-03-2023, e incide sobre a decisão de 09-03- 2023, que entendeu ter-se esgotado o poder jurisdicional do tribunal com a prolação da sentença, não podendo conhecer não podendo conhecer da questão suscitada pelo A., arguindo a nulidade/falta de mandato forense do ilustre mandatário da Ré; a ré respondeu ao recurso, apresentando as contra-alegações em 13-04-2023, opondo-se ao indicado efeito suspensivo; o recurso foi admitido por despacho de 07-06-2023, para subir em separado, com efeito meramente devolutivo.
2. Os recursos são possíveis, mostrando-se correcto o enquadramento do Tribunal a quo, e a parte tem legitimidade para os interpor.
3. No que concerne à tempestividade, como ficou referido, a Ré suscita a questão da EXTEMPORANEIDADE da apresentação do recurso referido em ii. Alega, no essencial, o seguinte:
- A Sentença que julgou improcedente o justo impedimento invocado pelo Recorrente e que, concomitantemente, deu como provados os factos constantes da Motivação do Despedimento levado a cabo pela Entidade Empregadora foi proferida em 06/02/2023, tendo sido notificada às partes (Mandatários) nesse mesmo dia, por meio da plataforma Citius.
- O Trabalhador/Recorrente recebeu essa mesma Sentença, via postal, em 09/02/2023. - Tratando-se de um processo urgente, o prazo para eventual interposição de recurso é reduzido para metade, conforme o disposto no n.º 2, do artigo 80.º do C.P.T.
- Assim, com a presunção legal prevista no n.o 1 do artigo 248.º do C.P.C., os Mandatários consideraram-se notificados da Sentença em 09/02/2023.
- O prazo para interpor recurso da Douta Sentença terminaria em 24/02/2023, sendo que com os três dias de multa terminaria em 29/02/2023.
- Veio, no entanto, o Recorrente interpor recurso, em 08/03/2023, socorrendo-se da prova gravada, produzida em audiência de julgamento decorrida em 31/01/2023, para assim usufruir dos 10 (dez) dias concedidos pelo n.o 3, do artigo 80.º do C.P.T.
- A justificação para esta extensão, ou alongamento, do prazo consiste na necessidade do Recorrente ter que instruir as suas alegações com as especificações dos meios de prova cuja reapreciação, na sua opinião, determinam a modificação da decisão da matéria de facto. - Ao impor um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, com fundamento na reapreciação da prova gravada, o legislador pretendeu evitar que o impugnante se limite a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo simplesmente a reapreciação de toda a prova produzida em primeira instância, daí que o prazo acrescido de 10 (dez) dias só seja aplicável quando o recorrente o use efetivamente para impugnar a matéria de facto.
- Sucede que, em momento algum das suas alegações de recurso, o Recorrente transcreve o depoimento das testemunhas CC e EE, ouvidas na audiência de 31/01/2023.
- Crê, portanto, a aqui Recorrida que não poderá tal recurso ser admitido, por claramente intempestivo e extemporâneo, porquanto o Recorrente não concretizou o excerto ou excertos do depoimento ou depoimentos em que se suporta para impugnar a matéria de facto dada como não provada.
- [..] não restam dúvidas de que o Recorrente não deu cumprimento cabal ao ónus supra referido (quer na motivação, quer nas conclusões do recurso) de indicação da parte seleccionada da gravação, com referência à hora, minuto e segundo de início e da hora, minuto e segundo do respectivo termo – tendo indicado apenas o ''início de gravação e o ''fim de gravação'' constantes dos blocos de depoimentos constantes do CD-ROM, inexistindo a necessária individualização temporal dos trechos específicos que fundamentam a impugnação.
Partilhamos o entendimento da recorrente quanto aos princípios enunciados para aplicação em termos gerais.
Porém, não cremos que tenha razão no caso concreto.
O recorrente diz não se conformar com a decisão recorrida, na parte em que não deu como provado que:
“a) O Sr. Dr. BB, desde 22.12.2022, esteve acamado e impossibilitado de se levantar;
b) Bem como de pedir ajuda e declarar ao Trabalhador que estaria impedido de exercer o mandato.”.
No seu entender, “Estes factos deviam ter sido dados como provados”. Alega, no essencial, o que segue:
-«[..] a prova produzida, prova [documental e gravada em CD (testemunhal)] que impunha decisão diversa, no sentido de tal matéria ser julgada como provada com a redação proposta.
Conforme ata da audiência de discussão e julgamento realizada no dia 31/01/2023 e CD de gravação, a prova produzida ficou gravada:
• o depoimento da testemunha CC, prestado na sessão de julgamento realizada em 31/01/2023, foram gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, com início às 10:22:20h e término às 10:54:29h, com duração de 32m:09s;
• o depoimento da testemunha da Ré EE, prestado na sessão de julgamento realizada em 31/01/2023, foram gravadas através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, com início às 10:55:06h e fim às 11:32:27h, com duração de 37m:16s.
[..] Começando pela forma de atuar do mandatário, pela testemunha EE foi explicado que o advogado do Autor não utiliza computador portátil, mas sim fixo, vidé minutos 21m.01s a 33m.49s da gravação. [..] Acresce que, como explicaram as duas testemunhas ouvidas acerca do justo impedimento, a EE e CC, Advogadas estagiárias, os advogados que constam de procuração, junta no processo disciplinar, ali se encontram apenas por razões de estágio da Ordem, sem qualquer extensão ou pretensão de mandato conjunto, cfr. minutos 24m33s a 38m.25s da gravação da EE.
[..]». É certo que o recorrente não transcreve literalmente extractos dos testemunhos, mas invocaos e apresenta uma síntese do que terão referido. Mas para além disso, sendo esse o aspecto fulcral, é feita uma indicação dos temos de gravação em que encontram os extractos, embora apenas da testemunha EE.
É escasso, tanto mais que apenas assim procede quanto a uma testemunha, podendo suscitar séria dúvida, mas é o bastante para obstar que possa afirmar-se, com a segurança que seria exigível, que o ilustre mandatário do A. não procedeu à audição da prova gravada, pelo menos quanto àquele testemunho.
Não vimos, pois, razões suficientes que impeçam que o recorrente beneficie da extensão do prazo de recurso. Nessa consideração, o recurso foi interposto tempestivamente.
4. Os recursos referidos em i e iii foram interpostos tempestivamente.
5. Mostra-se correcto o modo de subida determinado, bem como a subida num só apenso, nos termos já acima referidos, em cumprimento do art.º 645.º n.º 3, do CPC.
6. Igualmente está correcto o efeito devolutivo fixado a todos os recursos, em conformidade com o disposto no art.º 83.º 1, do CPT, sendo certo que o recorrente não requereu efeito suspensivo, nem qualquer deles se enquadra nos casos referidos no n.º3, do mesmo artigo. Notifique.»
As partes foram notificadas de tal despacho.

Tendo sido publicada a deliberação do CSM de 20-09-2023, desligando o Exmº Desembargador Relator (Jerónimo Joaquim Marques Freitas) do serviço por efeitos de aposentação/jubilação, com produção de efeitos a 1-10-2023, em conformidade com o ordenado no Provimento nº 10/2023 de 2-10-2023 do Exmº Srº Presidente do Tribunal da Relação do Porto, o processo foi remetido para redistribuição relativamente ao Relator, mantendo-se os Adjuntos. O processo foi distribuído à ora Relatora.

Foram colhidos os vistos, após o que o processo foi submetido à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
***
II – Objeto do recurso
O objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso [artigos 635.º, n.º 4, 637.º n.º 2, 1ª parte, 639.º, n.ºs 1 e 2, 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho], que não tenham sido apreciadas com trânsito em julgado e das que se não encontrem prejudicadas pela solução dada a outras.
No caso, estão em causa três recursos de apelação autónomos que subiram conjuntamente em separado dos autos principais.
Tendo em conta o teor das conclusões dos recursos em referência, colocam-se as seguintes questões:
1) No primeiro recurso interposto – que incide sobre a decisão proferida em ata de inquirição de testemunhas (ato respeitante à produção de prova para apreciação do incidente de justo impedimento invocado para o efeito da apresentação da contestação do Autor ao articulado motivador do despedimento para além do prazo legal) de indeferimento da requerida designação de nova data para audição da testemunha Dr. DD – saber se o tribunal devia ter admitido que o depoimento da identificada testemunha se produzisse numa nova data a designar para a respetiva inquirição – ou seja, se a audiência de produção de prova devia ter sido oportunamente suspensa em ordem a permitir a inquirição da identificada testemunha arrolada e a apresentar noutra data.
2) No segundo recurso interposto – que incide sobre a decisão que apreciou o requerimento de justo impedimento apresentado no sentido da sua não verificação e em consequência da qual foi considerada intempestiva a apresentação da contestação do articulado motivador do despedimento -, saber se deve ser modificada a matéria de facto constante de tal decisão (impugnação da matéria de facto) e se deve ser alterada tal decisão quanto ao mérito.
Neste recurso o Autor suscitou ainda uma outra questão atinente à invocada nulidade por falta de mandato de representação da Ré. No âmbito deste segundo recurso o Autor refere que suscitou essa questão perante o Tribunal de 1ª instância e que este não se tinha pronunciado até àquele momento, requerendo a sua apreciação pelo Tribunal ad quem.
3) No terceiro recurso interposto – que incide sobre a decisão que entendeu ter-se esgotado o poder jurisdicional do tribunal com a prolação da sentença, não podendo conhecer da questão suscitada pelo Autor, arguindo a nulidade/falta de mandato forense do ilustre mandatário da Ré – saber se se encontrava ou não esgotado o poder jurisdicional do tribunal aquando da prolação do despacho em causa e, bem assim, da verificação da invocada nulidade por omissão de pronúncia – artigo 615.º, n.º 1, alínea d), 1ª parte, do Código de Processo Civil.
***
III – Fundamentação
Tem-se como assente o que resulta do relatório supra, matéria que se suporta na consulta dos autos principais a que se procedeu, sendo essas as incidências fáctico-processuais relevantes para o conhecimento do recurso.
Começaremos pela apreciação da questão colocada no primeiro recurso apresentado, sendo certo que a decisão a proferir quanto ao mesmo terá necessariamente implicações no que respeita ao conhecimento dos restantes recursos.
O primeiro recurso prende-se com um acto respeitante à produção de prova para apreciação do justo impedimento invocado para apresentar a contestação do Autor ao articulado motivador do despedimento para além do prazo legal, reagindo o Apelante contra o indeferimento da requerida designação de nova data para audição de uma das testemunhas arroladas como prova a produzir no incidente de justo impedimento.
O Autor pugna pela revogação do despacho em referência, sustentando que o mesmo deve ser substituído por outro que admita o depoimento da testemunha em causa para efeitos de tomada de decisão no incidente de justo impedimento, argumentando que o despacho de indeferimento do Tribunal a quo ofendeu, entre outros, o disposto nos artigos 411.º, 508.º, n.º 3, alínea b), 526.º, 598.º todos do Código de Processo Civil e os artigos 2.º, 3.º, 13.º, 18.º, 20.º e 29.º da Constituição da República Portuguesa.
Argumenta, em síntese, que:
- o Tribunal violou o prazo para agendamento da audiência de discussão e julgamento do incidente apelando ao artigo 598.º do Código de Processo Civil a contrario sensu;
- tendo a testemunha conhecimento direto dos factos, seria até de aplicar ao caso a norma especial artigo 526.º do Código de Processo Civil, sendo que a inobservância do inquisitório, a gerar nulidade processual, nos termos gerais do n.º 1 do artigo 195.º do Código de Processo Civil, pode validamente ser suscitada no recurso da decisão interlocutória de não audição;
- tem plena aplicação ao caso, sem sequer se socorrer ao princípio do inquisitório, o decidido no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 12-03-2019, no sentido de que as normas do Código de Processo Civil que permitem o adiamento da inquirição de testemunha ou a sua substituição se aplicam independentemente da forma como a testemunha é chamada a juízo (apresentada pela parte ou notificada pelo tribunal), nomeadamente o disposto no artigo 508.º, n.º 3, alínea b), do Código de Processo Civil.
Vejamos então.
Relembre-se o que resulta dos autos:
- Foi realizada audiência de partes no dia 18-11-2022, no âmbito da qual, frustrada a conciliação das partes, foi determinada a notificação da entidade empregadora para no prazo de 15 dias apresentar articulado para motivar o despedimento e juntar procedimento disciplinar, apresentar rol de testemunhas e requerer quaisquer outras provas e, bem assim, designado o dia 31 de janeiro de 2023, pelas 9:15 horas (data encontrada em concertação de agenda com os Ilustres Advogados que compareceram em representação das partes) para a realização da audiência final, exceto se houvesse lugar a audiência prévia.
- A Ré/Empregadora apresentou o articulado motivador em 5-12-2022.
- Em 7-12-2022 foi expedida notificação para o efeito de o Autor/Trabalhador apresentar contestação no prazo de 15 dias, presumindo-se tal notificação efetuada no dia 12-12-2022 (1º dia útil seguinte seguinte ao terceiro dia posterior o qual não era dia útil – artigo 248.º do Código de Processo Civil), pelo que o prazo de 15 dias terminava em 27-12-2023 (podendo o ato ainda ser praticado independentemente de justo impedimento dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa fixada no artigo 139.º do Código de Processo Civil).
- No dia 12-01-2023, com a apresentação da contestação pelo Autor (trabalhador) foi suscitado o incidente de justo impedimento, aí se invocando que:
1.º
O Autor foi notificado para contestar, referência citius n.º 437134074, expedida no dia 07/12/2022.
2.º
Sucede, porém que, desde o dia 22-12-2022, devido a doença de tal modo súbita, grave e prolongada, o ora Signatário esteve acamado, doente e absolutamente impossibilitado de se levanter, de pedir ajuda e avisar o constituiente da impossibilidade de não poder exercer o mandato, o que atenta a complexidade da causa e de já ter sido a sua pessoa a participar na audição de testemunhas no processo disciplinar, tal não era aconselhável, na legítima e integral defesa do seu constituinete, cfr. atestado medico que ora se junta como Doc. N.º 1-A e B, cujo teor se dá por integralmente reproduzida para todos os devidos e legais efeitos.
3.º
Entretanto, apesar de o signatário ainda se encontrar bastante doente, com fortes e intensas dores e apesar de vivamente aconselhado medicamente a permanecer retido no seu leito, por mais duas semanas, excecionalmente, conseguiu no dia de hoje preparar a defesa do seu constituinte Autor.
4.º
Estes factos supra descritos constituem justo impedimento para o signatário não poder entretanto apresentar a contestação, com Reconvenção, o qual, desde já se invoca para todos os devidos e legais efeitos.
Terminou requerendo o reconhecimento do justo impedimento e, em consequência, a admissão da contestação com reconvenção, com todas as legais consequências.
No âmbito de tal incidente ofereceu prova, consistente na junção de um documento (atestado médico) e indicou três testemunhas a apresentar.
- Estando os autos conclusos desde a data de 11-01-2023, foi proferido despacho com data de 13-01-2023, no qual se consignou o seguinte:
Ao preparar-se para proferir sentença, verifico ter dado entrada contestação pelo Trabalhador, com invocação de justo impedimento para a prática do acto em tempo.
Como tal e antes de mais, notifique a Empregadora para, querendo, exercer no prazo de dez dias o contraditório quanto ao justo impedimento (segunda parte do nº 2 do art. 140.º do Código de Processo Civil, aplicável por força da al. a) do nº 2 do art. 1º do Código de Processo do Trabalho).
- A notificação da Ré para o exercício do contraditório foi expedida no dia 16-01-2023, presumindo-se tal notificação efetuada no dia 19-01-2023 (3º dia posterior ao da elaboração da notificação, o qual era dia útil – artigo 248.º do Código de Processo Civil), pelo que o prazo de 10 dias terminava em 30-01-2023 (podendo o ato ainda ser praticado independentemente de justo impedimento dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa fixada no artigo 139.º do Código de Processo Civil).
- Por requerimento apresentado no dia 25-01-2023 (pelas 15:19:26 conforme certificação citius), a Ré veio exercer o contraditório quanto ao justo impedimento, no qual pugnou pela não admissão do justo impedimento invocado com a consequente rejeição da contestação por extemporânea.
- A Ré apresentou ainda um novo requerimento no dia 26-01-2023 (pelas 17:55:17 conforme certificação citius), com a menção que o fazia “em aditamento ao seu requerimento de 25/01/2023 (Ref.ª Citius n.º 44510710), por ainda estar em tempo para o efeito”, pronunciando-se ainda sobre o justo impedimento invocado.
- Foi aberta conclusão em 27-01-2023 (sexta-feira) e proferida decisão nessa mesma data, designando o dia 31-01-2023, pelas 9H15m para inquirição das testemunhas arroladas pelo Autor/Trabalhador no que respeita ao justo impedimento.
- A notificação deste último despacho foi expedida eletronicamente para os ilustres mandatários nessa mesma data de 27-01-2023 (sexta-feira), conforme data de elaboração da notificação certificada no citius, presumindo-se tal notificação efetuada no dia 30-01-2023 (2º feira - 3º dia posterior ao da elaboração da notificação, o qual era dia útil – artigo 248.º do Código de Processo Civil).
- No dia 30-01-2023 a Ré apresentou ainda um novo requerimento (pelas 9:19:32 conforme certificação citius), com a menção que o fazia “ainda no exercício do contraditório, relativamente à notificação de 16/01/2023 (Ref.ª Citius n.º 125401109), pronunciando-se ainda sobre o justo impedimento invocado, concluindo no sentido de que o mesmo deve ser considerado não verificado e não provado.
- No dia 31-01-2023 (terça-feira), na diligência de inquirição de testemunhas designada, compareceram os ilustres mandatários Dr. BB e Dr. FF e duas das testemunhas arroladas pelo Autor no que respeita ao justo impedimento, mais precisamente as testemunhas CC e EE, resultando da respetiva ata o seguinte:
* No início de tal diligência, o ilustre mandatário do Autor pediu a palavra e fez um requerimento com o seguinte teor:
“Foi requerida a inquirição de três testemunhas, sendo uma delas o Dr. DD, médico que efetuou o acompanhamento clínico e que emitiu o atestado médico que foi junto aos autos.
Contudo, atendendo à proximidade entre a data de notificação do agendamento e do dia desta audiência, aquele não conseguiu desmarcar consultas médicas já previamente agendadas a realizar no Hospital ... no Porto, acrescendo que muitos dos pacientes que têm consulta agendada para a manhã de hoje são residentes das regiões do interior do país.
Face a tais fundamentos e considerando que o depoimento da indicada testemunha se afigura de enorme relevância para a matéria que se irá discutir hoje, e tendo aquele manifestado disponibilidade para ser ouvido através de telefone ou vídeo-chamada, nomeadamente Whatsapp, requer-se que a sua inquirição seja efetuada por essa via, ou, não sendo tal tecnicamente possível a este Tribunal, requer-se que seja designada nova data para inquirição daquele, caso o Tribunal entenda que este depoimento é relevante para a descoberta da verdade material.”
* Nessa sequência, foi dada a palavra ao ilustre mandatário da Ré que em resposta ao requerido disse o seguinte:
. primeiro, tendo em conta a natureza urgente do processo;
. segundo, considerando que o ónus da prova deste incidente impende sobre a parte que o invoca e, por último, que esta testemunha é a apresentar nos termos do próprio requerimento da prova a produzir neste incidente pela parte;
a Ré entende que deve ser liminarmente indeferido o requerido pelo Autor.”
* Após, foi proferido pelo Mmº Juiz o seguinte despacho:
“Compreendendo embora as razões invocadas pelo Ilustre Mandatário do Trabalhador relativamente aos afazeres profissionais da testemunha DD e, bem ainda, a proximidade da data agendada para a inquirição das testemunhas, o certo é que nem os fundamentos invocados constituem justificação para a não presença da testemunha em Tribunal, nem a data de hoje foi fixada apenas no despacho que designou a diligência, por já anteriormente estar agendada para a realização da audiência de julgamento.
Por sua vez, a testemunha em causa, tratando-se de meio de prova indicado no requerimento apresentado e em que foi invocado o justo impedimento, trata-se de testemunha a apresentar.
Como tal e por tudo o exposto, indefere-se o requerido.
Notifique.”
* Na referida diligência foram inquiridas as duas testemunhas presentes, CC e EE, após o que foi dada a palavra para alegações orais aos ilustres mandatários, que o fizeram, tendo sido depois proferido despacho a determinar que, oportunamente, fosse aberta conclusão a fim de ser proferida decisão e declarada encerrada a diligência quando eram 12:25 horas.
* Foi aberta conclusão para decisão no dia 3-02-2023 (sexta-feira), tendo sido proferida nessa mesma data decisão do incidente de justo impedimento suscitado, julgando não verificada uma situação de justo impedimento e o ato de contestação praticado fora do prazo e, bem assim, proferida sentença com fundamento na confissão da factualidade alegada pela Ré/Empregadora por não apresentação tempestiva da contestação e julgando lícito e regular o despedimento do Autor/Trabalhador.
O Apelante pugna pela revogação do despacho recorrido, invocando, para além do mais, a violação do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa.
Dispõe este normativo, sob a epígrafe “Acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva” o seguinte:
“1. A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
2. Todos têm o direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade.
3. A lei define e assegura a adequada protecção do segredo de justiça.
4. Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objeto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo.
5. Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais”.
O n.º 4 deste preceito constitucional consagra o direito a um processo equitativo – exigido pelo artigo 6.º da Convenção Europeia de Direitos Humanos - que, numa das suas vertentes, postula a igualdade das partes, assegurada pelos princípios do contraditório e da igualdade de armas.
O princípio do contraditório é hoje entendido como garantia da participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objeto da causa e em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão.
Nesta consonância, inexistem dúvidas que o direito à tutela jurisdicional efectiva consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa implica também o direito à prova, o que engloba a possibilidade de a propor e produzir.
Uma consequência lógica do reconhecimento do direito à prova é, naturalmente, o direito das partes à aquisição das provas admitidas e consequente dever do juiz de as admitir, como se pode deduzir do artigo 413.º (provas atendíveis) do Código de Processo Civil.
De facto, o direito de apresentar provas seria uma mera ilusão se não estivesse correlacionado com o direito à aquisição das mesmas, uma vez consideradas admissíveis e relevantes.
A consagração no n.º 4 do preceito em análise do direito a um processo equitativo, de facto, envolve a opção por um processo justo em cada uma das suas fases, sendo certo que o direito fundamental à prova constitui uma das dimensões em que aquele se concretiza. O direito à prova emana da necessidade de se garantir ao cidadão a adequada participação no processo e de assegurar a capacidade de influenciar o conteúdo da decisão.
A prova ou o direito à prova constitui, pois, uma vertente do direito à ação e do direito de defesa, direitos esses que colhem proteção a nível constitucional (princípio do acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva – artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa – cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in CRP Anotada, Vol. I, 4ª edição, notas X e XI ao referido artigo, págs. 414/416; cfr., entre outros, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 86/88, de 13-04-1988, processo n.º 235/86, disponível in www.tribunalconstitucional.pt) e a nível infraconstitucional no Código de Processo Civil, através do princípio da ação e do contraditório (artigo 3.º, n.ºs 1, 2, 3 deste último diploma legal).
Claro que o direito à prova não é um direito absoluto e incondicionado, podendo existir limitações legais aos meios de prova utilizáveis ou imposição de condições de utilização dos mesmos, desde que tais limitações se mostrem materialmente justificadas e respeitadoras do princípio da proporcionalidade.
Por outro lado, ao juiz, enquanto “gestor” ou responsável pela direção do processo incumbe autorizar a realização das diligências que se afigurem necessárias e adequadas e indeferir as que se afigurem inúteis ou meramente dilatórias.
Assim, a propósito do dever de gestão processual, dispõe o artigo 6.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, que “[c]umpre ao juiz, sem prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às partes, dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório e, ouvidas as partes, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável.”
Tal dever está também expressamente consagrado no âmbito do processo laboral no artigo 27.º do Código de Processo do Trabalho, cujo n.º 1 tem redação coincidente com a do artigo 6.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
No caso sub judice, estamos perante um incidente de justo impedimento, invocado pelo Autor (trabalhador) para o efeito de ser considerada tempestiva a apresentação da contestação ao articulado motivador apresentado pela Ré (entidade empregadora).
O justo impedimento encontra-se regulado no artigo 140.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho.
Estabelece o referido artigo 140.º o seguinte:
“1 – Considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do ato.
2 – A parte que alegar o justo impedimento oferece logo a respetiva prova; o juiz, ouvida a parte contrária, admite o requerente a praticar o ato for a de prazo se julgar verificado o impedimento e reconhecer que a parte se apresentou a requerer logo que ele cessou.
3 – É do conhecimento oficioso a verificação do impedimento quando o evento a que se refere o n.º 1 constitua facto notório, nos termos do n.º 1 do artigo 412.º, e seja previsível a impossibilidade da prática do ato dentro do prazo”.
O Recorrente deduziu o incidente em referência, alegando, em substância, que: foi notificado para contestar por notificação expedida em 7-12-2022, porém, desde o dia 22-12-2022, devido a doença de tal modo súbita e grave e prolongada o respetivo mandatário BB “esteve acamado, doente e absolutamente impossibilitado de se levantar, de pedir ajuda e avisar o constituinte da impossibilidade de não poder executar o mandato, o que atenta a complexidade da causa e de já ter sido a sua pessoa a participar na audição de testemunhas no processo disciplinar, tal não era aconselhável, na legítima e integral defesa do seu constituinte”; “entretanto, apesar de o signatário ainda se encontrar bastante doente, com fortes e intensas dores e apesar de vivamente aconselhado medicamente a permanecer retido no seu leito, por mais duas semanas, excecionalmente, conseguiu no dia de hoje preparar a defesa do seu constituinte Autor”. Com o requerimento em que suscitou o incidente juntou prova documental (1 documento – atestado médico) e arrolou prova testemunhal que indicou ser a apresentar, mais precisamente três testemunhas, entre as quais figurava o médico ortopedista que subscreveu o referido atestado médico.
O Tribunal a quo agendou data para a inquirição das testemunhas arroladas pelo Autor no tocante ao justo impedimento, sendo que na diligência agendada compareceram duas das testemunhas arroladas pelo Autor (as testemunhas CC e EE), não tendo comparecido nessa diligência a testemunha Dr. DD, médico ortopedista que subscreveu o atestado médico junto, testemunha também arrolada pelo Autor.
Logo no início da diligência de inquirição de testemunhas, o ilustre mandatário do Autor fez um requerimento em que requereu que a inquirição da testemunha que não se encontrava presente fosse efetuada através de telefone ou vídeo-chamada, nomeadamente whatsapp, ou, não sendo tal tecnicamente possível ao Tribunal, que fosse designada nova data para a inquirição dessa mesma testemunha. Para tanto, invocou que: a testemunha em causa foi o médico que efetuou o acompanhamento clínico e que emitiu o atestado médico junto aos autos; atendendo à proximidade entre a data da notificação do agendamento e do dia da inquirição, tal testemunha não conseguiu desmarcar consultas médicas já previamente agendadas a realizar no Hospital ... no Porto, acrescendo que muitos dos pacientes que tinham consulta agendada para essa manhã serem residentes das regiões do interior do País; a testemunha manifestou disponibilidade para ser ouvido através de telefone ou video-chamada, nomeadamente whatsapp.
Cumprido o contraditório a Ré manifestou posição no sentido do indeferimento do requerido, apelando à natureza urgente do processo, ao facto do ónus de prova do incidente impender sobre a parte que o invoca e ao facto de a testemunha em causa ser a apresentar.
O Tribunal a quo indeferiu o requerido pelo Autor no que respeita à inquirição da referida testemunha, nos seguintes termos (que se reproduzem mais uma vez):
Compreendendo embora as razões invocadas pelo Ilustre Mandatário do Trabalhador relativamente aos afazeres profissionais da testemunha DD e, bem ainda, a proximidade da data agendada para a inquirição das testemunhas, o certo é que nem os fundamentos invocados constituem justificação para a não presença da testemunha em Tribunal, nem a data de hoje foi fixada apenas no despacho que designou a diligência, por já anteriormente estar agendada para a realização da audiência de julgamento.
Por sua vez, a testemunha em causa, tratando-se de meio de prova indicado no requerimento apresentado e em que foi invocado o justo impedimento, trata-se de testemunha a apresentar.
Como tal e por tudo o exposto, indefere-se o requerido.
Notifique.”
É contra este despacho que o Autor reage no primeiro recurso de apelação apresentado.
Que dizer?
Diremos, desde já adiantando a conclusão, e sempre ressalvando o devido respeito por entendimento divergente, que se considera não poder ser mantida a decisão objeto do recurso.
Se não vejamos.
O Tribunal a quo designou o dia 31-01-2023 pelas 9h15m para inquirição das testemunhas arroladas pelo Autor no tocante ao justo impedimento.
É certo que tal data era já a data que tinha sido anteriormente agendada em sede de audiência de partes (que teve lugar no dia 18-11-2022) em concertação com a agenda dos ilustres mandatários para a realização da audiência final de julgamento.
Sucede que a designação de tal data para o efeito da produção da prova em sede de incidente de justo impedimento – inquirição das testemunhas arroladas pelo Autor e que foram indicadas como sendo a apresentar – apenas foi feita em despacho proferido no dia 27-01-2023, agendando para o efeito o dia 31-01-2023.
Apesar de quanto à data em questão existir disponibilidade de agenda dos ilustres mandatários – essa questão nem sequer é colocada em crise no recurso – constitui facto incontornável que a data em causa foi aproveitada para o agendamento de uma distinta diligência, em que os meios de prova a produzir eram também distintos.
Tal significa que apenas com o despacho proferido em 27-01-2023 (sexta-feira) ficou definido que a realização da inquirição de testemunhas arroladas pelo Autor em sede de incidente de justo impedimento iria ter lugar ainda nesse mês de janeiro de 2023, mais precisamente no dia 31-01-2023 (terça-feira).
Acresce que a notificação do despacho proferido em 27-01-2023 foi expedida pela via normal – pelo menos é o que resulta dos autos -, isto é, notificação via citius aos ilustres mandatários, pelo que apenas se pode presumir tal notificação como efetuada no dia 30-01-2023 (2º feira - 3º dia útil posterior ao da elaboração da notificação – artigo 248.º do Código de Processo Civil).
Daqui decorre que apenas se pode afirmar que o Autor ficou a ter conhecimento no dia 30-01-2023 que no dia seguinte, 31-01-2023 logo às 9h15m, iria ter lugar a diligência de inquirição da prova testemunhal que arrolou e indicou como sendo a apresentar, e, portanto, ficou a saber no dia 30-01-2023 que tinha que diligenciar pela apresentação das testemunhas no dia seguinte.
Na prática, o Autor no próprio dia em que teve conhecimento da marcação da diligência em causa teve que diligenciar pelo contacto com as testemunhas que tinha que apresentar no dia seguinte logo pela manhã.
Mesmo assim, o Autor ainda conseguiu apresentar no dia seguinte duas das três testemunhas que arrolou!
O Autor não apresentou apenas uma testemunha, mais precisamente o médico ortopedista que subscreveu o atestado médico que juntou como prova documental no âmbito do incidente de justo impedimento, dando uma justificação para essa não apresentação na diligência, consistente no facto de a testemunha em causa não ter conseguido desmarcar as consultas médicas previamente agendadas a realizar no Hospital ... no Porto e acrescendo que muitos dos pacientes que tinham consulta agendada para a manhã desse dia serem residentes das regiões do interior do País. Não obstante, o Autor deu ainda conta da disponibilidade da testemunha para ser ouvido através de telefone ou video-chamada, nomeadamente whatsapp. Nessa decorrência, o Autor requereu que a inquirição da testemunha em referência fosse efetuada por esses meios alternativos, ou no caso de tal não ser tecnicamente possível ao Tribunal, que fosse designada nova data para inquirição dessa mesma testemunha.
Ora, não se desconhece a controvérsia existente na jurisprudência quanto à questão da aplicação ou não do disposto no artigo 508.º, n.º 3, alínea b), do Código de Processo Civil, no caso das testemunhas a apresentar e, concretamente, quanto à possibilidade de adiamento da sua inquirição [Decorre do referido normativo que, no caso de a parte não prescindir de alguma testemunha faltosa, se a impossibilidade para depor for meramente temporária ou se deixar de comparecer por outro impedimento legítimo a parte pode substituí-la ou requerer o adiamento da inquirição pelo prazo que se afigure indispensável, nunca excedente a 30 dias – No sentido da aplicação deste regime independentemente de a testemunha ser a notificar ou a apresentar temos o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-03-2019 (Relatora Desembargadora Higina Castelo, processo n.º 2330/17.3T8ALM.L1-7), o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 25-10-2023 (Relatora Desembargadora Manuela Machado, processo n.º 5489/21.1T8MTS-A.P1) e o Acórdão da Relação de Guimarães de 25-05-2023 (Relatora Desembargadora Conceição Sampaio, processo n.º 107221/18.1YIPRT.G2); No sentido da inaplicabilidade desse regime às testemunhas que a parte deva apresentar, temos o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 14-04-2016 (Relator Desembargador António Beça Pereira, processo n.º 3719/10.4TJVNF-A.G1) e o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12-07-2022 (Relatora Desembargadora Cristina Neves, processo n.º 65/19.1T8CLB-A.C1)].
O certo é que, no caso, nem sequer é necessário tomarmos posição nesta questão em concreto, tendo em consideração o circunstancialismo atinente ao agendamento da diligência de inquirição de testemunhas no âmbito do incidente de justo impedimento e, bem assim, o requerido pelo Autor quanto à inquirição da testemunha em causa e os fundamentos invocados.
Perante tal circunstancialismo, fundamentos invocados e requerimento apresentado o Tribunal de primeira instância deveria ter permitido a inquirição da testemunha em causa, suspendendo oportunamente a diligência após a inquirição das testemunhas presentes e marcando nova data para inquirição da testemunha não presente.
O requerido pelo Autor quanto à inquirição da testemunha em referência não era ilegal nem ofensivo das normas processuais, não era impertinente ou dilatório.
A verdade é que, atenta a extrema proximidade ocorrida entre o despacho de agendamento e a realização da diligência agendada da produção da prova de inquirição de testemunhas, em que não foram sequer adotadas medidas para garantir o conhecimento do despacho na própria data da sua prolação – v.g. via contacto telefónico da unidade de processos -, pelo menos quanto à parte onerada com a apresentação das testemunhas a inquirir, o que até surpreende é que ainda assim o Autor tenha conseguido apresentar duas das testemunhas arroladas.
O requerido pelo Autor quanto à inquirição da testemunha a apresentar e não presente no dia 31-01-2023 não constitui manifestamente um expediente dilatório.
Em abono da verdade, numa primeira linha o requerido pelo Autor até se prendia apenas com a mera modificação da forma de prestação do depoimento da testemunha, por forma a que a mesma pudesse ser inquirida nessa mesma data, mas por meio que lhe permitisse prestar o depoimento sem necessidade de deslocação presencial ao Tribunal, atentos os inadiáveis compromissos profissionais enquanto médico atinentes a consultas médicas que não conseguiu adiar e que tinha agendadas para essa manhã. Não sendo possível essa via de inquirição, então sim o Autor requereu o agendamento de nova data para a inquirição dessa testemunha.
Ao contrário da posição sufragada pelo Tribunal, tendo em conta o já sobredito circunstancialismo que presidiu ao agendamento da diligência de inquirição em causa, entende-se que os fundamentos invocados constituíam justificação suficiente para a não presença da testemunha em Tribunal.
É certo que a parte, no caso o Autor, tinha o ónus de apresentação da testemunha.
Também não se olvida que todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado (artigo 417.º, n.º 1, do Código de Processo Civil). Regra que se aplica também às testemunhas, independentemente da forma como sejam chamadas a juízo.
No entanto, não podemos esquecer que as pessoas, as testemunhas, têm outros deveres, nomeadamente decorrentes das suas obrigações profissionais para com os compromissos previamente assumidos em virtude de agendamentos anteriores. Tanto mais, que está em causa um médico que tem agendamento de consultas, no caso no Hospital ..., sendo consabida a dificuldade que há no agendamento e concretização de muitas dessas consultas e as deslocações dos pacientes inerentes às mesmas consultas (vindos muitas vezes de longe, organizando a sua vida pessoal e profissional em função desse mesmo agendamento).
É questão para perguntar se o que seria justificado era o médico cancelar no dia 30-01-2023 (porque antes não o poderia ter feito, já que a parte nem sequer estava notificada de que tinha que o apresentar) todas as consultas que tinha agendadas para o dia seguinte de manhã, se calhar até numa altura em que já nem teria possibilidade de avisar os pacientes desse cancelamento e com as consabidas dificuldades no agendamento das consultas.
Por outro lado, tendo em conta a data em que foi apresentado o incidente de justo impedimento (12-01-2023), a data do despacho em que foi ordenado o cumprimento do contraditório – prazo geral de 10 dias – quanto à ré (13-01-2023) e a data da expedição da notificação de tal despacho às partes (16-01-2023, considerando-se as partes notificadas do mesmo em 19-01-2023), não era, de facto, minimamente expetável que o Tribunal fosse ainda posteriormente a essa data aproveitar a data agendada para a audiência final de julgamento para agendar a inquirição das testemunhas oferecidas pelo Autor em sede de incidente de justo impedimento.
Ou seja, não pode afirmar-se que o Autor em data anterior a 30-01-2023 pudesse razoavelmente contar que teria que diligenciar pela apresentação das testemunhas que ofereceu em sede de incidente de justo impedimento na data de 31-01-2023 que estava agendada para a audiência final (julgamento).
No caso, perante o sobredito circunstancialismo, ao abrigo do dever de gestão processual (artigos 6., n.º 1, do Código de Processo Civil e 27.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho) e do princípio da cooperação (artigo 7.º do Código de Processo Civil), e por forma a não cercear ao Autor o seu o direito a produzir toda a prova que indicou no incidente de justo impedimento (no qual estava onerado com o ónus de alegação e prova), competia ao Tribunal a quo admitir a inquirição da testemunha em causa numa nova data a designar.
Ao não o fazer, isto é ao não designar nova data para a inquirição da testemunha em causa, foi colocado à parte (ao Autor) um excessivo e desproporcionado obstáculo formal para a almejada produção de tal meio de prova.
Sublinhe-se que o princípio da celeridade processual não pode ser promovido a qualquer preço.
Na verdade, se transformarmos esse princípio num dogma tal acarreterá o efeito preverso de neutralizar o princípio da cooperação, para já não falar do princípio da verdade material.
A posição em concreto perfilhada pelo Tribunal a quo de indeferimento do requerido pelo Autor quanto à designação de uma nova data para inquirição da sua testemunha a apresentar como meio de prova, no circunstancialimo particular verificado, afronta, em nosso entender, a Constituição, os seus princípios ou direitos fundamentais, em particular o de acesso ao direito, o direito à prova e à tutela jurisdicional efectiva, em violação do disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, e, bem assim, os sobreditos dever de gestão processual e princípio da cooperação.
Refira-se que, em abstrato, o depoimento de uma testemunha pode ser relevante para a decisão (no caso, para a matéria de facto a ter em conta no incidente de justo impedimento), pelo que não podemos neste momento conjeturar sobre a concreta importância do depoimento da concreta testemunha para o desfecho do incidente do justo impedimento.
Perante a sobredita violação, constitui facto incontornável que, in casu, não se pode manter o despacho objeto do primeiro recurso interposto.
Foi cometida uma nulidade processual suscetível de influir na instrução e na decisão do incidente de justo impedimento, decidindo-se pela revogação do despacho proferido pelo Tribunal a quo na diligência de inquirição de testemunhas de 31-01-2013, mais precisamente o despacho que indeferiu a requerida designação de nova data para inquirição da testemunha médico ortopedista, DD, anulando-se os atos posteriores, que não possam ser aproveitados (cfr. artigos 195., n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
A revogação de tal despacho implica, por seu turno a reabertura da diligência de produção de prova testemunhal no âmbito do incidente de justo impedimento, com a designação de novo dia e hora para a inquirição da identificada testemunha arrolada pelo Autor e a apresentar.
Nessa decorrência, impõe-se a anulação - porque consubstanciam termos subsequentes absolutamente dependentes do despacho revogado - do processado atinente às alegações produzidas no âmbito da diligência de produção de prova no incidente de justo impedimento (alegações produzidas na diligência realizada em 31-01-2023), com a decorrente anulação da decisão proferida por escrito em 3-02-2023 quanto ao incidente de justo impedimento porque absolutamente dependente da produção de prova quanto a tal incidente (cfr. artigo 295.º do Código de Processo Civil) e, consequentemente, também da sentença proferida nessa mesma data porque dependente da prévia decisão proferida quanto ao dito incidente e, bem assim, do despacho objeto do terceiro recurso em separado que teve como pressuposto o facto de se ter esgotado o poder jurisdicional atenta a prolação da sentença final.
Procedendo o primeiro recurso fica prejudicado o conhecimento dos demais recursos instaurados em separado, tendo em consideração que na procedência do primeiro recurso ficaram anuladas as decisões objeto dos demais recursos apresentados pelo Autor.
Esclareça-se que, também por decorrência do regime processual vigente, não cumpre a este Tribunal da Relação, substituindo-se ao Tribunal da 1ª instância, decidir o mais pretendido pelo Recorrente em sede do segundo recurso de apelação apresentado no que respeita à questão suscitada pelo Autor no requerimento referência citius 14186499.
O recurso visa a reponderação de uma decisão proferida, visa o controlo de uma decisão proferida.
No caso, a questão em causa foi suscitada pelo Autor perante o Tribunal da 1ª instância, mas esse Tribunal não a apreciou apenas porque na altura perante a sentença final proferida considerou que estava esgotado o poder jurisdicional nessa matéria nos termos do artigo 613.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, sendo certo que nessa sentença em sede de saneamento do processo havia sido mesmo afirmado estarem as partes “devidamente representadas”.
A sentença foi, entretanto, anulada por força da procedência do primeiro recurso apresentado, pelo que nada obsta agora à apreciação de tal questão pelo Tribunal recorrido, na regular tramitação processual subsequente à anulação decorrente do despacho revogado.
De facto, tendo em consideração a anulação da sentença, caberá ao Tribunal de 1ª instância apreciar a questão suscitada e, nomeadamente, verificar da regularidade de representação das partes, sob pena de, a não ser assim, se estar a preterir um grau de jurisdição quanto a essa matéria.
Em suma, impõe-se, nos termos expostos, revogar a decisão objeto do primeiro recurso de apelação apresentado, com a consequente anulação das alegações produzidas em sede de audiência de produção de prova no âmbito do incidente de justo impedimento, da decisão proferida quanto a tal incidente, da sentença final subsequente proferida e do despacho que entendeu ter-se esgotado o poder jurisdicional do tribunal com a prolação da sentença e não poder conhecer da questão suscitada pelo Autor no requerimento com a referência citius 14186499, devendo o Tribunal a quo seguir os normais termos processuais em face de tal revogação do despacho e da sobredita anulação dos indicados termos subsequentes, para o efeito da designação de data para continuação da audiência de produção de prova em sede de incidente de justo impedimento com vista à inquirição da testemunha DD arrolada pelo Autor e a apresentar, sem prejuízo da oportuna pronúncia sobre o requerimento apresentado pelo Autor com a refª citius 14186499 e arguição que aí é feita (sem prejuízo também da apreciação da tempestividade de tal arguição) e verificação da regularidade de representação das partes pelo Tribunal de 1ª instância.
No que se refere a responsabilidade pelas custas do recurso, essa impende sobre a Recorrida/Ré (artigo 527.º do Código de Processo Civil).
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IV – DECISÃO
Em face do exposto, acorda-se em julgar totalmente procedente o primeiro recurso de apelação interposto pelo Autor do despacho proferido na audiência de produção de prova de 31-01-2023 que indeferiu a designação de nova data para inquirição da testemunha DD arrolada pelo Autor e a apresentar e, em consequência, revoga-se o despacho aí impugnado e anula-se o processado subsequente que dele depende absolutamente, máxime as alegações produzidas em sede de produção de prova no âmbito do incidente de justo impedimento, a decisão proferida quanto ao justo impedimento (despacho objeto do 2º recurso de apelação apresentado) e a sentença final proferida – decisões datadas de 3-02-2023 - , e, bem assim, o despacho proferido em 7-03-2023 que julgou extinto o poder jurisdicional para o efeito de apreciar o requerimento do Autor com a referência citius 14186499 (despacho objeto do 3º recurso apresentado), devendo o Tribunal a quo seguir os normais termos processuais em face de tal revogação do despacho e da sobredita anulação dos indicados termos subsequentes, para o efeito da designação de data para continuação da audiência de produção de prova em sede de incidente de justo impedimento com vista à inquirição da referida testemunha DD arrolada pelo Autor e a apresentar, tudo sem prejuízo da oportuna apreciação do identificado requerimento do Autor refª citius 14186499 e da verificação da regularidade de representação das partes pelo Tribunal de 1ª instância.
Custas a cargo da Recorrida/Ré (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).
Notifique e d.n.
(texto processado e revisto pela relatora, assinado eletronicamente)

Porto, 15 de janeiro de 2024
Germana Ferreira Lopes
Rita Romeira
Nelson Fernandes