Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
A AUDIOGEST – Associação Para a Gestão e Distribuição de Direitos intentou uma acção contra a Associação Académica da Universidade do Minho formulando os seguintes pedidos:
a) deve a Ré ser condenada a reconhecer à Autora o direito exclusivo de autorizar a utilização/execução pública de fonogramas e/ou videogramas no evento denominado “Receção ao Caloiro”;
b) deve a Ré ser condenada na proibição de utilizar/executar publicamente fonogramas e/ou videogramas no evento denominado “Receção ao Caloiro”, enquanto não obtiver, junto da Autora, a licença PassMúsica;
c) deve a Ré ser condenada no pagamento da remuneração de acordo com as tabelas tarifárias da Autora, que vigoraram para 2017, por contrapartida do respetivo licenciamento da PassMúsica e que atualmente se cifra em € 2.968,38 (€ 2.455,80 + € 512,58) correspondente ao capital em dívida e aos juros de mora vencidos e, bem assim, os juros de mora vincendos à taxa supletiva legal sucessivamente em vigor, desde 17 de Novembro de 2022 (data da distribuição da presente ação em Tribunal) até efetivo e integral pagamento;
d) deve a Ré ser condenada no pagamento da remuneração de acordo com as tabelas tarifárias da Autora, que vigoraram para 2018, por contrapartida do respetivo licenciamento da PassMúsica e que atualmente se cifra em € 3.832,54 (€ 3.281,28+ € 551,26) correspondente ao capital em dívida e aos juros de mora vencidos e, bem assim, os juros de mora vincendos à taxa supletiva legal sucessivamente em vigor, desde 17 de Novembro de 2022 (data da distribuição da presente ação em Tribunal) até efetivo e integral pagamento;
e) deve a Ré ser condenada no pagamento da remuneração de acordo com as tabelas tarifárias da Autora, que vigoraram para 2019, por contrapartida do respetivo licenciamento da PassMúsica e que atualmente se cifra em € 3.738,90 (€ 3.316,40+ € 422,50) correspondente ao capital em dívida e aos juros de mora vencidos e, bem assim, os juros de mora vincendos à taxa supletiva legal sucessivamente em vigor, desde 17 de Novembro de 2022 (data da distribuição da presente ação em Tribunal) até efetivo e integral pagamento
f) deve a Ré ser condenada no pagamento da remuneração de acordo com as tabelas tarifárias da Autora, que vigoraram para 2021, por contrapartida do respetivo licenciamento da PassMúsica e que atualmente se cifra em € 2.629,09 (€ 2.522,44 + € 106,65) correspondente ao capital em dívida e aos juros de mora vencidos e, bem assim, os juros de mora vincendos à taxa supletiva legal sucessivamente em vigor, desde 17 de Novembro de 2022 (data da distribuição da presente ação em Tribunal) até efetivo e integral pagamento
g) deve a Ré ser condenada no pagamento da remuneração de acordo com as tabelas tarifárias da Autora, que vigoram para 2022, por contrapartida do respetivo licenciamento da PassMúsica e que atualmente se cifra em € 2.532,57 (€ 2.522,44 + € 10,13) correspondente ao capital em dívida e aos juros de mora vencidos e, bem assim, os juros de mora vincendos à taxa supletiva legal sucessivamente em vigor, desde 17 de Novembro de 2022 (data da distribuição da presente ação em Tribunal) até efetivo e integral pagamento;
h) deve a Ré ser condenada a pagar à Autora a quantia de 2.000,00 € (dois mil euros) devida a título de indemnização arbitrada pelos danos não patrimoniais causados pela sua conduta omissiva;
i) deve ainda a Ré ser condenada a pagar à Autora a quantia de 2.000,00 € (dois mil euros), correspondente ao ressarcimento dos encargos suportados com a proteção dos direitos lesados pela Ré, bem como, com a investigação e cessação da conduta lesiva da mesma;
Foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu:
A. Julgar improcedente a arguida excepção peremptória da prescrição, por não provada, ao abrigo do disposto nos artigos 498.º, n.º 1 e 3, 306.º, n.º 1, 323.º, n.º 2, e 279.º todos do Código Civil;
B. Condenar a R. ASSOCIAÇÃO ACADÉMICA DA UNIVERSIDADE DO MINHO a reconhecer o direito exclusivo da A. AUDIOGEST – ASSOCIAÇÃO PARA A GESTÃO E DISTRIBUIÇÃO DE DIREITOS de autorizar a utilização/execução pública de fonogramas e/ou videogramas no evento denominado “Recepção ao Caloiro”;
C. Condenar a R. ASSOCIAÇÃO ACADÉMICA DA UNIVERSIDADE DO MINHO na proibição de utilizar/executar publicamente fonogramas e/ou videogramas no evento denominado “Recepção ao Caloiro”, sem a obtenção do devido licenciamento;
D. Condenar a R. ASSOCIAÇÃO ACADÉMICA DA UNIVERSIDADE DO MINHO a pagar à A. AUDIOGEST – ASSOCIAÇÃO PARA A GESTÃO E DISTRIBUIÇÃO DE DIREITOS as seguintes quantias:
- € 2455,80, acrescida de juros de mora à taxa de 4% (Portaria n.º 291/2003) calculados desde 4/10/2017 até efectivo e integral pagamento;
- € 2132, 83, acrescida de juros de mora à taxa de 4% (Portaria n.º 291/2003) calculados desde 3/10/2018 até efectivo e integral pagamento;
- € 2155,66, acrescida de juros de mora à taxa de 4% (Portaria n.º 291/2003) calculados desde 3/10/2019 até efectivo e integral pagamento;
- € 1639,59, acrescida de juros de mora à taxa de 4% (Portaria n.º 291/2003) calculados desde 16/10/2022 até efectivo e integral pagamento;
- € 1000,00.
E. Absolver a R. do demais contra si peticionado;
F. Condenar A. e R. nas custas devidas, na proporção dos respectivos decaimentos, fixando-se em 53% para a A. e 47% para a R., sem prejuízo da isenção de que a primeira beneficia.
Inconformada com a sentença dela veio apelar a autora, AUDIOGEST – Associação para a Gestão e Distribuição de Direitos, formulando após motivação as seguintes conclusões:
1. O presente recurso foi interposto pela Autora Audiogest – Associação Para a Gestão e Distribuição de Direitos, ora Apelante, da douta sentença, proferida em 2 de Setembro de 2024, que julgou parcialmente procedente a ação declarativa acima identificada condenando a Ré a reconhecer à Autora o direito exclusivo, relativamente ao reportório que representa, de autorizar a utilização/execução pública de fonogramas/videogramas, no evento denominado “Receção ao Caloiro”, bem como, na proibição de utilizar/executar publicamente fonogramas/videogramas, no referido evento, enquanto não obtiver junto da mesma o licenciamento e ainda no pagamento à Autora das quantias de €2.455,80, €2.132,83, €2.155,66 e € 1.639,59 acrescidos, respetivamente, de juros de mora à taxa legal supletiva em vigor desde 04.10.2017, 03.10.2018, 03.10.2019 e 16.10.2022, respetivamente, até integral pagamento, bem assim no montante de € 1.000,00, absolvendo a Ré do demais peticionado.
2. O recurso merece – com o devido respeito – inteiro provimento, pois que a decisão do Mmo. a quo, de julgar parcialmente procedente a pretensão indemnizatória da Autora, no que concerne ao pedido formulado quanto à indemnização patrimonial (remuneração devida) fixando-as, no que diz respeito aos licenciamentos referentes a 2018, 2019 e 2022, nos montantes de € 2.132,83, € 2.155,66 e € 1.639,59, respetivamente, não foi, na perspetiva da Autora, ora apelante, e com o devido respeito, a mais acertada.
3. Desde logo, a decisão do Mmo. Juiz a quo, contida na douta sentença recorrida, teve (na ótica da Apelante) por base uma, uma errada interpretação dos preceitos legais aplicáveis em face daquela.
4. Quer o direito de autor, quer os direitos conexos assumem a veste de direitos absolutos e exclusivos, pois da sua natureza resulta imediatamente a faculdade de “impedir” ou de “autorizar/proibir” uma dada utilização por terceiros.
5. São, pois, direitos dotados de eficácia erga omnes, à qual, corresponde um dever geral de abstenção (obrigação passiva universal) de quaisquer atos que ponham em causa a atribuição do “exclusivo de exploração”.
6. Sendo esta a justificação dogmática e legal da atribuição do direito de remuneração aos titulares de direito de autor e direitos conexos.
7. Atendendo à factualidade dada como provada, resultou que a Ré, ora apelada, comunicou/executou publicamente, no período em causa nos autos, fonogramas, cuja gestão pertencia à Autora, no evento denominado “Receção do Caloiro” sem autorização ou licenciamento desta para o efeito e sem lhe liquidar qualquer remuneração em virtude da mesma - sendo essa violação fonte de responsabilidade civil.
8. Estando ciente, pelo menos desde 2017, quer das condições/termos para obter o licenciamento, quer da circunstância de não se encontrar autorizada/licenciada para proceder (como procedeu) à comunicação/execução pública de fonogramas e/ou videogramas no evento em questão, determinando-se, ainda assim, a fazê-lo.
9. Pelo que, como bem sustentou o Mmo. a quo, se encontram reunidos, in casu, os pressupostos da responsabilidade civil da Ré (atuação ilícita, culposa, dolosa e que provocou danos) e verificada a sua obrigação de indemnizar a Apelante.
10. Acresce que, o valor peticionado a título de indemnização por danos patrimoniais correspondia à única contraprestação possível e o único meio idóneo de que a Ré, poderia lançar mão para evitar a produção do dano patrimonial na esfera jurídica da Apelante.
11. Assim, mostra-se forçoso concluir que o incumprimento daquela mesma obrigação terá de conduzir, necessariamente, a uma indemnização de valor superior (ou, no mínimo, equivalente) ao valor correspondente àquele que seria devido se a obrigação tivesse sido cumprida.
12. Donde decorre que o pagamento de uma indemnização (nos exatos termos em que foram peticionados) configura, pois, a única via possível de reparação dos danos patrimoniais sofridos pela Apelante.
13. Sendo tal indemnização (assim quantificada) a única que permite recolocar a Apelante na situação em que estaria se não tivessem ocorrido os danos alegados e comprovados na ação.
14. Acresce que, sem prejuízo de, in casu, se chamar à colação as regras gerais relativas aos pressupostos da responsabilidade civil e os critérios de determinação do dano como conteúdo da obrigação de indemnizar, mostra-se determinante atender aos critérios indemnizatórios fixados no artigo 211º do CDADC.
15. Este normativo legal, introduzido no CDADC em resultado da transposição para o ordenamento jurídico nacional da Diretiva Comunitária nº 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril (denominada Directiva Enforcement), consagrou, de acordo com a doutrina nacional, um princípio de adequação entre o montante da indemnização e o prejuízo (o que permite uma maior flexibilidade da determinação do montante da obrigação de indemnização).
16. Deste modo, admitindo-se um recurso mais amplo à responsabilidade civil, aquele consubstanciou-se num «alargamento conceptual do dano, parecendo “promover um afastamento da teoria da diferença no cômputo do dano e dar relevância a outros critérios no cálculo indemnizatório”, com “a presença de uma forte dimensão sancionatória».
17. Acrescendo que, o carácter absoluto e exclusivo do direito da Apelante, bem como, a sua eficácia erga omnes, faz impender junto dos utilizadores, in casu, a Ré, uma acrescida exigência quanto a um elevado grau de averiguação das circunstâncias que inibem ou limitam o uso de tais obras/prestações intelectuais.
18. Por outro lado, com o devido respeito, a Ré, ao contrário do sustentado pela Mmo. a quo., voluntária e conscientemente, tendo todos os elementos e dados para efetuar o pagamento dos licenciamentos em questão optou, voluntaria e conscientemente, por não o fazer, em momento algum.
19. Sendo que, em face da recusa de licenciamento por parte da Apelante perante o não pagamento da remuneração devida, também não logrou alegar ou demonstrar que tivesse encetado quaisquer outras diligências que não a execução pública não autorizada de fonogramas, persistindo na sua conduta delituosa “cuja intensidade dolosa tem que se reputar como crescente em relação a cada ano que sucede”.
20. Tendo a Apelante base e fundamentos jurídicos para recusar as (vãs e vazias) solicitações de licenciamento da Ré, consubstanciando nas suas sucessivas recusas o exercício de um legítimo direito por parte daquela - quer ao abrigo do disposto no artigo 6º do Decreto-Lei nº 166/2013, de 27 de Dezembro , quanto aos licenciamentos de 2018 e 2019, quer ao abrigo do disposto no artigo 428º CC , quanto ao licenciamento de 2022 -, inexiste também qualquer abuso da sua parte como demonstrado e provado nos autos.
21. Como aliás, nesse sentido, já se pronunciou, e.g., o Acórdão da Relação de Lisboa, datado de 21.01.2016 [Processo nº 99/15.5YHLSB-L1-2, Relator: EZAGÜY MARTINS, disponível em www.dgsi.pt] no qual se prescreve que “Integra causa justificativa da recusa, por Entidade de Gestão Coletiva de Direitos de artistas e produtores de fonogramas/videogramas, do licenciamento para a execução pública de fonogramas produzidos pelos seus representados, a existência de débitos vencidos e não liquidados referentes a anteriores períodos em que tal execução teve lugar sem prévia autorização”.
22. Sem que nunca a Apelante tivesse recusado qualquer pagamento que a Ré eventual e efetivamente pretendesse concretizar, a verdade é que a mesma nunca teve intenção de o fazer (não obstante ter todas as condições e conhecimento para o efeito) sempre optando, pelo contrário e conscientemente, por utilizar, como se fossem seus, os direitos de terceiros - perpetuando assim a violação dos direitos da Apelante.
23. Pelo que, atento todo o histórico e as disposições legais aplicáveis, com o devido respeito, mostra-se incompreensível como se poderá entender, como sustenta a Mmo. a quo. que, ao não emitir para os anos de 2018, 2019 e 2022 os respetivos avisos de licenciamento e ao recusar as solicitações da Ré quanto ao licenciamento anual, a Apelante “contribuiu de forma juridicamente relevante para a verificação dos danos, havendo, pois, concorrência entre a culpa do lesante e a culpa do lesado” e bem assim que a sua “culpa” seja correspondente a 35%.
24. Pois, impor uma obrigação à Apelante, como sugere a Mmo. a quo. de emitir licenciamentos para períodos determinados sem pagamento de períodos anteriores, seria, com o devido respeito, quase um incentivo à continuação do comportamento da Ré de violação dos direitos dos representados da Apelante em períodos alternados e assim ir conseguindo funcionar com pagamentos muito parcelares e, igualmente, alternados.
25. Criando-se, deste modo, por via judicial, uma licença compulsiva o que não se mostra admissível.
26. Conduzindo, inevitavelmente, também, a que a Apelante fosse obrigada não só a violar as suas regras e condições gerais de licenciamento que aplica, de forma generalizada e indiferenciada, a todos os utilizadores da música cuja gestão lhe cabe, como também, em consequência do mesmo, a violar normas concorrenciais a que se encontra sujeita.
27. Colocando-se, inclusive a Ré numa circunstância em que teria de liquidar um valor de remuneração inferior àquela que os utilizadores que diligente e em estrito cumprimento da lei, ao terem, previamente à utilização, obtido a respetiva autorização para a comunicação/execução pública de fonogramas, tiveram de liquidar.
28. Deste modo, admitir-se que a Ré indemnizasse a Autora apenas pelo valor a que foi condenada na douta sentença, seria iníquo, na medida em que a colocaria em melhor posição que os seus concorrentes cumpridores, premiando-se as entidades prevaricadoras, beneficiando-as, sem qualquer causa que o justifique, face às concorrentes cumpridoras (bem como se sustenta na jurisprudência nacional, estar-se-ia a promover o incumprimento generalizado das obrigações por parte de todas as entidades obrigadas a obter o licenciamento em questão), mas também, assim desconsiderando e desvirtuando, de igual modo e de forma total, a natureza de tais direitos intelectuais consubstanciada no “exclusivo de exploração”.
29. Posição esta que, com o devido respeito e s.m.o., contraria todos os princípios éticos subjacentes à obrigação de indemnizar, bem como as regras (específicas) fixadoras da indemnização in casu, bem como, a sua tríplice vertente ou natureza, como é defendido de forma unânime, entre nós, pela jurisprudência e doutrina.
30. Efetivamente, ao fixar-se o montante indemnizatório no valor determinado pelo Mmo. A quo., o mesmo não se mostrará por um lado, minimamente reintegrador dos prejuízos sofridos pela Autora, bem como pelo contrário, se revelará compensatório face à postura ilícita da Ré.
31. Na realidade, com o devido respeito, ao assim decidir não se cumpre sequer a ratio do artigo 483º do CC, pois a indemnização fixada na douta sentença não se mostra minimamente equitativa, acabando por desconsiderar, de todo, a existência dos “danos causados”.
32. Ficcionando-se que, não obstante a violação comprovada, reiterada e dolosa de direitos, esta não tinha ocorrido, tudo se passando, como se não houvesse qualquer espécie de censura, ou de ilicitude.
33. Consubstanciando-se num verdadeiro convite à violação dos direitos de autor e dos direitos conexos.
34. Circunstância tanto mais gravosa atendendo ao facto de tal atuação – comunicação/execução pública de fonogramas de forma não autorizada nem licenciada – ter constituído em parte dos anos em causa nos presentes autos crime (público) de usurpação – cfr. os artigo 195º e punido no artigo 197º, ambos do CDADC na redação anterior à Lei n.º 92/2019, de 04 de Setembro -, e ainda constituir, atualmente, uma contraordenação (nos termos do disposto no atual artigo 205º do CDADC) .
35. Sendo que, em face da redação do artigo 211º do CDADC, aplicável in casu, os novos critérios especiais de fixação da indemnização aí estabelecidos incluem um vector típico do enriquecimento sem causa, assim, nos casos de violação de direitos inteletuais não estamos já perante o figurino clássico da responsabilidade civil, mas antes do instituto do enriquecimento sem causa (art.º 473º CC).
36. Sendo que o «julgador […] apenas está limitado pelo mínimo da indemnização, podendo fixá-la acima desse mínimo tomando em consideração eventuais outros valores que considere relevantes. Entre estes vectores poderá estar designadamente a gravidade da infracção e o grau de culpabilidade do agente, numa lógica de “punitive damages”», como aliás já se pronunciou, a este propósito, quer a doutrina, quer a jurisprudência nacional.
37. Deste modo, podendo o montante indemnizatório ser fixado, como mínimo, numa quantia fixa, correspondente valor da remuneração devida por contrapartida do licenciamento, como prescreve a doutrina, sublinhe-se aqui a expressão «no mínimo», pois, por certo, não se quererá que o infrator pague a mesma quantia (ou inferior!) que um utilizador tem de pagar quando obtém a autorização devida. Ou seja, o objetivo dissuasor deverá ser ponderado.
38. Impondo-se, por isso, que a Ré fosse e seja condenada no pagamento de uma indemnização, a qual deverá corresponder, no mínimo, para cada ano de licenciamento in casu, ao valor total peticionado a título de danos patrimoniais.
39. Considerando tudo o exposto, e o mais que, doutamente, será suprido, a decisão recorrida violou, por erro de interpretação e de aplicação, nomeadamente, o disposto nos artigos 6º, 428º, 473º, 483º, 562º, 563º, 564º e 566º do Código Civil, bem como, os artigos 184º, 203º e 211º, todos do Código de Direitos de Autor e Direitos Conexos e os artigos 13º da Diretiva 2004/48/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos, há que apreciar e decidir.
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II. Questões a decidir
Nos termos dos artigos 635.º, nº4 e 639.º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial. Esta limitação objectiva da actuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (artigo 5.º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.
Assim, sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, a única questão a decidir é se a sentença incorreu em erro de julgamento no que respeita à repartição de responsabilidade na produção dos danos (concorrência de culpa do lesado).
*
III. Fundamentação
III.1. Os factos
Na sentença foram considerados provados os seguintes factos:
A. A Autora foi constituída por escritura pública lavrada no 12.º Cartório Notarial de Lisboa, em 26 de Novembro de 2002, e é uma pessoa colectiva privada, associação de utilidade pública, sem fins lucrativos, com o seguinte objecto e atribuições (cfr. documento 1 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais):
Artigo 3.º
(Objecto e Âmbito Territorial)
1. A Associação tem por objecto a cobrança, a gestão, incluindo a negociação e publicação de tarifários, e a distribuição dos direitos de autor e direitos conexos dos produtores fonográficos nacionais ou estrangeiros sedeados ou não no território Português, abrangendo designadamente, sem limitação, as seguintes categorias e formas de exploração:
a) Os direitos autorais - designadamente de concepção, produção, guião ou texto, cenários e adereços, guarda-roupa e realização, com excepção dos direitos autorais sobre a tetra e a música - e os direitos conexos referentes às obras audiovisuais, concebidas com o objectivo de ilustrar visualmente qualquer peça musicai, destinadas a ser exibidas ou difundidas, cuja gestão seja cometida pelos produtores fonográficos à Associação;
b) Os direitos conexos relativos à difusão e execução pública, por qualquer meio, de fonogramas editados comercialmente;
c) Os direitos conexos relativos à reprodução de fonogramas, parcial ou total, de carácter efémero ou permanente, efectuada com o objectivo de permitir ou facilitar a execução pública ou a difusão, por qualquer meio, de obras neles incorporadas, desde que a -atribuição aos produtores dos respectivos fonogramas de uma compensação ou remuneração como condição ou contrapartida daquelas reproduções não seja legalmente excluída;
d) A cobrança, gestão e distribuição de direitos conexos relativos às utilizações livres de fonogramas previstas no Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, desde que tal utilização esteja sujeita a remuneração ou compensação a atribuir aos produtores de fonogramas nos termos da lei;
e) O direito à remuneração pela cópia privada da titularidade dos produtores de fonogramas, previsto no artigo 82.º do "Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos e na Lei 62/98, de 1 de Setembro.
2. São ainda atribuições da associação:
a) Promover e apoiar o combate da contrafacção e usurpação de fonogramas e incentivar a aquisição de fonogramas originais;
b) Promover a realização de estudos de mercado sobre os fonogramas
executados e difundidos nos diversos meios de comunicação, bem como sobre os fonogramas vendidos no mercado nacional;
c) Promover a realização de quaisquer estudos de opinião, ou estatísticos sobre as preferências e hábitos de consumo de produtos culturais.
3. No desenvolvimento da sua actividade a Associação poderá, nomeadamente:
a) Celebrar acordos com associações representativas de outras classes de titulares de direitos com vista à cobrança e gestão conjuntas de direitos autorais e direitos conexos;
b) Celebrar acordos de reciprocidade com associações estrangeiras, representativas de titulares de direitos conexos, com vista â cobrança de direitos de produtores nacionais no estrangeiro e de produtores estrangeiros no território nacional.
4. A Associação exerce a sua actividade em todo o território nacional e para todas as utilizações de obras que tenham origem no território nacional.
(…)
B. A Autora e GDA - Cooperativa de Gestão dos Direitos dos Artistas, Intérpretes e Executantes, C.R.L., encontram-se registadas na IGAC (Inspecção Geral das Actividades Culturais) – cfr. documentos 2 e 3 juntos com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por reproduzidos para todos os efeitos legais.
C. A A. está também mandatada pela GDA – Cooperativa de Gestão dos Direitos dos Artistas Intérpretes ou Executantes, CRL para promover o licenciamento e cobrança das remunerações devidas aos artistas, intérpretes e executantes (cfr. documento 4 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
D. Em parceria com a GDA, a A. emite uma licença com a referência “PassMúsica”, que identifica o licenciamento conjunto de direitos conexos dos artistas, intérpretes e executantes e produtores fonográficos/videográficos, habitualmente designados por “editores discográficos” (cfr. documento 5 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
E. Na sua actividade de licenciamento e cobrança de direitos conexos de produtores e artistas, a Autora representa o seguinte repertório nacional e estrangeiro, cfr. documento número 6 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais:
 
F. Por carta registada enviada para a R., datada de 15 de Maio de 2017 e entregue no dia 16/05/2017, junta como doc. 8 com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, a A. comunicou, designadamente, que:

(…)
G. No dia 4 de Outubro de 2017, durante o evento denominado “Recepção ao Caloiro”, organizado pela R. e aberto ao público, executaram-se os seguintes fonogramas (cfr. relatório junto como doc. 7 e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais):

H. Correu termos no Juiz 3 deste Juízo o processo n.º 402/17.3YHLSB, entrado em juízo em 12 de Outubro de 2017 por, na realização do evento (Enterro da Gata 2017), ter sido utilizada pela R. música gravada (fonogramas musicais) sem que a mesma obtivesse a respectiva licença, tendo sido celebrada uma transacção judicial em 26/11/2018 (cfr. documentos n.º 9 e 10 juntos com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
I. A Autora, por carta datada de 15 de Maio de 2018, cfr. documento 11 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, a A. comunicou à R., designadamente, que:
Exmo(s). Senhor(es),
A AUDIOGEST e GDA, as Entidades que representam, respectivamente, Produtores musicais e Artistas (intérpretes ou executantes), actuando conjuntamente sob a referência ‘PASSMÚSICA", dirigem-se a V. Exa. com o objetivo de informar a necessidade e obrigatoriedade de obter o Licenciamento PassMúsica.
O seu evento denominado “Evento de Gata 2017" foi visitado pelos nossos colaboradores, tendo sido verificada a comunicação/ execução pública de Fonogramas, Vídeos musicais e/ ou Karaoke, cujos Direitos são por nós representados. Após a visita efetuada ao eventoe do envio desta carta, acreditamos que a sua decisão será ponderada no sentido de legalizar a utilização de música. A Licença da PASSMÚSICA é obrigatória e sem ela pode estar a incorrer num crime de usurpação.
A utilização de música gravada, vídeos musicais e/ ou karaoke, em estabelecimentos ou em quaisquer outros espaços públicos, independentemente do formato em que a mesma é utilizada (CD's originais, MP3‘s legais, ficheiros de computador, ou outros formatos legais), sem a respetiva autorização de Produtores e Artistas, viola a Lei, nomeadamente o artigo 184.º, n.ºs 2 e 3 do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos (CDADC). Essa violação, além de ser fonte de responsabilidade civil, poderá constituir crime de usurpação (Cfr. artigos 195.º e 197.º do mesmo Código) punível com pena de prisão até 3 anos e multa de 150 a 250 dias.
A Licença PassMúsica, criada pela AUDIOGEST e pela GDA, representa a autorização destas duas Entidades para a utilização da música gravada, vídeos musicais e/ou karaoke, integrados no seu vastíssimo reportório nacional e estrangeiro. A Licença da PASSMÚSICA representa assim a totalidade do mercado organizado, pelo que todas as formas de utilização de gravações musicais carecem da respetiva autorização, bem como do pagamento da respetiva licença (de acordo com a Legislação nacional e as respetivas normas europeias em vigor).
A AUDIOGEST e a GDA são Entidades de Gestão Coletiva de Direitos, dotadas de utilidade pública, legalmente inscritas e reconhecidas pela IGAC (Inspeção Geral das Atividades Culturais) tendo, através da PASSMÚSICA, legitimidade para cobrar Direitos Conexos junto dos utilizadores que procedam à execução pública de música gravada, vídeos musicais e/ ou karaoke.
Com vista à obtenção do licenciamento voluntário, aguardamos o contacto de V, Exa(s), para o nosso Departamento de Licenciamento no prazo máximo de 3 dias, evitando a interposição de Acções judicias, assim como a fiscalização das Policias ou Entidades competentes (ASAE, IGAC, PJ, PSP, GNR, Polícia Marítima, Polícia Municipal, entre outras) e as inevitáveis consequências legais, civis e criminais que daí advêm.
Adicionalmente informamos que a obtenção da Licença PassMúsica não anula sem substitui a necessidade de obtenção da licença da SPA (Cfr Art.º 177 do CDAOC).
Para mais informações visite o nosso site em www.passmusica.pt (onde também encontrará toda a informação sobre o licenciamento, os nossos Tarifários, Formulários e Pedidos de Licenciamento) ou contactemos através do número 213 137 640, entre as 09:30h e as 18:00b.
Resta-nos reafirmar que, na ausência do seu contacto para Licenciamento no prazo supra referido, a AUDIOGSST e a GDA utilizarão os procedimentos Legais ao seu dispor para por cobro ao incumprimento de V. Exa(s), e/ou exigir o ressarcimento dos danos causados.
(…)
J. Para poder proceder, em 2018, à comunicação/execução pública, no evento “Recepção ao Caloiro 2018”, a realizar no Pavilhão Multiusos de Guimarães, Alameda Cidade de Lisboa, 481, de fonogramas do repertório entregue à gestão da Autora, a Ré, em 27 de Setembro de 2018, solicitou, junto daquela o licenciamento “PassMúsica”, declarando que, no evento em causa, seriam utilizados fonogramas cuja gestão cabe à Autora (“música ambiente gravada não incluída no espectáculo/evento”), bem como que aquele se tratava de um “Festival de música, Dança e Multimédia, “Disco & Rave parties”, a realizar entre os dias 3 a 6 de Outubro de 2018, entre as 22h e as 06h – conforme documento 12 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais .
K. Nas regras e condições gerais de licenciamento PassMúsica – cfr. ponto 9.1 - consta que “considera-se que, num determinado evento, aberto ao público ou de acesso reservado, a Execução/Comunicação Pública do Reportório assume carácter essencial sempre que exista […] um espetáculo ou atuação artística (DJ)…”, cfr. documento n.º 14 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
L. Do ponto 2.4 das regras e condições gerais de licenciamento PassMúsica, cfr. documento n.º 14 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais consta, designadamente, que:
O serviço de Licenciamento PassMúsica reserva o direito de recusar e devolver o pedido de licenciamento sempre que:
(…)
O Utilizador se encontre em situação de comprovado incumprimento, anterior à formulação do pedido de licenciamento e se recuse a regularizar a situação pretérita.
(…)
M. No dia 3 de Outubro de 2018, durante o evento denominado “Recepção ao Caloiro”, organizado pela R. e aberto ao público, executaram-se os seguintes fonogramas (cfr. relatório junto como doc. 14-A e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais):

N. O referido evento teve a actuação de diversos DJ´s, e inclusivamente a presença de DJ´s residentes (cfr. conforme documento 13 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
O. Em 2019, proceder à comunicação/execução pública, no referido evento denominado Recepção ao Caloiro 2019, a realizar no Pavilhão Multiusos de Guimarães, Alameda Cidade de Lisboa, 481, em Guimarães, de fonogramas do repertório entregue à gestão da Autora, a Ré, em 23 de Setembro de 2019, solicitou, junto daquela, enquanto entidade de gestão colectiva, o licenciamento “PassMúsica”, declarando que no evento em causa seriam utilizados fonogramas cuja gestão cabe à Autora (“fonogramas e/ou vídeos musicais: Música essencial [e] “música ambiente gravada não incluída no espetáculo/evento”) bem como, que aquele se tratava de um “Festival de música, Dança e Multimédia, “Disco & Rave parties”, a realizar entre os dias 02 a 05 de Outubro de 2019, entre as 22h e as 06h, conforme documento 15 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
P. No dia 3 de Outubro de 2019, durante o evento denominado “Recepção ao Caloiro”, organizado pela R. e aberto ao público, executaram-se os seguintes fonogramas (cfr. relatório junto como doc. 15-A e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais):

Q. A Ré, em 29 de Outubro de 2021, remeteu à Autora o pedido de licenciamento “PassMúsica”, referido que no evento denominado Recepção ao Caloiro 2021 seriam utilizados fonogramas cuja gestão cabe à Autora (“fonogramas e/ou vídeos musicais: Música essencial [e] “música ambiente gravada não incluída no espetáculo/evento”), bem como que um “Festival de música, Dança e Multimédia, “Disco & Rave parties” iria realizar-se no Pavilhão Multiusos de Guimarães, Alameda Cidade de Lisboa, 481, em Guimarães, entre os dias 3 a 6 de Novembro de 2021, entre as 22h e as 06h, cfr. documento n.º 18 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
R. Das notas do verso do pedido de licenciamento “PassMúsica” referido supra consta, designadamente, que o licenciamento só ocorre após a liquidação do valor de remuneração correspondente ao pedido de licenciamento apresentado, cfr. documento 18 já referido.
S. O DJ Quim das Remisturas utiliza nos seus sets musicais aquando das suas actuações públicas para fins de execução pública, fonogramas, nomeadamente e a título meramente exemplificativo:

T. No ano de 2022, a Ré, em 7 de Outubro de 2022, remeteu à Autora, o pedido de licenciamento “PassMúsica”, referindo que, no evento denominado Recepção ao Caloiro 2022 seriam utilizados fonogramas cuja gestão cabe à Autora (“fonogramas e/ou vídeos musicais: Música essencial”), bem como que um “Festival de música, Dança e Multimédia, “Disco & Rave parties”, iria realizar-se na Alameda Cidade de Lisboa, 481, em Guimarães, entre os dias 12 a 15 de Outubro de 2022, entre as 22h e as 06h cfr. documento n.º 19 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
U. Na sequência do mesmo, a Autora, ao devolver o referido pedido por não aceite, comunicou à Ré os termos e condições para a obtenção do licenciamento em questão, cfr. documento n.º 20 junto com a petição inicial e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
V. No dia 15 de Outubro e madrugada do dia 16 de Outubro, ambos de 2022, período em que o evento ocorria e se encontrava aberto ao público, estava a ser efectuada a execução pública de fonogramas (cfr. respetivo relatório de verificação junto como documento número 21 e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais):

W. A R. encontra-se, pelo menos desde 2017, ciente quer das condições/termos para obtenção do licenciamento, quer da circunstância de não se encontrar autorizada/licenciada para proceder à comunicação/execução pública de fonogramas e/ou videogramas no evento em questão.
X. Não podendo a R. desconhecer que o pagamento da remuneração devida era pressuposto prévio e essencial do licenciamento por parte da Autora para o período em causa (com correspondente envio do respectivo título de licenciamento).
Y. Encontrando-se assim a Ré ciente que não se encontrava licenciada para proceder, como procedeu, em todas as situações supra descritas, à execução/comunicação pública de fonogramas.
Z. A Autora fixa e publica os tarifários aplicáveis às várias categorias de direitos conexos e às suas diferentes formas de exploração, cobrados pela mesma, através do licenciamento conjunto com a GDA, identificado com a referência PassMúsica, encontrando-se todos os tarifários disponíveis no site https://www.passmusica.pt/.
AA. Quanto a 2017 [Evento com música essencial, entrada paga, com lotação/capacidade máxima do recinto de até 5.000, que se realizou durante 4 dias (03.10.2017 a 07.10.2017) e no qual foram utilizados fonogramas musicais], a tarifa aplicável de comunicação/execução pública de fonogramas é de €2.455,80 (dois mil, quatrocentos e cinquenta e cinco euros e oitenta cêntimos).
BB. Quanto a 2018 [Evento com música essencial, entrada paga, com lotação/capacidade máxima do recinto de 8.000, que se realizou durante 4 dias (03.10.2018 a 06.10.2018) e no qual foram utilizados fonogramas musicais], a tarifa aplicável de comunicação/execução pública de fonogramas é de € 3281,28 (três mil, duzentos e oitenta e um euros e vinte e oito cêntimos).
CC. Quanto a 2019 [Evento com música essencial, entrada paga, com lotação/capacidade máxima do recinto de 8.000, que se realizou durante 4 dias (02.10.2019 a 05.10.2019) e no qual foram utilizados fonogramas musicais], a tarifa aplicável de comunicação/execução pública de fonogramas é de € 3316,40 (três mil, trezentos e dezasseis euros e quarenta cêntimos).
DD. Quanto a 2021 [Evento com música essencial, entrada paga, com lotação/capacidade máxima do recinto de 4.212, referente a 4 dias (03.11.2021 a 06.11.2021), a tarifa aplicável de comunicação/execução pública de fonogramas é de € 2522,44 (dois mil, quinhentos e vinte e dois euros e quarenta e quatro cêntimos).
EE. Quanto a 2022 [Evento com música essencial, entrada paga, com lotação/capacidade máxima do recinto de 5.000, que se realizou durante 4 dias (12.10.2022 a 15.10.2022), e no qual foram utilizados fonogramas musicais], a tarifa aplicável de comunicação/execução pública de fonogramas é de € 2522,44 (dois mil, quinhentos e vinte e dois euros e quarenta e quatro cêntimos).
FF.A presente acção entrou em juízo no dia 24/11/2022.
GG. Os licenciamentos referidos em J), O) e T) não foram atribuídos pela A. à R. por falta de pagamento de dívidas anteriores.
E foram considerados não provados os seguintes factos:
1. No dia 04 de Novembro de 2021, foram utilizados fonogramas musicais e ocorreu a actuação de diversos DJ´s como é o caso do DJ Quim das Remisturas e DJ´s residentes.
2. A actividade da R. afecta e lesa o bom nome e reputação dos editores discográficos, já que vêem as suas obras, publicamente executadas, sem que, para o efeito tivessem dado autorização para tal.
3. Impedindo-os de exercer, em toda a sua plenitude, e sem restrição de que espécie for, os seus direitos – o referido “exclusivo de exploração” -, nomeadamente, e nos que, igualmente, aqui importa, o de impedir a utilização por terceiros.
4. Autora sofreu um prejuízo decorrente de se tornar do conhecimento público que esta tem que recorrer às vias judiciais para exercer a gestão colectiva dos direitos de que são titulares, pelo que mais nenhum dos utilizadores da licença PassMúsica a pagará de forma voluntária.
5. A fim de exercer os direitos cuja gestão lhe incumbe assegurar, a Autora teve de suportar encargos, não apenas com o recrutamento, selecção e formação de colaboradores, como com as despesas inerentes ao desenvolvimento da actividade de verificação que desenvolve, com o tratamento da informação recolhida e ainda, com as tentativas goradas de obter o cumprimento voluntário das obrigações da Ré.
*
III.2. Do mérito do recurso
A Recorrente entende que a decisão de julgar parcialmente procedente a sua pretensão indemnizatória, no que concerne ao pedido de indemnização formulado, fixando a remuneração devida, no que diz respeito aos licenciamentos referentes a 2018, 2019 e 2022, nos montantes de €2.132,83, €2.155,66 e €1.639,59, respectivamente, padece de erro de julgamento, tendo por base uma errada interpretação dos preceitos legais aplicáveis.
Vejamos.
A sentença concluiu pela verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual da R., Associação Académica da Universidade do Minho, e, quanto aos danos sofridos pela A., Audiogest, no que respeita aos danos não patrimoniais, que “não resultaram provados os correspondentes factos, tendo sido utilizadas pela A. fórmulas conclusivas e genéricas insusceptíveis de confirmação judicial. Além disso, sempre faltaria magnitude, relevância e negatividade bastantes que permitisse concluir pelo merecimento da tutela do direito, pelo que, a pretensão da A., nesta sede, falece”; que, face aos elementos constantes dos autos, é “justo e adequado fixar a indemnização por encargos em €1000,00”; e, quanto aos restantes danos patrimoniais, o seguinte:
“Quanto ao ano de 2017, o valor corresponde a € 2455,80 (facto AA)).
Já quanto aos restantes anos (vide factos BB) a EE)), tendo sido fixada a repartição de culpas em 65% para a R. e 35% para a A., temos que a R. será condenada no pagamento à A. dos seguintes valores:
- 2018: € 2132,83;
- 2019: € 2155,66 e
- 2022: € 1639,59.
Ao referido valor, acrescerão juros de mora, contados desde as respectivas datas dos factos ilícitos (4/10/2017, 3/10/2018, 3/10/2019 e 16/10/2022), nos termos conjugados dos artigos 804.º, n.º 1 e 2 e 805.º, n.º 3 ambos do Código Civil.”.
Entendeu-se também na sentença que a conduta da Audiogest – ao não conceder a licença à R. depois de esta a solicitar, nos anos 2018, 2019 e 2022 - contribuiu de forma juridicamente relevante para a verificação dos danos, existindo, assim, concorrência entre a culpa do lesante e a culpa do lesado, que se fixou em 35% para a A, aqui Recorrente e 65% para a R., a Associação Académica da Universidade do Minho.
Escreveu-se na fundamentação:
“ (…) a lei actualmente não consagra disposição expressa que preveja a recusa em contratar (para além do que resulta da aplicação do princípio da autonomia privada).
Neste contexto, não é indiferente a natureza jurídica da A., que é uma pessoa colectiva de utilidade pública, nos termos do artigo 30.º, n.º 1 da Lei n.º 36/2021 e respectivo anexo III, al. j), a qual prossegue, nomeadamente, fins de interesse geral, regional ou local e que coopera, nesse âmbito, com a administração central, regional ou local – artigo 4.º, n.º 1 da citada lei.
Além disso, nos termos do artigo 16.º Lei n.º 26/2015, de 14 de Abril que regula as Entidades de Gestão Coletiva do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, estão vinculadas ao direito da concorrência, sendo-lhe subsidiariamente aplicável a legislação sobre associações, cooperativas e sociedades comerciais, consoante a respetiva natureza jurídica – artigo 17.º da citada Lei.
Ora, o artigo 11.º, n.º 1 da Lei n.º 19/2012, de 8 de Maio dispõe que é proibida a exploração abusiva, por uma ou mais empresas, de uma posição dominante no mercado nacional ou numa parte substancial deste, prevendo o n.º 2 do citado normativo diversas condutas consideradas abusivas, nenhuma delas aplicável aos nossos autos. Não obstante, uma vez que é aí utilizado o advérbio “nomeadamente”, fácil é concluir que o normativo em causa não é taxativo pelo que comportamento abusivo censurado e interditado pela norma pode assumir outras apresentações que não as indicadas nas diversas alíneas do n.º 2 desse artigo.
No nosso caso, e sendo indiscutível o papel atribuído à A. para a defesa dos direitos de autor e de direitos conexos, o que é inclusivamente de reconhecido interesse geral, actuando em cooperação com a Administração do Estado, a verdade é que não se nos afigura que tenha a liberdade – como teria um mero privado - de, nessa qualidade de pessoa colectiva de utilidade pública, se recusar a contratar por existência de dívidas anteriores.
É que, inexistindo outra entidade que conceda as licenças em causa, pode-se afirmar que a A. detém o seu monopólio. Por outro lado, beneficia do estatuto de utilidade pública, o que lhe confere os benefícios previstos na lei, tendo como pressuposto que actua na prossecução de um interesse geral. Como tal e por isso, não tendo a obrigação nem o dever jurídicos de emitir as licenças de emissão pública de música, tem o ónus de o fazer, desde que receba a contrapartida devida e nada mais. E é no desrespeito deste ónus que reside a sua contribuição para o resultado verificado, o da reprodução de fonogramas desacompanhada do licenciamento a emitir pela A.
É, assim, com os referidos fundamentos que conclui este Tribunal pela existência de culpa do lesado, pois que a conduta deste contribuiu de forma juridicamente relevante para a verificação dos danos, havendo, pois, concorrência entre a culpa do lesante e a culpa do lesado.” – destaques nossos.
É nesta parte que a Recorrente entende que a sentença incorreu em erro de Direito.
A sentença considerou que, estando as EGC vinculadas, nos termos do 16.º da Lei n.º 26/2015, de 14 de Abril, ao direito da concorrência, é abusiva a sua recusa em contratar com a R. com fundamento na existência de dívidas anteriores, configurando essa conduta um abuso de posição dominante integrável no elenco não taxativo do art.º 11.º da Lei n.º 19/2012, de 08 de Maio, diploma que estabelece o regime jurídico da concorrência. Por outro lado, inexistindo outra entidade que conceda as licenças em causa, considerou poder afirmar-se que detém o seu monopólio. Pelo que, e beneficiando do estatuto de utilidade pública, que pressupõe que actua na prossecução de um interesse geral, embora não tenha a obrigação e o dever jurídicos de emitir a licença em causa, tem esse ónus, desde que receba a contrapartida devida pela licença requerida.
Em suma, entendeu-se na sentença que o ónus incumprido pela Recorrente, de contratar com a Recorrida, concedendo-lhe a licença requerida desde que paga a contrapartida monetária - e que fundamentou o estabelecimento de uma concorrência de culpas, do lesante mas também do lesado, nos termos do art.º 570.º do Código Civil – resulta do facto de ter uma posição dominante no mercado, de monopólio, e do seu estatuto de utilidade pública.
Vejamos.
A Audiogest e a GDA são entidades de gestão colectiva (na definição do art.º 2.º, al. b) da Lei n.º 26/2015, de 14 de Abril, uma entidade autorizada por lei, por transmissão, licença ou qualquer outra disposição contratual, a gerir direitos de autor ou direitos conexos em nome de mais do que um titular de direitos, para benefício colectivo desses titulares de direitos como finalidade única ou principal, e que é detida ou controlada pelos seus membros e/ou não tem fins lucrativos) dos direitos conexos dos produtores fonográficos e dos artistas, intérpretes e executantes, respectivamente.
Gerem os direitos (patrimoniais) conexos de que são titulares os produtores e os artistas que representam – v.g. os produtores das obras identificadas nos pontos G, M, P, S e N da matéria de facto provada e que foram objecto de execução pública nos eventos promovidos pela Recorrida em 2017, 2018, 2019, 2020 e 2022.
Como consta do facto provado A, nos termos do n.º 1 dos respectivos Estatutos, a Recorrente tem por objecto a cobrança, a gestão, incluindo a negociação e publicação de tarifários, e a distribuição dos direitos de autor e direitos conexos dos produtores fonográficos nacionais ou estrangeiros sedeados ou não no território Português, abrangendo designadamente, sem limitação, as categorias e formas de exploração previstas nas al.s a) a e) do referido n.º1.
Sublinhe-se que o objecto das entidades de gestão do direito de autor e dos direitos conexos está definido no art.º 3.º da Lei n.º 26/2015 de 14 de Abril: 1 - As entidades de gestão coletiva têm por objeto:
a) A gestão dos direitos patrimoniais que lhes sejam confiados;
b) As atividades de natureza social e cultural que beneficiem coletivamente os titulares de direitos por elas representados, bem como a defesa, promoção, estudo e divulgação do direito de autor e dos direitos conexos e da respetiva gestão coletiva.
2 - As entidades de gestão coletiva, quando os seus estatutos assim prevejam, podem exercer e defender os direitos morais dos seus representados desde que estes o solicitem.
Dispondo de autonomia, nos termos do art.º 4.º da referida Lei, “escolhem livremente o objeto da sua atividade e prosseguem autonomamente a sua ação, em respeito dos estatutos e da lei”.
De acordo com os factos B a D, a Recorrente está mandatada pela GDA - Cooperativa de Gestão dos Direitos dos Artistas Intérpretes ou Executantes, CRL para promover o licenciamento e cobrança das remunerações devidas aos artistas, intérpretes e executantes; emitindo, em parceria, uma licença com a referência “PassMúsica”, que identifica o licenciamento conjunto de direitos conexos dos artistas, intérpretes e executantes e produtores fonográficos/videográficos.
O interesse geral referido na sentença não reside na prossecução destas atribuições e sim nas que estão previstas no n.º2 dos Estatutos da Recorrente: a) Promover e apoiar o combate da contrafacção e usurpação de fonogramas e incentivar a aquisição de fonogramas originais; b) Promover a realização de estudos de mercado sobre os fonogramas executados e difundidos nos diversos meios de comunicação, bem como sobre os fonogramas vendidos no mercado nacional; c) Promover a realização de quaisquer estudos de opinião, ou estatísticos sobre as preferências e hábitos de consumo de produtos culturais.
Na concessão da licença PASSMÚSICA a Recorrente não actua na prossecução de qualquer interesse geral e sim como representante dos seus associados, na gestão dos seus direitos patrimoniais, a quem tem que distribuir a percentagem respectiva dos direitos cobrados pelo licenciamento a que procede no âmbito da gestão que constitui o seu objecto.
Não está demonstrada a existência de qualquer “monopólio”. Cfr. consta do ponto E. da matéria de facto provada, na sua actividade de licenciamento e cobrança de direitos conexos de produtores e artistas, a Recorrente representa o repertório nacional e estrangeiro reproduzido no referido ponto (e doc. 6 junto da petição inicial). E é na gestão colectiva dos direitos conexos dos produtores e dos artistas sobre os fonogramas e prestações artísticas protegidos que integram esse reportório que procede ao licenciamento da sua execução pública.
Também não se vê que exista qualquer abuso de posição dominante no facto de, na gestão dos direitos patrimoniais dos seus representados, a Recorrente recusar emitir uma licença com fundamento na existência de dívidas anteriores. O direito de autorizar é dos titulares dos direitos conexos em questão – que no caso são representados pela Recorrente, que estabeleceu com a GDA esta licença PassMúsica, os seus termos e a tabela de preços. Como já se decidiu no ac. TRL de 21.01.2016 citado pela Recorrente, proc. 99/15.5YHLSB-L1-2, “integra causa justificativa da recusa, por Entidade de Gestão Coletiva de Direitos de artistas e produtores de fonogramas/videogramas, do licenciamento para a execução pública de fonogramas produzidos pelos seus representados, a existência de débitos vencidos e não liquidados referentes a anteriores períodos em que tal execução teve lugar sem prévia autorização”.
Não se equacionou na sentença a possibilidade de a Recorrida diligenciar pela autorização para a execução pública dos fonogramas e das prestações artísticas directamente com os seus produtores e com os artistas, intérpretes e executantes.
Nos termos do art.º 184.º, n.º 1 do CDADC, assiste ao produtor do fonograma ou do videograma o direito exclusivo de fazer ou autorizar, por si ou pelos seus representantes, a execução e comunicação pública dos fonogramas e videogramas. Que produtor daria autorização para essa execução pública se o requerente mantivesse uma dívida decorrente de anterior execução não autorizada?
A Recorrida requereu os licenciamentos referidos em J), O) e T) da matéria de facto provada conhecendo as condições desse licenciamento (cfr. factos provados W e X), designadamente, da regra que consta do facto provado L: que o serviço de licenciamento PassMúsica se reserva o direito de recusar e devolver o pedido de licenciamento sempre que o utilizador se encontre em situação de comprovado incumprimento, anterior à formulação do pedido de licenciamento e se recuse a regularizar a situação pretérita.
O art.º 570.º, n.º1 do Código Civil dispõe que, quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.
De acordo com o n.º 1 do artigo 483.º do Código Civil a culpa consiste num juízo de censura ao agente por ter adoptado a conduta que adoptou, quando de acordo com o comando legal estaria obrigado a adoptar uma conduta diferente.
Ora, não se vê que comando legal impunha à Recorrente que adoptasse uma conduta diferente da recusa do licenciamento pelos fundamentos por que o fez, de acordo com as regras pré-estabelecidas e de que a Recorrida tinha conhecimento quando requereu a emissão da licença.
Na tese da sentença, se a Recorrente tinha o ónus de ter emitido as licenças solicitadas relativas a todos os anos em questão (excluindo 2017), apenas mediante o seu pagamento, a conclusão não seria, então, a de que os danos alegados - a falta de recebimento da contraprestação devida pelos licenciamentos - ocorreram porque não emitiu as licenças e recebeu o pagamento por cada uma delas, sendo ela própria, afinal, a única responsável pela produção desses danos?
Ora, como se decidiu no acórdão de 8.05.2024 desta Secção, proc. 269/22.0YHLSB.L1, “para se concluir pela aplicação do art.º 570.º, teria que se poder assumir que a Recorrente teria violado, com dolo ou negligência, algum dever que lhe impusesse o licenciamento em quaisquer circunstâncias, que a existência de dívidas anteriores era irrelevante para efeitos de concessão de licenciamento ou que a mesma praticou acto ilícito ao denegar a concessão de permissão de exibição pública”.
Não se divisa qualquer dever legal que impusesse o licenciamento em quaisquer circunstâncias. O que a sentença reconhece, sustentando, porém, a existência de um ónus (ou seja, uma responsabilidade ou dever de fazer), que retira do facto de se tratar de uma pessoa colectiva de utilidade pública e, nessa medida, não ter a liberdade de se recusar a contratar com fundamento na existência de dívidas anteriores.
Não é o que resulta do art.º 12.º da Lei n.º 36/2021, de 14 de Junho (lei-quadro do estatuto de utilidade pública), que estabelece os deveres das pessoas colectivas com estatuto de utilidade pública.
Na prática, a consequência da decisão recorrida seria a redução do valor da contraprestação a que os produtores cujos fonogramas foram objecto de execução pública nos eventos da Recorrida teriam direito, valores que seriam distribuídos aos titulares dos direitos pelas EGC que emitem a licença PassMúsica. E, por outro lado, a redução, em 35%, do valor que a Recorrida - uma Associação Académica Universitária, de quem se esperaria que fosse a primeira a reconhecer a importância da tutela dos direitos em causa - teria de pagar pelo normal licenciamento da execução pública a que procedeu nos seus eventos “Festival de música, Dança e Multimédia, “Disco & Rave parties”.
No que se afigura constituir uma insustentável compensação pela reiterada violação dolosa dos direitos conexos em causa, colocando-a ainda numa injustificada posição favorável em relação aos licenciados cumpridores.
O que tudo contraria, desde logo, o espírito do art.º 211.º do Código do Direito de Autor e Direitos Conexos – norma decorrente da transposição da Directiva sobre o Respeito dos Direitos de Propriedade Intelectual – que pretende impedir o infractor de beneficiar da lesão dos direitos, remover o lucro ilícito e os benefícios indevidamente obtidos pelo infractor e evitar que este reitere a sua actividade ilegal – v. Patrícia Akester, Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos Anotado, Almedina, 2017, p. 289.
Não resta senão concluir pela procedência do recurso, devendo a sentença recorrida, na parte impugnada no presente recurso, ser revogada e a Ré/Recorrida ser condenada no pagamento da totalidade das quantias peticionadas pela Autora/Recorrente.
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IV. Decisão
Pelo exposto, acordam em julgar o recurso procedente e revogar a sentença recorrida quanto à condenação que consta do ponto D. do dispositivo, que se substitui pela seguinte condenação da Ré no pagamento à Autora das seguintes quantias:
- €2.455,80, acrescida de juros de mora vencidos à taxa de 4% (Portaria n.º 291/2003) calculados desde 4/10/2017 até efectivo e integral pagamento;
- €3.281,28, acrescida de juros de mora à taxa de 4% (Portaria n.º 291/2003) calculados desde 3/10/2018 até efectivo e integral pagamento;
- €3.316,40 acrescida de juros de mora à taxa de 4% (Portaria n.º 291/2003) calculados desde 3/10/2019 até efectivo e integral pagamento;
- €2.522,44, acrescida de juros de mora à taxa de 4% (Portaria n.º 291/2003) calculados desde 16/10/2022 até efectivo e integral pagamento;
- € 1000,00.
Custas pela Recorrida (art.º 527.º, n.ºs. 1 e 2 do CPC).
***
Lisboa, 24.02.2025
Eleonora Viegas
Carlos M.G.de Melo Marinho
Alexandre Au-Yong Oliveira
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