| Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
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| Nº Convencional: | JTRP000 | ||
| Relator: | RODRIGUES PIRES | ||
| Descritores: | RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL PERDA DO DIREITO À VIDA DANOS NÃO PATRIMONIAIS INDEMNIZAÇÃO | ||
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| Nº do Documento: | RP2024042318987/22.0T8PRT.P1 | ||
| Data do Acordão: | 04/23/2024 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
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| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA | ||
| Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO | ||
| Área Temática: | . | ||
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| Sumário: | I – A perda do direito à vida, o mais importante dos direitos fundamentais, reclama a fixação de valores progressivamente mais elevados tendo em conta os princípios da atualidade e da dignidade na compensação dos danos. II – Relativamente a uma vítima de 72 anos de idade, casado e com dois filhos, com relações de profunda afeição com a sua esposa, a quem dava apoio, e com os seus filhos, consideramos justo e equitativo que a indemnização pela perda do seu direito à vida seja fixada em 70.000,00€. III - No que toca à compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pela viúva e pelos filhos com a morte da vítima, face aos padrões jurisprudenciais adotados e à factualidade apurada, consideramos adequado que os respetivos montantes indemnizatórios se fixem quanto à viúva em 35.000,00€ e quanto aos filhos em 25.000,00€ por cada um deles. | ||
| Reclamações: | |||
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| Decisão Texto Integral: | Proc. nº 18987/22.0T8PRT.P1 Comarca do Porto – Juízo Central Cível do Porto – Juiz 3 Apelação Recorrente: “A..., Compañia de Seguros y Reaseguros, S.A.” Recorridos: AA; BB e CC Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Fernando Vilares Ferreira e Alberto Taveira 
 Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: 
 RELATÓRIO Os autores AA, BB e CC vieram intentar contra a ré “A..., S.A.” a presente ação declarativa, na forma de processo comum, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de 175.015,67€, acrescida de juros moratórios, que reputam como adequada para ressarcimento dos danos que sofreram por força de acidente de viação que levou ao falecimento do seu marido e pai. Acidente esse que alegam ter sido culposamente causado pelo condutor de veículo segurado na ré. A ré contestou sustentando que o acidente foi culposamente causado pelo falecido, condutor do outro veículo interveniente. Mais impugnou os danos alegados. Foi citado o Instituto da Segurança Social, IP (art. 1º, nº 2, do Dec. Lei nº 59/89, de 22.2), que veio formular pedido indemnizatório no valor de 13.023,70€, acrescido de juros, que alega corresponder a reembolso de despesas de funeral e a pensões de sobrevivência liquidadas à viúva. A ré também impugnou tal factualidade. Foi dispensada a realização de audiência prévia. Proferiu-se despacho saneador com identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova. Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo. Por fim, foi proferida sentença que: 1) Condenou a ré no pagamento aos autores da quantia de 70.000,00€, pela perda da vida de DD, acrescida de juros à taxa legal de juro civil, desde a presente data e até efetivo e integral pagamento; 2) Condenou a ré no pagamento à autora AA da quantia de 35.000,00€, ao autor BB da quantia de 25.000,00€ e ao autor CC da quantia de 25.000,00€, pelos danos não patrimoniais que sofreram com a morte de DD, sendo estes valores acrescidos de juros, à taxa legal de juro civil, desde a presente data e até efetivo e integral pagamento; 3) Condenou a ré no pagamento à autora AA da quantia de 2.000,00€, pelos danos não patrimoniais correspondentes às dores por esta sofridas, sendo este valor acrescido de juros, à taxa legal de juro civil, desde a presente data e até efectivo e integral pagamento; 4) Condenou a ré no pagamento à autora AA das quantias 415,67€ e de 2.600,00€, correspondentes a despesas de tratamento e de funeral por ela suportadas, acrescidas de juros, à taxa legal de juro civil, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento; 5) Condenou a ré no pagamento aos autores, enquanto cônjuge meeira e herdeiros do falecido, da quantia de 1.500,00€, para ressarcimento da destruição da viatura Toyota, acrescida de juros, à taxa legal de juro civil, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento; 6) Condenou a ré no pagamento ao Instituto da Segurança Social, IP, das quantias de 1.316,43€ e de 11.707,27€, acrescidas de juros, à taxa legal de juro civil, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento; 7) Absolveu a ré do mais peticionado. Inconformada com o decidido, a ré interpôs recurso, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. São exageradas as indemnizações arbitradas para ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos. 2. Nomeadamente, no que concerne à perda do direito à vida é muito elevada a indemnização de 70.000,00€ que foi fixada em primeira instância, devendo em sua substituição ser arbitrado um montante que não exceda 50.000,00€, por se afigurar mais justo e equilibrado. 3. É igualmente exagerada a indemnização de 35.000,00€, atribuída à viúva, e de 25.000,00€, atribuída a cada um dos dois filhos, como compensação moral pelo desgosto face à perda do filho, entendendo-se que seria mais justa uma indemnização não superior a 25.000,00 €, para a viúva, e de 15.000,00 €, para cada um dos dois filhos a tal título. 4. A douta sentença recorrida violou, além do mais, por errada interpretação e aplicação, o disposto no art. 496.º, 562.º e 566.º do Código Civil. 5. O Tribunal a quo interpretou e aplicou tais normas no sentido exposto na douta sentença, condenando a recorrente numa indemnização manifestamente excessiva. 6. A interpretação correta de tais preceitos era a que resultaria na atribuição de montantes de indemnização que não se afastassem dos agora preconizados. Pretende assim que a sentença recorrida seja revogada e substituída por outra que condene nos valores apontados. Não foi apresentada resposta. O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. Cumpre então apreciar e decidir. * FUNDAMENTAÇÃO O âmbito do recurso, sempre ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – cfr. arts. 635º, nº 4 e 639º, nº 1 do Cód. do Proc. Civil. * As questões a decidir são as seguintes: I – Apurar se foi correta a indemnização arbitrada pela perda do direito à vida; II – Apurar se foram corretas as indemnizações arbitradas pelos danos não patrimoniais sofridos pelos autores. * OS FACTOS É a seguinte a factualidade dada como provada na sentença recorrida: 1. No dia 25 de Julho de 2021, pelas 16:24 horas, na avenida ..., freguesia ..., Gondomar, ocorreu um acidente de viação, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros, marca Volkswagen, com a matrícula ..-RQ-.., propriedade de EE, e por ele conduzido, e o veículo ligeiro de passageiros, marca Toyota, com a matrícula ..-..-HV (corrigindo-se aqui, ao abrigo do disposto no art. 146º, do CPC, o óbvio lapso material ocorrido aquando da indicação desta matrícula no art. 3º da petição inicial), propriedade de DD e por ele conduzido. 2. O tempo estava seco e limpo. 3. O piso, em alcatrão, na ocasião do acidente, encontrava-se seco, com boa aderência e em bom estado de conservação. 4. Com dois sentidos de trânsito, separados por linha longitudinal descontínua, 5. Com uma largura de 7,10 metros. 6. O limite de velocidade máxima é de 50 Km/h. 7. A via, naquele local, configura uma curva. 8. Nas circunstâncias de tempo e lugar descritas, o veículo “Toyota” circulava no sentido .../..., pela metade direita da faixa de rodagem, atento o referido sentido. 9. A uma velocidade não superior a 50 kms por hora. 10. O veículo “Volkswagen”, por seu lado, circulava em sentido contrário, i.e., circulava no sentido .../.... 11. Ao entrar na referida curva, à sua direita, o seu condutor, perdeu o controle do veículo. 12. Invadindo a faixa de rodagem contrária. 13. Indo embater na parte lateral esquerda do veículo “Toyota”, projectando-o para fora da estrada. 14. Do descrito acidente, resultou a morte de DD, condutor do veículo “Toyota” que contava 72 anos de idade. 15. À data do seu falecimento DD era casado em primeiras núpcias, ocorridas em 01-09-1968, no regime de comunhão geral de bens, com a 1ª autora. 16. Tendo como únicos filhos os restantes autores. 17. Não deixou testamento ou qualquer outra disposição de última vontade. 18. Vivia a vida com gosto, activamente e em solidariedade com todos, designadamente dava todo o apoio à sua esposa, que era, como é, pessoa doente seguida no IPO ... devido a neoplasia da mama, sofrendo também de incontinência urinária, hipertensão arterial e depressão. 19. A vítima, à data do acidente, vivia com a sua esposa. 20. A vítima era muito dedicada à sua esposa com quem vivia e convivia e a quem dava todo o seu carinho e o amparo de que a mesma necessitava. 21. Como era dedicado aos seus identificados filhos. 22. Por sua vez a 1ª autora e os seus filhos devotavam enorme estima e apreço por seu marido e pai. 23. A morte da vítima abalou profundamente os autores por uma desesperada e angustiante dor que se repercute em cada dia que passa. 24. A viatura “Toyota” ficou totalmente destruída. 25. A 1ª autora teve ainda despesas médicas e medicamentosas no valor de €415,67 (quatrocentos e quinze euros e sessenta e sete cêntimos) resultantes das lesões sofridas em consequência do acidente acima descrito, enquanto passageira transportada no veículo “Toyota”. 26. Pelas despesas de funeral, a 1ª autora despendeu a quantia de €2.600,00 (dois mil e seiscentos euros). 27. Ainda devido ao acidente acima descrito, a 1ª autora sofreu fractura do esterno com necessidade de internamento do dia 30 de Julho ao dia 02 de Agosto de 2021. 28. Durante este período de internamento a ao longo de todo o período de recuperação, a 1ª autora sofreu dores. 29. À data do acidente, o condutor do veículo “Volkswagen” tinha transferida para a 1ª ré a responsabilidade civil emergente de sinistros automóvel, ocasionados pela circulação desta viatura através do contrato de seguro titulado pela apólice nº .... 30. Com base no falecimento, em 2021/07/25, do beneficiário nº ..., DD, em consequência do acidente a que dizem respeito os autos, o ISS/CNP pagou a título de subsídio por morte, a AA, o total de €1.316,43. 31. O ISS/CNP pagou ainda Pensões de Sobrevivência, no período de 2021/08 a 2023/02, à viúva AA, no total de €11.707,27. * Não se provaram os seguintes factos: 32. A curva supra descrita era ligeira e tinha boa visibilidade. 33. O veículo “Volkswagen” circulava uma velocidade superior a 100 kms por hora. 34. O condutor do veículo “Volkswagen” seguia distraído. 35. Entre o momento em que ocorreu o acidente e aquele em que ocorreu a morte (cerca de 2 horas depois), sofreu a vítima dores e angústias indescritíveis. 36. A depressão da autora foi agravada pelo evento atrás descrito. 37. A viatura tinha, à data do acidente, um valor comercial aproximado de €2.000,00 (dois mil euros), encontrando-se, antes do acidente, em bom estado de conservação, com todas as revisões efectuadas. 38. O condutor do veículo de matrícula ..-RQ-.. circulava atento ao trânsito e à condução. 39. Animado de velocidade não superior a 50 Km/h. 40. A curva é acentuada. 41. Quando o condutor do ..-RQ-.. se encontrava a menos de 20 metros da referida curva surgiu, o automóvel ligeiro de passageiros matrícula ..-..-HV, circulando com velocidade superior a 70 Km/h. 42. Em virtude da referida velocidade, não conseguiu descrever a curva, “cortou” a dita curva e invadiu a metade esquerda da faixa de rodagem, atento o seu sentido de marcha. 43. Ao aperceber-se desta manobra, o segurado da ré encetou uma travagem de recurso. 44. Porém o condutor do ..-..-HV não alterou a sua velocidade e trajectória, mantendo-se a circular na hemifaixa de rodagem destinada ao sentido de trânsito contrário. 45. Nestas circunstâncias o embate entre as viaturas tornou-se inevitável e o veículo ..-..-HV acabou por embater no ..-RQ-... 46. Esse embate ocorreu em plena metade direita da faixa de rodagem, atento o sentido de trânsito do ..-RQ-... * O DIREITO I – Apurar se foi correta a indemnização arbitrada pela perda do direito à vida 1. Na sentença recorrida fixou-se em 70.000,00€ a indemnização fixada pela perda da vida de DD, valor que teve a discordância em via recursiva da ré seguradora que, enfatizando a idade da vítima – 72 anos -, considera mais justa e equilibrada para ressarcimento deste dano a importância de 50.000,00€. Vejamos. 2. A lesão corporal que pela sua irreversibilidade melhor expressa a fragilidade da vida humana e potencialmente desencadeia danos patrimoniais de maior expressão e gravidade é a morte.[1] Com a morte findam os sonhos de uma vida, cessa a esperança. Ora, se a compensação pelo dano moral da morte é um dado pacífico do nosso ordenamento jurídico, os problemas surgem quando se trata de proceder à sua quantificação, sendo certo que o padrão de decisão terá que ser definido sempre com recurso à equidade. De qualquer modo, nenhuma razão séria justifica que este dano, perfilando-se como lesão do bem vida, de grau máximo e inexcedível, possa ter um tratamento de menor dignidade ressarcitória do que aquele que é conferido às lesões da saúde em geral, todas necessariamente, e por definição, de menor gravidade.[2] 3. Centremos agora a nossa atenção em algumas decisões que têm vindo a ser proferidas pelo nosso mais alto tribunal, uma vez que estamos perante matéria, como é a da sinistralidade rodoviária, em que a fixação dos montantes indemnizatórios efetuada com base em juízos de equidade implica frequentes intervenções do Supremo Tribunal de Justiça. No acórdão do STJ de 3.11.2016 (proc. 6/15.5 T8VFR.P1.S1, relator António Piçarra, disponível in www.dgsi.pt) escreveu-se, com referência a esta data, que “consolidou-se (…) na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça o entendimento de que o dano pela perda do direito à vida, direito absoluto e do qual emergem todos os outros direitos, situa-se, em regra e com algumas oscilações, entre os €50000,00 e €80000,00, indo mesmo alguns dos mais recentes arestos a €100.000,00 (cfr, entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de Janeiro de 2012, de 10 de Maio de 2012 (processo 451/06.7GTBRG.G1.S2), de 12 de Setembro de 2013 (processo 1/12.6TBTMR.C1.S1), de 24 de Setembro de 2013 (processo 294/07.0TBETZ.E2.S1), de 19 de Fevereiro de 2014 (processo 1229/10.9TAPDL.L1.S1), de 09 de Setembro de 2014 (processo 121/10.1TBPTL.G1.S1), de 11 de Fevereiro de 2015 (processo 6301/13.0TBMTS.S1), de 12 de Março de 2015 (processo 185/13.6GCALQ.L1.S1), de 12 de Março de 2015 (processo 1369/13.2JAPRT.P1S1), de 30 de Abril de 2015 (processo 1380/13.3T2AVR.C1.S1), de 18 de Junho de 2015 (processo 2567/09.9TBABF.E1.S1) e de 16 de Setembro de 2016 (processo 492/10.OTBB.P1.S1), todos acessíveis através de www.dgsi.pt.).” No caso concreto aí apreciado, reportando-se este a uma situação em que a vítima contava 52 anos de idade, fixou-se a indemnização pela perda do direito à vida na importância de 60.000,00€. No acórdão do STJ de 22.2.2018 (proc. 33/12.4 GTSTB.E1.S1, relator Manuel Braz, disponível in www.dgsi.pt.) em que a vítima tinha 25 anos de idade e era piloto da Força Aérea, com a patente de alferes, a indemnização pela perda do direito à vida foi arbitrada em 120.000,00€. No acórdão do STJ de 7.5.2020 (proc. 952/06.7 TBMTA.L1.S1, relator Olindo Geraldes, disponível in www.dgsi.pt) em que a vítima tinha 29 anos de idade, considerando a elevada expetativa de vida, o casamento contraído há cerca de dois anos e a circunstância de ter sido pai há um ano, fixou-se a indemnização pela perda do direito à vida em 85.000,00€. No acórdão do STJ de 11.2.2021 (proc. 625/18.8 T8AGH.L1.S1, relator Abrantes Geraldes, disponível in www.dgsi.pt) em que a vítima tinha 7 anos de idade fixou-se a indemnização pela perda do direito à vida em 100.000,00€. No acórdão do STJ de 25.2.2021 (proc. 4086/18.3 T8FAR.E1.S1, relatora Rosa Tching, disponível in www.dgsi.pt.), em sede de compensação pela perda do direito à vida, tendo em conta que a vítima tinha 53 anos de idade e não contribuiu para a produção do acidente, teve-se por razoável fixar o valor base daquela compensação em 80 000,00€. No acórdão do STJ de 27.9.2022 (proc. 253/17.5 T8PRT-A.P1.S1, relator Isaías Pádua, disponível in www.dgsi.pt.) em que a vítima tinha 41 anos de idade, sendo pessoa saudável, feliz, com família constituída e estabilizada profissionalmente, fixou-se a indemnização pela perda do direito à vida na importância de 95.000,00€. Por fim, no mais recente acórdão do STJ de 10.10.2023 (proc. 9039/20.9 T8SNT.L1.S1, relator Jorge Arcanjo, disponível in www.dgsi.pt.), também citado na sentença recorrida, escreveu-se o seguinte: “A jurisprudência portuguesa, sobretudo a partir de meados da década de 90 (do século passado) deu um salto qualitativo, aumentando progressivamente a indemnização pela perda do direito à vida, como se resumiu no Ac do STJ de 17/2/2002 (www.dgsi.pt/jstj ), com indicação de diversas decisões. Como critério adjuvante para a determinação equitativa do dano, a jurisprudência passou a socorrer-se da Resolução do Conselho de Ministros sobre o caso do acidente de ... de 4/3/2001, segundo o parecer do Provedor de Justiça (Diário da República, n.º 96, 2ª série, de 24 de Abril de 2001 - resumo, parte VIII, páginas 7142). Funcionando então o acidente de ... como uma espécie de “precedente” ou “premissa endoxal”, não pode deixar de se entender hoje a posterior evolução do custo de vida, os aumentos dos prémios de seguros, e sobretudo o princípio da dignidade da compensação dos danos. *  II – Apurar se foram corretas as indemnizações arbitradas pelos danos não patrimoniais sofridos pelos autores 1. Na sentença recorrida, quanto a este segmento indemnizatório, fixaram-se os respetivos montantes em 35.000,00€ para a viúva, a autora AA e em 25.000,00€ para cada um dos filhos, os autores BB e CC. Porém, em via recursiva, a ré seguradora, não considerando estes valores adequados, pugna pela sua redução para 25.000,00€ quanto à viúva e 15.000,00€ quanto a cada um dos filhos. Vejamos. 2. Inequívoco é que a dor e o sofrimento daqueles que constituem o círculo familiar mais íntimo do lesado é tutelado pela nossa ordem jurídica. No seu ressarcimento há a considerar o grau de parentesco, mais próximo ou mais remoto, o relacionamento da vítima com esses seus familiares, se era fraco ou forte o sentimento que os unia, se a dor com a perda foi realmente sentida e se o foi de forma intensa ou não.[3] A indemnização a atribuir neste âmbito, com base na equidade [arts. 496º, nº 4 e 494º do Cód. Civil], destinar-se-á assim a compensar a dor, a tristeza, a angústia, a perda, o sofrimento tidos pelos familiares a quem a vítima, com a sua morte, faltou. Da matéria de facto dada como assente resulta o seguinte: - À data do seu falecimento DD era casado em primeiras núpcias, ocorridas em 01-09-1968, no regime de comunhão geral de bens, com a 1ª autora [nº 15]; - Tendo como únicos filhos os restantes autores [nº 16]; - Dava todo o apoio à sua esposa, com quem vivia, que era, como é, pessoa doente seguida no IPO ... devido a neoplasia da mama, sofrendo também de incontinência urinária, hipertensão arterial e depressão [nºs 18 e 19]; - Dava à sua esposa todo o seu carinho e o amparo de que a mesma necessitava [nº 20]; - Era dedicado aos seus filhos [nº 21]; - A 1ª autora e os seus filhos devotavam enorme estima e apreço por seu marido e pai [nº 22]; - A morte da vítima abalou profundamente os autores por uma desesperada e angustiante dor que se repercute em cada dia que passa [nº 23]. Ora, deste contexto fáctico emerge, em consequência da morte de DD, um quadro de grande sofrimento para os autores, mais intenso ainda no que toca à viúva, a autora AA, a quem o falecido dava todo o apoio. Apoio de que aquela bem carecia por ser pessoa doente seguida no IPO ... devido a neoplasia da mama, sofrendo também de incontinência urinária, hipertensão arterial e depressão. Acontece que as importâncias arbitradas na sentença recorrida [35.000,00 para a viúva e 25.000,00€ para cada um dos filhos] se mostram, perante a factualidade assente, adequadas ao sofrimento que os autores experimentaram e experimentam, compaginando-se, de resto, com os padrões jurisprudenciais seguidos e com a necessidade de uma progressiva atualização dos valores indemnizatórios neste âmbito - Cfr., entre outros, Ac. STJ de 21.3.2019, p. 20121/16.7T8PRT.P1.S1, relatora Maria de Graça Trigo; Ac. STJ de 11.2.2021, proc. 625/18.8T8AGH.L1.S1, relator Abrantes Geraldes; Ac. STJ de 25.2.2021, p. 4086/18.3T8FAR.E1.S1, relatora Rosa Tching e Ac. Rel. Porto de 6.11.2019, proc. 1231/16.7GAMAI.P1, relator Moreira Ramos, todos disponíveis in www.dgsi.pt., dos quais resulta a compatibilidade entre os valores fixados na sentença recorrida e os atualmente arbitrados pelos nossos tribunais superiores. Como tal, por se mostrarem justas e equitativas, deverão estas importâncias ser mantidas, o que importará a total confirmação do decidido pela 1ª Instância. * Sumário (da responsabilidade do relator – art. 663º, nº 7 do Cód. de Proc. Civil): ……………………………… ……………………………… ……………………………… * DECISÃO Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este tribunal em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela ré “A..., Compañia de Seguros y Reaseguros, S.A.” e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida. Custas, pelo seu decaimento, a cargo da ré/recorrente.   |