Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JOÃO GRILO AMARAL | ||
Descritores: | MEDIDAS TUTELARES INTERNAMENTO EM REGIME FECHADO CENTRO EDUCATIVO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 06/03/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO TUTELAR EDUCATIVO | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
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Sumário: | (da inteira responsabilidade do relator) I. As medidas cautelares previstas na LTE são preliminares, apresentando-se como preparatórias da medida definitiva, visando acautelar a averiguação no processo da eventual prática do facto e necessidade educativa do menor, não se confundindo com as medidas tutelares. II. A medida de internamento em regime fechado não se reconduz a uma mera medida contentora ou securitária, determinante do afastamento do menor do seu meio natural de vida. III. O cerne dessa medida encontra-se na necessidade de proporcionar ao menor das condições educativas passíveis de o reconduzir a uma perspectiva de vida conforme às regras socialmente adequadas, visa proporcionar ao menor, por via do afastamento temporário do seu meio habitual e da utilização de programas e métodos pedagógicos, a interiorização de valores conformes ao direito e a aquisição de recursos que lhe permitam, no futuro, conduzir a sua vida de modo social e juridicamente responsável. IV. Se o jovem, a quem foi aplicada a medida cautelar de guarda em centro educativo, revela uma evolução positiva no âmbito desta, tal não obstaculiza à aplicação da medida de internamento em regime fechado, dado que a mudança comportamental do jovem apenas ocorreu, finalmente, quando o mesmo foi afastado da envolvência social em que se encontrava. V. Tal demonstra que esse é o único caminho que poderá obstaculizar a uma permanente radicalização daquele no âmbito de comportamento anti-sociais e logo da manifesta necessidade de uma medida de internamento. VI. A medida tutelar educativa é suscetível de revisão, a requerimento, logo que concluídos três meses a contar do início da execução ou da última revisão; oficiosamente a todo o momento e obrigatoriamente de seis em seis meses; podendo dessa revisão resultar, entre o mais, uma modificação do regime implementado ou da natureza da medida e até a extinção desta. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordaram, em conferência, na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa: I-RELATÓRIO I.1 Pelo Juízo de Família e Menores da Comarca de Cascais – J3, foi proferido acórdão em 29 de Março de 2025, com intervenção da Sra. Juíza de Direito e de dois Juízes Sociais, no âmbito do presente Processo Tutelar Educativo, relativo ao jovem AA, nascido em ... de ... de 2009, aplicando a este a medida tutelar de internamento em centro tutelar educativo, em regime fechado, com a duração de 18 (dezoito) meses. » I.2 Recurso da decisão final Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o jovem AA para este Tribunal da Relação, com os fundamentos expressos na respectiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]: (…) A- O presente Recurso, vem interposto do acórdão que lhe aplicou a medida tutelar de internamento em centro educativo, em regime fechado, pelo período de 18 (dezoito) meses; B- Não contestando a matéria de facto dada como provada, nem tão pouco a gravidade dos factos praticados, até porque os confessou, não pode aceitar a medida, o regime e o tempo aplicado; C- O recorrente, está muito diferente desde que lhe foi aplicada a medida cautelar de internamento em regime fechado, está mais calmo, responsável, consciente dos danos que as suas condutas causaram nos ofendidos, arrependido e determinado a mudar o rumo da sua vida; D- O período que esteve privado da sua liberdade serviu para dar valor à vida que poderia ter e querer recuperá-la e não mais praticar factos contra o direito e danosos para terceiros, a orientação e apoio que teve dos técnicos e demais profissionais, ajudaram-no a centrar-se no que realmente é importante. E- Resulta da decisão que “Desde que ingressou no centro educativo tem vindo a adequar os seus comportamentos, tendo sido registada uma evolução muito positiva quer ao nível dos comportamentos com os demais jovens, quer com a equipa educativa, revelando interesse e empenho no prosseguimento do seu percurso escolar.” F- As finalidades que se visavam atingir com a aplicação de uma medida tutelar de internamento, já foram alcançadas. G- O Tribunal, ao aplicar 18 meses em regime fechado quando o recorrente demonstra que já interiorizou o desvalor das suas condutas e a necessidade de mudar o rumo da sua vida, querendo estudar e agir conforme o direito, cometeu um erro, que pode custar toda a evolução e futuro do recorrente. H- As medidas devem ser proporcionais, necessárias, adequadas e suficientes; I- Dezoito meses é desproporcional para os factos e situação do recorrente. J- E, a necessidade da aplicação da medida de internamento já foi alcançada com a medida cautelar aplicada, em execução há quase 4 meses; K- Também o facto de o avô ter falecido enquanto estava privado da liberdade e o receio de não se poder despedir dele, fê-lo ter ainda mais consciência das consequências do seu comportamento e de não mais querer estar nessa situação; L- O excesso será pernicioso, terá o efeito contrário do que se pretende, pois é gerador de incompreensão, revolta e descaminho; M- Por isso, errou o Tribunal ao aplicar uma medida tutelar institucional, quando uma não institucional é suficiente, servindo as finalidades pretendidas; N- Porém, e caso se entendesse que o internamento seria a única medida capaz de satisfazer as necessidades do recorrente, deveria ter sido aplicado pelo mínimo atendendo a todos os factos acima indicados e ao tempo que já se encontra no centro educativo; O- Tal como aplicar 18 meses, e em regime fechado, é manifestamente desproporcional e desadequado; P- A medida adequada, se não se entender aplicar uma não institucional, sempre o internamento pelo período mínimo e em regime semiaberto; Q- Só não se requerendo o regime aberto, porque tal implicaria mudar de centro educativo, uma vez que onde o recorrente está internado só tem os regimes semiaberto e fechado, onde está devidamente adaptado e inserido; R- Tal mudança poderia ser mais prejudicial para o recorrente, não sendo pelo mesmo desejada; S- Ao não decidir assim, violou o Tribunal o disposto nos artigos 6.º, 7.º, 16.º a 18.º da LTE. Termos em que e, com os mais de direito que resultarão do suprimento de V. Exas., Venerandos Desembargadores, deve ser concedido provimento ao RECURSO alterando-se a medida tutelar aplicada, substituindo-se por outra não institucional ou, caso se entenda manter o internamento, deverá ser aplicado em regime semiaberto e pelo período mínimo admissível (6 meses). Só assim, esse mais alto Tribunal fará JUSTIÇA! (…) * O recurso foi admitido, nos termos do despacho proferido em 31/03/2025, com os efeitos de subir nos próprios autos, imediatamente e com efeito meramente devolutivo. * I.3 Resposta ao recurso Efectuada a legal notificação, o Ministério Público junto da 1ª Instância respondeu ao recurso interposto, pugnando pela sua improcedência, não apresentando conclusões, mas aduzindo[transcrição] (…) i. Quanto à aplicação de medida institucional (…) No presente caso, entendemos que, em consonância com o Acórdão proferido, a única medida adequada e suficiente para educar o jovem AA para o Direito e garantir a sua inserção responsável na comunidade é o internamento em centro educativo. Como resulta da fundamentação do Acórdão ora recorrido, os factos praticados pelo jovem revelam a sua indiferença por valores ético-jurídicos relevantes e insensibilidade pelos efeitos provocados nos ofendidos. Apesar de o jovem ter admitido, sem quaisquer reservas, a prática dos factos, passando a imagem de ter consciência da sua gravidade, permanecem dúvidas sobre se interiorizou verdadeiramente o desvalor da sua conduta ou se está apenas a dizer aquilo que acha que o Tribunal quer ouvir. Tal consideração é suportada pelo Relatório de Perícia à Personalidade que conclui “da avaliação realizada, resulta a elevada probabilidade de o jovem AA se voltar a envolver em situações em que os direitos dos outros não são respeitados, sem que reconheça o desvalor das suas condutas e a necessidade de reparação das mesmas, revelando uma insuficiente internalização do interdito e da lei, como elementos reguladores das relações sociais. Tende a adotar uma postura de suposta adequação, sem que, contudo, revele ter necessidade de refletir e de reparar os comportamentos que vinha adotando, minimizado as consequências dos mesmos. Evidencia acentuada necessidade de educação para o direito, que denotam na necessidade de uma intervenção especializada em meio estruturado e contentor, em regime fechado, de modo a que interiorize valores conformes ao direito e para que adquira recursos e competências pessoais e sociais que possibilitem a construção de uma identidade juridicamente responsável.” Este raciocínio pode, de igual forma, ser transporto para a interpretação do comportamento do jovem no decorrer da medida cautelar. Sabendo que a sua adesão à medida e a alteração do seu comportamento antes do julgamento será devidamente tida em consideração na medida a ser aplicada, o recorrente pode adotar esta postura de suposta adequação e consciencialização das consequências dos seus atos, sem que tal se traduza numa efetiva reflecção e interiorização dos valores ético-sociais postos em causa pela sua atuação. Ademais, nunca se poderia concordar com a posição do recorrente de que a necessidade da aplicação da medida de internamento já foi alcançada com a medida cautelar aplicada. As medidas cautelares são preliminares, apresentando-se como preparatórias da medida definitiva, visando acautelar a averiguação no processo da eventual prática do facto e necessidade educativa do menor, não se confundindo com as medidas tutelares. A medida cautelar de internamento em centro educativo é uma medida geral, não especializada, não se iniciando a intervenção com o jovem em concreto, devendo este apenas seguir as regras instituídas. É sim no âmbito de execução da medida tutelar aplicada, que será delineado um projeto educativo pessoal, com base nas características e necessidades de cada jovem em concreto, individualizado e específico, que permitirá um acompanhamento especializado e focado para a educação e capacitação do jovem visado. Assim, mesmo que o jovem já tenha demonstrado mudança neste curto espaço de tempo que esteve no centro tutelar educativo, é necessário consolidar este processo, que podendo já se encontrar iniciado, não está com certeza finalizado. E, atento todo o percurso de vida do jovem até agora, não se afigura possível que tal caminho seja feito em meio natural de vida. Como mencionou o recorrente no início da motivação do seu recurso, o Processo Tutelar Educativo não se confunde com o Processo de Promoção e Proteção. Contudo, no âmbito do processo de promoção e proteção que corre em benefício do jovem desde 2019, é possível conhecer e vir a acompanhar a realidade vivida pelo mesmo e o contexto familiar em que se insere. A família do recorrente tem beneficiado da intervenção do sistema protetivo desde 2010, tendo sido aplicadas várias medidas de promoção e proteção tanto a favor do recorrente, como da sua irmã BB. No Processo de Promoção e Proteção (apenso E), foi aplicada, a 05.12.2024, em benefício do jovem AA e da jovem BB, a medida cautelar de promoção e proteção de acolhimento residencial, sendo que a sua execução não se iniciou quanto ao recorrente, por lhe ter sido aplicada a medida cautelar de internamento nos presentes autos. Tal decisão foi tomada com base, designadamente, na seguinte factualidade: “A fratria não beneficia de um quotidiano estruturado e organizado, carecendo de supervisão, nomeadamente AA. Os avós tendem a desculpabilizar o comportamento de AA e a normaliza-lo. O progenitor demite-se das suas responsabilidades parentais, sendo uma figura ausente desde há muito da vida dos filhos. A progenitora revela ser incapaz de exercer as responsabilidades parentais, molde a garantir aos filhos os mais elementares cuidados, sendo uma figura intermitente, e pouco investida na vida dos filhos, que mantem consumos que obstam a que posa efetivamente e com segurança ser por eles responsável. Com a saída da avó de casa a fratria evidenciou ainda maior instabilidade e denotou que estaria entregue a si mesma e em autogestão. CC revela cansaço físico e psicológico, devido à sua própria instabilidade, tendo descurado a prestação de cuidados de saúde e envolvimento escolar na vida dos netos, desculpabilizando-se, no caso de AA, com o facto de não conseguir obrigar o jovem a ir às consultas médicas ou a algum lado a que ele se recuse ir. Questionados DD e EE a respeito de algum outro familiar, capaz de se constituir como uma alternativa para acolher AA e BB, ambos respondem que não existe rede disponível, em virtude das questões comportamentais exibidas pelos netos, nomeadamente, de incumprimento de regras e limites. Os avós maternos e a mãe concordam com o acolhimento residencial dos netos, uma vez que consideram não ter capacidade para fazer mais do que garantir cuidados ao nível da alimentação.” Assim, no âmbito do processo de promoção e proteção, conclui-se que o jovem, pelos comportamentos que tinha vindo a adotar, coloca-se inúmeras vezes em situação de risco e grande vulnerabilidade, nomeadamente devido ao absentismo escolar e ao envolvimento em situações que, tivesse o jovem mais de 16 anos, consubstanciariam a prática de crimes. Não se afigurando possível a manutenção dos jovens com os avós maternos com quem têm estado, face à separação dos mesmos, à falta de condições financeiras da avó para os ter consigo e supervisionar as suas rotinas e encontrar-se muito desgastada com todas as situações que têm ocorrido e o avô por passar a maior parte do tempo fora de casa a trabalhar, entendeu-se que só o acolhimento residencial em instituição adequada constituía, nesse momento, a solução para alcançar a possibilidade de salvaguardar e proteger os jovem enquanto não se mostra definido o seu projeto de vida. Face a tudo o exposto, apurado em sede do processo de promoção e proteção, é possível concluir de que a opção por uma medida tutelar em meio natural de vida não fará face às necessidades de educação para o Direito que o jovem evidencia, uma vez que tanto os pais como a avó materna do recorrente se revelam incapazes de o acompanhar e de lhe proporcionar um ambiente contentor e securizante necessário para desenvolver competências pessoais e sociais. Todas as medidas de promoção e proteção aplicadas até este momento, em meio natural de vida, não surtiram efeito, tendo o jovem permanecido neste percurso disruptivo que aqui culminou. Também as medidas tutelares não institucionais previamente aplicadas não tiveram qualquer influência na conformação dos comportamentos do jovem, o que evidencia que também estas são inviáveis na sua educação para o Direito. No âmbito do Processo Tutelar Educativo que correu termos no apenso D, foi aplicada a medida tutelar educativa de acompanhamento educativo com duração de 12 meses, sem que o jovem tenha cumprido as ações constantes do projeto educativo pessoal, assim como obrigação de frequência de consultas de acompanhamento pedopsiquiátrico/psicológico, às quais nunca compareceu por entender não necessitar das mesmas. Tudo considerado, apenas a medida de internamento em centro educativo se apresenta como adequada às necessidades de educação evidenciadas pelo recorrente, pois impõe um afastamento temporário do seu meio habitual, que permitirá consolidar o processo de mudança já iniciado. No âmbito da execução desta medida, será elaborado um projeto educativo pessoal, com base nas motivações e necessidades educativas especificas do jovem, que será trabalhado no sentido de permitir ao jovem ganhar capacidades e ferramentas para inverter o rumo que a sua vida tinha vindo a assumir, de modo a intervir na sociedade de forma responsável e consentânea com os valores ético-jurídicos vigentes. Atenta a evolução registada pelo recorrente no período em que esteve em cumprimento da medida cautelar, sem qualquer acompanhamento especializado, entendemos que a execução da medida de internamento trará um crescimento e um progresso que realmente farão a diferença na vida deste jovem, permitindo-lhe chegar ao final como uma verdadeira história de sucesso. Nestes termos, o Acórdão ora objeto de recurso muito bem andou em aplicar a medida de internamento em centro educativo, não merecendo qualquer reparo, pelo que o recurso deve necessariamente improceder quanto a esta questão. ii. Quanto ao regime Caso se entendesse que o internamento seria a única medida capaz de satisfazer as necessidades do recorrente, defende o mesmo que o Tribunal a quo deveria ter dado preferência ao regime semiaberto, apenas não pugnando pelo regime aberto por o centro em que se encontra integrado não prever tal modalidade, sendo mais prejudicial do que benéfico retirá-lo desse contexto já conhecido. No que concerne à fixação do regime de execução da medida tutelar, remete o artigo 6.º, n.º 2 da LTE, para os critérios da escolha das medidas, ínsitos no n.º 1 desse mesmo artigo. Assim, toda a argumentação expendida quanto à escolha da medida se aplica igualmente à fixação do regime fechado. Como decorre do Acórdão objeto de recurso, ficou por mais demonstrado que o recorrente necessita de um ambiente contentor e securizante, a partir do qual seja possível intervir no sentido de o educar para o Direito, com os apoios necessários, por forma a possibilitar um investimento no seu percurso escolar e no desenvolvimento das suas capacidades sociais e pessoais, objetivos que não se afiguram possíveis de alcançar no seu meio de vida quotidiano. Assim, urge afastar o recorrente dos meios sociais em que se tem movido, de modo reorganizar e recentrar a sua vida, investindo em si próprio e no seu futuro. Permitir que o jovem se mantivesse nos meios que lhe são conhecidos e que propiciaram que este assumisse o modo de viver que foi levando até à aplicação da medida cautelar, numa fase tão embrionária da intervenção junto do mesmo, seria votar ao insucesso a mudança que se deseja. Ademais, como já foi referido anteriormente, o facto de a família do recorrente não apresentar as condições necessárias para supervisionar os seus comportamentos cria dúvidas quanto à segurança das saídas e visitas do mesmo. Porém, como resulta do texto do Acórdão e da informação comunicada ao recorrente aquando da leitura do mesmo, o regime fixado pode ser alterado a qualquer altura, apenas dependendo de si e do seu comportamento. Assim, se o jovem continuar a aderir à medida com a motivação que tem demonstrado até aqui, registando melhorias que permitam perspetivar uma inserção na comunidade de forma responsável e digna, e partindo do pressuposto que estarão reunidas as condições necessárias no seu seio familiar, irá certamente ser possível alterar o regime fechado para um regime semiaberto e, eventualmente, para um regime aberto. Nestes termos, atenta a gravidade dos factos praticados pelo jovem, a sua necessidade de educação para o direito e de desenvolver competências pessoais e sociais que passam pela consciencialização das consequências dos seus atos, aliadas à falta de resposta familiar, o único regime que se revela adequado e suficiente é o fechado. Termos em que, aplicada a medida tutelar de internamento em centro tutelar educativo, a fixação da execução em regime fechado é a única que se afigura adequada e suficiente, não merecendo a decisão do Tribunal a quo qualquer censura, pelo que o recurso, também quanto a esta questão, tem que Improceder. iii. Quanto ao período Por fim, alega o recorrente que o período de 18 meses é manifestamente desproporcional, pugnando pela fixação pelo mínimo, ou seja, 6 meses (artigo 18.º, n.º 1 e 2 da LTE). Nos termos do artigo 7.º da LTE, a medida tutelar deve ser proporcional à gravidade do facto e à necessidade de educação do menor para o direito, manifestada na prática do facto e subsistente no momento da decisão. Os factos praticados pelo recorrente revestem elevada gravidade, uma vez que se reportam a duas circunstâncias distintas, mediadas por cinco meses, não tendo o jovem se abstido de praticá-los por uma segunda vez. Além de ter ofendido dois outros jovens no seu corpo e na sua saúde, em ambas as circunstâncias, fê-lo de forma a impossibilitar a sua resistência e limitar a sua defesa, através de superioridade numérica e do recurso a uma arma branca, difundindo de seguida filmagens dos atos de agressão nas redes sociais, por forma a demonstrar o seu poder e a impotência dos jovens, humilhando-os. Com a sua atuação, o recorrente demonstrou extremo desrespeito pelos bens jurídicos protegidos pelas normas penais, como a integridade física e psíquica, a liberdade pessoal, a reserva da vida privada e a imagem, bens jurídicos pessoais que são reflexão dos direitos fundamentais que todos gozamos enquanto cidadãos. Atenta a desconsideração pelos bens jurídicos protegidos exteriorizada pelo recorrente aquando da prática dos factos, assim como a insensibilidade às consequências que os seus atos têm nos outros, é patente a necessidade de educação para o Direito que o jovem carece. A interiorização da importância do respeito por estes bens jurídicos, assim como por tantos outros, é essencial para o recorrente conseguir viver de forma sã, coesa e responsável no seio da comunidade. Ademais, apesar de ter admitido todos os factos que, se tivesse mais de 16 anos, configurariam a prática de crimes, tal não significa que reconheça o desvalor das suas condutas e que tenha internalizado e tomado consciência do porquê. Confrontados com a gravidade os factos praticados e as elevadíssimas necessidades de educação para o direito que o recorrente apresenta, entendemos que o período de 18 meses é proporcional e adequado para a expectada mudança que se pretende na vida do recorrente, de interiorização dos valores conformes ao direito e de aquisição de competências pessoais e sociais que possibilitem a construção e consolidação de uma identidade juridicamente responsável, através da intervenção especializada em meio estruturado e contentor, que incida na frequência de programas de natureza sociopedagógica, escolar/profissional e terapêutica. Nestes termos, a decisão de aplicação da medida tutelar de internamento em centro tutelar educativo, em regime fechado, pelo período de 18 meses, é adequada, suficiente e proporcional, não merecendo qualquer censura, pelo que, mais uma vez, o recurso tem que improceder. Nestes termos, deve ser negado provimento ao recurso e ser confirmada, na íntegra a decisão proferida. Porém, Vossas Excelências farão a melhor Justiça. (…) * I.4 Parecer do Ministério Público Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, nesta instância o Exmo. Procurador-Geral Adjunto nos termos do qual, aderindo à posição da Digna Magistrada do Ministério Público na primeira instância, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso. * I.5. Resposta Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não tendo sido apresentada resposta ao dito parecer. * I.6 Concluído o exame preliminar, prosseguiram os autos, após os vistos, para julgamento do recurso em conferência, nos termos do artigo 419.º do Código de Processo Penal. Cumpre, agora, apreciar e decidir. * II- FUNDAMENTAÇÃO II.1- Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objeto do recurso: Conforme decorre do disposto no n.º 1 do art.º 412.º do Código de Processo Penal, bem como da jurisprudência pacífica e constante [designadamente, do STJ1], e da doutrina2, são as conclusões apresentadas pelo recorrente que definem e delimitam o âmbito do recurso e, consequentemente, os poderes de cognição do Tribunal ad quem, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso a que alude o artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal3, tudo ex vi do artigo 128.º da Lei Tutelar Educativa. * II.2- Apreciação do recurso Assim, face às “conclusões” apresentadas, a questão decidenda que dela se retira é a seguinte: a) Se a medida tutelar de internamento em centro educativo, em regime fechado, pelo período de 18 (dezoito) meses aplicada ao recorrente, deverá ser substituída por uma medida não institucional, ou em alternativa, deverá ser aplicado em regime semiaberto e pelo período mínimo admissível de 6 meses. Vejamos. II.3 - Da decisão recorrida [transcrição dos segmentos relevantes para apreciar as questões objecto de recurso]: (…) Finda a produção da prova e com relevância para a decisão da causa, resultaram provados os seguintes factos: 1. No dia ...-...-2024, antes da hora de almoço, junto à entrada da escola ..., sita na ..., em ..., FF nascido em ...-...-2009, aluno daquela escola, cruzou-se com uma colega de nome GG que estava acompanhada do namorado de nome HH, tendo-a cumprimentado e falado com a mesma. 2. O referido HH não terá gostado e disse "Se o voltar a ver vou bater-lhe!". 3. Na mesma data, cerca das 15h45m, FF saiu da escola pelo portão, momento em que HH o agarrou e puxou pela mochila, para junto e si, do jovem AA, de II, de JJ e de dois outros indivíduos cuja concreta identidade não foi possível apurar e que permaneceram um pouco mais recuados. 4. Estando os referidos indivíduos colocados de frente para FF, o jovem AA de imediato desferiu-lhe um soco, atingindo-o na face, do lado esquerdo. 5. O referido HH, disse ainda a FF que "Para a próxima bato-te na escola!". 6. Tal ato foi filmado por pessoa cuja identidade não se logrou apurar, que remeteu as imagens ao jovem AA, que por sua vez as difundiu através nas redes sociais, nomeadamente no Instagram. 7. No dia ...-...-2024, pelas 13h30m KK, nascido a ...-...-2014, saia da escola básica e secundária do ..., sita em ..., onde estuda, com um colega. 8. Nessa ocasião avistou o jovem AA no exterior da escola, e juntamente com o amigo, encetaram uma corrida em direção de casa. 9. A cerca de 100 metros da escola, surgiu o jovem AA acompanhado da sua irmã BB, nascida a ... de ... de 2010. 10. Imediatamente KK recuou e ficou encostado a uma parede, junto a uns caixotes de lixo. 11. Nesse momento o jovem AA agarrou-o pela roupa junto ao pescoço e ordenou-lhe que pedisse desculpa à sua irmã dizendo-lhe ainda "Eras aluno na ... não eras? Então já me devias conhecer!". 12. KK dirigiu-se imediatamente na direção de BB para efetuar o ordenado pedido de desculpa, momento em que o jovem AA veio por trás dele, encostou-lhe uma faca de cozinha ao pescoço, ao mesmo tempo que lhe dizia para se ajoelhar e pedir desculpa à irmã. 13. KK assim fez ajoelhando-se em frente a BB, ocasião em que o jovem AA sacou de uma faca encostando-lha ao pescoço. 14. A faca teria cerca de 21,5cm de comprimento e tinha um cabo de cor cinzenta. 15. No momento em que KK estava ajoelhado em frente a BB e, já depois de lhe ter pedido desculpa, o jovem AA desferiu-lhe um violento pontapé, atingindo-o na face e, deixando-o atordoado. 16. De seguida e, depois de KK se ter levantado, o jovem AA afastou-o para mais longe e, enquanto com ele falava, desferiu-lhe um violento soco, atingindo-o na face, após o que se lhe dirigiu dizendo "Estás tonto não estás!?". 17. Toda esta atuação com exceção da que se reporta à faca, foi filmada por um dos presentes, que acompanhava o jovem AA e a sua irmã BB. 18. O vídeo que foi realizado, foi remetido ao jovem AA que o divulgou através das redes sociais, nomeadamente do Instagram. 19. BB é colega de escola e de turma de KK e, este ter-se-ia dirigido à mesma, assim como o teriam feito outros colegas, proferindo as palavras "Rata! Ratazana!". 20. Desde então que KK passou a vivenciar sentimentos de insegurança cada vez que tem de sair de casa e ir para a escola, passando a ser conduzido a tal local pelos pais que o vão levar a buscar. 21. Com as suas descritas condutas quis e conseguiu o jovem AA atingir FF e KK no seu corpo e na sua saúde, do modo descrito, com particular violência e intimidação no caso deste último causando lhes dores e lesões, bem sabendo que os meios que utilizou eram adequados a produzir tais resultados que pretendeu. 22. Em consequência da sua atuação as vítimas sofreram dores nas zonas atingidas sendo que FF apresentava um hematoma do lado esquerdo da face e, KK uma ferida incisa na mucosa jugal superior esquerda, edema lábio inferior direito, hematoma e edema circular na região malar esquerda com 3x4 cm doloroso ao toque, escoriação ligeira torácica direita, confrontação linear 4 faixas 5 cm de extensão, região retroauricular com sulcos 4cm bilaterais. 23. Quis o jovem AA obrigar KK a praticar um ato contra a sua vontade, para tanto usado de um meio particularmente perigoso, que lhe conferia manifesta superioridade sobre aquele e, que era apto a causar lesões muito graves e até a morte. 24. Sabia o jovem AA que o meio utilizado por si era idóneo à produção do resultado que quis e alcançou humilhando e, rebaixando KK, manifestando superioridade, movido por motivo fútil e torpe, e revelando manifesto prazer de causar elevado sofrimento, mesmo quando aquele já tinha concretizado o ato que lhe ordenou. 25. Igualmente nada tendo a ver com FF e com a situação anterior, agiu em contexto grupai, intimidando-o e limitando-o na sua capacidade de se defender, e atingindo-o no seu corpo e na sua saúde, sem qualquer motivo plausível ou atendível. 26. Nas descritas situações agiu junto a estabelecimentos de ensino e contra membros da comunidade escolar. 27. As imagens suprarreferidas, foram captadas e difundidas publicamente, sem o consentimento de FF e de KK. 28. Sabia o jovem AA que as mesmas tinham sido captadas nas referidas circunstâncias e ainda assim divulgou-as publicamente, nas redes sociais, bem sabendo que não estava autorizado a fazê-lo e que não o podia fazer. 29. Quis igualmente ao fazê-lo demonstrar poder e humilhar os referidos FF e KK. 30. Até aos 3 anos de idade o jovem AA viveu com os pais, com a irmã BB e uma irmã uterina já maior de idade; 31. Os pais separaram-se e o pai regressou ao ... onde permanece, sendo completamente ausente da vida dos filhos. 32. Desde a infância que o jovem AA apresenta comportamentos disruptivos, agressivos para com terceiros, afirmando que tal resulta da vivência, no contexto familiar materno de violência doméstica entre a mãe e o companheiro desta, que o deixavam perturbado e muito desamparado. 33. A progenitora ter-se-á, entretanto, separado de tal companheiro. 34. A progenitora mantém consumos de substâncias estupefacientes e de bebidas alcoólicas em excesso, referindo sempre intenção de se submeter a tratamento, que na realidade nunca concretiza. 35. Devido à incapacidade da progenitora para o exercício da parentalidade foi regulação do exercício das responsabilidades parentais no Proc. 7852/10.4TBCSC do J3 do Tribunal de Família e Menores de Cascais e fixada a residência do jovem AA e da irmã BB, junto da avó materna CC, sendo as responsabilidades parentais exercidas em conjunto pela avó materna e pela progenitora. 36. Decorre por apenso a tais autos processo de promoção e proteção em benefício do jovem AA em sede do qual foi em dezembro de 2024 aplicada a ambos a medida cautelar de acolhimento residencial, sendo que a do jovem foi suspensa em virtude da medida cautelar de guarda em centro educativo que lhe foi aplicada nestes autos; 37. O jovem AA residia com o avô, a mãe e os tios, sendo que os avós se separaram em 2022. 38. Após a separação, a avó foi para o estrangeiro durante algum tempo, após o que regressou e passou a residir num anexo situado nas imediações da anterior residência. 39. Por não ter condições para ter consigo os netos, estes permanecem na residência com o avô materno. 40. Os avós maternos estão desempregados e realizam biscates. 41. A progenitora está desempregada e subsiste com os rendimentos do seu pai. 42. A relação do jovem AA com a mãe, apesar da existência de afeto, é instável e pouco investida, gerando sentimentos ambivalentes, que desencadeiam conflitos e dificuldades de interação significativos, não a reconhecendo como figura de autoridade. 43. O jovem AA beneficiou de processo de promoção e proteção que decorreu na CPCJ de ..., sendo em 2023 aplicada medida de promoção e proteção de apoio junto dos avós e da mãe, que não foi possível executar por falta de colaboração de todos; 44. O jovem AA vinha num percurso disfuncional de vida, sem aceitar qualquer tipo de apoio/orientação por parte da família e das entidades, sendo que a progenitora foi orientada para suporte psicológico, sem que se tenha mobilizado para tal. 45. A disfuncionalidade familiar teve também reflexos na vida escolar do jovem AA, sendo a progenitora ausente do acompanhamento do mesmo, que quando muito era efetuado pelo avô, ou pela avó. 46. O jovem AA vivia em autogestão, fazendo apenas o que lhe apetecia, recusando qualquer tipo de intervenção/acompanhamento e que se mostravam necessários de molde a inverter o seu modo de vida. 47. AA repetiu 4 vezes o 6º ano de escolaridade e não transitou de ano. 48. Em ... de 2024 foi integrado no centro de formação profissional da ..., no curso de …, com equivalência ao 9º ano de escolaridade, tendo inicialmente revelado alguma capacidade de integração junto dos pares. 49. Volvido pouco tempo, denotou dificuldades de adaptação à dinâmica institucional, revelando desmotivação pelo curso, dificuldades de autocontrolo, falta de cumprimento das tarefas propostas, absentismo injustificado, assim como comportamentos de oposição e de agressividade, envolvendo-se numa situação de agressão a um colega, que conduziu a que, lhe fosse aplicada, a sanção disciplinar de suspensão de frequência das aulas. 50. O jovem AA consome substâncias estupefacientes desde os 12 anos, vindo tal consumo a aumentar, levando a que grande parte do seu tempo fosse passado, em convívio com indivíduos mais velhos, com condutas antissociais /delinquentes. 51. O jovem AA vem persistindo com condutas marginais e de desregulação emocional, sendo que perante as várias entidades, mantem um registo autocentrado e de oposição à realização de mudanças assertivas, recusando envolver-se nos projetos e apoios disponibilizados. 52. No âmbito do ITE 591/22.5GACSC, após revogação da suspensão do processo, foi-lhe aplicada a medida tutelar educativa de acompanhamento educativo com a duração de 12 meses (PTE 7852/10.4TBCSC-D), sem que tenha cumprido as ações contantes do projeto educativo pessoal, ainda que lhe tivesse sido imposta a obrigação de consultas de acompanhamento pedopsiquiátrico/psicológico, que nunca frequentou, por entender não necessitar das mesmas. 53. O jovem AA deu entrada no centro educativo a ...-...-2024 e aí tem conseguido relacionar-se com pares e agentes educativos de forma tendencialmente ajustada. 54. Está a frequentar a formação base ... e a formação tecnológica de operador de jardinagem, revelando competências intelectuais para acompanhar as diferentes matérias. 55. Beneficia de acompanhamento psicológico e pedopsiquiátrico no ..., com prescrição de medicação, que toma com a supervisão dos agentes educativos. 56. Mantem contacto telefónico e presencial com a mãe, avós e com a irmã BB. 57. A mãe e os avós entendem que o jovem AA tem de cumprir uma medida de internamento em centro educativo, por reconhecerem a incapacidade para intervir de forma eficaz junto do jovem, que tem apresentando uma escalada de comportamentos antissociais e com resistência às várias e diferentes intervenções. 58. Confrontado com a prática dos factos que estão em causa nestes autos, revelou uma atitude autocentrada e retraída da responsabilidade das suas condutas disfuncionais, responsabilizando os outros como responsáveis pelas suas reações provocadoras, agressivas ou hostis, desvalorizando o impacto manifestamente nocivo dos seus atos, sobre terceiros, afirmando ter agido justificadamente para proteger a irmã BB. 59. A progenitora passa várias noites sem pernoitar em casa, o avô tem problemas de saúde e o jovem AA adotava comportamentos desajustados subtraindo bens, tais com alimentação e roupa. 60. O jovem AA não beneficiava de um quotidiano estruturado e organizado, carecendo de supervisão. 61. Pese embora o acompanhamento social de que o agregado beneficia há vários anos, não adere às intervenções e não realiza quaisquer mudanças. 62. Os avós desculpabilizavam os comportamentos do jovem normalizando-os. 63. A progenitora para manter os seus consumos chega a vender bens. 64. O jovem AA desde há muito que faltava injustificadamente às aulas, não revelava interesse pela atividade escolar e adotava comportamentos de indisciplina. 65. Convivia maioritariamente com pares com comportamentos desviantes e alegava conviver com gangs, deslocando-se para o efeito para a LL. 66. O jovem AA terá inclusive pernoitado fora de casa. 67. Não tinha hábitos de sono adequados à sua idade e de molde a garantir que acordava cedo para ir para a escola e que cumpria com as suas obrigações. 68. A avó materna é a encarregada de educação dos netos, em reunião com a escola referiu que os netos são crescidos que têm idade para resolver os seus assuntos na escola, e que não tem tempo para tratar dos assuntos relacionados com os mesmos. 69. Com a saída da avó de casa o jovem AA evidenciou ainda maior instabilidade. 70. Revela fraca capacidade reflexiva, e dificuldades ao nível da interiorização das regras e em agir em conformidade, assim como em avaliar as situações do ponto de vista do outro. 71. Denota enorme instabilidade emocional e comportamental, adotando comportamentos de agressão física, em contexto grupai, ou individualizado, que vêm num crescendo, colocando em sério perigo a integridade física de outros jovens, sendo as suas condutas geradoras receio para tais pessoas e fortemente perturbadoras do sentimento de segurança. 72. Progressivamente vem agravando os seus comportamentos denotando enorme violência e prazer em causar sofrimento. 73. Denota acentuada dificuldade em aceitar as regras e autoridade, agindo em função do seus desejos e impulsos. 74. Adota atitudes antissociais que remetem para um processo educativo desorganizado, com reduzida exposição a regras, e fraca contenção das suas rotinas, o que a levam a justificar as suas condutas e a não revelar empatia pelo outro. 75. Desde a infância que evidencia dificuldades de vinculação e condutas desadaptadas nos diferentes contextos sociofamiliares, relacionadas com as vivências precoces de abandono, roturas relacionais, desamparo, negligência, violência e de frustrações recorrentes que poderão ter-se constituído como traumáticas e que impediram a construção de um sentimento de pertença e de confiança em si e nos outros. 76. A falta de competências parentais dos pais para se envolverem afetivamente, educam e cuidarem, contribuíram para a rotura relacional com o pai e para o afastamento em relação à mãe. 77. A instabilidade familiar, e o recorrente consumo de substâncias por banda da mãe, tem um impacto negativo no jovem AA, que revela dificuldades na construção de relações afetivas firmes, gratificantes, dada a ambivalência de sentimentos que refletem no medo de confiar, dai decorrendo prejuízo para a construção de uma identidade adaptada à vida em sociedade. 78. O seu percurso marcadamente disfuncional, desencadeia instabilidade emocional, dificuldade na gestão da frustração, sentimentos de desamparo e impotência, assim como afetos depressivos, decorrentes das perdas e insuficientes investimentos afetivos, dada a imaturidade, dependência afetiva e funcional das suas figuras adultas de referência, que na realidade não se revelaram estáveis, cuidadores e transmissores de valores concordantes com o respeito por si e pelo outro. 79. Embora revele capacidade para efetuar juízo critico sobre as suas condutas, o mesmo mostra-se distorcido nalgumas situações, desvalorizando os comportamentos transgressivos, revelando fraca perceção da sua desadequação e um sentido frágil de responsabilidade. 80. Persiste em comportamentos em que não reconhece as figuras de autoridade, adotando condutas de resistência ao cumprimento de regras básicas de interação social, adotando condutas agressivas, provocadoras e hostis. 81. Os comportamentos que adota evidenciam tendência para se relacionar de forma defensiva, com frágil tolerância à frustração, sentimentos de desvalor, impulsividade, procura de sensações e insensibilidade social, desrespeito pelos outros, dificuldades em realizar discriminação sobre a realidade interna e externa, podendo o consumo de substâncias traduzir-se numa fuga à realidade, como forma de defesa desadaptada para lidar com os conflitos, negando sentimentos de fragilidade e incapacidades internas. 82. Apresentou valores elevados de impulsividade, traços não emocionais e narcisismo, evidenciando um tipo de funcionamento com propensão para o agir irrefletido, frágil empatia ou débil sensibilidade/compreensão do outro e de si próprio, tendendo a centrar-se nos seus interesses, sem avaliar das consequências dos seus atos, contribuindo assim para a mobilização de sentimentos de raiva, hostilidade e agressividade física e verbal, quando contrariado relativamente aos seus propósitos, sem espelhar sentido de censura sobre os seus atos, que denotam a sua dificuldade em aceitar, compreender e elaborar os constrangimentos que a realidade impõe. 83. As suas condutas denotam um padrão de funcionamento mal adaptativo, com distorções cognitivas sobre a forma como interage em meio social, com tendência à oposição/desafio. 84. Evidencia falência de autorregulação emocional e na censura sobre as suas ações disruptivas, e uma representação de si inconsciente, com tendência para alienar-se de símbolos e figuras de autoridade, revelando distorções na elaboração do raciocínio moral que conduz frequentemente a atos antissociais. 85. Revela tendência para negar a sua sintomatologia e procura ser visto positivamente pelos outros. 86. Evidencia necessidade de procurar estímulos, excitação, atenção, tendendo a ser exigente e controlador, com egocentrismo exacerbado. 87. Revela propensão para ser indiferente ao bem-estar dos outros, sendo pouco empático e não respeita os direitos de terceiros para alcançar os seus intentos. 88. Apresenta um padrão disfuncional para o consumo de substâncias psicoativas, e inclinação para se envolver em situações em que os direitos dos outros são violados, quebrando as regras sociais. 89. Apresenta um alto nível global de risco de reincidência, dada a persistência das fragilidades pessoais e sociais, associadas a condutas antissociais. 90. As intervenções das entidades socializadoras até ao momento não sortiram efeito, persistindo a reatividade à mudança de condutas disruptivas/antissociais para um funcionamento assertivo e pró social, que não reconhece como necessário. 91. Da avaliação realizada, resulta a elevada probabilidade de o jovem AA se voltar a envolver em situações em que os direitos dos outros não são respeitados, sem que reconheça o desvalor das suas condutas, e a necessidade de reparação das mesmas, revelando uma insuficiente internalização do interdito e da lei, como elementos reguladores das relações sociais. 92. Tende a adotar uma postura de suposta adequação, sem que, contudo, revele ter necessidade de refletir e de reparar os comportamentos que vinha adotando, minimizando as consequências dos mesmos. 93. Evidencia acentuada necessidade e educação para o direito, que denotam na necessidade de uma intervenção especializada em meio estruturado e contentor, em regime fechado, de molde a que interiorize valores conformes ao direito e para que adquira recursos e competências pessoais e sociais que possibilitem a construção de uma identidade, juridicamente responsável. 94. Desde que ingressou no centro educativo tem vindo a adequar os seus comportamentos, tendo sido registada uma evolução muito positiva quer ao nível dos comportamentos com os demais jovens, quer com a equipa educativa, revelando interesse e empenho no prosseguimento do seu percurso escolar. 95. Já durante o internamento do Jovem faleceu o avô materno, uma das figuras de referência da vida do Jovem, encontrando-se, neste momento, a avó materna a residir na casa onde o jovem residia com a irmã BB, a Mãe e o avô materno. Factos não provados Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da causa. * Motivação de Facto O Tribunal formou a sua convicção relativamente à factualidade dada como provada com base nos seguintes elementos de prova, avaliados de forma crítica: - confissão e declarações do jovem, ouvido em audiência de julgamento, sincero, espontâneo e consciente, segundo pareceu ao Tribunal, do erro do seu procedimento e da necessidade corrigir a sua atuação, no futuro (ainda que não se duvide que o AA disse o que sabia que o Tribunal queria ouvir); - relatório social com avaliação psicológica junto a 17 de janeiro de 2025; - consulta do processo de promoção e proteção e processo tutelar educativo apensos. Assim e concretizando, para a prova da factualidade dada como provada formou o Tribunal a sua convicção nas declarações do AA que admitiu No que respeita à situação pessoal e académica do jovem e, bem assim, em relação ao seu perfil psicológico, baseou o Tribunal a sua convicção na consulta dos apensos e, bem assim, no relatório social e psicológico junto aos autos. A evolução positiva do jovem em termos de comportamentos e de empenho na sua formação académica decorreu do depoimento da sua tutora no centro educativo MM e a atual situação familiar no depoimento da avó do jovem, CC, as quais depuseram de forma clara e espontânea, merecendo credibilidade. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Decorre do artigo 1° da Lei Tutelar Educativa que a prática, por menor com idade compreendida entre os 12 e 16 anos de idade, de facto qualificado pela lei penal como crime dá lugar à aplicação de medida tutelar educativa. As medidas tutelares educativas visam a educação do(a) menor para o direito e a sua inserção, de forma digna e responsável, na vida em comunidade (cfr. artigo 2° da LTE). A finalidade de tal intervenção é a da educação do(a) menor e não a retribuição pelo crime. Assim, para além da prática de um facto considerado pela lei como crime, deve também —e essencialmente — verificar-se a necessidade de corrigir a personalidade do(a) menor que apresenta dificuldades de conformação com o dever ser jurídico e que se manifesta com a prática do facto. QUALIFICAÇÃO JURÍDICO-PENAL Ao AA é imputada a prática de factos qualificados crime, caso o mesmo já tivesse atingido a maioridade penal, a saber, 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelos arts. 1432, n.2 1, 145°, n.2 1 e 2, com referência ao art.° 1322, n.° 2, als. e) e h) do Código Penal, punido com pena de prisão até 4 anos, 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelo art.° 1992 n.2 2, al. b), do Código Penal, punido com pena de prisão até um ano (por referência aos factos praticados a ... de ... de 2024) e 1 (um) crime de coação, p. e p. pelo art.° 154°, do Código Penal, punível com pena de prisão até 3 anos, 1 (um) crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelo art.° 1432, 145°, n.2 1 e 2, com referência ao art.° 132°, n.° 2, al. als. d) e e), do Código Penal, punidos com pena de prisão até 4 anos e 1 (um) crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelo art.° 1992 n.° 2, al. b), do Código Penal, punido com pena de prisão até um ano (por referência aos factos praticados no dia ... de ... de 2024). Da factualidade provada resulta que, estão verificados, in casu, os elementos objetivos e subjetivos dos ilícitos criminais em apreço. Assim, e com base na factualidade descrita, importa concluir que o jovem praticou factos qualificados pela lei como crime, elemento fulcral na aferição da necessidade de aplicação de medida tutelar. NECESSIDADE DA MEDIDA TUTELAR Nestes autos, os factos praticados pelo jovem revelam indiferença por valores ético-jurídicos relevantes e insensibilidade pelos efeitos provocados nos ofendidos, sendo, contudo, de destacar a circunstância de o jovem, em julgamento, ter admitido, em sem quaisquer reservas, a prática dos factos dados como provados, o que fez de forma sincera e séria, passando a imagem de ter consciência da sua gravidade, ainda que tendo em consideração as suas caraterísticas de personalidade se tenha dúvida que tenha de facto interiorizado o desvalor da sua conduta e que não esteja apenas a dizer aquilo que acha que o Tribunal quer ouvir. Em face disso e dentro de todo o contexto tido como assente no que ao percurso vivencial do AA diz respeito, importa aplicar uma medida que garanta o efetivo reconhecimento, pelo Jovem, do caráter desvalioso da sua atuação, em consonância com as necessidades tutelares que o DD exige e valorando o respetivo percurso, comportamento anterior e atual, a sua personalidade e necessidades corretivas que se perfilam. A factualidade dada como provada depõe no sentido da necessidade de aplicação de medida tutelar ao jovem, assim a sensibilizando para o direito (cfr. artigo 22 n.º 1 da LTE), o que só será conseguido através da satisfação das específicas necessidades educativas do jovem para o direito, com especial atenção para a necessidade da jovem adquirir competências pessoais e sociais, com um forte enfoque no acompanhamento psicológico e psicoterapêutico (como forma de contribuir para uma saúde mental e psicológica sãs) e com o apoio da jovem na vertente escolar/formativa. Efetivamente, resulta da perícia à personalidade junta aos autos que «Da avaliação realizada, resulta a elevada probabilidade de o jovem AA se voltar a envolver em situações em que os direitos dos outros não são respeitados, sem que reconheça o desvalor das suas condutas, e a necessidade de reparação das mesmas, revelando uma insuficiente internalização do interdito e da lei, como elementos reguladores das relações sociais. Tende a adotar uma postura de suposta adequação, sem que, contudo, revele ter necessidade de refletir e de reparar os comportamentos que vinha adotando, minimizando as consequências dos mesmos. Evidencia acentuada necessidade e educação para o direito, que denotam na necessidade de uma intervenção especializada em meio estruturado e contentor, em regime fechado, de molde a que interiorize valores conformes ao direito e para que adquira recursos e competências pessoais e sociais que possibilitem a construção de uma identidade, juridicamente responsável.» Acresce que o percurso de vida do jovem foi sempre marcado pelo absentismo escolar (ainda se encontra a concluir o 62 ano), a disfuncionalidade (caracterizada pela adoção de comportamentos disruptivos e agressivos com pares e adultos) e a falta de supervisão parental (da qual naturalmente resultava a falta de reconhecimento da autoridade dos adultos). A progenitora e os avós maternos (com quem desde cedo residiu) têm-se revelado incapazes de acompanhar o AA e de lhe proporcionar o ambiente contentor e securizante necessário a que o mesmo desenvolva competências pessoais e sociais, com destaque para uma formação que o habilite a, como qualquer cidadão deste país, ter as imprescindíveis ferramentas para no futuro ingressar no mundo do trabalho. Apesar das tentativas de ajudar o jovem e de lhe proporcionar os acompanhamentos necessários a conferir as competências pessoais e sociais necessárias a investir o seu futuro, não foram as mesmas suficientes para que o Jovem invertesse o percurso disruptivo e se consciencializasse da necessidade de mudança. Nem a progenitora, nem os avós nem a medida de promoção de apoio junto dos avós maternos se revelaram suficientes para demover o jovem de colocar em perigo para a sua própria segurança e de terceiros, a sua saúde, desenvolvimento e formação, sendo, por isso, de excluir a aplicação de medida tutelar não institucional. Face ao exposto, o Tribunal entende, assim, que a medida mais adequada é uma medida que, aliando todo o controlo e apoios necessário, consiga oferecer ao AA uma maior responsabilização e investimento no seu percurso escolar, por forma a que também adquira ou reforce as suas competências pessoais e sociais, com uma consciência real e verdadeira dos comportamentos ilícitos que praticou, dos bens jurídicos que ofendeu e do efeito que teve no Outro enquanto indivíduo e ser integrado em Sociedade, sem se sentir desprotegido, face às circunstâncias de vida do mesmo. No caso vertente, as necessidades de educar o AA para o direito imperam sobre qualquer outro critério (por forma a atingir a mudança que se pretende alcançar em termos e personalidade e atuação futura), prevalecendo na decisão a tomar, sendo que a escolha da medida tutelar tem que ser orientada pelo interesse do jovem (cfr. artigo 22 nº 1, 62, nº 3 e 72, nº 1 da LTE). Efetivamente, urge afastar este Jovem dos perigos em que se tem colocado, dos meios sociais em que se tem movido e que têm feito parte do seu quotidiano por forma a viabilizar uma intervenção psicoterapêutica junto do mesmo que viabilize a sua estabilização e a aquisição de ferramentas/competências sociais e emocionais. Só assim será possível lograr que o Jovem invista na sua formação profissional e que se empenhe em criar as condições para se vir a inserir de forma ajustada em sociedade. Denota-se, igualmente, a falta de capacidade da parte da Progenitora e da Avó Materna para fazer face às necessidades do Jovem, e que o mesmo não aderiria á medida de acolhimento que estava proposta no processo de promoção e proteção nem ao acompanhamento que com a mesma poderia beneficiar. Assim e pese embora o Jovem tenha confessado os factos que lhe eram imputados e tenha referido que neste momento não agiria da mesma forma, não se afigura que o tempo que esteve no Centro Educativo (3 meses), e ainda que revele uma evolução positiva, tenha sido suficiente para sedimentar as mudanças que o mesmo alega já se verificarem. O relatório social com perícia psicológica tem cerca de um mês e é inequívoco na necessidade de ser proporcionado ao Jovem um ambiente contentor que lhe permita se reorganizar e recentrar a sua vida investindo em si próprio e no seu futuro, afastando-se da marginalidade e delinquência. O seu historial de vida, os antecedentes familiares, toda a envolvência dos bairros onde os familiares residem e se movem fazem temer que quaisquer saídas propiciem a sua fuga e que se perca a possibilidade de ajudar este Jovem a encontrar o seu rumo. A família não se tem demonstrado contentora, não se tem revelado como uma alternativa no seu acompanhamento, razão pela qual não se afigura que as saídas do Jovem do Centro Educativo se possam realizar de forma segura e gratificante para o Jovem. No entanto, caso se venha a verificar que o percurso do Jovem, as suas aquisições, os seus comportamentos e, bem assim, o ambiente familiar para onde sairia, aconselha que lhe seja dado um voto de confiança e que estejam, assim, reunidas as condições para o efeito, será sempre possível ser determinada a alteração da medida aplicada para um internamento em regime semiaberto, estando do lado do jovem demonstrar, com o seu empenho nos programas e na sua formação, que se encontra preparado para um regime menos contentor. Até lá e face ao exposto, por se revelar imperioso integrar o jovem num contexto sustentado, estruturante e contentor, educando-o para o direito e corrigindo a sua personalidade no sentido da sua conformação com os valores sociais e com o dever ser/estar e a falta de resposta familiar, a medida que se revela adequada é a medida de internamento em centro tutelar educativo, em regime fechado, pelo período de 18 (dezoito) meses, que é o período que se considera adequado para a mudança que se pretende na vida do jovem, de molde a permitir uma intervenção especializada em meio estruturado e contentor, que incida em métodos e frequência de programas de natureza sociopedagógica, escolar/profissional e terapêuticos, que contribuam para a interiorização de valores conformes ao direito e a aquisição de competências pessoais e sociais, que possibilitem a construção de uma identidade, individual e social, juridicamente responsável, intervenção essa que tem de se prolongar no tempo atentas as elevadíssimas necessidades de educação para o direito que apresenta (sem prejuízo de se poder ponderar, a médio prazo, dependendo do percurso a realizar pelo jovem no âmbito da medida aplicada, a sua flexibilização e, eventual alteração para uma medida de internamento em regime semiaberto) —cfr. artigos 1°, 2°, 4° n° 1, al. i), 6°, 7°, 172 n° 1 e n° 4, als. a) e b) e 18°, todos da LTE. (…) » II.4- Apreciemos, então, as questões a decidir. a) Se a medida tutelar de internamento em centro educativo, em regime fechado, pelo período de 18 (dezoito) meses aplicada ao recorrente, deverá ser substituída por uma medida não institucional, ou em alternativa, deverá ser aplicado em regime semiaberto e pelo período mínimo admissível de 6 meses. Defende o Recorrente que a medida tutelar aplicada é desproporcional e desadequada, sendo antes suficiente e adequada uma medida não institucional, ou, que a a enveredar-se por uma medida de internamento, deverá ser aplicado o regime semiaberto o qual não deverá exceder o período mínimo admissível de 6 meses. Vejamos: “Educar é educar para viver em sociedade, e não está preparado para viver em sociedade quem não observa as condições mínimas de subsistência e funcionamento da sociedade.” (...) Educar para o direito não é, portanto, em primeira linha, defender a sociedade. É, sobretudo, ajudar alguém para que possa ser um cidadão adaptado, sem o que, como antes se viu, a felicidade só será acessível a outros.” - Souto Moura, “A Tutela Educativa: Factores de legitimação e objectivos”, in Infância e Juventude n.º 4/00, pág. 37 e 38. Assim, a intervenção tutelar educativa traduz-se inequivocamente numa ingerência, em maior ou menor medida, em direitos fundamentais do jovem, nomeadamente no que toca ao livre desenvolvimento da sua personalidade (art.º 26º, nº 1 da CRP) e, no caso de medidas de internamento, à sua liberdade [art.º 26º, nºs 1 e 3, alínea e) da CRP]; e traduz-se ainda e também numa ingerência em direitos fundamentais dos seus pais, representantes ou de quem tenha a sua guarda de facto, no sentido em que são suscetíveis de contender, desde logo, com a intimidade da vida privada e familiar (art.º 26º, nº 1 da CRP). Ingerências essas cuja legitimação constitucional demanda o respeito por critérios de necessidade, adequação e proporcionalidade (art.º 18º, nºs 2 e 3 da CRP). A Lei Tutelar Educativa (Lei n.º 166/99, de 14 de Setembro na redacção dada pela Lei n.º 4/2015, de 15/01) é sensível à procura de soluções equilibradas nesta matéria, partindo dos seguintes pressupostos: - é inaplicável a menores de doze anos (art.º 1º); - depende da prévia prática de um facto considerado na lei como crime (art.º 1º); - assume que é sua finalidade a educação do menor para o direito e a sua inserção, de forma digna e responsável, na vida em comunidade (art.º 2º); - enuncia as medidas típicas a que pode recorrer-se (art.º 4º); - determina, de entre as que se mostrem adequadas e suficientes, que se privilegie a que represente menor intervenção na autonomia de decisão e de condução de vida do menor e que seja suscetível de obter a sua maior adesão e a adesão de seus pais, representante legal ou pessoa que tenha a sua guarda de facto (art.º 6º nº1)); - consagra a máxima segundo a qual a escolha da medida tutelar aplicável é orientada pelo interesse do menor (art.º 6º nº3); - afirma que a medida tutelar deve ser proporcionada à gravidade do facto e à necessidade de educação do menor para o direito manifestada na prática do facto e subsistente no momento da decisão (art.º 7º). Daqui resulta que a prática de facto ilícito tipificado na lei penal não determina necessariamente a aplicação de medida tutelar educativa, porquanto o fim da intervenção tutelar é a educação do menor para o direito, não o seu sancionamento ou punição pela prática do facto ilícito penal. Com efeito, as medidas tutelares educativas têm por finalidade a educação do menor para o direito e a sua inserção, de forma digna e responsável, na vida em comunidade. Conforme refere o Ac. RE de 18/06/2013, proc. 30/12.0TQFAR.E1, “Só é legítima a aplicação de medida tutelar educativa desde que verificados, cumulativamente, os seguintes pressupostos: o menor cometa facto ilícito tipificado na lei penal como crime; necessidade de correcção da sua personalidade no plano do dever-ser jurídico manifestada na prática do facto; que essa necessidade subsista no momento da decisão da aplicação da medida.” No caso concreto, é indiscutível – e o Recorrente não o põe em crise neste recurso – que praticou factos qualificados na lei como crime e que se justifica a sua sujeição a uma medida tutelar educativa; ponto é saber se a concretamente aplicada é excessiva, por desnecessária, e se bastaria o recurso a uma outra, de natureza não institucional ou, sendo de natureza institucional, em regime semi-aberto de menor duração. As medidas tutelares possíveis estão enunciadas no art.º 4º da Lei Tutelar Educativa, que tem o seguinte teor: «1 – São medidas tutelares: a) A admoestação; b) A privação do direito de conduzir ciclomotores ou de obter permissão para conduzir ciclomotores; c) A reparação ao ofendido; d) A realização de prestações económicas ou de tarefas a favor da comunidade; e) A imposição de regras de conduta; f) A imposição de obrigações; g) A frequência de programas formativos; h) O acompanhamento educativo; i) O internamento em centro educativo. 2 - Considera-se medida institucional a prevista na alínea i) do número anterior e não institucionais as restantes. 3 - A medida de internamento em centro educativo aplica-se segundo um dos seguintes regimes de execução: a) Regime aberto; b) Regime semiaberto; c) Regime fechado.» Aqui chegados, recordemos o modo como o acórdão recorrido justificou em particular a escolha da medida tutelar institucional: « A factualidade dada como provada depõe no sentido da necessidade de aplicação de medida tutelar ao jovem, assim a sensibilizando para o direito (cfr. artigo 22 nº 1 da LTE), o que só será conseguido através da satisfação das específicas necessidades educativas do jovem para o direito, com especial atenção para a necessidade da jovem adquirir competências pessoais e sociais, com um forte enfoque no acompanhamento psicológico e psicoterapêutico (como forma de contribuir para uma saúde mental e psicológica sãs) e com o apoio da jovem na vertente escolar/formativa. Efetivamente, resulta da perícia à personalidade junta aos autos que «Da avaliação realizada, resulta a elevada probabilidade de o jovem AA se voltar a envolver em situações em que os direitos dos outros não são respeitados, sem que reconheça o desvalor das suas condutas, e a necessidade de reparação das mesmas, revelando uma insuficiente internalização do interdito e da lei, como elementos reguladores das relações sociais. Tende a adotar uma postura de suposta adequação, sem que, contudo, revele ter necessidade de refletir e de reparar os comportamentos que vinha adotando, minimizando as consequências dos mesmos. Evidencia acentuada necessidade e educação para o direito, que denotam na necessidade de uma intervenção especializada em meio estruturado e contentor, em regime fechado, de molde a que interiorize valores conformes ao direito e para que adquira recursos e competências pessoais e sociais que possibilitem a construção de uma identidade, juridicamente responsável.» Acresce que o percurso de vida do jovem foi sempre marcado pelo absentismo escolar (ainda se encontra a concluir o 6º ano), a disfuncionalidade (caracterizada pela adoção de comportamentos disruptivos e agressivos com pares e adultos) e a falta de supervisão parental (da qual naturalmente resultava a falta de reconhecimento da autoridade dos adultos). A progenitora e os avós maternos (com quem desde cedo residiu) têm-se revelado incapazes de acompanhar o AA e de lhe proporcionar o ambiente contentor e securizante necessário a que o mesmo desenvolva competências pessoais e sociais, com destaque para uma formação que o habilite a, como qualquer cidadão deste país, ter as imprescindíveis ferramentas para no futuro ingressar no mundo do trabalho. Apesar das tentativas de ajudar o jovem e de lhe proporcionar os acompanhamentos necessários a conferir as competências pessoais e sociais necessárias a investir o seu futuro, não foram as mesmas suficientes para que o Jovem invertesse o percurso disruptivo e se consciencializasse da necessidade de mudança. Nem a progenitora, nem os avós nem a medida de promoção de apoio junto dos avós maternos se revelaram suficientes para demover o jovem de colocar em perigo para a sua própria segurança e de terceiros, a sua saúde, desenvolvimento e formação, sendo, por isso, de excluir a aplicação de medida tutelar não institucional. Face ao exposto, o Tribunal entende, assim, que a medida mais adequada é uma medida que, aliando todo o controlo e apoios necessário, consiga oferecer ao AA uma maior responsabilização e investimento no seu percurso escolar, por forma a que também adquira ou reforce as suas competências pessoais e sociais, com uma consciência real e verdadeira dos comportamentos ilícitos que praticou, dos bens jurídicos que ofendeu e do efeito que teve no Outro enquanto indivíduo e ser integrado em Sociedade, sem se sentir desprotegido, face às circunstâncias de vida do mesmo. No caso vertente, as necessidades de educar o AA para o direito imperam sobre qualquer outro critério (por forma a atingir a mudança que se pretende alcançar em termos e personalidade e atuação futura), prevalecendo na decisão a tomar, sendo que a escolha da medida tutelar tem que ser orientada pelo interesse do jovem (cfr. artigo 22 nº 1, 62, nº 3 e 72, nº 1 da LTE). Efetivamente, urge afastar este Jovem dos perigos em que se tem colocado, dos meios sociais em que se tem movido e que têm feito parte do seu quotidiano por forma a viabilizar uma intervenção psicoterapêutica junto do mesmo que viabilize a sua estabilização e a aquisição de ferramentas/competências sociais e emocionais. Só assim será possível lograr que o Jovem invista na sua formação profissional e que se empenhe em criar as condições para se vir a inserir de forma ajustada em sociedade. Denota-se, igualmente, a falta de capacidade da parte da Progenitora e da Avó Materna para fazer face às necessidades do Jovem, e que o mesmo não aderiria á medida de acolhimento que estava proposta no processo de promoção e proteção nem ao acompanhamento que com a mesma poderia beneficiar. Assim e pese embora o Jovem tenha confessado os factos que lhe eram imputados e tenha referido que neste momento não agiria da mesma forma, não se afigura que o tempo que esteve no Centro Educativo (3 meses), e ainda que revele uma evolução positiva, tenha sido suficiente para sedimentar as mudanças que o mesmo alega já se verificarem. O relatório social com perícia psicológica tem cerca de um mês e é inequívoco na necessidade de ser proporcionado ao Jovem um ambiente contentor que lhe permita se reorganizar e recentrar a sua vida investindo em si próprio e no seu futuro, afastando-se da marginalidade e delinquência. O seu historial de vida, os antecedentes familiares, toda a envolvência dos bairros onde os familiares residem e se movem fazem temer que quaisquer saídas propiciem a sua fuga e que se perca a possibilidade de ajudar este Jovem a encontrar o seu rumo. A família não se tem demonstrado contentora, não se tem revelado como uma alternativa no seu acompanhamento, razão pela qual não se afigura que as saídas do Jovem do Centro Educativo se possam realizar de forma segura e gratificante para o Jovem.» Ora, afigura-se-nos acertado o enquadramento jurídico geral que o Tribunal a quo faz nesta matéria, e acertada ainda a escolha de uma medida de natureza institucional, afigurando-se que esta é proporcional à gravidade dos factos e às necessidades educativas do Recorrente. Os factos provados dão conta do insucesso de todas as medidas de promoção e proteção aplicadas até este momento, mormente em meio natural de vida, tendo o jovem permanecido num percurso disruptivo que culminou com a prática dos factos em análise, sendo que todos os esforços desenvolvidos no sentido daquele se afastar de comportamentos desviantes não têm obtido qualquer sucesso. Também as medidas tutelares não institucionais previamente aplicadas não tiveram qualquer influência na conformação dos comportamentos do jovem, o que evidencia que também estas são inviáveis na sua educação para o Direito, sendo que no âmbito do ITE 591/22.5GACSC, após revogação da suspensão do processo, foi-lhe aplicada a medida tutelar educativa de acompanhamento educativo com a duração de 12 meses (PTE 7852/10.4TBCSC-D), sem que tenha cumprido as ações contantes do projeto educativo pessoal, ainda que lhe tivesse sido imposta a obrigação de consultas de acompanhamento pedopsiquiátrico/psicológico, que nunca frequentou, por entender não necessitar das mesmas. O jovem AA consome substâncias estupefacientes desde os 12 anos, vindo tal consumo a aumentar, levando a que grande parte do seu tempo fosse passado, em convívio com indivíduos mais velhos, com condutas antissociais /delinquentes. O menor repetiu 4 vezes o 6º ano de escolaridade e não transitou de ano. O jovem AA beneficiou de processo de promoção e proteção que decorreu na CPCJ de ..., sendo em 2023 aplicada medida de promoção e proteção de apoio junto dos avós e da mãe, que não foi possível executar por falta de colaboração de todos Em ... de 2024 foi integrado no centro de formação profissional da ..., no curso de …, com equivalência ao 9º ano de escolaridade, tendo inicialmente revelado alguma capacidade de integração junto dos pares mas volvido pouco tempo, denotou dificuldades de adaptação à dinâmica institucional, revelando desmotivação pelo curso, dificuldades de autocontrolo, falta de cumprimento das tarefas propostas, absentismo injustificado, assim como comportamentos de oposição e de agressividade, envolvendo-se numa situação de agressão a um colega, que conduziu a que, lhe fosse aplicada, a sanção disciplinar de suspensão de frequência das aulas. Persiste em comportamentos em que não reconhece as figuras de autoridade, adotando condutas de resistência ao cumprimento de regras básicas de interação social, adotando condutas agressivas, provocadoras e hostis. Não merece assim qualquer critica que apenas a medida de internamento em centro educativo se apresente como adequada às necessidades de educação evidenciadas pelo recorrente, pois impõe um afastamento temporário do seu meio habitual, que permitirá consolidar o processo de mudança já iniciado. E aqui entramos no âmago do principal argumento utilizado pelo recorrente, qual seja a de que se mostra provado na decisão que “Desde que ingressou no centro educativo tem vindo a adequar os seus comportamentos, tendo sido registada uma evolução muito positiva quer ao nível dos comportamentos com os demais jovens, quer com a equipa educativa, revelando interesse e empenho no prosseguimento do seu percurso escolar.” Entende este, assim, que as finalidades que se visavam atingir com a aplicação da medida de internamento já sofram alcançadas, pelo que a aplicação da medida em análise se mostra inadequada. Não se ignora que há alguns indicadores de melhoria no comportamento do Recorrente, onde readquiriu, aparentemente, interesse em adquirir competências de trabalho e empenho, quer nos estudos quer no relacionamento inter-pares. Poderá esta nova realidade consubstanciar eventualmente um princípio de mudança na vida do recorrente, mas trata-se de algo que é ainda manifestamente escasso e incipiente para que vejamos como desnecessária uma medida tutelar em meio institucional, dado não revestir a capacidade de indicar uma alteração definitiva, sustentada e cabal da personalidade deste. Face ao à gravidade dos comportamentos desviantes, e ao insucesso de todas as medidas até agora de que aquele foi alvo, a evolução verificada demonstra sim, e ao contrário do propugnado, do acerto da decisão do tribunal recorrido, dado que a mudança comportamental do jovem apenas ocorreu, finalmente, quando o mesmo foi afastado da envolvência social em que se encontrava. Tal demonstra que esse é o único caminho que poderá obstaculizar a uma permanente radicalização daquele no âmbito de comportamento anti-sociais e logo da manifesta necessidade de uma medida de internamento. E não se pode esquecer, como bem refere o Ministério Público, que “As medidas cautelares são preliminares, apresentando-se como preparatórias da medida definitiva, visando acautelar a averiguação no processo da eventual prática do facto e necessidade educativa do menor, não se confundindo com as medidas tutelares”, de onde resulta o desacerto da argumentação do recorrente, que entende que as finalidades da medida de internamento já foram atingidas no âmbito de uma medida cautelar. Como veremos adiante, a medida de internamento passará por pela elaboração de um projeto educativo pessoal, com base nas características e necessidades de cada jovem em concreto, individualizado e específico, que permitirá um acompanhamento especializado e focado para a educação e capacitação do jovem visado. E aqui entramos já na segunda questão do recurso, porquanto assumindo-se uma medida de internamento, propugna o recorrente que seja contemplado um regime semi-aberto e não o fechado, fixado no acórdão recorrido, sem que se verdadeiramente invoque qualquer vício da decisão recorrida, antes porque entende apenas que esse seria o mais adequado. A este respeito importa ter presente que no caso concreto, face à gravidade dos factos em apreço, seria legalmente possível escolher qualquer dos três regimes de internamento: aberto, semiaberto ou fechado (arts. 4º, nº 3 e 17º, nºs 2 a 4 da Lei Tutelar Educativa). Nas suas linhas gerais, plasmadas nos arts. 167º a 169º da Lei Tutelar Educativa: - no regime aberto os menores residem e são educados no estabelecimento, mas frequentam no exterior, preferencialmente, as atividades escolares, educativas ou de formação, laborais, desportivas e de tempos livres previstas no seu projeto educativo pessoal; os menores podem ser autorizados a sair sem acompanhamento e a passar períodos de férias ou de fim de semana com os pais, representante legal, pessoa que tenha a sua guarda de facto ou outras pessoas idóneas; e no desenvolvimento da atividade educativa os centros educativos de regime aberto devem incentivar a colaboração do meio social envolvente, abrindo ao mesmo, tanto quanto possível, as suas próprias estruturas; - no regime semi-aberto os menores residem, são educados e frequentam atividades educativas e de tempos livres no estabelecimento, mas podem ser autorizados a frequentar no exterior atividades escolares, educativas ou de formação, laborais ou desportivas, na medida do que se revele necessário para a execução inicial ou faseada do seu projeto educativo pessoal; e as saídas são normalmente acompanhadas por pessoal de intervenção educativa, mas os menores podem ser autorizados a sair sem acompanhamento para a frequência das atividades referidas e a passar períodos de férias com os pais, representante legal, pessoa que tenha a sua guarda de facto ou outras pessoas idóneas; - e no regime fechado os menores residem, são educados e frequentam atividades formativas e de tempos livres exclusivamente dentro do estabelecimento, estando as saídas, sob acompanhamento, estritamente limitadas ao cumprimento de obrigações judiciais, à satisfação de necessidades de saúde ou a outros motivos igualmente ponderosos e excecionais; e para efeitos de revisão da medida, pode o tribunal autorizar, mediante proposta dos serviços de reinserção social, saídas sem acompanhamento por períodos limitados. Face à natureza dos factos imputados ao recorrente e à sua ligação a grupos de pares associados a comportamentos desviantes e ilícitos, o regime semi-aberto propugnado neste recurso seria manifestamente inadequado à realização das finalidades perseguidas, dado que permitiria o acesso do Recorrente ao seu meio natural de vida, que, como se vem salientando, nunca conseguiu obstaculizar aos desvios comportamentais deste, pelo contrário, só os facilitou. Por outro lado, desde logo, a medida de internamento em regime fechado não se reconduz a uma mera medida contentora ou securitária, determinante do afastamento do menor do seu meio natural de vida. Na realidade, o cerne dessa medida encontra-se na necessidade de proporcionar ao menor das condições educativas passíveis de o reconduzir a uma perspectiva de vida conforme às regras socialmente adequadas (vd.Ac.RP de 17/01/2018, proc.511/17.9Y6PRT.P1). Como se deixou já visto, a medida de internamento visa proporcionar ao menor, por via do afastamento temporário do seu meio habitual e da utilização de programas e métodos pedagógicos, a interiorização de valores conformes ao direito e a aquisição de recursos que lhe permitam, no futuro, conduzir a sua vida de modo social e juridicamente responsável. E mesmo que em sede de medida cautelar, vejam-se os frutos já conseguidos ao fim de poucos meses, algo que anos de medidas de apoio diversas nunca conseguiram atingir, pelo que deveria ser o próprio recorrente, se efectivamente pretende reorganizar a sua vida, a não enjeitar tal oportunidade. E, assim, somos remetidos para o âmbito da execução da medida por forma a que dela possa ele próprio, retirar todas as vantagens para a sua vida futura, em termos de adopção de comportamentos adequados às regras que regulam a vida em sociedade. A começar, desde logo, pela sua adesão, interiorização à ideia da necessidade de investimento, também, da sua parte, para combater e fazer inverter o percurso que culminou com o quadro apurado nos autos, a fim de se alcançarem tais benefícios, em termos de educação da sua personalidade, em formação, despida de qualquer preconceito de estigmatização – que não existe, de todo. O regime fechado será, pois, o mais indicado, ainda que tal não deixe de comportar um significativo isolamento face ao universo de influências patológicas e de oportunidade de desvios do seu meio natural de vida, mas que vimos já, se revela fundamental. Se a isso associarmos a possibilidade de acesso a um apoio educativo especializado, próprio dos regimes de internamento, estamos em crer que poderá o recorrente vir a trilhar um caminho de crescente e sólido apego aos valores educativos, mormente de «respeito pelo outro», que se espera adquira definitivamente. * Defende por fim o recorrente que a medida não deverá ter duração superior a 6 meses. Lê-se nesta matéria no acórdão recorrido o seguinte: «No entanto, caso se venha a verificar que o percurso do Jovem, as suas aquisições, os seus comportamentos e, bem assim, o ambiente familiar para onde sairia, aconselha que lhe seja dado um voto de confiança e que estejam, assim, reunidas as condições para o efeito, será sempre possível ser determinada a alteração da medida aplicada para um internamento em regime semiaberto, estando do lado do jovem demonstrar, com o seu empenho nos programas e na sua formação, que se encontra preparado para um regime menos contentor. Até lá e face ao exposto, por se revelar imperioso integrar o jovem num contexto sustentado, estruturante e contentor, educando-o para o direito e corrigindo a sua personalidade no sentido da sua conformação com os valores sociais e com o dever ser/estar e a falta de resposta familiar, a medida que se revela adequada é a medida de internamento em centro tutelar educativo, em regime fechado, pelo período de 18 (dezoito) meses, que é o período que se considera adequado para a mudança que se pretende na vida do jovem, de molde a permitir uma intervenção especializada em meio estruturado e contentor, que incida em métodos e frequência de programas de natureza sociopedagógica, escolar/profissional e terapêuticos, que contribuam para a interiorização de valores conformes ao direito e a aquisição de competências pessoais e sociais, que possibilitem a construção de uma identidade, individual e social, juridicamente responsável, intervenção essa que tem de se prolongar no tempo atentas as elevadíssimas necessidades de educação para o direito que apresenta (sem prejuízo de se poder ponderar, a médio prazo, dependendo do percurso a realizar pelo jovem no âmbito da medida aplicada, a sua flexibilização e, eventual alteração para uma medida de internamento em regime semiaberto) — cfr. artigos 1°, 2°, 4° n° 1, al. i), 6°, 7°, 172 n° 1 e n° 4, als. a) e b) e 18°, todos da LTE..» Afigura-se-nos totalmente acertada esta fundamentação. Com efeito, o histórico de comportamentos desviantes do Recorrente é significativo e desenvolveu-se até data muito recente, sendo que entre os factos em análise mediaram cerca de 5 meses, não se coibindo aquele da prática, por uma segunda vez, de factos ainda mais gravosos, sempre revelando desrespeito pela integridade física, liberdade pessoal e reserva da vida privada, numa gratuitidade de comportamentos delituosos que inequivocamente indiciam que não será fácil, nem rápido, reconduzi-lo ao rumo do dever - ser social que se lhe impõe como cidadão. Não se afigura, assim, excessivo o período de 18 meses fixado, sendo certo – e importa realçar tal quadro normativo - que a medida tutelar educativa aplicada é suscetível de revisão, a requerimento, logo que concluídos três meses a contar do início da execução ou da última revisão; oficiosamente a todo o momento e obrigatoriamente de seis em seis meses; podendo dessa revisão resultar, entre o mais, uma modificação do regime implementado ou da natureza da medida e até a extinção desta, nos termos legalmente previstos, em função de uma apreciação atualizada da necessidade, adequação e proporcionalidade da medida em vigor à luz da evolução registada pelo Recorrente (arts. 137º, nºs 4 a 6 e 139º, nº 1 da Lei Tutelar Educativa). Em face do exposto, falece por inteiro razão ao recorrente, na sua pretensão, pois que, a medida aplicada na primeira instância é justa e necessária. Acresce que, não se vislumbra que tenham sido violadas as normas contidas na LTE, designadamente, nos seus artigos 6.º, 7.º, 16.º a 18.º da LTE. °, nem que não se tenha feito correcta aplicação dessa lei. » III- DISPOSITIVO Pelo exposto, acordam os juízes da 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso do recorrente AA, mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos. Sem custas por delas estar isento o recorrente (artigo 4º, nº 1, alínea i), do RCP). Notifique nos termos legais. » Lisboa, 3 de Junho de 2025 (O presente acórdão foi processado em computador pelo relator, seu primeiro signatário, e integralmente revisto por si e pelos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos – art.º 94.º, n.º 2 do Código de Processo Penal - encontrando-se escrito de acordo com a antiga ortografia) Os Juízes Desembargadores, João Grilo Amaral Paulo Barreto Rui Coelho _______________________________________________________ 1. Indicam-se, a título de exemplo, os Acórdãos do STJ, de 15/04/2010 e 19/05/2010, in http://www.dgsi.pt. 2. Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. 3, Universidade Católica Editora, 2015, pág.335; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos Penais, 8.ª ed., Rei dos Livros, 2011, pág.113. 3. Conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada pelo Acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95 de 19/10/1995, publicado no DR/I 28/12/1995. |