Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ISILDA PINHO | ||
Descritores: | ALTERAÇÃO DA MEDIDA DE COAÇÃO PRESSUPOSTOS OPHVE RELATÓRIO SOCIAL | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/26/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I.–Para que possa haver lugar à alteração da medida coativa imposta ao arguido, o pedido para a sua substituição por medida de coação menos grave terá de radicar numa concreta verificação de uma atenuação das exigências cautelares, o que significa que só poderá haver lugar a eventual deferimento desse pedido, caso ocorram circunstâncias posteriores/ou de conhecimento posterior, que não tenham sido ponderadas no momento em que foi proferida a decisão quanto à imposição da medida coativa inicial. II.–Pese embora a medida coativa de prisão preventiva não possa ser entendida como absolutamente definitiva [no sentido de, transitado em julgado o despacho que a decretou, jamais poder ser alterada], pois a lei prevê e permite a sua reapreciação, alteração, extinção e até revogação, a verdade é que, fora das circunstâncias expressamente previstas na lei [designadamente no artigo 212.º do Código de Processo Penal], tal decisão não pode ser alterada, nem modificada, se se mantiverem inalterados os pressupostos da sua aplicação. III.–No caso em que o arguido requer a elaboração do relatório social ou informação dos serviços de reinserção social, para apurar se reúne as condições para cumprimento da medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica, a sua prévia elaboração só se justifica se o tribunal entender ser de lhe aplicar tal medida de coação. IV.–A informação que se possa obter dos serviços de reinserção social não se reporta aos pressupostos da aplicação da medida de coação de OPHVE, que estão definidos no Código de Processo Penal, visando apenas apurar se a situação pessoal, familiar, laboral e social do arguido é compatível com as exigências da vigilância eletrónica e os sistemas tecnológicos a utilizar [artigo 7.º, n.º2, da Lei 33/2010, de 02 de Setembro - MEIOS TÉCNICOS DE CONTROLO À DISTÂNCIA - VIGILÂNCIA ELECTRÓNICA], o que são realidades bem distintas. [Sumário elaborado pela relatora] | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordaram, em conferência, na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa: I–RELATÓRIO I.1–No âmbito dos autos de inquérito n.º 267/21.0JELSB que corre termos pelo Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa – Juiz 8, a 25-06-2022, foi o arguido RO sujeito a primeiro interrogatório judicial de arguido detido, na sequência do qual foi-lhe aplicada a medida de coação de prisão preventiva. Além de ter interposto recurso de tal decisão [entretanto julgado no sentido da sua improcedência, mediante acórdão deste TRL, datado de 06-12-2022], o arguido requereu a alteração da referida medida de coação e consequente substituição por outra medida não detentiva ou, em último caso, a sua sujeição à obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica. Sobre tal requerimento incidiu o despacho datado de 27-01-2023, no que aqui relava, do o seguinte teor [transcrição]: “(…) Fls. 3596/3602 e 3772 E) - O arguido RO veio requerer a substituição da medida de coacção que lhe foi aplicada - prisão preventiva. Alegou, para tanto, e, em síntese, que: – Foi utilizada prova proibida para indiciar o arguido consistente na obtenção de dados referentes a localizações celulares que permitiram ao OPC identificar o arguido e as pretensas localizações do mesmo bem como para considerar o arguido indiciado pelos factos identificados no Apenso B - DEI III - SKY CC; – Durante os cinco anos que antecederam a sua constituição como arguido em 24/6/2022 até à presente data o arguido auferiu rendimentos lícitos no valor global de 678.496,22 euros; – A aplicação de outras medidas de coacção que não a prisão preventiva, designadamente a prestação de caução, proibição de se ausentar para o estrangeiro, apresentações periódicas no O.P.C. ou, em última, instância a obrigação de permanência na habitação mostram-se adequadas e suficientes. O Ministério Público pronunciou-se no sentido de que o arguido deve continuar sujeito a prisão preventiva, alegando, em síntese, a manutenção dos pressupostos que determinaram a aplicação ao arguido de tal medida de coacção. Cumpre apreciar e decidir. Nos termos do art. 212º, n.º 1, do C.P.P. “As medidas de coacção são imediatamente revogadas, por despacho do juiz, sempre que se verificar: a)-Terem sido aplicadas fora das hipóteses ou das condições previstas na lei; ou b)-Terem deixado de subsistir as circunstâncias que justificaram a sua aplicação”. Dispõe o n.º 3 do citado normativo legal “Quando se verificar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação de uma medida de coacção, o juiz substitui-a por outra menos grave ou determina uma forma menos gravosa da sua execução”. Vejamos, pois. Relativamente às contrariedades invocadas pelo requerente a propósito da propalada invalidade da prova, é manifesto que tal argumentário não tem amparo nem cabimento no âmbito do pedido de alteração da medida de coacção, ora em apreço. Com efeito, como resulta do Apenso C, o arguido/requerente invocou exactamente os mesmos fundamentos no recurso interposto quanto ao despacho que determinou a (sua) prisão preventiva e o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão proferido em 6 de Dezembro de 2022, julgou o recurso totalmente improcedente. Assim, quanto a tal segmento, nada há a apreciar e/ou decidir. No que concerne à temática dos rendimentos, alegadamente, lícitos do arguido/requerente, é evidente, ao contrário do invocado, que face às decisões já proferidas no Apenso B (arresto preventivo e oposição apresentada) não ocorreu qualquer mitigação dos indícios afirmados em sede de primeiro interrogatório judicial. Ao invés, está já devidamente assente (sempre num contexto indiciário, naturalmente) que o arguido/requerente tem um património incongruente de valor superior a um milhão de euros. Vale tudo por dizer que, desde a data em que foi determinada a prisão preventiva do arguido não houve qualquer alteração às circunstâncias de facto e/ou às razões de direito que determinaram a aplicação de tal medida de coacção. Com efeito, o arguido continua fortemente indiciado da prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado e de um crime de associação criminosa, p. e p., respectivamente, pelos art. 21º, n.º 1, 24º, al. b) e c) e 28º, n.º 1 e 3 do D.L. n.º 15/93, de 22/1 e mantêm-se, com a mesma acuidade, os perigos mencionados no despacho que determinou a aplicação da prisão preventiva. Conforme se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 16/2/2016, proferido no âmbito do processo n.º 5668/11.0TDLSB-A.E1, in www.dgsi.pt. «De acordo com o princípio «rebus sic stantibus», as decisões judiciais, que apliquem medidas de coacção, podem e devem ser alteradas pelo Tribunal que as tenha tomado, mas apenas quando se tenha verificado uma alteração relevante das circunstâncias, em sentido lato, que tenham dado origem à sua decretação. II–Tal regime legal procura atingir um ponto de equilíbrio entre a desejável flexibilidade das decisões que apliquem determinadas medidas, que têm natureza excepcional e que implicam sempre um maior ou menor grau de limitação do direito do arguido à liberdade, acarretando duas delas (a prisão preventiva e a obrigação de permanência na habitação) o sacrifício do núcleo essencial desse direito, fora de uma decisão condenatória final, pelo que não devem manter-se por mais tempo do que o estado de coisas que as justificou ou tornou necessárias, e certos princípios de direito processual, como o do caso julgado e o da exaustão do poder jurisdicional do Juiz, por força dos quais a decisão judicial se impõe ao próprio Tribunal que a proferiu. III–Nesta ordem de ideias, as decisões a que nos reportamos são dotadas de uma certa margem de imutabilidade, na medida em que se não tenham alterado as circunstâncias que as motivaram.» No mesmo sentido, entre muitos outros, o Ac. da R.L. de 28/8/2000, in www.dgsi.pt., n.º convencional JTRL00027840, o Ac. da R.L. de 20/6/2001, in www.dgsi.pt., n.º convencional JTRL00034103, o Ac. da R.L. de 12/7/2001, in www.dgsi.pt., n.º convencional JTRl00034771 e o Ac . da R.C. de 14/4/1999, in www.dgsi.pt. n.º convencional JTRC185/2. Assim, face a todo o exposto, e sem necessidade de outras considerações, determina-se que o arguido RO continue a aguardar os ulteriores termos processuais sujeito a prisão preventiva. Notifique, com observância do disposto no art. 113º, n.º 10 do C.P.P. (…)”. » I.2–Recurso da decisão Inconformado com esse despacho, o arguido interpôs o presente recurso, com os fundamentos expressos na respetiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]: “I Após o 1.° interrogatório judicial o património do arguido, incluindo os seus rendimentos, foram objeto de análise pelo Ministério Público, tendo o mesmo apurado que: “Durante os cinco anos que antecederam a sua constituição como arguido em 24/06/2022, e até à presente data o arguido auferiu rendimentos lícitos no valor global de 678.496,22€”. II A investigação posterior ao 1.° interrogatório judicial do Recorrente revelou uma realidade distinta daquela que foi apresentada à Mma Juiz de Instrução Criminal nessa diligência. III O Ministério Público apurou que os fundamentos invocados pelo Tribunal a quo para o alegado perigo de continuação da actividade criminosa por banda do Recorrente, que seria a necessidade de obtenção de dinheiro ilícito para fazer face às suas despesas, não se verifica. IV O Tribunal a quo apresentou como prova para sustentar a sua decisão provas proibidas, nomeadamente, as informações por intromissão ilegal no sistema de comunicações SKY ECC, e as localizações celulares. V As localizações celulares foram obtidas mediante o pedido de informações às respetivas operadoras, ao abrigo da Lei n.° 32/2008, de 17 de julho. Com efeito, conforme o O.P.C. verteu nos autos a fls. 1835:"... na sequência da informação remetida pela operadora de comunicações Móveis ALTICE/MEO, e junta cfr. Douto despacho a fls. 1683, faço constar que foram consultados os ficheiros Excel "GSMLocalização,> fornecidos pelas respectivas Operadoras de telecomunicações à UTI (Unidade de Telecomunicações e Informática) desta Polícia Judiciária, a fim de apurar a seguinte factualidade ...". VI Mas os pedidos de informação às operadoras não se ficaram por aqui, a fls. 1931 consta o seguinte: – Em primeira análise, atendendo ao auto de exame directo deste telemóvel Iphone, modelo 6 S, com o IMEI3............2, a fls. 1054 e 1055, apreendido na posse de JC (cfr. Fl. 479), facilmente se observa que o referido dispositivo tem acoplado, no seu interior, um cartão SIM da marca MOCHE, com o n.° 00009.......2. Partindo desta informação, foi solicitado à operadora, cfr. Ofício da Autoridade Judiciária, como os dados de base associados ao mesmo. Em resposta, a fls. 1211, a Operadora de Telecomunicações MEO/ALTICE informou que o referido cartão se encontra associado ao número de telemóvel 922221395, um cartão pré-pago sem dados (anónimo). VII Tais informações foram obtidas ao abrigo dos art.s 4.°, 6.° e 9.° da Lei n.° 32/2008, de 17 de junho. VIII Por acórdão do Tribunal Constitucional n.° 268/2002, publicado no Diário da República n.° 108, Ia série, de 3 de junho de 2022 foi decidido: a)-Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 4o da Lei n.0 32/2008, de 17 de julho, conjugada com o artigo 6o da mesma lei, por violação do disposto nos n.°l e 4 do artigo 35° e do n.° 1 do artigo 26°, em conjugação com o n.°2 do artigo 18°, todos da Constituição; b)-Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 9o da Lei n.0 32/2008, de 17 de julho, relativa à transmissão de dados armazenados às autoridades competentes para investigação, deteção e repressão de crimes graves, na parte em que não prevê uma notificação ao visado de que os dados conservados foram cedidos pelas autoridades de investigação criminal, a partir do momento em que tal comunicação não seja suscetível de comprometer as investigações nem a vida ou integridade física de terceiros, por violação do disposto no n. °1 do artigo 35° e do n.°l do artigo 20°, em conjugação com o n.°2 do artigo 18°, todos da constituição. ” IX Assim, dúvidas não restam de que a obtenção de dados referentes a localizações celulares que permitiram ao O.P.C., ainda que indiciaria e alegadamente, identificar o Recorrente e as pretensas localizações do mesmo, configuram prova proibida, a qual nunca poderia ser considerada para aplicação ao Arguido de medidas de coação. X Por outro lado, com referência ao Nuipc 601/21.3JAPRT, refere o O.P.C., e resulta dos autos, que os factos aí indiciados tiveram origem em alegadas informações obtidas através de intromissão no sistema de comunicação SKY ECC. Diga-se, desde já, que tais informações não pertencem ao Arguido. XI Contudo, não podemos deixar, desde já, de referir que as informações obtidas no referido sistema pelas Autoridades Francesas, como foi amplamente divulgado, foram-no fora do quadro legal, o acesso ao referido servidor foi efetuado através de pirataria, “hacking”, por parte das autoridades policiais francesas, sem qualquer autorização judicial. XII Os dados obtidos através da entrada nos servidores de comunicações SKY ECC foram- no de uma forma ilegal e abusiva. Questão que tem vindo já a ser decidida e considerada por vários Tribunais Europeus. XIII Essa intromissão não foi precedida de qualquer autorização ou controle judicial, atuando as Autoridades francesas como se de verdadeiros criminosos/piratas informáticos, se tratassem. XIV Sobre a ilegalidade dos dados recolhidos a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia não deixa qualquer margem para dúvidas, como resulta, aliás da jurisprudência citada no já referido Acórdão n.°268/2022 do Tribunal Constitucional. XV Assim, constitui prova proibida, utilizada pelo Tribunal a quo, para considerar o arguido indiciado pelos factos o identificado Apenso B - DEI III - SKY ECC, CD. XVI Considerando o acima exposto devem ser consideradas provas proibidas quer o Apenso B- Dei III - Sky ECC, CD, quer os autos de localização celular de fls. 1835 a 1844. XVII Não é credível que o Ministério Público invoque que o Recorrente “fugiu”, ou que existe perigo da sua fuga, quando o mesmo nunca foi notificado para comparecer a qualquer diligência processual. XVIII A data da sua detenção o Recorrente não tinha qualquer mandado de detenção contra si, nacional ou internacional. XIX O Recorrente nunca tinha sido notificado, por qualquer órgão de polícia Criminal, para comparecer em qualquer diligência processual, assim como, nunca foi mandado parar em qualquer fiscalização de O.P.C.. XX A tudo insto acresce o facto de que, quer em buscas efetuadas à sua residência, quer à revista que lhe foi efetuada, nada de relevante foi encontrado, nomeadamente, que permitisse associar o Recorrente às atividades imputadas. XXI E, com o decorrer da investigação, o Ministério Público já conseguiu apurar, pelo menos, que “Durante os cinco anos que antecederam a sua constituição como arguido em 24/06/2022, e até à presente data o arguido auferiu rendimentos lícitos no valor global de 678.496,22€.” XXII O Recorrente tem organizada em Portugal toda a sua vida pessoal e profissional, aqui vivem a esposa e os seus filhos menores, os quais sempre estudaram e viveram em Portugal. XXIII O Recorrente não tem averbado no seu registo criminal a prática de qualquer crime. XXIV No caso sub judice a aplicação ao arguido da medida de coacção de prisão preventiva é manifestamente desproporcional e desadequada em comparação, nomeadamente, com as medidas de coação que foram aplicadas a outros Arguidos nestes autos. XXV Como acima referimos, do conjunto de elementos indiciários apontados ao arguido, em consequência dos novos dados apurados pelo Ministério Público, consideramos não ser legítimo concluir-se que a medida de coacção de prisão preventiva se revela como a única medida adequada ao caso, em função das exigências processuais de natureza cautelar, designadamente em termos de afastar os perigos identificados pelo Tribunal a quo no seu despacho, ou seja, perigo de fuga e perigo de continuação da atividade criminosa. XXVI No caso em apreço, após o 1.° interrogatório judicial, o Ministério Público apurou que um dos principais motivos que esteve na origem da colocação do Recorrente em prisão preventiva, a alegada falta de atividade profissional e obtenção de rendimentos lícitos, afinal não se verificava. XXVII Ao decidir como decidiu, não procedendo a uma alteração das medidas de coação o Tribunal a quo violou o art. 213.°, n.° 4 do Código de Processo Penal, assim como o art. 379.°, n.° 1, al. c), porquanto não se pronunciou sobre questões que devia apreciar. Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. mui doutamente suprirão deve, em consequência, a medida de coacção de prisão preventiva aplicada ao Arguido ser substituída pela prestação de caução, com a obrigatoriedade de entregar o passaporte, a obrigatoriedade de se apresentar diariamente no posto de polícia da sua residência e, ainda, a proibição de se ausentar do País, art.s 197.°, 198.° e 200.°, ou pela “Obrigação de Permanência na Habitação”, sujeito a vigilância electrónica, art. 201.°, todos do Código de Processo Penal.”. » O recurso foi admitido, nos termos do despacho proferido a 28-02-2023. » I.3–Resposta ao recurso Efetuada a legal notificação, a Digna Magistrada do Ministério Público respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pela sua improcedência, sem ter, contudo, apresentado conclusões. » I.4–Parecer do Ministério Público Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, nesta instância o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, nos termos do qual, aderindo à posição da Digna Magistrada do Ministério Público na primeira instância, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso. » I.5.–Resposta Pese embora tenha sido dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não foi apresentada resposta ao sobredito parecer. » I.6.–Concluído o exame preliminar, prosseguiram os autos, após os vistos, para julgamento do recurso em conferência, nos termos do artigo 419.º do Código de Processo Penal. Cumpre, agora, apreciar e decidir: » II–FUNDAMENTAÇÃO II.1-Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objeto do recurso: Conforme decorre do disposto no n.º 1 do art.º 412.º do Código de Processo Penal, bem como da jurisprudência pacífica e constante [designadamente, do STJ[1]], são as conclusõesapresentadas pelo recorrente que definem e delimitam o âmbito do recurso e, consequentemente, os poderes de cognição do Tribunal Superior, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso a que alude o artigo 410º do Código de Processo Penal[2]. No presente recurso, face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação do recurso interposto, a questão a apreciar e decidir é a seguinte:
II.2-Com relevo para a decisão, resultam dos autos as seguintes circunstâncias: –Em sede de primeiro interrogatório judicial de arguido detido, ocorrido a 25-06-2022, foi aplicada ao recorrente a medida de coação de prisão preventiva, sustentada nos perigos de fuga e de continuação da atividade criminosa, perante a existência de fortes indícios, da prática, em coautoria, na forma consumada e em concurso real e efetivo de:
III- O Tribunal a quo apresenta como prova para sustentar a sua decisão, nomeadamente: (…) 15) Auto de localização celular de fls. 1835 a 1844; (…) VI- Assim, dúvidas não restam de que a obtenção de dados referentes a localizações celulares que permitiram ao OPC, ainda que indiciariamente, identificar o Recorrente e identificar, alegadas, localizações do mesmo, configuram prova proibida, a qual nunca poderia ser considerada para aplicação ao Recorrente de medidas de coação. VII- Mas a consideração desta prova é ainda mais grave, porquanto, através destas informações das Operadoras de telecomunicações, partiram-se a seguir para recolha de outros elementos de prova, nomeadamente, o confronto dos mesmos com um outro co-arguido. VIII- Por outro lado, com referência ao Nuipc 601/21.3JAPRT, refere o OPC e resulta dos autos que os factos aí indiciados tiveram origem em informações obtidas através de intromissão no sistema de comunicação SKY ECC. (…) XI- Os dados obtidos através da entrada nos servidores de comunicações SKY Ecc foram-no de uma forma ilegal e abusiva. Não foram precedidos de qualquer autorização ou controle judicial, atuando as Autoridades francesas como se de verdadeiros criminosos, piratas informáticos, se tratassem. (…) XIV- Considerando o acima exposto devem ser consideradas provas proibidas quer o Apenso B- Dei III — Sky ECC, CD, quer os Autos de localização celular de fls. 1835 a 1844, pelo que, em consequência deve o despacho que aplicou as medidas de coação ser anulado, remetendo-se o processo ao Juiz de Instrução para que expurgue o mesmo da prova proibida e que considerou para aplicação ao Arguido da medida de coação mais gravosa. (…) XV- Analisando o despacho que aplicou ao arguido as medidas de coação, constatamos que, (…), nenhuma prova é apresentada no despacho. (…) XLVII- Para associar o ora Recorrente à apreensão do referido produto estupefaciente referiu o Ministério Público, no ponto 83 que: "Nessa sequência o próprio RO nesse dia saiu de casa para parte incerta e no dia 16/02/2022, viajou para o Dubai apenas tendo regressado a Portugal no início desta semana." Com tal indiciação pretendeu o Ministério Público transmitir a ideia de que o Recorrente, em consequência da apreensão do produto estupefaciente ocorrida no dia 14/02/2022, fugiu à Justiça! XLVIII- Aconteceu, porém, que ao contrário do referido pelo MP, a viagem que o Recorrente realizou no dia 16/02/2022 já se encontrava agendada e reservada desde o dia 11/02/2022. Pelo que, na teoria do Ministério Público, o Recorrente para além de traficante também é bruxo, isto porque, no dia 11/02/2022 já sabia o que ia acontecer no dia 14/02/2022.. XLIX- É igualmente falso que entre o dia 16/02/2022 e o dia 24/06/2022 0 Recorrente tivesse estado ausente de Portugal. Com efeito, o Recorrente, alheio à investigação dos autos, fez a sua vida com normalidade habitual do seu dia a dia, acompanhando a pastelaria de que é sócio e gerindo a sua empresa de táxis, acompanhando os filhos à escola... L- Estranha-se a invocação do Ministério Público de que o Recorrente "fugiu", ou que existe perigo de fuga, quando o mesmo nunca foi notificado para comparecer a qualquer diligência processual. Como é que alguém poderia fugir se não estava sequer a ser procurada?! LI- É que, no caso sub judice o Recorrente não tinha qualquer mandado de detenção contra si, nacional ou internacional. O Recorrente nunca foi notificado, por qualquer Órgão de Polícia Criminal, para comparecer em qualquer diligência processual. LII-O Recorrente nunca foi mandado parar em qualquer fiscalização de OPC, a sua detenção no dia 24 de junho de 2022, foi uma triste encenação, única e exclusivamente com o objetivo de criar show off televisivo. LIII- A Polícia Judiciária, que sempre soube que o Recorrente estava em Portugal e que sabia que o mesmo iria tirar uns dias de férias com a família, aproveitou essa viagem que o Recorrente se preparava para efetuar com destino ao Algarve, para montar uma encenação de alegada fuga. LIV-Tudo previamente preparado e encenado como demonstraram as subsequentes reportagens televisivas com imagens do processo e indicação do nome do Recorrente, tudo com o condimento típico nestas situações, em absoluta violação do segredo de justiça. LV- Conforme resulta da documentação que apresentou em sede de 1.º interrogatório judicial de arguido detido, o mesmo auferia rendimentos da sua atividade de gerente das sociedades que administra, entenda-se pastelaria e empresa de táxis. LVI- Assim, dúvidas não podem restar que o Recorrente e a sua esposa tinham atividades lícitas, que lhes rendem proveitos lícitos, conferindo-lhes as mesmas desafogo financeiro. Sendo certo que, algumas das empresas das quais o Recorrente é sócio, a sua titularidade remonta ao ano de 2014, ou seja, têm já mais de 8 (oito) anos. LVII-O Recorrente, ao contrário daquilo que foi ardilosamente veiculado pelo OPC para os media, não tem testas de ferro, estando as empresas por si tituladas e sendo o gerente. LVIII-Por outro lado, a casa onde o Recorrente reside, conforme resulta da certidão permanente que se anexa, foi contruída num terreno que anteriormente se encontrava integrado numa AUGI, conforme documento anexo. LIX- Sendo certo que, para construção do imóvel, o Recorrente e a sua esposa contraíram um crédito de 285 000€ (duzentos e oitenta e cinco mil euros), o qual ainda se encontra por pagar, pelo que, e conforme facilmente se constata, o Recorrente sempre teve todo o seu património no próprio nome. LX- Nunca o tribunal a quo, em relação ao Recorrente poderia considerar como indiciado que: "95.- O dinheiro que sustenta os arguidos e as respetivas famílias provêm, essencial e maioritariamente, da atividade ilícita por todos levada a cabo, sendo certo que o dinheiro utilizado nos pagamentos é disponibilizado por outros elementos da associação criminosa ainda não identificados. ". LXI-O tribunal a quo não poderia considerar como indiciariamente demonstrado a prática em co-autoria (…), na forma consumada e em concurso real e efetivo (…) de: -um crime de tráfico de estupefacientes agravado, (…), e -um crime de associação criminosa, (…). Contudo, mesmo que assim não se entenda, o que não se concede e por mero dever de patrocínio se coloca à cautela ainda diremos o seguinte: LXII-A Senhora Juiz de Instrução considerou que para os mesmos crimes imputados ao Recorrente, o co-arguido LF deveria beneficiar da medida de coação de apresentações periódicas. LXIII-Ora, estando em causa a mesma indiciação, se para o arguido LF o tribunal considerou que os perigos inerentes aos crimes pelos quais se encontrava indiciado poderiam ser acautelados com a medida de coação de apresentações periódicas, não se compreende, porque em relação ao Recorrente o mesmo entendimento não foi sufragado. (…) LXVIII- Entendeu o tribunal a quo que o risco de continuação da atividade criminosa decorre do facto do Recorrente viajar com alguma frequência para o estrangeiro, aliás, como o próprio declarou e reconheceu. LXIX- Se o tribunal a quo considera que esse é o risco que propícia uma alegada continuação da atividade criminosa, a mesma está atenuada, desde logo porque, por um lado, encontra-se apreendida à ordem dos presentes autos a autorização de residência do Recorrente no Dubai. LXX-Por outro lado, o Recorrente é cidadão que tem unicamente nacionalidade portuguesa, pelo que, a entrega do passaporte imediatamente impede qualquer saída do continente Europeu. LXXI-Mas mais, estando em causa uma preocupação com a saída de território nacional do Recorrente o mesmo facilmente ficaria controlado através de monitorização através da medida de coação de OPHVE. LXXII-Importa, ainda ter presente que o Recorrente tem organizado em Portugal toda a sua vida, aqui vivem os seus filhos menores e a sua esposa. LXXIII- O Recorrente não tem averbado no seu registo criminal a prática de qualquer crime. LXXIV-O Recorrente encontra-se social e familiarmente inserido. LXXV-No caso sub judice o Recorrente não foi detido em flagrante delito, ou seja, não foi detido em consequência imediata à prática de um crime nem nunca foi notificado para comparecer a qualquer diligência processual quer pelo Ministério Público quer por qualquer OPC. LXXVI-Recorrente nunca foi sequer proibido de se ausentar do país. Pelo que, com o devido respeito, utilizar-se como argumento, para considerar verificado o perigo de fuga e continuação da atividade criminosa, o facto de que o Arguido se deslocou algumas vezes ao Brasil e ao Dubai é manifestamente desrazoável. LXXVII- Em face de tudo o que ficou exposto e presentes que são, por um lado, os princípios da excepcionalidade, da adequação e da proporcionalidade e(…) na aplicação da medida de coacção de prisão preventiva, e, por outro, que "cumpre (...) rodear de todas as cautelas necessárias e razoáveis a aplicação de uma medida que incide sobre cidadãos que se presumem inocentes e que reveste uma gravidade extrema", afigura-se-nos por adequada e proporcional a medida de coacção de obrigação de apresentações periódicas semanais, (…) ou caso se entenda que é de aplicar ao arguido medida privativa da liberdade, o que por mero dever de patrocínio se admite, então deve ser-lhe aplicada a medida de coacção de "Obrigação de Permanência na Habitação" (…), para a qual o mesmo dá o seu consentimento sujeito a medidas de controle à distância. (…)”. –Tal recurso, que subiu em separado no Apenso C, foi julgado improcedente mediante acórdão proferido por este Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 06-12-2022. » II.3- Apreciação do recurso Insurge-se o recorrente contra o despacho que veio a indeferir o seu requerimento de alteração da medida de coação [de prisão preventiva] que lhe foi aplicada em sede de primeiro interrogatório judicial, no âmbito do qual, formulado ao abrigo do artigo 212.º e 213.º do Código de Processo Penal, peticionou a alteração da medida de coação de prisão preventiva, pela prestação de caução, com a obrigatoriedade de entregar o passaporte, a obrigatoriedade de se apresentar diariamente no posto policial da sua residência e, ainda, a proibição de se ausentar do país, ou, em último caso, a sua sujeição a obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica, mais requerendo, e para efeitos de se apurar se tem possibilidades de beneficiar dessa medida de coação, que se procedesse à elaboração de relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social, por parte do IRS. Invocou, para tanto, uma alteração das circunstâncias que levaram à aplicação dessa mesma medida, argumentando que:
Pugna pela substituição da medida de coação de prisão preventiva que lhe foi aplicada por outra menos gravosa, não privativa da sua liberdade ou, em último recurso, de obrigação de permanência na habitação, ainda que sujeita a vigilância eletrónica. Vejamos: Para apreciação do presente recurso, o segundo em que o arguido se insurge contra a medida de coação de prisão preventiva que lhe foi aplicada [tendo, no primeiro se insurgido contra a medida de coação da prisão preventiva que lhe foi aplicada em sede de primeiro interrogatório judicial, recurso que veio a ser julgado improcedente, e neste insurge-se contra a decisão que indeferiu a requerida alteração da referida medida de coação], importa trazer à colação o disposto no artigo 212.º, do Código de Processo Penal, sob a epígrafe “revogação e substituição das medidas”, de onde decorre, no que aqui importa tendo em conta o requerimento formulado pelo arguido de alteração de medida de coação, que: “1- As medidas de coacção são imediatamente revogadas, por despacho do juiz, sempre que se verificar: a)- (…); ou b)- Terem deixado de subsistir as circunstâncias que justificaram a sua aplicação. (…) 3- Quando se verificar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação de uma medida de coacção, o juiz substitui-a por outra menos grave ou determina uma forma menos gravosa da sua execução. (…)”. Cumpre, ainda, ter em atenção que para que possa haver lugar à alteração da medida coativa imposta ao arguido, o pedido para a sua substituição por medida de coação menos grave terá de radicar numa concreta verificação de uma atenuação das exigências cautelares, o que significa que só poderá haver lugar a eventual deferimento desse pedido, caso ocorram circunstâncias posteriores/ou de conhecimento posterior, que não tenham sido ponderadas no momento em que foi proferida a decisão quanto à imposição da medida coativa inicial. Com efeito, embora não se esqueça que a medida coativa de prisão preventiva não pode ser entendida como absolutamente definitiva [no sentido de, transitado em julgado o despacho que a decretou, jamais poder ser alterada], pois a lei prevê e permite a sua reapreciação, alteração, extinção e até revogação, a verdade é que, fora das circunstâncias expressamente previstas na lei [designadamente no artigo 212.º do Código de Processo Penal], tal decisão não pode ser alterada, nem modificada, se se mantiverem inalterados os pressupostos da sua aplicação. Efetivamente, as medidas de coação, entre elas a prisão preventiva, estão sujeitas à condição rebus sic stantibus [ou caso julgado rebus sic stantibus].[3] Isso significa que, durante o período de vigência legalmente estabelecido, apenas quando constatada uma modificação das circunstâncias que determinaram a sua aplicação, a medida poderá e deverá ser alterada, mas só perante uma modificação das circunstâncias se pode revogar ou substituir a medida de coação aplicada [cfr. artigos 212.º e 213.º, n.º 1, do Código de Processo Penal], sob pena de, fazendo-o, provocar a instabilidade jurídica que advém de julgados contraditórios, que abalam os valores de certeza ou segurança jurídica que estão na base do caso julgado. Importa, pois, averiguar se, e em que medida, ocorreu modificação das circunstâncias, o que, obviamente, nos remete, desde logo, para uma indagação sobre as razões alegadas pelo recorrente. Cumpre, então, averiguar se o que o arguido invoca é de molde a poder considerar-se que se verificou uma atenuação das exigências cautelares quanto aos perigos concretos constantes no despacho inicial de imposição da medida coativa. Essa aferição far-se-á atendendo aos concretos perigos elencados, que no caso são os perigos de fuga e de continuação da atividade criminosa. In casu,caberá, desde já, realçar que as circunstâncias que o arguido invoca, com vista a ver alterada a medida de coação que lhe foi aplicada, já foram anteriormente por si suscitadas e apreciadas no sentido da sua improcedência, em sede do recurso que interpôs relativamente à aplicação da medida de coação de prisão preventiva, em cuja decisão este TRL refere, designadamente, que: “(…) Invoca o recorrente que os dados relativos às localizações celulares e, bem assim, as informações obtidas através de intromissão no sistema de comunicação SKY ECC são provas proibidas, pelo que não podem ser consideradas, e que não existe nos autos matéria de facto que autorize o Tribunal a quo a dar como indiciados a prática pelo arguido dos crimes de tráfico de estupefacientes agravado e de associação criminosa. Contudo, diz ainda o recorrente que, caso assim não se entenda, não se verifica o perigo de fuga e o perigo de continuação da actividade criminosa e assim sendo a medida de coacção de prisão preventiva que lhe foi aplicada deve ser substituída por outra menos gravosa, nomeadamente por apresentações periódicas ou obrigação de permanência na habitação. (…) Resulta do exame dos autos, designadamente dos autos de interrogatório do arguido GS [transcrito a fls. 2179/2310, Vol. VII] e, bem assim, da análise do telemóvel deste [cf. auto de visionamento, a fls. 1515/1516, Vol. V], conjugado com as declarações prestadas pelo mesmo, que quem esteve envolvido no transporte de cocaína apreendido nos autos foram os arguidos LF, JC e RO, este último o ora recorrente. Assim, na sequência daquelas declarações, com vista a apurar a localização dos referidos indivíduos, no caso, o arguido RO, o Ministério Público, em 21.04.2022, promoveu, por considerar indispensável ao prosseguimento da investigação, ao abrigo do disposto no artigo 187º e 189º, nºs. 1 e 2 do Código de Processo Penal, que se solicitasse junto da operadora MEO os dados de tráfego dos números usados pelos suspeitos, com incidência na localização celular dos mesmos, entre o dia 1 de Janeiro de 2022 a 14 de Fevereiro de 2022 [cf. fls. 1567 Vol. VI], o que foi deferido por despacho do JIC, ao abrigo do disposto nos citados artigos 187º e 189º, nº2 [cf. fls. 1569 Vol. VI], tendo sido ordenado a sua junção ao autos, encontrando-se os referidos dados a fls. 1620 a 1629. Ora, ao contrário do afirmado pelo recorrente, tais provas não são proibidas. (…) No caso em apreço foi considerado indispensável para o prosseguimento da investigação a necessidade de proceder à recolha de prova em suporte electrónico [o que é legalmente admissível ao abrigo do disposto no artigo 11º, nº1, alínea c) da Lei nº 109/2009], conforme se alcança da promoção do Ministério Público e do despacho do Juiz de Instrução Criminal, proferidos nos autos [cf. fls. 1567 e 1569, Vol. VI] . Deste modo, impõe-se, assim, concluir que, no caso, é legal a obtenção dos dados de tráfego e de localização celular do arguido [contantes de fls. 1620 a 1629], conservados pela operadora, solicitados e disponibilizados pela mesma dentro do prazo de seis meses previstos na citada Lei nº 41/2004, tal como a valoração nos autos de tais provas indiciárias obtidas através de metadados. Do exposto decorre que o “Auto de Localização Celular” de fls. 1835 a 1844, no qual o Tribunal a quo se estribou para sustentar a decisão recorrida não constitui prova proibida. (…) Considera ainda o arguido que as informações recolhidas através da entrada nos servidores de comunicações SKI ECC são ilegais e abusivas, por não terem sido precedidas de qualquer autorização judicial. Alega o arguido, além do mais, “com referência ao Nuipc 601/21.3JAPRT, refere o OPC e resulta dos autos que os factos aí indiciados tiveram origem em informações obtidas através de intromissão no sistema de comunicação SKY ECC.” – cf. Ponto VIII das conclusões de recurso, e; Além disso, que as “informações obtidas no referido sistema pelas Autoridades Francesas, como foi amplamente divulgado, foram-no fora do quadro legal. O acesso ao referido servidor foi efetuado através de pirataria, "hacking", sem qualquer autorização judicial. – cf. Ponto IX das conclusões de recurso; (…) As informações recolhidas foram sendo passadas de entre os estados membros da EU sem que ninguém se preocupasse em saber se os referidos dados são fiáveis.” – cf. Ponto X das conclusões de recurso. Entende, assim, o recorrente que, “como resulta do citado Acórdão nº 268/2022 do TC, devem ser consideradas provas proibidas o Apenso B- Dei III- SkY ECC.” (…) Em conclusão os documentos em causa, no qual o Tribunal a quo se baseou para sustentar a decisão recorrida, não constituem prova proibida. Porém, sempre se dirá que, ainda que assim não entendesse, só por si o conjunto de elementos probatórios juntos aos autos, com exclusão daqueles dados relativos às localizações celulares, é fortemente indiciadora da prática pelo arguido dos crimes investigados. (…) Da análise da prova junta aos autos e mencionada na acta do primeiro interrogatório judicial de arguido detido, na sequência da qual se veio a aplicar ao arguido a medida de coacção de prisão preventiva, só se pode chegar à conclusão a que chegou o Tribunal a quo no sentido de que os autos indiciam que o recorrente lidera desde 2019 uma Organização Criminosa, com carácter Transnacional, dedicada à introdução de grandes quantidades de produto estupefaciente em território Nacional, oriundo da América do Sul, com ramificações importantes em diferentes estruturas logísticas do nosso País, nomeadamente junto de Portos Marítimos (Setúbal e Leixões), Aeroporto Humberto Delgado, Mercado Abastecedor da Região de Lisboa (MARL), entre outras, permitindo assim utilizar a sua influência para importar grandes quantidades de produto estupefaciente fora da fiscalização das autoridades responsáveis. E foi “na prossecução dos objectivos da organização que os arguidos em comunhão de esforços e repartindo tarefas entre si procediam à importação de frutas e outros bens alimentares e não alimentares, fazendo uso de contentores ou malas de viagem para transportar a cocaína aí dissimulada, desde o Brasil até Portugal.” Recorriam igualmente ao esquema Rip On/Rip off (um modus operandi que se caracteriza pela introdução de produto estupefaciente dentro de contentores pela Organização criminosa responsável pela venda do produto e a retirada do mesmo no destino pela Organização criminosa que o adquiriu, sem conhecimento do proprietário da carga ou do contentor durante todo o trajecto).” (…) Por conseguinte, resulta evidente a ligação do arguido aos restantes arguidos e suspeitos, o papel de liderança que o mesmo desempenhava na organização, no transporte de cocaína, no controlo das operações de descarregamento, sendo patente que o dinheiro que sustenta o arguido e a sua família provêm, essencial e maioritariamente, da actividade ilícita levada a cabo pelo mesmo. Assim, em face do acervo probatório disponível nos autos, não vemos razões para discordar da avaliação das circunstâncias apuradas pelo Tribunal a quo e, deste modo, é de concluir pela forte indiciação da prática pelo arguido (em conjugação de esforços e intentos com outros indivíduos) dos crimes de tráfico de estupefacientes agravado e de associação criminosa. (…) Preenchido o pressuposto específico do artigo 202º, do Código de Processo Penal, vejamos agora os pressupostos constantes do artigo 204º do mesmo diploma legal, em que se fundou o Tribunal a quo para justificar a prisão preventiva do recorrente (que considerou verificado o perigo de fuga, o perigo de continuação da actividade criminosa e o perigo grave de perturbação da ordem e tranquilidade públicas contemplados nas alíneas a) e c) do preceito citado). (…) Como se enfatizou na decisão recorrida, existe claro perigo de fuga e de continuação da actividade criminosa e, ainda, de perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas. Desde logo, os elementos probatórios constantes dos autos, conjugados com as mais elementares regras da experiência comum, dizem-nos que a partir do momento em que o arguido tem conhecimento da pendência destes autos contra si e das consequências criminais que lhes poderão advir, considerando ademais as facilidades como se movimenta nos Portos Marítimos de Setúbal e Leixões e no Aeroporto de Lisboa e, outrossim, a rede de contactos que possui em Portugal e no estrangeiro, bem como a sua disponibilidade económica proveniente da actividade lucrativa do tráfico, vislumbra-se um perigo sério de fuga, uma vez que o arguido prevendo que lhes seja aplicada uma pena de prisão, o mais normal será colocar-se em fuga e longe do alcance da justiça como forma de não cumprir a mesma [com relevo para esta matéria são preponderantes os factos indicados descritos sob os nºs 82 a 86]. Importa atentar no método e sofisticação utilizado pelo arguido, o que revela um desígnio criminoso elaborado, associado ao transporte internacional de grandes quantidades de produto estupefaciente, conjuntamente com outros indivíduos, constituindo os proventos relacionados com a transacção de droga um incentivo acrescido para que o mesmo continue a dedicar-se a semelhante actividade como forma de angariação de rendimentos, o que é por si, também, um incentivo adicional para a continuidade dessa prática criminosa, que o arguido não deixará de prosseguir se não for sujeito à adequada medida de coacção. Na verdade, a decisão recorrida ao fundamentar a medida de coacção de prisão preventiva apenas no perigo de fuga, no perigo de continuação da actividade criminosa e de perturbação da ordem e tranquilidade públicas, ficou aquém de todos os perigos que se podiam, eventualmente, antever. Com efeito, sopesando os factos na sua globalidade, bem como a personalidade manifestada pelo arguido na sua perpetração, seria de vislumbrar como altamente provável que o mesmo, tentasse perturbar o normal decurso da investigação, mormente a aquisição da demais prova, nomeadamente sendo provável que o arguido em liberdade, conhecedor da identidade de outros indivíduos envolvidos no transporte de estupefacientes, pudesse transmitir a estes dados do processo ou até obstar à identificação de outros suspeitos. De qualquer modo, conclui-se existir, em concreto, perigo de fuga e perigo de continuação da actividade criminosa e, bem assim, perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas. Finalmente, uma nota, ainda, acerca do pressuposto consubstanciado no “perigo de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas”. Este pressuposto, ainda que despido do “cunho estritamente objectivo” que decorria da anterior redacção deste segmento normativo da alínea c) do artigo 204º do Código de Processo Penal, deve ser relacionado com o direito à liberdade e à segurança, instituído pelo artigo 5º da CEDH, mas não apenas na perspectiva do arguido, antes também na dos cidadãos que possam ser potenciais vítimas da conduta criminosa praticada por aquele e que se encontra indiciada. Daí que este pressuposto se revele na função preventiva do processo penal face à perigosidade social revelada pelo arguido, seja mediante um controlo cautelar e pré-punitivo (medidas de coacção), seja de contenção do conflito social provocado pela correspondente conduta delituosa. Necessidade de contenção que surge evidente no caso concreto, perante a natureza e gravidade dos crimes fortemente indiciados (tráfico de estupefacientes agravado, associado ao transporte internacional de grandes quantidades de produto, associação criminosa, conjuntamente com outros indivíduos), que afectam profundamente o sentimento de segurança dos cidadãos. A gravidade objectiva dos crimes que vem indiciados e a previsibilidade de condenação em pena de prisão efectiva justificam, do ponto de vista da proporcionalidade, a imposição da prisão preventiva como medida coactiva ao arguido. Por outro lado, tal como considerou a decisão recorrida, nenhuma outra medida de coacção não privativa da liberdade se afigura suficiente para afastar os aludidos perigos, pois não seriam aptas para impedir ou prevenir que o recorrente se ausentasse da sua residência, dificultando ou impossibilitando a acção da justiça. Com efeito, a medida de coacção de permanência na habitação, com vigilância electrónica, não impediria a fuga do arguido, apenas a assinalava, sendo por isso inadequada aos mencionados perigos, sendo certo que as circunstâncias concretamente indiciadas nos autos revelam que tal medida também não seria adequada a acautelar o receio do perigo de continuação da actividade criminosa. Por fim, alega o recorrente que “ estando em causa a mesma indiciação, se para o arguido LF o tribunal considerou que os perigos inerentes aos crimes pelos quais se encontrava indiciado poderiam ser acautelados com a medida de coação de apresentações periódicas, não se compreende, porque em relação ao Recorrente o mesmo entendimento não foi sufragado.” Porém, mais uma vez, sem qualquer razão. Com efeito, os factos imputados ao arguido LF são substancialmente diferentes dos imputados ao ora recorrente, razão pela qual as exigências cautelares verificadas são, também, diversas. Em conclusão, o despacho recorrido mostra-se fundamentado e encontram-se preenchidos os pressupostos, quer os de carácter geral quer os de carácter específico, legalmente exigidos para que ao arguido recorrente pudesse ser aplicada a medida de coacção de prisão preventiva, medida essa que, de entre o elenco das medidas de coacção que a lei prevê, é a única que, por ora, se mostra capaz de satisfazer de forma adequada e suficiente as exigências cautelares que o caso requer, pelo que o despacho impugnado não violou qualquer normativo legal ou constitucional, designadamente o artigo 32º da Constituição da República Portuguesa, nem os artigos 191º, nº 1, 193º, 202º e 204º, todos do Código de Processo Penal, nem os princípios da proporcionalidade, adequação e subsidiariedade. Improcede integralmente o recurso, mantendo-se o recorrente em prisão preventiva.”. [sublinhado nosso]. Como já foi apreciado e decidido neste mesmo TRL, in casu encontram-se verificados todos os pressupostos legais, que levaram à aplicação ao arguido da medida de coação de prisão preventiva, em sede de primeiro interrogatório judicial, pressupostos esses que ainda se mantêm. O princípio da excecionalidade da prisão preventiva, em função de outras medidas não detentivas, como o sejam, nomeadamente, a obrigação de apresentações periódicas, a caução, a entrega de passaporte, e mesmo a obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica, é por demais evidente que não foi violado, pois, como já se pronunciou este TRL, in casu essas medidas menos restritivas não são suficientes para acautelarem os perigos enunciados. As questões levantadas relativamente à falta de indícios da factualidade que levou a sustentar a aplicação ao arguido da medida de coação de prisão preventiva, o alegado uso de provas proibidas e a alegada violação do principio da proporcionalidade, necessidade e adequação da medida de coação aplicada, já foram invocadas em sede do recurso que o arguido interpôs relativamente àquela decisão e apreciadas, no âmbito da referida decisão proferida por este TRL a 06-12-2022. Quanto às demais razões invocadas pelo recorrente, designadamente respeitante ao invocado perigo de continuação de atividade criminosa e de fuga, somos, igualmente, remetidos para circunstancialismo que já se verificava ab initio, que foi ponderado na adoção do regime coativo vigente, não tendo o arguido trazido aos autos qualquer elemento novo suscetível de os contrariar. Na verdade, argumenta o recorrente, com vista à alteração da medida de coação de prisão preventiva que lhe foi aplicada, que se alteraram as circunstâncias que motivam a alteração da medida de coação, invocando a questão de o Ministério Público ter, entretanto, apurado, a existência de rendimentos lícitos no valor global de €678.496,22, o que revela uma realidade distinta daquela que foi apresentada pelo Ministério Público à Mm.ª JIC aquando dessa diligência. Porém, ao contrário do sustentado pelo recorrente, tais factos não consubstanciam alterações das circunstâncias que motivem a alteração da medida de coação que lhe foi aplicada e, muito menos, consubstanciam uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação da referida medida de coação. Com efeito, a este propósito, argumenta o recorrente que o fundamento invocado pelo Tribunal a quo para o perigo de continuação da atividade criminosa, que seria a necessidade de obtenção de dinheiro ilícito para fazer face às suas despesas, afinal, não se verifica, uma vez que, entretanto, após o primeiro interrogatório judicial, no âmbito de arresto preventivo intentado, os rendimentos do arguido foram objeto de análise pelo Ministério Público e este apurou que “Durante os cinco anos que antecederam a sua constituição como arguido em 24/06/2022, e até à presente data o arguido auferiu rendimentos lícitos no valor global de 678.496,22€”. Porém, sem razão. Na verdade, com o requerimento de alteração da medida de coação juntou o recorrente prova documental da citada peça processual da qual decorre tal factualidade [que:“Durante os cinco anos que antecederam a sua constituição como arguido em 24/06/2022, e até à presente data o arguido auferiu rendimentos lícitos no valor global de 678.496,22€”.], mas esquece-se o recorrente de dizer que da mesma peça processual por si invocada também decorre que: “O arguido possui (…) um património incongruente, tal como considerado no artigo 7.º, n.º1 da Lei 5/2002, no valor de 1 041 845,66€, que não é compatível com os seus rendimentos lícitos e fiscalmente comprovados (…)”, ou seja, resulta, igualmente, indiciado nos autos que o arguido possui rendimentos avultados obtidos de forma ilícita, pelo que o perigo da continuação da atividade criminosa não se encontra esbatido, até porque, diga-se, a necessidade de obter dinheiro ilícito para fazer face às suas despesas, não deixa de se verificar, com vista a sustentar, como o refere a Mm.ª Juíza a quo, as despesas do arguido e respetiva família, que não se prendem, necessariamente, com as despesas do dia a dia, mas sim as decorrentes do estilo de vida já alcançado. Acresce que, ao contrário do sustentado pelo recorrente, um dos principais motivos que esteve na origem da colocação do recorrente em prisão preventiva não foi a alegada falta de atividade profissional e obtenção de rendimentos lícitos, pois a Mm.ª Juíza a quo já teve em atenção que o arguido possuía atividade profissional e obtinha rendimentos de forma lícita, como decorre dos trechos da referida decisão trazidos à colação pelo próprio recorrente [“Os Arguidos dedicam-se única e exclusivamente ao tráfico de estupefacientes, tendo sido a empresa constituída com o propósito de introduzir cocaína em Portugal. O dinheiro que sustenta os Arguidos e respetivas famílias provém essencial e maioritariamente da atividade ilícita...” [sublinhado nosso]. Mais defende o arguido a inexistência de qualquer perigo de fuga, juntando prova documental com vista a confirmar que a viagem que efetuou no dia 16-02-2022 não se tratou de qualquer “fuga”, na sequência da apreensão do produto estupefaciente ocorrida a 14-02-2022, pois tal viagem já se encontrava agendada e reservada desde o dia 11-02-2022, mais trazendo à colação uma série de argumentos sobre os quais aqui nos escusamos de discorrer, de reapreciar, pois que já os invocou e já foram apreciados pelo tribunal na sequência da aplicação da medida de coação de prisão preventiva a que se viu sujeito em sede de interrogatório judicial, não se tratando, portanto, de qualquer facto novo, que não tenha sido tido em atenção pelo tribunal. No que respeita à sua vivência no Estabelecimento Prisional e às consequências daí decorrentes para si e seus familiares, como é consabido, não se trata de factualidade suscetível de fundamentar a alteração da medida de coação aplicada ao recorrente, pelo que nos dispensamos de tecer quaisquer outros considerandos a esse respeito. No que se refere à comparação que o arguido faz do seu estatuto coativo relativamente às medidas de coação menos gravosas aplicadas a outros co arguidos, cumpre dizer que a indiciação da mesma tipologia criminal não implica, necessariamente, o mesmo estatuto coativo, bastando, para tanto, atentar que o grau de culpabilidade, de ilicitude e as necessidades cautelares podem ser diferentes, como o são no caso dos autos, em que, indiciariamente, todos os arguidos encontram-se integrados numa estrutura vertical, encabeçada em território nacional precisamente pelo arguido/recorrente. Ou seja, a pretensão que o arguido quer alcançar nesta sede recursiva prende-se, essencialmente, com argumentos por si apresentados e já escrutinados, analisados e rebatidos em anteriores decisões, o que não importa uma alteração das circunstâncias já apreciadas, capaz de consentir uma alteração do estatuto coativo do arguido. Os factos indiciariamente imputados ao arguido, tal como os riscos invocados na sustentação da decisão que lhe aplicou a medida de coação de prisão preventiva, tal como foram analisados em sede recursiva supra transcrita, não desapareceram. Aqui chegados, face aos considerandos supra expostos, analisados os argumentos expendidos pelo arguido, designadamente ao que o mesmo intitula de “alteração das circunstâncias que motivam a alteração da medidas de coação aplicadas ao arguido”, apenas uma conclusão se pode retirar: não trouxe o arguido aos autos, nem o tribunal teve conhecimento por qualquer outra via, de qualquer facto novo suscetível de integrar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação da medida de coação de prisão preventiva. As razões invocadas pelo recorrente conduz-nos para o circunstancialismo que já se verificava ab initio, que foi ponderado na adoção do regime coativo vigente e na decisão que manteve a medida de coação de prisão preventiva, aquando do recurso interposto pelo arguido e que deixamos transcrita. Bastará analisar essas decisões, para se concluir que estamos perante circunstâncias já foram devidamente ponderadas e apreciadas, designadamente em sede recursiva. O único facto que se poderá rotular de “elemento novo”, trazido aos autos após a prolação da decisão de aplicação ao arguido da medida de coação de prisão preventiva, será o apuramento do montante do rendimento lícito obtido pelo arguido, mas a este contrapõe-se o, também agora, apurado rendimento obtido de forma ilícita, num valor de mais de um milhão de euros. Aqui chegados, forçoso será de concluir, como o refere a Mm.ª Juíza a quo no despacho recorrido, que “desde a data em que foi determinada a prisão preventiva do arguido não houve qualquer alteração às circunstâncias de facto e/ou às razões de direito que determinaram a aplicação de tal medida de coação. Com efeito, o arguido continua fortemente indiciado da prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado e de um crime de associação criminosa, p. e p., respectivamente, pelos art. 21º, n.º 1, 24º, al. b) e c) e 28º, n.º 1 e 3 do D.L. n.º 15/93, de 22/1 e mantêm-se, com a mesma acuidade, os perigos mencionados no despacho que determinou a aplicação da prisão preventiva”. Uma última palavra para dizer que como é consabido, estamos numa fase indiciária, competindo decidir sobre o despacho recorrido, sendo que se, designadamente, por via da investigação, quando a indiciação ou as exigências cautelares se alterarem, o tribunal, oficiosamente ou mediante requerimento, não deixará de apreciar a questão. Invoca, en passant, o recorrente, ao finalizar os argumentos recursivos, que ao decidir como decidiu, não procedendo a uma alteração das medidas de coação, o Tribunal a quo violou os artigos 213.º, n.º4 e 379.º, n.º1, al. c), ambos do Código de Processo Penal. Ora, diga-se, desde já, que se desconhece em que se baseia o recorrente para invocar tais normas legais, pois que nada alega nesse sentido. De qualquer forma: O invocado artigo 213.º, n.º4, do Código de Processo Penal dispõe que: “4- A fim de fundamentar as decisões sobre a manutenção, substituição ou revogação da prisão preventiva ou da obrigação de permanência na habitação, o juiz, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do arguido, pode solicitar a elaboração de perícia sobre a personalidade e de relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social, desde que o arguido consinta na sua realização.”. Analisado o requerimento formulado pelo recorrente, com vista a ver alterada a sua medida de coação, verifica-se que este ali requer a realização do relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social, para apurar se reúne as condições para cumprimento da medida de coação de obrigação de permanência na habitação. No que respeita ao invocado relatório social que o arguido pretendia ver elaborado, cumpre dizer que a Mm.ª Juíza a quo não fez qualquer referência ao mesmo, no entanto, não se pode esquecer que a necessidade da sua prévia elaboração só se justificaria se fosse adequada, proporcional e suficiente a aplicação ao arguido da medida de coação de OPHVE, o que, como vimos, não é o caso, e, além disso, trata-se de uma faculdade [diz a lei: “pode”] e não de uma imposição ao julgador, já para não falar que o sentido da informação que pudesse obter não se reporta aos pressupostos da aplicação da medida de coação de OPHVE, que estão definidos no Código de Processo Penal, mas antes e apenas a apurar se a situação pessoal, familiar, laboral e social do arguido é compatível com as exigências da vigilância eletrónica e os sistemas tecnológicos a utilizar [artigo 7.º, n.º2, da Lei 33/2010, de 02 de Setembro - MEIOS TÉCNICOS DE CONTROLO À DISTÂNCIA - VIGILÂNCIA ELECTRÓNICA], o que são realidades bem distintas. Relativamente à invocada violação do artigo 379.º, n.º1, al. c), do Código de Processo Penal cumpre dizer o seguinte: Do mencionado preceito legal, no que aqui releva, sob a epígrafe, “Nulidade da sentença” decorre que: “1- É nula a sentença: (…) c)- Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. (…)” Ora, in casu, o recorrente limita-se a invocar a violação da mencionada disposição legal, sem indicar qualquer questão sobre a qual, no seu entendimento, o tribunal a quo devia ter-se pronunciado e não o fez ou que tenha conhecido e não podia tomar conhecimento, pelo que, perante tal realidade, encontra-se este Tribunal ad quem impossibilitado de tomar posição quanto a eventual invocada nulidade. Improcede, pois, o recurso interposto pelo recorrente. » III–DISPOSITIVO Pelo exposto, acordam os juízes da 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recursointerposto pelo arguido RO e, consequentemente, mantem-se a medida de coação de prisão preventiva que lhe foi aplicada. Custas pelo recorrente, fixando a taxa de justiça em 3 UCS [artigo 515º, nº 1, al. b) do Código de Processo Penal e artigo 8º, nº 9, do RCP, com referência à Tabela III], sem prejuízo de se verificar o pressuposto a que alude a alínea j), do n.º1, do artigo 4.º, do Regulamento das Custas Processuais. Comunique-se, de imediato, à 1.ª instância, com cópia. » Lisboa, 26 de abril de 2023 [Elaborado e revisto pela relatora - artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal] Os Juízes Desembargadores Isilda Maria Correia de Pinho Luís Almeida Gominho Jorge Gonçalves [1]Indicam-se, a título de exemplo, os Acórdãos do STJ, de 15/04/2010 e 19/05/2010 in http://www.dgsi.pt, [2]Conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada no Acórdão do STJ n.º 7/95, de 28 de dezembro, do STJ, in DR, I Série-A, de 28/12/95. [3]Como refere Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código de Processo Penal, pág. 587. |