Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA TERESA F. MASCARENHAS GARCIA | ||
Descritores: | CONDOMÍNIO CAPACIDADE JUDICIÁRIA ADMINISTRADOR LEGITIMIDADE ACTOS DE CONSERVAÇÃO CONDENAÇÃO CONDICIONAL INEPTIDÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 02/20/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I. O condomínio constitui um centro autónomo de imputação de efeitos jurídicos, razão pela qual o legislador o dotou de organicidade e, embora não lhe tenha atribuído personalidade jurídica (ao contrário do que acontece noutros países), admite que o mesmo possa ser parte em acções judiciais. II. A concessão de personalidade judiciária ao condomínio não é lata e irrestrita: a medida da mesma coincide com as funções do administrador. Fora deste âmbito (dos poderes do administrador) o condomínio não tem personalidade judiciária, o que determina que - em tudo o que se situe fora daquele âmbito – os condóminos agirão em juízo em nome próprio, com a personalidade judiciária que a personalidade jurídica lhes confere. III. O artigo 12.º, al. e), do CPC tem necessariamente de ser conjugado com os artigos 1436.º e 1437.º do CC, onde se regula sobre as funções e legitimidade do administrador. IV. Os actos conservatórios previstos na al. g) do art.º 1436.º do CC, quer sejam de natureza material e/ou judicial, são os que nada resolvem em definitivo, que não comprometem o futuro, visando apenas manter uma coisa ou um direito numa determinada situação, isto é aqueles que são adequados a evitar a degradação ou destruição do conjunto de elementos que integram as partes comuns do edifício constituído em propriedade horizontal. V. Quando a questão se centra na ausência de deliberação, estamos já no âmbito da capacidade judiciária e da falta de deliberação, tal como a mesma vem regulada no art.º 29.º do CPC, e não no campo da falta de personalidade judiciária. VI. Numa acção judicial, a formulação do pedido é uma necessidade que resulta da consagração do princípio do dispositivo; mas a lei não se basta com a formulação do pedido, antes impondo que o mesmo seja formulado de modo claro e inteligível e que seja preciso e determinado – art.º 186.º do CPC. VII. Por força do princípio da determinabilidade do conteúdo das decisões judiciais, a lei processual não admite, por via de regra, a condenação condicional, isto é, aquela em que o reconhecimento do direito fica dependente da hipotética verificação de um facto futuro e incerto. VIII. À semelhança das situações de ineptidão da petição inicial, a formulação de pedidos condicionais, vagos e genéricos consubstancia uma excepção dilatória, geradora de absolvição da instância, sendo inquestionável, em face do artigo 577º do CPC (onde consta expressamente a referência a “entre outras”) o carácter exemplificativo das excepções ali tipificadas. (Sumário elaborado pela relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório: CONDOMÍNIO DO PRÉDIO SITO NA …, LISBOA intentou acção declarativa com processo comum contra P, ATIVIDADES HOTELEIRAS LDA., M e H, MA e BANCO … S.A. pedindo que: a) Sejam os 1.º, 2.ºs e 4.º Réus condenados a usar a fração “C” para fins exclusivamente habitacionais, bem como, na sanção pecuniária compulsória, de 100,00€ (cem euros), por cada dia de atraso no cumprimento ou em situação de incumprimento deste dever; b) sejam todos os Réus, solidariamente condenados a: i. Custear os estudos que o Autor mandará elaborar, demonstrativos do impacto que a remoção das lajes, alteração dos vãos e reposição em diferente local, tiveram, ou podem vir a ter, na estabilidade e segurança de todo o prédio; ii. Em função das conclusões técnicas obtidas, custear todas as obras necessárias para reconstituir uma situação idêntica à preexistente relativamente às remoções por si realizadas, com garantias de plena estabilidade para o prédio; iii. Apresentar à Câmara Municipal de Lisboa os projectos necessários, tendo em vista a regularização formal do processo do edifício e reduzir, até onde for possível, o risco gerado pela ofensa às suas estruturas; iv. Garantir, por meio de inscrição sobre as fracções B e C, na Conservatória do Registo Predial, sem limite de capital e como encargo em espécie, sem prazo determinado os riscos que, mesmo com a execução dos trabalhos que sejam recomendados pelos estudos a efetuar, sempre subsistirão; v. Reembolsar todas as despesas suportadas, em resultado da sua conduta, em causa nestes autos, designadamente a título de honorários, encargos e taxas de justiça, custas judiciais e pareceres técnicos que se venham a apurar em sede de execução de sentença. Alegou em síntese a Autora que: - o prédio urbano sito na … n.ºs --, ---A, --B, --- C e--- D, descrito na Conservatória de Registo Predial de Lisboa sob o n.º ---/20090106, freguesia de ---, é um imóvel com mais de 50 anos, construído em betão, com lajes entre os pisos, envolvendo estrutura em ferro armado, com cerca de 30 metros de altura, 15,70 de largura e 20 metros de comprimento, alicerçado numa cave abaixo do nível do solo; - a fracção A é composta por loja com entrada pelos n.ºs ---A e ---B, com cerca de 7 metros de frente para a ---, com uma divisão e sanitários no rés do chão e cave ampla na área imediatamente inferior; - a fracção B é também composta por loja com entrada inicialmente pelos números ---C e ---D - e actualmente só por este – de aproximadamente 5 metros de frente para a ---, tornejando para a Travessa ---, m cerca de 20 metros, sendo composta de uma divisão e sanitários no rés do chão e cave ampla na área imediatamente inferior. - a fracção C é composta pelo 1.º andar direito com destino a habitação; - o prédio está alicerçado numa cabe cujo espaço é ocupado pela caixa dos elevadores e a restante parte dividida, no sentido perpendicular à ---, pelas fracções A e B; - o piso térreo corresponde ao r/c, tendo dois níveis: a entrada e átrio do prédio, assim como a fracção A e parte da fracção B ao nível do passeio; e a restante parte da fracção B, e o acesso aos elevadores e escada do prédio, a cerca de um metro acima; - todos os restantes pisos a partir do primeiro, estão separados por placas niveladas; - no dia 29-01-2019 foi deliberado em Assembleia de Condóminos que “os proprietários das fracções que realizem obras de remodelação/beneficiação na sua fracção, são obrigados a informar, com pelo menos 15 dias de antecedência, a administração, bem como a entregar uma redacção de todos os trabalhos a ser executados, duração da obra e seguros de empreiteiro e subempreiteiro”, tendo nessa mesma assembleia sido votado por unanimidade a continuidade da empresa G.- Gestão de condomínios Lda., que exerce a administração do condomínio do prédio em questão; - A 1.ª Ré é uma sociedade que explora o estabelecimento de pastelaria instalado no rés do chão e cave, correspondente à fracção B, por força de contrato de arrendamento celebrado com o 3.º Réu, sendo os 2.ºs Réus sócios gerentes daquela e também utentes habitacionais da fracção C; - a referida fracção C é propriedade do 4.º Réu, tendo sido dado em locação financeira à 1.ª Ré; - em data anterior a 2019 a 1.ª Ré, por decisão e sob gerência dos 2.ºs Réus, demoliu a placa existente entre a cave e o r/c da fracção B, na parte em que ela estava elevada em relação aquela que se situa na cota zero, com o objectivo de colocar todo o estabelecimento ao mesmo nível, nivelando o r/c na totalidade com o passeio da ---; - o 3.º Réu, na qualidade de proprietário e condómino da Autora, nada disse ou comunicou à administração ou demais condóminos e, como proprietário e senhorio, não se opôs, nem obteve autorização para as mesmas, incluindo da Câmara Municipal; - para o efeito cortou as amarrações de ferro e removeu o betão da estrutura construtiva do prédio, e, além disso, abriu uma porta para a praça ---, com cerca de 2 m de largura e modificou as escadas entre o r/c e a cave; - em finais de Novembro de 2019 iniciaram-se obras nas fracção B e na fracção C, tendo a Administração do Condomínio sido para isso alertada pelos condóminos, uma vez que nada foi comunicado ou autorizado pela administração; - no interior da fracção C foram demolidas a maioria das paredes interiores, tendo algumas sido substituídas por pladur, bem como foi executada uma abertura na laje do pavimento, passando a constituir vão aberto para a aplicação de escada na ligação entre as fracções B e C, o que implicou o corte das armaduras resistentes existentes na zona; - assim como foram alteradas substancialmente duas casas de banho e reduzida a área da cozinha, bem como foram alterados os traçados de águas quentes e frias, esgoto e electricidade; - em virtude das intervenções, a fracção C, de uso habitacional, passou a ter uma tipologia diferente, diversa do projecto aprovados e das telas finais do prédio existentes na C.M.L.; - A administração do condomínio participou à polícia municipal mas, face à inércia dos órgãos responsáveis pela fiscalização pública, acabou por, através da representante legal da empresa que administra o condomínio, proceder ao embargo extrajudicial de obra nova, o qual ocorreu a 21-12-2019; - nesta sequência, foi requerida a rectificação do embargo, o qual foi distribuído ao juízo local cível de Lisboa, juiz 22, correndo termos sob o n.º 28143/19.0T8LSB; - por razões formais, foi negada a ratificação do embargo; - as obras efectuadas e a utilização da fracção C para fim diverso do habitacional viola normas de segurança, põe em causa a sustentabilidade estrutural do prédio e não foram objecto de licenciamento ou aprovação camarária; - a situação coloca em causa toda a estrutura do edifício, podendo originar uma ruptura na cadeia de distribuição de cargas e provocar o colapso do prédio. Conclui assim pela ilicitude da conduta dos Réus consequente condenação dos mesmos nos pedidos formulados. Devidamente citados vieram os Réus contestar. A 03-02-2023 veio o 3.º Réu MA apresentar a sua contestação, na qual, impugnando os factos constantes da petição inicial alegou, em suma, o seguinte: - foi informado, em meados de 2019, que a 1.ª Ré havia adquirido a fracção C e pretendia efectuar uma ligação entre a fracção B e aquela, não tendo sido informado dos detalhes da obra ou autorizado a mesma; - nunca lhe foi dado conhecimento o de qualquer visita da Polícia Municipal nem foi contactado pela administração do condomínio dando conhecimento de qualquer preocupação com as obras em curso; - não tem conhecimentos técnicos, confiou que a 1.ª Ré realizaria as obras com escrupuloso cumprimento das regras de segurança e obtenção de autorizações administrativas; - apenas tomou conhecimento das obras concretamente efectuadas após as mesmas estarem concluídas e de imediato questionou a 1.ª Ré que lhe assegurou que as mesmas não colocavam em causa a segurança da loja ou do edifício; - a perícia efectuada no âmbito do procedimento cautelar concluiu que as obras realizadas pouco provavelmente poderão acarretar prejuízo sério à estrutura do prédio e que muito dificilmente põem em causa a sua sustentabilidade estrutural; Conclui assim pela improcedência da presente acção e sua consequente absolvição do pedido. A 13-02-2023 veio o 4.º Réu Banco -- S.A. apresentar contestação excepcionando a falta de capacidade judiciária e de poderes de representação da Autora, a sua ilegitimidade passiva, excepção dilatória inominada de ilegalidade de pedidos genéricos e impugnando os factos alegados por desconhecimento, inverdade, imprecisão ou deles não resultar a conclusão jurídica pretendida pelo Autor, alegando, em suma, o seguinte: - não foi executou, mandou executar, foi informado ou deu autorização para a realização de qualquer obra na fracção C; - apenas teve conhecimento das referidas obras com a citação para o procedimento cautelar melhor identificado na petição inicial; - nunca foi interpelado ou questionado pelo Autor, ou qualquer outra entidade, sobre as obras em discussão nos autos; - nunca foi questionado pela locatária acerca da alteração/modificação da afectação do imóvel, conforme o impunha o art.º 12.º do contrato de locação financeira celebrado com aquela; - atento o teor do relatório pericial não foi apresentada evidência de que as obras alegadamente executadas na fracção C correspondam às alegadas pela Autora e tenham a extensão e impacto por esta atribuídos. Conclui assim pela procedência das excepções dilatórias/peremptória invocadas e a consequente absolvição da instância/pedido, respectivamente, ou, caso assim não se entenda pela total improcedência da acção por não provada e falta de fundamento legal. A 14-02-2023 vieram os 1.º e 2.ºs Réus apresentar contestação, na qual excepcionaram a ilegitimidade da Autora para intentar a presente acção, e impugnaram a factualidade constante da petição inicial, alegando em suma que: - toda a obra efectuada na fracção B foi objecto de licenciamento camarário; - nas obras efectuadas na fracção C não houve qualquer intervenção em vigas ou pilares; - o relatório do engenheiro da obra demonstra a falsidade das alegações da Autora, realçando a existência de um projecto de estabilidade prévio à obra, que deu cumprimento à legislação em vigor, estando a estabilidade calculada e assegurada; - do mesmo modo concluiu o Relatório de inspecção ao local, que deixou claro que as obras, por si só, muito dificilmente põem em causa a sustentabilidade estrutural do prédio ou podem originar prejuízo sério à estrutura do edifício ou ruptura na cadeia de distribuição de cargas ou até colapso do imóvel; - a ratio da proibição de obras que constituam inovações é a protecção daa segurança e estabilidade do edifício e, por arrastamento, a protecção da propriedade dos restantes condóminos; - pelo que as obras efectuadas não podem ser consideradas inovações, não estando igualmente sujeitas a qualquer licenciamento camarário; - a deliberação que obriga à comunicação de obras é uma norma de um regulamento de uso das partes comuns do edifício e inválida por não ter sido aprovada nos termos e condições previstos na lei. Concluem assim pela totalmente improcedência do pedido do Autor. Por despacho de 12-09-2023 convidou-se o Autor a responder às excepções invocadas em sede de contestação, a fim de agilizar os trabalhos a realizar em sede de audiência prévia, o que o mesmo veio fazer por articulado apresentado a 03-10-2023, na qual pugna pela improcedência das mesmas, ou seja, o seu conhecimento relegado para final. Designada data para Audiência Prévia realizou-se a mesma e, na impossibilidade da conciliação entre as partes, foi proferido despacho saneador no qual (i) conheceu a excepção de falta de capacidade da Autora, considerou a falta de personalidade e capacidade judiciária do Autor condomínio, (ii) assim como da excepção inominada de formulação ilegal de pedidos genéricos e, em consequência, absolveu as Rés da instância, nos termos do art.º 287.º, n.º 1, al. c) e), 576.º, n.º 2, 577.º, al. c) e 578.º, todos do CPC. Inconformados com o despacho saneador que absolveu os Réus da instância, veio o Autor Condomínio do Prédio sito na --- dele interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação. Nas alegações apresentadas pelo Autor foram formuladas as seguintes conclusões: 1. O artigo 590º, nº 2, alínea a) do C.P.C. dispõe que “…2 - Findos os articulados, o juiz profere, sendo caso disso, despacho pré-saneador destinado a: a) Providenciar pelo suprimento de exceções dilatórias, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º; …” 2. O dever de o juiz providenciar pelo suprimento das exceções dilatórias constitui um poder vinculado, de forma a permitir que o processo possa prosseguir com regularidade e possibilitar uma decisão de mérito sobre a pretensão das partes; e a omissão de tal poder/dever, constitui nulidade processual nos termos do art.º 195.º do CPC., conforme decidiu o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 19.06.2014. 3. Assim sendo, ao não ter sido notificado com o intuito de suprir tal irregularidade, nomeadamente, conforme requerido, para juntar aos autos deliberação com a autorização de todos os condóminos para intentar ação em conformidade, o despacho cometeu, por omissão, nulidade processual prevista no artigo 195º do C.P.C. 4. Mostram os autos que, o Tribunal a quo não providenciou pelo suprimento de tal exceção dilatória, tendo omitido sem mais tal ato. Não tendo sequer dado qualquer resposta ao requerido pelo Apelante. 5. O dever do juiz providenciar pelo suprimento das exceções dilatórias que detete, nos termos do art.º 590.º n.º 2 al a) nos termos do art.º 6.º n.º 2, não depende da posição das partes nos articulados quanto á existência daquelas, mas antes da necessidade de regularizar a instância, corrigindo as deficiências das partes, com vista ao essencial, ou seja, alcançar decisão de mérito. 6. Tal exceção é também passível de ser sanada, no âmbito do artigo 278º nº 2 e nº 3 do C.P.C. 7. Tendo o Tribunal a quo, omitido o dever de providenciar o suprimento da verificada exceção de falta de personalidade ou capacidade judiciária, ocorre indiscutivelmente uma nulidade processual (195.º do C.P.C). 8. Tal nulidade pode ser arguida em sede de recurso, por estar a coberto da decisão recorrida deve, pois, anular-se tal decisão determinando-se que o Tribunal de primeira instância providencie pelo suprimento das exceções dilatórias que detetar, convidando as partes a praticar os atos adequados para tanto, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 6.º do C.P.C. 9. O condomínio resultante da propriedade horizontal, relativamente às ações que se inserem no âmbito dos poderes do administrador, tem personalidade judiciária, conforme resulta da redação do artigo 12º, alínea e) do C.P.C. 10. Salvo o devido respeito, não se compreende a decisão de que não é o “Condomínio” que deve figurar como Autor nesta ação, porquanto, o próprio artigo 12.º, alínea e) do C.P.C, diz literalmente o contrário. 11. A presente ação insere-se no âmbito dos poderes do administrador, nomeadamente, na alínea g), do n.º 1, do artigo 1436.º do Código Civil que deverá ser objeto de uma interpretação extensiva, de acordo com o caráter orgânico da figura do Administrador, da sua posição na organização administrativa e do carácter autónomo da sua atividade. 12. Assim, é ao Condomínio que pertence a legitimidade para agir em juízo, no que toca a ações que se inserem no âmbito dos poderes do administrador. 13. A legitimidade conferida pelo artigo 1437.º do Código Civil ao administrador não exclui a legitimidade do próprio condomínio. Ele pode ser parte na acção, onde é representado pelo administrador. 14. A decisão em apreço confunde legitimidade processual com capacidade processual, na medida em que a questão sub judice concerne à representação do Condomínio. 15. Sendo o Administrador o órgão do Condomínio que tem a sua representação orgânica, está o Apelante representado ex necessário pelo seu administrador em exercício. 16. Além de que, a procuração forense foi outorgada pelo Administrador em exercício do Recorrente, à data da propositura da ação. 17. E bem assim, veio a Apelante em 19.03.2024 remeter via citius, requerimento com referência 38843146, no qual se juntou ata nº 82, onde veio indicar a nova administração de condomínio, agora em exercício. 18. É certo, não foi junta deliberação que autorizasse o poder de agir em juízo. 19. No entanto, não se vê a necessidade da existência de uma Assembleia de Condóminos que delibere a atribuição de poderes a advogado, quando, no exercício das funções de administrador, o Condomínio propõe ação, que, pela sua natureza, é de patrocínio judiciário obrigatório. 20. O Apelante tem legitimidade para interpor a presente ação, sem necessidade de uma deliberação de condóminos expressa, uma vez que invoca que as alterações introduzidas pelas obras levadas a cabo pelos Apelados, comprometem a segurança do edifício, estando, por isso, inserida nas funções de administrador. 21. Importa igualmente ter em atenção que em 13 de fevereiro de 2020, reuniu-se a Assembleia de Condóminos, na qual compareceu o subscritor como Advogado já constituído, que explicou a situação aos Condóminos, incluindo a existência do embargo, cuja apensação se requereu, tendo a Assembleia consensualizado a atuação da Administração, na constituição de Mandatário e no embargo extrajudicial, além de ter manifestado a necessidade de fazer intervir a Câmara Municipal de Lisboa, em paralelo com a ação judicial, como consta da Ata n.º 76, junta aos presentes autos no requerimento com referência 46693219, datado de 03.10.2023. 22. A menção em ata, assinada pelos condóminos presentes, constitui manifestação de vontade suficiente, da parte da Assembleia de Condóminos. 23. Nesse mesmo requerimento com referência 46693219, datado de 03.10.2023, veio o ora Apelante, indagar e requerer prazo para suprir tal irregularidade, uma vez que caso dúvidas ainda existissem, e se o Tribunal assim entendesse, ser necessário a introdução de ponto expresso na ordem de trabalhos e deliberações formais, o Apelante assim o faria. 24. Prazo esse, que nunca foi concedido ao Apelante, tendo o Tribunal a quo decidido sem mais. 25. O pedido de condenação formulado pelo Apelante na alínea a), no sentido de os Apelados usarem a fração autónoma para os fins exclusivamente habitacionais que o título constitutivo da propriedade horizontal institui, bem como, em sanção pecuniária compulsória não é ilegal e deve ser acolhido judicialmente. 26. A decisão segundo a qual utilizar a fração para o fim a que se destina é uma decorrência da lei, não cabendo ao Tribunal condenar a cumprir a lei, obrigação que se impõe a todos os cidadãos, deve ser revogada. 27. Se efetivamente um condómino está a violar a lei, o Tribunal tem o papel fulcral de a fazer cumprir. 28. Quanto ao pedido formulado na alínea a), o douto despacho saneador/sentença é insustentável. 29. Os pedidos devem ser claros e inteligíveis, coerentes com a causa de pedir e legalmente possíveis. 30. O Apelante sabe que foram feitas obras de rotura das lajes estruturais, das duas fracções dos Apelados, sem qualquer comunicação ao condomínio, ou seu Administrador, sem aprovação da Assembleia de Condóminos, nem da Câmara Municipal da área em que se situa o prédio, sem informação alguma, completamente à revelia e sem possibilidade de acesso ou observação do que foi feito, incluindo eventuais reforços ou substituições por vigas, vigotas, pilares ou outras que minimizem os efeitos da quebra das malhas de aço e ferro existentes. 31. Neste contexto, altamente limitados em termos de informação técnica, que sempre foi sonegada pelos Apelados, o Apelante condomínio, formula pedidos de condenação no custeio de estudos demonstrativos do impacto da remoção das lajes, alteração dos vãos e reposição em diferente local, tiveram, ou podem vir a ter na estabilidade e segurança de todo o prédio e em função das conclusões técnicas no custeio das obras necessárias a reconstruir uma situação idêntica à pré existente, o que é cristalino, possível, coerente com a causa de pedir, não se vendo onde está a ilegalidade. 32. Constituindo obrigação do condomínio manter a regularidade da construção na edilidade competente, não existe falta de clareza, ou obscuridade, ininteligibilidade, falta de coerência com a causa de pedir, ou ilegalidade no pedido formulado de apresentação à Câmara Municipal de Lisboa dos projetos necessários correspondentes às obras executadas e àquelas que eventualmente, possam vir a ser realizadas para reduzir o risco decorrente da ofensa às estruturas do prédio, tendo em vista a regularidade formal do processo municipal. 33. O pedido de garantia por meio de inscrição sobre as frações agressoras de inscrição predial, sem limite de capital, nem prazo, de responder pelos riscos que decorram, mesmo depois de executados trabalhos que sejam recomendados pelos estudos, acima referidos, é claro, inteligível, coerente com a causa de pedir, não resultando a sua ilegalidade de não ter capital, nem prazo, porquanto o risco gerado é, em si mesmo, insuscetível de ser quantitativa, qualitativa e temporalmente limitado. 34. O pedido de reembolso das despesas suportados pelo Apelante em resultado da conduta dos Apelados, designadamente, das obras ilícitas e ilegais, feitas à revelia, em causa nos autos, é claro, inteligível, coerente com a causa de pedir e absolutamente legal. 35. Mostram-se violados, além do mais os artigos 1436º e 1437º do Código Civil, 12º, 29º, 195º, 278º, 498º, 552º, 556º, 569º, 577º, 578º e 590º, todos do C.P.C. Conclui assim pela procedência da presente apelação e consequente revogação do despacho saneador, convidando-se o Autor ao suprimento das excepções dilatórias. O 4.º Réu/Recorrido Banco --- S.A. apresentou contra-alegações nas quais apresentou as seguintes conclusões: A. Vem o Autor, ora Recorrente, interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, que julgou procedente as exceções de falta de personalidade e capacidade judiciária do autor e bem assim da exceção inominada resultante da formulação ilegal de pedidos genéricos conclusivos e ilegais, e, em consequência, absolveu todos os réus da presente instância. B. Salvo o devido respeito, o recurso interposto pelo Autor carece em absoluto de qualquer fundamento C. No que concerne à falta da personalidade judiciária do condomínio, será de lembrar que o legislador, ciente de que o condomínio constitui um centro autónomo de imputação de efeitos jurídicos, dota-o de organicidade e, muito embora não lhe atribua personalidade jurídica, admite que ele pode ser parte nas ações que se inserem no âmbito dos poderes do administrador. D. Assim decorre direta e imediatamente do artigo 12º alínea e) do Código de Processo Civil, que ficciona a personalidade judiciária do condomínio relativamente às ações que se inserem no âmbito dos poderes do administrador. E. A medida da personalidade judiciária do condomínio coincide, portanto, com a das funções do administrador – ou seja, as ações que se inserem no âmbito dos poderes do administrador devem ser intentadas por (ou contra o) condomínio. F. Fora do âmbito dos poderes do administrador, o condomínio não tem personalidade judiciária e, portanto, os condóminos terão de agir em juízo em nome próprio. G. Nos termos do disposto no artigo 1437.º, nº 1 do Código Civil, o administrador pode agir em juízo, quer contra qualquer dos condóminos quer contra terceiros, na execução das funções que lhe pertencem ou quando autorizado pela assembleia. H. Ora, nos presentes autos está em causa a realização de obras que constituem inovações e alterações estruturais, sem que tenha sido obtida autorização da Assembleia de Condóminos para intentar a presente ação. I. A questão da presente ação, extravasa por completo o âmbito das funções do administrador, não se enquadrando em nenhuma das previstas no artigo 1436º do Código Civil. J. E mais, tal como confessado pelo autor, aqui recorrente, nomeadamente no ponto 18 das conclusões do presente recurso, não existe qualquer deliberação da Assembleia de Condóminos a autorizar o Administrador a intentar a presente ação. K. Em conclusão, há efetivamente falta de personalidade do condomínio, na medida em que a presente ação não se insere no âmbito dos poderes do administrador, nem sequer por via da atribuição destes pela Assembleia de Condóminos. L. Donde caberia aos condóminos agir em juízo em nome próprio, e não o autor condomínio. M. Já no que concerne à suposta sanação da falta de personalidade judiciária do condomínio, contrariamente ao que o Recorrente alega, esta é insanável. N. Isto porque, contrariamente ao que sucede em relação à falta de capacidade judiciária e à falta de legitimidade judiciária, a Lei não faz qualquer alusão à possibilidade de sanação da falta de sanação personalidade judiciária. O. E é perfeitamente compreensiva a posição do legislador: a falta de personalidade judiciária não permite que haja qualquer suprimento, ela é irremovível. P. Tal é igualmente a posição da doutrina, nomeadamente de Alberto dos Reis, de Antunes Varela e de Abrantes Geraldes, entre outros. Q. Há, todavia, casos em que a falta pode ser suprida, como seja o caso previsto no artigo 14º do Código de Processo Civil relativo à falta de personalidade judiciária das sucursais, filiais, delegações ou representações, a qual pode ser sanada mediante a intervenção da administração principal e a ratificação ou repetição do processado. R. No entanto, em lado algum no referido artigo é mencionado o condomínio. S. Como muitíssimo bem concluiu o Meritíssimo Juiz “a quo”: “a personalidade judiciária constitui um pressuposto processual que, pela sua natureza, não é em regra susceptível de ser sanado.” T. Mais concluiu que: “Efetivamente, não obstante o legislador ter previsto, a título excepcional, no art.º 14.º do Código de Processo Civil o suprimento da falta de personalidade judiciária das sucursais, agências, filiais, delegações ou representação, situações previstas no art.º 13.º, com a intervenção da administração principal e a ratificação ou repetição do processado, nada diz quanto ao condomínio.” (sublinhado nosso). U. Pelo que a sentença recorrida é exemplar também quanto a este ponto, não merecendo, por isso, qualquer censura jurídica. V. Por fim, o Recorrente vem alegar, singelamente, sem qualquer fundamentação diga-se, que os pedidos por si formulados na presente ação não são vagos, indeterminados e condicionais. W. Também neste ponto, carece de qualquer razão o Recorrente, sendo que a sentença recorrida não merecer qualquer censura jurídica. X. Ora, sendo o pedido o efeito jurídico que se pretende obter com a ação, este deve ser claro e inteligível, coerente com a causa de pedir e legalmente possível. Y. Devendo para tal ser formulado com toda a precisão, sendo que esta precisão resulta da necessidade de criar a certeza jurídica que é um atributo da própria essência da decisão sendo também o elemento definidor do caso julgado. Z. Daí que a Lei preveja os casos excecionais em que é permitido formular pedidos genéricos, mais precisamente no artigo 556.º do Código de Processo Civil, sendo esta enumeração taxativa. AA. Os pedidos formulados pelo autor padecem de vícios que efetivamente determinam a impossibilidade prosseguimento dos autos, sendo que não preenchem os requisitos do pedido, sendo vagos, indeterminados e condicionais e, por isso, inadmissíveis. BB. A fundamentação constante da sentença, e transcrita nestas contra-alegações, é exemplar não merecendo, portanto, qualquer censura jurídica. CC. Pelo que, também quanto a este ponto, carece de qualquer fundamento a alegação do Recorrente, uma vez que é manifesto que os pedidos formulados são genéricos, indeterminados e condicionais, pelo muitíssimo bem andou o Meritíssimo Juiz “a quo” quando absolveu os réus da instância por verificação desta exceção dilatória atípica. Conclui assim a 4.ª Ré/Recorrida pela improcedência do recurso e manutenção da decisão recorrida. Vieram os 1.º e 2.ºs Réus P Lda., M e H apresentar contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: A. São as conclusões que se define o objecto do recurso e se identificam as questões que se querem colocar ao Tribunal Ad Quem, demonstrando onde o Tribunal recorrido decidiu de forma errada. B. A primeira conclusão é que existiu uma nulidade processual porquanto o tribunal omitiu o dever de sanar um vício que entende a recorrente ser sanável. C. Ora, não só o Tribunal entendeu que o vício em questão não é sanável, como se vício houvesse seria da sentença que teria omitido pronuncia sobre tal questão, o que não ocorreu. D. Nulidades processuais não determinam a nulidade da sentença e delas reclamam-se não se recorre. E. A actuação do administrador do condomínio fora dos poderes conferidos pelo art.º 1437.º do CPC em nome do condomínio gera situação de falta de personalidade judiciária e não é suscetível de sanação. F. Os pedidos formulados em juízo são inadmissíveis porque vagos, indeterminados e condicionais. * Admitido o recurso neste tribunal e colhidos os vistos, cumpre decidir. * Questão a decidir: O objecto do recurso é definido pelas conclusões dos recorrentes (arts. 5.º, 635.º n.º 3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do CPC), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida. Importa assim, saber se, no caso concreto: - se verifica a falta de personalidade /capacidade judiciária do Autor Condomínio; - Da susceptibilidade de sanação de eventual falta de personalidade e capacidade judiciária e da nulidade decorrente do incumprimento do disposto no art.º 590.º, n.º 2., al. a), do CPC; - da excepção dilatória inominada de formulação de pedidos genéricos * II. Fundamentação: Factos ou actos processuais referidos e datados no relatório que antecede. * III. O Direito: a) Falta de personalidade judiciária do Condomínio O despacho saneador proferido nos presentes autos entendeu estarmos perante uma falta de personalidade judiciária do condomínio, enquanto pressuposto processual, o qual, pela sua natureza, não é em regra susceptível de ser sanado. E por essa razão não convidou o Autor a suprir a mesma. Assim, a questão da falta de personalidade e da susceptibilidade de sanação impõem-se como prévia à questão da apreciação da nulidade processual por omissão de cumprimento do despacho pré-saneador previsto no art.º 590.º do CPC. Na fundamentação do despacho saneador pode-se ler: “Como refere o R. os art.º 12º e 13º do Código de Processo Civil conferem a entidades que não dispõem de personalidade e capacidade jurídica a possibilidade de litigarem em tribunal, abarcando, entre outras, a situação do condomínio resultante da propriedade horizontal, relativamente às acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador previstos no art.º 1437º do Código Civil. Deste preceito resulta claro que o administrador da propriedade horizontal, na execução das funções que lhe pertencem ou quando munido de autorização da assembleia de condóminos – relativamente a assuntos que, exorbitando da sua competência, cabem, todavia, na competência desta assembleia – pode accionar terceiros ou qualquer dos condóminos, ou por eles ser demandado nas acções respeitantes às partes comuns do edifício. A propriedade horizontal tem como órgãos administrativos a assembleia de condóminos (órgão deliberativo) e o administrador (órgão executivo) a quem cabe a administração das partes comuns do edifício, conforme dispõe o artigo 1430.º do Código Civil. O administrador é um dos órgãos do condomínio, investido nas funções executivas pela assembleia de condóminos. Cumpre-lhe, nomeadamente, realizar os actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns e executar as deliberações da assembleia de condóminos (art.º 1436º, al.s f) e h), do Código Civil) Nos termos do disposto no artigo 1437.º, nº 1 do Código Civil, o administrador pode agir em juízo, quer contra qualquer dos condóminos quer contra terceiros, na execução das funções que lhe pertencem ou quando autorizado pela assembleia. Está em causa nos presentes autos a realização de obras que, alegadamente, constituem inovações e alterações estruturais, sem que tenha sido obtida autorização da Assembleia de Condóminos, visando a acção a defesa da propriedade comum. Tal questão, está, indubitavelmente, para além da administração ordinária e não está, por isso, no âmbito das funções que pertencem ao administrador do condomínio, pertencendo à Assembleia dos condóminos a decisão sobre a oportunidade de instaurar ou não a acção judicial contra o(s) Condómino(s). Efectivamente, não estamos perante uma situação cuja resolução se possa integrar nas funções ou poderes do administrador do condomínio, previstas no art.º 1436.º e 1437.º do C.Civil. A instauração de uma acção judicial com as características da presente implica a ponderação de vários factores, desde a escolha do mandatário e respectivos honorários, ponderação das despesas judiciais a pagar, avaliação do interesse na acção, possibilidade de prévia negociação da reposição do espaço comum, etc. Assim, afigura-se que o A., Condomínio representado pelo seu administrador, não podia tê-la instaurado sem autorização da Assembleia de todos os condóminos. Como bem explica Sandra Passinhas [“A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, Almedina, 2ª edição, pág. 339], quando o art.º 1437º se refere a “legitimidade para agir em juízo” do administrador, não se refere a uma legitimidade processual - que consiste no interesse directo em demandar, é um pressuposto processual que só em concreto pode ser determinado – mas à legitimidade ad processam, ou seja, à capacidade processual. Assim, a representação em juízo do condomínio, dentro das atribuições fixadas no art.º 1437ºcabe, inderrogavelmente, ao administrador. Fora do âmbito das suas funções, o administrador apenas tem poder para agir em Juízo quando autorizado pela assembleia. Faltando nos autos a competente deliberação da assembleia de condóminos e não bastando o mero conhecimento da pendência ou da futura instauração da acção, há que concluir pela falta de capacidade judiciária do administrador. Invoca o A. que caso o Tribunal considere necessária a deliberação do condomínio, fixará prazo para suprir este requisito (art.º 30º resposta). Diz-nos o nº 1 do art.º 29º do Código de Processo Civil que “se a parte estiver devidamente representada, mas faltar alguma autorização ou deliberação exigida por lei, é designado o prazo dentro do qual o representante deve obter a respectiva autorização ou deliberação, suspendendo-se, entretanto, os termos da causa”. Esta é uma questão de suprimento da incapacidade: a parte pode estar em juízo, mas não dispõe de autorização ou deliberação que devesse obter para exercer a sua representação. Contudo, a personalidade judiciária constitui um pressuposto processual que, pela sua natureza, não é em regra susceptível de ser sanado. Efectivamente, não obstante o legislador ter previsto, a título excepcional, no art.º 14.º do Código de Processo Civil o suprimento da falta de personalidade judiciária das sucursais, agências, filiais, delegações ou representação, situações previstas no art.º 13.º, com a intervenção da administração principal e a ratificação ou repetição do processado, nada diz quanto ao condomínio. E, não o diz porquanto atribuição de personalidade judiciária ao condomínio é também excepcional encontrando-se prevista, apenas nos termos da al. e) do art.º 12º do CPC relativamente às acções que se inserem nas funções e poderes do administrador, o que não é manifestamente o caso. Impõe-se, pois, concluir que a sanação da falta não é possível, o que determina a absolvição dos RR. da instância, nos termos do disposto no art.º 278.º n.º 1 al. c) do C.P.C.” Nas suas alegações refere o recorrente que “Por isso, e porque a lei confere personalidade judiciária ao Condomínio e não ao Administrador, que é seu mero representante, é em nome do condomínio que as ações devem correr. Questão diferente é a de saber se o Administrador tem capacidade para decidir, por si só, demandar, ou se carece de deliberação da Assembleia de Condóminos. A alínea g), do n.º 1, do artigo 1436.º do CC dispõe o seguinte: “São funções do administrador: … g) Realizar os actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns”. Defende Sandra Passinhas que, a alínea g), do n.º 1, do artigo 1436.º do CC “deverá ser objeto de uma interpretação extensiva, de acordo com o caráter orgânico da figura do Administrador, da sua posição na organização administrativa e do carácter autónomo da sua atividade.” Ora, parece que não fará sentido o administrador ver que o prédio está a ser afetado nas suas estruturas e virar as costas dizendo que não tem funções legalmente previstas para reagir. Dessa forma, convocará uma assembleia, que funcionará, na melhor das hipóteses, duas semanas depois, após o que poderá reagir.” Senhores Desembargadores: Nos tempos que correm, com a rapidez que acontecem os factos, interpretar a norma da alínea g) do nº1, do artigo 1436º do C.P.C., no sentido em que atos conservatórios são meramente formais, é equivalente a dizer que não cabe ao Tribunais condenar a cumprir a lei. A Justiça, tem um papel social muito importante, ao qual tem vindo a escapar, em Portugal, escondendo-se atrás da lei, assumindo a primazia da interpretação literal e esquecendo que estas condutas se repercutem no comportamento social. (…) Dificilmente se compreende como poderia o administrador ter legitimidade para estar em juízo, a representar interesses do condomínio, sendo que o próprio condomínio não poderia, quando é certo que tenha capacidade judiciária, neste sentido, veja-se o transcrito no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 19.04.2005: “A..., em S. Martinho do Porto, demandou, na comarca de Alcobaça, B..., para que seja condenado na reconstituição natural da situação que existia antes das obras que ele efectuou no prédio, por alegadamente terem violado os direitos dos condóminos. Na contestação, além do mais, foi arguida a ilegitimidade do autor. Houve resposta e, no saneador, o sr. juiz julgou procedente a excepção e absolveu o réu da instância.” (…) É certo, não foi junta deliberação que autorizasse o poder de agir em juízo. No entanto, não se vê a necessidade da existência de uma Assembleia de Condóminos que delibere a atribuição de poderes a advogado, quando, no exercício das funções de administrador, o Condomínio propõe ação, que, pela sua natureza, é de patrocínio judiciário obrigatório. Ora, como já vimos, o aqui, Apelante tem legitimidade para interpor a presente ação, sem necessidade de uma deliberação de condóminos expressa, uma vez que invoca que as alterações introduzidas pelas obras levadas a cabo pelos Apelados, comprometem a segurança do edifício, estando, por isso, inserida nas funções de administrador. Importa igualmente ter em atenção que em 13 de fevereiro de 2020, reuniu-se a Assembleia de Condóminos, na qual compareceu o subscritor como Advogado já constituído, que explicou a situação aos Condóminos, incluindo a existência do embargo, cuja apensação se requereu, tendo a Assembleia consensualizado a atuação da Administração, na constituição de Mandatário e no embargo extrajudicial, além de ter manifestado a necessidade de fazer intervir a Câmara Municipal de Lisboa, em paralelo com a ação judicial, como consta da Ata n.º 76, junta aos presentes autos no requerimento com referência 46693219, datado de 03.10.2023. Entende o Apelante que a menção em ata, assinada pelos condóminos presentes, constitui manifestação de vontade suficiente, da parte da Assembleia de Condóminos.” Apreciando: Da personalidade judiciária do condomínio Dita o art.º 11.º, n.º 1 do CPC que a personalidade judiciária consiste na susceptibilidade de ser parte num processo de natureza civil. Conforme refere Castro Mendes (in “Direito Processual Civil”, II, AAFDL, 1987, pág. 18), a personalidade judiciária constitui “pressuposto dos restantes pressupostos processuais subjectivos”. Querendo com isto dizer-se que só se compreende a apreciação da capacidade judiciária, da legitimidade, do interesse em agir ou do patrocínio judiciário de alguém que, independentemente da personalidade jurídica, goze da prerrogativa de ser sujeito processual. A personalidade judiciária acompanha a personalidade jurídica – art.º 11.º, n.º 2, do CPC – a qual, por seu turno consiste na susceptibilidade de ser titular de direitos e obrigações. Se é correcta a afirmação de que aquele que tem personalidade jurídica tem necessariamente personalidade judiciária, já o inverso não é verdadeiro, na medida em que a lei confere personalidade judiciária a determinadas entidades carecidas de personalidade jurídica. Exemplo da afirmação que acabámos de fazer é o teor dos arts. 12.º e 13.º do CPC. A razão da extensão da personalidade judiciária a quem não tem personalidade jurídica está, nas palavras de Gonçalo Oliveira Magalhães (“A personalidade judiciária do Condomínio e a sua representação em juízo”, in Revista Julgar, n.º 23, 2014), no “compromisso entre o excessivo dogmatismo, conceptual e formal, e a necessidade de atender a realidades que decorrem da vida corrente e que ficariam a descoberto se não houvesse tal desvio, dificultando seriamente o exercício de determinados direitos de terceiros ou a tutela dos interesses centrados nessas entidades carecidas de personalidade jurídica. As excepções consagradas pelo legislador processual ao princípio da correspondência entre a personalidade jurídica e a personalidade judiciária representam um afloramento do carácter instrumental do processo civil”. Entre essas excepções previstas no art.º 12.º do CPC está, na al. e), “o condomínio resultante da propriedade horizontal, relativamente às acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador”. O art.º 1414.º do Código Civil, ao dizer que as fracções de que um edifício se compõe, em condições de constituírem unidades independentes, podem pertencer a proprietários diversos em regime de propriedade horizontal, consagra uma derrogação ao princípio superficies solo cedit, nos termos do qual um edifício incorporado no solo só pode ser objecto de um único direito de domínio — direito que abrange toda a construção, o solo em que esta assenta e os terrenos que lhe servem de logradouro. Na propriedade horizontal, os titulares das várias fracções ou unidades independentes — condóminos, na terminologia legal — são ainda comproprietários das partes do edifício que constituem a sua estrutura comum ou estão afectadas ao serviço daquelas fracções – é isso que resulta dos arts. 1420.º e 1421.º do CC. As fracções independentes fazem parte de um edifício, na acepção do art.º 204.º, n.º 2 do Código Civil, de estrutura unitária, o que cria, necessariamente, especiais relações de interdependência entre os condóminos, quer no que respeita às partes comuns do edifício, quer mesmo no que respeita às fracções autónomas. Assim, nas palavras de Henrique Mesquita (in, «A propriedade horizontal no Código Civil Português», Revista de Direito e Estudos Sociais, XXIII, p. 148) o condomínio é a figura definidora da situação em que uma coisa materialmente indivisa ou com estrutura unitária pertence a vários contitulares, mas tendo cada um deles direitos privativos ou exclusivos de natureza dominial sobre fracções determinadas. No fundo, o direito de propriedade sobre a parte exclusiva é combinado com o direito de compropriedade sobre as partes comuns. Daí nasce um direito real complexo, no sentido de que combina figuras preexistentes de direitos reais. É, no entanto, diferente do mero somatório dos esquemas da propriedade e da compropriedade; contendo o uma regulamentação própria do seu exercício, constitui a se um direito real. Dissecando a regulação desta figura temos que o legislador: - instituiu uma forma de organização do grupo constituído pelos condóminos (de modo a assegurar uma vontade própria e um sistema de gestão e funcionamento): assim, a administração das partes comuns e do edifício compete à assembleia de condóminos e a um administrador – art.º 1430.º, n.º 1, do CC. - definiu que a assembleia é um órgão colegial composto por todos os condóminos, à qual cabe deliberar acerca da administração das partes comuns, através de um processo colegial de formação de vontade colectiva que reconduz as vontades individuais à vontade do próprio grupo (cf. Pinto Furtado, in “Deliberações dos Sócios”, Coimbra, Almedina, 1993, pág. 21); - instituiu como órgão executivo, da administração das partes comuns do edifício e das deliberações da assembleia, o administrador que, desta forma tem a seu cargo o desempenho das funções próprias enumeradas no art.º 1436.º do CC, assim como as funções que forem delegadas pela assembleia. Neste contexto, assente que o condomínio constitui um centro autónomo de imputação de efeitos jurídicos, o legislador dotou o mesmo de organicidade e, embora não lhe atribua personalidade jurídica (ao contrário do que acontece noutros países, de que é exemplo paradigmático a Colômbia através da sua Leo 675 de 03-08-2001), admite que a mesma possa ser parte em acções judiciais. A concessão de personalidade judiciária ao condomínio não é lata e irrestrita. A medida da mesma coincide com as funções do administrador, isto é, as acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador devem ser intentadas por (ou contra) o condomínio. Fora deste âmbito dos poderes do administrador o condomínio não tem personalidade judiciária, o que determina que - em tudo o que se situe fora daquele âmbito – os condóminos agirão em juízo em nome próprio, com a personalidade judiciária que a personalidade jurídica lhes confere. Ou seja, “No fundo, quando o condomínio assume o papel de parte, os condóminos assumem esse papel em simultâneo, mas sob a “máscara” do condomínio: não estão no processo, mas tudo se passa como se estivessem litigando do lado activo ou do lado passivo da instância. (...) O condomínio é a ‘capa’ processual dos condóminos, uma ‘capa’ que visa facilitar a identificação das partes, evitar que os condóminos, um por um, tenham de ser referidos na petição inicial ou na contestação” (cfr., Miguel Mesquita; “A personalidade judiciária do condomínio nas acções de impugnação de deliberações da assembleia de condóminos - anotação ao Acórdão do TRL de 25.06.2009, 4838/07.0TBALM.L1-8”, in Cadernos de Direito Privado, nº. 35, Julho-Set. 2011, pp. 50-51). Carecendo o condomínio de substrato físico, a sua representação em juízo é atribuída, pelo art.º 1437.º, n.º 1, do CC, ao administrador. E por essa mesma razão se vem entendendo que o art.º 1437.º do CC não trata de legitimidade processual - até porque esta consiste no interesse directo em demandar ou contradizer -, mas sim de legitimidade ad processum, isto é, de capacidade judiciária ou processual, que consiste na susceptibilidade de estar, por si, em juízo (neste sentido ver Sandra Passinhas, “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, Coimbra: Almedina, 2000, pág. 329). Essa representação do condomínio resulta não só do art.º 1437.º do CC, como resulta igualmente do art.º 26.º do CPC, que dispondo especificamente para as situações do art.º 12.º e 13.º do CPC, estatui a representação pelos administradores. Dito isto, vejamos agora se o condomínio no caso concreto que nos ocupa tem personalidade judiciária. A decisão recorrida entendeu que não, na medida em que a acção não se inseria nas funções e poderes do administrador e, como tal, absolveu os Réus da instância. Como referimos supra, o condomínio tem personalidade judiciária nas acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador. O mencionado artigo 12.º, al. e) do CPC tem necessariamente de ser conjugado com os artigos 1436.º e 1437.º do CC, onde se regula sobre as funções e legitimidade do administrador. Estes preceitos foram alterados pela Lei n.º 8/2022, de 10 de janeiro, que entrou em vigor a 10-04-2022, sendo por isso aplicáveis aos presentes autos. Em particular, o n.º 1 do artigo 1437.º do CC estabelece que “O condomínio é sempre representado em juízo pelo seu administrador, devendo demandar e ser demandado em nome daquele.”, acrescentando o n.º 2 que “O administrador age em juízo no exercício das funções que lhe competem, como representante da universalidade dos condóminos ou quando expressamente mandatado pela assembleia de condóminos.” Conforme salientam Ana Filipa Morais Antunes e Rodrigo Moreira (Comentário ao Código Civil – Direito das Coisas; Universidade Católica Editora; out. 2021, pp. 531-532), a respeito do artigo 1437.º do CC, “[o] normativo cumpre uma dupla função: por um lado, delimita indiretamente o âmbito da personalidade judiciária do condomínio; por outro lado, atribui ao administrador a representação judiciária do condomínio, em concretização do princípio enunciado no artigo 26.º do CPC, que reserva a representação das entidades que careçam de personalidade jurídica aos seus administradores (…). Por conseguinte, nas ações judiciais em que a intervenção do administrador está legitimada, a parte processual continua a ser o condomínio. O administrador assume o papel de representante do condomínio em juízo, nos termos e com os limites reconhecidos pelo presente preceito (…). O preceito constitui, assim, o título normativo habilitante da posição jurídica do administrador, que lhe é reconhecida para atuar os interesses do condomínio (…). O n.º 1 autoriza o administrador a atuar, em representação do condomínio, em ação intentada contra qualquer dos condóminos, assim como contra terceiro, na execução das funções que lhe são reconhecidas – desde logo, as elencadas no artigo 1436.º (…). No âmbito destas ações (que tenham por objeto matérias compreendidas nas funções do administrador), não se pressupõe qualquer ato de autorização por parte da assembleia dos condóminos, e não se admite a sua interferência (designadamente, avocando a competência que é deferida, por lei, ao administrador) (…).”. O que nos remete para o âmbito dos poderes do administrador – art.º 1436.º do CPC. Dispõe o art.º 1436.º do CC: 1 - São funções do administrador, além de outras que lhe sejam atribuídas pela assembleia: a) Convocar a assembleia dos condóminos; b) Elaborar o orçamento das receitas e despesas relativas a cada ano; c) Verificar a existência do seguro contra o risco de incêndio, propondo à assembleia o montante do capital seguro; d) Cobrar as receitas e efectuar as despesas comuns; e) Verificar a existência do fundo comum de reserva; f) Exigir dos condóminos a sua quota-parte nas despesas aprovadas, incluindo os juros legais devidos e as sanções pecuniárias fixadas pelo regulamento do condomínio ou por deliberação da assembleia; g) Realizar os actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns; h) Regular o uso das coisas comuns e a prestação dos serviços de interesse comum; i) Executar as deliberações da assembleia que não tenham sido objeto de impugnação, no prazo máximo de 15 dias úteis, ou no prazo que por aquela for fixado, salvo nos casos de impossibilidade devidamente fundamentada; j) Representar o conjunto dos condóminos perante as autoridades administrativas. l) Prestar contas à assembleia; m) Assegurar a execução do regulamento e das disposições legais e administrativas relativas ao condomínio; n) Guardar e manter todos os documentos que digam respeito ao condomínio. o) Informar, por escrito ou por correio eletrónico, os condóminos sempre que o condomínio for citado ou notificado no âmbito de um processo judicial, processo arbitral, procedimento de injunção, procedimento contraordenacional ou procedimento administrativo; p) Informar, pelo menos semestralmente e por escrito ou por correio eletrónico, os condóminos acerca dos desenvolvimentos de qualquer processo judicial, processo arbitral, procedimento de injunção, procedimento contraordenacional ou procedimento administrativo, salvo no que toca aos processos sujeitos a segredo de justiça ou a processos cuja informação deva, por outro motivo, ser mantida sob reserva; q) Emitir, no prazo máximo de 10 dias, declaração de dívida do condómino, sempre que tal seja solicitado pelo mesmo, nomeadamente para efeitos de alienação da fração. r) Intervir em todas as situações de urgência que o exijam, convocando de imediato assembleia extraordinária de condóminos para ratificação da sua atuação. 2 - Sempre que estiver em causa deliberação da assembleia de condóminos relativamente a obras de conservação extraordinária ou que constituam inovação, a realizar no edifício ou no conjunto de edifícios, o administrador está obrigado a apresentar pelo menos três orçamentos de diferentes proveniências para a execução das mesmas, desde que o regulamento de condomínio ou a assembleia de condóminos não disponha de forma diferente. 3 - O administrador de condomínio que não cumprir as funções que lhe são cometidas neste artigo, noutras disposições legais ou em deliberações da assembleia de condóminos é civilmente responsável pela sua omissão, sem prejuízo de eventual responsabilidade criminal, se aplicável. A questão coloca-se, num primeiro momento, em saber se a presente acção se insere no âmbito da al. g) do supra referido artigo, como é entendimento do Autor/Apelante. Se for esse o caso ultrapassada fica a questão da ausência de deliberação da Assembleia de Condóminos. A al. g) do art.º 1436.º do CC contempla os actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns. Dúvidas não subsistem que a acção respeita a direitos relativos aos bens comuns. Isso mesmo o afirma o despacho recorrido quando afirma que “Está em causa nos presentes autos a realização de obras que, alegadamente, constituem inovações e alterações estruturais, sem que tenha sido obtida autorização da Assembleia de Condóminos, visando a acção a defesa da propriedade comum.” Não obstante, entendeu a Mmª juiz a quo que “Tal questão, está, indubitavelmente, para além da administração ordinária e não está, por isso, no âmbito das funções que pertencem ao administrador do condomínio, pertencendo à Assembleia dos condóminos a decisão sobre a oportunidade de instaurar ou não a acção judicial contra o(s) Condómino(s).” Ou seja, na decisão recorrido subscreveu-se o entendimento de que a propositura de uma acção, com os contornos da presente, não se traduzia num acto meramente conservatório de direitos relativos a bens comuns, que a mesma ia para além dos poderes de administração ordinária e, como tal, estaria dependente da deliberação da Assembleia de Condóminos. Conforme foi entendimento plasmado no Ac. do STJ de 14-12-2017, actos conservatórios são os que “são praticados com o objetivo de evitar a deterioração ou a destruição dos bens e a perda dos direitos correspondentes. Para o conceito de «actos conservatórios» como «os adequados a evitar a degradação ou destruição do conjunto de elementos que integram as partes comuns do edifício constituído em propriedade horizontal, entendidas na acepção do art.º 1421.º do CC». No mesmo sentido, Ana Filipa Morais Antunes e Rodrigo Moreira (in “comentário ao Código Civil – Direito das Coisas”, Universidade Católica Editora, Out. 2021, págs. 524 -525 ) refere que “Deve entender-se que se encontram também abrangidos pela presente previsão os atos materiais que estejam relacionados instrumentalmente com estes bens, na linha da autorização enunciada pelo artigo 1427.º. É o que pode ser ilustrado com os seguintes atos: (i) reparação de paredes ou de sistemas de eletricidade; (ii) conservação de muros e de zonas de passagem. De igual modo, devem incluir-se os atos conservatórios relativos aos próprios direitos sobre os bens comuns: assim, pode o administrador, v.g. (i) requerer uma providência cautelar de embargo de obra nova, quando esta for realizada em parte comum do edifício (cfr. artigos 397.º a 402.º do CPC); (ii) promover ou prevalecer-se da interrupção dos prazos de prescrição ou de usucapião, em benefício do condomínio”. Como se refere igualmente no Ac. da R.C. de 06-10-2015 , a propósito da então al. f) do art.º 1436.º do CC (actualmente alínea g) em virtude da alteração introduzida pela Lei 8/2022, de 10-01) “Tal função respeita, em primeiro lugar, à conservação dos direitos sobre as partes comuns. Como salientam Aragão Seia, e Pires de Lima e Antunes Varela, entre os atos conservatórios referidos na alínea f), cabem, por ex., a instauração de providências cautelares relativamente às partes comuns (v. g., um embargo de obra nova realizada numa parte comum) e a interrupção de um prazo de prescrição ou de usucapião. Ou como escreve Henrique Mesquita, trata-se “de actos que nada resolvem em definitivo, que não comprometem o futuro e que apenas visam manter uma coisa ou um direito numa dada situação”. (…) Também Ana Sardinha e Francisco Cabral Metelo, englobam em tais atos conservatórios todos e quaisquer atos que visem assegurar ou preservar as partes comuns: atos de gestão que, eventual e independentemente, se sobreponham à própria vontade, individual, dos condóminos.” Não desconhecemos a posição mais abrangente de Sandra Passinhas (referida pelo Autor/Apelante nas suas alegações) que defende que a norma da al. f) do art.º 1436º deve ser objeto de uma interpretação extensiva, de acordo com o carácter orgânico da figura do Administrador, da sua posição na organização administrativa e do carácter autónomo da sua atividade. Partindo da ideia de que o Administrador tem poderes de gestão e representação processual em tudo o que não contenda com a propriedade ou a posse dos bens comuns (em que só agirá quando devidamente autorizado, nos termos do nº 3 do mesmo artigo), tem o mesmo poder-dever de realizar as medidas cautelares adequadas a evitar prejuízos na coisa comum, pode propor uma ação para obter o ressarcimento dos danos causados às partes comuns do edifício condominial, deve salvaguardar o edifício condominial de moléstias, perigos ou prejuízos causados por terceiros. Está legitimado a intentar uma ação respeitante à conservação das partes comuns do edifício apenas quando age ex re, devendo reconhecer-se-lhe, designadamente, o poder de exigir a eliminação dos defeitos, nos termos do art.º 1221º ex vi art.º 1225º, nº . A referida Autora dá mesmo o exemplo do Decreto-lei nº 106/96, de 31 de julho, que estabeleceu um regime específico de comparticipação e financiamento para a realização de obras de conservação e beneficiação pelos condóminos de edifícios antigos, segundo o qual o administrador representa o conjunto dos condóminos nos atos respeitantes à realização de obras nas partes comuns dos prédios (cf. respetivo art.º 11.º). Não obstante, tem sido outra a posição defendida por outra doutrina e pela maioria da jurisprudência e que assenta na ideia de que os actos conservatórios previstos na al. g) (anterior al. f) do art.º 1436.º do CC), de natureza material e judicial, são os que nada resolvem em definitivo, que não comprometem o futuro, visando apenas manter uma coisa ou um direito numa determinada situação. Para esta corrente, a interposição de uma ação judicial pelo Condomínio, representado pelo Administrador, contra, por exemplo, o construtor do edifício para correcção de defeitos de construção sempre depende da autorização/deliberação dos condóminos reunidos em assembleia ou de disposição regulamentar que a autorize. Por actos conservatórios deverão entender-se apenas aqueles que são adequados a evitar a degradação ou destruição do conjunto de elementos que integram as partes comuns do edifício constituído em propriedade horizontal. Aliás, a comparação que Sandra Passinhas faz com os poderes do Administrador do condomínio no citado regime do Decreto-lei nº 106/96, de 31 de julho (art.º 11º) poderá ter mesmo uma leitura inversa, no sentido que, por não caber nos poderes de administração concedidos ao Administrador pela lei geral, houve necessidade de, especialmente, a lei lhe atribuir o poder de representar o conjunto dos condóminos nos termos do artigo 1436.º do Código Civil, para efeitos da prática dos atos referidos no referido diploma respeitantes à realização de obras nas partes comuns do prédio – neste sentido ver Ac. R.P de 24-10-2019. Por isso mesmo subscrevemos o entendimento da maioria da jurisprudência – e que foi também o entendimento da decisão recorrida – de que a instauração desta concreta acção não cabe no âmbito dos actos (materiais ou judiciais) conservatórios, a que alude a actual al. g) do art.º 1436.º do CC. A instauração de uma ação judicial com as caraterísticas da presente implica a ponderação de vários factores, desde a escolha do mandatário, passando pelos seus honorários e despesas judiciais a pagar, avaliação do interesse na ação relativamente à gravidade dos eventuais danos e aos custos da respectiva correcção, possibilidade de prévia negociação da reparação com a parte contrária. Como assim, entendemos que, por não tratar a presente acção da realização de actos conservatórios (dos direitos relativos aos bens comuns) o A. não podia tê-la instaurado sem autorização da Assembleia dos condóminos arts. 1436º, al. h) e 1437º, do CC). Não estamos já no âmbito do embargo de obra nova, nem do procedimento cautelar de ratificação desse embargo, nem perante meros actos gestionários. E propositura de uma acção com vista à reposição definitiva de uma situação das partes comuns – com a envergadura e latitude que é peticionada – extravasa o âmbito dos actos de “conservação”, pelo que, sem prejuízo de, em tese, a acção por ser intentada pelo condomínio, careceria de autorização do órgão deliberativo do mesmo a formar uma vontade colectiva nesse sentido. Essa falta de deliberação remeter-nos-ia, em tese para o art.º 29.º do CPC, que dispõe que “Se a parte estiver devidamente representada, mas faltar alguma autorização ou deliberação exigida por lei, é designado o prazo dentro do qual o representante deve obter a respectiva autorização ou deliberação, suspendendo-se, entretanto, os termos da causa”. A este respeito, afastando a aplicação desta concreta prerrogativa concedido pelo art.º 29.º do CPC, diz-se na sentença recorrida: “Esta é uma questão de suprimento da incapacidade: a parte pode estar em juízo, mas não dispõe de autorização ou deliberação que devesse obter para exercer a sua representação. Contudo, a personalidade judiciária constitui um pressuposto processual que, pela sua natureza, não é em regra susceptível de ser sanado”. Afigura-se-nos existir aqui alguma confusão e contradição – ou até mesmo um salto de raciocínio - na fundamentação da decisão recorrida. Isto porque: - decide-se pela falta de personalidade judiciária do condomínio; - mas pressupõe-se ao longo de toda a fundamentação que o nó górdio se centra na falta de deliberação para intentar a presente acção; - o que nos leva a questionar: se a Assembleia tivesse deliberado a instauração de uma acção com vista à defesa das partes comuns, o condomínio poderia estar em juízo, representado pelo Administrador, demandando condóminos e/ou terceiros? A decisão recorrida não faz esse juízo de prognose, mas tudo nos leva a crer que a resposta seria afirmativa, em face dos seguintes trechos: “Tal questão, está, indubitavelmente, para além da administração ordinária e não está, por isso, no âmbito das funções que pertencem ao administrador do condomínio, pertencendo à Assembleia dos condóminos a decisão sobre a oportunidade de instaurar ou não a acção judicial contra o(s) Condómino(s)”, “Assim, afigura-se que o A., Condomínio representado pelo seu administrador, não podia tê-la instaurado sem autorização da Assembleia de todos os condóminos.”, “Faltando nos autos a competente deliberação da assembleia de condóminos e não bastando o mero conhecimento da pendência ou da futura instauração da acção, há que concluir pela falta de capacidade judiciária do administrador.” Ora, o condomínio tem personalidade judiciária e pode ser parte nas acções que se inserem nos poderes do administrador. Quais poderes? Em nosso entender os poderes próprios (de gestão e administração ordinária) e os poderes que lhe forem conferidos pela Assembleia (al. i) do n.º 1 do art.º 1436.º e 1437.º do CC). Ora, se a Assembleia de Condóminos podia deliberar a instauração de uma acção com vista à defesa das partes comuns, podia o Administrador, em representação do condomínio executá-la, interpondo a competente acção, não se questionando – nessa concreta situação – a sua personalidade judiciária. A questão está apenas na ausência e inexistência dessa deliberação. E se a questão se centra na ausência de deliberação, estamos já no âmbito da capacidade judiciária e da falta de deliberação, tal como a mesma vem regulada no art.º 29.º do CPC, e não no campo da falta de personalidade judiciária. Concluímos assim pela efectiva personalidade judiciária do condomínio, representado pelo Administrador, colocando-se assim a questão apenas e tão somente, no âmbito da capacidade. b) Capacidade Judiciária e seu suprimento Assente está: (i) a personalidade judiciária do Condomínio para intentar a presente acção; (ii) a necessidade de deliberação da Assembleia geral para propor uma acção de defesa das partes comuns; (iii) a ausência dessa deliberação prévia à instauração da presente acção. Entende o Autor/Apelado que tal deliberação é desnecessária na medida em que “Importa igualmente ter em atenção que em 13 de fevereiro de 2020, reuniu-se a Assembleia de Condóminos, na qual compareceu o subscritor como Advogado já constituído, que explicou a situação aos Condóminos, incluindo a existência do embargo, cuja apensação se requereu, tendo a Assembleia consensualizado a atuação da Administração, na constituição de Mandatário e no embargo extrajudicial, além de ter manifestado a necessidade de fazer intervir a Câmara Municipal de Lisboa, em paralelo com a ação judicial, como consta da Ata n.º 76, junta aos presentes autos no requerimento com referência 46693219, datado de 03.10.2023. Entende o Apelante que a menção em ata, assinada pelos condóminos presentes, constitui manifestação de vontade suficiente, da parte da Assembleia de Condóminos.” Discordamos deste entendimento e interpretação que o Autor/apelante faz. Uma menção feita em acta, de uma explicação ainda que efectuada por um advogado, assinada por todos os condóminos presentes de forma alguma pode ser entendida – de acordo com as regras da interpretação das declarações, constantes dos arts. 236.º e ss. do CC – como uma deliberação, como uma expressão de vontade concludente de tomar posição sobre determinada conduta a adoptar, desde logo por não ter qualquer correspondência no texto da acta, nem mesmo de forma imperfeitamente expressa. Deliberar é tomar uma resolução, decidir mediante exame ou discussão. E não ouvir uma explicação dada em assembleia e assinar a acta em que essa explicação foi dada, sem que se questionasse se se concordava ou não com ela. O que nos leva a concluir que, de forma nenhuma o teor da supra referida acta poderia dispensar a deliberação da Assembleia de Condóminos, com expressão formal na respectiva acta. Cumpriria aferir da bondade da decisão de absolvição das Rés da instância, sem se ter dado cumprimento ao disposto no art.º 29.º do CPC e art.º 590.º, n.º 2, al. a), do CPC. A este respeito refere o Autor/Apelante nas suas alegações que “Nesse mesmo requerimento com referência 46693219, datado de 03.10.2023, veio o ora Apelante, indagar e requerer prazo para suprir tal irregularidade, uma vez que caso dúvidas ainda existissem, e se o Tribunal assim entende-se, ser necessário a introdução de ponto expresso na ordem de trabalhos e deliberações formais, o Apelante assim o faria. Prazo esse, que nunca foi concedido ao Apelante. Tendo o Tribunal a quo decidido sem mais. Conforme repercute o artigo 590º, nº 2, alínea a) do C.P.C. “…2 - Findos os articulados, o juiz profere, sendo caso disso, despacho pré-saneador destinado a: a) Providenciar pelo suprimento de exceções dilatórias, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º; …” É um facto que a Mmª Juiz a quo não o fez, e não o fez porque entendeu que estávamos perante a falta de pressuposto processual de personalidade judiciária e a mesma era insuprível, ao invés da falta de poderes de representação, prevista no art.º 29.º do CC. Para o caso que aqui nos ocupa, haverá irregularidade de representação nos casos em que o administrador actue fora do âmbito das suas funções sem previamente ter sido autorizado pela assembleia de condóminos. Isto porque os poderes de representação judiciária do administrador, como já referimos supra, não se restringem às matérias de gestão corrente, assegurando ainda o administrador a representação do condomínio em juízo quando é incumbido pela assembleia, órgão deliberativo, de agir judicialmente em assuntos respeitantes às partes comuns, mas que exorbitam a competência que lhe é própria. É o exemplo da acção destinada a imputar, na esfera jurídica de terceiro, os danos causados em parte comum do edifício. Em tal caso, os poderes de representação do administrador pressupõem uma deliberação da assembleia. E a falta dessa deliberação pode ser suprida nos termos do art.º 29.º do Código de Processo Civil. Poder-se-ia pensar que o passo lógico seguinte, na decorrência de tudo o que se expôs, seria anular a decisão recorrida e ordenar a baixa dos autos à 1.ª instância para que se desse cumprimento ao disposto no art.º 29.º e 590.º, n.º 2, al. a) do CPC. Não obstante, o art.º 130º do C.P.C., que proíbe a prática de atos inúteis, tem plena aplicação nesta sede de apreciação reapreciação da decisão recorrida e da utilidade que advirá do cumprimento do art.º 29.º do CPC e da concessão de prazo ao Condomínio para vir juntar a deliberação em falta, bem como ratificação do processado pelo Administrador em data anterior a essa deliberação. A impugnação da matéria seja de facto seja de direito deve obedecer a um princípio de utilidade, na medida em que só importa considerar o que poder ser relevante. Em sede recursiva pretende-se, através da modificação de decisão que conheceu da falta de personalidade e capacidade judiciárias do Autor/Apelado, que seja reapreciada a pretensão do recorrente, nomeadamente no sentido de os autos não verem antecipado o seu desfecho antes do julgamento de mérito do mesmo. Pelo que, a consequência lógica do que se referiu supra e o cumprimento do art.º 29.º do CPC, estará sempre limitada pela circunstância de o Tribunal ter igualmente conhecido da excepção dilatória inominada de formulação de pedidos genéricos, no sentido da sua procedência, levando igualmente à absolvição da instância. Tal decisão foi igualmente objecto de recurso, pelo que necessário se torna conhecer da mesma na medida em que se, de todo o modo, se confirmar a absolvição da instância, com este outro fundamento, nenhum sentido útil tem de ordenar-se o cumprimento do disposto no art.º 29.º do CPC. Assim, urge apreciar de seguida a subsequente questão apreciada no despacho saneador recorrido e, igualmente, objecto de impugnação do presente recurso. c) Da excepção dilatória inominada de formulação de pedidos genéricos O Autor intentou a presente acção formulando os seguintes pedidos: a) Serem os 1º, 2º e 3º RR. condenados a usar a fracção “C” para fins exclusivamente habitacionais, bem como, na sanção pecuniária compulsória de 100€ por cada dia de atraso no cumprimento ou em situação de incumprimento deste dever. b) Todos os RR. solidariamente condenados a: i) Custear os estudos que o A. mandará elaborar demonstrativos do impacto que a remoção das lajes, alteração dos vãos e reposição em diferente local, tiveram, ou podem vir a ter, na estabilidade e segurança de todo o prédio; ii) Em função das conclusões técnicas obtidas, custear todas as obras necessárias para reconstruir uma situação idêntica à preexistente relativamente às remoções por si realizadas, com garantia de plena estabilidade do prédio; iii) Apresentar à Câmara Municipal de Lisboa os projectos necessários, tendo em vista a regularização formal do processo do edifício e reduzir, até onde for possível, o risco de ofensa as suas estruturas; iv) Garantir por meio de inscrição sobre as fracções B e C, na Conservatória do Registo predial, sem limite de capital e como encargo em espécie, sem prazo determinado os riscos que, mesmo com a execução dos trabalhos que sejam recomendados pelos estudos a efectuar, sempre subsistirão; v) Reembolsar todas as despesas suportadas, em resultado da sua conduta, em causa nestes autos. Designadamente a título de honorários, encargos e taxas de justiça, custas judiciais e pareceres técnicos que se venham a apurar em sede de execução de sentença. Apreciando a admissibilidade dos pedidos formulados, consta da fundamentação da decisão recorrida o seguinte: “É nos articulados, enquanto peças processuais em que as partes expõem os fundamentos da acção e da defesa e formulam os pedidos correspondentes, que as partes definem as suas pretensões jurisdicionais - cfr. art.º 147º do Código de Processo Civil. Para que o tribunal possa dirimir um concreto litígio submetido à sua apreciação, indispensável se torna que as partes fixem com precisão os termos exactos da controvérsia. A Petição inicial, como articulado onde o demandante propõe a acção, deduzindo certa pretensão de tutela jurisdicional, com a menção do direito a tutelar e dos fundamentos respectivos, e que é levada ao conhecimento do R. é a base do processo. É aí que se formula o pedido e se invoca a causa de pedir, ou seja, o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido pelo A., isto é, no acto ou facto jurídico em que o A. se baseia para formular o seu pedido (art.º 5º, n.º 1 e 552º, n.º 1 al. d) do Código de Processo Civil). Nos termos do art.º 552º, n.º 1 do Código de Processo Civil na P.I. deve o autor: a) (…) e) Formular o pedido;(…) O pedido é, conforme decorre do n.º 3 do art.º 498º do Código de Processo Civil o efeito jurídico que se pretende obter com a acção. É este que delimita o círculo dentro do qual o Tribunal tem de mover-se para dar solução ao conflito de interesses que é chamado a decidir (cfr. Art.º 615º, n.º 1 al. e) do Código de Processo Civil). Assim o pedido deve ser claro e inteligível; coerente com a causa de pedir; e legalmente possível. Para que tal ocorra, o pedido deve ser formulado com toda a precisão, especificando nitidamente tanto o objecto jurídico da acção (o efeito que o A. pretende obter) como o seu objecto material. A precisão do pedido resulta da necessidade de criar a certeza jurídica que é um atributo da própria essência da decisão sendo também o elemento definidor do caso julgado. Daí que a lei estatua os casos excepcionais em que é permitido formular pedidos genéricos (cfr. Art.º 556º do CPC) referindo que a mesma só pode ocorrer quando o objecto mediato da acção seja uma universalidade de facto ou de direito; quando não seja ainda possível determinar, de modo definitivo, as consequências do facto ilícito de o lesado pretenda usar da faculdade que lhe confere o art.º 569º do Código Civil, ou quando a fixação do quantitativo esteja dependente de prestação de contas ou de outro acto que deva ser praticado pelo Réu. Atentando nos pedidos formulados nos autos, é manifesto que os mesmos padecem de vícios que determinam a impossibilidade de prosseguimento dos autos. Efectivamente peticiona o A. a) Ser os 1º, 2º e 3º RR. condenados a usar a fracção “C” para fins exclusivamente habitacionais, bem como, na sanção pecuniária compulsória de 100€ por cada dia de atraso no cumprimento ou em situação de incumprimento deste dever. b) Todos os RR. solidariamente condenados a: i. Custear os estudos que o A. mandará elaborar demonstrativos do impacto que a remoção das lajes, alteração dos vãos e reposição em diferente local, tiveram, ou podem vir a ter, na estabilidade e segurança de todo o prédio; ii. Em função das conclusões técnicas obtidas, custear todas as obras necessárias para reconstruir uma situação idêntica à preexistente relativamente às remoções por si realizadas, com garantia de plena estabilidade do prédio; iii. Apresentar à Câmara Municipal de Lisboa os projectos necessários, tendo em vista a regularização formal do processo do edifício e reduzir, até onde for possível, o risco de ofensa as suas estruturas; iv. Garantir por meio de inscrição sobre as fracções B e C, na Conservatória do Registo predial, sem limite de capital e como encargo em espécie, sem prazo determinado os riscos que, mesmo com a execução dos trabalhos que sejam recomendados pelos estudos a efectuar, sempre subsistirão; v. Reembolsar todas as despesas suportadas, em resultado da sua conduta, em causa nestes autos. Designadamente a título de honorários, encargos e taxas de justiça, custas judiciais e pareceres técnicos que se venham a apurar em sede de execução de sentença. Ora, relativamente ao primeiro pedido, coloca-se desde logo a questão de saber se o mesmo é idóneo. O A. pretende a condenação dos RR. a usar a fracção “C” para fins exclusivamente habitacionais. O fim a que uma fracção autónoma é destinada constitui uma limitação ao exercício do direito de propriedade de cada condómino sobre a sua fracção, e encontra-se definido no título constitutivo da propriedade horizontal. Assim, utilizar a fracção para o fim a que se destina é uma decorrência da lei, não cabendo ao Tribunal condenar a cumprir a lei, obrigação que se impõe a todos os cidadãos. Acresce que, nos termos alegados pelo A., a referida fracção encontra-se ligada, por via das obras efectuadas, à loja sita no R/C do mesmo prédio. Logo, afigura-se que este pedido apenas faria sentido após o pedido de realização de obras de reposição da individualização das fracções, o que, em verdade, não é peticionado. Relativamente aos pedidos formulados na alínea b), pontos i) e ii) os mesmos encontram-se formulados em termos absolutamente condicionais. Pretende-se que os RR. sejam condenados a custear os estudos que o A. mandará elaborar demonstrativos do impacto que a remoção das lajes, alteração dos vãos e reposição em diferente local, tiveram, ou podem vir a ter, na estabilidade e segurança de todo o prédio.; e, em função das conclusões técnicas obtidas, custear todas as obras necessárias para reconstruir uma situação idêntica à preexistente relativamente às remoções por si realizadas, com garantia de plena estabilidade do prédio. Nunca o tribunal poderá concluir nos termos peticionados, sob pena de nulidade da decisão. Não pode o tribunal condenar os RR. a custear um estudo que não se sabe quando e se o A. mandará elaborar, a quem e por que valor. Acresce que, o tribunal não pode também condenar a efectuar obras apenas se o estudo concluir que as mesmas são necessárias. Já o pedido formulado em b.iv) é, para além de condicional, um pedido indeterminado. Pretende o A. que os RR. sejam condenados a “Garantir por meio de inscrição sobre as fracções B e C, na Conservatória do Registo predial, sem limite de capital e como encargo em espécie, sem prazo determinado os riscos que, mesmo com a execução dos trabalhos que sejam recomendados pelos estudos a efectuar, sempre subsistirão”. Ora, a procedência deste pedido estaria dependente da realização de um estudo, de esse estudo concluir pela existência de danos e necessidade de execução de trabalhos, de executados esses trabalhos subsistirem riscos de danos. Tudo isto são eventos futuros e incertos, que, logicamente, não podem ser garantidos por uma quantia incerta e por tempo indeterminado! Conforme se refere no Ac STJ de 07.04.2011 (relator Lopes do rego) in www.dgsi.pt, a lei não admite a figura da condenação condicional. A sentença judicial em que o reconhecimento do direito fica dependente da hipotética verificação de um facto futuro e incerto, ainda não ocorrido à data do encerramento da discussão da causa, não é possível. Também o Acórdão de 15/10/2020 do TRG (relator António Boavida) que, pela clareza de exposição, seguimos de perto refere “Por um lado, o artigo 610º do CPC permite o julgamento no caso de inexigibilidade da obrigação no momento em que a acção é proposta, mas trata-se de uma possibilidade restrita, não ampla. O artigo versa somente sobre situações em que a obrigação é inexigível (por exemplo, por não se encontrar ainda vencida, não ter decorrido o prazo certo a que está sujeita, o prazo ser incerto e a fixar pelo tribunal) e não sobre casos em que está em causa a própria constituição da obrigação. Admite-se a condenação do réu no cumprimento de uma obrigação ainda não exigível, mas que o réu (v. nº 2 do art.º 610º) ou o tribunal (v. nº 1 do art.º 610º) reconhece existir. Já não é admissível a condenação do réu numa prestação que pode nunca vir a constituir-se ou em que o facto condicionante da sua constituição sempre exigiria ulterior verificação judicial. E é assim por imposição do artigo 610º, que restringe os casos em que é lícita a condenação do réu in futurum (apenas em situações de inexigibilidade da obrigação), e por força do princípio da determinabilidade do conteúdo das decisões judiciais. Isto porque uma condenação condicional compromete a definitividade e certeza da composição de interesses realizada na acção, além de a tutela alcançada pelo demandante não ser dotada de efectividade; são decisões boomerang ou de “ida e volta”, que acabam por não solucionar definitivamente o litígio, que em maior ou menor grau subsiste entre as partes, tendendo a necessitar de ser resolvido através de nova acção.” Donde se impõe concluir que estes pedidos, por condicionais, não são legalmente admissíveis. No ponto b.iii) do pedido peticiona o A. a condenação dos RR. a apresentar Câmara Municipal de Lisboa os projectos necessários, tendo em vista a regularização formal do processo do edifício e reduzir, até onde for possível, o risco de ofensa as suas estruturas; Ora o processo camarário é um procedimento administrativo a que os Tribunais civis são alheios, não cabendo a este tribunal apreciar a existência/inexistência/invalidade do processo camarário. Afigura-se assim que os pedidos formulados não preenchem os requisitos do pedido, sendo vagos, indeterminados e condicionais e, por isso, inadmissíveis. A lei não determina expressamente qual a consequência para a formulação ilegal de pedidos genéricos e condicionais, sendo diversas as soluções que tem vindo a ser apontadas pela doutrina e pela jurisprudência. Assim, Castro Mendes considera que deve haver indeferimento liminar da PI por verificação de excepção dilatório atípica (DPC, III, 330), Anselmo de Castro entende que tal vicio determina o indeferimento liminar da petição por ineptidão (DPC, vol. II, p. 250). A jurisprudência maioritária, com a qual tendemos a concordar, defende a absolvição da instância por verificação de uma excepção dilatória atípica (AC RP de 13/4/1978, CJ, tomo III, pág. 812 e Ac. STJ de 8/2/1994, CJSTJ, tomo I, pág. 95).” Apreciando: A noção de pedido encontra-se consagrada no art.º 581.º, n.º 3, do CPC e corresponde ao efeito jurídico que o autor pretende retirar da acção interposta, traduzindo-se, em concreto, na providência que aquele solicita ao Tribunal. Segundo os ensinamentos de Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio da Nora (in Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, Coimbra Editora, pág. 245) o pedido é o meio de tutela jurisdicional pretendido pelo autor, sendo que nos mesmo sentido são os dizeres de Miguel Teixeira de Sousa no seu livro Introdução ao Processo Civil, pág. 23. Trata-se de um elemento fundamental que emerge da circunstância de se ter colocado nas mãos dos interessados o accionamento dos mecanismos jurisdicionais e a escolha das providências que os invocados direitos garantem. Daí resulta, conforme entendimento de Anselmo de Castro (Direito Processual Civil Declaratório, Vol. I, pág. 220), a necessidade de indicação precisa do pedido, tendo em vista que o Réu tenha conhecimento do pedido contra ele formulado e respectivo fundamento e, consequentemente, esteja em condições de se defender capazmente. Interessa-nos essencialmente, para a decisão a tomar nos presentes autos, o pedido no seu significado de pretensão processual, isto é, meio de tutela jurisdicional pretendido pelo autor. Como ensina Anselmo de Castro (ob. supra citada) mais importante que a qualificação jurídica, deve atender-se ao efeito prático que se pretende alcançar, o que releva para determinar o conteúdo da decisão final. A formulação do pedido – dentro do qual se vai desenvolver toda a lide e que circunscreve de forma impositiva o âmbito da decisão final – é uma necessidade que resulta da consagração do princípio do dispositivo. Com efeito, o art.º 3.º do CPC concretiza um dos pressupostos de intervenção jurisdicional na resolução de litígios de direito provado, e que depois é desenvolvido ao longo do CPC culminando com os arts. 5.º e 609.º do CPC, atinentes aos limites da actividade jurisdicional no plano da sentença. Com efeito, o princípio do dispositivo assume especial importância ao nível do direito que se pretende titular. Tenhamos por exemplo do direito de propriedade: com base numa mesma situação de facto, e invocando o mesmo direito, o titular poderá escolher de entre várias providências aquela que julgue mais oportuna (reivindicação, simples apreciação, acção indemnizatória). E o Tribunal é alheio a essa escolha/estratégia do autor, a qual depende única e exclusivamente da vontade do interessado, dentro dos diversos meios de actuação que o sistema pode legitimar. Mas a lei não se basta com a formulação do pedido. A lei processual impõe que o pedido seja formulado de modo claro e inteligível e que seja preciso e determinado – art.º 186.º do CPC (neste sentido ver António Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. 1, pág. 107). E compreende-se que assim seja, por forma a assegurar à contraparte o exercício do direito de defesa na sua plenitude. Assim e na senda do referido por António Abrantes Geraldes (ob. citada, pág. 108), sem prejuízo de outras características, podemos afirmar genericamente que o pedido deve reunir os seguintes requisitos: a) Ser expressamente referido na petição inicial (existência); b) Ser apresentado de forma clara e inteligível (inteligibilidade); c) Ter um conteúdo determinado e determinável em fase de liquidação ou execução de sentença (determinação); d) Ser coerente relativamente à causa de pedir ou pedidos cumulados (compatibilidade) e) Ser lícito, isto é, representar uma forma de tutela de direitos ou interesses protegidos e admitidos pela ordem jurídica (licitude); f) Ser viável, correspondendo ao corolário lógico dos factos alegados e correspondentes normas jurídicas (viabilidade); g) Representar uma forma de actuação do autor caracterizada pela boa fé e cumprimento de deveres de probidade (probidade); h) Representar uma forma de tutela de um direito ou de um interesse juridicamente relevante (juridicidade). Dito isto, urge analisar os diversos pedidos formulados pelo Autor: a) Serem os 1º, 2º e 3º RR. condenados a usar a fracção “C” para fins exclusivamente habitacionais, bem como, na sanção pecuniária compulsória de 100€ por cada dia de atraso no cumprimento ou em situação de incumprimento deste dever. Concordamos com a decisão recorrida quando refere que “o fim a que uma fração se destina constitui uma limitação ao exercício do direito de propriedade de cada condómino sobre a sua fração, encontrando-se definido no título constitutivo da propriedade horizontal”. Assim, condenar os Réu a utilizar a fração para fins exclusivamente habitacionais equivale a condená-los a cumprir a lei…. Ora, a lei impõe-se por si, não cabendo ao Tribunal condenar ninguém a cumprir aquilo que resulta da lei. O Tribunal existe para dar resposta a situações em que a lei é violada. E nessa conformidade o pedido é deduzido e aferida a sua viabilidade. Num caso como o dos autos, a lógica e a viabilidade, ditariam que o pedido formulado fosse “serem os Réus condenados a absterem-se de usar a fracção C para outros fins que não exclusivamente habitacionais e no pagamento de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso no cumprimento deste dever.” Só que não foi esse o pedido formulado! E o pedido formulado pelo Autor não tem viabilidade não sendo a sentença o meio idóneo para condenar alguém a dar a uma fracção o uso que resulta da sua própria natureza. O pedido há-de ser encarado e formulado como destinando-se a repor a legalidade de uma determinada situação concreta (desconforme ou ilícita) - prestação de non facere – e não de condenação …. Pelo que partilhamos das mesmas reservas em relação ao pedido formulado sob a al. a) que o Tribunal a quo. Poder-se-ia argumentar que estaríamos perante um pedido implícito. Mas entendemos que não e que a situação é exactamente a inversa! Implícito à condenação dos Réus a absterem-se de dar à fracção um uso distinto daquele a que está destinado (pedido omitido) é que está a condenação no cumprimento da lei (pedido expresso). Sem prejuízo da desformalização do processo civil, e da aplicação de eventuais regras da hermenêutica, não poderá o Tribunal converter um pedido formulado na positiva, para um pedido na sua vertente negativa, sob pena de violação do art.º 3.º e 609.º do CPC, sendo certo que o Autor nunca pediu a condenação dos Réus a absterem-se de dar à fracção o uso que, hipoteticamente, estarão a dar e que não é será o definido no título constitutivo da propriedade horizontal. Conforme se referiu no Ac. do STJ de 22-03-2007 (Relator Sousa Peixoto, proc. 06S3961) “O pedido constitui, pois, uma parte da petição absolutamente distinta da sua parte narrativa e há-de ser formulado em separado e de forma inequívoca. E compreende-se que assim seja, uma vez que a exposição das razões de facto e de direito não podem ser confundidas com o pedido. Com efeito, nada obsta a que o autor na parte narrativa da petição afirme ter direito a determinada importância e depois acabe por formular um pedido de quantia inferior àquela. O recorrente entende que o pedido formulado na conclusão da petição inicial deve ser integrado com o que havia sido alegado na parte narrativa da petição, mas isso implicaria que o juiz procedesse a uma interpretação da vontade do autor, o que a estrutura formal da petição não consente, uma vez que dessa interpretação poderia resultar um pedido diferente daquele que o autor realmente quis, o que constituiria uma violação do princípio dispositivo (art.º 3.º, n.º 1, do CPC).” Pelo que entendemos que o elemento literal do pedido formulado não comporta a interpretação com a formulação que, outro sim, o segmento do pedido deveria conter. b) Serem todos os RR. solidariamente condenados a: i. Custear os estudos que o A. mandará elaborar demonstrativos do impacto que a remoção das lajes, alteração dos vãos e reposição em diferente local, tiveram, ou podem vir a ter, na estabilidade e segurança de todo o prédio; ii. Em função das conclusões técnicas obtidas, custear todas as obras necessárias para reconstruir uma situação idêntica à preexistente relativamente às remoções por si realizadas, com garantia de plena estabilidade do prédio; iii. Apresentar à Câmara Municipal de Lisboa os projectos necessários, tendo em vista a regularização formal do processo do edifício e reduzir, até onde for possível, o risco de ofensa as suas estruturas; iv. Garantir por meio de inscrição sobre as fracções B e C, na Conservatória do Registo predial, sem limite de capital e como encargo em espécie, sem prazo determinado os riscos que, mesmo com a execução dos trabalhos que sejam recomendados pelos estudos a efectuar, sempre subsistirão; v. Reembolsar todas as despesas suportadas, em resultado da sua conduta, em causa nestes autos. Designadamente a título de honorários, encargos e taxas de justiça, custas judiciais e pareceres técnicos que se venham a apurar em sede de execução de sentença. Alegou a 4.ª Ré, em sede de contestação, que estaríamos perante a formulação de pedidos genéricos e que tal consubstanciaria uma excepção dilatória inominada, conducente à absolvição da instância. Não nos diz a lei o que é um pedido genérico. Limita-se a admitir a sua formulação apenas e tão só nos casos taxativamente referidos nas als. a) a c) do n.º 1 do art.º 556.º do CPC. Segundo A. Reis (Comentário ao Código de Processo Civil, Volume 3.º Coimbra Editora, 1946, p. 170), o pedido diz-se genérico quando é indeterminado no seu quantitativo e como essa indeterminação implica iliquidez, podendo-se considerar expressões equivalentes as de “pedido genérico” e “pedido ilíquido”. E no dizer de Anselmo de Castro (Anselmo de Castro, Lições de Processo Civil coligidas por Abílio Neto, Livraria Almedina, 1970, Vol. I, p. 274)., o pedido genérico contrapõe-se ao pedido específico e vem a significar o mesmo que pedido ilíquido. Entendemos por bem separar os diversos pedidos formulados nas várias alíneas. - Alíneas b.i), b.ii) e b.iii) ( i. Custear os estudos que o A. mandará elaborar demonstrativos do impacto que a remoção das lajes, alteração dos vãos e reposição em diferente local, tiveram, ou podem vir a ter, na estabilidade e segurança de todo o prédio; ii. Em função das conclusões técnicas obtidas, custear todas as obras necessárias para reconstruir uma situação idêntica à preexistente relativamente às remoções por si realizadas, com garantia de plena estabilidade do prédio; iii. Apresentar à Câmara Municipal de Lisboa os projectos necessários, tendo em vista a regularização formal do processo do edifício e reduzir, até onde for possível, o risco de ofensa as suas estruturas; Da formulação dos pedidos ressalta à evidencia o carácter condicional dos mesmos (custear os estudos que a Autora MANDARÁ elaborar e em função desse estudo e do seu resultado serem os Réus condenados a custear as obras necessárias a repor a situação anterior). Todos eles (i, ii e iii) estão dependentes da ocorrência de um facto futuro e incerto: um estudo que a Autora mandará efectuar. Atente-se na alegação do Autor em sede de petição inicial: “98.º Então, como reparar a situação criada? 99.º Em primeiro lugar, deverão os RR. custear os estudos que o A. mandará elaborar, demonstrativos do impacto que a remoção das lajes, alteração dos vãos e reposição em diferente local, tiveram, ou podem vir a ter, na estabilidade e segurança de todo o prédio. 100.º Em função das conclusões técnicas obtidas, deverão os RR. custear todas as obras necessárias para reconstituir uma situação idêntica à preexistente relativamente às remoções por si realizadas, com garantias de plena estabilidade para o prédio.” 101.º Apresentando à Câmara Municipal de Lisboa os projetos necessários, a expensas dos RR. 102.º Isto tendo em vista reduzir, até onde for possível, o risco gerado pela ofensa às estruturas do edifício.” Que estudo é esse? Não se sabe. Que obras são essas? Também não se sabe… Na medida em que: (i) a Autora ainda não encomendou o estudo; (ii) não se sabe se e quando o mandará elaborar; (iii) a quem e (iv) qual grandeza de valores inerentes ao custo desse estudo. Por outro lado, qual o sentido de condenar os Réus a efectuarem as obras que esse hipotético estudo venha a fixar como necessárias, se ainda nem sabemos se esse estudo vai concluir pela necessidade das obras? Qual o sentido de se condenarem os Réus a apresentar projectos à Câmara Municipal para realização de obras que não se sabem quais são, nem se terão se terão de ser efectuadas? Nunca poderá por isso o Tribunal condenar os Réus a efectuarem obras, nem a apresentarem os respectivos projectos camarários, sem se saber se as/os mesmas(os) são ou não necessárias(os)! Por força do princípio da determinabilidade do conteúdo das decisões judiciais, a lei processual não admite, por via de regra, a condenação condicional, isto é, aquela em que o reconhecimento do direito fica dependente da hipotética verificação de um facto futuro e incerto, ainda não ocorrido à data do encerramento da discussão, particularmente nos casos em que o facto condicionante requer ulterior verificação judicial. Conforme se refere, com toda a pertinência para a situação dos autos, no Ac. do STJ de 27-09-2012 (Relator Lopes do Rego, proc. 663/09.1TVLSB.L1.S1), a questão centra-se em saber em que medida será admissível que o autor/ credor “proponha acção de condenação tendo como objecto uma obrigação ainda não exigível ao devedor, nela obtendo decisão de mérito favorável, apesar de – nos momentos da propositura da causa e do encerramento da discussão – ainda não se ter verificado o termo ou ocorrido facto ou condição que tornaria tal obrigação vencida e exigível? Como é sabido, tem sido doutrinariamente controversa a articulação dos regimes – aparentemente dissonantes – que constam do nº 2 do art.º 472º e do art.º 662º do CPC – condicionando o primeiro de tais preceitos legais a efectivação em juízo de obrigações referentes a prestações futuras à existência de um interesse específico do credor ( que pretende antecipar a efectivação em juízo do seu direito) traduzido uma particular necessidade de tutela no momento da exigibilidade ou vencimento da obrigação; e, pelo contrário, parecendo a segunda daquelas normas admitir, sem essa ressalva, a prolação de sentença condenatória relativamente a obrigações ainda não vencidas ou exigíveis. Assim, uma parte substancial da doutrina ( Antunes Varela, Anselmo de Castro, Montalvão Machado), estribada na lição de Alberto dos Reis, estabelece uma diferenciação do campo de aplicação daquelas duas normas em função do momento processual em que a inexigibilidade é detectada no processo: o art.º 472º, nº2, vedaria a propositura de acções de condenação referentes a prestações futuras, em que a inexigibilidade actual é assumida pelo credor na petição inicial – condicionando a admissibilidade desta à invocação do referido interesse específico na obtenção de tutela jurídica futura ; pelo contrário, a norma que consta do art.º 662º aplicar-se-ia apenas na fase do julgamento, permitindo, por evidentes razões de economia processual, a condenação in futurum quando apenas se viesse a verificar, na fase do julgamento, que, afinal, a obrigação invocada como exigível pelo credor não estaria afinal ainda vencida, no momento mais recente que podia ser atendido pelo tribunal. Pelo contrário, outra orientação doutrinária, sustentada nomeadamente por Castro Mendes e Lebre de Freitas, delimita o âmbito de aplicação das referidas normas processuais em função da diversidade intrínseca das situações materiais em litígio, reportando-se o art.º 472º a obrigações ainda não constituídas e o art.º 662º a obrigações já actualmente existentes, mas ainda não vencidas ou exigíveis.” (…) 6. A figura da condenação in futurum e o exacto âmbito da sua admissibilidade envolve ponderação de vários interesses ou valores processuais relevantes: (…) - finalmente, há que ter em consideração a problemática da indispensável determinação do conteúdo da sentença judicial, colocando, nomeadamente, limites à admissibilidade de condenações condicionais, expressadas em sentenças que reconhecem direitos sujeitos a uma verdadeira condição suspensiva, de conteúdo amplamente indeterminado, ao menos nos casos em que as possíveis dúvidas sobre a verificação ou não verificação da condição impliquem inevitavelmente uma nova e ulterior apreciação jurisdicional. Ou seja: os direitos futuros e condicionais, a reconhecer jurisdicionalmente de forma antecipada, mesmo com base numa particular necessidade de tutela do credor, que careceria justificadamente de título executivo no momento em que tais relações se transformassem em actuais e exigíveis, não poderão traduzir-se numa condenação sujeita a um facto-condição de conteúdo amplamente indeterminado – e, portanto, susceptível de, com toda a probabilidade ocasionar um novo litígio entre as partes, a ser dirimido por nova intervenção do juiz. Como se afirma no Ac. de 7/4/11, proferido pelo STJ no P. 419/06.3TCFUN.L1.S1, A lei processual não admite em regra, por força do princípio da determinabilidade do conteúdo das decisões judiciais, a condenação condicional, ou seja, a sentença judicial em que o reconhecimento do direito fica dependente da hipotética verificação de um facto futuro e incerto, ainda não ocorrido à data do encerramento da discussão da causa – particularmente nos casos em que o facto condicionante sempre exigiria ulterior verificação judicial, prejudicando irremediavelmente a definitividade e certeza da composição de interesses realizada na acção e a efectividade da tutela alcançada pelo demandante. Pelo contrário, admitimos que possa ser logo judicialmente reconhecido um direito sujeito a condição suspensiva quando esta se consubstanciar numa factualidade que, embora futura e eventual, seja susceptível de fácil e inequívoca demonstração, nomeadamente mediante prova documental – veja-se, por exemplo, o Ac. de 10/9/09, (de que fomos relator), proferido pelo STJ no P.374/09.8YFLSB , em que, aderindo à posição sustentada por A. Varela, se tem como admissível a sentença de condenação condicional, em termos paralelos aos previstos no art.º 662º, num caso em que a condição suspensiva se resumia à obtenção de licença de utilização de certo prédio, por o “facto condicionante» da plena disponibilidade substantiva da fracção em causa, ligado à estrita verificação pela Administração das condições regulamentares de emissão da licença de utilização, , não exigir qualquer ulterior verificação judicial, susceptível de prejudicar a certeza do direito e das situações jurídicas reconhecidas, não devendo, nessa medida, constituir obstáculo relevante à prolação de condenação «in futurum» No caso dos autos, os pedidos formulados assentam no prognóstico de que os estudos a realizar determinarão o reconhecimento da posição assumida pela Autora quanto às intervenções efectuadas pela 1.ª Ré, no sentido de as mesmas afectarem a estrutura do prédio. Esse estudo não existe e ainda não foi pedido. Terá existência se e quando a Autora o solicitar. Essa condicionalidade afeta a definitividade e certeza da composição de interesses realizada na ação e a efectividade da tutela alcançada pelo demandante ( neste sentido Ac. do S.T.J de 27-09-2012, proc. n.º 663/09.1TVLSB.L1.S1, Lopes do Rego). Conforme se refere no Ac. da Relação de Coimbra de 22-1-2015 (proc. 1331/12.2TVLSB.L1-8, Catarina Manso- disponível para consulta in www.jurisprudência.pt), o juiz há de dizer o direito de uma forma real e manifesta, isto é, com exatidão e firmeza, de forma a trazer a quietude social preconizada por um Estado de Direito; e a permissividade de uma sentença condicional, tal e qual a entendemos, porque eivada de um estímulo a congeminar um buscado estado de incerteza, não pode obter refúgio numa legislação que se concebe deveras afastada desta desaconselhada peculiaridade. Segundo Antunes Varela e Miguel Bezerra e Sampaio e Nora (Manual de Processo Civil, 1984, Coimbra editora, p. 665, nota 1), importa, porém, não confundir a sentença de condenação condicional, em que condicionado é o direito reconhecido na sentença, com as sentenças condicionais, em que a incerteza recai sobre o sentido da própria decisão e que, em princípio não são admitidas no nosso sistema. Estes autores (ibidem, pp. 664/665) consideram admissível a sentença de condenação condicional nos casos em que a obrigação seja incerta nessa data ou em que sendo certa a obrigação, seja ainda incerta ou ilíquida a prestação. Ora, não é manifestamente esse o caso dos presentes autos. - Quanto ao pedido formulado em b.iv (iv. Garantir por meio de inscrição sobre as fracções B e C, na Conservatória do Registo predial, sem limite de capital e como encargo em espécie, sem prazo determinado os riscos que, mesmo com a execução dos trabalhos que sejam recomendados pelos estudos a efectuar, sempre subsistirão) Em sede de petição inicial alegou o Autor a este respeito que: “106.º Ou seja, os RR. têm de garantir os riscos que, mesmo com a execução dos trabalhos que sejam recomendados pelos estudos a efetuar, sempre subsistirão. 107.º Como garantir, por um período indeterminado que há-de corresponder à restante vida física do edifício? 108.º E qual o montante de capital a fixar, se fosse adotada uma solução por essa via? 109.º O A. entende que a constituição de uma garantia de capital é inadequada, tanto mais que, se trata de um condomínio, com natureza e características jurídicas próprias, pouco vocacionadas para a gestão destes riscos. 110.º Assim, ponderando diversas vertentes de abordagem da questão, entende que essa garantia deve ser inscrita sobre as frações B e C, na Conservatória do Registo Predial, sem limite de capital e como encargo em espécie, sem prazo determinado.” Mais uma vez o pedido está condicionado aos estudos a efectuar, pelo que – nos termos em que é formulado – é não só condicional como ainda é vago e genérico na sua formulação. Conforme é ensinamento de Oliveira Ascensão (in Direito Civil, Reais, 4ª Ed., p. 149), “Não é permitida a constituição, com carácter real, de restrições ao direito de propriedade ou de figuras parcelares deste direito senão nos casos previstos na lei;”. Ora, não indica o Autor na sua petição qual a concreta figura através da qual pretende que se onere a propriedade sobre as fracções B e C, aludindo de forma genérica a “garantia” e “encargo em espécie”. Pelo que, para além de condicional, o pedido formulado é vago e indeterminado, a menos que pretenda o Autor criar um direito real inominado o que, como se referiu supra, lhe está vedado. Para além de que qualquer garantia constituída nos termos peticionados pelo Autor caracterizar-se-ia sempre como uma garantia genérica ou omnibus, carecida de elementos que permitissem inferir, com segurança, a origem, o prazo, os possíveis montantes. Embora nos presentes autos a Autora pretenda uma garantia real, poderíamos sempre, por identidade de argumentos, fazer um paralelismo com a situação decidida no AUJ 4/2011, da nulidade da fiança por indeterminabilidade do objecto. A pretensão do Autor iria no mesmo sentido, colocando o Tribunal na posição confrontar com a situação de ele próprio condenar os Réus na constituição de uma garantia/encargo indeterminado e indeterminável, no momento da prolação da sentença! Dito isto, concordamos com a decisão recorrida quando afirma que os pedidos formulados pelo Autor “não preenchem os requisitos do pedido, sendo vagos, indeterminados e condicionais e, por isso, inadmissíveis.” Com efeito, consubstanciam pretensões procedimentais absolutamente abstractas, que não são susceptíveis de tutela jurisdicional – que se pretende certa, exacta e firme. Em face de tal conclusão, coloca-se a questão de aferir da sorte de tais pedidos e do acerto da decisão que determinou a absolvição dos Réus da instância. Impõe-se então concluir que os pedidos não podem ser formulados de forma vaga, imprecisa e indeterminada, e nem de forma ininteligível; antes devem ser formulados de forma clara, determinada, congruente e coerente e certa, ainda que possam ser apresentados de forma alternativa (artigo 553º), subsidiária (artigo 554º), cumulativa (artigo 555º), genérica (artigo 556º) e em prestações vincendas (artigo 557º), nas circunstâncias legalmente previstas. Nos casos em que tal não ocorre, e à semelhança das situações de ineptidão da petição inicial, expressamente prevista como exceção dilatória, estaremos também perante uma exceção dilatória, ainda que inominada, sendo inquestionável, em face do artigo 577º do Código de Processo Civil (onde consta expressamente a referência a “entre outras”) a existência de exceções dilatórias inominadas. Anselmo de Castro (Direito Processual Civil Declaratório, 1982, II, página 250) considera que quando se “formula indevidamente um pedido genérico, ainda aí a consequência deverá ser a absolvição da instância, pois não poderá o tribunal legalmente conceder o que o autor pede (a isso obsta, por definição, o art.º 471º) nem conceder coisa diversa (art.º 668º/1 al e)”; no sentido de a formulação ilegal de pedido genérico constituir excepção dilatória pronuncia-se também Abrantes Geraldes (Temas da Reforma do Processo Civil, II Volume, 1997, página 75 e ob. cit. Página 618) considerando que a “dedução de pedido genérico fora do condicionalismo legal reconduz-se a uma exceção dilatória inominada”. In casu, analisando os pedidos formulados pela Autora, temos de concordar com o entendimento perfilhado pelo tribunal a quo, concluindo que se apresentam efetivamente formulados com um caráter inconcludente, indeterminado, vago, condicional e genérico. Se acaso o tribunal julgasse os pedidos em causa procedentes, eles sofreriam de uma indeterminação e imprecisão tal que, qualquer eventual condenação dos Réus seria uma “caixa de pandora” de incertezas e inseguranças sobre o seu efectivo objecto, alcance e latitude da condenação. Conforme já referimos o pedido deve ser indicado e formulado de forma a que o alcance da pretensão seja perfeitamente compreendido pelo juiz e pelo réu tendo em vista possibilitar verdadeiramente o exercício do contraditório, permita a definição dos contornos do direito no caso concreto e a prolação de uma decisão que seja definidora do conflito de interesses subjacente ao mesmo. A decisão judicial a proferir não poderá, em caso algum, ser imprecisa e/ou indeterminada, antes sendo necessário saber com exactidão o que o tribunal decidiu, para que os autores e os réus, e qualquer pessoa, possam saber sem dúvidas o que foi decidido e o que deve ser cumprido pelos réus no futuro. Os pedidos em causa, da forma como se apresentam formulados, não permitem uma condenação nesses moldes, nem mesmo são susceptíveis de ser concretizados por liquidação, nos termos em que o art.º 556.º do CPC permite a dedução de pedidos genéricos. Pelo que, consequentemente, a decisão proferida pelo tribunal a quo, que absolveu os Réus da instância não merece censura, devendo manter-se, improcedendo nesta parte o presente recurso. d) Prejudicialidade entre a apreciação da questão de personalidade judiciária e excepção dilatória inominada de formulação de pedidos genéricos A posição tomada pelo Tribunal quanto à inadmissibilidade da formulação genérica, condicional e inconcludente dos pedidos do Autor – e consequente manutenção da absolvição dos Réus da instância – determina que o Tribunal não extraia CONSEQUÊNCIAS JURIDICAS conclusões do diverso entendimento que teve quanto à falta de personalidade judiciária. Pelo que, embora com fundamentação não totalmente coincidente, se mantém a decisão do Tribunal a quo que absolveu os Réus da instância. * IV. Decisão: Por todo o exposto: Acordam os Juízes na 6.ª secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa julgar improcedente o recurso de apelação apresentado pelo Autor, mantendo a decisão de absolvição da instância dos Réus, embora com fundamentação não totalmente coincidente. Custas da Apelação pela Autora/Apelada (nos termos dos arts. 527.º, n.ºs e 2, 607.º, n.º 6 e 663.º, n.º 2, do CPC). Registe e notifique. * Lisboa, 20 de Fevereiro de 2025 Maria Teresa F. Mascarenhas Garcia Cláudia Barata Anabela Calafate |