Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | JOÃO PEDRO PEREIRA CARDOSO | ||
Descritores: | IMPUTAÇÃO GENÉRICA DE FACTOS CONTRADITÓRIO IMPOSSIBILIDADE DIREITO DE DEFESA EXPRESSÕES SEM RELEVÂNCIA PENAL | ||
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Nº do Documento: | RP20221130709/22.8GBPNF-K.P1 | ||
Data do Acordão: | 11/30/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELO ARGUIDO | ||
Indicações Eventuais: | 4ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | I – As imputações conclusivas ou genéricas quando não sejam passíveis de um efetivo contraditório e, portanto, do direito de defesa (art.32º, nº5, da C.R.P.) devem ter-se como não escritas, não podendo servir de suporte à qualificação da conduta do agente. II – Constando da comunicação efetuada ao arguido, aquando do seu 1º interrogatório judicial, o local, as características identificativas do veículo utilizado no assalto, o período temporal em que os factos indiciados ocorreram e a relação dos objetos furtados, não ocorre insuficiente concretização da factualidade indiciariamente imputada ao arguido, podendo este exercer o seu direito de defesa. [Sumário da exclusiva responsabilidade do Relator] | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Processo 709/22.8GBPNF-K.P1 Sumário: ……………………………… ……………………………… ……………………………… Acordam, em conferência, na Segunda Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: 1. RELATÓRIO No âmbito do Inquérito nº 709/22.8GBPNF, do qual foi extraída a certidão que constitui os presentes autos, que corre termos pelo Juiz 1 do Juízo de Instrução Criminal de Penafiel, após interrogatório judicial, por decisão proferida em 5 de setembro de 2022, foi aplicada ao arguido AA a medida de coação de prisão preventiva. * Não se conformando com esta decisão, o arguido dela interpôs recurso para este Tribunal da Relação do Porto, com os fundamentos descritos na respetiva motivação e contidos nas seguintes “conclusões”, que se transcrevem: I. O arguido AA vem indiciado da prática de três crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º e 204.º n.º 1, al. b), e ainda, al. f) do Código Penal, (doravante CP); II. Mais vem indiciado da prática, e autoria material e concurso real, dois crimes de ofensas à integridade física simples, p. e p. pelo artigo 143.º do Código Penal; III. Em sede de 1.º interrogatório judicial, foi aplicada ao arguido a medida de coação de prisão preventiva. IV. A discordância do arguido prende-se com a, alegadamente, suficiente indiciação da factualidade descrita no Douto Despacho, bem como do alegado preenchimento dos requisitos ou condições gerais de aplicação, in casu, da medida de prisão preventiva. V. Assim, e iniciando o presente recurso pela suficiente indiciação da factualidade descrita no Douto Despacho: VI. Ora, bem sabemos que a concretização deverá estar presente nos vários momentos do Processo Penal. Ora, tal não se coaduna com a delimitação de "No período compreendido 06H30 e as 17H30". VII. Não podemos também olvidar que, a imputação, de pelo menos dois crimes, ao arguido, resulta meramente do facto de o mesmo se encontrar na posse de alguns objetos que haviam sido furtados noutros locais. VIII. É por esse prisma que reitera a Defesa que não crê que se encontre suficientemente indiciado, a prática dos factos descritos, por parte do arguido. IX. Por sua vez, quanto ao preenchimento dos requisitos ou condições gerais de aplicação da medida de coação de prisão preventiva: X. Do perigo de continuação da atividade e alarme social, é alegada a prática de vários ilícitos criminais, e inclusive que existe a "grande probabilidade de praticar muitos mais." XI. Ora, não compreende de onde se aferiu que existe uma grande probabilidade de o arguido ora Recorrente vir o praticar muitos mais crimes. XII. Na verdade, julgamos não se encontrar tipificado na Lei Penal Portuguesa o método, ou critério, apto a concluir se o arguido irá, ou não, praticar muitos mais crimes, após ser submetido a primeiro interrogatório judicial. XIII. Por sua vez, quanto ao perigo de perturbação da tranquilidade e paz públicas, não aparenta estar verdadeiramente consubstanciado a que se reporta o expressão "tendo em conta a forma como os factos são praticados." XIV. Face aos meios noticiosos existentes atualmente, somos inundados com relatos de crimes, através das televisões, jornais, redes sociais. XV. Assim, não cré a Defesa que, atendendo a muitas decisões concretas, (dando o exemplo leigo do Rei dos Catalisadores), que fosse existir um verdadeiro perigo de perturbação da paz públicas, na hipótese de ter sido aplicada uma medida menos gravosa ao arguido. XVI. Pelo que, não se conforma a Defesa que a aplicação da medida de coação de Obrigação de Permanência na Habitação, especialmente com controlo por meios técnicos à distância, fosse perturbar a tranquilidade ou paz públicos. XVII. Quanto ao perigo de perturbação do inquérito, julgamos também ser uma "falsa questão". Senão veja-se: XVIII. Já foi junta aos presentes autos toda a prova que alegadamente sustenta os factos alegadamente praticados. XIX. Os presentes autos já contam com depoimentos de supostos co-arguidos; também já foram inquiridos todos os ofendidos e também testemunhas; bem como já foi junto demais suporte probatório. XX. Mais se refere que, não crê a Defesa, como possa ficar demonstrado que o facto de o arguido alegar ser toxicodependente aumenta o risco de perigo de perturbação do inquérito, como parece querer induzir o Douto despacho. XXI. Finalmente, quanto ao perigo de fuga: XXII. Especialmente atendendo que o arguido não tem trabalho, não tem meios de subsistência económica nem grandes poupanças acumuladas, pelo que, ainda que acreditássemos que o arguido teria o intento de se pôr em fuga. racionalmente vemos que este não dispõe de meios para tal, pelo que se afiguro uma hipótese inviável. XXIII. Assim, face ao exposto, e em consonância com os princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade, entende a Defesa que deveria ter sido aplicada ao arguido a medida de coação de Obrigação de Permanência na Habitação com fiscalização por meios eletrónicos à distância, como aliás requereu o Douto Magistrado do Ministério Público, ao invés da medida de Prisão Preventiva. XXIV. Desse modo, nos termos dos artigos 193.º e 212.º do Código de Processo Penal, face aos elementos lácticos e probatórios constantes dos presentes autos. não é de crer que estejam preenchidos os pressupostos e motivos suficientes ou bastantes que justifiquem a aplicação da medida de coação de Prisão Preventiva, decidindo-se V. Exa. pela sua revogação e sua substituição por outra menos gravosa, nomeadamente a Obrigação de Permanência na Habitação, com meios de controlo técnicos à distância”. - O recurso foi regularmente admitido a subir de imediato, em separado e com efeito meramente devolutivo.* Respondeu o Ministério Público junto do tribunal a quo às motivações de recurso, concluindo pelo não provimento deste, mantendo-se a medida de coação decretada.* Subiram os autos a este Tribunal da Relação, onde o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto manifestou adesão à argumentação do despacho recorrido e da resposta do Ministério Público e conclui que nenhum reparo merece o despacho recorrido pelo que, concordando e subscrevendo a resposta do Ministério Público, entende que o recurso não deverá obter provimento.- Na sequência da notificação a que se refere o art. 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, procedeu-se a exame preliminar e foram colhidos os vistos, após o que o processo foi submetido à conferência, cumprindo apreciar e decidir.* 2. FUNDAMENTAÇÃOConforme jurisprudência constante e assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, em que sintetiza as razões do pedido (art. 412º, nº 1, do Código de Processo Penal), que se delimita o objeto do recurso e os poderes de cognição do Tribunal Superior. Face às conclusões extraídas pelo recorrente, são as seguintes as questões a apreciar nesta instância de recurso 1.ª) (In)suficiente concretização temporal da indiciada prática do crime (cfr. 6ª conclusão das alegações de recurso); 2.ª) (In)suficiente indiciação quanto a dois crimes de furto qualificado com base na detenção de objetos furtados (- cfr. 7ª conclusão das alegações de recurso); 3ª) Das exigências cautelares, proporcionalidade, adequação e subsidiariedade da prisão preventiva. -- Importa considerar o teor relevante dodespacho recorrido: “III - Factualidade que, após a audição do arguido, nesta fase processual, se julga suficientemente indiciada: 1. Por acórdão datado de 15.06.2022, transitado em julgado, proferido no processo comum coletivo n.º 1248/21.0JAPRT, do Juízo Central Criminal de Penafiel – Juiz 3, o arguido AA foi condenado: - pela prática em coautoria e na forma consumada de um crime de roubo p. e p. pelo art. 210º, nº1 do C. Penal na pena de de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão (NUIPC212/20.0GFPNF); - pela prática em autoria material e na forma consumada de um crime de furto simples p. e p pelo art. 203º, nº1 do C. Penal na pena de 8 (oito) meses de prisão (NUIPC109/20.4GBPNF); - pela prática em coautoria de um crime de roubo p. e p. pelo art. 210º, nº1 do C. Penal na pessoa de BB na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses e prisão (NUIPC 1248/21.0JAPRT); - pela prática em coautoria de um crime de roubo p. e p. pelo art. 210º, nº1 do C. Penal na pessoa de CC na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão (NUIPC 1248/21.0JAPRT); - pela prática em coautoria e na forma consumada de um crime de furto p. e p. pelos arts. 203º, nº1 e 204º, nº2, al. e), ambos do C. Penal na pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão (NUIPC75/20.6GFPNF) - em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas condenar o arguido AA na pena única de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com sujeição a regime de prova, cuja concreta elaboração do plano individual de readaptação social, será levado a efeito pelos serviços de reinserção social competentes, que se encarregará da sua fiscalização. 2. No dia 03.09.2022, entre as 07H00 e as 09H52, na localidade de ... – Paredes, o arguido AA, após quebrar o vidro traseiro do lado esquerdo da viatura da marca Volkswagen, modelo ..., matrícula ..-..-XF, pertencente a DD, retirou do seu interior e levou consigo uma mochila da marca Nike, que continha no seu interior uma careteira em pele, com vários cartões pessoais, uma capa de telemóvel, um colete refletor, assim como retirou uma segunda carteira que continha vários cartões multibanco, da loja Worten e outros, tudo pertencente ao referido DD e com o valor de 200,00€. 3. Vários desses documentos retirados pelo arguido vieram a ser achados e entregues na GNR ... e os cartões bancários foram apreendidos ao arguido, que os tinha numa carteira, misturados com outros cartões, vindo todos esses documentos a ser entregues ao seu legitimo dono. 4. O arguido agiu com o propósito conseguido de retirar do interior de um veículo automóvel e se apropriar, dos referidos bens e dinheiro, bem sabendo que não eram seus e que agia contra a vontade e sem o consentimento daquele. 5. Agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo a sua conduta proibida e punida por lei. 6. Pelo exposto, o arguido cometeu um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 203º e 204º, n.º 1, al. b), do CP. 7. No período compreendido entre as 15.30h e as 16.40h, do dia 03.09.2022, o arguido AA deslocou-se até às imediações da moradia de EE, sita na Rua ..., ... - Paredes, que é vedada em todo o seu perímetro com muro e grades com cerca de 1,40m de altura e com um portão de metal que na altura se encontrava fechado mas não trancado à chave. 8. Após entrar no recinto vedado da habitação pelo referido portão, o arguido retirou dali e levou consigo um ciclomotor, marca Piagio, do ano de 1999, matrícula ..-GG-.., que possuía as chaves na ignição, com o valor de 800,00€, pertencente a EE. 9. O arguido agiu com o propósito de se introduzir no logradouro da habitação e de se apropriar, como apropriou, do referido veículo, bem sabendo que não eram seus e que agia contra a vontade e sem o consentimento daquele. 10. Agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo a sua conduta proibida e punida por lei. 11. Pelo exposto, o arguido cometeu um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 203º e 204º, n.º 1, al. f) do CP; 12. No dia 03.09.2022, após, pelo menos, as 15.30 horas, na rua ..., em ..., o arguido estacionou ciclomotor retirado a EE e dirigiu-se a FF, que se encontrava no interior do Opel ..., matrícula ..-..-TJ, ali estacionado, pedindo-lhe um cigarro e quedando-se pelas imediações 13. Perante a atitude suspeita do arguido, FF contactou telefonicamente o seu companheiro GG que se deslocou àquele local. 14. Ao aperceber-se da presença de GG no local, o arguido pediu-lhe um cigarro, voltando a insistir nisso, mas em voz alta e agressiva, mesmo depois de GG lhe dizer que não possuía cigarros. 15. Como este desconfiasse que o arguido transportasse bens ilícitos e dissesse que ia chamara a GNR, o arguido afastou-se do local no ciclomotor subtraído ao mesmo tempo que dizia a GG que era “um homem morto”. 16. Volvidos cerca de 20 minutos, o arguido regressou à rua ..., trazendo consigo dois paus. 17. De imediato, desferiu com esses objetos várias pancadas no corpo de GG, bem como no corpo de FF que ao aperceber-se da situação tentou auxiliar o seu companheiro. 18. Como consequência direta e necessária da agressão sofrida, vieram os ofendidos a sofrer hematomas e escoriações no tronco e membros superiores respetivos. 19. Como o arguido se ausentasse do local, os ofendidos foram no respetivo encalce, tendo aquele seguido para o interior da auto estrada, em ... – Paredes, tendo no acesso à A4, se refugiado por entre uma falha nos rails, perdendo aqueles o AA de vista. 20. O ciclomotor subtraído pelo arguido a EE foi localizado e recuperado por elementos do Posto da GNR em Paredes, nas imediações do local supra indicado. 21. Na descrita conduta agiu o arguido com o propósito conseguido de maltratar fisicamente os ofendidos, bem sabendo que da mesma resultariam, como resultaram, as lesões supra referidas. 22. O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo a sua conduta proibida e punida por lei. 23. Pelo exposto, cometeu o arguido, em autoria material e concurso real, dois crimes de ofensas à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143º, do Código Penal. 24. No período compreendido 06H30 e as 17H30, o arguido AA, em ... – Paredes, na via pública, junto da residência do Sr. HH, lesado nos autos, após ter acedido ao interior do veiculo da marca Renault, modelo ..., matricula ..-..-SD, além de ter danificado o canhão da ignição, provavelmente com objetivo de o furtar, levou do seu interior, mais concretamente da mala do veiculo, uma máquina fotográfica da marca INSTAX MINI9, avaliada em €100 (cem euros), um disco externo da marca Toshiba, avaliado em €60 (sessenta euros), uma coluna de som da marca Goodio, avaliada em €20 (vinte euros), uma carteira em pele no valor de €35 (trinta e cinco euros) e cerca de €500 (quinhentos Euros) de danos na viatura acima indicada. 25. O arguido agiu com o propósito conseguido de retirar do interior de um veículo automóvel e se apropriar, dos referidos bens e dinheiro, bem sabendo que não eram seus e que agia contra a vontade e sem o consentimento daquele. 26. Agiu deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo a sua conduta proibida e punida por lei. 27.Pelo exposto, o arguido cometeu um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 203º e 204º, n.º 1, al. b), do CP. 28. A máquina fotográfica acima descrita, foi apreendida ao arguido AA, que a trazia ao tiracolo aquando da sua chegada ao hospital ... (apreendida à ordem dos autos 738/22.1GAPRD). 29. Parte dos demais objetos foram recuperados do interior do veículo de matrícula ..-..-LS. 30. Com efeito, cerca das18H00, do dia 03/09/2022, II, estacionou a sua viatura, marca Renault, modelo ..., matrícula ..-..-LS, com as chaves na ignição, junto ao café “...”, em ... – Paredes, a fim de ali adquirir um maço de tabaco. 31. Aproveitando-se desse facto e da sua deformada personalidade, o arguido entrou no veículo em causa, a fim de o retirar dali e levar consigo. 32. Ao aperceber-se que o arguido se tinha introduzido no interior do seu veículo, o ofendido II correu no encalce do mesmo, tendo-o agarrado através da janela do lado do condutor. 33. Por forma a não ser detido e fugir do local com a viatura, o arguido colocou o veículo em funcionamento e iniciou movimentos para a frente e para trás, visando ferir o ofendido na sua integridade física por forma a que o largasse. 34. O arguido somente não logrou aquele propósito, porque foi impedido pelo proprietário e ofendido e por alguns populares que acorreram em auxílio daquele, apesar da resistência que o mesmo ofereceu à sua detenção. 35. Como consequência direta e necessária da descrita atuação do arguido, o ofendido sofreu vários ferimentos por todo o corpo, tendo sido aconselhado pela GNR a deslocar-se ao hospital para receber tratamento e notificado para se deslocar ao Gabinete Médico Legal do Centro Hospitalar .... 36. No interior do veículo em causa foram pelos militares da GNR 1... recuperados vários objetos subtraídos do interior do veículo de matrícula ..-..-SD, conforme já mencionado. 37. O arguido agiu com o propósito conseguido de constranger o ofendido a não agir de modo a recuperar o seu veículo e assim conseguir conservar o mesmo, em valor superior a 200,00€, que tentava subtrair, não obstante saber que o veículo não lhe pertencia e que atuava contra a vontade e prejuízo do seu dono. 38. Agiu deliberada, livre e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei. 39. O arguido incorreu assim, em autoria material de um crime de violência depois da subtração, p. e p. pelo artigo 211.º, do Código Penal, por referência ao artigo 210º, n.º 1, e artigos 203, nº1, e 204.º, n.º 1, al. b) do Código Penal. IV - Elementos de prova que indiciam os factos imputados: A prova dos factos decorre da descrita no ponto 4), designadamente do Aditamento ao auto de notícia de fls. 242 a 259; do Auto de notícia de fls. 260 e ss.; do Auto de inquirição de HH, de fls. 264 e 265; do Auto de apreensão de fls. 269; do Auto de inquirição de II, de fls. 270; do Auto de inquirição de DD, de fls. 276; do Auto de apreensão de fls. 281; do Auto de inquirição de FF, de fls. 281/282; do Auto de inquirição de GG, de fls. 287/288; dos Fotogramas (cópias) de fls. 923 e ss; do Auto de inquirição de EE, de fls. 296; do Auto de apreensão de fls. 299 e ss.; do Aditamento de fls. 314; e do Auto de apreensão de fls. 316, após a sua análise critica nos termos gravados, tendo presente que o arguido pretendeu prestar declarações quanto aos factos. Como claramente resulta dos autos, após interrogatório do arguido, o Tribunal constatou que este veio aos autos tentar dar a ideia de que nada tinha que ver com os factos diretamente, mormente os furtos; e que quanto às ofensas à integridade física referenciados nos autos, como alegou, ele é que teria sido vitima de agressões por parte dos ofendidos, e não o contrário. Com claro está, não obstante o direito de defesa do arguido, o Tribunal na apreciação da prova tem que ter em conta a prova direta, tal com a indireta, conjugado esta com a analise critica das declarações prestadas pelo arguido. Da citada análise, resultou claro que a sua versão dos factos apresentada pelo arguido não nos merece qualquer credibilidade, tanto mais que é claro e evidente que ele (tal como outros suspeitos), têm-se dedicado à prática de vários ilícitos desta natureza. Repare-se que o autor é aquele que por si mesmo ou por intermédio de outrem, ou tomar parte direta na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros, e ainda quem, dolosamente, determinar outra pessoa à prática do facto, desde que haja execução ou começo de execução, como decorre do artigo 26º do CP Na situação concreta, em relação aos presentes factos, é preciso ter em conta que estes integram o mesmo modus operandi descrito pela arguida JJ, a fls. 83, de que o arguido fez uso para a prática de outros factos, no âmbito do qual resultou o furto da viatura Lexus, ..-..-LS. Por seu lado, em relação ao veículo ..-..-XF, foram recuperados objetos na posse do arguido que havia sido furtados da viatura. A viatura ..-GG-.., furtada a EE, é identificado pelas testemunhas FF e KK, como estando na posse do arguido, quando alegam que foram agredidos por este, sendo depois recuperado próximo do local pela GNR. Da viatura ..-..-SD, foi recuperada na posse do arguido, quando este se deslocava para o Hospital, a máquina fotográfica furtada. Relativamente aos factos que ocorreram com o ofendido II, este é claro em referir que o arguido se encontrava a furtar a sua viatura e tudo fez para fugir com esta. Por outro lado, mas não menos importante, o ofendido GG identificou o arguido com sendo uma pessoa que utilizava veículos furtados, o que também foi apreendido ao arguido, sendo este a pessoa em causa. Em face destes elementos, e tendo em conta o curto espaço de tempo em que eles ocorreram, associado ao modus operandi referenciado pela arguida JJ, não existem dúvidas que existem fortes indícios da prática dos factos pelo arguido, pois não tem qualquer lógica factual de que alguém, que não o arguido, praticou os furtos, e que depois entregou os bens ao arguido; tal como não se apreende lógico que o arguido utilizou o ciclomotor ..-GG-.., a pedido de um amigo, sem saber que era furtado, e que depois desses factos o aqui arguido, sem nada fazer, foi agredido por FF e EE, utilizando a viatura em causa. Também não tem qualquer lógica de que um amigo lhe disse que a viatura Renault ... era sua, não sabendo assim que esta não lhe pertencia, e que ao ir busca-la, este foi agredido pelo próprio ofendido. O que resulta claramente dos autos é que arguido se deslocou para a viatura no momento em que esta estava com a chave na ignição, e o proprietário no café. Logo, se a viatura fosse de um amigo, o normal era que este lhe entregasse as chaves, e não que esta estivesse na ignição. Por seu lado, caso se tratasse de um lapso, nada justifica que tivesse tentado fugir com a mesma, a partir que o ofendido diz que é dele. Claro está que o alegado pelo arguido não corresponde à verdade, porquanto o mesmo deslocou-se àquele local com clara intenção de furtar a viatura, o que só não conseguiu após a resistência oferecida pelo ofendido e outros populares, não obstante a violência perpetrada. Perante isto, sem prejuízo de mais e melhor prova que o Ministério Público se encontra a realizar, não existem dúvidas de que o arguido é um dos autores dos factos aqui em investigação, pelo que se dá a respetiva factualidade por indiciada. V- Os factos indiciados integram os ilícitos: Em face do exposto, o tribunal considerou o arguido AA, por ora, indiciado pela prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso efetivo, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 203.º e 204.º, n.º 1, al. b), do CP; um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art.º 203º e 204.º, n.º 1, al. f) do CP; dois crimes de ofensas à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143.º, do Código Penal; um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 203.º e 204.º, n.º 1, al. b), do CP e um crime de violência depois da subtração, p. e p. pelo artigo 211.º, do Código Penal, por referência ao artigo 210.º, n.º1, e artigos 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, al. b) do Código Penal. VI - Das razões das medidas de coação a aplicar. Dos seus fundamentos e princípios legais Como se sabe, a Constituição da República Portuguesa (CRP), refletindo um Estado de Direito democrático e social, baseado na dignidade da pessoa humana, no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais do cidadão [cfr. artigos 1.º e 2.º da C.R], impõe que o nosso processo penal, numa perspectiva jurídico-processual, tenha como finalidades, na aplicação da lei penal aos casos concretos, a descoberta da verdade material, a realização da justiça no caso concreto, por meios processualmente admissíveis, a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos perante o Estado, o restabelecimento do crime e a reafirmação da validade da norma violada – procurando garantir, assim, como afirma o Prof. Germano Marques da Silva «que nenhum responsável passe sem punição (impunitum non relinqui factinus) nem nenhum inocente seja condenado (innocentum non condennari)». Nessa medida, a verdade processual não assenta numa ideia de certeza cientificamente comprovada, mas sim numa ideia de probabilidade. Na expressão do Prof. Germano Marques da Silva [curso de Processo Penal II, Editorial Verbo, 1993, p. 96], «ela não é senão o resultado probatório processualmente válido, isto é, a convicção de que certa alegação singular de facto é justificadamente aceitável como pressuposto da decisão, obtidos por meios processualmente válidos». A realização da justiça pressupõe, pois, a descoberta da verdade material, pressuposto legitimador da necessidade e sujeição da sanção penal, que visa a protecção de bens jurídicos fundamentais, mas também a reintegração do agente do crime na sociedade, sendo certo que, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa [vid. Artigo 40.º do Código Penal], e, ainda, o restabelecimento da paz jurídica comunitária, posta em causa através do cometimento do crime. O restabelecimento da paz jurídica dos cidadãos, posta em causa através do cometimento do crime ou mesmo da suspeita da sua prática, incide, como refere o Prof. Germano Marques da Silva [curso proc. penal citado, p. 25], «tanto no plano individual, do arguido e da vítima, como no plano mais amplo da comunidade jurídica. Esta finalidade liga-se, em grande parte, a valores de segurança e, por isso, merece destaque a posição de Goldschmit, para quem o fim do processo era a obtenção de uma sentença com força de caso julgado». Daí que uma das finalidades do processo penal visa não só a condenação dos culpados, mas também a absolvição dos inocentes tendo em vista precisamente o desiderato da paz pública. Neste âmbito, as medidas de coacção são meios processuais penais limitadores da liberdade pessoal, de natureza meramente cautelar, aplicáveis a arguidos sobre os quais recaíam fortes indícios de um crime. Assim sendo, as medidas de coação não devem confundir-se com as penas. As finalidades das medidas de coacção constam do artigo 204.º do CPP, que dispõe: nenhuma medida de coacção prevista no capítulo anterior, à exceção da que se contém no artigo 196.º [termo de identidade e residência] pode ser aplicada se em concreto se não verificar: a) Fuga ou perigo de fuga; b) Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; ou c) Perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de perturbação da ordem e da tranquilidade públicas ou de continuação da actividade criminosa. No artigo 192.º do CPP dispõe-se sobre as condições gerais de aplicação das medidas de coacção que deve, no entanto, ser conjugado com o artigo 204.º (e artigo 227.º, para as medidas de garantia patrimonial), do mesmo diploma legal. A condição essencial para a aplicação de uma medida de coacção é a prévia constituição como arguido da pessoa que delas for objecto [artigos 192.º, n.º 1 e 58.º, n.º 1, al. b)], do mesmo diploma legal. O n.º 2 do artigo 192.º, estabelece ainda como condição geral para aplicação de uma medida de coacção, a inexistência de causas de isenção da responsabilidade ou de extinção do procedimento criminal, existiam ou não indícios da prática de crime. A expressão causas da isenção de responsabilidade é usada, no referido artigo 192.º, n.º 2, num sentido amplo, abrangendo todos os casos de afastamento da responsabilidade penal. São causas da isenção da responsabilidade penal as denominadas causas justificativas do facto, ou causas de justificação ou de exclusão da ilicitude ou da culpa, como verbi gratia, a legítima defesa [artigos 31.º e 32.º do Código Penal]. Artigo 31.º (exclusão da ilicitude) [1- O facto não é punível quando a sua ilicitude por executada pela ordem jurídica considerada na sua totalidade. 2- Nomeadamente não é ilícito o facto praticado: a) em legítima defesa; b) no exercício de um direito; c) No cumprimento de um dever imposto por lei ou por ordem legítima da autoridade; ou d) com o consentimento do titular do interesse jurídico lesado. Artigo 32.º (legítima defesa), constitui legítima defesa o fato praticado como meio necessário para repelir a agressão actual e ilícita de interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiros»; o direito de necessidade justificante (artigo 34.º, do mesmo diploma); o estado de necessidade desculpante (artigo 35.º do CP), o conflito de deveres (artigo 36.º do CP), a obediência indevida desculpante (artigo 37.º, do CP); o consentimento do ofendido (artigo 38.º, do C.P.). In casu, as respetivas causas não se verificam da prova e consequentemente factualidade dada como indiciada Em face do supra exposto, para a aplicação de uma medida de coacção torna-se necessário a imputação à pessoa que dela for objeto, de indícios (ou fortes indícios, nos casos dos artigos 200.º, 201.º e 202.º do CPP) da prática de determinado crime, ou seja, como afirma Prof. Germano Marques da Silva, «não pode ser aplicada uma medida de coacção ou de garantia patrimonial se não se indiciarem os pressupostos de que depende a aplicação ao sujeito de uma pena ou medida de segurança criminais». Por outro lado, não basta a existência de indícios da prática do crime e os requisitos específicos definidos na lei para cada uma de tais medidas, importa ainda que se verifiquem os requisitos ou condições gerais referidas nas várias alíneas do artigo 204.º, do CPP. Estes requisitos ou condições gerais, enumerados nas alíneas a), b) e c), são taxativos, bastando, consequentemente, a existência de algum deles para que a medida possa ser aplicada. Os requisitos ou condições gerais, referidos, são, respectivamente, os seguintes: fuga ou perigo de fuga; perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de perturbação da ordem e da tranquilidade ou de continuação da actividade criminosa. Nos termos do artigo 204.º, al. a), a fuga ou perigo de fuga justifica a aplicação ao arguido de uma medida de coacção (à excepção do termo de identidade e residência). O Código de Processo Penal de 1929, a este propósito, era menos exigente, na medida em que, como pressuposto da aplicação da prisão preventiva, exigia, apenas, o fundado receio de fuga [Código de Processo Penal de 1929, artigo 291.º, § 2.º: «Não são suficientes as medidas de liberdade provisória: a) quando haja fundado receio de fuga».] À luz do direito actual, parece que, como refere o Prof. Germano Marques da Silva, «a medida de coacção actua neste caso (em caso de fuga) como um antídoto ex post, pela consideração de que a fuga já verificada constitui prova decisiva da existência de perigo de nova fuga. A ocorrência de fuga do arguido será por si só motivo para aplicação ao arguido de uma medida de coacção» [ob. cit. Vol II, 3ª Edição, p. 265]. Refere o citado professor que «importa ter bem presente que a lei não presume o perigo de fuga, exige que esse perigo seja concreto, o que significa que não basta a mera probabilidade de fuga deduzida de abstractas e genéricas presunções, v.g. da gravidade do crime, mas que se deve fundamentar sobre elementos de facto que incidem concretamente aquele perigo, nomeadamente porque revelam a preparação para a fuga». Já o perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução, prevista na alínea b), do artigo 204.º, é outro dos requisitos gerais que tornam admissível a aplicação ao arguido de uma medida de coação, que decorre dos factos, suas circunstâncias e personalidade demonstrada pelo arguido. O perigo de perturbação da ordem e da tranquilidade públicas ou de continuação da actividade criminosa há-de resultar: ou das circunstâncias do crime imputado ao arguido ou da sua personalidade. Das circunstâncias do crime imputado ao arguido ou então da sua personalidade há-de resultar o perigo de perturbação da ordem e da tranquilidade públicas, alarme social ou de continuação da actividade criminosa, elemento justificador da aplicação de uma medida de coação, máxime a prisão preventiva. Das medidas concretas Tendo por assente estes princípios orientadores, impõe-se decidir sobre as medidas de coação adequadas e proporcionais ao caso concreto: - No presente caso, tendo por base os factos e ilícitos em causa, e atento às suas circunstâncias, constata-se que estes apresentam, desde já, elevada gravidade, tanto mais que tudo indica que o arguido praticou muitos mais ilícitos dos que ora lhe foram imputados, basta atentar no depoimento da arguida, JJ, a fls. 83. - Não obstante, os crimes pelos quais o arguido se encontra indiciado já se apresentam de considerável gravidade, tanto mais que são claramente indiciadores de que este tem feito deste tipo de ilícitos o seu modo de vida. - Repare-se que o arguido já foi acusado e condenado pela prática de roubo e furto, cuja pena de prisão se encontra suspensa na sua execução, e mesmo assim voltou a praticar crimes da mesma natureza com a agravante de apresentar sinais de ser uma pessoa violenta. - Repare-se que nos factos que envolvem a ofendida FF e o seu companheiro, tudo indica que este os agrediu, e que no caso do ofendido II ainda foi ameaçado de morte. - Perante estes elementos, não existem dúvidas que estamos perante uma situação de claro perigo de continuação da atividade ilícita, alarme social, perturbação do inquérito e, ainda, perigo de fuga, tudo nos termos as alíneas a), b) e c) do art.º 204.º do CPP. - Perigo de continuação da atividade e alarme social, decorrente dos vários ilícitos criminais já praticados pelo arguido e a grande probabilidade de praticar muitos mais. - Tudo isto conjugado, e tendo em conta a forma como os factos são praticados, há também o perigo de perturbação da tranquilidade e paz públicas. - Perigo de perturbação de inquérito, na medida em que se constatou que o arguido tem uma personalidade com propensão para mentir sobre os factos e, tendo praticado atos violentos, desvalorizou a sua conduta, imputando a responsabilidade aos próprios ofendidos. - Esta situação em si, associada ao facto de o arguido alegar ser toxicodependente, pode levar a que aja, em relação aos ofendidos/ testemunhas, perigo de confrontação do arguido com os mesmos, tanto mais que tudo indica que o arguido, e em relação a dois episódios indiciados, apresentou-se violento para com eles, sem receio das consequências. - Por seu lado, o perigo de fuga, resulta do facto do arguido passar a estar ciente que há uma elevada probabilidade da sua anterior condenação vir a ser revogada a suspensão da execução da pena; o facto de não ter trabalho ou local fixo onde residir, pois ainda no presente dia apresentou uma morada diferente da constante do TIR, alegando que ali residia apenas a duas semanas. - Em face de todos estes factos, a medida de coação que se apresenta necessária, adequada e proporcional ao caso concreto, no entendimento do Tribunal, após apreciação de todas as medidas de cocção, é a medida de coação de prisão preventiva, pelas seguintes razões. - O Tribunal considera que nenhuma outra das medidas constante do CPP serão suficientes para acautelar os perigos aqui em causa, mesmo a medida de coação doutamente promovida pelo Digno Procurador da República, neste momento, pelas seguintes razões: - Resultou claro dos autos que o arguido tem uma personalidade com propensão para mentir sobre os factos, desvalorizando tudo o que fez e inclusive imputa a responsabilidade a terceiros. - Neste momento, face à atuação do arguido, o Tribunal nem sequer tem a certeza de que a morada que indicou hoje para efeitos de TIR seja a habitação que utilize, tanto mais que referiu que só habita a mesma há cerca de duas semanas, pertencendo à sua ex-sogra, não obstante ao OPC ter indicado outra morada, a alegada morada anterior de sua mãe. - Por outro lado, se há cerca de duas semanas teve necessidade de alterar residência, não se compreende porque alegou, ainda hoje, que esta semana iria trabalhar para o estrangeiro, em particular para a Suíça, o que significa que esta versão também não se apresenta coerente ou verdadeira. - Por último, mas não menos importante, o Tribunal constata que o arguido em agosto do corrente ano, juntamente com outros amigos, tudo fez p fugir ao OPC, e não obstante isso voltou a praticar mais ilícitos criminais. - Perante tudo isto, a colocar-se o arguido com a medida de coação de Obrigação de Permanência na Habitação com pulseira eletrónica, haveria uma elevada probabilidade do arguido sair da respetiva habitação, confrontar os ofendidos com os factos, praticar novos ilícitos criminais e fugir. - Aliás, o arguido está ciente que é muito provável que venha a cumprir pena de prisão efetiva. - Por tudo isto, por ora, o Tribunal considera que a medida de coação que se apresenta mais adequada e proporcional é a medida de prisão preventiva, pois nenhuma outra acautela, de forma adequado e segura, os perigos em causa - tudo nos termos dos art.º 191.º a 196.º, 202.º, n.º1, al. a) e d), e 204.º, al. a), b) e c) todos do CPP. * Apreciação do mérito:(In)suficiente concretização temporal Entende o Recorrente haver insuficiente concretização temporal (cfr. 6. conclusão das alegações de recurso) referente à hora (entre às 06h30 e às 17h30) da indiciada prática do crime de furto qualificado ocorrido no dia 03/09/2022 no veículo de matrícula ..-..-SD, referido no art.° 24.° dos factos considerados. Trata-se de um dos crimes que foi considerado indiciariamente praticado pelo Recorrente, ou seja, o de furto qualificado, ocorrido no dia 03/09/2022, no veículo de matricula ..-..-SD, pertencente ao ofendido HH, que se encontrava estacionado junto à sua residência, no período compreendido entre às 06h30 e às 17h30. Esclarece o Ministério Público na sua resposta que, a partir do depoimento do ofendido, apenas foi possível apurar nesta fase investigatória que, tratando-se de um veículo estacionado na via pública, o furto ocorreu entre o momento em que, pelas 06h30, o seu filho estacionou a referida viatura num parque existente na via pública, junto da sua residência, e o momento em que, pelas 17h30, o seu filho se dirigiu ao veículo, constatou que quer o canhão da fechadura da porta, quer o canhão da ignição, se encontravam danificados, bem como que da mala haviam sido subtraídos todos os bens descritos. As imputações conclusivas, genéricas, abrangentes e difusas, quando não sejam passíveis de um efetivo contraditório e, portanto, do direito de defesa constitucionalmente consagrado devem ter-se como não escritas, não podendo servir de suporte à qualificação da conduta do agente. Com efeito, o arguido tem o direito a conhecer os factos imputados, os concretos factos em que assenta a imputação do crime, para os rebater e, desse modo, se poder defender, exercendo o seu direito ao contraditório, constitucionalmente garantido (art.32º, nº5, da C.R.P.). Assim, não são factos suscetíveis de sustentar uma condenação penal as imputações genéricas, em que não se indica o lugar, nem o tempo, nem a motivação, nem o grau de participação, nem as circunstâncias relevantes, mas um conjunto fáctico não concretizado. Uma imputação de factos tem de ser precisa e não genérica, concreta e não conclusiva, recortando com nitidez os factos que são relevantes para caracterizarem o comportamento ilícito, incluindo as circunstâncias de tempo e de lugar. Contudo, relativamente ao momento e lugar da prática do crime não tem necessariamente de se reportar a uma concreta data e sitio. O direito ao contraditório, à defesa e ao processo equitativo fica assegurado quando, na impossibilidade de indicação da data e/ou hora da conduta ofensiva, se fixarem apenas balizas temporais da sua verificação – cfr. Ac RC 25/02/2015 (Maria José Nogueira), e Ac RE 3/06/14, em www.dgsi.pt. A descrição fáctica imputada ao Recorrente contém uma concretização bastante que lhe permite localizar a respetiva imputação no tempo e no espaço com suficiente precisão. A factualidade descrita tem a densidade suficiente para permitir uma defesa eficaz por parte do arguido, ao nível do exercício do seu direito ao contraditório, tanto mais que essa garantia é assegurada a partir de outras circunstâncias marcantes e individualizadoras que permitem, por si e/ou conjugadamente com outras, no contexto da narração dos factos, localizar e/ou identificar os concretos factos, a singularidade e/ou narrativa detalhada do seu modo de execução, o contexto dos atos nomeadamente pelos termos espácio-temporais, dada a referência temporal mínima neles contida. Os factos apontados pelo recorrente não consubstanciam imputações vagas, genéricas e conclusivas, sem concretização temporal e, nessa medida, não o impediram nem impedem o efetivo exercício do direito ao contraditório por parte do arguido. Na verdade, constando do despacho/promoção, da qual lhe foi dado conhecimento aquando da realização da diligência de 1.º interrogatório judicial de arguido detido, o dia, o local, as características identificativas do veículo, o período temporal em que os factos considerados indiciados ocorreram, e a relação dos objetos furtados do seu interior, não ocorre insuficiente concretização da factualidade cuja prática foi indiciariamente imputada ao Recorrente, podendo este exercer plenamente e sem qualquer limitação o seu direito de defesa. -- (In)suficiente indiciação quanto a dois crimes de furto qualificado com base na detenção de objetos furtadosNo entender do Recorrente existe insuficiente indiciação quanto a dois crimes de furto qualificado, com base "... meramente do facto de o mesmo se encontrar na posse de alguns objetos que haviam sido furtados noutros locais." - cfr. 7ª conclusão das alegações de recurso. Contudo, refere-se o recorrente apenas à posse dos cartões bancários alegadamente retirados do interior do veiculo de matrícula ..-..-XF - cfr. 7ª conclusão das alegações de recurso. Contudo, como se observa na decisão recorrida foram três os assaltos indiciados com base, além no mais, na detenção pelo Recorrente de objetos furtados, a saber: - em relação ao veículo ..-..-XF foram recuperados objetos na posse do arguido que havia sido furtados da viatura; - a viatura ..-GG-.., furtada a EE, é identificado pelas testemunhas FF e KK, como estando na posse do arguido, quando alegam que foram agredidos por este, sendo depois recuperado próximo do local pela GNR; - da viatura ..-..-SD foi recuperada na posse do arguido, quando este se deslocava para o Hospital, a máquina fotográfica ali subtraída. Ora, como bem refere o Ministério Público, além da detenção destes objetos furtados por parte do recorrente, outros indícios igualmente fortes corroboram a indiciada prática daqueles dois crimes de furto. Concretamente, “todos os diversos ilícitos criminais cuja prática foi indiciariamente imputada ao Recorrente, incluindo os dois referidos crimes de furto qualificado, ocorreram no mesmo dia, ou seja, 03/09/2022, entre às 06h30 e às 18h00. Acresce que o "modus operandi" do Recorrente foi o mesmo relativamente aos furtos qualificados, ou seja, acedia ao interior dos veículos, se necessário arrombando-os, lançava mão de todos os objetos de valor que existissem no seu interior e levava-os com ele, fazendo dos mesmos coisa sua, até que, na última situação relatada (a ocorrida pelas 18h00 desse mesmo dia) não conseguiu concretizar os seus intentos em virtude de ter sido impedido pelo proprietário da viatura e por outros populares que se encontravam no local”. Neste sentido, escreveu-se na análise crítica da decisão recorrida que: “Na situação concreta, em relação aos presentes factos, é preciso ter em conta que estes integram o mesmo modus operandi descrito pela arguida JJ, a fls. 83, de que o arguido fez uso para a prática de outros factos, no âmbito do qual resultou o furto da viatura Lexus, ..-..-LS. (…) Relativamente aos factos que ocorreram com o ofendido II, este é claro em referir que o arguido se encontrava a furtar a sua viatura e tudo fez para fugir com esta. Por outro lado, mas não menos importante, o ofendido GG identificou o arguido com sendo uma pessoa que utilizava veículos furtados, o que também foi apreendido ao arguido, sendo este a pessoa em causa. Em face destes elementos, e tendo em conta o curto espaço de tempo em que eles ocorreram, associado ao modus operandi referenciado pela arguida JJ, não existem dúvidas que existem fortes indícios da prática dos factos pelo arguido, pois não tem qualquer lógica factual de que alguém, que não o arguido, praticou os furtos, e que depois entregou os bens ao arguido; tal como não se apreende lógico que o arguido utilizou o ciclomotor ..-GG-.., a pedido de um amigo, sem saber que era furtado, e que depois desses factos o aqui arguido, sem nada fazer, foi agredido por FF e EE, utilizando a viatura em causa. Também não tem qualquer lógica de que um amigo lhe disse que a viatura Renault ... era sua, não sabendo assim que esta não lhe pertencia, e que ao ir busca-la, este foi agredido pelo próprio ofendido. O que resulta claramente dos autos é que arguido se deslocou para a viatura no momento em que esta estava com a chave na ignição, e o proprietário no café. Logo, se a viatura fosse de um amigo, o normal era que este lhe entregasse as chaves, e não que esta estivesse na ignição. Por seu lado, caso se tratasse de um lapso, nada justifica que tivesse tentado fugir com a mesma, a partir que o ofendido diz que é dele. Claro está que o alegado pelo arguido não corresponde à verdade, porquanto o mesmo deslocou-se àquele local com clara intenção de furtar a viatura, o que só não conseguiu após a resistência oferecida pelo ofendido e outros populares, não obstante a violência perpetrada. Perante isto (…) não existem dúvidas de que o arguido é um dos autores dos factos aqui em investigação, pelo que se dá a respetiva factualidade por indiciada”. Diferente a versão do Recorrente, segundo a qual os objetos furtados lhe foram entregues por terceira pessoa, versão essa que nenhum outro facto ou meio de prova corroborou de modo a criar a dúvida fundada e objetiva sobre a autoria daqueles dois assaltos. De qualquer modo, sendo a prática de furtos congruente com os antecedentes criminais do arguido, não tendo explicado de forma convincente a detenção daqueles objetos apreendidos em momento próximo dos furtos, temos reunidos elementos que tornam fortemente verosímil a prática pelo Recorrente dos assaltos em referência, sem que desta convicção resulte sacrifício para o princípio do in dúbio pro reo [1], tanto mais que durante o interrogatório não surgiu qualquer outra hipótese plausível que pudesse levar a conclusão diversa. As circunstâncias concretas em que a posse das coisas se verificou são de molde a corroborar, na base de uma análise racional e crítica, a inferência ou conclusão segura quanto à imputação da autoria também daqueles furtos. -- Das exigências cautelares e a subsidiariedade da prisão preventiva. Insurge-se o recorrente contra a verificação das exigências cautelares e não substituição da prisão preventiva por medida de coação menos gravosa e especificamente pela obrigação de permanência na habitação. Entende o recorrente não estarem consubstanciados: - perigo de continuação da atividade e alarme social; - perigo de perturbação da tranquilidade e paz públicas, - perigo de perturbação do inquérito; - perigo de fuga. Termina defendendo que, de acordo com os princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade, deveria ter sido aplicada ao arguido uma medida de coação menos gravosa designadamente a de Obrigação de Permanência na Habitação com fiscalização por meios eletrónicos à distância. Vejamos. O despacho recorrido fundou a aplicação das medidas de coação: - no perigo de continuação da atividade criminosa; - no perigo de perturbação da ordem e tranquilidade públicas; e - no perigo de perturbação do decurso do inquérito: - perigo de fuga. - Do perigo de continuação da atividade criminosaQuanto ao perigo de continuação da atividade criminosa, que muito se relaciona com a natureza dos factos e a personalidade do arguido no contexto global dos factos em apreciação, a conduta anterior e posterior aos mesmos, não se pode desconsiderar desde logo a verdade do respetivo certificado de registo criminal. É certo que o juízo de prognose sobre o perigo de continuação da atividade criminosa há-de resultar das circunstâncias anteriores ou contemporâneas à conduta que se encontra indiciada e sempre relacionada com esta ou com a personalidade do arguido, devendo a medida de coacção, para respeitar o princípio da presunção de inocência, fundar-se num juízo rigoroso e preciso de plausibilidade de reiteração criminosa O arguido poderia não ter antecedentes criminais. Mas, não só os tem, como aqueles que tem o são pela prática de vários outros crimes contra para património com carácter violento. De acordo com o CRC de 10 de agosto 2022: - no processo 143/11.5GBPNF, por factos de 2011/02/11, sentença de 2013/09/24, transitada em 2013/10/24, foi condenado pela prática de um crime de roubo, ART.º 210º, Nº 1 DO C. PENAL, na pena de prisão substituída por multa que pagou; - no processo 224/18.4GFPNF, por factos de 2018/10/28, sentença de 2019/10/10, transitada em 2019/10/10, foi condenado pela prática de 1 crimes(s) de condução de veículo em estado de embriaguez, p.p. pelo art.º 292º, nº 1, e 69º, n.º 1, al a) do c. penal, em pena de multa e pena acessória de proibição de conduzir; Por acórdão datado de 15.06.2022, transitado em julgado, proferido no processo comum coletivo n.º 1248/21.0JAPRT, do Juízo Central Criminal de Penafiel – Juiz 3, o arguido AA foi condenado: - pela prática em coautoria e na forma consumada de um crime de roubo p. e p. pelo art. 210º, nº1 do C. Penal na pena de de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão (NUIPC212/20.0GFPNF); - pela prática em autoria material e na forma consumada de um crime de furto simples p. e p pelo art. 203º, nº1 do C. Penal na pena de 8 (oito) meses de prisão (NUIPC109/20.4GBPNF); - pela prática em coautoria de um crime de roubo p. e p. pelo art. 210º, nº1 do C. Penal na pessoa de BB na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses e prisão (NUIPC 1248/21.0JAPRT); - pela prática em coautoria de um crime de roubo p. e p. pelo art. 210º, nº1 do C. Penal na pessoa de CC na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão (NUIPC 1248/21.0JAPRT); - pela prática em coautoria e na forma consumada de um crime de furto p. e p. pelos arts. 203º, nº1 e 204º, nº2, al. e), ambos do C. Penal na pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão (NUIPC75/20.6GFPNF) - em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas condenar o arguido AA na pena única de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com sujeição a regime de prova, cuja concreta elaboração do plano individual de readaptação social, será levado a efeito pelos serviços de reinserção social competentes, que se encarregará da sua fiscalização. Ora, os vários crimes em apreço ocorreram no dia 03.09.2022, a revelar a forte propensão do recorrente para a prática de crimes contra o património especialmente o crime de roubo, indiferente às diversas condenações de que tem sido alvo. A pluralidade de crimes objeto daquelas condenações e aqui imputados sugere uma personalidade tendencialmente criminosa, com carácter violento. Outro fator de risco decorre da circunstância do arguido ter interpretado as sucessivas reações penais (não privativas da liberdade) como um êxito do seu empreendimento criminoso e, assim, contribuído decisivamente para um relaxamento instalado na sua consciência sobre a ilicitude da ação. Tal risco é maior quando, como aqui ocorre, o arguido não tem ocupação profissional estável e é toxicodependente, o que potencia a reiteração de comportamentos idênticos com vista à manutenção de iguais vantagens. Por conseguinte, verifica-se o fundamentado perigo de continuação da atividade criminosa, especialmente quando o arguido nenhum sentido critico revela em relação ao seu comportamento anterior e, portanto, uma personalidade avessa ao cumprimento das normas tributárias e da sã convivência social (art.204º, al.c)). - Perigo de perturbação da ordem e tranquilidade públicas A medida de coação deve responder adequada e proporcionalmente ao receio de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas decorrente dos termos em que são perpetrados certos crimes, pela revolta e insegurança que geram nas pessoas, sobretudo quando não se lhes segue uma imediata reação reasseguradora, por parte do aparelho repressivo, em que repousa a crença da ordem e segurança comunitárias [2]. Este perigo está claramente evidenciado na reiteração e gravidade dos factos praticados pelo recorrente, sendo expressiva e reiterada a violência que vem empregando na prática dos assaltos, contribuindo para gerar um forte sentimento de insegurança e indignação da comunidade perante este tipo de assaltantes violentos em liberdade. Naturalmente que a elevada frequência deste tipo de criminalidade, sobretudo quando, como aqui ocorre, os factos indiciados espelham elevada gravidade e permanência, surge como fator de forte perturbação da ordem e tranquilidade públicas (art.204º, al.c)). - Do perigo de perturbação da provaFinalmente, em relação à perturbação da aquisição, conservação ou veracidade da prova no decurso do inquérito ou da instrução, o despacho recorrido evidencia o risco de manipulação dos depoimentos. Ora, o “perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo consiste, claramente e apenas, no risco, sério e atual, de ocultação ou alteração da prova por parte do arguido, visando a medida de coação a aplicar, perante a forte suspeita de que o arguido possa destruir, ocultar, falsificar meios de prova, ou influir de maneira desleal nas testemunhas ou peritos, acautelar o potencial probatório das fontes que já se encontram nos autos ou que possam vir a ser obtidas, devendo ser concretizada a indicação das circunstâncias, objetivas e subjetivas, que tornam altamente provável uma intervenção inquinadora das fontes de prova por parte daquele” – cfr. RG 11-06-2019 (Ausenda Gonçalves) www.dgsi.pt. No caso concreto, o despacho recorrido não especifica os depoimentos suscetíveis de manipulação pelo arguido e as circunstâncias em que tanto pode ocorrer, de nada valendo a sua possibilidade em abstrato, sendo que a prova testemunhal não se mostra sequer especialmente valiosa em relação a todos os crimes aqui imputados ao arguido, -- Do perigo de fugaO perigo de fuga, não podendo ser presumido, virtual ou longínquo, deve, antes, ser real e concreto e está necessariamente dependente de o processo conter factos concretos reveladores de o agente possuir meios económicos superiores ao cidadão comum ou da possibilidade de se instalar num qualquer outro ponto do país ou no estrangeiro e de aí prosseguir a sua vida, quer na vertente, pessoal, quer profissional, i. é, circunstâncias que, conjugadas, permitam concluir pela elevada probabilidade de o arguido, não estando privado da sua liberdade de movimentos, se ausentar, assim se furtando à ação da justiça. Ora, como bem refere a decisão recorrida, o perigo de fuga resulta na situação concreta do facto do arguido recear fundadamente pela revogação da suspensão da execução da pena de prisão antes aplicada, o facto de não ter trabalho ou local fixo onde residir, pois ainda no presente dia apresentou uma morada diferente da constante do TIR, alegando que ali residia apenas a duas semanas. De referir que o próprio arguido afirmou em interrogatório que esta semana iria trabalhar para o estrangeiro, em particular para a Suíça. Verifica-se, assim, o perigo de fuga. - Da necessidade, adequação e proporcionalidadeConsabidamente a aplicação das medidas de coação está sujeita, por um lado, aos princípios genéricos da legalidade ou da tipicidade (nº 1 do art.191 do Código Processo Penal) e, por outro, aos princípios a analisar em cada caso concreto, como seja, avaliar, in casu, da necessidade, da adequação, da proporcionalidade e da subsidiariedade (uma medida de coação mais gravosa, só em última instância deverá ser aplicada, quando as demais, menos gravosas, não forem julgadas adequadas ou suficientes, para o caso concreto) consagrados no art.193, nº 1 do Código Processo Penal. Quando se torne necessária a aplicação de uma medida de coação, o juiz deve, de entre as legalmente previstas aplicar a que julgue salvaguardar (sem excesso) as exigências cautelares ao caso concreto, tendo em conta o meio/fim a que se destina. De tal princípio resulta, em obediência aos vetores fundamentais do sistema nesta matéria, que sempre que a cumulação de duas ou mais medidas de coação se mostre suficiente e adequada ao cumprimento das finalidades previstas no artigo 204.º do CPP, são essas que devem ser aplicadas, em detrimento da aplicação de uma só medida, mas mais gravosa [3]. As medidas de coação a aplicar em concreto devem, assim, ser necessárias e adequadas às exigências cautelares que o caso requerer e proporcionais à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas – art. 193º/1 do Código de Processo Penal. Ora, perante as exigências cautelares que o caso impõe, afigura-se que a prisão preventiva é absolutamente necessária e adequada à consecução das apontadas finalidades cautelares que o caso reclama. Qualquer outra medida de coação menos gravosa, inclusivamente a OPHVE, não seria suficiente para com um mínimo de eficácia prevenir o receio eminente e atual de repetição criminosa, perigo de fuga e perturbação da tranquilidade pública decorrentes do comportamento futuro do arguido, caso não fosse sujeito a prisão preventiva. Não vemos que outras medidas possam ser eficazes para fazer face às indicadas exigências cautelares. A prisão preventiva é proporcional à pena que previsivelmente será aplicada ao arguido, considerando as molduras penais dos crimes em que incorre e a extrema gravidade dos factos imputados, considerada a sua situação pessoal e os seus antecedentes criminais por crimes da mesma natureza (art.193º, nº1 e 2, do Código Processo Penal). De resto, o arguido nem sequer sugere como e onde se propõe cumprir a OPHVE, solução aventada sem garantir as condições necessárias para tanto. Concluindo, encontram-se preenchidos os pressupostos impostos por lei para que ao recorrente seja aplicada a medida de coação de prisão preventiva, a qual se mostra como adequada e proporcional à gravidade dos factos, sendo a única capaz de satisfazer as exigências cautelares resultantes do caso em análise, não tendo o despacho recorrido violado, quaisquer normativos legais, mormente os aventados pelo recorrente. Pelo exposto, não merece censura o despacho recorrido quanto à medida de coação aplicada, sendo improcedente o presente recurso interposto pelo arguido. -- 3. DECISÃOPelo exposto, acordam os juízes da Segunda Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar a decisão recorrida. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) UCs. Notifique. (Elaborado e revisto pelo relator – art. 94º, nº 2, do CPP – e assinado digitalmente). - Porto, 30.11.2022João Pedro Pereira Cardoso Raúl Cordeiro Carla Oliveira ___________ [1] Não é uma qualquer dúvida em matéria de facto que obriga à aplicação deste princípio, mas apenas a dúvida “razoável”, após a produção de todas as provas e sua avaliação de acordo com a lei e as regras da experiência comum. Se após a ponderação da prova – toda a prova – o julgador se convenceu, com base numa análise objetiva e racional, de acordo com os critérios legais e doutrinais de valoração da prova sem que no seu espírito se tenha instalado a dúvida consistente ou razoável, não se verifica a violação de tal princípio. [2] Ac TRP 8/2/2012 (Ricardo Costa e Silva) www.dgsi.pt. [3] A prisão preventiva e a obrigação de permanência na habitação só podem ser aplicadas quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coação, e mesmo que no caso caiba medida de coação privativa da liberdade, deve ser dada preferência à obrigação de permanência na habitação sempre que ela se revele suficiente para satisfazer as exigências cautelares – art. 193º/2 e 3 do Código de Processo Penal. |