Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JOÃO ABRUNHOSA | ||
Descritores: | CRIME DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CORRECÇÃO DO ACORDÃO PEDIDO DE INDEMNIZAÇÃO CIVIL | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 11/11/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
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Sumário: | I–De harmonia com o disposto no artigo 82º-A, nº 1 do Código de Processo Penal,não tendo sido deduzido pedido de indemnização civil no processo penal ou em separado, nos termos dos artigos 72º e 77º, o tribunal, em caso de condenação, pode arbitrar uma quantia a título de reparação pelos prejuízos sofridos quando particulares exigências de protecção da vítima o imponham, mas considerando que nos presentes autos se mostra formulado pedido de indemnização civil, haverá, lugar à apreciação deste e não ao arbitramento de indemnização nos termos das disposições acima mencionadas; II–Quanto ao montante da indemnização, pese embora os tribunais de recurso possam alterar o valor do dano fixado com recurso a critérios de equidade, só o devem fazer quando o tribunal recorrido afronte, manifestamente, as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida, coisa que não sucedeu no caso “sub judice”. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: No Juízo Local Criminal de Lisboa, por sentença de 15/06/2021, constante de fls. 577/630, foi o Arg.[1] AA, com os restantes sinais dos autos (cf. ), condenado nos seguintes termos: “… Pelo exposto, decide-se julgar a acusação procedente por provada e, em consequência: a)-Condenar o arguido AA pela prática como autor material de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152º, nº 1, ais b) e nº2, al. a) do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão suspensa na sua execução por 3 (três) anos com regime de prova e na pena acessória de proibição de contactos com BB por três anos, incluindo afastamento da residência e local de trabalho devendo o seu cumprimento ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância, e na obrigação de frequência de programa específico de prevenção da violência doméstica; b)-Condenar o arguido no pagamento das custas do processo, fixando a taxa de justiça em 3 (três) Ucs, nos termos do Regulamento das Custas Processuais; c)-Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela assistente BB e, em consequência, condena-se o arguido/demandado no pagamento à mesma da quantia de €10.000,00 (dez mil euros) acrescida de juros vincendos à taxa legal até integral pagamento a título de indeminização por danos não patrimoniais, improcedendo o restante peticionado; d)-Custas da parte cível pelo arguido/demandado e assistente/demandante segundo o decaimento sendo de 85% o primeiro e 15% a assistente. …”. ***** Não se conformando, o Arg., interpôs recurso da referida decisão, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 643/647, com as seguintes conclusões: “… 1.–Da leitura da decisão, nomeadamente do ponto 1 dos factos julgados não provados, resulta a inelegibilidade do ponto 1 julgado não provado. 2.–Não sendo perceptível para o Recorrente o alcance do facto julgado não provado. 3.–Da leitura atenta da Decisão ora recorrida, resulta que relativamente ao pedido de indemnização cível formulado pela Assistente nos autos, o tribunal a quo refere não proceder ao arbitramento de indemnização nos termos dispostos no artigo 21º nº1 e nº2 da Lei nº122/2009 de 16 de Setembro, atendendo ao facto de a Assistente ter formulado pedido de indemnização civil, referindo o facto de ter de haver lugar à apreciação deste e não ao arbitramento de indemnização nos termos das disposições legais referidas. 4.– Ora, o tribunal a quo na sede que ora se pugna, além de remeter a decisão sobre a indemnização de pedido cível para o pedido formulado pela Assistente, não observou o disposto no nº3 do artigo 494º que refere o facto de “o montante da indemnização (por danos não patrimoniais) será fixado equitativamente pelo tribunal, (…). 5.– Ora, a indemnização cível ora recorrida, além de bastante excessiva perante os factos julgados provados pelo tribunal a quo, cujo texto da decisão enuncia em termos genéricos, não especificando em concreto quais os factos que pretende demonstrar o nexo de causalidade entre a conduta do arguido e o dano infligido à Assistente, não é equitativa. 6.– Pese embora o supra referenciado, cabe observar o facto de apesar de terem sido julgados provados, os factos constantes nos pontos 22, 23 e 26 consubstanciarem factos que não poderão, segundo as regras da experiência comum e segundo o ponto de vista de um homem de formação média, ser factos que revelem ou ressumam o grau de culpabilidade do agente, neste caso do Recorrente. 7.–Ora, os factos supra referenciados, e que terão sido relevantes para a decisão ora recorrida, atendendo ao facto de o texto da mesma remeter para os factos julgados na sua globalidade, além de provar o facto de a Assistente não ter sofrido qualquer incapacidade para o trabalho, não demonstra a razão de a vida profissional ter ficado gravemente prejudicada, não podendo ser imputada ao Recorrente qualquer culpa relativamente ao horário de trabalho da Assistente, muito menos e de outra forma não se compreenderia, do horário em que a mesma se levanta diariamente. 8.–Ora, a apreciação dos factos em questão e a sua subsunção à fundamentação de direito para a procedência de um pedido cível, extremamente excessivo e desproporcional, subsumem-se ao vício de erro notório na apreciação da prova. 9.–Ainda que assim não se entenda, O montante da indemnização julgada nos presentes autos, não observa o princípio da equidade nem o da proporcionalidade, não tendo observado, a título de exemplo e além do já referenciado em termos de nexo de causalidade, apesar de ter julgado provado o facto de o Recorrente auferir mensalmente €645,00 (seiscentos e quarenta e cinco euros) da sua atividade profissional de assistente operacional da Câmara Municipal de Lisboa. 10.–Ora, o que o tribunal a quo produziu com a decisão que ora se impugna, além de se ter cingido ao pedido formulado pela Assistente sem obediência a critérios de causalidade, equidade e proporcionalidade por não ter referenciado em sede de fundamentação e por não se poder retirar da leitura atenta da decisão globalmente considerada, foi, sem mais, proporcionar o empobrecimento drástico e repentino do Recorrente assim como o enriquecimento da Assistente, sem qualquer justificação. 11.–Neste modos pugna-se a decisão ora Recorrida, devendo os presentes autos ser remetidos ao tribunal de primeira instância, revogando-se a decisão proferida, para efeitos de alteração do ponto 1 dos factos não provados por ininteligível assim como para alteração do valor da indemnização cujo valor, atendendo ao princípio da equidade, proporcionalidade e aos critérios estabelecidos no artigo 494º do Código civil, não poderá ser superior a €1.000,00 (mil euros). …”. ***** O Exm.º Magistrado do MP[2] respondeu ao recurso, a fls. 661/664, para além do mais, da seguinte forma: “… 1)–A invocada ininteligibilidade do ponto 1 dos Factos Não Provados da matéria de facto da sentença corresponde a manifesto lapso de escrita, que não importa modificação essencial e é passível de correção nos termos do art.º 380º/1-b) e 2 do CPP. 2)– certo que, na matéria de facto dada como não provada, sob 2 – Factos Não Provados, escreveu a sentença, “Não se provou que: 1) - O arguido e a ofendida BB até ao ano de 2015, altura em que se separaram.”, asserção que, sem mais, resulta evidentemente desconexa, do ponto de vista intrínseco e em termos semânticos. 3)–Não tanto quando confrontada ao teor da matéria de facto dada como provada, onde na Fundamentação de facto da sentença, quanto aos Factos Provados, se constata ter sido asseverado que resultaram provados os seguintes factos com pertinência para a decisão: “o arguido e a ofendida BB viveram, em comunhão de mesa e cama, na Rua …………. (e não ……….. como por lapso de escrita consta do despacho de acusação), em Lisboa, entre o ano de 2000 até 2010.” 4)–Perfilando-se por aí o erro de escrita na sentença, quando no mencionado ponto da matéria de facto dada como não provada, não verteu tudo o que manifestamente pretendeu verter, ou seja, dizer pela negativa, que “1) o arguido e a ofendida BB viveram em comunhão até ao ano de 2015, altura em que se separaram.” 5)–Também o confronto à correspondente negação da matéria de facto veiculada na acusação aponta no mesmo sentido, pois aí se veiculara em termos indiciários que: 6)–“1) O arguido e a ofendida BB viveram, em comunhão de mesa e cama, na Rua …………….. Lisboa, entre o ano de 2000 e 2015, altura em que se separaram. 2) A ofendida e o arguido têm um filho em comum, CC, nascido a …………. 3) O menor CC, devido ao ambiente hostil e de violência doméstica no seio familiar, foi retirado aos progenitores em 2015, ficando sob a tutela do pai da ofendida. 4) 4. Em 2017 o menor foi residir com a ofendida e o arguido prometeu mudar, tendo ambos reatado a relação, voltando a viver maritalmente, na residência sita na …………………………, em Lisboa. 7)–A leitura da fundamentação da decisão da matéria de facto operada na sentença (na parte final da pág. 28 e na parte inicial da pág 29 das 54 páginas) corrobora o exposto, no tocante ao crivo de convicção do tribunal quanto à matéria de facto não firmada, por falta de prova relativamente à intermitência dos períodos de coabitação/convívio entre o arguido e a ofendida. 8)– A Lei 112/2009, de 16-09, por via do art.º 21º/1 e 2, reconhece à vítima o direito a obter uma decisão de indemnização (em tempo razoável), no âmbito do processo penal, fazendo remissão ao art.º 82º-A do CPP para a correspondente concretização. 9)–Aderimos à argumentação do recorrente quanto a que na estipulação da indemnização cível o tribunal penal deva ater-se aos princípios da equidade e da proporcionalidade, na decorrência dos dispositivos legais aplicáveis, sobremaneira no momento em que aquela versa os danos morais (ou, não patrimoniais). 10)–Por isso mesmo, aliás, o Ministério Público ao deduzir a acusação suscitou o arbitramento da indemnização, também ao abrigo desses normativos. 11)–O arbitramento dessa indemnização tem natureza subsidiária, designadamente não sucedendo quando a vítima expressamente se opuser à sua fixação (art.º 21º/2 da Lei 112/2009). 12)–Cumprindo extrair então que, quando a vítima se interessa pelo processo a ponto de deduzir específico pedido de indemnização cível é a esse que o tribunal se deve ater, tendo em conta a quantificação aí operada e o especial interesse das partes diretamente envolvidas, em nome até do próprio princípio da adesão, conforme art.º 71º do CPP. …”. ***** Também a Assistente, AA, respondeu ao recurso, nos termos de fls. 666/671, concluindo da seguinte forma: “... a)- A ininteligibilidade do Ponto 1 da matéria não provada em nada prejudica a decisão recorrida; b)- A indemnização fixada não feriu nem a equidade nem a proporcionalidade À cautela, c)- O indeferimento da Acareação não violou nem o princípio da inocência do arguido nem o princípio da investigação, uma vez que o pedido da diligência foi formulado sem cuidar de concretizar onde residiriam as alegadas divergências, o que, desde logo, determinaria a ilegalidade da mesma, sendo que a acareação ilegal é um meio de prova proibido. d)- O requerido depoimento de DD por também ele, caso tivesse sido admitido, viria a ser considerado depoimento indirecto que em nada contribuiria para o apuramento da verdade material, pelo que bem andou o tribunal “a quo” ao indeferir a diligência solicitada, não havendo aqui qualquer violação do artigo 340.º do CPP, antes sendo o indeferimento determinado no exercício do poder de condução dos autos na fase do julgamento inerente ao magistrado em questão. Termos em que deve o Recurso ser julgado improcedente assim se fazendo a costumada serena, sã e objectiva JUSTIÇA! ...”. ***** Neste tribunal, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o parecer de fls. 693, em suma, subscrevendo a posição assumida pelo MP na 1ª instância de pugnando pela improcedência do recurso. ***** A Assistente respondeu ao parecer do MP, dando por reproduzida a sua resposta ao recurso.. ***** A sentença (ou acórdão) proferida em processo penal integra três partes distintas: o relatório, a fundamentação e o dispositivo. A fundamentação abrange a enumeração dos factos provados e não provados relevantes para a decisão e que o tribunal podia e devia investigar; expõe os motivos de facto e de direito que fundamentam a mesma decisão e indica, procedendo ao seu exame crítico e explanando o processo de formação da sua convicção, as provas que serviram para fundamentar a decisão do tribunal. Tais provas terão de ser produzidas de acordo com os princípios fundamentais aplicáveis, ou seja, os princípios da verdade material; da livre apreciação da prova e “in dubio pro reo”. Tendo a prova sido produzida em sede de audiência de julgamento, está ainda sujeita aos princípios da publicidade, da oralidade e da imediação. O tribunal recorrido fixou da seguinte forma a matéria de facto: “… 1-FACTOS PROVADOS Resultaram provados os seguintes factos com pertinência para a decisão: 1- O arguido e a ofendida BB viveram, em comunhão de mesa e cama, na Rua …………. (e não ………. como por lapso de escrita consta do despacho de causação), em Lisboa, entre o ano de 2000 até 2010; 2- A ofendida e o arguido têm um filho em comum, CC, nascido a ………….; 3-O menor CC, devido ao ambiente hostil e de violência doméstica no seio familiar, foi retirado aos progenitores em 2015, ficando sob a tutela do pai da ofendida; 4-Em 2017 o menor foi residir com a ofendida e o arguido prometeu mudar, tendo ambos reatado a relação, voltando a viver maritalmente, na residência sita na …………………… em Lisboa; 5-A relação decorreu até Outubro de 2017, apenas com discussões frequentes - em outubro de 2018, a ofendida confrontou o arguido com o facto de este estar a ser infiel e a partir dessa altura o arguido deixou de ajudar a nível financeiro, deixando de ajudar a pagar um crédito que ambos tinham pedido no valor de €12.000,00 (doze mil euros); 6-O arguido chamava à ofendida "PUTA DE MERDA", "VAI PARA O CARALHO", "VAI-TE FODER", "FILHA DA PUTA» e dizia-lhe "TENS QUE SAIR DE CASA", "NÃO TE QUERO AQUI", "VAIS VIVER DE ESMOLA"; 7-De Dezembro de 2018 até Fevereiro de 2019, apesar de viverem na mesma casa, ambos deixaram de se falar; 8-Em Fevereiro de 2019, em data não concretamente apurada, o arguido por não concordar com um determinado comportamento da ofendida chamou-lhe "FILHA DA PUTA", "ÉS UMA GRANDE PUTA", "ENTREGASTE A TODOS OS HOMENS", "GRANDE VAGABUNDA" e, de seguida, agarrou a ofendida por um braço e expulsou-a de casa, só a deixando entrar à noite; 9-Entre Março e Abril de 2019, a ofendida e o arguido começaram a falar e a relacionar-se sexualmente, por mútuo consentimento; 10-No início de Maio de 2019, o arguido acordou sair de casa, que é propriedade da Gebalis, e assinou um documento para que a casa ficasse só em nome da ofendida, mas o tempo foi passando e o arguido não abandonava a habitação; 11-Em Julho de 2019, o arguido começou a importunar diariamente a ofendida, querendo manter relações sexuais todos os dias, e como a ofendida se negava, por não querer manter qualquer relação com o arguido, este dizia-lhe: "DÁME CONA", "DÁ-ME CONA", "DÁ-ME CONA", de forma repetitiva e insistente e, por vezes, agarrava-a para manter sexo, e esta para evitar conflitos cedia sempre e tinha relações contra sua vontade. Nessa altura, o arguido deixou também de ajudar a ofendida monetariamente e começou a ameaçar que a iria expulsar da residência; 12-Farta e saturada, a ofendida apresentou queixa crime contra o arguido, pois no dia 1 de Agosto de 2019, durante todo o dia e durante a noite, o arguido não a deixou descansar, assim como ao filho, dizendo constantemente em tom de ameaça, para ambos se irem embora daquela casa, senão iam ter problemas, dizendo: "VÃO-SE EMBORA", "O TEU FILHO QUE VÁ PARA CASA DA TUA MÃE", "FILHOS DA PUTA", "CABRÕES", "VÃO-SE FODER" - face às ameaças a ofendida deslocou-se novamente à Esquadra e pediu ajuda, em virtude de estar no seu limite psíquico e emocional, ficando em alojamento temporário, juntamente com o filho; 13- No dia 17 de Setembro de 2019, pelas 19 horas e 45 minutos, o arguido, por querer que ofendida saísse de casa, para poder aí habitar com a sua atual companheira, disse à ofendida que abandonasse a residência, ao mesmo tempo partia objetos em casa, nomeadamente um candeeiro, um jarro e um rooter da ofendida, o que a deixou aterrorizada, dizendo ao arguido que se continuasse com aquele comportamento iria apresentar queixa; 14- Na sequência o arguido, agarrou numa faca de cozinha, apontou-a na direção da ofendida, dizendo "É por isso que muitas mulheres ficam deitadas no chão..." - sendo comum o arguido aludir várias vezes às mulheres que terminaram este tipo de situações de forma trágica, morrendo - e em ato contínuo encostou a faca ao braço da ofendida, pressionando com força, o que deixou a ofendida em pânico, tendo fugido para a Esquadra a fim de se proteger, o arguido foi atrás da ofendida e foi preciso a PSP intervir para evitar que o mesmo a agredisse, dando origem ao aditamento nº 6 a fls. 46 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; 15- A PSP acompanhou a ofendida a sua casa, para recolher alguns dos seus bens, uma vez que nessa noite teve de pernoitar fora de casa com receio do arguido, no domicílio foi apreendida a faca com 15 cm de lamina, que o arguido utilizou para ameaçar a ofendida - cfr. fls. 50 a 52 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; 16-O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, com o intuito, concretizado, de causar dores e lesões corporais na ofendida, bem como medo e receio ao proferir as expressões acima descritas, bem sabendo que as mesmas eram aptas a provocar na ofendida receio pela sua vida e integridade física e querendo com as referidas expressões também ofender a honra e dignidade da ofendida; 17-O arguido tinha consciência que a ofendida era sua companheira e mãe do seu filho, e, portanto, que dela devia cuidar e proteger, não se abstendo de assim atuar, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por Lei; 18-O comportamento do arguido afectou fortemente o estado psíquico e psicológico da assistente que, para além de ter sofrido hematomas, escoriações visíveis e dores na sequência das diversas agressões físicas perpetradas pelo arguido, ficou limitada na execução dos seus movimentos quotidianos e da sua capacidade para o trabalho; 19- Além das agressões físicas, a assistente foi também vítima de ameaças e de injúrias, sendo grande parte delas proferidas na presença do filho comum do casal, CC, ainda menor à data da prática dos factos; 20- Como consequência directa das várias ameaças feitas pelo arguido, a assistente sentia um sério receio pela usa integridade física e vida, pois tinha medo que aquele viesse a concretizá-las, motivo pelo qual veio a beneficiar da teleassistência - pelo mesmo motivo tem também constante ansiedade e frequentes ataques de pânico; 21- Por ter sido expulsa pelo arguido no dia 1 de Agosto de 2019 da casa de morada de família, a assistente teve de pedir ajuda à Esquadra da P.S.P., pernoitando essa noite no Centro de Alojamento Temporário ……………………………, em Lisboa; 22- A assistente é cozinheira e trabalhava para entidade patronal ……………….. S.A., desde 03.09.2018, desempenhando as suas funções na Escola EB ……………………., auferindo um salário líquido de cerca de €565,15 (quinhentos e sessenta e cinco euros e quinze cêntimos) - documento nº2 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; 23-Actualmente desempenha as mesmas funções no mesmo local, sendo agora a entidade patronal a ………….., S.A., desde 02.09.2019, auferindo um salário líquido de cerca de €573,26 (quinhentos e setenta e três euros e vinte e seis cêntimos) - documento nº3 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; 24-Em virtude da sua insuficiência económica, a assistente viu-se obrigada a regressar para casa depois do episódio relatado no artigo 8° da acusação, tendo sido expulsa da mesma no dia 17.09.2019, conforme descrito nos artigos 13° e 14° da acusação, tendo tido novamente de solicitar o apoio da P.S.P. para recolher alguns dos seus objectos em sua casa, onde foi apreendida a faca de 15 cm de lâmina com a qual o arguido a havia ameaçado e, tendo de pernoitar em casa da sua irmã e posteriormente tendo ido viver juntamente com o filho na casa dos seus pais sita no Z....-L.... 25- Encontra-se, assim, desalojada tal como o seu filho desde 17.09.2019, tendo, em Janeiro de 2020, arrendado um quarto para ambos, pelo qual desembolsa a quantia de €350,00 (trezentos e cinquenta euros) mensais, em virtude de uma derrocada na casa dos seus pais que tomou impossível a permanência da assistente e do seu filho; 26- A sua vida profissional ficou gravemente prejudicada, uma vez que passou a ter de se levantar às 4 horas para se poder apresentar no seu local de trabalho às 8 horas já que cumpre um horário de trabalho diário compreendido entre as 8 horas e as 17 horas; 27- Os actos físicos e psicológicos que o arguido praticou contra a assistente foram de tal modo graves que esta teve de recorrer a apoio médico, tendo-lhe sido diagnosticada pela Dra. ……………., sua médica de família, a 25.02.2019, uma forte depressão associada a ansiedade e tendo desde então sido obrigada a tomar medicamentos antidepressivos e ansiolíticos, mantendo estes últimos até à data actual - documentos nº 4 e 5 juntos com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; 28- Têm igualmente prejudicado gravemente a saúde e percurso escolar do filho de ambos, o qual continuou a frequentar a mesma Escola EB ……………, onde se encontrava a concluir simultaneamente o ……………. anos de escolaridade, conforme é do conhecimento da sua coordenadora escolar, a Dra. …………………., o que causa igualmente enorme angústia e tristeza à assistente; 29- A assistente já desembolsou entre Janeiro de 2020 e a data da apresentação do pedido de indemnização civil, a quantia de €1.400,00 (mil e quatrocentos euros) a título de alojamento e tem feito face sozinha a todas as despesas necessárias ao sustento do filho do casal, ainda estudante, no qual gasta em média cerca de €100,00 (cem euros) mensais; 30- Para além disso tem suportado sozinha diversas dívidas decorrentes de despesas comuns do ex-casal nomeadamente: - uma dívida à GEBALIS no valor de cerca de €3.000,00 (três mil euros) decorrente das rendas não pagas relativas à casa de morada de família - documento nº6 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; - uma dívida à NOS no valor de cerca de €691,74 (seiscentos e noventa um euro e setenta e quatro cêntimos) decorrente da prestação de serviços de telemóvel, televisão e internet de todo o agregado familiar - documento nº7 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; - uma dívida à ENDESA no valor de cerca de €876,43 (oitocentos e setenta e seis euros e quarenta e três cêntimos) decorrente do fornecimento de serviços de electricidade à casa de morada de família - documento nº8 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; - uma dívida de cerca de €3.127,53 (três mil cento e vinte e sete euros e cinquenta e três cêntimos) ao NOVO BANCO contraída a título de empréstimo pessoal para fazer face às despesas comuns do casal cuja cobrança foi delegada à empresa INTRUM PORTUGAL - documento nº 9 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; 31- Pelo que se encontra numa situação de extrema carência económica, tendo de recorrer a ajuda financeira e material por parte de familiares e de colegas que, inclusivamente, lhe têm dispensado comida, sob pena de a assistente e o seu filho passarem fome, tendo-lhe já sido passado pela Junta de Freguesia de …………..Atestado de Insuficiência Económica - documento nº 10 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; 32- O arguido é solteiro mas tem três filhos de 25 (vinte e cinco), 18 (dezoito) anos e 6 (seis) meses de idade; 33- Os dois filhos mais velhos do arguido não dependem economicamente dele; 34- O filho mais novo do arguido vive com ele e depende economicamente dele; 35- O arguido aufere mensalmente €645,00 (seiscentos e quarenta e cinco euros) da sua actividade profissional de assistente operacional da Câmara Municipal de Lisboa; 36- O arguido tem o 9° (nono) ano de escolaridade; 37- No relatório social de fls. 427 a 430 dos autos consta que: "( ... ) Pese embora tenha crescido num meio social associado a pobreza e exclusão social, AA retrata uma infância gratificante, no seio de uma família que dispunha de condições socioeconómicas estáveis, proporcionadas pelo trabalho desenvolvido pelo progenitor, que era embarcadiço e por isso permanecia grande parte do tempo fora de casa. Nos momentos em que o pai estava no agregado, o arguido refere que mantinha relacionamento adequado com a mãe e de proximidade afetiva ao arguido e irmãs. A progenitora era doméstica e assumiu o principal papel educativo do arguido. Contando com um percurso escolar regular até ao 9.º ano, AA abandonou os estudos aos 15 anos de idade para começar a trabalhar e ter o seu próprio dinheiro. Iniciou atividade laboral como aprendiz numa serração, onde permaneceu até integrar o Serviço Militar Obrigatório, aos 20 anos. Descrevendo-se como ambicioso, o arguido refere que, com vista a auferir melhor remuneração, depois da tropa, passou por vários postos de trabalho, durante uns anos exercendo diversas funções na área da construção civil, teve depois experiência laboral como técnico de equipamento desportivo, seguindo-se cerca de 12/13 anos de trabalho como segurança. Chegou a estar emigrado em França durante uns meses, trabalhando na área da cofragem, mas regressaria a Portugal por não dispor de condições satisfatórias naquele país. No plano afetivo-relacional, AA tem um filho com 24 anos de idade, que sempre viveu com a mãe do arguido. O arguido refere ter-se separado da mãe do filho logo após o nascimento do mesmo, descrevendo o relacionamento isento de conflitualidade. (... ) Contando atualmente com 45 anos de idade, AA iniciou relacionamento com BB, ofendida no presente processo, aos 25 anos. O casal viveu durante os primeiros tempos de relacionamento em casa da mãe do arguido, numa habitação camarária situada num bairro social associado a problemáticas socioeconómicas. Entretanto o arguido terá solicitado aos Serviços camarários um desdobramento da casa da mãe, tendo-lhe sido atribuído uma habitação onde passou a viver com a ofendida e filho. Esta residência, localizada no Bairro da ………… meio caracterizado pelas problemáticas de exclusão social, é a atual residência do arguido sendo nela que vivia com a ofendida e o filho à data das circunstâncias que estiveram na origem do presente processo. Sobre a dinâmica conjugal com BB, AA descreve como positivos os primeiros anos de convivência, assinalando o início da deteriorização da relação no ano 2009. O arguido atribui os motivos da conflitualidade com a ofendida, ao facto de a mesma ter passado a pretender ter uma habitação própria. Sem assumir qualquer desadequação da sua própria conduta, o arguido refere que a ofendida provocava discussões para o fazer reagir, retratando uma dinâmica relacional com agressões mútuas para explicar como surge o presente processo e outros envolvimentos processuais. Com efeito, AA tem anterior condenação pelo crime de violência doméstica, numa pena de prisão que ficou suspensa, sem acompanhamento pela DGRSP, em 2011, no âmbito do processo 159/09.1 S2LSB. O arguido apresenta sobre esta condenação um discurso vago, projetando toda a responsabilidade do mesmo na conduta da ofendida e sem qualquer sentido autocrítico relativamente condutas criminais por si adotadas. Também no que diz respeito à educação do filho comum com a ofendida, o arguido adota um discurso de total desresponsabilização quanto aos motivos que desencadearam a intervenção do tribunal de família e menores no sentido de garantir a proteção do filho, que, na adolescência, chegou a estar institucionalizado durante aproximadamente um ano e meio, fase em que o arguido refere ter-se sentido psicologicamente afetado, tendo procurado apoio emocional e colocando-se como vítima face aos serviços de ação social, que nunca o terão apoiado. Posteriormente a guarda do filho foi atribuída ao pai da ofendida. A ofendida também descreve os primeiros anos de relacionamento como gratificantes. BB atribui a origem da conflitualidade surgida, com o facto de o arguido não lidar bem com críticas e de não aceitar a relação dela com a família de origem, nomeadamente com o pai e irmã, referindo as dificuldades relacionais que surgiram na sequência da guarda do filho ter sido atribuída ao seu pai. Com a condenação do arguido no processo anteriormente referido, a ofendida refere que chegaram a separar-se durante algum tempo. Depois de reatarem a relação, passaram a ocorrer discussões frequentes, por motivos de desconfiança e ciúme do arguido e face às quais a ofendida tendia a afastar-se o que provocaria no arguido ainda maior desconfiança e conflitualidade, forçando-a a ter relações sexuais. No ano de 2018, a ofendida refere ter descoberto que o arguido tinha outro relacionamento amoroso, com a atual companheira. Permanecendo a coabitar juntos, a conflitualidade viria, no entanto, a aumentar, sendo dissonante a descrição que arguido e ofendida fazem da interação então estabelecida e a respeito da danificação da casa, episódios em que foram partidos diversos objetos, mobiliário e inclusive uma janela e cuja autoria cada um atribui ao outro elemento. A titularidade da habitação terá neste período passado para a ofendida, que, segundo o arguido, o terá embriagado para o obrigar a assinar um documento nesse sentido. Contudo, seria a ofendida a sair de casa no final de 2019, na sequência da conflitualidade com o arguido. A ofendida atribui ao arguido a precariedade em que se encontra desde que saiu de casa, assinalando as carências económicas e as fragilidades de saúde mental com que se tem deparado desde então. Depois da separação, BB refere que ainda chegaram a falar mas entretanto cortou qualquer forma de contacto com o mesmo. Questionada sobre sentimentos de medo face ao arguido, a ofendida apresenta um discurso ambivalente, considerando que o risco dependerá da forma como for resolvida pelos serviços camarários a titularidade da habitação. O arguido refere um relacionamento positivo com o filho, atualmente com 18 anos, mencionando que o mesmo foi viver com ele há cerca de três meses, na sequência da ofendida o ter posto na rua. Contudo, do que nos foi possível perceber, após uns dias a viver com o arguido, o filho terá voltado para junto da ofendida, onde permanecerá. Desde 2018 que o arguido mantém relacionamento amoroso com EE, mais nova que o arguido 18 anos, com quem tem uma filha, atualmente com dois meses. O arguido retrata uma dinâmica conjugal gratificante. O casal passou a viver junto em setembro/outubro de 2019, na casa onde o arguido vivia com a ofendida. A atual companheira do arguido descreve-o como uma pessoa trabalhadora e salienta, das qualidades pessoais do arguido, o facto de não ser agressivo. Contudo, questionada sobre aspetos menos positivos da dinâmica relacional, refere o tom por vezes ofensivo com que AA comunica, reconhecendo que por vezes a rebaixa. Verbaliza ainda a identificação de sentimentos de ciúme por parte do arguido. EE considera, no entanto, normativos os comportamentos do arguido no seio relacional, considerando manter com o mesmo uma relação positiva, e apresenta uma visão favorável de AA assente na perceção desvalorizada que tem sobre a ofendida do atual processo e a forma disfuncional como considera que a mesma se relacionava com o arguido. Atualmente o arguido vive com a companheira, a filha de ambos, com dois meses de idade e uma enteada com nove anos. A companheira encontra-se de licença de maternidade e o arguido trabalha como coveiro, profissão desempenhada desde há três anos, como funcionário da Câmara Municipal de Lisboa. Aferindo o ordenado mínimo nacional, embora contida, o arguido descreve uma condição económica suficiente para fazer face às despesas. Na ocupação dos tempos livres, para além da dedicação à família, AA refere praticar a atividade boxe desde há quatro anos.(... ) AA refere forte impacto emocional da presente situação jurídico penal, manifestando sentimentos de revolta por considerar que as suas queixas contra a ofendida não foram atendidas. O arguido não identifica alterações comportamentais que tenha feito na sequência do presente processo, o que parece estar relacionado com a forma vitimizante como se coloca face às circunstâncias que conduziram ao processo. Com efeito, o arguido não reconhece fragilidades pessoais que possam ter contribuído para o seu envolvimento processual. Contudo, em caso de condenação, mostra-se recetivo para colaborar com o que possa vir a ser estipulado no âmbito de uma medida a executar na comunidade, nomeadamente a possibilidade de frequentar um programa dirigido a agressores de violência doméstica.(... ) Não obstante o crescimento de AA tenha decorrido num meio social associado a problemáticas delinquenciais, no decurso do seu processo de socialização, o arguido parece ter contado com um ambiente familiar promotor da sua inserção social, o que terá facilitado o seu percurso laboral, aparentemente consistente. Todavia, no domínio relacional, destaca-se negativamente o facto de o arguido contar com anterior processo judicial por crime de violência doméstica exercido contra a mesma vítima do atual processo e no âmbito do qual foi condenado uma pena de prisão suspensa na sua execução. Destaca-se sobre o passado criminal, o facto de AA não apresentar um discurso autocrítico quanto aos seus comportamentos criminais ou sequer de reconhecimento de condutas menos adequadas da sua parte. Dispondo atualmente de um relacionamento conjugal descrito como satisfatório, o arguido não mantém contacto com a vítima, o que pode ser considerado como fator de proteção. Contudo, arguido e ofendida têm um filho em comum e mantêm litígio no que diz respeito à resolução de questões patrimoniais pendentes, nomeadamente sobre a titularidade da habitação onde o arguido vive atualmente, aspetos que continuam a contribuir para a existência de risco de comportamentos ofensivos dirigidos contra a ofendida. Face ao exposto, caso seja ponderada uma sanção de execução na comunidade, consideramos que deverá ser salvaguardada a proteção da vítima, com ponderação de obrigatoriedade de o arguido se manter afastado da mesma, com vista a garantir a sua segurança. Atendendo ainda às características pessoais identificadas no arguido, nomeadamente, fragilidades ao nível do autocontrolo de impulsos e fracas competências comunicacionais e de descentração, consideramos que o arguido deverá ainda ser sujeito à frequência de um programa dirigido a temáticas associadas à violência doméstica, com vista a promover uma maior autoresponsabilização pessoal e adquirir respostas comportamentais assertivas em relacionamentos de intimidade. Destaca-se, todavia, que caso venha a ser ponderada a sujeição do arguido ao Programa para Agressores de Violência Doméstica, promovido pela DGRSP, o mesmo só é exequível se aplicado no âmbito de uma medida judicial de duração mínima de dois anos.(... )"; 38- O arguido não tem antecedentes criminais. ***** 2-FACTOSNÃO PROVADOS Não se provou que: 1- O arguido e a ofendida BB até ao ano de 2015, altura em que se separaram; 2- Em Fevereiro de 2019, o arguido atirou a frigideira com os bifes para o chão e de seguida agarrou a ofendida pelos cabelos. …”. ***** Como dissemos, o art.º 374º/2 do CPP[3] determina que, na sentença, ao relatório se segue a fundamentação que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal. A redacção deste preceito inculca a ideia, que a obediência a regras de bom senso, clareza e precisão apoiam, de que a fundamentação da decisão se repartirá pela enumeração dos factos provados, depois dos não provados e, seguidamente, pela exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão com o exame crítico das provas. Necessário e imprescindível é que o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência se possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado[4]. No cumprimento desse dever, o tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de facto da seguinte forma: “… Para formar a convicção do Tribunal, quanto à matéria dada como provada, foram determinantes as declarações da assistente P………….. e das testemunhas M…………, A……………., MM…………., CC, …………….. e R……………………… O arguido explicou que nem tudo o que consta do despacho de acusação é verdade pois não pôs o filho na rua, não partiu a casa e não dirigiu as palavras que constam do despacho de acusação à assistente. Mais explicou a sua situação económica e familiar. A testemunha M…………. explicou que sendo médica de família da assistente desde o ano de 2009 teve conhecimento de violência doméstica em 2016 com problema com o filho da assistente que foi institucionalizado e foi diagnosticada a assistente com depressão sabendo que em Fevereiro de 2019 recorreu à urgência do Hospital de Santa Maria por ansiedade e vómitos, em Abril de 2020 sabe de violência doméstica e agora a assistente foi a uma consulta em que lhe relatou que vive em dois quartos com o filho de 18 anos em situação económica muito frágil sendo apoiada pela Santa Casa da Misericórdia, não tem dinheiro para pagar a medicação que lhe foi passada a 15 de Dezembro de 2020 de um calmante, antidepressivo e um comprimido para dormir pelo que pediu-lhe um calmante mais barato e esta testemunha passou-lho assim como explicou que a assistente lhe explicou que não tem casa vivendo num quarto com o filho que está desempregado após ter feito um curso que terminou bem como também explicou que a situação de violência doméstica conjugada com não ter dinheiro para as despesas básicas causa ansiedade e depressão à assistente. Esta testemunha foi confrontada com os documentos nºs 4 e 5 do pedido de indemnização civil de fls. 400 e 401 dos autos explicando que o primeiro foi prescrito por uma sua colega à assistente de anti-depressivo, calmante e um comprimido para a diarreia enquanto que o segundo é a sua prescrição de Abril de 2000 de um calmante. A testemunha A…………………. explicou que a assistente trabalha com ela há três anos e que no trabalho contava que era agredida pelo arguido contudo esta testemunha não viu qualquer marca no corpo. Explicou que ouvia que discutiam ao telefone e que a assistente contava que tinham dificuldades financeiras e ela facilitava-lhe com as sobras de comida para a assistente dar ao filho e também lhe comprava bens alimentares para dar ao filho (nomeadamente cereais), no Natal ela e uma outra colega fizeram um saco de bens alimentares que deram à assistente assim como explicou que a assistente contava que ela trabalhava, eles compraram coisas - o carro - e ficou essa dívida, o arguido ajudava mas ajudava pouco, ela é que "andava para a frente". Mais explicou esta testemunha que viu que a assistente estava mais agressiva e revoltada, notando isso mais em 2019 assim como explicou que a assistente, cozinheira de 3ª agora só faz 7 horas de trabalho desde Setembro de 2020 enquanto antes fazia 8 horas, antes ganhava €570,00 por mês e agora não chega a €500,00. A testemunha MM……………….. explicou que trabalha com a assistente vai fazer três anos no refeitório e que não assistiu a discussões nem a nenhuma agressão mas a assistente dizia que tinha maus tratos do arguido ("nomes" e batia-lhe) e não tinha dinheiro pelo que esta testemunha ajudavaa com alimentos (para ela e para o filho dando-lhe arroz, massa, bolachas e detergente para roupa) e monetariamente (deu-lhe dinheiro várias vezes porque não tinha dinheiro para comer) mas não viu feridas nem nodoas negras na assistente. A assistente BB explicou a relação que teve com o arguido com início em 2000 a viver em casa da mãe dele sita na Rua …………….., até ao ano de 2005, depois foram viver para uma casa sita no …………….. após 2005 até 2018, têm um filho comum que foi retirado em 2015 e dada a tutela ao pai dela assim como explicou as palavras que o arguido lhe dirigiu que constam do despacho de acusação, o crédito de doze mil euros, que o arguido não pagava alimentação, luz e a conta da NOS, o documento que o arguido fez para que a casa ficasse para ela mas não saiu de casa, as palavras que o arguido lhe dirigiu e ao filho para saírem de casa e o que o arguido "partiu a casa" assim como também explicou como se sentiu com a conduta do arguido tendo depressão e ataques de pânico tendo que andar sempre com comprimidos como faz hoje que os tem no bolso do casaco que veste. Mais explicou a assistente que trabalha agora com redução de horas de trabalho tendo salário liquido de €485,00 quando antes recebia €517,00 e que o arguido expulsou-a a 17 de Setembro de 2019 ficou uma semana em casa da irmã, depois foi para casa dos pais, arrendou depois um quarto por €350,00 mês em F..... levantando-se às 4 horas da manhã para ir trabalhar para Alcântara e saia às 16 horas assim como explicou as repercussões no percurso escolar do filho que viu o pai a agredir a mãe e a falar com ela de modo que ele tentou defendê-la porque o arguido queria bater-lhe e o filho reagiu tendo pai e filho ficado frente a frente. A assistente explicou que pagando €350,00 de renda e gastando €100,00, pelo menos, com o filho teve que pedir ajuda para alimentação à Caixa Comunitária de F..... e vendo documentos nºs 6 a 9 juntos com o pedido de indemnização civil explicou que o primeiro é a dívida à Gebalis de falta de pagamento de rendas da casa de morada da família, o documento nº7 é de dívida da NOS, o documento nº8 é factura da ENDESA de dívida de consumo de electricidade da casa e o documento nº9 é dívida de crédito do banco NOVO BANCO tal como explicou que paga €450,00 de renda, tem comida do Banco Alimentar e vai ao caixote do lixo buscar roupa para vestir. A testemunha CC, filho do arguido e da assistente, explicou como viu o relacionamento dos pais com excepção de um ano em que viveu num colégio (tinha 13/14 anos de idade) com discussões e quando as havia "ia lá para fora" para a rua porque não gostava de as ouvir e que eram porque a mãe passava muito tempo em casa da vizinha e por questões de dinheiro - "era uma situação quase diária" a partir dos 11 anos de idade dele e ouviu o pai dirigir palavras à mãe de "vaca, puta" - ouviu-as dizer várias vezes: por exemplo cinco vezes por mês assim como o pai o mandou fora de casa, e também à mãe, ele saiu com a mãe mas o pai deu-lhe as chaves e disse para voltarem assim como viu agressões do pai à mãe com murros e pontapés - mais na zona da cabeça e tronco - sendo também nessas ocasiões que ele saia e "ia dar uma volta" - e tal ocorreu mais do que uma vez antes de ir para o colégio bem como também explicou que voltou a casa dos pais mais ou menos em 2018 e o pai "arranjou" outra companheira (já ele tinha saído do colégio) queria sair da casa e ir para outra casa com a outra mulher - a casa era da GEBALIS e agora está lá nessa casa o pai, a esposa dele e a filha - houve uma discussão com o pai a dizer-lhes para saírem, foram para a casa do avó e o pai foi lá buscá-los. Mais explicou que outra vez o pai discutiu com a mãe e ele pôs-se à frente da mãe para a proteger "porque a discussão estava a passar dos limites com muitos gritos" mas agora não se lembra de quais foram as palavras ditas assim como explicou que um dia o pai apontou uma faca à mãe mas ele não estava, estava a chegar a casa e a mãe puxou-o, não o deixando assim entrar em casa, levou-o para a Esquadra, a mãe saiu de casa e ele foi com a mãe também explicou que o pai ameaçou a mãe três vezes com ele presente dizendo-lhe "quero que saias daqui senão vou-te tirar à força". Mais explicou que esteve um dia em centro de acolhimento com a mãe quando o pai apontou a faca à mãe, depois foram para casa da tia B……….. e depois para casa dos avós onde estiveram cerca de dois anos assim como também viveu com a mãe num quarto arrendado durante um ano desde Janeiro de 2020 em F..... pagando quatrocentos e cinquenta euros/quinhentos euros por mês até antes de ontem mas quando estiveram com os avós o pai não ajudou e quando foram para o quarto o arguido "deu quase três quilos de carne uma vez" sendo a mãe que assegurava as despesas pagando a renda e alimentação gastando cem euros a cento e cinquenta. Ainda explicou esta testemunha que viu marcas - hematomas - no braço da mãe e viu agressões à mãe tal como explicou que a mãe trabalha como cozinheira numa escola em Alcântara e quando viviam em F..... acordava mais cedo (às 6 da manhã), ia de transportes e chegava às 5/5 e meia da tarde, enquanto que ele frequenta a Escola EB ………………. - "faz três anos" - estava atrasado em relação aos colegas, e também explicou que a mãe teve uma depressão diagnosticada, tem dívidas que a preocupam de "seis mil e tal euros" à GEBALIS, à NOS e aos bancos (Novo Banco). A testemunha B…………. é irmã da assistente e explicou como viu o relacionamento do casal arguido-assistente que era problemático com conflitos assim como disse que uma vez viu o arguido dar "uma chapada" à irmã mas não sabe em que data foi assim como viu marcas no braço da irmã tendo-lhe esta dito que batera num sítio e que a irmã teve que sair de casa com o sobrinho, refugiaram se na sua casa onde ficaram uns dias tendo depois ido para casa dos pais desta testemunha e enquanto estiveram nesta última casa o arguido comparticipou uma vez nas despesas do menor que esteve mais ou menos um ano lá assim como explicou que a irmã já tinha ido para casa de uma amiga antes de 2019 e depois de sair de casa dos pais a irmã alugou dois quartos para ela e para o filho em Janeiro de 2020 pagando quatrocentos e cinquenta euros de renda, o arguido não contribuiu com nada tendo ela mesma sido encarregada de educação do sobrinho em 2018/2019 vendo que o percurso escolar do menor David foi afectado sendo ele problemático, bastante influenciável e teve um psicólogo na escola assim como ainda explicou a situação financeira da irmã com dívidas da GEBALIS (dívida do casal de três mil euros da casa onde viviam), da NOS (seiscentos e tal euros dos cartões dos três telemóveis do arguido, irmã e sobrinho), do Novo Banco (três mil e tal euros de empréstimo para fazer face a dívidas comuns do casal) e ENDESA (oitocentos/novecentos euros - viu documentos de fls. 402 a 410 sendo de 2.8.2019 dívidas antigas em que moravam os dois arguido-irmã). Esta testemunha ainda explicou que ajuda economicamente a irmã tal como os pais dela dando duzentos a trezentos euros para alimentação e despesas do CC e também explicou que a irmã teve uma depressão sendo medicada até à actualidade e a mudança para F.... também a prejudicou porque tinha que acordar mais cedo. A testemunha R…………… explicou como no exercício da sua actividade profissional de Técnica de medida educativa do …………..o filho do arguido CC faz parte e assim teve contacto com a mãe pois o menor vinha de percurso educativo alternativo e fez medida educativa porque estava atrasado três anos, na altura residia no ……………. mas saiu de repente, deixou a medida por terem ido viver para ……….. para casa dos pais da mãe assim como explicou que na altura o menor não tinha vontade de estudar, queria trabalhar até para ajudar a mãe devido às dificuldades que passavam. Mais explicou que o menor era muito reservado e tinha situações de tensão interna que o fazia parecer estar em constante contensão, dizia que eram problemas, sem adiantar mais nada e que na altura o encarregado de educação era o avó do menor, por o mesmo ter sido retirado aos pais, depois passou a ser a mãe que participava e com quem a testemunha falava todos os dias tal como também explicou que pediu apoio para o transporte escolar pois o menor entrava às 9 horas todos os dias e que não viu marcas de agressão na assistente que ganhava pouco mais que o salário mínimo, notava carências em roupa depois foram para um quarto de L……… para O………….e com o confinamento "as coisas ficaram muito piores" com a assistente em law-off o dinheiro era para o quarto (€350,00 mais ou menos) e ficavam sem comida sendo o transporte gratuito com refeições da escola gratuitas para o menor CC- mas era pouco para o CC- e a mãe chegou a ir a pé de F……. até ao B………… para recolher uma refeição diária que só dava para o CC mas conseguiram o apoio da Junta de Freguesia de ………. e a equipa da testemunha reunia semanalmente bens de higiene e outros. A testemunha também recolhia e imprimia as fichas e levava-as ao CC (porque ele não tinha telemóvel nem podia usar o da mãe) semanalmente juntamente com bens alimentares e de higiene tal como explicou que a assistente tinha dívidas como lhe foi relatado pela própria - tinha muitas dívidas à sua responsabilidade - tendo apoio da Santa Casa para pagar o quarto (apoios temporários só dados 2 ou 3 vezes) talvez de trezentos e cinquenta euros na totalidade do valor do quarto por período de 2 ou 3 meses e também explicou que esta situação teve reflexos no CC que foi retirado por situação abusiva do seu meio e é um jovem muito carente, de boa capacidade de racionalizar mas em situação de tensão ficava isolado por medo de não saber como responder por ele tendo conhecimento de duas situações de violência. O arguido apresentou testemunhas de defesa – AR, MC, SM, BG, AL, LD. A testemunha AR sendo vizinho do arguido explicou que ao fim do dia havia grandes discussões lá em casa em que ouvia mais a assistente a gritar e que o arguido lhe diz que o filho CC vai a casa dele assim como explicou que o arguido lhe deve duzentos e cinquenta euros do que ele lhe emprestou. A testemunha ML, vizinha do arguido, explicou que ouvia discussões entre arguido e assistente e que ouvia mais a voz da assistente percebendo que partiam coisas e que o menor CC era obediente e ainda hoje, quando de vez em quando vai a casa do pai, dá as boas tardes a esta testemunha. A testemunha SM explicou como o arguido se queixava a ela de que chegava a casa e não tinha nada para comer e que o ordenado não lhe chegava assim como explicou a relação do arguido com o filho CC em que o arguido se queixa à testemunha que o menor não atende o telefone. A testemunha BG, amigo do arguido, explicou que "não via brilho no casal arguido-assistente" e que o arguido é trabalhador mas passavam necessidades pois o arguido pedia-lhe dinheiro emprestado e assim como também explicou que vê o arguido a falar com o filho CC nunca tendo visto agressões do arguido à assistente. A testemunha AL, filho do arguido, explicou que viu que a relação do arguido com a assistente era normal, saudável, a segunda oportunidade para o pai, moraram juntos até aos 8 anos desta testemunha - o CC teria ¾ anos - não ouviu discussões entre ambos mas na adolescência ia pouco a casa do arguido - duas vezes por mês e em épocas festivas - e convive pouco com o irmão CC vendo que este precisa de constante acompanhamento e que "puxando" pelo CC este vai dizendo o que se passava lá em casa mas não falou de discussões sabendo que o CC foi retirado de casa tendo-lhe contado que tal era por má conduta na escola. A testemunha LD actual companheira do arguido explicou que o conhece há quatro anos (desde Outubro de 2018) e conheceu-o pela internet assim como explicou que o arguido estava na mesma casa que a assistente mas a relação de ambos já tinha acabado. Actualmente vê que o arguido dá-se bem com o filho CC e ainda que a assistente saiu de casa depois de queixa na polícia tendo visto a casa com vidros partidos da janela e cheia de sangue. As duas primeiras testemunhas de defesa do arguido, vizinhos, não mereceram credibilidade ao Tribunal pois foi patente o sentimento de ódio que têm pela assistente e disseram o que o arguido lhes disse tendo no entanto dito que ouviam discussões entre o casal. O filho do arguido AL explicou que a vida entre o pai e a assistente não lhe interessava, não se quer comprometer a falar em relação ao pai, e ia-se embora, enquanto que as testemunhas SM e BG não presenciaram os factos e disseram o que o arguido lhes disse assim como a última testemunha é a actual companheira do arguido não presenciou os factos de que o arguido está acusado e tendo dito que falava com o arguido pelo telemóvel em alta voz ouvia a assistente gritar para se ir embora o que não tem relevância para os factos em discussão nos autos. Atento o depoimento claro, preciso e coerente da assistente conjugado com o do filho CC que descreveram a relação da assistente com o arguido com as palavras que o arguido dirigiu à assistente e as agressões à mesma nomeadamente que o filho viu com murros e pontapés conjugados com os depoimentos das testemunhas como a médica assistente da assistente que explicou o que ela lhe contou, com a testemunha B…………, irmã da assistente, que viu marcas nos braços e na cara da assistente e que ouviu o arguido ameaçá-la, como o fez à restante família, com as duas colegas da assistente que não viram marcas físicas na assistente mas era a elas que ela falava da violência que sofria do arguido e da técnica do filho CC que tão claramente explicou o comportamento do jovem e das dificuldades económicas do mesmo e da mãe conjugados com os documentos que constam dos autos, o Tribunal ficou convencido da actuação do arguido para com a assistente e como esta se sentiu e sente em consequência da mesma e as dificuldades económicas com as diversas dívidas que tem. Assim, o Tribunal ficou convencido de que o arguido e BB viveram, em comunhão de mesa e cama, na Rua ……………… em Lisboa, entre o ano de 2000 até 2010. A ofendida e o arguido têm um filho em comum, CC, nascido a ………... O menor CC, devido ao ambiente hostil e de violência doméstica no seio familiar, foi retirado aos progenitores em 2015, ficando sob a tutela do pai da ofendida. Em 2017 o menor foi residir com a ofendida e o arguido prometeu mudar, tendo ambos reatado a relação, voltando a viver maritalmente, na residência sita na ………………., em Lisboa. A relação decorreu até Outubro de 2017, apenas com discussões frequentes - em outubro de 2018, a ofendida confrontou o arguido com o facto de este estar a ser infiel e a partir dessa altura o arguido deixou de ajudar a nível financeiro, deixando de ajudar a pagar um crédito que ambos tinham pedido no valor de €12.000,00 (doze mil euros). O arguido chamava à ofendida "PUTA DE MERDA", "VAI PARA O CARALHO", "VAI-TE PODER", "FILHA DA PUTA» e dizia-lhe "TENS QUE SAIR DE CASA", "NÃO TE QUERO AQUI", "VAIS VIVER DE ESMOLA". De Dezembro de 2018 até Fevereiro de 2019, apesar de viverem na mesma casa, ambos deixaram de se falar. Em Fevereiro de 2019, em data não concretamente apurada, o arguido por não concordar com um determinado comportamento da ofendida chamou-lhe "FILHA DA PUTA", "ÉS UMA GRANDE PUTA", "ENTREGASTE A TODOS OS HOMENS", "GRANDE VAGABUNDA" e, de seguida, agarrou a ofendida por um braço e expulsou-a de casa, só a deixando entrar à noite. Entre Março e Abril de 2019, a ofendida e o arguido começaram a falar e a relacionar-se sexualmente, por mútuo consentimento. No início de Maio de 2019, o arguido acordou sair de casa, que é propriedade da Gebalis, e assinou um documento para que a casa ficasse só em nome da ofendida, mas o tempo foi passando e o arguido não abandonava a habitação. Em Julho de 2019, o arguido começou a importunar diariamente a ofendida, querendo manter relações sexuais todos os dias, e como a ofendida se negava, por não querer manter qualquer relação com o arguido, este dizia-lhe: "DÁ-ME CONA", "DÁ-ME CONA", "DÁ-ME CONA", de forma repetitiva e insistente e, por vezes, agarrava-a para manter sexo, e esta para evitar conflitos cedia sempre e tinha relações contra sua vontade. Nessa altura, o arguido deixou também de ajudar a ofendida monetariamente e começou a ameaçar que a iria expulsar da residência. Farta e saturada, a ofendida apresentou queixa crime contra o arguido, pois no dia 1 de Agosto de 2019, durante todo o dia e durante a noite, o arguido não a deixou descansar, assim como ao filho, dizendo constantemente em tom de ameaça, para ambos se irem embora daquela casa, senão iam ter problemas, dizendo: "VÃO-SE EMBORA", "O TEU FILHO QUE VÁ PARA CASA DA TUA MÃE", "FILHOS DA PUTA", "CABRÕES", "VÃO-SE FODER". Face às ameaças a ofendida deslocou-se novamente à Esquadra e pediu ajuda, em virtude de estar no seu limite psíquico e emocional, ficando em alojamento temporário, juntamente com o filho. No dia 17 de Setembro de 2019, pelas 19 horas e 45 minutos, o arguido, por querer que ofendida saísse de casa, para poder aí habitar com a sua atual companheira, disse à ofendida que abandonasse a residência, ao mesmo tempo partia objetos em casa, nomeadamente um candeeiro, um jarro e um rooter da ofendida, o que a deixou aterrorizada, dizendo ao arguido que se continuasse com aquele comportamento iria apresentar queixa. Na sequência o arguido, agarrou numa faca de cozinha, apontou-a na direção da ofendida, dizendo "É por isso que muitas mulheres ficam deitadas no chão..." - sendo comum o arguido aludir várias vezes às mulheres que terminaram este tipo de situações de forma trágica, morrendo - e em ato contínuo encostou a faca ao braço da ofendida, pressionando com força, o que deixou a ofendida em pânico, tendo fugido para a Esquadra a fim de se proteger; o arguido foi atrás da ofendida e foi preciso a PSP intervir para evitar que o mesmo a agredisse, dando origem ao aditamento nº 6, a fls. 46 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido. A PSP acompanhou a ofendida a sua casa, para recolher alguns dos seus bens, uma vez que nessa noite teve de pernoitar fora de casa com receio do arguido, no domicílio foi apreendida a faca com 15 cm de lamina, que o arguido utilizou para ameaçar a ofendida - cfr. fls. 50 a 52 cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido. O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, com o intuito, concretizado, de causar dores e lesões corporais na ofendida, bem como medo e receio ao proferir as expressões acima descritas, bem sabendo que as mesmas eram aptas a provocar na ofendida receio pela sua vida e integridade física e querendo com as referidas expressões também ofender a honra e dignidade da ofendida. O arguido tinha consciência que a ofendida era sua companheira e mãe do seu filho, e, portanto, que dela devia cuidar e proteger, não se abstendo de assim atuar, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por Lei. O comportamento do arguido afectou fortemente o estado psíquico e psicológico da assistente que, para além de ter sofrido hematomas, escoriações visíveis e dores na sequência das diversas agressões físicas perpetradas pelo arguido, ficou limitada na execução dos seus movimentos quotidianos e da sua capacidade para o trabalho. Além das agressões físicas, a assistente foi também vítima de ameaças e de injúrias, sendo grande parte delas proferidas na presença do filho comum do casal, CC, ainda menor à data da prática dos factos. Como consequência directa das várias ameaças feitas pelo arguido, a assistente sentia um sério receio pela usa integridade física e vida, pois tinha medo que aquele viesse a concretizá-las, motivo pelo qual veio a beneficiar da teleassistência - pelo mesmo motivo tem também constante ansiedade e frequentes ataques de pânico. Por ter sido expulsa pelo arguido no dia 1 de Agosto de 2019 da casa de morada de família, a assistente teve de pedir ajuda à Esquadra da P.S.P., pernoitando essa noite no Centro de Alojamento Temporário ……………….. em Lisboa. A assistente é cozinheira e trabalhava para entidade patronal …………………., S.A., desde 03.09.2018, desempenhando as suas funções na Escola EB ……………………, auferindo um salário líquido de cerca de €565,15 (quinhentos e sessenta e cinco euros e quinze cêntimos) - documento nº2 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido. Actualmente desempenha as mesmas funções no mesmo local, sendo agora a entidade patronal a …………. S.A., desde 02.09.2019, auferindo um salário líquido de cerca de €573,26 (quinhentos e setenta e três euros e vinte e seis cêntimos) - documento nº3 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido. Em virtude da sua insuficiência económica, a assistente viu-se obrigada a regressar para casa depois do episódio relatado no artigo 8° da acusação, tendo sido expulsa da mesma no dia 17.09.2019, conforme descrito nos artigos 13º e 14º da acusação, tendo tido novamente de solicitar o apoio da P.S.P. para recolher alguns dos seus objectos em sua casa, onde foi apreendida a faca de 15 cm de lâmina com a qual o arguido a havia ameaçado e, tendo de pernoitar em casa da sua irmã e posteriormente tendo ido viver juntamente com o filho na casa dos seus pais sita no …… - L..... . Encontra-se, assim, desalojada tal como o seu filho desde 17.09.2019, tendo, em Janeiro de 2020, arrendado um quarto para ambos, pelo qual desembolsa a quantia de €350,00 (trezentos e cinquenta euros) mensais, em virtude de uma derrocada na casa dos seus pais que tomou impossível a permanência da assistente e do seu filho. A sua vida profissional ficou gravemente prejudicada, uma vez que passou a ter de se levantar às 4 horas para se poder apresentar no seu local de trabalho às 8 horas já que cumpre um horário de trabalho diário compreendido entre as 8 horas e as 17 horas. Os actos físicos e psicológicos que o arguido praticou contra a assistente foram de tal modo graves que esta teve de recorrer a apoio médico, tendo-lhe sido diagnosticada pela Dra. ……………, sua médica de família, a 25.02.2019, uma forte depressão associada a ansiedade e tendo desde então sido obrigada a tomar medicamentos antidepressivos e ansiolíticos, mantendo estes últimos até à data actual - documentos nº4 e 5 juntos com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido. Têm igualmente prejudicado gravemente a saúde e percurso escolar do filho de ambos, o qual continuou a frequentar a mesma Escola EB …………….., onde se encontrava a concluir simultaneamente o ……………. anos de escolaridade, conforme é do conhecimento da sua coordenadora escolar, a Dra. R……………………, o que causa igualmente enorme angústia e tristeza à assistente. A assistente já desembolsou entre Janeiro de 2020 e a data da apresentação do pedido de indemnização civil, a quantia de €1.400,00 (mil e quatrocentos euros) a título de alojamento e tem feito face sozinha a todas as despesas necessárias ao sustento do filho do casal, ainda estudante, no qual gasta em média cerca de €100,00 (cem euros) mensais. Para além disso tem suportado sozinha diversas dívidas decorrentes de despesas comuns do ex-casal nomeadamente uma dívida à GEBALIS no valor de cerca de €3.000,00 (três mil euros) decorrente das rendas não pagas relativas à casa de morada de família - documento nº6 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; uma dívida à NOS no valor de cerca de €691,74 (seiscentos e noventa um euro e setenta e quatro cêntimos) decorrente da prestação de serviços de telemóvel, televisão e internet de todo o agregado familiar - documento nº7 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido; uma dívida à ENDESA no valor de cerca de €876,43 (oitocentos e setenta e seis euros e quarenta e três cêntimos) decorrente do fornecimento de serviços de electricidade à casa de morada de família - documento nº8 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido e uma dívida de cerca de €3.127,53 (três mil cento e vinte e sete euros e cinquenta e três cêntimos) ao NOVO BANCO contraída a título de empréstimo pessoal para fazer face às despesas comuns do casal cuja cobrança foi delegada à empresa INTRUM PORTUGAL - documento nº 9 junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido. Pelo que se encontra numa situação de extrema carência económica, tendo de recorrer a ajuda financeira e material por parte de familiares e de colegas que, inclusivamente, lhe têm dispensado comida, sob pena de a assistente e o seu filho passarem fome, tendo-lhe já sido passado pela Junta de Freguesia de ………. Atestado de Insuficiência Económica - documento nº 1 O junto com o pedido de indemnização civil cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido. Foram tidos em consideração os documentos de fls. 29 a 35 36 a 49, 60 a 67, 69 a 90, 100 a 106, 145, 182,241 (aditamento), 50 (auto de exame e avaliação), 51 a 52 (auto de apreensão), 123 a 128 (auto de denúncia), 146 (participação), 178 a 181 (mensagens), 183 (guia de entrega), 213 a 214 (assento de nascimento), 395 a 397 (acordo de promoção e protecção), 398, 399 (recibo de salário), 400, 401 (guia de tratamento), 402 (adenda ao contrato de arredamento), 403 (pedido), 404 a (adenda), 405 (mensagem), 406, 407, 408 a 409 (factura), 410 (mensagem), 411 (atestado)427 a 430 (relatório social) e 498 (certificado de Registo Criminal do arguido quanto aos seus antecedentes criminais). Quanto aos factos não provados tal deve-se à ausência de prova. …”. ***** É pacífica a jurisprudência do STJ[5] no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação[6], sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso. Da leitura dessas conclusões e tendo em conta as questões de conhecimento oficioso, afigura-se-nos que as questões fundamentais a decidir no presente recurso são as seguintes[7]: I– Ininteligibilidade da sentença; II– Medida da indemnização. ***** Cumpre decidir. I– Alega o Recorrente que a sentença é ininteligível, atento o teor do facto não provado n.º 1. Importa, desde já, assinalar que o meio adequado para pedir o esclarecimento de obscuridades ou ambiguidades da sentença não é o recurso, mas requerimento próprio para a sua correcção (art.º 380º/1-b) do CPP). De qualquer forma, tendo a decisão subido em recurso, nos termos do art.º 380º/2 do CPP, a correcção do lapso pode ser feita por este tribunal. Verificamos que, na verdade, o texto do facto provado n.º 1 é, aparentemente ininteligível. Mas, como afirma o Exm.º Magistrado do MP na sua resposta, se tivermos em conta o facto imputado no art.º 1º da acusação[8], o facto provado n.º 1 e a fundamentação da matéria de facto, forçoso é concluir que o que se quis dizer foi “Não se provou que: 1- O arguido e a ofendida BB viveram, em comunhão de mesa e cama, até ao ano de 2015, altura em que se separaram;”, pelo que se trata de um lapso. Procederemos, pois, à correcção do referido lapso. ***** Não vislumbramos na decisão recorrida qualquer dos vícios previstos no art. 410º/2 do CPP, que têm que resultar do próprio texto da decisão recorrida por si só ou conjugada com as regras da experiência comum[9]. ***** II–Entende o Recorrente que a indemnização fixada é exagerada e deve ser reduzida. O tribunal recorrido fundamentou a determinação que fez da indemnização, para além do mais, nos seguintes termos: “.... Nos termos do disposto no artigo 129º do Código Penal (em conjugação com o disposto nos artigos 483º, nº 1, 496º, nº 1 e 562º e seguintes, todos do Código Civil): "a indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil". A reparação civil arbitrada em processo penal não é um efeito da condenação, o supra mencionado artigo apenas remete para a lei civil. Para além das sanções penais que venha a sofrer, o agente de um delito encontra-se obrigado a reparar o dano do ofendido por via da restituição do produto do crime ou da equivalente indemnização no plano jurídico-civilístico. A obrigação de indemnizar resultante da prática de factos ilícitos pressupõe a observância dos requisitos constantes do artigo 483º, nº 1 do Código Civil. Preceitua o artigo 483.º, n.º 1 do Código Civil que: "Aquele que, com dolo ou mera culpa violar ilicitamente os direitos de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação". Importa, assim, apurar a existência de um comportamento do agente dominável pela vontade, ilícito enquanto violador do direito de outrem, culposo no sentido de o agente optar livremente por conduta diversa daquela exigível pela ordem jurídica, a verificação de um dano e o nexo causal entre a conduta do agente e os danos que lhe sobrevieram. Só e apenas quando preenchidos cumulativamente os pressupostos acima indicados incorrerá o agente em responsabilidade civil por factos ilícitos e, eventualmente, no pagamento da respectiva indemnização. Em relação aos danos não patrimoniais, ou seja, prejuízos que, insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização - vide Antunes Varela in "Das Obrigações em Geral", I, 10.ª, 2000, página 601. Tal situação encontra-se salvaguardada pela lei civil uma vez que o artigo 496º, nº 1 do Código Civil dispõe que: "na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito". O Ministério Público pediu a condenação do arguido no pagamento de uma indemnização à ofendida nos termos dos artigos 21º, nº 1 e 2 da Lei nº 1 12/2009, de 16.09, e 82°-A do Código de Processo Penal. Porém, já após a dedução da acusação, a assistente deduziu pedido de indemnização civil, o qual foi liminarmente admitido. Como dispõe o artigo 21º, nº 1 e nº 2 da Lei nº 122/2009, de 16.09 (regime jurídico aplicável à prevenção da violência doméstica e à protecção e assistência às suas vítimas) "À vítima é reconhecido, no âmbito do processo penal, o direito a obter uma decisão de indemnização por parte do agente do crime, dentro de um prazo razoável (... ) Para efeito da presente lei, há sempre lugar à aplicação do disposto no artigo 82º-A do Código de Processo Penal, excepto nos casos em que a vítima a tal expressamente se opuser.". De harmonia com o disposto no artigo 82º-A, nº 1 do Código de Processo Penal "não tendo sido deduzido pedido de indemnização civil no processo penal ou em separado, nos termos dos artigos 72º e 77º, o tribunal, em caso de condenação, pode arbitrar uma quantia a título de reparação pelos prejuízos sofridos quando particulares exigências de protecção da vítima o imponham". Considerando que nos presentes autos se mostra formulado pedido de indemnização civil, haverá, então, lugar à apreciação deste e não ao arbitramento de indemnização nos termos das disposições acima mencionadas. A assistente deduziu pedido de indemnização civil peticionando a condenação do arguido/demandado no pagamento de indemnização por danos patrimoniais e por danos não patrimoniais. Em relação aos danos patrimoniais, foi peticionado o pagamento da quantia de €1.800,00 (mil e oitocentos euros) acrescida de juros vincendos à taxa legal até integral pagamento e foram alegadas diversas dívidas decorrentes de despesas comuns do ex-casal nomeadamente dívida à GEBALIS, dívida à NOS, dívida à ENDESA e ao NOVO BANCO. Sucede que estas são dívidas comuns do casal e não são emergentes do crime que o arguido praticou pelo que improcede o pedido de indemnização civil quanto aos danos patrimoniais. Atentos os factos provados e verificando-se que estão preenchidos os pressupostos legais, condena-se o arguido/demandado a pagar à assistente a quantia de €10.000,00 (dez mil euros) acrescida de juros vincendos à taxa legal até integral pagamento a título de indemnização por danos não patrimoniais que lhe causou com a conduta apurada nos presentes autos. ...”. No presente caso, o tribunal recorrido fixou os danos não patrimoniais sofridos pela Ofendida com recurso a critérios de equidade, o que podia fazer, porque previsto legalmente (art.ºs 4º/1-a) e 496º/4 do CC[10]). Embora os tribunais de recurso possam alterar o valor do dano fixado com recurso a critérios de equidade, só o devem fazer quando o tribunal recorrido afronte, manifestamente, “as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida”[11]. No presente caso, entendemos que, tendo em conta os actos praticados pelo Arg.; a extensão e consequências dos danos; os rendimentos da Assistente e do Arg. e a dimensão punitiva da indemnização por danos não patrimoniais[12], a indemnização foi fixada com ponderação, equilíbrio e justeza, pelo não pode deixar de improceder, também nesta parte, o recurso. ***** Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, julgamos não provido o recurso e, consequentemente, confirmamos a decisão recorrida, mas corrigimos o facto dado como não provado sob o n.º 1, que passa a ter a seguinte redacção: “1 - O arguido e a ofendida BB, em comunhão de mesa e cama, até ao ano de 2015, altura em que se separaram;”. Custas pelo Recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 3 (três) UC. * Notifique. D.N.. ***** Elaborado em computador e integralmente revisto pelo relator (art.º 94º/2 do CPP). ***** Lisboa, 11/11/2021 João Abrunhosa Cristina Pego Branco _______________________________________________________ [1]Arguido/a/s. [2]Ministério Público. [3]Código de Processo Penal. [4]Relativamente à fundamentação de facto, cf. a jurisprudência plasmada no Ac. STJ de 17/11/1999, relatado por Martins Ramires, in CJSTJ, III, p. 200 e ss., do qual citamos: “O entendimento do STJ sobre o cumprimento deste preceito encontra-se sedimentado: trata-se de exposição tanto quanto possível completa, mas concisa, dos motivos de facto e indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, sem necessidade de esgotar todas as induções ou critérios de valoração das provas e contraprovas, mas permitindo verificar que a decisão seguiu um processo lógico e racional na apreciação da prova, não sendo ilógica, arbitrária contraditória ou violadora das regras da experiência comum ... .”. Também neste sentido, ver Maria do Carmo Silva Dias, in “Particularidades da Prova em Processo Penal. Algumas Questões Ligadas à Prova Pericial”, Revista do CEJ, 2º Semestre de 2005, pp. 178 e ss., bem como a doutrina e a jurisprudência constitucional citadas. No mesmo sentido, cf. Sérgio Gonçalves Poças, in “Da sentença penal – Fundamentação de facto”, revista “Julgar”, n.º 3, Coimbra Editora, p. 21 e ss.. Ver ainda José I. M. Rainho, in “Decisão da matéria de facto – exame crítico das provas”, Revista do CEJ, 1º Semestre de 2006, pp. 145 e ss. donde citamos: “Em que consiste portanto a especificação dos fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção? Consiste simplesmente na indicação das razões fundamentais, retiradas a partir das provas segundo a análise que delas fez o julgador, que levaram o tribunal a assumir como real certo facto. Ou, se se quiser, consiste em dizer por que motivo ou razão as provas produzidas se revelam credíveis e decisivas ou não credíveis ou não decisivas. No primeiro caso o tribunal explica por que julgou provado o facto; no segundo explica por que não julgou provado o facto. … a motivação não tem porque ser extensa, de modo a significar tudo o que foi probatoriamente percepcionado pelo julgador. Pelo contrário, deve ser concisa, como é próprio do que é instrumental, conquanto não possa deixar de ser completa.”. Ver, por último, o acórdão do Tribunal Constitucional de 17/01/2007, in DR, 2ª Série, n.º 39, de 23/02/2007, que decidiu, além do mais, “Não julgar inconstitucional a norma dos artigos 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal, interpretados no sentido de que não é sempre necessária menção específica na sentença do conteúdo dos depoimentos da arguida e das testemunhas de defesa.”. [5]Supremo Tribunal de Justiça. [6]“Cfr. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 05.12.2007; proferido no proc. nº 1378/07, disponível in Sumários do Supremo Tribunal de Justiça; www.stj.pt. “O objecto do recurso é definido e balizado pelas conclusões extraídas da respectiva motivação, ou seja, pelas questões que o recorrente entende sujeitar ao conhecimento do tribunal de recurso aquando da apresentação da impugnação – art. 412.º, n.º 1, do CPP –, sendo que o tribunal superior, tal qual a 1.ª instância, só pode conhecer das questões que lhe são submetidas a apreciação pelos sujeitos processuais, ressalvada a possibilidade de apreciação das questões de conhecimento oficioso, razão pela qual nas alegações só devem ser abordadas e, por isso, só assumem relevância, no sentido de que só podem ser atendidas e objecto de apreciação e de decisão, as questões suscitadas nas conclusões da motivação de recurso, questões que o relator enuncia no exame preliminar – art. 417.º, n.º 6, do CPP –, a significar que todas as questões incluídas nas alegações que extravasem o objecto do recurso terão de ser consideradas irrelevantes. Cfr. ainda Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 24.03.1999, CJ VII-I-247 e de 20-12-2006, processo 06P3661 em www.dgsi.pt) no sentido de que o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas [Ressalvando especificidades atinentes à impugnação da matéria de facto, na esteira do doutrinado pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-02-2005, quando afirma que :“a redacção do n.º 3 do art. 412.º do CPP, por confronto com o disposto no seu n.º 2 deixa alguma margem para dúvida quanto ao formalismo da especificação dos pontos de facto que no entender do recorrente foram incorrectamente julgados e das provas que impõem decisão diversa da recorrida, pois que, enquanto o n.º 2 é claro a prescrever que «versando matéria de direito, as conclusões indicam ainda, sob pena de rejeição» (...), já o n.º 3 se limita a prescrever que «quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar (...), sem impor que tal aconteça nas conclusões.” -proc 04P4716, em www.dgsi.pt; no mesmo sentido o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-06-2005, proc 05P1577,] (art.s 403º e 412º do Código de Processo Penal), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art. 410º nº 2 do Código de Processo Penal e Acórdão do Plenário das secções criminais do STJ de 19.10.95, publicado no DR Iª série A, de 28.12.95).” (com a devida vénia, reproduzimos a nota 1 do acórdão da RC de 21/01/2009, relatado por Gabriel Catarino, no proc. 45/05.4TAFIG.C2, in www.dgsi.pt). [7]Foi interposto, pelo Arg., um recurso intercalar, que foi admitido para subir com o que fosse interposto da decisão final. No entanto, nas conclusões do recurso interposto da decisão final, não referiu interesse na sua apreciação, nem o fez depois de convidado para o efeito, razão pela qual dele não conheceremos. [8]Com o seguinte teor: “1. O arguido e a ofendida BB viveram, em comunhão de mesa e cama, na Rua .... ...., Lote ..., ....., em L....., entre o ano de 2000 e 2015, altura em que se separaram.”. [9]Assim, o Ac. do STJ de 19/12/1990, proc. 413271/3.ª Secção: " I - Como resulta expressis verbis do art. 410.° do C.P.Penal, os vícios nele referidos têm que resultar da própria decisão recorrida, na sua globalidade, mas sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, designadamente declarações ou depoimentos exarados no processo durante o inquérito ou a instrução ou até mesmo no julgamento (...). IV. É portanto inoperante alegar o que os declarantes afirmaram no inquérito, na instrução ou no julgamento em motivação de recursos interpostos". [10]Código Civil. [11]Neste sentido, veja-se a seguinte jurisprudência: - Acórdão do STJ de 09/06/2010, relatado por Fernando Frois no proc. 562/08.4GBMTS.P1.S1, do qual citamos: “…Estando em causa a fixação do valor da indemnização por danos não patrimoniais com apelo a um julgamento segundo a equidade, em que os critérios que «os tribunais devem seguir não são fixos» – Antunes Varela/Henrique Mesquita, Código Civil Anotado, 1.º vol., anotação ao art. 494.º - «devem os tribunais de recurso limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, “as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida”» – só se justificando uma intervenção correctiva se a indemnização se mostrar exagerada por desconforme a esses elementos. Neste sentido podem ver-se os acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça de 16-10-2000, processo n.º 2747/00-5ª; de 29-11-2001, processo n.º 3434/01-5ª; de 16-05-2002, processo n.º 585/02-5ª; de 14-11-2002, processo n.º 3316/02-5ª; de 08-05-2003, processo n.º 4520/02-5ª; de 17-06-2004, processo n.º 2364/04-5ª; de 09-12-2004, processo n.º 4118/04-5ª; de 24-11-2005, processo n.º 2831/05-5ª; de 13-07-2006, processo n.º 2172/06-5ª; de 07-12-2006, processo n.º 3053/06-5ª; de 27-11-2007, processo n.º 3310/07 -5ª; de 06-12-2007, processo n.º 3160/07-5ª; de13-12-2007, processo n.º 2307/07-5ª; de 13-03-2008, processo n.º 2589/07-5ª; de 03-07-2008, processo n.º 1226/08-5ª; de 11-09-2008, processo n.º 587/08-5ª; de 11-02-2009, processo n.º 313/09-3ª; de 25-02-2009, processo n.º 390/09-3ª; de 12-03-2009, processo n.º 611/09-3ª; de 15-04-2009, processo n.º 3704/08-3ª. No acórdão de 11-07-2006, revista n.º 1749/06-6ª, consignou-se que salvo caso de manifesto arbítrio na fixação da indemnização, o STJ não pode sobrepor-se ao Tribunal da Relação na apreciação do quantum indemnizatório por esta julgado equitativo. O juízo equitativo é critério primordial e sempre corrector de outros critérios. …”; - Acórdão do STJ de 28/10/2010, relatado por Lopes do Rego no proc. 272/06.7TBMTR.P1.S1, do qual citamos: “…Temos entendido que – quando o cálculo da indemnização haja assentado decisivamente em juízos de equidade, - ao Supremo não compete a determinação exacta do valor pecuniário a arbitrar, já que a aplicação de puros juízos de equidade não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», mas tão somente a verificação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação casuística da individualidade do caso concreto «sub juditio». Como se afirma, por ex., no ac. de 5/11/09, proferido no p. 381-2002.S1: Finalmente – e no nosso entendimento – não poderá deixar de ter-se em consideração que tal «juízo de equidade» das instâncias, alicerçado, não na aplicação de um critério normativo, mas na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, não integra, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», pelo que tal juízo prudencial e casuístico das instâncias deverá , em princípio, ser mantido, salvo se o julgador se não tiver contido dentro da margem de discricionariedade consentida pela norma que legitima o recurso à equidade – muito em particular, se o critério adoptado se afastar, de modo substancial, dos critérios que generalizadamente vêm sendo adoptados, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da adopção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados, e , em última análise, o princípio da igualdade. …”; - Acórdão do STJ de 07/12/2011, relatado por Santos Carvalho no proc. 461/06.4GBVLG.P1.S1, do qual citamos: “…Além de que não só «escapam à admissibilidade de recurso “as decisões dependentes da livre resolução do tribunal”» como, em caso de julgamento segundo a equidade, «devem os tribunais de recurso limitar a sua intervenção às hipóteses [que não é a dos autos] em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, “as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida”» (STJ 16-10-2000, recurso n.º 2747/00-5, 17-06-2004, recurso n.º 2364/04-5 e STJ 27-11-2007, recurso n.º 3310/07-5). …”; - Acórdão da RC de 01/02/2012, relatado por Maria Pilar de Oliveira, no proc. 6/06.6PTLRA.C1, do qual citamos: “…Como o dano não patrimonial consiste num prejuízo que atinge bens imateriais, insusceptível de avaliação pecuniária, é irreparável mas susceptível de ser compensado por um equivalente monetário, residindo a dificuldade em encontrá-lo, por apelo, sempre imperfeito, ao que o dinheiro pode propiciar e que constitua um lenitivo no sentido de encontrar um equilíbrio entre a dor psicológica e física e o que o dinheiro em substituição pode propiciar. No encontro desse ponto de equilíbrio reside o exercício da equidade, critério para que a lei aponta. E nesta matéria, ao invés de buscar exemplos que possam servir de comparação, entende-se mais significativo salientar que o Supremo Tribunal de Justiça vem acentuando que estando em causa critério de equidade, as indemnizações arbitradas apenas devem ser reduzidas quando afrontem manifestamente as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das regras da vida (cfr. entre outros o Acórdão de 7.12.2011 proferido no processo 461/06.4GBVLG.P1.S1 publicado em www.dgsi.pt), como igualmente acentua que o valor indemnizatório deve ter carácter significativo, não podendo assumir feição meramente simbólica (cfr. entre outros o Acórdão proferido no processo 526/08.4TMS.P1.S1 de 8.6.2010). …”. [12]Nesse sentido, vejam-se os seguintes acórdãos: - do STJ de 14/11/2006, relatado por Faria Antunes, no proc. 06A2899, in www.dgsi.pt; - do STJ de 15/04/2009, relatado por Raul Borges, no proc. 08P3704, in www.dgsi.pt; - do STJ de 13/01/2010, relatado por Santos Carvalho, no proc. 476/09.0PBBGC.P1.S1, in www.dgsi.pt; |