Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | FÁTIMA ANDRADE | ||
Descritores: | NULIDADE DA SENTENÇA JUROS MORATÓRIOS CONTRATO DE ADESÃO | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RP2018102210502/16.1T8PRT.P1 | ||
Data do Acordão: | 10/22/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA PARCIALMENTE | ||
Indicações Eventuais: | 5ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 682-A, FLS 2-34) | ||
Área Temática: | . | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - As causas de nulidade da sentença estão taxativamente previstas no artigo 615º do CPC. II - É nula a sentença nos termos do artigo 615º nº 1 al. d) do CPC que não conhece de pedido formulado, atento o dever/limite imposto ao julgador de conhecer (de todas) as questões submetidas à sua apreciação. III - O tribunal apenas se pode pronunciar sobre juros moratórios se tal pedido tiver sido formulado pelo autor na p.i. ou em ulterior ampliação do pedido (vide Ac. Unif. Jurispr. de 14/05/2015). IV - Tendo o A. no corpo expositivo da petição e já no final da mesma, último artigo antes do pedido formulado, concluído que “o total do montante indemnizatório se eleva a “€ 120.406,06 (…) a que acrescerão os respetivos juros moratórios até efetivo e integral pagamento”, mas não tendo introduzido no pedido final esta pretensão e se analisada a contestação não se retira da defesa apresentada pela R. qualquer pronúncia quanto a esta não expressa pretensão, para que daqui se possa inferir ter a R. entendido o pedido do A. como abrangendo os juros moratórios, pressuposto da defesa que tem de ser garantida, em respeito pelo princípio do contraditório à parte contrária, tem de se concluir inexistir pedido formulado de condenação em juros moratórios e como tal não pode ser considerada essa pretensão em sede de recurso. V - Impugnada a decisão da matéria de facto com base em meios de prova sujeitos à livre apreciação, com cumprimento dos requisitos previstos no art. 640º do NCPC, cumpre à Relação proceder à reapreciação desses meios de prova, sobre os mesmos formando a sua própria convicção nos termos do art. 662º. VI - Na medida em que as conclusões delimitam o objeto do recurso, é exigível que no mínimo das mesmas conste de forma clara quais os pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados, sob pena de rejeição do mesmo ou de apreciação limitada à matéria de facto identificada nas conclusões. VII - O documento particular cuja autoria tenha sido reconhecida, faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor na medida em que seja contrária aos seus interesses, nos termos do artigo 376º do CC. VIII - Estando em causa um contrato de adesão e pretendendo o aderente fazer-se valer de uma disposição legal do DL 446/85 (Regime das Cláusulas Contratuais Gerais) como forma de afastar a aplicação de uma cláusula do contrato, sobre o mesmo recai o ónus de prova da não negociação do clausulado. IX - O artigo 809º do CC não proíbe que as partes convencionem a exclusão ou limitação de responsabilidade do devedor nos casos de culpa leve. X - Ao contrato de prestação de serviços de comunicações eletrónicas celebrado entre uma operadora e uma sociedade utente, não consumidora, aplica-se a Lei das Comunicações eletrónicas (LCE / Lei 5/2004 de 10/02) bem como a Lei dos Serviços Públicos essenciais (LSP / Lei 23/96 de 26/07). XI - Nos termos do artigo 11º da LSP, cabe à operadora/prestadora do serviço a prova de todos os factos relativos ao cumprimento das suas obrigações e ao desenvolvimento de diligências decorrentes da prestação dos serviços a que se refere esta lei. XII - O conceito de culpa grave tem por referência uma situação de negligência grosseira. O de culpa leve a referência da omissão da diligência normal, enquanto conduta que não seria praticada por um homem médio, correspondendo a sua atuação à omissão da diligência do bonus pater famílias. XIII - O artigo 563º do CC adotou a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, ao estabelecer que a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão. XIV - O Bloqueio das comunicações por parte da operadora fora do circunstancialismo do artigo 52º da LCE faz incorrer a operadora na obrigação de indemnizar a A. pelos prejuízos que tal atuação lhe causou. XV - Na falta de elementos para quantificar os danos que a tal título foram peticionados deve ser relegado para incidente de liquidação posterior esta mesma quantificação. | ||
Reclamações: | |||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Processo nº. 10502/16.1T8PRT.P1 3ª Secção Cível Relatora – Juíza Desembargadora M. Fátima Andrade Adjunto - Juíza Desembargadora Fernanda Almeida Adjunto - Juiz Desembargador António Eleutério Tribunal de Origem do Recurso – T J Comarca de Porto – Inst. Central Porto Apelantes (R)/ “B..., S.A.” e (A)/ “C..., S.A.” Apeladas (R)/ “B..., S.A.” e (A)/ “C..., S.A.” Sumário (artigo 663º n.º 7 do CPC). ............................................................... ............................................................... ............................................................... Acordam no Tribunal da Relação do Porto I- Relatório “C..., S.A.” instaurou ação declarativa sob a forma de processo comum contra “B..., S.A.” peticionando pela procedência da ação a condenação da R. “A INDEMNIZAR A AUTORA NA QUANTIA DE € 120.406,06 (CENTO E VINTE MIL QUATROCENTOS E SEIS EUROS E SEIS CÊNTIMOS).” Para tanto alegou em suma: - ter celebrado com a R. em 13/07/2013 um contrato de prestação de serviços de comunicações eletrónicas, compreendendo “serviços carrier ethernet”, “”voz fixa”, “voz móvel”, “internet” e “redes privativas de dados”, conforme resulta da cláusula primeira do contrato e dos anexos e pedido de ativação. Bem como um sistema “OpenScape Office”, ou seja, um sistema de comunicações unificadas, com vista a satisfazer as necessidades de atendimento e contacto com os clientes por parte da Autora; - as cláusulas de tal contrato não foram objeto de negociação entre as partes, com exceção das condições especiais constantes do anexo I; - pela aquisição do equipamento necessário à instalação dos serviços contratados, a Autora pagou à Ré a quantia de € 26.089,89, quantia essa que incluía o suporte técnico de apoio à central telefónica pelo período de um ano (pelo qual a Autora pagou a quantia de € 1.348,31 acrescido de IVA), - os serviços contratados revelaram todavia problemas de operacionalidade, o que desde cedo motivou reclamações por parte da A.; - não obstante a não resolução dos problemas reclamados, a R. solicitou em 21/01/2015 a A. ao pagamento da quantia de € 1.500,00 pela renovação do contrato de suporte técnico. Após ter sido convencida que os problemas seriam resolvidos a A. pagou o valor peticionado; - apesar das reclamações apresentadas a R. não ofereceu qualquer satisfação à A. ou perspetiva de solução; - pelo que veio a A. por carta de 1/12/2015 a denunciar o contrato celebrado com a R. face à não resolução dos problemas denunciados, causa de bloqueios de chamadas. Após a denúncia comunicada e sem antes ter aguardado pela portabilidade para outro operador, bloqueou a R. os serviços da autora sem qualquer prévio aviso, em violação da lei alegando não pagamento de faturas que a A. se viu obrigada a pagar, apesar de em causa estarem valores que entendia não serem exigíveis e por indicação expressa da R. aguardava retificação. - O incumprimento contratual da R. que levou aos referidos bloqueios de chamadas na central entre 1/01/2015 e 26/11/2015 pelo período de 16 horas e 12 minutos foi causa de prejuízos pela inoperacionalidade da A. que esta quantificou em € 80.034,29; e o bloqueio dos serviços à A. entre 8/03 e 09/03 de 2015 que determinou a completa paralisação da atividade da A. por um período de 7 horas e 30 minutos causou à A. um prejuízo de € 37.052,85, tudo perfazendo – incluindo o valor de € 3.318,92 correspondente ao serviço de apoio técnico por si pago mas não prestado - o valor total de € 120.406,06. Regularmente citada, veio a R. contestar em suma tendo alegado: - a A. assinou a minuta do contrato que lhe foi proposta pela R. sem ter manifestado que pretendia alterar qualquer das cláusulas que fosse. Impugnando que de um contrato de adesão se trate (6º da contestação); - os problemas elencados pela autora de colocação de chamadas em espera não lhe foram comunicados como devia ter ocorrido, antes o tendo sido à empresa parceira da R.; - só em 13 de janeiro de 2015 os problemas foram reportados pela A. à R. Tendo sempre que foram reportados problemas, a R. e seus parceiros diligenciado pela resolução dos mesmos; - o bloqueio dos números fixos e o barramento ao serviço de Internet teve subjacente o não pagamento de faturas, ao abrigo da lei e após aviso à A. pela R. efetuado; - o contrato celebrado com a A. não é um contrato de adesão, pois é passível de negociação individual. Tendo o anexo I junto pela A. sido objeto de negociação, como aliás esta o reconhece na p.i.; - a indemnização por lucros cessantes está excluída contratualmente (cláusula 7ª); - o bloqueio à realização de chamadas telefónicas fixas bem como o barramento da internet fixa da A. foram licitamente realizados porquanto justificados na ausência de pagamento da A. pelos serviços prestados; - e os serviços de apoio técnico foram efetivamente prestados. Termos em que concluiu nenhuma indemnização ser devida à A. e como tal pela total improcedência da ação. Respondeu a A. em suma tendo reiterado a natureza de contrato de adesão do contrato celebrado entre A. e R.; a nulidade da cláusula de exclusão de responsabilidade invocada pela R. e no mais concluindo como na p.i.. * Realizada audiência prévia, foi no âmbito da mesma proferido despacho saneador; identificado o objeto do litígio e elencados os temas da prova.* Realizada audiência final, foi após proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência condenou a “ré B..., S.A. a pagar à autora C..., S.A. a quantia de € 19.000,00 (dezanove mil euros).”. * Do assim decidido apelaram A. e R..Apelou a R., oferecendo alegações e formulando as seguintes Conclusões: “1 - São os pontos da matéria de facto abaixo indicados aqueles que a Ré julga incorretamente julgados. 2 – Não se pode extrair do documento 45 junto com a pi que apenas estivesse por pagar o remanescente indicado (1660.50€) da FT ....../...... pois que aí se refere a existência de faturação em dívida. 3 – Assim, propõe-se seja alterado o ponto 86 da matéria de facto provada da sentença para: A Autora contactou a Ré para esclarecer o que se passava, tendo obtido em 05/04/2016 a informação escrita de que o bloqueio de comunicações ocorrido em 08/03/2016 se deveu à existência de faturação por liquidar e que a fatura ....../...... apresentava um valor por liquidar de € 1.660,50. 4 - Em face do último aviso do serviço de telefone fixo com a referência a “Aviso de suspensão”, datado de 09/02/2016, enviado pela Ré antes do bloqueio (efetuado em 08/03/2016), e junto sob documento nº 5 da contestação, e associado com o depoimento da testemunha D... (ficheiro 20170421141833_14610972_2871442 do CD) (minutos 00:29:26 a 00:33:35) resulta que, para além do remanescente de 1660.50€ da FT ....../...... respeitante ao suporte técnico à central telefónica, estava em falta o pagamento da FT ....../...., datada de 08/01/2016, de 1186,66€, respeitante à prestação de serviços de comunicações eletrónicos fixos. 5 – Assim propõe-se seja alterado o ponto 87 da matéria de facto provada da sentença para: A Ré mencionou nas cartas que emitiu e enviou à Autora (em algumas destas cartas era feita referência a “Aviso de suspensão”) que estavam em dívida faturas que estavam pagas, mas no último aviso constava a FT ....../...., datada de 08/01/2016, de 1186,66€, que se encontrava por pagar, tendo a Ré, após o pagamento pela Autora do montante de € 1.660,50, em 09/03/2016, procedido ao desbloqueio dos serviços atrás referidos. 6 - O IES de 2015 (documento de fls. 478 a 536 dos autos) apresenta na rubrica ..... o valor de € 9.575.008,06 a título de “Vendas e Serviços prestados”. 7 - Pelo que, propõe-se seja alterado o ponto 91 da matéria de facto provada para: No ano de 2015, a Autora prestou serviços e vendeu acessórios e peças do seu comércio no montante de € 9.575.008,06, o que perfaz uma média de faturação diária de € 26.232,89, ou seja, a quantia de € 3.729,11/hora. 8 - No que concerne à decisão de Direito, não tendo o motivo do bloqueio ocorrido em 08/03/2016 sido apenas a FT ....../......, respeitante ao serviço de suporte técnico à central telefónica, mas também a FT ....../...., respeitante à prestação de serviços de comunicações eletrónicas, é lícita a conduta da Ré ao abrigo do disposto no artº 52º da Lei nº 5/2004, de 10 de Fevereiro (Lei das Comunicações Eletrónicas). 9 – Assim, desde logo, não existe incumprimento contratual por parte da Ré, não lhe podendo nada ser exigido com base na alegada responsabilidade civil contratual. 10 – Sem prescindir, a Ré ao não deixar de cumprir a legislação acima referida, não lhe pode ser imputada uma atuação com culpa. 11 - Donde, não havendo qualquer comportamento culposo não tem a Ré, por força disso, qualquer obrigação de indemnizar a Autora. 12 - E caso assim não seja entendido, sempre tal culpa consubstanciaria apenas uma culpa leve, não ficando, por conseguinte, afastada a aplicação da «cláusula sétima» do contrato, com a consequente não responsabilização da Ré perante a Autora pelos lucros cessantes reclamados. 13 – Sem prescindir ainda, para além das vendas diretas que continuou a poder realizar (facto provado 92), a Autora sempre pôde continuar a receber chamadas telefónicas, só não podendo efetuar chamadas telefónicas – veja-se o depoimento da E... funcionária da Ré sobre aquilo em que consiste o bloqueio (ficheiro 20170421172021_14610972_2871442 do CD) (minutos 00:06:02 a 00:07:26). 14 - Portanto, a Autora não ficou impedida de vender por telefone fixo os seus artigos, não se mostrando, por conseguinte, tal bloqueio causa adequada à produção dos danos (lucros cessantes) peticionados pela Autora. 15 - Para a condenação da Ré na quantia de € 19.000,00 a título de lucros cessantes, o Tribunal a quo baseou-se em primeiro lugar na faturação alegada pela Autora e seguidamente, por tal montante se afigurar excessivo, dado que a faturação, como se sabe, não coincide com o lucro da empresa, recorreu à equidade e, ponderando as circunstâncias envolvidas no caso dos autos, reduziu a quantia acima indicada para valor que se aproxime da metade da quantia peticionada pela Autora. 16 - Afigura-se à Ré, com o devido respeito, não deixar de aqui dizer que se devia ter tido em conta que a faturação em causa incluía necessariamente a faturação decorrente das vendas diretas. 17 - A título de lucros cessantes alega a Autora ter ficado impedida da comercialização dos seus produtos em resultado do bloqueio dos serviços fixos entre os dias 08/03/2016 e 09/03/2016 (artigo155º da pi), do que decorre que, relativamente aos lucros cessantes, não foi alegada, tão-pouco concretizada (e por isso provada) uma única venda que deixasse de ser executada pela Autora em virtude do bloqueio em causa, pois não basta alegar genericamente que, em resultado da falta dos serviços deixou de haver vendas, sendo necessário concretizar quais foram. 18 - O artº 566º, nº 3, do Código Civil pressupõe, por um lado, que os danos foram alegados e se encontram provados e, por outro, terem-se esgotado todos os meios suscetíveis de se determinar o seu valor exato, o que no entendimento da Ré não se verificou. 19 - A sentença recorrida violou, pois, os artigos 52º da Lei nº 5/2004, de 10 de Fevereiro, 342º, nº 1, 563º, e 566º, nº 3, todos do Código Civil. Nestes termos, deve ser revogada a sentença na parte recorrida e substituída por outra que absolva a Recorrente do pedido formulados pela Recorrida, como é de JUSTIÇA.” Apresentou a A. recurso, oferecendo alegações e formulando as seguintes Conclusões: “1 – Deve ser considerado como provado o ponto 1) dos factos não provados, ou seja, que “As cláusulas do contrato celebrado entre a Autora e a Ré não foram objeto de negociação entre as partes, apenas tendo sido negociadas as condições especiais constantes do anexo I.”; 2 – Em consequência, deverá ser eliminado dos factos provados o ponto 11 da matéria de facto da sentença. 3 - O conteúdo e teor das cláusulas do contrato foi imposto pela Recorrida à Recorrente (aderente) sem precedência de negociação, sendo resultado de uma prévia conformação que esta não podia moldar, tratando-se de cláusulas que foram rigidamente predispostas sem que esta pudesse influenciar o seu teor, à exceção dos pontos que se prendem com a duração, serviços a prestar e o período de fidelização. 4 – No caso em apreço, resulta evidente a impossibilidade real de modelação do conteúdo contratual por parte da Recorrente, o que determina a submissão do contrato sub judice ao regime do DL n.º 446/85, sendo inegável que o contrato reveste as características essenciais de um contrato de adesão. 5 - Nos termos do artigo 1º, n.º 3 do DL n.º 446/85, o ónus da prova de que a cláusula sétima foi negociada entre as partes e que foram observados os deveres de informação e comunicação que sobre si impendiam recaía sobre a Recorrida, pelo que não tendo logrado demonstrar e provar a observância desses deveres, o artigo 8º, al. a) e b) do DL n.º 446/85 comina tal inobservância com a exclusão dessas cláusulas do contrato. 6 - A cláusula sétima do contrato encontra-se ferida de nulidade, que expressamente se invoca, por contrária à boa-fé (artigo 15º do DL n.º 446/85), sendo, ainda, absolutamente proibida à luz do artigo 18º al. c) e d) do DL n.º 446/85. 7 - Mesmo que se entenda que o caso sub judice não se submete à disciplina do DL n.º 446/85, tal cláusula sempre seria nula à luz do disposto no artigo 809º do CC, que aqui expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos. 8 - A atuação da Recorrida durante o período contratual revelou deficiências e omissões manifestamente graves e indesculpáveis, que só uma pessoa especialmente negligente, descuidada e incauta deixaria de observar, o que se subsume a um grau de culpa qualificado como grave. 9 - Os extensos factos dados como provados (cfr. factos provados n.º 13 a 69) relativamente ao incumprimento da Recorrida não são consentâneos com um juízo de culpa leve, conforme sustentado na sentença recorrida, mas sim com um juízo de culpa grave. 10 - Enquadrando-se a situação dos autos no âmbito da responsabilidade contratual, incumbia à Recorrida demonstrar que o incumprimento ou cumprimento defeituoso não procedeu de culpa sua (artigo 799º CC). 11 – A cláusula de exclusão e limitação da responsabilidade, ainda que se admita como válida, não tem a virtualidade de alterar as normas substantivas imperativas do Código Civil de 1966 relativas ao ónus do prova, designadamente impondo sobre o credor o ónus probatório da existência de dolo ou culpa grave do devedor no incumprimento ou cumprimento defeituoso da prestação. 12 - Tal posição equivaleria à completa subversão do regime legalmente estabelecido relativo à responsabilidade contratual e às regras do ónus da prova. 13 - A sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia quanto à condenação da ré no pagamento de juros de mora sobre o montante indemnizatório. TERMOS EM QUE, E NOS MELHORES DE DIREITO QUE V. EXAS. SUPRIRÃO, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, REVOGANDO-SE A SENTENÇA RECORRIDA E, EM CONSEQUÊNCIA, JULGANDO-SE A ACÇÃO TOTALMENTE PROCEDENTE, POR PROVADA, SENDO A RECORRIDA CONDENADA NOS EXACTOS TERMOS PETICIONADOS NA P.I. CASO ASSIM SE NÃO ENTENDA, O QUE APENAS POR HIPÓTESE DE RACIOCÍNIO SE ADMITE, DEVE SER SUPRIDA A NULIDADE DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA E CONDENADA A RECORRIDA NO PAGAMENTO DOS JUROS DE MORA À TAXA LEGAL, COMO PEDIDO NA PETIÇÃO INICIAL, SOBRE O CAPITAL INDEMNIZATÓRIO QUE SEJA FIXADO.” Apresentou a R. contra alegações ao recurso da A., em suma tendo: i- realçado que as questões que consubstanciam o objeto do presente recurso apenas podem ser aquelas que se encontram indicadas nas conclusões, pelo que apenas compreende os bloqueios da central telefónica reportada ao período temporal situado entre 01/01/2015 e 26/11/2015. Por este motivo estando excluído nomeadamente o ponto 87 dos factos provados; ii- pugnado pela não alteração da demais matéria de facto objeto do recurso do A., face ao bem decidido pelo tribunal a quo neste aspeto; iii- concluído pela improcedência da invocada (pelo autor) nulidade da sentença; iv- bem como e no mais pela improcedência do recurso. *** Os recursos foram admitidos como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.Foram colhidos os vistos legais. *** II- Âmbito do recurso.Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta das formuladas pelos apelantes serem questões a apreciar: 1) Recurso da R.. i- erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto: tendo por objeto os pontos 86 e 87 e 91 dos factos provados, por cuja alteração da redação pugna [vide conclusões 3, 5 e 7 as quais delimitam o objeto do processo]. iii- erro na aplicação do direito [vide conclusões 8 e segs.]. 2) Recurso da autora. i- nulidade da sentença por omissão: em causa a não condenação em juros [vide conclusão 13]; ii- erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto: tendo por objeto o ponto 1 dos factos não provados, cuja transição para os factos provados a recorrente pugna com a consequente eliminação do ponto 11 dos factos provados [vide conclusões 1 e 2 as quais delimitam o objeto do processo]. Nesta sede sendo ainda apreciada e como questão prévia suscitada pela recorrida R. a não reapreciação do ponto 87 dos factos provados que em sede de corpo alegatório a recorrente A. elencou, porquanto em sede de conclusões as quais delimitam o objeto do recurso, não foi incluído tal ponto. iii- erro na aplicação do direito [vide conclusões 3 e seguintes]. Também aqui sendo apreciada como questão prévia, a limitação do objeto do recurso em função das conclusões formuladas pela recorrente autora. Questão suscitada pela recorrida. *** III- FundamentaçãoForam dados como provados os seguintes factos: “1. A Autora é uma sociedade anónima que se dedica à importação, armazenamento e comercialização por grosso de peças e acessórios para veículos automóveis, camiões e tratores. 2. Os milhares de referências de artigos que a Autora possui são comercializados através de encomenda online no seu sítio na internet, através de venda direta e, sobretudo, através de encomendas efetuadas por contacto telefónico dos clientes. 3. Para o efeito, a Autora dispõe de uma central telefónica e de vários funcionários que recebem os contactos dos clientes e encaminham as encomendas efetuadas para o armazém para posterior tratamento e expedição para o destinatário. 4. Dentro do seguinte horário de funcionamento: de segunda a sexta-feira, de manhã entre as 9h e as 12h e 30m e de tarde entre as 14h e 30m e as 19h; ao sábado, entre as 9:00 horas e as 12:30 horas. 5. Dentro do seguinte horário de funcionamento: de segunda a sexta-feira, de manhã entre as 09:00 horas e as 13:00 horas e de tarde entre as 14:00 horas e as 19:00 horas; ao sábado, entre as 9h e as 12h e 30m (atualmente). 6. Para além do local onde se encontra instalada a sua sede (Rua ..., n.º .., Porto), a Autora tem outro armazém sito na Rua ..., n.º ., ..., Lisboa. 7. No dia 03/07/2013 foi celebrado entre Autora e a F..., S.A. (redenominada B..., S.A. após a fusão por incorporação da G..., S.A. na F..., S.A.) o “contrato de prestação de serviços de comunicações eletrónicas” corporizado no documento junto a fls. 89 a 102 dos autos, cujo teor aqui é dado como reproduzido. 8. Tal contrato compreendia, além do mais, a prestação pela Ré dos serviços de voz fixo e internet fixo, voz móvel e internet móvel (V...). 9. E incluía a aquisição, pela Autora, de uma central telefónica (sistema “OpenScape Office”), ou seja, um sistema de comunicações unificadas (incluindo equipamentos e sistema operativo), com vista a satisfazer as necessidades de atendimento e contacto com os clientes por parte da Autora, e a subscrição/aquisição de um serviço de suporte/apoio técnico à central telefónica, prestado pela Ré com recurso a parceiros, pelo período de um ano, tudo no valor total de € 26.089,89 (sendo que o serviço de suporte/apoio técnico teve o custo de € 1.348,31 + IVA, no valor total de € 1.658,42). 10. A Autora já era cliente da Ré antes da celebração do referido contrato, tendo feito um novo contrato (e não uma renovação) porque quis subscrever serviços, necessários à sua atividade, que o contrato anterior não contemplava. 11. A Autora assinou a minuta de contrato que lhe foi proposta pela Ré sem alguma vez ter manifestado que pretendia alterar qualquer uma das cláusulas aí incluídas, sendo certo que os contratos que a Ré celebra com os seus clientes corporate são passíveis de negociação individual por cada cliente, sendo possível a alteração das cláusulas propostas pela Ré. 12. Entre as cláusulas contratuais constantes do referido contrato conta-se a «cláusula sétima», com o seguinte teor: “Cláusula Sétima (Reembolsos e indemnizações) 1. Sem prejuízo do que se dispõe no número seguinte, a F... não será contratualmente responsável por lucros cessantes e por danos indiretos, ficando a sua responsabilidade contratual limitada, em qualquer caso, aos danos que resultem diretamente do incumprimento, com dolo ou culpa grave, de obrigações contratuais, por si ou por representantes, agentes, auxiliares ou quaisquer outras pessoas que utilize para o cumprimento das suas obrigações, incluindo-se neste incumprimento as situações de falha ou deficiência do Serviço. 2. Quando ocorra interrupção do Serviço resultante de avaria imputável à F... que resultem das situações referidas nas várias alíneas do número dois da Cláusula 6ª e impliquem uma interrupção na prestação desses Serviços, o Cliente poderá, a título de indemnização pelo facto, solicitar a dedução do valor correspondente ao Serviço proporcional ao período de tempo em que se verificou a restrição, suspensão ou limitação da oferta, devendo o mesmo ser descontado ao preço da mensalidade eventualmente aplicável ou de eventuais consumos que tivessem obrigatoriamente de ser utilizados no período em questão.”. 13. Na vigência do contrato atrás identificado, concretamente nos dias 29/08/2013, 30/08/2013 e 02/09/2013, a Autora reclamou do mau funcionamento dos serviços, com deslocação dos técnicos da Ré às suas instalações, tendo sido solucionados os problemas. 14. No dia 06/02/2014, a Autora experienciou novo problema de funcionamento dos serviços, desta vez inerente ao software de gestão de chamadas telefónicas, e que se prendia com a colocação das chamadas em espera sem motivo aparente e sem que os assistentes da Autora o tivessem feito. 15. Tal situação foi transmitida por e-mail, nesse mesmo dia, à empresa que assegurava o apoio técnico dos serviços aos clientes “corporate” da Ré, a saber, “H...” (na pessoa de I...). 16. O mesmo problema evidenciou-se nos dias 05/03/2014, 12/03/2014 e 17/03/2014. 17. No dia 05/11/2014, surgiu um novo problema no sistema da central telefónica da Autora, desta vez respeitante a bloqueio de chamadas na central telefónica. 18. A Autora recebeu um contacto telefónico de um cliente que bloqueou o sistema, ou seja, não permitia que as chamadas recebidas em simultâneo ou posteriormente de outros clientes fossem encaminhadas para os assistentes disponíveis. 19. De imediato, a Autora comunicou por e-mail a ocorrência à “H...”, tendo remetido em anexo um “print screen” do sistema de gestão de chamadas “MyAgent”. 20. Nos dias 19/11/2014, 24/11/2014 e 25/11/2014, os bloqueios das chamadas voltaram a verificar-se, tendo sido comunicados por e-mail, com cópia da imagem do sistema “MyAgent”. 21. O suporte técnico da Ré, na pessoa de I... da empresa “H...”, solicitou à Autora dados sobre chamadas que bloqueassem o sistema com data do próprio dia para que a B... pudesse analisar os dados, sob pena de desaparecerem dos registos desta última. 22. No dia 02/12/2014, os bloqueios das chamadas voltaram a ocorrer, desta vez com maior frequência, já que ocorreram pelo menos por três vezes. 23. A funcionária da Autora, J..., enviou três e-mails ao suporte técnico da Ré, de acordo com o solicitado, anexando imagens demonstrativas dos bloqueios. 24. Apesar das várias reclamações da Autora junto do suporte técnico da Ré e do conhecimento que este pontualmente dava à Ré da existência dos problemas (apesar da Autora não comunicar diretamente à Ré a existência dos problemas), estes problemas continuavam a surgir. 25. No dia 09/12/2014, os bloqueios das chamadas voltam a acontecer, tendo sido novamente remetidos três e-mails ao suporte técnico da Ré, anexando imagens demonstrativas dos bloqueios, chegando a funcionária da Autora, J..., a questionar o suporte técnico da Ré quantos bloqueios seriam necessários para resolver o problema, não tendo obtido resposta ou iniciativa no sentido de resolver o problema, por parte do suporte técnico da Ré. 26. No dia 15/12/2014, ocorreram bloqueios de chamadas na central telefónica, por cinco vezes, tendo sido enviados e-mails ao suporte técnico da Ré, conforme solicitado, imediatamente após a sua ocorrência, anexando imagens demonstrativas dos bloqueios. 27. No dia 16/12/2014, a situação voltou a repetir-se, por duas vezes, tendo sido dado conhecimento por e-mail ao suporte técnico da Ré. 28. Entre os dias 05/01/2015 e 08/01/2015, pelo menos em nove ocasiões, o sistema bloqueou as chamadas recebidas pela Autora, tendo sido dado conhecimento por e-mail ao suporte técnico da Ré. 29. No dia 13/01/2015, via e-mail, a Autora, através da sua funcionária J..., exasperada com a demora na resolução da avaria e da operacionalidade do sistema, questionou o suporte técnico da Ré no sentido de perceber se alguma solução havia sido encontrada para reparar o problema, sendo certo que, nesse dia, apenas no período da manhã, por seis vezes o sistema bloqueou as chamadas. 30. Também no dia 13/01/2015, o funcionário da Autora adstrito ao departamento de informática, K..., instou o suporte técnico e a própria Ré, na pessoa de L..., a perspetivar um prazo concreto para a resolução do problema, bem como a adoção das medidas necessárias para o efeito. 31. Em 21/01/2015, a Ré, através do seu funcionário L..., propôs à Autora a renovação do contrato de suporte técnico, pelo período de um ano, pelo valor de € 1.500,00, com a entrada de um novo parceiro (“Informatem”) para o apoio/suporte técnico à central telefónica e “começar as resoluções de imediato conforme combinando”, referindo ainda que “como vamos avançar com um novo parceiro, peço-vos que não dêem mais visibilidade das situações”. 32. A Autora, através do seu funcionário K..., respondeu por e-mail de 21/01/2015 (16:05 horas), referindo que havia pago um valor semelhante pelo suporte técnico anterior H... sem que o problema tivesse sido resolvido. 33. A situação já se arrastava há mais de três meses, tendo sido reportada e comunicada sempre que sucedia ao suporte técnico, com conhecimento pontual por este à Ré. 34. A Ré, novamente através de L..., respondeu à Autora, lamentando o sucedido e garantindo que “o novo parceiro está empenhado em resolver rapidamente os vossos problemas”. 35. A Autora acedeu a pagar o valor de € 1.350,00 (acrescido de IVA) para o novo suporte técnico pelo período de um ano, tendo confirmado tal decisão por e-mail de 22/01/2015. 36. Assim, a partir daquela data, o suporte técnico passaria a ser assegurado pela “M...”, parceiro da Ré e sob a orientação desta, conforme informado pela Ré. 37. Em Março de 2015, a Autora foi surpreendida com a presença nas suas instalações de um técnico da empresa “H...”, não permitindo qualquer intervenção no sistema por parte do mesmo, uma vez que não só estava insatisfeita com o serviço prestado anteriormente e tinha sido informada pela Ré, em Janeiro de 2015, que o suporte técnico passaria a ser assegurado por outro parceiro. 38. Havia a necessidade de intervir no sistema da Autora, com realização de um “upgrade” ao sistema OSB e com coordenação da intervenção entre a H... e a M..., tendo sido agendada tal intervenção para o dia 23/03/2015 entre as 13 horas e as 14 horas, o que veio, efetivamente, a acontecer. 39. No dia 26/03/2015, as chamadas voltaram a ser bloqueadas pela central por cinco vezes, tendo a Autora dado conhecimento, por e-mail, a I... (H...). 40. A empresa H... concluiu, em 27/03/2015 (dia em que se verificaram bloqueios), que “o problema que está a bloquear o Contact Center deverá ser da parte da B... / F...”, aludindo à “configuração do SIP Trunk” e referindo que “temos outros SIP Trunks a funcionar com a F... e com Contact Center e não têm problemas”. 41. O problema decorria do software da central – as comunicações chegavam à central mas não eram geridas visto a mesma apresentar um conflito no seu próprio software. 42. No dia 21/04/2015, voltaram a evidenciar-se bloqueios das chamadas na central telefónica. 43. Entre os dias 5 e 7 de Maio de 2015 os problemas de bloqueio e queda de chamadas voltaram a verificar-se, pelo menos, em 6 ocasiões, tendo sido dado conhecimento por e-mail à M..., à H...e a I.... 44. O responsável da H..., N..., respondeu no dia 5/05/2015 por email, informando estar a ser tratada uma intervenção na configuração da interface SIP, que impunha interrupção do serviço de comunicações. 45. No dia 7/05/2015, após mais um bloqueio, o responsável do suporte técnico da Ré, N..., enviou novamente um e-mail à Autora, do seguinte teor: “Pedimos desculpa pelo incómodo causado. Estamos a ver a melhor forma de fazermos uma intervenção rápida de forma a solucionar o problema. Temos consciência que este problema existe há algum tempo, mas todos os vossos reports são recebidos e tomados em consideração. Prometemos intervir o mais rápido possível.”. 46. Um mês decorrido, e sem que o problema estivesse sanado ainda, como resposta a mais uma interpelação da Autora no sentido de perceber quanto tempo mais teria de esperar e quantos prejuízos teria de suportar para que a reparação do problema fosse efetuada, o responsável da M..., O..., enviou um e-mail à Autora no dia 09/06/2015, referindo que “Entendendo, desde já, o incómodo que a demora na resolução dos problemas reportados e ainda não resolvidos com a central telefónica têm motivado à C..., apesar de todas as diligências que têm vindo a ser tomadas com vista à sua resolução, contactei diretamente a P.../Espanha [fabricante].”. 47- Referiu também que “Obtive a total disponibilidade para a resolução da situação, inclusivamente a disponibilidade para visitar a C... por parte da P..., foi-me garantido que até ao final da presente semana seria elaborado um plano de ação com vista à resolução definitiva do problema.”. 48. E referiu ainda que “Por parte da B... estará disponível “online” aquando da intervenção, a equipa de engenharia de sistemas, por forma a poder despistar em estreita colaboração com a equipa da P... qualquer problema que possa ser identificado a nível de “Trunk”.”. 49. No dia 11/06/2015, a Autora contactou via e-mail, com conhecimento à Ré e ao fabricante, a M..., comunicando que aguardaria até ao final dessa semana pela solução definitiva do problema, bem como reportando frequentes situações de bloqueios e quedas de chamadas durante esse dia 11/06/2015. 50. A Ré respondeu ao referido e-mail informando que se deslocaria às instalações da Autora no dia 15/06/2015 para “proceder às correções necessárias das configurações”. 51. No dia 15/06/2015, a Autora foi confrontada com novos incidentes de bloqueio e queda de chamadas. 52. Bem como nos dias 16/06/2015, 17/06/2015 e 18/06/2015, tendo sido dado conhecimento à Ré e ao suporte técnico. 53. Ainda no dia 17/06/2015, o suporte técnico da Ré, na pessoa de N..., informou a Autora por e-mail que se encontrava a analisar os números de telefone que bloquearam no dia anterior, questionando também se entretanto havia ocorrido mais algum bloqueio. 54. Novamente por e-mail, N..., solicitou à funcionária da Autora, J... o seguinte: que contactasse um dos números que bloqueou, questionando se pertencia à B..., Q... ou S...; que esse número ligasse novamente para a Autora; que questionasse se ouvia algum tipo de ruído além da mensagem em fila de espera. 55. A Autora respondeu, referindo o seguinte: que o problema deveria ser resolvido internamente sem abordar entidades externas à Autora, nomeadamente os clientes; que os problemas que se mantinham desde a implementação, há dois anos, não devem transparecer para o exterior, sob pena de retirar a confiança dos clientes da Autora; que a Autora não tinha a obrigação de contactar clientes para resolver problemas de quem lhe fornece os serviços; que pretendia o problema resolvido sem abordar os seus clientes; que após a reunião ocorrida em Março de 2015, já se encontravam ultrapassados todos os prazos razoáveis, requerendo uma solução definitiva do problema. 56. No dia 24/06/2015, sendo feriado de S. João no Porto, e sem que o problema estivesse ainda resolvido, a Autora deparou-se com a paralisação completa das suas instalações em Lisboa. 57. Nesse dia, à semelhança do que acontece com o feriado de Santo António (neste caso ao contrário), as instalações do Porto encontravam-se encerradas, o que leva a um exponencial aumento dos contactos e encomendas efetuadas às instalações da Autora em Lisboa. 58. Com efeito, uma chamada recebida ao início da tarde pelo atendimento de Lisboa bloqueou o sistema e todas as chamadas posteriores, ficando o sistema perfeitamente inoperacional, pelo que todos os clientes que tentaram contactar ou encomendar artigos à Autora se viram impossibilitados de o fazer. 59. O funcionário da Autora adstrito ao departamento de informática, K..., resolveu o problema, com recurso ao seu telemóvel, mas, entre as 14:00 e as 19:00 horas, a Autora viu-se impossibilitada de ser contactada pelos seus clientes e de comercializar os seus produtos. 60. Esta paralisação foi reportada à Ré, à H... e à M... na manhã seguinte, dia 25/06/2015, pelas 10:17 horas, através de e-mail enviado por K..., hora durante a qual já se verificavam novos problemas. 61. Ainda durante o dia 25/06/2015, para além dos problemas ocorridos durante a manhã, foi reportado mais um bloqueio durante a tarde através de e-mail enviado às 14:55 horas à Ré e ao suporte técnico. 62. A Ré apenas se deslocou às instalações da Autora no dia 17/07/2015 para proceder à instalação de equipamento e testes. 63. Bem como no dia 23/07/2015 para migração de serviço, com acompanhamento e validação remota por parte do funcionário da Ré, T.... 64. E, ainda, no dia 24/08/2015, para proceder a trabalhos conexos com o voice mail e a extensão 111 que estava desativada. 65. No dia 24/09/2015, a central telefónica da Autora voltou a bloquear, tendo sido reportada tal situação ao funcionário da Ré, L..., e ao seu suporte técnico Corporate, à H... e à M..., às 16:37 horas desse dia. 66. A Ré respondeu no dia seguinte, 25/09/2015, solicitando o número configurado na central, a morada do local e a marca da central, bem como um contacto para um despiste adicional. 67. A Autora respondeu agradecendo a “urgência” demonstrada e informando que o Sr. I... havia resolvido o problema minutos após ter sido reportado. Mais referiu a Autora que a Ré deveria ter a informação relativa aos dados da central e solicitou que a Ré contactasse o parceiro que prestava o suporte técnico para retirar os “log’s” do dia anterior de forma a averiguar o sucedido. 68. A Ré respondeu informando que iria verificar junto do parceiro o motivo pelo qual os bloqueios das chamadas continuavam a ocorrer. 69. Certo é que o problema nunca foi solucionado, repetindo-se constante e reiteradamente durante os meses seguintes. 70. Em Outubro de 2015 a Ré procedeu ao envio da fatura referente ao período de 01/09/2015 a 30/09/2015, que incluía, para além do mais, sob a rubrica “créditos/débitos” e com a descrição “equipamentos”, a quantia de € 1.350,00, acrescida de IVA (total € 1.660,50), referente ao serviço de suporte técnico que havia sido acordado em Janeiro de 2015. 71. Em reunião ocorrida em Novembro de 2015, os funcionários da Ré, L... e U..., reconhecendo a existência de problemas com a central telefónica, como forma de agrado face a tais situações e no âmbito da negociação destinada à renovação do contrato de telecomunicações, informaram a Autora que aquela iria reduzir o valor do suporte técnico em causa. 72. Os referidos funcionários da Ré disseram à Autora para não efetuar o pagamento da referida fatura, enquanto se tratava da renovação do contrato. 73. Para além da necessidade de retificação da fatura quanto ao valor, em face da posição da Ré e enquanto se processassem as negociações tendentes à renovação do contrato, havia ainda a necessidade de retificar a descrição da fatura, na parte respeitante ao serviço em causa. 74. Em reuniões que manteve com a Autora durante o mês de Novembro de 2015, a Autora tentou convencer esta última a renovar o contrato, referindo que tudo estava a fazer para resolver os problemas da central telefónica e chegando a oferecer à Autora seis mensalidades como bónus de renovação do contrato. 75. Porque os problemas de bloqueio e queda de chamadas continuaram a evidenciar-se, a Autora procedeu à denúncia do contrato de prestação de serviços de comunicações eletrónicas por carta registada com aviso de receção, datada de 01/12/2015 e recebida pela Ré no dia 03/12/2015, que constitui o documento junto a fls. 291 a 293 dos autos, cujo teor aqui é dado como reproduzido. 76. Já em 27/11/2015, através de e-mail, a Ré havia informado a Autora que não iria renovar o contrato (relegando para momento ulterior a comunicação por carta registada), tendo, nesse altura, solicitado “o valor das faturas que se encontram pendentes para liquidação” e a “retificação do valor apresentado para pagamento do apoio técnico da central, bem como a descrição da fatura”. 77. Em resposta a este e-mail, a Ré informou a Autora, através de e-mail de 30/11/2015, dos valores em dívida, nos seguintes termos: “Conta móvel: - Fatura .............. – 905,25€ - Fatura FT ....../...... – 702,03€ - Fatura FT ....../...... – 597,77€ - Fatura FT ....../...... – 686,19€ - Fatura FT ....../...... – 672,44€ - vence a 6/12 Conta fixo: - Fatura .............. – 1179,24€ - Fatura FT ....../...... – 1180,49€ - Fatura FT ....../...... – 1170,45€ - Fatura FT ....../...... – 2918,25€ - Fatura FT ....../...... – 1213,82€ - vence a 6/12 Resumo: - Móvel – 3.563,68€ - Fixo – 7.662,25€ TOTAL – 11.225,93€”. 78. No referido e-mail de 30/11/2015, a Ré comunicou ainda à Autora que “em relação à oferta referente aos pressupostos para a renovação do atual contrato, informo que a mesma fica sem efeito na íntegra”. 79. Entre o dia 01/01/2015 e o dia 30/06/2015, o tempo de bloqueio das chamadas cifrou-se em cerca de 25600 segundos, ou seja, o equivalente a cerca de 7 horas e 12 minutos. 80. No dia 24/06/2015, as instalações de Lisboa da Autora viram-se complemente paralisadas entre as 14:00 horas e as 19:00 horas, face ao bloqueio de chamadas ocorrido. 81. Entre o dia 01/07/2015 e 26/11/2015 o tempo de bloqueio das chamadas foi de cerca de 4 horas. 82. Após a denúncia do contrato (aceite pela Ré), a Ré comunicou à Autora, através de e-mail de 08/01/2016, que iria aguardar os pedidos de portabilidade e que estava a tratar da retificação da descrição da fatura quanto ao apoio técnico da central telefónica. 83. Dados os atrasos na portabilidade dos números, a mudança de operador arrastou-se cerca de dois meses, pelo que o prestador de serviços de comunicações continuou a ser a Ré durante esse período. 84. No dia 08/03/2016, a Autora viu-se surpreendida com o bloqueio dos números fixos e com o barramento ao serviço de internet fixo, levados a cabo pela Ré. 85. A Ré bloqueou os referidos serviços à Autora entre as 15:55 horas do dia 08/03/2016 e as 12:25 horas do dia 09/03/2015, num total de 7 horas e 30 minutos. 86. De imediato, a Autora contactou a Ré para esclarecer o que se passava, tendo obtido a informação de que o bloqueio de comunicações se deveu à existência de faturação por liquidar, dado que a fatura ....../...... (fatura de Outubro, referida no facto provado nº 70) apresentava um valor por liquidar de € 1.660,50. 87. De facto, não obstante a Ré mencionar, nas cartas que emitiu e enviou à Autora (em algumas destas cartas era feita referência a “Aviso de suspensão”), que estavam em dívida várias faturas (o que não correspondia à verdade, uma vez que a Autora havia pago todas as faturas, a maioria no dia 15/12/2015, com exceção do valor de € 1.660,50 incluído na fatura de Outubro de 2015, atrás identificada), após o pagamento pela Autora do montante de € 1.660,50, em 09/03/2016, a Ré procedeu ao desbloqueio dos serviços atrás referidos. 88. A retificação da descrição da fatura ainda não tinha sido efetuada em 8/01/2016, nem tampouco foi efetuada posteriormente. 89. Em 07/04/2016, a Autora solicitou à Ré novamente a retificação da descrição da fatura (“equipamento”) para efeitos contabilísticos, conforme já havia feito cerca de seis meses antes, ou seja, em Novembro de 2015. 90. A Autora vendeu acessórios e peças do seu comércio, no ano de 2014, no montante de € 8.598.393,78, o que perfaz, atento o horário de laboração da Autora, uma média diária de faturação de € 31.845,90, ou seja, € 3.980,74 por hora durante o ano de 2014. 91. No ano de 2015, a Autora vendeu acessórios e peças do seu comércio no montante de € 10.671.230,74, o que perfaz uma média de faturação diária de € 39.523,07, ou seja, a quantia de € 4.940,38/hora. 92. A encomenda telefónica constitui uma importante forma de venda dos artigos e acessórios comercializados pela Autora. 93. O bloqueio dos dias 08/03/2016 e 09/03/2016, num total de 7h e 30m, referido no facto provado nº 85, impediu a Autora de exercer normalmente a sua atividade comercial.” O tribunal a quo deu ainda como não provada a seguinte factualidade: “1. As cláusulas do contrato celebrado entre a Autora e a Ré não foram objeto de negociação entre as partes, apenas tendo sido negociadas as condições especiais constantes do anexo I. 2. Sendo feriado no Porto, não se encontrava ninguém disponível da parte da Ré ou do seu suporte técnico para resolver o problema. 3. Nenhum serviço de apoio técnico digno dessa designação foi efetivamente prestado.” * Conhecendo.* Por uma questão de precedência lógica das questões suscitadas a este tribunal de recurso, será apreciada em 1º lugar a questão da nulidade da sentença por omissão de pronúncia, suscitada pela A. recorrente. Após o que será apreciado o alegado erro imputado à decisão de facto. Apreciando em conjunto nesta sede, tanto o recurso da R. como da autora. 1) Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia (invocada pela A. recorrente). Estando as causas de nulidade da sentença previstas de forma taxativa no artigo 615º do CPC, importa em primeiro lugar recordar que nas mesmas se não inclui quer os erros de julgamento da matéria de facto ou omissão da mesma, a serem reapreciados nos termos do artigo 662º do CPC, quando procedentes e pertinentes, quer o erro de julgamento derivado de errada subsunção dos factos ao direito ou mesmo de errada aplicação do direito [cfr. Ac. STJ de 30/05/2013, Relator Álvaro Rodrigues, in www.dgsi.pt/jstj sobre a distinção entre nulidade da sentença, no caso por oposição entre os fundamentos e decisão, versus erro de julgamento]. Em causa, tal como alegado pela recorrente, está a não pronúncia da sentença relativamente aos juros moratórios peticionados, o que na perspetiva da recorrente configura nulidade por omissão de pronúncia nos termos da al b) do artigo 615º nº 1 do CPC [na verdade a menção à al. b) será lapso, já que o vício da omissão está expressamente previsto na al. d) do mesmo artigo e nº 1]. Omissão que assim a recorrente pugna seja por este tribunal suprida, assim condenando a R. por referência à indemnização arbitrada/a arbitrar nos “juros moratórios devidos, contados desde a citação.” A recorrida contrapôs que a recorrente não formulou o pedido de juros moratórios na petição inicial tal como estipulado no artigo 552º nº 1 do CPC. Nem o fez em ulterior pedido nos termos do artigo 265º nº 2 do CPC. Pelo que concluiu pela improcedência da sua pretensão. Dispõe o artigo 609º nº 1 do CPC que a “sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir”. E em consonância sanciona com o vício da nulidade, a sentença que “…condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido” (al. e) do nº 1 do artigo 615º do CPC. Apreciando precisamente a necessidade de ser formulado pedido condenatório em juros, para que o tribunal sobre os mesmos se possa pronunciar sob pena de violação do princípio do pedido, foi por Ac. Uniformizador de Jurisprudência do STJ de 14/05/2015, decidido fixar a seguinte jurisprudência: “Se o autor não formula na petição inicial, nem em ulterior ampliação, pedido de juros de mora, o tribunal não pode condenar o réu no pagamento desses juros.” Tal como resulta do disposto no artigo 552º do CPC, na petição deve o autor, para além do mais, expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à ação [al. d) do nº 1 deste artigo] após formulando o pedido [al. e) deste mesmo artigo e nº 1]. Analisada a petição inicial da A. constata-se que após a exposição factual, a mesma terminou peticionando, tal como supra já reproduzido, pela condenação da R. “A INDEMNIZAR A AUTORA NA QUANTIA DE € 120.406,06 (CENTO E VINTE MIL QUATROCENTOS E SEIS EUROS E SEIS CÊNTIMOS).” Ou seja, na verdade no pedido final formulado não incluiu a A. o pedido condenatório em juros moratórios. É bem verdade que no corpo expositivo da petição e já no final da mesma, último artigo antes do pedido formulado, concluiu a A. que o total do montante indemnizatório se eleva a “€ 120.406,06 (…) a que acrescerão os respetivos juros moratórios até efetivo e integral pagamento”. No entanto não introduziu no pedido final esta pretensão e analisada a contestação não se retira da defesa apresentada pela R. qualquer pronúncia quanto a esta não expressa pretensão, para que daqui se possa inferir ter a R. entendido o pedido do A. como abrangendo os juros moratórios. Pressuposto da defesa que tem de ser garantida, em respeito pelo princípio do contraditório à parte contrária. Neste contexto e no confronto formal com o pedido formulado pela A. resta concluir pela não inclusão no pedido condenatório dos juros moratórios a implicar a improcedência da arguida nulidade da sentença por omissão de pronúncia. Termos em que se julga improcedente a arguida nulidade da sentença. 2) Do erro imputado à decisão de facto, tanto por A. como R. e nesta sede como questão prévia definição do objeto do recurso da A.. * Na reapreciação da decisão de facto, importa ter presente os seguintes pressupostos:1- Estando em causa a impugnação da matéria de facto, obrigatoriamente e sob pena de rejeição deve o recorrente especificar (vide artigo 640º n.º 1 do CPC): “a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”. No caso de prova gravada, incumbindo ainda ao recorrente [vide n.º 2 al. a) deste artigo 640º] “sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”. Sendo ainda ónus do recorrente apresentar a sua alegação e concluir de forma sintética pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – artigo 639º n.º 1 do CPC - na certeza de que estas têm a função de delimitar o objeto do recurso conforme se extrai do n.º 3 do artigo 635º do CPC. Pelo que das conclusões é exigível que no mínimo das mesmas conste de forma clara quais os pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados, sob pena de rejeição do mesmo. 2- Na reapreciação da matéria de facto – vide nº 1 do artigo 662º do CPC - a modificação da decisão de facto é um dever para a Relação, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou a junção de documento superveniente impuser diversa decisão. Cabendo ao tribunal da Relação formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou que se mostrem acessíveis. Sem prejuízo de e quanto aos factos não objeto de impugnação, dever o tribunal de recurso sanar mesmo oficiosamente e quando para tal tenha todos os elementos, vícios de deficiência, obscuridade ou contradição da factualidade enunciada, tal como decorre do disposto no artigo 662º n.º 2 al. c) do CPC. 3- Na medida em que os recursos visam, por via da modificação de decisão antes proferida reapreciar a pretensão dos recorrentes por forma a validar o juízo de existência ou inexistência do direito reclamado, temos igualmente de concluir que a reapreciação da matéria de facto está limitada ao efeito útil que da mesma possa provir para os autos, em função do objeto processual delineado pelas partes e assim já antes submetido a apreciação pelo tribunal a quo [vide neste sentido Acs. deste TRP Relator Miguel B. Morais de 21/02/2018, e do TRG de 12/07/2016, Relator Jorge Seabra e de 15/12/2016, Relatora Maria João Matos, todos in www.dgsi.pt/]. * Tendo presentes estes considerandos e analisadas as conclusões das recorrentes, bem como o corpo das suas alegações, conclui-se terem sido observados pelas mesmas os ónus de alegação e impugnação sobre si incidentes, pelo que cumpre reapreciar a decisão de facto tendo por referência os pontos impugnados constantes das respetivas conclusões que delimitam o objeto do recurso ou seja os pontos da matéria de facto 86, 87 e 91 quanto ao recurso da R. e 1 dos factos não provados e 11 dos factos provados.*** Do exposto, resulta não se poder considerado incluído no objeto de recurso o ponto 87 dos factos provados no recurso da A.. Embora esta no seu corpo alegatório mencione este ponto de facto e de forma clara, de igual forma claramente não o introduziu nas suas conclusões. Conforme já referido, na medida em que as conclusões delimitam o objeto do recurso, é exigível que no mínimo das mesmas conste de forma clara quais os pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados, sob pena de rejeição do mesmo. Embora na jurisprudência se encontrem posições mais ou menos exigentes quanto aos elementos que das conclusões devem constar, este é um denominador mínimo comum a todas elas [fazendo uma resenha alargada desta temática vide Ac. TRG de 07/04/2016, Relator José Amaral in www.dgsi.pt/jtrg; vide igualmente Abrantes Geraldes in ob. cit., em anotação ao artigo 640º, nota 5 – p. 135, bem como Acs. STJ de 01/10/2015, Relatora Ana Luísa Geraldes, de 22/09/2015, Relator Pinto de Almeida, de 29/10/2015 Relator Lopes do Rego e de 06/12/2016 Relator Garcia Calejo, todos in www.dgsi.pt]. Assim e não incluído o ponto 87 nas conclusões, não será este ponto reapreciado no âmbito do recurso instaurado pela recorrente autora. * Importa assim reapreciar o decidido, do recurso da R. quanto aos factos 86, 87 e 91[1] dos factos provados.Bem como e quanto ao recurso da A. o facto provado 11 e o facto não provado 1[2]. Para tanto relembrando ainda que o princípio da livre apreciação das provas continua a ser a base, nomeadamente quando em causa estão documentos sem valor probatório pleno; depoimentos das testemunhas ou de parte [vide art.ºs 341º a 396º do Código Civil (C.C.) e 607.º, n.ºs 4 e 5 e ainda 465º (quanto à confissão prestada em depoimento de parte, esta irretratável) do C.P.C.], cabendo ao tribunal da Relação formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou que se mostrem acessíveis [cfr. Ac. STJ de 11/02/2016, Relator Abrantes Geraldes in www.dgsi.pt/jstj]. Fazendo ainda apelo [vide António S. Geraldes in “Recursos no Novo Código do Processo Civil, 2ª ed. 2014, anotação ao artigo 662º do CPC, págs. 229 e segs. que aqui seguimos como referência] ao: - uso de presunções judiciais – “ilações que a lei ou julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido” (vide artigo 349º do CC), sem prejuízo do disposto no artigo 351º do CC, enquanto mecanismo valorativo de outros meios de prova; - ou extraindo de factos apurados presunções legais impostas pelas regras da experiência em conformidade com o disposto no artigo 607º n.º 4 última parte (aqui sem que possa contrariar outros factos não objeto de impugnação e considerados como provados pela 1ª instância); - levando em consideração, sem dependência da iniciativa da parte, os factos admitidos por acordo, os provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito por força do disposto no artigo 607º n.º 4 do CPC (norma que define as regras de elaboração da sentença) ex vi artigo 663º do CPC (norma que define as regras de elaboração do Acórdão e que para o disposto nos artigos 607º a 612º do CPC remete, na parte aplicável). Por fim relembrando que na dúvida acerca da realidade de um facto ou da repartição do ónus da prova, deve o tribunal resolver a mesma contra a parte à qual o facto aproveita, tal como decorre do disposto nos artigos 414º do CPC e 346º do C.C.. Será com base nos considerandos acima expendidos quanto aos poderes do tribunal na reapreciação da matéria de facto e por referência à prova produzida – documental, testemunhal e depoimentos de parte - que será reapreciada a decisão da matéria de facto. * Recurso da Ré.Dos factos provados 86 e 87. Quanto a estes factos fundou o tribunal a quo a sua convicção nos seguintes termos: “Quanto aos factos provados nºs 86 e 87 e quanto à surpresa da Autora referida no facto provado nº 84, importa tecer algumas considerações. Em primeiro lugar, o teor do documento de fls. 303 e 304 (documento nº 45 junto com a p.i.) é claríssimo quanto ao motivo do bloqueio ocorrido em 08/03/2016: “A FT ....../...... apresentava um valor em aberto de 1660,50€, sendo o seu valor total de 2918,25€. O desbloqueio foi efetuado após pagamento deste mesmo valor.”. Logo, a tese da Ré de que existiam diversas faturas em dívida e que foi esse o fundamento do bloqueio revelou-se infundada. Em segundo lugar, discutiu-se muito em julgamento a questão da existência de aviso prévio. Ora, quanto a esta aspeto, a Ré juntou aos autos os documentos de fls. 436 a 441, fls. 442 a 447 e 451 a 460 (documentos nºs 5, 6 e 7 juntos com a contestação, respetivamente). Tais documentos são constituídos por avisos emitidos pela Ré e dirigidos à Autora, alertando para a existência de quantias em dívida com atraso de pagamento, constando de alguns desses avisos a referência a «Aviso de suspensão de comunicações da sua conta B... …». A Autora quis fazer passar a ideia de não ter recebido qualquer aviso prévio. A funcionária da Ré E... referiu que estes avisos são enviados por correio simples. Aceita-se que tais avisos tenham sido enviados pela Ré à Autora. Contudo, tais avisos contêm flagrantes incorreções, reveladoras da flagrante falta de cuidado com quem a Ré tratou a questão do bloqueio dos serviços e consequente ilegitimidade de tal conduta. Desde logo, tais avisos mencionam a existência de dívidas de faturas que já haviam sido pagas pela Autora há largo tempo. Centrando-nos nos avisos relativos ao serviço de telefone fixo (documentos nºs 5 e 6 juntos com a contestação), constata-se, por exemplo, que o aviso que consta de fls. 436 e 437 dos autos (datado de 09/02/2016) contém a menção a uma fatura (no montante de € 1.213,82) que já havia sido paga em 15/12/2015. O aviso que consta de fls. 444 e 445 dos autos (datado de 12/01/2016) contém cinco faturas (as cinco primeiras) que haviam sido pagas em 15/12/2015. Estes pagamentos podem ser comprovados pelo teor do documento junto a fls. 300 a 302 dos autos e também pelo documento junto a fl. 476 dos autos (pagamento efetuado em 16/02/2016). Depois, em todos os avisos (do telefone fixo) é feita referência à FT ....../......, com data de emissão de 07/10/2015, com o valor faturado de € 2.918,25, com o valor a pagar de € 1.660,50 e com a data limite de pagamento de 06/11/2015, quando é certo que, conforme já foi atrás referido e analisado, os funcionários da Ré havia dito à Autora que tal fatura não seria devida enquanto decorressem as negociações relativas à renovação do contrato e enquanto não fosse efetuada a retificação da descrição desta fatura (sendo certo que a Ré comunicou à Autora, em 08/01/2016, que estava a tratar da retificação da fatura – documento nº 43 junto com a p.i.). De resto, ainda em 07/04/2016, a Autora estava a pedir à Autora que procedesse á retificação da fatura (documento junto a fls. 307 e 308 dos autos – documento nº 47 junto com a p.i.) – factos provados nºs 88 e 89. Em suma, todos os valores que a Ré referiu estarem em dívida, no e-mail de 30/11/2015 (fls. 420 a 422 dos autos – documento nº 2 junto com a contestação), foram pagos pela Autora em 15/12/2015, com exceção do mencionado valor de € 1660,50. Por tudo o exposto, não é difícil aceitar que o bloqueio constituiu uma surpresa para a Autora.” Pretende a recorrente que a redação do ponto 86 passe a ser: “A Autora contactou a Ré para esclarecer o que se passava, tendo obtido em 05/04/2016 a informação escrita de que o bloqueio de comunicações ocorrido em 08/03/2016 se deveu à existência de faturação por liquidar e que a fatura ....../...... apresentava um valor por liquidar de € 1.660,50.”[conclusão 3]. Alega para o efeito que do doc. 45 junto com a p.i. não se pode extrair que estivesse por pagar apenas o remanescente indicado de € 1660,50 da FT ....../...... pois que aí se refere a existência de faturação em dívida [conclusão 29]. No que a este ponto 86 concerne, não há como dar razão à recorrente. O que neste ponto consta é o teor da resposta da R. dada através do doc. junto sob o nº 45, datado de 05/04/2016 e nos autos inserto a fls. 303/304. Nesta comunicação o que na mesma consta é exatamente o que o tribunal a quo transpôs para este facto 86. Pode ler-se nesta comunicação: “(…) venho esclarecer que o bloqueio de comunicações ocorrido no passado dia 08/03 se deveu à existência de faturação por liquidar. A FT ....../...... apresentava um valor em aberto de 1660.50€, sendo o seu valor total de 2.918.50€ O desbloqueio foi efetuado após pagamento deste mesmo valor”. Ainda e no parágrafo seguinte desta mesma comunicação (de abril de 2016 realça-se), consta: “Acrescento que na mesma data informei um diferencial de 59,71€ em aberto, decorrente da utilização de uma NC indevida e que foi necessário corrigir, conforme acordado com a área comercial. Este valor deverá ser liquidado em conjunto com a próxima ordem de pagamentos”. Ou seja não só a R. informa a causa do bloqueio. Como ainda esclarece que então estava em dívida o valor de € 59,71 (não indicado como causa do bloqueio) decorrente de uma utilização de NC indevida (necessariamente pela R. emitida) e que foi necessário corrigir. Pelo que nenhuma responsabilidade se pode imputar à A. pela emissão por parte da R. de uma indevida NC. Sendo que a fls. 397, por comunicação de 7/04/16 da A., dá esta nota de o valor de € 59,71 ter já sido pago que na resposta da mesma data (a fls. 308) a R. não questiona. Resumindo, o teor desta comunicação de 5/04/16 (de fls. 303) não podia ser mais claro quanto aos motivos apresentados para justificar o bloqueio: a existência de uma dívida – valor em aberto de € 1.660,50 - que uma vez paga gerou o desbloqueio. O facto 86 traduz portanto exatamente o que consta neste comunicado e não merece qualquer censura. Pelo que improcede a alteração neste ponto requerida. Analisemos agora o ponto 87 dos factos provados. Pretende a recorrente que o mesmo passe a ter a seguinte redação: “A Ré mencionou nas cartas que emitiu e enviou à Autora (em algumas destas cartas era feita referência a “Aviso de suspensão”) que estavam em dívida faturas que estavam pagas, mas no último aviso constava a FT ....../...., datada de 08/01/2016, de 1186,66€, que se encontrava por pagar, tendo a Ré, após o pagamento pela Autora do montante de € 1.660,50, em 09/03/2016, procedido ao desbloqueio dos serviços atrás referidos.” Que o desbloqueio ocorreu após o pagamento da quantia de € 1.660,50 (último segmento deste ponto em análise) é precisamente o que a comunicação referida em 86 informa. E nesta parte a recorrente não questiona, aliás, a redação dada a este ponto. O que na verdade a recorrente pretende ver introduzido neste ponto dos factos provados é a existência de outros montantes em dívida para além dos mencionados € 1660,50, nomeadamente o montante de € 1.186,66 referente à fatura FT....../.... datada de 08/01/2016, contrariando assim a afirmação do tribunal a quo de que a autora havia pago todas as faturas, a maioria em 15/12/2016 com exceção do valor de € 1660,50. Para o efeito convocou a recorrente o depoimento da testemunha da autora D... conjugado com os seguintes docs.: doc. 5 junto com a contestação (acima já referido), intitulado “Aviso de Suspensão” e datado de 09/02/2016 enviado pela R. antes do bloqueio (efetuado a 08/03/2016), o qual inclui a FT ....../.... datada de 08/01/2016 de € 1186,66 com data limite de pagamento em 07/02/2016. Analisado o doc. 5 junto com a contestação a fls. 436, o qual identifica como assunto “Aviso de Suspensão de comunicações da sua conta B... nº .........” datado de 09/02/2016 enviado pela R. antes do bloqueio (efetuado a 08/03/2016), verifica-se que o mesmo inclui: - uma fatura de outubro precisamente a fatura relativa ao ponto 86 dando nota do valor em dívida de € 1660,50 (sendo que o demais valor faturado se mostra pago através da liquidação a que corresponde o doc. 44 a fls. 300 dos autos) - uma outra fatura de novembro igualmente liquidada nos termos indicados no doc. 44, ora a fls. 301; - uma fatura de dezembro de 2015 a qual se mostra paga a fls. 476 (liquidação de 16/02/2016) e finalmente - a FT ....../.... datada de 08/01/2016 de € 1186,66 com data limite de pagamento em 07/02/2016 [realça-se que o aviso é datado de 09/02/16]. De referir ainda que deste aviso de suspensão (doc. 5) mais consta: “Na ausência de pagamento das faturas supra referidas até 20 dias após a data de emissão da presente carta, ficará impedido de realizar comunicações e a reativação das comunicações será condicionada ao pagamento integral dos valores indicados. A reativação do serviço será efetuada no prazo máximo de 24 horas após o registo do pagamento da sua conta B...” Analisados os documentos juntos aos autos, tal como o tribunal a quo deu nota, verifica-se que anteriormente a este aviso a R. juntou aos autos vários outros avisos, nomeadamente: datado de 01/02/16 com o mesmo assunto de “Aviso de suspensão” e a mesma advertência de impedimento de realizar comunicações no caso de não pagamento em 20 dias, tendo por referência a fatura mencionada em 86 dos factos provados e mais duas faturas, uma já paga em dezembro de 2015 e outra que viria a ser paga em 16/02/16; um outro aviso de “suspensão”, com as mesmas advertências, datado de 23/01/16 no qual é pedido de igual forma o pagamento das mesmas faturas do aviso de 1/02/2016 (com as mesmas incorreções portanto); aviso este precedido de um aviso de atraso de pagamento datado de 20/01/16 relativo às mesmas faturas; ainda e com data de 12/01/16 foi emitido um outro aviso de atraso de pagamento no qual são incluídas como faturas a pagar 5 faturas que haviam já sido pagas a 15/12/15 (a referida em 86 com pagamento parcial, atenta a retificação aguardada quanto ao valor de € 1660,50) e uma última fatura (vencida a 06/01) que viria a ser paga em fevereiro de 2016. Sendo este aviso de janeiro, uma repetição do aviso de suspensão datado de 12/12/15 quanto às faturas nele elencadas, com exceção da última fatura introduzida no aviso de janeiro, pois só então se venceria. Ocorrendo o pagamento posteriormente a este aviso (recorda-se o pagamento ocorreu em 15/12/15) [em causa os docs. juntos pela R. a fls. 436 a 447 como docs. 5 e 6]. Para além destes docs. e para o que ora releva, importa ainda levar em consideração o já mencionado doc. 45 de fls. 303 (a que o ponto 86 dos factos provados se reporta) do qual se extrai a afirmação por parte da R. de que estava então em dívida os mencionados € 1660,50, (causa do bloqueio) para além de um acerto a efetuar de € 59,71 na sequência de NC pela mesma R. emitida e indevida. Analisado o depoimento da testemunha D... convocado pela recorrente do mesmo nada se extrai em favor da pugnada alteração da recorrente. Esta testemunha afirmou que em dezembro de 2015 liquidam tudo o que está em dívida, exceto a parcela relativa ao serviço técnico (o valor referido em 86 dos factos provados) porquanto a B... ficou de o corrigir. Tendo no entretanto entrado em licença de maternidade disse quanto à fatura com vencimento em 07/02/16 de € 1186,66 não saber em concreto o que se passou. Afirmando que pelo seu pagamento deveria ter sido emitida nota de liquidação (à semelhança das notas de liquidação emitidas e juntas aos autos a fls. 472 a 477). Sendo um facto que aos autos não se mostra junta a nota de liquidação desta fatura, com vencimento em fevereiro, também é uma realidade o informado pela B... em abril no documento de fls. 303 vindo de analisar. Este documento da autoria da aqui R. enquanto documento particular cuja autoria foi pela mesma reconhecida, faz prova plena quanto às declarações no mesmo contidas (vide 376º do CC). Implicando que os factos compreendidos na declaração se consideram provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante. Neste contexto, à R. incumbiria afastar - mediante a arguição de falsidade do documento ou de eventual vício de vontade justificativo da anulação da declaração confessória (vide 359º do CC) – o valor probatório deste mesmo documento e assim a declaração confessória de que o bloqueio se deveu a faturação por liquidar e que então os valores em aberto eram de € 1660,50 para além do valor a acertar, já acima mencionado. Neste contexto, não se vê que o ponto 87 dos factos provados mereça qualquer censura por erro na apreciação da prova. Termos em que se conclui pela improcedência da alteração requerida. Do facto provado 91. Quanto a este facto fundou o tribunal a quo a sua convicção nos seguintes termos: “Quanto ao facto provado nº 91, o tribunal valorou o teor dos documentos de fls. 298 e 478 a 536 dos autos, levando ainda em consideração o horário de laboração da Autora que já havia sido dado como provado.” A recorrente pretende a alteração da redação dada a este ponto para: “No ano de 2015, a Autora prestou serviços e vendeu acessórios e peças do seu comércio no montante de € 9.575.008,06, o que perfaz uma média de faturação diária de € 26.232,89, ou seja, a quantia de € 3.729,11/hora.” E para o efeito, contrapondo a valoração do tribunal aos docs. mencionados na sua fundamentação, convocou unicamente o teor do doc. de fls. 478 a 536 dos autos – IES de 2015, nomeadamente rubrica ..... relativa à verba de “Vendas e serviços prestados”. Da qual retira o valor de € 9.575.008,06 ao invés dos considerados, pelo tribunal, € 10.671.230,74. A fls. 298 consta o Balancete de Razão (Abertura a Regularizações de 2015), onde e sob a verba vendas é indicado o valor acumulado de 2015 a crédito de € 10.671.230,74, ou seja precisamente o valor dado como apurado pelo tribunal. Porém relativamente a esta mesma verba, consta também o valor acumulado a débito de € 1.023.907,10 e ainda o saldo acumulado (diferença entre crédito e débito) de € 9.647.323,64. Estes valores não foram explicados por parte da A.. O balancete razão é um resumo dos movimentos a débito e a crédito num determinado momento da vida empresarial. O IES corresponde à declaração anual apresentada pela empresa ao Estado – Informação Empresarial Simplificada – e respeita às contas anuais da empresa. Como tal merece credibilidade. Analisada a IES relativa ao ano de 2015 verifica-se a indicação clara e individualizada de que o valor de vendas e serviços neste mesmo ano foi de € 9.575.008,06. Este deve ser como tal o valor a considerar, tal como pugnado pela recorrente, para o cálculo do valor hora de faturação. Para tanto relevando considerar o horário de trabalho da A. provado e constante do ponto 4 dos factos provado (horário à data dos factos). Considerando que a A. trabalhava então 5 dos 7 dias da semana, isso significa que em média num ano trabalhava 260 dias, 8 horas por dia. Considerando o valor apurando anual, significa um volume diário de faturação de € 36.826,95 [9.575.008,06: 260]. E um valor hora de € 4.603,37 [36.826,95: 8]. Impõe-se assim a correção da redação dada ao ponto 91 dos factos provados, nos seguintes termos: “91. No ano de 2015, a Autora prestou serviços e vendeu acessórios e peças do seu comércio no montante de € 9.575.008,06, o que perfaz uma média de faturação diária de € 36.826,95, ou seja, a quantia de € 4.603,37/hora.” Procede portanto e parcialmente a reapreciação da matéria de facto apontada pela recorrente R., quanto a este ponto 91. Recurso da autora. Dos factos provados – nº 11 e dos factos não provados – nº 1. Quanto a estes factos fundou o tribunal a quo a sua convicção nos seguintes termos [em causa os termos da celebração contratual]: “(…) Os únicos factos controvertidos correspondem ao facto provado nº 11 e ao facto não provado nº 1. A base factual destes factos constava dos arts. 12º e 133º da p.i. e dos arts. 6º e 75º a 79º da contestação. Ora, em sede de julgamento, a legal representante da Autora não alegou que o conteúdo do contrato tenha sido imposto pela Ré, antes referindo que já eram clientes, que houve conversações tendentes à celebração de um novo contrato (abordaram a Ré com vista à nova solução pretendida – central telefónica adaptada à dimensão da empresa – e a Ré apresentou uma minuta de contrato, lida à declarante pelos representantes da Autora, referindo, no entanto, que não lhe foi totalmente explicado o conteúdo), que leu a minuta apresentada pela Autora (muitas páginas), que lhe pareceu igual ao anterior contrato, que não fez perguntas sobre o contrato porque não quis e que aceitou aquele contrato. Ora, a acrescer a este relato da legal representante da Autora (elucidativo da forma como se processou a contratação em análise), cumpre referir os depoimentos das testemunhas U... e L... (funcionários da Ré), os quais, em depoimentos que mereceram credibilidade (dada a forma objetiva e pormenorizada do relato e, por não dizê-lo, corroborado, ao menos em parte, pelas declarações da legal representante da Autora), afirmaram que na contratação da área corporate da Ré existe uma negociação próxima e concreta com o cliente que vai celebrar o contrato, sendo enviado um texto contratual pela Autora (justificada a elaboração prévia deste texto, além do mais, pela obrigação legal – Lei das Comunicações Eletrónicas – de ser aposto no contrato determinado conteúdo, conforme foi referido pela testemunha U...), o qual pode ser objeto de alterações sob proposta do cliente (que ocorrem com frequência, conforme foi referido pelas mencionadas testemunhas, referindo a testemunha U... exemplos concretos de tais alterações).” * A recorrente – pugnando pela introdução do ponto 1 dos factos não provados nos factos provados e pela eliminação destes do facto provado 11 – convocou em abono da sua tese os depoimentos da legal representante da autora e da testemunha U....A recorrida, na resposta a este recurso, convocou de igual modo os mesmos depoimentos, bem como ainda o depoimento da testemunha L... para concluir pelo bem decidido pelo tribunal a quo. Foram ouvidos na íntegra os depoimentos prestados e gravados das testemunhas e legal representante da A. pelas partes convocados. E em suma resta-nos afirmar a correção da apreciação feita pelo tribunal a quo. A legal representante confirmou que sendo já cliente B... disse o que pretendiam para o seu trabalho / disse que queriam determinado contrato, com determinado serviço e prazo e B... apresentou solução contratada – um documento com muitas páginas que “lemos”, mas “nada nos foi explicado”. Sendo um contrato semelhante ao anterior, disse apenas que lhe disseram para estar descansada pois seria a solução pretendida (e mais em concreto sobre a negociação, de relevante, nada disse). Por seu turno a testemunha U... esclareceu que o contrato é remetido à empresa a quem é dado tempo para ler e concordando assina. Afirmou ser dada margem ao cliente (corporate) para propor alterações ao clausulado que já está pré-elaborado e é enviado ao cliente e quando solicitadas são apreciadas pelo departamento jurídico e comercial, podendo ou não ser aceites até porque e conforme referiu parte do clausulado é regulado pela ANACOM [tendo no decurso do seu depoimento exemplificado com situações concretas em que tais alterações consigo diretamente já se verificaram]. Assim reafirmou que remetido o contrato pode a empresa negociar o que bem entender. Tendo em 2013 sido comunicadas as cláusulas que o cliente pôde ler e assinou. No mesmo sentido depôs a testemunha L.... Afirmou ter estado presente nas negociações de 2013. Não ter a A. manifestado a intenção de alterar qualquer cláusula, o que era possível. Mais disse ter sido enviado por email o clausulado que a cliente assinou sem ter sugerido qualquer alteração. O depoimento destas testemunhas foi prestado de forma coerente e com aparente isenção, demonstrando dos factos conhecimento, merecendo por tanto credibilidade. Em conclusão, não merece censura o decidido pelo tribunal a quo nestes pontos. Termos em que se conclui pela improcedência da alteração requerida pela recorrente autora. * 3) Do erro na aplicação do direito.Em função do acima enunciado cumpre apreciar de direito, tendo presente que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, não obstante e sem prejuízo do limite imposto pelo artigo 609º quanto ao objeto e quantidade do pedido, não estar o tribunal vinculado às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito [vide artigo 5º nº 3 do CPC]. Entre as partes foi celebrado no dia 3/07/2013 um contrato de prestação de serviços de comunicações eletrónicas, definidos estes no artigo 3º al. ee) da Lei das Comunicações Eletrónicas [LCE] aprovada pela Lei nº 5/2004, de 10-02 [na versão em vigor à data da celebração do contrato] como o “serviço oferecido em geral mediante remuneração, que consiste total ou principalmente no envio de sinais através de redes de comunicações eletrónicas, incluindo os serviços de telecomunicações e os serviços de transmissão em redes utilizadas para a radiofusão, sem prejuízo da exclusão referida nas alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 2º”. Contrato este do qual obrigatoriamente devem constar os elementos definidos no artigo 48º desta mesma Lei. Estando ainda no que à suspensão e extinção do serviço prestado concerne, sujeito à limitação imposta pelo artigo 52º desta mesma Lei das Comunicações Eletrónicas[3] porquanto a aqui A. contratou os serviços em questão para uso profissional no âmbito da sua atividade profissional[4]. Regulando o artigo 54º desta mesma Lei o regime da portabilidade dos números[5] Mais e porque abrangido o serviço de comunicações eletrónicas pela Lei dos Serviços Públicos Essenciais, está este mesmo contrato sujeito às regras estabelecidas em tal diploma legal para proteção do utente – considerado este como “a pessoa singular ou coletiva a quem o prestador do serviço se obriga a prestá-lo” [vide artigo 1º nºs 1, 2 al. d) e nº 3]. De entre os deveres estipulados por este diploma legal de realçar o princípio geral consagrado no artigo 3º que impõe ao prestador do serviço a obrigação de “proceder de boa-fé e em conformidade com os ditames que decorram da natureza pública do serviço, tendo igualmente em conta a importância dos interesses dos utentes que se pretende proteger”; a obrigação de “informar, de forma clara e conveniente, a outra parte das condições em que o serviço é fornecido e prestar-lhe todos os esclarecimentos que se justifiquem, de acordo com as circunstâncias.”; a obediência a elevados “padrões de qualidade, neles devendo incluir-se o grau de satisfação dos utentes, especialmente quando a fixação do preço varie em função desses padrões” (vide artigo 7º); ainda no que à suspensão do fornecimento do serviço concerne as limitações impostas pelo artigo 5º[6], à semelhança do previsto no artigo 52º da LCE, ao qual aliás faz referência. Finalmente do artigo 11º desta mesma Lei decorre recair sobre o prestador de serviços o ónus de prova: “1- (…) de todos os factos relativos ao cumprimento das suas obrigações e ao desenvolvimento de diligências decorrentes da prestação dos serviços a que se refere a presente lei. 2- (…) da realização das comunicações a que se refere o artigo 10.º, relativas à exigência do pagamento e do momento em que as mesmas foram efetuadas.” O serviço em análise abrange o telefone (da rede fixa e móvel), internet e a televisão por cabo. Este serviço é legalmente considerado um serviço público essencial, integrando, desde 2008, o elenco constante da Lei dos Serviços Públicos Essenciais [doravante LSPE] (Lei nº 23/96, de 26-07, com sucessivas alterações) – cfr. art. 1º, nº 2, al. d). Assim enquadrado o regime jurídico específico aplicável ao contrato em análise, cuja qualificação de resto as partes não discutem, importa analisar em concreto as questões suscitadas em sede de direito por A. e R.. Sendo em primeiro lugar apreciado o recurso da A. já que a eventual procedência do por si pugnado terá influência no fundamento de recurso da R.. Do recurso da A.. Da nulidade da cláusula 7ª[7] do contrato sub judice por contrária à boa-fé e por absolutamente proibida nos termos dos artigos 15º e 18º al. c) do DL 446/85 [vide conclusões 3ª a 7ª do recurso da A.]. Para a apreciação desta questão, importa previamente definir o âmbito de aplicação material do regime legal convocado pela recorrente e instituído pelo DL 446/85 de 25/10 [com as alterações relevantes introduzidas pelo DL 220/95 e DL 249/99 que visaram adaptar este diploma de 85 às orientações comunitárias da Diretiva n.º 93/13/CEE, do Conselho, de 5 de Abril, ampliando nomeadamente o seu âmbito material]. Este tem como âmbito de aplicação material quer os contratos que incorporam cláusulas contratuais gerais quer os contratos dirigidos a pessoa ou consumidor determinado mas em cujo conteúdo determinado não pôde influir e visa a salvaguarda dos interesses da parte negocialmente mais fraca, justificada por uma realidade social em que a negociação privada, assente no postulado da igualdade formal das partes, deixou de corresponder “muitas vezes, ou mesmo via de regra, ao concreto da vida.”, os denominados contratos de adesão [conforme consta do preâmbulo do citado DL]. Assim e nos termos do artigo 1º é definido o seu âmbito de aplicação nos seguintes termos: “1 - As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respetivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma. 2 - O presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar.” O nº 1 especificamente se reporta às cláusulas contratuais gerais e o nº 2 aos contratos de adesão. O contrato de adesão, contrato singular/individualmente celebrado pode caracterizar-se “como aquele cujo conteúdo clausular é unilateralmente definido por um dos contraentes que o apresenta à contraparte, não podendo esta discutir qualquer das suas cláusulas: ou aceita em bloco a proposta contratual que lhe é feita ou a rejeita e prescinde da celebração do contrato”[8]. A precedência de um período de conversações não afasta necessariamente a integração de uma relação contratual neste conceito quando a não discussão no todo ou em grande parte do conteúdo clausular e a impossibilidade de influenciar esse mesmo clausulado permanecem uma realidade. Sendo aliás neste contexto que se entendem as previsões contidas quer nos artigos 5º e 6º que exigem cuidados acrescidos na comunicação e informação do conteúdo do clausulado quer no artigo 21º quando nas als. a) e c) se reporta às obrigações assumidas na “contratação” fazendo antever um período prévio de conversações[9]. Nesta forma de contratar as cláusulas são unilateralmente predispostas para um contrato específico. Uma padronização do clausulado não é de estranhar, na medida em que contratos como o dos autos têm de obedecer a requisitos específicos como os impostos pelo já mencionado artigo 48º da LCE. O ponto de charneira no contrato de adesão em causa nos autos, será contudo, frisa-se, a já mencionada possibilidade real de influenciar o conteúdo clausular. No nº 3 do artigo 1º o legislador estabeleceu uma presunção de não negociação prévia das cláusulas contratuais, na medida em que definiu recair sobre o interessado em se prevalecer do seu conteúdo o ónus de prova da existência de negociação prévia, como forma de evitar a sujeição às regras estabelecidas neste regime. Assim dispõe o citado artigo 1º nº 3 : “3 - O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo.”. A propósito do contraente onerado com esta prova, a doutrina tem divergido na interpretação deste normativo. Sousa Ribeiro[10] defende numa interpretação restritiva ser o “regime de prova estabelecido no nº 3 (…) restrito às cláusulas contratuais gerais, cabendo à contraparte do utilizador, no que respeita às cláusulas individualizadas, provar a falta de negociação”. E justifica esta distinção de regimes quanto ao ónus de prova atentas as realidades contratuais distintas (p. 109) “corporizadas nos contratos de adesão que incorporam cláusulas contratuais gerais e nos contratos de adesão individualizados. Nos primeiros, a falta de negociação está por assim dizer in re ipsa: se estamos perante uma cláusula contratual geral (…) uniformemente aplicada, sem modificações, numa multiplicidade de contratos e também naquele que está em causa, essa qualidade tem um fortíssimo valor indiciário de que não foi dada oportunidade ao aderente de influenciar o conteúdo. Se excecionalmente assim não foi, cabe ao utilizador prová-lo (…). No caso de um contrato individualizado, de conteúdo moldado pelas particularidades da relação concretamente estabelecida entre sujeitos determinados, não dispomos à partida de qualquer base concludente para uma presunção. Na verdade a falta de negociação é então elemento bastante para a constituição do direito a gozar da tutela conferida pelo diploma, surgindo desacompanhado de qualquer outro elemento relevante, do qual ela se pudesse inferir. Está justificado, a nosso ver, que caiba ao interessado a sua prova.” Ana Prata in ob. cit. p. 175, discordando da posição deste autor quanto à interpretação restritiva da norma, reconhece todavia a necessidade de em sede de ónus da prova da negociação merecer tratamento diferente a sua aplicação à cláusula contratual geral versus o contrato de adesão individual. E assim afirma, no primeiro “a padronização do conteúdo contratual constitui uma espécie de presunção de que a(s) cláusula(s) não foi(ram) negociadas; no segundo, sendo o contrato único, pode o tribunal duvidar da alegação do aderente de que não existiu negociação do contrato. Neste último caso das duas uma: ou é o aderente a invocar a invalidade da cláusula por força do regime deste diploma e terá de provar a falta de negociação que não é ostensiva; ou é o predisponente a invocar a cláusula e o aderente a contestá-la com fundamento neste Decreto-Lei e não há razão – apesar de não ser aparente que o contrato não foi negociado – para afastar esta norma sobre o ónus de prova” E portanto conclui que o “nº 3 inverte o ónus de prova do carácter negociado (ou não) de um contrato para o contraente que invoque uma sua cláusula; que tratando-se de contrato concluído com base em cláusulas contratuais gerais constituirá em princípio facto notório (ou ao menos presunção ilidível) a sua não negociação; que nos contratos de adesão individuais, ao aderente só é exigível a prova da sua não negociação na medida em que invoque contra o outro contraente uma disposição deste Decreto-Lei, ao predisponente se aplicando este nº 3 sempre que ele pretenda prevalecer-se de direito atribuído por uma cláusula contratual” (mesma autora in ob. cit. p. 180). Concluindo para ambos os autores, estando em causa um contrato de adesão como no caso sub judice e pretendendo o aderente fazer-se valer de uma disposição legal deste DL como forma de afastar a aplicação de uma cláusula do contrato, sobre o mesmo recai o ónus de prova da não negociação. No mesmo sentido se tem pronunciado o nosso tribunal superior. Assim no Ac. de 10/05/2007, Relator João Bernardo in www.dgsi.pt decidiu-se caber à parte que se quer fazer valer da aplicação deste regime legal e nomeadamente beneficiar da invalidade de cláusulas contratuais gerais o ónus de provar que as cláusulas cuja validade questiona se enquadram em tal regime, afastando o entendimento de em causa estarem factos notórios não carecidos de prova[11]. O ónus de prova da não negociação in casu recaía portanto sobre a aqui A.. O tribunal a quo, no seguimento desta interpretação e concluindo ser exigível à parte a prova da não negociação, afastou a aplicação do regime das cláusulas contratuais gerais ao contrato em análise em função do dado como provado sob o ponto 11 dos factos provados e ponto 1 dos factos não provados que apesar de atacado pelo A. não mereceu alteração. Pode ler-se em tal fundamentação, que por estar em linha com o antes exposto em parte se reproduz: “A qualificação de determinado contrato como de adesão pressupõe que se dê como demonstrada a existência de uma imposição unilateral de cláusulas prefixadas, mesmo que o tenham sido para modelar o conteúdo de uma única relação. Quer dizer, a qualificação depende, exclusivamente, da questão de saber se o conteúdo das cláusulas pode ser imputado a ambas as partes, ou se, pelo contrário, ele resulta de um “Diktat” unilateral, da imposição, por um dos contraentes, de uma prévia conformação inegociável. (…) o que conta é a “possibilidade real de uma influência modificadora no conteúdo da cláusula” ou, dito doutro modo, a preformulação só é factor de aplicação do regime especial de tutela quando afaste a possibilidade de participação da contraparte na modelação do conteúdo. Mas os dois dados têm que vir ligados por um nexo causal, só relevando a impossibilidade de influência que resulte da prefixação rígida do conteúdo (cfr. Joaquim de Sousa Ribeiro,…). (…) A norma do nº 3 do art. 1º do RJCCG (acrescentada, como nº 2, na altura, pelo DL nº 220/95, de 31-08) pretendeu dar um contributo para a questão agora em análise, estabelecendo que “o ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo”. Contudo, a interpretação desta norma tem dado origem a diferentes entendimentos. A natureza de adesão de um contrato ou de uma contratação não pode ser afirmada, em regra, em face do mero texto do contrato (sendo necessário que se demonstre em que contexto e circunstâncias ele foi celebrado e/ou assinado para que se possa concluir que estamos perante um contrato de adesão). Por outro lado, como acima já foi referido, a elaboração de um determinado clausulado contratual por uma só das partes, com consequente submissão de tal clausulado à contraparte, se pode indiciar a natureza de adesão do contrato, não constitui certeza de tal natureza, uma vez que pode ser normal uma das partes dar início à negociação contratual com a entrega de um projeto de clausulado, abrindo-se, a partir daí, a negociação mais ou menos extensa de tal clausulado. Contudo, quando o contrato se apresenta como um formulário com conteúdo inalterável e espaços destinados ao preenchimento de aspetos parcelares do negócio pode-se (presunção natural) deduzir sem mais do texto do contrato e da aparência do documento que o contém estarmos um contrato de adesão (não excluindo a possibilidade de, mesmo nesta forma de contratos, haver clientes com capacidade e vontade negocial para forçar a alteração de algumas das cláusulas propostas). Assim, como é referido no Ac. RP, de 17/03/2016 (relator: Aristides Rodrigues de Almeida; in www.dgsi.pt), a parte que pretende beneficiar do regime jurídico correspondente deve alegar factos destinados a caracterizar o contrato como contrato de adesão (quer dizer, deve alegar que o contrato não foi objeto de negociação [prévia]), só então recaindo sobre a parte que se pretende fazer valer do documento (e do seu conteúdo) os ónus de alegação e prova previstos no RJCCG, designadamente, da negociação individual (se o objetivo for excluir o contrato desse Regime) ou da comunicação e da informação das cláusulas (para demonstrar, à luz desse regime, a validade da inserção das cláusulas que o compõem; podendo, depois, colocar-se a questão da validade do conteúdo de tais cláusulas). Em sentido parcialmente coincidente (com o qual concordamos e aderimos), entende Joaquim de Sousa Ribeiro (ob. cit, pags. 223 a 226) que a presunção de falta de negociação prevista no nº 3 do art. 1º do RJCCG (norma introduzida pelo DL nº 220/95, de 31-08) apenas se aplica nos casos de adesão a cláusulas contratuais gerais (não se aplicando nos casos de adesão a cláusulas individualizadas), fundamentando esta posição com recurso ao texto da Diretiva nº 93/13/CEE e a uma justificação material evidente. De facto, nas cláusulas ajustadas para uma relação singular, não se vislumbra, à partida, qualquer elemento objetivo que nos diga, com uma boa dose de verosimilhança, se o contrato é de adesão ou não. Não há assim, qualquer base factual legitimadora de uma presunção no primeiro sentido. E a falta de negociação é, nesta hipótese, o requisito autonomamente constitutivo do direito, que um dos contraentes se arroga, a beneficiar do particular regime de tutela que a tem por pressuposto. De acordo com os critérios gerais, cabe-lhe a ele a respetiva prova. No caso dos autos, a Autora não logrou provar que as cláusulas do contrato sub judice não foram objeto de negociação entre as partes, i.e., não logrou provar que se tratava de um contrato de adesão (cfr. facto não provado nº 1), provando-se antes que foi dada à Autora a possibilidade de negociar os termos do contrato previamente à respetiva celebração (cfr. facto provado nº 11). Assim, o RJCCG mostra-se excluído do regime jurídico aplicável ao contrato em causa nos autos.” Por tudo o exposto e concordando-se com o decidido pelo tribunal a quo tem de se concluir pela exclusão do regime do DL 446/85 ao contrato em causa com a consequência de improceder a invocada nulidade da cláusula 7ª ao abrigo dos normativos invocados pela recorrente. Alegou em seguida a recorrente, a improceder a nulidade da cláusula em questão ao abrigo do regime das CCG, a nulidade da mesma ao abrigo do artigo 809º do CC. Em causa a nulidade da cláusula “pela qual o credor renuncia antecipadamente a qualquer dos direitos que lhe são facultados nas divisões anteriores nos casos de não cumprimento ou mora do devedor, salvo o disposto no n.º 2 do artigo 800.º” Tem vindo a ser entendido quer pela doutrina quer pela jurisprudência que o artigo 809º do CC não proíbe que as partes convencionem a exclusão ou limitação de responsabilidade do devedor nos casos de culpa leve, implicando que fora destas situações e quando em causa estejam situações de culpa grave ou dolo a cláusula será na verdade nula. A justificação apresentada para esta distinção radica no entendimento de que ao aceitar-se a validade de tais cláusulas – restritas à culpa leve – não se estará perante uma renúncia ao direito de indemnização (cuja proibição resulta do artigo 809º), não violando então tais cláusulas limitativas e de exclusão forçosamente a lei[12]. Então a possibilidade circunscrita à culpa leve, não “representa mais do que uma forma de fazer depender a responsabilidade do devedor de uma culpa qualificada(…) definindo-se assim antecipadamente - e por acordo - os termos da responsabilidade debitória, fixando os contraentes os pressupostos de que ficará dependendo a imputação da responsabilidade. Não haverá assim propriamente uma renúncia do credor à indemnização, antes uma alteração por acordo dos termos em que será apreciado um dos requisitos da responsabilidade: a culpa”[13]. É ainda invocado como argumento favorável a esta interpretação a própria limitação contida no artigo 18º al. c) do DL 446/85 declarando em absoluto nulas as CCG que excluam ou limitem a responsabilidade por não cumprimento definitivo, mora ou cumprimento defeituoso em caso (apenas) de dolo ou culpa grave. O tribunal a quo seguindo esta interpretação do artigo 809º declarou a validade da cláusula porquanto a mesma excluiu/limitou a responsabilidade à culpa leve, com ressalva precisamente dos casos de dolo ou culpa grave [vide ponto 12 dos factos provados]. No seguimento da jurisprudência e doutrina que citámos e com a qual concordamos, entende-se não assistir razão à pretensão da recorrente que também neste fundamento improcede. Tendo por base a exclusão/limitação da responsabilidade em caso de culpa leve, o tribunal a quo julgou improcedente o pedido indemnizatório da A. relativo ao período de 01/01/2015 a 26/11/2015. Nas sua conclusões a recorrente alega que os extensos factos provados constantes dos nºs 13) a 69) relativamente ao incumprimento da R. evidenciam um juízo de culpa grave, para além de sobre a R. recair a presunção de culpa quanto ao incumprimento defeituoso demonstrado no período em questão nos termos do artigo 799º do CC, implicando à mesma incumbir afastar tal presunção [vide conclusões 8 a 12]. Por esta via tendo concluído que a ação deveria ter sido julgada totalmente procedente. Das conclusões resulta portanto ser também objeto do recurso esta parte decisória, ao contrario do que a recorrida alegou em resposta. Sendo correta a invocada presunção de culpa, alega a recorrente que à recorrida incumbia o ónus de provar que o seu comportamento não extravasa as fronteiras da culpa leve, ao contrário do que afirmou o tribunal a quo : que à A. recaia o encargo de provar a atuação dolosa ou com culpa grave da R.. Não obstante o assim afirmado pelo tribunal a quo e sem prejuízo de entendermos que efetivamente sobre a R. incumbia fazer a prova de todos os factos relativos ao cumprimento das suas obrigações – em respeito pelo estabelecido no artigo 11º da LSP (Lei 23/96 de 26/07 e suas subsequentes alteração denominada Lei dos Serviços Públicos) e assim também a prova de que no caso atuou com culpa leve (para efeitos de exclusão da aplicação da cláusula 7ª), facto é que em função da muita factualidade apurada, para o efeito decidiu o tribunal a quo improceder a pretensão da A. na parte do pedido julgado improcedente e ora em causa, porquanto analisou essa factualidade e da mesma concluiu que a conduta da R. não é passível de um juízo de censura de dolo ou culpa grave, mas antes e tão só de culpa leve. A implicar que a questão do ónus da prova é para o caso irrelevante, pois a decisão foi baseada na análise factual e sua interpretação e não com base em aplicação de regras de direito, nomeadamente ónus probatórios perante factualidade omissiva. A este tribunal de recurso cabe apenas apreciar a factualidade apurada e perante a mesma concluir se esta permite um juízo de censura a título de dolo ou culpa grave, ou antes culpa leve como foi o juízo do tribunal a quo. Para tanto tendo presente a distinção tradicionalmente apresentada entre culpa grave, leve ou levíssima convocada no Ac. STJ de 16/12/2010, Relator Serra Baptista in www.dgsi.pt que seguimos: “A propósito do grau de culpabilidade costumam os autores distinguir, dentro da doutrina tradicional, entre culpa lata (grave ou grosseira), culpa leve ou culpa levíssima. Correspondendo a culpa grave a uma situação de negligência grosseira, em que a conduta do agente só seria susceptível de ser realizada por uma pessoa especialmente negligente, uma vez que a grande maioria das pessoas não procederia da mesma forma. Sendo a culpa leve a omissão da diligência normal: a conduta do agente não seria susceptível de ser praticada por um homem médio, correspondendo a sua atuação à omissão da diligência do bonus pater famílias. Correspondendo a culpa levíssima, por seu turno, a omissão de cuidados especiais que só as pessoas muito prudentes e escrupulosas observam (17).” A este propósito excursou o tribunal a quo: “Os extensos factos dados como provados sob os nºs 13 a 69 permitem, sem dúvida, qualificar como cumprimento defeituoso da prestação a atuação da Ré acabada de descrever. Assente o cumprimento defeituoso do contrato pela Ré (isto é, a desconformidade entre a conduta devida e o comportamento observado), importa saber a conduta da Ré é culposa (i.e., passível de um juízo de censura por incompetência e/ou falta de diligência ou zelo). Como já foi referido, na responsabilidade civil contratual a lei estabelece uma presunção de culpa do devedor, incumbindo a este provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua (art. 799º, nº 1, do CC). É aqui que entronca uma questão nuclear para a resolução do litígio em causa nos autos, traduzida na invocação, pela Ré, da existência, no contrato celebrado, de uma cláusula limitativa ou de exclusão da sua responsabilidade. A Autora reclama nos autos o pagamento de lucros cessantes a título de indemnização (i.e., o valor que deixou de obter, já que certamente teria vendido produtos do seu comércio pelo menos no montante que agora reclama). Efetivamente, a Autora contabilizou em € 80.034,29 o prejuízo, respeitante ao período temporal entre 01/01/2015 e 26/11/2015, relativo ao impedimento de encomenda de artigos pelos seus clientes e consequente impossibilidade de venda dos mesmos. De igual modo, a Autora contabilizou em € 37.052,85 o prejuízo respeitante ao bloqueio (ilegal) dos serviços entre os dias 08/03/2016 e 09/03/2016, traduzido no impedimento de comercialização dos seus produtos e consequente impossibilidade de venda dos mesmos. Alega a Ré que a cláusula 7ª do contrato celebrado exclui a indemnização por lucros cessantes, sendo certo que esta cláusula é perfeitamente admissível ao abrigo do disposto nos arts. 809º e 800º, nº 2, do CC (alegando ainda a Ré que a Autora não concretizou uma única venda que não tenha sido feita em consequência das ocorrências em causa). Contrapõe a Autora que tal cláusula está ferida de nulidade por contrária à boa-fé e é absolutamente proibida, à luz do RJCCG (arts. 15º e 18º, als. c) e d)), sendo certo que incumbiria à Ré provar que esta cláusula decorreu de negociação prévia entre as partes e que foram observados os deveres de comunicação e informação. Alega também a Ré que tal cláusula não é admissível à luz do disposto no art. 809º do CC, sendo certo que a mesma não alteraria as regras do ónus da prova (art. 799º do CC), cabendo à Ré provar que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua.” E efetuada a análise da validade da cláusula em questão, após excluir a aplicação do regime das CCG e concluir pela sua validade nos termos do artigo 809º do CC nos termos acima já deixámos enunciados e sobre os quais expressámos o nosso acordo, sobre a apreciação da culpa concluiu o tribunal a quo: “Não se desvaloriza a frequência e o prolongamento no tempo dos problemas. Contudo, os problemas surgiram sem intervenção direta da Ré (no sentido de terem ocorrido por questões técnicos, não totalmente domináveis pela Ré e sem que a vontade desta tenha interferido em tal ocorrência), podendo a censura ser unicamente dirigida ao facto de não ter providenciado convenientemente pela reparação do problema que estava na base das anomalias, sendo certo, no entanto, que os factos provados espelham que a Ré, quando diretamente acionada pela Autora para a existência e necessidade de resolução dos problemas, providenciou, nomeadamente através do parceiro que dava apoio ao suporte técnico, pela resolução do problema, com intervenções ao nível dos equipamentos, sem que, no entanto, tenha sido cabalmente resolvido o problema. Em suma, não existe, em nosso entender, possibilidade de sustentação de um juízo de culpa grave inerente ao cumprimento do contrato pela Ré, no que respeita à responsabilidade contratual que lhe era imputada pela Autora, reportada ao período temporal situado entre 01/01/2015 e 26/11/2015, com prejuízos lucros cessantes contabilizados pela Autora no montante de € 80.034,29), prevalecendo, portanto, a aplicação da «cláusula sétima» do contrato (cláusula de exclusão da responsabilidade da Ré por culpa leve ou de limitação da responsabilidade da Ré aos casos de dolo ou culpa grave), com consequente improcedência, nesta parte, da ação.” Importa para além do juízo que acima se reproduziu, realçar os seguintes pontos: a relação contratual teve o seu início em 3/07/2013 e até à data da denúncia do contrato em 01/12/2015 os serviços foram sendo prestados (portanto durante o período de quase dois anos e meio). Durante tal período e num contexto de utilização semanal de 2ª a 6ª feira num horário laboral das 9h00 às 12.30 e das 14.30 às 19 h (portanto num horário laboral de 8 horas diárias) ocorreram os incidentes que retratam os factos provados 13 a 69 e que corresponderam a um tempo de bloqueio das chamadas de 16 horas e 12 minutos (vide factos provados 79 a 81). Não se desmerecem os múltiplos incidentes reportados e o transtorno pelos mesmos causados implicando um bloqueio das chamadas por um período correspondente sensivelmente a 2 dias completos de trabalho. Apenas se pretende realçar que a atuação da R. e seus parceiros de assistência não foi durante todo este período contratual omissiva. Antes e conforme o evidenciam os factos provados ocorreram diversos contactos e tentativas de solucionar os problemas. O que de forma definitiva não se logrou. Aliás diretamente a R. só foi interpelada, de acordo com a factualidade provada, pela 1ª vez em janeiro de 2015 (vide facto provado 30). Os problemas tinham origem no software da central (vide facto provado 41), e a R. diretamente foi comunicando estar a tentar resolver o problema (vide 45 a 50, 62 e 63, 66, 68 dos factos provados). Problemas que a A. ia conseguindo solucionar (sem eliminar a causa dos mesmos entenda-se) conforme resulta dos pontos 59 e 67 dos factos provados. Relembrando os conceitos de culpa grave por referência a situação de negligência grosseira e culpa leve por referência à omissão da diligência normal tendo por referência a diligência do bónus pater famílias, sem olvidar o especial dever da R. em prestar um serviço baseado em elevados padrões de qualidade (artigo 7º da LSP), entende-se demonstrado que a R. foi acompanhando as queixas da A.; o suporte técnico quando contactado diligenciou pela solução que pontualmente conseguia mas não de forma definitiva e a R. a partir do momento em que diretamente foi interpelada foi acompanhando a situação, tentando obter solução definitiva para o problema ainda que não tenha logrado solucionar a causa do mesmo. Do exposto conclui-se não merecer a conduta da R. um juízo de censura superior ao de culpa leve, a justificar a manutenção da improcedência dos pedidos em apreciação e que o tribunal a quo julgou improcedentes. Do recurso da R.. Em causa a licitude da conduta da R. quanto ao bloqueio ocorrido em 08/03/2016 porquanto em dívida estariam – na versão da R. - mais faturas, para além da fatura FT ....../....... O imputado erro de direito nesta parte tinha como pressuposto a alteração dos pontos 86 e 87 dos factos provados bem como o juízo de validade da cláusula 7ª que supra mantivemos. A alteração dos pontos 86 e 87 improcedeu. A não alteração destes pontos, implica que a análise do tribunal a quo quanto à censura que incidiu sobre a conduta da R. é correta. O corte da prestação dos serviços com base no não pagamento de uma fatura que a própria R. havia comunicado estar a tratar de retificar e cujo pagamento não era neste circunstancialismo exigível, é censurável integrando, tal como referido pelo tribunal a quo “uma violação grosseira dos seus deveres contratuais, manifestando-se uma culpa grave ou negligência grosseira por parte da Ré, suscetível de a fazer incorrer em responsabilidade perante a Autora, não sendo aqui aplicável a clausula limitativa ou de exclusão prevista na «cláusula sétima» do contrato.” Basta para tanto atentar nos especiais deveres que a Lei dos Serviços Públicos faz recair sobre a R. de boa-fé e especial proteção dos utentes (artigo 3º); de informação e esclarecimentos (artigo 4º); de obediência a levados padrões de qualidade (artigo 7º) e em especial condições em que lhe é permitido proceder à suspensão do fornecimento do serviço prestado (artigo 5º), conjugado este com o artigo artigo 52º da LCE, ao qual aliás faz referência. Condicionalismo que in casu e atenta a situação do valor em divida causa do bloqueio não se verificava. Ainda de recordar o ónus de prova relativo ao cumprimento das suas obrigações e ao desenvolvimento das diligências decorrentes da prestação dos serviços a que se reporta a LSP (vide artigo 11º). Esta atuação com culpa grave faz incorrer a R. na obrigação de indemnizar a A. pelos prejuízos que tal atuação lhe causou. Do facto provado 93 (este não impugnado) consta que o bloqueio dos dias 8 e 9 março impediu a A. de exercer a sua atividade comercial normalmente pelo período do bloqueio, num total de 7 h e 30 minutos. A recorrente R. questiona o nexo de causalidade entre o período do bloqueio e os lucros cessantes cuja indemnização a A. peticionou e que o tribunal a quo parcialmente deferiu. Alega a recorrente R. que a A. pôde continuar a receber chamadas telefónicas e que como tal inexiste o mencionado nexo causal. Ao contrário do alegado, está demonstrado que por causa do bloqueio originado indevidamente pela R. a A. sofreu uma interrupção dos números fixos e barramento ao serviço de internet fixo pelo período de 7 horas e 30 minutos entre as 15.55 horas do dia 08/03/2016 e as 12.25 horas do dia 09/03 (vide factos provados 84 e 85. Mais resultou provado que a encomenda telefónica constitui uma importante forma de venda dos artigos e acessórios comercializados pela autora (facto provado 92). Ainda provado está que o mencionado bloqueio impediu a autora de exercer normalmente a sua atividade comercial (vide 93 dos factos provados). Da análise conjugada desta factualidade não há como não concluir que a perturbação da normalidade da atividade comercial da R. foi o resultado da atuação ilícita por violadora das obrigações contratuais da R.. “A lei civil (art.563 do CC) adotou a teoria da causalidade adequada, ao estabelecer que a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão. Para que um facto seja causa de um dano é necessário, antes de mais, que, no plano naturalístico, ele seja condição sem o qual o dano não se teria verificado e depois que, em abstrato ou em geral, seja causa adequada do mesmo (nexo de adequação). Releva a causalidade adequada na sua formulação negativa: a condição deixará de ser causa do dano sempre que, segundo a sua natureza geral, era de todo indiferente para a produção do dano e só se tornou condição dele em virtude de outras circunstâncias extraordinárias, sendo, portanto, inadequado para esse dano (cf., por ex., ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, I, 2ª ed., pág.743 e segs.; Ac STJ de 15/4/93, C.J. ano I, tomo 2, pág.59; de 15/1/2002, C.J. ano X, tomo I, pág.36). A teoria da causalidade adequada, na sua formulação negativa, não pressupõe a exclusividade do facto condicionante do dano, nem exige que a causalidade tenha de ser direta e imediata, admitindo não só a ocorrência de outros factos condicionantes, como ainda a chamada causalidade indireta, na qual é suficiente que o facto condicionante desencadeie outro que diretamente suscite o dano.” [cfr. Ac. TRC de 14-10-2014, Relator Jorge Arcanjo]. No mesmo sentido da consagração do nexo da causalidade adequada na sua formulação negativa se decidiu no Ac. STJ de 16/06/2016, Relator Tavares Paiva, in www.dgsi.pt onde e em situação similar à dos autos, se atribuiu indemnização por lucros cessantes para tanto e convocando a teoria da causalidade adequada se entendendo como demonstrada a frustração de ganho perante factos que evidenciam a diminuição de fluxos normais de encomendas perante as interrupções dos serviços. Ora in casu temos demonstrado que o exercício normal da atividade comercial da autora ficou afetado pelo bloqueio em análise e daqui se pode inferir que não fora tal bloqueio e aquela atividade não teria ficado afetada. O mesmo é dizer que se considera demonstrada uma frustração de ganhos ou seja um lucro cessante, ainda que em concreto não quantificado factualmente. O tribunal a quo neste ponto decidiu recorrer a critérios de equidade e com base nos mesmos tendo por referência o valor da faturação média/hora (facto provado 91 – ora com a alteração de redação por nós introduzida) e o número de horas em que ocorreu o ilícito bloqueio, fixou a quantia indemnizatória em € 19.000,00. Para tanto tendo ainda justificado a redução com base na diferença entre faturação (ponto de partida da autora para formular o pedido indemnizatório) e lucro da empresa após abatidas as despesas. A nosso ver não existem elementos apurados que nos permitam quantificar estes danos em concreto que carecem de liquidação. Note-se que a A. alegou um prejuízo concreto, correspondente ao valor do seu pedido nesta sede. Fez corresponder tal valor à faturação. Contudo o lucro cessante da A. tem de ser aferido pelo lucro que deixou de auferir, esse é o seu verdadeiro prejuízo. Não tendo sido apurados elementos de onde se possa quantificar tal prejuízo há lugar a incidente de liquidação, sem prejuízo de oportunamente e sendo necessário, ser então formulado um juízo de equidade para fixação do valor a arbitrar. Para já impõe-se que seja apurado, tendo por referência o número de horas do bloqueio e o valor médio de faturação igualmente dado como provado, qual o valor que tal faturação hora representa para a A. em termos de lucro líquido. Ainda e com base em análise contabilística, por período que as partes oportunamente indicarão como suficiente e na falta de acordo se reportará ao mesmo ano de 2015, deverá ser aferido qual a percentagem de vendas feitas por telefone e internet fixo e qual a percentagem de vendas feitas por internet e voz móvel. A fim de permitir quantificar a percentagem a que corresponde o bloqueio dos serviços efetuados (vide factos provados 8 que define os serviços contratados e 84 que define os serviços bloqueados). Assim e nesta parte decide-se revogar a sentença proferida, decidindo-se relegar para incidente de liquidação a quantificação dos lucros cessantes da A., balizados pelos elementos a apurar e supra definidos (vide artigos 358º nº 2, 359º e 609º nº 2 do CPC). * III. Decisão.*** Em face do exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente a presente apelação e consequentemente revogando-se a sentença sob recurso na parte em que liquidou os lucros cessantes da A. e pelos quais a R. é responsável, decide-se relegar a liquidação destes mesmos para incidente de liquidação, nos termos supra expostos. Custas do recurso e da ação na proporção do vencimento e decaimento pelas recorrentes/recorrridas, sendo na parte em que se relega o pedido para incidente de liquidação a fixar na proporção do que ali se vier decidir. Notifique. *** Porto, 2018-10-22Fátima Andrade Fernanda Almeida António Eleutério _______________ [1] Cujo teor aqui se relembra: 86. De imediato, a Autora contactou a Ré para esclarecer o que se passava, tendo obtido a informação de que o bloqueio de comunicações se deveu à existência de faturação por liquidar, dado que a fatura ....../...... (fatura de Outubro, referida no facto provado nº 70) apresentava um valor por liquidar de € 1.660,50. 87. De facto, não obstante a Ré mencionar, nas cartas que emitiu e enviou à Autora (em algumas destas cartas era feita referência a “Aviso de suspensão”), que estavam em dívida várias faturas (o que não correspondia à verdade, uma vez que a Autora havia pago todas as faturas, a maioria no dia 15/12/2015, com exceção do valor de € 1.660,50 incluído na fatura de Outubro de 2015, atrás identificada), após o pagamento pela Autora do montante de € 1.660,50, em 09/03/2016, a Ré procedeu ao desbloqueio dos serviços atrás referidos. (…) 91. No ano de 2015, a Autora vendeu acessórios e peças do seu comércio no montante de € 10.671.230,74, o que perfaz uma média de faturação diária de € 39.523,07, ou seja, a quantia de € 4.940,38/hora.” [2] Cujo teor aqui se relembra: (facto provado 11) “11. A Autora assinou a minuta de contrato que lhe foi proposta pela Ré sem alguma vez ter manifestado que pretendia alterar qualquer uma das cláusulas aí incluídas, sendo certo que os contratos que a Ré celebra com os seus clientes corporate são passíveis de negociação individual por cada cliente, sendo possível a alteração das cláusulas propostas pela Ré.” (facto não provado 1) “1. As cláusulas do contrato celebrado entre a Autora e a Ré não foram objeto de negociação entre as partes, apenas tendo sido negociadas as condições especiais constantes do anexo I.” [3] Artigo 52º cuja redação, pela sua relevância, aqui se deixa reproduzida: “1 - As empresas que oferecem redes de comunicações públicas ou serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público apenas podem suspender a prestação dos serviços que prestam a assinantes que não sejam consumidores após pré-aviso adequado ao assinante, salvo caso fortuito ou de força maior. 2 - Em caso de não pagamento de faturas, a suspensão apenas pode ocorrer após advertência por escrito ao assinante, com a antecedência mínima de 20 dias, que justifique o motivo da suspensão e informe o assinante dos meios ao seu dispor para a evitar. 3 - Nos casos referidos no número anterior, o assinante tem a faculdade de pagar e obter quitação de apenas parte das quantias constantes da fatura, devendo, sempre que tecnicamente possível, a suspensão limitar-se ao serviço em causa, exceto em situações de fraude ou de pagamento sistematicamente atrasado ou em falta. 4 - Durante o período de suspensão e até à extinção do serviço, deve ser garantido ao assinante o acesso a chamadas que não impliquem pagamento, nomeadamente as realizadas para o número único de emergência europeu. 5 - A extinção do serviço por não pagamento de faturas apenas pode ter lugar quando a dívida seja exigível e após aviso adequado, de oito dias, ao assinante.” [4] Vide artigo 2º nº 1 da Lei de Defesa do Consumidor, o qual define o conceito de consumidor como “(…) todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios.” Assim afastando o contrato celebrado entre A. e R. do âmbito de aplicação desta Lei e como tal, a sua sujeição ao artigo 52º da LCE acima citado. [5] Artigo 54º que aqui em parte se reproduz: “1 - Sem prejuízo de outras formas de portabilidade que venham a ser determinadas, é garantido a todos os assinantes com números incluídos no Plano Nacional de Numeração que o solicitem o direito de manter o seu número ou números, no âmbito do mesmo serviço, independentemente da empresa que o oferece, no caso de números geográficos, num determinado local, e no caso dos restantes números, em todo o território nacional. 2 - As empresas responsáveis pela execução da portabilidade devem assegurar que a transferência de um assinante de uma empresa para outra, com implementação da portabilidade, se conclua no prazo mais curto possível e com respeito pela vontade expressa do assinante. 3 - Quando o assinante conclua um acordo para a transferência do número, a transferência efetiva do número para a nova empresa deve ocorrer no prazo máximo de um dia útil, não podendo a perda de serviço exceder esse período. (…)” [6] Cuja redação aqui se reproduz: “1 - A prestação do serviço não pode ser suspensa sem pré-aviso adequado, salvo caso fortuito ou de força maior. 2 - Em caso de mora do utente que justifique a suspensão do serviço, esta só pode ocorrer após o utente ter sido advertido, por escrito, com a antecedência mínima de 20 dias relativamente à data em que ela venha a ter lugar. 3 - A advertência a que se refere o número anterior, para além de justificar o motivo da suspensão, deve informar o utente dos meios que tem ao seu dispor para evitar a suspensão do serviço e, bem assim, para a retoma do mesmo, sem prejuízo de poder fazer valer os direitos que lhe assistam nos termos gerais. 4 - A prestação do serviço público não pode ser suspensa em consequência de falta de pagamento de qualquer outro serviço, ainda que incluído na mesma fatura, salvo se forem funcionalmente indissociáveis. 5 - À suspensão de serviços de comunicações eletrónicas prestados a consumidores aplica-se o regime previsto no artigo 52.º-A da Lei n.º 5/2004, de 10 de fevereiro, alterada pelo Decreto-Lei n.º 176/2007, de 8 de maio, pela Lei n.º 35/2008, de 28 de julho, pelos Decretos-Leis n.ºs 123/2009, de 21 de maio, e 258/2009, de 25 de setembro, pela Lei n.º 46/2011, de 24 de junho, e alterada e republicada pela Lei n.º 51/2011, de 13 de setembro.” [7] Cujo teor aqui se reproduz: “Cláusula Sétima (Reembolsos e indemnizações) 1. Sem prejuízo do que se dispõe no número seguinte, a F... não será contratualmente responsável por lucros cessantes e por danos indiretos, ficando a sua responsabilidade contratual limitada, em qualquer caso, aos danos que resultem diretamente do incumprimento, com dolo ou culpa grave, de obrigações contratuais, por si ou por representantes, agentes, auxiliares ou quaisquer outras pessoas que utilize para o cumprimento das suas obrigações, incluindo-se neste incumprimento as situações de falha ou deficiência do Serviço. 2. Quando ocorra interrupção do Serviço resultante de avaria imputável à F... que resultem das situações referidas nas várias alíneas do número dois da Cláusula 6ª e impliquem uma interrupção na prestação desses Serviços, o Cliente poderá, a título de indemnização pelo facto, solicitar a dedução do valor correspondente ao Serviço proporcional ao período de tempo em que se verificou a restrição, suspensão ou limitação da oferta, devendo o mesmo ser descontado ao preço da mensalidade eventualmente aplicável ou de eventuais consumos que tivessem obrigatoriamente de ser utilizados no período em questão.”. [8] Vide Ana Prata in Contrato de Adesão e Cláusulas Contratuais Gerais, edição Almedina 2010, p. 17. [9] Neste sentido Ana Prata in ob. cit. p. 99. [10] [Sousa Ribeiro, in “Cláusulas Contratuais Gerais”, Colóquio de Direito Civil de Santo Tirso, O Código Civil 50 anos depois: Balanço e perspetivas, edição Almedina 2018, p. 97 e segs.]. [11] Entendimento sufragado em posteriores decisões deste mesmo tribunal: Ac. 18/02/2014, Relator Gregório Silva Jesus; Ac. 09/07/2015, Relator Salazar Casanova, ambas in www.dgsi.pt. [12] Vide neste sentido Ac. STJ de 19/03/2002, Relator Garcia Marques in www.dgsi.pt; Anotação a este mesmo Ac. de António Pinto Monteiro in RLJ Ano 138º, maio-junho 2009, 3956 e segs. e demais jurisprudência no mesmo citada; ainda Ac. STJ de 24/01/2012 em que declara a nulidade de cláusula excludente de indemnização prévia independente de qualquer grau de culpa nos termos do artigo 809º; [13] Cfr. Pinto Monteiro in “Cláusulas Limitativas e de Exclusão de Responsabilidade Civil”, edição Almedina, 2003, p. 252. |