Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ANA PAULA AMORIM | ||
Descritores: | CONTRATO DE SEGURO INDEMNIZAÇÃO CONCRETIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO DEVIDA PELA SEGURADORA | ||
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Nº do Documento: | RP202406171288/22.1T8PFR.P1 | ||
Data do Acordão: | 06/17/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I - Através dos fundamentos da sentença, no segmento que se pronunciou sobre a matéria de facto, o tribunal de recurso vai controlar, através das regras da lógica e da experiência, a razoabilidade da convicção do juiz do tribunal de 1ª instância e formar a sua própria convicção, perante a prova produzida. II - Apurados os danos e o seu montante, não existe fundamento para relegar para liquidação a fixação da indemnização. III - No seguro de danos aplica-se, em princípio, o critério previsto no Código Civil para o cálculo da indemnização (art.º 123º e segs., em especial o art.º 128º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro – Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de Abril) e no âmbito da concretização da prestação devida pela seguradora, tem que ser considerado o valor global que o beneficiário do seguro irá despender com a reparação dos danos, o que necessariamente inclui o valor que lhe será exigido a título de IVA. IV - Sem a atribuição desse valor global a reposição ou restauração patrimonial não são atingidas. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Seguro-RMF-Danos-1288/22.1T8PFR.P1 * SUMÁRIO[1] (art. 663º/7 CPC): ……………………………… ……………………………… ……………………………… --- Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível)
I. Relatório Na presente ação declarativa que segue a forma de processo comum, em que figuram como: - AUTORA: AA, maior, casada, contribuinte fiscal nº ..., residente na Rua ..., ..., ... - RÉ: A... – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., Pessoa Coletiva nº ..., com sede no Largo ..., ..., Lisboa, pede a autora a condenação da ré no pagamento da quantia de €39.789,62 (trinta e nove mil setecentos e oitenta e nove euros e sessenta e dois cêntimos), acrescida dos juros vincendos desde a presente data até efetivo e integral pagamento. Alegou para o efeito e em síntese que a Autora é dona e legítima proprietária do prédio urbano sito na rua ..., freguesia ..., concelho de Paços de Ferreira, o qual foi dado de arrendamento a uma sociedade coletiva denominada B..., Lda no dia 01 de janeiro de 2016. A Autora celebrou um contrato de seguro multirriscos negócios com a Ré. Tal contrato foi celebrado a 24.10.2018 pelo período de um ano, sendo, no entanto, prorrogável. Na sequência da celebração de tal contrato, foi emitida a Apólice nº ... à Autora. Na apólice estabelece um capital seguro de €612.000,00 (seiscentos e doze mil euros), sendo tal valor o limite de indemnização em caso de inundações, com ressalva de franquia de 10% do prejuízo indemnizatório. Mais alegou que o imóvel propriedade da Autora é composto por cave, rés-do-chão e primeiro andar, possui um poço de elevador que atravessa todos os andares. Os funcionários da arrendatária da Autora constataram a ocorrência do sinistro aqui descrito no dia 23 de dezembro de 2019, segunda-feira, ao chegar ao imóvel. No fim de semana da ocorrência do sinistro, o fim de semana anterior ao dia 23 de dezembro de 2019, foi particularmente chuvoso, devido a uma tempestade (Tempestade Fabien) com especial incidência no sábado, dia 21 de dezembro de 2019, o que foi objeto de notícias na RTP, onde se escreveu: “O norte do país está sob alerta vermelho, devido à previsão de vento forte, com rajadas que poderão chegar aos 140 quilómetros/hora. A agitação marítima também será forte nas próximas horas, sendo aguardadas vagas entre seis e sete metros. As autoridades pedem cuidados especiais às populações, sobretudo no que toca a passeios à beira-mar. As condições atmosféricas deverão melhorar a partir de segunda-feira.” “17h00 - Porto. Dezenas de quedas de árvores e de inundações. O despiste de um veículo ligeiro em ..., Gondomar, provocou quatro feridos, um dos quais caiu ao rio ..., tendo já sido resgatado, disse à Lusa fonte do Comando Distrital de Operações de Socorro, CDOS, do Porto. […]Ao longo de todo o dia, segundo o CDOS, o mau tempo, sobretudo o vento forte que se está a fazer sentir na região, provocou "muitas dezenas de quedas de árvores e de outras estruturas, assim como inundações." “13h30 - Porto e Vila Nova de Gaia viveram a maior cheia dos últimos 13 anos. No Porto e Vila Nova de Gaia, já não se viam inundações assim há 13 anos. Com as ribeiras dos dois lados do ... a ficarem inundadas.” Mais alegou que o fenómeno atmosférico do fim de semana anterior à constatação do sinistro foi catastrófico. Foram comunicados avisos vermelhos devido à intensa chuva e ventos a atingir os 140 km/h. Sabemos de antemão que os ventos têm especial incidência nas terras altas. O termo “terras altas” significa também planalto, sendo que Paços de Ferreira encontra-se situado num planalto e, como tal, esteve sujeito, no dia 21.12.2019 a ventos até 140 km/h. Os ventos provocaram os danos nos rufos do imóvel. A intensidade e caudal tão acentuado de chuva provocou a impossibilidade da normal drenagem dos solos e inclusive das caixas públicas de águas pluviais. Tal situação fez com que a terra atingisse o seu limite de absorção de água, o que causou o aumento dos depósitos de água presentes no subsolo do imóvel da Autora. Mais alegou que ao longo do fim de semana, momento em que a arrendatária se encontra encerrada, o aumento dos depósitos de água presentes no subsolo foi tão abrupto que a água começou a entrar pelo poço do elevador que está em contacto direto com o subsolo. Com a queda contínua de chuva e o consequente aumento do nível de água nos subsolos, a água continuou a subir pelo poço do elevador até chegar à cave do imóvel da segurada. As caixas de saneamento localizadas na via pública ao nível do rés-do-chão não tiveram a capacidade de escoamento necessárias, fazendo com que a água entrasse pelo piso do rés-do-chão e, como enxurrada, entrasse pela rampa para a cave. Alegou, ainda, que não obstante o supramencionado, a autora, por forma a evitar situações iguais ao caso em apreço, possuía um motor de bombagem de águas no interior do poço do elevador o qual se dedicava a bombear as águas para o exterior, mas o aludido aparelho avariou no referido dia, não tendo, portanto, efetuado o propósito para o qual foi adquirido. Chegada à cave, a água causou diversos prejuízos no imóvel. Mais alegou que a autora sofreu, também, danos nos rufos do imóvel, proveniente da ação do vento, o que causou o seu levantamento, permitindo a entrada de água no imóvel, causando danos no teto falso e paredes na sala de exposições. A entrada de água no imóvel, com origem no mesmo fenómeno meteorológico, verificou-se na cave pelo poço do elevador, na cave através do rés-do-chão, proveniente da via pública e proveniente do levantamento dos rufos causados pela força dos ventos. Na sequência do sinistro foram perpetrados os seguintes danos: rufos da cobertura; tetos falsos e paredes em pladur na sala de exposições; rodapé em madeira; chão da cave do imóvel. Mais alegou que em 23 de dezembro de 2019 a Autora realizou a participação do sinistro à Ré para a qual transferiu a responsabilidade através de contrato de seguro titulado pela apólice supramencionada. Em virtude de tal participação, foi enviado um técnico para proceder à averiguação dos danos, que ocorreu a 04.02.2020. Tal processo culminou em 06 de abril de 2020 com a declinação do sinistro. A Ré alegou, entre o mais, que os danos têm origem em infiltrações decorrentes de deficiente impermeabilização, situação que não se encontra garantida nas condições da apólice e que no que diz respeito à cave, os danos reclamados são resultantes da subida do nível freático, devido ao escoamento de águas pluviais não possuir a adequada drenagem ao nível da cave. Mais alegou que tal não corresponde à realidade, porque o imóvel possuía uma bomba de água responsável pela bombagem de água de dentro do poço do elevador para o exterior. No entanto, tal bomba de água avariou. Os danos não têm origem em infiltrações, mas na tempestade catastrófica que se fez sentir e na sequência disso os rufos levantaram por efeito da ação dos ventos, causando a entrada de água no imóvel. A autora através do seu mandatário diligenciou pela resolução amigável do sinistro, tendo enviado à ré uma carta em 27 de abril de 2022, mantendo a ré a mesma posição, o que determinou a instauração da presente ação. Mais alegou que em consequência do sinistro sofreu danos ascendendo o montante da reparação a €13.851,03, acrescido do montante necessário para a substituição do cerâmico da cave com mais de 600 m2. Atualmente, tal valor ascende a €17.289,62 (dezassete mil, duzentos e oitenta e nove euros e sessenta e dois cêntimos), motivado pelo aumento exponencial das matérias-primas nos mercados internacionais. Alegou ainda que €17.289,62 correspondem ao valor necessário para fazer face aos danos causados aos seguintes elementos estruturais do imóvel: - danos no teto falso e parede da exposição devido à entrada de água para o interior do imóvel; - danos a rodapés causados pela entrada de água; - danos nos rufos na cobertura. A tal valor acresce o custo da substituição do cerâmico da cave (que sofreu danos devido à subida da água) com mais de 600 m2, o que, por si só, perfaz, sensivelmente, €22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros). Os danos provocados no imóvel ascendem ao montante global de €39.789,62 (trinta e nove mil setecentos e oitenta e nove euros e sessenta e dois cêntimos). - Citada a ré, contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação. Alegou para o efeito e em síntese, que por ocasião da Tempestade Bruno, ocorrida em 26.12.2017, a aqui A. participou à R. um sinistro no qual relatava que, por causa de tais condições atmosféricas, o rufo de remate do telhado do seu estabelecimento comercial levantara provocando danos no teto do piso superior do estabelecimento, por força da entrada de água, e bem assim no mecanismo elétrico dos estores. A ré em cumprimento do contrato de seguro identificado na petição inicial indemnizou a A. pelo valor de € 1.764,00, em 3.7.2018. Por ocasião da Tempestade Gisele, ocorrida em 16.3.2018, veio a A. a participar à R. idêntico sinistro – ou seja, levantamento do rufo de remate do telhado, por força do vento, com a consequente entrada de água para o interior do edifício. A ré honrando o contratado de seguro indemnizou a A. pela quantia de € 1.960,13 correspondente, uma vez mais, ao valor necessário à substituição dos ditos rufos. Na sequência da participação referente ao sinistro descrito na petição inicial, ocorrido em 23.12.2019, a R. fez deslocar ao estabelecimento comercial da A. os seus serviços técnicos, que vieram a constatar que o sinistro relatado – uma vez mais, levantamento do rufo de remate do telhado por força dos ventos com inerente infiltração de água no teto do 1º andar do estabelecimento – só ocorrera porquanto tal rufo não havia sido reparado. Os serviços técnicos da R. não só constataram tal facto como solicitaram à autora comprovativo da reparação, na sequência do sinistro ocorrido em 16.3.2018, tendo esta reconhecido que nunca procedera à sua substituição nem reparação integral, tendo apenas efetuado uma intervenção pontual e superficial, sem substituição de materiais. Mais alegou que sendo inegável que os danos reclamados tinham origem nas infiltrações decorrentes da deficiente impermeabilização do imóvel, a ré declinou o pagamento dos danos reclamados por verificação da exclusão atinente à falta de estanquicidade do imóvel (Exclusão específica prevista na alínea c) da cobertura Tempestades (pág. 5/25). Os danos reclamados têm a mesma origem dos sinistros anteriormente participados tendo sido exclusivamente causados por falta de reparação do telhado, mormente o dito rufo, não obstante a aqui R. ter liquidado à A. o necessário valor para o efeito. Em relação aos danos emergentes do alagamento da cave, por subida do nível freático, alegou que os serviços técnicos da R. constataram que tal só ocorreu por causa da deficiente estanquicidade da cave que não possuía sistema de drenagem de águas pluviais adequado, o que, igualmente consubstancia causa de exclusão contratual. Por fim, impugnou alegando ignorar a restante matéria da petição. - Dispensou-se a realização de audiência prévia e elaborou-se o despacho saneador e o despacho que fixou o objeto do litígio e os temas da prova. - Realizou-se o julgamento, em três sessões, com observância do legal formalismo, conforme consta das respetivas atas. - Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve: “Em face do exposto, decido julgar a presente ação parcialmente procedente e, em consequência: a) Condenar a A... – Companhia de Seguros, S.A., a pagar a AA € 35.810,66 (trinta e cinco mil, oitocentos e dez euros e sessenta e seis cêntimos), quantia acrescida de juros moratórios à taxa prevista para os juros civis, desde a citação até integral pagamento, absolvendo a ré do demais peticionado. b) Condenar a autora e a ré no pagamento das custas processuais na medida dos respetivos decaimentos, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do Código de Processo Civil”. - A ré A... – Companhia de Seguros, SA veio interpor recurso da sentença. - Na alegação que apresentou a apelante formulou as seguintes conclusões: 1. Não se conforma a Ré, ora Recorrente, desde logo com a presente condenação, sob o entendimento de que não logrou provar as exclusões contratuais alegadas. 2. Desde logo, e no que diz respeito à exclusão invocada atinente à falta de impermeabilização do imóvel no piso superior, pelo facto de os rufos do telhado não terem sido substituídos e terem, como tal, permitido a entrada da água, entende a Ré, ora Recorrente, que a prova produzida impõe antes conclusão antagónica. 3. Na verdade, encontra-se já assente nos autos que a Autora participou à Ré, e foi por esta indemnizada em cerca de € 3.700,00, dois sinistros anteriores, ambos com danos ao nível do piso superior, em circunstancialismo coincidente com o presente. 4. As próprias testemunhas arroladas pela Autora, e como bem se reconhece na fundamentação da sentença, reconheceram que a Autora nunca substituiu tais rufos, tendo os mesmos sido apenas objeto de pequenas reparações. 5. Idêntica informação foi prestada pela própria Autora à Perita da Ré (e conforme resulta do Relatório de Peritagem junto aos autos) para justificar a ausência de comprovativos de realização das reparações anteriores justamente referindo que tinha efetuado uma ligeira e provisória reparação. 6. Também as fotos constantes dos Relatórios de Peritagem são elucidativas desta factualidade, mormente a existência da dita cola veda que bem denota a ausência da substituição dos rufos e a provisoriedade de tal ‘remendo’. 7. Em bom rigor, e ressalvado naturalmente o devido respeito, afigura-se-nos até contraditório o reconhecimento de tais meras pequenas reparações concluindo-se, simultaneamente pela absoluta estanquicidade do imóvel. 8. De igual modo, e encontrando-se já assente (ponto 5 dos factos provados) que o imóvel possui um poço no elevador no qual está instalada uma bomba de drenagem justamente para evitar a ocorrência de inundações como a ocorrida e que a inundação sub iudice só ocorreu pelo facto de tal bomba se encontrar avariada. 9. Entendemos que será de concluir, sem mais, e como o fez a Ré ao declinar o sinistro, nesta parte, que tal inundação se encontrava excluída contratualmente pelo facto de se ter ficado a dever à falta/deficiente drenagem da cave. 10. Ora, muito embora não questione o exposto em 8. entende, contudo a Meritíssima Juiz a quo que tal exclusão contratual não se encontra demonstrada pelo facto de a bomba ter avariado nesse dia – facto que, indevidamente levou á factualidade provada. 11. Na verdade, e como acima se demonstrou, a única testemunha que depôs sobre esta matéria jamais referiu que a avaria tenha ocorrido nesse dia. 12. Tendo acrescidamente referido que antes do dia do sinistro nunca se tinha deslocado a casa da Autora para a instalação ou manutenção de tal bomba. 13. De todo o modo, e ainda que assim fosse, não seria de responsabilizar a Autora por tal avaria pela ausência ou deficiente manutenção da bomba?! 14. De resto, o facto de se encontrar definitivamente assente que não havia drenagem no dia do sinistro participado comprova justamente, a nosso ver e sem mais, a factualidade atinente à dita exclusão. 15. Para prova desta exclusão é, de igual modo, preponderante o ofício junto aos autos pela Seguradora C... – e ao qual nem se alude na sentença - que declinou o mesmo sinistro, referente ao recheio do imóvel, com idêntico fundamento – ou sejam justamente a reconhecida falta de drenagem da cave. 16. Também o depoimento da testemunha BB, que descreveu a absoluta impermeabilidade do terreno circundante à casa da Autora, e o facto de a rua se encontrar a uma quota inferior do imóvel da Autora contrariam a decisão proferida. 17. Em suma, concluímos pela alteração da factualidade provada pugnando-se pela inserção da integralidade da matéria não provada na matéria provada e pela eliminação desta dos pontos 7, 12 e 14 – os quais deverão constar da matéria não provada. 18. Admitindo-se, contudo que esse Colendo Tribunal assim não venha a entender fundamos, de igual modo, o presente recurso na discordância quanto aos valores indemnizatórios fixados. 19. Desde logo, não nos conformamos com o custo – de € 22.500,00 – fixado para a substituição do cerâmico da cave. 20. Das fotografias juntas aos autos resulta que tal cerâmico não se encontra sequer danificado. 21. O que, desde logo, motivou o facto de no Relatório de Peritagem não se ter sequer orçamentado este dano (contrariamente a todos os demais peticionados). 22. E sendo certo que é o único relativamente ao qual não foi junto qualquer orçamento. 23. Ou produzida qualquer outra prova, mormente testemunhal – tal como, de resto, bem se reconhece na sentença proferida. 24. A ponto de se justificar tal valor com recurso a cálculos abstratos e a um juízo de equidade. 25. Perante o exposto entende a Ré que deveria ter sido, pura e simplesmente absolvida desta condenação por inexistência do dano. 26. A concluir-se pela verificação dos danos – deste e de todos os demais – a solução mais justa, e uma vez que a Autora se limita a juntar meros orçamentos – seria a condenação da Ré ao pagamento das quantias cuja determinação se relegaria para ulterior momento, qual fosse o da realização dos trabalhos e seu pagamento. 27. Até esse momento desconhece-se o real valor de tais trabalhos podendo os mesmos, e face à divergência de valores dos coincidentes trabalhos constantes dos orçamentos juntos em diferentes momentos temporais, vir a ter um valor inferior, ou até superior, ao da presente condenação. 28. Além do mais, e sendo certo que tais danos aguardam reparação há mais de dois anos – e, no caso dos rufos do telhado, há pelo menos, seis anos desde 2017 – sempre se imporia reduzir o montante da condenação face ao inegável agravamento dos danos, pelo decurso do tempo, e ao abrigo do art.º 570º do Código Civil – o que a Meritíssima Juiz a quo não fez. 29. Por último, sempre se dirá que constando os valores da condenação de meros orçamentos, nunca poderá a Ré, ora Recorrente, ter sido condenada no pagamento dos respetivos IVA – o qual só é devido após emissão da fatura/recibo dos serviços realizados, e mediante o respetivo pagamento. 30. Decidindo-se em contrário violou-se os art.483º; 562º e 570º do Código Civil e art.º 1º; 7º; 28º e 25º do CIVA. Termina por pedir que se julgue o presente recurso totalmente procedente, revogando-se a sentença recorrida. - A Autora veio apresentar resposta ao recurso, na qual formula as seguintes conclusões: 1. A Ré, aqui Recorrente, interpôs recurso da decisão tomada em 1ª instância pelo Juízo Local Cível de Paços de Ferreira. 2. Para o efeito, fundou o seu recurso no facto do Tribunal a quo ter efetuado uma errónea ponderação dos factos dados como provados, pois, no seu entender, o sinistro em causa recai sobre causas de exclusão tipificadas na apólice de seguro. 3. Nestes termos, alegou que a Autora, aqui Recorrida, não procedeu à reparação da parte superior do imóvel, em especial, os rufos, quando estes sofreram danos em 26.12.2017, razão pela qual surgiram novamente danos. 4. Para o efeito, susteve tal entendimento numa “avaliação” efetuada por membros do próprio grupo da A..., pelo que os seus depoimentos foram parciais e, acima de tudo, desonestos. 5. É evidente que os rufos foram objeto de reparação. 6. De que outra forma poderia o imóvel estar incólume durante tanto tempo se não tivesse sido restaurada a integridade do mesmo?! 7. A própria testemunha apresentada pela Ré referiu que não se deparou com danos com mais de um ano na parte superior do imóvel, quando se deslocou ao local para avaliar o sinistro. 8. Ora, se não tivesse existido reparação dos rufos, conforme entende a Ré, não seria de esperar uma situação diferente àquela com a qual a testemunha se deparou? Obviamente que sim! 9. É, por isso, sem sombra de dúvidas, que o imóvel foi objeto de reparação. 10. No que concerne à cave, não há dúvidas da existência de drenagem eficaz do poço do elevador, ao contrário do que acha a Ré. 11. A Autora, tirando este infortúnio, nunca teve problemas com inundações, fundamento demonstrativo da eficácia do método de drenagem. 12. Tal sinistro apenas se deu ao facto da bomba de drenagem de água se ter avariado de forma imprevisível. 13. Relativamente aos valores indemnizatórios, é óbvia a falta de coerência da Ré quando, por um lado, afirma que o pavimento em cerâmico não apresenta danos, baseando tal juízo através de uma fotografia tirada no local à data dos factos e, posteriormente, pedir a redução do valor indemnizatório por força do lapso de tempo entre a ocorrência dos factos e o presente, pois tal lapso de tempo agravou os danos causados. 14. O pavimento, claramente, sofreu danos, sendo esses visíveis, apenas, em momento posterior ao da captura da fotografia, pelo que o argumento apresentado pela Ré é inválido. 15. No que concerne à redução do valor indemnizatório, esta tentativa é jocosa, na medida em que a Ré é a única culpada pelo agravamento dos danos, pois negou sempre qualquer pretensão à Autora, motivo pelo qual não deve tal argumento ser tido em consideração. 16. Durante todo este processo a Ré tem agido de forma incoerente, tentando, de todas as formas, afastar responsabilidades, quando, claramente, esta tem a obrigação de indemnizar a Autora pelos danos sofridos. 17. As alegações presentes no requerimento de interposição de recurso nada mais são do que uma simulação idealizada pela Recorrente. 18. Pelo que, em suma, inexiste qualquer reparo a fazer à douta decisão de 1ª instância. 19. Tudo isto, sem olvidar que a Ré não logrou provar, como lhe competia, qualquer uma das exceções por si invocadas. Termina por pedir a improcedência do requerimento de recurso e a confirmação da sentença recorrida. - O recurso foi admitido como recurso de apelação. - Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. - II. Fundamentação 1. Delimitação do objeto do recurso O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art. 639º do CPC. As questões a decidir: - reapreciação da decisão de facto, com fundamento em erro na apreciação da prova; - verificação das exclusões contratuais contratadas; - da indemnização dos danos; - se ao valor arbitrado a título de indemnização, acresce IVA à taxa legal. - 2. Os factos Com relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância: 1. A autora celebrou um contrato de seguro multirriscos negócios com a ré, em 24.10.2018, pelo período de um ano prorrogável, relativo ao prédio urbano sito na rua ..., freguesia ..., concelho de Paços de Ferreira. 2. Na sequência da celebração do referido contrato de seguro, foi emitida a Apólice nº .... 3. Tal apólice estabelece um capital seguro de € 612.000,00, sendo tal valor o limite de indemnização em caso de tempestades, inundações e danos por água, com ressalva de franquia de 10% do prejuízo indemnizatório. 4. O imóvel é composto por cave, rés-do-chão e primeiro andar. 5. Tal imóvel possui um poço de elevador. 6. O fim de semana anterior ao dia 23 de dezembro de 2019 foi muito chuvoso, devido à tempestade Fabien, com especial incidência no sábado, dia 21 de dezembro de 2019, com ventos até 140 km/h. 7. A chuva intensa impossibilitou a normal drenagem dos solos e das caixas públicas de águas pluviais. 8. Tal situação fez com que a terra atingisse o seu limite de absorção de água. 9. O que causou o aumento dos depósitos de água presentes no subsolo do imóvel descrito em 1. 10. Ao longo do aludido fim de semana, o aumento dos depósitos de água presentes no subsolo foi tão abrupto que a água começou a entrar pelo poço do elevador, em contacto direto com o subsolo. 11. Com a queda contínua de chuva e o consequente aumento do nível de água no subsolo, a água subiu pelo poço do elevador até chegar à cave do imóvel seguro. 12. As caixas de saneamento localizadas na via pública ao nível do rés-do-chão não tiveram capacidade de escoamento, fazendo com que a água entrasse pelo piso do rés-do-chão e, como enxurrada, pela rampa, para a cave. 13. O imóvel seguro possuía um motor de bombagem de águas no interior do poço do elevador, destinado a bombear as águas para o exterior. 14. O aludido motor de bombagem avariou no referido dia. 15. Com os ventos fortes, os rufos de cobertura do imóvel levantaram, permitindo a entrada de água no mesmo. 16. A entrada de água no imóvel causou danos nos seguintes elementos do imóvel: a. - rufos da cobertura; b. - tetos falsos e paredes em pladur na sala de exposições; c. - rodapé em madeira; d. - chão da cave. 17. A reparação dos danos no teto falso e na parede da exposição, nos rodapés e nos rufos apresenta o custo global de, pelo menos, €17.289,62. 18. A substituição do material cerâmico da cave, com a área de 600 m2, apresenta o custo de, pelo menos, €22.500,00. 19. Por ocasião da Tempestade Bruno, ocorrida em 26.12.2017, a autora participou à ré um sinistro no qual relatava que, por causa de tais condições atmosféricas, o rufo de remate do telhado do seu estabelecimento comercial levantara, provocando danos no teto do piso superior do estabelecimento, por força da entrada de água, e, bem assim, no mecanismo elétrico dos estores. 20. Ao abrigo do contrato de seguro identificado em 1, a ré indemnizou a autora, em 3.7.2018, pelo valor de € 1.764,00. 21. Por ocasião da Tempestade Gisele, ocorrida em 16.3.2018, a autora participou à ré o levantamento do rufo de remate do telhado, por força do vento, com a consequente entrada de água para o interior do edifício. 22. Ao abrigo do contrato de seguro identificado em 1, a ré indemnizou a autora, pela quantia de € 1.960,13. - B – Factos não provados A. O levantamento do rufo de remate do telhado por força dos ventos ocorridos em 21.12.2019, com inerente infiltração de água no teto do primeiro andar do edifício só ocorreu porquanto tal rufo não havia sido reparado após o anterior sinistro participado à ré (de 16.3.2018). B. Na sequência do sinistro ocorrido em 16.3.2018, a autora realizou apenas uma intervenção pontual e superficial, sem substituição de materiais, não tendo o imóvel ficado impermeabilizado. C. Os danos na cave do edifício segurado só ocorreram por causa da deficiente estanquicidade da cave, que não possuía sistema de drenagem de águas pluviais adequado. - 3. O direito - Reapreciação da decisão de facto - Nas conclusões de recurso, sob os pontos 1 a 17, insurge-se a apelante contra a decisão da matéria de facto, pretendendo a sua reapreciação em relação aos factos julgados não provados e pontos 7, 12 e 14 dos factos provados. Passando à apreciação da verificação dos pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da decisão de facto. O art.º 640º CPC estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos: “1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. 3. […]” Recai, assim, sobre o recorrente, face ao regime concebido, um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar – delimitar o objeto do recurso - e motivar o seu recurso – fundamentação - com indicação dos meios de prova que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação. No caso concreto, realizou-se o julgamento com gravação dos depoimentos prestados em audiência e a apelante veio impugnar a decisão da matéria de facto, com indicação dos pontos de facto, prova a reapreciar - documentos, prova testemunhal - e decisão que sugere. Em relação à prova a reapreciar consta da motivação do recurso as passagens relevantes para sustentar a alteração da decisão, por referência ao momento da gravação. Nos termos do art.º 640º/1/2 do CPC consideram-se reunidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da decisão de facto. - Nos termos do art.º 662º/1 CPC a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto: “[…]se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”. A respeito da gravação da prova e sua reapreciação cumpre considerar, como refere ABRANTES GERALDES, que funcionando o Tribunal da Relação como órgão jurisdicional com competência própria em matéria de facto, “tem autonomia decisória”. Isto significa que deve fazer uma apreciação crítica das provas que motivaram a nova decisão, de acordo especificando, tal como o tribunal de 1ª instância, os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador[2]. Nessa apreciação, cumpre ainda, ao Tribunal da Relação reapreciar as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados. Decorre deste regime que o Tribunal da Relação tem acesso direto à gravação oportunamente efetuada, mesmo para além dos concretos meios probatórios que tenham sido indicados pelo recorrente e por este transcritos nas alegações, o que constitui uma forma de atenuar a quebra dos princípios da imediação e da oralidade suscetíveis de exercer influência sobre a convicção do julgador, ao mesmo tempo que corresponderá a uma solução justificada por razões de economia e celeridade processuais[3]. Cumpre ainda considerar a respeito da reapreciação da prova, em particular quando se trata de reapreciar a força probatória dos depoimentos das testemunhas, que neste âmbito vigora o princípio da livre apreciação, conforme decorre do disposto no art.º396º CC e art.º607º/5, 1ª parte CPC. Como bem ensinou ALBERTO DOS REIS: “[…] prova […] livre, quer dizer prova apreciada pelo julgador segundo a sua experiência e a sua prudência, sem subordinação a regras ou critérios formais preestabelecidos, isto é, ditados pela lei”[4]. Daí impor-se ao julgador o dever de fundamentação das respostas à matéria de facto – factos provados e factos não provados (art.º 607º/4 CPC). Esta exigência de especificar os fundamentos decisivos para a convicção quanto a toda a matéria de facto é essencial para o Tribunal da Relação, nos casos em que há recurso sobre a decisão da matéria de facto, poder alterar ou confirmar essa decisão. Através dos fundamentos da sentença, no segmento que se pronunciou sobre à matéria de facto vai o tribunal de recurso controlar, através das regras da lógica e da experiência, a razoabilidade da convicção do juiz do Tribunal de 1ª instância[5] e formar a sua própria convicção, perante a prova produzida. Como observa ABRANTES GERALDES: “[s]em embargo da ponderação das circunstâncias que rodearam o julgamento na 1ª instância, em comparação com as que se verificam na Relação, esta deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, portanto, deve introduzir na decisão da matéria de facto impugnada as modificações que se justificarem, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal”[6]. Ponderando estes aspetos, face aos argumentos apresentados pela apelante, tendo presente o segmento da sentença que se pronunciou sobre a fundamentação da matéria de facto, não se justifica alterar a decisão, pelos motivos que se passam a expor. - A apelante visa a reapreciação dos seguintes factos: - Factos provados - 7. A chuva intensa impossibilitou a normal drenagem dos solos e das caixas públicas de águas pluviais. 12. As caixas de saneamento localizadas na via pública ao nível do rés-do-chão não tiveram capacidade de escoamento, fazendo com que a água entrasse pelo piso do rés-do-chão e, como enxurrada, pela rampa, para a cave. 14. O aludido motor de bombagem avariou no referido dia. - Factos Não Provados - A. O levantamento do rufo de remate do telhado por força dos ventos ocorridos em 21.12.2019, com inerente infiltração de água no teto do primeiro andar do edifício só ocorreu porquanto tal rufo não havia sido reparado após o anterior sinistro participado à ré (de 16.3.2018). B. Na sequência do sinistro ocorrido em 16.3.2018, a autora realizou apenas uma intervenção pontual e superficial, sem substituição de materiais, não tendo o imóvel ficado impermeabilizado. C. Os danos na cave do edifício segurado só ocorreram por causa da deficiente estanquicidade da cave, que não possuía sistema de drenagem de águas pluviais adequado. Na fundamentação da decisão fazendo a apreciação crítica da prova, considerou-se como se passa a transcrever: “A celebração do contrato de seguro entre a autora e a ré e as respetivas condições contratuais, para além de constituírem factos aceites pela ré, encontram-se documentados pela respetiva apólice de fls. 10 verso e pelas condições gerais de fls. 63 verso. Tanto as testemunhas CC, filha da autora, como DD, irmão da autora, confirmaram a configuração e composição do edifício seguro, encontrando-se em condições de o fazer, por o frequentarem diariamente. A existência e intensidade da tempestade Fabien não foi colocada em causa pela ré, sendo certo que existem vários elementos probatórios que o comprovam, como as notícias do dia em causa hora a hora atualizadas na página da internet da RTP que a autora juntou (fls. 11 verso), mas ainda e sobretudo, por se reportarem à zona concreta onde o imóvel se insere, várias testemunhas. A título de exemplo, EE, canalizador que reparou a bomba situada na cave da autora, a qual constatou que avariara, disse que nesse dia foi muito solicitado por outros clientes, pois houve muita chuva e temporal, tendo existido outros estragos e avarias. As duas testemunhas antes mencionadas também asseveraram que durante o fim-de-semana em questão existiu um grande temporal com chuvas e ventos muito intensos. Finalmente, a testemunha BB, pai do genro da autora, engenheiro geotécnico e gestor de empresa de construção civil, tendo-se deslocado ao local, verificou que, dada a grande quantidade de chuva que caiu durante a tempestade, os solos ficaram saturados e a água da chuva, por consequência, escoou por percolação, fenómeno que descreveu e explicou, tendo drenado para a cave através da rampa. Várias testemunhas constataram no dia 23 de Dezembro de 2019, aquando da reabertura do edifício após o fim de semana, os estragos que haviam sido provocados pela tempestade, tendo os seus relatos parecido objetivos, concretizados e espontâneos. Em primeiro lugar, as referidas testemunhas CC e DD que, à época, trabalhavam no edifício, confirmaram os alegados estragos e danos verificados na cave, no telhado e no primeiro andar. Também FF, mediador de seguros, de modo desinteressado, deu conta do que naquele dia, chamado ao edifício pela autora, verificou tanto no telhado, no andar imediatamente abaixo e na cave. A sua ida prendeu-se com a eventualidade de dever ser acionado outro seguro cuja celebração mediara, referente ao recheio do edifício, tendo concluído que só podia ser acionado o seguro do edifício e não do recheio. Articulando as fotografias existentes no processo com os estragos verificados pelas referidas testemunhas na imediata sequência da tempestade, as quais asseveraram que tais danos não existiam antes, não parecendo exagerar a gravidade do que observaram, e o que a testemunha GG, que elaborou um relatório de peritagem para a ré (fls. 77) na sequência da sua visita ao local pouco mais de três meses após a ocorrência do sinistro, ainda observou, não teve o Tribunal dúvidas em concluir pela verificação dos danos alegados pela autora. Levando em consideração o orçamento da reparação dos tetos falsos e divisórias (fls. 92 verso e 25), a fatura proforma relativa à substituição do rodapé em madeira (fls. 92 e 25 verso) e o orçamento da obra de serralharia para reparação e substituição dos rufos do telhado (fls. 91 verso e 26 verso), mas ainda o facto de os materiais e mão-de-obra terem sofrido nos últimos meses um aumento exponencial do respetivo preço, consideramos demonstrado o valor alegado pela autora para o custo da respetiva reparação. Embora a autora não tenha junto orçamento para a remoção da tijoleira da cave e respetiva substituição, tendo em conta a área em causa e os preços correntes de mercado, mas ainda um juízo de equidade que se impõe, é nosso entendimento ser o valor alegado um valor razoável e não excessivo. As participações de sinistros anteriores e respetiva indemnização não foram colocadas em causa pela autora, encontrando ainda suporte documental a fls. 34 verso, 37 verso, 42 verso, 50 verso, 51 e 56. D – Motivação dos factos não provados A ré não logrou demonstrar que o levantamento dos rufos do telhado e a correspondente entrada de água no edifício se ficou a dever ao facto de, desde o anterior sinistro, a autora não procedido à respetiva reparação. Em primeiro lugar, porque as testemunhas CC e DD não tiveram qualquer dúvida em afirmar que, após a autora receber o pagamento da indemnização respeitante ao sinistro ocorrido em Março de 2018, os rufos e os tetos falsos foram reparados por um empreiteiro, o Sr. HH, que também estava a construir umas vivendas para o marido da autora. Em segundo lugar, porque, tendo o edifício sido submetido ao Inverno da época 2018/2019, não se compreende como não entrou novamente água da chuva no edifício, caso o telhado não tivesse sido reparado. Em terceiro lugar, porque a já aludida testemunha GG apenas se deslocou ao edifício seguro já durante o mês de Abril de 2020, ou seja, mais de três meses após a ocorrência do sinistro e depois de transcorrido todo o Inverno da época 2019/2020. Esta testemunha disse ter visto no telhado a aplicação de cola e veda e concluído ter-se reduzido a tal aplicação a reparação efetuada após o sinistro de 2018, o que considerou ser inidóneo para a impermeabilização do telhado. Contudo, para além de as referidas testemunhas indicadas pela autora terem afirmado que, após o sinistro de Dezembro de 2019, a autora procedeu a uma pequena reparação dos rufos só para que não entrasse no imediato mais água, o que nos parece perfeitamente normal, atendendo ao facto de, depois de 23 de Dezembro de 2019, ainda ser de esperar muitos dias invernosos com muita chuva, a avaliar pelas fotografias presentes no processo, captadas em Abril de 2020, o cola e veda aplicado não parece ser antigo, mas sim recente, por ter uma tonalidade clara. Finalmente, também ocorre acrescentar que, atento o material dos rufos, uma chapa metálica fina, não é difícil acreditar que ventos com a intensidade extrema atingida em Dezembro de 2019 tenham danificado e empenado rufos colocados alguns meses antes. Por tais motivos, não pôde o Tribunal concluir, como pretende a ré, que a única reparação feita pela autora, desde o sinistro anterior, foi a colocação de cola e veda. A ré também não conseguiu demonstrar a sua tese relativamente à causa dos danos provocados na cave do edifício seguro. Com efeito, o Tribunal não ficou convencido de que a causa da inundação da cave tenha sido a ausência de um sistema de drenagem de águas pluviais adequado por dois motivos fundamentais. Em primeiro lugar, porque a autora tinha montado na cave uma bomba de drenagem de águas que, aparentemente, funcionou, pelo menos, durante as duas tempestades anteriores que deram origem às participações de sinistro à ré, em 2017 e 2018, o que nos conduz à conclusão de que, funcionando, será um método eficaz de drenagem de águas. Em segundo lugar, porque, desta vez, a bomba foi afetada por avaria que a impediu funcionar, drenando as águas, como, aliás, atestou a testemunha que a foi rebobinar, EE. Por fim, deverá acrescentar-se que, a avaliar pelos relatos acima descritos sobre a intensidade dos ventos e das chuvas ocorridos em Dezembro de 2019 e as condições do solo envolvente do edifício (atente-se, em particular, na explicação dada pela testemunha BB), os próprios sistemas de drenagem públicos das águas fluviais não foram suficientes para conter o aumento enorme do caudal, não sendo de admirar que os sistemas privados de drenagem também não fossem suficientes para o efeito”. A apelante sugere que se julguem não provados os factos sob os pontos 7, 12 e 14 e provados os factos que se julgaram não provados. Sustenta a alteração da decisão nos documentos que juntou com a contestação, de modo particular, o relatório de peritagem elaborado para instruir o processo de averiguação da seguradora (inserido a páginas 290 do processo eletrónico sistema Citius -doc. nº 5), a informação obtida junto da Companhia de Seguros C... (inserida a página 112 do processo eletrónico sistema Citius) e no depoimento das testemunhas CC, DD, EE, BB. Cumpre ter presente os depoimentos das testemunhas que vieram depor referindo o seguinte: - EE, nascido em ../../1972, com domicílio em ..., Paços de Ferreira. -Mandatário da autora - “Faz trabalhos para a autora da sua área, canalizador. Sinistro: dezembro 2019 Deslocou-se ao imóvel por causa de uma avaria. Detetou que a bomba de águas pluviais não estava em funcionamento. Retirou, reparou e deslocou-se novamente para colocar a bomba. A bomba não funcionava derivado a um problema elétrico. Foi preciso rebobinar a bomba. O problema elétrico foi causado por uma descarga. A bomba estava no poço do elevador, na casa. Rebobinou a bomba e ficou a trabalhar. Nesse ano houve alguns contactos nessa época do ano. Nessa “maré” mês de dezembro foi muito solicitado e era situações do género destas situações. Foi nessa semana. Nessa semana ocorreu excesso de chuvas. Um ano atípico. As tubagens pluviais não escoam e faz retorno das águas das casas. Quando há estas chuvadas ocorre este fenómeno. Na casa há uma rampa para acesso à garagem. Não esteve lá quando ocorreu a chuvada. O volume da água foi anormal”. - Mandatário da ré - “Trabalho misto, de canalizador e eletricista. Foi remunerado pelo trabalho prestado. Não tem documento que comprove o pagamento pela autora. Retirou a bomba. Não fazia manutenção à bomba. Foi solicitado porque a bomba não trabalhava. Foi solicitado para retirar a bomba. Havia água no poço do elevador. Fez o trabalho sozinho. Foi a primeira vez que foi reparar. Não fez a instalação original da bomba nem nunca foi chamado para reparar a bomba. Naquele edifício nunca fez qualquer intervenção”. - CC, nascida em 1991, com domicílio em Paços de Ferreira. Filha da Autora. -Mandatário da Autora - “Trabalha no prédio onde ocorreu o sinistro. Entram às 09.30 horas. Colegas já tinham telefonado, foi segunda-feira, a loja estava inundada. Chamaram os bombeiros para extrair a água; estiveram a bombear a água para o exterior. Quando já tinham pouca água começaram a encher baldes com uma pá. Tem uma bomba para extrair a água que funcionava. Depois do sinistro deixou de funcionar. A água na loja atingia o rodapé, cobria o pé. Quando chegou já não viu água a escorrer pela rampa da garagem. Na loja verificou que do “pladur” pingava, subiram à cobertura e viram os rufos levantados. O prédio é composto por cave, r/c e 1º andar. No 1º andar pingava água do teto. Participaram à seguradora. Chamaram o mediador que é pessoa dos seus conhecimentos, ligaram e fez a participação. A seguradora A... mandou um perito algum tempo depois. Primeiro veio outro senhor pelo “seguro de coisas”. Anteriormente ocorreram dois sinistros: um, em dezembro de 2017 e outro, em março de 2018. Nessa ocasião repararam os danos provisoriamente, porque aguardavam a indemnização. Depois quando receberam a indemnização, o que ocorreu após o segundo sinistro (março 2018), um empreiteiro veio proceder à reparação do rufo. Empreiteiro que estava a trabalhar em 4 moradias. A reparação foi feita. Em dezembro de 2019 houve muita chuva e vento. Era um bocado a mais do que é normal naquela altura do ano. Ocorreram danos no teto no 1º andar e paredes no r/c, por causa da água que entrou na cave. Chão da casa em cerâmico. O chão está manchado, devido à madeira e metálico de candeeiros e placas soltas que apanharam água. Está alaranjado e não sai com limpeza”. - Mandatário da ré “Sinistros 2017 e 2018 Em relação ao sinistro de dezembro de 2017 procederam à reparação provisória dos rufos, logo a seguir. Ficaram a aguardar o pagamento da indemnização pela seguradora. A água entrou no 1º andar, tetos a pingar. A resposta da seguradora foi dada depois do segundo sinistro. Depois do segundo sinistro é que procederam à reparação definitiva pelo mesmo empreiteiro. Tentaram reparar para evitar a entrada de água e depois da reparação a água não entrou. No sinistro que ocorreu em março 2018 os rufos ficaram danificados levantaram na totalidade. O teto ficou com manchas. Só repararam o teto da segunda vez. A grande preocupação era arranjar no exterior. A seguradora pagou a indemnização e a obra foi executada por altura do Verão e a loja estava aberta. Os danos no teto situavam-se na subida das escadas do lado direito; no 1º andar o teto estava manchado e entrava água. Em 2017 e 2018 a entrada de água só danificou o teto no 1º andar. Não houve problema na cave. Fizeram as obras: reparação dos rufos e dos tetos falsos. Peças substituídas nos rufos, porque estavam todas dobrados e não era possível reutilizar. Repararam o teto na parte estragada e não retiraram os móveis do expositor. Retiraram o que estava estragado e depois substituíram e lixaram e mantiveram uma empregada para limpar. O mesmo empreiteiro fez a obra no rufo e no pladur e pela mesma altura. Chamava-se “Sr. HH”. Não foi emitida fatura. Em dezembro de 2019 ocorreu nova entrada de água. O edifício está ligeiramente acima da cota da estrada, 4 degraus, em relação ao rés-do-chão. A cave já fica abaixo da cota da estrada. Estava tudo cheio de água na cave. Na cobertura levantou outra vez o rufo. E no 1º andar notava-se um pouco de humidade no teto e na cobertura viram que o rufo estava outra vez levantado. Já não havia água a cair, mas caiu água. Na cave havia água por toda a cave. O poço do elevador estava cheio e as carpetes que estavam na rampa de acesso à cave estavam encharcadas e por isso, deduziram que a água entrou pela rampa. Não houve obras em redor do edifício. Não sabe o motivo pelo qual ocorreu este fenómeno. Exibida a fatura do carpinteiro disse que eventualmente respeita aos rodapés. O empreiteiro não fez a obra de carpintaria e foi o II que fez os rodapés. O perito pediu orçamentos. Diligenciaram por obter os orçamentos.com preços atualizados. Documento exibido: doc. nº 5 – fotografia da cave. As carpetes estavam colocadas a meio da rampa. Para ficarem encharcadas a água teve de entrar pela rampa. Documento exibido (fatura carpinteiro junto com a petição)”. - BB, nascido em 1960, com domicílio em Paços de Ferreira. Sogro da filha da autora (anterior testemunha). - Mandatário da autora “Engenheiro geotécnico de profissão e gestor numa empresa de construção. Estuda o comportamento dos solos. Intempérie no Natal de 2019. Foi ao local a pedido da autora. Temporal anormal. No concelho chove bastante e naquela altura choveu de forma extraordinária e a drenagem da rua, da estrada municipal, era insuficiente para efetuar a drenagem da água, transbordava as caixas e isso pode ter condicionado a drenagem na zona envolvente do edifício. Todos os terrenos estão impermeabilizados e ao lado do prédio existe um terreno agrícola, que estava inundado. O solo estava saturado. A percolação não se fazia por infiltração. Os terrenos agrícolas saturados tiveram que drenar para algum lado. Verificou na visita que fez ao imóvel que a cave estava inundada. A cave é sempre um ponto favorável de drenagem e por isso é fácil que as águas dos campos tenham percolado para a cave. Dada a quantidade de água que caiu a própria drenagem do terreno do edifício estivesse saturada. As caixas não eram suficientes para drenar a água que entrasse na rampa de acesso à cave. Se a água não consegue sair não tem capacidade para escoar tudo o que cai. Há ali uma rampa. A área circundante está toda impermeabilizada. Estava tudo tão saturado que não escoava mais água no solo”. -Mandatária da ré “Conhece a situação de 2019. Anteriormente não foi ver. Tomou conhecimento mas não se deslocou ao local. Esta situação pela gravidade é que justificou a sua deslocação ao local. A área envolvente está impermeabilizada porque está revestida por materiais que impedem a absorção da água. Cimento, argamassa. O que há entre as várias pedras é tal pequena que dificulta qualquer absorção da água. Impermeabilização da superfície do edifício. A água que cai não penetra. A água escorre pela superfície e não se infiltra”. - DD, nascido em 2505/1977, com domicílio em Paços de Ferreira. Irmão da autora e na altura era funcionário da loja que funciona no edifício. Foi funcionário durante 20 anos. A empresa para quem trabalhava tinha a denominação B... Lda”. -Mandatário da Autora “2019 – altura do Natal, antes da pandemia. Foi à loja e a água passava o rodapé no rés-do-chão. Foi a primeira pessoa a chegar ao local. Era impossível tirar a água. Chamaram os bombeiros. Na cave estavam carpetes e estava tudo estragado. Arrecadação na cave. O poço do elevador tinha uma bomba. Só viu água e a bomba não devia estar a funcionar, porque se estivesse não teria água. Os bombeiros colocaram mangueira para extrair a água, cá para fora. Colocaram nas caixas pluviais mas era tanta água que ela voltava outra vez e por isso colocaram mesmo na rua. Choveu muito. Danos na cave: estragou-se os móveis, as paredes ficaram todas cheias de machas; rodapés danificados; o chão ficou com marcas e levantaram algumas peças do mosaico. Rufos: tiveram danos, mas já anteriormente tiveram problemas. Mas em concreto não sabe. Antes foram danificados e foram reparados. 1º andar: não se recorda”. -Mandatário da ré “Nesta situação o que se afigurou mais grave foi a água na cave. A reparação dos rufos ocorreu no Verão. Fizeram a reparação dos rufos e os tetos. Abria a porta para procederem à reparação”. - FF, conhece a autora, mediador. - Mandatário da autora “Em dezembro 2019 ocorreu o sinistro. Foi ao local, dois ou três dias depois (23.12). Deslocou-se ao local porque a autora também tem o seguro do recheio do edifício. O marido da autora levou-o à cobertura e viu o rufo ou chapéu numa das partes totalmente levantado e na placa bocados da cobertura. Teriam sido removidos por ação do vento. Desceram e reparou numa mangueira que saía para fora, porque como choveu muito e a água entrou pela rampa que dá acesso à cave. Verificou danos em tapetes. Estavam a fazer um inventário. Exerce a profissão de mediador de seguros. O seguro de recheio do imóvel está com a C..., com quem trabalha. Deslocou-se ao imóvel por motivos profissionais. Deduz que procederam à reparação dos rufos porque não voltou a ser chamado. A sua visita está relacionada com danos no recheio e para fazer participação relacionada com o recheio. Posteriormente houve outra participação relacionada com o recheio cerca de um ou dois anos depois. Essa participação não está relacionada com este sinistro. Anteriormente não teve qualquer participação. Era a primeira vez que se deslocava ao local. Começou a fazer seguros cerca de meio ano antes de isto acontecer. Disse-lhe que os danos nos rufos respeitam ao seguro do edifício. Na altura não tem noção se havia apólice de seguro relativamente ao recheio. Poderia existir, mas não estava assinada. Deslocou-se para ver o edifício por causa dos danos. Não está preparado para falar sobre o recheio”. - JJ, funcionária da ré, gestora de sinistros. -Mandatária da ré “Não foi ao local do sinistro. Fez a análise do relatório apresentado pela “D...” e verificou que os danos reclamados já tinham sido reclamados em processos anteriores e não tendo sido reparados não estavam a garantir o bom estado de edifício e originou as infiltrações. Peritagem de 2019 (única que tem consigo) Fotografias: -doc. nº 1 – rufo danificado; zona branca reparação feita no rufo; -doc. nº3 – não é uma reparação definitiva. Pagaram duas indemnizações e a reparação limitaram-se a uns remendos. A indemnização atribuída destinava-se a reparar com substituição. A cave, a causa está associada a deficiente drenagem. Leu o relatório”. -Mandatário da autora “Não sabe se a apólice se mantém em vigor. Data do sinistro 23 de dezembro de 2019. A funcionária da D... deslocou-se ao local, mas não sabe quando. Só sabe a data das fotografias 14.01.2020. Não tem fotografia com rufos levantados, mas na participação consta que os rufos foram deslocados”. - GG, engenheira, presta serviços para a D... que faz parte do grupo A.... Faz perícias e avalia danos há 13 anos. -Mandatário da ré “Deslocou-se ao local para proceder à avaliação dos danos. Data do sinistro: 23.12.2019. A participação do sinistro foi feita por volta de 14-15 de janeiro de 2020. Foi ao local em 02 de fevereiro de 2020. Espaço comercial, loja de exposição de móveis. Duas situações diferentes: dano resultante da cobertura e dano por subida de água do nível freático, na caixa de elevador. Não colocaram o elevador. A bomba avariou e tiveram que chamar os Bombeiros. Duas situações anteriores: tempestade Bruno, a indemnização e a substituição dos rufos. Verificou que os rufos estão empenados e empolados e não oferecem resistência ao vento. Caso fossem substituídos o imóvel estaria estanque e suportaria estas condições adversas. - Cave Existe um poço preparado para colocação do elevador. Tem caixa para levar elevador. Estava a acumular água. Zona do edifício que não está terminada. Nestas condições elevador que se coloque no local avaria logo, porque há uma situação de falta de estanquicidade. A bomba foi aplicada para extrair a água. Foi colocada ali naquela altura de chuva. Está ali porque há um problema de estanquicidade, tem de estar ali quando chove a água entra. Tem de estar sempre ali instalada. Solução provisória. Existe uma bomba e avariou e tiveram que chamar os bombeiros. Como não conseguiu extrair inundou a cave. Não viu arrastamento de finos, as paredes estavam limpas. Só vem a água que vem do elevador. Em 02.02.2020 não viu água na caixa do elevador; tinha pouca água, a bomba está lá. Tinha pouquinha água. - Rufos Os danos nos rufos foram objeto de indemnização em duas situações anteriores. Os ventos arrancaram os rufos. Deviam ter colocados novos rufos e não reaproveitados e ali nota-se que há um reaproveitamento. Colocaram cola e veda. Pediram a fatura comprovativa da reparação anterior. O estado de empeno dos rufos era muito grande. Não têm evidências que os rufos tenham sido substituídos. A empresa que fez a obra abandonou o país e não passaram as faturas. Os materiais estavam muito empenados. Os rufos não têm aspeto de terem sido substituídos mas antes reaproveitados e isso impede a estanquicidade do edifício. Fotografia nº4 – fls. 44 verso – 12.01.2018 Doc. nº 5 – fotografia nº 3 – fls. 82 – 04.02.2020 Semelhante à anterior, mesma fotografia no mesmo local em datas diferentes. A resistência era muito superior, se a fixação fosse nova e substituídas as peças do rufo. Em relação ao pavimento referiu que nunca nos foi indicado como tendo danos. Não se pronuncia porque nunca foram alvo de análise pela peritagem”. - Mandatário da Autora Efetuou a peritagem na qualidade de prestadora de serviços à D.... Só reclamou neste sinistro a entrada de água na caixa do elevador. A rampa é bastante inclinada. Em relação aos sinistros anteriores referiu que “só pagaram depois do segundo sinistro; não contabilizaram na 2ª indemnização os rufos, porque até ali não tinham substituído os rufos”. Caso contrário estavam a pagar duas vezes a mesma coisa, sem que tenha sido objeto de substituição. 2020 – pladur amarelecido, danificado, não estava escuro e os rodapés danificados. Observou a aplicação nos rufos de cola e veda. Se as fixações não forem reforçadas é possível levantar novamente, tudo depende da velocidade dos ventos. No momento em que foi ver os rufos estavam no sítio, com aplicação de cola e veda, para mitigar os danos. Verifica pela cola e veda aplicada que era muito fresca, recente. Se não colocasse o rufo no sítio o prejuízo seria muito maior. Exibida a fotografia - fls. 44 verso – 12.01.2018 (após o sinistro de 2017) disse: “são rufos; a zona branca é cola e veda”. Exibida fotografia 04.02.2020 (pág. 82) – fotografia posterior –, disse: “tem cola e veda no rufo. A fotografia foi feita pela testemunha. No meio tem cimento. A cola e veda fresca, branquinha. Mais do que a cola e veda, a chapa está toda empenada na foto nº 5. A chapa está toda ondulada até ao fundo. Estando ondulada não tem resistência ao vento. A cola e veda não são materiais de fixação para este tipo de situações. Os rufos levantaram e por isso é natural que empenem”. - Em confronto com o depoimento da testemunha, cumpre ter presente os considerandos que fez constar do relatório pericial e que se transcrevem: “Descrição: Efetuamos deslocação ao local de risco, onde fomos recebidos pelo tomador de seguro, a qual nos informou que no passado dia 23/12/2019, ocorreu levantamento dos rufos da cobertura, com consequente entrada de água para o interior da fração comercial danificando teto falso de sala de exposições. Informou-nos ainda que devido ao excesso de pluviosidade do mês de Dezembro ocorreu alagamento da cave devido a subida de nível freático. No local verificamos os rufos aplicados na cobertura do imóvel. Verificamos danos em teto de sala de exposições no alinhamento dos rufos indicados como tendo sido levantados. Solicitamos fatura comprovativa da reparação efetuada ao abrigo do processo anterior ..., dado que segurada reclama os rufos e os danos no teto de sala no mesmo alinhamento e nas mesmas áreas afetadas. A segurada disse que não tem fatura e que efetuou apenas uma reparação pontual aos rufos e ao teto, não tendo sido substituídos os materiais na sua totalidade. Disse que o empreiteiro fugiu para fora do país. Segurado reclama reparação de rufo e teto de sala de exposições no mesmo alinhamento dos danos já reclamados ao abrigo do processo em referência …, não possui fatura da reparação anterior. Rufos foram reaproveitados e foi aplicada cola e veda. Os rufos estão empenados, ondulados e não oferecem qualquer estanquicidade ao edifício, facto que motiva a regulação condicional. Na cave verificamos danos ao nível dos rodapés e paredes. Verificamos os poços dos elevadores com água no momento da nossa deslocação ao local. Devido à subida do nível freático existe acumular de água em poços dos elevadores provenientes do solo. Não se verifica indícios de efeitos de enxurrada nem arrastamento de finos, pois a rua possui quota inferior ao edifício. Não temos inundações na localidade onde se insere o imóvel seguro na data indicada. Analisado o relatório dos bombeiros verificamos que foi efetuado bombeamento da água da cave. Os danos reclamados ao nível da cave são resultantes da subida do nível freático, devido ao escoamento de águas pluviais não possuir a adequada drenagem ao nível da cave ocorrência sem enquadramento. Contactamos o perito interveniente da congénere C... que segura os bens das mercadorias através da apólice ..., processo ..., o qual corrobora o condicionalismo do processo pelos fatores mencionados. Verificamos os poços dos elevadores com água no momento da nossa deslocação ao local. Devido à subida do nível freático existe acumular de água em poços dos elevadores provenientes do solo. Não se verifica indícios de efeitos de enxurrada nem arrastamento de finos, pois a rua possui quota inferior ao edifício. Não temos inundações na localidade onde se insere o imóvel seguro na data indicada. Analisado o relatório dos bombeiros verificamos que foi efetuado bombeamento da água da cave. Os danos reclamados ao nível da cave são resultantes da subida do nível freático, devido ao escoamento de águas pluviais não possuir a adequada drenagem ao nível da cave ocorrência sem enquadramento. Contactamos o perito interveniente da congénere C... que segura os bens das mercadorias através da apólice ..., processo ..., o qual corrobora o condicionalismo do processo pelos fatores mencionados. Fixamos todos os prejuízos do sinistro com caracter condicional e informativo”. A informação prestada pela C... (inserida a página 112 do processo eletrónico sistema Citius): Resulta da prova testemunhal indicada pela apelante em confronto com os documentos juntos com a petição e de um modo geral admitido pelas restantes testemunhas, que no fim de semana, entre o dia 21 e 23 de dezembro de 2019, e em particular no local onde ocorreu o sinistro verificaram-se períodos de chuva muito intensa acompanhados de ventos muito fortes. O depoimento da testemunha BB mostrou-se esclarecedor a respeito da capacidade de drenagem dos solos no local onde está construído o edifício. A testemunha revelou conhecer o local, deslocou-se ao edifício após a ocorrência e atenta a sua especial habilitação técnica (engenheiro Geotécnico) o seu depoimento mereceu particular relevo para apurar o motivo pelo qual as águas das chuvas não escoavam. O depoimento prestado não foi contrariado por qualquer outro elemento de prova. O depoimento da testemunha DD que esteve presente no local, depois da ocorrência e que foi a primeira pessoa a verificar a inundação que existia na cave do edifício, descreveu a dificuldade em extrair a água da cave, ao ponto de só com a intervenção dos Bombeiros se ter alcançado esse efeito. O depoimento da testemunha veio confirmar o depoimento da anterior testemunha a respeito da capacidade de escoamento da água nas caixas de águas pluviais existentes na via pública, pois referiu que se verificava retorno, o que determinou os bombeiros e colocar a mangueira na estrada e dessa forma escoar a água. A testemunha CC confirmou a intervenção dos Bombeiros para permitir escoar a água que estava depositada na cave e rés-do-chão do edifício, facto que também consta do relatório de peritagem apresentado pela ré-apelante. Nenhuma das indicadas testemunhas assistiu ao fenómeno que deu causa à inundação na cave. Contudo, resulta dos seus depoimentos, pelo facto de terem comparecido no local logo que foram alertados para a inundação na cave e danos causados em objetos que ali se encontravam depositados, que a inundação que descrevem é compatível com a entrada de água pela rampa de acesso à cave devido à chuva intensa que se fez sentir naqueles dias e dificuldade em proceder ao escoamento das águas através das caixas de saneamento. Aliás, essa dificuldade subsistia no dia em que os bombeiros foram chamados ao local para proceder ao escoamento da água depositada na cave do edifício, o que comprova que a água entrou pela rampa de acesso à cave. De igual forma, as testemunhas referiram que o motor instalado no poço do elevador avariou, o que impediu que se conseguisse escoar a água e justificou a intervenção dos bombeiros. A reparação do motor foi confirmada pela testemunha EE, que no dia em que o dono do prédio tomou conhecimento da inundação, solicitou a reparação do motor junto da testemunha. A testemunha referiu que nunca anteriormente lhe tinha sido solicitado tal serviço e não faz a manutenção do motor, revelador do caráter extraordinário e súbito da sua intervenção e que permite confirmar o depoimento da testemunha CC quando refere que a bomba avariou nesse dia. A testemunha GG quando realizou a peritagem viu o motor instalado na caixa do elevador. Os depoimentos permitem concluir que o motor estava instalado na caixa de elevador, com a finalidade de extrair a água no caso de ocorrer a entrada de água na caixa do elevador, o que só não ocorreu no dia do sinistro porque se avariou, avaria de natureza elétrica. Estando, como está, instalado na caixa de elevador não existe motivo para não estar em funcionamento. Aliás, não se fez prova de factos instrumentais que permitissem uma diferente apreciação das circunstâncias de acordo com um juízo de normalidade. Sobre a matéria do ponto 12 dos factos provados a testemunha GG descreve uma realidade distinta daquela que as testemunhas que se deslocaram de imediato ao local transmitiram. Referiu a testemunha GG que não eram visíveis deslizamentos de finos na zona da rampa, nem manchas nas paredes, o que bem se compreende porque com o escoamento da água se terá procedido à limpeza da rampa, até por motivos de segurança, sob pena de se tornar intransitável. Por outro lado, a testemunha não observou os objetos que as testemunhas referiram como estando ali depositados e que ficaram danificados. A testemunha verificou a colocação do motor no poço do elevador, o qual tinha muito pouca água. Refere não existirem sinais de manchas nas paredes, mas no relatório que elaborou refere tais manchas, sendo certo que a autora não reclama a reparação das paredes na cave. O depoimento mostra-se pouco sustentado e o facto de não ter procedido à vistoria logo após a ocorrência acaba por desvalorizar as considerações que tece sobre as caraterísticas do local. Neste contexto, o depoimento das testemunhas indicados pela apelante não justifica a alteração pretendida quanto aos pontos 7, 12 e 14 dos factos provados. Em relação à matéria de facto julgada “não provada” a apelante sustenta a alteração no relatório de peritagem elaborado a solicitação da seguradora e informação prestada pela C..., elementos de prova que estão sujeitos ao princípio da livre apreciação da prova e por isso, apenas no confronto com os demais elementos de prova podem sustentar a pretendida alteração (art.º 607º/5 CPC). O depoimento da testemunha GG que fez a vistoria e elaborou o relatório permite uma melhor interpretação dos considerandos do relatório, mas não justifica a alteração da decisão. Decorre do depoimento da testemunha que por efeito dos anteriores sinistros, o primeiro, que ocorreu em dezembro de 2017 e o segundo, em março de 2018, o rufo do telhado soltou-se e na sequência da participação do sinistro a seguradora indemnizou a autora. Porém, apenas em relação ao primeiro sinistro atribuiu a indemnização para proceder à substituição do rufo, porque na data em que ocorreu o segundo sinistro ainda não tinha sido atribuída a indemnização devida e respeitante ao primeiro sinistro, pois a seguradora não poderia indemnizar uma obra que não estava executada. Contudo, admitiu que logo após o primeiro sinistro a autora procedeu a uma reparação sumária e simples do rufo, aplicando-o no local, unindo com cola e veda as partes soltas. Depois não executou qualquer outra obra. A testemunha CC confirmou que inicialmente procederam a uma reparação sumária, porque estavam a aguardar a indemnização para proceder à substituição do rufo. Procederam à reparação sumária para evitar mais danos e referiu ainda, que procederam à substituição do rufo depois do segundo sinistro e quando receberam a indemnização respeitante ao primeiro sinistro. O depoimento das testemunhas acaba por ser coincidente quanto à natureza da primeira reparação provisória e momento em que foi paga a indemnização. Neste terceiro sinistro, por efeito do vento, o rufo solta-se de novo do telhado e a autora volta a colocar o rufo no mesmo local, reparando ou unindo as partes soltas com cola e veda, como referiram as testemunhas CC e GG. A testemunha GG admitiu que o material aplicado “cola e veda” era recente, o que confirma o depoimento da testemunha CC. Contudo, considera a testemunha GG que o rufo apresentava-se amolgado e torcido, o que leva a concluir que nunca chegou a ser substituído e por isso não garantia a estanquicidade necessária. Perante a descrição que as testemunhas CC, DD e FF fizeram do estado em que ficou o rufo após a intempérie é possível concluir que ao soltar-se tenha ficado amolgado e deformado, pois estamos a falar de uma peça metálica com alguns metros e que ficou derrubado sobre a cobertura do prédio. A testemunha GG apenas verificou o estado da cobertura do prédio e do rufo em 02 de fevereiro de 2020, quando já estava colocado e reparado provisoriamente. Desta forma, ao ser recolocado teria de apresentar amolgaduras, mas não permite concluir que não tenha sido anteriormente substituído e muito menos, que se tivesse sido substituído poderia resistir aos ventos que se fizeram sentir, como pretende a apelante. Refira-se, ainda, que o depoimento das testemunhas CC e DD, que vieram depor sobre as obras executadas no imóvel, após o segundo sinistro, mereceram credibilidade pela forma objetiva e circunstanciada como vieram depor, criando a dúvida sobre a verificação dos concretos factos alegados pela ré e que constam das alíneas a) e b) dos factos não provados. Recaindo sobre a ré o ónus da prova destes factos (art.º 342º/2 CC), por aplicação do critério do art.º 414º CPC devem continuar a considerar-se “não provados”. Por fim, é de referir que do depoimento das testemunhas não resulta que a cave não dispunha de sistema de drenagem de águas pluviais. Aliás, nenhuma testemunha se pronunciou nesse sentido. Apenas a testemunha GG veio referir que a caixa do elevador, que consistia na edificação preparada para instalação de um elevador, mas que não tinha elevador, carecia de estanquicidade, o que justificava a instalação da bomba de drenagem. Existia um problema de drenagem de águas na caixa de elevador que estava resolvido com a instalação da bomba de drenagem. Contudo, a cave não se restringe à caixa do elevador, porque resulta do depoimento das testemunhas que ali estava também instalada uma arrecadação. A informação prestada pela seguradora C... permite confirmar o que as testemunhas referiram a respeito da intempérie que se abateu sobre aquele local. Em conclusão a prova produzida e a indicada pela apelante não justifica a alteração da decisão que julgou não provada a matéria das alíneas a. b. e c. dos factos não provados. Pelo exposto improcede a reapreciação da decisão de facto e as conclusões de recurso sob os pontos 1 a 17. - - Das exclusões contratuais contratadas - Nas conclusões de recurso, sob os pontos 1 a 17, a apelante também se insurge contra o segmento da sentença que julgou improcedentes as exceções, no pressuposto da alteração da decisão de facto. Mantendo-se inalterada a decisão de facto e não impugnado a apelante a decisão de direito, não cumpre reapreciar a decisão. Improcedem também sob este segmento as conclusões de recurso. - - Do montante dos danos - Nas conclusões de recurso, sob os pontos 18 a 27, a apelante insurge-se contra o segmento da sentença que arbitrou a indemnização, calculando no seu cômputo o custo com substituição do cerâmico. Entende que não se provou existir o dano, devendo ser absolvida do pedido nesta parte. Na sentença consideram-se no cálculo do montante da indemnização o valor apurado com substituição do cerâmico - € 22.500,00. Resulta dos pontos 16 a 18 dos factos provados: 16. A entrada de água no imóvel causou danos nos seguintes elementos do imóvel: a. - rufos da cobertura; b. - tetos falsos e paredes em pladur na sala de exposições; c. - rodapé em madeira; d. - chão da cave. 17. A reparação dos danos no teto falso e na parede da exposição, nos rodapés e nos rufos apresenta o custo global de, pelo menos, €17.289,62. 18. A substituição do material cerâmico da cave, com a área de 600 m2, apresenta o custo de, pelo menos, €22.500,00. A apelante não se insurgiu contra a decisão de facto e ao pretender que o tribunal reaprecie o segmento da decisão que fixou o montante da indemnização, não considera os factos provados e que não foram objeto de impugnação. No cálculo da indemnização cumpre ter presente o critério estabelecido nos art.º 562º a 566º CC, aplicável ao seguro de danos (art.º 123º e segs., em especial o art.º 128º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro – Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de Abril). De acordo com o art.º 562ºCC, que consagra o princípio da reposição natural, quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação. Dispõe o art.º 566º CC que a indemnização é fixada em dinheiro sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor. Por outro lado, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e que teria nessa data se não existissem danos. Se não puder ser averiguado o valor exato dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados – art.º 566º/3 CC. A indemnização em dinheiro tem carácter subsidiário, conforme decorre do disposto no art.º 562º CC, motivo pelo qual apenas tem lugar nas situações previstas no art.º 566º CC. Considerando que a indemnização visa reparar o dano e que o montante arbitrado deve reparar os danos do lesado caso não tivesse ocorrido a lesão e não se questionando o nexo de causalidade, é forçoso concluir perante os factos provados que no cálculo da indemnização se justificava considerar os danos no chão da cave e o montante que se provou para a sua reparação. Desta forma, a sentença não merece censura ao considerar os danos em causa. - Nas conclusões de recurso, sob os pontos 26 e 27, considera a apelante que a concluir-se pela verificação dos danos e uma vez que a autora junta meros orçamentos se devia relegar para ulterior momento a fixação do montante da indemnização, qual fosse a da realização dos trabalhos e seu pagamento. Pretende a apelante que se relegue a fixação da indemnização para o momento em que se mostrem realizados os trabalhos. Determina o art.º 609º nº 2 do CPC: “Se não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo na condenação imediata na parte que já seja líquida”. O preceito não tem aplicação quando, na ação declarativa, não tenha resultado provado a existência de danos. Nesse caso, formou-se caso julgado material quanto à inexistência de danos, não podendo a questão voltar a ser discutida. Contudo, provando-se a existência de danos, como acontece no caso presente e quantificados os danos, não se justifica relegar para liquidação a sua fixação. - Por fim, no ponto 28 das conclusões de recurso, considera a apelante que se justificava proceder à redução do montante da indemnização, por aplicação do regime previsto no art.º 570º CC, porque no caso dos rufos no telhado, os danos aguardam reparação há mais de dois anos (pelo menos seis), face ao agravamento dos danos, pelo decurso do tempo. Trata-se de uma questão nova, que não cumpre ao tribunal de recurso apreciar. O recurso consiste no pedido de reponderação sobre certa decisão judicial, apresentada a um órgão judiciariamente superior ou por razões especiais que a lei permite fazer valer[7]. O recurso ordinário (que nos importa analisar para a situação presente) não é uma nova instância, mas uma mera fase (eventualmente) daquela em que a decisão foi proferida. O recurso é uma mera fase do mesmo processo e reporta-se à mesma relação jurídica processual ou instância[8]. Dentro desta orientação tem a nossa jurisprudência[9] repetidamente afirmado que os recursos visam modificar decisões e não criar soluções sobre matéria nova. O tribunal de recurso vai reponderar a decisão tal como foi proferida. Podemos concluir que os recursos destinam-se em regra a reapreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, apenas se excetuando: o caso da verificação de nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia (artigo 615º, nº 1, alínea d), do CPC); a existência de questão de conhecimento oficioso; a alteração do pedido, em segunda instância, por acordo das partes (artigo 265º do CPC); e a mera qualificação jurídica diversa da factualidade articulada. Verifica-se que os factos e novos argumentos que a apelante vem introduzir nas conclusões do recurso não podem ser considerados, pois constituem factos novos, já que em sede de contestação não foram alegados. Se os novos factos e os novos fundamentos de sustentação da defesa resultaram da discussão da causa, recaía sobre as partes ao abrigo do art.º 5º/2 CPC, suscitar junto do tribunal “a quo”, a sua consideração em sede de decisão, o que também não ocorreu. Conclui-se, assim, nos termos do art.º 627º CPC que nenhuma relevância merece, nesta sede, os factos novos que a apelante vem alegar e bem assim, os novos fundamentos de sustentação da sua defesa, pois os mesmos não foram considerados na decisão objeto de recurso e não são de conhecimento oficioso, sendo certo que ao tribunal de recurso apenas cumpre reapreciar as matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal “a quo“ ficando por isso vedado a apreciação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada). Tal como o juiz da 1ª instância, em sede de recurso, o tribunal “ad quem” está limitado pelo pedido e seus fundamentos e pela defesa tal como configurados na ação, motivo pelo qual está impedido de conhecer do objeto do recurso nesta parte. Improcedem as conclusões de recurso sob os pontos 18 a 28. - - Do valor do IVA à taxa legal - Na última questão colocada pela apelante, sob os pontos 29 e 30 das conclusões de recurso, considera a apelante que constando os valores da condenação de meros orçamentos não deveria a ré ser condenada no pagamento do respetivo IVA, o qual apenas é devido após emissão da fatura recibo e depois de realizado o serviço e efetuado o pagamento. Como se começou por referir, a obrigação de indemnização no domínio do direito civil visa reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (art.º562º do CC). Se a indemnização for em dinheiro, como sucede no caso dos autos, terá “como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem danos” - art.º 566º, nº 2, do CC. Em princípio, este é o regime aplicável ao seguro de danos (art.º 123º e segs., em especial o art.º 128º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro – Decreto-Lei nº 72/2008, de 16 de Abril), sendo precisamente essa a natureza do seguro em causa nestes autos. O Imposto sobre o Valor Acrescentado é um imposto geral sobre o consumo e tem natureza indireta, incidindo sobre as diversas fases do circuito económico. Em termos de incidência objetiva, na parte relevante para os autos, segundo o art.º 1º, nº 1, al. a), do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA), estão sujeitas a este imposto “as transmissões de bens e as prestações de serviços efetuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal”. No que respeita à sua incidência subjetiva, regulada principalmente no art.º2º do CIVA, é sujeito passivo do imposto, em geral, a pessoa que opere o ato comercial como transmitente do bem ou prestador do serviço tributável. O imposto torna-se exigível logo que verificado o facto gerador (arts. 7º e 8º do CIVA) e é ao respetivo sujeito passivo que compete a obrigação de entregar na administração fiscal o montante do imposto exigível (art.º 27º do CIVA). No caso concreto, a reparação dos danos no imóvel resultantes do sinistro será realizada por terceira pessoa e quando for prestado o respetivo serviço ser-lhe-á exigido, por devido face ao disposto nos artigos 1º, nº 1, al. a), 7º, nº 1, al. b), 8º e 27º, todos do CIVA, o montante correspondente ao IVA. O pagamento dos serviços a prestar impõe também o pagamento do IVA liquidado sobre aquela retribuição, o que significa que a indemnização do respetivo dano engloba o montante daquele imposto. Trata-se de um valor que será necessariamente cobrado futuramente à autora que terá de ter disponibilidade financeira para o suportar, pelo que se integra ainda no conceito de dano decorrente do sinistro (v. artigo 128º do RJCS), indemnizável ao abrigo do contrato de seguro. Como se observa no Ac. Rel. Porto 24 de outubro de 2022, Proc. 2015/21.6T8STS.P1 (acessível em www.dgsi.pt): “[o] dano não será reparado se a respetiva indemnização não integrar o custo total que os segurados, enquanto consumidores (na qualificação fiscal/tributária), terá que despender com a prestação do serviço (ou a aquisição do bem). E no custo total está integrada uma parcela, regra geral de 23% sobre a contrapartida devida pela prestação do serviço, correspondente ao imposto que será exigido pelo prestador do serviço aos Autores”. Prosseguindo refere-se, ainda, que “[…] a questão coloca-se a montante da relação tributária, que se estabelece entre o prestador do serviço (ou o transmitente do bem) e a Autoridade Tributária e Aduaneira, logo no âmbito da relação jurídica civil, resultante do contrato de seguro, na medida em que a indemnização tem que contemplar o necessário para alcançar a reparação do dano, em termos de reconstituição da situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”. O facto do montante da indemnização se mostrar calculado a partir de orçamentos, não invalida este raciocínio, porque como se refere no Ac. Rel. Porto, 31 de março de 2009, Proc. 254/07.1TBSJM (acessível em www.dgsi.pt): “[n]o montante da indemnização a pagar pela seguradora atinente à reparação dos danos ocorridos na habitação há que incluir o valor do IVA devido pela aquisição dos materiais e serviços necessários à realização dessas obras, ainda que aquele montante seja calculado com base em estimativas ou orçamentos”. Como se considera no Ac. STJ 04 de abril de 2024, Proc. 2079/19.2T8VRL.G1.S2 (acessível em www.dgsi.pt): “I – Na quantificação da obrigação de indemnizar a cargo de uma seguradora, gerada pela concretização do risco por ela assumido através de um contrato de seguro de danos, deve usar-se o critério do volume de dinheiro que seja necessário ao lesado despender para poder repor ou restaurar o estado de coisas como seriam sem dano; II – O imposto sobre o valor acrescentado, com génese na transmissão de bens ou prestação de serviços, tem por único sujeito passivo, a quem onera o vínculo de o pagar à administração fiscal, o transmitente dos bens ou o prestador dos serviços; III – Ao repercutir-se na retribuição que é necessário despender para conseguir, mediante a aquisição de algum bem ou a execução de tarefa, repor ou restaurar a esfera patrimonial lesada, o IVA integra o encargo global devido sem o qual a reposição ou restauração patrimoniais não são atingidas”. No âmbito da concretização da prestação devida pela seguradora, tem que ser considerado o valor global que a autora irá despender com a reparação dos danos, o que necessariamente inclui o valor que lhe será exigido a título de IVA. Sem a atribuição desse valor global a reposição ou restauração patrimonial não são atingidas, motivo pelo qual, não merece censura a sentença quando arbitrou a indemnização considerando no seu montante o valor devido a título de Imposto sobre o Valor Acrescentado. Improcedem as conclusões de recurso sob os pontos 29 e 30. - Nos termos do art.º 527º CPC as custas são suportadas pela apelante. - III. Decisão: Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença. - Custas a cargo da apelante. * (processei, revi e inseri no processo eletrónico – art.º 131º, 132º/2 CPC) Assinado de forma digital por Ana Paula AmorimEugénia Cunha Anabela Morais __________________ [1] Texto escrito conforme o Novo Acordo Ortográfico de 1990. [2] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos em Processo Civil, 7ª edição atualizada, Coimbra, Almedina, 2022, pág. 333-335. [3] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Temas da Reforma de Processo Civil, vol. II, Coimbra, Almedina, Janeiro 2000, 3ª ed. revista e ampliada, pág. 272. [4] JOSÉ ALBERTO DOS REIS Código de Processo Civil Anotado, vol. IV, Coimbra Editora, Coimbra, pág. 569. [5] Ac. Rel. Guimarães 20.04.2005 - www.dgsi.pt. [6] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos em Processo Civil, 7ª edição atualizada, Coimbra, Almedina, 2022, pág. 333-334. [7] CASTRO MENDES Direito Processual Civil – Recursos, ed. AAFDL, 1980, pág. 5. [8] CASTRO MENDES, ob. cit., pág. 24-25 e ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil, vol V, pág. 382, 383. [9] Cf. os Ac. STJ 07.07.2009, Ac. STJ 20.05.2009, Ac. STJ 28.05.2009, Ac. STJ 11.11.2003 Ac. Rel. Porto 20.10.2005, Proc. 0534077 Ac. Rel. Lisboa de 14 de maio de 2009, Proc. 795/05.1TBALM.L1-6; Ac. STJ 15.09.2010, Proc. 322/05.4TAEVR.E1.S1 (www.dgsi.pt) |