Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | ISABEL PEIXOTO PEREIRA | ||
Descritores: | CONDOMÍNIO CRÉDITOS ATA DA ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS TÍTULO EXECUTIVO | ||
Nº do Documento: | RP2024062016774/20.0T8PRT-E.P1 | ||
Data do Acordão: | 06/20/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Indicações Eventuais: | 3. ª SECÇÃO | ||
Área Temática: | . | ||
Sumário: | I - Também a acta da assembleia de condóminos em que se delibere que, em determinado momento, este ou aquele condómino tem em dívida determinados montantes resultantes de contribuições ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, pode servir como título executivo. Donde, não apenas a acta que delibere a constituição das obrigações de pagamento, mas também a que declare/liquide as dívidas incumpridas se pode constituir como título executivo. II - Ponto é que resulte da aprovação/deliberação do valor em dívida, ter existido a deliberação constitutiva, mediante a menção à aprovação anterior do orçamento e despesas a que respeita a liquidação. III - É a solução conforme ao teor literal do preceito considerando e à intenção subjacente de facilitar a cobrança dos créditos do condomínio, sem fazer perigar a posição do condómino. Assim, reconduzindo-se este à inexistência mesma da deliberação constituinte, caberá o ónus da prova da respectiva existência ao exequente, mediante a junção da acta respectiva. Não estando, pois, em causa uma formalidade substancial, mas um mero meio de prova da constituição da obrigação. IV - Apenas quando inexista a deliberação causal ou na falta de prova desta, quando necessária, por provocada pelo executado, é que não será possível ter por caracterizado o título executivo… V - A força executiva da acta da assembleia de condóminos não exige a liquidação do montante concreto, certo, da dívida de cada condómino, bastando que os dados da acta e dos demais documentos que a completam permitam determinar esse valor. Pode, pois, a dívida estar determinada/liquidada em documentos complementares. VI - É bem assim de admitir a ampliação do pedido em sede executiva, quanto a juros de mora, os quais têm de haver-se por constantes do título exequendo, a acta, ainda quando aprovada a dívida exequenda antes da entrada em vigor da Lei n.º 8/2022, de 10/01. (da exclusiva responsabilidade da relatora - art. 663º, nº 7, do C.P.C.) | ||
Reclamações: | |||
Decisão Texto Integral: | Processo: 16774/20.0T8PRT-E.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo de Execução do Porto - Juiz 1
Relatora: Isabel Peixoto Pereira 1º Adjunto: António Paulo Vasconcelos 2º Adjunto: Isabel Ferreira
*
Acordam os juízes da 3.ª secção do Tribunal da Relação do Porto:
I. Na execução para pagamento de quantia certa veio a exequente requerer a ampliação do pedido e a executada suscitar, em resposta, a questão do “indeferimento liminar da execução” (o que fez mediante dedução de embargos, liminarmente indeferidos, determinada oficiosamente a inserção do articulado que suscitou as questões invocadamente geradoras da extinção imediata da execução no principal, para aí ser objecto de apreciação). Cumprido e exercido o contraditório, nos termos que dos autos resultam, foi proferido despacho a admitir a ampliação do pedido executivo e a julgar improcedente a arguição dos vícios dos títulos executivos. De ambas as decisões/despachos foi interposto recurso pela executada, concluindo pelo modo seguinte: 1.- Afigura-se à Recorrente que a decisão recorrida está em desconformidade com uma boa decisão de Direito, como adiante se demonstrará. Vejamos, I.- DA FALTA DE TÍTULO EXECUTIVO: 2.- No exercício do contraditório referente ao requerimento de ampliação do pedido, a ora Recorrente, tendo por referência o preceituado ao art. 734.º, n.º1 do CPC, alegou a falta de título executivo. 3.- Porém, ao abrigo do art. 6.º, n.º1 do DL n.º 268/94 de 25/10, o Tribunal a quo sufragou que as atas de condomínio oferecidas nos presentes autos reúnem todos os seus requisitos e, por isso, julgou as mesmas como sendo título executivo válido e eficaz, decisão essa com a qual a Recorrente não se conforma. A.- DA ATA N.º 4 DE 26/08/2017: 4.- Dispõe o art.º 6.º do DL nº 268/94 que a ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte. 5.- Tem sido entendimento jurisprudencial maioritário que somente a ata da assembleia de condóminos deliberativa da obrigação – e seu montante, prazo e modo de pagamento – referente a contribuições para o condomínio ou despesas necessárias, a que alude o art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25-10 (versão originária), e não atas meramente certificativas de dívidas resultantes de deliberação anteriormente tomada, constitui título executivo contra o proprietário/condómino inadimplente. No caso sub judice, 6.- No que concerne às quotizações extraordinárias e às quotizações ordinárias referentes aos meses de maio a agosto de 2018, apenas será título ata referente à deliberação que alicerça tais quotas de condomínio, ou seja, a ata n.º 4 de 26/08/2017, e não a ata n.º 5 de 29/12/2018 e a ata de 05/09/2020 que apenas referem montantes alegadamente em dívida. 7.- Ora, conforme já exposto supra, quanto às quotizações extraordinárias referentes às obras a realizar nas fachadas do edifício, tal ata não refere o montante, o prazo de vencimento e o modo de pagamento. Apenas refere que 50% do valor da obra tem que ser liquidado à data de início da obra e que os restantes 50% no fim da obra. 8.- Com efeito, não consta da ata, nem de nenhum dos seus anexos a data de início e do fim da obra, apenas meras previsões. 9.- Assim, cremos que quanto a tais quotizações extraordinárias, há falta de título, uma vez que as atas dadas à execução não cumprem com os requisitos impostos pelo DL n.º 268/94, de 25/10. 10.- Quanto às quotizações ordinárias referentes aos meses de maio a agosto de 2018, de tal deliberação também não é possível concluir o prazo de vencimento das aludidas quotizações, bem como a forma de distribuição de tal orçamento pelas frações. 11.- Desta feita, cremos que a ata n.º 4 dada à execução não poderá constituir título executivo, por incumprimento dos requisitos legais estatuídos ao art. 6.º do DL n.º 269/94, de 25/10. 12.- Quanto às quotizações peticionadas de setembro de 2018 a agosto de 2019, da ata n.º 5 de 29/12/2018 não é possível concluir o prazo de vencimento das aludidas quotizações, a forma de distribuição e o correspondente montante, pelo que também tal deliberação não poderá valer como título executivo. 13.- Quanto às quotizações peticionadas de setembro de 2019 a setembro de 2020, não existe qualquer deliberação que sustente tais valores, pois que a ata de 05/09/2020 não procede à aprovação de contas referente a tal exercício, como também não existe qualquer ata que delibere um orçamento para esse período. Por fim, e não menos importante, 14.- Importa ainda referir que ata de 05/09/2020 dada à execução não poderá valer como título executivo válido e eficaz, visto que a aqui Recorrente impugnou as deliberações ínsitas em tal ata, na ação de processo comum que corre seus termos sob o processo n.º 1362/20.9T8PVZ no Juízo Local Cível da Póvoa de Varzim – Juiz 2. 15.- Analisando o teor das atas de condomínio oferecidas à execução, conclui-se pela sua insuficiência enquanto título executivo, já que não observa os requisitos legais. 16.- Ao não ter assim decidido, o Tribunal a quo violou na sua interpretação e aplicação a norma constante ao art. 6.º, n.º1 do DL n.º 268/94 de 25/10 e, bem assim, o art. 703.º, n.º1, alínea d) do CPC. Por outro lado, e sem prescindir, II.- DA AMPLIAÇÃO DO PEDIDO: 17.- O Exequente ofereceu requerimento para ampliação de pedido, requerendo que a aqui Executada fosse também condenada a liquidar juros moratórios vencidos desde 08/10/2020, cuja matéria por si alegada se acha em contradição do argumentado em sede de requerimento executivo. 18.- Em primeira linha, de salientar que as primeiras três quotizações peticionadas pelo Exequente totalizam a quantia de €24.382,72, sendo que aquela quota única, alegadamente com vencimento em 08/10/2020 é uma tentativa de cobrar duas vezes a mesma quantia com base na em duas atas de Assembleias de Condóminos, ocorridas em datas distintas, mas que se alicerçam nos mesmos fundamentos. 19.- Em segunda linha, de notar também que o Exequente faz referência às datas de vencimento alegadamente ocorridas em 30/09/2018 e 10/10/2018, para após procurar cobrar as mesmas quantias através de uma outra deliberação, desta feita, ocorrida em 05/09/2020, embora ambas referentes às quotas ordinárias e extraordinárias deliberadas em 26/08/2017. 20.- Com efeito, e atendendo que temos duas deliberações que, aparentemente, sustentam as mesmas quotizações, uma ocorrida em 26/08/2017 que determina as datas de vencimento em 30/09/2018 e 10/10/2018, e outra ocorrida em 05/09/2020 que determina as datas de vencimento em 08/10/2020. 21.- Ora, uma vez que o Exequente oferece duas atas distintas para procurar cobrar tais quotizações, sempre lhe incumbia alegar e demonstrar porquê que a data de vencimento e, por conseguinte, para efeitos de contagem de juros moratórios e, bem assim, para efeitos de prescrição, é a referente à deliberação ocorrida em 05/09/2020 e não à referente à ata de 26/08/2017. 22.- Isto porque no seu requerimento executivo, o Exequente refere aquelas deliberações e junta as respetivas atas de Assembleia de Condóminos, sem, contudo, no seu requerimento para ampliação do pedido justificar porque entende que o devedor se considera em mora apenas em virtude da deliberação de 05/09/2020, em absoluto detrimento da deliberação ocorrida em 26/08/2017. 23.- Aliás, a ineptidão de tal requerimento e consequente pedido é clarividente no presente caso, porquanto sem que o Exequente proceda ao seu esclarecimento do que entende ser efetivamente o seu título executivo de que aqui lança mão, não é possível apurar pela eventual prescrição de quotizações e consequentes juros, ou, por outro lado, pretendendo fazer se valer de uma ata de 05/09/2020, que executa logo em 10/10/2020, podendo a mesma não ser valida e eficaz, já que àquela data ainda se encontrava em curso o prazo para a respetiva impugnação das deliberações ali ínsitas. 24.- Pelo que, ao não ter o Tribunal a quo ponderado sobre as questões mencionadas supra, nem tendo decidido no sentido da ineptidão do requerimento de ampliação do pedido, violou os preceitos legais constantes dos arts. 5.º, 186.º, do CPC. Reclama a revogação de ambas as decisões, sendo substituída por outra que declare procedente a exceção de falta de executivo e, por consequência, seja a Recorrente absolvida da instância.
Veio a exequente contra-alegar, sustentando, desde logo, que o recurso deve ser rejeitado nos termos do artigo 641.º, nº 2, al. b), do CPC., já que a reprodução do texto das alegações nas conclusões de recurso equivale à falta das mesmas não sendo de admitir despacho de aperfeiçoamento. De fundo, sustenta que os títulos dados à execução são dotados dos requisitos de exequibilidade previstos no art. 6, do DL 268/94 de 25 de Outubro, uma vez que deles constam as deliberações aprovadas quanto ao orçamento dos anos a que respeitam, quer quanto às obras aprovadas, constando ainda dessas atas o prazo para pagamento respectivo, ou seja, o prazo para cumprimento da obrigação do pagamento dessas despesas que impendem sobre a Executada, sendo que a fonte da obrigação de pagamento de juros moratórios deriva da existência do título em que se funda a execução, o qual, por força da lei – artigo 703.º, n.º 2, do CPC – incorpora juros de mora à taxa legal da obrigação que nele assenta. Sempre o disposto neste artigo ampliou o âmbito do título executivo, de modo a considerar nele compreendidos - qualquer que seja a sua natureza - os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante, sendo, deste modo, possível ao Exequente requerer a execução de tais juros moratórios - mas já não dos juros convencionais – mesmo quando o título executivo (judicial ou extrajudicial) seja omisso quanto à respectiva obrigação acessória, decorrente directa e automaticamente da lei. Conclui pela improcedência do recurso. Colhidos os vistos, cumpre apreciar.
II. OBJECTO DO RECURSO Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pela recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar: - da falta de requisitos de exequibilidade dos títulos exequendos (e sua consequência), em função da inexistência de datas de vencimento da obrigação de pagar, como da menção ou referência à proporção da responsabilidade da executada; sempre de estar em causa ao menos uma acta meramente confirmativa de obrigação anteriormente deliberada, sendo esse o título a apresentar quanto à mesma obrigação; - Se existe fundamento para a ampliação do pedido aos juros de mora das obrigações exequendas. Previamente, da admissibilidade mesma do recurso, vista a inexistência de conclusões deste, por estas se reconduzirem à mera reprodução das alegações mesmas. É que, adiante-se, absolutamente fora do âmbito da apreciação por este tribunal a suscitada questão da impugnação pela executada de deliberações exequendas, na medida em que desenhando-se como questão nova, não apreciada na decisão recorrida, por não ter sido oportunamente suscitada, não se prefigurando outrossim como de conhecimento oficioso. Essa questão não foi oportunamente suscitada pela executada para suscitar a (in)exequibilidade das actas[1] a que se reporta a acção de impugnação das deliberações de que agora, apenas em sede de recurso, vem dar nota, donde não foi objecto de decisão ou consideração na decisão recorrida. Ora, por definição, a figura do recurso exige uma prévia decisão desfavorável, incidente sobre uma pretensão colocada pelo recorrente perante o Tribunal recorrido. Só se recorre de uma decisão que analisou uma questão colocada pela parte e a decidiu em sentido contrário ao pretendido. Não sendo uma situação de conhecimento oficioso, não pode o Tribunal superior apreciar uma questão nova, por pura ausência de objecto: em bom rigor, não existe decisão de que recorrer, sendo nessa parte caso de extinção do recurso por inexistência de objecto. Impedida, consequentemente, por impossibilidade legal, a apreciação “do mérito” daquela concreta questão suscitada no recurso, nos termos das conclusões formuladas.
III.
O artigo 639º, nºs 1 e 2, alíneas a), b) e c) do CPCivil, determina o conteúdo impositivo do requerimento de recurso. Naquele normativo estabelecem-se os ónus que impendem sobre o Recorrente: o primeiro deles é o de alegação, aludido no nº 1; o segundo é o da observância dos requisitos especificados no seu nº 2 quanto à formulação das conclusões. A Recorrente, reconheça-se, acabou por reduzir aquelas duas imposições distintas à mesma preposição, apresentando sob a forma de conclusões, de uma forma quase integral, a motivação que as precedia. A falta de alegações e/ou conclusões pode caracterizar-se em duas dimensões: a formal, em que impera a ausência; e a material, onde embora exista a peça jurídica que as enforma, esta em nada se refira ao que lhe é prescrito, cfr Ac STJ de 20 de Novembro de 2003 (Relator Lopes Pinto), in www.dgsi.pt.. In casu, não obstante o acervo conclusivo apresentado corresponda quase na sua integralidade ao texto alegatório, não podemos dizer que não tenham sido apresentadas conclusões, porque estas estão lá, sendo que, não correspondendo plenamente a uma síntese conclusiva das pretensões formuladas, não se pode dizer sem mais, como o faz o Recorrido, que a repetição nas conclusões do que foi dito na motivação se traduz numa falta de apresentação do acervo conclusivo, cominado com uma rejeição do conhecimento do objecto do recurso interposto. As conclusões existem, delas se podendo retirar quais as pretensões da Recorrente e, por isso, não podemos reduzir a falha assim cometida à cominação expressa no normativo inserto no artigo 641º, nº 2, alínea b) do CPCivil, condenando o requerimento de impugnação apresentado ao indeferimento. Outrossim não é sequer caso de se dar oportunidade ao Recorrente de poder corrigir o vício[2], posto se logra perceber ou atingir o escopo da impugnação encetada, à qual, aliás, o Recorrido apresentou resposta nas suas contra alegações, após se insurgir primeiramente contra a inobservância dos requisitos legais atinentes à formulação de conclusões por banda da Apelante. Neste preciso conspectu permitimo-nos acrescentar ex abundanti que no âmbito da ponderação dos pressupostos processuais, os princípios antiformalistas, “pro actione” e “in dubio pro favoritate instanciae” impõem uma interpretação que se apresente como a mais favorável ao acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva, pelo que, suscitando-se quaisquer dúvidas interpretativas nesta área, deve optar-se por aquela que favoreça a acção e assim se apresente como a mais capaz de garantir a real tutela jurisdicional dos direitos invocados pela parte, o que, na especie equivale a dizer que, ao invés da rejeição do recurso, se impõe o seu conhecimento.
Na decisão recorrida escreveu-se que: O titulo dado à execução são actas da Assembleia dos Condóminos do Condomínio Exequente que convoladas ressalta à evidencia com meridiana clareza que são dotas dos requisitos de exequibilidade então e à data previstos no art. artigo 6º, do D.L. nº 268/94, de 25 de Outubro, que veio conferir a natureza de título executivo à acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam, ser suportadas pelo condomínio. Por seu turno, o artigo 1º, do mesmo diploma legal, que estabelece várias regras sobre as deliberações da assembleia de condóminos. Assim, o nº 1 desse normativo estatui que «são obrigatoriamente lavradas actas da assembleia de condóminos, redigidas e assinadas por quem nelas tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado». O nº 2, do mesmo preceito legal, estabelece que «as deliberações devidamente consignadas em acta são vinculativas tanto para os condóminos como para os terceiros titulares de direitos relativos às fracções». E as actas em causa formalmente obedecem aos supra citados requisitos. Para além do mais consta delas as deliberações aprovadas quer quanto ao orçamento dos anos a que respeitam, quer quanto às obras aprovadas, constando ainda dessas actas o prazo para pagamento respetivo, ou seja o prazo para cumprimento da obrigação do pagamento dessas despesas que impende sobre o condómino e assim sobre a qui executada, pelo que não se impõe, o indeferimento liminar da execução tal como o pretende agora o executado. Tendo em conta a argumentação da executada, atender-se-á ao teor de cada um dos títulos exequendos. Assim. A 26 de Agosto de 2017, foi aprovado em Assembleia Geral Ordinária e pela unanimidade dos condóminos presentes, no seu ponto 5, o orçamento para execução de obras na fachada do edifício, no valor global de 123.973,42€ a que acresce IVA à taxa em vigor, e a entidade responsável pela execução da obra, a "A... Lda". No ponto 5 da ordem de trabalhos da referida ata n.º4 consta que “(…) ainda neste ponto ficou deliberado pela unanimidade dos condóminos presentes e/ou representados que à data de início da obra, em setembro de 2018, a administração terá que ter em conta bancária 50% do valor referente obra. Os restantes 50%, e tendo em conta que o prazo de execução da obra será de sensivelmente 90 dias, terá que ser liquidado até ao final de obra, em novembro de 2018. (…)”. Ficou ainda aprovado que tal pagamento, seria efectuado em 2 prestações, cujo valor seria calculado de acordo com a permilagem de cada fracção. Mais ficou aprovado que no caso de não pagamento a 30.09 da primeira prestação, seriam considerados vencidos os restantes valores. Foi emitida à executada uma nota de débito a 10 de Outubro de 2018 com a totalidade do valor correspondente ao cálculo da responsabilidade correspondente à permilagem da sua fracção no valor global do orçamento aprovado para a obra extraordinária ali melhor identificada, 24.201,60€, conforme documento junto ao requerimento executivo. Mais foi aprovado nesta acta, o orçamento a vigorar no período entre Setembro 2017 e Agosto 2018, no valor global de 3.234,00. Ali foram considerados como aprovados e em dívida os valores das quotas de condomínio em falta referentes ao período de Setembro de 2018 a Setembro de 2020, por referência às quotas aprovadas a 29 de Dezembro de 2018, o que para a fracção "A" comportaria um valor em dívida de 1.132,00€, lançado numa quota única pelo doc. ...73 a 14.09.2020 e com vencimento a 08.10.2020, junto bem assim ao requerimento executivo. Mais foi aprovado o orçamento a vigorar entre Outubro de 2020 e Setembro de 2021, no valor global de 5.939,88€. A 15.09.2020 e com vencimento a 08.10.2020, foi emitida a quota referente a Outubro de 2020, correspondente à divisão do valor aprovado em função da permilagem da fracção da executada, no montante de 52,63 EUR.
Vejamos. O art.º 703.º, n.º 1, alínea d), do CP Civil elenca como títulos executivos, entre outros, “Os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.” O D.L. n.º 268/94, de 25/10 criou um destes títulos executivos especiais, procurando solução que tornasse mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros (tal como se lê no respectivo Preâmbulo). O respectivo art.º 6.º dispunha que a Acta da reunião da assembleia de condóminos que tenha deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportados pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixe de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte. Desta forma, o legislador passou a atribuir força executiva à Acta da assembleia de condóminos, permitindo ao condomínio instaurar acção executiva contra o proprietário da fracção, condómino devedor, relativamente à sua contribuição para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, na proporção do valor da sua fracção, sem que, previamente, tivesse que lançar mão ao processo de declaração a fim de obter o reconhecimento do crédito. Apesar de este normativo ter, entretanto, sido alterado pela Lei n.º 8/2022, de 10/01, continua a ser esta a redação aplicável ao caso em análise, já que era a vigente na data das Assembleias de Condóminos em que se produziram as Actas apresentadas como título executivo[3]. Pouco rigorosa de resto a destrinça das situações em sede de recurso, são duas, essencialmente, as questões suscitadas quanto aos títulos exequendos. Na verdade, sob a mesma menção, a verdade é que parte das questões suscitadas pela recorrente respeitam não à questão da essência da exequibilidade do título[4], mas aos requisitos necessários à liquidação da obrigação[5], caso a mesma conste do título… Como salienta Rui Pinto[6], a questão de fundo suscitada pelo artigo 6º – em que condições as atas de condomínio têm força executiva ? –, tem-se desdobrado em várias sub questões, dentro das quais destacamos, por serem as que o recurso apreciando convoca: i) deve a ata constituir as obrigações de pagamento ou deve declarar/liquidar as dívidas incumpridas? ii) pode a dívida estar determinada/liquidada em documentos complementares? No campo dos títulos executivos rege o princípio da legalidade, segundo o qual só podem servir de base a um processo de execução documento a que seja legalmente atribuída força executiva[7]. No caso em apreço, encontramo-nos perante um documento, a que, por disposição legal, é conferida força executiva. Quanto à questão de saber se a acta que constitui, à face da lei, título executivo, é a acta da reunião da assembleia de condóminos que documente a deliberação da qual nasce a obrigação de pagamento da contribuição por parte do condómino e estipule o prazo e o modo de pagamento e não já a que declare, tão só, o montante da dívida, desacompanhada dos elementos que contenham a fixação da quota-parte devida a título de contribuição de condomínio: A discussão que vem sendo suscitada na doutrina e na jurisprudência a este respeito divide-se, efetivamente, entre duas correntes, uma, mais restritiva, em que apenas se atribui força executiva à Acta da reunião em que é deliberada a aprovação de determinadas despesas (ordinárias ou extraordinárias) e fixada a comparticipação pelos condóminos, e uma outra, mais ampla, que atribuiu igualmente força executiva à posterior Acta de reunião na qual a Assembleia delibere proceder-se judicialmente contra determinado condómino para cobrança das dívidas por este acumuladas durante anos, discriminando os respetivos montantes[8]. Caberá interpretar a disposição legal que rege quanto ao título, para o que releva, para além do mais o relacionamento do título executivo em causa com o regime substantivo respeitante às contribuições para o condomínio. Os condóminos estão obrigados a contribuir para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum, em regra em montante proporcional ao valor das respetivas frações (art.º 1424.º, n.º 1 do C Civil). Para o efeito, cabe ao administrador elaborar o orçamento das receitas e despesas relativas a cada ano (alínea b) do art.º 1436.º do C Civil), o qual deverá ser sujeito a aprovação em Assembleia dos condóminos, convocada pelo administrador para a primeira quinzena de janeiro de cada ano (art.º 1431.º do C Civil). Aprovado o orçamento, incumbirá ao administrador cobrar as receitas e efetuar as despesas comuns (e outras para as quais tenha sido autorizado – art.º 1436.º, alíneas d) e h) do C Civil) e exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas (art.º 1436.º, alínea e) do C Civil. Da conjugação de tais normas poder-se-á afirmar que a deliberação a que se refere a al. b) do artigo 1436º CC – deliberação de aprovação do orçamento anual e definição da quota-parte de cada um dos condóminos – é constitutiva da obrigação de pagamento da contribuição de cada um dos condóminos. Nesta circunstância se fundamenta a jurisprudência para a qual é apenas à Acta desta assembleia, em que é tomada a deliberação a que se reporta o nº 1 do artigo 1431º do CC, bem como aquela em que se venha a deliberar a realização de quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que o artigo 6º vem conferir força executiva[9]. E assim validamente constituída a obrigação de cada um dos condóminos, em caso de posterior incumprimento por parte de algum deles, o Administrador de condomínio encontrar-se-á devidamente habilitado para proceder à respetiva cobrança judicia sem necessidade de qualquer deliberação de autorização nesse sentido por parte do condomínio. Mais, não sendo o elenco de títulos executivos suscetível de aplicação por analogia é unicamente à Acta em que é tomada a deliberação de aprovação de determinadas despesas e a forma de comparticipação pelos condóminos que é atribuída força executiva. Por conseguinte, sendo esta a deliberação que é constitutiva da obrigação de cada um dos condóminos, a Acta na qual a mesma é exarada constitui um requisito essencial, uma formalidade ad substanciam, para a respetiva validade e vinculação a todos os condóminos[10]. Defende outrossim Rui Pinto[11], atendendo à excecionalidade das normas que preveem títulos executivos, à discricionariedade legislativa na conformação do teor e requisitos de um dado titulo executivo e que as normas que atribuem força executiva a um documento devem ser interpretadas de acordo com a Constituição e com os princípios da segurança jurídica e da proibição de discricionariedade na aplicação da lei, deve poder retirar-se do título executivo, com um grau de segurança razoável, a constituição e o reconhecimento de uma certa obrigação, ainda que não vencida, face ao título, contra certa pessoa. Ainda segundo tal autor[12], a resposta à questão em causa – qual o objeto da deliberação documentada e acta? É a constituição da dívida a vencer-se no futuro (ata constitutiva da obrigação)? Ou é o reconhecimento da dívida vencida e não paga (ata recognitiva da dívida)? –, numa leitura da lei efetuada de acordo com os referidos parâmetros, levar-nos-á a atribuir força executiva à ata que documenta a deliberação de constituição da obrigação, ou seja, à ata que documente a deliberação onde nasce a obrigação de pagamento de contribuição por parte do condomínio. Sendo esta ata uma formalidade ad substantiam, relativamente à deliberação constitutiva da obrigação ao condomínio, não poderá a mesma ser substituída por uma Ata de uma posterior reunião onde se delibere quais os montantes até então em dívida por determinado condómino[13]. Tem de ser proferida uma deliberação que aprove o valor global que os condóminos ficam obrigados a pagar por contribuições ou por despesas e quanto é o quinhão de cada comproprietário, seja nas contribuições, seja na despesa[14]. Nesta perspectiva, a ata apresentada (de 05.09.2020) não constituiria título executivo relativamente aos valores ali aprovados como em falta referentes ao período de Setembro de 2018 a Setembro de 2020, por referência às quotas aprovadas a 29 de Dezembro de 2018, o que para a fracção "A" comportaria um valor em dívida de 1.132,00€… Já não assim quanto à quotização nessa acta aprovada para o período subsequente, quanto à qual tal ata constituirá, de facto, título executivo para as obrigações que, com aquela deliberação, se constituíram para cada um dos condóminos e que se achassem em atraso[15]. Temos para nós, contudo, que nem a letra da lei, nem o regime substantivo da obrigação do condómino impõem uma interpretação assim restritiva do título exequendo constituído por uma acta certificativa de dívidas anteriores. Nas palavras de José Lebre de Freitas[16], “o acertamento é o ponto de partida da ação executiva, pois a realização coativa da prestação pressupõe a anterior definição dos elementos (subjectivos e objectivos) da relação jurídica de que ela é objecto. O título executivo contém esse acertamento ; daí que se diga que constitui a base da execução, por ele se determinando «o fim e os limites da ação executiva» (art. 10-5), isto é, o tipo de ação (…) e o seu objecto, assim como a legitimidade, ativa e passiva, para ela (art. 53-1), e, sem prejuízo de poder ter que ser complementado (arts. 714 a 716), em face dele se verificando se a obrigação é certa, líquida e exigível (art. 713)”. Ora, na configuração do título como causa de pedir na acção executiva, a causa de pedir deixaria “de ser o facto jurídico de que resulta a pretensão do exequente (art. 581-4) para passar a ser o próprio título executivo (que, como vimos, dela constitui prova ou acertamento)”. Todavia, “não constituindo o título executivo um ato ou facto jurídico, esta construção não se harmoniza com o conceito de causa de pedir”, sendo que “a recusa da identificação do título com a causa de pedir é largamente dominante na jurisprudência”[17]. E, acrescenta o mesmo autor[18], “o título executivo ganha a relevância especial que a lei lhe atribui da circunstância de oferecer a segurança mínima reputada suficiente quanto à existência do direito de crédito que se pretende executar”. Já no Acórdão do STJ datado de 10/12/2013[19] se aduz que “na execução a causa de pedir não é o próprio título executivo, mas antes os factos constitutivos da obrigação exequenda reflectidos naquele: o título executivo terá de representar o acto jurídico pelo qual o executado reconhece uma obrigação para com o exequente”. Nas elucidativas palavras ainda do STJ no Acórdão de de 19/02/2009 – Processo nº. 07B4427 -, o título executivo é “o invólucro sem o qual não é possível executar a pretensão ou o direito que está dentro. Sem invólucro não há execução, embora aquilo que vai realizar-se coativamente não seja o invólucro mas o que está dentro dele”. Desde logo, a expressão legal “contribuições devidas” pode significar contribuições fixadas e a cargo de cada condómino, a liquidar, periodicamente, em regra, mensalmente ou que se reportam às contribuições que estejam já vencidas e não pagas e, como tal, reconhecidas em assembleia de condóminos ou, então, abranger umas e outras. Ora, reconhecendo não ser unívoca a nossa posição, como antecede, sufragamos a posição assumida no Acórdão da Relação de Lisboa 07/04/2016[20], nos termos da qual, “toda a acta da assembleia de condóminos em que se delibere que, em determinado momento, este ou aquele condómino tem em dívida determinados montantes resultantes de contribuições ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, pode servir como título executivo para o administrador instaurar a competente execução contra o condómino relapso” – v. Ac. R.P. de 02.06.1998, CJ, Tomo III, 190 e segs., Acs. R.C. de 20.06.2012 (Pº 157/10.2TBCVL-A. C1) e de 14.12.2010 (Pº 78/10.9TBMGR.C1); e Acs. R.L. de 18.03.2010 (Pº 85181/05.0YYLSB-A.L1-6) e de 07.07.2011 (Pº 42780/06.9YYLSB.L1-2)”. Neste sentido, ainda, o Acórdão da mesma Relação de 12/04/2018 – Relatora: Maria Teresa Pardal, Processo nº. 2712/14.2TBOER-A.L1-6. Assim é que se extrai do teor do citado artº6º nº1 que “a força executiva da acta não depende de nela se fazer necessariamente constar o montante determinado, concreto, certo, da dívida de cada condómino”, mas tal força executiva extrai-se antes do critério que permita que esse valor se determine, a achar pelo confronto da acta que o preveja. Desde logo, objectava a recorrente não resultar a aprovação mesma da dívida/crédito. Sem razão, colocando-se em causa uma mera questão de interpretação da declaração constante da acta exequenda, de acordo com as regras gerais, por estar em causa acto jurídico não negocial, visto o art. 295º do CC, pois. Ora, a teoria da impressão do destinatário, no confronto agora com o teor da acta, não deixa dúvidas quanto à aprovação da dívida exequenda pelos condóminos e, assim, quanto à existência ou materialidade de uma deliberação no sentido desta existência e cobrança. Ultrapassada esta primeira questão, temos para nós que, resultando da aprovação/deliberação do valor em dívida, ter existido a deliberação constitutiva, mediante a menção à aprovação anterior do orçamento e despesas, tanto basta a que se possa atribuir força executiva ao teor apenas recognitivo da acta sob apreciação. Temos por desnecessária agora a junção da acta respectiva, bastando a menção à existência de uma tal causa originária, cabendo já ao executado a alegação da respectiva inexistência, que na situação decidenda não vem feita… Com efeito, no afã de tudo colocar em causa, de uma forma mais ou menos vaga e/ou genérica, a executada não toma posição concreta sobre a data de aprovação das obrigações reconhecidas como em falta, por referência ao teor mesmo da acta exequenda. Não, pode, pois valorar-se a invocação de uma inexistência em geral, sem a impugnação concreta da data da aprovação perfeitamente referida/referenciada. Assim o determina a imposição legal do ónus da invocação/alegação de factos defensivos e, por essa via, o princípio da preclusão. Desta forma, a acta pode conter o valor global devido ao condomínio por contribuições correntes, ainda quando não se mostre acompanhada da deliberação da assembleia que fixa a obrigação exequenda, desde que esta tenha existido e se aluda à mesma na deliberação que reconhece o valor em falta. É a solução que se nos afigura mais conforme ao teor literal do preceito considerando e à intenção subjacente de facilitar a cobrança dos créditos do condomínio[21], sem fazer perigar a posição do condómino. Assim, reconduzindo-se este à inexistência mesma da deliberação constituinte, caberá o ónus da prova da respectiva existência ao exequente, mediante a junção da acta respectiva. Não estando, pois, em causa uma formalidade substancial, mas um mero meio de prova da constituição da obrigação. Apenas quando inexista a deliberação causal ou na falta de prova desta, quando necessária, por provocada pelo executado, é que não será possível ter por caracterizado o título executivo… Improcedente, pois, a argumentação pela executada, de inexistência de título executivo quanto às quantias em apreço. Importa ademais afrontar já a segunda questão – a da determinabilidade da quantia em dívida pela executada, face ao teor das Atas e documentos acompanhantes. Nesta sede, é entendimento expresso na jurisprudência maioritária que o mencionado no artigo 6º, nº 1, não faz depender a força executiva da ata da assembleia de condóminos da liquidação do montante concreto da divida de cada condomínio, bastando que os dados da ata e demais documentos que a completem permitem determinar esse valor – entendimento com o qual concordamos na íntegra. Aqui se convoca, a título meramente exemplificativo, o Acórdão da RP de 15/01/2019, Relatora: Maria Cecília Agante, Processo nº. 13190/18.7T8PRT-A.P1, acessível na base de dados da dsgi, no qual se consignou que o “artigo 6º/1 do decreto-lei 268/94 não faz depender a força executiva da ata da assembleia de condóminos da liquidação do montante concreto, certo, da dívida de cada condómino, bastando que os dados da ata e dos demais documentos que a completam permitam determinar esse valor. Cremos até bastar a menção do valor global devido ao condomínio por contribuições correntes, pela realização de despesas de conservação ou fruição das partes comuns ou para pagamento de serviços de interesse comum, se os demais dados permitirem que cada condómino, pela aplicação da permilagem da sua fração ao valor global, conheça o montante que lhe diz respeito” (sublinhado nosso) Por seu turno, Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo[22], no mesmo sentido, defendem que “Em bom rigor, o que se pretende é que a obrigação (na sua constituição inicial ou traduzindo a existência de um débito) conste da acta de assembleia de condóminos e a responsabilidade do executado seja apurável por simples cálculo aritmético por referência a cada um dos períodos considerados em dívida.” Na jurisprudência, decidiu-se neste sentido designadamente no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/10/2014, tendo como Relator Fernandes do Vale[23]: “Para constituir título executivo, a acta da assembleia de condóminos tem de permitir, de forma clara e por simples aritmética, a determinação do valor exacto da dívida de cada condómino, não dependente, pois, a respectiva força executiva, da assinatura de todos os condóminos (ainda que participantes) nem de, nela, ser explicitado aquele valor.” Tenhamos como exemplo, ainda, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, Processo n.º 7240/17.1T8VNF-A.G1, ao referir que admitindo-se, como a generalidade da jurisprudência admite, constituir título executivo a ata que decide o valor das quotas periódicas que devem ser pagas pelos condóminos (…) o que implica aceitar que a liquidação complementar (…) seja efetuada no requerimento executivo (art. 724º, nº 1, h) do CPC), não nos parece dever colocar-se obstáculos a que, dando-se à execução uma ata que certifique a dívida global de um condómino sem especificação dos valores que a integram, a decomposição do valor global aprovado seja, também ela, feita no requerimento executivo. Ademais, se em sede de propositura de uma ação executiva, deve constar do requerimento executivo uma exposição sucinta dos factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo [alínea e) do nº1 do artigo 724º do CPC], parece-nos legalmente admissível que o exequente proceda, nesse requerimento, à discriminação dos valores que compõem a dívida exequenda, indicando a origem de cada uma das parcelas, o seu vencimento, assim como quaisquer outras informações relevantes para a boa decisão do mérito da causa, uma vez que é a ele que cabe o ónus da prova dos factos constitutivos. Caso o executado discorde de tais pretensões, é-lhe assegurado o direito do contraditório, através da oposição à execução mediante embargos, correndo depois por apenso à execução esse incidente de natureza declarativa. Ainda sem prejuízo da preclusão implicada pela não dedução desse incidente. Ora, cada uma das dívidas sob cobrança é liquidável face ao título e documentos acompanhantes, sendo que a leitura atenta do requerimento executivo inicial, das Actas das reuniões de Condomínio e dos documentos que as acompanham, leva-nos a concluir que as quantias devidas pela executada, são perfeitamente determináveis e determinadas. Como o são as datas de vencimento da obrigação de pagar, justificadas ademais no requerimento executivo e em conformidade com as deliberações exequendas e a documentação junta. Assim, desde logo, a referência das quantias aprovadas em cada ano à permilagem da fracção em apreço, a quantia relativa a despesas com obras extraordinárias, determinável do mesmo modo; mais emergindo das actas as datas de vencimento da obrigação de pagar tais quais caracterizadas no requerimento executivo… De resto, sempre fora do âmbito do recurso, por não ter sido suscitada, a única questão com relação à qual concretamente posta em causa pela executada a liquidação pela exequente, não já a partir da data de vencimento da obrigação de pagar, mas da exigência de uma obrigação de suscitar a purga da mora… Assim quanto à dívida aprovada na acta de 05.09.2020. É que, no mais, limitando-se a executada a reportar-se à uma genérica falta de requisitos, sem atentar na alegação mesma em sede de requerimento executivo. Improcedente, pois, o segmento recursivo principal, assente na inexistência parcial do título, como na falta de verificação dos requisitos ou condições de exequibilidade destes. Não se antevendo, consequentemente, causa para a extinção, sequer parcial, da execução. Concorda-se com os termos da decisão recorrida, sendo certo que, em reforço desta posição se impõe convocar jurisprudência que alude à dita Lei n.º 8/2022, de 10/01, como uma lei interpretativa (donde de aplicação imediata, nessa parte), designadamente quanto a sanções de natureza pecuniária, âmbito em que, perante a controvérsia de pretérito, não há inovação ou criação de direito novo, mas uma dimensão meramente interpretativa. Cfr., inter alia, o Ac. TRG de 27/04/2023, Proc. 2251/22.8T8GMR.G1 (Rel. Sandra Melo), também disponível em www.dgsi.pt, em cujo sumário pode ler-se: «.1-Se uma lei posterior define um entendimento que já cabia na lei anterior, resolvendo conflito jurisprudencial e doutrinal sobre qual os sentidos a atribuir-lhe, essa nova lei não é inovadora ou criadora, mas meramente interpretativa, pelo que esse entendimento vale para as situações existentes na vigência da anterior lei. // 2- Tal ocorre com a nova redação dada pela Lei 8/2022 ao artigo 6º do DL n.º 268/94, concedendo força executória ás atas das assembleias de condóminos no que toca às sanções de natureza pecuniária “desde que aprovadas em assembleia de condóminos ou previstas no regulamento do condomínio”. // 3- Dúvidas não há, pois, hoje, que as atas de condomínio podem servir de título executivo quanto a sanções pecuniárias, desde que aprovadas em assembleia de condóminos ou previstas no regulamento do condomínio, interpretação que deve ser a seguida mesmo para o período em que ainda não havia vigorava a Lei 8/2022.». Assim é que estabelece a atual redação do dito art.º 6.º (dada pela Lei n.º 8/2022, de 10/01), no que ao segmento decidendo importa: 3 - Consideram-se abrangidos pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante, bem como as sanções pecuniárias, desde que aprovadas em assembleia de condóminos ou previstas no regulamento do condomínio. Só uma leitura desatenta ou patentemente tendenciosa do requerimento executivo permite sustentar a existência de uma dupla data de vencimento quanto à obrigação de pagar a contribuição extraordinária aprovada pela acta nº 4 de 2007… Na verdade, a acta de 05.09.2020, vem, como resulta claramente do requerimento executivo, como título com referência apenas aos valores das quotas de condomínio em falta referentes ao período de Setembro de 2018 a Setembro de 2020, por referência às quotas aprovadas a 29 de Dezembro de 2018, num valor em dívida de 1.132,00€, lançado numa quota única pelo doc. ...73 a 14.09.2020 e com vencimento a 08.10.2020, junto bem assim ao requerimento executivo. Ainda, em função da aprovação já do orçamento a vigorar entre Outubro de 2020 e Setembro de 2021, no valor global de 5.939,88€, do montante de 52,63 EUR, com vencimento a 08.10.2020, referente à quota do mês de Outubro de 2020, correspondente à divisão do valor aprovado em função da permilagem da fracção da executada. Fora do âmbito do recurso, finalmente, a questão da taxa de juro cabível… Impõe-se, por conseguinte, concluir pela improcedência da argumentação recursiva, quanto à inadmissibilidade da decidida ampliação da execução quanto aos juros, vista a caracterização do vencimento da obrigação de pagar no requerimento executivo mesmo e a natureza legal da obrigação de juros.
III. Tudo visto, decide-se negar provimento ao recurso interposto pela executada, confirmando-se ambas as decisões recorridas. Custas pela recorrente. Notifique.
Porto, 20 de Junho de 2024 Isabel Peixoto Pereira António Paulo Vasconcelos Isabel Ferreira _______________________ [1] Vejam-se já os termos do requerimento de embargos de executada incorporado no principal em 07.12.2023… [2] Cfr. no sentido desta admissibilidade inter alia os Ac STJ de 29 de Abril de 2008 (Relator Garcia Calejo), 27 de Maio de 2010 (Relator Bettencourt de Faria), 6 de Julho de 2017 (Relator Gonçalves Rocha) e 27 de Novembro de 2018 (Relator Júlio Gomes), in www.dgsi.pt; Paulo Ramos de Faria, Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas Ao Novo Código Processo Civil, 2014, II Volume, 52. [3] Assim é que as actas juntas com o requerimento executivo têm data bem anterior à data de entrada em vigor da Lei n.º 8/2022, de 10/01, que alterou a norma em causa, que rege quanto aos requisitos de exequibilidade das actas do condomínio, a qual entrou em vigor 90 dias após a sua publicação, isto é, em 10/04/2022 (cfr. art.º 9.º deste diploma legal). [4] Esta é a implicada pela oposição à execução da acta de 05/09/2020, porquanto reportando-se aos valores das quotas de condomínio em falta referentes ao período de Setembro de 2018 a Setembro de 2020, por referência às quotas aprovadas a 29 de Dezembro de 2018. [5] Assim a determinação do valor da prestação atinente à fracção do executado e do prazo de vencimento da obrigação de pagar. [6]A execução por dívidas de condomínio, in “Novos Estudos de Processo Civil”, Petrony, p.192. [7] António Abrantes Geraldes, “Títulos Executivos,” Revista Themis, Ano IV-nº7-2003, A Reforma da Ação Executiva, pp.37-38. [8] Neste sentido, Fernando Pereira Rodrigues, Elucidário de Temas de Direito (Civil e Processual), Coimbra Editora, 211, pp.105-106 [9] Neste sentido, entre muitos outros, cfr., Acórdão do TRG de 08-01-2013, relatado por Paulo Barreto, disponível in www.dgsi.pt. [10] Neste sentido, Sandra Passinhas, segundo a qual, “Uma vez aprovadas e exaradas em ata as deliberações da assembleia representam a vontade colegial e são vinculativas para todos os condóminos, mesmo para os que não tenham participado na reunião ou que, participando, se abstiveram de votar ou de votar contra, e ainda para aqueles que ingressem no condomínio após a sua aprovação. (…) A acta forma um corpo único com a deliberação da assembleia, atribuindo-lhe certeza jurídica e permitindo, outrossim, que o administrador a execute e que os condóminos a impugnem” – “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, Almedina, pp.257-258. Também Delgado de Carvalho, In Acção Executiva para pagamento de quantia certa, 2.ª Edição, 2016, Quid Juris, pág 68, refere “(…) a fonte da obrigação pecuniária do condómino relapso é a própria deliberação da assembleia de condóminos, vertida em acta, que aprova e fixa o valor a pagar de imediato e para o futuro, correspondente à sua quota-parte nas contribuições e nas despesas comuns.” [11] A execução de dívidas do condomínio, local citado, pp. 197-198. [12] Artigo e obra citada, pp.198-200. [13] Se o condomínio apresentar à execução uma ata de cobrança, Rui Pinto distingue duas situações, i) se existir a ata de aprovação das contribuições e despesas, não é suficiente a mera remessa para tal ata, defendo ser a execução indeferida liminarmente, tendo o exequente de propor nova execução com a ata correta que é a primeira; ii) se não existir ata a certificar a deliberação de aprovação das contribuições e despesas põe-se um problema da oponibilidade de tal deliberação, supondo que ela foi mesmo produzida – Artigo e local citados, p.102. [14] Rui Pinto, local citado, p.200. [15] Convoca-se o Acórdão da Relação de Lisboa de 17/05/2018, Relatora: Carla Mendes, Processo nº. 10176/17.2T8LSB.L1, in www.dgsi.pt., que assinala precisamente a divergência jurisprudencial existente, enunciando que “alguns arestos defendem que só é título executivo a acta de assembleia de condóminos que documente deliberação onde sejam quantificados os valores em dívida pelo condómino a ser demandado - cfr. ac. RL de 7/7/2011, proc. 42780/06.9YYLSB.L1-2; outros, entendem que a lei atribui força executiva só à acta que contenha deliberação da assembleia de condóminos que aprove as despesas que serão suportadas pelo condomínio e a quota parte que será devida por cada condómino, com indicação do prazo do respectivo pagamento, entendendo ser meramente complementar/desnecessária, a acta que liquide o que for já devido – cfr. Ac. RL de 30/6/2011, proc. 13722/10.9YYLSB, de 22/6/2010, proc. 1155/05.3TCLRS.L1-7, de 11/10/2012, proc. 1515/09OTBSCR.L1-2 e de 14/6/2012, proc. 26879/11.2YYLSB-A.L1-6; e outros defendem que qualquer uma das duas modalidades de acta, quanto ao seu conteúdo, supra enunciadas, goza de força executiva (é título executivo) – cfr. Ac. RL de 18/372010, proc. 85181/05.OYYLSB-A.L1-6, de 7/7/2011, proc. 42780/06.9YYLSB.L1-2 e RP de 24/2/2011, proc. 3507/06.2TBAI-A.P1”. Conclui, então, sufragando o entendimento de que “constitui título executivo – contra o proprietário que deixar de pagar -, à luz do art. 6 DL 268/94 de 25/10, a acta da assembleia de condóminos que documente deliberação onde nasce a obrigação de pagamento de contribuição por parte do condómino (fixa a quota-parte de comparticipação de cada condómino nas despesas comuns), estipule o prazo e o modo de pagamento e não já a que declare, tão só, o montante da dívida. [16] A Ação Executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 6ª Edição, Coimbra Editora, pág. 43. [17] Idem, pág. 90 e 91. [18] A Ação Executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, 7ª Edição, Gestlegal, pág. 47 e 48. [19] Relatora: Ana Paula Boularot, Processo nº. 2319/10.3TBOAZ-A.P1.S1, in www.dgsi.pt , citando Lebre de Freitas, A Acção Executiva, Depois Da Reforma Da Reforma, 5ª edição, Lebre de Freitas, João Redinha, Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume, 1º, 1999, 92/93. [20] Relatora: Ondina Carmo Alves, Processo nº. 2816/12.6TBCSC-A.L1-2, in www.dgsi.pt. [21] Aliás, atentemos à intenção do legislador que, desde logo, consagrou na alínea d) do nº1 do artigo 703º do CPC a admissibilidade de um determinado leque de documentos enquanto títulos executivos. O Regime da Propriedade Horizontal, sendo uma das disposições especiais, nos termos do artigo supramencionado, admite que as atas de assembleias de condóminos, das quais constem deliberações sobre os montantes em dívida ao condomínio, sirvam de base à execução. Parece-nos claro que o objetivo de admissibilidade destes documentos é a celeridade na satisfação do interesse do credor, especialmente num cenário como este, em que o credor é um condomínio, encarregado de gerir e administrar várias frações autónomas e prosseguir o interesse comum. Como tal, não faz sentido que fique desprotegido durante um longo período de tempo, enquanto decorre a tramitação da ação declarativa para provar a existência do seu direito. [22] A Acção Executiva Anotada e Comentada, 2017, 2.ª Edição, Almedina, pág. 138. [23] No Processo n.º 4852/08.8YYLSB-A.L1-S1 e disponível em www.dgsi.pt. |