Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | FRANCISCA MOTA VIEIRA | ||
| Descritores: | CONTRATO DE MÚTUO PRESTAÇÕES PRESCRIÇÃO PRAZO DE PRESCRIÇÃO DEFESA EM RELAÇÃO À MATÉRIA DA EXCEPÇÃO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO | ||
| Nº do Documento: | RP2025111315990/24.0T8PRT-A.P1 | ||
| Data do Acordão: | 11/13/2025 | ||
| Votação: | MAIORIA COM 1 VOT VENC | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | REVOGADA | ||
| Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - As quotas de amortização do capital mutuado, pagáveis conjuntamente com juros, … prescrevem no prazo de 5 anos, prazo esse que se mantém mesmo quando ocorra vencimento antecipado da dívida nos termos do art. 781.º do Código Civil, conforme fixado pelo AUJ do STJ n.º 6/2022. II - Se o contrato de mútuo contém uma cláusula de exigibilidade antecipada que atribui à mutuante o direito de considerar imediatamente vencida a totalidade da dívida, …, essa cláusula configura uma cláusula específica de perda do benefício do prazo, autónoma, mas compatível com os arts. 780.º e 781.º do CC. III - São duas questões distintas: 1. Exigibilidade antecipada do capital (vencimento antecipado) que se admite, por força da cláusula de vencimento antecipado e do regime da fiança. 2. Constituição em mora para efeitos de cobrança de juros de mora e cálculo da dívida. IV - Não existe violação do princípio do contraditório, nem do direito de defesa, na vertente de “decisão — surpresa”, na qualificação da notificação do embargante. (enquanto co-executado, efetuada num apenso de reclamação de créditos pela anterior titular do crédito exequendo numa execução anterior instaurada contra os mesmos executados e em que foi reclamado precisamente o crédito aqui em cobrança, já deduzido do montante recebido nessa execução) como facto interruptivo da prescrição, se a exceção da prescrição foi tempestivamente suscitada na petição de embargos e respondida pela exequente -embargada na contestação juntando documentos relativos a essa execução anterior, limitando-se o tribunal a quo a aplicai- o direito aos factos alegados (iura novit cúria), sem introduzir questão nova. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Processo n.º 15990/24.0T8PRT-A.P1 (Embargos de Executado) Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo de Execução do Porto - Juiz 6 ACORDAM OS JUÍZES DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: I. RELATÓRIO: 1.A..., S.A. instaurou Execução para pagamento de quantia certa, apresentando como título executivo uma Escritura, contra AA e BB para obter o pagamento da quantia global de 58.999,78 € respeitante a Capital: 35.573,10 €, Juros: 23.426,68 €, sendo que peticionou ainda juros vincendos, até efetivo e integral pagamento. Reproduz-se o requerimento executivo apresentado a 17.09.2024. “Factos: I - Da legitimidade da A..., S.A. 1. A A..., S.A. é uma sociedade de responsabilidade limitada portuguesa constituída ao abrigo das leis de Portugal como sociedade de titularização de créditos e registada como tal na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, com sede na Avenida ..., n.º ... – 5.º andar, Lisboa, com o número único de pessoa coletiva e de registo .... 2. Por Contrato de Cessão de Créditos, outorgado em 20 de dezembro de 2019, a Banco 1..., S.A., cedeu B..., SARL uma carteira de créditos, bem como todas as garantias a eles inerentes, conforme Contrato de Cessão de Créditos que aqui se junta como Doc. 1 e que, tal como os restantes documentos, se dá por reproduzido para todos os devidos efeitos legais. 3. Sucede que, por contrato de cessão outorgado em 03/04/2020 e aditado em 31/03/2021 e em 14/07/2023, a B..., S.A.R.L. cedeu à ora Exequente a carteira de créditos que lhe havia sido cedida pela Banco 1..., S.A., bem como todas as garantias a eles inerentes, incluindo os créditos que aquela instituição bancária detinha sobre os ora Executados, cfr. contrato de cessão que se junta como Doc. 2. 4. A cessão de créditos supra mencionada foi devidamente notificada aos Executados. 5. Razão pela qual assiste à aqui Exequente a legitimidade para propor os presentes autos, como sucessora da Banco 1..., S.A. e atual titular dos créditos. II - EXPOSIÇÃO DOS FACTOS 6. No exercício da sua atividade bancária, a Banco 1..., S.A. celebrou com os Executados Contrato de Mútuo com Hipoteca, ao qual foi atribuído o nº..., conforme contrato que aqui se junta como Doc. 3. 7. Sucede que os Executados deixaram de efetuar os pagamentos a que estavam adstritos, tendo entrado em incumprimento em 16/09/2016. 8. Excutida a garantia hipotecária constante do referido contrato, permanece ainda em divida a titulo de capital o montante de 35.573,10 € (trinta e cinco mil, quinhentos e setenta e três euros e dez cêntimos). 9. Ao valor em dívida a título de capital acrescem juros à taxa contratual de 8,246%, desde a data do respectivo incumprimento, no montante de 23.426,68 € (vinte e três mil, quatrocentos e vinte e seis euros e sessenta e oito cêntimos). 10. Ademais, sobre o montante total em dívida acrescem juros vincendos, desde a data de entrada do requerimento executivo até efetivo e integral pagamento, custas, custas de parte, despesas e honorários de A.E., e em tudo o que mais for de Direito. 11. Face ao silêncio dos Executados às missivas enviadas e ao reiterado incumprimento contratual, a Exequente tem direito a exigir todo o montante em dívida até ao final, incluindo juros de mora e demais encargos da responsabilidade dos Executados, dentro dos trâmites contratuais. 12. Assim, encontra-se em dívida à presente data, a quantia global de 58.999,78 € (cinquenta e oito mil, novecentos e noventa e nove euros e setenta e oito cêntimos), à qual sempre acrescerão os juros calculados à taxa legal, até efetivo e integral pagamento, bem como todas as despesas que a Exequente incorrer, para recuperação do valor mutuado. 13. O contrato em apreço constitui título executivo nos termos no art. 703.º, n.º 1, alínea c) do CPC. CUSTAS JUDICIAIS Taxa de Justiça (…) LIQUIDAÇÃO DA OBRIGAÇÃO Na presente data, encontra-se em dívida o valor global de 58.999,78 € respeitante a: - Capital: 35.573,10 € - Juros: 23.426,68 € Ao valor acima discriminado sempre acrescerá a nota de despesas e honorários do Agente de Execução, bem como juros vincendos, até efetivo e integral pagamento.” Juntou cópia da escritura pública e documento complementar supra referenciados, dos contratos de cessão de créditos e procuração forense. E resulta da escritura pública de Mútuo com Hipoteca e Fiança celebrada em 16-11-2007, que BB constituiu hipoteca sobre prédio urbano para garantia das obrigações decorrentes de empréstimo que a “Banco 1..., S.A.” lhe concedeu, no montante de 44.000,00€, cujo reembolso seria efetuado em 27 anos, em prestações mensais e sucessivas de capital e juros, tendo AA declarado constituir-se fiador e principal pagador. Alega a exequente que os executados não pagaram as prestações que se venceram em 16/09/2016, nem as subsequentes. Alega ainda que por via de sucessivas cessões, adquiriu o crédito exequendo ao Banco mutuante. 2.Citado, o executado AA deduziu os presentes embargos de executado por oposição à execução sumária para pagamento de quantia certa que lhe move A..., S.A., pedindo a extinção da execução. E, no essencial, alega que a obrigação está prescrita, que o requerimento executivo é inepto porque ininteligível, impugna a liquidação do montante em dívida, que não foi interpelado, pelo que não perdeu o benefício do prazo; que ainda não pode ser demandado porque não foram excutidos os bens da mutuária; que os juros peticionados não são devidos. Termina pedindo a condenação da embargada/exequente como litigante de má-fé. 3. Recebidos os embargos, contestou a embargada no dia 21.01.2025, juntando documentos comprovativos pugnando pela total improcedência dos embargos, pois a prescrição se interrompeu com a propositura do processo n.º ..., que correu termos neste mesmo Juízo de Execução do Porto – Juiz 6 e no mais impugnando tudo o alegado. Reproduzem-se, por revelarem para a decisão a proferir, segmentos da contestação na parte em que exequente-embargada toma posição sobre a exceção da prescrição do crédito arguida pelo co – executado e embargante nestes autos: “30º.Quanto à exigibilidade da dívida exequenda, conforme decorre do documento complementar da escritura já junta com o requerimento executivo, por acordo das partes, ficou clausulado (13.ª al.c)) quea Banco 1... poderia considerar antecipadamentevencida toda a dívida eexigiroseu imediato pagamento no caso de oneração do bem dado em garantia da obrigação emergente do contrato. 31º.O imóvel dado em garantia foi penhorado em 29/03/2012 no âmbito do processo n.º..., onde é Exequente Banco 2... (Portugal ), S.A. e são Executado AA (aqui embargante) e BB. 32º.A Banco 1..., S.A., perante a penhora operada, considerou a dívida antecipadamente vencida. 33º.A Banco 1..., S.A foi citada em 28/03/2012, na qualidade de credora com garantia real, para reclamar o seu crédito. 34º.Em 23/04/2012 a Banco 1..., S.A. reclamou três créditos no valor total de 152.871,25€, tendo peticionado, por conta da obrigação aqui executada, o pagamento de € 40.343,72 a título de capital, conforme reclamação de créditos já junta como documento n.º 2. 35º.A garantia foi vendida a terceiro por € 100.000,00 (cem mil euros), tendo a Banco 1..., S.A., na qualidade de credora reclamante, recebido a quantia de € 91.292,46 (noventa e um mil duzentos e noventa e dois euros e quarenta e seis cêntimos), cfr. documento n.º 3 e n.º 4, que se juntam e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido. 36º.Do produto da venda a Banco 1... aplicou à dívida dada à Execução € 4.770,62. O valor em questão foi todo aplicado ao capital. 37º.Assim sendo, permanece em dívida a título de capital, conforme peticionado no requerimento executivo, € 35.573,10 (trinta e cinco mil quinhentos e setenta e sete euros e dez cêntimos), sobre o qual foram calculados juros desde a aplicação do pagamento até à entrada da acção executiva (09/09/2024).(…) “41ºQuanto à questão da falta de interpelação do fiador, cumpre dizer que, conforme decorre dos termos do artigo 780.º n.º 1 do Código Civil, há perda do benefício do prazo sempre que, por causa imputável ao devedor, diminuírem as garantias do crédito. 42º. A oneração por penhora registada sobre o imóvel, garantia real constituída a favor do crédito exequendo, representou uma diminuição de garantias do banco e, como tal, assiste-lhe o direito de exigir o cumprimento imediato da obrigação. 43º. Quando a Banco 1..., S.A. em 23 de Abril de 2012 reclama os créditos no âmbito do processo n.º... e exige o cumprimento imediato da obrigação não havia prestações em dívida. O documento n.º 7 anexo à reclamação de crédito comprova-o, quando, quanto ao crédito agora dado à execução refere que a data da última prestação paga é 16/04/2012. (…) A embargada exequente juntou com a contestação documentos comprovativos do processo n.º..., onde é Exequente Banco 2... (Portugal ), S.A. e são Executado AA (aqui embargante) e BB, incluindo das citações e notificações dos executados e da notificações feitas ao ora embargante-recorrente.” 4.O embargante foi notificado da contestação e não se pronunciou quanto aos documentos juntos. 4. Findos os articulados, no dia 06.03.2025 o tribunal a quo, exarou despacho pelo qual, determinou a notificação das partes para declararem expressamente se aceitam a dispensa da audiência prévia, e, querendo, se pronunciarem por escrito. Mais se exarou que caso algum das partes se oponha ou nada diga será agendada audiência prévia. 5. E nos dias 19.03.2025e 20.03.2025, as partes, por requerimento, declararam por escrito aceitarem a dispensa da audiência prévia, tendo o autor aproveitado para declarar que impugnava toda a documentação junta pela embargada na contestação. 6. De seguida no dia 02.04.2025 foi proferido despacho saneador -sentença, que, conhecendo do mérito da causa, julgou improcedentes os embargos, sendo que na sentença recorrida, foram apreciadas e decididas as seguintes questões: I. Ineptidão do requerimento executivo; II. Inexigibilidade da obrigação exequenda, por prescrição; III. Perda do benefício do prazo; IV. Benefício da excussão prévia. V. Liquidação da obrigação exequenda, VI. Cálculo dos juros; VII. Litigância de má-fé por parte da exequente. 6. Inconformado o embargante apelou e concluiu nos termos aqui reproduzidos: A. A alegada citação que foi enviada, no âmbito do processo n.º ..., foi enviada para a morada Pct ..., ..., 2.º dto, ... Vila Nova de Gaia, nunca tendo sido recebida pelo Recorrente, que desconhecia completamente dos trâmites do processo. B. No âmbito de tal processo n.º ... (que visava a cobrança de uma letra de câmbio, que nada tem a ver com os valores agora em causa a ser exigidos na presente acção executiva), tendo sido penhorado o imóvel que havia sido hipotecado, foi a Banco 1... notificada para reclamar os seus créditos, o que fez, pelo que é entendimento geral que somente a notificação para a impugnação dos créditos reclamados pela Banco 1... seria viável para fazer interromper o prazo prescricional em curso. C. Somente com a apresentação de tal reclamação de créditos, o credor manifestava a sua vontade expressa de reaver os valores mutuados, pois a acção executiva principal em nada tinha a ver com tal vontade, e como tal, somente a notificação válida do Recorrente para o apenso de reclamação de créditos constituiria motivo para interrupção do prazo de prescrição da dívida. D. Sucede que, o Recorrente nunca foi notificado de tal reclamação de créditos, por se encontrar a residir no Luxemburgo desde setembro de 2011, pelo que, não se pode considerar que quanto ao ora Recorrente, o prazo prescricional tenha sido interrompido aquando da notificação para impugnação da reclamação de créditos, pois tal notificação nunca foi recebida. E. Neste sentido veja-se o entendimento do STJ, vertido no Código Civil Anotado, Abílio Neto, Edição de abril 2018, pág. 263, ponto 30, “A interrupção da prescrição nos termos do art. 323.º n.º 1, do CC, supõe que, embora mais tarde, a citação ou notificação veio a ter efectivamente lugar, pois de contrário o processo passa à margem do réu. “ F. No presente caso foi precisamente isso que aconteceu, o processo passou completamente à margem do Recorrente, sem que tenha sido citado ou notificado de qualquer diligência ou peça processual, não se podendo considerar que o prazo de prescrição tenha sido interrompido, uma vez que, perante o ora Recorrente, o credor nuca manifestou a vontade expressa de exigir o seu crédito. . Se assim não se entender, e subsidiariamente, assumindo que o prazo de prescrição interrompeu com a notificação (não recebida) do Recorrente para impugnação da reclamação de créditos apresentada pela Banco 1..., sempre se refira que, o prazo prescricional começou a contar desde o momento em que o credor recebeu o valor que lhe cabia com a venda do imóvel hipotecado, uma vez que, enquanto credor hipotecário, a sua intervenção processual terminou com a venda. H. Ainda que na acção principal tivessem sido penhorados mais bens, nunca o credor hipotecário receberia qualquer valor pela penhora dos mesmos, esgotando-se a sua intervenção a partir do momento em que o imóvel foi vendido e o credor recebeu o valor que lhe competia, devendo o prazo prescricional iniciar a sua contagem a partir de tal momento, ou seja, a partir de 13/03/2017. I.No que toca à questão da ineptidão da petição inicial, refere a douta Sentença recorrida que “(…) basta uma leitura atenta do contrato dado à execução e da obrigação pecuniária que dele resultou para se concluir que do mesmo resulta, de forma expressa e objectiva, com recurso a mera operação aritmética, que os executados reconhecem a obrigação pecuniária perante a exequente, cujo montante é determinável por simples cálculo aritmético, de acordo com as cláusulas nele exaradas. Nada mais precisa a exequente de alegar. A exequente tem que alegar os factos constitutivos do seu direito (…)”. J.Não podemos concordar com tal decisão, uma vez que a simples menção da existência de um contrato de mútuo que o Recorrente tem conhecimento, porque o assinou, não é suficiente para que o Recorrente possa entender o valor peticionado, uma vez que a quantia exequenda não resulta de um simples cálculo aritmético, possível de fazer através da mera leitura do contrato de mútuo. O valor da divida peticionado pela Recorrida, acrescido de juros, não se encontra fundamentado em qualquer documento junto com a petição inicial. K. Em momento algum, no requerimento executivo, a Recorrida indica o processo de cálculo por si utilizado para suster a quantia em dívida, nomeadamente, (1)data da última prestação paga, (2) valor da dívida à data do vencimento da mesma, (3) valor reclamado na acção executiva anterior onde foi penhorado o imóvel, (4) valor de venda do imóvel, (5) valor recebido pela Recorrida do seguimento desse processo executivo, (6) valor remanescente em dívida, a título de capital, após tal recebimento, informação sobre algum pagamento subsequente após (7) recebimento de valores no âmbito de tal processo executivo. L.O cálculo usado pela Recorrida não depende de mero cálculo aritmético, nem sequer é minimamente perceptível através da documentação junta pela mesma, tornando a petição inicial completamente inepta. M. Para que a Recorrida se arrogue credora do valor em causa tem que, em primeiro lugar, demonstrar o incumprimento da prestação, e em segundo lugar comprovar que, efectivamente, executou a garantia hipotecária, e qual foi o valor pelo qual o imóvel foi vendido ou adjudicado, tendo ainda a obrigação de demonstrar de que forma tal valor foi incorporado na quantia exequenda (abatido a capital e juros), o que não faz em lugar algum do seu requerimento executivo. N. A Recorrida limita-se a alegar um valor em dívida a título de capital, que remanesceu após a execução da garantia bancária, sem juntar qualquer documentação suporte, o que é inconcebível, principalmente tendo em conta que o Recorrente – que apenas era fiador – não teve qualquer intervenção processual no processo de venda do imóvel, por nunca ter sido regularmente citado. O. A este propósito, leia-se o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 18/10/2016, no âmbito do processo n.º 203848/14.2YIPRCT.C1, disponível em www.dgsi.pt: “IV - Em ação em que o pedido é o pagamento de quantia referente ao incumprimento de um contrato de mútuo ou de aluguer de veículo sem condutor ou semelhante, a autora terá de alegar e provar os termos do contrato, nomeadamente o montante mutuado, o montante das prestações devidas e seu prazo de vencimento e bem assim, a data da mora e incumprimento definitivo e de onde decorre o valor que peticiona, se só de juros e capital se de outra origem, concretizando-a nesse caso.” P. A ora Recorrida A..., S.A., remeteu uma carta dirigida ao Recorrente, informando da cessão de créditos, para a morada Rua ..., ..., ... Vila Nova de Gaia, novamente, morada onde o mesmo não residia – reside no estrangeiro – mais uma vez, nunca tendo recebido tal carta. Q. Ora, o que é certo é que o ora Recorrente nunca recebeu nenhuma das cartas mencionadas, tendo completo desconhecimento dos trâmites do processo n.º ... e, consequentemente, desconhecendo o que terá acontecido com o imóvel, propriedade da co-Executada, desconhecendo se o mesmo teria sido vendido ou adjudicado, e por que valor, desconhecendo igualmente o montante que a Credora teria recebido de tal negócio. R. Sendo o Recorrente apenas o fiador, é essencial que no requerimento executivo, seja descrito o raciocínio que leva ao apuramento dos valores que consubstanciam a quantia exequenda, o que não foi feito pela Recorrida, nem tampouco foi junta qualquer documentação que demonstrasse tal cálculo. S. Entende a douta sentença que “No entanto, no caso dos autos, afigura-se que tal interpelação se tem que considerar feita, se não por via da carta referida em 9.º, pois a mesma não foi enviada para o domicílio efectivo, nem para o electivo, do embargante, mas por via da notificação do embargante para a reclamação de créditos, já sobejamente debatida.” Sucede que, também esta notificação para a reclamação de créditos, não foi enviada para o domicílio efectivo do Recorrente, que nunca recebeu a mesma, uma vez que se encontrava a residir no estrangeiro, com reside até ao presente. T.O Recorrido encontra-se a residir no Luxemburgo – onde foi citado para a presente acção executiva – desde Setembro de 2011, sendo que uma mera pesquisa às bases de dados – como foi feita para a presente acção executiva – seria suficiente para aferir a morada do Recorrente. U. Com o devido respeito, não podemos concordar com a fundamentação usada na douta Sentença, no sentido de que “(…) resulta do antecedente processo executivo a inexistência de bens (…) e o próprio embargante, notificado para esse efeito, não indicou bens à penhora (…)”. Desde logo porque, como já foi amplamente referido anteriormente, o Recorrente nunca recebeu qualquer notificação do processo executivo referido, uma vez que se encontra a residir no Luxemburgo já desde setembro de 2011; por outro lado, o facto de não existirem bens em 2022, não significa que, de momento, não existam. V. No contrato de mútuo em que o Executado figura como fiador, nunca este renunciou ao benefício da excussão prévia, como tal, para que possa ser Executado, tem o Exequente que demonstrar ter excutido todos os bens do devedor principal, sem obter satisfação do seu crédito. Prejudicado -e principal pagador W. Excussão prévia O Recorrido junta comprovativos de pesquisas feitas na base de dados da Autoridade Tributária, Segurança Social, e Banco 1... Geral de Aposentações, relativamente à esfera jurídica da devedora principal, mas nenhuma pesquisa foi feita ao nível de Registo Automóvel, Conservatória do Registo Predial, Instituições Bancárias, entre outros. As meras pesquisas efectuadas, não são susceptíveis de demonstrar que foi feita a excussão prévia dos bens da devedora principal, pelo que é inexigível a quantia exequenda, quanto ao ora Recorrente. Nestes termos, e nos que V. Ex.as muito doutamente suprirão, Deve ser dado provimento ao recurso, e em consequência revogada a decisão recorrida e substituída por outra que considere provadas as excepções invocada se, consequentemente declare extinta a execução quanto ao Recorrente. 7. Foi apresentada resposta. 8. No dia 08.10.2025 a relatora proferiu o seguinte despacho: “Analisada a sentença recorrida, o recurso interposto e as contra-alegações, afigura-se-me indispensável para apreciação das questões recursórias aceder ao processo n.º ..., que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto- Juízo de Execução do Porto - Juiz 6. Assim, solicite autorização para acompanhamento electrónico desses autos.” 9. Foi concedida autorização para o acompanhamento daqueles autos acima indicados, a efetuar-se através do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais 10. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. II.DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO. Nas conclusões recursórias o recorrente, suscita questões relativas ao mérito da sentença recorrida, designadamente: 1.Alega, sem impugnar a decisão sobre a questão-de-facto, que nunca foi notificado da reclamação de créditos apresentada pela Banco 1... nos autos de execução nº processo n.º .... 2. Defende que ainda que na acção principal tivessem sido penhorados mais bens, nunca o credor hipotecário receberia qualquer valor pela penhora dos mesmos, esgotando-se a sua intervenção a partir do momento em que o imóvel foi vendido e o credor recebeu o valor que lhe competia, devendo o prazo prescricional iniciar a sua contagem a partir de tal momento, ou seja, a partir de 13/03/2017. 3.Ineptidão do requerimento executivo. 4. Falta de excussão prévia dos bens. III. FUNDAMENTAÇÃO. 3.1.Na primeira instância, com fundamento no acordo e na consulta do processo n.º ..., que correu termos no mesmo Juízo de Execução do Porto – Juiz 6, foram julgados provados os seguintes A. FACTOS: 1.No dia 16-11-2007 compareceram perante o Sr. Notário CC, DD, na qualidade de procurador da Banco 1..., S.A. e AA, tendo a Banco 1..., S.A. declarado emprestar a BB a quantia de 44.000,00€, cujo reembolso seria efetuado acrescido de juros nos termos do documento complementar anexo, em 27 anos, em prestações mensais e sucessivas de capital e juros até à taxa de 8,246% acrescida, em caso de mora de uma sobretaxa até 4% a título de cláusula penal. 2.Mais declarou BB que para garantia dos capitais mutuados, respectivos juros e despesas, constituía hipoteca sobre a fração autónoma designada pelas letras “AC”, correspondente a habitação tipo T3, no Rés-do-chão assinalado com o nº ..., com garagem e arrumos na cave, assinalado com o nº ... do prédio urbano sito na Rua ..., ..., freguesia ..., Concelho de V. N. Gaia, inscrito na matriz sob o artigo ...- AC, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de V. N. Gaia sob o nº ..., e aí registada pela apresentação: AP. ... de 2007/10/30. 3.O embargante declarou nessa escritura que residia na mesma morada, Rua ..., ..., V. N. Gaia. 4.Acordaram ainda no documento complementar, para além de estipulações sobre a forma de disponibilização do capital e do seu reembolso, assim como sobre o cálculo de juros e de comunicações entre as partes e que aqui por brevidade se dão por integradas, que: 5.Ainda na mesma escritura, AA declarou «Que se responsabiliza como fiador e principal pagador por tudo quanto venha a ser devido à Banco 1... credora em consequência do empréstimo aqui titulado dando, desde já, o seu acordo a quaisquer modificações de taxa de juro e bem assim às alterações de prazo ou moratórias que venham a ser convencionadas entre a credora e a parte devedora e aceitando que a estipulação relativa ao extracto de conta e aos documentos de débito seja também aplicável à fiança.» 6.A A..., S.A. é uma sociedade de responsabilidade limitada portuguesa constituída ao abrigo das leis de Portugal como sociedade de titularização de créditos e registada como tal na Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, com sede na Avenida ..., n.º ... – 5.º andar, Lisboa, com o número único de pessoa coletiva e de registo .... 7.Por acordo escrito denominado «Contrato de Cessão de Créditos», outorgado em 20 de dezembro de 2019, a Banco 1..., S.A., declarou ceder a B..., SARL uma carteira de créditos, bem como todas as garantias a eles inerentes, incluindo o crédito emergente da escritura supra identificada. 8.Por acordo escrito denominado «contrato de cessão» outorgado em 03/04/2020 e aditado em 31/03/2021 e em 14/07/2023, a B..., S.A.R.L. declarou ceder à ora Exequente a carteira de créditos que lhe havia sido cedida pela Banco 1..., S.A., bem como todas as garantias a eles inerentes, incluindo os créditos que aquela instituição bancária detinha sobre os ora Executados. 9.A ora embargada/exequente remeteu ao embargante uma carta registada com AR, remetida para a Rua ..., ... ... Vila Nova de Gaia com o seguinte teor: «Na qualidade de mandatários da A..., S.A. vimos pela presente informar que, por efeito do contrato de cessão de créditos datado de 20 de dezembro de 2019, a B..., SARL adquiriu à Banco 1..., S.A. o crédito proveniente do incumprimento do(s) contrato(s) acima mencionado(s). Sucede que, por contrato de cessão outorgado em 03/04/2020, aditado em 31/03/2021 e em 14/07/2023, a B..., S.A.R.L. cedeu à nossa Constituinte a carteira de créditos que lhe havia sido cedida pela Banco 1..., S.A. e Banco 1... Leasing e Factoring – Sociedade Financeira de Crédito, S.A., bem como todas as garantias a eles inerentes. Por conta do(s) referido(s) contrato(s), o valor em dívida ascende, na presente data, ao montante de € 58.782,79 (cinquenta e oito mil, setecentos e oitenta e dois euros e setenta e nove cêntimos), conforme infra se discrimina: Contrato nº ...: − Capital: € 35.573,10; − Juros vencidos: € 23.209,69. Assim, servimo-nos da presente missiva para informar que nos incumbiu a nossa Constituinte de promover as diligências necessárias à cobrança do crédito, designadamente através da instauração da competente ação executiva. Deste modo, no prazo máximo de 10 (dez) dias, deverá proceder ao contacto imediato por telefone para o n.º ..., por carta para a morada em rodapé ou por e-mail para ..........@....., podendo, ainda, proceder ao pagamento do valor em dívida por depósito ou transferência bancária para o IBAN ... – Banco 3..., identificando a operação com a n/ ref.ª interna Banco 1...-... para permitir a correta alocação ao vosso processo. Findo o referido prazo, sem que tenhamos rececionado um contacto ou o pagamento, seremos forçados a, sem mais, proceder em conformidade com os interesses da A..., S.A.». 10.A carta foi devolvida ao remetente, com a menção “não reclamada”. 11.No dia 24 de Maio de 2011 o Banco 2... (Portugal) S.A. instaurou uma Execução Comum (Sol.Execução) contra BB e AA, com vista à cobrança do montante de 6.987,62 €, com base em Letra de câmbio. 12.Esse processo correu termos com o nº ... pelo Juízo de Execução do extinto Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, tendo posteriormente transitado para este Juízo de Execução do Porto - Juiz 6. 13.Nessa acção executiva foi penhorada, no dia 2012/01/24 a fracção hipotecada supra descrita em 2º, tendo a Banco 1..., S.A. sido citada para reclamar créditos em 2 de Abril de 2012. 14.O ora embargante foi citado no âmbito dessa acção executiva por via postal registada com AR no dia 18/01/2013, na morada sita em Pct ..., ... - 2º DTO ... VILA NOVA DE GAIA. 15.A Banco 1..., S.A. deduziu reclamação de créditos, por apenso à sobredita acção executiva, aí reclamando o crédito de 152.871,25€ correspondente a capital, que se reporta a três contratos de mútuo celebrados pelos executados, garantidos por hipotecas constituídas a favor do reclamante sobre o prédio objecto de penhora nos referidos autos sendo dois contratos de mútuo celebrados em 10/2/2000 garantidos pelas hipotecas registadas em 11/11/1999 (ap. ... e ...) e o crédito reclamado com referência ao contrato de mútuo celebrado em 16/11/2007 garantido pela hipoteca registada em 30/10/2007. 16.Juntou à petição inicial (documento nº 7) um extrato emitido pela Banco 1..., S.A., do qual resulta que, à data de 23-04-2012, o montante em dívida relativamente à operação descrita supra em 1º era de €40.343,72. 17.Quando a Banco 1..., S.A. em 23 de Abril de 2012 reclama os créditos no âmbito do processo n.º ... e exige o cumprimento imediato da obrigação não havia prestações em dívida. 18.A data da última prestação paga é 16/04/2012. 19.O ora embargante AA foi notificado para impugnar o crédito reclamado em 21-05-2014. 20.No dia 27 de Junho de 2014 foi nesse apenso de reclamação de créditos proferida sentença, já transitada em julgado, que a final, decidiu: «Pelo exposto, julgo verificado o crédito reclamado e graduo-o da seguinte forma: 1.º - Os créditos hipotecários reclamados pela “Banco 1..., S.A.” com referência aos contratos de mútuo celebrados em 10/2/2000, até aos montantes máximos assegurados pelas hipotecas constituídas e registadas em 11/11/1999, concorrendo entre si na proporção dos respectivos créditos; 2.º - O crédito hipotecário reclamado pela “Banco 1..., S.A.” com referência aos contratos de mútuo celebrado em 16/2/2007, até ao montante máximo assegurado pela hipoteca constituída e registada em 30/10/2007; 3.º - A quantia exequenda.». 21.No dia 13 de Março de 2017, perante a Sr.ª Notária EE, compareceram FF, em representação do Sr. Agente de Execução, GG e a proponente HH, outorgando escritura de compra e venda judicial, e que incide sobre a fração autónoma designada pelas letras AC, destinada a habitação, do prédio urbano sito Av./Rua/Praça: RUA ..., ... Lugar: ... Código Postal: ... ... VNG, Andar/Divisão: Rés-do-chão assinalado com o nº ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, descrita na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o ... - AC, inscrita na respetiva matriz predial sob o artigo U - ... - AC, da referida freguesia, que foi vendido à proponente, pelo preço de € 100.000,00 (cem mil euros), no âmbito da venda por negociação particular levada a cabo naqueles autos. 22.O Sr. Agente de Execução naqueles autos pagou à Banco 1..., S.A. os montantes de 50.000,00 € (cinquenta mil euros) e 41.292,46 € (quarenta e um mil duzentos e noventa e dois euros e quarenta e seis cêntimos) no dia 30-03-2017. 23.Do produto da venda a Banco 1... aplicou à dívida dada à Execução € 4.770,62, totalmente imputado ao capital, que ficou reduzido ao montante de € 35.573,10 (trinta e cinco mil quinhentos e setenta e sete euros e dez cêntimos). 24.A acção executiva nº ... foi extinta em 29-11-2022, por inexistência de bens penhoráveis. 25.A presente execução deu entrada em juízo em 17-09-2024. 26.O embargante foi citado para a execução de que estes autos dependem no dia 26-10-2024, na morada sita em RUE ... – LUXEMBURGO. B.Ao abrigo do disposto no art 607º, nº4 do CPC, aplicável aos tribunais da Relação, ex vi, nº2, art 663º CPC, com base nos documentos juntos ao requerimento executivo, julgamos provados os seguintes factos: Resulta da escritura pública de Mútuo com Hipoteca e Fiança celebrada em 16-11-2007 que as partes outorgantes acordaram entre o mais, no seguinte: Claúsula 13ª do documento complementar denominada “ Incumprimento- Exigibilidade Antecipada” “ 1.A Banco 1... poderá considerar antecipadamente vencida toda a dívida e exigir o seu pagamento imediato no caso de, designadamente: a) Incumprimento pela parte devedora ou… de qualquer obrigação decorrente deste contrato; b) (…) c) Venda, permuta, (…) ou qualquer outra forma de oneração, sem prévio acordo escrito da Banco 1..., dos bens que sejam … dados em garantia das obrigações emergentes do contrato (… ) d) Propositura contra a parte devedora de qualquer execução, arresto, … que implique limitação da livre disponibilidade dos seus bens; (…). 3.2 DO MÉRITO DA SENTENÇA: Assinalamos, antes de mais, que este tribunal de recurso deve observar na apreciação das questões colocadas uma ordem de precedência lógica e jurídica, a saber: . .ineptidão do requerimento executivo. . da alegação, sem impugnar a decisão sobre a questão-de-facto, que nunca foi notificado da reclamação de créditos apresentada pela Banco 1... nos autos de execução nº processo n.º .... .da alegada prescrição da dívida; . alegação de que ainda que na acção principal tivessem sido penhorados mais bens, nunca o credor hipotecário receberia qualquer valor pela penhora dos mesmos, esgotando-se a sua intervenção a partir do momento em que o imóvel foi vendido e o credor recebeu o valor que lhe competia, devendo o prazo prescricional iniciar a sua contagem a partir de tal momento, ou seja, a partir de 13/03/2017. . falta de excussão prévia dos bens. 3.2.1 Da alegada ineptidão do requerimento executivo, diremos o seguinte: Nos termos do art. 186º nº 2 al. a) do Código de Processo Civil “diz-se inepta a petição, quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir”. A revelar que importa apreciar e verificar se no requerimento inicial, o embargado mencionou, ou não, os factos determinantes da causa de pedir ou seja, o facto jurídico de onde emerge o direito do autor e que fundamenta, portanto, a sua pretensão. Os factos alegados no requerimento executivo são aqueles acima reproduzidos. Por sua vez, dispõe o art. 724º, nº 1, al. e) do Código de Processo Civil: 1 - No requerimento executivo, dirigido ao tribunal de execução, o exequente: (…)e) Expõe sucintamente os factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo, podendo ainda alegar os factos que fundamentam a comunicabilidade da dívida constante de título assinado apenas por um dos cônjuges; Posto isto, afigura-se-me que a exequente respeitou esse comando normativo na medida em que na dita peça processual alegou, de forma sucinta, os factos respeitantes ao contrato dado à execução, invocando a sua celebração, as obrigações que dele decorreram para os executados. Assim, a Exequente alega estar em dívida um determinado valor a título de capital, sendo que tal resultará do facto de ter sido, executada noutra execução instaurada contra os mesmos executados e com base em título distinto, a garantia hipotecária, ficando como remanescente em dívida o valor referido pela Exequente. Por outro lado, basta uma leitura atenta da alegacão vertida no requerimento executivo conjugada com a leitura do contrato dado à execução que a exequente alega de forma sucinta e inteligível a obrigação pecuniária que dele resultou para o executado-embargante, na qualidade de fiador, sem prejuízo de a final se apurar que essa obrigação não era devida nos termos vertidos no requerimento inicial. Assim, de forma expressa e objectiva, indicando os valores liquidados, a exequente indica o valor da obrigação pecuniária que vincula os executados perante a exequente, cujo montante é determinável por simples cálculo aritmético, de acordo com as cláusulas nele exaradas. E nada mais precisa a exequente de alegar. Acresce que resulta da petição de embargos que o co-executado, ora embargante e recorrente, percebeu que no caso concreto, está em causa uma obrigação de reembolso de dívida que foi objecto de um plano de amortização, composto por diversas quotas, que compreendem uma parcela de capital e outra de juros e que traduzem a existência de várias prestações periódicas, com prazos de vencimento autónomos, conforme artigo 12 º-da petição inicial. De resto, logo à cabeça o embargante excecionou a prescrição da obrigação exequenda, alegando: “Assim, alegando o Exequente que o incumprimento ocorreu em 2016 – sem que para tal junte qualquer prova ou documento comprovativo – certo é que decorreram mais de cinco anos desde tal data, encontrando-se a totalidade da dívida exequenda prescrita, devendo a instância ser considerada extinta, o que expressamente se requer., conforme artigo 15º da petição de embargos.” Todavia, sempre se dirá, que o requerimento inicial poderia ser mais rico alegando o exequente que efectivamente foi executada a garantia hipotecária e qual foi o valor pelo qual o imóvel foi vendido ou adjudicado. Todavia, trata-se de uma deficiência de alegação de factos que não compromete, de todo, a inteligibilidade do requerimento executivo. De modo algum se poderá afirmar que a origem do crédito e sua definição se encontram subtraídos do requerimento executivo. Só a falta total (e já não a escassez) ou a ininteligibilidade da causa de pedir é que geram a ineptidão da petição inicial. Assim, concluímos que não se verifica a alegada ininteligibilidade do requerimento executivo suscetível de implicar a ineptidão do mesmo. Pelo que não existe qualquer ineptidão. Improcede, assim, nesta parte o recurso. 3.2.2. Resumo da factualidade julgada provada. 1.Dos fatos provados resulta que através de escritura pública celebrada a 16.11.2017 a Banco 1...,, SA, emprestou a BB €44.000, a 27 anos, em prestações mensais de capital e juros, taxa 8,246%, com sobretaxa até 4% em mora. Nesse contrato de mútuo foi constituída hipoteca sobre a fração “AC” (T3, R/C n.º 02, com garagem e arrumos n.º 1) do prédio sito na Rua ..., ..., V. N. Gaia, com os registos prediais e matriciais indicados. Na escritura outorgou também o co-executado- embargante AA, vinculando-se como fiador e principal pagador, declarou residir na mesma morada do imóvel hipotecado, aceitando futuras alterações de taxa, prazo ou moratórias e a aplicação do regime de extrato de conta à fiança. No documento complementar que integra o contrato de mutuo as partes estipularam uma Cláusula 13.ª (exigibilidade antecipada), a qual prevê o vencimento antecipado em casos como incumprimento, oneração/venda do bem dado em garantia sem acordo da Banco 1..., ou propositura de execução/arresto que limite a livre disposição de bens. A 20-12-2019 a Banco 1... cedeu uma carteira de créditos à B..., Sàrl, incluindo o crédito deste mútuo e respetivas garantias. Em 03-04-2020 a B..., Sàrl cedeu essa carteira à A..., S.A. (ora exequente), sociedade de titularização registada na CMVM (NIPC ...). A exequente enviou carta registada com AR ao embargante, comunicando a cadeia de cessões, exigindo o pagamento e discriminando o valor então em dívida (€58.782,79 = capital €35.573,10 + juros vencidos €23.209,69), com instruções de contacto/pagamento. Essa carta foi devolvida, com a menção “não reclamada”. Numa Execução anterior à qual foi apensada reclamação de créditos (proc. ...) em 24-05-2011º o Banco 2... (Portugal) S.A. instaurou execução contra BB e AA (€6.987,62) – proc. .... E no dia 24-01-2012 foi feita a Penhora da fração hipotecada. A 02-04-2012 a Banco 1... citada para reclamar créditos. A 18-01-2013 o Embargante foi citado nessa execução (via postal, AR). Na Reclamação da Banco 1... reclamou €152.871,25 (três mútuos, incluindo o de 2007, com hipotecas correspondentes), sendo que à data que em 23-04-2012 a dívida da operação de 2007 era €40.343,72. Em 23-04-2012, quando a Banco 1... reclamou e exigiu cumprimento imediato, não havia prestações em atraso, sendo que a última prestação foi paga em 16-04-2012. A 21-05-2014 o embargante, co – executado AA foi notificado para impugnar a reclamação. No dia 27-06-2014 foi proferida Sentença no apenso de reclamação de créditos e os créditos da Banco 1... foram verificados e graduados (incluindo o relativo ao contrato de 2007). No dia 30.03.2017 foi feita a Venda judicial da fração “AC” por €100.000imóvel A 30-03-2017 o Agente de Execução entregou à Banco 1... €50.000 e €41.292,46. Imputação: a Banco 1... imputou €4.770,62 ao capital deste contrato, ficando o capital remanescente em €35.573,10. Andamento processual posterior e nova execução No dia 29-11-2022 foi extinta a execução n.º ... por inexistência de bens penhoráveis. No dia 17-09-2024 ocorreu a entrada da presente execução. No dia 26-10-2024 o embargante foi citado na morada 4, RUE ..., Luxemburg. 3.2.3.Da Inexigibilidade da obrigação exequenda, por prescrição. A. Porque o embargante-co executado e recorrente outorgou na escritura pública de mútuo e hipoteca na qualidade de fiador e principal pagador urge tecer as seguintes considerações sobre a fiança: Antes de mais, por uma questão de precedência lógica urge afirmar que o ora recorrente, que é embargante e co executado nos autos principais, outorgou o contrato de mútuo com hipoteca que constitui o título executivo dado à execução, na qualidade de “ fiador e principal pagador” Dispõe o artigo 627º, n.º 1, do C.C., que o fiador garante a satisfação do direito de crédito, ficando pessoalmente obrigado perante o credor. A fiança constitui, pois, uma garantia pessoal das obrigações, passando o património de um terceiro – o fiador – a responder, cumulativamente com o património do devedor, pelo pagamento da dívida; carateriza-se pela acessoriedade e subsidiariedade. A responsabilidade do fiador abrange todo o seu património, embora possa limitar-se a alguns dos bens que o integram, desde que tal limitação resulte de convenção entre as partes, nos termos do artigo 602.º do Código Civil. E resulta do disposto no artigo 634.º do mesmo diploma legal, que a fiança tem o conteúdo da obrigação principal e cobre as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do devedor. A significar que a responsabilidade do fiador, salvo estipulação em contrário (artigo 631.º, n.º 1 do CC), se molda pela do devedor principal e abrange tudo aquilo a que ele está obrigado, não só a prestação devida, mas também a reparação dos danos resultantes do incumprimento culposo ou a pena convencional que porventura se haja estabelecido (artigos 798.º e 810º do CC). São, assim, características fundamentais da fiança, a acessoriedade e a subsidiariedade. A acessoriedade reporta-se à questão da necessidade da interpelação do devedor original e da interpelação do fiador respeita a uma fase prévia, respeitante ao vencimento da obrigação principal e ao momento a partir do qual é exigível a obrigação do fiador. Com efeito, a natureza acessória da fiança – expressa pelo princípio acessorium sequitur principale – resulta expressamente do preceituado no artigo 627º, nº 2, do C.C., e tem importantes consequências que se refletem no seu regime jurídico. Assim, quanto à sua forma, exige a lei que a vontade de prestar fiança seja expressamente declarada pela forma exigida para a obrigação principal; quanto ao conteúdo da obrigação, impõe-se que ela não possa ser constituída de forma mais onerosa do que a dívida garantida; no que concerne à sua validade e extinção, determina-se que a fiança acompanha quer a invalidade, quer a extinção da obrigação principal; e, no que toca aos meios de defesa, preceitua-se que o fiador pode invocar perante o credor os meios de defesa do afiançado – artigos 628º, nº 1, 631º, nº 1, 632º, 651º e 637º, todos do C.C. E no tocante à acessoriedade, importa referir que a acessoriedade da fiança, prevista no nº2 do artigo 627º, sua caraterística fundamental, significa que o fiador assume uma obrigação (acessória) de garantia, perante o credor, de que a obrigação (principal) do devedor será cumprida. A fiança tem o conteúdo da obrigação principal e cobre as consequências legais e contratuais da mora ou culpa do devedor” – art. 634º do Código Civil. Já a declaração de que “se constituiu fiador e principal pagador”, não acarreta qualquer renúncia ao benefício do prazo de pagamento das prestações ou o afastamento do disposto no art.782º do CC, sendo inócua para o efeito. A subsidiariedade reporta-se à uma fase de cobrança da dívida e concretiza-se através do benefício de excussão, que se traduz, conforme resulta do nº 1 do artigo 638º do C.C., no direito que assiste ao fiador, de recusar o cumprimento, enquanto não estiverem excutidos todos os bens do devedor principal, muito embora este benefício seja renunciável, nos termos do n.º 1 do artigo 640.º do Código Civil. Sob a epígrafe “Dívida liquidável em prestações”, dispõe o artigo 781.º do Código Civil, que: Se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas. Assim, o artigo 781º do C.C., ao determinar o vencimento imediato das restantes prestações, deve ser interpretado no sentido de que o inadimplemento do devedor gera o direito do credor de exigir dele a satisfação daquelas prestações, e não, no sentido de que o não pagamento de uma das prestações no prazo acordado, determina, por si só, a entrada em mora do devedor quanto ao cumprimento das demais.[1] A revelar que no artigo 781º do CPC se confundem os conceitos de exigibilidade e de vencimento o que tem levado a doutrina e a jurisprudência a fazer interpretação correctiva, sendo que o credor deve dispor da faculdade de exigir o pagamento imediato de todas as prestações em falta, interpelando o devedor, e da faculdade de não exigir.[2] É que o vencimento de tais prestações é um benefício concedido por lei ao credor que, querendo aproveitar-se dele, deverá manifestar a sua vontade nesse sentido, interpelando o devedor para cumprir imediatamente a totalidade da obrigação. Em consequência, do imediato vencimento das prestações futuras, previsto no artigo 781.º do CC, não decorre automaticamente a entrada em mora do devedor relativamente a tais prestações, revelando-se necessária a sua prévia interpelação, carecendo a exigência de pagamento de todas as prestações assim vencidas, de interpelação. Mais. A perda do benefício do prazo de pagamento de obrigações a prestações emergente do não pagamento de uma delas não vale quanto ao fiador. E não é automático, carecendo a exigência de pagamento de todas as prestações assim vencidas, de interpelação, nos precisos termos do citado artigo 782.º do Código Civil Assim, o artigo 782.º do C.C., prevê excepções ao regime geral consagrado no citado artigo 781º ao estatuir: A perda do benefício do prazo não se estende aos co-obrigados do devedor, nem a terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia. Significa assim, que a perda do benefício do prazo que se traduz no facto de a lei consentir que em determinadas circunstâncias o credor possa exigir antecipadamente o cumprimento da obrigação, apesar de o devedor ser beneficiário exclusivo ou conjunto do prazo estipulado, não é extensiva aos garantes da obrigação, nos precisos termos do citado artigo 782.º do Código Civil. A necessidade de interpelação do fiador, porém, respeita a uma fase anterior, isto é, ao vencimento da obrigação principal e ao momento a partir do qual a obrigação daquele é exigível. No tocante à subsidiariedade: Um traço que diferencia a fiança do aval é a sua natureza subsidiária relativamente à obrigação principal, caraterística esta a que a lei alude como benefício da excussão – artigo 638º do C.C. T Trata-se, contudo, de um benefício que pode ser afastado por vontade das partes e que, assim sendo, não pode considerar-se como uma caraterística essencial da fiança. É que o fiador fica, desde logo, pessoalmente obrigado perante o credor e pode, inclusive, ser chamado a cumprir antes do devedor, conforme resulta do disposto nos artigos 640º e 641º do C.C. A renúncia ao benefício da excussão significa apenas que o credor não é obrigado a esgotar o património do devedor principal antes de atingir o património do fiador, podendo executá-lo de imediato. A defesa que o benefício da excussão confere ao fiador consiste «em obstar à execução (e, desde logo, à penhora) dos bens do garante antes de prévia e insatisfatoriamente haverem sido excutidos todos os bens do devedor». A. Varela, Das Obrigações em Geral, volume II, págs. 488 e 489. Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações”, 8ª ed., pag 824, ensina que, renunciando ao benefício de excussão, o fiador “equipara-se, do ponto de vista do credor, a um verdadeiro devedor solidário”. No entanto “a posição do fiador que se obrigou como principal pagador não se identifica com a do condevedor solidário. Na verdade, a obrigação daquele, embora não seja subsidiária em face do credor, continua a ser acessória em relação à do devedor afiançado, com as respectivas consequências”. Com efeito, a renúncia ao benefício de excussão tem apenas como consequência o afastamento da regra da subsidariedade, traduzida no direito que assiste ao fiador de, nada sendo estipulado em contrário, recusar o cumprimento enquanto não estiverem excutidos todos os bens do devedor principal. A declaração da fiadora/opoente no sentido de se constituir como principal pagadora, com renúncia ao benefício da excussão prévia, apenas significa que, em vez de poder recusar o cumprimento da obrigação, enquanto o credor não tiver excutido todos os bens dos devedores sem ter obtido a satisfação do seu crédito, responderá, em solidariedade com os devedores, pelo cumprimento das obrigações destes, sendo completamente inócua para efeitos de renúncia ao benefício do prazo – v. neste sentido Ac. R.C. de 03.07.2012 (Pº 1959/11.8T2OVR-A.C1) e Ac. R.L. de 11.02.2014 (Pº 12878/09.8T2SNT-A.L1-7). E como é sabido, o benefício da excussão está previsto no art. 638.º do Código Civil nos seguintes termos: 1. Ao fiador é lícito recusar o cumprimento enquanto o credor não tiver excutido todos os bens do devedor sem obter a satisfação do seu crédito. 2. É lícita ainda a recusa, não obstante a excussão de todos os bens do devedor, se o fiador provar que o crédito não foi satisfeito por culpa do credor. Todavia, o art. 640º do mesmo diploma estabelece os casos em que o fiador não se pode valer daquele benefício: “O fiador não pode invocar os benefícios constantes dos artigos anteriores: a) Se houver renunciado ao benefício da excussão e, em especial, se tiver assumido a obrigação de principal pagador; b) Se o devedor ou o dono dos bens onerados com a garantia não puder, em virtude de facto posterior à constituição da fiança, ser demandado ou executado no território continental ou das ilhas adjacentes.” B. O recorrente, alega, sem impugnar a decisão sobre a questão-de-facto, que nunca foi notificado da reclamação de créditos apresentada pela Banco 1... nos autos de execução nº º .... Ora, essa afirmação, nos termos em que está feita, isto é, desacompanhada da impugnação da decisão de facto, designadamente, dos itens 11 a 20 dos factos provados, nos quais, está assente que o ora recorrente- co-executado-embargante e co -executado na ação executiva anterior a que se referem aqueles itens dos fatos provados foi citado para os termos dessa execução e foi notificado da sentença proferida no apenso de reclamação de créditos, não tem qualquer eficácia. Assim, resulta dos itens 11º, a 14º, 15º, 17º,, 19º e 20º dos fatos provados que o ora recorrente, co-executado nos autos de execução anteriormente instaurados contra ele e sua mulher, foi citado nessa acção executiva, foi notificado do requerimento de reclamação de créditos e transitou em julgado a sentença proferida nos autos de reclamação de créditos. A implicar que a apreciação da exceção da prescrição terá em consideração os factos julgados provados. Na petição inicial, neste segmento, o embargante alegou: “14º.O fraccionamento do pagamento do capital mutuado em prestações que incluem capital e juros – a pagar conjuntamente - enquadra-se no prazo de prescrição a que alude a al. e) do artigo 310.º do Código Civil, pelo que prescrevem no prazo de cinco anos, as quotas de amortização do capital pagáveis com os juros, relativas a contrato de mútuo. 15º. Assim, alegando o Exequente que o incumprimento ocorreu em 2016 – sem que para tal junte qualquer prova ou documento comprovativo – certo é que decorreram mais de cinco anos desde tal data, encontrando-se a totalidade da dívida exequenda prescrita, devendo a instância ser considerada extinta, o que expressamente se requer.” E na sentença recorrida, a propósito, a Mma Juiz discorreu nos termos que se reproduzem: “A propósito da questão da prescrição que foi suscitada nos autos, segue o tribunal a doutrina do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2022, de 22 de setembro, publicado no Diário da República n.º 184/2022, Série I de 2022-09-22, páginas 5 – 15, que fixou a Uniformização de Jurisprudência da forma seguinte: "I - No caso de quotas de amortização do capital mutuado pagável com juros, a prescrição opera no prazo de cinco anos, nos termos do artigo 310.º alínea e) do Código Civil, em relação ao vencimento de cada prestação." "II - Ocorrendo o seu vencimento antecipado, designadamente nos termos do artigo 781.º daquele mesmo diploma, o prazo de prescrição mantém-se, incidindo o seu termo 'a quo' na data desse vencimento e em relação a todas as quotas assim vencidas." Importa apurar se tal prazo decorreu, pois não há dúvidas que estamos perante quotas de amortização do capital mutuado pagável com juros, embora tenha ocorrido vencimento antecipado nos termos do artigo 781.º do Código Civil. Convocam-se os factos pertinentes para esta questão: A presente execução deu entrada em juízo em 17-09-2024. A data da última prestação paga é 16/04/2012. A embargada/exequente considerou vencida toda a dívida, reportada à data da última prestação paga. O embargante foi citado em 26-10-2024. Visto isto, o prazo para a prescrição iniciou-se em 16/04/2012, data em que a embargada/exequente considerou vencidas todas as prestações, e é de 5 anos, pelo que terminaria em 17-04-2017, muito antes da propositura da presente execução, o que logo indicia a verificação da prescrição. Não há dúvidas que «a prescrição interrompe-se pela citação», de acordo com o n.º 1 do artigo 323.º do mesmo Código Civil. Face à factualidade provada, importa apurar se a prescrição se interrompeu com a notificação para a reclamação de créditos deduzida no processo ..., interrompendo-se o prazo em 21-05-2014. Por força do art. 327º, nº 1 do Código Civil, não voltaria a correr até ao termo daquele processo ..., que ocorreu em 29-11-2022. E a interrupção da prescrição inutiliza o prazo anterior – art. 326º do Código de Processo Civil. Levanta-se, todavia, a questão de tal prazo ter passado a ser de 20 anos por forma do art. 311º do Código Civil, ou seja, por a obrigação estar reconhecida por sentença. É que ele efectivamente permite a transformação de um prazo curto de prescrição no prazo ordinário, se o primeiro não se tiver esgotado ou se na formação do título executivo se tiverem precludido os direitos de defesa do devedor – como é o caso de uma sentença judicial ou de uma qualquer declaração confessória posterior relevante – como a emissão de uma declaração autenticada de dívida ou um título de crédito, desde que sejam posteriores, porque pressupõem a mesma preclusão ou declaração contrária à vontade de invocar a prescrição. Já não é assim, por exemplo, se esses títulos forem de formação contemporânea à dívida – como é entendimento unânime da doutrina e da jurisprudência - ou se a mera não dedução de oposição não tem qualquer efeito preclusivo de todos os direitos de defesa invocáveis pelo devedor. O aludido art. 311º do Código Civil dispõe: 1. O direito para cuja prescrição, bem que só presuntiva, a lei estabelecer um prazo mais curto do que o prazo ordinário fica sujeito a este último, se sobrevier sentença passada em julgado que o reconheça, ou outro título executivo. 2. Quando, porém, a sentença ou o outro título se referir a prestações ainda não devidas, a prescrição continua a ser, em relação a elas, a de curto prazo. O prazo ordinário de prescrição é de vinte anos, nos termos do art.º 309.º do Código Civil. É discutível, na jurisprudência e na doutrina, que a sentença de graduação de créditos constitua caso julgado fora do processo em que foi proferida. Se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/03/2019, da Juiz Conselheira Rosa Ribeiro Coelho, proc. 713/12.4T8BRG.B.G1.S1, se defende inequivocamente que sim, citando-se os Professores Castro Mendes e Miguel Teixeira de Sousa, já no Acórdão do mesmo Tribunal de 22/06/2010, do Juiz Conselheiro Ferreira de Almeida, proc. 326/04.4TBOFR.C1.S1, (ambos acessíveis in www.dgsi.pt), se defende que não, citando o Professor Lebre de Freitas. O relevo consiste em saber se a excepção de caso julgado, de conhecimento oficioso, poderia aqui ser aplicável. Todavia, independentemente da posição que se siga, sobre o que parece não haver dúvida é que, em caso de procedência da reclamação apresentada por um credor terceiro à execução, naquele apenso profere-se uma sentença, que, quando transitada em julgado, reconhece, verifica e gradua o crédito reclamado. E tanto basta para que seja aplicável o referido art.º 311.º do Código Civil, ou seja, para que se conheça da invocada prescrição. Não chega, no entanto, para que imediatamente se considere que o prazo prescricional que até aí era de cinco anos passou a ser o prazo de prescrição ordinário. Afigura-se que terá que aplicar-se também o nº 2 do mesmo preceito. Na medida em que, mesmo existindo uma sentença que reconhece o crédito, estavam em causa prestações ainda não devidas, como confirma a embargada/exequente, a prescrição continua a ser, em relação a elas, de curto prazo. No entanto, como o prazo prescricional se interrompeu e só voltou a correr com o términus da anterior execução, em 29-11-2022, desde então até à citação para estes autos não decorreram 5 anos, pelo que não se verifica prescrição do capital exequendo, ou seja € 35.573,10 (trinta e cinco mil quinhentos e setenta e sete euros e dez cêntimos). O mesmo se diga quanto aos juros, pois o prazo é o mesmo.” O ora recorrente no recurso rebela-se contra esse julgamento. Todavia, parte da alegação recursória, a qual, aqui se reproduz, não tem qualquer eficácia -operância, porquanto a decisão sobre a questão de facto, revela o contrário. Reproduz-se aqui a alegação que releva nesta parte: “Aquando do contrato de mútuo, celebrado em 2007, o Recorrente indicou como sua morada Rua ..., ..., ..., Vila Nova de Gaia, que é a morada do imóvel sobre o qual foi constituída a hipoteca. A alegada citação que foi enviada, no âmbito do processo n.º ..., foi enviada para a morada Pct ..., ..., 2.º dto, ... Vila Nova de Gaia, nunca tendo sido recebida pelo Recorrente, que desconhecia completamente dos trâmites do processo. No âmbito de tal processo, tendo sido penhorado o imóvel que havia sido hipotecado, foi a Banco 1... notificada para reclamar os seus créditos, o que fez. Uma vez que o processo n.º ..., visava a cobrança de uma letra de câmbio,que nata tem a ver com os valores agora em causa a ser exigidos na presente acção executiva, é entendimento geral que somente a notificação para a impugnação dos créditos reclamados pela Banco 1... seria viável para fazer interromper o prazo prescricional em curso. Isto porque, somente com a apresentação de tal reclamação de créditos, o credor manifestava a sua vontade expressa de reaver os valores mutuados, pois a acção executiva principal em nada tinha a ver com tal vontade. Ora, somente a notificação válida do Recorrente para o apenso de reclamação de créditos constituiria motivo para interrupção do prazo de prescrição da dívida. Sucede que, como já se referiu, o Recorrente nunca foi notificado de tal reclamação de créditos, por se encontrar a residir no Luxemburgo desde setembro de 2011. Pelo que, não se pode considerar que quanto ao ora Recorrente, o prazo prescricional tenha sido interrompido aquando da notificação para impugnação da reclamação de créditos, pois tal notificação nunca foi recebida.” (…) (… ) o processo passou completamente à margem do Recorrente, sem que tenha sido citado ou notificado de qualquer diligência ou peça processual, não se podendo considerar que o prazo de prescrição tenha sido interrompido, uma vez que, perante o ora Recorrente, o credor nuca manifestou a vontade expressa de exigir o seu crédito. A falta de citação deveu-se, unicamente, a causas imputáveis ao credor, que não diligenciou por obter a morada do devedor.” Posto isto, no que respeita à alegada falta de citação nos autos de execução processo n.º ... e no que respeita à alegada falta de notificação do ora recorrente da petição de reclamação de créditos tramitada por apenso aqueles autos de execução, concluímos, sem necessidade de outras considerações, que não assiste razão ao recorrente. C.Do entendimento subsidiário do recorrente, O recorrente, para a hipótese de não lhe assistir razão quanto à alegada falta de citação nos autos de execução processo n.º ... e quanto à alegada falta de notificação do ora recorrente da petição de reclamação de créditos tramitada por apenso aqueles autos de execução, aceitando que o prazo de prescrição interrompeu com a notificação para impugnação da reclamação de créditos apresentada pela Banco 1..., alega: . que o prazo prescricional começou a contar desde o momento em que o credor recebeu o valor que lhe cabia com a venda do imóvel hipotecado, uma vez que, enquanto credor hipotecário, a sua intervenção processual terminou com a venda. Apreciando e decidindo: Nesta parte, importa referir que o ora recorrente não tece qualquer argumento jurídico para tentar afastar o entendimento acolhido na sentença recorrida quanto à exceção da prescrição. E, estranhamente, limita-se a afirmar que o prazo prescricional começou a contar desde o momento em que o credor recebeu o valor que lhe cabia com a venda do imóvel hipotecado, uma vez que, enquanto credor hipotecário, a sua intervenção processual terminou com a venda. Nesta parte, sem necessidade de considerações jurídicas extensas, atenta a forma como o recorrente discorre, importa referir o seguinte. Como é sabido, a prescrição consubstancia exceção perentória de natureza substantiva, por via da qual se extingue o direito do credor à prestação, obstando à procedência da ação executiva se tempestivamente invocada por quem dela beneficia (arts. 303.º e 304.º do Código Civil; arts. 576.º e 579.º do CPC). A sua verificação depende, assim, da demonstração do decurso do prazo legal sem ocorrência de causas de interrupção ou suspensão. No que respeita ao prazo aplicável, estando em causa nos autos um mútuo amortizável em prestações com juros, é de convocar o regime do art. 310.º, al. e), do Código Civil, que fixa em cinco anos o prazo de prescrição das quotas de amortização do capital pagáveis com juros, contado autonomamente por referência ao vencimento de cada prestação. Assim, nesta matéria, tal como o tribunal recorrido, também este Tribunal acolhe expressamente o entendimento firmado pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 6/2022, de 22.09.2022, segundo o qual: (i) as quotas de amortização do capital mutuado pagáveis com juros prescrevem no prazo de cinco anos; e (ii) ocorrendo vencimento antecipado das prestações, designadamente nos termos do art. 781.º do Código Civil, mantém-se o prazo quinquenal, fixando-se o termo a quo na data desse vencimento antecipado e para todas as quotas então vencidas. Assim, o que o Supremo Tribunal de Justiça afirmou, uniformizou e vem reafirmando é que o vencimento antecipado da obrigação, ou seja, das prestações (quotas de amortização do capital pagáveis com os juros) em dívida não altera o prazo prescricional de cinco anos, já antes aplicável a cada uma dessas prestações, unitariamente consideradas. Tal interpretação, tendo em conta as razões que fundam a consagração das prescrições de curto prazo, não se mostra desconforme ao disposto no artigo 9.º do Código Civil.[3] No caso concreto, importa atentar nos seguintes factos provados: 1. A presente execução deu entrada em juízo em 17-09-2024; 2. O executado foi citado em 26-10-2024; 3 Factos provados relevantes: “11.No dia 24 de Maio de 2011 o Banco 2... (Portugal) S.A. instaurou uma Execução Comum (Sol.Execução) contra BB e AA, com vista à cobrança do montante de 6.987,62 €, com base em Letra de câmbio. 12.Esse processo correu termos com o nº ... pelo Juízo de Execução do extinto Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, tendo posteriormente transitado para este Juízo de Execução do Porto - Juiz 6. 13.Nessa acção executiva foi penhorada, no dia 2012/01/24 a fracção hipotecada supra descrita em 2º, tendo a Banco 1..., S.A. sido citada para reclamar créditos em 2 de Abril de 2012. 14.O ora embargante foi citado no âmbito dessa acção executiva por via postal registada com AR no dia 18/01/2013, na morada sita em Pct ..., ... - 2º DTO ... VILA NOVA DE GAIA. 15.A Banco 1..., S.A. deduziu reclamação de créditos, por apenso à sobredita acção executiva, aí reclamando o crédito de 152.871,25€ correspondente a capital, que se reporta a três contratos de mútuo celebrados pelos executados, garantidos por hipotecas constituídas a favor do reclamante sobre o prédio objecto de penhora nos referidos autos sendo dois contratos de mútuo celebrados em 10/2/2000 garantidos pelas hipotecas registadas em 11/11/1999 (ap. ... e ...) e o crédito reclamado com referência ao contrato de mútuo celebrado em 16/11/2007 garantido pela hipoteca registada em 30/10/2007. 16.Juntou à petição inicial (documento nº 7) um extrato emitido pela Banco 1..., S.A., do qual resulta que, à data de 23-04-2012, o montante em dívida relativamente à operação descrita supra em 1º era de €40.343,72. 17.Quando a Banco 1..., S.A. em 23 de Abril de 2012 reclama os créditos no âmbito do processo n.º ... e exige o cumprimento imediato da obrigação não havia prestações em dívida. 18.A data da última prestação paga é 16/04/2012. 19.O ora embargante AA foi notificado para impugnar o crédito reclamado em 21-05-2014. 20.No dia 27 de Junho de 2014 foi nesse apenso de reclamação de créditos proferida sentença, já transitada em julgado, que a final, decidiu: «Pelo exposto, julgo verificado o crédito reclamado e graduo-o da seguinte forma: 1.º - Os créditos hipotecários reclamados pela “Banco 1..., S.A.” com referência aos contratos de mútuo celebrados em 10/2/2000, até aos montantes máximos assegurados pelas hipotecas constituídas e registadas em 11/11/1999, concorrendo entre si na proporção dos respectivos créditos; 2.º - O crédito hipotecário reclamado pela “Banco 1..., S.A.” com referência aos contratos de mútuo celebrado em 16/2/2007, até ao montante máximo assegurado pela hipoteca constituída e registada em 30/10/2007; 3.º - A quantia exequenda.». .Resulta destes factos que a exequente apresentou reclamação do créditos no apenso de reclamação de créditos dos autos de execução que também correram termos contra os ora executados, embora com fundamento em título distinto. E resulta da petição inicial de reclamação de créditos apresentada por apenso à anterior execução que correu termos contra os mesmos executados com fundamento em título distinto, que a credora original exigiu antecipadamente o pagamento das prestações vincendas, isto é, da totalidade do crédito invocando o vencimento antecipado da totalidade do crédito com fundamento na penhora do imóvel hipotecado. E o ora embargante, ali co -executado, foi notificado da reclamação de créditos apensa àquela outra execução, pela qual o ali credor reclamante reclamou o mesmo crédito que agora pretende executar na execução principal contra o embargante-co executado e a devedora principal, também executada. Conforme estabelece o artigo 323º, nº1, a) do c. Civil, a prescrição só se interrompe mediante a citação ou notificação judicial do devedor para ato que exprima a intenção de exercer o direito contra ele. Ora, daquela sentença proferida em sede de apenso de reclamação de créditos numa execução distinta em que o ora executado-embargante era também co-executado retira-se que existiu uma interpelação do ora embargante -co-executado para cumprimento da obrigação e, por isso, essa notificação produziu efeito interruptivo da prescrição da obrigação exequenda. Concretizando. Como é sabido, a perda do benefício do prazo estabelecido a favor do devedor encontra-se regulada, supletivamente, nos artigos 779.º a 781.º do CC. Assim, o artigo 780.º, n.º 1, 1.ª parte, prescreve a perda do benefício daquele prazo quando o devedor se torne insolvente, ainda que a insolvência não tenha sido judicialmente declarada, o que, determina “o vencimento imediato da obrigação, por caducidade do prazo estabelecido”[4] Outra hipótese de perda de benefício do prazo contemplada na 2.ª parte do n.º 1 do referido artigo 780.º é a respeitante à diminuição ou não prestação das garantias prometidas, por causa imputável ao devedor, em que também, nas palavras de Antunes Varela, “a dívida a termo torna-se imediatamente exigível, perdendo o devedor o benefício do prazo”[5] Nestes casos, porém, o n.º 2 do mesmo artigo atribui, ao credor, em alternativa ao cumprimento imediato da obrigação, o direito de exigir do devedor a substituição ou reforço das garantias. Por fim, no domínio das dívidas liquidáveis em prestações, como é o caso dos autos, o artigo 781.º estabelece que: “Se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas.” E conforme entendimento doutrinário e jurisprudencial hoje largamente maioritário, tal vencimento imediato das prestações fracionadas vincendas não opera automaticamente, exigindo-se antes a prévia interpelação do devedor para pagar a dívida remanescente, condição indispensável à sua constituição em mora quanto a esta, bem como, a interpelação do fiador e outros co - obrigados do devedor, em conformidade com os artigos 781º e 782º, ambos do C. Civil E, a este propósito, convém, desde já, ter presente o ditame jurisprudencial uniformizador do AUJ do STJ n.º 7/2009, de 25/03/2009, publicado no Diário de República, 1.ª série, de 05/05/2009, nos termos do qual: «No contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao artigo 781.º do Código Civil não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporadas.» Acresce que o referido regime legal de perda do benefício do prazo reveste natureza supletiva, podendo ser afastado por convenção das partes a coberto do princípio da liberdade contratual proclamado no artigo 405.º do CC. E conforme assinalado, no Acórdão do STJ de 06.12.2028, proferido no processo nº 739/16.0T8LOU-A.P1.S1, acórdão cujas considerações acolhemos por aí se terem apreciado, questões semelhantes, “ Nessa latitude, podem as partes estipular cláusulas atípicas de perda do benefício do prazo, estabelecer o vencimento imediato e automático das prestações fracionadas vincendas em derrogação do disposto no artigo 781.º do CC, como também podem os coobrigados, nomeadamente os fiadores, vincular-se, desde logo, à perda do benefício do prazo por parte do devedor principal, em detrimento da norma supletiva do artigo 782.º.” Todavia, no caso dos autos, como adiante iremos aprofundar, o embargante, ao assumir a qualidade de devedor principal no âmbito do mútuo em causa, não se vinculou à perda do benefício do prazo, por parte do devedor principal, de modo a afastar a aplicação supletiva do artigo 782.º do CC. A revelar que no caso dos autos, sempre seria necessário que a exequente interpelasse o co-executado-fiador e recorrente para efeitos de exigir antecipadamente o pagamento antecipado das prestações vincendas do mútuo. Todavia, importa centrar apreciar o alcance do estipulado Claúsula 13ª do documento complementar denominada “Incumprimento- Exigibilidade Antecipada”, cujo conteúdo foi por nós transcrito. “1.A Banco 1... poderá considerar antecipadamente vencida toda a dívida e exigir o seu pagamento imediato no caso de, designadamente: a)Incumprimento pela parte devedora ou… de qualquer obrigação decorrente deste contrato; b)(…) c)Venda, permuta, (…) ou qualquer outra forma de oneração, sem prévio acordo escrito da Banco 1..., dos bens que sejam … dados em garantia das obrigações emergentes do contrato (… ) d)Propositura contra a parte devedora de qualquer execução, arresto, … que implique limitação da livre disponibilidade dos seus bens; (…).” As alíneas c) e d) dessa estipulação desdobram-se, pois, em dois segmentos: i) - o vencimento do empréstimo, em caso de incumprimento pela parte devedora ou… de qualquer obrigação decorrente deste contrato; ii) o imóvel hipotecado ser onerado ou alienado sem consentimento da credora; O primeiro segmento alcança, nomeadamente, as situações de falta de pagamento de qualquer prestação de dívida liquidável em frações, tais como as previstas no artigo 781.º do CC e aí, supletivamente, reguladas. O segundo segmento traduz-se numa cláusula, de certo modo atípica, de perda do benefício do prazo de amortização estabelecido a favor do devedor, a qual, embora revelando alguma afinidade com as situações de diminuição das garantias do crédito por causa imputável ao devedor previstas na parte final do artigo 780.º, n.º 1, do CC, se apresenta mais específica, na medida em que faz depender a perda do benefício do prazo da oneração com penhora e/ou alienação do imóvel hipotecado sem o consentimento da credora. Poder-se-ia discutir se o primeiro segmento se limita a reeditar a norma do artigo 781º C.Civil. Todavia, não releva discorrer sobre essa questão, porquanto a exequente confina o vencimento imediato da obrigação de amortização do empréstimo em causa relativamente a prestações vincendas com fundamento na oneração do bem dado em garantia com uma penhora realizada noutra execução. E quanto ao segundo segmento, afigura-se que o alcance a dar àquela estipulação, à luz do critério de interpretação negocial plasmado no artigo 236.º, n.º 1, do CC, deve ser no sentido da exigibilidade imediata da obrigação de amortização do empréstimo em causa no caso de ocorrência de oneração-penhora do imóvel dado em garantia hipotecária sem o consentimento da credora. E esta cláusula trata-se de uma cláusula de perda do benefício de prazo numa situação particular de diminuição das garantias do crédito, consistente na oneração e posterior alienação do bem hipotecado sem o consentimento da credora, alheada da sua imputação ao devedor e, por isso, não inteiramente coincidente com as situações preconizadas na parte final do artigo 780.º, n.º 1, do CC. Acresce, como salienta o citado Ac STJ de 6 de dezembro de 2018, que a expressão literal de se reconhecer o direito da credora “a considerar o empréstimo vencido”, sem qualquer ressalva de faculdade alternativa de a mesma exigir a substituição ou o reforço das garantias, conforme o previsto no artigo 780.º, n.º 2, do CC, milita no sentido de dispensa de interpelação do devedor e, por conseguinte, em sentido equivalente à caducidade do benefício do prazo. Ademais, como ali se escreveu: “não se divisa que, perante a oneração - alienação do bem hipotecado sem consentimento da credora, esta mantenha qualquer interesse em optar pela exigência do cumprimento da obrigação ao longo do prazo inicialmente estabelecido, em vez do vencimento imediato das prestações vincendas. “ Nesta conformidade, conclui-se que a interpretação da estipulação em foco mais condizente com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário – no caso, os mutuários – e com que ele razoavelmente podia contar, é a de que a oneração através de penhora- alienação do bem hipotecado sem consentimento da credora implicava a exigibilidade imediata da obrigação de amortização dos empréstimos, conducente à caducidade do benefício do prazo. Importa agora apreciar e decidir se esse efeito é também extensível ao fiador, ora embargante. É certo que este se assumiu como principal pagador e assim renunciou ao benefício da excussão prévia. Todavia, essa renúncia, não releva para esta fase de interpelação para pagamento da dívida, mas sim, para a cobrança da dívida, como adiante iremos referir. Não obstante isso, da factualidade provada colhe-se que o embargante interveio, na qualidade de fiador na outorga do documento complementar da escritura pública do mútuo dada à execução em que foi estipulada a referida cláusula 13ª, acima transcrita. Ademais, o mesmo embargante interveio, nessa qualidade, na outorga da referida escritura, em que ficou consignado que o mútuo se regia pelas cláusulas constantes dessa escritura, bem como pelas cláusulas do respetivo documento complementar. Nesse clausulado inclui-se, pois, a estipulação de que era reconhecido à credora o direito de considerar o vencimento dos empréstimos em caso de o imóvel hipotecado ser onerado- alienado sem consentimento dela, o que dever ser entendido com o alcance acima considerado. Ora, o embargante, nessa escritura, além de se responsabilizar como fiador e principal pagador, declarou " Por fim, o mesmo embargante declarou que conhecia perfeitamente o conteúdo do referido documento complementar, que já leu e inteiramente aceita, e que faz parte integrante da escritura. Ora, perante uma assunção do fiador tão perentória, absoluta e adesiva em relação, nomeadamente, a ulteriores modificações dos prazos de amortização, afigura-se que, entre “tudo quanto venha a ser devido à Banco 1... Credora” em consequência daquele empréstimo, não se poderá deixar de incluir o devido pelo estipulado direito da credora a considerar o vencimento imediato do empréstimo em caso de oneração-penhora do imóvel hipotecado sem o seu consentimento. A propósito, sempre cumpre assinalar que neste contexto negocial, a situação dos autos difere do caso de que se ocupou o acórdão do STJ, de 10/05/2007, proferido no processo n.º 07B841[6], em que os fiadores se declararam, simplesmente, como “principais pagadores da dívida contraída” pelos mutuários “com renúncia expressa ao benefício da excussão prévia”, mormente ante a estipulação de que “o incumprimento, por parte do mutuário, de qualquer uma das obrigações decorrentes do presente contrato, poderá determinar o vencimento e exigibilidade da totalidade da dívida e de todas as importâncias cujo pagamento seja devido nos termos contratuais e de lei, se o Banco assim o entender”. E foi nesses precisos termos que ali se considerou “estar incluída a não extensão a eles [fiadores] da perda do benefício do prazo, por se tratar de fiadores e lhes valer o artigo 782.º do Código Civil”, embora se admitisse a natureza supletiva desta norma. Por razões similares considera-se igualmente diverso o caso de que se ocupou o recente acórdão do STJ, de 18/01/2018, proferido no processo n.º 2351/12.2TBTVD-A.[7] Concluímos, assim que no caso vertente, em face dos sobreditos texto e contexto negocial, o embargante, na qualidade de fiador solidário, assumiu também contratualmente, em detrimento da norma supletiva do artigo 782.º do CC, a responsabilidade pela amortização do empréstimo no caso da sua exigibilidade imediata em virtude da oneração com penhora e alienação do imóvel hipotecado sem consentimento da credora. Sucede que o imóvel dado como garantia hipotecária do empréstimo em referência foi objeto de penhora e posterior venda forçada no âmbito do processo de execução que correu termos com o nº ... referido no item 12 e ss dos factos provados. Esse imóvel foi vendido à proponente, pelo preço de € 100.000,00 (cem mil euros), no âmbito da venda por negociação particular levada a cabo naqueles autos. O Sr. Agente de Execução naqueles autos pagou à Banco 1..., S.A. os montantes de 50.000,00 € (cinquenta mil euros) e 41.292,46 € (quarenta e um mil duzentos e noventa e dois euros e quarenta e seis cêntimos) no dia 30-03-2017. Do produto da venda a Banco 1... aplicou à dívida dada à Execução € 4.770,62, totalmente imputado ao capital, que ficou reduzido ao montante de € 35.573,10 (trinta e cinco mil quinhentos e setenta e sete euros e dez cêntimos), valor que corresponde ao valor do capital de 35.573,10 €, cuja cobrança foi feita no requerimento executivo. A acção executiva nº ... foi extinta em 29-11-2022, por inexistência de bens penhoráveis. Perante tal situação, assistia à ora exequente o direito de considerar vencidas as obrigações de pagamento do capital remanescente do empréstimo em causa, nos termos da cláusula 13.ª do documento complementar da escritura dada à execução, obrigações essas por que é responsável o embargante, na qualidade de fiador solidário da mutuária, nos termos acima expostos. Prosseguindo. É certo que a norma do artigo 311º do C.Civil permite alargar o prazo da prescrição para 20 anos se o direito for reconhecido em sentença transitada em julgado ou outro título executivo. Todavia, porque no caso, a sentença proferida no referido apenso de reclamação de créditos, abrangeu prestações vincendas cujo pagamento foi antecipadamente exigido com fundamento na penhora do imóvel dado em garantia, segue-se que em conformidade com o nº2 do art 311º do C Civil, o prazo de prescrição quanto a essas prestações continua a ser o prazo de prescrição de curto prazo. E porque o prazo de prescrição de cinco anos se interrompeu com a notificação do recorrente-embargante para a reclamação de créditos na anterior execução, ficando inutilizado o tempo antes decorrido- art 326º C.Cvil- segue-se que o novo prazo de prescrição de cinco anos só voltou a correr após transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo, a 29.11.2022, conforme item 24 dos factos provados(24. A acção executiva nº ... foi extinta em 29-11-2022, por inexistência de bens penhoráveis). Neste sentido, importa convocar o Acórdão proferido neste tribunal da Relação do Porto, no dia 09.05.2024, no processo n 9/23.0T8OVR-B.P1, cujo sumário em parte se reproduz: “III - O n.º 1 do artigo 327.º do Código Civil, ao mandar que, quando a interrupção da prescrição resulta de citação ou notificação, o novo prazo começa a correr quando passar em julgado a decisão que puser termo ao processo, deve ser interpretado como reportando-se ao trânsito em julgado não da sentença de verificação e graduação dos créditos, onde a citação ou notificação teve lugar, mas da sentença que julgar extinta a execução no caso de esta terminar sem o crédito graduado ter obtido pagamento.” Como aí se entendeu o que releva para efeitos dos n.ºs 1 e 3 do artigo 327.ºdo Código Civil não é o trânsito em julgado da sentença de verificação e graduação dos créditos mas antes o trânsito em julgado da sentença que decretou a extinção da execução onde os créditos foram reclamados obrigando o credor a instaurar nova execução. “A reclamação de créditos é um incidente declarativo da execução e através dela, em virtude de o seu crédito dever ser pago na própria execução, o reclamante passa a dispor de alguns direitos próprios do exequente, como o direito de em determinadas circunstâncias requerer o prosseguimento da execução, assumindo na execução o papel de verdadeira parte ainda que parte acessória (cf. Lebre de Freitas, in A Acção Executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 6.ª edição, página 164). Ora não parece fazer sentido que o novo prazo se conte daquele trânsito quando, precisamente por efeito da sentença que julgou o crédito verificado e o graduou, o credor ficou em condições de ver o seu crédito pago na execução já pendente pelo produto do bem imóvel hipotecado e penhorado naquela execução. Não é defensável que apesar de se encontrar pendente a execução na qual o crédito foi graduado, se iniciou um novo prazo de prescrição, quando, por um lado, a prescrição visa sancionar a inércia do credor e no caso o credor não apenas actuou judicialmente no sentido de ver o seu crédito pago como a sentença proferida lhe conferiu o direito de ser pago na execução, e, por outro lado, estando pendente a execução e nela penhorado o bem hipotecado e tendo o credor reclamado nela o seu crédito, não lhe era sequer possível instaurar outra execução com idêntica finalidade, quando o artigo 306.º, n.º 1, do Código Civil estabelece que o prazo de prescrição só começa a correr quando o direito puder ser exercido.” Daí que, neste contexto processual específico, se nos afigura que o disposto no n.º 1 do artigo 327.º do Código Civil deve ser interpretado como reportando-se ao trânsito em julgado não da sentença de verificação e graduação dos créditos, mas verdadeiramente da sentença que julgar extinta a execução no caso de esta terminar sem o crédito graduado ter obtido pagamento. A implicar que no caso dos autos desde 29.11.2022 até 26.10.2024, data da citação do embargante-executado para os termos da execução principal, conforme item 26 dos fatos provados, não decorreram cinco anos. Em consequência do exposto, também nós concluímos não estar verificada a prescrição do capital exequendo, ou seja € 35.573,10 (trinta e cinco mil quinhentos e setenta e sete euros e dez cêntimos), nem dos juros, pois o prazo é o mesmo, improcedendo, assim, as conclusões recursórias G) a H). D. Um dos Senhores Adjuntos divergiu do entendimento que fez vencimento quanto à qualificação da notificação efetuada no apenso de reclamação de créditos do processo n.º ... como facto interruptivo da prescrição, por entender verificada decisão-surpresa e violação do princípio do contraditório. Todavia, a maioria deste Colectivo considera que a questão da prescrição foi expressamente suscitada pelo embargante, que a exequente lhe respondeu convocando aquele processo executivo anterior, com junção dos respetivos elementos (incluindo citações e notificações) e que o tribunal a quo se limitou a extrair dos factos alegados os efeitos jurídicos previstos na lei (arts. 323.º e 326.º do CC), sem introduzir questão nova, nem contender com o princípio do contraditório. Concretizando. A prescrição foi claramente colocada em causa pelo embargante na petição de embargos e a exequente respondeu-lhe na contestação, invocando expressamente o processo executivo n.º ..., a penhora do imóvel hipotecado, a reclamação de créditos da Banco 1..., a exigência de cumprimento imediato e juntando os respetivos elementos documentais, incluindo citações e notificações dos executados. Findos os articulados, no dia 06.03.2025 o tribunal a quo, exarou despacho pelo qual, determinou a notificação das partes para declararem expressamente se aceitam a dispensa da audiência prévia, e, querendo, se pronunciarem por escrito.Mais se exarou que caso algum das partes se oponha ou nada diga será agendada audiência prévia. E nos dias 19.03.2025e 20.03.2025, as partes, por requerimento, declararam por escrito aceitarem a dispensa da audiência prévia, tendo o autor aproveitado para declarar que impugnava toda a documentação junta pela embargada na contestação. Logo, a questão submetida ao tribunal recorrido sempre foi se o crédito estava prescrito, e a exequente sustentou a não prescrição precisamente com base nesse anterior processo executivo e nas comunicações aí efetuadas. Os factos relevantes para a qualificação da notificação como ato interruptivo estavam alegados e documentados. Nestes termos, o tribunal não introduziu qualquer “questão nova”, limitou-se a aplicar o direito aos factos alegados – iura novit curia – qualificando a notificação no apenso de reclamação de créditos como facto interruptivo da prescrição (arts. 323.º, 326.º e 327º, todos do CC). O que varia é a fundamentação jurídica, não o objeto da decisão. Como se escreveu no sumário do Acordão do STJ de 16.02.2023 in www.dgsi.pt: “I.O artigo 5.º, n.º 3, do CPC dá expressão à ideia ou regra conhecida como “iura novit curia”, ou seja, de que o juiz conhece (todo) o direito. II. Nos termos do artigo 5.º, n.º 3, do CPC, o julgador não está circunscrito às alegações das partes no que toca à indagação, à interpretação e à aplicação das regras jurídicas aplicáveis. III. Sempre que o enquadramento jurídico realizado pelo tribunal se contenha dentro dos limites da factualidade essencial alegada e seja adequado ao efeito prático-jurídico pretendido, pode o tribunal realizá-lo, posto que as partes tenham tido oportunidade de se pronunciar sobre ele, sendo poder-dever do julgador proceder à requalificação ou reconfiguração normativo-jurídica do caso quando cumpridas aquelas condições.” Também não se verifica “decisão-surpresa”: – o tema da prescrição foi amplamente debatido; – o recorrente conhecia todos os elementos do processo n.º ...; – podia ter alegado, se o entendesse, que não tivera conhecimento da notificação, mas não o fez. Significativamente, no próprio recurso o embargante não invoca violação do contraditório, nem nulidade por decisão-surpresa, não se referindo sequer ao art. 615.º, n.º 1, al. d), nem ao art. 195.º do CPC. Conclui-se, assim, que: (i) não houve violação do princípio do contraditório ou do direito de defesa; (ii) o juiz a quo atuou dentro dos poderes de qualificação jurídica dos factos. De resto, urge afirmar a verificação a uma nulidade da sentença com os fundamentos referidos equivaleria a uma posição paternalista em relação a uma das partes e contrariaria o dever de imparcialidade e de celeridade na decisão. 3.2.4.Da Perda do benefício do prazo e benefício da excussão prévia Nesta parte, o recorrente, repete-se e alega que não foi notificado da reclamação de créditos apresentada na execução anterior e que até ser citado para a presente execução nunca o Recorrente recebeu qualquer interpelação por parte da Recorrida concedendo-lhe e a oportunidade de liquidar as prestações que se haviam vendido até à data de incumprimento, mantendo o benefício do prazo para com as restantes e alega que nunca renunciou ao benefício da excussão prévia E porque releva, a propósito, escreveu-se na sentença recorrida: “O título dado à execução – a escritura - é documento autêntico e é título executivo enquanto tal e de harmonia com o previsto no art. 703º, nº 1, al. b) do Código de Processo Civil. A exigibilidade e vencimento das obrigações são pressupostos da sua exequibilidade – art. 713º do Código de Processo Civil. No caso dos autos, e ao abrigo do princípio da liberdade contratual, o contrato em apreço foi garantido com fiança prestada pelo aqui embargante. A fiança consiste no facto de um terceiro garantir com o seu património, o cumprimento da obrigação, constituindo desta maneira uma obrigação acessória da contraída pelo devedor - art. 627º, nºs 1 e 2, do Código Civil. Funciona, pois, como uma garantia das obrigações, pela qual um terceiro assegura a satisfação dum direito de crédito. Ela tem carácter de obrigação acessória, resultando da vontade do fiador e constitui-se, sempre, por negócio jurídico - Pires de Lima e Antunes Varela, Noções Fundamentais de Direito Civil, 4ª edição, 1º-342. Estamos perante uma dívida fraccionada, liquidada em prestações, que convoca o regime do artigo 781.º Código Civil, nos termos do qual, se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas. No caso de dívida fraccionada em prestações, o vencimento imediato das restantes prestações à falta do pagamento de uma das prestações, nos termos do artigo 781º do Código Civil constitui um benefício que a lei concede ao credor e que deve ser exercido mediante interpelação do devedor. De acordo com o art. 782º do Código Civil ao fiador, que renunciou ao benefício da excussão, são exigíveis as prestações já vencidas, e não pagas, à data da propositura da execução e respectivos juros. A dívida venceu-se, quanto à mutuária, por força do art. 781º do Código Civil. No entanto, o regime estabelecido no artigo 781.º do Código Civil não se aplica aos fiadores, por força do disposto no artigo 782.º Código Civil. Dispõe o referido preceito que a perda do benefício do prazo não se estende aos co-obrigados do devedor, nem a terceiro que a favor do crédito tenha constituído qualquer garantia. Invoca o embargante que, sendo fiador, devia ser interpelado para pagar, sem o que tais quantias não lhes seriam exigíveis. Efectivamente, não apenas a perda do benefício do prazo prevista no artº 781º (vencimento imediato de todas as prestações) se não aplica aos fiadores (como dispõe o art. 782º) salvo estipulação contratual em contrário, que não existe no caso dos autos, como se exige, quanto a estes (fiadores), a sua interpelação, não apenas para o vencimento, assim fazendo, quanto a eles, funcionar o disposto no artº781º, como, também para que lhes possa ser exigido o pagamento da totalidade das prestações e demais em dívida nos termos constantes do contrato de mútuo celebrado com o devedor principal, sendo que podem, com tal interpelação, pôr termo à mora, a fim de obviarem ao vencimento antecipado das prestações. No entanto, no caso dos autos, afigura-se que tal interpelação se tem que considerar feita, se não por via da carta referida em 9º, pois a mesma não foi enviada para o domicílio efectivo, nem para o electivo, do embargante, mas por via da notificação do embargante para a reclamação de créditos, já sobejamente debatida. Improcede assim também este argumento.” “IV. O benefício da excussão está previsto no art. 638.º do Código Civil nos seguintes termos: 1. Ao fiador é lícito recusar o cumprimento enquanto o credor não tiver excutido todos os bens do devedor sem obter a satisfação do seu crédito. 2. É lícita ainda a recusa, não obstante a excussão de todos os bens do devedor, se o fiador provar que o crédito não foi satisfeito por culpa do credor. Todavia, o art. 640º do mesmo Diploma estabelece os casos em que o fiador não se pode valer daquele benefício: O fiador não pode invocar os benefícios constantes dos artigos anteriores: a) Se houver renunciado ao benefício da excussão e, em especial, se tiver assumido a obrigação de principal pagador; b) Se o devedor ou o dono dos bens onerados com a garantia não puder, em virtude de facto posterior à constituição da fiança, ser demandado ou executado no território continental ou das ilhas adjacentes. Ora, no caso dos autos verifica-se que o embargante se constituiu principal pagador; e mais ainda, resulta do antecedente processo executivo a inexistência de bens, pois que aqueles autos foram extintos precisamente com esse fundamento e o próprio embargante, notificado para esse efeito, não indicou bens à penhora nos termos do art. 750º do Código de Processo Civil. Como refere L.P. Moitinho de Almeida, ainda a propósito de idêntica norma já contida no Código de Seabra – in O Benefício da Ordem ou da Excussão, Revista da Ordem dos Advogados, 1º/2º trim. 1962, pág. 58, «Nos casos em que o fiador se obrigou igualmente como principal pagador, é evidente que não pode invocar o benefício da excussão porque, em tais casos, não só a tanto obsta o nº 1 do art. 830 do C. Civ., mas também, nessa circunstância, o “soi-disant” fiador, embora não passa, afinal, dum co-obrigado do devedor principal, com quem se encontra na situação de solidariedade passiva em relação ao “accipiens”». Improcede mais este fundamento.” Quid iuris? Posto isto, no caso dos autos, no tocante à alegada falta de interpelação do recorrente-embargante-co-executado (que outorgou na qualidade de fiador o contrato de mútuo dos autos) para cumprir imediatamente a totalidade da obrigação, concluímos, repetindo em parte a argumentação atrás expendida, em face dos sobreditos texto e contexto negocial, que o embargante, na qualidade de fiador solidário, assumiu também contratualmente, em detrimento da norma supletiva do artigo 782.º do CC, a responsabilidade pela amortização do empréstimo no caso da sua exigibilidade imediata em virtude da oneração com penhora e alienação do imóvel hipotecado sem consentimento da credora. Perante tal situação, assistia à ora exequente o direito de considerar vencidas as obrigações de pagamento do capital remanescente do empréstimo em causa, nos termos da cláusula 13.ª do documento complementar da escritura dada à execução, obrigações essas por que é responsável o embargante, na qualidade de fiador solidário da mutuária, nos termos acima expostos. E no caso dos autos, afigura-se-nos que a interpelação do fiador para cumprir imediatamente a totalidade da obrigação, para evitar o vencimento antecipado das prestações se tem que considerar feita por via da notificação do embargante para a reclamação de créditos apresentada no apenso da reclamação de créditos. É certo que no caso em apreço, não refere o exequente no requerimento executivo que haja interpelado o fiador. Todavia, resulta dos fatos provados que ao embargante através daquela notificação foi dada a possibilidade de assumir a posição do devedor principal, pagando as prestações que se fossem vencendo, isto é, teve a possibilidade de exercer o contraditório e, se assim o entendesse, cumprir voluntariamente a obrigação exigida. Tratou-se de um ato judicial receticio, o qual, manifestou inequivocamente a intenção da credora, exequente, exigir o cumprimento imediato da obrigação garantida. Nesta conformidade, conclui-se pela procedência das razões da embargada - Recorrida no sentido de se reconhecer a perda do benefício do prazo de amortização do remanescente do empréstimo ajuizados e da sua eficácia em relação ao embargante -fiadores. Improcede assim este argumento, relativo à alegada não verificação da perda do benefício do prazo e relativo ao benefício da excussão prévia, improcedendo, pois, a argumentação das conclusões recursórias vertidas nas alíneas A) a F) e P) e Q) das conclusões recursórias. 3.2.5 .Da Liquidação da quantia exequenda. Aqui chegados importa apreciar e decidir sobre o montante em dívida e se este se encontra devidamente liquidado pela exequente. Ora, em face da alienação do imóvel hipotecado nas circunstâncias acima descritas, para a determinação do capital ainda em dívida, importava que fosse apurado o valor do capital já pago, bem como que fosse apurado em que termos foi feita a imputação ao capital do valor atribuído à credora no âmbito da anterior execução, em ordem a calcular então o montante do capital remanescente, na linha do ditame jurisprudencial enunciado no AUJ do STJ n.º 7/2009, de 05/05/2009. Sem esse novo cálculo não se consegue apurar o valor das prestações tidas por vencidas e ainda não pagas. De qualquer modo, verificada que foi a perda do benefício do prazo em virtude da referida oneração e alienação do imóvel dado em garantia, impunha-se que a credora procedesse ao novo cálculo do remanescente do capital ainda em dívida e o comunicasse ao fiador, ora embargante e recorrente. Sem uma tal liquidação, cujo ónus impendia sobre a credora aqui exequente e cuja falta não se mostra imputável ao fiador ora embargante, não é lícito que se considere este, desde logo, constituídos em mora como decorre do preceituado no 805.º, n.º 3, 1.ª parte, do CC. Todavia, sucede que a exequente enviou ao embargante a carta reproduzida no item 9º dos factos provados, a qual, foi dirigida para morada distinta daquela que consta da escritura de mútuo e essa carta foi devolvida, por não reclamada, a revelar que essa carta não revela que antes da citação para os termos da presente ação executiva, o embargante-recorrente tenha sido constituído em mora. Só no requerimento executivo é que a exequente veio discriminar os montantes por ela tidos em dívida a título de capital, juros, despesas e comissões nos moldes acima relatados, o que, mesmo assim, foi impugnado pelos embargantes. E não logramos perceber a exequente, ao peticionar o pagamento da dívida remanescente resultante do abatimento doe parte do valor obtido com o produto da venda do imóvel hipotecado na parte em que alega: “ 7. Sucede que os Executados deixaram de efetuar os pagamentos a que estavam adstritos, tendo entrado em incumprimento em 16/09/2016. 8. Excutida a garantia hipotecária constante do referido contrato, permanece ainda em divida a titulo de capital o montante de 35.573,10 € (trinta e cinco mil, quinhentos e setenta e três euros e dez cêntimos). 9. Ao valor em dívida a título de capital acrescem juros à taxa contratual de 8,246%, desde a data do respectivo incumprimento, no montante de 23.426,68 € (vinte e três mil, quatrocentos e vinte e seis euros e sessenta e oito cêntimos). 10. Ademais, sobre o montante total em dívida acrescem juros vincendos, desde a data de entrada do requerimento executivo até efetivo e integral pagamento, custas, custas de parte, despesas e honorários de A.E., e em tudo o que mais for de Direito.” (…) - Capital: 35.573,10 € - Juros: 23.426,68 € Ao valor acima discriminado sempre acrescerá a nota de despesas e honorários do Agente de Execução, bem como juros vincendos, até efetivo e integral pagamento.” Seja como for, em tais circunstâncias, apesar de se ter por verificada, quanto ao fiador e aqui embargante- recorrente, a perda do benefício do prazo para o pagamento do capital em dívida por efeito da referida alienação do imóvel hipotecado, não se mostra lícito considerar o mesmo fiador constituído em mora antes da sua citação para a presente execução, dada a falta da necessária liquidação dos juros descritos como vencidos no requerimento executivo, nos termos do já acima citado art.º 805.º, n.º 3, 1.ª parte, do CC, não sendo, por isso, exigíveis os juros calculados antes dessa citação. E, como já referido, tal liquidação foi toda ela objeto de impugnação pelo embargante, sustentando que é manifestamente incompreensível, por não especificar o modo como foram apurados tais valores. Por sua vez a exequente, contrapôs que indicou expressamente o cálculo aritmético que esteve na base dos valores peticionados. É certo que o montante indicado a título de capital, no total de € 35.573,10 €, condiz com o diferencial entre o produto da venda aplicado à dívida dada à Execução.(item 23 dos fatos provados) Todavia, desconhecemos como foram apurados os juros vencidos peticionados, sendo certo que no requerimento executivo a exequente alega que os executados entraram em incumprimento em 16/09/2016 e está provado que a última das prestações pagas foi de 16.04.2012 Neste quadro alegatório, não se pode deixar de ter como ainda controvertida a matéria da liquidação preliminarmente efetuada pela exequente e impugnada pelo embargante no respeitante ao juros e às peticionadas despesas e comissões. Consequentemente, devem os presentes embargos prosseguir para instrução e julgamento com vista a tal apuramento, mais precisamente do montante devido a título dos juros moratórios devidos a contar da citação, bem como das despesas e comissões peticionadas. Síntese- nº 7 do art 667º do CPC: ……………………………… ……………………………… ……………………………… IV – DELIBERAÇÃO: Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação, revogando-se a sentença recorrida e, em sua substituição, decide-se: A - Julgar os embargos: a) – improcedentes quanto ao fundamento respeitante à alegada ineptidão do requerimento executivo, à excecionada prescrição da obrigação exequenda, quanto à alegada não perda do benefício do prazo, considerando-se tal perda vinculativa para o fiador/embargante em consequência da oneração-penhora do imóvel hipotecado; b) – mas procedentes quanto à falta de constituição em mora do mesmo fiador/embargante antes da sua citação para a execução, tendo-se por não exigíveis os juros peticionados até à citação dos executados; B – No mais, determinar o prosseguimento dos embargos para liquidação dos juros de mora vencidos e vincendos desde a citação dos executados, bem como das despesas e comissões peticionadas, convidando-se previamente a exequente/embargada a explicitar os fatores e a fórmula de cálculo dos valores liquidados a título de juros no requerimento executivo. As custas da ação e do recurso serão devidas a final, na proporção do decaimento das partes. Porto, 13.11.2025 Francisca da Mota Vieira António Carneiro da Silva [Segue declaração de voto de vencido Com todo o respeito pela posição que fez vencimento, discordo da razoabilidade da decisão de simples improcedência do recurso quanto à excepção de prescrição suscitada. Desacordo que resumidamente decorre das seguintes reflexões. Antes de mais cumprirá recordar que, na petição de embargos, o embargante notoriamente restringe a discussão, quanto à excepção de prescrição, à aplicabilidade ao caso do prazo fixado no artigo 310º do Código Civil. Na contestação, por seu turno, e quanto à mesma questão, o exequente limita-se a defender apenas a aplicabilidade do prazo geral de prescrição. As referências pelo exequente feitas relativamente à prévia pendência do processo nº ... são enquadradas, todas elas, na resposta à falta de interpelação para cumprir também invocada pelo embargante como [outra] excepção peremptória destinada a paralisar pedido de cumprimento. Ou seja, ao longo do processado nenhuma das partes sequer se referiu a uma qualquer notificação feita no âmbito do processo nº ... como facto interruptivo do prazo prescricional. Logo, tendo o tribunal a quo de sua iniciativa considerado essas notificações como facto interruptivo sem previamente conceder às partes a possibilidade de sobre a matéria se pronunciarem, afigura-se-me claro estarmos perante decisão-surpresa violadora do princípio do contraditório – de decisão tomada sobre matéria relevantíssima no processo sem que as partes fossem chamadas a participar na obtenção da norma-do-caso. O que representa grosseira violação do princípio basilar consagrado no nº 3 do artigo 3º do Código de Processo Civil, elemento estruturante do moderno edifício da Justiça num estado que se queira de Direito [o processo equitativo não é sequer pensável sem contraditório – nº 4 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa]. O vício processual correspondente, na manifesta falta de outra opção [divergindo de parte relevante da jurisprudência e doutrina nacionais, recuso a aplicação ao caso da norma que sanciona o excesso de pronúncia (alínea d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil), pelo simples e óbvio motivo de me parecer claro constituir esta concretização do princípio do dispositivo, vendo com muita estranheza que o que num momento é encarado como estando a mais face ao pedido possa ser transmutado em conforme ao pedido só porque se concedeu às partes a possibilidade de pronúncia], reconduzir-se-á à nulidade processual prevista no artigo 195º do Código de Processo Civil, que evidentemente não é de conhecimento oficioso [artigos 196º e 197º, ambos do Código de Processo Civil]. Mas, atenta a estrutural importância do princípio em causa, afigura-se-me que a conclusão pela efectiva invocação do vício, e consequente possibilidade do seu conhecimento, não deve impor a necessidade de a parte utilizar a expressão sacramental «nulidade». Antes deve bastar-se com a prática de actos que revelem o notório insurgir contra a impossibilidade de pronúncia prévia, como sucede quando no recurso a parte vem esgrimir factos, não anteriormente invocados, cuja consideração e prova obstaria à prolação da decisão com o sentido com que o foi. Este afigura-se-me claramente constituir o caso em apreço nos autos. Pelo que determinaria a revogação da decisão recorrida na parte em que me surge ter prematuramente conhecido da excepção de prescrição, e determinaria a baixa do processo à primeira instância também para que às partes fosse permitida a pronúncia sobre a possibilidade de consideração das notificações realizadas no apenso de reclamação de créditos no âmbito do processo nº ... como facto interruptivo da prescrição. Assim, a sentença não podia conhecer da interrupção da prescrição com a notificação do ora recorrente na reclamação de créditos acima referida e que, por isso, o recorrente ficou impedido de demonstrar nos autos que não teve conhecimento dessa notificação”] João Venade. ______________ [1] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, 6ª ed., 53, [2] Menezes Cordeiro, Direito das Obrigações, AAFDL, 1986, 2º vol., 193, nota 55 e MÁRIO JÚLIO DE ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações”, 8ª ed., 941. [3] Entre outros, acórdão de 10.03.2015, proferido pela Relação Porto, no processo nº6559/24.0T8PRT-A.P1 [4] In Direito das Obrigações, Almedina, 11.ª Edição, 2008, p. 1016. [5] Das Obrigações em Geral, Vol. II, Almedina, 7.ª Edição, 1997, p. 49. [6] Relatado pelo Juiz Cons. João Bernardo, acessível na Internet http://www.dgsi.pt/jstj. [7] Relatado pela Juíza Cons. Fátima Gomes, acessível na Internet http://www.dgsi.pt/jstj. |