Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
24620/15.0T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: EUGÉNIA CUNHA
Descritores: REQUISITOS DE IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
NULIDADE DE SENTENÇA
COMPRA E VENDA DE IMÓVEL
DEFEITOS DE EDÍFICIO
CADUCIDADE DE DIREITOS
Nº do Documento: RP2024040824620/15.0T8PRT.P1
Data do Acordão: 04/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Deve ser considerado preenchido o ónus previsto na alínea a), do n.º 1, do artigo 640.º, do CPC, quando, apesar de o recorrente indicar nas conclusões das alegações os pontos a alterar de modo inconcludente quanto a que parte dos mesmos - “total ou parcialmente” -, no corpo das alegações especifique as concretas alterações de cada ponto de facto que considera incorretamente julgados e pede a alteração da decisão com base na reapreciação da prova gravada e na demais prova junta aos autos, conforme aí indicado, ponto por ponto.
II - Podendo deficiente fundamentação de facto conduzir à revogação da sentença pelo Tribunal superior não origina vício consagrado no nº1, do art. 615º, do CPC, gerador da sua anulação. Nos casos de vícios de fundamentação ao nível da decisão de facto tem o mesmo de ser solucionado com recurso às regras enunciadas nos nº1 e 2, do art. 662º, daquele diploma legal.
III - Na venda de consumo, subtipo da compra e venda, quanto a imóveis, a lei estabelece três prazos de caducidade: i) o de denúncia dos defeitos, de um ano, ii) o para o exercício de direitos, de três anos, a contar da atempada denúncia dos defeitos, iii) prazos esses, sempre, dentro do prazo limite máximo da garantia legal, de cinco anos (v. art.º 1225.º, do Código Civil e art.º 5º-A, n.º 2 e 3, do específico regime introduzido pelo Decreto-Lei 67/2003 de 8 de Abril, alterado pelo Decreto-Lei nº 84/2008 de 21 de Maio).
IV - E sendo três os prazos de caducidade, três podem ser as exceções perentórias deduzidas pelo vendedor, àqueles atinentes, a ele cabendo o ónus da prova dos concretos factos invocados como causa extintiva do direito do Autor (art. 342º, nº2, do Código Civil).
V - O prazo, de cinco anos, da garantia conta-se a partir da entrega do bem imóvel e estando em causa defeitos nas partes comuns dos edifícios constituídos em propriedade horizontal (cfr. art. 1421º), a entrega das partes comuns considera-se efetuada no momento em que o vendedor deixa de ter poderes para determinar ou influir sobre o curso das decisões dos condóminos constituídos em assembleia de interesses autónomos, correspondendo, assim, o dies a quo a partir do qual se conta o início do prazo dos cinco anos à transmissão dos poderes de administração das partes comuns para os condóminos, através da sua estrutura organizativa, reunindo em assembleia de condóminos e com plena autonomia para denunciar os eventuais defeitos existentes na obra.
VI - Assim, sendo o dies a quo a partir do qual se conta o início do prazo dos cinco anos o da transmissão dos poderes de administração das partes comuns para os condóminos, verificada se não mostra real autonomia para denunciar defeitos em situação de o Administrador do condomínio prestar serviços de representação e serviços profissionais de advogado à vendedora;
VII - E o prazo de garantia não pode ter início enquanto os trabalhos de construção se não mostrarem, totalmente, executados (em todas as frações autónomas e partes comuns que integram a propriedade horizontal).
VIII - Dada a dificuldade da prova da existência do defeito à data da entrega (podendo ele manifestar-se num período de tempo relativamente longo: dentro de 5 anos, a contar da entrega de coisa imóvel), a lei, protegendo o consumidor (devendo o condomínio ser considerado como tal a pelo menos uma das frações que o compõem estar destinada a uso privado), consagra a presunção de a falta de conformidade verificada dentro do referido prazo (fazendo presumir que o defeito já existia à data da entrega, salvo quando tal for incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade - nº2, do art. 3º, do Dec. Lei n.º 67/2003). Assim, o consumidor/comprador apenas tem de fazer a prova do defeito (da falta de conformidade) - facto base da presunção -, sem que sobre si impendam os ónus de alegar e provar a causa concreta da origem do mau funcionamento e a sua existência à data da entrega (v. arts. nº1, do art. 342º, 349º e nº1, do 350º, do CC).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 24620/15.0T8PRT.P1
Processo da 5ª secção do Tribunal da Relação do Porto (3ª Secção cível)
Tribunal de origem do recurso: Juízo Central Cível do Porto – Juiz 7


Relatora: Des. Eugénia Cunha
1º Adjunto:  Des. Manuel Fernandes

 2º Adjunto: Des. José Eusébio Almeida

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto

Sumário (cfr nº 7, do art.º 663º, do CPC):

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I. RELATÓRIO

Recorrente: A..., Lda

Recorrido: Condomínio do Prédio ...

Condomínio do Prédio ..., sito na Rua ..., n.º ..., Rua ... n.º ..., Rua ..., n.º ..., da freguesia ..., propôs a presente ação, com processo comum, contra A..., Lda., com sede no ..., ..., Amarante, pedindo a condenação desta a eliminar os defeitos, vícios e desconformidades de construção das partes comuns do supra id. prédio, no prazo de 3 meses após o trânsito em julgado da sentença, e, em caso de incumprimento desta prestação, no pagamento da quantia de 298.599,33 €, acrescida de juros, vencidos e vincendos, desde a citação nos autos de arresto e em sanção pecuniária compulsória, no valor mínimo de 200,00 € diários, pelo atraso na realização das obras, bem como na realização de outras obras necessárias, ou, em caso de incumprimento, em equivalente monetário, decorrentes do agravamento dos ditos defeitos construtivos a apurar no decurso da ação ou em sede de liquidação se a condenação nesta parte tiver de ser genérica.

Alegou, para tanto e resumidamente, que o id. prédio, constituído por vários blocos e em propriedade horizontal, foi construído e as respetivas frações vendidas pela sociedade R. em diferentes fases, sendo os jardins e garagem, entre outros, comuns a todos eles, e que a administração do condomínio só passou a ser exercida pelos condóminos a partir de Fevereiro de 2013 - tanto que o bloco ... só foi entregue pela R. a 30/03/2012 e o bloco ... em Setembro de 2012 -, altura a partir da qual deram conta de diversos defeitos de construção denunciados à R., que reparou apenas parte deles, decidindo a A., em assembleia de condomínio de 30/01/2014, o recurso às vias judiciais para exigir da R. a reparação dos defeitos existentes.

Citada, a Ré, além de invocar a caducidade do direito do Autor, assim como do direito de denúncia, e a ilegitimidade do A.., impugnou a generalidade dos factos e negou a existência de alguns dos apontados defeitos de construção, que antes imputa ao A,. e alegou a reparação de outros.

 Em resposta, o A. impugnou a matéria das exceções invocadas pela R., e, subsidiariamente, requereu a intervenção principal dos proprietários das frações.

Proferido despacho saneador, no âmbito do qual foi julgada procedente a exceção da ilegitimidade relativamente à reparação dos defeitos assinalados no art. 119.º, al. u) da PI na parte em que o piso do pavimento é composto por frações autónomas pertencentes a título individual a cada um dos condóminos, e o conhecimento da exceção da caducidade relegado para ulterior momento, identificado o objeto do processo e enunciados os temas de prova, do que não houve reclamações.

Procedeu-se à audiência final, com a observância das formalidades legais.


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Foi proferida sentença com a seguinte

parte dispositiva:
“Julgo procedente a presente acção e improcedente a excepção da caducidade, e, em consequência, condeno a R., a, no prazo máximo de 90 (noventa) dias, eliminar os defeitos supra ids. em 56) dos Factos Provados, e, subsidiariamente, para o caso de não cumprir definitivamente esta sua obrigação, condeno a R. a pagar ao A. Condomínio a quantia, a liquidar ulteriormente, necessária à eliminação dos defeitos.
Custas pela R.”.


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Apresentou a Ré recurso de apelação a pugnar por que seja anulada a sentença, alterada a matéria de facto e revogada a condenação da Ré, incluindo na parte relativa à condenação em custas, que pretende seja substituída por outra que tenha em consideração o decaimento de ambas as partes, formulando as seguintes

CONCLUSÕES:
“A. Não se conforma o recorrente com a sentença recorrida por considerar que a mesma faz uma errada apreciação da prova dando como provados factos interpretação dos factos julgados provados, fazendo uma errada aplicação do Direito aos factos provados e não se pronunciando sobre questões de que devia ter conhecido, verificando-se dessa forma um erro de julgamento e erro - vício;
B. Nos termos do artigo 640.°, n.° 1, al. a) do C.P.C., a recorrente considera que o Tribunal a quo julgou erradamente como provados os factos abaixo discriminados, porque são dados como provados factos que os próprios documentos, descritos e enumerados na sentença recorrida, nomeadamente as atas das assembleias de condóminos da autora, impunham uma decisão diversas;
C. A recorrente considera incorretamente julgados, total ou parcialmente, nos termos que a seguir se expõem, os factos provados números 3, 4, 12, 14, 15, 24, 26, 46, 56 a), b), c), d), e), f), j), k), n) e q), bem como os "factos provados" 57, 58, 62, 64, 65 e 66 por entender que os mesmos são meras conclusões de facto ou de direito ou conceitos jurídicos, e ainda os pontos b), i) e m) dos factos não provados referentes à contestação, nos termos já acima apontados, e que se pede vénia em dar por reproduzido;
D. A alteração dos factos provados e não provados conduzirá, no entender da aqui recorrente, à sua não condenação à reparação dos seguintes defeitos ou anomalias enunciadas no facto provado 56,
I. Tomadas e saídas de ar nas zonas de circulação dos edifícios ... e ....
II. Indícios de humidade nas portas do armário da zona do quadro eléctrico dos serviços comuns do edifício ..., bem como nos tetos interior e exterior.
III. Degradação do piso da garagem na zona da 1.a fase (blocos ... e ...).
IV. Infiltrações nos tetos das garagens, nas zonas do logradouro.
V. Manchas de humidade no revestimento nas platibandas da fachada Poente nos blocos ... e ... que leva a alguma degradação do revestimento da fachada. VI. Desconformidade de cores das chapas de revestimento da fachada Norte do edifício ....
VII. Infiltrações no teto do hall de entrada do R/C do edifício ... que chega até à zona do quadro eléctrico do edifício ....
VIII. A betonilha da cave apresenta em determinados locais localizados aspectos de degradação a necessitar de demolição e reconstituição dessas zonas identificadas de forma a garantir a sua conservação e cumprimento da função de pavimento estável e duradouro.
IX. Defeitos no revestimento do teto da cave de estacionamento junto a colectores prediais e juntas de dilatação com manchas de humidade, manchas de reparações anteriores e destacamentos em áreas pontuais do revestimento.
X. A ventilação da cave é feita por conduta directa à cobertura e a essa conduta estão ligadas as ventilações de cada piso de acordo com o projecto de ventilação.
XI. A tubagem de drenagem das águas pluviais e da rega estão parcialmente obstruídas com a passagem da tubagem de rega.
E. Independentemente da alteração da matéria de facto, por violação do princípio da "livre convicção" e da suficiência - art °s 607 °, n° 5 e 662 °, n° 2, c) do C.P.C.-, relativamente aos pontos acima,
F. ao dar-se como provado como "realidade de um facto" (art° 341° do C.C. aquilo que é o tema do processo - pressuposto da responsabilidade, a sua qualificação como "defeito" -, acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27/01/2020 - já que tal tem se subsumir na norma do art. 2.°, n.° 2, d) do DL n.° 67/2003 -, há violação do regime do n° 3 do art° 607.° do C.P.C., por insuficiente fundamentação de facto capaz de levar a aplicação da norma correspondente naquilo que é essencial para a definição do pedido (cfr. art° 662.°, n° 2, d) do C.P.C.), o que implica a baixa do processo para ser complementada;
G. Sendo regra do art. 5.°-A do DL 67/2003 - lei reguladora do contrato ao tempo - que a denúncia de "defeitos" e, porventura, subsequente instauração de acção estejam sujeitos a caducidade, e tendo em conta que, no caso, estamos perante um conjunto de imóveis, a edificar em diferentes fases, mas que constituem um único prédio em propriedade horizontal - art° 1438.°-A do C.C. , há que concluir que qual o termo inicial de contagem do tempo para exercício desses direito, e aferido pelo regime daqueles artigos do DL n.° 67/2003;
H. Visto não ter sido alegado "reconhecimento", e a primeira denúncia ter ocorrido em 13 de Fevereiro de 2013 - facto 35 dos factos provados -, e tendo os "Blocos ... e ... sido entregues em 2003, e com administração "autónoma" assumida em 16/11/2006 - arestos do STJ de 29-11-2011 e 721/12.5TCFUN.Ll.Sl. de 31.05.2016)., já em 16/11/2012 caducara o direito de denunciar, ao menos no que respeita às partes comuns dos blocos ... e ...
É que,
H.1 - é inequívoco que, ao menos para os Condóminos dos blocos ... e ..., dois deles ouvidos em audiência de julgamento como testemunhas da A AA e BB, o conhecimento dos "danos" ocorreu antes de 2010 e que foram alertados para a exiguidade de tempo para exercerem os seus direitos - ponto 69, acta n.º ... de 30/01/2008 e depoimento das referidas testemunhas, que afirmaram perentoriamente que os problemas com as fachadas dos blocos ... e ..., as infiltrações e humidade nas garagem e a fendilhação ou danos no pavimento das garagens são anteriores a 2010, tendo como referência a instalação do sistema de rega ocorrida em 2010;
I. Seria, pois, de data anterior a 2010 que se deveria começar a contar o prazo para exercer os direitos referidos no n° 3 do artigo 1221.° do CC e art° 5 do DL n.° 67/2003, e se só em 13.02.2013 - factos 22 e 23 da matéria provada - essa denúncia foi levada a conhecimento do "empreiteiro', a mesma foi feita para além do prazo de 2 anos apos aquele conhecimento;
J. Ao perfilhar a tese de que só aquando da entrega da "fase" correspondente ao bloco ... se iniciaria o prazo de garantia, houve erro de interpretação e aplicação dos artigos 329.°, 1224.°, n.° 2 e 1225°, n.° 1, do CC , como 5°, n.° 1 do mesmo DL n.° 67/2003, e mesmo a jurisprudência constante dos doutos Ac. Rel. Coimbra, de 20.05.2014, citado em nota 20 de págs. 242 do estudo de Pinto Monteiro e Jorge Morais Carvalho na R. L.J. ano 145, como Cura Mariano citado em acórdão da Rel. Porto n.° 0730350, onde se alude a "reconhecer de forma inequívoca a existência do direito no prazo da caducidade".
[1] - aresto do STJ 378/07.5TBLNH.L1.S, de 01/14/2014; como já Ac. do STJ, de 15/11/2012; e Ac. do TRL, de 10/2/2014; Ac. do TRL, de 13/3/2014; Ac. do TRL, de 30/4/2015, 4288/16.7T8FNC.Ll.S2, de 10.12.2019;
K. E, a perfilhar-se a doutrina da douta decisão, não teria caducado o prazo para denúncia, porque nem se teria iniciado, pois o bloco ... (embora fazendo parte da "propriedade" sob administração "independente e autónoma — quando menos desde 2013 na tese da douta sentença) ainda não estava todo vendido! E se a construtora lá mantivesse a sede ou várias fracções, o prazo do art° 1225 do C.C. era perene? Só que,
L. Para além de o art. 5.°, n.° 1 do DL n.° 67/2003, aludir a "prazo a contar da entrega do bem', a jurisprudência vêm entendendo que, para efeitos de a entrega do prédio, se deve considerar como tal a existência de "uma entidade/administração distanciada do vendedor e com plena autonomia para denunciar os eventuais defeitos existentes na obra" (sic) - arestos do STJ de 29-11-2011 e 721/12.5TCFUN.Ll.Sl. de 31.05.2016, como Rel. Porto 4073/04.9TBMAL.PI de 14.03.2009, nunca se falando em "ultima transmissão';
M. É erróneo concluir por algo ilícito relativamente à administração que vigorou até 2013, pois que:
- o referido Administrador o foi durante 7 anos, sem que nenhum Condómino usasse da faculdade prevista nos n°s 1 ou 4 do art° 1435 do C.C., sequer quando a Ré já não tinha maioria de permilagem (algo diferente, para efeitos legais - 1430.°, n° 2 do C.C- da regra supletiva do art° 1403.°, n° 2);
- era seu dever agir na "execução das deliberações da assembleia - h) do art° 1436.° do C.C., na redação ao tempo - e nenhuma inexecução ter sido comprovada; e
- a matéria de facto provada (como as atas de 2008 e 2009) demonstra que, em devido tempo, alertou para a proximidade de prazo de caducidade de denúncia e mereceu voto de confiança quando apresentou demissão;
N. Nenhuma prova existe que possa levar a concluir que:
houve atuação lesiva, mesmo que "mandatado pela R. como seu representante em outros assuntos do seu interesse" - (sem que se diga quais ou se em coincidência temporal).
como nenhuma prova se fez que tenha agido contra os interesses do condomínio, ou não acatado deliberações dos Condóminos (outros que não a Ré), desde que maioritários para o que basta;
O. Há, pois, falta de fundamentação fáctica que permita concluir, como se lê na douta sentença, que esta dupla e simultânea qualidade do identificado condómino, representante do condomínio por um lado, e representante da empresa vendedora por outro, é claramente conflituante, não permitindo excluir o domínio da R. sobre a administração do condomínio;
 P. Violou, pois, o regime do n.° 3 e 4 do art.° 607.° do C.P.C. traduzindo-se em nulidade prevista no art° 615, n°1, als, c) e d), este com referência ao artigo 154.° ambos do C.P.C.;
Q. Tendo em conta que na propriedade horizontal, há que considerar a individualidade física de cada bloco" a par com a unidade jurídica, que está garantida quando se alude a "adaptação necessária", no art0 1438 ° - A, exige:
- que cada um dos "condóminos é comproprietário das partes comuns - art° 1420 °, n° 1 do C.C. -, com a participação consagrada no título constitutivo - art° 1418.°, n° 1 do C.C. -, só em conjunto e através do Administrador, pode agir naquilo que é relativo à compropriedade — arts 1405.°, como 1436.°, f) e h), ao tempo do C.C.
- e que as partes comuns são a "comunhão de fim";
temos que a obrigação que emerge de qualquer violação de direito de "comproprietário de parte comum" geral um regime de solidariedade activa;
R. - o regime da solidariedade activa, por haver pluralidade de obrigações, ligadas entre si por certo nexo (comunhão de fim) - como ensina A. Varela, in Obrigações, 4a ed., vol. I, Obrigações, op. cit, pág. 698 -, a que se aplica o regime do art° 512, n°2 in fine do C.C.;
S. Tendo-se verificado uma creditícia por defeito na parte comum, há que ter em conta o regime do n° 2 do artigo 514.° do C.C., daqui resulta que, nos termos do n° 2 do art° 514.° do C.C., pode haver credores solidários que possam exigir a prestação do devedor, enquanto outros possam ver ser-lhes oponível, e na permilagem em que comungam nas partes comuns, excepções de direito substantivo, ainda que de natureza pessoal;
T. atente-se o que na acta ... a ... se consignou por unanimidade quanto à individualidade de valores de fundo de reserva afectos a fundo de reserva, entre Condóminos dos blocos ... e ..., por um lado, e C e D, por outro;
U. Condenar a Ré a efectuar a expensas suas as reparações de defeitos relativamente a partes comuns, suportando custos que os Condóminos dos blocos ... e ... (e também dos blocos ... e ... - face ao que se apure em termos de facto) deixaram de poder exigir por caducidade, é violar o regime do citado art° 514.°, n.° 2, como 533 ° do C.C., sob pena de se consagrar um "enriquecimento sem causa" dos Condóminos que tal não exigiram em tempo devido, vendo caducar o seu direito.
V. A condenação da ré na totalidade das custas judiciais não tem em conta o decaimento da autora que viu grande parte do seu pedido ser julgado improcedente por não provado”.

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Junta a Ré/Apelante com as alegações “parecer jurídico”, o que é legalmente admissível face ao que dispõe o nº2, do art. 651º, do CPC.

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Respondeu o Autor pugnando por que seja rejeitada a impugnação da matéria de facto, dada a inobservância dos ónus impostos pelo artigo 640º, do CPC, mantida a decisão e a condenação nos exatos termos constantes da decisão proferida em primeira Instância e, sem prescindir, apresenta “pedido de ampliação e de impugnação da matéria de facto nos termos do art. 636º, nº2, do Código de Processo Civil”, apresentando as seguintes

CONCLUSÕES:
“I. No caso de ser julgado procedente o recurso interposto pela Recorrente sempre se dá cumprimento ao disposto no art. 636.° n.° 2 do CPC relativamente à ampliação e impugnação da decisão sobre pontos determinados na matéria de facto.
II. Isto porque considera a Recorrente mal julgado o seguinte facto NÃO PROVADO: "O parecer de 12/07/2023 tenha sido entregue à R", decisão que se impugna porquanto , o parecer de Julho de 2014, foi exibido e entregue à Ré em Setembro de 2013, como forma de instruir e sustentar a discussão sob as patologias que enfermavam o prédio que naquela altura tinham lugar, o que resulta no Doc. 1 junto com a resposta, atinente à acta n.º ..., de Assembleia de Condóminos de 09 de Setembro de 2013, junto aos autos a fls. 266 do Vol. I.
III. Esteve a Ré presente, através do seu Ilustre Mandatário, signatário da Contestação apresentada, já que a Ré era proprietária, na época, de várias fracções e nessa acta consta como Ponto 1 da ordem de trabalhos resulta o seguinte tópico: "apresentação e discussão da resposta da construtura A... à carta do condomínio conducente à reparação dos defeitos existentes no prédio e deliberação das medidas a serem tomadas contra a A... relativamente a este assunto", não se negligenciando que tal Mandatário encontrava-se munido de procuração para representação, assinou a lista de presenças e foi notificado, in locu, do relatório junto sob Doc. 18 do RI, que denunciava a maior parte das patologias e que constam no facto provado 56, sendo que a Ré referia que parte dos defeitos não eram imputáveis ao Construtor e Promotor, foi deliberado o seguinte: '
Após um longo debate entre todos os presentes foi proposto pelos condóminos, que a Administração:
1- Fizesse a triagem do que é realmente imputável ao promotor/construtor baseado na análise ponto por ponto do relatório técnico;
2- Solicitasse um parecer jurídico para perceber se é viável seguir com este caso para tribunal com alguma garantia de que a A... seria condenada ao pagamento das reparações dos edifícios;
3- Nomeasse um advogado para elaborar uma resposta à carta da A... e tentar um acordo de modo a resolver os problemas reportados sem recurso a tribunal”.
IV. A Ré, nesta votação, absteve-se, não tendo votado contra tal deliberação, sendo que esta teve como premissa o citado relatório técnico que nada mais era que o referido Documento n.° 18 junto com o RI.
V. Se claros são os documentos juntos aos autos que enunciam o circunstancialismo acima elencado, também clara foi a prova testemunhal produzida, designadamente a prova da testemunha CC que confirmou que nessa assembleia entregou o referido parecer, em mão, ao Sr. Dr. DD, advogado e representante da Ré, cuja transcrição acima se realizou na alegação 16 que aqui se considera integralmente realizada, sendo que tal testemunha depôs de uma forma séria e credível, com a relevância de presentemente não ter proprietário de qualquer fração já que o seu apartamento foi vendido após a propositura da presente ação, não tendo qualquer interesse no desenvolvimento da lide.
VI. Portanto, deverá ser alterada a resposta dada ao primeiro facto não provado, que deverá merecer a resposta de PROVADO que o parecer de 12/07/2023 tenha sido entregue à R. em 19 de Setembro de 2023.
VII. Acresce, ainda, que o Autor impugna o facto dado como provado n.° 70 ("A ventilação do edifício encontra-se executada de acordo com o projeto de especialidades que foi aprovado e licenciado pelo Município ...").
VIII. Com todo o respeito pela Douta Instância recorrida - que é, naturalmente, muito - não foi produzida prova para que a resposta tenha sucedido nos termos em que sucedeu, pelo que, por falta de prova terá que ser considerado NÃO PROVADO o facto n.° 70, o que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos”.

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Respondeu a Ré pugnando pelo indeferimento do pedido de ampliação e de impugnação da matéria de facto apresentado pela recorrida.

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Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.

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II. FUNDAMENTOS

- OBJETO DO RECURSO

Apontemos, por ordem lógica, as questões objeto do recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações da recorrente, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº3 e 4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil -, ressalvado o estatuído no artigo 665º, de tal diploma legal.

Assim, as questões a decidir são as seguintes:
1ª- Da nulidade da sentença, por padecer dos vícios a que aludem as al.s  c) e d), do nº1, do art. 615º, do CPC;
2ª- Quanto à impugnação da decisão de facto:
2.1 - Da observância dos ónus de impugnação da decisão de facto;
2.2 - Do mérito da impugnação da decisão de facto/modificabilidade de tal decisão:
2.2.1 - Critérios do julgamento (âmbito da apreciação e autonomia decisória).
2.2.2 - Da modificabilidade da decisão de facto quanto aos pontos aludidos na al. C) das conclusões das alegações, supra exaradas.
3ª- Do erro da decisão de mérito:
3.1 - Da qualificação dos contratos celebrados entre a Ré e os condóminos e dos direitos do condomínio quanto a defeitos verificados nas partes comuns;
3.2 - Se os direitos do Condomínio Autor se extinguiram por caducidade;
3.3 - Dos direitos do Autor (e correspetiva obrigação da Ré): a reparação de defeitos das partes comuns/a indemnização.
4ª- Da ampliação do âmbito recurso.


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II.A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

1. FACTOS PROVADOS

Foram os seguintes os factos considerados provados pelo Tribunal de 1ª instância (transcrição):

(Da PI)

1. “O Autor é o Condomínio do prédio constituído, em 27/10/2003, em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ... n.ºs ..., ... e ..., Rua ... n.ºs ... e ... e Rua ... n.ºs ..., ..., e ..., da freguesia ....

2. A Administração do Condomínio é presentemente exercida pela Sociedade Comercial por Quotas “B..., LDA.”.

3. A Ré é uma Sociedade Comercial por Quotas que tem por objecto a construção civil, bem como a compra e venda de bens imobiliários.

4. No exercício da sua actividade comercial de empresa do ramo da construção civil, a Ré construiu/edificou em regime de propriedade horizontal o prédio supra id. composto por um total de cem fogos habitacionais de tipologia T0 e T3, três estabelecimentos comerciais e cave com lugares de garagem e arrumos.

5. O referido prédio é composto por cinco blocos: blocos ..., ..., ..., ... e ....

6. O referido prédio é constituído por cinco edifícios que se desenvolvem em cave enterrada para estacionamento e arrumos e em pisos elevados para habitação.

7. Na zona central dos edifícios, em regime de condomínio fechado, existe um espaço de lazer ajardinado e pavimento comum aos vários edifícios.

8. A construção destes blocos, constituídos por diversas fracções, apartamentos e aparcamentos e partes comuns, não foi concluída pela R. numa única vez.

9. Uma parte do prédio, constituída pelo bloco ..., está ainda em construção.

10. A construção destes vários blocos foi realizada de forma faseada, tal como faseada foi a venda das fracções, que agora são dos agora proprietários destas.

11. A construção e venda das fracções do prédio em regime de propriedade horizontal da aqui Autora foram realizadas por etapas.

12. Os jardins e garagens, entre outros, são comuns a todos os blocos.

13. Em 27 de Novembro de 2003, a Ré, então proprietária da totalidade das fracções (100 % do prédio) que constituíam o bloco ... e ..., procedeu à eleição da Administração do Condomínio, mandato exercido pela empresa “C..., Lda.”.

14. Nessa mesma altura, a Ré procedia à edificação dos blocos ... e ... e à edificação de elementos que constituem, por exemplo, a garagem do prédio, situada no piso inferior de todos os blocos.

15. Os blocos ... e ... apenas foram concluídos em finais do ano de 2006, tendo as vendas dos vários apartamentos ocorrido em momento posterior, o que levou a que a entrega do prédio à Administração do Condomínio tenha sucedido em 30 de Março de 2012 quanto ao bloco ... e em 21 de Setembro de 2012 quanto ao bloco ....

16.  Em 30 de Março de 2012, das 20 fracções do bloco ..., 10 pertenciam à Ré.

17. Em 21 de Setembro de 2012, das 20 fracções do bloco ..., 06 eram da propriedade da Ré.

18.  Em 15 de Setembro de 2005, das 27 fracções cujos proprietários por si, ou representados, estavam presentes na assembleia de condóminos então realizada, 17 eram propriedade da Ré.

19.  A 16 de Novembro de 2006, a Ré era proprietária de, aproximadamente, 1/3 das fracções dos blocos ... e ....

20.  A 6/11/2006 foi eleito como Administrador do Condomínio BB, cujas funções se iniciaram a 01 de Dezembro de 2006, tendo as mesmas cessado em 11 de Janeiro de 2013, com a sua demissão.

21. Da acta n.º ... resulta o esclarecimento quanto às actas ... e ... no sentido de aclarar que a administração do condomínio apenas recebeu os blocos ... e ... em Março e Outubro, respectivamente do ano de 2012.

22.  A nova administração do condomínio foi eleita em 01 de Fevereiro de 2013, cujo mandato cessou com a eleição da actual administração.

23. Nesta data, as partes comuns do prédio padeciam de problemas.

24. Em 31 de Janeiro de 2014, realizou-se assembleia de condomínios que deliberou o recurso às vias judiciais contra a Ré quanto à questão da exigibilidade da reparação dos defeitos de construção.

25. A Administração constituída, em conjunto, pelos condóminos CC, EE, FF, GG e AA, eleita em 01 de Fevereiro de 2013, encomendou o levantamento das patologias das partes comuns do edifício.

26. O supra id. BB, Advogado de profissão, no período compreendido entre 6/11/2006 e 11/01/2013, assumiu a representação da R. A... em assembleias de condóminos desta empresa noutros edifícios que esta construtora edificou.

27. O Dr. BB foi Advogado mandatado pela Ré para assumir a sua representação no âmbito de uma acção executiva.

28. O administrador BB foi interpelado acerca da forma como se encontrava a agir, no que diz respeito a diligenciar para que fossem resolvidos os problemas/defeitos de construção nas partes comuns do imóvel do Condomínio Autor.

29.  Este Administrador diligenciou pela realização de uma assembleia de condóminos que, a 21/12/2012, deliberou o recurso às vias judiciais contra a Ré no sentido de serem reparados os defeitos de construção existentes.

30.  Esta assembleia foi impugnada pela Ré, por violação das regras das convocatórias das assembleias de condóminos.

31. Não foi convocada uma assembleia de condóminos extraordinária para renovação das deliberações em crise.

32. A Administração do Condomínio eleita em 01 de Fevereiro de 2013, logo que tomou posse e lhe chegou às mãos todos os dossiers do prédio, para além das chaves de todas as partes comuns edifício, diligenciou por indagar do status quo das partes comuns.

33. A 6/02/2013 a Administração do Condomínio solicitou à Ré um pedido de agendamento de reunião para 7 de Fevereiro de 2013.

34. Tal reunião visava que a Administração do Condomínio recentemente eleita se apresentasse junto da Ré com o objectivo de transmitir a existência de diversos problemas existentes nas partes comuns dos prédios.

35. Tal reunião foi realizada em 13 de Fevereiro de 2013, e na sequência da mesma a Administração do Condomínio, no mesmo dia, denunciou a existência dos seguintes defeitos/problemas de construção nas zonas comuns do imóvel:

a. Problemas no interior da cisterna;

b. Infiltrações na cisterna do edifício ... e ...;

c. Buracos da ventilação/insuflação dos pisos dos edifícios ... e ...;

d. Infiltrações no quadro elétrico dos serviços comuns do edifício ...;

e. Os intercomunicadores não abrem a porta do r/c do edifício ... e ...;

f. Ventilação do exaustor nas cozinhas do edifício ... não funciona;

g. Faltam rufos no telhado;

h. Os rufos do telhado estão enferrujados;

i. Não existem telas junto das chaminés nem no edifício de acesso à cobertura;

j. Pagamento das inspeções dos elevadores;

k. Degradação do chão da garagem;

l. Infiltrações na garagem;

m. Teto a cair na garagem do edifício E;

n. Existirá alguma forma de desviar a água proveniente da mina que é despejada para a garagem? Esta situação implica o funcionamento constante das bombas de água da garagem.

o. Cabo preto no teto da garagem parece um ramal provisório. Qual é o destino deste cabo? Parece-nos os escritórios da A...;

p. Infiltrações no alpendre de acesso ao edifício ...;

q. Tubo existente no teto do lugar de garagem da fração BJ (D0.2);

r. O motor da ventilação das casas de banho do edifício ... nunca funcionou;

s. Infiltrações no alpendre de acesso ao edifício ...;

36.  Como resposta à denúncia de defeitos, replicou a Ré a 14 de Fevereiro de 2013, em primeiro lugar, invocando que os defeitos denunciados não foram realizados “no prazo legal de cinco anos previsto no art. 1225.º do Código Civil e no DL 84/2008”, e, em segundo lugar, colocava a Ré a possibilidade dos defeitos denunciados se fundamentarem no “decurso do tempo ou de uma má utilização por parte dos condóminos, ou opções de projecto e arquitectura”.

37. Invocando a expectativa dos condóminos mais recentes do lote ... e ... e a sua boa-fé e o seu bom nome, a R. disponibilizou-se para analisar os diversos defeitos.

38. Mais preconizou a realização de uma peritagem em relação à garagem.

39. A Ré reparou alguns dos defeitos/desconformidades desde Fevereiro de 2013 até ao final do ano de 2014.

40. À denúncia dos defeitos realizada pelo Condomínio Autor a Ré respondeu novamente a 6/05/2013, expondo, mais uma vez, que o prazo de denúncia dos defeitos estava já decorrido nos termos dos arts. 1225.º e DL 84/2008.

41.  A 20/05/2014, a R., sem reconhecer que lhe fossem imputáveis, admitiu à Administração do Condomínio Autor a possibilidade de reparar algumas patologias de forma graciosa.

42.  Foi solicitado pelo Autor um Parecer técnico para aferir dos defeitos de construção denunciados, o que foi comunicado à R.

43. O Condomínio Autor comunicou à Ré que, caso não fossem solucionados os defeitos de construção existentes nas partes comuns, iria socorrer-se da tutela do Tribunal para que fosse a vendedora compelida judicialmente a realizar as obras.

44.  A R. assumiu a realização de algumas obras nas partes comuns.

45.  Em 12 de Julho de 2013 foi entregue ao Condomínio Autor o Parecer que havia solicitado acerca das patologias das partes comuns.

46. Em Dezembro de 2013 foi entregue ao A. um outro Parecer, elaborado pelo mesmo técnico, e donde consta a existência dos seguintes defeitos de construção que foram comunicados à R. em Janeiro de 2014:

No exterior

a. Manchas de humidade e degradação do revestimento nas platibandas da fachada Poente do edifício ... e platibandas da fachada Nascente do edifício ... e ...;

b. Desconformidade de cores da fachada Norte do edifício ... e a presença de manchas de escorrimento de corrosão pontuais;

c. Parede de fachada de edifício ... com manchas de eflorescências em pequenas áreas do revestimento cerâmico;

d. Parede de fachada do edifício com descolamento localizados em pequenas áreas de revestimento cerâmico;

e. Paredes exteriores da casa de máquinas do elevador e caixa de estacas com fendilhação longitudinal que atravessa a superfície rebocada e pintada;

f. Obstrução do interior dos tubos de queda do edifício ... resultado da entrada da camada de brita da protecção da cobertura, que diminuirá a capacidade de escoamento de caixas de visita e dos colectores prediais e originar humidades no interior do edifício;

g. Existência de água e humidade na ligação de cabos eléctricos à caixa de electricidade existente na cobertura do edifício ..., encontrando-se os cabos eléctricos bastante folgados pelo que alguma instalação eléctrica e ou de ventilação poderá não estar a funcionar;

h. O ventilador de cobertura ligado às colunas de extracção do ar das cozinhas do edifício ... que extrai menor caudal de ar comparativamente com o do ar das cozinhas do edifício ...;

i. Parte da área da cobertura do alpendre de acesso ao edifício ... que possui acumulação de água pluvial e a presença de sinais de desenvolvimento de fungos;

j. Laje do alpendre de acesso ao edifício ... com destacamento superficial do betão sendo visível a armadura com corrosão pontual;

k. Fendilhação extensa de média abertura acompanhada de destacamento de betão ao longo da viga de bordadura da laje de cobertura da cave, permitindo a entrada de água pluvial;

l. Obstrução parcial da tubagem para drenagem de água de rega e da água pluvial;

No interior

a. Na parede interior da caixa de escadas com fissuração longitudinal de pequena abertura afectando apenas a parte superficial;

b. Infiltração de água no tecto do hall de entrada do rés-do-chão do edifício ... que chegou até ao quadro eléctrico do edifício ....;

c. Betonilha de acabamento do pavimento da cave de estacionamento com fendilhação e deterioração;

d. Revestimento do tecto da cave de estacionamento junto a colectores prediais e juntas de dilatação com manchas de humidade, manchas de reparações anteriores e destacamentos em áreas pontuais do revestimento;

e. Área envolvente à fracção do reservatório de abastecimento de água possui na parede que confronta o solo e no piso manchas de humidade e escorrimentos resultantes de dissolução de componentes de betão e das armaduras;

f. Parede interior da célula esquerda do reservatório de abastecimento de água possui armaduras à vista com corrosão;

g. Pela ventilação natural, parte do ar extraído da cave do estacionamento está a ir para as comunicações horizontais interiores dos pisos de habitação.

47.  O Condomínio foi informado em Maio de 2014, pela Ré, que iria proceder à reparação de alguns dos defeitos.

48. Em conformidade, durante o ano de 2014 a Ré destacou diversos funcionários e colaboradores, o que fez por diversas vezes, no sentido de se deslocarem ao prédio do Condomínio Autor para procederem a várias reparações conducentes à eliminação dos defeitos denunciados.

49.  Realizou a Ré as seguintes reparações:

● “Substituição da platibanda da fachada Norte do edifício ... e revisão de toda a platibanda envolvente dos blocos ... e ...;

● Reparação da viga de bordadura da laje da cave com tela (foi feita junta de dilatação);

● Reparação de fissuras no reboco exterior da casa das máquinas do bloco ...;

● Pintura da casa das máquinas e caixa de escadas do bloco ...;

● Selagem com produto betumoso da caixa de ligação das infraestruturas eléctricas na cobertura;

● Ligação da caleira periférica à caixa de recolha de águas pluviais”.

50. Para além disso, a Ré procedeu à remoção e colocação de novo capacete de remate na fachada lateral direita.

51. Bem como procedeu à revisão geral, incluindo substituição de fixações, colocação de mais fixações nos restantes capacetes de remate em todo o perímetro da cobertura.

52. Os diversos trabalhos realizados pela Ré foram acompanhados pela Administração do Condomínio do Autor.

53.  Procedeu, ainda, durante o ano de 2014, a Ré à realização de trabalhos conducentes a eliminar as infiltrações da garagem no sentido de tratar a fendilhação da laje da cobertura da cave/garagem.

54. Tais trabalhos não foram suficientes para resolver as patologias existentes na garagem.

55. Alguns dos problemas supra elencados continuam por reparar.

56.  O prédio do condomínio do A.  padece dos seguintes problemas:

● Tomadas e saídas de ar nas zonas de circulação dos edifícios ... e ....

● Indícios de humidade nas portas do armário da zona do quadro eléctrico dos serviços comuns do edifício ..., bem como nos tetos interior e exterior.

● Degradação do piso da garagem na zona da 1.ª fase (blocos ... e ...).

● Infiltrações nos tetos das garagens, nas zonas do logradouro.

● Manchas de humidade no revestimento nas platibandas da fachada Poente nos blocos ... e ... que leva a alguma degradação do revestimento da fachada.

● Desconformidade de cores das chapas de revestimento da fachada Norte do edifício ....

● Manchas de eflorescências em áreas do revestimento cerâmico da parede de fachada do edifício ....

● Tubos de ligação de cabos eléctricos à caixa de electricidade existente na cobertura do edifício ... apresenta uma inclinação descendente e deveria ter uma inclinação ascendente.

● Fendilhação na ligação entre a laje de cobertura da cave e a camada de enchimento.

● Infiltrações no teto do hall de entrada do R/C do edifício ... que chega até à zona do quadro eléctrico do edifício ....

● A betonilha da cave apresenta em determinados locais localizados aspectos de degradação a necessitar de demolição e reconstituição dessas zonas identificadas de forma a garantir a sua conservação e cumprimento da função de pavimento estável e duradouro.

● Defeitos no revestimento do teto da cave de estacionamento junto a colectores prediais e juntas de dilatação com manchas de humidade, manchas de reparações anteriores e destacamentos em áreas pontuais do revestimento.

● Escorrimentos na parede e humidade no pavimento na fracção do reservatório de abastecimentos de água.

● A ventilação da cave é feita por conduta directa à cobertura e a essa conduta estão ligadas as ventilações de cada piso de acordo com o projecto de ventilação.

● Alguma fissuração na ligação das paredes exteriores com a estrutura de betão armado da caixa de escadas/elevador.

● No teto da entrada de acesso ao edifício ... por baixo da respectiva cobertura verifica-se desgaste na pintura do teto e vestígios de humidade na zona junto aos focos de iluminação.

● A tubagem de drenagem das águas pluviais e da rega estão parcialmente obstruídas com a passagem da tubagem de rega.

57. Os problemas elencados no ponto antecedente são defeitos de construção.

58. Emergem da violação das regras de bem construir e/ou da falta de aplicação de materiais adequados para os fins habitacionais a que se destinam.

59. No edifício ... faltam as pinhas na entrada das descargas da água da cobertura.

60. A tubagem de abastecimento da rega foi metida por alguns dos tubos de drenagem, obstruindo-os em mais de 50% da sua área.

61. A parede da fachada Norte do edifício ... possui uma solução provisória em chapa metálica canelada que compromete a estética e o seu valor patrimonial.

62. As infiltrações de água verificadas na garagem são consequência da falência ou inexistência do sistema de impermeabilização.

63.  Apenas estão em funcionamento em cada um dos blocos ... e ... um elevador.

64. A principal razão da ventilação da cave é garantir que não haverá aí acumulação de gases dos escapes e garantir a renovação do ar desse espaço, tornando-se assim necessário garantir a entrada natural de ar pelas aberturas existentes e permitir a saída do ar do espaço das garagens pelos ductos de ventilação colocados nos tetos das garagens e eliminar a ligação dos ductos de ventilação das garagens às ventilações das caixas de escadas.

65. As manchas de humidade no revestimento nas platibandas da fachada nos blocos ... e ... que leva a alguma degradação do revestimento da fachada devem-se à falta de capeamento das platibandas.

66. As eflorescências em áreas do revestimento cerâmico da parede de fachada do edifício ... deve-se à perda de água (ou solvente) por cristalização da atmosfera na exposição ao ar formando sal hidratado, cujas boas técnicas de construção são adequadas a evitar.

67. Em 20 de Janeiro de 2014 foi a Ré notificada da missiva denunciando que nos edifícios ... e ... que possuem, cada um, dois elevadores, apenas um elevador funciona em cada um dos edifícios.

68. Em 19/09/2014 foi registada na Conservatória do Registo Predial a aquisição à aqui R. da fracção CB do prédio supra id. em 1.

(Da Contestação)

69.  Em Assembleia Geral de Condóminos realizada a 11/01/2008 foi discutida a questão das diversas avarias e defeitos de construção que o construtor deve reparar.

70. A ventilação do edifício encontra-se executada de acordo com o projecto de especialidades que foi aprovado e licenciado pelo Município ....

71.  Em Assembleia Geral realizada a 22/01/2010, o A. deliberou instalar o sistema de rega no condomínio nos jardins.

72.  Tal operação foi realizada mediante a introdução do sistema de rega no sistema de escoamento de águas pluviais do condomínio”.


*

2. FACTOS NÃO PROVADOS

Considerou o Tribunal de 1ª instância não provados todos os factos que se mostrem em contradição com os que acima se deram como provados e, designadamente que (transcrição):

● “O parecer de 12/07/2023 tenha sido entregue à R.

● Os elevadores tenham sido entregues à Administração totalmente inaptos para serem colocados em funcionamento.

● O custo para a reparação dos dois elevadores seja de 2.158,45 €.

● O interior da cisterna tenha defeitos.

● Haja infiltrações na cisterna do edifício ... e ....

● As inspecções dos elevadores não estejam pagas.

● O teto na garagem do edifício E esteja a cair.

● Haja problemas provenientes da mina que é despejada para a garagem.

● Haja problemas no tubo existente no teto do lugar de garagem da fracção BJ.

● Haja problemas no motor da ventilação das casas de banho do edifício ....

● Manchas de humidade e degradação do revestimento nas platibandas da fachada Poente do edifício ....

● Defeitos de construção na parede de fachada do edifício com descolamento localizados em pequenas áreas de revestimento cerâmico.

● Existência de água e humidade na ligação de cabos eléctricos à caixa de electricidade existente na cobertura do edifício ....

● Defeitos na parede interior da célula esquerda do reservatório de abastecimento de água.

● Corrosão à vista neste reservatório.

● Inexistência de iluminação de emergência nas partes comuns no caso de corte de energia.

● Problemas nos dois elevadores que não estão em funcionamento.

● Acumulação de água pluvial e a presença de sinais de desenvolvimento de fungos na cobertura do alpendre de acesso ao edifício ....

● Para reparar os defeitos supra referidos em 56 dos Factos Provados seja necessário o valor de 296.440,88 €.

Da Contestação:

● A primeira comunicação de defeitos pela A. à R. tenha sido por missiva de 25/02/2013.

● Os concretos defeitos comunicados a 13/02/2013 e em Janeiro de 2014 fossem conhecidos do A. há mais de um ano.

● Os elevadores tenham sido entregues aptos.

● Tenham sido os condóminos que decidiram manter dois dos quatro elevadores parados para poupar energia.

● As infiltrações na garagem sejam resultantes da instalação do sistema de rega no sistema de escoamento das águas pluviais.

● A degradação do chão da garagem seja devida à falta de manutenção.

● As manchas e humidades dos edifícios A e B sejam consequência nomal do decurso do tempo e da degradação dos respectivos materiais.

● A data da sua conclusão estes edifícios não apresentassem qualquer vício.

● As manchas de humidade e a degradação do revestimento das platibandas destes dois blocos sejam do conhecimento da A. desde data anterior a Janeiro de 2013.

● As manchas de eflorescência sejam próprias do decurso do tempo e do facto de as fachadas estarem expostas ao exterior,

● Tenha sido colocada uma pinha de plástico em todas as entradas dos tubos de queda.

● A pinha tenha sido removida.

● O sistema de rega tenha sido executado pelo jardineiro do condomínio.

● Em 2011/inícios de 2012, os condóminos tenham deliberado instalar o sistema de rega em todo o sistema de águas pluviais do condomínio.

● As infiltrações das águas da chuva tenham ocorrido pela primeira vez em 2012/1013.

● O sistema de rega tenha ficado concluído em 2012.

● O sistema de rega tenha sido a causa das infiltrações na garagem”.


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II.B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

- Da nulidade da sentença
Arguiu o Réu/Apelante, no recurso que apresentou, a nulidade da sentença por a mesma padecer dos vícios previstos nas als c) e d), do nº1, do art.º 615.º, do Código de Processo Civil, diploma a que pertencem todos os preceitos citados sem outra referência.
Analisemos, em primeiro lugar, das invocadas nulidades, pois que as mesmas contendem com a validade da própria decisão.
Começa por se referir que as “Causas de nulidade da sentença”, vêm taxativamente consagradas no referido preceito que estabelece:
“1 - É nula a sentença quando:
… c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
…”.
As nulidades da sentença são, assim, tipificados, vícios formais, intrínsecos de tal peça processual, reportando-se à estrutura, à inteligibilidade e aos limites, sendo vícios do silogismo judiciário inerentes à sua formação e à harmonia formal entre as premissas e a conclusão, que não podem ser confundidas com erros de julgamento (error in judicando) de facto ou de direito[1].  Trata-se de um error in procedendo, nada tendo a ver com os erros de julgamento (error in judicando), seja em matéria de facto seja em matéria de direito.
E, como vícios intrínsecos daquela peça processual, as nulidades da sentença são apreciadas em função do texto da sentença e do discurso lógico que nela é desenvolvido, não podendo ser confundidas com erros de julgamento de facto nem com erros de aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento, estes, a sindicar noutro âmbito. Nos erros de julgamento assiste-se a uma deficiente análise crítica das provas produzidas e/ou a uma deficiente enunciação e/ou interpretação dos institutos jurídicos aplicados ao caso concreto. Esses erros, por não respeitarem já a defeitos que afetam a própria estrutura da sentença, antes o mérito da relação material controvertida, nela apreciada, não a inquinam de invalidade, mas de error in judicando atacáveis em via de recurso[2].
Os vícios da sentença são, portanto, aqueles que “afetam formalmente a sentença e provocam a dúvida sobre a sua autenticidade, como é o caso da falta de assinatura do juiz, ou a ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que se decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduzir logicamente a resultado oposto do adotado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões que deveria conhecer (omissão de pronúncia)”[3] ou condenar ultra petitum, tendo o julgador de limitar a condenação ao que, concretamente, vem peticionado, em obediência ao princípio do dispositivo.
Os referidos vícios respeitam à “estrutura ou aos limites da sentença. Respeitam à estrutura da sentença os fundamentos das alíneas b) (falta de fundamentação), c) (oposição entre os fundamentos e a decisão). Respeitam aos seus limites os das alíneas d) (omissão ou excesso de pronúncia) e e) (pronúncia ultra petitum)”[4].

Analisemos os invocados vícios, que se reportam quer à estrutura quer aos limites, exarando-se, desde já, que, fundamentada é a decisão, quer de facto quer de direito, consequente com os fundamentos, não contendo qualquer ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível, tendo havido pronúncia sobre todas as questões que o tribunal devia apreciar.
Sendo frequente a confusão entre a nulidade da decisão (que a proceder conduz à anulação da sentença) e a discordância do resultado obtido, cumpre reforçar e deixar claro que os vícios da sentença não podem ser confundidos com erros de julgamento (error in judicando), que são erros quanto à decisão de mérito, estes decorrentes de má perceção da realidade factual (error facti) e/ou aplicação do direito (error juris) de forma que o decidido não corresponde à realidade normativa (que, na procedência, conduzem à alteração da decisão da matéria de facto e/ou à revogação da decisão).
E, com efeito, “Ao juiz cabe especificar os fundamentos de facto e de direito da decisão (art. 607-3). Há nulidade (no sentido de invalidade, usado pela lei) quando falte em absoluto a indicação dos fundamentos de facto ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão (ac. do STJ de 17.10.90, Roberto Valente, AJ, 12, p. 20: constitui nulidade a falta de discriminação dos factos provados). Não a constitui a mera deficiência de fundamentação (ac. do TRP de 6.1.94, CJ, 1994, I. p 197: a simples indicação do preceito legal aplicável constitui fundamentação suficiente da decisão…”[5].
 E no que concerne a insuficiência de fundamentação de facto, diga-se que, integrando a sentença tanto a decisão sobre a matéria de facto como a fundamentação dessa decisão (art. 607º, nº3 e 4), “deve considerar-se que a nulidade consagrada na alínea b), do nº1 (falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão) apenas se reporta à primeira, sendo à segunda, diversamente, aplicável o regime do art. 662, nºs 2-d e 3, alíneas b) e d) (ac. do TRP de 5.3.15, Aristides Rodrigues de Almeida, www.dgsi.pt.proc.1644/11, e ac. do TRP de 29.6.15, Paula Leal de Carvalho, www.dgsi.pt, proc 839/13)”[6].
Assim, “é nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto e de direito ou que se caracterize pela sua ininteligibilidade, previsões que a jurisprudência tem vindo a interpretar de forma uniforme, de modo a incluir apenas a absoluta falta de fundamentação e não a fundamentação alegadamente insuficiente e ainda menos o putativo desacerto da decisão (STJ 2-6-16,781/11).” [7].
Deste modo, importa distinguir entre erros de atividade ou de construção da sentença, geradores de nulidade a que se reporta aquele art. 615º, n.º 1, dos erros de julgamento, que apenas afetam o valor doutrinal da decisão, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada[8] atacáveis em via de recurso e não determinativos daquela invalidade.
A deficiente fundamentação, em que apenas se verifica uma insuficiente ou errada análise das provas produzidas ou uma indevida enunciação e interpretação dos institutos jurídicos aplicados ao caso concreto, não constitui omissão de fundamentação, determinativa de nulidade da sentença, mas mero erro de julgamento, atacável e sindicável em via de recurso[9].
E nos casos em que o vício da deficiente fundamentação se coloque ao nível da decisão sobre a matéria de facto, esse vício tem de ser solucionado mediante as regras próprias enunciadas nos n.ºs 1 e 2 do art. 662º.

*
Quanto ao vício consagrado na al. c), os fundamentos estarem em oposição com a decisão ou ocorrer ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, cumpre referir que “Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora da ineptidão da petição inicial (art. 186-2-b)”[10] 
Verificando-se contradição entre os fundamentos e a decisão quando no raciocínio do julgador existe vício tal que apontando a fundamentação num sentido a decisão segue em sentido oposto, pelo menos diferente, constata-se que no caso a decisão se orienta no mesmo sentido da fundamentação.
A apontada nulidade não se verifica no caso pois que nenhuma oposição entre os fundamentos e a decisão se verifica, antes os fundamentos aduzidos conduzem, necessariamente, à decisão, que de ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível não padece, antes a mesma tem um só sentido e é clara, evidente e bem percetível, prendendo-se a questão suscitada, antes com o mérito que, adiante, será objeto de reapreciação.
Como se decidiu no Ac. do STJ de 22.02.2019, proc. 19/14.4T8VVD.G1.S1, consultável in www.dgsi.pt, “A nulidade ancorada na ambiguidade ou obscuridade da decisão proferida, remete-nos para a questão dos casos de ininteligibilidade do discurso decisório, concretamente, quando a decisão, em qualquer dos respetivos segmentos, permite duas ou mais interpretações (ambiguidade), ou quando não é possível saber com certeza, qual o pensamento exposto na sentença (obscuridade)”,  sequer vindo suscitado erro de construção do silogismo judiciário, mas diferente valoração e opinião sobre a prova produzida, questão a prender-se com erro de julgamento.
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Relativamente ao vício de omissão de pronúncia (al. d)), cumpre referir que “Devendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, com as respetivas causas de pedir, das exceções invocadas e de todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (v. nº2, do art. 608º), o não conhecimento de pedido ou exceção, cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão, constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica diferentes das seguidas na sentença, que as partes hajam invocado”[11].
Assim, cabe distinguir “questões” das “razões ou argumentos”, pois que uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar e outra, diversa, é invocar razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção. “São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer a questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar as suas pretensões”[12]
A não apreciação pelo tribunal quanto a questões que lhe são submetidas determina a nulidade da sentença, não a sendo suscetível de determinar a falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões.
A nulidade da sentença, por omissão ou excesso de pronúncia, há de, assim, resultar da violação do dever prescrito no n.º 2, do referido artigo 608º, do qual resulta o dever do juiz de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
Na verdade, não se verifica omissão de pronúncia quando o não conhecimento de questões fique prejudicado pela solução dada a outras[13] e o dever de pronúncia obrigatória é delimitado pelo pedido e causa de pedir e pela matéria de exceção[14].
O dever imposto no nº2, do artigo 608º diz respeito ao conhecimento, na sentença, de todas as questões de fundo ou de mérito que a apreciação do pedido e da causa de pedir apresentadas pelo autor (ou, eventualmente, pelo réu reconvinte) suscitam. Só estas questões é que são essenciais à solução do pleito e já não os argumentos, razões, juízos de valor ou interpretação e aplicação da lei aos factos. Para que este dever seja cumprido, é preciso que haja identidade entre a causa petendi e a causa judicandi, entre a questão posta pelas partes e identificada pelos sujeitos, pedido e causa de pedir e a questão resolvida pelo juiz[15].
Orienta-se a jurisprudência uniformemente no sentido de a nulidade por omissão de pronúncia supor o silenciar por parte do tribunal sobre qualquer questão de cognição obrigatória, isto é, que a questão tenha passado despercebida ao tribunal, já não preenchendo esta concreta nulidade a decisão escassamente fundamentada a propósito dessa questão[16] ou decisão que não acolha os argumentos do apelante e decida em sentido oposto ao que o mesmo se apresentou a propugnar, sendo esta a situação que se verifica no caso concreto.
In casu, a nulidade da sentença é arguida por falta da devida apreciação e valoração de prova, por falta de fundamentação fáctica, confundindo o apelante a invocação da nulidade da sentença com a existência de erro de julgamento, este o efetivo fundamento do seu recurso, que será conhecido de seguida.
Não padece, pois, a decisão dos apontados vícios formais, que improcedem.

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2ª. Da impugnação da decisão de facto:

2.1 - Da observância dos ónus de impugnação.
Cumpre começar por decidir da impugnação da decisão de facto para que, ante a definitiva definição dos contornos fácticos do caso, possamos entrar na reapreciação da decisão de mérito.
Antes, porém, cabe analisar a questão, suscitada pelo apelado, e, mesmo, de conhecimento oficioso, da observância dos ónus, para tanto, impostos ao recorrente que impugne a matéria de facto (questão adjetiva, prévia à análise da apreciação de mérito da impugnação).
Encontram-se os ónus de impugnação da decisão de facto enunciados nos nº1, do art. 639º e nos nº1 e 2, a), do art. 640º, decorrendo eles dos princípios da cooperação, da lealdade e da boa-fé processuais, visando garantir a seriedade e a consistência do recurso e assegurar o exercício do contraditório.
Comecemos por referir que, na verdade, os ónus legalmente impostos em sede de impugnação da decisão da matéria de facto, constituem requisitos habilitadores a que o tribunal ad quem possa conhecer da impugnação.
Na verdade, a lei adjetiva, que no nº1, do art. 639º, consagra o ónus de alegar e de formular conclusões, estabelece que “o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”, sendo as conclusões das alegações de recurso que balizam a pronúncia do tribunal (art. 635º).
E o art. 640º consagra ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, estabelecendo no nº1, que:
 “1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a)- os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b)- os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c)- a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
O n.º 2, do referido artigo, acrescenta que:
“a) … quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”.
Verifica-se, no caso, que embora o apelante não tenha especificado de modo concludente nas conclusões das alegações, a delimitar o objeto do recurso, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, dado que nas conclusões das alegações se limitou a impugnar pontos provados e não provados afirmando que os “considera incorretamente julgados, total ou parcialmente[17], certo é que no corpo das alegações toma posição definida quanto a cada um dos pontos de facto que pretende sejam alterados, manifestando as razões da sua devergente opinião relativamente à decisão.
Assim, indicando nas conclusões das alegações, com precisão, “os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados”, concretiza no corpo das alegações o que considera incorretamente julgado quanto a cada ponto que impugna e, aí, dá cumprimento aos demais ónus impostos.
Ora, como analisou o STJ, na Decisão de 27/9/2023, proferida no proc. nº2702/15.8T8VNG-C.S1 que, por bem esclarecedora, se cita:
Com ampla sedimentação na jurisprudência deste tribunal, no funcionamento dos efeitos do disposto nos artigos 640º e 662º, nº1, do CPC, devemos distinguir, a exigência da concretização dos pontos de facto incorretamente julgados, da  indicação dos concretos meios probatórios convocados e da decisão a proferir, a que aludem as alíneas a), b) e c) do nº1 do artigo 640º, que integram o denominado ónus primário, atenta a sua função de delimitação do objeto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto.
De outro lado, o requisito da indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, contemplada na alínea a) do nº 2 do mesmo artigo 640º, que integra um ónus secundário, para permitir que a Relação aceda de forma dirigida aos meios de prova gravados, que o recorrente entende necessários à reapreciação do sentido probatório dos factos impugnados.
Ora, perante alguma dificuldade na aplicação do dispositivo legal em certas casuísticas, na aferição do cumprimento dos aludidos ónus pelo recorrente, devem perseverar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, modelando na medida necessária, os requisitos de forma.
Tal como reiterado em diversos arestos deste Supremo Tribunal , v.g., «I.  Constitui jurisprudência do STJ que a verificação do cumprimento do ónus de alegação regulado no art. 640.º do CPC deve ser compaginada com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, atribuindo-se maior relevo aos aspectos de  ordem material em detrimento das questões formais.(…)»; « (…)III - De acordo com a orientação reiterada do STJ, a verificação do cumprimento do ónus de alegação do art. 640.º do CPC tem de ser realizada com respeito pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, dando-se prevalência à dimensão substancial sobre a estritamente formal.(...)» .[18]
 No mesmo percurso, salienta o Acórdão do STJ de 19.01.2023 - «Entre os corolários do ónus de delimitação do objecto e de fundamentação concludente da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, consagrado no n.º 1 do art. 640.º do CPC, está o de que o recorrente deve sempre indicar nas conclusões do recurso de apelação os concretos pontos de facto que julgou incorrectamente julgados
Por último, ainda na órbita do debate das exigências previstas no artigo 640º, nº1, do CPC, desenha-se como jurisprudência constante deste tribunal, o limite do cumprimento do ónus primário (al) a) nas conclusões de recurso, como pontifica, entre outros, o Acórdão do STJ de 22.09.2022 - «II -Nesta linha interpretativa, tem vindo a admitir-se que, no que se refere às exigências das alíneas b) e c) do n.º 1 do art. 640.º do CPC, possam as mesmas ser cumpridas apenas no corpo das alegações. Já quanto ao ónus da alínea a) da mesma disposição legal, afigura-se que a jurisprudência não se encontra estabilizada, não obstante se admitir que tem vindo a prevalecer o sentido de que o incumprimento de tal ónus nas conclusões recursórias implica a rejeição do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto. »[19] (negrito e sublinhado nosso).
Pacífico vem sendo, na verdade, na Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, que as conclusões, que balizam o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, têm de conter a indicação dos concretos pontos de facto cuja alteração se pretende, ónus este que permite circunscrever o objeto do recurso no que concerne à decisão de facto. Deste modo, mesmo na Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, vem a ser manifestada, reiteradamente, posição no sentido de, para cumprimento dos ónus impostos pelos art.s 639º e 640º, do CPC, o recorrente ter que indicar nas conclusões, com precisão, os pontos da matéria de facto que pretende que sejam alterados pelo tribunal de recurso, podendo os demais ónus impostos vir cumpridos apenas no corpo das alegações.
Com efeito, fixada foi, até, já, jurisprudência no sentido de “Nos termos da alínea c), do nº1, do artigo 640º, do Código de Processo Civil, o recorrente que impugne a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, nas alegações”[20].
Contudo, a alínea a) tem de ser observada mesmo nas conclusões das alegações, tendo nelas de ser indicados os concretos, os específicos pontos de facto incorretamente julgados, pois só assim ficam os mesmos incluídos no objeto do recurso, dado serem, como vimos, as conclusões das alegações que o delimitam o objeto do recurso em sede de impugnação da decisão de facto e se delas não se puderem determinar com rigor os factos impugnados o recurso tem de ser rejeitado nessa parte.
Ora, embora não tenha indicado, de modo completo e autónomo, nas conclusões do Recurso, a concreta/específica matéria de facto que pretendia impugnar (cfr. al. C), supra), certo é que, com recurso ao corpo das alegações, tal fica esclarecido nas alegações oferecidas, mostrando-se, também, aí, os demais ónus impostos observados.

Assim, e sendo de considerar preenchido o ónus previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC quando o recorrente indique nas conclusões das alegações os pontos a alterar e no corpo das alegações especifique as concretas alterações de cada ponto de facto que considera incorretamente julgados  e pede a alteração da decisão com base na reapreciação da prova gravada e na demais prova junta aos autos, conforme aí indicado, ponto por ponto, considera-se que a Recorrente cumpriu aquele ónus, mostrando-se os demais ónus, também, observados nas alegações oferecidas. Com efeito, apresentou a Autora alegações, observando o ónus de alegar e de formular conclusões, consagrados no nº 1, do artigo 639º, e deu cumprimento aos ónus impostos pelo nº1 e 2, do artigo 640.º, referindo os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados (e tal é efetuado nas conclusões, assim delimitado estando o âmbito do recurso na vertente da impugnação da matéria de facto), indicando elementos probatórios a conduzirem à alteração dos pontos impugnados nos termos si propugnados (prova testemunhal produzida e documentos juntos) e a decisão que, no seu entender, deveria sobre eles ter sido proferida e exarando, ainda, passagens da gravação, preenchidos se mostrando os pressupostos de ordem formal para se proceder à reapreciação da decisão de facto, os requisitos habilitadores a tal conhecimento. Tem de se entender que a Recorrente, ao cumprir esses ónus, circunscreveu o objeto do recurso no que concerne à matéria de facto, nos termos exigidos pelo legislador e interpretados pelos Tribunais Superiores, sendo, por isso, de apreciar, o recurso, na vertente de mérito, da impugnação.


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1.2. Do mérito da impugnação da decisão de facto/modificabilidade de tal decisão:

1.2.1. Critérios do julgamento (âmbito da apreciação e autonomia decisória).
Antes de entrarmos na decisão de mérito da impugnação, vejamos os parâmetros e balizas do julgamento a efetuar por este tribunal.
Havendo impugnação da matéria de facto, o Tribunal da Relação pode alterar a decisão, nesta vertente, de facto, a:
i) padecer a mesma de determinadas patologias (podendo elas corresponder a erros de apreciação ou de julgamento ou a outros erros, também estes, lato senso, de julgamento, como seja caso a envolver a consideração de factos essenciais complementares ou concretizadores fora das condições previstas no art. 5º e situações de se não estar perante relevante matéria de facto e questões de facto);
ii) formar diversa convicção sobre a matéria fáctica impugnada. 
Em matéria de alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, para o caso de erro, estatui o nº1, do art. 662º, com a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto” que Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto: “… se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, podendo, como referido, ainda, a decisão da matéria de facto sofrer alterações (para além das situações de erro) no caso de divergência na apreciação probatória, sendo que, “dentro dos limites definidos pelo recorrente, a Relação goza de autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção sobre os meios de prova sujeitos a livre apreciação, sem exclusão do uso de presunções judiciais. Ou seja, (…) a Relação não está limitada à reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes, devendo atender a todos quantos constem do processo, independentemente da sua proveniência (art. 413º), sem exclusão sequer da possibilidade de efetuar a audição de toda a gravação se esta se revelar oportuna para a concreta decisão (cf. Abrantes Geraldes, ob. cit. , pp. 288-293)”.[21].
Os objetivos visados pelo legislador com o duplo grau de jurisdição em matéria de facto “designadamente quando esteja em causa decisão assente em meios de prova oralmente produzidos, determinam o seguinte: reapreciação dos meios de prova especificados pelo recorrente, através da audição das gravações (…); conjugação desses meios de prova com outros indicados pelo recorrido ou que se mostrem acessíveis, por constarem dos autos ou da gravação; (…) formação de convicção própria  e autónoma quanto à matéria de facto impugnada, introduzindo na decisão da matéria de facto que se considere erradamente julgada as modificações que forem consideradas pertinentes (cf. STJ 14-5-15, 260/70, STJ 29-10-13, 298/07, STJ 14-2-12, 6823/09 e STJ 16-12-10, 170/06). Cf. ainda Luís Filipe Sousa, Prova por Presunção no Direito Civil, pp. 187-189, no sentido de que a Relação pode fazer uso de presunções judiciais que o Tribunal de 1ª instância não utilizou, bem como que alterar a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida com base em presunções judiciais”[22].    
Deste modo, “a livre convicção da Relação deve ser assumida em face dos meios de prova que estão disponíveis, impondo-se que o Tribunal de recurso sustente a sua decisão nesses mesmos meios de prova, descrevendo os motivos que o levaram a confirmar ou infirmar o resultado fixado em 1ª instância[23], sendo que “a Relação goza dos mesmos poderes atribuídos ao tribunal a quo, sem exclusão dos que decorrem do princípio da livre apreciação genericamente consagrado no art. 607º, nº5, e a que especificamente se alude no arts. 349º (presunções judiciais), 351º (reconhecimento não confessório), 376º, nº3 (certos documentos), 391º (prova pericial) e 396º (prova testemunhal), todos do CC, bem assim nos arts. 466º, nº3 (declarações de parte) e 494º, nº2 (verificações não qualificadas) do CPC”[24].
Cumpre referir que o âmbito da apreciação do Tribunal da Relação, em sede de impugnação da matéria de facto, deve obedecer ao seguinte: i) o Tribunal da Relação só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pelo Recorrente (a menos que se venha a revelar necessária a pronúncia sobre facticidade não impugnada para que não haja contradições); ii) sobre essa matéria, o Tribunal da Relação tem que realizar um novo julgamento; iii) nesse novo julgamento, o Tribunal da Relação forma a sua convicção de uma forma autónoma, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não só os indicados pelas partes). E dentro destes parâmetros, o Tribunal da Relação, como verdadeiro Tribunal de Substituição, que é, está habilitado a proceder à reavaliação da matéria de facto especificamente impugnada pelo Recorrente, e, neste âmbito, a sua atuação é praticamente idêntica à do Tribunal de 1ª Instância, apenas se distinguindo dele quanto a fatores de imediação e de oralidade.
Devido a estes fatores, o controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, tem de ser efetuado na consideração de a convicção do julgador em 1ª Instância ter sido construída dialeticamente e na importante base da imediação e da oralidade, fatores estes que, muitas vezes, se revelam de grande valia para dar mais relevo a um depoimento do que a outro.
Assim, a garantia do duplo grau de jurisdição quanto a julgamento de facto não subverte o, vigente, princípio da livre apreciação da prova (consagrado no artigo 607.º, nº 5 do CPC), que está atribuído quer ao tribunal da 1ª instância quer ao Tribunal de recurso, sendo que, contudo, na formação da convicção do julgador podem intervir elementos que escapam à gravação e, para a valoração de um depoimento são de grande relevo elementos que só a imediação e a oralidade trazem. Neste sistema, da livre apreciação da prova, o julgador goza do poder de formar a sua convicção sobre os factos, objeto do julgamento, com base, apenas, no juízo adquirido no processo, bastando-lhe indicar, objetivamente, fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade da convicção[25]. A lei determina a exigência dessa objetivação, através da imposição da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (artigo 607.º, nº 4), sendo, contudo, esta, livre. E o princípio da livre apreciação de provas encontra-se conexionado, em termos lógicos, com os princípios da imediação, da oralidade e da concentração das provas sendo da conjugação de todos eles que, depois de toda a prova produzida decorrem as conclusões a que o julgador chega, em conformidade com todas as impressões geradas no seu espírito, de acordo com as regras da normalidade, da experiência e da ciência[26].
E, como vimos, na reapreciação dos meios de prova, o Tribunal de segunda instância, revisitando as provas produzidas, procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção - desta forma assegurando o duplo grau de jurisdição nessa vertente da decisão - com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância, impondo-se, assim, ao Tribunal da Relação, que analise criticamente as provas indicadas pelo impugnante, como fundamento da impugnação (sejam elas as declarações de parte/depoimento de parte não confessório, a testemunhal, a documental, a pericial ou outra, de livre apreciação, conjugando-as entre si,  e contextualizando-as, se necessário, no âmbito da, demais, prova produzida, de modo a formar a sua autónoma convicção, que não pode deixar de ser fundamentada.
Ao Tribunal da Relação competirá apurar, no confronto das provas, da falta de razoabilidade da convicção formada pelo julgador. E, como vimos, norteando-se o julgamento pelos princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, que continuam vigorantes no nosso direito adjetivo, e regendo-se o julgamento humano por padrões de probabilidade, nunca de certeza absoluta, o uso dos poderes de alteração da decisão sobre a matéria de facto, proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, pelo Tribunal da Relação deve ser atuado sempre que diversa convicção forme, nos casos de desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados[27], devendo ser usado quando se possa concluir, de modo fundado e seguro, por outra convicção relativamente aos concretos pontos de facto impugnados.
Assim, deve ser efetuada alteração da matéria de facto pelo Tribunal da Relação a, após audição da prova gravada e da reanálise de toda a prova convocada para a decisão dos concretos pontos impugnados, concluir, com a necessária segurança, no sentido de os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova, apontarem para direção diversa e justificarem, objetivamente, outra conclusão, que não aquela a que chegou o Tribunal de 1ª Instância.
Na apreciação dos depoimentos, quanto ao seu valor e à credibilidade, é de ter presente que a apreciação dessa prova pelo Tribunal da Relação envolve “risco de valoração” de grau mais elevado que na primeira instância, em que há imediação, concentração e oralidade, permitindo contacto direto com as partes e as testemunhas, o que não acontece neste tribunal. Por estas razões, está, muitas vezes, em melhor situação o julgador de primeira instância, relativamente ao da Relação, para apreciar os depoimentos prestados, uma vez que o foram perante si, pela possibilidade de apreensão de elementos que não transparecem na gravação dos depoimentos (pese embora devam, se de relevo, ser sempre esclarecidos na decisão de facto).
E cada elemento de prova tem de ser ponderado por si, mas, também, em relação com os demais, sendo que o julgamento da matéria de facto é o resultado da ponderação de toda a prova produzida, pelo que toda ela tem de ser revisitada e sopesada.

Ponderando os critérios e balizas que deverão conduzir o julgamento da Relação, os argumentos apresentados pela apelante e, ainda, os da parte contrária e debruçando-nos sobre a parte da sentença onde vem motivada a decisão de facto, entendemos não se justificar alterar a decisão de facto pelas razões que se passam a expor, meramente se indo proceder à retificação de um lapso de escrita existente num ponto impugnado e à eliminação de matéria conclusiva e de direito constante de dois pontos impugnados.


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1.2.2 - Das alterações ao decidido pelo tribunal de primeira instância.

Revisitada toda a prova, verifica-se não ser a prova produzida, a indicada pela apelante e toda a restante, suficiente para dar uma resposta diversa aos factos impugnados, como refere o apelado, e não poder deixar de se considerar que bem decidiu o Tribunal a quo a matéria que, agora, vem impugnada, não podendo, por isso, a impugnação da decisão de facto deixar de improceder, meramente sendo de, como referimos, proceder à retificação de um lapso de escrita existente no ponto 22 e à eliminação de matéria conclusiva e de direito constante dos pontos 57 e 58.
Analisemos.
Impugna a Ré/Apelante a decisão da matéria de facto, visando a alteração do decidido relativamente aos:
i) - pontos 3, 4, 12, 14, 15, 24, 26, 46, 56 a), b), c), d), e), f), j), k), n) e q), dos factos provados, que pretende sejam eliminados, no todo ou em parte;
ii) - pontos 57, 58, 62, 64, 65 e 66, dos factos provados, a suprimir, por de conclusões, de facto ou de direito, ou conceitos jurídicos se tratar;
iii) - itens b), i) e m), dos factos não provados relativos à contestação, que pretende sejam considerados provados.
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Analisemos, ponto por ponto, das alterações pretendidas aos:
i) Itens 3, 4, 12, 14, 15, 24, 26, 46, 56, dos factos provados:

- Quanto aos referidos pontos 3 e 4:

Têm os factos considerados provados nos pontos 3 e 4 a seguinte redação:

“3. A Ré é uma Sociedade Comercial por Quotas que tem por objecto a construção civil, bem como a compra e venda de bens imobiliários.

4. No exercício da sua actividade comercial de empresa do ramo da construção civil, a Ré construiu/edificou em regime de propriedade horizontal o prédio supra id. composto por um total de cem fogos habitacionais de tipologia T0 e T3, três estabelecimentos comerciais e cave com lugares de garagem e arrumos”.

Sustenta a Ré que, apesar de não se lhe afigurar com grande interesse para a decisão do recurso, a ré não exerce a atividade de construção civil, mas sim a compra e venda de imóveis e promoção imobiliária, como resulta da certidão comercial permanente junta aos autos a fls. 790 v. e seguintes do apenso do procedimento cautelar, pelo que a redação deve passar a ser “3 - A Ré é uma Sociedade Comercial por Quotas que tem por objeto, entre outras, a compra e venda de bens imobiliários." e “4. No exercício da sua actividade comercial a Ré construiu/edificou em regime de propriedade horizontal o prédio supra id.".

O Apelado entende não dever ser efetuada alteração, pois que, para além de irrelevante, bem resulta da prova produzida, designadamente dos depoimentos das testemunhas HH e II, indicadas pela Ré, ter sido a Ré, além de a vendedora, a construtora dos Edifícios que integram os prédio do Condomínio Autor.

Nenhuma alteração cabe introduzir aos referidos pontos por, na verdade, tal se revelar inócuo, irrelevante,  inútil, sendo proibida a prática, no processo, de atos inúteis (nº1, do art. 130º), e por bem resultar, do depoimento das referidas testemunhas e de toda a prova produzida em audiência, e, ainda, da pericial e documental, ter sido a Ré a construtora dos edifícios em causa, como bem motiva o Tribunal a quoQuanto à atribuição à R. não só da reconhecida promoção e venda das fracções mas também da construção do empreendimento em apreço foram decisivos os alvarás de utilização de fls. 216 e fls. 218 que justamente mencionam a licença de construção emitida a favor da aqui R.”.

- Quanto ao referido ponto 12:

Tem o facto considerado provado no ponto 12 a seguinte redação:

“12. Os jardins e garagens, entre outros, são comuns a todos os blocos”.

Sustenta a Ré que "as garagens, na sua totalidade, não são partes comuns a todos os blocos. De facto, conforme resulta do próprio título constitutivo da propriedade horizontal e escritura de retificação — documentos juntos aos autos de providência cautelar a fls. 321 e seguintes - resulta que o que é comum a todos os blocos são os "... corredores de circulação e manobra no interior..." das garagens e não as próprias garagens”, pelo que o referido facto deverá ser corrigido para "Os jardins e os corredores de circulação e manobra no interior do espaço destinado a garagens são comuns a todos os blocos/'.

O Apelado entende não dever ser efetuada alteração, pois que, tal resultou da prova produzida, como refere.

 Nenhuma alteração cabe introduzir ao referido ponto por nele se não estar a referir que os jardins e as garagens, entre outros, são “partes comuns”. O que se selecionou no referido ponto dos factos provados, em conformidade com toda a prova produzida – quer pericial (designadamente esclarecimentos prestados em audiência) quer testemunhal (v., designadamente, depoimento de CC, que foi condómino do prédio de Setembro de 2012 a 2016, Administrador do Condomínio em 2013 e que fez parte da comissão de condóminos depois de 2013, JJ, engenheiro Civil que colaborou com uma antiga Administração do Condomínio, a B..., Lda, em 2014, AA, atual condómino e II, encarregado da obra da construção dos edifícios em causa nos autos) foi, sim, terem os blocos (os edifícios) em causa nos autos, para todos eles, daí “são comuns” (não se estando a referir serem partes comuns, pois que tal decorre da escritura de constituição da propriedade horizontal), entre outos, os jardins e as garagens. 

- Quanto ao referido ponto 14:

Tem o facto considerado provado no ponto 14 a seguinte redação:

“14. Nessa mesma altura, a Ré procedia à edificação dos blocos ... e ... e à edificação de elementos que constituem, por exemplo, a garagem do prédio, situada no piso inferior de todos os blocos”.

 Sustenta a Ré que, conforme resultou dos depoimentos da testemunha da autora AA e das testemunhas da ré II e HH, quando o bloco ... e ... foi concluído a garagem já se encontrava totalmente construída e, de facto, sendo que o espaço subterrâneo destinado a garagem, teve de ser a primeira coisa a ser construída, para depois, sobre a mesma, irem sendo construídos os diversos Blocos de apartamentos, razão pela qual em 2003, aquando do início da comercialização dos blocos ... e ... a garagem já estava totalmente construída, pelo que o facto provado n.° 14 deve ser alterado para "Nessa mesma altura, a Ré procedia à edificação dos blocos ... e .../'.

O Apelado entende dever ser indeferida a impugnação em causa pois a alteração pretendida pela Ré não tem qualquer utilidade ou relevância jurídica e sempre deve improceder, pois não resulta que a totalidade da garagem do edifício tenha ficado concluída, como resulta da prova produzida dado ter sido demonstrado que a Ré foi colocando redes ou, mesmo, erigiu muros dentro da garagem para limitar o acesso a determinadas zonas da mesma enquanto desenvolvia trabalhos de construção no exterior da própria garagem, conforme os depoimentos de CC, AA, KK e BB.

Nenhuma alteração cabe introduzir ao referido ponto por, efetivamente, para além de resultar que “Nessa mesma altura, a Ré procedia à edificação dos blocos ... e ...”, bem se provou que a mesma mantinha vedada e inacessível parte da garagem, procedendo, ainda, “à edificação de elementos que constituem, por exemplo, a garagem do prédio, situada no piso inferior de todos os blocos”. Com efeito, resultando da prova produzida que a garagem era um só espaço, comum a todos os cinco edifícios, resultou, de igual modo, que edificados os blocos ... e ..., só, ulteriormente, após edificação dos blocos ... e ..., foi terminada e aberta pela Ré à circulação parte da garagem (e, mesmo, então, ainda, não toda, permanecendo, ainda, parte vedada (por o bloco ... ainda estar em construção). Tal resultou da análise conjunta e conjugada de toda a referida prova testemunhal acabada de mencionar, quer da indicada pela apelante quer pelo apelado, e, desde logo, do depoimento da testemunha CC, que bem explicou que a garagem só foi sendo concluída e aberta à circulação por fases, abrindo-a a Ré, por partes, à medida que concluía os edifícios, de construção faseada (tendo concluído primeiro o A e o B, depois o C e  o D e estando o E, ainda, em construção), bem resultando, pois, provado que “Nessa mesma altura, a Ré procedia à edificação dos blocos ... e ...” e à edificação de elementos que constituem, por exemplo, a garagem do prédio, situada no piso inferior de todos os blocos”.

- Quanto ao referido ponto 15:

Tem o facto considerado provado no ponto 15 a seguinte redação:

“15. Os blocos ... e ... apenas foram concluídos em finais do ano de 2006, tendo as vendas dos vários apartamentos ocorrido em momento posterior, o que levou a que a entrega do prédio à Administração do Condomínio tenha sucedido em 30 de Março de 2012 quanto ao bloco ... e em 21 de Setembro de 2012 quanto ao bloco ...”.

Sustenta a Ré não aceitar, também, o facto provado n.° 15 na parte em que se afirma "Os blocos ... e ... apenas foram concluídos em finais de 2006..." (facto provado n.° 15) uma vez que os dois referidos Blocos foram concluídos em Março ou Abril de 2005, sendo que a respetiva licença de utilização - Licença n.º ... foi emitida em 19/05/2005 para os blocos ... e ..., conforme resulta do documento em causa junto com a contestação à presente ação, bem como é expressamente referido pelos Senhores Peritos na resposta que dão ao quesito 4 no relatório pericial junto aos autos a fls 964 dos autos principais, quando escrevem "Não. Conforme referido na resposta ao quesito 2, o prédio é constituído por cinco blocos, sendo a sua construção dividida em 3 fases, a fase 1 que contempla a construção dos blocos ... e ..., a fase 2 que contempla a construção dos blocos ... e ... e a fase 3 que contempla a construção do bloco .... Este faseamento pode ser verificado nas Licenças de Utilização, n.ºs ... e ..., relativas respetivamente à 1a e 2a fases, passadas pela Câmara Municipal ... respetivamente em 4/12/2003 e 19/05/2005, onde se verifica que, para a construção dos blocos já construídos, houve duas fases de construção" e, assim, não se tendo apurado ao certo a data em que a construção dos blocos ... e ... foi concluída, o facto provado n.° 15 deve ser alterado passando a redação da parte impugnada a ser "Os blocos ... e ... foram concluídos antes de 19/05/2005...".

O Apelado sustenta não entender o teor da alegação e que deve ser indeferida a alteração tendo presente o teor do depoimento de BB e de LL.

Atendendo a que data de emissão da licença de utilização não equivale a data de efetiva conclusão da obra, nenhum elemento de prova convocando a Ré para a pretendida alteração, não pode deixar de ser mantido o decidido, face ao depoimento da testemunha BB, que refere ter-se tal conclusão verificado ulteriormente e, mesmo, MM bem explicou que inclusive quando comprou, em meados de 2012, ainda estavam a ser efetuados acabamentos nos blocos ... e ....

- Quanto ao referido ponto 24:

Tem o facto considerado provado no ponto 24 a seguinte redação:

“24. Em 31 de Janeiro de 2014, realizou-se assembleia de condomínios que deliberou o recurso às vias judiciais contra a Ré quanto à questão da exigibilidade da reparação dos defeitos de construção”.

Sustenta a Ré que “na Assembleia de 21/01/2014, conforme ata da Assembleia de Condóminos n.° 11, junta aos autos a fls 578 v. e seguintes, apesar de constar no ponto 5 da ordem de trabalhos "Deliberação da propositura de uma ação judicial contra a A... com vista à reparação dos defeitos/vícios de construção... ", nada sobre esse assunto foi deliberado pelos condóminos” e por essa razão deve tal facto ser suprimido dos factos provados e incluído nos factos não provados.

O Apelado pronuncia-se no sentido de dever ser julgada improcedente a impugnação realizada, por não ter a Recorrente razão no pedido de alteração da resposta à matéria de facto do facto provado 24, mas que resulta ter-se o Tribunal recorrido equivocado na data em apreço, pois deveria constar a data de 21 de Janeiro de 2014, tratando-se de uma simples gralha, passível de ser constatado pela leitura da ata n.º... em causa, constante de fls. 268 do Vol. 1 dos autos, junto como Doc. 2 da resposta, cuja retificação requer ao abrigo do art. 614°, n° 1, do Cód. de Processo Civil.

Efetivamente nenhuma razão tem a Ré apelante, como resulta da ata e do depoimento prestado por CC que esclareceu os referidos factos, existindo o mencionado lapso de escrita, pois onde foi escrito “31”, pretendia ter-se escrito “21”, como bem resulta da ata em causa, da assembleia de condomínios, que se realizou no indicado dia.

Assim, mantém-se o facto em causa nos factos provados, cabendo indeferir a reclamação por falta de fundamento, corrigindo-se, contudo o apontado lapso, determinando que onde no facto provado 24 figura 31 passe a constar 21.

Destarte, o facto provado 24. passa a ter a seguinte redação:

24. Em 21 de Janeiro de 2014, realizou-se assembleia de condomínios que deliberou o recurso às vias judiciais contra a Ré quanto à questão da exigibilidade da reparação dos defeitos de construção”.

- Quanto ao referido ponto 26:

Tem o facto considerado provado no ponto 26 a seguinte redação:

“26. O supra id. BB, Advogado de profissão, no período compreendido entre 6/11/2006 e 11/01/2013, assumiu a representação da R. A... em assembleias de condóminos desta empresa noutros edifícios que esta construtora edificou”.

Sustenta a Ré que não aceitar o referido porque como o mesmo BB, ouvido na 2.a sessão de julgamento realizada no dia 05/06/2023, afirmou no seu depoimento a sua colaboração com a A... se limitou a participar em uma assembleia de condóminos e a representar a A... numa ação executiva, já depois de deixar de ser administrador do condomínio, devendo o facto provado n.° 26 ser alterado para: "O supra id. BB, Advogado de profissão, assumiu a representação da R. A... em duas assembleias de condóminos de outros edifícios que a ré mandou construir".

O Apelado pronunciou-se no sentido de dever ser julgada improcedente a impugnação realizada, por bem resultar do depoimento do referido BB a confirmação do que consta do ponto 26, também disso tendo revelado ter conhecimento as testemunhas MM e HH, que bem mostraram saber da referida representação da Ré em Assembleias de Condóminos de outros condomínios pelo referido BB. 

Não cabe alterar o decidido pelo Tribunal a quo, tendo este Tribunal formado a mesma convicção que o Tribunal de 1ª instância, pois que bem resultou do depoimento do próprio BB (apesar da revelada indecisão nas respostas que, de modo pensado, pretendia dar ao Tribunal) que o mesmo respondeu que durante o período em que exerceu a administração do condomínio dos autos prestou serviços à Ré, representando-a, para além de num processo de execução, em assembleias de condóminos de outros condomínios, referindo o mesmo, expressamente, dois (um junto ao D... e um outro próximo do E...).

 E apesar do que foi referindo, designadamente quanto a outros empreendimentos que conhecia serem da Ré, ficou este Tribunal convencido de que, também, a testemunha HH não falou inteiramente a verdade, pois que de uns factos sabendo não podia deixar de conhecer outros com eles relacionados. Que o referido BB foi administrador do condomínio Autor desde finais de 2006 e até ao início de 2013 e que o mesmo assumiu, quando se demitiu das referidas funções, prestar serviços à Ré (como advogado e representante), resultou, também, do depoimento de CC, eleito para a administração do condomínio no dia 1/2/2013, o qual bem disso mostrou saber, desde logo por o referido BB o ter dito na sua presença. Do mesmo modo, MM esclareceu que tal se verificou e apontou essa como sendo a razão do afastamento do referido administrador do condomínio de tais funções, no início de 2013, por incompatibilidades verificadas e desconfianças havidas quanto à atuação do mesmo no exercício do cargo.

- Quanto ao referido ponto 46:

Tem o facto considerado provado no ponto 46 a seguinte redação:

“46. Em Dezembro de 2013 foi entregue ao A. um outro Parecer, elaborado pelo mesmo técnico, e donde consta a existência dos seguintes defeitos de construção que foram comunicados à R. em Janeiro de 2014:

No exterior

a. Manchas de humidade e degradação do revestimento nas platibandas da fachada Poente do edifício ... e platibandas da fachada Nascente do edifício ... e ...;

b. Desconformidade de cores da fachada Norte do edifício ... e a presença de manchas de escorrimento de corrosão pontuais;

c. Parede de fachada de edifício ... com manchas de eflorescências em pequenas áreas do revestimento cerâmico;

d. Parede de fachada do edifício com descolamento localizados em pequenas áreas de revestimento cerâmico;

e. Paredes exteriores da casa de máquinas do elevador e caixa de estacas com fendilhação longitudinal que atravessa a superfície rebocada e pintada;

f. Obstrução do interior dos tubos de queda do edifício ... resultado da entrada da camada de brita da protecção da cobertura, que diminuirá a capacidade de escoamento de caixas de visita e dos colectores prediais e originar humidades no interior do edifício;

g. Existência de água e humidade na ligação de cabos eléctricos à caixa de electricidade existente na cobertura do edifício ..., encontrando-se os cabos eléctricos bastante folgados pelo que alguma instalação eléctrica e ou de ventilação poderá não estar a funcionar;

h. O ventilador de cobertura ligado às colunas de extracção do ar das cozinhas do edifício ... que extrai menor caudal de ar comparativamente com o do ar das cozinhas do edifício ...;

i. Parte da área da cobertura do alpendre de acesso ao edifício ... que possui acumulação de água pluvial e a presença de sinais de desenvolvimento de fungos;

j. Laje do alpendre de acesso ao edifício ... com destacamento superficial do betão sendo visível a armadura com corrosão pontual;

k. Fendilhação extensa de média abertura acompanhada de destacamento de betão ao longo da viga de bordadura da laje de cobertura da cave, permitindo a entrada de água pluvial;

l. Obstrução parcial da tubagem para drenagem de água de rega e da água pluvial;

No interior

a. Na parede interior da caixa de escadas com fissuração longitudinal de pequena abertura afectando apenas a parte superficial;

b. Infiltração de água no tecto do hall de entrada do rés-do-chão do edifício ... que chegou até ao quadro eléctrico do edifício ....;

c. Betonilha de acabamento do pavimento da cave de estacionamento com fendilhação e deterioração;

d. Revestimento do tecto da cave de estacionamento junto a colectores prediais e juntas de dilatação com manchas de humidade, manchas de reparações anteriores e destacamentos em áreas pontuais do revestimento;

e. Área envolvente à fracção do reservatório de abastecimento de água possui na parede que confronta o solo e no piso manchas de humidade e escorrimentos resultantes de dissolução de componentes de betão e das armaduras;

f. Parede interior da célula esquerda do reservatório de abastecimento de água possui armaduras à vista com corrosão;

g. Pela ventilação natural, parte do ar extraído da cave do estacionamento está a ir para as comunicações horizontais interiores dos pisos de habitação”.

Sustenta a Ré não aceitar o referido porque “o Parecer que discriminou as referidas patologias foi o Parecer entregue à autora em 12/07/2013 (identificado no facto provado n.° 45), e não o parecer de Dezembro de 2013, que se limitou a pronunciar sobre a questão das "... Patologias na zona ajardinada e Praceta do condomínio ...", veja-se a este respeito os pareceres juntos aos autos a folhas 161 e seguintes (717 e ss dos autos principais) e 186 e seguintes (740 e ss dos autos principais) dos autos de procedimento cautelar, e ainda o próprio depoimento do autor dos referidos pareceres Eng. NN, pelo que o facto provado n.°46 deve ser retificado no sentido de passar a constar que "Em Dezembro de 2013 foi entregue ao A. um outro Parecer, elaborado pelo mesmo técnico, sobre as patologias na zona ajardinada e praceta do condomínio ...."

O Apelado pronunciou-se no sentido de dever ser julgada improcedente a impugnação realizada, por ter sido efetuada prova da comunicação do referido parecer. O relatório técnico em causa, elaborado pelo Sr. Eng. NN, foi enviado à Ré, o que esta assume conforme Doc. 20 junto com o R.I., fls. 194 dos autos, correspondente a uma carta da própria em que responde, ponto por ponto, ao teor do relatório em causa.

Motivou o Tribunal a quoa comunicação da maior parte dos defeitos por escrito foi efectuada por email de 13/02/2013 (fls. 147 da Providência Cautelar) e mais tarde de forma mais completa, na sequência dos pareceres de Julho e Dezembro de 2013, por carta de 9/01/2013 (fls. 632 e ss. da Providência Cautelar), como resulta da resposta da R. de 20/01/2014 (fls. 644), na sequência da qual a própria a 20/05/2014 se disponibiliza para resolver algumas patologias, como seja as relativas às platibandas das fachadas dos edifícios (fls. 194 e ss. da Providência Cautelar)” e, ainda, que bem resultou o referido provado pelo depoimento da testemunha CC, condómino desde 2012 a 2016 que, juntamente com outros quatro condóminos, sucedeu a BB na administração do condomínio que descreveu, além das patologias dos edifícios, a evolução dos acontecimentos inclusive da relação com a R. que levou à decisão dos condóminos a recorrer às vias judiciais nos termos expostas nas actas n.ºs 6-C e 12 (fls. 133  e 378 da Providência Cautelar).

Na verdade assim sucede, bem tendo a testemunha CC analisado os referidos documentos e esclarecido assim ter acontecido, improcedendo a impugnação apresentada a este ponto.


- Quanto ao referido no ponto 56 a) a f), j), k), n) e q);

Pretende a Apelante se elimine do item 56, o referente a:

 - "Tomadas e saídas de ar nas zonas de circulação dos edifícios ... e ..." e "A ventilação da cave é feita por conduta directa à cobertura e a essa conduta estão ligadas as ventilações de cada piso de acordo com o projecto de ventilação.", verificando-se contradição entre estes pontos e o facto provado n.° 70. Sustenta, para tanto, que “se "A ventilação do edifício encontra-se executada de acordo com o projeto de especialidades que foi aprovado e licenciado pelo Município ..." (facto provado n.º 70), e se para os blocos ... e ... foi emitida, após vistoria, a competente licença de utilização, então não pode ser considerado como defeito de construção” e, ainda, que, “por outro lado, esta questão não pode ser analisada e decidida a luz dos padrões atuais, como pretendeu a Meritíssima Juiz e algumas das testemunhas, mas sim de acordo com o que era normal ou aceite à data em que o prédio foi projetado, aprovado e construído. E, tendo o Município ... aprovado os respetivos projetos, vistoriado o prédio e emitido a respetiva Licença de Utilização temos de concluir que não estamos perante defeitos de construção”;

- "Indícios de humidade nas portas do armário da zona do quadro eléctrico dos serviços comuns do edifício ..., bem como nos tetos interior e exterior." e "Infiltrações no teto do hall de entrada do R/C do edifício ... que chega até à zona do quadro eléctrico do edifício ...", pois não poderão ser considerados defeito de construção, dado a origem das infiltrações e humidade ser a varanda do primeiro andar do edifício ..., localizado por cima do hall de entrada, e não por qualquer vicio ou defeito de construção;

- "Infiltrações nos tetos das garagens, nas zonas do logradouro", pois ficou demonstrado que na zona ajardinada e na praceta comum foram feitas várias intervenções pelo autor que podem ter causado o ferimento das telas, nomeadamente a instalação do sistema de rega, executado a mando e por conta do autor condomínio. Afirma que, tendo a colocação do sistema de rega sido realizada em 2010, como também no verão de 2012 (quanto aos blocos ... e ...), e tendo em consideração que as infiltrações se agravaram após 2010, veja-se os depoimentos das testemunhas BB e AA, temos forçosamente de concluir que a causa daquelas infiltrações não pode ser imputada à aqui recorrente como sendo um defeito de construção mas sim à própria autora considerando a intervenção posterior que no mesmo local executou;

- "Desconformidade de cores das chapas do revestimento da fachada Norte do edifício ...”, porque esta fachada, provisória, já nem existe dada a construção do bloco ...;

- "A tubagem de drenagem das águas pluviais e da rega estão parcialmente obstruídas com a passagem da tubagem de rega.", pois que tal não é um problema do prédio do condomínio autor e um defeito de construção, tanto mais que não foi a ré quem executou esses trabalhos.

O Apelado pronuncia-se pela improcedência da impugnação dos problemas em causa, os quais, como resulta de toda a prova produzida e como bem decidido, resultaram provados, desde logo pela perícia, pese embora a parcialidade revelada pelo perito da Ré.

Na verdade, assim é, bem resultando da perícia realizada e, em concreto dos esclarecimentos prestados pelos Senhores Peritos, tendo os do Senhor Perito do Tribunal sido esclarecedores e convincentes (oferecendo, mesmo, este senhor perito maiores garantias de imparcialidade que os restantes, por não ligado a nenhuma das partes), conjugada com a restante prova, designadamente testemunhal, que analisou e explicou a documental, que os problemas referidos nos mencionados itens deste ponto 56 se verificam.

 E, diga-se, para além do que consta do relatório pericial, bem motivou o Tribunal a quo os problemas surgidos, relacionados com a construção executada:
“foram apreciados antes do mais os esclarecimentos dos Srs. Peritos, OO, PP e QQ, que subscreveram o relatório pericial supra id. de fls. 964 e ss. donde, em especial das respostas do Eng. OO indicado pelo Tribunal e portanto com mais equidistância em relação a ambas as partes do que os demais peritos, resultam como defeitos de construção, por utilização de materiais desadequados e violação das regras de bem construir, os problemas das partes comuns do edifício em causa elencados no ponto 56 dos Factos Provados, mormente as infiltrações, humidades, efervescências e fissurações, inclusive as manchas de humidade e degradação nas platibandas da fachada Nascente do edifício ... e ..., como melhor esclareceu em julgamento o Sr. Perito indicado pelo Tribunal, as efervescências, passíveis de serem evitadas, a ventilação da caixa de escadas através da conduta de ventilação das garagens e as infiltrações na garagem”. “Do mesmo passo, em reforço do apontado entendimento pericial de que as infiltrações na garagem se devem a problemas de construção por falência ou inexistência do sistema de impermeabilização depuseram as testemunhas AA e BB, que foram viver para o empreendimento em 2005 e 2003, respectivamente, e afirmaram que aquelas infiltrações são anteriores à instalação do sistema de rega em 2010 (cfr. acta n.º ... de fls. 278 e orçamento e facturas de fls. 283 e ss.), assim desvalorizando a relevância do depoimento de HH, funcionária da R. de que antes de 2012 não houve reclamações quanto a infiltrações na garagem e do depoimento de II, encarregado de construção da R. na construção dos autos, de que foram colocadas telas na respectiva laje de cobertura”. “CC, condómino desde 2012 a 2016 que, juntamente com outros quatro condóminos, sucedeu a BB na administração do condomínio descreveu, além das patologias dos edifícios … Sobre os problemas das fracções, corroborando o teor dos relatórios periciais, pronunciaram-se, além das já ids. testemunhas, as testemunhas MM, condómino desde 2012 a 2021, KK, condómina desde 2012”. “As testemunhas JJ, autor do orçamento de reparação de fls. 208 e ss. da Providência Cautelar, e NN, autor dos pareceres de 161 ss. e 186 e ss. da Providência Cautelar, tendo sido contratados pelo A. para prestarem os seus serviços, em prejuízo da sua imparcialidade, apenas puderam ser valorizados, assim como os ditos orçamento e relatórios, na medida em que coincidem com os relatórios periciais. (…) o depoimento da testemunha RR, contratada pela R. para fazer um levantamento das patologias do empreendimento, enfraquecida por esta ligação, acabou por não convencer o Tribunal de que as apontadas patologias, consideradas de construção nos termos sobreditos, ou se desconhece a causa ou devem-se aos próprios condóminos por falta de manutenção”.
Bem foi considerado provado que o prédio do condomínio do A. padece dos problemas:
- Tomadas e saídas de ar nas zonas de circulação dos edifícios ... e ....  e ventilação da cave feita por conduta direta à cobertura, conduta a que estão ligadas as ventilações de cada piso de acordo com o projecto de ventilação.
- Indícios de humidade nas portas do armário da zona do quadro eléctrico dos serviços comuns do edifício ..., bem como nos tetos interior e exterior e infiltrações no teto do hall de entrada do R/C do edifício ... que chega até à zona do quadro eléctrico do edifício ....
- Infiltrações nos tetos das garagens, nas zonas do logradouro, degradação do piso da garagem na zona da 1.ª fase (blocos ... e ...) e ainda a betonilha da cave apresentar, em determinados locais, aspetos de degradação (a necessitar de demolição e reconstituição dessas zonas identificadas de forma a garantir a sua conservação e cumprimento da função de pavimento estável e duradouro).
- Manchas de humidade no revestimento nas platibandas da fachada Poente nos blocos ... e ... que leva a degradação do revestimento da fachada e desconformidade de cores das chapas de revestimento da fachada Norte do edifício ....
 - A tubagem de drenagem das águas pluviais e da rega estão parcialmente obstruídas com a passagem da tubagem de rega”.   

E tal resulta da análise conjunta e conjugada da prova produzida.

Com efeito, os senhores peritos pronunciaram-se quanto à questão da existência "Buracos na ventilação/insuflação dos pisos dos edifícios ... e ..." e "verifica-se a existência de tomadas e saídas de ar nas zonas de circulação dos edifícios" - cfr. resposta ao quesito 7 c) relatório pericial fls. 965, e responderam nos pontos 8 e 9 que tais problemas constituem defeitos de construção, sendo que nos esclarecimentos que prestaram em audiência foram, igualmente, claros nesse sentido e projeto existente ao arrepio das mais elementares regras de segurança que apontam nunca justificaria o, evidente, problema, pois que não pode deixar de constituir defeito a canalização de ar poluído dos veículos para a área das habitações. A "humidade nas portas do armário da zona do quadro eléctrico dos serviços comuns do edifício ..., bem como nos tetos interior e exterior", verifica-se demonstrada a existência deste problema, desde logo por os senhores peritos o referirem e de defeito de construção se trata, como esclareceu designadamente o perito do Tribunal por a humidade entrar no edifício vinda da zona exterior por área envolvente do mesmo. Quanto a "infiltrações no teto do hall de entrada do R/C do edifício ... que chega até à zona do quadro elétrico do edifício ...") têm, na verdade, de ser levados em consideração os esclarecimentos prestados pelos senhores peritos relativamente ao relatório pericial. A fls. 965 dos autos, do relatório pericial à questão "verificam-se indícios de humidade nas portas do armário a zona do quadro eletrico, bem como nos tetos interior e exterior?", Senhores Peritos responderam que "o teto exterior em gesso cartonado, junto à porta está apodrecido tendo como causa provável alguma infiltração ou humidade relativa do ar elevado no exterior". Quanto a “Infiltrações nos tetos da garagem nas zonas do logradouro", o relatório pericial a fls. 978 refere que as "infiltrações de água poderão ser consequência da falência ou inexistência do sistema de impermeabilização", respondendo os Senhores Peritos "essa falência poderá ser atribuída a danos causados aquando da execução da rede de rega, mas não há elementos nos autos que permitam concluir que seja apenas essa a razão. Poderá o sistema de impermeabilização ter sido mal executado desde o inicio, o que leva certamente á existência de infiltrações". Quanto a "Desconformidades de cores das chapas do revestimento da fachada Norte do edifício ...", tais desconformidades existem, conforme atestaram os senhores peritos em fls. 968 dos autos. Relativamente à tubagem obstruída, sendo problema que se verifica, não constitui a obstrução um defeito de construção, o que pacífico é, pois que não foi tal trabalho executado pela Ré.

E resultou que as testemunhas do Autor bem mostraram ter conhecimento dos referidos factos, sendo que:

- CC, que foi proprietário de uma fração autónoma no bloco ... entre setembro de 2012 e finais de 2016 e que foi eleito administrador de condomínio em 1/2/2013, tendo tido conhecimento dos referidos problemas, muniu-se dos relatórios técnicos de engenheiros civis juntos aos autos e acompanhou todo o processo que levou à propositura da ação, bem mostrando saber serem os mesmos devidos à má execução da construção.

- JJ, engenheiro técnico civil que colaborou com a administradora do condomínio B... e que verificou a existência de todos os referidos problemas;

- NN, engenheiro Civil que foi contactado pelo condomínio Autor para dar um parecer técnico das patologias de que o edifício padecia e que apresentou  os dois mencionados pareceres em 2013 – um primeiro relatório de 12/7/2013, tendo efetuado visita aos edifícios aqui em causa em 21/5/2013, e um segundo relatório de dezembro de tal ano – esclarecendo o que viu, confirmando os relatórios de sua autoria e a verificação dos apontados problemas dados como provados pelo tribunal a quo e ora impugnados;

- MM, proprietário de uma fração no edifício ..., do condomínio Autor, que adquiriu em de maio-junho de 2012, tendo-a ido habitar em agosto desse ano, aí tendo residido até 2021, e que esclareceu que, na altura da compra, ainda se encontravam no prédio, a efetuar acabamentos, trabalhadores e mencionou, detalhadamente, padecerem os edifícios dos referidos problemas;

- AA, medidor orçamentista que reside numa fração no bloco ..., do condomínio Autor desde junho de 2005 e que se foi apercebendo de todos os referidos problemas dos edifícios, bem sabendo que as infiltrações na garagem começaram anos antes da instalação do sistema de rega;

- KK, proprietária de uma fração no bloco ... e que foi morar para o condomínio Autor em novembro de 2012 que descreveu todos os referidos problemas que notaram quando foram começando a aí morar;

- BB que referiu ter prestado serviços à Ré, ter sido Administrador do condomínio Autor desde 2006 até ao início de 2013 e habitar uma fração no bloco ..., tendo sido a primeira pessoa que foi residir para este condomínio, e que mostrou conhecer a existência de todos os problemas de construção dados como provados e impugnados, esclarecendo que o sistema de rega  foi colocado em agosto de 2010, não tendo sido a Ré a instalá-lo, e que já antes disso havia infiltrações na garagem, não tendo sido aquele sistema a criá-las. Esclareceu que os blocos ... e ... foram edificados em 2006 e que, tendo sido, então, vendidas duas frações, ficou tudo parado e só foi colocado à venda em 2012, esclarecendo, ainda, que, apresentando a garagem buracos, está, mesmo, por concluir. 

 Nenhuma credibilidade nos mereceu a Testemunha HH, funcionária da Ré desde 2012, estando no grupo desta desde 2004, dado ter prestado um depoimento lacónico e inverosímil, bem mostrando a sua parcialidade, sendo que dos factos que podiam interessar à Ré revelou saber e daqueles que a poderiam prejudicar afirmou nada conhecer.

 II, encarregado de construção civil, que foi o encarregado da construção, afirmou ter construído os blocos ... e ..., as garagens e depois os blocos ... e o D e permanecido na obra até 2005, nada sabendo do que sucedeu nos anos subsequentes. Apenas lá regressou no ano 2015 por o terem chamado para ver o que se passava e mostrou ter, então, verificado que o piso da garagem estava a desfazer-se e viu as humidades, deixando, contudo, transparecer não serem os tubos a causar infiltrações.

Deste modo, da análise conjunta da prova pericial (relatórios apresentados e esclarecimentos prestados pelos Senhores Peritos no início da audiência de julgamento) e referida prova testemunhal, bem como das atas do condomínio, resulta a prova da verificação de todos os impugnados problemas dados como provados, sendo, por isso, de manter, na parte em causa, a decisão dada ao ponto 56.

ii) Itens 57, 58, 62, 64 a 66 dos factos provados:

Pretende a apelante que os pontos 57, 58, 62, 64 a 66 dos factos provados, com a seguinte redação:

“57. Os problemas elencados no ponto antecedente são defeitos de construção.

 58. Emergem da violação das regras de bem construir e/ou da falta de aplicação de materiais adequados para os fins habitacionais a que se destinam”.

“62. As infiltrações de água verificadas na garagem são consequência da falência ou inexistência do sistema de impermeabilização”.

“64. Apenas estão em funcionamento em cada um dos blocos ... e ... um elevador”.

 65. A principal razão da ventilação da cave é garantir que não haverá aí acumulação de gases dos escapes e garantir a renovação do ar desse espaço, tornando-se assim necessário garantir a entrada natural de ar pelas aberturas existentes e permitir a saída do ar do espaço das garagens pelos ductos de ventilação colocados nos tetos das garagens e eliminar a ligação dos ductos de ventilação das garagens às ventilações das caixas de escadas.

66. As manchas de humidade no revestimento nas platibandas da fachada nos blocos ... e ... que leva a alguma degradação do revestimento da fachada devem-se à falta de capeamento das platibandas”.

sejam eliminados dos factos provados por se tratar de meras conclusões, de facto ou de direito, ou conceitos jurídicos, contra tal se pronunciando a apelada, que pugna pela manutenção da decisão por de facto e a lei o não vedar.
Devendo o tribunal conhecer de todas as questões que lhe são submetidas (art. 608º, n.º 2 do CPC), isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e de todas as exceções de que oficiosamente lhe cabia conhecer, tinha, para o efeito, de proceder à seleção e recolha dos factos. E na decisão da matéria de facto, com concreta e especificada exposição de factos provados e não provados, o juiz deve garantir a recolha de todos os factos (cfr. art. 5º, do CPC) que mostrem relevância jurídica para a decisão da causa, de acordo com as diversas soluções plausíveis da questão de direito.
Ora, nenhuma relevância jurídica têm factos que não densificam a causa de pedir da ação e as exceções deduzidas, não devendo, por isso, ser expostos na sentença factos inócuos para a decisão das questões de que cabe conhecer (o que deve ser aferido em face do pedido e da causa de pedir e da matéria de exceção), factos que integrem impugnação motivada dos factos da causa (pois que os relevantes são os factos constitutivos que integram a causa de pedir) e matéria conclusiva e de direito (pois que, como o próprio nome indica, decisão da matéria de facto tem de versar sobre factos).
Vedada está, também, a recolha de factos não alegados pelas partes nos articulados da causa destinados à alegação fáctica, sendo de desatender pretensão de aditamento de factos neles não alegados pela parte que tem o ónus de alegação (a Autora, de factos constitutivos do seu direito e a Ré, de factos a densificar exceção), pelo que factos alegados em resposta a exceção nunca seriam de selecionar na sentença.

Resulta evidente que: “57. Os problemas elencados no ponto antecedente são defeitos de construção” e “58. Emergem da violação das regras de bem construir e/ou da falta de aplicação de materiais adequados para os fins habitacionais a que se destinam”, de meras conclusões se trata, estando, já os concretos problemas, advenientes da construção, condensados no, antecedente, ponto 56.
E, como se pronunciou, já, o Senhor Desembargador ora Adjunto, Dr. Manuel Fernandes - no Ac. RP de 19/12/2023, proc. nº 4201/22.2T8PRT.P1, em que a ora relatora foi adjunta, citando-se no lugar próprio as respetivas notas, para melhor perceção -, “importa não esquecer que o artigo 607.º, nº 4 do CPCivil[28] dispõe que na fundamentação da sentença, o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.
No âmbito do anterior regime do Código de Processo Civil, o artigo 646.º, nº 4 do CPCivil, previa, ainda, que: têm-se por não escritas as respostas do tribunal coletivo sobre questões de direito e bem assim as dadas sobre factos que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documento, quer por acordo ou confissão das partes”.
Esta norma não transitou para o atual diploma, o que não significa que na elaboração da sentença o juiz deva atender às conclusões ou meras afirmações de direito.
Ao juiz apenas é atribuída competência para a livre apreciação da prova dos factos da causa e para se pronunciar sobre factos que só possam ser provados por documento ou estejam plenamente provados por documento, admissão ou confissão.
Compete ao juiz singular determinar, interpretar e aplicar a norma jurídica (artigo 607.º, nº 3 do CPCivil) e pronunciar-se sobre a prova dos factos admitidos, confessados ou documentalmente provados (artigo 607.º, nº 4).
Às conclusões de direito são assimiladas, por analogia, as conclusões de facto, ou seja, “os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados e exprimindo, designadamente, as relações de compatibilidade que entre eles se estabelecem, de acordo com as regras da experiência”[29].
Antunes Varela considerava que deve ser dado o mesmo tratamento “às respostas do coletivo, que, incidindo embora sobre questões de facto, constituam em si mesmas verdadeiras proposições de direito[30].
Em qualquer das circunstâncias apontadas, confirmando-se que, em concreto, determinada expressão tem natureza conclusiva ou é de qualificar como pura matéria de direito, deve continuar a considerar-se não escrita porque o julgamento incide sobre factos concretos.
Como assim, e por os citados pontos conterem meras conclusões, não podem integrar o elenco dos factos provados”[31].
Deste modo, e por, efetivamente, estarmos perante meras conclusões de facto e de direito, cabe eliminar os pontos 57 e 58, apesar de sobre tais questões ter incidido a prova, quer a pericial quer a testemunhal, resultando das regras da experiência comum que os problemas referidos no ponto antecedente decorrem da construção, exceção o último, que se não reporta à execução da construção efetuada pela Ré.
Relativamente aos restantes pontos impugnados (os 62 e 64 a 66), desde logo por não conterem matéria conclusiva nem de direito, mas a acontecimentos, a factos concretos, mantêm-se no elenco dos provados.


*

iii) Itens b) i) e m) não provados relativos à contestação

Pretende a Ré que os factos julgados não provados das alíneas b), i) e m) relativos à contestação sejam considerados provados.

Têm eles a seguinte redação, não provado que:

b. “Os concretos defeitos comunicados a 13/02/2013 e em Janeiro de 2014 fossem conhecidos do A. há mais de um ano”;

i. “As manchas de humidade e a degradação do revestimento das platibandas destes dois blocos sejam do conhecimento da A. desde data anterior a Janeiro de 2013”; e

m. “O sistema de rega tenha sido executado pelo jardineiro do condomínio”.

Considerou o Tribunal a quo que a resposta dada aos factos não provados se ficou a dever a ausência ou insuficiência de prova e, na verdade, nenhuma prova existe que permita dar como provado que os concretos defeitos comunicados a 13/02/2013 e em janeiro de 2014 fossem conhecidos do A. há mais de um ano, que as manchas de humidade e a degradação do revestimento das platibandas destes dois blocos sejam do conhecimento da A. desde data anterior a janeiro de 2013 e que o sistema de rega tenha sido executado pelo jardineiro do condomínio. Nada resulta que permita fundamentar qualquer resposta positiva aos referidos factos impugnados, como bem transparece da análise de toda a prova produzida. Integralmente revisitada a prova e vista a decisão da matéria de facto, supra, ficou-nos a convicção de que, in casu, não existe o erro de julgamento que a recorrente aponta, ao invés a matéria de facto foi livremente e bem decidida, sendo que cada elemento de prova de livre apreciação, não pode ser considerado de modo estanque e individualizado. Há que proceder a uma análise crítica, conjunta e conjugada dos aludidos elementos probatórios, para que se forme uma convicção coerente e segura. Fazendo essa análise crítica, conjunta e conjugada de toda a prova produzida, e com base nas regras de experiência comum, não pode este Tribunal, com segurança, divergir do juízo probatório do Tribunal a quo.

Efetuou este Tribunal a análise da prova e não há elementos probatórios produzidos no processo que imponham ou justifiquem decisão diversa – como exige o nº1, do artigo 662.º, para que o Tribunal da Relação possa alterar a decisão da matéria de facto.
O Tribunal Recorrido decidiu de uma forma acertada quando considerou a referida factualidade, de acordo com a livre convicção que formou de toda a prova produzida nos termos que bem refere.
Assim, tendo-se procedido a nova análise da prova, ponderando, de uma forma conjunta e conjugada e com base em regras de experiência comum, os meios de prova produzidos, que não foram validamente contraditados por quaisquer outros meios de prova, pode este Tribunal concluir que o juízo fáctico efetuado pelo Tribunal de 1ª Instância, no que concerne a esta matéria de facto, se mostra conforme com a prova, de livre apreciação, produzida, não se vislumbrando qualquer razão para proceder à alteração do ali decidido, que se mantém, na íntegra.
E, na verdade, não obstante as críticas que são dirigidas pela Recorrente, não se vislumbra, à luz dos meios de prova invocados qualquer erro ao nível da apreciação ou valoração da prova produzida – sujeita à livre convicção do julgador –, à luz das regras da experiência, da lógica ou da ciência, bem tendo, por falta de prova, a matéria em causa, sido julgada não provada.
Tendo a convicção do julgador para as respostas negativas, apoio nos ditos meios de prova produzidos e na ausência de prova que permita fundar resposta diversa, é de manter a factualidade tal como decidido pelo tribunal recorrido, não sendo de aderir ao mero convencimento subjetivo e genérico da Apelante.
Não resultando erros de julgamento, antes convicção livre e adequadamente formada pelo julgador (ante a prova prestada perante si e, por isso, com oralidade e imediação), que também é, como vimos, a nossa, havendo concordância entre a apreciação probatória do Tribunal de 1ª instância e o Tribunal da Relação, tem de se concluir pela improcedência da apelação, nesta parte.
Não estamos, salvo quanto aos pontos 57 e 58, por de matéria conclusiva e de direito se tratar, perante o erro de julgamento apontado nas conclusões das alegações, mas, sim, perante livre e autónoma convicção do julgador de 1ª instância que, também, é a nossa.

*
Neste conspecto, procede parcialmente o recurso na vertente da impugnação da matéria de facto, eliminando-se a matéria constante dos pontos 57 e 58 e mantendo-se, no demais, tal decisão, retificando-se, contudo, como decidido, o lapso de escrito constante do ponto 24, dos factos provados.
*
São, pois, os seguintes os:
1. FACTOS PROVADOS:
1. O Autor é o Condomínio do prédio constituído, em 27/10/2003, em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ... n.ºs ..., ... e ..., Rua ... n.ºs ... e ... e Rua ... n.ºs ..., ..., e ..., da freguesia ....
2. A Administração do Condomínio é presentemente exercida pela Sociedade Comercial por Quotas “B..., LDA.”.
3. A Ré é uma Sociedade Comercial por Quotas que tem por objeto a construção civil, bem como a compra e venda de bens imobiliários.
4. No exercício da sua atividade comercial de empresa do ramo da construção civil, a Ré construiu/edificou em regime de propriedade horizontal o prédio supra id. composto por um total de cem fogos habitacionais de tipologia T0 e T3, três estabelecimentos comerciais e cave com lugares de garagem e arrumos.
5. O referido prédio é composto por cinco blocos: blocos ..., ..., ..., ... e ....
6. O referido prédio é constituído por cinco edifícios que se desenvolvem em cave enterrada para estacionamento e arrumos e em pisos elevados para habitação.
7. Na zona central dos edifícios, em regime de condomínio fechado, existe um espaço de lazer ajardinado e pavimento comum aos vários edifícios.
8. A construção destes blocos, constituídos por diversas frações, apartamentos e aparcamentos e partes comuns, não foi concluída pela R. numa única vez.
9. Uma parte do prédio, constituída pelo bloco ..., está ainda em construção.
10. A construção destes vários blocos foi realizada de forma faseada, tal como faseada foi a venda das frações, que agora são dos agora proprietários destas.
11. A construção e venda das frações do prédio em regime de propriedade horizontal da aqui Autora foram realizadas por etapas.
12. Os jardins e garagens, entre outros, são comuns a todos os blocos.
13. Em 27 de novembro de 2003, a Ré, então proprietária da totalidade das frações (100 % do prédio) que constituíam o bloco ... e ..., procedeu à eleição da Administração do Condomínio, mandato exercido pela empresa “C..., Lda.”.
14. Nessa mesma altura, a Ré procedia à edificação dos blocos ... e ... e à edificação de elementos que constituem, por exemplo, a garagem do prédio, situada no piso inferior de todos os blocos.
15. Os blocos ... e ... apenas foram concluídos em finais do ano de 2006, tendo as vendas dos vários apartamentos ocorrido em momento posterior, o que levou a que a entrega do prédio à Administração do Condomínio tenha sucedido em 30 de março de 2012 quanto ao bloco ... e em 21 de setembro de 2012 quanto ao bloco ....
16. Em 30 de março de 2012, das 20 frações do bloco ..., 10 pertenciam à Ré.
17. Em 21 de setembro de 2012, das 20 frações do bloco ..., 06 eram da propriedade da Ré.
18. Em 15 de setembro de 2005, das 27 frações cujos proprietários por si, ou representados, estavam presentes na assembleia de condóminos então realizada, 17 eram propriedade da Ré.
19.  A 16 de Novembro de 2006, a Ré era proprietária de, aproximadamente, 1/3 das frações dos blocos ... e ....
20.  A 6/11/2006 foi eleito como Administrador do Condomínio BB, cujas funções se iniciaram a 01 de dezembro de 2006, tendo as mesmas cessado em 11 de janeiro de 2013, com a sua demissão.
21. Da ata n.º ... resulta o esclarecimento quanto às atas ... e ... no sentido de aclarar que a administração do condomínio apenas recebeu os blocos ... e ... em março e outubro, respetivamente do ano de 2012.
22. A nova administração do condomínio foi eleita em 01 de fevereiro de 2013, cujo mandato cessou com a eleição da atual administração.
23. Nesta data, as partes comuns do prédio padeciam de problemas.
24. Em 21 de janeiro de 2014, realizou-se assembleia de condomínios que deliberou o recurso às vias judiciais contra a Ré quanto à questão da exigibilidade da reparação dos defeitos de construção.
25. A Administração constituída, em conjunto, pelos condóminos CC, EE, FF, GG e AA, eleita em 01 de fevereiro de 2013, encomendou o levantamento das patologias das partes comuns do edifício.
26. O supra id. BB, Advogado de profissão, no período compreendido entre 6/11/2006 e 11/01/2013, assumiu a representação da R. A... em assembleias de condóminos desta empresa noutros edifícios que esta construtora edificou.
27. O Dr. BB foi Advogado mandatado pela Ré para assumir a sua representação no âmbito de uma ação executiva.
28. O administrador BB foi interpelado acerca da forma como se encontrava a agir, no que diz respeito a diligenciar para que fossem resolvidos os problemas/defeitos de construção nas partes comuns do imóvel do Condomínio Autor.
29. Este Administrador diligenciou pela realização de uma assembleia de condóminos que, a 21/12/2012, deliberou o recurso às vias judiciais contra a Ré no sentido de serem reparados os defeitos de construção existentes.
30. Esta assembleia foi impugnada pela Ré, por violação das regras das convocatórias das assembleias de condóminos.
31. Não foi convocada uma assembleia de condóminos extraordinária para renovação das deliberações em crise.
32. A Administração do Condomínio eleita em 01 de fevereiro de 2013, logo que tomou posse e lhe chegou às mãos todos os dossiers do prédio, para além das chaves de todas as partes comuns edifício, diligenciou por indagar do status quo das partes comuns.
33. A 6/02/2013 a Administração do Condomínio solicitou à Ré um pedido de agendamento de reunião para 7 de fevereiro de 2013.
34. Tal reunião visava que a Administração do Condomínio recentemente eleita se apresentasse junto da Ré com o objetivo de transmitir a existência de diversos problemas existentes nas partes comuns dos prédios.
35. Tal reunião foi realizada em 13 de fevereiro de 2013, e na sequência da mesma a Administração do Condomínio, no mesmo dia, denunciou a existência dos seguintes defeitos/problemas de construção nas zonas comuns do imóvel:
a. Problemas no interior da cisterna;
b. Infiltrações na cisterna do edifício ... e ...;
c. Buracos da ventilação/insuflação dos pisos dos edifícios ... e ...;
d. Infiltrações no quadro elétrico dos serviços comuns do edifício ...;
e. Os intercomunicadores não abrem a porta do r/c do edifício ... e ...;
f. Ventilação do exaustor nas cozinhas do edifício ... não funciona;
g. Faltam rufos no telhado;
h. Os rufos do telhado estão enferrujados;
i. Não existem telas junto das chaminés nem no edifício de acesso à cobertura;
j. Pagamento das inspeções dos elevadores;
k. Degradação do chão da garagem;
l. Infiltrações na garagem;
m. Teto a cair na garagem do edifício E;
n. Existirá alguma forma de desviar a água proveniente da mina que é despejada para a garagem? Esta situação implica o funcionamento constante das bombas de água da garagem.
o. Cabo preto no teto da garagem parece um ramal provisório. Qual é o destino deste cabo? Parece-nos os escritórios da A...;
p. Infiltrações no alpendre de acesso ao edifício ...;
q. Tubo existente no teto do lugar de garagem da fração BJ (D0.2); r. O motor da ventilação das casas de banho do edifício ... nunca funcionou;
s. Infiltrações no alpendre de acesso ao edifício ...;
36. Como resposta à denúncia de defeitos, replicou a Ré a 14 de fevereiro de 2013, em primeiro lugar, invocando que os defeitos denunciados não foram realizados “no prazo legal de cinco anos previsto no art. 1225.º do Código Civil e no DL 84/2008”, e, em segundo lugar, colocava a Ré a possibilidade dos defeitos denunciados se fundamentarem no “decurso do tempo ou de uma má utilização por parte dos condóminos, ou opções de projecto e arquitectura”.
37. Invocando a expectativa dos condóminos mais recentes do lote ... e ... e a sua boa-fé e o seu bom nome, a R. disponibilizou-se para analisar os diversos defeitos.
38. Mais preconizou a realização de uma peritagem em relação à garagem.
39. A Ré reparou alguns dos defeitos/desconformidades desde fevereiro de 2013 até ao final do ano de 2014.
40. À denúncia dos defeitos realizada pelo Condomínio Autor a Ré respondeu novamente a 6/05/2013, expondo, mais uma vez, que o prazo de denúncia dos defeitos estava já decorrido nos termos dos arts. 1225.º e DL 84/2008.
41. A 20/05/2014, a R., sem reconhecer que lhe fossem imputáveis, admitiu à Administração do Condomínio Autor a possibilidade de reparar algumas patologias de forma graciosa.
42. Foi solicitado pelo Autor um Parecer técnico para aferir dos defeitos de construção denunciados, o que foi comunicado à R.
43. O Condomínio Autor comunicou à Ré que, caso não fossem solucionados os defeitos de construção existentes nas partes comuns, iria socorrer-se da tutela do Tribunal para que fosse a vendedora compelida judicialmente a realizar as obras.
44.  A R. assumiu a realização de algumas obras nas partes comuns.
45. Em 12 de julho de 2013 foi entregue ao Condomínio Autor o Parecer que havia solicitado acerca das patologias das partes comuns.
46. Em dezembro de 2013 foi entregue ao A. um outro Parecer, elaborado pelo mesmo técnico, e donde consta a existência dos seguintes defeitos de construção que foram comunicados à R. em janeiro de 2014:
No exterior
a. Manchas de humidade e degradação do revestimento nas platibandas da fachada Poente do edifício ... e platibandas da fachada Nascente do edifício ... e ...;
b. Desconformidade de cores da fachada Norte do edifício ... e a presença de manchas de escorrimento de corrosão pontuais;
c. Parede de fachada de edifício ... com manchas de eflorescências em pequenas áreas do revestimento cerâmico;
d. Parede de fachada do edifício com descolamento localizados em pequenas áreas de revestimento cerâmico;
e. Paredes exteriores da casa de máquinas do elevador e caixa de estacas com fendilhação longitudinal que atravessa a superfície rebocada e pintada;
f. Obstrução do interior dos tubos de queda do edifício ... resultado da entrada da camada de brita da proteção da cobertura, que diminuirá a capacidade de escoamento de caixas de visita e dos coletores prediais e originar humidades no interior do edifício;
g. Existência de água e humidade na ligação de cabos elétricos à caixa de eletricidade existente na cobertura do edifício ..., encontrando-se os cabos elétricos bastante folgados pelo que alguma instalação elétrica e ou de ventilação poderá não estar a funcionar;
h. O ventilador de cobertura ligado às colunas de extração do ar das cozinhas do edifício ... que extrai menor caudal de ar comparativamente com o do ar das cozinhas do edifício ...;
i. Parte da área da cobertura do alpendre de acesso ao edifício ... que possui acumulação de água pluvial e a presença de sinais de desenvolvimento de fungos;
j. Laje do alpendre de acesso ao edifício ... com destacamento superficial do betão sendo visível a armadura com corrosão pontual;
k. Fendilhação extensa de média abertura acompanhada de destacamento de betão ao longo da viga de bordadura da laje de cobertura da cave, permitindo a entrada de água pluvial;
l. Obstrução parcial da tubagem para drenagem de água de rega e da água pluvial;
No interior
a. Na parede interior da caixa de escadas com fissuração longitudinal de pequena abertura afetando apenas a parte superficial;
b. Infiltração de água no teto do hall de entrada do rés-do-chão do edifício ... que chegou até ao quadro elétrico do edifício ....;
c. Betonilha de acabamento do pavimento da cave de estacionamento com fendilhação e deterioração;
d. Revestimento do teto da cave de estacionamento junto a coletores prediais e juntas de dilatação com manchas de humidade, manchas de reparações anteriores e destacamentos em áreas pontuais do revestimento;
e. Área envolvente à fração do reservatório de abastecimento de água possui na parede que confronta o solo e no piso manchas de humidade e escorrimentos resultantes de dissolução de componentes de betão e das armaduras;
f. Parede interior da célula esquerda do reservatório de abastecimento de água possui armaduras à vista com corrosão;
g. Pela ventilação natural, parte do ar extraído da cave do estacionamento está a ir para as comunicações horizontais interiores dos pisos de habitação.
47. O Condomínio foi informado em maio de 2014, pela Ré, que iria proceder à reparação de alguns dos defeitos.
48. Em conformidade, durante o ano de 2014 a Ré destacou diversos funcionários e colaboradores, o que fez por diversas vezes, no sentido de se deslocarem ao prédio do Condomínio Autor para procederem a várias reparações conducentes à eliminação dos defeitos denunciados.
49. Realizou a Ré as seguintes reparações:
“Substituição da platibanda da fachada Norte do edifício ... e revisão de toda a platibanda envolvente dos blocos ... e ...;
Reparação da viga de bordadura da laje da cave com tela (foi feita junta de dilatação);
Reparação de fissuras no reboco exterior da casa das máquinas do bloco ...;
Pintura da casa das máquinas e caixa de escadas do bloco ...;
Selagem com produto betumoso da caixa de ligação das infraestruturas elétricas na cobertura;
Ligação da caleira periférica à caixa de recolha de águas pluviais”. 50. Para além disso, a Ré procedeu à remoção e colocação de novo capacete de remate na fachada lateral direita.
51. Bem como procedeu à revisão geral, incluindo substituição de fixações, colocação de mais fixações nos restantes capacetes de remate em todo o perímetro da cobertura.
52. Os diversos trabalhos realizados pela Ré foram acompanhados pela Administração do Condomínio do Autor.
53. Procedeu, ainda, durante o ano de 2014, a Ré à realização de trabalhos conducentes a eliminar as infiltrações da garagem no sentido de tratar a fendilhação da laje da cobertura da cave/garagem.
54. Tais trabalhos não foram suficientes para resolver as patologias existentes na garagem.
55. Alguns dos problemas supra elencados continuam por reparar.
56. O prédio do condomínio do A.  padece dos seguintes problemas:
Tomadas e saídas de ar nas zonas de circulação dos edifícios ... e ....
Indícios de humidade nas portas do armário da zona do quadro elétrico dos serviços comuns do edifício ..., bem como nos tetos interior e exterior.
Degradação do piso da garagem na zona da 1.ª fase (blocos ... e ...).
Infiltrações nos tetos das garagens, nas zonas do logradouro.
Manchas de humidade no revestimento nas platibandas da fachada Poente nos blocos ... e ... que leva a alguma degradação do revestimento da fachada.
Desconformidade de cores das chapas de revestimento da fachada Norte do edifício ....
Manchas de eflorescências em áreas do revestimento cerâmico da parede de fachada do edifício ....
Tubos de ligação de cabos elétricos à caixa de eletricidade existente na cobertura do edifício ... apresenta uma inclinação descendente e deveria ter uma inclinação ascendente.
Fendilhação na ligação entre a laje de cobertura da cave e a camada de enchimento.
Infiltrações no teto do hall de entrada do R/C do edifício ... que chega até à zona do seu quadro elétrico.
A betonilha da cave apresenta em determinados locais localizados aspetos de degradação a necessitar de demolição e reconstituição dessas zonas identificadas de forma a garantir a sua conservação e cumprimento da função de pavimento estável e duradouro.
Defeitos no revestimento do teto da cave de estacionamento junto a coletores prediais e juntas de dilatação com manchas de humidade, manchas de reparações anteriores e destacamentos em áreas pontuais do revestimento.
Escorrimentos na parede e humidade no pavimento na fração do reservatório de abastecimentos de água.
A ventilação da cave é feita por conduta direta à cobertura e a essa conduta estão ligadas as ventilações de cada piso de acordo com o projeto de ventilação.
Alguma fissuração na ligação das paredes exteriores com a estrutura de betão armado da caixa de escadas/elevador.
No teto da entrada de acesso ao edifício ... por baixo da respetiva cobertura verifica-se desgaste na pintura do teto e vestígios de humidade na zona junto aos focos de iluminação.
A tubagem de drenagem das águas pluviais e da rega estão parcialmente obstruídas com a passagem da tubagem de rega.
(57. e 58 - eliminados)
59. No edifício ... faltam as pinhas na entrada das descargas da água da cobertura.
60. A tubagem de abastecimento da rega foi metida por alguns dos tubos de drenagem, obstruindo-os em mais de 50% da sua área.
61. A parede da fachada Norte do edifício ... possui uma solução provisória em chapa metálica canelada que compromete a estética e o seu valor patrimonial.
62. As infiltrações de água verificadas na garagem são consequência da falência ou inexistência do sistema de impermeabilização.
63. Apenas estão em funcionamento em cada um dos blocos ... e ... um elevador.
64. A principal razão da ventilação da cave é garantir que não haverá aí acumulação de gases dos escapes e garantir a renovação do ar desse espaço, tornando-se assim necessário garantir a entrada natural de ar pelas aberturas existentes e permitir a saída do ar do espaço das garagens pelos ductos de ventilação colocados nos tetos das garagens e eliminar a ligação dos ductos de ventilação das garagens às ventilações das caixas de escadas.
65. As manchas de humidade no revestimento nas platibandas da fachada nos blocos ... e ... que leva a alguma degradação do revestimento da fachada devem-se à falta de capeamento das platibandas.
66. As eflorescências em áreas do revestimento cerâmico da parede de fachada do edifício ... deve-se à perda de água (ou solvente) por cristalização da atmosfera na exposição ao ar formando sal hidratado, cujas boas técnicas de construção são adequadas a evitar.
67. Em 20 de Janeiro de 2014 foi a Ré notificada da missiva denunciando que nos edifícios ... e ... que possuem, cada um, dois elevadores, apenas um elevador funciona em cada um dos edifícios.
68. Em 19/09/2014 foi registada na Conservatória do Registo Predial a aquisição à aqui R. da fração CB do prédio supra id. em 1.
69. Em Assembleia Geral de Condóminos realizada a 11/01/2008 foi discutida a questão das diversas avarias e defeitos de construção que o construtor deve reparar.
70. A ventilação do edifício encontra-se executada de acordo com o projeto de especialidades que foi aprovado e licenciado pelo Município ....
71. Em Assembleia Geral realizada a 22/01/2010, o A. deliberou instalar o sistema de rega no condomínio nos jardins.
72. Tal operação foi realizada mediante a introdução do sistema de rega no sistema de escoamento de águas pluviais do condomínio”.
*
2. FACTOS NÃO PROVADOS
Não se provou que:
• O parecer de 12/07/2023 tenha sido entregue à R.
• Os elevadores tenham sido entregues à Administração totalmente inaptos para serem colocados em funcionamento.
• O custo para a reparação dos dois elevadores seja de 2.158,45 €.
• O interior da cisterna tenha defeitos.
• Haja infiltrações na cisterna do edifício ... e ....
• As inspeções dos elevadores não estejam pagas.
• O teto na garagem do edifício E esteja a cair.
• Haja problemas provenientes da mina que é despejada para a garagem.
• Haja problemas no tubo existente no teto do lugar de garagem da fração BJ.
• Haja problemas no motor da ventilação das casas de banho do edifício ....
• Manchas de humidade e degradação do revestimento nas platibandas da fachada Poente do edifício ....
• Defeitos de construção na parede de fachada do edifício com descolamento localizados em pequenas áreas de revestimento cerâmico.
• Existência de água e humidade na ligação de cabos elétricos à caixa de eletricidade existente na cobertura do edifício ....
• Defeitos na parede interior da célula esquerda do reservatório de abastecimento de água.
• Corrosão à vista neste reservatório.
• Inexistência de iluminação de emergência nas partes comuns no caso de corte de energia.
• Problemas nos dois elevadores que não estão em funcionamento.
• Acumulação de água pluvial e a presença de sinais de desenvolvimento de fungos na cobertura do alpendre de acesso ao edifício ....
• Para reparar os defeitos supra referidos em 56 dos Factos Provados seja necessário o valor de 296.440,88 €.
• A primeira comunicação de defeitos pela A. à R. tenha sido por missiva de 25/02/2013.
• Os concretos defeitos comunicados a 13/02/2013 e em Janeiro de 2014 fossem conhecidos do A. há mais de um ano.
• Os elevadores tenham sido entregues aptos.
• Tenham sido os condóminos que decidiram manter dois dos quatro elevadores parados para poupar energia.
• As infiltrações na garagem sejam resultantes da instalação do sistema de rega no sistema de escoamento das águas pluviais.
• A degradação do chão da garagem seja devida à falta de manutenção.
• As manchas e humidades dos edifícios A e B sejam consequência normal do decurso do tempo e da degradação dos respetivos materiais.
• A data da sua conclusão estes edifícios não apresentassem qualquer vício.
• As manchas de humidade e a degradação do revestimento das platibandas destes dois blocos sejam do conhecimento da A. desde data anterior a Janeiro de 2013.
• As manchas de eflorescência sejam próprias do decurso do tempo e do facto de as fachadas estarem expostas ao exterior,
• Tenha sido colocada uma pinha de plástico em todas as entradas dos tubos de queda.
• A pinha tenha sido removida.
• O sistema de rega tenha sido executado pelo jardineiro do condomínio.
• Em 2011/inícios de 2012, os condóminos tenham deliberado instalar o sistema de rega em todo o sistema de águas pluviais do condomínio.
• As infiltrações das águas da chuva tenham ocorrido pela primeira vez em 2012/1013.
• O sistema de rega tenha ficado concluído em 2012.
• O sistema de rega tenha sido a causa das infiltrações na garagem”.
*

3. Do erro da decisão de mérito: da procedência das exceções e da inexistência de obrigação de reparar

Insurge-se a apelante contra a decisão de mérito, entendendo verificada a caducidade dos direitos do Autor quanto a defeitos de construção verificados nas partes comuns.

 Sustenta que, dado a primeira denúncia ter ocorrido em 13 de Fevereiro de 2013 e tendo os "Blocos ... e ... sido entregues em 2003, com administração "autónoma" assumida em 16/11/2006, já em 16/11/2012 caducara o direito, ao menos no que respeita às partes comuns dos blocos ... e ..., e, tendo em conta que na propriedade horizontal há a considerar a individualidade física de cada bloco, a par com a unidade jurídica, condenar a Ré a efetuar, a expensas suas, as reparações de defeitos relativamente a partes comuns que deixaram de poder ser exigidas, por caducidade, é ilegal, constituindo enriquecimento sem causa dos condóminos que não exigiram em devido tempo, vendo o seu direito caducar.

Cabe, pois, analisar da caducidade do direito do Autor e, para tanto, necessário é apurar e analisar o regime legal aplicável.

3.1 - Da qualificação dos contratos celebrados entre a Ré e os condóminos e dos direitos do condomínio quanto a defeitos verificados nas partes comuns.


Em causa nos presentes autos estão defeitos existentes em partes comuns dos edifícios, constituídos em propriedade horizontal, englobando um só condomínio, tendo os contratos, de compra e venda, relativos à aquisição das frações autónomas sido celebrados entre os condóminos, compradores, e a sociedade Ré, vendedora.
A compra e venda vem definida no artigo 874º, do Código Civil, como sendo “o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço”. Deste modo, a celebração deste tipo de contrato gera obrigações reciprocas: a do vendedor, de transmitir a propriedade da coisa ou a titularidade do direito e a obrigação de entregar a coisa; a do comprador, de pagar o preço (cfr. arts. 879º, 882º e 883º, todos do CC).  
Como subtipo do contrato de compra e venda, surge o contrato de compra e venda para consumo, regulado, para além das regras gerais do Código Civil, pela Lei n.º 24/96, de 31 de julho (que estabelece o regime legal aplicável à defesa dos consumidores), e por diplomas de proteção dos consumidores: o Dec. Lei n.º 67/2003, de 08.04, alterado posteriormente pelo Dec. Lei. n.º 84/2008, de 21.05, pelo Dec. Lei nº 9/2021, de 29/1 e pelo Dec. Lei nº84/2021, de 18/10[32], que «procede à transposição para o direito interno da Directiva n.º 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Maio, relativa a certos aspectos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, com vista a assegurar a protecção dos interesses dos consumidores» (cfr. art. 1º deste Dec. Lei)[33].
Bem esclarece o Acórdão vindo de citar que a razão de ser da introdução desta regulamentação, específica, mais protetora do comprador consumidor consiste em haver o legislador considerado o comprador – que seja consumidor – a parte mais fraca no respetivo negócio de compra e venda[34], e, por isso, carecido de uma maior proteção legal. 
A situação em análise faz apelo ao regime legal de defesa dos consumidores a que se referem a Lei nº 24/96, de 31/7 (LDC) e o DL nº 67/2003, de 8/4, afastando, desde logo, a convocação para o caso do regime de caducidade do Código Civil[35]. Aplica-se a legislação de defesa do consumidor (Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril com as alterações introduzidas, e no caso, pelo Decreto-Lei n.º 84/2008, de 21 de Maio) e só subsidiariamente o Código Civil [36] [37], sendo, aquele, específico regime a que o caso se subsume e que afasta o regime geral, menos favorável ao consumidor.
Compra e venda de bens de consumo é “o contrato de compra e venda celebrado entre um empresário/profissional e um consumidor que tenha por objeto um bem imóvel ou móvel corpóreo”[38], importando nele distinguir os requisitos subjetivos e os requisitos objetivos, sendo que:
i) quanto a requisitos subjetivos temos que “estão aqui abrangidos os contratos celebrados entre empresários/profissionais e consumidores: ou seja, os contratos pelos quais uma pessoa singular ou coletiva (“vendedora”), no exercício profissional da respetiva atividade económica e lucrativa, vende bens (ou celebra outros negócios equiparados) a outra pessoa (“consumidor” pra uso privado ou não profissional desta última (art. 1º-B, a) e c) da LVBC). Estão assim excluídas as compras e vendas puramente civis (entre consumidores: v.g., venda de um bem usado entre meros particulares), puramente comerciais (entre empresários), ou invertidas (entre consumidor- vendedor e empresário-comprador)”[39];
ii) quanto a requisitos objetivos temos de atentar na “consideração simultânea de objetos relevantes, excluídos e equiparados”, estando “Entre os primeiros (objetos relevantes) …os bens imóveis – v.g., prédios rústicos, prédios urbanos, as respetivas partes integrantes – e os bens móveis corpóreos …, sujeitos ou não a registo …, fontes de energia (v.g. contratos de fornecimento de eletricidade, de gás, etc.) -, independentemente de se tratar de bens novos ou em segunda mão (arts. 1º-B, b) e 5º, nº2 da LVBC) e independentemente de o bem ser posteriormente transmitido a um terceiro (art. 6º, nº4 da LVBC). Em contrapartida, devem considerar-se como objetos excluídos ou irrelevantes para estes efeitos todos os demais, incluindo os bens incorpóreos (v.g., obras literárias e artísticas, criações de aplicação industrial, etc), os serviços (ressalvas as exceções previstas na lei: cf. art. 1º-A, nº2 da LVBC, art. 34º, nº3 do RJACSR), e os direitos. Finalmente, alargando… o âmbito de aplicação do regime legal, foram ainda considerados como equiparados os contratos de empreitada de consumo (art. 1º-A, nº2 da LVBC) de prestação de serviços em que sejam fornecidos bens de consumo (art. 1º-A, nº2 da LVBC) e de serviços regulados pelo RJACSR (art. 34º, nº3), e ainda de locação de bens de consumo, v.g. arrendamento, aluguer, “leasing”, ALD (art. 1º-A, nº2 da LBVC), devendo também ter-se por implicitamente abrangidos certos contratos mistos  de compra e venda de bens de consumo, v. g., bens com serviços de instalação pelo vendedor (art. 2º, nº4 da LVBC), e outros contratos onerosos de transmissão de bens de consumo, “maxime”, troca de bens de consumo (“ex vi”  do art. 939º do CCivil)”[40].
Analisemos, no que para o caso releva (vícios/defeitos do imóvel e prazo de garantia), o referido específico regime da venda de consumo, introduzido pelo Decreto-Lei 67/2003 de 8 de abril, alterado pelo Decreto-Lei nº 84/2008 de 21 de Maio, vigente à data dos factos, certo sendo terem contratos de compra e venda de frações autónomas sido celebrados entre a Ré vendedora e os condóminos (consumidores) em 2012.
O n.º 1, do art. 1º-A regula o âmbito da sua aplicação, consagrando:
 “O presente decreto-lei é aplicável aos contratos de compra e venda celebrados entre profissionais e consumidores”
O art. 1º-B, define:
a) «Consumidor», aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma actividade económica que vise a obtenção de benefícios, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho; 
b) «Bem de consumo», qualquer bem imóvel ou móvel corpóreo, incluindo os bens em segunda mão;”. 
Estatui o art. 2º, quanto a conformidade com o contrato:
1 - O vendedor tem o dever de entregar ao consumidor bens que sejam conformes com o contrato de compra e venda.
 2 - Presume-se que os bens de consumo não são conformes com o contrato se se verificar algum dos seguintes factos:
 a) Não serem conformes com a descrição que deles é feita pelo vendedor ou não possuírem as qualidades do bem que o vendedor tenha apresentado ao consumidor como amostra ou modelo;
 b) Não serem adequados ao uso específico para o qual o consumidor os destine e do qual tenha informado o vendedor quando celebrou o contrato e que o mesmo tenha aceitado;
 c) Não serem adequados às utilizações habitualmente dadas aos bens do mesmo tipo;
 d) Não apresentarem as qualidades e o desempenho habituais nos bens do mesmo tipo e que o consumidor pode razoavelmente esperar, atendendo à natureza do bem e, eventualmente, às declarações públicas sobre as suas características concretas feitas pelo vendedor, pelo produtor ou pelo seu representante, nomeadamente na publicidade ou na rotulagem.
 3 - Não se considera existir falta de conformidade, na aceção do presente artigo, se, no momento em que for celebrado o contrato, o consumidor tiver conhecimento dessa falta de conformidade ou não puder razoavelmente ignorá-la ou se esta decorrer dos materiais fornecidos pelo consumidor.
 4 - A falta de conformidade resultante de má instalação do bem de consumo é equiparada a uma falta de conformidade do bem, quando a instalação fizer parte do contrato de compra e venda e tiver sido efetuada pelo vendedor, ou sob sua responsabilidade, ou quando o produto, que se prevê que seja instalado pelo consumidor, for instalado pelo consumidor e a má instalação se dever a incorreções existentes nas instruções de montagem”. 
Assim, “os bens de consumo objeto do contrato devem possuir as características acordadas pelos contraentes (qualidade, quantidade, tipo, etc) ser funcionalmente adequados às utilidades habituais de bens idênticos e servir as finalidades específicas a que se destinam” e alei consagrou um elenco de presunções indiciárias, … da desconformidade contratual”[41].
Com a epígrafe “Entrega do bem”, dispõe o art. 3.º:
1 - O vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue.
2 - As faltas de conformidade que se manifestem num prazo de dois ou de cinco anos a contar da data de entrega de coisa móvel corpórea ou de coisa imóvel, respectivamente, presumem-se existentes já nessa data, salvo quando tal for incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade”.
Estipula o art. 4º, a regular “Direitos do consumidor”:
1 - Em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato. (negrito nosso por pertinente para o caso)
 2 - Tratando-se de um bem imóvel, a reparação ou a substituição devem ser realizadas dentro de um prazo razoável, tendo em conta a natureza do defeito, e tratando-se de um bem móvel, num prazo máximo de 30 dias, em ambos os casos sem grave inconveniente para o consumidor.
 3 - A expressão «sem encargos», utilizada no n.º 1, reporta-se às despesas necessárias para repor o bem em conformidade com o contrato, incluindo, designadamente, as despesas de transporte, de mão-de-obra e material.
 4 - Os direitos de resolução do contrato e de redução do preço podem ser exercidos mesmo que a coisa tenha perecido ou se tenha deteriorado por motivo não imputável ao comprador.
 5 - O consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais.
 6 - Os direitos atribuídos pelo presente artigo transmitem-se a terceiro adquirente do bem.
E, ainda, e de acordo com o estatuído no nº 1, do art. 12º, da Lei n.º 24/96, de 31/07, o consumidor tem, também, direito, nos termos gerais, a indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens defeituosos, consagrando este preceito:
1 - O consumidor tem direito à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos”.
Consagra o artigo 4º “direitos especiais – o direito à reparação do bem desconforme, o direito à substituição do bem desconforme, o direito à redução do preço, e o direito à resolução do contrato (…) – e, cumulativamente, um direito de indemnização por perdas e danos (art. 12º, nº1, da LDC, art. 798 do CCivil)”[42], direitos especiais que não estão sujeitos a uma ordem de hierarquia, sendo que “Nos termos do art. 4º, nº5 da LVBC, o princípio geral é o de que o consumidor é livre de exercer em alternativa um qualquer desses direitos, escolhendo aquele que melhor serve os seus interesses, salvo com os limites decorrentes da natureza das coisas (…) ou do abuso de direito (fundamental para prevenir exercícios arbitrários e desproporcionados por parte do comprador, em ostensiva lesão dos legítimos interesses do vendedor”[43]
O Art. 5º, com a epígrafePrazo da Garantiaestatui:
1 - O consumidor pode exercer os direitos previstos no artigo anterior quando a falta de conformidade se manifestar dentro de um prazo de dois ou de cinco anos a contar da entrega do bem, consoante se trate, respectivamente, de coisa móvel ou imóvel.
2 - Tratando-se de coisa móvel usada, o prazo previsto no número anterior pode ser reduzido a um ano, por acordo das partes.
(…)”
Analisa o citado Ac. RG. de 17/1/2019, proc. 201/15.7T8BAO.G1, o referido, específico, regime jurídico, bem desenvolvendo, citando-se as respetivas notas no local próprio para melhor perceção: “Por referência ao art. 2º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 67/2003, a «conformidade é sempre avaliada pela operação que consiste em comparar a prestação estipulada (explícita ou implicitamente) no contrato e a prestação efetuada»[44].
Acrescenta o citado autor que, mais do que caraterizar o que é ou não conforme o contrato, o que se pretende no citado art. 2º é precisar-se o que é que consta do contrato, para depois, no momento do cumprimento, aferir se o objeto prestado corresponde ao objeto contratado.
Aquilo que, no regime legal que regula a venda de bens de consumo (Dec. Lei nº 67/2003, alterado pelo Decreto-Lei nº 84/2008), se designa como falta de conformidade com o contrato corresponde à noção tradicional de defeitos do bem. Não existe qualquer categoria de falta de conformidade em relação ao contrato para além das “deficiências” do bem vendido, objecto do mesmo contrato[45].
Essa noção de desconformidade abrange quer os vícios na própria coisa objeto do contrato, quer os vícios de direito ou vícios jurídicos[46].
O citado art. 2º, no seu n.º 2, veio consagrar um sistema de presunções ilidíveis (de falta conformidade dos bens), com base numa formulação negativa, como também afastou a exigência de verificação cumulativa dos critérios para o funcionamento da presunção[47].
Para Calvão da Silva[48], os critérios presuntivos de determinação da não conformidade são de duplo sentido, pois, por um lado, facilitam a prova ao vendedor para que mostre no caso em concreto a coexistência dos critérios, e, por outro lado, podem servir de prova de falta de conformidade ao consumidor se este demonstrar a não verificação de qualquer um dos critérios no caso em concreto.
Como se explicitou no Ac. do STJ de 20/03/2014 (relator Moreira Alves), in www.dgsi.pt., o Dec. Lei n.º 67/2003 não alterou o ónus da prova que já resultava do nosso direito comum a respeito da venda de coisa defeituosa.
Assim sendo, para que possa exercer os direitos que lhe assistem, compete ao comprador/consumidor alegar e provar o defeito da coisa, isto é, a sua desconformidade com o contrato, na terminologia do referido Dec. Lei, e que esse defeito existia à data da entrega.
Simplesmente, para garantir ao consumidor um mínimo de protecção, a lei estabeleceu presunções de não conformidade, as quais, abrangendo situações correntes “valem como regras legais de integração do negócio jurídico, destinadas a precisar o que é devido contratualmente na ausência ou insuficiência de cláusulas que adrede fixem as características e qualidades da coisa a entregar ao consumidor em execução do programa negocial adoptado pelas partes[49].
Por outro lado, considerando a dificuldade da prova da existência do defeito à data da entrega, quando ele se manifesta ao longo de um período de tempo relativamente longo (dentro de 2 ou 5 anos, a contar da data de entrega de coisa móvel corpórea ou de coisa imóvel, respectivamente), a lei favorece o consumidor, determinando que a falta de conformidade verificada dentro dos referidos prazos faz presumir que o defeito já existia à data da entrega, competindo, então, ao vendedor, ilidir a presunção de não conformidade ou que, atentas as circunstâncias, o defeito não existia na data da entrega. 
A lei, no art. 3º, n.º 2, do Dec. Lei n.º 67/2003, previu, assim, a dispensa ou liberação legal do ónus da prova da anterioridade da falta de conformidade.
Esta regra liberta o consumidor da difícil prova da existência de falta de conformidade no momento da entrega do bem, tendo aquele apenas de provar a falta de conformidade do bem (e, naturalmente, a celebração do contrato)[50].
Contanto que a desconformidade se manifeste num prazo de dois anos a contar da entrega do bem móvel[51][52], ao consumidor basta fazer a prova do defeito de funcionamento da coisa (da falta de conformidade), sem necessidade de (alegar e) provar a causa concreta da origem do mau funcionamento e a sua existência à data da entrega.
Trata-se de uma verdadeira presunção específica que estabelece a responsabilidade do vendedor pela falta de conformidade do bem com o contrato[53], a qual, de acordo com o regime imperativo imposto pelo art. 10º do Dec. Lei n.º 67/2003, não poderá ser, em qualquer circunstância, afastada pelas partes.
Uma vez provado o facto que dê origem à presunção de desconformidade, terá o vendedor o ónus de provar o facto concreto, posterior à entrega, que gerou a falta de conformidade, designadamente a prova do mau uso ou do uso incorreto do bem pelo consumidor[54].
O mesmo é dizer que bastará ao consumidor alegar e provar os factos base da presunção e que eles se manifestaram dentro do prazo da garantia legal imposta pelo Dec. Lei n.º 67/2003 (…); já a 1ª ré (vendedora), para se ilibar da responsabilidade, incumbirá alegar e provar que a causa do mau funcionamento é posterior à entrega da coisa vendida e imputável ao comprador (designadamente por falta de diligência ou violação de deveres de cuidado), a terceiro ou devida a caso fortuito[55][56].

Definido o regime legal aplicável a contratos de compra e venda celebrados pela Ré (vendedora) com os condóminos (consumidores/compradores), comecemos por analisar do erro de mérito na apreciação da caducidade do direito do Autor, primeira questão a decidir (porquanto a procedência da exceção acarretaria ficarem as demais questões prejudicadas), e, de seguida, na improcedência da exceção, debruçar-nos-emos sobre os direitos reconhecidos ao Autor pela sentença recorrida, postos em causa no presente recurso: o de reparação dos defeitos e o de indemnização.
Importa, pois, conhecer da procedência da exceção da caducidade do direito que o Autor pretende fazer valer (outra defesa da Ré se mostrando precludida e a este Tribunal, de recurso, vedada está a apreciação de questões novas, não de conhecimento oficioso, estando o objeto do recurso limitado, como já referido, às questões suscitadas nas conclusões das alegações).

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3.2- Da caducidade dos direitos do Autor
A integrar matéria de exceção relativamente ao exercício de direitos pelo comprador de coisa defeituosa, encontram-se estatuídos na lei três prazos de caducidade:
i)- o de denúncia dos defeitos;
ii)- o para o exercício de direitos (designadamente o de reparação/eliminação de defeitos);
iii)- o, em que aqueles se têm de conter, referente ao limite máximo da garantia legal[57].
E bem analisa a Relação de Coimbra no referido Acórdão que “se funcionam e se articulam 3 prazos de caducidade – o prazo de denúncia dos defeitos, o prazo para o exercício dos direitos e o chamado limite/prazo máximo da garantia legal – isso também significa que estamos perante 3 possíveis excepções de caducidade, ou seja, o vendedor, quando invoca a caducidade dos direitos do comprador de coisa defeituosa, tem que a reportar ao prazo que considera excedido e se só menciona um prazo como excedido só essa respectiva caducidade pode ser considerada como invocada”, acrescentando “Caducidades que, para poderem ser conhecidas, têm que ser invocadas na contestação (como o exige o princípio da eventualidade ou preclusão, constante do art. 573.º do C. P. Civil), uma vez que (não se estando perante matéria que não está excluída da disponibilidade das partes, cfr. art. 323.º do C. Civil) não podem ser conhecidas oficiosamente”.
Em causa nos autos estão defeitos nas partes comuns dos edifícios constituídos em propriedade horizontal (cfr. art. 1421º), provado se encontrando que as mesmas enfermam dos problemas/patologias discriminados, peticionando o A. a reparação dos defeitos, o que bem foi determinado, não estando, contudo, o que pacífico é, os tubos de rega (último item do ponto 56) incluídos nos defeitos de construção, como vimos.
Conclui a Ré ter decorrido o prazo da garantia consagrado no referido artigo 5º, caducado se encontrando o direito do Autor à reparação de defeitos nas partes comuns.
Ora, “A entrega considera-se feita no momento em que o vendedor deixa de ter poder para determinar ou influir sobre o curso das decisões dos condóminos constituídos em assembleia de interesses autónomos, correspondendo, assim, o dies a quo a partir do qual se conta o início do prazo dos cinco anos à transmissão dos poderes de administração das partes comuns para os condóminos, através da sua estrutura organizativa, reunindo em assembleia de condóminos e com plena autonomia para denunciar os eventuais defeitos existentes na obra” e “Segundo os arts 5.º, n.º 1 e 5.º - A do Decreto-Lei n.º 84/2008, de 21 de Maio, o adquirente beneficia de um prazo de cinco anos para o conhecimento da desconformidade do objeto, do prazo de um ano, a contar do conhecimento do defeito, para exercer o direito de denúncia e de um prazo de três anos, subsequente à denúncia, dentro do qual terá de ser instaurada a ação destinada a exercitar o direito à reparação ou eliminação dos defeitos[58] (negrito e sublinhado nosso) [59], específico regime a que, como vimos, o caso se subsume e que afasta o regime geral, in casu, menos favorável ao consumidor.
A “denúncia tem como objetivo informar o vendedor de que a coisa tem um vício ou uma falta de qualidade. Revela-se, portanto, desnecessária se o comprador tiver conhecimento de que o vendedor sabe do vício ou falta de qualidade da coisa. É o que sucede, nomeadamente, se o vendedor reconhecer a existência do vício ou falta de qualidade (art. 331º, nº2), expressa ou tacitamente, fazendo p. ex. reparações na coisa ou participando a ocorrência à seguradora. Em sede de empreitada defeituosa, o art. 1220º, nº2, também estabelece que “equivale à denúncia o reconhecimento, por parte do empreiteiro, da existência do defeito”[60].
“O ónus da denúncia dos defeitos ao vendedor de coisa defeituosa resulta de um dever de colaboração entre os contratantes, posto que as condições em que se fazem muitas vendas tornam por vezes impossível ao vendedor estar a par da desconformidade” e “A contagem do prazo para a denúncia apenas se inicia com a tomada de conhecimento suficiente da desconformidade (ou vício), não relevando a mera possibilidade de conhecimento ou o desconhecimento da extensão integral do defeito quando este revista uma natureza eminentemente técnica”[61].
A denúncia, não sujeita a forma especial, podendo ser feita oralmente ao vendedor, tem de fazer referência ao vício ou falta de qualidade invocada pelo comprador, não relevando, pois, para este efeito observações genéricas e vagas sobre o estado da coisa. E o vício ou falta de qualidade que se manifeste depois de uma denúncia de outro vício ou falta de qualidade não se encontra abrangido por ela, devendo o comprador voltar a contactar o vendedor, denunciando o novo vício ou a nova falta de qualidade[62], sendo que o prazo de cinco anos se conta a partir da data da entrega da coisa.
Na ausência de denúncia (e sem reconhecimento do direito), os direitos do comprador caducam. E, sendo de aplicar as regras sobre a caducidade, a terem caducado, necessário se tornaria apreciar da verificação de causa impeditiva da caducidade, nos termos do art. 331º, sendo que, para além da própria prática, dentro do prazo legal ou convencional, do ato a que a lei ou convenção atribua esse efeito impeditivo – v. nº1 -, em conformidade com o nº2, impede, nos direitos disponíveis, manifestamente o caso, “a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido”.
Assim, se o vendedor admitir o defeito, de forma expressa ou tácita, o prazo de caducidade da ação deixa de correr, podendo o direito ser exercido após o seu termo[63], sendo que o reconhecimento do direito não origina a abertura de novo prazo de caducidade[64], antes a caducidade para definitivamente[65], sendo que, contudo, “impedida a caducidade e estabilizado o direito, não fica, no entanto, o direito imune às regras da prescrição que lhe serão, em princípio, aplicáveis” (Ana Filipa Morais Antunes, 2008:178)[66].
Necessário se torna, contudo, para que releve como causa impeditiva da caducidade, que o reconhecimento:
i) seja realizado pela pessoa contra quem o direito seria exercido (legitimidade para o reconhecimento);
ii) ocorra até ao final do prazo de caducidade, já que posteriormente o direito se encontra extinto, por caducidade[67] (tempo para a sua prática);
iii) seja concreto, claro e inequívoco (características exigíveis ao ato de reconhecimento), que não pode, nunca, ser revestido de declarações vagas, gerais e dubitativas[68] [69].
E, na verdade, “O acto de reconhecimento pelo vendedor, da responsabilidade pela eliminação dos defeitos em imóvel vendido, acompanhando de atuação consentânea com esse mesmo reconhecimento, releva para efeitos de impedimento da caducidade do direito de ação respetivo” sendo que “O comprador pode pedir a condenação no valor da reparação sem ter pedido a eliminação dos defeitos, quando o vendedor (tal como ocorre com o empreiteiro) se encontre numa situação de incumprimento definitivo, quando o obrigado emite declaração de recusa ou em casos de urgência incompatível com a natural demora na resolução do diferendo[70], adianta-se já.
Cumpre, ainda, referir que o prazo de denúncia se não confunde com o prazo para propositura da ação, tendo, para poder ser conhecidas de ambas as causas de caducidade, que, como vimos, não são de conhecimento oficioso, de ser invocadas as duas.

E, denunciados os defeitos em 2013 e em inícios de 2014, quando conhecidos (cfr. pareceres técnicos solicitados pelo Autor) a ação foi proposta em 2015.

Assim, e demonstrados os problemas que os edifícios apresentam, tem o Autor direito à sua reparação, bem tendo as exceções sido julgadas improcedentes por entre a denúncia dos defeitos, denunciados dentro do prazo de um ano a contar do seu conhecimento e dentro do prazo de garantia, como veremos, e a propositura da ação, para fazer valer direitos relativos a partes comuns, não ter decorrido o específico prazo de três anos.
O direito de propriedade horizontal, direito cujo regime os autos convocam, nos termos do artigo nº1, do 1420.º, do Código Civil, integra uma duplicidade de direitos: o direito de propriedade plena, exclusivo de cada condómino à fração que lhe pertence, e simultânea e forçosamente, o direito de compropriedade sobre as partes comuns do prédio, de todos os condóminos.
A especificidade daquele direito reside, precisamente na ligação entre a propriedade sobre uma fração autónoma do edifício e a comunhão sobre as partes comuns, dado que nos termos do referido preceito “cada condómino é proprietário exclusivo da fração que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício” e “o conjunto dos dois direitos é incindível”.
E dada a relação funcional entre as partes comuns do prédio e as frações autónomas, bem como as específicas relações de vizinhança entre os condóminos, os direitos que recaem sobre umas e outras, embora regulados, subsidiária e respetivamente, pelos institutos gerais da compropriedade e da propriedade singular[71], obedecem à regulamentação própria do regime da propriedade horizontal, em especial quanto à administração, uso, fruição e disposição das partes comuns, bem como relativamente a limitações de uso e fruição das frações autónomas por parte dos respetivos condóminos, sendo que tal regime reveste a natureza própria dos direitos reais, subordinando-se ao princípio da tipicidade legal e sendo dotado de eficácia erga omnes, nos termos do nº1, do artigo 1306.º[72]
Sendo própria de cada condómino a fração autónoma de sua propriedade, elenca o artigo 1421º as partes comuns do edifício, distinguindo as partes imperativamente comuns (nº1) das partes presumidamente comuns (nº2, onde se consagrada uma presunção iuris tantum, suscetível de ser ilidida por prova em contrário). 
Dispõe o nº1, de tal artigo, imperativamente:
1. São comuns as seguintes partes do edifício:
a) O solo, bem como os alicerces, colunas, pilares, paredes mestras e todas as partes restantes que constituem a estrutura do prédio;
b) O telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso de qualquer fração; (…)”,
acrescentando o seu nº3 que «O título constitutivo pode afetar ao uso exclusivo de um condómino certas zonas das partes comuns.».
“As partes necessária ou imperativamente comuns são as partes estruturais do edifício, designadamente o solo, os alicerces, as colunas e pilares e as paredes mestras; os elementos de cobertura, o telhado ou certos terraços; os elos que permitem a circulação, a comunicação, ou a ligação espacial entre as várias fracções, e entre estas e as partes comuns do prédio ou as saídas para a rua: entradas, vestíbulos, escadas e corredores – elos ou elementos comunicantes; são ainda partes necessariamente comuns as instalações gerais, que estão funcionalmente afectadas ao uso comum” e, assim, temos “uma afetação estrutural, uma afetação denvolvente ou de cobertura, uma de comunicação e uma funcional” [73].
 “No elenco das coisas forçosa ou necessariamente comuns cabem não só as partes do edifício que integram a sua estrutura (como elementos vitais de toda a construção), mas ainda aquelas que, transcendendo o âmbito restrito de cada fração autónoma, revestem interesse coletivo, por serem objetivamente necessárias ao uso comum do prédio.
Quanto ás primeiras (as que pertencem à estrutura da construção), elas são comuns, ainda que o seu uso esteja afetado a um só dos condóminos, pela razão simples de que a sua utilidade fundamental, como elemento essencial de toda a construção, se estende a todos os condóminos”[74].

O condomínio deve ser considerado como um consumidor desde que pelo menos uma das fracções que o compõem seja destinada a uso privado [75], como o é a habitação.

E, na verdade, “estando-se perante a invocação de defeitos num imóvel de longa duração que foi construído por quem o vendeu, numa primeira análise aparentam ser aplicáveis aos respectivos direitos dos compradores os prazos de caducidade previstos no art.° 1225° do C. Civil, atento o disposto no n.° 4 deste artigo”, porém, “se as fracções que integram o edifício (em causa) tiverem por destino a habitação, é possível configurar nesta situação uma relação de consumo, o que determina a aplicação do regime da Lei de Defesa do Consumidor (Lei n.° 24/96) e do Decreto-Lei n.° 67/2003, que transpôs para o direito português a Directiva n.° 1999/44/CE, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 84/2008 (...)"[76], bem citando o Apelado, nesse sentido, o Conselheiro JOÃO CURA MARIANO: "(...) se as fracções que integram o condomínio têm um destino maioritário não profissional (v.g. a habitação), já aquele contrato deve ser qualificado como de empreitada para consumo"[77].

Assim, bem segue a sentença recorrida Acórdão desta Relação[78] a analisar “Relativamente ao autor, importa ter em conta que a realidade com que se está a lidar é de propriedade horizontal onde se criou uma figura de ficção – verdadeiramente um órgão - que não é nem uma pessoa colectiva nem uma pessoa singular e que se encontra mandatado pela Assembleia de condóminos para a realização dos direitos que competem a todos os condóminos. Dúvidas não se suscitam que cada condómino é um consumidor relativamente à fracção de que é proprietário. Relativamente ás partes comuns do edifício em que se integra essa fracção autónoma, cuja administração nos termos do artº 1430º do Código Civil compete à Assembleia de condóminos e a um administrador, este com as funções definidas no artº 1436º do Código Civil, se se tratar de um imóvel cuja totalidade ou maioria das fracções se destina a habitação, como ocorre na situação em análise, e sendo certo que não é possível adquirir uma fracção autónoma de um edifício constituído em propriedade horizontal sem simultaneamente e, por efeito dessa mesma aquisição, passar a ser titular dos direitos e deveres face às partes comuns mencionados na lei, não deixa cada um dos condóminos de satisfazer menos essa condição de consumidor por não destinar a aquisição da sua fracção autónoma à satisfação de necessidades profissionais relativamente às partes comuns que relativamente à fracção de que é proprietário. Seria mesmo um absurdo admitir que num prédio constituído sob o regime de propriedade horizontal todos os condóminos fossem consumidores relativamente à sua fracção e deixassem de o ser relativamente às partes comuns que adquirem por efeito da aquisição da sua fracção, não se destinando esta a uso profissional. Naturalmente que a situação será diversa num imóvel constituído segundo o regime de propriedade horizontal em que todas ou a maioria das fracções se destinam ao exercício do comércio por se tratar da situação inversa em que os condóminos não seriam consumidores quanto à fracção que adquiriam para nela exercer o comércio, mas já seriam consumidores quanto às partes comuns desse mesmo edifício. Nada obsta, pois, deste ponto de vista à consideração do autor como consumidor para efeitos de aplicação do regime legal de protecção do consumidor” (in www.dgsi.pt)”.

Ora, como vimos, no caso, sendo a quase totalidade das frações autónomas vendidas destinadas a habitação, é aplicável ao caso o regime previsto no DL n.º 67/2003, de 8/04, com a redação conferida pelo DL n.º 84/2008 de 21/05, dadas, desde logo, as vendas de frações autónomas para habitação em 2012, sendo de considerar o autor consumidor e, a considerar-se não decorrido o prazo da garantia e não decorridos os prazos de caducidade, a reconhecerem-se-lhe os direitos atuados.

E, como vimos e bem refere o Tribunal a quo, por força do art. 2.º, n.º 1 do citado DL n.º 67/2003 a vendedora tinha o dever de entregar aos consumidores compradores bens conformes com o contrato de compra e venda, presumindo-se, a falta de conformidade, nos termos da al. d) do n.º 2 do mesmo preceito legal, quando os bens de consumo, não apresentam as qualidades e o desempenho habituais nos bens do mesmo tipo e que o consumidor pode razoavelmente esperar, atendendo à natureza do bem e às declarações sobre as suas características concretas feitas pelo vendedor.

Entendeu-se na sentença recorrida seguindo Jorge Morais Carvalho, que citado aí vem:

 “o art. 2.º, n.º 2 do DL n.º 67/2003 deve ser interpretado no sentido de não consagrar uma presunção. O facto de não estarmos perante um raciocínio indutivo baseado em regras de experiência (contrariamente ao que sucede no caso da formulação pela positiva, na qual, da verificação dos factos constantes das quatro alíneas do art. 2.º-2 da Diretiva 1999/44/CE, se induz a verificação de todos s factos dos quais resultaria a conformidade) faz com que não estejamos perante uma presunção, mas antes perante a enunciação dos factos integrantes da previsão da norma que estatui a desconformidade do bem com o contrato. A relação entre previsão e estatuição não envolve um raciocínio indutivo entre a ocorrência de um facto e a suposição da ocorrência de outro facto, mas apenas – pelo menos segundo o entendimento tradicional cuja adequação ao direito não pretendemos aqui analisar – a aplicação de uma consequência jurídica em função da prova do facto constante da previsão”. … “A única forma, prossegue o mesmo autor, que o vendedor tem de afastar a sua responsabilidade é pôr em causa a previsão normativa” (in “Manual de Direito do Consumo”, 7.ª Edição, Almedina, pág. 287/288)” “Especificamente sobre a al. d) do n.º 2 do art. 2.º a que vimos de nos reportar, o eminente autor, salienta que “Esta alínea refere-se às qualidades e ao desempenho dos bens do mesmo tipo. Não estão em causa as utilizações habituais, a que alude a alínea c), mas as próprias características do bem de consumo objecto do contrato. Com efeito, o bem deve apresentar todas as particularidades – quer ao nível da sua essência quer no que respeita à sua performance – que o consumidor possa razoavelmente esperar, dentro dos limites da norma (a natureza do bem…)” – in loc. cit., págs. 297/298 (com interesse vide igualmente acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 27/01/2020, relatado pelo Exmo. Desembargador Miguel Baldaia Morais, in www.dgsi.pt)”.

Ora, provado se encontra que as partes comuns do edifício apresentam, designadamente, fissuras, humidades e infiltrações, por deficiente impermeabilização, deficiente ventilação e demais problemas referidos no ponto 56, que, com exceção dos “tubos de rega”, não só correspondem a falta de qualidade da construção como, mesmo, não permitem o normal utilização, em condições de segurança e conforto, das pessoas que habitam os edifícios em propriedade horizontal, que constitui o empreendimento do condomínio fechado.

E como bem considera o Tribunal a quo:

“as anomalias elencadas no ponto 56 dos Factos Provados, inclusive as de concepção, representam desconformidades com o contrato de compra e venda porquanto configuram a ausência das qualidades próprias de um edifício do género com as quais um consumidor poderia razoavelmente contar.

Assim, nos termos do art. 3.º, n.º 1, do DL n.º 67/2003, o vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue, altura em que o risco se transfere do primeiro para o segundo, por força do art. 9.º- C da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho (Lei de Defesa do Consumidor- LDC), aditado pela Lei n.º 47/2014, de 28/07,  e a partir da qual, de acordo com o n.º 2 do supra referido art. 3.º, se contam os prazos, cinco anos no caso de imóveis, da garantia e da dispensa ou liberação legal do ónus da prova da contemporaneidade ou da anterioridade da falta de conformidade.

“Com efeito, escreve o já mencionado autor Jorge Morais Carvalho, considera-se que a regra da dispensa ou liberação do ónus da prova de que a falta de conformidade existia no momento da entrega do bem se aplica quando o consumidor faça prova de que o bem vendido não está em conformidade com o contrato e que a falta de conformidade em causa se manifestou, isto é, se revelou materialmente, num prazo…a contar da entrega do bem. O consumidor não está obrigado a provar a causa dessa falta de conformidade nem que a origem da mesma é imputável ao vendedor. Acrescenta-se que a responsabilidade só pode ser excluída se o vendedor demonstrar cabalmente que a causa ou origem da referida falta de conformidade reside numa circunstância ocorrida depois da entrega do bem” (in loc. cit., pág. 322)”.

Assim, e não tendo a Ré/vendedora demonstrado que a origem das anomalias seja subsequente à entrega das frações do edifício, tem-se a sua responsabilidade por verificada, tanto mais que os prazos a que se referem os art.s 5.º e 5.-A , de garantia e de caducidade, respetivamente, do DL 67/2003 foram observados, como conclui o Tribunal a quo, improcedendo as exceções deduzidas, pois que a Ré, invocando a falta de denúncia no prazo de um ano a contar do conhecimento dos defeitos e a falta de propositura da ação no prazo da garantia, não logrou provar factos a densificar tais exceções.
 Na verdade, situações de desconformidade de bem imóvel com o contrato que se manifeste num prazo de cinco anos a contar da data da entrega têm como consequência a atribuição ao consumidor dos direitos previstos no art. 4.º do DL 67/2003, entre eles reparação do bem.
“Na hipótese de o empreiteiro ser simultaneamente vendedor das frações autónomas, o STJ tem reiteradamente afirmado que o prazo de garantia dos defeitos se deve contar a partir da data da entrega e que a data da entrega coincide com a data da constituição da administração do condomínio. Por conseguinte, em relação aos defeitos das partes comuns do edifício, o prazo deverá contar-se a partir da constituição da administração do condomínio.”[79].
Tal jurisprudência, relativa a situações de os contratos incidirem sobre frações autónomas de um imóvel constituído em propriedade horizontal, no que respeita às partes comuns, vem a ser posta em causa, tendo-o sido na presente ação, no seguimento de Doutrina, afirmando os ensinamentos de Jorge Morais Carvalho.
Refere este autor que o prazo não pode deixar de se contar:
-“a partir da data em que se verificou a última transmissão pelo vendedor ou empreiteiro profissional. Uma solução noutro sentido, considerando relevante para este efeito o momento em que instituída a administração do condomínio[80], deixaria parcial ou totalmente desprotegidos todos aqueles que adquirissem o imóvel posteriormente. Defende-se, em sentido contrário, que “tão grande retardamento implicaria um demasiado e intolerável prolongamento do prazo de garantia enquanto o construtor […] conservasse a propriedade de uma das frações”[81]. No entanto, este argumento não parece ser decisivo, uma vez que qualquer adquirente deve ter direito a exercer os direitos resultantes da desconformidade do imóvel no prazo de cinco anos previstos no diploma, independentemente de se tratar da fracção autónoma ou de uma parte comum. Esta conclusão é igualmente válida se o imóvel não for novo. O regime aplica-se a bens imóveis usados, sendo o vendedor profissional responsável, perante o consumidor, por qualquer falta de conformidade com o contrato quer da fração autónoma quer das partes comuns” [82].
Revertendo para o caso, temos que o empreendimento em causa vem a ser construído por fases, sequer estando a construção acabada, tendo correspondido a primeira fase aos blocos ... e ..., a segunda aos blocos ... e ... e a última, relativa ao bloco ..., ainda se mostra em curso. Deste modo, não estando a construção, mesmo na parte relativa a partes comuns, terminada, nunca se podería, por isso, considerar decorrido o prazo de garantia.
Bem considerou, pois, a primeira instância que frações autónomas, que fazem parte do mesmo condomínio, ainda não estão vendidas e, nessa medida, os prazos de caducidade dos direitos dos condóminos relativamente às partes comuns não se mostram esgotados.
Vamos, mesmo, mais longe.
Nunca o prazo de garantia relativa a partes comuns se pode considerar decorrido estando, ainda, trabalhos de execução de partes comuns (e frações autónomas) por executar.
Diga-se, mesmo, sequer teve já lugar o dies a quo a partir do qual se conta o início do prazo dos cinco anos da garantia das partes comuns, o qual não pode ter lugar antes da conclusão dos trabalhos.

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Acrescenta, ainda, o Tribunal a quo que, de qualquer modo, temos no caso que desde 16/11/2006 até Janeiro de 2013, a administração do condomínio foi exercida pelo condómino BB, o primeiro habitante do condomínio, que a par de tais funções, de representação do condomínio, também mandatado foi, pela R., como seu representante para outros assuntos do seu interesse e que esta dupla e simultânea qualidade, representante do condomínio, por um lado, e representante da empresa vendedora, por outro, é conflituante, não permitindo excluir o domínio da Ré sobre a administração do condomínio, nem, consequentemente, a falta de garantias de exercício adequado e atempado dos direitos deste e, nesta medida, também não se pode considerar que até fevereiro de 2013 a administração do condomínio tenha estado entregue a entidade distinta da Ré.
Bem concluiu, pois, o Tribunal a quo pela denúncia atempada dos defeitos, quer em 13/02/2013 quer em janeiro de 2014, assim como pela tempestividade do exercício dos direitos através da presente ação, proposta em 14 de outubro de 2015 (cfr. fls 59) dentro do prazo da garantia, não esgotado.
Assim, bem foi reconhecida a responsabilidade da R. pela eliminação dos defeitos das partes comuns do edifício em apreço, e pelo pagamento de indemnização, em caso de incumprimento definitivo da obrigação de reparação, sendo que podendo mesmo, como vimos, ser cumulado um pedido indemnizatório, nada impede a formulação de pedido indemnizatório deduzido para o caso de se verificar incumprimento da obrigação de eliminação de defeitos, a liquidar ulteriormente.


3.3 - Dos direitos do Autor (e correspetiva obrigação da Ré): a reparação de defeitos das partes comuns / a indemnização.

Radicando a pretensão da Autora nos contratos celebrados entre a Ré e condóminos e na verificação dos apontados defeitos, carecidos de reparação, como demonstrado, surgidos em parte comum do edifício, denunciados as Ré, conforme o que resulta dos factos provados, e exercido o direito de ação tempestivamente, bem se mostra, também, como vimos, não estar esgotado o prazo de garantia de defeitos existentes nas partes comuns.
A reparação é, como vimos, um direito que é concedido por lei ao consumidor de coisa defeituosa, a poder ser exercido logo em primeiro lugar, o que é pacificamente aceite, e o direito a indemnização, em caso de incumprimento, é um outro direito que lhe é facultado, conforme, também, já referido.
Sendo pedida a reparação dos defeitos de construção densificados, uma vez verificados, não podem deixar de ser reconhecidos os direitos que o Autor pretende fazer valer na presente ação, bem fundamentando o Tribunal a quo o direito à reparação, que assiste ao Autor (pedido que, contudo, não engloba a “tubagem de rega” aludida no ponto 56, não colocada pela Ré).

As custas do recurso e as da ação são, integralmente, da responsabilidade da Ré/Recorrente, dado o seu total decaimento em 1ª instância e a total improcedência da pretensão recursória que deduziu (nº1 e 2, do artigo 527º, do Código de Processo Civil).

Improcedem, por conseguinte, as conclusões da apelação, não ocorrendo a violação de qualquer dos normativos invocados pela apelante, devendo, por isso, a decisão recorrida ser mantida.


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4. Da ampliação do âmbito do recurso
Sendo o recurso de julgar improcedente e a sentença recorrida de confirmar, integralmente, não se aprecia a ampliação do âmbito do recurso, requerida, nos termos do nº1 e 2, do art. 636º, apenas, a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da apreciação, nenhuma utilidade tendo o seu conhecimento, atenta a manutenção da decisão.

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III. DECISÃO

Pelos fundamentos expostos, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam, integralmente, a decisão recorrida.


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Custas pela apelante, pois que ficou vencida – art. 527º, nº1 e 2, do CPC.

Porto, 8 de abril de 2024
Assinado eletronicamente pelos Juízes Desembargadores
Eugénia Cunha
Manuel Domingos Fernandes
José Eusébio Almeida
__________________
[1] Cfr., entre muitos, Ac. do STJ de 1/4/2014, Proc. 360/09: Sumários, Abril /2014, e Ac. da RE de 3/11/2016, Proc. 1070/13, in dgsi.Net.
[2] Ac. STJ. 08/03/2001, Proc. 00A3277, in dgsi.net.
[3] Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 2ª ed., janeiro/2014, pág. 734.
[4] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª Edição Almedina, pág. 735.
[5] Ibidem, pág 735 e seg.
[6] Ibidem, pág 736.
[7] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2ª Edição, Almedina, pág. 763.
[8] Ac. STJ de 5/4/2016, Proc. 128/13, Sumários Abril/2016, pág 8, Abílio Neto, in Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª ed., Março/2017; pág. 921.
[9] Ac. STJ. 08/03/2001, Proc. 00A3277, in dgsi.pt.
[10] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, idem, pág 736-737.
[11] Ibidem, pág 737.
[12] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, 5º vol., págs. 55 e 143.
[13] Ac. do STJ, de 30/9/2014, proc. 2868/03: Sumários, setembro 2014, pág 39.
[14] Ac. da RL de 17/3/2016, proc. 218/10: dgsi.net.
[15] Ac. do STJ, de 20/10/2015, proc. 372/10: Sumários, 2015, p. 555.
[16] Acs. STJ. de 01/03/2007, proc. 07A091; 14/11/2006, proc. 06A1986; 20/06/2006 e proc. 06A1443, in dgsi.pt.
[17] “C. A recorrente considera incorretamente julgados, total ou parcialmente, nos termos que a seguir se expõem, os factos provados números 3, 4, 12, 14, 15, 24, 26, 46, 56 a), b), c), d), e), f), j), k), n) e q), bem como os "factos provados" 57, 58, 62, 64, 65 e 66 por entender que os mesmos são meras conclusões de facto ou de direito ou conceitos jurídicos, e ainda os pontos b), i) e m) dos factos não provados referentes à contestação, nos termos já acima apontados, e que se pede vénia em dar por reproduzido”.
[18] De 07-11-2019 – Revista n.º 162867/15.0T8YIPRT.L1.S1; de 08-02-2018, Revista 8440/14.1T8PRT.P1.S1, ambos desta 2ª secção, in www.dgsipt
[19] Na Revista n.º 3160/16.5T8LRS-A.L1-A.S1 in www.dgsi.pt.
[20] AUJ de 17/10/2023, proc. 8344/17.6T8STB.E1-A.S1
[21] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2ª Edição, Almedina, pág. 823 e seg.
[22] Ibidem, págs 824 e seg.
[23] Ibidem, pág, 825.
[24] Ibidem, pág, 825.
[25] Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, pág. 348.
[26] Lebre de Freitas, Código de Processo Civil, vol II, Almedina, pag.635.
[27] Cfr. Ac. RP de 19/9/2000, CJ, 2000, 4º, 186 e v., ainda, Ac. RP de 13/11/2023, proc. 12254/19.4T8PRT.P1 (Relatora: Ana Paula Amorim). Sobre a questão da alteração da decisão da matéria de facto pela Relação v., entre muitos, os Acórdãos desta Relação, em que a ora relatora foi adjunta, com os seguintes sumários: - proc. 4201/22.2T8PRT.P1, “O Tribunal da Relação goza no âmbito da reapreciação da matéria de facto dos mesmos poderes e está sujeito às mesmas regras de direito probatório que se aplicam ao juiz em 1ª instância, competindo-lhe proceder à análise autónoma, conjunta e crítica dos meios probatórios convocados pelo recorrente ou outros que os autos disponibilizem, introduzindo, nesse contexto, as alterações que se lhe mostrem devidas” (Relator: Manuel Fernandes); - proc. 124/18.8T8PVZ.P1: “I. Tendo em vista alcançar o duplo grau de jurisdição ao nível da decisão de facto, incumbe ao Tribunal da Relação proceder à reanálise crítica e autónoma da decisão de facto proferida pelo Tribunal de 1ª instância, convocando, para o efeito, todos os meios de prova disponíveis no processo (e não apenas os que foram convocados pelo apelante).II. Os poderes de alteração da matéria de facto conferidos ao tribunal de recurso constituem um remédio a utilizar apenas nos casos em que os meios probatórios apontam inequivocamente (em termos de convicção autónoma) para uma resposta diferente da que foi dada pelo Tribunal de 1ª instância e já não naqueles (como é o caso) em que, existindo versões contraditórias, o tribunal recorrido, beneficiando da oralidade e da imediação, logrou firmar a sua convicção quanto à demonstração de determinado quadro factual, sem que se evidencie nesse seu juízo algum atropelo das regras da lógica, da ciência e da experiência comum, assumindo uma opção que justificou de forma consonante, lógica e racional com toda a prova produzida nos autos” (Relator: Jorge Seabra); - proc. 9648/21.9T8PRT.P1:“… II- O tribunal de 1ª instância é livre de dar credibilidade a determinados depoimentos em detrimento de outros, desde que na explicitação do iter formativo da sua convicção evidencie de forma coerente e convincente a adoção de uma das teses em confronto, mormente estribando-se na coerência e consistência dos elementos probatórios que a sustentam. III- Os poderes para alteração da matéria de facto conferidos ao tribunal de recurso constituem apenas um remédio a utilizar nos casos em que os elementos constantes dos autos apontam inequivocamente (em termos de convicção autónoma) para uma resposta diferente da que foi dada pela 1ª instância e já não naqueles em que, existindo versões contraditórias, o tribunal recorrido, beneficiando da oralidade e da imediação, firmou a sua convicção numa delas (ou na parte de cada uma delas que se apresentou como coerente e plausível) sem que se evidencie no juízo alcançado algum atropelo das regras da lógica, da ciência e da experiência comum” (Relator: Miguel Baldaia Morais).
[28] No que diz respeito aos factos conclusivos cumpre observar que na elaboração do acórdão deve observar-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º CPCivil aplicáveis ex vi artigo 663.º, nº 2 do mesmo diploma legal.
[29] José Lebre de Freitas e A. Montalvão Machado, Rui pinto Código de Processo Civil–Anotado,Vol. II, Coimbra Editora, pag. 606.
[30] Antunes Varela, J. M. Bezerra, Sampaio Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição Revista e Atualizada de acordo com o DL 242/85, S/L, Coimbra Editora, Lda. 1985, pág. 648.
[31] Ac. RP de 19/12/2023, proc. nº 4201/22.2T8PRT.P1 (que não vimos publicado).
[32] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, Manuel de Direito de Consumo, 5ª ed., 2018, Almedina, p. 262.
[33] Ac. RG de 17/1/2019, proc. 201/15.7T8BAO.G1, in dgsi.pt
[34] Cfr. Ac. do STJ de 05/05/2015 (relator João Camilo), in www.dgsi.pt.
[35] Ac. do STJ de 20/5/2014, proc. 492/07: Sumários, 2014, p. 311 citado in Abílio Neto, Código Civil Anotado, 20ª Edição Actualizada, abril de 2018, Ediforum, pág. 1140,
[36] Ac. do STJ de 31/5/2016, proc. 721/12.5TCFUN.L1.S1, in dgsi.pt
[37] Cfr., ainda, Ac. do STJ de 17/10/2019, proc. 1066/14.1T8PDL.L1.S1, in dgsi.pt, onde se analisa:
“I. Visando responder às distorções que o regime civil tradicional encerra em casos de cumprimento defeituoso, foi criada a Lei n.º 24/96 de 31 de Julho (LDC), alterada pelo Decreto-Lei n.º 67/2003 de 8 de Abril (que transpôs para a ordem jurídica nacional a Directiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Maio de 1999, sobre certos aspectos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas), cuja primeira alteração decorre do Decreto-Lei n.º 84/2008 de 21 de Maio que reconhece ao consumidor um direito à qualidade dos bens ou serviços destinados ao consumo, direito esse que é objecto de uma garantia contratual injuntivamente imposta, no âmbito da qual “os bens e serviços destinados ao consumo devem ser aptos a satisfazer os fins a que se destinam e a produzir os efeitos que se lhes atribuem, segundo as normas legalmente estabelecidas ou, na falta delas, de modo adequado às legítimas expectativas do consumidor”, assegurando, inequivocamente, a protecção dos interesses dos consumidores nos contratos de transmissão de bens de consumo. II. As normas contidas na Lei de Defesa dos Consumidores constituem normas especiais relativamente às regras gerais do Código Civil, derrogando estas com as quais se revelem incompatíveis no seu campo de aplicação, que é o da relação de consumo, e como lei especial, deverá prevalecer o seu regime, a menos que a disciplina da venda de coisa defeituosa do Código Civil, se revele mais favorável para o comprador/consumidor. III. O âmbito de aplicação da garantia contratual de bens de consumo é indicado pelo art.º 1º do Decreto-Lei nº. 67/2003, de 8 de Abril, cujo n.º 1, refere a hipótese da venda de bens de consumo, tutelando os interesses dos consumidores, tal como definidos pelo art.º 1º-B alínea a), e cujo art.º 1º nº. 2, na republicação do Decreto-Lei nº. 67/2003, de 8 de Abril, em razão do Decreto-Lei nº. 84/2008, de 21 de Maio, determina a sua aplicação “com as necessárias adaptações, aos bens de consumo fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada”, sendo esta garantia restrita aos contratos entre aqueles fornecem bens de consumo no exercício de uma actividade económica que visa a obtenção de benefícios e consumidores, pessoas que adquirem bens de consumo com fins não profissionais.(…)”.
[38] José Engrácia Antunes, Direito do Consumo, 2021, Almedina, pág. 155.
[39] Ibidem, pág. 156 e seg.
[40] Ibidem, pág. 157 e seg.
[41] Ibidem, pág. 159.
[42] Ibidem, pág. 161 e seg.
[43] Ibidem, pág. 162.
[44] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, obra citada, p. 274.
[45] Cfr. Ac. do STJ de 17/12/2015 (relatora Maria da Graça Trigo), in www.dgsi.pt.
[46] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, obra citada, p. 272.
[47] Diversamente do critério adotado na Diretiva n.º 1999/44/CE (art. 2º, n.ºs 1 e 2), em vez de uma presunção de conformidade o legislador nacional decidiu estabelecer uma presunção de não conformidade.
[48] Cfr. Venda de Bens de Consumo – Comentário, Revista, Aumentada e Atualizada, 4.ª ed., Almedina, Coimbra, 2010, p.84.
[49] Cfr. Calvão da Silva, obra citada, p. 83.
[50] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, obra citada, p. 309.
[51] Relativamente à Diretiva 1999/44/CE (art. 5º, n.º 3), o legislador nacional alargou o prazo da presunção de anterioridade (da falta de conformidade) de seis meses para dois anos após a entrega do bem, aumentando substancialmente o nível de proteção do consumidor.
[52] No caso, 5 anos, imóvel.
[53] A esta presunção excecionam-se apenas os casos em que a mesma for incompatível com a natureza do bem ou com as características da falta de conformidade (parte final do n.º 2 do art. 3º do Dec. Lei n.º 67/2003).
A presunção é incompatível com a natureza do bem quando o mesmo seja de desgaste rápido ou sujeito a um prazo de validade. Nestes casos a presunção apenas poderá funcionar dentro dos respectivos prazos de validade.
Por outro lado, a presunção será incompatível com as características da falta de conformidade quando for claro que a mesma se deveu a mau uso ou uso incorrecto por parte do consumidor, de sabotagem, de acção de terceiro. – cfr., sobre o tema, Jorge Morais de Carvalho, obra citada, pp. 310/311.
[54] Cfr. Jorge Morais de Carvalho, obra citada, p. 309.
[55] Cfr. Ac. da RL de 10/02/2015 (relator Manuel Marques), in www.dgsi.pt.
[56] Ac. RG. de 17/1/2019, proc. 201/15.7T8BAO.G1, in dgsi.pt
[57] Cfr. Ac. da RC de 12/3/2019, proc. 190/15.8T8CNT.C2, in dgsi.pt, onde se decidiu “Em relação às partes comuns, o prazo de 5 anos do chamado limite máximo da garantia legal só se inicia no momento em que os órgãos de administração do condomínio (o administrador e a assembleia de condóminos) passam a estar em condições de poderem exercer os referidos direitos (cfr. art. 329.º do C. Civil), ou seja, a partir da data em que o construtor faz a transmissão dos poderes de administração das partes comuns para os condóminos ou, não se podendo precisar o momento em que tal sucedeu (expressa ou tacitamente), a partir do momento em que os condóminos constituíram a sua estrutura organizativa (reunindo em assembleia de condóminos e elegendo o administrador).
[58] Ac. do STJ de 31/5/2016, proc. 721/12.5TCFUN.L1.S1, in dgsi.pt
[59] Cfr., ainda, Ac. do STJ de 17/10/2019, proc. 1066/14.1T8PDL.L1.S1, in dgsi.pt, onde se analisa, “…Estando em causa a extensão aos bens de consumo no âmbito de um contrato de empreitada impõe-se reconhecer tendo a Ré, enquanto empreiteiro, construído o edifício a solicitação da dona da obra, não interveniente nos autos e que promoveu a venda aos condóminos, representados pelo Condomínio/Autor, no âmbito da sua actividade profissional do ramo imobiliário, desenvolvendo uma actividade económica lucrativa, ter-se-á que admitir que para a aplicação do regime da Lei de Defesa do Consumidor, ao terceiro adquirente, Condomínio, aqui Autor, depende de este, ficcionando-se, poder ser qualificado como consumidor se tivesse sido parte no primeiro contrato. V. A lei estabelece o prazo de denúncia dos defeitos e o prazo para o exercício do direito de eliminação dos defeitos, a par do limite máximo de 5 (cinco) anos da garantia legal, sendo o primeiro, de 1 (um) ano, estando em causa um imóvel destinado a longa duração quanto à empreitada de consumo (art.º 1225.º, n.º 2 do Código Civil e art.º 5º-A, n.º 2 do Decreto-Lei 67/2003 de 8 de Abril, alterado e republicado pelo Decreto-Lei 84/208 de 21 de Maio), sendo o prazo para o exercício do direito de eliminação dos defeitos, na empreitada de consumo, de 3 (três) anos, a contar da denúncia atempada dos defeitos (art.º 5º-A, n.º 3, do Decreto-Lei 67/2003 de 8 de Abril, alterado e republicado pelo Decreto-Lei84/208 de 21 de Maio). VI. No Decreto-Lei 67/2003 de 8 de Abril, alterado e republicado pelo Decreto-Lei 84/208 de 21 de Maio, os direitos conferidos ao consumidor são independentes uns dos outros, podendo exercê-los livremente, com respeito pelos princípios da boa-fé e dos bons costumes e da finalidade económico-social do direito escolhido (que se traduz, essencialmente, na satisfação do interesse do respectivo titular no âmbito dos limites legalmente previstos), sendo as particularidades do caso concreto que enquadrarão as possibilidades de exercício dos diferentes direitos colocados ao dispor do adquirente consumidor - art.º 4º, n.ºs 1 e 5 do Decreto-Lei 67/2003 de 8 de Abril, alterado e republicado pelo Decreto-Lei84/208 de 21 de Maio - importando reconhecer ao consumidor, no condicionalismo concreto apurado em cada caso, o direito de proceder à realização dos trabalhos que se impõem, por terceiro por ele contratado, assistindo-lhe o direito de indemnização em dinheiro, correspondente ao custo dessas reparações, a satisfazer pelo empreiteiro”.
[60] Jorge Morais Carvalho, em anotação ao artigo 916º, Ana Prata Coord., Código Civil Anotado, vol. I, Almedina, pág. 1132.
[61] Ac. RP de 25/3/2019, proc. 1159/17.3T8GDM.P1, in dgsi.pt
[62] Ibidem, pág. 1133
[63] Ibidem, pág. 1134
[64] Júlio Gomes, em anotação ao artigo 331º, in Comentário ao Código Civil, Parte Geral, Universidade Católica, pág. 781
[65] Ricardo Bernardes, em anotação ao artigo 331º, Ana Prata (Coord.), Código Civil Anotado, vol. I, Almedina, pág. 403
[66] Júlio Gomes, Idem, pág. 781
[67] Ac. RE de 15/4/1993, BMJ, 426º, 545
[68] Ricardo Bernardes, Idem, pág. 403
[69] Ac. do STJ de 25/11/1998, BMJ, 481º, 430, onde se refere que “O reconhecimento do direito como causa impeditiva da caducidade (art. 331º, nº2, do CC) deve ser expresso, concreto e preciso, de modo a não subsistirem dúvidas sobre a aceitação pelo devedor do direito do credor” e Ac. da RL de 19/5/2005, proc. 4339/2005-6.dgsi.net onde se refere ter o reconhecimento de ser “claro e distinto”.
[70] Ac. RL de 12/3/2009: CJ, 2009, 2º, 72
[71] O regime das frações autónomas é disciplinado pelas regras da propriedade sobre imóveis, ao passo que as partes comuns se encontram subordinadas ao regime estabelecido para a compropriedade, conforme resulta do preceituado, respectivamente, nos art.ºs 1405º e 1406º, sendo que nos termos deste preceito, a qualquer comproprietário é lícito servir-se da coisa comum, contanto que a não use para fim diverso daquele a que se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito, assim resultando desta disposição legal que ao condómino é consentido o uso da coisa comum, mas não a sua ocupação, ainda que parcial, na medida em que dela sempre resultaria a privação do uso por banda dos demais comproprietários – Ac. RC de 2/2/2016, proc. 309/07.2TBLMG.C1, in dgsi.pt .
[72] Ac. do STJ de 22/2/2017, proc. 2064/10.0TVLSB.L1.S1, in dgsi.pt
[73] Sandra Passinhas, A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, Almedina, pág. 27
[74] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. III, Coimbra, 1987, pág. 420
[75] Ac. RP de 27/10/2022, proc. 14521/20.5T8PRT.P1 e v. Ac. da RP de 2/12/2021, proc. 11255/19.7T8PRT.P2, ambos acessíveis in dgsi.pt.
[76] Cfr. Ac. RC, de 18/9/2012, proc. 493/11.0T2AVR.C1, in dgsi.pt.
[77] JOÃO CURA MARIANO, op. cit. p. 211.
[78] De 26/06/2008 (relatado pela Senhora Desembargadora Ana Paula Lobo)
[79] Ac. do STJ de 16/11/2023, proc. 10835/19.5T8LRS.L1.S1, in dgsi.pt
[80] V. a respetiva nota, a 1070, da pág. 442, onde vêm referidos os seguintes Acórdãos: Ac. do STJ, de 15/11/2012; Ac. do STJ de 14/1/2014; Ac. do TRP de 10/2/2014, Ac. do TRP de13/3/2014; Ac. TRL de 30/4/2015
[81] V. a respetiva nota, a 1071, da pág. 442, onde vêm referidos os seguintes Acórdãos: Ac. do STJ de 1/6/2010; Ac. do TRP de 20/6/2016.
[82] Jorge Morais Carvalho, Manual de Direito do Consumo, 8ª Edição, 2022, Almedina, pág. 442.