Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | FÁTIMA ANDRADE | ||
Descritores: | PROCESSO DE EXPROPRIAÇÃO JUSTA INDEMNIZAÇÃO LAUDO DOS PERITOS | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RP20240909182/19.8T8MAI.P1 | ||
Data do Acordão: | 09/09/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMAÇÃO | ||
Indicações Eventuais: | 5. ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - No processo de expropriação a justa indemnização visa compensar o expropriado pelo prejuízo que lhe advém da expropriação. II- O critério adequado para aferir o mencionado prejuízo tem como ponto referencial o valor corrente, venal ou de mercado do bem. III - Valor indemnizatório que terá por referência o valor do bem expropriado à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data –vide artigo 23º nº 1 do Código de Expropriações (CE). IV - Atenta a especificidade técnica que em sede avaliativa o processo expropriativo implica, o tribunal deve aderir, em princípio, ao parecer dos peritos, dando preferência quando entre estes haja unanimidade, ao laudo dos peritos indicados pelo tribunal pela pressuposta independência e imparcialidade que a sua posição garante. V - A indemnização devida pela expropriação de terreno integrado na Reserva Agrícola Nacional (RAN) e inserido no Plano Diretor Municipal (PDM) em solo rural - espaço canal, destinado a construção de infraestrutura rodoviária, não pode ser fixada por recurso ao critério previsto no artigo 25º nºs 1 e 2 al. a) e 26º, nomeadamente pelo seu nº 12, mas antes de acordo com o critério definido pelo artigo 27º do CE, enquanto solo para outros fins. | ||
Reclamações: | |||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Processo nº. 182/19.8T8MAI.P1 3ª Secção Cível Relatora – M. Fátima Andrade Adjunto – Jorge Martins Ribeiro Adjunto – José Eusébio Almeida
Tribunal de Origem do Recurso – Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Jz. Local Cível da Maia
Apelantes / AA e outros Apelada/ IP – Infra Estruturas de Portugal, S.A.
Sumário (artigo 663º n.º 7 do CPC). …………………………………….. …………………………………….. ……………………………………..
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto
I- Relatório Por despacho nº 1132/2018 do Secretário de Estado das Infraestruturas de 11/1/2018 publicado no Diário da República 2ª S., nº 22 de 31/01/2018, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação (entre outras) da seguinte parcela, necessária à construção da obra da EN 14 – Maia (Nó do Jumbo) /Via Diagonal: - Parcela 45, pertencente a BB e outros, a destacar do prédio rústico com a área total de 5.755 m2, sito na freguesia ..., concelho da Maia, descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial da Maia sob o n.º ...75/... (...) e inscrito na matriz rústica daquela freguesia sob o artigo ...05º (vide doc. 1 junto com a p.i.).
* Foi realizada a vistoria ad perpetuam rei memoriam e lavrado o respetivo auto em abril de 2018 (vide doc. 17 junto com a p.i.). Deste constando: - que o prédio do qual será destacada a parcela a expropriar com a área de 5755m2 tem a área total de 13600m2. - prédio que embora se situe em solo agrícola tem “os seus limites na transição para as áreas urbanas”. Sendo a parcela a expropriar “com 5755m2 de topografia plana ocupada com culturas de regadio. É afetada uma construção agrícola de pedra e uma eira. A propriedade encontra-se vedada com muro em pedra armada nas confrontações com os arruamentos. A parcela tem uma configuração irregular, decorrente do traçado do arruamento a construir. 3.3 Infraestruturas O prédio confronta com estrada pavimentada a blocos de granito, dispondo de redes públicas de água, eletricidade, telefone e saneamento.” - “5. Classificação segundo o Plano Diretor Municipal (PDM) Segundo o PDM da Maia, aprovado em Assembleia Municipal de 18 de dezembro de 2008 e publicitado pelo Aviso n2 2383/2009 publicado no Diário da Republica nº 17, 2g série, de 26 de janeiro de 2009, a parcela localiza-se em Solo rural, espaços agrícolas - áreas agrícolas fundamentais na RAN. A versão atual do PDM é a que resulta da alteração aprovada pela Assembleia Municipal em 30 de abril de 2013 e publicitada pelo Aviso nº 9751/2009 publicado no Diário da Republica nº 145, 2ª série, de 30 de julho de 2013.”
Este auto, após reclamações apresentadas, foi alvo de esclarecimentos/aditamentos em 24/05/2018, conforme doc. 24 junto com a p.i. (por requerimento de 18/01/2019).
* Em 13/06/2018 a entidade expropriante tomou posse administrativa da parcela referida (ao abrigo do disposto nos artigos 15º e 19º a 22º do C. Expropr.), em tal auto assim descrita: “parcela de terreno n.° 45, com área de 5755 m2, que confronta a norte com Rua ..., a sul com parcela 44 e Travessa ..., a nascente com parte restante do prédio e parcela 46 e a poente com Rua ... e parcela sobrante 45S, a destacar do prédio rústico, situado na freguesia ..., concelho da Maia, inscrito na matriz predial Rústica da mesma freguesia sob o artigo ...05, e descrito nesta Conservatória do Registo Predial da Maia sob o n.º ...75/... (...)” (vide doc. 29 junto com a p.i.). * Não tendo sido possível obter acordo quanto ao valor das indemnizações, teve lugar a arbitragem, de acordo com o preceituado no art. 38º, n.º 1 do Cód. das Expropriações, no âmbito da qual foi elaborado o respetivo relatório e proferido Acórdão Arbitral em 22/10/2018 que por unanimidade decidiu atribuir: - aos expropriados a indemnização de 91.163,13 € (NOVENTA E UM MIL, CENTO E SESSENTA E TRÊS EUROS E TREZE CÊNTIMOS) [vide doc. 51 junto com a p.i. a que corresponde o Relatório e respetivo Laudo de Arbitragem “que serviu de base ao cálculo da indemnização estipulada”]. * Efetuados os depósitos pela entidade expropriante nos termos do artigo 20º do CE no valor de € 92.040,00 (em montante superior, portanto ao que posteriormente foi fixado pelo Acórdão Arbitral, pelo que não houve lugar ao cumprimento do previsto no artigo 51º nº 1 do CE) e remetidos os autos a juízo, foi adjudicada a propriedade das parcelas expropriadas à entidade beneficiária da expropriação. * Notificados nos termos do art.º 51, n.º 5, 2ª parte do Cód. das Expropriações, vieram os expropriados BB e os expropriados CC e outros interpor recurso das decisões arbitrais. Tendo ainda: - o recorrente BB requerido a expropriação da parcela sobrante do lado Poente denominada “45S” e assinalada nas plantas topográficas dos autos apresentadas pela expropriante com a área de 607 m2, nos termos do artigo 3º do CE. A final pugnando pela fixação do valor indemnizatório às parcelas expropriadas nºs 45 e 45S de € 547.354,63, devendo o Recorrente ser indemnizado com o valor de 136.838,66 Euros, a ser atualizado à data da decisão final nos termos do artigo 24º n.º 1 do Código das Expropriações - e os recorrentes CC e outros igualmente requerido a expropriação da parcela sobrante designada como pela expropriante como parcela “45S”, a ser avaliada nos exatos termos por si defendidos para a parcela expropriada 45. A final pugnando pela fixação do valor indemnizatório “pela expropriação litigiosa da parcela denominada de nº 45 necessária à execução da obra EN 14 - Maia (Nó do Jumbo / Via Diagonal), no montante que se vier a concluir ser o correto pelo menos em € 741 265,15 (setecentos e quarenta e um mil, duzentos e sessenta e cinco euros e quinze cêntimos), caso o solo seja classificado como solo apto para construção ou, em alternativa, em pelo menos em € 229 731,25 (duzentos e vinte e nove mil, setecentos e trinta e um euros e vinte cinco cêntimos), caso o solo venha a ser classificado como solo apto para outros fins.”
Admitidos os dois recursos interpostos e notificada a expropriante para responder, apresentou a mesma resposta a ambos os recursos. * O pedido de expropriação da parcela sobrante poente (parcela 45S), foi deferido por decisão de 24/06/2019, adjudicando “ao Estado Português, livre de quaisquer ónus ou encargos, a propriedade da parcela n.º 45S, com a área de 607m2, que confronta do Nascente e do Sul com o domínio público (parcela expropriada n.º 45), do Norte com estrada (Rua ...) e do Poente com estrada (Rua ...), a destacar da parte rústica do prédio misto situado no lugar de ..., freguesia ..., concelho da Maia, descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial da Maia sob o n.º ...75/... (...) e inscrito na matriz rústica daquela freguesia sob o artigo ...05º. Cumpra-se o disposto no art. 51º6 do C. Exp.” Nesta mesma decisão tendo sido: - notificada a expropriante para em “30 dias depositar a indemnização correspondente à expropriação desta parcela, pelo montante em que há acordo (607m2 x 8,50€ = 5.159,50€.”; - atribuída a indemnização aos expropriados na parte em que há acordo, no montante de “91.163,13 + 5.159,50€ = 96.322,63€.” - fixado o valor dos recursos de “CC e outros tem o valor de 741.265,15 - 96.322,63€ = 644.942,52€ E o de BB de 547.354,63€ - 96.322,63€ = 451.032,00€.” - quanto à divisão da indemnização pelos expropriados tendo sido decidido: “Questão diferente é a da entrega da indemnização aos expropriados. Faz-se nos termos dos art.s 37º ex vi art. 73º, 1, C.Exp. Pelo que para ser atribuída individualmente, devem os expropriados dizer como deve ser dividida. Ou indicar uma pessoa a quem seja entregue a totalidade. Senão terá que ser consignada em depósito. Sem embargo do acima referido, e se nada for dito em contrário, face ao que decorre dos dois recursos, a repartição entre CC e os outros, por um lado, e BB, por outro, será feita em 3/4 para os primeiros e 1/4 para este último.”
Nada tendo sido oposto a esta divisão, foi ordenada a entrega das quantias indemnizatórias sobre a qual existiu acordo (vide ainda despachos de 22/10/2019, 29/01/2020 e de 22/04/2020). * Após realização de diligências instrutórias e nomeadamente informações solicitadas junto da CMM, foi ordenada a realização de perícia para avaliação da parcela expropriada e resposta aos quesitos apresentados (vide despacho de 17/09/2021. Foi junto relatório pericial em 21/03/2022. Pedidos esclarecimentos, foram prestados em 15/06/2022 pelo perito indicado pelos expropriados, DD. Tendo os demais Srs. Peritos (nomeados pela expropriante e pelo tribunal) prestado os esclarecimentos em 25/07/2022. Após o que e já em audiência, prestaram ainda esclarecimentos requeridos pelos expropriados (vide despacho de 29/09/2022 e ata de audiência de 28/11/2022). Finda a produção de prova em audiência, foram as partes notificadas para apresentarem alegações por escrito (o que fizeram – vide artigo 64º do CE). Após o que foi proferida sentença em 25/01/2023, decidindo a final: “90. Julgam-se os recursos parcialmente procedentes e fixa-se a indemnização em 97.953,00€ (noventa e sete mil novecentos e cinquenta e três euros). 91. No mais, improcedem os recursos. 92. A indemnização será atualizada de acordo com o disposto no art. 24º, 1, CE. 93. Custas por ambas as partes na proporção do decaimento. 94. Valor dos recursos: o fixado no despacho de 24/6/2019 95. Registe e notifique. 96. Após trânsito, remeta cópia da decisão aos peritos (art. 19º do DL nº 125/2002, de 10/5).” * * Do assim decidido apelaram os expropriados, oferecendo alegações e formulando as seguintes
Conclusões: “I. Estamos perante uma classificação dolosa, perante uma manipulação das regras urbanísticas. II. Este solo nunca esteve em RAN desde a criação desta em 1982, sendo antes terreno urbano e apto para a construção. III. Só e 2009 passou para a RAN quando se sabia que ia ser sacrificado para a via. IV. Onde estava a proteção pura dos solos bons para agricultura, 27 anos depois da criação da RAN? V. Esta parcela tem de ser avaliada nos termos do nº 12 do artigo 26º do código. VI. Está prevista para a via no PDM em vigor á data da DUP, e preenche os requisitos da alínea a) do nº 2 do artigo 25º do código para ser solo apto para construção VII. E está na família pelo menos desde 1975 como a caderneta predial demonstra ao referir o nome dum antepassado dos expropriados (o avô) VIII. A sentença recorrida não elencou como factos provados factos relevantes, a saber. “Esta expropriação concretiza uma previsão para o local com muitas décadas”. A Variante à EN14 é uma obra que está prevista no PDM da Maia aprovado em 17 de maio de 1994, está implicitamente a deixar demonstrado que a expropriação concretiza uma obra para aquele local de muitos anos. IX. “O traçado deste novo troço da EN 14 está previsto no PDM da Maia na planta da hierarquia viária, e a E.N. 14 está integrada no PRN 2000”. X. De facto, “O projeto de execução foi precedido dum Estudo Prévio da Variante à EN 14 por despacho nº 159/200, publicado no Diário da República, II série, de 23/07/2010” XI. A propriedade já está na família há gerações (na matriz estava em nome dos pais desde 1975 XII. A estação do metro do ... dista cerca de 800 metros do prédio”. XIII. “o prédio se situava em linha reta cerca de 1000 metros do centro do ... e a cerca de 2800 metros da sede do concelho”. XIV. E, segundo o PDM da Maia a parcela expropriada insere-se na carta de ordenamento em espaço canal. XV. A inserção em RAN é incompatível com a inserção simultânea em espaço canal (a inserção neste exclui naquela). XVI. Por sua vez, e no que respeita às características da envolvente do prédio expropriada, resulta referido pelos senhores Peritos que a parcela dista cerce 800 metros da Estação de Metro ..., realidade que tem de ser aditada aos factos provados como complemento do artigo 46 do mencionado elenco. XVII. Também e como complemento do que resulta selecionado pela sentença recorrida, o tribunal também tinha que ter atendido a que o prédio se situava em linha reta cerca de 1000 metros do centro do ... e a cerca de 2800 metros da sede do concelho. XVIII. Mais, e no ainda diz respeito à análise da matéria de facto, o Tribunal não considerou que o prédio está na família antes da publicação do PDM em vigor e inclusivamente muito antes do primeiro PDM da Maia de 1994, elemento este que se assume da maior relevância nomeadamente para a classificação do solo expropriado. XIX. O processo não está devidamente instruído, carecendo designadamente da avaliação como solo apto para construção, o valor da mina e o encargo com as vedações das sobrantes. XX. A EN 14 está incluída no Plano Rodoviário Nacional (artigo 93º, nº1) e, entre outras, está incluída em espaços canais (artigo 98º, nº 1). XXI. O artigo 14º do 1º RPDM da Maia (DR, IIª Série, nº 114 de 17/05/1994) define os espaços canais das vias rodoviárias e previstas. XXII. A previsão em plano da via condiciona o aproveitamento urbano do solo definido para o canal. XXIII. O artigo 47º do 1º RPDM fixou uma zona non aedificandi para o corredor do espaço canal previsto. XXIV. O RJIGT determina que os planos de ordenamento do território sejam compatíveis, coerentes, prevalecendo os de âmbito territorial mais amplo sobre os restritos. XXV. A presente expropriação implicou a alteração do traçado da antiga EN14 no troço em causa e implicou a desclassificação do traçado que foi substituído. XXVI. A EN14 faz parte integrante do PRN 2000, da rede rodoviária nacional. XXVII. O atual regime jurídico da RAN, vigente à data da DUP, e hoje, delimita as áreas da RAN no PDM e as alterações à sua delimitação só pode ocorrer por alteração do PDM ou do Plano Intermunicipal. XXVIII. O regime jurídico da RAN permite a construção em RAN, em duas fases, a primeira com um simples parecer prévio favorável e subsequente exclusão com a alteração posterior do PDM. XXIX. Naturalmente que o parecer prévio favorável, destinando-se o terreno à construção não é compatível com a manutenção no RAN (por impossibilidade objetiva). XXX. Embora a exclusão, por razões formais, só ocorre mais tarde, já depois da obra concretizada, não tem retorno, até porque as obras implantadas (por exemplo uma estrada tem carácter de perpetuidade). XXXI. Ou por exclusão, por alteração da delimitação da área da RAN no PDM. XXXII. No caso dos autos e porque estamos perante uma obra da Rede Rodoviária Nacional, incluída no PRN, pelo que a atualização do PDM ocorre de imediato, face à adequação que ocorre no plano inferior, o que tem como consequência a exclusão do RAN (uma espécie de revogação do plano inferior, o PDM). XXXIII. Acontece que, no caso dos autos, a via, o Traçado da Variante já estava previsto no plano não só no PDM de 1994 como no atual. XXXIV. E, face à incompatibilidade de coexistência entre o RAN e o espaço canal (uma inserção exclui a outra pela própria natureza das coisas) a parcela à data da DUP já não estava no RAN, mas em espaço canal. XXXV. O PDM distingue os espaços agrícolas dos espaços canais. XXXVI. O RJIGT impõe a obrigatoriedade de se edificar de acordo com o previsto em plano de ordenamento sob a cominação da nulidade do ato que aprovar. XXXVII. A inclusão da EN14 no PRN e aprovação do novo Traçado pelas I.P. definiram, cristalizaram no PRN o Traçado. XXXVIII. E este impõe-se aos planos inferiores, embora no caso coincidem por já haver um Estudo Prévio aprovado desde 2010 e publicado no Diário da República. XXXIX. A previsão do Traçado antes do RPDM, a inclusão dele no 1º PDM e a aprovação do Estudo Prévio em 2010, e a manutenção no atual PDM – planta da hierarquia viária, condicionaram o aproveitamento da parcela. XL. Estamos perante uma expropriação do plano. XLI. A não existência de uma avaliação da parcela com base nestes parâmetros demonstra a insuficiência da instrução deste processo. XLII. Não fazendo sentido indemnizar com base numa limitação que já não existe nem pode ser prosseguida para todo o sempre. XLIII. Esta solução implica, a prevalecer, violação do princípio da igualdade, na vertente interna já que a adquirente aplica o solo para a concretização de infraestrutura e, no entanto, paga pelo valor do rendimento fundiário. XLIV. Outra insuficiência do processo está relacionada com a mina que existia na parcela expropriada. XLV. Trata-se de questão que foi suscitada na vistoria ad perpetuam rei memoriam e que o perito vistor não confirmou, nem procurou apurar. Também todos os demais senhores peritos não apuraram a existência da mina, as suas características e os prejuízos que a sua afetação com a expropriação teve para os expropriados. XLVI. Perante a omissão da prova técnica cabia ao Tribunal determinar o apuramento de tal factualidade o que também não fez. Estamos perante uma insuficiência de instrução, cujo valor tem de ser relegado para incidente de liquidação. XLVII. Por fim, um outro motivo de discordância prende-se com a não condenação da expropriante a indemnizar o encargo com a vedação da parcela sobrante. XLVIII. Contrariamente ao que foi decidido, não se trata de questão nova, mas um complemento do que já havia sido suscitado pelos expropriados. Com o término da obra constatou-se que a expropriante não procedeu à vedação da sobrante, daí impor-se-nos pedir o valor que nos vai custar tal tarefa. XLIX. O facto considerado como não provado está perfeitamente demonstrado, pois resulta óbvio que a via condicionou a classificação do solo. Nestes termos e nos melhores de Direito que Vªs Ex.ªs mui doutamente suprirão deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente ser fixada a justa indemnização nos exatos termos defendidos.” * Contra-alegou a expropriante, em suma pugnando pela improcedência do recurso e confirmação da decisão recorrida, aduzindo as seguintes “Conclusões: 1.ª – Tendo os apelantes deixado de fora do âmbito do recurso a questão do valor indemnizatório fixado na sentença (cf. a motivação e as conclusões do recurso) e não podendo, por isso, a Relação pronunciar-se sobre a questão, não se vislumbra que utilidade possa ter a apreciação, pela Relação, das questões que constituem objeto do recurso e elencadas nas respetivas conclusões, as quais nunca poderiam ser senão instrumentais face à decisão de mérito sobre a fixação do valor indemnizatório, que constitui o objetivo do processo nesta fase. Donde, a necessária improcedência do presente recurso (supra, I). 2.ª – Improcede inteiramente a impugnação da matéria de facto (supra, II): a) Conclusão VIII (“previsão de muitas décadas”): não provado. b) Conclusão IX (“previsão na planta de hierarquia viária”): não foi indicada prova, acarretando a rejeição (art.º 640.º, n.º 1 e 2 CPC); repetição face ao que já está dado como assente no ponto 47 da sentença. c) Conclusão IX (“integração da EN14 no PRN 2000”): irrelevante. d) Conclusão X (“aprovação do estudo prévio”): irrelevante. e) Conclusão XI (“antiguidade da aquisição”): não foi indicada prova, acarretando a rejeição (art.º 640.º, n.º 1 e 2 CPC); nada mais se provou do que aquilo que já está dado como assente no ponto 48 da sentença. f) Conclusão XII (“distância ao metro”): não provado; não justificada a relevância da alteração. g) Conclusão XIII (“distância ao centro do ... e à Maia”): não justificada a relevância da alteração; que entraria em contradição com o que foi dado como assente nos pontos 44 e 45 da sentença. h) Conclusão XIV (“inserção em espaço canal”): este pedido de alteração não consta da motivação; não foi indicada prova, acarretando a rejeição (art.º 640.º, n.º 1 e 2 CPC); já abrangido pelo ponto 40 da sentença; irrelevante. i) Conclusão XV (“incompatibilidade entre espaço canal e RAN”): não é matéria de facto. j) Conclusão XLIX (“condicionamento da classificação do solo / classificação dolosa”): não foi indicada prova, acarretando a rejeição (art.º 640.º, n.º 1 e 2 do CPC); não provado. 3.ª – A alegação de que o terreno não estaria inserido na RAN à data da DUP não tem cabimento e é feita em flagrante oposição à prova produzida no processo, estando, aliás, a inserção do terreno na RAN dada como provada nos pontos 41 e 49 da sentença, que não foram impugnados pelos apelantes (supra, III). 4.ª – Bem andou a sentença ao concluir que o solo expropriado devia ser avaliado como “solo para outros fins”, em consonância, aliás, com o ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA N.º 6/2011, de 7 de abril de 2011 (supra, IV). 5.ª – A norma do art.º 26.º, n.º 12 do CE é inaplicável no caso concreto, conclusão esta a que teria de se chegar mesmo que não existisse o ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA N.º 6/2017, de 11 de maio de 2017, já que o caso não se subsume à previsão da norma e não há analogia entre a situação nela prevista e a situação do caso concreto, afastando a possibilidade da sua aplicação analógica (supra, V). 6.ª – Quanto à pretensa “mina” (conclusões XLIV a XLVI), não foi peticionada nenhuma quantia a este título no recurso da arbitragem; ainda que assim não fosse, não se provou a existência de tal “mina”, sendo que os próprios expropriados, presentes na vistoria, não indicaram ao perito a sua localização. E, não tendo os expropriados requerido qualquer prova sobre este ponto, tendo eles o ónus da prova, não faz qualquer sentido alegarem que «cabia ao Tribunal determinar o apuramento de tal factualidade» (supra, VI). 7.ª – No recurso da decisão arbitral, os expropriados não reclamaram qualquer indemnização a título de vedação da sobrante (conclusões XLVII e XLVIII). A questão só foi invocada em sede de alegações finais, mediante uma “ampliação do pedido” manifestamente improcedente, como bem decidiu o Tribunal a quo. Ainda que assim não fosse, a questão teria de improceder, por falta de prova, porque o prédio só estava parcialmente vedado à data da DUP e porque resultou da prova que a sobrante do prédio foi vedada (supra, VII). 8.ª – Improcede a alegação de que o processo não estaria «devidamente instruído», porque faltaria a «avaliação como solo apto para construção, o valor da mina e o encargo com a vedação das sobrantes» (conclusão XIX) (supra, VIII). Nestes termos, o recurso deverá ser declarado totalmente improcedente.” *** O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.[1] Foram colhidos os vistos legais. *** II- Âmbito do recurso. Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta das formuladas pelos apelantes serem questões a apreciar: i- Omissão de factos com relevo para a decisão [vide conclusões VIII a XVIII]. E observância dos ónus de impugnação e especificação; ii- Se existe fundamento para avaliar e indemnizar os recorrentes com o encargo da vedação da parcela sobrante, bem como pela alegada existência de uma mina. iii- Se os critérios seguidos para o cálculo indemnizatório aos expropriados merecem censura.
*** III- Fundamentação Foram julgados provados os seguintes factos: “22. Por despacho do Secretário de Estado das Infraestruturas de 11/1/2018 publicado no Diário da República nº 22, de 31/1/2018, 2ª série, foi declarada a utilidade pública, com carácter de urgência, da expropriação da parcela nº 45, necessária à construção da obra da EN 14 – Maia (Nó do Jumbo) /Via Diagonal. 23. A parcela n.º 45 corresponde a um terreno com a área de 5.755m2, que confronta do Norte com estrada (Rua ...), do Sul com BB, do Nascente com a parte restante do prédio e do Poente com a parte restante do prédio e com estrada (Rua ...), 24. Parcela a destacar da parte rústica do prédio misto com a área de 12.896m2 situado no lugar de ..., freguesia ..., concelho da Maia, descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial da Maia sob o n.º ...75/... (...) e inscrito na matriz rústica daquela freguesia sob o artigo ...05º. 25. O prédio confronta com a Rua ..., por norte, com a Rua ... (Travessa ...) e outro, por sul, e com a Rua ..., a poente. 26. A parcela insere-se em solo agrícola e situa-se nos seus limites na transição para áreas urbanas. 27. O prédio está num local predominantemente urbano onde coexistem edifícios antigos de tipologia unifamiliar com edifícios mais recentes com tipologias multifamiliares com comércio e serviços, e com algumas bolsas de zonas agrícolas e zonas florestais. 28. A edificação mais próxima, uma morada unifamiliar em frente ao prédio, fica a sete metros, do outro lado da rua. 29. O prédio localiza-se a cerca de 400m da atual Via Diagonal, a 1,0 Km da EN 14, a 2,9 Km do nó de acesso à A41 e a 3,5 Km da sede do concelho da Maia. 30. A parcela, com topografia plana e configuração irregular alongada, estava ocupada com culturas de regadio. 31. A propriedade encontrava-se vedada com muro em pedra armada nas confrontações com os arruamentos com a extensão: na Travessa ... (junto ao edifício e eira): 19m; na Rua ... 60m; na Rua ...: 74m. 32. Altura média: 1m e a espessura: 0,35m. 33. O prédio confronta com estrada pavimentada a blocos de granito, dispondo de redes públicas de água, eletricidade, telefone e saneamento ligado a estação de tratamento de esgotos. 34. Na extremidade sul existe uma construção de pedra com 55m2 (10 x 5,5 metros) de área, acoplada a uma eira de piso cimentado com a área de 105m2 (10 x 10,5m). 35. Na extremidade norte, lado nascente existem três esteios com cerca de três metros e duas videiras velhas. 36. Resultaram da expropriação duas sobrantes, uma a nascente/sul com 6.534,00m2 e outra, de 607m2, a poente/norte. 37. Por despacho proferido nestes autos a 24/6/2019, foi deferido o pedido de expropriação desta última sobrante: Parcela n.º 45S, com a área de 607m2, que confronta do Nascente e do Sul com o domínio público (parcela expropriada n.º 45), do Norte com estrada (Rua ...) e do Poente com estrada (Rua ...). 38. Na delimitação desta sobrante existe um muro de pedra de vedação de alvenaria de pedra de granito com uma extensão total de 83,00ml, subdividida num troço com cerca de 38,00ml, e 0,95m de altura e noutro troço de 45,00ml de comprimento de 0,60m de altura em razoável estado de conservação. 39. A sobrante a nascente/sul mantém as mesmas características e cómodos do prédio inicial com exceção de espaço para arrumação de alfaias e produtos agrícolas que foi demolido. 40. Segundo o PDM da Maia, aprovado em Assembleia Municipal de 18 de dezembro de 2008 e publicitado pelo Aviso nº 2383/2009 publicado no Diário da Republica nº 17, 2ª série, de 26 de janeiro de 2009, a parcela localiza-se em Solo Rural, Espaços Agrícolas - Áreas Agrícolas Fundamentais, Estrutura Ecológica em solo rural e Espaços Canais. 41. Relativamente à carta de condicionantes, a parcela encontra-se abrangida por Servidões Administrativas e Restrições de Utilidade Pública, nomeadamente pela Reserva Agrícola Nacional (R.A.N.) 42. Nas imediações da parcela expropriada existem edifícios de um ou dois pisos destinados a habitação. 43. Não se detetam focos de poluição na área da envolvente da parcela. 44. A distância da parcela ao centro de ... (a zona junto à EN 14 a norte do entroncamento com a Via Diagonal) é de 700metros. 45. Na freguesia e no concelho em que o prédio se insere existem escolas e estabelecimentos de saúde como centro de saúde, clínicas de especialidades distintas, farmácia, policia, particularmente no centro cívico da Maia, zona da Camara Municipal, a 2700m. 46. Mais próximo, há a Escola Secundária ... a 500m; farmácia a 1000m, centro de saúde a 700m e estabelecimentos de comércio, restauração, no centro da freguesia já referido. 47. A via cuja declaração de utilidade pública foi declarada encontrava-se prevista no PDM da Maia, em vigor à data da declaração de utilidade pública. 48. No registo predial, os expropriados têm inscrição de aquisição a seu favor, por sucessão hereditária, pela Ap. ... de 5/11/2022. 49. O prédio expropriado está inserido na RAN desde a publicação do Aviso nº 2383/2009, de 26/1. 50. A Variante à EN 14 é uma obra que está prevista no PDM da Maia aprovado em 17/5/1994. 51. O prédio situa-se fora do perímetro urbano do ....”
Julgou ainda o tribunal a quo como não provada a seguinte factualidade “Factos não provados: 52. A previsão da construção da via no local condicionou a classificação dos solos de maneira a impedir que neles se construísse.”
*** *** Conhecendo. I- Cumpre em primeiro lugar apreciar o imputado erro à decisão de facto – por omissão de factos tidos por pertinentes pelos recorrentes.
A regularidade da impugnação (ou indicação de omissão de factualidade pertinente à decisão da causa) da decisão de facto, depende da verificação dos seguintes pressupostos: - obrigatoriamente e sob pena de rejeição deve o recorrente especificar (vide artigo 640º n.º 1 do CPC): “a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”. - no caso de prova gravada, incumbindo ainda ao(s) recorrente(s) [vide n.º 2 al. a) deste artigo 640º] “sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”. Sendo ainda ónus do(s) mesmo(s) apresentar a sua alegação e concluir de forma sintética pela indicação dos fundamentos por que pede(m) a alteração ou anulação da decisão – artigo 639º n.º 1 do CPC - na certeza de que estas têm a função de delimitar o objeto do recurso conforme se extrai do n.º 3 do artigo 635º do CPC. Pelo que das conclusões é exigível que conste, no mínimo, de forma clara quais os pontos de facto que o(s) recorrente(s) considera(m) incorretamente julgados – ou omitidos, sob pena de rejeição do objeto do recurso nessa parte. Podendo os demais requisitos serem extraídos do corpo alegatório.
Tendo presentes os pressupostos acima assinalados e analisadas as alegações de recurso e subsequentes conclusões, importa em primeiro lugar assinalar que os recorrentes afirmam a prova de alguns factos (ausentes da decisão de facto) que pretendem ver julgados provados, sem que efetivamente concretizem qual a prova documental ou outra que impõe ver tais factos julgados provados. Em causa nomeadamente a questão relativa à data desde a qual o prédio em questão já está na família (vide o alegado em 52 a 56 das alegações e conclusão XI). O que os recorrentes fundamentam por referência a uma escritura de partilha alegadamente outorgada em abril de 2004, sem que identifiquem onde e quando a mesma foi junta aos autos e submetida a contraditório [no recurso da decisão arbitral, os recorrentes CC e outro alegaram, aliás, tão só, que a parcela havia sido adquirida pelos expropriados muito antes da entrada em vigor do 1º PDM da Maia, por referência à inscrição do prédio na matriz deste 1975, data de inscrição que sem mais nada demonstra (vide o teor do doc. 4 junto a fls. 11 dos autos); de igual forma alegando o recorrente BB uma copropriedade do prédio por si e seus pais há mais de 30 e 40 anos, sem junção de prova documental do assim alegado]. A falta de concretização de tal meio probatório, afasta sem mais a pretensão dos recorrentes quanto ao por si alegado a este propósito. Sem prejuízo do que consta provado em 48 dos fp’s e que efetivamente merece correção por, de acordo com o teor da certidão da CRP que constitui doc. 5 junto a fls. 12 dos autos, ser o registo da aquisição da sucessão hereditária de 2002 e não 2022, como certamente por lapso se fez constar neste ponto 48 dos fp’2 que aqui assim se deixa corrigido. O ponto 48) dos fp’s passará assim a ter a seguinte redação: “No registo predial, os expropriados têm inscrição de aquisição a seu favor, por sucessão hereditária, pela Ap. ... de 05/11/2002”.
Quanto à localização do imóvel – vide o alegado em 59 a 62 do corpo alegatório – temos como provado o que consta em 44 a 46 dos fp´s, constando já que o prédio se situa a cerca de 2700 m da zona da Camara Municipal e a cerca de 700 metros do centro do ... – pelo que se não entende e não é pertinente o requerido e indicado em 62 do corpo alegatório [com correspondência na conclusão XIII]. Quanto à distância ao Metro que os recorrentes invocaram por referência ao teor do relatório pericial, temos que do mesmo - junto em 21/03/2022 - a distância concreta indicada ao Metro de 800 metros não foi reconhecida por todos os Srs. Peritos e apenas mencionada pelo perito nomeado pelos recorrentes (vide p. 27 do relatório), sem prejuízo da resposta por unanimidade constante da p. 42 do relatório – quanto a este equipamento e outros se localizarem a menos de 1500 metros da parcela expropriada. Tendo sido convocado apenas o relatório pericial como meio probatório para o aditamento pretendido e atenta a não apurada unanimidade do relatório quanto ao pretendido, vai indeferida a pretendida alteração em análise. Quanto às demais alterações, temos que a indicada em 30 das alegações e conclusão VIII, corresponde a um mero facto conclusivo, perante o que já consta provado em 47 e 50 dos factos provados. Correspondendo o indicado em 32 precisamente ao provado em 50. Tal como conclusivo é o facto indicado em 51 do corpo alegatório, atento o já provado e constante de 47 dos factos provados.
Não releva para o mérito dos autos o indicado em 47 do corpo alegatório, com tradução (este e o alegado em 51) na conclusão IX. Note-se que não é a EN 14 em si que está em causa nestes autos, mas antes o “nó do Jumbo” obra da «EN 14 – Maia (No do Jumbo) / Via Diagonal” por referência à Resolução de Expropriar aprovada em 2017. Vide declaração de utilidade pública com caráter de urgência de janeiro de 2018 junta como doc. 1 a fls. 5; ainda o parecer da Comissão de Avaliação – Processo AIA nº 2617 – junto a fls. 232 verso e seguintes do qual se extrai: - na respetiva introdução que o procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental solicitado em 2009 é relativo «ao projeto à variante à EN 14 – Maia (Nó do Jumbo) / Famalicão (Nó da Cruz do IP1/A3” em fase de estudo prévio; - no ponto 2 “Procedimentos para avaliação” consta que a instrução do processo AIA teve início a 12/10/2009; - no ponto 3 “Antecedentes” é dada nota de terem ocorrido em 1992 e 1995 anteriores estudos prévios “para variantes à EN 14” quer na área do Concelho da Trofa (Variante à Trofa) quer na área de Vila Nova de Famalicão (Variante de Famalicão entre o IC5/A7 e o Nó da Cruz da A3. Estudos que não tiveram prosseguimento. Após o que foram ainda desenvolvidos estudos em 2006 e 2007 a uma Variante à EN 14 os quais culminaram com Declaração de Desconformidade do EIA e encerramento do processo; - no Ponto 4 é mencionado o PRN 2000 para a EN 14 que liga Braga ao Porto. E pelas funções que a mesma EN 14 desempenha e constrangimentos que apresenta, a necessidade de “uma estratégia territorial regional” que dê solução aos constrangimentos assinalados. Sendo neste contexto que surge o projeto em avaliação – Variante à EN 14, com início nas proximidades do designado Nó do Jumbo, desenvolvendo-se nos termos assinalados no ponto 5.2 (solução Base e alternativas). Ainda de referir a assinalada intervenção com ocupação nomeadamente em área RAN (vide p. 54 do Parecer).
Valem estes considerandos para reafirmar de um lado que não é a EN 14 que está na base do processo expropriativo, antes uma variante à mesma. E esta variante ainda estava em estudo em 2009, não estando demonstrado que se encontrava prevista no PRN 2000. Motivo por que improcede também a pretendida alteração quanto a este ponto factual. Quer por para o mérito dos autos não relevar a EN 14. Quer por que a considerar a obra que é causa da DUP – a variante à EN 14 / Nó do Jumbo - não está provado que em 2000 a mesma já estivesse integrada no PRN 2000. Sem prejuízo do que já consta em 47 e 50 dos fp’s. Igualmente é de indeferir o aditamento indicado na conclusão X que visava aliás justificar o aditamento indicado na conclusão IX e acima já apreciado. Em suma, é de concluir pela total improcedência do pretendido aditamento de matéria factual à decisão de facto pugnada pelos recorrentes, sem prejuízo da retificação ordenada ao ponto 48) dos fp’s.
2) Em segundo lugar cumpre apreciar se existe fundamento para avaliar/indemnizar os recorrentes com o encargo da vedação da parcela sobrante e com a alegada existência de uma mina. Quanto ao encargo com a vedação da parcela sobrante é de reconhecer, sem mais, razão ao tribunal a quo quando afirma estar em causa questão nova. Com efeito, o dano em causa nunca foi assinalado pelos recorrentes nem, consequentemente, identificado no relatório pericial. Deste constando apenas avaliado, em conformidade com o que os recorrentes haviam oportunamente elencado como danos, o valor devido a título de benfeitorias (vide págs. 10, 23 e 35 do relatório), o qual mereceu o assentimento de todos os peritos. Em suma, por se tratar de questão nova antes e tempestivamente não colocada à apreciação do tribunal a quo, não pode a mesma tão pouco, ser agora apreciada em sede de recurso. Pelo que improcede esta pretensão. Improcedente é, igualmente, a pretensão dos recorrentes em verem-se indemnizados pelo valor correspondente a uma alegada existente mina. Aos recorrentes incumbia, desde logo, ter feito prova da existência de tal mina. Prova que não fizeram oportunamente, afastando como tal a possibilidade de qualquer indemnização a tal título. Note-se que no Auto de Vistoria ad perpetuam rei memoriam é afirmado que os expropriados afirmaram a sua existência, mas não lograram identificar a mesma (vide auto de fls. 28 e segs. do processo, doc. 16), tendo após reclamações sido prestados esclarecimentos (vide doc. 24 a fls. 44/45 onde foi reiterado que a mina não foi vista). Não demonstrada a existência de qualquer mina – prova que aos recorrentes incumbia, assim contrariando o constante do Auto de Vistoria APRM, não há como atribuir qualquer valor a tal título aos expropriados. Pelo que também nesta sede improcede a sua pretensão.
3) Em terceiro lugar, cumpre apreciar se os critérios seguidos para o cálculo indemnizatório merecem censura. Conforme decorre do disposto no art.º 1º do C.Exp. (Código de Expropriações) “Os bens imóveis e os direitos a eles inerentes podem ser expropriados por causa de utilidade pública compreendida nas atribuições, fins ou objeto da entidade expropriante, mediante o pagamento contemporâneo de uma justa indemnização.”. Justa indemnização que igualmente beneficia de garantia constitucional (vide artigo 62º n.º 2 da C.R.Portuguesa). E embora o legislador constitucional não tenha definido os termos de tal indemnização que assim delegou no legislador ordinário, tem o Tribunal Constitucional vindo a reconhecer de forma reiterada, tal como reafirmado no Ac. do T. Constit. nº 84/2017 de 16/02/2017 publicado in www.tribunalconstitucional.pt que “a justa indemnização deve atingir valor adequado a ressarcir o expropriado da perda do bem que lhe pertencia, com respeito pelo princípio da equivalência de valores.” Ali e citando o Acórdão n.º 52/90 se realçando que «Em termos gerais, deve entender-se que a “justa indemnização” há-de corresponder ao valor adequado que permita ressarcir o expropriado da perda que a transferência do bem que lhe pertencia para outra esfera dominial lhe acarreta, devendo ter-se em atenção a necessidade de respeitar o princípio da equivalência de valores: nem a indemnização pode ser tão reduzida que o seu montante a torne irrisória ou meramente simbólica nem, por outro lado, nela deve atender-se a quaisquer valores especulativos ou ficcionados, por forma a distorcer (positiva ou negativamente a necessária proporção que deve existir entre as consequências da expropriação e a sua reparação». Neste sentido se tem vindo a reconhecer como critério adequado para aferir o mencionado prejuízo o valor corrente, venal ou de mercado do bem, como uma vez mais é referido no Ac. do TC vindo de citar, ali se afirmando “Na ausência de indicação no texto fundamental de um qualquer critério ou método de avaliação, tem sido reconhecido ao referencial valor venal do bem, enquanto critério geral de valorização de bens expropriados, idoneidade a “fazer entrar, na esfera do atingido, o equivalente pecuniário do bem expropriado, de tal modo que, efetuada uma expropriação, o seu património ativo muda de composição, mas não diminui de valor” (JOAQUIM SOUSA RIBEIRO, O direito de propriedade na jurisprudência do Tribunal Constitucional, Relatório apresentado na Conferência Trilateral, Outubro 2009, p. 39, acessível em www.tribunalconstitucional.pt), sem postergar, porém, uma ampla margem de determinação do legislador na eleição e composição dos relevantes critérios avaliativos dos prédios expropriados, de modo a aproximá-lo do que seria o jogo de fatores que influenciam a cada momento a formação do preço em mercado fundiário - realidade social, e não normativa, dotada de uma irremovível margem de aleatoriedade”. Realçando os Profs. Gomes Canotilho e Vital Moreira (in “Constituição da República Portuguesa Anotada”, vol. I, 4.ª ed., revista, pág. 809), que o conceito da justa indemnização comporta “duas dimensões importantes: (a) uma ideia tendencial de contemporaneidade, pois, embora não sendo exigível o pagamento prévio, também não existe discricionariedade quanto ao adiamento do pagamento da indemnização; (b) justa indemnização quanto ao ressarcimento dos prejuízos suportados pelo expropriado, o que pressupõe a fixação do valor dos bens ou direitos expropriados que tenha em conta, (…) as circunstâncias e as condições de facto”. Em consonância com o referido juízo constitucional, o legislador ordinário clarificou desde logo o pretendido com a garantia da justa indemnização e moldes em que deve ser aferido o prejuízo do expropriado, nos termos do n.º 1 do artigo 23º do C.Expr., o qual assim dispõe: “1- A justa indemnização não visa compensar o benefício alcançado pela entidade expropriante, mas ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efetivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data.” Após o que fixou nos artigos 26º e segs. critérios referenciais para o cálculo do valor dos bens (tal como o menciona o n.º 4 deste artigo 23º). Importa ainda ter presente que, nos termos do artº 24º nº1 do C.Exp. o montante da indemnização calcula-se com referência à data da declaração de utilidade pública, sendo atualizado à data da decisão final do processo de acordo com a evolução de preços no consumidor, com exclusão da habitação. Sobre esta atualização, tendo sido publicado in DR de 25/10/01, Ac. do STJ de U. Jurispr. de 12/07/2001, n.º 7/2001, nos termos do qual foi fixada a seguinte jurisprudência: “I - Em processo de expropriação por utilidade pública, havendo recurso da arbitragem e não tendo esta procedido à atualização do valor inicial, o valor fixado na decisão final é atualizado até á notificação do despacho que autorize o levantamento de uma parcela do depósito. Daí em diante a atualização incidirá sobre a diferença entre o valor fixado na decisão final e o valor cujo levantamento foi autorizado. II - Tendo havido atualização na arbitragem, só há lugar á atualização, desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até á decisão final, sobre a diferença entre o valor fixado na decisão final e o valor cujo levantamento foi autorizado.” Por último, de referir ser pacífico na jurisprudência o entendimento de que atenta a especificidade técnica que em sede avaliativa o processo expropriativo implica, tanto que a peritagem é obrigatória, “ainda que a prova não seja vinculativa, mas tratando-se de um problema essencialmente técnico, o tribunal deve aderir, em princípio, ao parecer dos peritos, dando preferência ao valor resultante desses pareceres, desde que sejam coincidentes, e, por razões de imparcialidade e independência, optar pelo laudo dos peritos nomeados pelo tribunal quando haja unanimidade destes” [assim foi decidido no Ac. do TRC de 07/02/2012, Relator Jorge Arcanjo, entendimento este reiterado no Ac. do TRP de 16/09/2014, Relator Rui Moreira e igualmente nesta RG, Ac. de 02/02/2017, Relator José Fernando Amaral, Ac. 08/12/2016, Relator Fernando Freitas e ainda Ac. de 02/06/2016, Relator Miguel Morais todos in www.dgsi.pt]. Tendo presentes estes considerandos e retomando os fundamentos do recurso, insurgem-se os recorrentes, quanto ao valor indemnizatório atribuído pela expropriação de que foram alvo. O que fundam, em suma, no seu desacordo quanto ao facto de a seu ver a parcela expropriada dever ser considerada como solo apto para construção nos termos do artigo 25º nº 2 al. a) do C.Expropriações (CE). Ou, quando assim se não entenda, sendo para o mesmo efeito avaliada nos termos do artigo 26º nº 12 do mesmo CE. Seguindo, para tanto, o entendimento expresso pelo Sr. Perito indicado pelos recorrentes e constante do relatório pericial. Relatório no qual os demais Srs. Peritos (e assim maioritariamente) concluíram pela classificação da parcela expropriada como solo para outros fins, de acordo com o previsto no artigo 27º do C.Expropr. É e foi sempre, ao longo dos autos, esta a principal causa de discórdia quanto ao valor indemnizatório a atribuir aos expropriados pela expropriação em causa. Defenderam sempre estes que o solo onde a mesma se insere deveria ser classificado para efeitos avaliativos como solo apto para construção. Ou quando assim se não entenda, sendo-lhe aplicado o previsto no nº 12 do artigo 26º do CE. Isto não obstante e tal como vem provado, a parcela em questão estar abrangida pela RAN (fp 47) e de acordo com o PDM aprovado em 2008 e publicado em 2009 se situar em solo rural (…) e espaços canais (vide fp 40).
Avançam os recorrentes com duas ordens de argumentos. De um lado, alegam que a classificação do solo em questão no âmbito da RAN resulta de uma atuação dolosa (vide conclusões I a IV). E, portanto, deveria ser avaliado como solo apto para construção. De outro, alegam que por constar esta mesma parcela no PDM em espaço Canal, ficou excluída da RAN – exclusão que também invocaram por referência à inclusão da EN 14 no PRN, mas que e pelos motivos já antes expostos é questão não relevante (quanto à inclusão da EN 14 no PRN, por não ser esta a obra em causa para a DUP) e não demonstrada (se em causa estiver a inclusão da obra Variante à EN 14 no PRN). Da alegada exclusão da RAN, associada à aquisição da parcela pelos expropriados por sucessão em 2002 (e não 2022 como por lapso constava do fp 48, já corrigido), parcela que já pertencia a seus pais desde 1975, concluindo ser de aplicar o critério previsto no nº 12 do artigo 26º do CE. Quanto ao primeiro argumento – afirmam os recorrentes no corpo alegatório que o prédio em questão só passou a estar em área RAN em 2009 [afirmando que na 1ª carta de 1982 o prédio estava inserido em zona urbana e urbanizável], tendo esta mudança ocorrido por então se saber que a variante à EN 14 ia ser construída, tendo numa manipulação urbanística dolosa sido inseridos na zona RAN todos os terrenos deste novo traçado da variante à EN 14, incluindo a parcela expropriada. Parcela que até então era solo apto a construção e como tal deve ser avaliado para fins indemnizatórios. É pressuposto, que não merece discussão, do valor indemnizatório a arbitrar aos expropriados que este terá por referência o valor do bem expropriado à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data – tal como de forma clara e linear o define o artigo 23º nº 1 do CE. A inserção da verba expropriada em área RAN desde a publicação do Aviso nº 2383/2009 de 26/01 era, à data da DUP em 2018 (fp22), uma realidade (fp 41). Tal como o era a sua localização em solo Rural – espaço canal segundo o PDM da Maia aprovado em dezembro de 2008 e publicitado pelo Aviso nº 2383/2009, publicado em 26/01/2009. A sua avaliação à data da DUP teria inevitavelmente de considerar estas circunstâncias e condições de facto. Uma alegada atuação dolosa (ilícita) perante manipulação urbanística, para prejudicar os expropriados que não vem sequer provada e cuja qualificação nunca se bastaria com uma alegação de previsão de tal obra há muitas décadas para o local ou a sua previsão no PRN 2000 (mesmo que provado fosse) teria de ter sido discutida em sede própria – seja em meios procedimentais, nomeadamente a participação em sede da consulta pública a que se alude entre o mais no Parecer da CA na sua p. 6 – vide doc. junto a fls. 231 verso e seguintes pelos recorrentes aquando da interposição do Recurso da Decisão Arbitral em 22/02/2019; seja em meios contenciosos por via de ação administrativa de impugnação de normas (artigo 73º e segs. do CPTA) ou ação de impugnação de atos (artigo 50º e segs. do CPTA), na sequência da integração efetuada da parcela em RAN. Não no âmbito deste processo expropriativo, para o qual releva no que à indemnização concerne, a realidade factual existente à data (artigo 23º nº1 do CE). Tanto é quanto baste para afastar esta argumentação, quer por fundada numa dolosa e não demonstrada integração da parcela em questão na área RAN, quer por não ser este o meio processual para discutir tal questão.
Como segundo fundamento, alegam os recorrentes que por constar esta mesma parcela no PDM em espaço Canal, ficou excluída da RAN, assim impondo a sua avaliação com recurso ao critério previsto no nº 12 do artigo 26º do CE já que o prédio foi adquirido por si por via sucessória em 2002 (tendo também alegado a aquisição pelos seus pais já em 1975, o que não provaram). Esta argumentação, tal como a recorrida dá nota, já foi esgrimida e apreciada nos tribunais superiores, tendo motivado dois AUJ’s: - AUJ nº 6/2011 publicado in DRE I S de 17/05/2011 e proferido pelo STJ em 07/04/2011, disponível in www.dgsi.pt/jstj,o qual uniformizou jurisprudência no seguinte sentido: «Os terrenos integrados, seja em Reserva Agrícola Nacional (RAN), seja em Reserva Ecológica Nacional (REN), por força do regime legal a que estão sujeitos, não podem ser classificados como «solo apto para construção», nos termos do artº 25º, nº 1, alínea a) e 2 do Código das Expropriações, aprovado pelo artº 1º da Lei 168/99, de 18 de setembro, ainda que preencham os requisitos previstos naquele nº 2». E AUJ 6/2017 publicado in DRE I S de 05/07/2017 e proferido pelo STJ em 11/05/2017, igualmente disponível in www.dgsi.pt/jstj o qual uniformizou jurisprudência no seguinte sentido: “A indemnização devida pela expropriação de terreno rústico integrado na Reserva Ecológica Nacional e destinado por plano municipal de ordenamento do território a «espaço-canal» para a construção de infraestrutura rodoviária é fixada de acordo com o critério definido pelo art. 27.º do Cód. das Expropriações, destinado a solos para outros fins, e não segundo o critério previsto no art. 26.º, n.º 12”.
Bem como a apreciação em sede constitucional da interpretação dos artigos 25º nº 2, 26º nº 12 e 27º - tendo no Ac. T. Constit. nº 84/2017 de 16/02/2017, publicado in DRE S II de 07/04/2017 – sido decidido “não ser inconstitucional a norma contida artigos 25º nº 2, 26º nº 12 e 27º do Código das Expropriações aprovado pela Lei 168/99 de 18/09, segundo a qual o valor da indemnização devida pela expropriação de terreno integrado na RAN e/ou na REN, com aptidão edificativa segundo os elementos objetivos definidos no n.º 2 do artigo 25.º, deve ser calculado de acordo com os critérios definidos no artigo 27.º, e não de acordo com o critério previsto no n.º 12 do artigo 26.º, todos do referido Código”.
Dispõe o convocado artigo 26º no seu nº 12: “12 - Sendo necessário expropriar solos classificados como zona verde, de lazer ou para instalação de infraestruturas e equipamentos públicos por plano municipal de ordenamento do território plenamente eficaz, cuja aquisição seja anterior à sua entrada em vigor, o valor de tais solos será calculado em função do valor médio das construções existentes ou que seja possível edificar nas parcelas situadas numa área envolvente cujo perímetro exterior se situe a 300 m do limite da parcela expropriada.” Tal como assinalado no Ac. do STJ de 11/05/2017[2], com a salvaguarda legal prevista neste nº 12 – a qual equipara solos classificados como “zona verde ou de lazer” aos solos destinados à instalação de “infraestruturas e equipamentos públicos” e desde que os solos em questão tenham sido adquiridos pelo expropriado em data anterior à da entrada em vigor do plano municipal de ordenamento do território – visou o legislador “tutelar interesses dos proprietários de terrenos que, conquanto não sejam formalmente classificados como terrenos para construção, apresentam, ainda assim, potencialidade construtiva que sai prejudicada pela atribuição de alguma das aludidas classificações por parte de planos municipais de ordenamento do território.” Os critérios que orientam a elaboração, aprovação e ratificação de instrumentos de gestão territorial de âmbito municipal (como o PMOT ou PDM) não se confundem com os que presidem a outros instrumentos, designadamente os que rodeiam a aprovação, delimitação e integração de solos em zonas REN ou em zonas RAN. Os planos municipais de ordenamento do território são instrumentos de natureza regulamentar, aprovados pelos municípios e estabelecem o regime de uso do solo, definindo modelos de evolução previsível da ocupação humana e da organização de redes e sistemas urbanos e, na escala adequada, parâmetros de aproveitamento do solo e de garantia da qualidade ambiental -vide artigo 69º nºs 1 e 2 do DL 380/99 de 22/09 que aprovou o RJIGT em vigor à data em que a parcela em questão foi integrada em solo Rural e espaço Canais e subsequente artigo 70º que elenca os objetivos dos PMOT. Sendo o “regime de uso do solo (…) definido nos planos municipais de ordenamento do território através da classificação e da qualificação do solo.” (artigo 71º nº 1) assentando na distinção fundamental “entre solo rural e solo urbano” (vide artigo 72º) “regulando o aproveitamento do mesmo em função da utilização dominante que nele pode ser instalada ou desenvolvida, fixando os respetivos uso e quando, admissível, edificabilidade” (vide artigo 73º). O Plano Diretor Municipal (PDM), por sua vez (artigo 84º), “estabelece a estratégia de desenvolvimento territorial, a política municipal de ordenamento do território e de urbanismo e as demais políticas urbanas, integra e articula as orientações estabelecidas pelos instrumentos de gestão territorial de âmbito nacional e regional e estabelece o modelo de organização espacial do território municipal.(nº1); sendo um “instrumento de referência para a elaboração dos demais planos municipais de ordenamento do território e para o estabelecimento de programas de ação territorial, bem como para o desenvolvimento das intervenções sectoriais da administração do Estado no território do município, em concretização do princípio da coordenação das respetivas estratégias de ordenamento territorial.” (nº2), tendo o “modelo de organização espacial do território municipal (…) por base a classificação e a qualificação do solo.” (nº 3) Acresce que nos termos do artigo 86º, o PDM é constituído por: “a) Regulamento; b) Planta de ordenamento, que representa que representa o modelo de organização espacial do território municipal, de acordo com os sistemas estruturantes e a classificação e qualificação dos solos e ainda as unidades operativas de planeamento e gestão definidas; c) Planta de condicionantes que identifica as servidões e restrições de utilidade pública em vigor que possam constituir limitações ou impedimentos a qualquer forma específica de aproveitamento.” O Regime Jurídico da Reserva Agrícola Nacional – RAN - aprovado pelo DL 196/89 de 14/06, ainda em vigor à data em que as parcelas em questão se consideram inseridas na RAN (vide fp 49) – visa, por sua vez, defender e proteger as áreas de maior aptidão agrícola e garantir a sua afetação à agricultura, de forma a contribuir para o pleno desenvolvimento da agricultura portuguesa e para o correto ordenamento do território (vide artigo 1º), constituindo “o conjunto das áreas que, em virtude das suas características morfológicas, climatéricas e sociais, maiores potencialidades apresentam para a produção de bens agrícolas” (vide artigo 3º nº 1), sendo as suas áreas “identificadas na carta da RAN, a publicar por portaria do Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação.” (artigo 5º nº 1); carecendo de prévio “parecer favorável das comissões regionais da reserva agrícola todas as licenças, concessões, aprovações e autorizações administrativas relativas a utilizações não agrícolas de solos integrados na RAN.” (vide artigo 9º nº 1) e subordinados aos condicionalismos previstos nos nºs 2 e 3 do mesmo artigo. Ademais, e para além do parecer relativo à capacidade de uso dos solos que o Conselho Nacional da Reserva Agrícola deve emitir aquando dos processos de elaboração de PROT e PDM’s (entre outros - vide artigo 32º), são os solos integrados na RAN obrigatoriamente “identificados em todos os instrumentos que definam a ocupação física do território, designadamente planos regionais de ordenamento, planos diretores municipais e planos de urbanização.” (vide artigo 33º).
A delimitação dos solos RAN obedece assim a interesses com projeção nacional, dependentes das caraterísticas intrínsecas dos terrenos que nela são incluídos, e não da sua concreta localização ou aptidão construtiva. Não sendo como tal “legítimo estabelecer uma equiparação entre instrumentos cuja aprovação é da responsabilidade de entidades administrativas de natureza diversa e orientados por princípios e por objetivos diversos” No confronto entre os diplomas legais citados e respetivos normativos citados, realçando agora o previsto no artigo 86º do DL 380/99, resulta do mesmo a necessidade de compatibilização entre o estabelecido no PDM e, nomeadamente, as servidões e restrições de utilidade pública em vigor que constituam limitações ou impedimentos a qualquer forma específica de aproveitamento, como é o caso das decorrentes da RAN. E, tal como vem provado em 41 (e não foi impugnado), a parcela dos recorrentes vinha identificada na Carta de Condicionantes como abrangida por servidões Administrativas e Restrições de Utilidade Pública, in casu e de acordo com os factos provados, pela RAN. O mesmo é dizer que na compatibilização entre o PDM (que se pressupõe consonante com o PMOT identificado no nº 12 do artigo 26º em análise) e a RAN, a indicação no 1º como localização em solo rural e espaços canais de uma determinada parcela, não afasta a integração da mesma na RAN com as condicionantes daí derivadas. O PDM ou o PMOT não exclui a classificação da parcela na RAN, ao contrário do defendido pelos recorrentes. Tendo aliás o Decreto Regulamentar nº 11/09 aprovado ao abrigo do artigo 72º do DL 380/99 [o qual veio definir em cumprimento do previsto no citado artigo 72º, critérios uniformes de classificação e reclassificação do solo, de definição de utilização dominante, bem como das categorias relativas ao solo rural e urbano, aplicáveis a todo o território nacional] confirmado este entendimento, quando no seu artigo 3º estipula que “Nas áreas abrangidas por restrições e servidões de utilidade pública, os respetivos regimes prevalecem sobre as demais disposições dos regimes de uso do solo das categorias em que se integram”. Tal como afirmado no Ac. do STJ que vimos acompanhando e ali citando também anterior jurisprudência do STJ: «O legislador, presumivelmente ciente da diferenciação entre as classificações e as condicionantes de solos que resultam de planos municipais de ordenamento do território em confronto com as que decorrem de outras das variadíssimas restrições ao direito de propriedade, como as que resultam da integração na REN (ou na RAN), reservou para as primeiras a aplicação do critério especial previsto no preceito em causa. Sendo de presumir a perceção da multiplicidade de situações que a realidade reflete e da diversidade de instrumentos de gestão territorial ou de diplomas que prescrevem vinculações, servidões administrativas ou outras restrições ao direito de propriedade, tanto o elemento literal, como a evolução histórica do preceito ou a sistemática que envolve a regulamentação dos diversos instrumentos de gestão territorial contrariam a possibilidade de se estabelecer a equiparação aos solos cuja classificação decorra unicamente de planos municipais de ordenamento do território dos demais solos cujas classificações, limitações ou restrições resultem de outros instrumentos de gestão territorial, com especial destaque para os que respeitam à REN» (in casu, com base na mesma argumentação à RAN). Por tanto afastando uma qualquer possibilidade de interpretação extensiva do preceito, por forma a abranger enquanto instrumento de gestão territorial a RAN (no que in casu releva). Na mesma linha de argumentação e agora excluindo a hipótese de aplicação analógica da norma com fundamento em lacuna legis, afirmou-se ainda no Ac. que seguimos: «Como se refere no citado Ac. do STJ, de 29-11-12, “a proibição de construir que incide sobre os solos integrados na RAN/REN é consequência da vinculação situacional da propriedade, sendo uma manifestação da hipoteca social que onera a propriedade privada, consubstanciada na imposição, por via legal, aos particulares de restrições decorrentes da natureza intrínseca dos terrenos e que se mostram necessárias e funcionalmente adequadas para acautelar uma reserva de terrenos agrícolas que propiciem o desenvolvimento da atividade agrícola, o equilíbrio ecológico e outros fundamentais interesses públicos”. Ora, tal efeito não é idêntico ao que se verifica quando estão em causa zonas verdes ou equiparadas cujo destino é fixado em planos municipais aprovados segundo critérios de oportunidade amplamente discricionários das entidades administrativas e que justificam a sujeição dos solos a um critério de avaliação que não exclua de todo a valorização que é potenciada pela sua localização ou envolvente urbanística.» Motivo por que ali se concluiu inexistir fundamento para uma eventual aplicação analógica do preceito em causa. Inviabilizando assim a aplicação da solução normativa prevista no nº 12 do artigo 26º, com base na mesma argumentação, às limitações decorrentes da inclusão da parcela em RAN. Implicando que a indemnização devida pela expropriação de terreno integrado na RAN e inserido no PDM em solo rural - espaço canal, destinado a construção de infraestrutura rodoviária, não pode ser fixada por recurso ao critério previsto no artigo 25º nºs 1 e 2 al. a) e 26º, nomeadamente pelo seu nº 12, mas antes de acordo com o critério definido pelo artigo 27º do CE, enquanto solo para outros fins.
O assim decidido não viola o princípio da igualdade- argumento também convocado pelos recorrentes. Violação do princípio da igualdade que reportam ao valor indemnizatório arbitrado com base numa limitação que afirmam não existir – a da integração da parcela em RAN. No que lhes não assiste razão. Defendendo que a expropriação decorre do Plano e assim a sua indemnização deve seguir o critério do nº 12 do artigo 26º, por estar em causa concretização de infraestrutura (vide conclusão XLIII). Numa primeira linha e porquanto a argumentação pressupõe uma realidade não apurada, seria de rejeitar in limine tal argumentação. Ponderando que a argumentação aduzida sobre a violação do princípio da igualdade poderá abranger a dimensão da não aplicação dos mesmos critérios de avaliação previstos no nº 12 do artigo 26º quando em causa estejam parcelas inseridas na RAN, por contraponto às situações em que se reúnam os requisitos para aplicação de tal normativo, também nesta vertente não assiste razão aos recorrentes. Tal como já foi decidido pelo T. Constitucional, nomeadamente no Ac. 84/2017 e o AUJ mencionado o reafirmou, o apelo ao «valor de mercado comporta a ficção da transação imediata do bem expropriado, procurando determinar um equivalente pecuniário que atenda às utilidades que ele proporciona ou está apto a proporcionar no momento da expropriação, com primazia, tratando-se de parcela de terreno, para a potencialidade edificativa. Ora, a integração em REN e/ou RAN, não pode ser configurada como um mero obstáculo conjuntural e contingente, indiferente como fator de determinação do que seria o valor de uma transação no mercado fundiário: conforme se referiu o Acórdão n.º 641/2013, “a limitação de construção, decorrente da integração do terreno na RAN, influi necessária e decisivamente no valor venal dos terrenos afetados, retirando-lhe mesmo o principal fator de valorização”. Desse modo, não pode ser dada como certa a inidoneidade do critério normativo em questão para assegurar a justa indemnização devida, do mesmo jeito que, como se diz no Acórdão n.º 599/2015, não é possível afirmar, sem mais, que cálculo do valor do terreno inserido em RAN através dos critérios referenciais contidos no artigo 27.º do CE fique aquém do valor de mercado, dando lugar a um défice indemnizatório lesivo do princípio constitucional da justa indemnização, tanto mais que, como se verá de seguida, o regime indemnizatório pela expropriação comporta mecanismos corretores.» (…) Ainda no plano da igualdade interna, agora considerando os expropriados nas situações contempladas no sentido literal do enunciado textual contido no n.º 12 do artigo 26. º do CE, o Tribunal já afirmou as diferenças que afastam as duas situações. Como se assinalou, novamente, no Acórdão n.º 315/2013, entendimento inteiramente transponível para a situação dos presentes autos: «As disposições dos planos municipais de ordenamento do território que reservam terrenos particulares para a instalação de infraestruturas (v.g. arruamentos) ou equipamentos públicos (v.g. hospitais, instalações desportivas, escolas), atendendo ao seu destino público, têm necessariamente implícita uma intenção de aquisição futura desses terrenos pela Administração, sendo tais disposições até apelidadas de “reservas de expropriação” ou de “expropriações a prazo incerto” (vide ALVES CORREIA, em “Manual de direito do urbanismo”, vol. I, pág. 774, da 4.ª ed., da Almedina). Quanto às prescrições dos planos que destinam certos terrenos situados em áreas edificáveis a espaços verdes ou de lazer, verifica-se que a destinação imposta àqueles terrenos pela Administração é também de tal modo dominada pela satisfação de puros interesses públicos urbanísticos que o seu aproveitamento privado é quase impraticável. Por isso se considera que as mesmas esvaziam tão severamente o conteúdo mínimo essencial do direito de propriedade, por motivos de utilidade pública, que são encaradas como verdadeiras “expropriações de plano” (vide ALVES CORREIA, na ob. cit., pág. 777-778). As situações contempladas na letra do referido n.º 12, do artigo 26.º, do Código das Expropriações, como acima se disse, correspondem, pois, a casos em que as limitações impostas por plano de ordenamento do território aniquilam de tal forma o conteúdo mínimo essencial do direito de propriedade que se traduzem em atos que se aproximam de uma verdadeira expropriação, pelo que o legislador considerou que a sua posterior expropriação efetiva por um valor que atendesse à desvalorização resultante das severas limitações impostas, resultava objetivamente numa inadmissível manipulação das regras urbanísticas pela Administração, independentemente da prova de uma intenção dolosa. O legislador terá, aliás, tido em atenção que a doutrina já defendia que estes atos pré ou quase expropriativos poderiam gerar, só por si, uma obrigação de indemnização autónoma (vide ALVES CORREIA, em “O plano urbanístico e o princípio da igualdade”, pág. 521-528, da ed. de 1989, da Almedina), a qual atualmente tem cobertura legal no artigo 143.º do Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de setembro. Ora, a inclusão de um terreno na RAN ou na REN não é rigorosamente equiparável a estas situações, uma vez que as limitações inerentes ao estatuto destas reservas não têm a severidade dos casos anteriormente referidos (apesar de, relativamente à REN poderem, em determinados casos, ocorrer restrições de utilização de igual grau de severidade) e têm em atenção a especial localização factual desse terreno e as suas características intrínsecas. Recorde-se que as limitações resultantes da integração de um terreno em zona RAN ou REN, em regra, não atingem o núcleo essencial do direito de propriedade, uma vez que o destino permitido é suscetível duma utilização privada e tem em consideração as características morfológicas, climatéricas e sociais do terreno em causa. As proibições, designadamente a proibição de construção, restrições ou condicionamentos à utilização dos terrenos integrados em área RAN ou REN, são uma mera consequência da vinculação situacional da propriedade que incide sobre eles, pelo que são encaradas como meramente conformadoras do conteúdo do direito de propriedade, não se considerando que possam gerar, por isso, qualquer direito de indemnização autónomo.» Afastada a aplicação do critério previsto no nº 12 analisado, tem o cálculo do valor do solo de ser aferido nos termos do artigo 27º do CE, como “solo apto para outros fins”. Tal como os Srs. Peritos (por maioria, incluindo a unanimidade dos peritos nomeados pelo tribunal) o fizeram e o tribunal a quo sindicou. Em suma, nenhum princípio da igualdade se mostra violado. Quanto ao valor de indemnização propriamente fixado, improcedente a pretensão dos recorrentes quanto à alteração dos pressupostos em que o mesmo se fundou, nada há a dizer. Com efeito e tal como assinalou a recorrida, nada opuseram os recorrentes em concreto quanto ao cálculo efetuado. Tendo a crítica dos recorrentes incidido, nos termos já apreciados, nos pressupostos que não mereceram da nossa parte crítica, nada mais há a apreciar no que à quantificação do valor indemnizatório respeita. Termos em que resta concluir pela total improcedência do recurso interposto.
*** IV. Decisão.
Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar totalmente improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida. Custas pelos recorrentes.
Porto, 2024-09-09 Fátima Andrade Jorge Martins Ribeiro José Eusébio Almeida _________________________ [1] Recurso de que cumpre conhecer, após o Acórdão já proferido em 25/09/23 em que se apreciou o recurso interposto sobre o valor processual da causa para efeitos de determinação da taxa de justiça devida na instância de recurso. [2] Acórdão cuja argumentação aqui seguimos – e embora neste estivesse em causa solo que integrava REN, foi ali apreciada em equivalência a situação de REN e RAN - e no qual se assinalam quer as anteriores decisões do STJ que abordaram a questão, quer os Acs. do T.Constit. sobre a matéria, incluindo as já citadas. |