Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | PAULO FERNANDES DA SILVA | ||
Descritores: | NULIDADE DE SENTENÇA FUNDAMENTAÇÃO OPOSIÇÃO ENTRE FUNDAMENTOS E DECISÃO OBJECTO DO PROCESSO IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ARQUITECTURA BOA-FÉ ABUSO DE DIREITO LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 02/13/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | (artigo 663.º, n.º 7, do CPCivil): I. A sentença deve estar minimamente motivada de facto e de direito, sendo nula aquela em que falte de todo em todo tal motivação ou em que esta seja absolutamente incompreensível, não cumprindo, assim, o dever constitucional e legal de justificação que deve revestir qualquer decisão judicial. II. Os fundamentos então em oposição com a decisão quando ocorre uma desconformidade entre a motivação da decisão e o dispositivo desta. III. Sem prejuízo da prejudicialidade que o discurso jurídico impõe, o juiz deve referir-se aos temas, aos assuntos nucleares do processo, suscitados pelas partes, bem como àqueles de que oficiosamente deva conhecer, cumprido que se mostre o contraditório, não se exigindo, contudo, que o juiz aprecie toda e qualquer consideração ou argumento tecido pelas partes. IV. Sob pena de rejeição do recurso da decisão de facto, na impugnação desta o Recorrente tem um triplo ónus: (i) concretizar os factos que impugna, (ii) indicar os concretos meios de prova que justificam a impugnação e impõem uma decisão diversa, sendo que caso tenha havido gravação daqueles deve o Recorrente indicar as passagens da gravação em que funda a sua discordância, e (iii) especificar a decisão que entende dever ser proferida quanto à factualidade que impugna. V. A boa fé constitui um padrão de conduta que reclama dos contraentes deveres de confiança, cooperação e lealdade próprios do sistema jurídico. VI. É abusivo um exercício do direito contrário a procedimento anterior do titular de tal direito, por minar a confiança por que devem pautar as relações jurídicas. VII. Na responsabilidade contratual, o dever de indemnizar o credor pressupõe uma situação de inexecução da obrigação, culposa e danosa. VIII. Na litigância de má fé está em causa a postura ignóbil, processual ou substancial, ativa ou omissiva, dolosa ou com negligência grave, de quem é parte em processo judicial. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa I. RELATÓRIO. A A., A …, LDA., intentou processo comum de declaração contra a R., B …, LDA., deduzindo o seguinte pedido: «Deve a presente ação ser julgada procedente por provada e por via dela ser declarada a nulidade do negócio jurídico celebrado com a Ré, e em consequência ser a R. condenada a devolver à Autora todos os valores por ela recebidos. Ou, SUBSIDIARIAMENTE, condenar-se a Ré no pagamento à Autora de quantia que vier a liquidar-se em execução de sentença correspondente aos danos decorrentes do atraso na abertura do estabelecimento comercial a título de indemnização derivada de responsabilidade civil contratual nos termos sobreditos». Como fundamento do seu pedido, a A. alegou, em suma, que em 09.03.2021 celebrou com a R. dois contratos de prestação de serviços, com vista ao licenciamento camarário de obras de reconstrução de um edifício/armazém de que é proprietária, obrigando-se a R. a elaborar os respetivos projetos de arquitetura e de especialidades. Referiu também que pagou à R. o valor de €71.711,20 pela totalidade dos projetos, com IVA, sendo que era condição que a obra estivesse pronta até final de 2021, condição essa que foi transmitida à R. e por esta aceite. Aludiu que dos contratos em causa não constam a identificação do coordenador do projeto, nem dos autores dos projetos, diversamente do que prescreve o artigo 7.º. n.º 2, da Lei n.º 40/2015, de 01.06. Sustentou igualmente que até ao momento da entrega do projeto de arquitetura na Câmara Municipal da Praia da Vitória a A. não teve conhecimento de quem eram os autores dos projetos ou a quem pertencia a autoria da elaboração dos mesmos, nunca lhe tendo sido facultado o acesso aos projetos de especialidade até ao momento da entrega dos mesmos para licenciamento na Câmara. Mencionou ainda que o valor máximo da empreitada foi estabelecido em €1.000.000,00 e que a empreitada do projeto entregue na Câmara ultrapassava exponencialmente tal valor, pelo que a A. viu-se impossibilitada de fazer uso e qualquer aproveitamento do projeto para o qual contratou a R. e pelo qual pagou, termos em que se encontra sem empreitada, sem armazém e sem projeto arquitetónico que possa aproveitar. Finamente, referiu que a R. não só não disponibilizou os projetos de especialidade à A. como, no que respeita ao projeto por si executado, não respeitou nem o prazo acordado entre as partes, nem sequer o orçamento que a A. havia fixado inclusivamente com a anuência da R., o que causou danos à A., a contabilizar em execução de sentença. A R. contestou, alegando, em resumo, que não se comprometeu com prazos para execução do contratado, tendo apresentado o projeto de arquitetura na Câmara em 19.03.2021. Referiu também que nunca ocultou à A. o nome dos técnicos responsáveis pela elaboração dos projetos de especialidades, sendo que a A. assinou a guia de remessa e o requerimento de início do processo camarário onde são identificados todos os técnicos, a ordem profissional a que pertencem e qual o seguro de responsabilidade que possuem, tendo a A. tido acesso àqueles projetos em 04.05.2021. Mencionou igualmente que o projeto de arquitetura foi aprovado em 22.04.2021 e os projetos da especialidade em 30.06.2021, tendo sido emitido o Alvará de construção em 05.08.2021, após o que, na sequência de reunião havida em 10.09.2021 entre as partes, a R. informou a A. que cessava as suas funções por manifesta quebra de confiança e respeito. Alegou ainda que a A. litiga sem razão e de má-fé, procurando refinanciar o seu investimento agora à custa da R., a pretexto de uma pretensa invalidade formal, não substancial, de algo que quis, a celebração do contratado com a R., e cujos frutos desse trabalho aceitou e entregou na Câmara para aprovação. Nestes termos, a R. concluiu pedindo que a ação seja julgada improcedente e a R. absolvida do pedido. As partes juntaram diversos documentos e indicaram prova pessoal. Realizou-se a audiência prévia, na qual, além do mais, foi proferido despacho saneador, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova. Foi deferida a realização de perícia colegial. Junto o relatório da perícia, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com sessões em 16.11.2023 e 14.02.2024. Seguidamente, o Juízo Central Cível e Criminal de Angra do Heroísmo proferiu sentença cujo dispositivo é do seguinte teor: «i. Julgo totalmente improcedente, por totalmente não provada, a presente ação e, em consequência, absolvo a Ré B …, LDA de todos os pedidos contra si deduzidos pela Autora, A …, LDA. ii. Condeno a Autora A …, LDA como litigante de má fé na multa de 60 (sessenta) Unidades de Conta». Inconformada com tal decisão, dela recorreu a A., tendo apresentado as seguintes conclusões: «1º. O presente recurso versa sobre a matéria de facto e a matéria de direito da decisão proferida em primeira instância pelo … Juízo Central Cível e Criminal de Angra do Heroísmo. 2º. Recorre-se, para tais alegações, da gravação da prova, para os efeitos do disposto no n.º 7 do art.º 638 do Código de Processo Civil. 3º. A A. instaurou a presente ação declarativa contra a Ré a rogando que fosse declarada a nulidade do negócio jurídico celebrado entre A e R, com a revogação dos seus efeitos e devolução dos valores entretanto pagos por A. a R.; e ainda, subsidiariamente que fosse a Ré condenada no pagamento dos danos provocados pelo incumprimento contratual. 4º. Em suma, a A. alega que o contrato não foi preenchido com os requisitos legais quanto à sua forma, e ainda que a dar-se como válido o contrato a R. não cumpriu com os seus deveres contratuais; ao passo que a autora se defende tanto por impugnação como por exceção. 5º. Considera, a A., que foram incorretamente julgados os factos n.º 7, 13, 14, 19, 20, 24, 26, 29, 30, e ainda erradamente dados como não provados os factos c), k), d), e), f), g), h), i), o), p), q); argumentação que se encontra nos locais assinalados da alegação. 6º. A decisão sobre a matéria de facto não está fundamentada, em obediência ao previsto no art.º 607, n.º 4 e 5 do C.P.C.. 7º. Os fundamentos estão em clara contradição com a sentença recorrida, pelo que se verifica a nulidade da sentença, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.º 615 do C.P.C.. 8º. Isto porque o Tribunal a quo funda a sua convicção em documentos que demonstram exatamente o contrário daquilo que resulta da convicção do Tribunal. 9.º Da prova testemunhal produzida resulta, ainda, razão à A., tendo o Tribunal apenas fundado a sua convicção nas declarações de parte da Ré. 10º. Só a Ré violou as obrigações contratuais celebradas com a A.. 11º. A Ré não cumpriu a obrigação contratual assumida de não exceder o orçamento de 1.000.000,00€. 12º. A Ré não cedeu os direitos de autor do projeto para poderem ser aproveitados. 13º. A Ré exigiu dos técnicos de especialidade a retirada do seu termo de responsabilidade do projeto. 14º. O prazo inicialmente previsto para conclusão da obra sofreu atraso devido ao embargo provocado pela Ré. 15º. As conclusões do relatório pericial são livremente apreciáveis pelo juiz, mas para se afastar delas o juiz fica obrigado a um dever especial de fundamentação, que não cumpriu. 16º. Mesmo suscitado pela A., o Tribunal a quo acabou por não apreciar a nulidade do contrato em causa. 17.º A Ré, ao retirar a responsabilidade da obra, incumpriu com as suas obrigações contratuais. 18.º A A. foi condenada em litigância de má-fé por factos que foi a própria A a enunciar no seu articulado, como se os tivesse escondido. 19.º Por isso deve, ainda, a A., ser absolvida do pedido de litigância de má-fé. 20.º Na sentença recorrida o Tribunal violou as normas dispostas no art.º 286, 289º, 406º, 483º, 1154º do código civil, assim como o art.º 7 da Lei n.º 40/2015, de 1 de Julho; o art.º 11 do II anexo da Portaria n.º 701-H/2008; e ainda 607º, n.º 2 do art.º 608, n.º 1, al. b) c) e d) do art.º 615 todos estes do C.P.C. Termos em que, sempre com o douto suprimento de V.Ex.ªs, se pugna pela procedência do recurso interposto, ordenando-se: a) A declaração da nulidade da sentença proferida, remetendo-se ao tribunal de origem para correção da referida nulidade. b) Quando assim se não entenda ser proferida decisão que altere a matéria de facto no sentido proposto. c) Em qualquer dos casos, que seja a Ré condenada a devolver a A. tudo aquilo que recebeu em consequência do contrato nulo, e subsidiariamente d) A indemnizá-la pelas consequências do seu incumprimento a liquidar a execução de sentença». A R. contra-alegou, sustentando a manutenção da decisão recorrida. Colhidos os vistos, cumpre ora apreciar a decidir. II. OBJETO DO RECURSO. Atento o disposto nos artigos 663.º, n.º 2, 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, todos do CPCivil, as conclusões do recorrente delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo do conhecimento de questões que devam oficiosamente ser apreciadas e decididas por este Tribunal da Relação. Nestes termos, atentas as conclusões deduzidas pela A. e pela R., nos presentes autos está em causa apreciar e decidir: · Da nulidade por falta de fundamentação, · Da nulidade por contradição da factualidade com a decisão, · Da nulidade por omissão de pronúncia · Da impugnação da decisão de facto, · Da nulidade do contrato, · Da pretensão indemnizatória da A. · Da condenação daquela como litigante de má fé. Assim. III. DA NULIDADE POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. (Conclusões 6 e 20 das alegações de recurso). A Recorrente alegou, em suma, que a decisão recorrida não está fundamentada, termos em que considerou a mesma nula, conforme artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPCivil. Analisemos. Nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea b), do CPCivil, «[é] nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão». A sentença deve estar minimamente motivada de facto e de direito, sendo nula aquela em que falte de todo em todo tal motivação ou em que esta seja absolutamente incompreensível, não cumprindo, assim, o dever constitucional e legal de justificação que deve revestir qualquer decisão judicial. A fundamentação escassa, deficiente ou incorreta não constitui causa de nulidade da decisão, conforme a apontada disposição legal. Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, volume I, edição de 2020, página 763, em anotação ao referido artigo 615.º, no que ora está em causa a sentença é nula quando ocorre «(…) a absoluta falta de fundamentação e não a fundamentação alegadamente insuficiente e ainda menos o putativo desacerto da decisão (…)». No mesmo sentido, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13.10.2020, processo n.º 3015/06.1TBVNG.P1.S1, refere que «[q]uanto ao dever de fundamentar as decisões que se impõe ao juiz por imperativo constitucional e legal, mostra-se pacificamente aceite na doutrina e jurisprudência que só a falta absoluta de fundamentação (fáctica ou jurídica) conduz à nulidade da decisão, não integrando tal vício, uma fundamentação deficiente que apenas pode merecer cabimento em sede de erro de julgamento». In casu. Após o «Relatório», a decisão recorrida explicitou sucessivamente, de forma inteligível, o «Objeto do litígio», as «Questões a decidir, os «Factos Provados», os «Factos Não Provados», a «Fundamentação da Matéria de Facto» e o «Direito» aplicável, concluindo com a prolação de uma «Decisão». Ou seja, a decisão recorrida mostra-se fundamentada, conforme artigo 607.º, n.ºs 2 a 6, do CPCivil. Designadamente, na fundamentação da decisão de facto, consta da decisão recorrida que: «O tribunal fundou a sua convicção, quanto aos factos provados: - Quanto aos factos provados nºs 1 a 4, o teor dos escritos juntos como Doc. 1 e Doc. 2 com a petição inicial. - Quanto aos factos provados nºs 5, 6 e 7, no acordo das partes em sede de articulados. - Quanto aos factos provados nºs 8, 9, 10 e 13, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do escrito junto como Doc. 8 com a contestação subscrito pelos representantes legais da Autora, datado de 05/05/2021, onde constam os nomes de todos os técnicos autores dos projetos das especialidades, e com o teor do depoimento da testemunha C … (arquiteto da Câmara Municipal da Praia da Vitória), o qual se revelou espontâneo, objetivo e coerente. - Quanto ao facto provado nº 11, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor dos escritos juntos como Doc. 10, 11, 12 e 13 com a contestação. - Quanto ao facto provado nº 12, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor dos escritos juntos como Doc. 14 e 15 com a contestação. - Quanto ao facto provado nº 14, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor dos escritos juntos como Doc. 16 e 7 com a contestação. - Quanto ao facto provado nº 15, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor dos escritos juntos como Doc. 16 e 6 com a contestação. - Quanto aos factos provados nºs 16, 17, 19, 20, 21, 22 e 24, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do depoimento da testemunha D … (arquiteta, trabalha no mesmo atelier da Ré), o qual se revelou espontâneo, objetivo e coerente, e da testemunha E … (arquiteta), o qual se revelou espontâneo, objetivo e coerente. - Quanto ao facto provado nº 18, o teor dos escritos juntos com a contestação como Doc. 17 e 18 com a contestação. - Quanto ao facto provado nº 23, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do escrito junto como Doc. 19 com a contestação e com o teor do depoimento da testemunha C … (arquiteto da Câmara Municipal da Praia da Vitória), o qual se revelou espontâneo, objetivo e coerente. - Quanto ao facto provado nº 25, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do escrito junto como Doc. 20 com a contestação. - Quanto ao facto provado nº 26, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do escrito junto como Doc. 21 com a contestação. - Quanto ao facto provado nº 27, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, sendo que a Autora, na pessoa do seu ilustre mandatário, admitiu este facto na sessão de julgamento do dia 14/02/2024, conforme consignado na respetiva ata. - Quanto ao facto provado nº 28, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes. - Quanto ao facto provado nº 29, o teor do escrito junto como Doc. 4 com a petição inicial em conjugação com o teor do depoimento da testemunha C … (arquiteto da Câmara Municipal da Praia da Vitória), o qual se revelou espontâneo, objetivo e coerente. - Quanto ao facto provado nº 30, o teor do Relatório Pericial datado de 25 de maio de 2023, junto ao processo eletrónico em 30/05/2023 e junto ao processo físico a fls. 235 a 240, o qual, em resposta aos quesitos colocados constantes das alíneas a), b), c), d), e), f), g), h), i), j), l), m), n), o)-2ªparte, p), q), s)-1ªparte, referiu a existência de muitas semelhanças e de soluções idênticas (e que poderiam ser diferentes) no projeto inicial da sociedade de arquitetura B …, Ld.ª (FBARQ), aqui Ré, e no projeto atual da arquiteta F …. - Quanto aos factos provados nºs 31 e 32, o teor do Relatório Pericial datado de 25 de maio de 2023, junto ao processo eletrónico em 30/05/2023 e junto ao processo físico a fls. 235 a 240, o qual respondeu afirmativamente ao quesito constante da alínea k) «Desenvolver um projeto na posse de um levantamento topográfico e do edificado existente em formato digital editável pode ajudar a ganhar tempo na elaboração do mesmo?» e ao quesito constante da alínea r) «Os requerentes A …, Lda. ao terem na sua posse todos os desenhos, peças escritas (memória descritiva com pesquisa histórica) das diversas fases do Estudo Prévio, Licenciamento, Execução em Formato Digital e papel inclusive em formato editável digital DWG, obtiveram uma economia de meios e de tempo para desenvolver o novo projeto com a autora RB?», em conjugação com o teor dos mails juntos como Doc. 21 com a contestação, datados de 22/09/2021, às 11h26 e às 14h28 (no primeiro mail enviado à arquiteta M …, o contabilista da Autora, G …, pediu que fossem disponibilizados «os ficheiros editáveis do Projeto que a A …, Lda. fez convosco para que seja possível dar continuidade ao processo» e no segundo mail, de resposta ao primeiro, a arquiteta M … enviou em anexo ficheiro editável do levantamento topográfico, levantamento do edificado existente, projeto de arquitetura e Arranjos Exteriores, com o teor do depoimento da testemunha G … (contabilista da Autora desde 2020), o qual confirmou que foi pedido à arquiteta N … para que esta disponibilizasse os ficheiros do projeto em modo editável e esta disponibilizou tais ficheiros em modo editável no sentido de a Autora fazer as alterações que entendesse, e com o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais foram concordantes com aquele depoimento nesta matéria. - Quanto ao facto provado nº 33, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor dos escritos juntos como Doc. 1, 2, 3 e 4 com a contestação. - Quanto ao facto provado nº 34, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do escrito junto como Doc. 1 com a petição inicial. - Quanto aos factos provados nºs 35, 36, 37, 38, 39, 40 e 41, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do escrito junto como Doc. 5 com a contestação. - Quanto ao facto provado nº 42, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do escrito junto como Doc. 6 com a contestação. - Quanto ao facto provado nº 43, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do escrito junto como Doc. 7 com a contestação. - Quanto ao facto provado nº 44, o teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes. * A convicção do tribunal, quanto aos factos provados, fundou-se na análise conjugada e cruzada dos meios de prova supra enunciados. ** Quanto aos factos não provados, atendeu-se à falta de produção de meios de prova objetivos e consistentes sobre os mesmos ou à prova do contrário. A testemunha H …, empresário da construção civil e prestador de serviços à Autora desde 2021, prestou um depoimento pouco preciso e pouco distanciado da Autora, para quem trabalha. A testemunha F …, arquiteta e autora do 2º projeto de arquitetura, prestou um depoimento pouco preciso e pouco distanciado da Autora, para quem elaborou o projeto de arquitetura da obra em questão e em execução». Nestes termos, a decisão de facto mostra-se motivada e é compreensível, não sendo necessário que da mesma conste o referido pelas testemunhas. Pode discordar-se de tal fundamentação. Não pode é assacar-se à decisão recorrida o vício da falta de fundamentação ora em causa. Em suma, improcede nesta parte o recurso. IV. DA NULIDADE POR CONTRADIÇÃO DA FACTUALIDADE COM A DECISÃO. (Conclusões 7 a 9 e 20 das alegações de recurso). Invocando o artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do CPCivil, a Recorrente alega que «os fundamentos estão em clara contradição com a sentença recorrida», «[i]sto porque o Tribunal a quo funda a sua convicção em documentos que demonstram exatamente o contrário daquilo que resulta da convicção do Tribunal», sendo que «[d]a prova testemunhal produzida resulta, ainda, razão à A., tendo o Tribunal apenas fundado a sua convicção nas declarações de parte da Ré». Vejamos. No que ora releva, o artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do CPCivil dispõe que a sentença «é nula» quando «[os] fundamentos estejam em oposição com a decisão». Em causa está a desconformidade entre a motivação da decisão e o dispositivo desta. Trata-se de contradição nos termos da decisão em si mesma, entre as respetivas premissas e as suas conclusões. Com refere Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, volume II, edição de 2019, página 436, em causa está «um vício lógico da sentença: o juiz elegeu deliberadamente determinada fundamentação e seguiu um determinado raciocínio para extrair uma dada conclusão; só que esses fundamentos conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a um resultado oposto a esse, isto é, existe contradição entre os fundamentos e a decisão (…). Não se trata de um qualquer simples erro material (…) mas de um erro lógico-discursivo em termos de obtenção de um determinado resultado – contradição ou oposição real». Na situação vertente. Os Recorrentes, embora invoquem o disposto no referido artigo 615.º, n.º 1, alínea c), referem-se a uma contradição entre a factualidade demonstrada nos autos e a decisão do pleito, o que não se reconduz de todo em todo à nulidade a que se refere aquele preceito legal, termos em que improcede a arguida nulidade à luz de tal normativo, sendo que a impugnação da decisão de facto e a aplicação a esta do respetivo direito, no desiderato da prolação de decisão de mérito nos atos, constituem itens a abordar em fase ulterior deste acórdão. V. DA NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA. (Conclusões 16 e 20 das alegações de recurso). Nesta sede o A., aqui Recorrente, alega que o Tribunal recorrido omitiu pronúncia quanto à arguida nulidade do contrato celebrado entre as partes. Analisemos. Segundo o disposto no artigo 608.º, n.º 2, do CPCivil, o Tribunal «deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)». No que aqui releva, o artigo 615.º n.º 1, alínea d), do CPCivil dispõe que «[é] nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (…)». Na omissão de pronúncia estão, pois, em causa questões e não simples razões ou argumentos aduzidos pelas partes. Sem prejuízo da prejudicialidade que o discurso jurídico impõe, o juiz deve referir-se aos temas, aos assuntos nucleares do processo, suscitados pelas partes, bem como àqueles de que oficiosamente deva conhecer, cumprido que se mostre o contraditório, não se exigindo, contudo, que o juiz aprecie toda e qualquer consideração ou argumento tecido pelas partes. Como referem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2.º, edição de 2019, página 737, em anotação ao referido artigo 615.º, «[d]evendo o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (art.º 608-2), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da sentença, que as partes hajam invocado (…)». No mesmo sentido, refere o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18.05.2024, processo n.º 19039/19.6T8LSB.L1.S1, «[a] omissão de pronúncia significa, em traço breve, que ocorre ausência de posição ou de decisão do tribunal sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa, questões que os sujeitos processuais submeteram à apreciação do tribunal, e também as que sejam de conhecimento oficioso, de que o tribunal deva conhecer independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual; esse é o sentido e alcance da imposição legal a ter em conta na elaboração sentença previsto no artigo 608º, nº 2, do CPC e cuja violação determinará a nulidade processual prevista no artigo 615º , nº 1, al. d) 1ª parte do CPC; não se confunde, nem com uma fundamentação ausente ou insuficiente, nem com a discordância relativamente à conclusão retirada». Na situação vertente. No que respeita à arguida nulidade do contrato, a decisão recorrida refere que: «(…) III - Questões a decidir. 1. Da eventual nulidade do contrato celebrado entre as partes por preterição de formalidades legais e suas consequências na esfera jurídica da Autora e da Ré (…) (…) VI – Do Direito. 1. Da eventual nulidade do contrato celebrado entre as partes por preterição de formalidades legais e suas consequências na esfera jurídica da Autora e da Ré (…) (…) Estabelece o art.º 1154.º do Código Civil, sob a epígrafe «Noção», que: «Contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição». Por seu turno, prevê o art.º 7.º, da Lei nº 31/2009, de 03 de julho, na redação mais recente dada pela Lei nº 25/2018, de 14/06, sob a epígrafe «Contrato para elaboração de projeto»: «1 - A elaboração de projeto nos contratos sujeitos à lei portuguesa é contratada por escrito, contendo, sob pena de nulidade, a identificação completa do coordenador de projeto e dos autores de projeto, a especificação das funções que assumem e dos projetos que elaboram, a classificação das obras pelas categorias i, ii, iii e iv, previstas no artigo 11.º do anexo i e no anexo ii da Portaria n.º 701-H/2008, de 29 de julho, bem como a identificação dos elementos do seguro, previsto no artigo 24.º da presente lei, que garante a sua responsabilidade civil. 2 - A elaboração de projeto é contratada, nomeadamente: a) A uma empresa de projeto, com expressa identificação dos autores de projeto e do coordenador de projeto nos termos do número anterior, salvaguardando sempre o cumprimento integral do disposto na presente lei; b) A uma equipa de projeto, de forma global, sempre com expressa identificação dos autores de projeto e do coordenador de projeto». * A Autora invoca que dos contratos celebrados com a Ré não constam todos os elementos indicados no art.º 7º da Lei n.º 31/2009 de 03 de julho, na redação da Lei n.º 40/2015 de 01 de junho, e que, por esse motivo, os contratos seriam nulos. Da leitura dos contratos de prestação de serviços celebrados entre a Autora e a Ré, cujos teores se deram por integralmente reproduzidos no facto provado nº 2, als. a) e b), constata-se que a Ré encontra-se identificada nos mesmos. A identificação dos técnicos que elaboraram os projetos de especialidades consta do requerimento entregue na Câmara Municipal da Praia da Vitória datado de 05/05/2021 assinado pelos representantes legais da Autora (cfr. facto provado nº 10). Afigura-se-nos que os contratos de prestação de serviços celebrados entre a Autora e a Ré não careciam de conter a identificação dos técnicos dos projetos de especialidade e, como tal, não estão feridos de nulidade. Ainda que se entenda de modo diverso, seria de considerar que a Autora age com abuso de direito ao invocar a falta de identificação dos autores dos projetos de especialidade nos contratos celebrados com a Ré. De harmonia com o disposto no art.º 334.º do Código Civil: «É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito». Para Manuel de Andrade, haverá abuso de direito quando «um certo direito, admitido como válido em tese geral, surge, num determinado caso concreto, exercitado em termos clamorosamente ofensivos da justiça, entendida segundo o critério social dominante» (Teoria Geral das Obrigações). Em sentido semelhante, pronuncia-se o Prof. Vaz Serra, para quem, «de um modo geral há abuso de direito quando um certo direito, legítimo (razoável), em princípio, é exercido em determinado caso de maneira a constituir uma clamorosa ofensa do sentimento jurídico dominante» – Abuso do Direito, BMJ Ano 85, p. 253. No caso em apreço, afigura-se-nos que a Autora age com abuso de direito, porquanto verifica-se uma elevadíssima desproporção, que fere em termos clamorosos e chocantes o sentido de justiça, entre a vantagem que seria obtida pela Autora com o recebimento das quantias pagas, a título de honorários, à Ré, e o sacrifício imposto à Ré consistente na devolução das quantias recebidas e pagas pelos serviços prestados à Autora, a título de honorários, sendo que o trabalho contratualizado entre a Autora e a Ré foi concluído pela Ré, o projeto foi aprovado na Câmara Municipal da Praia da Vitória e a identificação dos autores dos projetos de especialidade nunca foi questionada pela Autora (cfr. factos provados nºs 8, 9 e 10). Conforme consta nos factos provados nºs 8, 9, 10, 27, 28, 30, 31 e 32, a Ré nunca ocultou, ou tentou fazê-lo, o nome dos técnicos responsáveis pela elaboração dos projetos de especialidades, nem a Autora teve qualquer interesse em saber quem eram os técnicos que a Ré indicou, a Autora poderia consultar o processo na Câmara Municipal da Praia da Vitória e inquirir quanto aos nomes escolhidos, a identificação dos técnicos que elaboraram os projetos de especialidades consta do requerimento entregue na Câmara Municipal da Praia da Vitória datado de 05/05/2021 assinado pelos representantes legais da A., conforme Doc. 8 junto com a contestação, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido, a Câmara Municipal da Praia da Vitória que analisou e aprovou o processo não apontou quaisquer falhas técnicas ao mesmo e/ou projetos que impedissem a aprovação dos mesmos tal como desejado e requerido pela Autora, a Autora aceitou os contratos e pagou o valor indicado em ambos para os honorários, tendo recebido a respetiva quitação, a Autora aproveitou o projeto feito pela R., tendo o trabalho da nova equipa ficado facilitado e acelerado, pois o novo projeto (01/2021/198) apresenta, em diversas situações, as mesmas opções projetuais propostas por esta, beneficiando-se, assim, do levantamento topográfico, levantamento do edificado existente, projeto de arquitetura e arranjos exteriores entregue anteriores à A., trabalho esse da R., o levantamento topográfico e do edificado existente e custos presentes no projeto inicial da Arq. M … não foram repetidos pela A. visto já terem sido entregues em formato digital editável DWG à A. pela R. e o projeto de Arquitetura inicial também foi cedido pela Ré à A. em formato editável DWG, mesmo depois da reunião do dia 10 de Setembro de 2021, em que a sócia-gerente da R. foi ameaçada pelos clientes. Ou seja, ainda que se considerasse que os contratos de prestação de serviços celebrados entre a Autora e a Ré são nulos, devido à falta de identificação dos autores dos projetos de especialidade, os factos provados supra descritos apontam no sentido de que a Autora age com abuso de direito e que a restituição pela Ré das quantias pagas pela Autora pelos serviços que a Ré lhe prestou, tendo o alvará sido emitido pela Câmara Municipal da Paria da Vitória em 05/08/2021 com base nos projetos de arquitetura e de especialidades elaborados pela Ré, fere, de forma clamorosa, o sentido de justiça, devendo o direito à restituição das quantias entregues, caso se considerasse existir nulidade dos contratos de prestação de serviços entre a Autora e a Ré, ser sacrificado à luz do instituto do abuso de direito, revelando-se o exercício de tal direito ilegítimo por exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé, na modalidade de venire contra factum proprium, improcedendo, por esta via também, em consequência, o pedido de restituição das quantias pagas pela Autora à Ré, a título de honorários». Em função dos excertos transcritos da decisão recorrida é, pois, manifesto que a decisão recorrida não deixou de pronunciar-se quanto à suscitada nulidade dos contratos, pelo que carece de fundamento a arguida nulidade daquela decisão, sendo que da justeza de tal pronúncia cuidaremos em fase ulterior deste acórdão. Não pode é confundir-se nulidade por omissão de pronúncia com a discordância quanto a esta. Improcede, assim, também nesta o recurso. VI. DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO. (Conclusões 1 a 5, 8, 9 e 15 das alegações de recurso). 1. Segundo o disposto no artigo 640.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do CPCivil, «1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes». Ou seja, sob pena de rejeição do recurso da decisão de facto, na impugnação desta o Recorrente tem um triplo ónus: (i) concretizar os factos que impugna, (ii) indicar os concretos meios de prova que justificam a impugnação e impõem uma decisão diversa, sendo que caso tenha havido gravação daqueles deve o Recorrente indicar as passagens da gravação em que funda a sua discordância, e (iii) especificar a decisão que entende dever ser proferida quanto à factualidade que impugna. Como refere Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, edição de 2018, páginas 163, 168 e 169, em anotação ao referido artigo 640.º, com a reforma processual-civil de 2013 «foram recusadas soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição dos julgamentos, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recurso genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, (…), tendo o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente[1]». «(…) A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão de facto deve verificar-se em algumas das seguintes situações: (…) «a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (arts. 635.º, n.º 4, e 641.º, n.º 2, al. b)); (…) b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art.º 640.º, n.º 1, al. a)); (…) c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.); (…) d) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda; (…) e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação. (…) As referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor. Trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da autorresponsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo (…)». No mesmo sentido, Lebre de Freitas, Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2.º, edição de 2022, páginas 97 e 98, em anotação ao referido artigo 640.º do CPCivil, referem que «[v]ê-se que o recorrente é destinatário de exigentes ónus legais, na medida em que está obrigado a indicar sempre os concretos pontos de facto que considera terem sido incorretamente julgados, indicando-os na fundamentação da alegação e sintetizando-os nas conclusões, bem como a identificar os concretos meios de prova, constantes do processo ou que tenham sido registados, que, do seu ponto de vista, impunham decisão diversa da recorrida (cf. art.º 662-1). Tem assim o recorrente, sob cominação da rejeição do recurso na parte em que estes ónus não tenham sido observados, de demonstrar o erro na fixação dos factos materiais em causa, resultante da formação de uma convicção assente num erro na apreciação das provas que ao juiz cabe livremente apreciar (art.º 607, n.ºs 4 e 5), recorrendo às presunções judiciais concretamente mais adequadas, de acordo com as regras da experiência (…). Tem, por isso, também o recorrente o ónus de indicar ao tribunal “a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de factos impugnadas”». «(…) Não ficam por aqui os ónus das partes». «A gravação da produção de prova (…) tem como consequência, de acordo com o n.º 2, que o recorrente (…) tem de indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo de poder proceder à sua transcrição. Se não o fizer, o recurso é rejeitado (…)». Na matéria, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08.02.2024, processo n.º 7146/20.7T8PRT.P1.S1, refere que «a rejeição do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto apenas deve verificar-se quando falte nas conclusões a referência à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, através da referência aos «concretos pontos de facto» que se considerem incorretamente julgados (alínea a) do n.º 1 do artigo 640.º), sendo de admitir que as restantes exigências (alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo. 640.º), em articulação com o respetivo n.º 2, sejam cumpridas no corpo das alegações». 2. No caso vertente. A Recorrente entende que foram incorretamente julgados os factos provados 7, 13, 14, 19, 20, 24, 26, 29 e 30, assim como os factos dados como não provados de c) a i), k) e o) a q), conforme conclusão 5 do seu recurso, pelo que a dilucidação deste Tribunal na matéria restringe-se a tal factualidade. Vejamos. 2.1. Do facto provado 7. O Tribunal recorrido deu aí como provado que: «7. Até ao momento da entrega do projeto de arquitetura na Câmara Municipal da Praia da Vitória, com vista à obtenção da aprovação para licenciamento, a Autora não teve conhecimento de quem eram os autores dos projetos ou a quem pertencia a autoria da elaboração dos mesmos. (art.º 12º da p.i.)» Fundamentou tal «no acordo das partes em sede de articulados». Ora, na matéria, a Recorrente, embora considere como incorretamente julgado tal facto, não indica na motivação e respetivas conclusões os meios probatórios que impunham diversa da recorrida, nem a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre a matéria em causa, incumprindo, pois, os ónus de impugnação da matéria de facto referidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 640.º, n.º 1, do CPCivil. Contraditoriamente, a fls. 7 do seu recurso, a Recorrente socorre-se até do facto provado 7 para fundamentar a arguida nulidade dos contratos em causa. Nestes termos, cumpre rejeitar a impugnação do facto provado 7. 2.2. Do facto provado 13. O Tribunal recorrido deu então como provado que: «13. Os projetos, ao serem apresentados na C.M.P.V., tiveram o requerimento que lhes deu entrada assinado também pelos representantes da A., pelo que estes tiveram conhecimento daqueles, da data da sua apresentação, da identidade do técnico responsável, dos respetivos termos de responsabilidade, das seguradoras que os representam, e puderam consultá-los, conforme documento junto com a contestação como Doc. 8, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 30º da contestação)» Fundamentou tal factualidade no «teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do escrito junto como Doc. 8 com a contestação subscrito pelos representantes legais da Autora, datado de 05/05/2021, onde constam os nomes de todos os técnicos autores dos projetos das especialidades, e como o teor do depoimento da testemunha C … (arquiteto da Câmara Municipal da Praia da Vitória) a qual se revelou espontâneo, objetivo e coerente». Na matéria a Recorrente invocou o depoimento da testemunha C … e os factos provados 11 e 43, sem indicar a decisão que, no seu entender, deve ser proferida na matéria, incumprindo, pois, o ónus de impugnação da matéria de facto referida na alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPCivil, o que só por si é motivo para rejeição do recurso da decisão de facto nesta sede. De todo o modo, não se vislumbra qualquer desconformidade entre os referidos factos provados 11, 13 e 43. No facto provado 13 não se refere que o requerimento aí mencionado foi entregue na Câmara Municipal da Praia da Vitória por gerente da A. Por isso, o excerto do depoimento da testemunha C … transcrito pela Recorrente releva-se absolutamente impertinente à matéria factual em causa, sendo certo que aí se reproduzem generalidades e, também por isso, nada se aduz àquela factualidade Do documento n.º 8 da contestação, requerimento de apresentação dos projetos de especialidade consta a identificação dos respetivos projetistas, sendo que tal requerimento encontra-se assinado pelos gerentes da A., conforme esta reconheceu na sessão de julgamento da manhã de dia 14.02.2024. Ou seja, mesmo que nesta parte não fosse de rejeitar o recurso da matéria de facto, sempre o mesmo haveria que ser julgado improcedente. 2.3. Do facto provado 14. O Tribunal recorrido deu como tal provado que: «14. O documento de estimativa de custos da obra junto com a contestação como Doc. 16 indica o valor estimado para a mesma - € 920.000,00 - e o mesmo foi aceite pela Autora, uma vez que este documento acompanha o requerimento inicial, bem como a guia de remessa assinada pelos representantes da A. e depois foi-lhes remetida por mail a 25/03/2021, assinado pelos sócios gerentes da A., quando deram entrada, a 19/03/2021, ao pedido de licenciamento de obras, aprovação do projeto, conforme documento junto com a contestação como Doc. 7, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 32º da contestação)». O Tribunal recorrido fundamentou tal nas «declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se (…) revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor dos escritos juntos com os Doc. 16 e 6 com a contestação». Embora a Recorrente considere o facto em causa como incorretamente julgado, contraditoriamente refere na sua motivação de recurso que «tal facto prova (…) a versão da A. segundo a qual a Ré sabia que a obra não poderia exceder o valor de um milhão de euros, como sendo o disponível da A. para gastar», conforme página 13 do seu recurso. Ora, também aqui a Recorrente não cumpriu o ónus de impugnação da matéria de facto referida na alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPCivil, o que só por si é motivo para rejeição do recurso da decisão de facto nesta sede. De todo o modo, da análise dos indicados documentos 7 e 16 da contestação decorre a factualidade provada em causa, sendo que do excerto referido pela Recorrente quanto à testemunha D …, que este Tribunal da Relação de Lisboa ouviu a partir do media studio do Citius, designadamente 32:20 a 35:43 minutos, não decorre o contrario do provado. Em suma, mesmo que nesta parte não fosse de rejeitar o recurso da matéria de facto, sempre o mesmo haveria que ser julgado improcedente. 2.4. Do facto provado 19. Consta aí como provado que: «19. A Ré afastou-se do processo por força das alterações não contratualizadas, já pós-conclusão da fase de projeto de execução, que a A. pretendia, à força, introduzir trazendo um desenho feito por um terceiro (Sr. MB) que pretendia utilizar como base da alteração do projeto de arquitetura, insistindo com a intenção de demandar a Ré judicialmente, caso não aceitasse proceder às alterações solicitadas. (art.º 37º da contestação)» Relativamente a tal facto o Tribunal recorrido referiu que o mesmo se baseou: No «teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do depoimento da testemunha D … (arquiteta, trabalha no mesmo atelier da Ré), o qual se revelou espontâneo, objetivo e coerente, e da testemunha E … (arquiteta), o qual se revelou espontâneo, objetivo e coerente. Mais uma vez, também aqui, a Recorrente não cumpriu o ónus de impugnação da matéria de facto referida na alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPCivil, o que só por si é motivo para rejeição do recurso da decisão de facto nesta sede. De todo o modo, na matéria factual em causa, para além de generalidades, a Recorrente invocou excertos do depoimento das testemunhas D …, 36:10 a 36:24 minutos e 39:00 a 40:20 minutos e E …, 16:30 a 17:20 minutos, que este Tribunal da Relação de Lisboa ouviu a partir do media studio do Citius, os quais de modo algum justificam decisão diversa da factualidade em causa, conforme artigo 662.º, n.º 1 do CPCivil. 2.5. Do facto provado 20. Como tal o Tribunal recorrido deu como provado que: «20. Após consulta da Ordem dos Arquitetos, na sequência dessa reunião que teve lugar a 10/09/2021 com a presença da sócia-gerente da R., os sócios gerentes da A. bem como com o Sr. H … e a Sra. I … que se apresentou como jurista e mais tarde veio a R. a saber que era filha do Sr. H …, apesar de na reunião se comportarem todos como se não se conhecessem uns aos outros, a Ré informou a Autora que cessava as suas funções por manifesta quebra de confiança e de respeito. (art.º 38º da contestação)». Fundamentou tal facto nos mesmos termos do facto provado 19 supra referido: declarações de parte da R. e depoimento das testemunhas D … e E …. De novo, a Recorrente não cumpriu o ónus de impugnação da matéria de facto referida na alínea c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPCivil, o que só por si é motivo para rejeição do recurso da decisão de facto nesta sede. Apesar disso, diga-se, ainda, que o alegado na matéria pela Recorrente não justifica a pretendida alteração da factualidade, pois olvida a Recorrente que o referido conhecimento de que a Sra. I … era filho do Sr. G… reporta-se à R. e não às testemunhas D … e E …, cujos excertos indicados pela Recorrente foram ouvidos por este Tribunal da Relação de Lisboa a partir do medio studio do citius, não se descortinando aí «testemunhos discordantes». 2.6. Do facto provado 24. O Tribunal recorrido deu aí como provado que: «24. Com a emissão do alvará, atestando a conformidade com a lei dos projetos apresentados (arquitetura e especialidades), o trabalho da R. estava concluído. (art.º 42º da contestação)». Fundamentou tal facto nos mesmos termos dos factos provados 19 e 20 supra referido: declarações de parte da R. e depoimento das testemunhas D … e E …. Ora, na matéria, a Recorrente, embora considere como incorretamente julgado tal facto, limita-se a referir generalidades, não indicando na motivação, nem nas respetivas conclusões os meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, nem a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre a matéria em causa, incumprindo, pois, os ónus de impugnação da matéria de facto referidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 640.º, n.º 1, do CPCivil, termos em que cumpre rejeitar a impugnação do facto provado 24. 2.7. Do facto provado 26. Refere-se aí como provado que: «26. Aquando do termo da intervenção da R., esta entregou à A., em 22/09/2021, os suportes digitais em formato editável (DWG) de todo o projeto de arquitetura, levantamento topográfico e levantamento do edificado existente que foi a base do novo projeto de arquitetura apresentado pela nova arquiteta da A., conforme documento junto com a contestação como Doc. 21, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 44º da contestação)». O Tribunal recorrido fundamentou tal factualidade no «teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Ré, a arquiteta M …, as quais se nos revelaram objetivas e coerentes, em conjugação com o teor do escrito junto como Doc. 21 com a contestação». Por sua vez, a Recorrente entende que tal facto foi incorretamente julgado, invocando na matéria o depoimento da testemunha F …, bem como as declarações de parte da R. e o exame pericial. Vejamos. O facto provado 26 encerra em si mesmo duas realidades factuais diversas: - Por um lado, refere aí que R. entregou à A. os suportes digitais em formato editável (DWG) de todo o projeto de arquitetura, levantamento topográfico e levantamento do edificado existente; - Por outro, menciona igualmente que tais elementos constituíram a base do novo projeto de arquitetura apresentado pela nova arquiteta da A. Ora, no que respeita àquele primeiro segmento factual, quanto à entrega dos suportes digitais editáveis, o documento n.º 21 da contestação invocado na decisão recorrida não foi impugnado e dele se infere tal entrega eletrónica, termos em que urge manter o constante da decisão recorrida nessa matéria. Aliás, o contrário também não se infere das referências feitas ao depoimento da testemunha F … pela Recorrente, pois elas dizem respeito ao procedimento da própria testemunha e não à relação entre as partes. Quanto à relevância dos referidos suportes digitais no novo projeto de arquitetura, trata-se de matéria absolutamente inócua à decisão do mérito da causa, pelo que em razão do princípio da limitação de atos, conforme artigo 131.º do CPCivil, não se procederá aqui à sua dilucidação, devendo, por isso, eliminar-se do facto provado 26 a factualidade respetiva, termos em que tal facto deve passar a ter a seguinte redação: 26. Aquando do termo da intervenção da R., esta entregou à A., em 22/09/2021, os suportes digitais em formato editável (DWG) de todo o projeto de arquitetura, levantamento topográfico e levantamento do edificado existent, conforme documento junto com a contestação como Doc. 21, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 44º da contestação). 2.8. Do facto provado 29. Consta aí como provado que: «29. Com data de 30/09/2021, foi lavrado, pela Câmara Municipal da Praia da Vitória, Auto de Embargo de Demolição Parcial, Reconstrução e Ampliação de Edificação destinada a comércio e armazém que a A …, Ld.ª «estava a levar a efeito sem licença, sito no … da …, …, da freguesia de Santa Cruz, porquanto verifiquei que as mesmas obras estão em desacordo com o previsto na alínea a) do nº 1 do art.º 102-B, do Decreto-Lei nº 555/99 de 16 de dezembro, e ulteriores alterações, o que tudo é infração prevista e punida pela alínea a) do nº 1 e nº 2 do art.º 98.º do Decreto-Lei nº 555/99 de 16 de dezembro e ulteriores alterações», conforme documento junto com a petição inicial como Doc. 4, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 47º, parte final, da p.i.)». O Tribunal recorrido fundamentou tal facto no «teor do escrito junto como Doc. 4 com a petição inicial em conjugação com o teor do depoimento da testemunha C … (arquiteto da Câmara Municipal da Praia da Vitória), o qual se revelou espontâneo, objetivo e coerente». Ora, na matéria, a Recorrente, embora considere como incorretamente julgado tal facto, limita-se a referir generalidades, não indicando na motivação, nem nas respetivas conclusões os meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, nem a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre a matéria em causa, incumprindo, pois, os ónus de impugnação da matéria de facto referidos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 640.º, n.º 1, do CPCivil, termos em que cumpre rejeitar a impugnação do facto provado 29. 2.9. Do facto provado 30. O Tribunal recorrido deu então como provado que: «30. A Autora aproveitou o projeto feito pela Ré, tendo o trabalho da arquiteta F …, que a Autora contratou após a Ré ter cessado a relação contratual com a Autora, ficado facilitado e acelerado, pois o novo projeto da arquiteta F … apresenta, em diversas situações, as mesmas opções projetuais propostas por esta, beneficiando-se, assim, do levantamento topográfico, levantamento do edificado existente, projeto de arquitetura e arranjos exteriores entregue anteriores à Autora, trabalho esse da Ré. (art.º 46º da contestação)». Fundou tal factualidade nos seguintes termos: No «teor do Relatório Pericial datado de 25 de maio de 2023, junto ao processo eletrónico em 30/05/2023 e junto ao processo físico a fls. 235 a 240, o qual, em resposta aos quesitos colocados constantes das alíneas a), b), c), d), e), f), g), h), i), j), l), m), n), o)-2ªparte, p), q), s)-1ªparte, referiu a existência de muitas semelhanças e de soluções idênticas (e que poderiam ser diferentes) no projeto inicial da sociedade de arquitetura B …, Ld.ª (FBARQ), aqui Ré, e no projeto atual da arquiteta F …». A Recorrente considera incorretamente julgado o facto provado 30, fundando-se no relatório pericial constante dos autos. Ora, procedem aqui as considerados supra feitas quanto ao facto provado 24, ponto 2.7. supra, pelo sendo a matéria factual em causa impertinente ao desfecho da causa, deve o facto 30 ser eliminado da decisão de facto: 30. (Eliminado) 2.10. Dos factos não provados c), k) e d). A Recorrente alega que tais factos foram «erradamente dados como não provados», sem, indicar, contudo, a factualidade concreta que tem como provada, omitindo, assim, o ónus a que se refere a alínea c), do n.º 1 do referido artigo 640.º do CPCivil, o que só por si constitui motivo de rejeição do recurso. De todo o modo, quanto ao indicado em c) e K) a Recorrente refere-se tão-só à «urgência da elaboração dos projetos», expressão com necessidade de densificação, sendo que a factualidade em causa é muito mais abrangente e na parte substancial da mesma a Recorrente nada aduz. O mesmo se diga no que respeita ao mencionado em d): a contratação do tio de um dos representantes da A. é aspeto irrelevante no contexto da factualidade em causa, na medida em que esta se refere à necessidade de construção substancial do armazém até ao final de junho de 2021 e quanto a este segmento a Recorrente nada esclarece no seu recurso. 2.11. Do facto não provado e). O Tribunal recorrido deu aí como não provado que: «e) Que, ainda que o empreiteiro tentasse acelerar o pedido dos materiais de forma a agilizar o processo e facilitar os trabalhos da Autora, tal nunca tivesse sido possível pois nunca tivesse sido facultado o acesso aos projetos de especialidade até ao momento de entrega dos mesmos para licenciamento na Câmara. (art.º 14º da p.i.)». A Recorrente entende que tal facto deve ser dado como provado em função do depoimento da testemunha F …, concretamente 11:30 a 11:50 minutos. Ora, ouvido tal excerto a partir do media studio do citius, conclui-se que o mesmo não pode fundamentar a factualidade em causa, pois trata-se de um depoimento vago quanto à factualidade em causa, designadamente não está temporalmente delimitado, sendo que a própria testemunha não foi perentória nas suas afirmações, «eu penso que (…)», revelando um conhecimento indireto. Por outro lado, refere-se tão-só ao projeto de engenharia quando o facto em causa tem a ver com os diversos projetos de especialidade. Aliás, tendo tais projetos sido entregues na Câmara em 05.05.2021 e levados então ao conhecimento da A., conforme designadamente factos provados 10, 11 e 13, em momento necessariamente anterior ao projeto de execução, conforme factos provados 11, 25 e 41, a factualidade em causa na alínea e) impunha que os projetos de especialidade tivessem ficado prontos em data anterior a 05.05.2021, o que dificilmente se concebe no contexto dos factos apurados. Improcede, pois, nesta parte o recurso. 2.12. Do facto não provado f). Consta aí como não provado: «f) Que, aquando da primeira reunião com a Ré, a Autora tivesse explicitado que o valor máximo que poderiam disponibilizar para a construção e tivesse estabelecido o valor de 1.000.000,00€ (um milhão de euros). (art.º 15º da p.i.)». A Recorrente entende que tal facto deve ser dado como provado com fundamento em excertos que indica do depoimento da testemunha Marco Fagundes, 13:37 a 14:37 minutos, bem como no documento 16 da contestação. Analisemos. Àquele documento refere-se o facto provado 14, sendo que aí está em causa uma estimativa de custos indicados à Câmara, no âmbito do processo de urbanismo que aí foi instaurado, e a factualidade em causa na referida alínea f) é diversa daquela: tem a ver com o contrato celebrado entre as partes e ao limite máximo que a A. podia pagar com a obra em causa. A partir do medio studio do citius, procedeu-se à audição do indicado excerto do depoimento da testemunha Marco Fagundes, contabilista da A. Dessa audição decorre que a testemunha não esteve presente na primeira reunião entre a A. e a R. e que o seu conhecimento quanto ao valor máximo da empreitada que a A. estava disposta a pagar resulta de conversas que teve com representantes da A., o que é manifestamente insuficiente para dar o facto em causa como provado, pois, nesse circunstancialismo, não se impõe uma decisão diversa, conforme artigo 662.º, n.º 1, do CPCivil. Improcede, assim, também nesta parte o recurso. 2.13. Do facto não provado g). O Tribunal recorrido deu então como não provado: «g) Que a empreitada do projeto conforme entregue na Câmara Municipal da Praia da Vitória para Licenciamento, ultrapassasse exponencialmente o valor que foi indicado à Ré. (art.º 16º da p.i.)». Improcedendo o recurso quanto ao facto não provado f), fica prejudicada a apreciação da matéria factual ora em causa: não tendo ficado provado o valor máximo para a empreitada indicado pela A. à R., de nada serve saber se a execução dos projetos da R. ultrapassavam «exponencialmente» tal valor. Improcede, pois, igualmente nesta sede o recurso. 2.14. Dos factos não provados h) e i). O Tribunal recorrido deu aí como não provado: «h) Que o valor tivesse sido ultrapassado e que a Autora se tivesse visto impossibilitada de fazer uso e qualquer aproveitamento do projeto para o qual contratou a Ré e pelo qual pagou. (art.º 17º da p.i.). i) Que a Autora se encontre sem empreitada, sem armazém, e sem projeto arquitetónico que possa aproveitar. (art.º 18º da p.i.) A Recorrente entende que tal factualidade deve ser dada como provada em consequência do facto provado 29, do Auto de Embargo que constitui o documento 4 da petição inicial, e de excertos do depoimento da testemunha C …, 05:18 a 05:32 minutos e 20:00 a 20:26 minutos. Vejamos. Procede aqui o referido em 2.12. e 2.13. no que respeita ao valor máximo da obra em causa acordado: não se tendo provado tal valor não pode concluir-se que ele foi ultrapassado, nem que em razão disso a A. ficou impossibilitada de executar o projeto da R. Por outro lado, o documento n.º 4 da petição inicial, Auto de Embargo da CMPV, conforme referido facto provado 29, refere-se à execução de obras não licenciadas, ou seja, não compreendidas no Alvará de Construção de 05.08.2021, emitido em função do projeto da R., pelo que assacar a esta sem mais a responsabilidade por tais embargos configura-se absolutamente infundado. Ouvidos os indicados excertos do depoimento da testemunha C … não se vislumbra que os mesmos se reportem à matéria factual ora em causa, sendo que o referido Auto de Embargo não atribui este ao facto de «os autores dos projetos apresentados terem retirado os seus termos de responsabilidades», mas antes à execução da obra divergir do licenciado, conforme decorre do referido Auto de Embargo, documento que a própria A. juntou aos autos. Improcede, assim, igualmente nesta sede o recurso. 2.15. Do facto não provado o). O Tribunal recorrido fez constar então como não provado: «o) Que a Autora se tivesse visto forçada a contratar novo arquiteto que assegure os trabalhos/ projetos de forma a dar início à obra. (art.º 45º da p.i.)». A Recorrente refere que tal facto deve ser dado como provado «por inerência e decorrência de se considerar como provado o facto das alínea[s] h) e i), mas também porque decorre da retirada pela Ré da sua responsabilidade conjugada com a assinatura de novos projetos pela Arqª F …». Apreciemos. Embora os factos não provados h) e i) permaneçam como tal, conforme 2.14. supra, é uma evidência que a cessação de funções por parte da R. implicou a contratação de um novo arquiteto por parte da A., pois esta manteve pretensão de executar a obra, com um outro projeto, contratação essa que efetivamente sucedeu, tudo conforme factos provados 15, 19, 20, 22, 30, 42 e 43, termos em que importa eliminar dos factos não provados a indicada alínea o) e aditar aos factos provados o seguinte facto: 45. Em razão da cessação de funções da R. a A. teve de contratar um novo arquiteto que fizesse um outro projeto de arquitetura. 2.16. Do facto não provado p). Refere-se aí como não provado: «p) Que até termo da execução de novos projetos e construção efetiva do armazém pelo empreiteiro adjudicado, a Autora se encontrasse privada de obter quaisquer lucros com a exploração de um espaço o qual previa que estivesse terminado e em funcionamento desde junho de 2021, o que lhe tivesse sido assegurado pela Ré, e lhe causasse transtorno e manifesto prejuízo. (art.º 46º da p.i.)». Pretende a Recorrente que tal facto seja considerado provado por decorrência dos factos provados 35 a 37, bem como das regras da experiência comum. Ou seja, a Recorrente não indica um único meio de prova que fundamente a factualidade em causa, incumprindo, pois, o ónus que decorre do referido artigo 640.º, n.º 1, alínea b), do CPCivil, o que constitui motivo de rejeição da sua pretensão nesta sede. Dos factos provados 35 a 37 não resulta também a factualidade em causa. Se o encerramento do armazém decorria da realização de obras, embargadas estas era previsível a reabertura do armazém até ao reinício das obras com os novos projetos, termos em que também as regras da experiência não justificam o requerido pela Recorrente na matéria ora em causa. Improcede, também aqui, o recurso. 2.17. Do facto não provado p). Consta como ali como não provado: «q) Que, em virtude do incumprimento contratual perpetrado pela Ré, tivesse sido forçosamente determinada a suspensão dos trabalhos, mediante Auto de Embargo, datado de 30 de setembro de 2021 descrito no facto provado nº 29. (art.º 47º, parte inicial, da p.i.)». A Recorrente insurge-se quanto a tal, invocando o documento 4 da petição inicial, ou seja, o referido Auto de Embargo, de 30.09.2021. Ora, da simples análise daquele documento decorre a manifesta falta de razão da Recorrente: conforme já se referiu e consta provado sob o número 29, o embargo decorre do facto da A., não a R., estar a levar a efeito uma obra sem licença, termos em que não se vislumbra daí «incumprimento contratual» da R., expressão essa, aliás, que não poderia constar da factualidade provada, por não ser facto, mas uma qualificação jurídica decorrente de factos. Improcede, assim, ainda nesta sede o recurso. * * * Em função do exposto, este Tribunal da Relação de Lisboa tem, pois, como provada a seguinte factualidade: 1. A Autora, pretendendo reconstruir um edifício/armazém destinado a comércio a retalho, celebrou com a Ré contratos de prestação de serviços, com vista ao respetivo licenciamento camarário, obrigando-se a Ré a elaborar os projetos de arquitetura e de especialidades. (art.º 1.º da p.i.); 2. Em 09/03/2021, a Autora e a Ré celebraram dois contratos de prestação de serviços: a) O primeiro contrato teve como objeto a proposta de honorários referente à elaboração dos projetos de Arquitetura, Arranjos Exteriores destinado à construção de um edifício destinado a Comércio a retalho e Armazém, com área bruta total 2949m2, sito na Boa Vista, concelho da Praia da Vitória, conforme documento junto com a p.i. como Doc. 1, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (arts. 2.º e 3.º da p.i.); b) O segundo contrato teve como objeto a proposta de honorários referente à elaboração dos projetos de Especialidades destinado à construção de um edifício destinado a Comércio a retalho e Armazém, com área bruta total 2949m2, sito na Boa Vista, concelho da Praia da Vitória, conforme documento junto com a p.i. como Doc. 2, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (arts. 2.º e 4.º da p.i.); 3. O contrato referente à proposta de honorários para a elaboração do projeto de Arquitetura e Arranjos Exteriores perfez um total honorários de 31.900,00€ (trinta e um mil e novecentos euros) + IVA, conforme documento junto com a p.i. como Doc. 1, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 5.º da p.i.); 4. O contrato referente à proposta de honorários para a elaboração do projeto de Especialidade perfez um total honorário de 29.920,00€ (vinte e nove mil e novecentos e vinte euros) + IVA, conforme documento junto com a p.i. como Doc. 2, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 6.º da p.i.); 5. A Autora pagou o valor de 71.711,20€ (setenta e um mil, setecentos e onze euros e vinte cêntimos) pela totalidade do projeto, já contabilizado com a taxa de IVA em vigor aplicada. (art.º 7.º da p.i.); 6. Ainda que a Arquiteta M … fosse a encarregada do projeto de arquitetura, os projetos de especialidade foram elaborados por diferentes engenheiros contratados pela mesma. (art.º 11.º da p.i.); 7. Até ao momento da entrega do projeto de arquitetura na Câmara Municipal da Praia da Vitória, com vista à obtenção da aprovação para licenciamento, a Autora não teve conhecimento de quem eram os autores dos projetos ou a quem pertencia a autoria da elaboração dos mesmos. (art.º 12.º da p.i.); 8. A Ré nunca ocultou, ou tentou fazê-lo, o nome dos técnicos responsáveis pela elaboração dos projetos de especialidades, nem a Autora teve qualquer interesse em saber quem eram os técnicos que a Ré indicou. (art.º 23.º da contestação); 9. A Autora poderia consultar o processo na Câmara Municipal da Praia da Vitória e inquirir quanto aos nomes escolhidos, sendo que assinou o requerimento de início do processo camarário, conforme documento junto com a contestação como Doc. 8, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido, onde são identificados todos os técnicos. (art.º 24.º da contestação); 10. A identificação dos técnicos que elaboraram os projetos de especialidades consta do requerimento entregue na Câmara Municipal da Praia da Vitória datado de 05/05/2021 assinado pelos representantes legais da A., conforme Doc. 8 junto com a contestação, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 61.º da contestação); 11. Em 05/05/2021 a Ré encaminhou o requerimento apresentado na C.M.P.V. esclarecendo, adicionalmente, que para avançar com a fase de execução dos projetos (essencial para pedidos de orçamentos de empreiteiro) era necessário aguardar pelo parecer da Proteção Civil referente ao projeto de segurança contra incêndios, visto que esta especialidade, reportando-se a um edifício que está classificado na 2.ª categoria de risco, o parecer daquela é vinculativo, ou seja, caso seja solicitado pela Proteção Civil alguma alteração a mesma terá de ser contemplada em todas as especialidades, conforme documentos juntos com a contestação como Docs. 10, 11, 12 e 13. (art.º 27.º da contestação); 12. Foi primeiro aprovado o projeto de arquitetura em 22/04/2021 e só depois os de especialidades em 30/06/2021, conforme documentos juntos com a contestação como Docs. 14 e 15, cujos teores dão-se aqui por integralmente reproduzidos. (art.º 29.º da contestação); 13. Os projetos, ao serem apresentados na C.M.P.V., tiveram o requerimento que lhes deu entrada assinado também pelos representantes da A., pelo que estes tiveram conhecimento daqueles, da data da sua apresentação, da identidade do técnico responsável, dos respetivos termos de responsabilidade, das seguradoras que os representam, e puderam consultá-los, conforme documento junto com a contestação como Doc. 8, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 30.º da contestação); 14. O documento de estimativa de custos da obra junto com a contestação como Doc. 16 indica o valor estimado para a mesma - € 920.000,00 - e o mesmo foi aceite pela Autora, uma vez que este documento acompanha o requerimento inicial, bem como a guia de remessa assinada pelos representantes da A. e depois foi-lhes remetida por mail a 25/03/2021, assinado pelos sócios gerentes da A., quando deram entrada, a 19/03/2021, ao pedido de licenciamento de obras, aprovação do projeto, conforme documento junto com a contestação como Doc. 7, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 32.º da contestação); 15. O novo projeto apresentado pela A., assinado pela Sra. Arq. F …, apresenta um valor estimado de 900.000,00€ quando o da R. era de 920.000,00€, sendo que só pela aplicação do valor do IVA (16%) é que o montante de 1.000.000,00€ é ultrapassado em ambos os casos, conforme documento junto com a contestação como Doc. 6, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 33.º da contestação); 16. A Ré não se responsabilizou em momento algum pelas variações dos preços da mão-de-obra ou dos materiais, assim como também não se responsabilizou contratualmente pela realização da obra, sendo que a parte de construção e da encomenda dos materiais era da exclusiva responsabilidade do empreiteiro e da Autora e o valor estimado para a obra é apenas isso, uma estimativa. (art.º 34.º da contestação); 17. Por força da pandemia de COVID19, bem como agora pela guerra na Ucrânia, os custos dos materiais, bem como da própria mão-de-obra, dispararam por todo o mundo, sendo que tal verifica-se não apenas no caso da Autora, mas em toda a economia. (art.º 35.º da contestação); 18. A Autora apresentou, em 23/11/2021 (conforme documento junto com a contestação como Doc. 17, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido), um novo projeto de arquitetura e de especialidades (este a 16/02/2022, conforme documento junto com a contestação como Doc. 18, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido). (art.º 36.º da contestação); 19. A Ré afastou-se do processo por força das alterações não contratualizadas, já pós-conclusão da fase de projeto de execução, que a A. pretendia, à força, introduzir trazendo um desenho feito por um terceiro (Sr. MB) que pretendia utilizar como base da alteração do projeto de arquitetura, insistindo com a intenção de demandar a Ré judicialmente, caso não aceitasse proceder às alterações solicitadas. (art.º 37.º da contestação); 20. Após consulta da Ordem dos Arquitetos, na sequência dessa reunião que teve lugar a 10/09/2021 com a presença da sócia-gerente da R., os sócios gerentes da A. bem como com o Sr. G … e a Sra. I … que se apresentou como jurista e mais tarde veio a R. a saber que era filha do Sr. G…, apesar de na reunião se comportarem todos como se não se conhecessem uns aos outros, a Ré informou a Autora que cessava as suas funções por manifesta quebra de confiança e de respeito. (art.º 38.º da contestação); 21. Mais tarde veio a Ré a saber que a Autora havia pretendido essa reunião com urgência já após ter consultado outros arquitetos e estando já munida de pelo menos um orçamento alternativo, no sentido de forçar o fim da relação contratual com a Ré, o [que] logrou fazer. (art.º 39.º da contestação); 22. Após ter-se desvinculado da Autora, a Ré, bem como os técnicos que haviam elaborado e se responsabilizado pelos projetos de especialidade, informaram a C.M.P.V. que já não prestavam serviço para a Autora (art.º 40.º da contestação); 23. Tanto o projeto de arquitetura apresentado na C.M.P.V., como o de especialidades, foram aprovados, tendo sido licenciada a construção tal como projetada, pedido e emitido o necessário alvará (05/08/2021) para o início de obras, alvará, esse, levantado pela Autora que, desse modo, expressou a sua aceitação desse ato e de todas as suas consequências, mormente do valor estimado das obras, das características projetadas destas e que estava em condições de as iniciar, conforme documento junto com a contestação como Doc. 19, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 41.º da contestação); 24. Com a emissão do alvará, atestando a conformidade com a lei dos projetos apresentados (arquitetura e especialidades), o trabalho da Ré estava concluído. (art.º 42.º da contestação); 25. A Autora tinha o projeto já aprovado, licenciado e com o respetivo alvará emitido e levantado dos serviços da C.M.P.V. pelos representantes da Autora como já tinha na sua posse o projeto de execução desde o dia 06/08/2021, conforme documento junto com a contestação como Doc. 20, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 43.º da contestação); 26. Aquando do termo da intervenção da R., esta entregou à A., em 22/09/2021, os suportes digitais em formato editável (DWG) de todo o projeto de arquitetura, levantamento topográfico e levantamento do edificado existente, conforme documento junto com a contestação como Doc. 21, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 44º da contestação); 27. A Câmara Municipal da Praia da Vitória que analisou e aprovou o processo não apontou quaisquer falhas técnicas ao mesmo e/ou projetos que impedissem a aprovação dos mesmos tal como desejado e requerido pela Autora (art.º 62.º da contestação); 28. A Autora aceitou os contratos e pagou o valor indicado em ambos para os honorários, tendo recebido a respetiva quitação. (art.º 63.º da contestação); 29. Com data de 30/09/2021, foi lavrado, pela Câmara Municipal da Praia da Vitória, Auto de Embargo de Demolição Parcial, Reconstrução e Ampliação de Edificação destinada a comércio e armazém que a A …, Ld.ª «estava a levar a efeito sem licença, sito no … da …, …, da freguesia de Santa Cruz, porquanto verifiquei que as mesmas obras estão em desacordo com o previsto na alínea a) do nº 1 do art.º 102-B, do Decreto-Lei nº 555/99 de 16 de dezembro, e ulteriores alterações, o que tudo é infração prevista e punida pela alínea a) do nº 1 e nº 2 do art.º 98.º do Decreto-Lei nº 555/99 de 16 de dezembro e ulteriores alterações», conforme documento junto com a petição inicial como Doc. 4, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 47.º, parte final, da p.i.); 30. (Eliminado); 31. O levantamento topográfico e do edificado existente e custos presentes no projeto inicial da Arq. M … não foram repetidos pela Autora visto já terem sido entregues em formato digital editável DWG à Autora pela Ré (art.º 47.º da contestação); 32. O projeto de Arquitetura inicial também foi cedido pela Ré à Autora em formato editável DWG, mesmo depois da reunião do dia 10 de setembro de 2021, em que a sócia-gerente da R. foi ameaçada pelos clientes. (art.º 48.º da contestação); 33. A Autora e a Ré já haviam celebrado dois anteriores contratos com os mesmos objetos, concretamente no dia 04/01/2021, quando a Autora julgava que o seu terreno, antes de ser medido corretamente, tinha a área de apenas 3.872m2, o que correspondia a 1.600m2 de área bruta de construção (total de construção), sendo que, após a Ré ter descoberto, através do levantamento topográfico, que o mesmo tinha uma área substancialmente superior, concretamente de 6.363,25m e que se podia construir um máximo de 3 pisos com, cada um 3.180m2 de área bruta, pretendeu a Autora construir na maior área possível e daí a celebração de novos contratos tendo-lhe sido enviada uma nova proposta para contemplar esse aumento a 04/03/2021, conforme documentos juntos com a contestação como Doc. 1, 2, 3 e 4, cujos teores dão-se aqui por integralmente reproduzidos. (art.º 2.º da contestação); 34. A Autora, conhecedora da área correta do prédio e da área bruta de construção, voltou a pedir novo aumento da área bruta de implantação do edifício em reunião do dia 09/03/2021 tida no escritório da Ré, tendo esta, em resposta, enviado por e-mail nova proposta que veio a ser aceite pela Autora, que corresponde ao Doc. 1, junto com a p.i., cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 3.º da contestação); 35. No terreno da Autora havia uma construção de menor qualidade que estava afeta a armazém, elemento edificado esse que seria objeto das obras projetadas pela Ré, sendo que, no mesmo, verificava-se uma degradação extensa e comprometedora da cobertura por força da exposição marítima (bloco-telha elemento contraindicado atenta a localização do prédio). (art.º 10.º da contestação); 36. A Autora pretendia fazer uso desse espaço comercial, transformando-o em armazém, antes de ser loja, enquanto as obras, no mesmo, decorriam, obras, essas, de ampliação e de remodelação do próprio armazém. (art.º 11.º da contestação); 37. Como foi sempre explicado pela Ré à Autora, não é possível, nem seria jamais licenciado, a realização de obras enquanto o espaço intervencionado tivesse mercadorias guardadas e clientes e funcionários a frequentá-lo. (art.º 12.º da contestação); 38. A Ré chegou a sugerir se pretendiam fazer um projeto por fases, contudo o problema mais imediato da Autora eram as infiltrações que se verificavam e que só poderiam ser resolvidas após um conjunto de trabalhos a nível estrutural incompatíveis com a utilização comercial do espaço, pois havia, desde logo e designadamente, que montar estaleiro, colocar andaimes, remover a estrutura existente com recurso a máquinas pesadas, deixar o edifício sem cobertura temporariamente, realizar uma cinta na parede para chumbar a estrutura metálica, sendo que todas estas obras requerem licenciamento prévio. (art.º 13.º da contestação); 39. Como a Autora pretendia a implantação da loja na zona que seria afeta, temporariamente e durante o decurso da obra, a armazém, o que seria manifestamente incompatível, desde logo em termos de segurança, não foi possível acomodar a sua vontade, o que lhe foi explicado desde o início. (art.º 14.º da contestação); 40. A Autora pretendia proceder obras de demolição de uma estrutura existente no terreno e que unia o forno de cal ao edifício de maior escala (edifício de vãos azuis até ao edifício verde de dois pisos), sendo que foi-lhe também explicado, desde logo por mail de 08/02/2021, que caso quisesse proceder à demolição teria de instruir o processo camarário com os elementos legalmente exigidos ou, poderia fazer a demolição integrada na obra, sendo que ambos os processos de demolição e de construção não podem ser analisados em simultâneo para a mesma obra, havendo que optar por um ou por outro, conforme documento junto como Doc. 5 com a contestação, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido. (art.º 15.º da contestação); 41. A obra exigiria pareceres das várias entidades que têm que se pronunciar sobre os projetos de especialidades (eletricidade, água/esgotos, bombeiros/proteção civil, força aérea uma vez que está no trajeto de aterragens/descolagens, entre outras), tendo a Câmara Municipal da Praia da Vitória que emitir a respetiva licença titulada pelo alvará, e implicaria: a) Demolições, b) Remoção de entulho, c) Fundações, d) Estrutura, e) Paramentos, f) Pavimentos, g) Águas e Esgotos, h) Revestimentos, i) Eletricidade, ited, cctv, j) Carpintarias, k) Pinturas, l) Arranjos Exteriores. (arts. 17.º e 18.º da contestação); 42. Todas essas operações demandam, em circunstâncias normais, não menos que 12 meses, sendo que, no atual projeto apresentado pela Autora, com nova arquiteta, o prazo estimado por esta para a conclusão das obras é igualmente de 12 meses (projeto de licenciamento de arquitetura da atual arquiteta do processo, F …, conforme documento junto com a contestação como Doc. 6, cujo teor dá-se aqui por integralmente reproduzido). (art.º 19.º da contestação); 43. A Ré apresentou o projeto de arquitetura na Câmara Municipal da Praia da Vitória em 19/03/2021, conforme documento junto com a contestação como Doc. 7, tendo o contrato sido assinado dez dias antes. (art.º 20.º da contestação); 44. A sócia-gerente da Ré perguntou no início do processo (antes de apresentar a respetiva proposta) se os potenciais novos clientes pretendiam apenas o orçamento de Projeto de Arquitetura e Arranjos Exteriores ou se pretendiam também os projetos de especialidades, e daí a existência de dois contratos separados (Arquitetura e Especialidades para o cliente poder optar), sendo que, caso a Autora pretendesse apenas prosseguir com o de Arquitetura e Arranjos Exteriores, poderia fazê-lo. (art.ºs 21º e 22º da contestação); 45. Em razão da cessação de funções da R. a A. teve de contratar um novo arquiteto que fizesse um outro projeto de arquitetura. * Este Tribunal da Relação de Lisboa considera que não ficou provado: a) Que a Autora tivesse contratado a Ré para a prestação destes serviços por não ter conhecimento do mercado arquitetista nos Açores e por ter sido a arquiteta sugerida por um conhecido. (art.º 8.º da p.i.); b) Que a relação de confiança que existia entre a Autora e a Ré apenas se gerou com base na recomendação feita quanto à Ré, devido ao facto de esta ter aceitado projetar o edifício e por terem-lhe sido comunicadas, na primeira reunião, as pretensões quanto à edificação do Armazém, pelos representantes da Autora, o Sr. J … e a Sra. L …. (art.º 9.º da p.i.); c) Que a Autora tivesse transmitido a urgência da elaboração do projeto visto que iam ser despejados do local onde se encontravam a exercer a atividade e precisariam de ter o armazém substancialmente pronto até ao final de junho de 2021, condição esta que foi transmitida e aceite por parte da Ré. (art.º 10.º da p.i.); d) Que a Autora tivesse contratado um empreiteiro sugerido pelo tio do Sr. J …, representante da Autora[2], para a edificação do armazém e que lhe tivesse comunicado a mesma pretensão: que o armazém se encontrasse substancialmente construído até ao final do mesmo de junho de 2021. (art.º 13.º da p.i.); e) Que, ainda que o empreiteiro tentasse acelerar o pedido dos materiais de forma a agilizar o processo e facilitar os trabalhos da Autora, tal nunca tivesse sido possível pois nunca tivesse sido facultado o acesso aos projetos de especialidade até ao momento de entrega dos mesmos para licenciamento na Câmara. (art.º 14.º da p.i.); f) Que, aquando da primeira reunião com a Ré, a Autora tivesse explicitado que o valor máximo que poderiam disponibilizar para a construção e tivesse estabelecido o valor de 1.000.000,00€ (um milhão de euros). (art.º 15.º da p.i.); g) Que a empreitada do projeto conforme entregue na Câmara Municipal da Praia da Vitória para Licenciamento, ultrapassasse exponencialmente o valor que foi indicado à Ré. (art.º 16.º da p.i.); h) Que o valor tivesse sido ultrapassado e que a Autora se tivesse visto impossibilitada de fazer uso e qualquer aproveitamento do projeto para o qual contratou a Ré e pelo qual pagou. (art.º 17.º da p.i.); i) Que a Autora se encontre sem empreitada, sem armazém, e sem projeto arquitetónico que possa aproveitar. (art.º 18.º da p.i.); j) Que a Ré não tivesse disponibilizado os projetos de especialidade à Autora bem como, no que respeita ao projeto por si executado, não tivesse respeitado o prazo acordado entre as partes nem o orçamento que a Autora havia fixado inclusivamente com a anuência da Ré. (art.º 40.º da p.i.); k) Que a Ré se tivesse comprometido a executar os referidos projetos dentro do orçamento e dentro do timing que lhe havia sido proposto, e que esse timing fosse condição essencial para a celebração dos contratos em apreço, na medida em que tinha a Autora urgência na execução dos trabalhos em análise. (art.º 41.º da p.i.); l) Que constasse do contrato outorgado entre as partes, no que se reporta ao projeto de execução, a estimativa de custos como elemento essencial, e que fosse pressuposto determinante para a celebração do contrato (art.º 42.º da p.i.); m) Que o trabalho desenvolvido pela Ré com vista à elaboração do projeto ao qual se obrigou, por não se reconduzir ao peticionado pela Autora, designadamente, por exceder manifestamente o orçamento que aquela lhe havia apresentado, o qual limitaria os trabalhos, não apresenta qualquer interesse para a Autora. (art.º 43.º da p.i.); n) Que a Autora visse, ainda na presente data, os trabalhos suspensos, pese embora tivesse, nomeadamente, contratado com o empreiteiro os termos da obra que lhe pretendia adjudicar para acelerar todo o processo de construção assim que os projetos necessários se encontrassem terminados e aprovados. (art.º 44.º da p.i.); o) (Eliminado); p) Que até termo da execução de novos projetos e construção efetiva do armazém pelo empreiteiro adjudicado, a Autora se encontrasse privada de obter quaisquer lucros com a exploração de um espaço o qual previa que estivesse terminado e em funcionamento desde junho de 2021, o que lhe tivesse sido assegurado pela Ré, e lhe causasse transtorno e manifesto prejuízo. (art.º 46.º da p.i.); q) Que, em virtude do incumprimento contratual perpetrado pela Ré, tivesse sido forçosamente determinada a suspensão dos trabalhos, mediante Auto de Embargo, datado de 30 de setembro de 2021 descrito no facto provado n.º 29. (art.º 47.º, parte inicial, da p.i.); VII. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO. (Conclusões 1, 3, 4, 10 a 14 e 17 a 20 das alegações do recurso). Em causa está ora apreciar da suscitada nulidade do negócio jurídico celebrado entre as partes, da requerida indemnização por responsabilidade contratual da R./Recorrida e da condenação da A./Recorrente como litigante de má fé. Vejamos. 1. Não merece controversa que as partes vincularam-se entre si por meio de contrato de prestação de serviços atípico, conforme artigo 1154.º do CCivil: a R./Recorrida obrigou-se a proporcionar à A./Recorrente projetos de arquitetura e arranjos exteriores, bem como projetos de especialidades, destinados à construção de um edifício para comércio a retalho e armazém, mediante o pagamento por parte da A./Recorrente das quantias de €31.900,00 e €29.920,00 respetivamente, acrescidas de IVA à taxa legal, no caso 16%, num total de €71.711,20, conforme factos provados 1 a 4. Tal negócio jurídico foi constituído em 09.03.2021, com duas propostas de honorários da R./Recorrida e a aceitação das mesmas pela A./Recorrente, complementadas em escritos de 19.03.2021 e 05.05.2021, conforme factos provados 10, 13, 14 e 43. Explicitando. Em 09.03.2023 a R./Recorrida apresentou à A./Recorrente uma «proposta de honorários referente à elaboração dos projetos de Arquitetura e Arranjos Exteriores», no valor total de €31.900,00 mais IVA, com várias fases: programa preliminar, estudo prévio, projeto de licenciamento e execução, sendo que em tal escrito a A./Recorrente declarou concordar com tal proposta de honorários, tudo conforme facto provado 2. a) e documento n.º 1 da petição inicial. Na mesma data, em 09.03.2023, a R./Recorrida apresentou à A./Recorrente uma «proposta de honorários referente à elaboração dos projetos de Especialidades»: «Fundações e Estruturas», «Redes Prediais de distribuição de Água e recolha de Esgotos e Águas Pluviais», «Demonstração do Comportamento Térmico e Pré-Certificação Energética», «Projeto Acústico», «Alimentação e Distribuição de Instalação Elétricas», «Instalações Telefónicas e de Telecomunicações», «Projeto de Segurança e de Telecomunicações», «Projeto de Segurança Contra incêndios», «Projeto de AVAC e Ventilação», «Plano de Segurança e Saúde e «Plano de Prevenção e Gestão de Resíduos de Construção e Demolição», no valor total de €29.920,00, mais IVA, com a fase de projeto de licenciamento e projeto de execução, sendo que em tal escrito a A./Recorrente declarou concordar com tal proposta de honorários, tudo conforme facto provado 2. b) e documento n.º 2 da petição inicial. Na sequência daquelas propostas de honorários e respetivas aceitações, a R./Recorrida apresentou os projetos de licenciamento de arquitetura e das diversas especialidades, os quais deram entrada na Câmara Municipal de Praia da Vitória em 19.03.2021 e 05.05.2021, respetivamente, em requerimentos subscritos pela A./Recorrentes, conforme documentos n.ºs 7 e 8 da contestação. Naquele primeiro requerimento de 19.03.2021, remetido à Câmara Municipal de Praia da Vitória, a A./Recorrente declarou, além do mais, juntar «Projeto de Arquitetura e Arranjos Exteriores», referindo como técnica « N …: Arquiteta» e referindo ainda que «a equipa multidisciplinar [era] coordenada pelo(a) Sr(a) Arq. M …», sendo que então a A./Recorrente tomou conhecimento de uma Declaração da Ordem dos Arquitetos e do comprovativo de seguro de responsabilidade civil relativamente àquela arquiteta, conforme facto provado 13 e 43, bem como documento n.º 7 da contestação. No requerimento de 05.05.2021, remetido à Câmara Municipal de Praia da Vitória, a A./Recorrente declarou, além do mais, juntar «Projeto de Estabilidade», cujo «Técnico» era « O …», «Projeto de alimentação e distribuição de energias elétrica», cujo «Técnico» era « P …», «Projeto de redes prediais de águas e esgotos», cujo «Técnico» era « O …», «Projeto de águas pluviais», cujo «Técnico» era « O …», «Projeto de arranjos exteriores», cujo «Técnico» era « N …», «Projeto de infraestruturas de telecomunicações», cujo «Técnico» era « P …», «Estudo de comportamento térmico e demais elementos previstos na Portaria 349-C/2013, de 2 de Dezembro», cujo «Técnico» era « O …», «Projeto de instalações eletromecânicas, incluindo as de transporte de pessoas e ou mercadorias», cujo «Técnico era « Q …», «Projeto de segurança contra incêndios em edifícios», cujo «Técnico» era « R …», «Projeto de condicionamento acústico», cujo «Técnico» era O …» e projeto de «Aquecimento, ventilação e ar condicionado», cujo «Técnico» era «S …», sendo que então a A./Recorrente tomou conhecimento dos seguros de responsabilidade civil relativos àqueles técnicos, conforme facto provado 10 e 13, bem como documento n.º 8 da contestação. Ou seja, o negócio jurídico celebrado entre as partes é integrado pelos referidos escritos de 09.03, 19.03 e 05.05.2021, devendo em função dos mesmos, na sua necessária conjugação entre si, dilucidar-se da respetiva validade e eficácia. 2. Sustenta a Recorrente a nulidade do contrato em causa por o mesmo «não conter identificação completa dos autores de projeto e a especificação das suas funções», referindo que não foi observado o disposto no artigo 7.º da Lei n.º 31/2009, na redação da Lei n.º 40/2015, de 01.06. Segundo aquele preceito, na apontada redação: 1 - A elaboração de projeto nos contratos sujeitos à lei portuguesa é contratada por escrito, contendo, sob pena de nulidade, a identificação completa do coordenador de projeto e dos autores de projeto, a especificação das funções que assumem e dos projetos que elaboram, a classificação das obras pelas categorias i, ii, iii e iv, previstas no artigo 11.º do anexo i e no anexo ii da Portaria n.º 701-H/2008, de 29 de julho, bem como a identificação dos elementos do seguro, previsto no artigo 24.º da presente lei, que garante a sua responsabilidade civil. 2 - A elaboração de projeto é contratada, nomeadamente: a) A uma empresa de projeto, com expressa identificação dos autores de projeto e do coordenador de projeto nos termos do número anterior, salvaguardando sempre o cumprimento integral do disposto na presente lei; b) A uma equipa de projeto, de forma global, sempre com expressa identificação dos autores de projeto e do coordenador de projeto». Ora, visto o negócio jurídico a que as partes se vincularam conforme indicado em 1. supra e, pois, em função da integração dos diversos escritos aí indicados, de 09.03.2021, de 19.03.2021 e de 05.05.2021, considerando o contrato de prestação de serviços em causa na expressão conjunta e integrada de tais escritos, é manifesto que do mesmo consta a identificação dos autores dos diversos projetos e das suas funções, bem como do coordenador de tais projetos e dos respetivos seguros profissionais, diversamente do alegado pela Recorrente. É certo que tal não constava nos referidos escritos de 09.03.2021, mas já não assim dos indicados escritos de 19.03.2021 e 05.05.2021, os quais integram a relação jurídica das partes em causa nos autos, não podendo deixar de consubstanciar a mesma, termos em que o contrato em causa mostra-se válido e eficaz, carecendo de fundamento a suscitada nulidade do mesmo. 3. Se assim não se entendesse, sempre a nulidade do referido contrato invocada pela A./Recorrente haveria que improceder por consubstanciar uma situação de abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium. Com efeito, o artigo 334.º do CCivil, com a epígrafe «Abuso de direito», dispõe que «[é] ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito». A boa fé constitui um padrão de conduta que reclama dos contraentes deveres de confiança, cooperação e lealdade próprios do sistema jurídico. Como refere Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, II, edição de 2017, página 269, a referência à boa-fé «equivale a uma remissão para os valores fundamentais do sistema, presentes nas situações consideradas. Os valores em causa são mediados, como é sabido, pelos princípios da tutela da confiança e da primazia da materialidade subjacente (…). O seu alcance é inesgotável. Analiticamente, ela origina deveres de segurança, de informação e de lealdade, como referido e em termos hoje pacíficos na jurisprudência. (…) Na sua vertente de contrariedade à boa fé, o exercício do direito revela-se, pois, ilegítimo quando seja adverso à confiança, à cooperação e à lealdade próprias das relações entre pessoas. Designadamente, é abusivo um exercício do direito contrário a procedimento anterior do titular de tal direito, por minar a confiança por que devem pautar as relações jurídicas: a sua alteração radical de atitude, contrária à expetativa criada na contraparte, justifica que a sua nova postura não mereça a tutela do direito. Como refere Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria do Direito Civil, edição de 2017, página 242, «[o] direito deve ser exercido sem frustrar expetativas criadas pelo seu titular. No exercício do direito o seu titular deve respeitar a fé (fides servare), deve evitar frustrar a confiança que tenha suscitado em outrem. Se por qualquer razão o titular do direito tiver agido activa ou passivamente de modo a criar em outrem uma confiança legítima relativa ao exercício do direito, não poderá frustrar essa confiança que tenha criado ou contribuído para criar. A frustração de expetativas criadas corresponde ao tipo doutrinário de má fé tradicionalmente designado como venire contra factum proprium (…) Este tipo de má fé assenta na inadmissibilidade de comportamentos contraditórios (…)». Ora, tal contraditoriedade é o que decorre na situação vertente no que respeita à A./Recorrente. Com a aceitação das propostas de honorários da R./Recorrida, bem como dos diversos projetos delas decorrentes, com os diversos elementos juntos, assim como com o pagamento integral de tais honorários, é manifesto que a A./Recorrente criou na R./Recorrida a expetativa de que o contrato de prestação de serviços em causa era válido e eficaz, pelo que vir ora, com a presente ação, desdizer tal, invocando a nulidade do contrato, colocando em absoluta crise a confiança que devem pautar as relações jurídicas, torna ilegítimo o exercício do respetivo direito, termos em que sempre improcederia a suscitada nulidade do contrato, por abuso de direito da A./Recorrente. 4. De todo o modo, mesmo que assim não se entendesse, mesmo que se considerasse nulo o contrato de prestação de serviços em causa, sempre a devolução da retribuição pelo serviço prestado pretendido pela A./Recorrente teria que improceder, conforme disposto no artigo 289.º, n.º 1, do CCivil: dado que a R./Recorrida prestou integralmente a sua prestação e esta, dada a sua natureza, um serviço prestado, não pode ser restituída e tem um valor de mercado que corresponde ao atribuído pelas partes no contrato em causa, sempre a pretendida devolução da quantia entregue pela A./Recorrente à R./Recorrida careceria de qualquer justificação, representando um enriquecimento injustificado daquela. Como refere Clara Sottomayor, Comentário ao Código Civil, Parte Geral edição da UCP, edição de 2014, página 718, em anotação ao referido artigo 289.º, «[e]m regra, o critério para calcular o valor (…) do serviço prestado será aquele que foi adoptado no próprio contrato inválido que fixou o valor da contraprestação, o que tem por consequência que cada uma das partes retém a prestação recebida, equivalendo, na prática, a liquidação do contrato inválido à execução do mesmo». 5. Subsidiariamente, a A./Recorrente peticiona uma indemnização «pelas consequências do (…) incumprimento da R./Recorrida. Apreciemos. Segundo o disposto nos artigos 798.º e 799.º, n.º 1, do CCivil, «[o] devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor», sendo que «[i]ncumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua». Na responsabilidade contratual, o dever de indemnizar o credor pressupõe, assim, uma situação de inexecução da obrigação, culposa e danosa. Como refere Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, volume II, edição de 2018, páginas 251 e 252, a responsabilidade obrigacional pressupõe a ocorrência de um facto ilícito, que «corresponde (…) à violação de uma obrigação», a qual «tem (…) que ser imputável ao devedor», sendo que «não há constituição da obrigação de indemnização se não se verificar um dano» e este deve ser uma «consequência da falta de incumprimento por parte do devedor, exigindo-se, desta forma, o nexo de causalidade entre o facto e o dano». Ora no caso vertente não ficou demonstrada uma situação de inexecução da obrigação por parte da R./Recorrida e muito menos que de tal inexecução tenham resultado prejuízos para a A./Recorrente, conforme designadamente factos não provados f) a q). Pelo contrário, provou-se que a R./Recorrida cumpriu integralmente a prestação a que se tinha obrigado: elaborou os projetos conforme contratado, sendo que os projetos de arquitetura e das especialidades mereceram aprovação camarária, e foi emitido o respetivo alvará de construção. Nestes termos, carece de fundamento a pretensão indemnizatória da A./Recorrente, improcedendo, assim, a ação, conforme decisão recorrida. 6. No que respeita à litigância de má fé. Segundo o disposto no artigo 542.º, n.º 2, do CPCivil, «Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave: a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão». Está em causa a postura ignóbil, processual ou substancial, ativa ou omissiva, dolosa ou com negligência grave, de quem é parte em processo judicial. Como referem João de Castro Mendes e Miguel Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, volume I, edição de 2022, página 104, «[a] litigância de má fé pressupõe que a parte actua com dolo ou negligência grave, de forma diferente daquela que é devida e esperada, violando, nomeadamente, os deveres de lealdade e de probidade». No mesmo sentido referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Lima, Código de Processo Civil Anotado, volume I, edição de 2020, páginas 615 a 617, em anotação ao referido artigo 542.º, «(…) o recurso legítimo aos tribunais não pode restringir-se àqueles que inequivocamente tenham a razão do seu lado. Ao invés, a lei confere uma vasta amplitude ao direito de ação ou de defesa, de maneira que, para além da repercussão no campo das custas judiciais, não retira do decaimento qualquer outra consequência, a não ser que alguma das partes aja violando as regras e princípios básicos por que devem pautar a sua atuação processual (…).» «Através da litigância de má-fé, a lei sanciona a instrumentalização do direito processual em diversas vertentes, quer ela se apresente como uma forma de conseguir um objetivo considerado ilegítimo pelo direito substantivo, quer como um meio de impedir a descoberta da verdade, quer ainda como forma de emperrar ainda mais a máquina judiciária, com a colocação de obstáculos ou com a promoção de expedientes meramente dilatórios. Abarca ainda os casos em que se pretende impedir o trânsito em julgado da decisão e, deste modo, prejudicar a contraparte na tutela ou na realização do direito substantivo que através da decisão lhe seja reconhecido». No que respeita ao juízo de censurabilidade, como refere o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31.10.2023, processo n.º 349/20.8T8LRS-C.L1.S1, «a lei não exige o dolo, bastando-se com a negligência grosseira. Não se torna, pois, necessário a prova da consciência da ilicitude do comportamento do litigante e da intenção de conseguir um objetivo ilegítimo, bastando tão só que, à luz dos concretos factos apurados, seja possível formular um juízo intenso de censurabilidade pela sua atuação». «O Código de Processo Civil, no artigo 542.º, passou a adotar o aforismo tradicional que equipara a culpa lata ao dolo com o intuito de atingir uma maior responsabilização das partes». In casu. Analisada a petição inicial constata-se que A./Recorrente apresentou uma narrativa que omite factos relevantes ao desfecho do mérito da causa, procurando daí tirar proveito, quer por via do pedido de nulidade, quer através do pedido indemnizatório, integrando a sua conduta manifestamente as referidas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 542.º do CPCivil. Com efeito, a A. omitiu que: · O projeto de arquitetura foi apresentado na Câmara em 19.03.2021, dez dias depois da aceitação da nota de honorários e muito antes do termo final acordado para tal; · Tal projeto foi aprovado pela Câmara em 22.04.2021; · Os projetos de especialidades foram apresentados na Câmara em 05.05.2021, escassos 13 dias depois da aprovação do projeto de arquitetura; · Aquando da apresentação daqueles projetos teve conhecimento dos autores dos respetivos projetos e do coordenador da equipa de projetista, assim como de outros elementos relativos aos mesmos; · Os projetos de especialidades foram aprovados pela Câmara em 30.06.2021; · A Câmara emitiu o Alvará para construção da obra em 05.08.2021, o qual levantado pela A.; · A A. teve o projeto de execução em 06.08.2021; · Após aquela data, a A. forçou a R. a alterar o projeto de arquitetura, manifestando o propósito de demandar judicialmente esta caso não aceitasse tal, tendo já então consultado outros arquitetos, bem como um desenho e orçamento alternativos; · O embargo camarário de 30.09.2021 decorreu de a obra estar a ser executada em desrespeito do Alvará de construção e, pois, dos projetos licenciados; · A R. disponibilizou à A. o projeto de arquitetura, inclusive em formato digital editável inclusive. Mais, neste contexto e em função da demais factualidade apurada, a nulidade do contrato e o incumprimento contratual suscitadas pela A. configuram-se absolutamente inconsistentes, o que a A. não podia deixar de saber em razão dos requerimentos apresentados na Câmara, por si subscritos em 19.03.2021 e 05.05.2021, bem como do pagamento integral do preço acordado pelos serviços da R., bem expressivo afinal do cumprimento desta. Estamos, pois, perante uma litigância de má fé substancial por parte da A., a qual é sancionada com multa «entre 2 UC e 100 UC» e deve ser fixada «tendo em consideração os reflexos da violação da lei na regular tramitação do processo e na correta decisão da causa, a situação económica do agente e a repercussão da condenação no património deste», conforme artigo 27.º, n.ºs 3 e 4, do Regulamento das Custas Processuais. Ora, não fosse as apontadas omissões e seguramente que a causa podia ter uma tramitação mais simples e um desfecho mais célere. Por outro lado, no contrato de prestação de serviços em causa foi fixada a retribuição de €71.711,20, com IVA, sendo que tal contrato refere-se a uma obra cuja execução rondará pelo menos um milhão de euros. Nestes termos, a multa de 60 UC aplicada pelo Tribunal recorrido revela-se adequada ao caso. Improcede, pois, também nesta sede o recurso que, assim, não obtém provimento. * * * Quanto às custas. Segundo o disposto nos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPCivil e 1.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais, «[a] decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa», entendendo-se «que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção que o for». Ora, in casu o recurso improcede integralmente, pelo que as custas deverão ser suportadas pela Recorrente. VIII. DECISÃO Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida nos seus precisos termos. Custas do recurso pela Recorrente Lisboa, 13 de fevereiro de 2025 Paulo Fernandes da Silva Laurinda Gemas António Moreira _______________________________________________________ [1] Tal pode envolver, em casos-limite, a totalidade da matéria de facto mas, ainda assim, exige-se a concretização e a motivação das alterações relativamente a cada facto ou conjunto de factos. Mas não legítima a invocação de um generalizado erro de julgamento justificativo da reapreciação global dos meios de prova». [2] Embora a decisão recorrida refira «da Ré», tal deve-se a manifesto lapso de escrita. |