Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | ANTÓNIO CARNEIRO DA SILVA | ||
| Descritores: | CONTRATO-PROMESSA PRAZO PARA A CELEBRAÇÃO DO CONTRATO-PROMETIDO NATUREZA DO PRAZO ACORDO POSTERIOR AO CONTRATO | ||
| Nº do Documento: | RP20251113150/24.8T8PVZ.P1 | ||
| Data do Acordão: | 11/13/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Indicações Eventuais: | 3. ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
| Sumário: | I - O estabelecimento de cláusula pela qual, no âmbito de contrato promessa de compra e venda de imóvel, é reconhecida exclusivamente a uma das partes a faculdade de, até determinada data, proceder ao agendamento do contrato prometido, em nada obsta a que, ultrapassada tal data, qualquer das partes interpele a outra para cumprir através da marcação de data para a celebração do contrato de compra e venda; II - Constando de contrato promessa de compra e venda de imóvel cláusula pela qual uma sua qualquer alteração, mesmo a título de cláusula acessória, apenas poderá ser atendida caso conste de acordo escrito assinado por ambas as partes, eventual posterior acordo verbal entre as partes quanto a características da coisa prometida vender é irrelevante para aferir do (in)cumprimento da promessa. | ||
| Reclamações: | |||
| Decisão Texto Integral: | Proc. n.º 150/24.8T8PVZ.P1 Acordam os Juízes que integram a 3ª secção do Tribunal da Relação do Porto Relatório: AA, residente na rua ..., Porto, intentou, perante o juízo central cível da Póvoa de Varzim (J6), a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra “A..., Ldª”, com sede na Travessa ..., rés-do-chão esquerdo, união das freguesias ..., ... e ..., Matosinhos. Alegou a autora, em súmula, na petição inicial, que celebrou com a ré contrato promessa de compra e venda de fracção autónoma de edifício, que identifica, ascendendo a € 620.000,00 o valor global acordado para a venda, tendo a autora entregue, a título de sinal, a quantia de € 124.000,00. Invoca que, nos termos contratados, o contrato prometido deveria ter sido celebrado até final do mês de Novembro de 2022. Afirma que, em Agosto de 2022, a autora constatou ter-lhe sido omitida informação que considerava relevante à sua decisão de contratar [designadamente a identificação e actividade dos adquirentes das demais fracções autónomas do edifício], e ainda que o edifício não iria imediatamente dispor de diversas comodidades que haviam sido anunciadas pela promitente vendedora [piscina, sauna, banho turco, etc]. Alega que, na sequência, solicitou diversos esclarecimentos à promitente vendedora, tendo ré concordado em auxiliar a autora na cessão da sua posição contratual no contrato promessa celebrado. Invoca que, no âmbito dos contactos entre as partes entretanto mantidos, a autora propôs à ré a revogação do contrato promessa, o que foi recusado, e deixou de receber as comunicações enviadas pela autora, nas quais solicitava uma moratória relativamente à outorga do contrato prometido. Alega que, nos preliminares da outorga do contrato promessa de compra e venda, transmitiu à ré, para quem ficou claro, constituir a disponibilidade de adequado sistema de aquecimento e arrefecimento da fracção autónoma requisito essencial da contratação, ou, pelo menos, a possibilidade da sua instalação [especificamente quanto ao sistema de arrefecimento], cabendo à autora, após a aquisição, custear essa instalação, a qual, segundo acordado entre as partes, deveria ocorrer antes da outorga do contrato prometido, defendendo constituir esta condição essencial à outorga do contrato prometido. Alega que, após a outorga da promessa, e não obstante as solicitações da autora, designadamente a expressa e formal interpelação levada a cabo por carta e comunicação electrónica de 25 de Novembro de 2022, a ré jamais indicou os pontos da pré-instalação do sistema de arrefecimento, impedindo a autora de diligenciar pela respectiva instalação. Invoca que, não obstante, pela mesma missiva de 25 de Novembro de 2022 a autora comunicou à ré ter agendado para 10 de Abril de 2023 a outorga do contrato prometido. Afirma que, em resposta, a ré comunicou que, nos termos contratuais, o agendamento do contrato prometido deveria ter sido feito até final de Novembro de 2022, e, porque o não foi, a ré designou 21 de Dezembro de 2022 para a outorga do mesmo, e advertindo a autora que o seu não comparecimento determinaria a transformação da sua situação de mora em incumprimento definitivo. Porque a autora não compareceu no local designado para a outorga da compra e venda a 21 de Dezembro de 2022, a ré expediu nova comunicação à autora, realizando novo agendamento para 19 de Janeiro de 2023, e declarando que o não comparecimento da autora seria considerado incumprimento definitivo, fazendo a ré seu o sinal prestado, o que veio a novamente declarar, por carta de 19 de Janeiro de 2023. Afirma que, por carta de 04 de Abril de 2023, foi a autora a comunicar à ré o agendamento para 10 de Abril de 2023 da escritura de compra e venda prometida, solicitando ainda a prestação de determinadas informações que entende serem devidas pela ré, e advertindo que o incumprimento pela ré seria pela autora considerado incumprimento definitivo. Alega que, porque a ré não compareceu à escritura pública agendada para 10 de Abril de 2023, por carta de 14 de Abril de 2023 a autora comunicou a resolução do contrato promessa. Invoca que, não obstante, a ré mantém na sua posse o valor do sinal prestado pela autora. Defende que a sua actuação respeita os termos do contrato celebrado, pelo que não assistia à ré a faculdade de eficazmente proceder à resolução do contrato promessa. Invoca que, de qualquer modo, a ré encontrava-se em mora quanto à obrigação de fornecer diversos elementos relativos à fracção prometida vender, dever acessório determinante ao integral cumprimento do acordo, motivo pelo qual à ré não assistia o direito de promover a resolução do negócio. Re-afirma o seu próprio direito à resolução do contrato promessa, com fundamento no incumprimento por parte da ré. Subsidiariamente, invoca o erro sobre o objecto do negócio, designadamente quanto ao perfil de adquirentes das restantes fracções e ao não funcionamento dos diversos serviços anunciados pela promitente vendedora, o que, defende, gera a anulabilidade do negócio e a obrigação de a ré restituir o valor do sinal prestado. Conclui pedindo: a) a declaração de resolução do contrato-promessa de compra e venda celebrado entre autora e ré a 08 de Agosto de 2022, por incumprimento definitivo e culposo, imputável à ré, e, consequentemente, ser a ré condenada a restituir à autora o valor que por esta lhe foi entregue, a título de sinal, de € 124 000,00, acrescido de igual montante, no total de € 248 000,00, nos termos do disposto no artigo 442º, nº 2, do CC, e cláusula 4ª, nº 2 do CPCV, acrescido de juros, à taxa legal, desde a citação até integral cumprimento; Subsidiariamente, b) a declaração de anulação do contrato-promessa por erro quanto ao objeto e motivos determinantes da vontade da autora, com a consequente restituição à mesma do montante que por esta foi entregue à ré, a título de sinal, de € 124 000,00, acrescida de juros à taxa legal, desde 08 de Agosto de 2022. Citada, a ré apresentou contestação, na qual, em súmula, principia por aceitar a celebração com a autora de contrato promessa de compra e venda, mas afirma situar-se a 30 de Novembro de 2022 a data limite para outorga do contrato prometido, pelo que o agendamento pela autora feito para Abril de 2023 não respeita os termos contratuais, do que resulta, defende, a mora da autora. Entende que, ultrapassado o momento temporal de que a autora dispunha para realizar o agendamento do contrato prometido, tal faculdade passou a caber a ambas as partes, na sequência do que a ré procedeu à marcação do contrato prometido para 21 de Dezembro de 2022, a que a autora injustificadamente não compareceu. Afirma que, na sequência, procedeu a novo agendamento para 19 de Janeiro de 2023, advertindo a autora que o seu não comparecimento traduziria incumprimento definitivo da sua obrigação de contratar, pelo que, não tendo a autora comparecido, por carta desse mesmo dia a ré comunicou à autora a resolução do contrato. Por esse motivo defende a improcedência do pedido de condenação da ré na restituição do dobro do sinal. Impugna os fundamentos de facto e de direito da acção. Nega a situação de erro invocada pela autora, e afirma ter prestado todas as informações pela autora solicitadas. Conclui pedindo a improcedência da acção, com a sua consequente absolvição do pedido. Para o efeito notificada, a autora apresentou novo articulado de resposta à matéria de excepção arguida pela ré, resumidamente mantendo a versão por si vertida na petição inicial, concluindo como nesta. A audiência prévia foi dispensada. O valor da causa foi fixado em € 248.000,00. Foi proferido despacho saneador tabelar. Procedeu-se à fixação do objecto do processo e à enunciação dos temas da prova, tendo sido apreciadas as reclamações apresentadas pelas partes. Instruída a causa, realizou-se a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a ré dos pedidos contra si formulados. É desta decisão que, inconformada, a autora vem interpor recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: Quanto à matéria de facto - 1- A. A Recorrente entende que o Tribunal fez uma incorreta apreciação da prova produzida no que respeita aos temas de prova números dois, relativo a saber-se se “a ré incumpriu o dever de indicar à Autora a localização dos pontos de instalação dos ventilo-convectores [equipamentos de climatização] e se havia aceite que a Autora instalasse esses aparelhos após a assinatura do CPCV e antes da celebração do contrato definitivo”, tendo, por via disso, considerado como não provados os factos que formulou em 3. 4. e 5. dos factos não provados, bem como, no que respeita ao tema de prova número três, relativo a saber-se se “a autora solicitou à ré, por diversas vezes, que lhe enviasse a certidão de registo predial, a caderneta predial urbana, a licença de utilização, o certificado energético e a declaração de condomínio exigida pelo artigo 1224-A [do CC] e, em caso afirmativo, em que data e por que forma e se a ré não enviou essa documentação”. Nesse contexto, entende a autora que devem ser alterados os factos dados como provados nos números 5, 39 e 40, dos factos provados, bem como, que devem ser dados como provados e aditados os factos constantes dos números 3. e 4. dos factos não provados, e ainda, que devem ser dados como provados outros factos que resultam de prova documental junta e aceite nos autos; 2- QUANTO AO FACTO DADO COMO PROVADO SOB O NÚMERO 39: “Foi transmitido à autora que a infraestrutura se encontrava operacional, sendo necessário efetuar obras para instalar os aparelhos”. a) Conforme resulta conjugadamente dos factos provados números 29 a 38, a existência de um sistema de climatização adequado às necessidades de saúde da Autora, dada a sua suscetibilidade às condições ambientais e de habitabilidade, por sofrer de doença pulmonar crónica, foi uma das condições determinantes para que esta procedesse à aquisição da fração em causa nos autos, tendo-lhe sido garantido que a fração se encontrava equipada com pré-instalação para aplicação de aparelhos ventiloconvectores, capazes de fazer aquecimento e arrefecimento em complementaridade com aquecimento por piso radiante. Contudo, também conforme provado, os pontos terminais de instalação dos aparelhos ventilo-convectores não se encontravam visíveis, encontrando-se ocultos, desconhecendo-se, por conseguinte, onde viriam a ser instalados (cfr. facto provado nº 38); b) Ora, o Tribunal a quo deu como provado, no número 39 dos factos provados, que “foi transmitido à autora que a infraestrutura se encontrava operacional, sendo necessário efetuar obras para instalar os aparelhos” (negrito e sublinhado nossos). Sucede que, em momento algum da audiência de julgamento foi produzida prova no sentido de que a infraestrutura em causa (pré-instalação para sistema de ventiloconvectores) “se encontrava operacional”, ou que tal tenha sido transmitido à autora, não ressaltando da motivação que o Tribunal a quo expende a este propósito qualquer fundamento que legitime tal conclusão; c) Conforme resulta dos depoimentos técnicos prestados a propósito desta problemática, não basta a afirmação genérica de que a infraestrutura existe para que se considere como provado que a mesma se encontra operacional (cfr. supra nº 1 da motivação do presente recurso). De resto, em momento algum a ré fez prova de que terá transmitido à autora que a pré-instalação se encontrava operacional; d) Em nosso entender, a motivação expendida pelo Tribunal a quo no que respeita à problemática inerente à infraestrutura para instalação dos aparelhos ventilo-convectores diverge substancialmente da prova produzida em audiência de julgamento; e) O Tribunal afirma que a testemunha Arquiteto BB, autor do projeto de arquitetura do empreendimento em causa, explicou que “no seu projeto estava prevista a colocação de ventiloconvectores debaixo das janelas, tendo o mesmo conhecimento que esses aparelhos não foram colocados, tendo sido informado que quem fez a obra acabou por não instalar os aparelhos, mas fazer a pré-instalação e que essa pré-instalação iria ser feita nas paredes”. Mais afirma o Tribunal que a referida testemunha explicou que [“existindo a pré-instalação nas paredes é muito fácil detetar onde estão os pontos, sendo que isso é feito “todos os dias”]. Ora, do depoimento gravado da testemunha não resulta tal factualidade, conforme transcrição, nas alegações supra [Ficheiro de gravação: Diligencia_150-24.8T8PVZ_2025-04-01_11-53 10.mp3_Depoimento da testemunha Arq. BB, de minuto 3´14” a 12’36”]; f) Ora, conforme resulta do depoimento do técnico autor do projeto de arquitetura, o sistema de climatização por ventilo-convectores foi desenhado para que os aparelhos ficassem instalados no pavimento e não na parede. De facto, a testemunha refere por diversas vezes que projetou os radiadores debaixo das janelas e que os mesmos são horizontais (3’51’’) e que, por conseguinte, seriam colocados no pavimento, debaixo das janelas (5’23’’), e não nas paredes (10’49”). Mais refere que, estando tapados os pontos da instalação, como estavam (facto provado 38), é preciso fazer uma obra — “uma obra suja”, conforme refere a testemunha em 6´31” — “; g) Em nenhum segmento a testemunha refere que “é muito fácil detetar onde estão os pontos, sendo que isso é feito “todos os dias”, conforme se refere na sentença (página 13): em rigor, o que diz a testemunha é que partir paredes é algo que se faz todos os dias (cfr. 6’06” a 6’39”). Mais, a testemunha não afirma que a instalação iria ser feita nas paredes, mas sim no pavimento, debaixo das janelas (5’23’’), e não nas paredes (10’49”); h) A instalação no pavimento é uma das modalidades possíveis para a instalação de climatização por ventilo-convectores, conforme explicou ao Tribunal a testemunha Engº CC, que igualmente descreveu em Tribunal as condições de instalação para que uma infraestrutura desse tipo se considere operacional, conforme nas alegações supra [Ficheiro de gravação: Diligencia_150-24.8T8PVZ_2025-04-01_12-11-28 Testemunha Engº DD, minutos 3’00 e 3´15´´]; i) Assim, o Tribunal a quo fez uma errónea apreciação da prova produzida ao dar como provado que a infraestrutura para instalação dos aparelhos ventilo-convectores se encontrava operacional, devendo, em consequência, ser alterado o número 39 dos factos provados no sentido de ser eliminada a referida conclusão, limitando-se o referido ponto ao seguinte: Facto provado 39. Foi transmitido à autora que seria necessário efetuar obras para instalar os aparelhos; 3- QUANTO AO FACTO DADO COMO PROVADO SOB O Nº 40: “foi acordado pela autora e pela ré que a autora compraria e instalaria os ventilo-convetores e a ré assumiria o compromisso de pagar as obras necessárias para “destapar” os pontos de instalação dos ventilo-convectores, incluindo o custo da pintura das paredes que viessem a ser intervencionadas para a dita finalidade” a) No que a este ponto respeita, entende-se que o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que impendia sobre a ré a obrigação de realização das obras necessárias para “destapar” os pontos de instalação dos ventiloconvectores (e não apenas o “compromisso de pagar as obras necessárias para “destapar” os pontos de instalação dos ventilo-convectores, incluindo o custo da pintura das paredes que viessem a ser intervencionadas para a dita finalidade”); b) Tal resulta, desde logo, do depoimento do representante legal da ré, do qual resulta com suficiente clareza que o compromisso da ré consistiu em realizar e, não apenas, pagar as obras necessárias para “destapar” os pontos de instalação dos ventilo-convectores, incluindo o custo da pintura das paredes que viessem a ser intervencionadas para a dita finalidade, conforme excertos da gravação transcritos nas alegações: Ficheiro de gravação: Diligencia 150-24.8T8PVZ 2025-04-01 09-56-20; depoimento do representante legal da ré, de 0’57” a 3’57”]; c) De resto, o Tribunal a quo corrobora precisamente tal entendimento ao escrever na fundamentação da sentença que “No caso em apreço, foi acordado entre a autora e a ré que a primeira compraria os aparelhos e contrataria a empresa que iria fazer a instalação em causa, sendo que a ré se comprometeu a fazer as obras necessárias para destapar os pontos de instalação e a pintura das paredes que viessem a ser intervencionadas para essa finalidade” (cfr. sentença a págs. 28); d) Assim, entendemos que o número 40 dos factos provados deve ser alterado em conformidade para a seguinte redação: “Foi acordado pela autora e pela ré que a autora compraria e instalaria os ventilo-convetores e a ré assumiria o compromisso de realizar e pagar as obras necessárias para “destapar” os pontos de instalação dos ventiloconvectores, incluindo o custo da pintura das paredes que viessem a ser intervencionadas para a dita finalidade”; 4- O Tribunal a quo considerou como não provado que “foi acordado entre a autora e a ré que a preparação da fração para instalação dos equipamentos de climatização seria efetuada antes da realização da escritura de compra e venda, de modo a que esta pudesse dispor de condições de habitabilidade assim que formalizada a referida escritura, bem como, “que a ré estava consciente que se comprometeu com a autora a facultar a instalação dos aparelhos ventiloconvectores logo após a assinatura do contrato-promessa e antes da celebração do contrato definitivo”, conforme números 3 e 4 dos factos não provados; 5- Para concluir e formar a sua convicção relativamente aos factos números 3 e 4 que considerou não provados, face às declarações da autora de que tinha sido acordado com o legal representante da ré que a instalação dos aparelhos seria realizada depois da outorga do contrato promessa e antes da celebração da escritura, o Tribunal afirma que “o legal representante da ré negou perentoriamente essa factualidade, dizendo que em momento algum acordou nessa instalação antes da celebração da escritura de compra e venda”, afirmando igualmente que “as declarações da autora não são só por si um meio de prova bastante para que o este tribunal considere essa factualidade, sendo certo que nos autos não foi feita qualquer outra prova que sustentasse a versão da autora”; 6- Perante os testemunhos prestados, ambos em sede de declarações de parte (uma vez que, presume-se, o tribunal desconsiderou os depoimentos de parte que foram requeridos por ambas as partes, uma vez que não houve redução dos mesmos a escrito), o Tribunal valorou de modo diferente a posição processual da autora e da ré, ao aceitar como credível a declaração do representante da ré de que “em momento algum acordou nessa instalação [dos ventilo-convectores] antes da celebração da escritura de compra e venda” e relativizar as declarações de parte da autora sobre o mesmo objeto, dizendo que as mesmas não são, só por si, um meio de prova bastante para que o Tribunal considere a factualidade inerente às mesmas provada, desacompanhadas de outro meio de prova. 7- Ora, sendo certo que as declarações de parte não são, só por si, um meio de prova pleno para que o Tribunal dê como provado determinado facto, também não podem estas ser desconsideradas em si mesmas e, muito menos, serem as declarações de parte prestadas pela autora desvalorizadas face às declarações de parte prestadas pela ré. É que o Tribunal a quo não explicita qualquer fundamento para valorar diferentemente, como fez, em função da posição processual das partes, as declarações de uma e de outra, limitando-se a desconsiderar as declarações prestadas pela autora; 8- Por outro lado, argumenta o Tribunal a quo que “do ponto de vista da normalidade e atendendo a juízos de experiência comum não é credível que a ré assentisse na colocação desses aparelhos por parte da autora antes da outorga da escritura”, dizendo que, em apoio a tal tese, que “antes da outorga da escritura de compra e venda, a ré, ainda que estivesse convencida que o negócio definitivo se iria realizar, não iria assumir o custo de uma obra sem que tivesse qualquer garantia que o negócio definitivo viesse, efetivamente, a ser outorgado”; 9- Mais refere o Tribunal que “não faz sentido, atendendo às regras da experiência comum, que a ré aceitasse essa colocação em momento anterior à outorga da escritura de compra e venda, correndo o risco de, caso o contrato definitivo não se viesse a concretizar, ter que novamente proceder a obras para repor as paredes no estado anterior”. E continua: “de acordo com a versão da autora a ré aceitaria pagar essas obras antes da outorga da escritura de compra e venda. A verdade é que se o negócio de compra e venda não se viesse a realizar – como acabou por acontecer – nesse caso a ré teria que fazer uma nova obra para repor tudo como estava antes, já que a autora certamente retiraria os aparelhos”; 10- Ora, tal raciocínio é, no mínimo, completamente ilógico, no âmbito da relação contratual em causa! De facto, sabendo-se que a existência de um sistema de climatização por ventilo-convectores foi essencial para que a autora tomasse a decisão de adquirir a fração em causa, dadas as condicionantes associadas à doença de que padece, conforme resulta claramente dos factos provados sob os números 29 a 40 da sentença, o que é evidente — contrariamente ao que defende o Tribunal a quo —, do ponto de vista da normalidade e atendendo a juízos da experiência comum, é que as obras para instalação dos referidos ventiloconvetores fossem efetivamente realizadas antes da escritura de compra e venda, e não o contrário!; 11- E, desde logo, a tal se opõem argumentos de natureza jurídica relativos à própria essência do contrato-promessa de compra e venda e argumentos de senso comum ou de ordem prática (cfr. supra pontos 22 e 23 da motivação do presente recurso); 12- O que não é normal, nem decorre da experiência comum, é que depois de celebrado o contrato definitivo se viessem a realizar obras na fração, por conta do transmitente, destinadas a dotar a fração das condições necessárias para que o adquirente pudesse proceder à instalação dos aparelhos de que necessita para garantir as condições de habitabilidade que a sua condição de saúde — ou de falta dela, no caso — exigem, aparelhos esses que o mesmo se comprometeu a adquirir e a instalar assim que dispusesse das condições técnicas para o efeito (cfr. supra pontos 25 e 26 da motivação do presente recurso); 13- O que o Tribunal está a defender — a nosso ver, incompreensivelmente —, é que a ré, ao realizar a obra antes da outorga do contrato definitivo — com a qual, de resto, se comprometeu, no âmbito da execução do contrato —, correria o risco de assumir o respetivo custo sem que tivesse qualquer garantia que o negócio definitivo viesse, efetivamente, a ser outorgado, e que, nesse caso, tal implicaria que a ré tivesse que fazer uma nova obra para repor tudo como estava antes, já que a autora certamente retiraria os aparelhos! Tal tese é absolutamente inaceitável à luz dos princípios gerais a que o Tribunal está vinculado no seu julgamento. De facto, o Tribunal a quo limita-se a analisar a prova pelo prisma da ré, desconsiderando em absoluto a posição da autora (cfr. supra pontos 27 a 29 da motivação do presente recurso); 14- Vejamos: por um lado, a ré dispunha, desde logo, de um sinal elevadíssimo que lhe foi prestado pela autora, no montante (€ 124.000,00), não se vislumbrando em que medida correria qualquer risco ou necessitaria de qualquer garantia para realizar obras que efetivamente se comprometeu a realizar; por outro, a realização das obras em causa não exigiria a reposição das condições anteriormente existentes no imóvel caso o negócio não se viesse a realizar, uma vez que as mesmas se destinavam a tornar visíveis e acessíveis os terminais de ligação dos aparelhos ventilo-convetores, podendo assim permanecer para o futuro; por outro, fazendo apelo à igualdade entre as partes, importa perguntar quem garantiria à autora que, uma vez celebrado o contrato definitivo, a ré viesse a realizar as obras, ou que, mesmo que as realizasse, a pré-instalação se encontrava operacional e a funcionar devidamente (?); 15- Em nenhum momento ficou provado que a autora se tenha comprometido a realizar as obras necessárias para tornar visíveis e acessíveis os terminais de ligação dos aparelhos ventilo-convetores. De facto, o que a autora se comprometeu a fazer foi a comprar e aplicar, ou seja, ligar, os aparelhos ventiloconvectores, processo que é simples, desde que se encontrem à vista e operacionais os terminais para a o efeito. Para corroborar o exposto, deve atender-se às declarações de parte da autora a tal propósito, transcritas nas alegações e respeitantes ao Ficheiro de gravação: Diligência_150-24.8T8PVZ_2025-04-01_10-29-28_depoimento da autora, de c. 2’20”” a 9’60” e de 20’45” a 29’50”; 16- Do depoimento da Autora resulta de forma clara e fundamentada que as obras necessárias para se proceder à instalação dos ventilo-convectores deveriam ser efetuadas pela ré antes da realização da escritura de compra e venda de modo a que esta pudesse dispor das condições de habitabilidade assim que fosse formalizada a referida escritura; 17- Acresce que, existem no processo outros elementos de prova que corroboram as declarações da autora, que o Tribunal entendeu não valorar, os quais se encontram detalhadamente elencados no ponto 34. da motivação do presente recurso, os quais, por economia processual, aqui se dão como integralmente reproduzidos (cfr. supra pág. 27); 18- Face ao exposto, não devem ser dados como não provados os factos elencados em 3. e 4. dos factos não provados, devendo, ao invés, ser dado como provado que: a) Foi acordado entre a autora e a ré que a preparação da fração para instalação dos equipamentos de climatização seria efetuada de modo a que esta pudesse dispor das condições de habitabilidade assim que fosse formalizada a escritura de compra e venda aprazada para final do mês de novembro de 2022; b) A ré estava consciente que se comprometeu com a autora, logo após a assinatura do contrato promessa, a facultar a instalação dos aparelhos ventiloconvetores; c) Não foi fixado entre as partes um prazo certo, uma data específica, para que a ré procedesse à realização das obras necessárias para “destapar” os pontos de instalação dos ventilo-convectores; d) a ré, mesmo interpelada para o efeito, em 25.11.2022, nunca indicou à autora os pontos de instalação dos ventilo-convectores, nem lhe comunicou que a fração estava em condições de serem aplicados os ditos aparelhos; 19- Sob o nº 5, o Tribunal deu como não provado que “a autora insistentemente pedir à ré que lhe indicasse a localização dos pontos de instalação dos ventiloconvectores, o que a ré nunca fez”. Ora, também aqui o Tribunal a quo fez uma errada apreciação da prova; 20- Antes de mais, o Tribunal utiliza o advérbio “insistentemente” para qualificar o facto que pretende consignar como não provado. Sucede que, para além de pretender atribuir à autora uma obrigação à qual a mesma não se encontrava vinculada — a obrigação de “insistentemente” pedir à ré que lhe indicasse o que, à partida, a mesma estaria obrigada a indicar —, o Tribunal a quo coloca, desse modo, à autora, uma exigência probatória que excede claramente o limite do que é razoável exigir à parte neste contexto; 21- De facto, tendo dado como provado que os pontos (terminais) para instalação dos aparelhos ventilo-convectores: (a) não se encontravam visíveis, sendo que os mesmos se encontravam ocultos dentro das paredes (facto provado 38); (b) tendo dado como provado que foi acordado pela autora e pela ré que a autora compraria e instalaria os ventilo-convectores e a ré assumiria o compromisso de pagar as obras necessárias para “destapar” os pontos de instalação dos ventilo-convectores, incluindo o custo da pintura das paredes que viessem a ser intervencionadas para tal finalidade (ponto 40 dos factos provados); e ainda, (c) tendo dado como provada a importância – até essencialidade – para a autora de dispor de condições de controlo térmico da fração (por motivos de saúde e dada a específica configuração da fração), através do sistema de climatização (factos provados de 29 a 37); não se compreende que o Tribunal a quo exija à autora que faça prova qualificada, de grande exigência, de que interpelou “insistentemente” a ré para que lhe indicasse os pontos de instalação dos ventilo-convectores! 22- Acresce que, a autora por diversas vezes interpelou, de facto, a ré, para que a mesma diligenciasse no sentido de preparar a fração para a instalação/ligação dos referidos aparelhos por parte da autora, conforme elencou supra (ver supra, número 34 da presente motivação, cujo teor, por economia, aqui se dá por integralmente reproduzido); 23- O que efetivamente sucedeu foi que, mesmo interpelada formalmente pela autora para lhe serem disponibilizadas as plantas da fração com a indicação clara e precisa dos pontos de pré-instalação dos ventilo-convectores, com a advertência de que as correspondentes infraestruturas se deveriam encontrar devidamente preparadas para receber os ditos aparelhos, designadamente, encontrarem-se desobstruídas as canalizações e pontos de instalação e efetuadas as reparações decorrentes de tal preparação – conforme factos provados sob os números 22, 23, 16 e 18 – a ré nunca respondeu à autora sobre tal questão. A ré ignorou por completo a obrigação a que se vinculou perante a autora, conforme se provou; 24- Face ao exposto, não deve ser dado como não provado o número 5 dos factos não provados, devendo ao invés, ser dado como provado que: A autora pediu por diversas vezes à ré que lhe indicasse os pontos de instalação dois ventilo-convectores na fração, o que a ré nunca fez; 25- Com interesse para a decisão da causa devem ser dados como provados os seguintes factos, uma vez que resultam de prova documental junta e aceite nos autos: a) No dia 30 de novembro de 2022, data a que se reporta a cláusula 5ª do CPCV, a ré não tinha ainda publicado o anúncio para o exercício do direito legal de preferência, o qual foi apenas publicado no dia 2 de dezembro de 2022, conforme resulta do documento nº 7 junto pela ré na reclamação ao despacho saneador; b) No dia 30 de novembro de 2022, data a que se reporta a cláusula 5ª do CPCV, a ré não tinha dispunha da declaração emitida pelo condomínio a que se refere o artigo 1424º-A, do Código Civil, documento instrutório obrigatório da escritura ou documento particular autenticado para alienação da fração em causa, o qual foi apenas emitido em 20.12.2022, conforme resulta do documento nº 9 junto pela ré na reclamação ao despacho saneador; 26- Face ao exposto, entende-se que o Tribunal a quo fez uma errónea apreciação da prova produzida em audiência de julgamento, e/ou suportada por documentos constantes dos autos, em violação do princípio da livre apreciação da prova resultante do artigo 607.º, n.º 5 do CPC; Quanto à matéria de Direito 27- Conforme resulta dos factos provados sob o número 23., a autora comunicou à Ré, por carta registada com aviso de receção e e-mail, ambos expedidos em 25.11.2022, que a escritura de compra e venda da fração se encontrava agendada para o dia 10 de abril de 2023, pelas 9:00 h, no Cartório Notarial de Espinho; 28- Conforme resulta igualmente dos factos provados, na cláusula 5ª, alínea a) do CPCV, ficou a constar que “a marcação da escritura, ou documento particular autenticado (doravante DPA) de compra e venda ficará a cargo da segunda interveniente [aqui A.] que deverá ocorrer até ao final do mês de novembro de 2022, cabendo à segunda contraente [uma vez mais a aqui A.] a marcação da mencionada escritura ou DPA através de carta registada com aviso de receção ou por qualquer outro meio que considere idóneo (fax ou email), com a antecedência mínima de 15 (quinze dias)”; 29- Concluiu-se, por conseguinte, que a autora procedeu à marcação da escritura, conforme lhe competia nos termos contratuais, tendo, contudo, marcado a data da escritura para momento posterior ao que a mesma deveria ter ocorrido; 30- Considera o Tribunal a quo que “a autora não marcou, como lhe competia, a escritura até à data acordada entre as partes, incorrendo em mora já que a obrigação de marcação da escritura tinha(...) um prazo certo”, mais dizendo que “perante a mora da autora, a ré marcou ela própria a escritura e notificou a autora da data marcada e do local para a sua realização, advertindo-a de que consideraria definitivamente resolvido o contrato-promessa caso a autora não comparecesse. A verdade é que a autora não compareceu nessas duas datas. As interpelações dirigidas pela ré à autora transmutaram a mora da autora em incumprimento definitivo”; 31- Contudo, em rigor, a autora procedeu à marcação da escritura dentro do prazo contratualmente previsto, embora tenha fixado uma data para a respetiva realização para momento posterior ao que se encontrava fixado no CPCV. Ou seja, a obrigação de marcação da escritura por parte da autora foi cumprida. O que não correspondeu ao que se encontrava contratualmente acordado foi, efetivamente, a fixação pela autora de uma data para a realização da escritura diversa da prevista no CPCV, pelo que, o que está realmente em causa é a existência de eventual retardamento da prestação, ou incumprimento parcial e temporário da mesma, por parte da Recorrente/Promitente Compradora, uma vez que a mesma manteve o seu interesse e compromisso na celebração do contrato definitivo; 32- Neste contexto, coloca-se a questão de se se o prazo em causa está sujeito a um termo essencial absoluto, cujo vencimento importa a perda do interesse ou utilidade da prestação para o credor, ou se tal prazo está sujeito a um termo essencial relativo, cujo vencimento implica a mera mora do devedor, que o credor pode converter ou não em incumprimento definitivo (neste sentido, Acórdão do STJ de 14.07.2022, Proc. 514/20.6T8SSB.E1.S1, relator Freitas Neto, em dgsi.pt); 33- Tal como também se concluiu no Acórdão do TRP, de 12.07.2023, proferido no procedimento cautelar que correu termos sob o nº 809/23.7T8PVZ, e referente ao caso aqui em apreço — o qual, de resto, o Tribunal a quo invoca em vários segmentos da sentença — não se pode concluir que o limite previsto na cláusula quinta do CPCV represente “um termo essencial, devendo por isso ser tido como não essencial ou relativo, cuja ultrapassagem mantém incólume o interesse no contrato prometido”. Sendo o prazo não essencial ou relativo, o respetivo vencimento implica, efetivamente, a (simples) mora do devedor; 34- A questão que se coloca, no caso concreto, é a de saber-se se o contrato permite concluir que, em caso de mora da autora relativamente à obrigação de marcação da escritura para determinada data — tendo a autora procedido a tal marcação, mas para data posterior à prevista no contrato —, assistia à ré a faculdade de proceder ela mesma à marcação dessa escritura, como efetivamente fez; 35- Ora, nada no contrato permite concluir que, em caso de mora da autora/promitente compradora relativamente à marcação da data da escritura, a ré ficasse habilitada a marcar ela mesma tal ato, para data por si estipulada, sem prévio acordo com a autora, com a cominação de que a falta de realização da mesma determinaria o incumprimento definitivo do contrato; 36- De facto, o retardamento da prestação por parte da autora/promitente compradora, relativamente à data de realização da escritura, apenas habilitaria a ré a exigir que a mesma cumprisse a obrigação a que estava contratualmente vinculada, fixando-lhe os termos que entendesse convenientes, nomeadamente, fixando-lhe um prazo para que esta procedesse à marcação da escritura e uma data limite para a realização da mesma. Só desse modo existiria correspondência entre a obrigação a que se encontrava adstrita a autora e a obrigação que lhe poderia ser exigida pela ré; 37- A nosso ver, não assistia à ré, nem legal, nem contratualmente, a faculdade de proceder ela mesma, unilateralmente, à marcação da escritura, uma vez que a obrigação contratual de proceder à marcação da escritura competia efetivamente à autora, a qual, de resto, o fez — facto que a ré, pura e simplesmente, resolveu ignorar, independentemente da data corresponder, ou não, ao contratualmente previsto —; 38- A ré, entendendo que a autora estaria em mora, poderia reagir mediante interpelação admonitória à mesma dirigida para que esta procedesse à marcação e outorga da escritura da compra e venda em prazo razoável, desde logo fixado pela própria R., e sob pena de incumprimento definitivo (cfr. artº 808º, nº 1, do CC), e não, como fez, mediante interpelação admonitória para que a autora comparecesse ao ato da escritura, marcada pela própria ré, nas condições que bem entendeu, sem sequer se pronunciar relativamente ao facto de já se encontrar marcada previamente pela autora tal escritura. Poderia, ainda, a ré, recorrer à execução específica, faculdade que, de resto, lhe assistia legal e contratualmente, caso o prazo dado à autora para a celebração da escritura não fosse por esta respeitado; 39- Ou poderia a ré, tão só, sob a égide da boa-fé na execução dos contratos, promover um diálogo consensual com a autora no sentido de acordarem numa data para a escritura — eventualmente diversa da proposta pela autora, caso a ré não concordasse com a data marcada —, e, cumulativamente, acordarem nas condições que deveriam encontrar-se reunidas, em termos de realização de obras na fração, para que a autora pudesse proceder à aquisição e aplicação dos ventilo-convectores essenciais às condições especificas de habitabilidade que a mesma necessitava de dispor na fração; 40- Ao marcar a escritura da compra e venda, apesar do contrato estipular que tal marcação competia à A., ignorando e desprezando por completo o facto de que a data da escritura já se encontrava aprazada pela autora; nada dizendo ou fazendo no que respeita às suas obrigações contratuais de organização e entrega da documentação necessária à celebração do contrato definitivo, conforme também se encontrava contratualmente obrigada, bem como, nada dizendo ou fazendo relativamente à realização das obras para que a autora pudesse proceder à instalação do sistema de ventilo-convectores, a ré impôs unilateralmente a sua vontade, alterando a estipulação contratual de que tal marcação cabia à A; 41- Por regra, como é sabido, não é consentido a nenhuma das partes impor a sua vontade unilateral à outra parte no contrato, sob pena de violação da própria essência da relação contratual ou da boa fé (pacta sunt servanda). Ao agir deste modo a ré mais não pretendeu do que precipitar de forma habilidosa e oportunista um estado de coisas que lhe permitisse invocar o incumprimento definitivo do contrato por parte da autora, e sua consequente resolução, o que efetivamente veio a fazer; 42- Ao fixar unilateralmente a data da realização da escritura de compra e venda, a ré procedeu à alteração unilateral do contrato, servindo-se de tal alteração para invocar o incumprimento definitivo do mesmo e a sua consequente resolução; 43- Acresce, no caso concreto, a execução contratual do CPCV envolveu componentes relativamente complexas entre as partes, conforme resulta dos autos e da matéria provada (cfr. v.g. nºs 7,8,9, 35, 38, 39, 40, 41, 42, dos factos provados), pelo que, o ato de marcação da escritura não pode, em nosso entender, ser classificado como um ato de carácter puramente instrumental. A nosso ver, as nuances relativas ao cumprimento e incumprimento do CPCV têm que ser analisadas no contexto dos acontecimentos que se verificaram entre o momento da assinatura do contrato-promessa, e o momento em que, nos termos contratuais, deveria ter ocorrido a celebração do contrato definitivo. RR. Contudo, o Tribunal a quo desconsiderou em absoluto o contexto em que se processou a relação contratual, limitando-se a responsabilizar a ré pelo incumprimento; 44- A ré agiu completamente ao arrepio das regras da boa fé, tanto nos preliminares como na formação do contrato (cfr. 227º e 762º, nº 2, do CC); 45- Ao invocar a resolução contratual com fundamento na não comparência da Recorrente/Promitente Compradora à escritura por si unilateralmente marcada, sem que para tal estivesse contratual ou legalmente legitimada, tal resolução é ilícita; 46- Não podendo a ré, também nestas circunstâncias, por falta de fundamento legal ou contratual, fazer seu o sinal prestado pela A., como fez (cfr. artigo 442º, nº 2, primeira parte, a contrario); 47- Impunha-se neste contexto que o Tribunal a quo declarasse a ilicitude da resolução do contrato levada a efeito pela ré; 48- Ao decidir deste modo, o Tribunal a quo violou por erro de interpretação e aplicação o disposto na cláusula 5ª, alínea a) do CPCV em causa nos autos, bem como o disposto nos artigos 406º, nº 1, e 442º, nº 2, primeira parte, a contrario, do CC; 49- Conforme resulta do facto provado sob o nº 44 da sentença, “a ré não remeteu à autora a certidão de registo predial, a caderneta predial, a licença de utilização e a declaração do condomínio exigido pelo artigo 1424º-A do código civil; 50- Entendeu o Tribunal a quo, apoiando-se, de resto no aresto do Tribunal da Relação do Porto relativo ao procedimento cautelar a que supra já se fez referência, que “estes documentos apenas eram necessários para a celebração do contrato de compra e venda, não eram indispensáveis para a marcação da data para essa celebração. Tanto assim é que, não obstante acusar a falta desses documentos, a promitente-compradora logrou fazer a marcação para o dia 10 de abril! Logo, a promitente-vendedora apenas entraria em mora, sendo-lhe imputável o não cumprimento provisório do contrato, se, chegado o momento aprazado para aquela celebração, esta fosse impedida pela falta de algum dos documentos imprescindíveis e que deveriam ser obtidos e facultados pela promitente-vendedora. Por outras palavras, a circunstância de até final de 2022 a promitente-vendedora não ter apresentado à promitente-compradora tais documentos não determina que esta se encontrasse em mora nesse momento”; 51- Ora, atendendo à estrutura da cláusula 5ª, do CPCV, entendemos que o Tribunal a quo, uma vez mais, faz um erróneo enquadramento da questão, ao, por um lado, entender que a autora se constituiu em mora pelo facto de ter marcado a escritura para data diversa da estipulada na alínea a) do CPCV e, por outro, entender que a obrigação da ré em proceder à entrega da documentação necessária à celebração do contrato definitivo, prevista na mesma cláusula, “não constitui qualquer motivo para se considerar que a ré estaria em mora por incumprimento do dever de remeter essa documentação”; 52- Ou seja, o Tribunal a quo, valora de forma desigual as obrigações contratuais das partes, considerando que a autora incorreu em mora por não ter cumprido o previsto na alínea a) da cláusula 5ª do contrato, e entendendo, ao invés, que não há mora da ré quando a mesma comprovadamente não cumpriu a alínea b) da mesma cláusula! De facto, a circunstância da ré não ter entregue à A. a documentação “necessária à celebração do contrato definitivo” não a desonera da responsabilidade contratual inerente à falta de cumprimento dessa obrigação, independentemente de tal documentação poder ser entregue, no limite, apenas no próprio ato da escritura; 53- Atentando com mais rigor na cláusula quinta do CPCV, facilmente se conclui que existe uma correspondência clara entre a obrigação da autora de marcação da escritura e a obrigação da ré de entrega dessa documentação. Ou seja, as partes estipularam uma clara reciprocidade entre as obrigações de uma e de outra no que respeita à outorga do contrato definitivo; 54- Contudo, mesmo interpelada, pela autora, por carta e email expedidos no dia 25.11.2022, para proceder à entrega de tal documentação, tendo-lhe sido fixado um prazo de 8 dias para o efeito, sob pena de incumprimento (facto provado nº 23), a ré não o fez. A ré, pura e simplesmente, ignorou as interpelações que lhe foram dirigidas pela autora; 55- Ao não entregar a documentação que lhe foi solicitada, mediante interpelação expressa para o efeito, entendemos que, contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, existe mora da ré no que respeita ao cumprimento dessa obrigação contratual; 56- Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou por erro de interpretação e aplicação o disposto no artigo 804º, nº 2, do CC e a cláusula 5ª, alínea b) do CPCV. Por outro lado: 57- Foi dado como provado a existência de um acordo entre a Autora e a Ré, mediante o qual “a autora compraria e instalaria os ventilo-convetores e a ré assumiria o compromisso de pagar as obras necessárias para “destapar” os pontos de instalação dos ventilo-convectores, incluindo o custo da pintura das paredes que viessem a ser intervencionadas para a dita finalidade” (facto provado nº 40), uma vez que “os pontos (terminais) para instalação dos aparelhos ventiloconvectores se encontravam ocultos no interior das paredes” (facto provado nº 40), bem como; 58- Foi também dado como provado que a ré foi interpelada pela autora, por carta e email expedidos no dia 25.11.2022, para que, no prazo máximo de 8 dias, sob pena de “incumprimento dos deveres contratuais” lhe fossem “disponibilizadas as plantas da fração com indicação clara e precisa dos pontos de pré-instalação do referido sistema de aquecimento, devendo as correspondentes infraestruturas encontrar-se devidamente preparadas para receber os aparelhos ventilo-convectores (designadamente, encontrarem-se desobstruídas as canalizações e pontos de instalação e efetuadas eventuais reparações decorrentes de tal preparação”(facto provado nº 23); 59- Face a tal factualidade, dada como provada, não se compreende que o Tribunal a quo não atribua qualquer relevância ao acordo estabelecido entre as partes, escudando-se no teor da cláusula do CPCV onde se estatui que “qualquer alteração ao presente contrato, mesmo na modalidade de cláusula acessória, só poderá ser atendida caso venha a constar de acordo escrito e assinado pelas partes”. Entende o Tribunal a quo que a “questão do aquecimento representa uma estipulação acessória ao contrato, a qual, nos termos acordados pelas partes, estava sujeita a uma exigência contratual de forma escrita, não havendo nos autos documentos escritos que suportem o acordo de ambas as partes quanto ao que a promitente-compradora pretende”; 60- Existiu efetivamente um acordo entre as partes o qual não visou esclarecer ou alterar o conteúdo do CPCV, visando, isso sim, regular uma problemática que se colocou já após a celebração do contrato-promessa; 61- Nos termos do disposto no artigo 221º, nº 2, do Código Civil, que respeita à forma das declarações negociais, sendo uma estipulação posterior à celebração do CPCV, a mesma só estaria sujeita à forma legal prescrita para a declaração se as razões da exigência especial da lei lhes forem aplicáveis, pelo que, tratando-se de um acordo dirigido à realização de uma obra na fração prometida comprar, estabelecido pelas partes depois da assinatura do contrato-promessa de compra e venda, não se vislumbra que, para tal, a lei exija forma especial (cfr. supra número 54 da presente motivação); 62- Por conseguinte, o acordo em causa não constitui uma convenção sobre o conteúdo do documento, ou para além dele, sendo tal estipulação válida, nos termos do disposto no artigo 222º, nº 2, a ela não se opondo o regime do disposto no artigo 394º, nº 1, ambos do Código Civil; 63- Assim, mal andou o tribunal, mesmo tendo dado como provada a existência de um acordo entre as partes relativamente à problemática da realização das obras para viabilização da aplicação dos ventilo-convectores, ao considerar que tal estipulação “acessória” ao contrato estava sujeita a uma exigência contratual de forma escrita; 64- Ao dar o referido enquadramento a esta questão, o Tribunal violou, por erro de interpretação e aplicação o disposto no artigo 222º, nº 2, do Código Civil; 65- Para sustentar a sua fundamentação relativamente ao afastamento de existência de mora por parte da ré, o Tribunal a quo escreve, a dado passo, o seguinte: “não foi feita qualquer prova nos autos que a autora estivesse autorizada a instalar esses aparelhos antes da escritura de compra e venda. Por outro lado, a mesma também não fez prova nos autos que, antes da resolução do contratopromessa por parte da ré, tenha interpelado a ré para que a mesma lhe indicasse a localização exata dos pontos da pré-instalação desses aparelhos”; 66- Ora, não é assim! Tendo como referência que a ré resolveu o contrato em 19 de janeiro de 2023, encontra-se dado como provado que: a) em 25.11.2022, a autora, por intermédio do seu mandatário, remeteu à ré uma carta registada, a qual não foi reclamada (facto provado sob o número 22 dos factos provados); b) Encontra-se também dado como provado, sob o número 23 dos factos provados, que, a autora, simultaneamente, remeteu também por correio eletrónico à ré uma mensagem através da qual remeteu cópia dessa carta, conforme mensagem junta com a petição inicial sob doc. nº 16, constando dessa carta designadamente que “para efeitos de preparação e celebração do contrato definitivo, vimos solicitar a V. Exas., o seguinte: (...) ii) Que, considerando que até ao momento não foram promovidas pela V/empresa quaisquer diligências no sentido de ser possibilitada a instalação do sistema de aquecimento por ventilo-convectores na fracção — condição essencial para que a mesma reunisse as condições de habitabilidade para a M/Constituinte, como é do V/perfeito conhecimento e conforme se encontrava acordado —, lhe sejam disponibilizadas as plantas da fracção com a indicação clara e precisa dos pontos de pré-instalação do referido sistema de aquecimento, devendo as correspondentes infraestruturas encontrar-se devidamente preparadas para receber os aparelhos ventilo-convectores (designadamente, encontrarem-se desobstruídas as canalizações e pontos de instalação e efetuadas eventuais reparações decorrentes de tal preparação). iii)Que sejam disponibilizados os documentos a que se reporta a cláusula 5ª, alínea b), do contrato-promessa de compra e venda (CPCV), bem como, o Regulamento do Condomínio em vigor e a indicação do(s) responsáveis pela gestão do condomínio. Reputa-se como adequado o prazo máximo de oito dias, a contar da recepção da presente, para disponibilização, por parte da V/empresa, dos elementos referidos nas alíneas precedentes, findo o qual, sem que os mesmos nos tenham sido facultados, consideramos haver fundamento para invocação de incumprimento dos deveres inerentes à execução contratual, com as devidas consequências. Por fim, Nos termos da cláusula quinta, alínea a), do CPCV, comunicamos a V. Exas. que a escritura de compra e venda da fracção se encontra marcada para o dia 10 de Abril de 2023, pelas 9:00 horas, no Cartório Notarial de Espinho – Dra. EE, sito à Rua ..., em Espinho.” c) Encontra-se ainda dado como provado, sob o número 16 dos factos provados, que, a autora, em resposta à carta da ré datada de 21.12.2022, lhe enviou uma carta datada de 11 de janeiro de 2023, subscrita pelo seu mandatário, cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob o doc. nº 23, a qual foi devolvida por não reclamada, cujo teor o Tribunal deu por integralmente reproduzido, na qual consta o seguinte: “Em resposta à V/carta datada de 21 de dezembro de 2021, vimos transmitir a V. Exas. o seguinte: i. Conforme decorre do disposto na cláusula 5ª, alínea a), do contrato promessa de compra e venda (CPCV), competia à promitentecompradora, M/constituinte, a marcação da escritura, ou documento particular autenticado, até final do mês de novembro de 2022, o que esta fez, em 25.11.2022, por carta registada com aviso de receção e por correio eletrónico, ambos expedidos para os endereços convencionados constantes da cláusula oitava, alínea a) do CPCV. ii. Não compete, por conseguinte, a V. Exas., nos termos contratuais, a marcação da escritura de compra e venda, a qual se mantém agendada pela M/Constituinte para a data e local que Vos foram tempestivamente notificados; iii. Acresce que, até à presente data, apesar da interpelação que na referida missiva de 25.11.2022 Vos foi dirigida para o efeito, não foram disponibilizados por V. Exas. quaisquer dos elementos solicitados pela M/constituinte, nomeadamente, todos os documentos referentes à fracção em causa e respetivo condomínio (contratualmente elencados na alínea b) da respetiva cláusula 5ª), bem como, conforme acordado durante as negociações, garantia das condições de funcionamento da rede, e localização, em planta, dos pontos da pré-instalação do sistema de aquecimento, cuja instalação, como é do V/conhecimento, constitui um requisito essencial de habitabilidade da fração, dadas as condições específicas de saúde da M/Constituinte; 67- Resulta, por conseguinte, dos factos provados que, contrariamente ao que afirma o Tribunal a quo na sua fundamentação (cfr. sentença a págs. 29), a autora, ainda antes do prazo contratualmente considerado para a realização da escritura, e ainda antes da resolução contratual operada pela ré, a INTERPELOU, sob cominação de incumprimento contratual, para que a mesma lhe indicasse a localização exata dos pontos de instalação dos aparelhos ventilo-convectores (cfr. supra número 55 da motivação do presente recurso); 68- Tal matéria foi dada como provada, pelo que, ao considerar que a autora “não fez prova nos autos que, antes da resolução do contrato-promessa por parte da ré, a tenha interpelado para que a mesma lhe indicasse a localização exata dos pontos da pré-instalação desses aparelhos”, o Tribunal a quo julgou contrariamente à matéria dada como assente, incorrendo assim em manifesto erro de julgamento; 69- Acresce que, mesmo que, por hipótese, não se venha a dar como provado, em sede de reapreciação da matéria de facto, que a ré se comprometeu a facultar a instalação dos aparelhos ventilo-convectores logo após a assinatura do contratopromessa e antes da celebração do contrato definitivo, o certo é que também não foi dado com o provado que a ré apenas se comprometeu a promover as obras necessárias para o efeito, da sua responsabilidade, após a realização da escritura pública! 70- Ora, na ausência de prazo certo estipulado entre as partes, para efeitos de realização das ditas obras — embora, conforme supra se defendeu, as mesmas devessem ser realizadas pela ré até à data aprazada para a escritura — caberia a qualquer das partes determinar o momento do cumprimento dentro dos condicionalismos próprios da relação contratual, nomeadamente, no caso concreto, tendo por limite, no contexto de uma ponderação absolutamente razoável dos interesses em causa, o prazo para a realização da escritura de compra e venda (artigo 777º, nº 1, do CC); 71- Não tendo a obrigação da ré prazo certo, deverá a mesmo ser caracterizada como uma obrigação pura, isto é, sem termo convencional, legal ou judicial, o seu vencimento depende da interpelação do credor ao devedor. O efeito da interpelação é o vencimento da obrigação. E neste tipo de obrigações, o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, consagrando-se o princípio da essencialidade da interpelação (artigo 805º, nº 1, do CC) – [neste sentido Acórdão do TRP, de 23.05.2022, Relator Manuel Domingos Fernandes, disponível em dgsi.pt]; 72- Ora, o facto é que a autora interpelou a ré em 25.11.2022, fixando-lhe um prazo de 8 dias, com a cominação de que esta incorria em incumprimento, para que lhe fossem disponibilizadas as plantas da fração com a indicação clara e precisa dos pontos de pré-instalação do sistema de climatização, alertando-a para que as correspondentes infraestruturas se deveriam encontrar devidamente preparadas para receber os aparelhos ventilo-convectores, designadamente, encontrarem-se desobstruídas as canalizações e pontos de instalação e efetuadas eventuais reparações decorrentes de tal preparação (cfr. factos dados como provados sob o número 23); 73- A ré respondeu a tal interpelação, em 30.11.2022, data limite para a celebração do contrato definitivo, dizendo apenas que a fração se “encontrava no mesmo estado físico em que se encontrava no momento das visitas”, e nada dizendo sobre a preparação da fração para instalação dos ventilo - convectores” (cfr. factos dados como provados sob o número 24). Daqui decorre, claramente, que a ré, até à data de realização da escritura, nenhuma diligência tinha promovido no sentido de dotar a fração das condições de que a autora necessitava para proceder à instalação dos ventilo-convectores; 74- Ora, a obrigação da ré consistia precisamente em realizar as obras necessárias na fração para “destapar” o sistema de pré-instalação de ventiloconvectores e, na sequência disso, informar a autora de que a fração se encontrava apta para que esta pudesse proceder à aquisição e instalação dos ditos aparelhos, o que ré, mesmo interpelada para o efeito, nunca fez! 75- Nestes termos, o prazo de 8 dias dado pela autora à Ré, para que esta lhe disponibilizasse as plantas da fração com a indicação clara e precisa dos pontos de pré-instalação dos ventilo-convectores — com a advertência de que as correspondentes infraestruturas deveriam encontrar-se devidamente preparadas para receber os referidos aparelhos (designadamente, encontrarem-se desobstruídas as canalizações e pontos de instalação e efetuadas eventuais reparações decorrentes de tal preparação) —, bem como, que lhe fossem disponibilizados os documentos necessários para a realização da escritura, terminou no dia 3 de novembro, razão pela qual, nessa data a ré se constituiu em mora perante a autora; 76- Mal andou, por conseguinte, o Tribunal a quo, ao afirmar, contrariamente à matéria dada como provada, que não foi feita prova que a autora “antes da resolução do contrato-promessa por parte da ré, tenha interpelado a ré para que a mesma lhe indicasse a localização exata dos pontos de instalação desses aparelhos”, e daí concluir que a “ré não estava em mora quanto ao cumprimento de qualquer obrigação acessória a que se tivesse obrigado, tanto mais que não há prova nos autos que a mesma tenha assumido que pagaria o custo da obra antes da outorga do contrato definitivo de compra e venda”; 77- Mais ainda, o Tribunal, para além de considerar que “do ponto de vista da normalidade e atendendo a juízos de experiência comum, não é credível que a ré assentisse na colocação desses aparelhos por parte da autora antes da outorga da escritura” (cfr. sentença a págs. 15), confundindo a obrigação a que a ré se vinculou de realizar as obras para que a colocação dos aparelhos fosse viável, com a aplicação propriamente dita dos mesmos, alvitra que a “autora deveria comprar os aparelhos e contratar a empresa para os colocar e, nessa altura, interpelar a ré para proceder ao custo da obra que teria que ser realizada para essa instalação, designadamente com a pintura das paredes intervencionadas” (cfr. sentença a págs 29); 78- Ora, tal raciocínio, para além de meramente conclusivo, não encontra o mínimo de sustentação na prova produzida, inverte a lógica da normalidade do acontecer e escapa a uma análise ponderada onde se façam intervir os juízos da experiência comum (cfr. número 57 da motivação do presente recurso); 79- Estando a ré em mora perante a autora desde, pelo menos, o dia 3 de dezembro de 2022 — mora essa que se iniciou no final do prazo de 8 dias que em 25.11.2022 foi, pela A., fixado à R. para que esta lhe fornecesse os elementos de que necessitava para proceder à instalação dos aparelhos ventilo-convectores — não assistia à ré a possibilidade de invocar a mora da autora, como fez, por carta datada de 5 de dezembro de 2022, sob pena de violação do princípio da boa-fé; 80- A mora da R. decorre do facto da mesma, mesmo depois de ter sido interpelada para tal, não ter praticado os atos necessários e indispensáveis à entrega da fração nas condições acordadas com a A., nomeadamente, e no mínimo, os elementos relativos ao referido sistema de climatização. A obrigação de proporcionar à A. os elementos relativos à localização, no interior da fração, da rede para instalação dos ventilo-convectores constitui, pela sua natureza — e essencialidade para as condições de habitabilidade da fração, atendendo às específicas necessidades da autora e que eram do conhecimento da ré — um dever acessório da prestação que se repercute necessariamente na evolução da execução contratual, pondo em crise a viabilização do seu objetivo final (cfr. Ac. STJ de 27.05.2003, proc. 03A1232; Ac. TRP, de 09.03.2023, proc. 9882/21.1T8PRT.P1; Ac. TRC, de 27.02.2018, proc. 6918/16.1T8CBR.C1, disponíveis em dgsi.pt); 81- Ao omitir, de forma patente e culposa, um dever acessório ou lateral suscetível de colocar em perigo o contrato, a ré incorreu em incumprimento contratual; 82- A ré não dispunha de qualquer fundamento, contratual ou legal, para proceder, ela mesma, unilateralmente, à marcação da escritura de compra e venda — como fez —, bem como, para invocar a existência de incumprimento do contrato por parte da A. e assim converter a invocada mora em incumprimento definitivo e, por essa via, resolver o contrato, como fez; 83- Ao resolver o contrato com fundamento na não comparência da Recorrente/Promitente Compradora às datas por si unilateralmente marcadas para a realização da escritura, sem que para tal estivesse a contratual ou legalmente legitimada, tal resolução é ilícita; 84- Por outro lado, não estando a Recorrente/Promitente Compradora em mora, conforme supra demonstrado, uma vez que a escritura se encontrava por esta marcada para o dia 10 de abril de 2023, tendo sido agendada e comunicada à Promitente Vendedora/Requerida no dia 25 de novembro de 2022 (ou seja, até ao final do mês de novembro de 2022, como resulta da cláusula 5ª, nº 1, alínea a), do contrato) não assistia à Promitente Vendedora/Requerida a possibilidade de invocação de incumprimento definitivo do contrato por parte daquela; 85- Não sendo, por conseguinte, também por esta via, lícita a resolução do contrato operada pela Promitente Vendedora/Requerida, não se tendo, sequer, formado qualquer direito de resolução na sua esfera jurídica, conforme se extrai do disposto no nº 1, do artigo 432º, do CC; 86- Acresce que, conforme tem sido entendimento doutrinal e jurisprudencial o incumprimento definitivo de uma obrigação ocorre sempre que o devedor adote uma conduta concludente ou emita uma declaração dos quais se retire uma vontade séria e definitiva de não cumprir. Sucede que a autora em momento algum recusou o cumprimento do CPCV, uma vez que a escritura de compra e venda se encontrava por esta marcada para o dia 10 de abril de 2023, tendo sido agendada e comunicada à ré no dia 25 de novembro de 2022. Por seu lado, a ré em momento algum invocou perda de interesse na realização do negócio acordado; 87- Assim, a ré agiu de forma deliberada no sentido de precipitar a resolução do contrato, por sua iniciativa, com o único objetivo de fazer seu o sinal prestado pela autora, bem sabendo, que ela própria nada fez para cumprir as suas obrigações contratuais prévias à celebração do contrato prometido, nomeadamente, no que respeita à questão fundamental da instalação da climatização na fração em causa; 88- Não podendo a ré, nestas circunstâncias, por falta de fundamento legal ou contratual, fazer seu o sinal prestado pela A., como fez (cfr. artigo 442º, nº 2, primeira parte, a contrario); 89- Ao decidir deste modo, o Tribunal a quo, violou, por erro de interpretação e aplicação, o disposto no artigo 442º, nº 2, primeira parte, a contrario, do CC, bem como, os artigos 804, nº 1 e 808º, nº 1, 2ª parte, do CC; 90- Face a mora da R. relativamente à entrega dos elementos para a realização da escritura pública de compra e venda, bem como os elementos relativos ao sistema de climatização, a A. interpelou-a, sob a forma de interpelação admonitória, para que a mesma desse cumprimento às obrigações de entrega dos referidos documentos e restantes elementos, tendo-lhe fixado prazo para o efeito, sob cominação de ser por esta declarada a resolução do contrato, por incumprimento absoluto e definitivo, com as inerentes consequências, nomeadamente a prevista na cláusula 4ª, nº 2, do mesmo, ou seja, a devolução do sinal em dobro (cfr. factos provados nºs 18); 91- A R., notificada nos referidos termos, não procedeu à entrega dos documentos e elementos a que se encontrava obrigada, nem compareceu ao ato da escritura, tendo a Recorrente/Promitente Compradora, por seu lado, estado presente (cfr. factos provados nºs 19); 92- Ao não proceder à entrega dos documentos necessários à realização da escritura dentro do prazo que lhe foi fixado, incluindo o próprio dia em que se encontrava marcada a escritura de compra e venda — obrigação relativamente à qual se encontrava em mora, depois de ter sido por diversas vezes interpelada para o efeito —, nem ter comparecido à outorga da mesma, a R. incumpriu, de modo absoluto e definitivo o CPCV, por via da conversão da mora em incumprimento definitivo (artigo 808º, nº 1, do CC); 93- Face a tal incumprimento, a autora comunicou à ré a resolução do CPCV entre ambas celebrado, tendo-a igualmente interpelado, com fixação de prazo, para que esta procedesse ao pagamento do sinal em dobro, nos termos contratualmente previstos (cfr. factos provados nº 20); 94- A resolução contratual declarada pela A. nos termos supra expostos foi, por válida e eficaz, implicando a destruição do negócio jurídico e a consequente restituição do sinal em dobro (artigos 433º e 442ª, nº 2, do CC, e cláusula 4ª, nº 2 do CPCV); 95- Conforme resulta à evidência, a ré não cumpriu um conjunto de deveres de conduta que se impõem no âmbito da execução contratual, em obediência ao princípio da boa-fé (nomeadamente os elencados no ponto 64, supra, da motivação do presente recurso, os quais, por economia processual aqui se dão como integralmente reproduzidos); 96- Da análise contextualizada de toda a factualidade, o certo é que a ré, não adotou, ao longo da relação contratual, uma conduta pautada pela boa-fé na execução do contrato, alheando-se do cumprimento dos mais elementares deveres de conduta, os quais, “não interessando diretamente à prestação principal, nem dando origem a qualquer ação autónoma de cumprimento (cfr., arts. 817º e ss) são todavia essenciais ao correto processamento da relação obrigacional em que a prestação se integra” (cfr. “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, ) ed. Almedina, pág. 126); 97- A ré pura e simplesmente ignorou todos os seus deveres acessórios de conduta e o dever geral de boa-fé a partir do momento em que ficou formalizado o CPCV, não tendo prestado as informações e esclarecimentos que lhe foram solicitados pela autora, não tendo, inclusivamente, aceite a correspondência sob registo que a mesma lhe enviou, nem levado a efeito quaisquer diligências para realizar a obra a que se comprometeu; 98- A admitir-se que a autora não cumpriu o acordado quanto à data contratualmente fixada para a realização da escritura de compra e venda, e que, de tal incumprimento, decorre o respetivo incumprimento definitivo, o certo é que a conduta da ré contribuiu, de forma clara e evidente, para que não fosse viável a realização do contrato definitivo na data contratualmente fixada; 99- A ré agiu patentemente com o propósito de obstaculizar à celebração da escritura e precipitar a resolução do CPCV no sentido de fazer seu o sinal prestado, aproveitando-se do facto da autora, em determinado momento, ter manifestado receio de correr o risco de vir a habitar num complexo habitacional praticamente deserto (conforme factos provados nº 42), e ter, nessa circunstância, em determinado período, equacionado não vir a celebrar o negócio, tendo proposto à ré, na sequência de conversas havidas entre ambas, a revogação do CPCV (facto provado sob o nº 7), e, mais tarde tendo proposto uma moratória para a celebração da escritura de compra e venda (conforme factos provados nº 9). A ré aproveitou-se de forma despudorada das fragilidades manifestadas pela autora em determinado momento da relação contratual para adotar uma conduta omissiva tendente a precipitar a resolução do contrato, como veio a suceder; 100- A ré aproveitou-se claramente, sem o concurso de qualquer outra causa, do facto da autora ter marcado a escritura de compra e venda para data diversa da contratualmente fixada, como pretexto para precipitar a resolução contratual — estando ela mesma em mora, como entendemos, que estava —, alegando incumprimento da autora, sendo que, para esse incumprimento, também concorreu a ré, com a sua conduta culposa e morosa; 101- A conduta da ré, ao declarar a resolução contratual nas circunstâncias descritas, é claramente abusiva (artigo 334º do Código Civil) e, como tal, insuscetível de tutela para os fins previstos no artigo 442º, nº 2, co CC; 102- Mesmo que não se considere a existência de abuso de direito, entendemos que, mediante um exercício ponderado da conduta das partes, deverá, no mínimo, ser equacionada a verificação de condutas culposas de autora e ré, sendo pertinente o recurso ao regime previsto no artigo 570º, do Código Civil, para valoração da indemnização, com base na gravidade das culpas; 103- Como ensina Calvão da Silva, citado no Acórdão do TRP, de 02.05.2013, relator Pinto de Almeida: “Se as culpas dos dois contraentes forem iguais, a indemnização deve ser excluída, devendo o accipiens restituir o sinal em singelo, pois não se vê a que título possa retê-lo legitimamente. É que tal restituição não reveste natureza indemnizatória, sendo antes mera consequência da resolução – equiparada quanto aos efeitos, à nulidade ou à anulabilidade (arts. 433º e 434º) — que tem eficácia retroativa, pelo que deve ser restiyuido tudo quanto tiver sido prestado (artº 289º, ex vi do artigo 433º”. Assim, caso se considere existir equivalência no que respeita às condutas culposas das partes contraentes, não há lugar a indemnização, mas apenas à restituição à autora do sinal prestado; 104- Tratando-se da restituição do sinal em singelo, o respetivo montante é inferior à quantia inicialmente peticionada pela autora (dobro do sinal), contendose, por isso, no âmbito desse pedido - artº 661º, nº 1, do CPC – (nesse sentido o Acórdão citado). Nestes termos e melhores de Direito, Entende a Recorrente que o Tribunal a quo fez uma errónea análise crítica da prova, bem como, uma errada interpretação e aplicação do direito, incorrendo em manifesto erro de julgamento, pelo que, deve a sentença ser revogada e substituída por outra que determine: a) Declarar ilícita a resolução do contrato promessa operada pela ré e, consequentemente, condenar a mesma a restituir à autora o sinal em dobro; Caso assim não se entenda; b) Ponderadas as condutas das partes, nos termos supra enquadrados, ser determinada a restituição do sinal em singelo à autora. Assim se fazendo Justiça. A ré apresentou contra-alegações, que termina com as seguintes conclusões: 1- A Recorrente interpôs recurso da Douta Sentença, que julgou a ação improcedente e, consequentemente, absolveu a Ré dos pedidos. Assim, pugna a Autora pela revogação da decisão e pela sua substituição por outra que declare ilícita a resolução do contrato-promessa efetuada pela Ré, com a consequente condenação desta na restituição do sinal em dobro ou, subsidiariamente, na restituição do sinal em singelo à Autora; 2- Ora, entendemos que o recurso não merece provimento; 3- Em primeiro lugar, cumpre esclarecer que a expressão “desconhecendo-se, por conseguinte, onde viriam a ser instalados” não consta do facto provado n.º 38; 4- Por outro lado, defende ainda a Recorrente, no ponto III.1., que o facto provado n.º 39 deveria ser alterado. Sustenta tal pretensão com o argumento de que, em momento algum da audiência de julgamento, teria sido produzida prova no sentido de que a infraestrutura em causa (pré-instalação para sistema de ventilo-convectores) se encontrava operacional, ou de que tal facto tivesse sido transmitido à Autora; 5- Todavia, resulta de forma clara, da prova documental, concretamente as mensagens trocadas entre a Autora e o legal representante da Ré, no dia 05/08/2022, constantes no Doc. 1 da Contestação, página 10, bem como resulta do depoimento da Autora, que esta tinha conhecimento da pré-instalação dos aparelhos. Vejamos o depoimento da Autora, AA, na sessão de julgamento do dia 01-04-2025, dos minutos 00:21:36 a 00:23:25; 6- Por outro lado, alega, na parte III 1. ponto 2, que não resulta do depoimento do Sr. Arquiteto BB o afirmado pelo tribunal, ou seja, que a testemunha explicou que “no seu projeto estava prevista a colocação de ventiloconvectores debaixo das janelas, tendo o mesmo conhecimento que esses aparelhos não foram colocados, tendo sido informado que quem fez a obra acabou por não instalar os aparelhos, mas fazer a pré-instalação e que essa pré-instalação iria ser feita nas paredes”, mais explicou que ” “existindo a pré-instalação nas paredes é muito fácil detetar onde estão os pontos, sendo que isso é feito “todos os dias”, que “existindo a pré- instalação nas paredes é muito fácil detetar onde estão os pontos, sendo que isso é feito “todos os dias”; 7- Contudo, é incorreta a alegação da Recorrente neste ponto, porquanto, tal decorre inequivocamente do depoimento do Arquiteto BB, que afirmou que, quem tivesse procedido à instalação poderia verificar a existência da pré-instalação, sendo certo que, ainda que tal implicasse partir paredes, isso não constituía um obstáculo relevante, uma vez que tais intervenções, apesar de serem uma obra, são frequentes e relativamente simples. Vejamos o depoimento da testemunha, BB, na sessão de julgamento do dia 01-04-2025, dos minutos 00:05:39 a 00:06:35; assim como decorre das transcrições do depoimento da referida testemunha nas alegações de recurso (00:09:39), a instâncias da Sra. Dra. Juíza, que um colaborador do Arqt. foi ao local e lhe disse que existia essa pré-instalação; 8- Mais refere a Recorrente, nos pontos 4 e 5 da parte III 1., citando o Sr. Arquiteto BB, que os radiadores teriam sido projetados “debaixo das janelas e que os mesmos são horizontais (3’51’’) e que, por conseguinte, seriam colocados no pavimento, debaixo das janelas (5’23’’), e não nas paredes”. (sublinhado nosso); 9- Contudo, a testemunha esclareceu que, de facto, muito embora inicialmente tivesse projetado o sistema de pré-instalação sob as janelas, teve conhecimento que, por razões de altura, dado que a fração objeto dos autos se localiza no sótão, a instalação viria a ser feita nas paredes. Veja- se o depoimento da testemunha, BB, na sessão de julgamento do dia 01-04- 2025, dos minutos 00:05:12 a 00:05:51; 10- Ora, perante o alegado, conclui a Recorrente que deve ser alterada a redação do facto provado nº 39, pois, conforme consta na parte III. 1., ponto 1., “em momento algum da audiência de julgamento foi produzida prova no sentido de que a infraestrutura em causa (pré-instalação para sistema de ventilo-convectores) se encontrava operacional”; 11- Contudo, o facto provado constante no n.º 39, de que a infraestrutura estava “operacional”, deve ser lida neste contexto: o edifício dispunha de um sistema de climatização instalado e em condições de cumprir a sua função, restando ao comprador a opção de expandir o sistema (com ventilo-convectores), o que em nada afeta a operacionalidade da infraestrutura já existente; 12- A tentativa da Recorrente de reduzir a noção de “operacional” a uma exigência de existência imediata dos ventilo-convectores não corresponde à realidade técnica do projeto, como resulta do depoimento do Arq. BB e demais testemunhas, nomeadamente do consultor imobiliário Sr. FF, que confirmou que os apartamentos apenas dispunham de pré- instalação, cabendo ao comprador a aquisição e instalação dos aparelhos; 13- Veja-se as transcrições do depoimento do Arquiteto BB, também constantes das alegações do Recorrente, minuto 00:09:49, em que Recorrente omite um texto relevante, aqui sublinhado, e em sua substituição coloca reticências, mas que se passa a transcrever de forma completa: minuto 00:09:49 - BB “E que soube que havia. Mas não está nada à vista. Eu acho muito estranho que se faça a instalação e depois se tape. Estranho, não é? Geralmente deixa-se umas pontas de uns canos”; 14- Da sequência do depoimento do Arquiteto BB resulta claramente a operacionalidade dessa estrutura, uma vez que existia a pré-instalação necessária para o efeito. Veja-se o depoimento da testemunha, BB, na sessão de julgamento do dia 01-04-2025, dos minutos 00:09:30 a 00:10:15, e ainda o depoimento do Sr. FF, consultor imobiliário, que promoveu a fração em discussão nos presentes autos, na sessão de julgamento do dia 01-04-2025, dos minutos 00:03:13 a 00:05:28; 15- Por todo o exposto, não assiste razão à Recorrente e não deve ser alterado o facto provado n.º 39; 16- Já no que respeita à parte III. 2., dos pontos 9 ao 13, a Recorrente entende que o facto provado nº 40 deveria ser alterado, pois sobre a Ré impendia o compromisso de realizar e pagar as obras necessárias para destapar os pontos de instalação; 17- Para justificar tal pretensão, a Recorrente apoia-se nos depoimentos do legal representante da Ré, o qual declarou que “assumia a obra de trolha”, e que tinha aceitado “fazer a obra da parte de trolha”; 18- Contudo, é evidente que tais expressões não podem ser interpretadas senão como um lapso decorrente da oralidade do depoimento, não encontrando qualquer sustento nos documentos juntos aos autos, uma vez que do seu depoimento se deve entender que “assumir” e “fazer” são declarados no sentido de contratar outrem para a realização das referidas obras, mas que o custo das mesmas seria suportado pela Ré; 19- Aliás, quando confrontado, em instâncias do Advogado da A., o legal representante da Ré foi perentório ao esclarecer que apenas aceitou pagar e não realizar/executar a obra. Vejamos o depoimento do legal representante da Ré, GG, na sessão de julgamento do dia 01-04-2025, dos minutos 00:11:38 a 00:11:52; 20- Pelo exposto, não se pode atribuir qualquer relevo a lapsos orais ou a eventuais contradições resultantes da espontaneidade dos depoimentos, sobretudo quando em desconformidade com a prova documental ou obtidos mediante a omissão de partes relevantes do depoimento prestado; 21- Sem prejuízo do supra exposto, entendemos ser irrelevante acrescentar a palavra “realizar” no número 40º dos factos provados; 22- Por outro lado, na parte III. 3. ponto 35, defende a Recorrente que devem ser dados como provados os pontos 3. e 4. dos factos não provados, sugerindo nova redação para os mesmos. Para alicerçar tal pretensão, indica, na parte III. 3. no ponto 16, que “o Tribunal valorou de forma diferente a posição processual da autora e da ré, ao aceitar como credível a declaração do representante da ré (…) e relativizar as declarações de parte da autora”; 23- Todavia, o Tribunal a quo justificou a valoração das declarações de parte do legal representante da ré, uma vez que “nos autos não foi feita qualquer outra prova que sustentasse a versão da autora”, conforme também consta do ponto 15 da parte III. 3. das alegações; 24- Com efeito, é entendimento consolidado na jurisprudência que “as declarações de parte (art. 466 do CPC) ou o depoimento de um interessado na procedência da causa não podem valer como prova de factos favoráveis a essa procedência se não tiverem o mínimo de corroboração por um qualquer outro elemento de prova”. – Douto Acórdão do TRP, datado de 20-11-2014, P.1878/11.8TBPFR.P2, disponível em https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/68f4a7f536821d4a80257da300330060?OpenDocument; 25- Não obstante, sustenta a Recorrente que o raciocínio do Tribunal a quo é ilógico, porquanto “não é normal, nem decorre da experiência comum (…) que depois de celebrado o contrato definitivo se viessem a realizar obras na fração”, sugerindo factos provados, nas alíneas a) e b); 26- Para justificar a sua pretensão, invoca que “a existência de um sistema de climatização por ventilo-convectores foi essencial para que a autora tomasse a decisão de adquirir a fração em causa”, concluindo que “do ponto de vista da normalidade e atendente a juízos de experiência comum, é que as obras para instalação dos referidos ventilo-convetores fossem efetivamente realizadas antes da escritura de compra e venda, e não o contrário!”. (sublinhado e negrito nossos); 27- Todavia, importa sublinhar que, por Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no âmbito de um procedimento cautelar, P. 809/23.7T8PVZ.P1, datado de 12-07-2023, disponível em https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/0617d749001a1f3480258a3200341bb9?OpenDocument, do qual são partes a aqui A. e R., considerou também como estipulação acessória; 28- Assim, inexistindo qualquer estipulação contratual que indicasse a instalação de ventilo-convectores como condição essencial e necessária, nem adenda ao CVPC, nem sequer trocas de mensagens, cartas ou emails entre a A. e a R. cujo teor concluísse pela existência de tal acordo, designadamente quanto à realização da obra antes da celebração do contrato prometido, não é possível afirmar que tal constituía cláusula essencial à celebração do negócio; 29- Mais indica, no ponto 27 e 28, que não vislumbra “em que medida [a Ré] correria qualquer risco ou necessitaria de qualquer garantia para realizar obras”, uma vez que estas obras, para tornar visíveis os terminais de ligação dos ventilo-convectores, permaneceriam para o futuro; 30- Todavia, importa sublinhar que o apartamento já se encontrava totalmente construído e em condições de ser habitado, pelo que a realização de obras adicionais para expor os terminais de ligação dos ventilo-convectores apenas faria sentido se um outro adquirente tivesse, de antemão, manifestado a intenção de instalar tais equipamentos. Nesse cenário, afigura-se desprovido de racionalidade exigir da Ré que suportasse despesas suplementares com trabalhos que poderiam revelar-se inúteis, caso um outro comprador optasse por não utilizar os referidos terminais; 31- Refere ainda que o Tribunal confunde a realização das obras para destapar os terminais de ligação dos referidos aparelhos com a colação dos mesmos propriamente ditos, o que não corresponde à verdade. Está claro que os pontos 30 e 31 das Alegações de recurso nunca foram colocados em causa pelo Venerado Tribunal, conforme o facto provado nº 40; 32- Acrescenta ainda, no ponto 34, que o legal representante da Ré referiu que a Autora poderia começar a “preparar o apartamento”, expressão que, de forma evidente, se reportava a diligências como “tirar medidas”, para ajustar as mobílias e decoração, atividades que, aliás, a Autora já havia realizado em momento anterior, acompanhada pela testemunha HH, conforme consta do depoimento da A. e do documento 1 da contestação, ou a colocação de alguns móveis. Tal referência não pode, pois, ser entendida como autorização para a realização de obras a expensas da Ré, as quais implicariam encargos adicionais, e conforme já exposto, da intenção ou não do comprador de instalar o aparelho em causa; 33- Refere ainda, no mesmo ponto, que, na carta enviada pela Autora à Ré, se fazia menção a que as obras necessárias deveriam ser realizadas antes da sua mudança, pretendendo extrair daí que tal facto se encontraria assente, pelo simples motivo de a Ré não ter respondido; 34- O que não corresponde à verdade, uma vez que a Ré respondeu à sua missiva informando a Autora de que teria acesso para preparar “o imóvel para a sua mudança”; 35- Caso assim não se entenda, é evidente que o silêncio não pode, por si só, ser interpretado como concordância com o teor da missiva, não resultando daí qualquer aceitação tácita da obrigação invocada pela Autora; 36- Conclui-se, assim, que a tese da Recorrente assenta apenas em juízos de experiência comum incorretos e em declarações de parte não corroboradas por qualquer elemento documental ou probatório, razão pela qual bem andou o Tribunal a quo ao considerar não provados os factos em causa; 37- Por outro lado, na parte III. 4., dos pontos 36 a 41, alega A. que a existência dos pontos de instalação dos ventilo-convectores era condição essencial para a outorga do contrato definitivo, no entanto, a falta de interpelação neste sentido, fragiliza a sua própria versão, uma vez que, se tal condição fosse verdadeiramente essencial e necessária, seria expectável que a Recorrente tivesse diligenciado, de forma expressa e documentada, no sentido de obter da Ré a informação da localização dos pontos de instalação dos ventilo-convectores; 38- Isto é ainda reiterado na Fundamentação de Direito da Sentença do Tribunal a quo, que reitera a inexistência de comunicações a este propósito, uma vez que “não obstante a troca de mensagens e cartas constante entre as partes, a primeira vez que a autora faz referência por escrito a essa questão dos pontos de pré-instalação foi na carta que remeteu à Ré a marcar a escritura para abril de 2023”, veja-se em 25/11/2022, muito após o prazo limite estabelecido para a marcação da celebração da escritura; 39- Aliás, para além da prova documental, tal convicção do Tribunal resulta ainda do depoimento da própria Autora, na mesma sessão de julgamento, dos minutos: 00:06:50 a 00:07:56; 00:09:28 a 00:10:33; 00:29:30 a 00:30:02; 00:47:38 a 00:51:40; 40- Ora, não tendo a Autora demonstrado, por qualquer meio de prova documental ou testemunhal, ou mesmo com o seu depoimento, que, efetivamente, formulou tais interpelações, inexiste fundamento para alterar a decisão proferida pelo Tribunal a quo quanto ao ponto n.º 5 dos factos não provados; 41- Mais alega a Recorrente na parte III. 5, nos pontos 42 e 43 que, com interesse para a decisão da causa devem dados como provados os factos neles constantes; 42- Ora, entendemos que tais factos não têm qualquer interesse para a decisão da causa, considerando os factos provados n.ºs 11 a 15, porquanto, nas datas agendadas para outorga do contrato definitivo – 21/12/2022 e 19/01/2023 estava reunida toda a documentação necessária e válida que permitia a outorga do documento particular de compra e venda, conforme Douta Sentença e Acórdão deste Venerado Tribunal, suprarreferido, nº 809/23.7T8PVZ.P1; 43- Certo é que não foi marcada qualquer escritura para o dia 30 de novembro de 2022, pelo que é irrelevante para a decisão da causa que tais factos sejam dados como provados; 44- Quanto à Matéria de Direito, na parte IV. 1. pontos 50 e 44, respetivamente, defende a Recorrente que o Tribunal “violou por erro de interpretação e aplicação o disposto na cláusula 5ª, alínea a) do CPCV em causa nos autos, bem como o disposto nos artigos 406º, nº 1, e 442º, nº 2, primeira parte, a contrario, do CC”, porquanto entende que a obrigação de marcação da escritura, a cargo da Autora, foi cumprida; 45- Sustenta, em síntese, que o incumprimento da Autora não residiu na omissão da marcação da escritura, mas antes na fixação, pela Autora, de data diversa daquela que havia sido contratualmente estipulada, o que configuraria apenas um eventual retardamento da prestação ou incumprimento parcial e temporário, e não definitivo, porquanto a Recorrente/Promitente Compradora teria mantido o seu interesse e compromisso na celebração do contrato definitivo; 46- Tal como referido na Douta Sentença do Tribunal a quo, bem como do Douto Acórdão do Tribunal ad quem, no âmbito do processo suprarreferido (P. 809/23.7T8PVZ.P1), considerou-se que a cláusula 5ª, alínea a) do CPCV, que a Recorrente refere, deve ser interpretada como sendo a data da “celebração do contrato prometido, não a mera marcação de uma data futura para essa finalidade”; 47- Aliás, é falso que a Recorrente tenha mantido o seu interesse e compromisso na celebração do contrato definitivo, uma vez que, nem marcou a escritura dentro do prazo contratualmente previsto no CPCV, nem compareceu nas duas datas fixadas pela Ré, posteriores ao seu incumprimento, tendo expressamente manifestado, de forma documental e testemunhal, a sua intenção de resolver o contrato. Vejamos o depoimento da Autora, AA, na mesma audiência de julgamento, já suprarreferido; 48- Prosseguindo, a Recorrente sustenta, no ponto 48 da parte IV.1, que cumpre apurar se “assistia à ré a faculdade de proceder ela mesma à marcação dessa escritura, como efetivamente fez”, o que não se coaduna com o Acórdão suprarreferido P. 809/23.7T8PVZ.P1; 49- Veja-se que, para que o incumprimento não se tornasse definitivo, a Ré, de boa-fé, indicou mais duas datas distintas para a celebração da escritura, sem que a A. comparecesse a qualquer uma delas; 50- Veja-se que a A. nada fez, tendo a R. diligenciado duas datas distintas, razoáveis, com a devida antecedência, o que poderia nem sequer ter feito, uma vez que “nada obsta a que, por razões de economia processual, se utilize uma única declaração para a interpelação admonitória e para a resolução”. – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. nº 831/19.8T8PVZ.P1.S1, datado de 23- 06-2022, disponível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/f3522860209e7f718025886a00567ff8?OpenDocument. Aliás, mais refere este Douto Acórdão que “A interpelação admonitória é, porém, dispensada quando a parte contratante a quem a mesma seria endereçada teve uma conduta que, para além de atentatória da boa fé contratual, se mostra reveladora de clara intenção de não querer cumprir o contrato”; 51- Foi precisamente o que se verificou no caso em apreço: a Autora, por declarações suas e por prova documental, demonstrou claramente a intenção de não cumprir, manifestando vontade de resolver o contrato, em outubro de 2022; 52- Destarte, ao contrário do que a Recorrente alega, a Ré não só se limitou a marcar a escritura, faculdade que lhe assistia, como foi além do exigível, ao diligenciar pela marcação de mais uma data, garantindo todas as condições necessárias à celebração; 53- Não lhe competia, portanto, instaurar um diálogo adicional para marcação de nova data, sendo a própria Autora quem, como bem refere o Acórdão do Tribunal da Relação n.º 809/23.7T8PVZ.P1, poderia ter sugerido data alternativa, cessando desse modo a sua mora. De facto, quem não promoveu o diálogo foi a Autora; 54- Prossegue a Recorrente, na parte IV. 2. Contudo, apesar de a Recorrente invocar o facto provado nº 44 da Douta Sentença para justificar uma alegada mora da Ré, tal facto não consubstancia, em rigor, a verdadeira razão pela qual a Autora não diligenciou pela marcação da escritura de compra e venda; 55- Com efeito, a Autora alega que não dispunha da documentação necessária para a outorga do contrato prometido, sendo certo que, do facto provado n.º 44, resulta que a Ré não entregou tal documentação; 56- Ora, conforme resulta dos factos provados 10 a 15, nas datas agendadas para a realização da escritura, já estava reunida a documentação; 57- Assim sendo, veja-se que, não foi por esse motivo que a A. não marcou a escritura, conforme resulta do depoimento da própria Autora, já supratranscrito, mas sim por motivos diversos, designadamente o receio de residir num edifício ainda pouco habitado. Tal constata-se no seu depoimento, quando, interpelada pela Ilustre Mandatária da Ré acerca da carta remetida pela Autora em outubro; 58- Com efeito, a A. reconheceu que, já em agosto, tinha obtido, por sua própria iniciativa, os elementos documentais necessários, resultando, pois, que a falta de entrega documental pela Ré não constituiu, na prática, a causa impeditiva da celebração da escritura. Vejamos o depoimento da Autora, AA, na mesma sessão de julgamento, dos minutos 00:49:10 a 00:50:07; 59- Em suma, a invocação da mora da Ré pela Recorrente carece de fundamento, pois a Autora não deixou de marcar a escritura por ausência de documentação, mas antes por razões alheias a essa questão, funcionando tal argumento como uma justificação artificiosa; 60- Já no ponto 54, alega a Autora que o Tribunal não atribui qualquer relevância ao acordo estabelecido entre as partes, quanto aos ventilo-convetores, escudando-se no teor da cláusula do CPCV que exige a redução a escrito de qualquer alteração ao contrato; 61- Porém, tal não corresponde à verdade, uma vez o tribunal considerou facto provado, relativamente à matéria cuja prova foi produzida; 62- Quanto ao demais, o Douto Tribunal o que refere, e bem, é que não foi feita qualquer prova nos autos que a Autora estivesse autorizada a instalar esses aparelhos antes da escritura de compra e venda; 63- Por outro lado, quanto ao alegado pela Recorrente nos pontos 55 a 58, ou seja, que o Douto Tribunal na fundamentação de direito alega que a Autora não faz prova de que, antes da resolução do contrato-promessa por parte da Ré, a Autora tenha interpelado a Ré para que a mesma lhe indicasse a localização exata dos pontos pré-instalação desses aparelhos; 64- Mas que tal não resulta dos documentos juntos aos autos; 65- Ora, entendemos que se trata de um lapso manifesto na Fundamentação de Direito, e que o Tribunal não julgou contrariamente à matéria dada como assente, não se tendo verificado qualquer erro de julgamento; 66- Aliás, a decisão está devidamente fundamentada e a decisão está conforme a matéria de facto dada como provada; 67- O lapso manifesto é evidente pela leitura da Motivação da sentença, páginas 19 e 20, em que o Tribunal faz uma análise cuidada da correspondência trocada entre as partes, quanto à interpelação para indicação da localização dos pontos ventiloconvectores. Aliás, a decisão está devidamente fundamentada quanto a este tema, veja-se na página 15 da sentença, para além de referir que não foi efetuada qualquer prova de que a Autora estivesse autorizada a instalar esses aparelhos antes da escritura de compra e venda; 68- Também é referido que do ponto de vista da normalidade e atendendo a juízos de experiência comum, não é credível que a ré assentisse na colocação desses aparelhos antes da escritura, assim como, não é credível que fossem efetuadas quaisquer diligências no sentido de ser possibilitada a instalação do sistema, antes da outorga da escritura, ou seja, o facto de haver interpelado a Ré não altera o mérito da decisão proferida; 69- Porque na verdade não ficou provada qualquer mora por parte da Ré; 70- No que respeita ao alegado pela Recorrente nos pontos 60, 61, 62, e 63 da parte IV. 2., cumpre referir que tais matérias já se encontram devidamente esclarecidas pela Recorrida, dando-se aqui por reproduzido o já alegado quanto à marcação da escritura e quanto aos documentos necessários para o efeito; 71- Por seu turno, na parte IV. 3., a Recorrente sustenta que a Ré não cumpriu os deveres de conduta decorrentes do princípio da boa-fé. Com efeito, enumera, na alínea a), que as cartas remetidas pela Recorrente nunca foram reclamadas, tendo sido devolvidas; 72- Ora, tal facto explica-se, de forma simples e objetiva, pela circunstância de o legal representante da Ré ser piloto de aviação e, por conseguinte, encontrar-se frequentemente ausente do território nacional, o que o impossibilitou de receber a correspondência, o que era do perfeito conhecimento da Autora; 73- Aliás, estranha-se é que a determinada altura a correspondência tenha deixado de ser por e-mail, e passe a ser apenas por carta registada com A/R. Porém, conforme resulta dos factos provados, a Ré respondeu a toda a correspondência que recebeu, via carta ou e-mail; 74- Não se tratou, portanto, de qualquer falta de interesse ou negligência; 75- Em relação às alíneas b), c), d) e e), reitera-se igualmente que a Recorrida já prestou os devidos esclarecimentos em momento anterior; 76- Por fim, quanto à alínea f), cumpre salientar a manifesta contradição da Recorrente: se, por um lado, ao longo das Alegações afirma que a Autora marcou a escritura de compra e venda em data contratualmente estabelecida, por outro, vem agora sustentar que tal escritura foi marcada “para data diversa da contratualmente fixada”. Aliás, a A. refere várias vezes esta contradição, inclusive no ponto 66; 77- Com efeito, é também no ponto 66 que a Recorrente alega que a Ré teria agido “com o propósito de obstaculizar a celebração da escritura”. Todavia, da prova produzida resulta precisamente o contrário: ficou demonstrado que foi a Autora quem manifestou a intenção de resolver o negócio já em outubro, sendo, pois, ela quem verdadeiramente criou entraves à celebração da escritura; 78- Pelo que resulta demonstrado que não existiu qualquer má-fé por parte da R., muito pelo contrário, foi notária a boa-fé da Ré no sentido de se concretizar o contrato definitivo; 79- Pelo que não poderá ser imputada qualquer culpa à Ré. Termos em que se requer a V/Exas. que julguem o recurso improcedente, confirmado a sentença recorrida. O recurso foi admitido [despacho de 07 de Outubro de 2025, referência nº 476281776] como de apelação, a subir imediatamente e nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo. No exame preliminar entendeu-se nada obstar ao conhecimento do objecto do recurso. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. ** * II - Fundamentação Como é sabido, o teor das conclusões que o recorrente extrai da motivação que apresenta, onde sintetiza as razões da sua discordância com o decidido e resume o pedido (nº 4 do artigo 635º e artigos 639º e 640º, todos do Código de Processo Civil), delimita o objecto do recurso e fixa os limites do horizonte cognitivo do Tribunal Superior, sem prejuízo das questões que devem ser conhecidas oficiosamente. Assim, atentas as conclusões da recorrente, mostram-se colocadas à apreciação deste tribunal as seguintes questões, enunciadas por ordem de precedência lógico-jurídica: A) A impugnação da decisão sobre a matéria de facto; B) A regularidade negocial do agendamento pela ré de data para outorga do contrato prometido [concretamente, para 21 de Dezembro de 2022 e 19 de Janeiro de 2023]; C) A mora da ré decorrente da não entrega da documentação prevista na cláusula 5ª do contrato promessa de compra e venda necessária à outorga do contrato prometido; D) O incumprimento da ré traduzido na não disponibilização das plantas da fracção com a indicação clara e precisa dos pontos de pré-instalação do sistema de climatização; E) O incumprimento definitivo da promessa de contratar imputável à ré; F) A actuação da ré em abuso de Direito; G) A concorrência de culpas. * Delimitado o objecto do recurso, importa conhecer a factualidade em que assenta a decisão impugnada. * Factos Provados (transcrição): 1- A Ré é uma sociedade comercial, por quotas, que tem por objeto a “compra e venda de prédios rústicos e urbanos e revenda dos adquiridos para esse fim, conceção, edificação e exploração de empreendimentos imobiliários e turísticos”. 2- A autora e a ré outorgaram, em 8/8/2022, o “contrato promessa de compra e venda ”cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. n.º 2 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, através do qual a ré prometeu vender e a autora prometeu comprar a fração autónoma designada pela letra “E”, correspondente à habitação 5, de tipologia T1, no 2º andar do edifício A, do empreendimento imobiliário conhecido por “Quinta ...”, com acesso pelo nº ... da Avenida ..., pelo nº ... da Rua ..., ... da Rua ... da Rua ..., descrita na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o número ...35..., da freguesia ... e inscrita na matriz sob o artigo ...28 da mesma freguesia pelo valor de € 620.000,00 (seiscentos e vinte mil euros). 3- Na cláusula 5ª, alínea a), do CPCV, ficou a constar que a “a marcação da escritura, ou documento particular autenticado (doravante DPA) de compra e venda ficará a cargo da segunda interveniente, [a aqui A.] que deverá ocorrer até ao final do mês de Novembro de 2022, cabendo à segunda contraente [uma vez mais, a aqui A.] a marcação da mencionada escritura ou DPA através de carta registada com aviso de receção ou por qualquer outro meio que considerem idóneo (fax ou email), com a antecedência mínima de 15 (quinze dias)”. 4- E na 5ª, alínea b), do CPCV, ficou a constar que a “Compete ao primeiro contraente a organização e entrega de toda a documentação necessária à celebração do contrato definitivo, nomeadamente a certidão do registo predial, caderneta predial urbana, licença de utilização, certificado energético e declaração do condomínio, nos termos do artigo 1424º-A do Código Civil”. 5- A autora, na data da outorga do mencionado contrato-promessa entregou à ré, a título de sinal e princípio de pagamento, a quantia de €124.000,00 (cento e vinte e quatro mil euros). 6- A autora esteve presente numa reunião do condomínio do prédio que se realizou no dia 10 de agosto de 2022. 7- A autora dirigiu à ré uma carta registada com aviso de receção, com data de 17.10.2022, cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. n.º 8 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido através da qual propôs à Ré a revogação do CPCV, disponibilizando-se para assumir os encargos decorrentes da comercialização do imóvel através de agência imobiliária. 8- A ré respondeu a essa carta através de email datado de 30/10/2022 cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. 9 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 9- A autora, através do seu Mandatário, remeteu à ré a carta cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. n.º 11 datada de 14/11/2022 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido através da qual formaliza uma “nova proposta no sentido de estabelecermos uma moratória relativamente à outorga do contrato definitivo, por período e moldes a acordar, que permita a colocação no mercado da fracção, de modo a que a mesma possa ser entretanto transacionada”, solicitando uma resposta a essa proposta. 10- A ré remeteu à autora, que a recebeu, uma carta datada de 5/12/2022 cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. 21 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido através da qual a informa que “a escritura de compra e venda (…) está agendada para o dia 21 de dezembro de 2022” e que “desde já a informo que, com a não realização da escritura no passado dia 31/11/2022, entrou V.ª Exc.ª em mora. Mora essa que, por agora ficará suspensa na eventualidade de V.ª Exc.ª comparecer à 1.ª interpelação para escritura.” 11- A autora foi notificada pela Ré para comparecer, no escritório da Advogada Dra. II, sito na Rua ..., ..., na Maia, no dia 21/12/2022, para efeitos de outorga do documento particular autenticado de compra e venda, da responsabilidade da Advogada JJ, não compareceu. 12- No dia 21/12/2022 estava reunida toda a documentação necessária e válida que permitia a outorga do documento particular autenticado de compra e venda e presentes o representante do banco e o representante da vendedora, aqui ré. 13- A ré remeteu à autora, que a recebeu, uma carta datada de 21/12/2022 cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. 22 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido através da qual lhe comunica que “Não tendo V. Exa. comparecido à realização da escritura (…) agendada (…) para o dia 21 de dezembro de 2022 (…) Fica, desde já, notificada para o 2º, e último, agendamento da escritura (…) para o dia 19 de janeiro de 2023 (…)”. 14- A Autora notificada pela Ré para comparecer, no escritório da Advogada Dra. II, sito na Rua ..., ..., na Maia, no dia 19/01/2023, para efeitos de outorga do documento particular autenticado de compra e venda, da responsabilidade da Advogada JJ, não compareceu. 15- No dia 19/01/2023 estava reunida toda a documentação necessária e válida que permitia a outorga do documento particular autenticado de compra e venda e presentes o representante do banco e o representante da vendedora, aqui Ré. 16- A autora respondeu à carta mencionada no ponto 13-, através do envio de carta datada de 11 de janeiro de 2023, subscrita pelo seu Mandatário, cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. 23 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, a qual veio devolvida por não reclamada. 17- A ré remeteu à autora, que a recebeu, uma carta datada de 19 de janeiro de 2023 cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. 25 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido através da qual lhe comunica que considera resolvido o contrato-promessa por incumprimento definitivo da autora e, por tal facto, fazia seu o sinal entregue. 18- A autora remeteu à ré, que a recebeu, uma carta datada de 4 de abril de 2023, subscrita pelo seu Mandatário, cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. 26 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, através da qual lhe transmite que “somos a interpelar V. Exas., pela última vez, para procederem à entrega dos documentos a que se refere a alínea b) da cláusula 5ª do CPCV, fixando-se como prazo limite para esse efeito o dia 10 de abril de 2023, até à hora marcada para a realização da escritura de compra e venda, ou seja até às 9:00 da manhã, no local que lhes foi oportunamente comunicado. Caso V. Exas. não cumpram o prazo ora fixado, que é de natureza peremptória, ou compareçam à escritura de compra e venda da fracção em causa munidos dos documentos e condições necessárias à realização da mesma, incluindo o distrate que permite o cancelamento da hipoteca que subsiste sob a fracção prometida vender, consideramos que se verifica o incumprimento definitivo e culposo do CPCV por parte da A... Lda., pelo que, procederemos à resolução do mesmo, com as inerentes consequências, nomeadamente a prevista na respetiva cláusula 4ª, nº 2, ou seja, a devolução do sinal prestado, em dobro.” 19- A ré não compareceu na escritura que esteve marcada no dia 10 de abril de 2023. 20- A autora remeteu à ré, que a recebeu, uma carta datada de 14 de abril de 2023 cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. 28, subscrita pelo seu Mandatário, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 21- A ré remeteu ao Il. Mandatário da autora, que a recebeu, a carta cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob doc. 30 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 22- A autora, por intermédio do seu Il. Mandatário, remeteu à ré uma carta registada datada de 25/11/2022, a qual não foi reclamada. 23- Simultaneamente remeteu também por correio eletrónico à ré uma mensagem através da qual remeteu cópia dessa carta conforme mensagem junta com a petição inicial sob doc. n.º 16 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, constando dessa carta designadamente que: “para efeitos de preparação da celebração do contrato definitivo, vimos solicitar a V.ª Exas, o seguinte: i. Que sejam facultadas à M/Constituinte fotos da fração para efeitos de promoção da venda (ou que lhe fosse autorizada a respetiva captação), bem como, lhe sejam transmitidas as condições para realização de visitas de potenciais interessados. ii. Que, considerando que até ao momento não foram promovidas pela V/empresa quaisquer diligências no sentido de ser possibilitada a instalação do sistema de aquecimento por ventilo-convectores na fracção — condição essencial para que a mesma reunisse as condições de habitabilidade para a M/Constituinte, como é do V/perfeito conhecimento e conforme se encontrava acordado —, lhe sejam disponibilizadas as plantas da fracção com a indicação clara e precisa dos pontos de pré-instalação do referido sistema de aquecimento, devendo as correspondentes infraestruturas encontrar-se devidamente preparadas para receber os aparelhos ventilo-convectores (designadamente, encontrarem-se desobstruídas as canalizações e pontos de instalação e efetuadas eventuais reparações decorrentes de tal preparação). iii. Que sejam disponibilizados os documentos a que se reporta a cláusula 5ª, alínea b), do contratopromessa de compra e venda (CPCV), bem como, o Regulamento do Condomínio em vigor e a indicação do(s) responsáveis pela gestão do condomínio. Reputa-se como adequado o prazo máximo de oito dias, a contar da recepção da presente, para disponibilização, por parte da V/empresa, dos elementos referidos nas alíneas precedentes, findo o qual, sem que os mesmos nos tenham sido facultados, consideramos haver fundamento para invocação de incumprimento dos deveres inerentes à execução contratual, com as devidas consequências. Por fim, Nos termos da cláusula quinta, alínea a), do CPCV, comunicamos a V. Exas. que a escritura de compra e venda da fracção se encontra marcada para o dia 10 de Abril de 2023, pelas 9:00 horas, no Cartório Notarial de Espinho – Dra. EE, sito à Rua ..., em Espinho.” 24- A ré respondeu à autora através de email datado de 30 de novembro de 2022, cuja cópia se encontra junta com a petição inicial sob documento 19, cujo teor de dá por integralmente reproduzido, no qual refere, designadamente que: “Relativamente à V/ missiva de 14 de novembro de 2022, não posso aceitar a indicação, em vários pontos da mesma, de que não demos respostas desde 11 de agosto de 2022 pois como a V/ Constituinte bem sabe, e não pode negar, temos tido várias conversas sobre este assunto via whatsapp (as quais tenho guardadas e que se quiserem posso enviar para prova do que digo). (…) Ora, relativamente à fração a mesma encontra-se no estado físico em que se encontrava no momento das visitas o qual foi aceite pela V/ Constituinte e que por tal motivo a levaram a querer contratar e assinar o contrato promessa de compra e venda, com o pagamento de sinal, sem nenhuma condição resolutiva. E quanto ao condomínio, esta questão diz respeito à gestão das partes comuns e por isso nada tem a ver com a fração (…) Quanto à questão que coloca de que não sabia que as outras frações foram adquiridas por empresas e por isso não está inserida num conceito habitacional familiar queira desculpar, mas esse motivo não tem qualquer fundamento nem é razoável uma vez que, como deve compreender, ninguém tem o poder de opinar na venda das frações dos vizinhos impedindo-os de vender imóveis a empresas ou obrigando-os a vender a famílias tradicionais, aliás, poderiam até levantar-se questões de desrespeito pelas minorias ou discriminação. Recebo a V/ missiva de 25 de novembro e solicitam documentos atinentes à realização do contrato definitivo de compra e venda e quanto a esta missiva cumpre-me esclarecer: 1 – O contrato definitivo de compra e venda (…) deverá realizar-se até ao fim do mês de novembro de 2022; 2 – O incumprimento pela Parte Promitente Compradora implica a perda do sinal e a possibilidade de resolução do contrato pela Parte Promitente Vendedora; 3 – Não é permitida a cedência da posição contratual por parte da Promitente Compradora nos termos da alínea b) da cláusula 7.ª do contrato promessa de compra e venda. Aliás desta última missiva depreendo que a V/ Constituinte perdeu o interesse em contratar. Tendo em consideração que os contratos são para cumprir, ponto por ponto, aguardo a marcação do contrato definitivo de compra e venda que se deverá realizar até ao dia 30 de novembro de 2022 sob pena de incumprimento por parte da V/ Constituinte com todas as implicações acima referidas e contempladas no contrato promessa que juntos assinamos”. 25- A autora, através do seu Il. Mandatário, respondeu a essa comunicação através da comunicação datada de 30/11/2022 cuja cópia se encontra sob doc. 20 com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 26- A autora visitou a fração por duas vezes antes da assinatura do contrato-promessa de compra e venda, tendo sido recebida por um sujeito de nome HH, pessoa que acompanhou as visitas. 27- A referida fração encontra-se integrada num empreendimento habitacional comercialmente designado como “Quinta ...”. 28- O empreendimento, caracterizado por ser um condomínio totalmente fechado (murado em todo o perímetro), é constituído por frações autónomas construídas de raiz (ou seja, totalmente novas) e frações autónomas integradas em edifícios já existentes na referida propriedade e que foram totalmente reabilitados no âmbito da construção do dito empreendimento. 29- A fração autónoma que a autora prometeu comprar à ré situa-se no 2º (e último) Andar do edifício A, do referido empreendimento, estando integrada num dos edifícios reabilitados. 30- A fração apresenta características de sótão/águas furtadas, ou seja, com grande parte dos tetos interiores inclinados e diversas janelas embebidas nos mesmos (vulgo, janelas de sótão). 31- A exposição solar da fração é sul-poente, encontrando-se, por conseguinte, sujeita a uma forte incidência da luz solar, quer nos vãos existentes no telhado, quer nos vãos de portas e janelas comuns ou normais. 32- A específica configuração da fração, no que respeita às particularidades acima descritas, obriga ao controlo das condições térmicas no seu interior, em termos de aquecimento e arrefecimento, uma vez que a tendência é que a mesma seja excessivamente quente nos meses de verão e demasiado fria nos meses de inverno. 33- A autora padece de uma incapacidade multiuso de 84% necessitando de condições de habitabilidade controladas ao nível da temperatura e humidade. 34- A autora sofre de doença pulmonar crónica com agudizações muito frequentes, o que acarreta limitações físicas e grande suscetibilidade a condições ambientais. 35- Antes da outorga do contrato-promessa foi transmitido à autora – e, de resto, era publicitado pelo empreendimento – que o sistema de aquecimento da fração em causa era composto por piso radiante para aquecimento, dispondo a mesma, adicionalmente, de infraestruturas pré-instaladas para aplicação de sistema de climatização por ventilo-convectores, com a dupla funcionalidade de aquecimento e arrefecimento. 36- A autora, tendo em vista assegurar-se de que o sistema de climatização em causa — piso radiante combinado com ventilo-convectores de aquecimento e arrefecimento — era adequado às suas necessidades em termos de controlo térmico do interior da fração, dada a sua suscetibilidade às condições ambientais e de habitabilidade, consultou o autor do projeto de arquitetura (Arq. BB), bem como, um técnico engenheiro qualificado para o efeito (Eng.º DD). 37- Tendo concluído, e confirmado, após tais consultas, que, efetivamente, a instalação dos aparelhos ventilo-convectores seria a solução adequada a garantir as condições de climatização e controlo térmico do interior da fração de que necessitava. 38- Nas visitas efetuadas pela autora à fração a mesma verificou que os pontos (terminais) para instalação dos aparelhos ventilo-convectores não se encontravam visíveis, sendo que os mesmos se encontravam ocultos no interior das paredes. 39- Foi transmitido à autora que a infraestrutura se encontrava operacional, sendo necessário efetuar obras para instalar os aparelhos. 40- Foi acordado pela autora e pela ré que a autora compraria e instalaria os ventiloconvectores e a ré assumiu o compromisso de pagar as obras necessárias para “destapar” os pontos de instalação dos ventilo-convectores, incluindo o custo da pintura das paredes que viessem a ser intervencionadas para a dita finalidade. 41- Na reunião de condomínio mencionada no ponto 6- dos factos acima elencados a autora teve conhecimento que o empreendimento habitacional se encontrava na sua maioria vendido a um pequeno grupo de empresas e investidores e que um vasto conjunto de frações autónomas tinham sido vendidas a um pequeno número de entidades empresariais. 42- Por essa razão, a autora ficou receosa por correr o risco de vir a habitar num complexo habitacional praticamente deserto. 43- Antes da outorga do contrato-promessa de compra e venda as partes fixaram como data limite para a celebração do contrato de compra e venda da fração identificada no ponto 2- o final do mês de novembro de 2022. 44- A ré não remeteu à autora a certidão do registo predial, a caderneta predial, a licença de utilização e a declaração do condomínio exigido pelo art. 1424.º-A do código civil. ** * Factos Não Provados (transcrição): a) no decurso do processo negocial a ré transmitiu à autora que praticamente todas as frações se encontravam vendidas e que a maioria dos habitantes seriam pessoas com idade superior a 50 anos; b) na reunião de condomínio mencionada no ponto 6 dos factos provados não era previsível que o empreendimento em causa viesse a dispor, de imediato ou a curto prazo, das condições de segurança e das comodidades anunciadas e legitimamente esperadas por esta, designadamente as de utilização coletiva dos condóminos, como piscina, banho turco, ginásio, etc; c) foi acordado entre a autora e a ré que a preparação da fração para instalação dos equipamentos de climatização seria efetuada antes da realização da escritura de compra e venda, de modo a que esta pudesse dispor das condições de habitabilidade assim que fosse formalizada a referida escritura; d) a ré estava consciente que se comprometeu com a autora a facultar a instalação dos aparelhos ventilo-convetores logo após a assinatura do contrato-promessa e antes da celebração do contrato definitivo; e) a autora insistentemente pediu à ré que lhe indicasse a localização dos pontos de instalação dos ventilo-convetores na fração, o que a ré nunca fez; f) a estratégia de comercialização do empreendimento da “Quinta ...” era dirigida a investidores; g) os serviços integrados do condomínio não estariam em pleno funcionamento se a autora adquirisse a fração id. em 2- no prazo previsto no contrato promessa. ** * A) A discordância da recorrente quanto à decisão sobre a matéria de facto reconduz-se à inclusão dos pontos 39- e 40- na matéria de facto provada [39- Foi transmitido à autora que a infraestrutura se encontrava operacional, sendo necessário efetuar obras para instalar os aparelhos; 40- Foi acordado pela autora e pela ré que a autora compraria e instalaria os ventiloconvectores e a ré assumiu o compromisso de pagar as obras necessárias para “destapar” os pontos de instalação dos ventilo-convectores, incluindo o custo da pintura das paredes que viessem a ser intervencionadas para a dita finalidade], à inclusão dos pontos c), d) e e) na matéria de facto não provada [c) foi acordado entre a autora e a ré que a preparação da fração para instalação dos equipamentos de climatização seria efetuada antes da realização da escritura de compra e venda, de modo a que esta pudesse dispor das condições de habitabilidade assim que fosse formalizada a referida escritura; d) a ré estava consciente que se comprometeu com a autora a facultar a instalação dos aparelhos ventilo-convetores logo após a assinatura do contrato-promessa e antes da celebração do contrato definitivo; e) a autora insistentemente pediu à ré que lhe indicasse a localização dos pontos de instalação dos ventilo-convetores na fração, o que a ré nunca fez], e à omissão da referência a 2 factos na matéria provada [i. No dia 30 de novembro de 2022, data a que se reporta a cláusula 5ª do CPCV, a ré não tinha ainda publicado o anúncio para o exercício do direito legal de preferência, o qual foi apenas publicado no dia 2 de dezembro de 2022, conforme resulta do documento nº 7 junto pela ré na reclamação ao despacho saneador; ii. No dia 30 de novembro de 2022, data a que se reporta a cláusula 5ª do CPCV, a ré não tinha dispunha da declaração emitida pelo condomínio a que se refere o artigo 1424º-A, do Código Civil, documento instrutório obrigatório da escritura ou documento particular autenticado para alienação da fração em causa, o qual foi apenas emitido em 20.12.2022, conforme resulta do documento nº 9 junto pela ré na reclamação ao despacho saneador]. Não obstante a recorrente, no corpo das alegações e nas conclusões do seu recurso, se referir ainda ao ponto 5- da matéria de facto provada, entende-se ter aqui incorrido em manifesto lapso, na medida em que, por um lado, não indica absolutamente nenhum meio de prova susceptível de colocar em crise o juízo de demonstração dessa matéria; por outro, o ponto 5- reporta-se ao sinal constituído e seu valor, matéria que foi introduzida no objecto do processo pela própria autora [artigo 5º da petição inicial], expressamente aceite pela ré na contestação [artigo 38º da contestação]. Aliás, trata-se de matéria que até foi considerada demonstrada por acordo entre as partes logo na altura do despacho saneador, sem que tenha sido apresentada qualquer reclamação a esse propósito [e não obstante ambas as partes terem apresentado reclamações relativamente a outros pontos]. Logo, como manifesto lapso sendo a questão tratada, simplesmente não se apreciará o ponto 5- da matéria de facto provada. No demais, mostra-se razoavelmente cumprido o ónus fixado no artigo 640º do Código de Processo Civil. O ponto 39- do elenco dos factos provados Quanto a este ponto entende a autora não terem sido produzidos meios de prova que justifiquem a sua inclusão no elenco dos factos provados. O tribunal a quo justificou a sua decisão, nesta parte [fls 13 e 14 da sentença recorrida], com o teor do depoimento das testemunhas BB e DD, o documento nº 1 junto com a contestação [print de um conjunto de mensagens telefónicas trocadas entre a autora e o sócio-gerente da ré entre final de Julho de 2022 e princípio de Outubro de 2022], e as declarações de parte da própria autora. Com todo o devido respeito, a autora labora em notório equívoco – é que neste ponto da matéria de facto claramente não é referido que a instraestrutura destinada ao funcionamento dos aparelhos ventilo-convectores se encontrava, de facto, a funcionar, mas apenas que tal foi transmitido à aqui recorrente [recorde-se o teor literal do ponto em causa, nesta parte, «Foi transmitido à autora que a infraestrutura se encontrava operacional» (itálico nosso)]. E, como resulta da simples leitura das mensagens trocadas entre as partes através da plataforma whatsapp [cfr documento nº 1 junto com a contestação], a 05 de Agosto de 2022 a recorrente questiona o representante da recorrida quanto a saber quem suportará o custo dos trabalhos de destapamento das ligações para colocação dos ventiloconvectores e da reparação da pintura [fls 13 de tal documento], ao que lhe é respondido [cfr fls 14] «em relação ao destapamento e pintura quando tiver os aparelhos é só dizer. Falarei com o Sr. HH tb sobre isso». Isto quando, dias antes, a autora havia enviado mensagem ao legal representante da ré através da mesma plataforma, declarando: «sei que tem os pontos para ventiloconvectores» [documento 1 junto com a contestação, página 10]. A própria autora, no depoimento/declarações de parte que em audiência de julgamento prestou, enfaticamente confirmou ter-lhe sido transmitido que a infratestrutura necessária ao funcionamento dos ventilo-convectores estava colocada e a pronta a receber a ligação aos aparelhos [03m40s a 03m55s; 21m55 a 22m05]. Aliás, é a própria autora a alegar [!!], nos artigos 60º a 63º e 70º da sua petição inicial, ter-lhe sido transmitido que a infraestrutura estava colocada e pronta a receber os ventilo-convectores. Daqui apenas se pode retirar, de acordo com o que se considera constituir a absoluta normalidade das coisas [isto é, não se vê que a mensagem enviada razoavelmente comporte qualquer outro sentido], que, tendo a autora indagado quanto ao procedimento a tomar relativamente à colocação dos ventiloconvectores, foi-lhe transmitido que seria apenas necessário proceder ao destapamento dos pontos de ligação ao sistema e posteriormente pintar – claramente foi transmitido à autora que nenhum problema existia quanto à operacionalidade da infraestrutura, sendo apenas necessário realizar a obra de ligação dos aparelhos; ou seja, precisamente o que foi vertido neste ponto 39- da matéria de facto provada. Do que se conclui que, ao contrário do alegado pela recorrente, foram produzidos meios de prova que sustentam o juízo de demonstração feito. Nesta parte improcede o recurso. O ponto 40- do elenco dos factos provados Quanto a este ponto entende a recorrente ter sido demonstrado que a ré assumiu perante a autora a obrigação de proceder à obra de colocação dos ventiloconvectores, e não apenas de suportar o seu custo. E, como fundamento para a alteração que pretende, indica o depoimento/declarações de parte do legal representante da ré. O tribunal a quo justificou do seguinte modo o juízo probatório feito: «O ponto 40 resultou provado atendendo à conjugação dos depoimentos da autora e do legal representante da ré sendo que os mesmos, de forma coincidente, explicaram que foi acordado entre ambos que a autora compraria os aparelhos ventiloconvetores e contrataria a empresa para os instalar e que a ré pagaria as obras necessárias para destapar os pontos de instalação desses aparelhos e a pintura das paredes que viessem a ser intervencionadas para fazer essa instalação, sendo que também se valorou a mensagem remetida pelo legal representante da ré à autora cuja cópia se encontra com a contestação, mensagem essa datada de 14/8/2022 na qual o mesmo refere que “O que disse foi para a Dra. comprar os equipamentos e pagava a obra para fazer o buraco para a instalação do equipamento e pintura”». Principiando a análise pelas conversações mantidas entre as partes através da plataforma whatsapp [novamente, documento nº 1 junto com a contestação; esta mensagem mostra-se transcrita, também, no documento nº 6 junto com a petição inicial], vemos que sobre a questão há apenas um registo [de 14 de Agosto de 2022, fls 18] em que a questão é abordada, tendo o legal representante da ré deixado escrito: «O que disse foi para a Dra comprar os equipamentos e pagava a obra para fazer o buraco para a instalação do equipamento e pintura como se deve recordar» - o que, se bem se analisa, não é propriamente esclarecedor quanto a saber quem assumiu o encargo de executar a obra de instalação, independentemente de quem deveria suportar o seu custo. Sobre a matéria considera-se também relevante o documento nº 9 junto com a petição inicial [mensagem electrónica dirigida pelo legal representante da ré à recorrente, datada de 30 de Outubro de 2022], na qual é feito constar: «único ponto que referiu foi relacionado com os Termoventiladores, pondo a questão quem pagava a respectiva colocação, o que lhe respondi, que eu pagava obra e pintura da parede, mas a Drª. tinha que contactar a empresa e pagar os temos ventiladores»; e ainda o documento nº 5 junto com a petição inicial [mensagem electrónica dirigida pelo legal representante da ré à recorrente, datada de 14 de Agosto de 2022], com o seguinte conteúdo: «o que prometi (como sabe e deve lembrar-se) foi pagar a obra de instalação (abrir e fechar buraco na parede e pintar) dos equipamentos termo-ventiladores». Portanto, a prova documental produzida, se bem que não totalmente esclarecedora, indicia que a ré se comprometeu apenas a assumir o custo da colocação dos aparelhos, e não propriamente a realizar a obra. O legal representante da ré [GG], se na parte inicial do depoimento/declarações de parte que prestou verdadeiramente não se mostrou esclarecedor quanto a saber a quem propriamente incumbiria a execução da obra de colocação dos ventilo-convectores, acabou por peremptoriamente dizer que a ré se comprometeu apenas a suportar o custo da obra, e não a executá-la [10m36 a 10m44s; 11m44s a 11m50s; 19m00s a 19m20s] – o que, verdade seja dita, corresponde ao que foi alegado na própria petição inicial [artigo 73º: «Tendo a R. assumido o compromisso de averiguar a localização dos pontos de instalação dos ventilo-convectores no interior da fração, verificar o bom funcionamento da infraestrutura e de transmitir essa informação à A., de modo a que esta pudesse providenciar a instalação dos mesmos» (sublinhado nosso); artigo 75º «À A., como referido, competia a aquisição e aplicação dos aparelhos ventiloconvectores, o que faria mediante a colaboração da R., nos termos supra mencionados (sublinhado nosso)]. Portanto, independentemente da relevância da pretendida alteração para o desfecho da acção e do recurso, a verdade é que razoavelmente não se vê que o meio de prova pela recorrente invocado imponha a alteração pretendida. Também nesta parte improcede a impugnação. Os pontos c) e d) da matéria de facto não provada Insurge-se a recorrente contra o que classifica de injustificada desvalorização das declarações na matéria por si prestadas, entendendo que o apelo a juízos de normalidade e experiência devem credibilizar de forma determinante as suas declarações. O tribunal a quo justificou assim o juízo de não demonstração desta matéria: «A autora veio a juízo dizer que tinha acordado com o legal representante da ré que a instalação desses aparelhos seria realizada depois da outorga do contrato promessa e antes da celebração da escritura de compra e venda. O legal representante da ré negou perentoriamente essa factualidade, dizendo que em momento algum acordou nessa instalação antes da outorga da escritura. Ora, as declarações de parte da autora não são só por si um meio de prova bastante para que este tribunal considere essa factualidade provada, sendo certo que nos autos não foi feita qualquer outra prova que sustentasse a versão da autora. Acresce que do ponto de vista da normalidade e atendendo a juízos de experiência comum não é credível que a ré assentisse na colocação desses aparelhos por parte da autora antes da outorga da escritura. Com efeito, antes da outorga da escritura de compra e venda, a ré, ainda que estivesse convencida que o negócio definitivo se iria realizar, não iria assumir o custo de uma obra sem que tivesse qualquer garantia que o negócio definitivo viesse, efetivamente, a ser outorgado. A verdade é que a opção de colocação dos aparelhos em causa era da compradora, sendo certo que, se por alguma razão o negócio definitivo não se viesse a concluir, os aparelhos entretanto colocados pela autora seriam por esta novamente retirados. Não faz sentido, atendendo a regras de experiência comum, que a ré aceitasse essa colocação em momento anterior à outorga da escritura de compra e venda, assumindo o custo de destapar os pontos de pré-instalação e a posterior pintura, correndo o risco de, caso o contrato definitivo não se viesse a concretizar, ter que novamente proceder a obras para repor as paredes no estado anterior. De acordo com a versão da autora a ré aceitaria pagar essas obras antes da outorga da escritura de compra e venda. A verdade é que se o negócio de compra e venda não se viesse a realizar – como acabou por acontecer – nesse caso a ré teria que fazer uma nova obra para repor tudo como estava antes, já que a autora certamente retiraria os aparelhos. Pelo exposto, por ausência de prova, foram considerados como não assentes os pontos 3 e 4 dos factos não provados». Basta apenas ler a motivação adiantada pelo tribunal a quo para facilmente constatar que, ao contrário do afirmado pela recorrente, não foi atribuída valoração especial às declarações de parte de autora e ré, mas apenas se procedeu à aplicação das regras do ónus da prova subjectivo [artigo 414º do Código de Processo Civil] – existindo dúvida fundada quanto à verificação de um facto, ela deve ser resolvida contra a parte a quem o facto aproveita; no caso, a autora-recorrente. E, de facto, ouvidas as declarações prestadas pela autora e pelo legal representante da ré, obviamente se constata que forneceram versões contraditórias sobre a questão. A dúvida assim suscitada, em tese, poderia ser ultrapassada pela consideração do que se considere a normalidade do acontecer. Claro que, no caso em apreço, temos o obstáculo de promitente vendedor e promitente comprador encabeçarem interesses opostos – para o primeiro constituindo um problema permitir a realização de alterações no imóvel antes da outorga do contrato prometido, na medida em que tal se traduz na aceitação da modificação do objecto da venda à medida do interesse do promitente comprador sem ter a certeza que este irá honrar a sua palavra, com o inerente risco de posteriormente ter de re-colocar o imóvel no estado anterior [caso um novo interessado na aquisição optasse por outra solução]; para o segundo constituindo uma dificuldade a realização da obra, a ser parcialmente custeada pela parte contrária, apenas após a outorga do contrato prometido, uma vez que a celebração da venda em grande medida esvaziará a posição de força que o promitente comprador detém, com a possibilidade de recusar a celebração do contrato prometido sem a prévia realização das obras. Afigura-se que a solução do problema não poderá deixar de passar pela consideração dos concretos termos do contrato promessa em causa. E este, como é sabido, mostra-se totalmente omisso quanto à obrigação de execução de qualquer obra pelo promitente vendedor [documento nº 2 junto com a petição inicial]. Ou seja, a promitente vendedora assumiu a obrigação de contratar no futuro sem estabelecer qualquer ressalva ou condição directamente ligada à realização ou não da obra de colocação dos ventilo-convectores, o que, afigura-se claro, é em si contraditório com o acordo entre as partes na necessária realização da obra antes da outorga do contrato prometido. O argumento jurídico pela recorrente invocado [o clássico motivo para a celebração de um contrato promessa – o tempo de que as partes necessitam para reunir as condições necessárias à outorga do contrato prometido] esboroa-se por completo se tivermos em conta que ficou na inteira disponibilidade da promitente compradora a marcação da escritura de compra e venda até final de Novembro de 2022; ou seja, a autora-recorrente, se nisso tivesse tido interesse, poderia ter agendado a celebração do contrato prometido para final de Agosto, Setembro ou Outubro de 2022, independentemente da execução ou não das obras em causa. E o conteúdo da documentação que a recorrente convoca nos pontos 28 a 30 do corpo das suas alegações de recurso é notoriamente equívoco na matéria, de ponto algum se afigurando possível retirar, com a necessária segurança, que autora e ré acordaram na execução da obra de colocação dos ventilo-convectores necessariamente antes da outorga do contrato prometido. Logo, mostra-se inultrapassável a dúvida na matéria, o que, por aplicação das regras do ónus da prova, plenamente justifica, tal como decidido pelo tribunal a quo, a inclusão dos pontos c) e d) na matéria de facto não provada. Também aqui improcede a impugnação da decisão sobre a matéria de facto. O ponto e) da matéria de facto não provada Quanto a esta matéria a recorrente principia por insurgir-se quanto ao que considera constituir «uma exigência probatória que excede claramente o limite do que é razoável exigir à parte neste contexto», decorrente da suposta exigência de demonstração da insistência nos pedidos junto da ré para indicação da localização dos pontos de instalação dos ventilo-convectores [pontos 37- e 38- do corpo das alegações; conclusões 20ª e 21ª]. Mas a verdade é que foi a própria autora a alegar ter por várias vezes insistido junto da ré no sentido de lhe ser indicada tal localização [artigo 80º da petição inicial], e a decisão sobre a matéria de facto obviamente limita-se, num primeiro momento, a aferir, de entre o alegado, o que deve ser julgado demonstrado. Seja como for, caracterização à parte, o que a recorrente pretende é que sejam feitos constar do elenco dos factos provados os pedidos que afirma ter dirigido à ré para indicação dos pontos da infraestrutura que permitiriam a colocação dos venticlo-convectores, pedidos que afirma decorrerem das cartas que remeteu à réu e que reconhece resultarem já dos pontos 16-, 18-, 22- e 23- da matéria de facto provada [ponto 39º do corpo das alegações; conclusões 22ª e 23ª]. Ou seja, os concretos pedidos de indicação que a autora afirma ter dirigido à ré foram julgados demonstrados, restringindo-se a discordância da recorrente à utilização do advérbio de modo insistentemente e à não inclusão de um novo ponto que no fundo se limite a repetir o que já consta da matéria de facto provada. Obviamente, a reapreciação do decidido quanto aos factos relevantes no processo apenas se justificará se em qualquer caso possuir algum reflexo na reapreciação da questão jurídica suscitada nos autos. Isto porque, como parecerá óbvio, o «(…) princípio de que o juiz deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes, analisando todos os pedidos formulados, está sujeito a uma restrição, e a restrição reporta-se às matérias e aos pedidos que forem juridicamente irrelevantes. Estando em causa factos irrelevantes, não faz qualquer sentido ponderar sequer a sua inserção na matéria de facto provada» [acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de fevereiro de 2020, proc. n.º 4821/16.4T8LSB.L1.S2, disponível em www.dgsi.jstjpt/], sendo esta a orientação jurisprudencial absolutamente pacífica dos nossos tribunais superiores, fundada na proibição da prática de actos inúteis [artigo 130º do Código de Processo Civil – cfr, por todos, o decidido pelo STJ nos seus acórdãos de 14 de Março de 2019, processo nº 8765/16.1T8LSB.L1.S2, de 28 de janeiro de 2020, processo nº 287/11.3TYVNG-G.P1.S1, de 14 de Janeiro de 2020, processo nº 154/17.7T8VRL.G1.S2, de 13 de Julho de 2017, processo nº 442/15.7T8PVZ.P1.S1, todos disponíveis em www.dgsi.jstjpt/]. A própria recorrente considera irrelevante a demonstração de os pedidos de indicação terem sido feitos insistentemente; e a circunstância de os fundamentos que indica para a sua discordância, no mais, se reconduzirem a matéria já constante do elenco dos factos provados torna evidente a absoluta desnecessidade da reapreciação que pretende. Pelo que simplesmente não há que apreciar o recurso nesta parte. A inclusão de 2 novos pontos na matéria de facto provada Estes pontos cujo aditamento a recorrente pretende reportam-se à documentação necessária à celebração da escritura pública de compra e venda prometida – o comprovativo do cumprimento do direito legal de preferência; o comprovativo da inexistência de dívidas ao condomínio referentes ao imóvel a vender. Retoma-se o que imediatamente acima se deixou dito quanto ao requisito da utilidade da reapreciação da decisão sobre a matéria de facto para o desfecho da lide. Ora, como será evidente [e, aliás, mais de uma vez foi dito à autora ao longo deste litígio que tem mantido com a ré, e que se estende por este processo e pela providência cautelar que correu termos sob o nº 809/23.7T8PVZ.P1], a documentação necessária à celebração da escritura pública de compra e venda apenas tem de estar reunida na data agendada para essa outorga – não no momento da marcação. Como decorria e decorre do contrato promessa celebrado entre as partes, o agendamento do contrato prometido caberia à autora, que deveria fazê-lo até final de Novembro de 2022, avisando a ré com 15 dias de antecedência da data para o efeito escolhida. A autora, como é notoriamente pacífico entre as partes, não procedeu ao agendamento do contrato prometido até 30 de Novembro de 2022. Logo, a 15 de Novembro de 2022 a ré sabia já que a documentação necessária à outorga do contrato prometido não teria de estar reunida até 30 de Novembro – uma vez que, evidentemente, a antecedência de 15 dias contratualmente fixada para a comunicação da marcação destinava-se a permitir à ré diligenciar pela obtenção da documentação necessária à celebração da compra e venda. Logo, o que releva que, a 30 de Novembro de 2022, ainda não tivesse sido publicado o anúncio para exercício do direito legal de preferência, ou que, nessa mesma data, a ré não tivesse em mão documento a atestar a ausência de dívidas ao condomínio relacionadas com o imóvel? Absolutamente nada, porque, atenta a não marcação pela autora, o contrato de compra e venda seguramente não seria celebrado a 30 de Novembro, o que razoavelmente já se sabia desde 15 de Novembro. Aliás, as próprias partes, que se degladiam quanto a saber quem incumpriu definitivamente o contrato promessa, e designadamente se esse incumprimento definitivo ocorreu a 21 de Dezembro de 2022, 19 de Janeiro de 2023 ou 10 de Abril de 2023, notoriamente não põem em causa que a data do incumprimento definitivo, seguramente, não se verificou a 30 de Novembro. Logo, também aqui por total irrelevância, não há que apreciar o recurso nesta parte. B) A autora-recorrente, nesta fase de recurso, reconhece não ter respeitado o programa contratual ao agendar para 10 de Abril de 2023 a outorga do contrato prometido que deveria ter sido celebrado até final de Novembro de 2022 [ponto 46 do corpo das alegações; 29ª conclusão]. Mas defende que «o retardamento da prestação por parte da autora/promitente compradora, relativamente à data de realização da escritura, apenas habilitaria a ré a exigir que a mesma cumprisse a obrigação a que estava contratualmente vinculada, fixando-lhe os termos que entendesse convenientes, nomeadamente, fixando-lhe um prazo para que esta procedesse à marcação da escritura e uma data limite para a realização da mesma». E entende que a ré, «ao fixar unilateralmente a data da realização da escritura de compra e venda, (…) procedeu à alteração unilateral do contrato». Com todo o devido respeito, a posição da autora-recorrente não resiste a brevíssima análise. Vejamos. Não há qualquer dúvida que, pelo contrato promessa celebrado, autora e ré recíproca e essencialmente vincularam-se a uma prestação de facto futura – a celebração de um contrato de compra e venda. Como a autora-recorrente [apenas] agora reconhece, para o cumprimento da prestação de ambas as partes foi fixado um limite temporal [ainda que não se tratasse de limite fixo inultrapassável] – 30 de Novembro de 2022. Mas, até esse momento, cabia apenas à autora a faculdade de escolher a data que melhor lhe aprouvesse para o cumprimento. Ou seja, o agendamento da escritura prometida corresponde apenas à interpelação para cumprir, à concretização do dia em que as duas declarações de vontade, de sinal contrário mas harmonizáveis por forma a produzir um determinado resultado único, deveriam ser proferidas. O que facilmente se compreende se tivermos em conta que a outorga de uma escritura pública de compra e venda de um imóvel constitui um acto que exige a recolha, organização e apresentação de documentação vária [sem falar na disponibilização de fundos monetários], sem a qual o acto simplesmente não é possível. E é com nesse sentido que comummente se afirma que a marcação de data para a celebração de um contrato prometido constitui simples acto instrumental face ao interesse fundamental de ambas as partes na contratação – a celebração do contrato [cfr, por todos, pacificamente, o decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça no seu acórdão de 19 de Setembro de 2002, processo nº 02B2404, disponível em www.dgsi.jstj.pt/; já para não falar no decidido por este Tribunal da Relação do Porto no recurso apreciado no âmbito da providência cautelar que correu termos sob o nº nº 809/23.7T8PVZ.P1]. Aliás, nem verdadeiramente se alcança o que pretende a recorrente ao defender que «o ato de marcação da escritura não pode, em nosso entender, ser classificado como um ato de carácter puramente instrumental». Mas, razoavelmente, o agendamento de data para a outorga do contrato prometido poderá prosseguir qualquer outro interesse que não o do cumprimento da obrigação a título principal assumida pelos promitentes? Simplesmente não se vê, nem a autora-recorrente minimamente se esforça por o identificar. Instrumentalidade que resulta da sua natureza de simples interpelação para cumprimento, mediante a indicação de uma data e local certos para realização da prestação, necessária, como se disse, face à evidente especificidade da obrigação assumida pelos promitentes contratantes. Do que decorre que, até 30 de Novembro de 2022, apenas à aqui recorrente assistia a faculdade de exigir o cumprimento – ou seja, o prazo mostrava-se estabelecido em seu benefício [artigo 779º do Código Civil]. Ultrapassado o momento em que era faculdade apenas da aqui recorrente exigir o cumprimento, a qualquer uma das partes passou a ser legítima a interpelação [nº 1 do artigo 777º do Código de Processo Civil], isto é, a marcação de data para a outorga da escritura pública. A leitura que a recorrente faz da faculdade de agendamento da escritura de compra e venda até 30 de Novembro de 2022, encarando-a como um dever a cargo da autora [pretensamente submetido ao regime do artigo 808º do Código Civil, e mesmo a execução específica - pretende com isto a autora dizer que assistia à aqui ré a faculdade de recorrer a juízo para que o tribunal se substituísse à autora apenas no acto de agendamento da escritura? O inusitado da solução dispensa, pensa-se, outras considerações. Então, defende a autora que à ré assistiria a faculdade de recorrer a juízo para obter o cumprimento da obrigação principal, nos termos do artigo 830º do CC? Mas nesse caso reconhece que, a partir de 30 de Novembro, o cumprimento podia ser exigido a todo o tempo, também por iniciativa da ré. O que impedia, então, que o cumprimento fosse exigido extra-judicialmente, através do simples agendamento da escritura pública?], mostra-se notoriamente desfocada. A iniciativa da ré no agendamento da escritura prometida, ultrapassado o prazo de que a recorrente beneficiava para escolher a data que melhor satisfazia os seus interesses, apenas cumpre o programa contratual. C) Com todo o devido respeito, e mais uma vez, a alegação da recorrente esboroa-se após breve reflexão. Afirma a recorrente que, «atentando com mais rigor na cláusula quinta do CPCV, facilmente se conclui que existe uma correspondência clara entre a obrigação da autora de marcação da escritura e a obrigação da ré de entrega dessa documentação. Ou seja, as partes estipularam uma clara reciprocidade entre as obrigações de uma e de outra no que respeita à outorga do contrato definitivo». E, na sua perspectiva como consequência, «ao não proceder à entrega dos documentos necessários à realização da escritura dentro do prazo que lhe foi fixado, incluindo o próprio dia em que se encontrava marcada a escritura de compra e venda — obrigação relativamente à qual se encontrava em mora, depois de ter sido por diversas vezes interpelada para o efeito —, nem ter comparecido à outorga da mesma, a R. incumpriu, de modo absoluto e definitivo o CPCV, por via da conversão da mora em incumprimento definitivo (artigo 808º, nº 1, do CC)» [conclusão 92ª]. Dir-se-ia surgir óbvia a estreita ligação entre a marcação de data para a celebração do contrato prometido, a reunião e apresentação da documentação necessária a outorga do contrato, e o cumprimento da promessa de contratar – as duas primeiras condutas passos obviamente necessários à celebração do contrato prometido. Mas daí não decorre, nem se vê mínimo motivo para tal, que a reunião e apresentação da imprescindível documentação devesse ser feita antes da data agendada para a celebração da escritura – e a verdade é que a recorrente nenhum motivo razoável apresenta para se considerar o contrário. A actuação do devedor no cumprimento da obrigação que assumiu deve referir-se ao interesse do credor na contratação [decorrência do princípio geral de actuação de boa fé no cumprimento dos contratos – artigo 762º do Código Civil], interesse que o devedor em concreto poderá ou não conhecer, mas que pelo menos deverá ponderar partindo da normal função económico-social da obrigação que assumiu, do fim a que esta se destina. E esse mesmo interesse não pode deixar de servir como bússola na definição do exacto sentido da vinculação. No caso, como já se referiu, autora e ré reciprocamente assumiram a obrigação de no futuro celebrarem contrato de compra e venda de um imóvel. Para a simples marcação da data para a outorga do contrato prometido, constitui evidência incontornável [como terá plena noção qualquer pessoa minimamente diligente, sagaz, capaz e inteligente que alguma vez tenha procedido ao agendamento de negócio semelhante] a desnecessidade de a certidão do registo predial, a caderneta predial, a licença de utilização e a declaração de inexistência de dívidas ao condomínio serem apresentadas em momento anterior à data agendada. Pelo que, atentos os interesses em jogo num negócio como o celebrado entre autora e ré, para pleno e satisfatório cumprimento da obrigação acessória por esta assumida bastaria a apresentação da documentação na data que viesse a ser designada para a outorga do negócio – logo, a autora, ao exigir a entrega da documentação em data anterior à data agendada, exigiu aquilo a que a ré não se vinculou. Do que obviamente decorre ser notório inexistir mora da ré a considerar quanto à obrigação de apresentação da documentação necessária à celebração do contrato prometido. E é claro que daqui não resulta «desigual valoração das obrigações das partes», na medida em que a marcação da escritura em qualquer data até final de Novembro de 2022 constituía [como se referiu] simples faculdade concedida à autora, e não propriamente uma sua obrigação, mas sobretudo porque se tratam de condutas evidentemente diversas apesar de unidas no fim a que se destinam. Também nesta parte improcede o recurso. D) Não há dúvida – após a outorga do contrato promessa que nos ocupa, autora e ré estabeleceram acordo verbal adicional quanto às características da coisa destinada a ser objecto do contrato prometido, e por ele a autora assumiu que compraria e procederia à instalação dos ventilo-convectores no imóvel, enquanto a ré procederia ao pagamento das obras necessárias a “destapar” os pontos de instalação dos aparelhos, incluindo o custo da pintura das paredes a serem intervencionadas [ponto 40- da matéria de facto provada]. Evidentemente, também, este novo acordo incidiu sobre o imóvel que a autora se comprometeu a comprar e a ré a vender. Mas qual a influência deste novo acordo, verbalmente assumido, na vinculação que decorre do contrato promessa? Atento o teor da cláusula 10ª do contrato promessa [«qualquer alteração ao presente contrato, mesmo na modalidade de cláusula acessória, só poderá ser atendida caso venha a constar de acordo escrito assinado entre as partes»], absolutamente nenhuma. Com certeza, «existiu efetivamente um acordo entre as partes o qual não visou esclarecer ou alterar o conteúdo do CPCV, visando, isso sim, regular uma problemática que se colocou já após a celebração do contrato-promessa» [conclusão 60ª]; seguramente, «nos termos do disposto no artigo 221º, nº 2, do Código Civil, que respeita à forma das declarações negociais, sendo uma estipulação posterior à celebração do CPCV, a mesma só estaria sujeita à forma legal prescrita para a declaração se as razões da exigência especial da lei lhes forem aplicáveis, pelo que, tratando-se de um acordo dirigido à realização de uma obra na fração prometida comprar, estabelecido pelas partes depois da assinatura do contrato-promessa de compra e venda, não se vislumbra que, para tal, a lei exija forma especial» [conclusão 61ª]; e sem dúvida, «o acordo em causa não constitui uma convenção sobre o conteúdo do documento, ou para além dele, sendo tal estipulação válida, nos termos do disposto no artigo 222º, nº 2, a ela não se opondo o regime do disposto no artigo 394º, nº 1, ambos do Código Civil» [conclusão 62ª]. Mas o ponto inultrapassável é que, independentemente da sua validade, face ao expresso teor do acordo entre as partes vertido no contrato promessa [artigo 406º do Código Civil] o (in)cumprimento desse acordo adicional, assumindo este natureza apenas verbal, é irrelevante para aferir do (in)cumprimento do contrato promessa – por outras palavras, esse novo acordo, porque não respeitou a forma contratual escolhida pelas partes, não pode afectar os termos da vinculação fixada no contrato-promessa [com todo o devido respeito, a linearidade e clareza da cláusula 10ª do contrato promessa simplesmente não permite outro sentido]. Do que decorre a total irrelevância do invocado nas conclusões 63ª a 81ª do recurso da autora – o (in)cumprimento da promessa de contratar não se mostrava dependente do cumprimento da alegada obrigação de indicar os pontos de ligação dos ventilo-convectores à infraestrutura pré-instalada. Também nesta parte improcede o recurso. E) A recorrente faz assentar a sua discordância face ao decidido pelo Tribunal a quo essencialmente em 3 pontos: i. não cabia à ré eficazmente proceder ao agendamento de data para a outorga do contrato prometido; ii. a ré foi interpelada para apresentar documentação diversa necessária à celebração do contrato promessa, e não o fez; iii. a ré, apesar de para tal interpelada, não cumpriu com a obrigação de indicar os pontos de ligação dos ventilo-convectores à infraestrutura de climatização. Já vimos [em B)] que, passado o dia 30 de Novembro de 2022, a faculdade de agendamento de data para a realização do contrato prometida passou a caber tanto à autora como à ré. Também já constatamos [em C)] inexistir qualquer obrigação de a ré apresentar a documentação necessária à celebração do contrato prometido em data anterior à agendada para a outorga. E concluímos [em D)] que o efectivamente acordado entre autora e ré quanto à colocação dos ventilo-convectores, por se tratar de convenção que não respeita a forma contratualmente estabelecida para a eficaz modificação do contrato-promessa, é insusceptível de produzir qualquer efeito sobre este, designadamente quanto à aferição do seu (in)cumprimento. Ou seja, como declarou o tribunal a quo, nenhuma das questões suscitadas pela recorrente é possível retirar o incumprimento da promessa de contratar, por parte da ré, ainda que a título de simples mora, antes de Janeiro de 2023. Mas o inverso, obviamente, já sucede. Ao contrato promessa aplica-se o regime geral de incumprimento das obrigações. Caso não exista prazo fixo essencial para cumprimento da obrigação principal [no caso, como já se disse, a obrigação de contratar no futuro], o incumprimento definitivo pode surgir: (1) na sequência de declaração inequívoca de um dos promitentes que exprima a intenção de não cumprir a promessa; (2) como resultado da perda do interesse do credor na manutenção do vínculo, ocorrido na sequência de mora da contraparte; ou, (3) ocorrendo situação de mora, a prestação não for realizada no prazo razoável para o efeito fixado pelo credor. No caso em apreço, como bem refere o tribunal a quo, a ré válida e eficazmente interpelou a autora para cumprir a 21 de Dezembro de 2022, e a autora simplesmente não compareceu na data e local agendados para a celebração do contrato promessa, momento em que se encontravam reunidos todos os requisitos que permitiriam a celebração do contrato prometido [cfr pontos 10- a 12- da matéria de facto provada], assim entrando em mora quanto à obrigação de contratar [artigo 804º do Código Civil]. Na sequência, a ré, novamente de forma válida e eficaz, interpelou a autora para a celebração do contrato prometido, para tal agendando o dia 19 de Janeiro de 2023, e expressamente advertiu a autora que a não celebração do contrato prometido em tal data operaria a transformação da situação de simples mora em incumprimento definitivo. Mais uma vez, a autora não compareceu na data e local agendados para a celebração do contrato promessa [pontos 13- a 15- da matéria de facto provada]. Pelo que não há como não concordar com o tribunal a quo, quando convoca o regime fixado no nº 1 do artigo 808º do Código Civil – “As interpelações dirigidas pela ré à autora transmutaram a mora da autora em incumprimento definitivo. Atendendo ao preceituado no n.º 2 do art. 442º do Código Civil e perante os factos dados como provados é inquestionável que assistia à ré o direito a fazer seu o sinal entregue pela autora em consequência do incumprimento definitivo do contrato e perante a resolução do contrato que lhe foi comunicada. Tendo a ré resolvido validamente o contrato em 19 de janeiro de 2023 atendendo ao incumprimento definitivo do contrato promessa por parte da autora, é inquestionável que não pode proceder o pedido da autora para que se considere resolvido esse mesmo contrato-promessa por incumprimento definitivo da ré por não ter comparecido na escritura marcada pela autora para o dia 10 de abril de 2023. E isto porque a resolução operada pela ré pôs fim ao contrato-promessa. Nos termos do artigo 433.º “a resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico, com ressalva do disposto nos artigos seguintes”. Nos termos do art. 434.º, n.º 1, “a resolução tem efeito retroativo, salvo se a retroatividade contrariar a vontade das partes ou a finalidade da resolução”. Atendendo ao regime da resolução do contrato, a partir do momento em que a ré resolveu validamente o contrato e comunicou essa resolução à autora, o contrato promessa deixou de estar em vigor, tendo cessado». F) Ocorre actuação em abuso de direito quando o titular deste excede manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim económico e social desse direito [artigo 334º do Código Civil]. A confiança inter-subjectiva constitui noção pré-jurídica a que o direito reconhece relevo fundamental, tornando-a critério de regulação. «Assim tem de ser, pois poder confiar é uma condição básica de toda a convivência pacífica e da própria possibilidade da comunicação dirigida ao entendimento, ao consenso e à cooperação (logo, da paz jurídica)» [Prof. Baptista Machado, in “Tutela da Confiança e Venire Contra Factum Proprium”, Obras Dispersas, volume I, Braga, 1991, página 352]. Assim, a tutela da legítima confiança manifesta-se na concreta regulamentação de diversos institutos do direito civil, muitas vezes como limitadora dos efeitos resultantes da aplicação estrita das normas positivas. Revela-se, desde logo, naquele que actua segundo a boa fé normativa, por esse motivo beneficiando de protecção [fundada na confiança legítima que está na base da conduta] em detrimento daquele que confia na aplicação estrita do direito. Que a não aplicação da uma norma para tutela da legítima expectativa representa a escolha entre duas condutas que se norteiam pela confiança [de um lado, confiança no recto e honesto actuar, em valores que enformam e são prosseguidos pelo ordenamento jurídico; de outro, a confiança na aplicação do direito] constitui factor a ter sempre presente quando se analisa e decide o caso concreto. Neste sentido, aliás, o artigo 334º do Código Civil apenas considera ilegítimo o exercício de um direito quando revele excesso manifesto dos limites impostos pela boa fé. Isto porque aquele a quem o ordenamento jurídico reconhece um direito deve confiar que livremente o pode exercer, apenas de tal devendo ser impedido quando clamorosa, manifesta e intoleravelmente viole a ideia de Justiça ou o sentimento jurídico socialmente dominante. Por outro lado, a boa fé [quer no sentido psicológico, enquanto ignorância desculpável; quer no sentido normativo, enquanto dever de conduta] não é um sentimento, uma névoa difusa que cada um pode invocar a seu favor sempre que lhe falece outro abrigo; é sim, e deve ser, um essencial instrumento técnico-jurídico, de contornos e aplicação precisos. “A função essencial do instituto do abuso do direito consiste em temperar, com o apelo a regras e princípios fundamentais (a boa fé, a confiança legítima, a finalidade económica e social dos direitos) os resultados que decorreriam de uma aplicação meramente formal ou estrita do direito” [acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07 de Dezembro de 2016, processo nº 370/14.3T8BVNG.P2.S1, disponível em www.dgsi.jstj.pt/]. A recorrente defende que a recorrida actuou em abuso de direito ao ter «marcado a escritura de compra e venda para data diversa da contratualmente fixada, como pretexto para precipitar a resolução contratual — estando ela mesma em mora, como entendemos, que estava —, alegando incumprimento da autora, sendo que, para esse incumprimento, também concorreu a ré, com a sua conduta culposa e morosa». Nada mais errado – após 30 de Novembro de 2022 à recorrida assistia a faculdade de a qualquer momento interpelar a recorrente para cumprir, desde que o fizesse com uma razoável antecedência [sendo certo que no contrato promessa até foi fixado o prazo que as partes entenderam cumprir esse critério de razoabilidade – 15 dias]. Ou seja, ao actuar como actuou, a ré limitou-se a exigir o cumprimento nos termos contratualmente fixados. Não ocorre actuação em abuso de direito. G) Como acima se referiu, não se detecta sequer qualquer incumprimento da parte da ré [entendendo-se, como se considera dever ser entendido, que a realização da obra para colocação dos ventilo-convectores, porque objecto de acordo não submetido a escrito, não pode relevar para aferir quanto ao (in)cumprimento da obrigação de contratar] – pelo que, consequentemente não há culpa da aqui recorrida a valorar. O recurso improcede na íntegra * Sumário – nº 7 do artigo 663º do Código de Processo Civil: ……………………………………………… ……………………………………………… ……………………………………………… ** * Dispositivo: Pelo exposto, acordam os Juízes que integram a 3ª secção deste Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao presente recurso, confirmando a sentença proferida em 1ª instância. Mais se condena a recorrente nas custas do recurso – artigo 527º do Código de Processo Civil. Notifique. Porto, 13/11/2025. António Carneiro da Silva Álvaro Monteiro Paulo Dias da Silva |