Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
724/08.4TCSNT.L1-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: IVA
FACTURA
CONTRATO DE EMPREITADA
PREÇO
PAGAMENTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/13/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIAL PROCEDÊNCIA
Sumário: Não tendo a empreiteira emitido as facturas nos termos referidos e em conformidade com a lei, não obstante ter recebido os valores correspondentes aos adiantamentos ou parte do preço da empreitada, ela apenas poderá obter o pagamento do valor correspondente ao imposto pelo pagamento do qual é em primeira linha responsável perante a administração fiscal, logo que emita a respectiva factura nos termos da lei (com o recibo correspondente ao preço já por si recebido), funcionando a emissão da factura como condição de exigibilidade legal do valor desse mesmo imposto e da condenação no seu pagamento pelo dono da obra àquela.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes na 2.ª secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO

APELANTES/AUTORES: “A” e mulher “B” (Representados em juízo, pela ilustre advogada CAE, com escritório em Rio de Mouro, conforme instrumento de procuração de 28/05/08  fls. 44  dos autos).

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APELADA/RÉ: “C”Sociedade de Construção Lda. (Representada em juízo pelo ilustre advogado AG, com escritório em Lisboa, conforme instrumento de procuração de fls. 86 dos autos, que substabelece com reserva na pessoa do Dr.. PCJ, aquando da audiência preliminar conforme fls. 129).
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Com os sinais dos autos.
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Os AA propuseram contra a R. a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário onde pedem a condenação da R. a:
a) pagarem-lhes uma indemnização pelos prejuízos que causou pela não conclusão da obra na data acordada no valor de 6.459,60 €;
b) eliminar por si ou à sua custa, os defeitos da obra já detectados e supra identificados no valor actual de 31.000,00€ acrescido do IVA o que perfaz a quantia global de 37.510,00 €;
c) pagarem-lhes os juros à taxa legal de 10%, desde 10 de Junho de 2007, sobre a quantia referida em a) e os juros vincendos até integral pagamento;
d) Pagarem-lhes o que se vier a liquidar a final em execução de sentença;
e) Com todas as legais consequências, nomeadamente a condenação em custas e procuradoria condignas;
Em suma alegaram:
· Em Janeiro de 2006 os AA contactaram a R para a construção de uma moradia sita na Rua …, n.º … … na …, tendo sido elaborado um orçamento que está a fls. 17/19, datado de 2/01/06, que os AA aceitaram tendo efectuado um primeiro pagamento de 30.000,00 €. (art.ºs 1 a 5)
· Embora não conste a data do início e termo da obra a ré comprometeu-se a iniciá-la em Março de 2006 e a concluí-la em Março do ano seguinte, sabendo a Ré que os AA se encontravam numa casa arrendada, arrendamento que acabava em Julho de 2006 prorrogado por mais um ano, porque are não tinha concluído a obra. (art.º 6 a 11)
· Os AA verificaram que os trabalhos frequentemente se encontravam parados, os AA alertavam para o abandono da obra; entretanto os AA foram efectuando os pagamentos que não acompanhavam o desenrolar das obras, pagamentos esse descontextualizados do avanço da obra e solicitados pela R.; os AA remeteram à R. a carta de 10/06/07 que teve a resposta pelo mandatário que exige a liquidação total e imediata da restante parte do preço, o que se não percebe porquanto a 9/98/97 a R reconhece a existência de defeitos na obra. (art.ºs 7 a 23)
· Tendo findado o arrendamento os AA viram-se obrigados a alojarem-se e à sua família na inacabada moradia, tendo sempre insistido pela conclusão e a eliminação dos defeitos, houve contra-ordenação da Câmara por factos executados à revelai dos AA, que foram obrigados a elaborar uma projecto rectificativo, a obra continua por acabar sem eliminação dos defeitos iniciais e aqueles que foram sendo detectados ao longo de meses, no exterior, no interior. (art.ºs 24 a 41)
· O projecto rectificativo, emergente da Câmara Municipal de Sintra importou 907,50 €, a taxa de entrega 53,10 €, os AA tiveram que a expensas suas e atento o estado em que a R. deixou os trabalhos de realizar vários trabalhos, prorrogar o contrato de arrendamento e porque a obra não estando licenciada o fornecimento de água e de luz continua a ser taxa de obras com o inerente custo agravado que só a final se determinará. (art.ºs 42 a 47)
· A eliminação dos defeitos e a conclusão dos trabalhos importa actualmente 31.000,00 € acrescido de IVA no valor total de 37.510,00 €, contabilizando os danos até ao momentos 43.969,00 €, além daqueles que só a final se apurarão. (art.ºs 48 a 51)
· A Ré constituiu-se em mora em 10/06/07.
A Ré citada veio defender-se por excepção em suam alegando:
· Sendo certo que a obra tinha a conclusão prevista para Março de 2007, tal prazo estava dependente do cumprimento por parte dos AA das obrigações que assumiram perante a R nomeadamente o pagamento das quantias previstas no contrato a que acrescia o IVA à taxa legal ou seja 21%, pelos que os valores eram os referidos em 6. (art.ºs 1 a 6)
· Tendo os trabalhos sido concluídos em Novembro de 2006 os AA até essa data apenas haviam pago a quantia de € 155.000,00 e apenas em virtude as insistências do gerente da R. vieram a pagar em 19/12/06 a quantia de 7.500,00 €, perfazendo um total de € 162.500,00, ficando em dívida a quantia de € 37.755,00. (art.ºs 7ª 10)
· Ao longo da execução da obra os AA pediram alterações e inovações comprometendo-se perante a R. a pagar o respectivo custo, que a R. executou imediatamente ou que iria executar, que aumentaram o valor dos trabalhos e dos materiais para além do montante inicialmente orçamentado, no total de € 6.271,71 acrescido de IVA a 21% no total de €7.576,67, o que acrescido dos €37.755,00 perfazia o total de €45.331,57, sendo certo que a R. já havia emitido as suas facturas no valo global de €86.515,00 incluindo € 15.015,00 de IVA, valores cujo pagamento o gerente da R. instou os AA a pagarem em vão procedendo assim a excepção de não cumprimento do art.º 428 do CCIv. (art.ºs 11 a 39, 104).
· A maior parte dos defeitos invocados refere-se a trabalhos por executar, trabalhos que serão executados logo que os AA cumpram a sua obrigação de pagamento, mas muitas obras referidas não são efeitos ou vícios de construção e correspondem a pedidos dos AA e quanto ao erro de implantação da construção no terreno deve-se ao facto de aquando da solicitação do terreno o A. marido ter entregue ao gerente da R. uma planta que marcava a construção no exacto local onde a mesma veio a ser construída, correspondia ao projecto inicialmente apresentado junto do Município e que posteriormente veio a ser substituída, não tendo a R. sido informada de tal alteração, pelo que executou a obra de acordo com a planta que lhe havia sido fornecida; a instalação eléctrica não foi concluída porquanto os AA, entretanto, ocuparam a casa. (art.ºs 40 a 103, 105 1 112)
· Os atrasos na conclusão da obra deveram-se ao incumprimento contratual dos AA. E a R. não teve qualquer responsabilidade na prorrogação do arrendamento da casa arrendada pelos AA, assim como não teve qualquer responsabilidade no projecto rectificativo, sendo impugnados as obras que os AA executaram e o respectivo valor. (art.ºs 113 a 136)
· Do valor total devido pela obra ou seja 200.255,00 € já com IVA a R., facturou aos AA 86.515,00 já com IVA, faltando facturar 93.300,00 a que acresce o IVA a 21% no total de 111.960,00 €, sendo o valor global do facturado de 198.475,00 € já com IVA, sendo que os AA apenas pagaram o montante total de 162.500,00, estando em dívida 35.975,00 €; de trabalhos a mais do orçamentado é devido ao R. o valor global de 6.271,71,00 € a que acresce o IVA a 21% no total de 7.526,05, o que acrescido àquele outro anterior dá um valor final em dívida de 43.501,05 €, valor que, logo que pago, serão emitidas e entregues as respectivas facturas e recibos. (art.ºs 137 a 164)
Houve resposta reiterando a condenação no pedido inicial pedindo a improcedência da matéria d excepção e do pedido reconvencional.
Proferido o saneador tabelar, admitido o pedido reconvencional, foi fixada à acção o valor de 80.470,65 € (cfr. fls. 131), organizados os factos controvertidos na base instrutória e elencados os assentes, instruídos os autos, procedeu-se ao julgamento com observância da forma legal, com gravação da prova no sistema integrado de gravação digital, após o que se respondeu à matéria de facto controvertida em sessão a que apenas esteve presente a ilustre advogada dos AA., que nada reclamou.
Inconformada com a sentença de 10/02/2011 que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a Ré a pagar €975,00 a título de indemnização pela mora no cumprimento do contrato, acrescido de juros de mora à taxa legal, assim como a realizar as obras referidas, absolvendo a Ré do restante pedido, e julgou o pedido reconvencional parcialmente procedente e condenou os AA a pagar à R a quantia de €34.125,00 correspondente ao IVA em falta, absolvendo os mesmos do restante pedido, dela apelaram os Autores em cujas alegações conclui:
1. Entre Autores e Ré foi celebrado um contrato de empreitada nos termos do disposto no art.º 1207 do Cciv;
2. O orçamento foi feito pela Ré e aceite pelos Autores, acrescia o IVA.
3. Pela obra realizada, os Autores pagaram a quantia de 162.500,00 € com IVA incluído.
4. Do preço orçamentado de €200.255,00
5. Falta pagar à Ré € 37.755,00.
6. As quantias indicadas na alínea T da matéria da especificação, dada como assente, não acresce IVA.
7. Por conseguinte, o quesito n.º 37 da base instrutória deveria ter sido dado como não provado.
8. Não tendo sido, inclusive, sujeito a prova testemunhal.
9. Impondo-se, portanto, a este doutro Tribunal, que profira decisão diversa da recorrida.
10. Em conformidade com os art.ºs 690-A, e n.ºs 1 e 2 do art.º 712 ambos do C.P.C.
11. Devendo a douta sentença ser alterada que não imponha aos Apelantes o pagamento da quantia de € 34.125,00 a título de IVA, que já pagaram.
Terminam pedindo que na procedência do recurso deve ser alterada a decisão.
Não houve contra-alegações.

Recebido o recurso, foram os autos aos vistos dos Meritíssimos Juízes-Adjuntos, acompanhados do respectivo projecto, nada tendo sido sugerido; nada obsta ao conhecimento do mesmo.
Questão a resolver: Saber se ocorreu erro de julgamento de facto quanto à matéria do art.º 37 da Base Instrutória e de direito, na medida em que condenando-se no pagamento dos AA à R. da referida quantia a título de IVA, acrescendo ao valor ainda em falta no pagamento do preço da empreitada, o valor a pagar à ré excede aquele que por ela foi orçamentado.

II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida deu como assentes os seguintes factos:
1. Em Janeiro de 2006, os AA. contactaram a R., para a construção de uma moradia, sita na Rua …, n.º …, …, … (a).
2. Em sequência desse contacto, foi elaborado um orçamento, que contemplava, todos os materiais a fornecer pela R., à excepção de jardinagem e electrodomésticos, conforme documento junto aos autos a fls. 17 e ss. (b).
3. Com a aceitação do orçamento, os AA. efectuaram, um primeiro pagamento por cheque no valor de € 30.000 (trinta mil euros). (c).
4. A R. comprometeu-se a iniciar a moradia em Março de 2006, tendo indicado como data prevista para a sua conclusão o final do mês de Março de 2007. (d) e artº 1º).
5. Os AA. encontravam-se numa casa arrendada, cujo arrendamento terminava em Julho de 2006 e foi prorrogado por mais um ano, o que a R. conhecia. (e) e artº 1º).
6. Os AA. efectuaram os seguintes pagamentos, para além do referido em c):
- € 50.000 (cinquenta mil euros) em, 21 de Abril de 2006, conforme doc. n.º 5 junto aos autos a fls. 14;
- € 40.000 (quarenta mil euros) em, 23 de Junho de 2006, conforme doc.n.º 6 junto aos autos a fls. 15;
- € 35.000 (trinta e cinco mil euros) em, 12 de Julho de 2006, conforme doc.n.º 7 junto aos autos a fls. 15;
- € 7.500 (sete mil e quinhentos euros) em, 13 de Dezembro de 2006, conforme doc. n.º 8 junto aos autos a fls. 16. (f).
7. Os AA. remeteram à R. a carta de 10 de Junho de 2007, conforme doc. n.º 9 junto aos autos a fls 23, que se dá por inteiramente reproduzido. (g) e artº 5º e 6º).
8. A R. respondeu à carta referida na alínea anterior em 14 de Junho de 2007, onde a R. através do seu Ex. Mandatário exige a liquidação total e imediata da restante parte do preço, conforme doc. n.º 10 junto aos autos a fls. 24 e ss., que se dá por inteiramente reproduzido. (h).
9. Em 9 de Agosto, a R. envia uma carta aos AA. onde reconhece e aceita a existência de defeitos na obra em causa, conforme doc. n.º 11 junto aos autos a fls. 27 e que se dá inteiramente por reproduzido. (i).
10. Findo o contrato de arrendamento, os AA. foram habitar a moradia em causa. (j).
11. Em 6 de Setembro de 2007, foi instaurado aos AA. um auto de contraordenação. (l).
12. Os AA. elaboraram um projecto rectificativo, a expensas suas de forma a cumprir o exigido, pela autoridade competente. (m).
13. O projecto rectificativo, emergente da Câmara Municipal de Sintra, custou aos AA. a quantia de € 907,50 (novecentos e sete euros e cinquenta cêntimos). (n).
14. Os AA. pagaram ainda a quantia de € 53,10 (cinquenta e três euros e dez cêntimos) a título de taxa de entrega. (o).
15. Na referida moradia, não foram realizados os seguintes trabalhos:
- fornecimento e montagem de portões e gradeamento do muro que confina com a Rua …, bem como das portas da cãs do gás;
- fornecimento e assentamento do revestimento em pedra no soco da moradia e muro;
- fornecimento e montagem de pérgola de madeira sobre os pilares existentes na alçada principal da moradia;
- efectuar a pintura do tecto da casa de banho e da cave;
- remate das paredes de tijolo de vidro da casa de banho do primeiro andar;
- colocar caixa do correio;
- montagem e isolamento do resguardo da base do duche;
- colocação de dois listeis em falta na parede de uma das casas de banho;
- colocação do rodapé em falta na sala, quarto e lavandaria;
- rectificação da ligação entre as guarnições das portas interiores e os rodapés de madeira. (p).
16. A R. efectuou a escavação do terreno junto da parede da cave com criação de espaço coberto sob a varanda da cozinha. (q).
17. Os pavimentos das varandas foram assentes à fiada, enquanto os restantes foram assentes à meia esquadria. (r).
18. As guarnições laterais dos roupeiros não têm a mesma dimensão. (s).
19. Foi acordado entre os AA. e a R. o pagamento das seguintes quantias nos seguintes termos:
- € 44.649,00 (quarenta e quatro mil seiscentos e quarenta e nove euros) no inicio dos trabalhos;
- € 47.190,00 (quarenta e sete mil cento e noventa euros), após a colocação da segunda placa;
- € 37.268,00 (trinta e sete mil duzentos e sessenta e oito euros), após a colocação do telhado;
- € 33.033,00 (trinta e três mil e trinta e três euros), após conclusão das paredes e execução dos rebocos exteriores;
- € 38.115,00 (trinta e oito mil cento e quinze euros), após colocação dos azulejos, perfazendo um total de € 200.255,00 (duzentos mil duzentos e cinquenta e cinco euros). (t).
20. Em 10 de Julho de 2007 a obra não se encontrava pronta. (artº 3º).
21. Quando os AA. se alojaram na moradia esta encontrava-se inacabada.(artº 4º).
22. Em 20 de Setembro de 2007 os AA. detectaram o seguinte: escavação do terreno junto da parede da cave com criação de espaço coberto sob a varanda da cozinha; dimensão de janelas; falta de rebordo nas colunas e ocultação de metade das colunas nas varandas dos quartos; alteração da chaminé; alteração no nível das muralhas e eliminação de canteiros; erro na implantação da construção no terreno. (artº 8º).
23. O erro na implantação da construção no terreno originou um procedimento administrativo, por parte da Câmara Municipal de Sintra. (artº 9º).
24. Não foi fornecido nem assentado o pavimento exterior na entrada da moradia bem como na zona de acesso à garagem. (artº 11º).
25. Não foi feita a parede sob a escada exterior de acesso à varanda, bem como um degrau para acesso ao passeio exterior. (artº 12º).
26. Não foram executados os arcos entre pilares do piso da cave no alçado tardoz. (artº 13º).
27. Não foram feitos os canteiros exteriores defronte da garagem. (artº 14º).
28. A instalação eléctrica não ficou concluída quanto à montagem de espelhos na aparelhagem, ligação das terras, ligação da bomba instalada no poço de bombagem, não tendo sido solicitada a emissão do respectivo certificado da instalação. (artº 15º).
29. Não foi fornecida e montada a porta corta-fogo na separação entre a escada que liga a garagem ao piso térreo. (artº 16º).
30. Não foi solicitada a emissão do certificado da instalação da rede de gás executada. (artº 17º).
31. A churrasqueira apresenta um buraco existente na parede da chaminé e inclinação do pavimento que está inclinado para a parede traseira originando a acumulação de água e diversos remates de acabamento estão em falta. (artº 18º).
32. Não foi colocada a tampa na caixa de electricidade enterrada junto da churrasqueira. (artº 19º).
33. Não foi feito o muro da escada de acesso entre o piso de acesso à garagem e o terraço onde se situa a churrasqueira, de modo a ficarem nivelados. (artº 20º).
34. O pavimento das varandas foi assente à fiada e o da churrasqueira e do alpendre estão assentes à meia esquadria. (artº 22º).
35. A alvenaria que envolve os pilares redondos existentes nas varandas dos quartos tem de ser retirada de modo a que a área em redondo fique à vista. (artº 23º).
36. O pavimento na casa de banho da cave e o pavimento da cave apresentam alguma fissuração. (artº 24º).
37. Na garagem as paredes e tectos não foram pintados e falta concluir a instalação eléctrica. (artº 25º).
38. A base das paredes sob a escada de acesso ao piso térreo apresenta sinais de humidade por capilaridade proveniente do solo, necessitando de isolamento e reparação. (artº 26º).
39. A silicone usada nas juntas entre os cobertores e os espelhos dos degraus não foi substituída por betume de cimento branco ou equivalente. (artº 27º).
40. As pedras das bancadas das casas de banho terão que ser substituídas por outras com nova furação, de modo a que as torneiras misturadoras possam ser instaladas com o afastamento apropriado à parede, de forma a poderem abrir completamente. (artº 28º).
41. Não foi feito o isolamento da banheira da casa de banho principal. (artº 29º).
42. As guarnições laterais dos roupeiros não têm mesma dimensão. (artº 30º).
43. Não foi concluída a pintura das paredes do corredor da sala. (artº 31º).
44. Existe uma infiltração de água no tecto da lavandaria proveniente da Cobertura. (artº 32º).
45. Falta assentar os listeis a envolver os espelhos colocados nas casas de banho. (artº 33º).
46. Os AA. realizaram a expensas suas o trabalho de colocação do corrimão (artº 34º).
47. Com referência ao que consta das alíneas d) e e) da matéria assente os AA. pagavam uma renda mensal de € 325,00. (artº 35º).
48. Os AA. ainda não detêm a licença de utilização, pelo que o fornecimento de água e luz continua a ser taxado como “obras”. (artº 36º).
49. Foi acordado que aos pagamentos referidos em t) acrescia o IVA à taxa legal em vigor. (artº 37º).
50. A R. conforme estava inicialmente previsto e constava do projecto que foi entregue para o efeito, orçamentou o fornecimento e colocação de 100 metros quadrados de pavimento denominado H6. (artº 43º).
51. A colocação do referido material implicava apenas a colocação duma base de areia compacta. (artº 44º).
52. Só depois dos AA. ocuparem a casa o gerente da R. instou por diversas vezes os AA. a efectuarem o pagamento dos valores que considerava que se encontravam em atraso, o que estes não fizeram. (artº 50º).
53. O referido na alínea q) da Matéria Assente, foi realizado apenas a pedido dos AA. para aí colocarem a caldeira. (artº 52º).
54. Em relação à dimensão das janelas, a R. apenas alterou a dimensão de uma janela, porque esta coincidia em parte com um pilar. (artº 54º).
55. A colocação da janela na dimensão prevista no projecto implicava o corte do pilar, o que colocava em risco a estabilidade da construção. (artº 55º).
56. A falta de rebordo nas colunas e a ocultação de metade das colunas nas varandas dos quartos, deve-se ao facto de no projecto de estabilidade não estarem marcadas quaisquer colunas ou pilares para aquele local, apenas constando no projecto de arquitectura sem qualquer rebordo. (artº 56º).
57. As colunas estão em parte ocultas porque as paredes rematam nos pilares. (artº 57º).
58. O erro de implantação da construção no terreno, deve-se ao facto de aquando da solicitação do terreno, o A. ter entregue ao gerente da R. uma planta que marcava a construção no exacto local onde a mesma veio a ser implantada. (artº 60º).
59. A planta correspondia ao projecto inicialmente apresentado junto do Município de Sintra para licenciamento e que, posteriormente, veio a ser substituída. (artº 61º).
60. A R. não foi informada de tal alteração, pelo que executou a obra de acordo com a planta que inicialmente lhe havia sido fornecida. (artº 62º).
61. A instalação eléctrica não foi concluída, nomeadamente a montagem dos espelhos na aparelhagem, pois os mesmos tiveram que ser retirados para proceder à pintura das paredes. (artº 66º).
62. A bomba foi instalada no poço. (artº 67º).
63. O pavimento das duas varandas do piso superior foram os primeiros a serem executados, tendo os AA. visto a forma como os mesmos foram assentes.(artº 73º).
64. Foi o A. que disse ao ladrilhador, algum tempo depois, que gostava mais dos pavimentos assentes à meia esquadria, pelo que solicitou que assentasse os que ainda faltavam dessa forma. (artº 75º).
65. No projecto de estabilidade não se encontravam marcados pilares redondos. (artº 76º).
66. As torneiras abrem e, apenas quando abertas exactamente a meio do curso do respectivo manípulo encostam à parede. (artº 79º).
67. A banheira de hidromassagem colocada na casa de banho principal, foi instalada. (artº 81º).
68. Os listeis não constam do orçamento contratado, nos termos do documento junto aos autos a fls. 17. (artº 86º).
69. A implantação da construção foi feita nos termos do projecto que os AA. entregaram à R., diferente do que foi aprovado pelo Município de Sintra. (artº 89º).
70. A casa para o aquecimento central, foi construída sem as dimensões necessárias para guardar o depósito de gasóleo, o que levou os AA. a adquirirem uma caldeira a gás. (artº 92º)
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Os AA impugnam a decisão de facto quanto ao ponto 49 correspondente à matéria de facto do quesito 37 da base instrutória.

III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Conforme resulta do disposto nos art.ºs 660, n.º 2, 664, 684, n.º 3, 685-A, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539.
Não havendo questões de conhecimento oficioso o objecto do recurso é delimitado pelas questões enunciadas nas conclusões das alegações de recurso, seja pela questão enunciada em I.

 Saber se ocorreu erro de julgamento de facto quanto à matéria do art.º 37 da Base Instrutória e de direito, na medida em que condenando-se no pagamento dos AA à R. da referida quantia a título de IVA, acrescendo ao valor ainda em falta no pagamento do preço da empreitada, o valor a pagar à ré excede aquele que por ela foi orçamentado.
Pergunta-se no art.º 37 da Base Instrutória:
“Foi acordado que aos pagamentos referidos em t) acrescida o IVA à taxa legal em vigor?”
Estava já assente na alínea t)
“Foi acordado entre os AA e a R. o pagamento das seguinte quantias nos seguintes termos:
-€44.649,00 (quarenta e quatro mil seiscentos e quarenta e nove euros) no início dos trabalhos;
-€47.190,00 (quarenta e sete mil e cento e noventa euros), após a colocação da segunda placa;
-€37.268,00 (trinta e sete mil duzentos e sessenta e oito euros), após a colocação do telhado;
-€33.033,00 (trinta e três mil e trinta e três euros), após a conclusão das paredes e execução dos rebocos exteriores;
-€38.115,00 (trinta e oito mil cento e quinze euros), após a colocação dos azulejos, perfazendo um total de €200.255,00 (duzentos mil duzentos e cinquenta e cinco euros);
Os mandatários das partes, perante os factos que o Tribunal considerou assentes e os factos que, controvertidos, levou à Base Instrutória, nada, espantosamente, reclamaram e, também não o fizeram posteriormente.
E diz-se, espantosamente, pelo seguinte: é que as partes estão de acordo em como celebraram um contrato de empreitada de uma moradia na Terrugem em conformidade com o orçamento junto aos autos pelos AA a fls. 17/19 (cfr. art.sº 1 a 6 da p.i e art.º 1 da contestação), tanto que passou para a matéria de facto assente sob os pontos a) a c), orçamento do qual consta expressamente aquilo que o R alega nos art.ºs 4, 5, 6, que o pagamento seria efectuado da seguinte forma: 1.ª prestação no início do trabalho de €36.900,00, 2.ª prestação na colocação da segunda placa de 39.000,00€, 3.ª prestação, após a colocação do telhado de €30.800,00, 4.ª prestação após a conclusão das paredes e execução dos rebocos exteriores de €27.300,00, 5.ª prestação após a colocação dos azulejos de €31.500,00, 6.ª e última prestação de €17.00,00 para o final da obra, valores a que, acrescendo o IVA a 21%, totalizam €44.649,00, €47.190,00, €37.268,00, €33.033,00, €38.115,00, correspondentes respectivamente às 1.ª a 5.ª prestações, e foi este valor final, já com IVA, muito justamente, aquele que ficou assente na alínea t) e não os valores que no orçamento vêm indicados sem IVA mas aos quais, conforme manifestamente acordado acresceria o IVA. De resto, se bem virmos a resposta dos AA à contestação, limitada que estava à matéria da excepção de não cumprimento e ao pedido reconvencional, por força da própria lei processual, não contesta que fossem os valores referidos no art.º 6 da contestação e que passaram à alínea t) dos factos assentes, os valores finais, isto é os valores já como IVA liquidado. Nem a Autora refere que pagou em conformidade com o acordado, nem tão-pouco refere que tenha pago tudo, pelo contrário os AA referem que os pagamentos não acompanharam o desenrolar dos trabalhos, estavam descontextualizados em relação à obra que estava atrasada e que face à inércia do Réu se recusaram depois a efectuar qualquer pagamento (art.ºs 15 a 19 e 32 da p.i.); nenhuma dúvida, pelo contrário admissão por acordo entre as partes conflituantes relativamente ao preço da empreitada, e aos valores dos pagamentos parciais contratualmente devidos com e sem IVA.
Donde, ser absolutamente imperceptível a elaboração do quesito 37, pois não corresponde a nenhuma factualidade controvertida, devendo ter-se por não escrita a resposta dada ao quesito 37, porquanto as partes acordaram nos articulados em como os valores referidos na alínea t) já incluem o IVA.
Impõe-se assim que, dando-se por não escrita a resposta ao quesito 37, se altere a redacção da alínea T, (o que é consentido posto que a matéria de facto assente pode ser sempre alterada até ao trânsito em julgado da decisão final do litígio, não formando caso julgado conforme já a doutrina do assento 14/94 de 26/05/94 in DR IA, n.º 230, de 04-10-94, hoje com valor de acórdão uniformizador de jurisprudência mesmo no âmbito do CPC na redacção dada pelo DL 329-A/95) que passa a ser:
“Foi acordado entre AA e a R. o pagamento das seguintes quantias nos seguintes termos: 1.ª prestação no início do trabalho de €36.900,00, 2.ª prestação na colocação da segunda placa de 39.000,00€, 3.ª prestação, após a colocação do telhado de €30.800,00, 4.ª prestação após a conclusão das paredes e execução dos rebocos exteriores de €27.300,00, 5.ª prestação após a colocação dos azulejos de €31.500,00, 6.ª e última prestação de €17.00,00 para o final da obra, valores a que, acrescendo o IVA a 21%, totalizam €44.649,00, €47.190,00, €37.268,00, €33.033,00, €38.115,00, correspondentes respectivamente às 1.ª a 5.ª prestações
Quanto à questão do erro de direito ínsito na condenação dos AA a pagarem à R “(…)a quantia de €34.125,00 (trinta e quatro mil cento e vinte e cinco euros) correspondentes ao IVA em falta,(…)”, há que ver a fundamentação da sentença recorrida que foi a seguinte, sucintamente:
· A R. reclama dos AA o pagamento das quantias de €35.975,00 correspondente ao pagamento do preço em falta a que acresce o valor de € 7.526,05 correspondente a trabalhos a mais e alterações solicitadas pelso AA.
· Uma parte substancial do valor reclamado pela R resulta dos AA não terem feito acrescer aos pagamentos efectuados o valor do IVA.
· Tendo os AA entregue à R a quantia de € 162.500,00 para pagamento da obra, estão ainda obrigados a entregar o valor de 21% correspondente ao IVA devido sobre tal valor, ou seja a quantia de € 34.125,00.
· Cada uma das prestações acordadas apenas se vence com a realização dos trabalhos correspondentes previsto no orçamento e ficando provada a existência de obras que a R. tem de realizar com vista à correcção de deficiências e bom cumprimento da sua prestação, não temos elementos suficientes que nos permitam concluir que os AA estão em mora relativamente ao pagamento da restante parte do preço.
Está assente que em 10/07/2007 a obra não se encontrava pronta e que quando os AA se alojaram na moradia, esta encontrava-se inacabada (resposta aos quesitos 3.º e 4.º da Base Instrutória); mais está coberto pelo caso julgado (art.º 684/4), que a R. está obrigada a realizar as obras “em falta e necessárias à reparação dos defeitos da obra…” e que estão enunciadas na fundamentação de facto e de direito da sentença, mais especificamente a fls. 276ª 278 dos autos. Ou seja, a obra não foi concluída e a que está feita padece de correcções, conclusão e correcções que vêm enunciadas, obrigação a cargo da empreiteira nos termos do art.º 1221 do CCiv.
Na fundamentação da sentença e que antecede o dispositivo diz-se que inexiste a obrigação dos AA pagarem preço pela empreitada que contrataram, pelas razões indicadas na sentença, dispositivo e motivação essas que, não estando em causa no recurso (a R. não interpôs recurso), têm força de caso julgado e que não podem ser alteradas nesta sede, atento, muito justamente, o disposto no art.º 684/4 já citado.
O que se sindica é saber se os AA têm de pagar e entregar à R. a quantia de €34.125,00, na medida em que pagaram apenas o preço e não também o IVA, nos adiantamentos do preço da empreitada, sendo os AA responsáveis pelo pagamento desse IVA, não podendo as partes acordar a exclusão do pagamento desse imposto que é sempre devido ao Estado, na medida em que tal acordo é nulo (art.º 280 do CCiv).
O Imposto sobre o Valor Acrescentado (doravante designado por IVA), é um imposto sobre o consumo, estando a ele sujeitas as prestações de serviços e transmissão de bens efectuados em território nacional (art.ºs 1/1/a, 3/1 do Código do Imposto Sobre o Valor Acrescentado aprovado pelo DL 394-B/84, de 26/12, sucessivamente alterado por vários diplomas legais, e que doravante designaremos pela sigla CIVA).
O contrato de empreitada dos autos não só é uma modalidade de contrato de prestação de serviços (art.ºs 1154, 1155, 1207 e ss do CCiv), como a execução de empreitada de construção civil em terreno alheio importa a transferência da propriedade dos materiais usados na construção pelo empreiteiro para o dono da obra, no caso os AA (art.º 1212/2 do CCiv). Logo, o contrato está sujeito a IVA. É sujeito passivo, contribuinte de direito desse imposto, a R, pessoa colectiva que, aparentemente, se dedica à essa actividade de prestação de serviços (art.º 2/1/a do CIVA), imposto que é devido e é exigível, no caso que nos ocupa, e em regra, no momento em que a empreitada termina, ou seja no momento em que a obra estiver concluída (art.º 7/2 do CIVA). Estando o sujeito passivo do imposto, no caso concreto a Ré empreiteira, obrigada a emitir uma factura ou documento equivalente nos termos do art.º 28, porquanto as partes acordaram em efectuar adiantamentos do preço em razão do avanço da obra, pagamentos esses que foram efectuados (muito embora em desconformidade com o acordado), o respectivo imposto é devido, isto é, torna-se exigível pelo Estado, no momento da efectivação desses pagamentos ou adiantamentos (art.º 8/1/c do CIVA).
Neste sentido, ainda que referente a uma empreitada pública, mas com situação análoga, veja-se, entre outros o seguinte aresto do STA, disponível no sítio www.dgsi.pt e que a seguir se sumaria:
 
Sumário: I - Os adiantamentos previstos no art. 191, do Decreto-Lei n. 235/86, de 18 de Agosto, efectuados pelo dono da obra a favor do empreiteiro, no âmbito de contratos de empreitadas de obras públicas, são reembolsados à medida que os materiais forem aplicados, por dedução nos respectivos pagamentos contratuais.
II - Tais adiantamentos constituem uma antecipação de pagamentos contratuais, não tendo a natureza de mútuos.
III - Sendo o valor tributável para efeitos de IVA, a contraprestação obtida ou a obter pelo sujeito passivo(art. 16, n. 1, do C.I.V.A.), os valores relativos aos adiantamentos não poderão deixar de ser considerados para incidência do I.V.A..
IV - A situação gerada com tais adiantamentos enquadra-se na 2 parte do n. 1 deste art. 35 do C.I.V.A., pelo que é obrigatória a emissão de documento comprovativo da sua percepção, no momento em que esta ocorre, isto é, antes do momento em que se efectivam as transmissões de bens ou prestações de serviços englobados no contrato de empreitada e, consequentemente, o I.V.A. torna-se exigível no momento da percepção dos adiantamentos (art.8, n. 2, do C.I.V.A.).
(…).
*
 A importância do imposto liquidado pelo sujeito passivo (isto é o empreiteiro), na medida em que a repercussão é obrigatória (cfr. art.º 36/3 a contrario) deve ser adicionada ao valor da factura ou documento equivalente “para efeitos da sua exigência aos adquirentes das mercadorias ou aos utilizadores dos serviços.”-cfr. art.º 36/1 do CIVA. (sublinhado nosso).
Ou seja, na medida em que o pagamento do preço da obra foi acordado ser efectuado em diferentes e sucessivos momentos da execução da empreitada, tendo os AA efectuado os pagamentos fraccionados, como comprovadamente efectuaram, estava a R. obrigada, fiscalmente, a emitir, aquando de cada um desses pagamentos, a respectiva factura e, não apenas, como ela própria entende na contestação, no final da empreitada aquando da entrega, e recepção da mesma pelo dono da obra, factura essa que, contendo a discriminação dos serviços efectuados e dos materiais utilizados, e respectivo preço, teria de conter a liquidação do imposto em causa, mediante a aplicação da respectiva taxa, adicionando esse valor ao valor da factura, por forma a exigir do consumidor final, o respectivo valor, entregando-o, depois, à administração fiscal como é sua obrigação.
Não o fez, porém.
O consumidor final, neste caso os AA, donos da obra, são também responsáveis pelo pagamento desse imposto devido ao Estado, gozando do direito de elaborar as facturas ou documentos equivalentes em nome e por conta do sujeito passivo (art.º 28/14 e 72 do CIVA). Sendo certo que os adquirentes AA podem elaborar essas facturas por conta e em nome da empreiteira R, o seu não cumprimento, não lhes pode acarretar qualquer consequência já que a responsabilidade pela emissão delas, da veracidade do seu conteúdo e pelo pagamento do respectivo imposto cabe à empreiteira, transmitente, sem prejuízo da responsabilidade solidária pelo pagamento do transmitente e do adquirente (art.º 72/3 do CIVA).
No sentido de que o consumidor final, o adquirente dos bens e serviços é também responsável, perante o Estado, pelo IVA, veja-se o seguinte aresto do STJ, disponível no sítio www.dgsi, e que a seguir se sumaria:
Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo: 680/06.3TVLSB.L1.S1 
 
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: ÁLVARO RODRIGUES
Descritores: PREÇO
IVA
JUROS DE MORA
 
Data do Acordão: 30-06-2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
 
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
(…) 
Sumário :

I- Se o contribuinte passivo tiver entregue o IVA nos prazos legais, à sua própria custa ( sem o ter recebido do adquirente), obviamente que o adquirente terá que o ressarcir pelo retardamento havido, da sua parte, no cumprimento de tal prestação debitória, já que não cabe ao prestador do serviço o pagamento de tal imposto à sua custa.

II- Se não o tiver entregue no prazo fixado, aguardando que o adquirente/ consumidor lhe entregue o dinheiro, é também evidente que o referido adquirente não fica exonerado do pagamento de tal imposto, já que não depende tal pagamento do cumprimento tempestivo das obrigações fiscais que impendem sobre o contribuinte passivo.

(..)
O IVA (Imposto Sobre o Valor Acrescentado), que desde Janeiro de 1986 é a base do nosso sistema fiscal de tributação do consumo, tem como sujeitos passivos dessa concreta relação jurídica tributária, os transmitentes de bens e os prestadores de serviços sobre os quais incide tal imposto (artº 2º do CIVA) mas são, na verdade, os consumidores finais que pagam tal imposto, justamente porque o mesmo é um imposto que incide sobre o consumo.
Nas palavras expressivas do Acórdão deste Supremo Tribunal, de 22-04-2004, de que foi Relator, o Exmº Juiz Conselheiro Oliveira Barros, «são de considerar nessa relação jurídica fiscal dois sujeitos passivos, que são o contribuinte de direito e o contribuinte da facto, sendo o IVA um imposto cobrado por uns, mas posto a cargo de e suportado por outros.
Na perspectiva tradicional, que por tal entendia quem, em último termo, suporta o imposto, são estes últimos quem vem, na realidade, a ser os contribuintes, pois são eles os devedores principais e originários desse tributo, e, nessa óptica, o seu sujeito passivo propriamente dito.
Enquanto o responsável fiscal é chamado a pagá-lo, o contribuinte de direito é responsável também pela falta da oportuna liquidação e cobrança desse imposto a quem efectivamente o desembolsa, ou seja, ao contribuinte de facto» ( Pº 04B837, disponível in www.dgsi.pt)

Assim sendo, cabe aos sujeitos passivos a liquidação e a entrega de tal imposto nos serviços de Finanças mas, por força do disposto no artº 37º do referido Código, tal imposto repercute-se no preço a pagar pelo adquirente dos bens e dos serviços, pois tal inciso legal expressamente dispõe no seu nº 1:
«A importância do imposto liquidado deve ser adicionada ao valor da factura ou documento equivalente para efeitos da sua exigência aos adquirentes das mercadorias ou aos utilizadores dos serviços».
Desta forma, porque se trata de um imposto, a vontade do consumidor (adquirente das mercadorias ou utilizador dos serviços) quanto à aceitação do seu pagamento é irrelevante, desde que tenha havido transmissão de bens materiais ou prestação serviços para esse adquirente, que não estejam isentos de IVA.(..)
*
Quid iuris se a empreiteira não emitiu as facturas nos termos acima referidos e em conformidade com a lei?
Não tendo a empreiteira emitido as facturas nos termos referidos e em conformidade com a lei, não obstante ter recebido os valores correspondentes aos adiantamentos ou parte do preço da empreitada, ela apenas poderá obter o pagamento do valor correspondente ao imposto pelo pagamento do qual é em primeira linha responsável perante a administração fiscal, logo que emita a respectiva factura nos termos da lei (com o recibo correspondente ao preço já por si recebido), funcionando a emissão da factura como condição de exigibilidade legal do valor desse mesmo imposto.
Neste sentido, entre outros, veja-se o aresto do STJ que a seguir se sumaria, disponível no mesmo sítio informático:
Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo: 04B837 
 
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: OLIVEIRA BARROS
(…) 
Nº do Documento: SJ200404220008377
Data do Acordão: 22-04-2004
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL PORTO
Processo no Tribunal Recurso: 2498/03
Data: 20-12-2003
Texto Integral: S
Privacidade: 1
 
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.
 
Sumário : I –(…).
II - Por isso de considerar nessa relação jurídica fiscal dois sujeitos passivos, que são o contribuinte de direito e o contribuinte de facto, o IVA é um imposto cobrado por uns, mas posto a cargo de e suportado economicamente por outros.
III - Na perspectiva tradicional, que por tal entendia quem, em último termo, suporta o imposto, são estes últimos quem vem na realidade a ser os contribuintes, pois são eles os devedores principais e originários desse tributo, e, nessa óptica, o seu sujeito passivo propriamente dito.
IV - Enquanto responsável fiscal chamado a pagá-lo, o contribuinte de direito é responsável também pela falta da oportuna liquidação e cobrança desse imposto a quem efectivamente o desembolsa, ou seja, ao contribuinte de facto.
V - Para além do IVA não poder ser exigido sem prévia emissão e apresentação de factura com os requisitos estabelecidos no nº 5 do art.35º CIVA, quando a emissão e apresentação duma tal factura for imposta por convenção das partes, estar-se-á perante condição da exigibilidade, e, assim, do vencimento, de toda a dívida - parte remuneratória e imposto -, e, assim, perante uma condição suspensiva, sem o preenchimento da qual, conforme art.270º C.Civ., o pagamento não é exigível - caso em que há lugar à aplicação do disposto no art.662º, nº1, CPC.
(…)
Como o imposto de selo, o IVA é, na verdade, um imposto cobrado por uns, mas posto a cargo de e suportado economicamente por outros. Na noção tradicional, que por tal entendia quem suporta o imposto, são estes últimos que vêm na realidade a ser os contribuintes. Nesta perspectiva, são eles os devedores principais e originários desse tributo, e, assim, o seu sujeito passivo propriamente dito (7). Daí que se possam, realmente, considerar, nesta relação jurídica fiscal dois sujeitos passivos: o contribuinte de direito e o contribuinte de facto.

Adiantado, no texto da alegação produzida na apelação, a fls.135 a 137 dos autos, que, conforme art.7º ( n.º 1, al.b) ) CIVA, a obrigação do pagamento do imposto nasce no momento da realização (efectivação) da prestação dos serviços, a contradição em que, usando o mesmo verbo (nascer), aí - prima facie ou à primeira vista - se incorre ao dizer que, conforme arts.28º, n.º 1, al.b), 35º, n.º 1, e 36º, n.º 1, CIVA, a obrigação do pagamento desse imposto só nasce com a emissão do documento contabilístico competente, ou seja, da respectiva factura, é apenas aparente: o art.7º CIVA refere-se, se bem se entende, à altura em que o imposto é exigível pelo Estado ao respectivo sujeito passivo (contribuinte de direito), os demais estabelecem, por sua vez, condição da exigibilidade dessa importância por este último a quem efectivamente suporta o tributo em questão (contribuinte de facto) (8).

Destacada na alegação da apelante, a fls.135, a parte final da al.b) do n.º 1 do art.28º CIVA, é certo que, referida a cláusula contratual aludida a pagamentos por conta de comissões, não consta que os tenha efectivamente havido a título de adiantamento, isto é, antes da efectiva prestação dos serviços a que as mesmas correspondem. Como quer que seja :

É na sobredita condição da exigibilidade do falado imposto pela prestadora à utilizadora dos serviços em questão, estabelecida nos arts.28º, n.º 1, al.b), 35º, n.º 1, e 36º, n.º 1, CIVA, que, tão só deduzida, na contestação, defesa por impugnação, afinal, assenta esta nova defesa, por excepção, abusivamente aditada na apelação.

Trata-se, em todo o caso, claramente, de condição legal relativa à exigência do imposto a quem deve efectivamente suportá-lo (contribuinte de facto), não confundível com a condição convencionalmente estabelecida na supramencionada cl.III, nº5, do contrato ajuizado; e exorbita, claro está, o âmbito da jurisdição dos tribunais comuns a consideração de qualquer eventual infracção prevenida nos arts.95º ss CIVA.
(..)
Bastando as disposições que seguem para resolver adequadamente, em termos de direito, a questão sub judicio, está-se, isso sim, como já visto, perante condição - cfr. art.270º, que, enquanto não preenchida, determina não poder considerar-se vencida e exigível a obrigação - toda ela, parte remuneratória e imposto - ainda litigada, havendo, por isso, lugar à aplicação do já falado art.662º (nº 1) CPC. E é isto tudo, se bem se crê (10).
(…)
Não sendo, ainda, legalmente exigível dos AA o pagamento do IVA, na medida em que a Ré não emitiu as facturas aquando o recebimento dos adiantamentos do preço da empreitada, devem, não obstante, ser os AA condenados a pagá-lo, pagamento diferido sob a condição da emissão da factura.
Dizem os AA que já o pagaram, porque os 162.500 euros por si pagos já o incluírem.
Em primeiro lugar há que dizer que os pagamentos que os Autores efectuaram não coincidem, nos seus valores, com aqueles que vêm orçamentados, quer os valores sem o montante do IVA quer os valores com o montante do IVA e a eles cabia a prova de o terem pago (art.ºs 342/2 do CCiv); não o tendo feito contra eles se resolve a dúvida (art.º 516 e 342/2 do CCiv).
Referem os AA, que, se o valor da empreitada como está assente da alínea t), na redacção por nós acima feita, é de €200 255,00 (duzentos mil, duzentos e cinquenta e cinco euros), valor esse que inclui já IVA, como resulta também aceite pelas partes e como acima se disse, se os AA fizeram à Ré pagamentos fraccionados no valor global de €162 500,00, então a diferença entre esses valores ou seja de €37 755,00, valor esse que a sentença não condena os AA a efectuar à ré, tem de incluir forçosamente o valor do IVA. E então, prosseguem os AA, se nesse valor da diferença não está incluído o IVA, a soma do valor IVA àqueles valores, o já pago e aquele que faltaria pagar perfaz €234 380,00 ou seja mais do que o valor orçamentado.
Não é assim, porém, face ao trânsito em julgado no tocante ao pagamento do preço da empreitada, cujo pagamento a sentença considera estar efectuado.
Sendo certo que o IVA a 21% contabilizado no valor global da empreitada assente em €200.255,00 é de €34 755,00 e que os AA pagaram o valor global de €162 500,00, aritmeticamente, o valor em que vão condenados a pagar (€34 125,00) é inferior àquele, pelo que nenhum prejuízo lhes acarreta o sentenciado. Contudo, aquando da emissão da factura, o valor da taxa do IVA poderá ser diferente daquele que consta da sentença e até mesmo daquele que actualmente se encontra em vigor de 23% pelo que manter-se-á a condenação pelo valor do IVA resultante da aplicação da taxa em vigor aquando da emissão da factura.


IV- DECISÃO
Tudo visto, acordam os juízes em:
a) Julgar parcialmente procedente a apelação, alterar a decisão de facto, dando-se por não escrita a resposta ao quesito 37 da base instrutória e alterando-se o teor da alínea t) dos factos assentes como de III resulta;
b) Manter, contudo, a condenação dos AA a pagar à R o valor do IVA à taxa em vigor aquando da emissão da factura sobre os montantes por eles pagos à R (no valor de €162 500,00), nos termos do art.º 662, tal como explicado em III, no momento e logo que seja emitida a factura legal (acompanhada da entrega aos AA do recibo correspondente às quantias pela R recebidas)
Regime da Responsabilidade por Custas: As custas são da responsabilidade dos AA que muito embora obtendo provimento na alteração da decisão de facto, decaem na pretensão da revogação da sentença (art.º 446, n.sº 1 e 2)

Lisboa, 13 de Outubro de 2011

João Miguel Mourão Vaz Gomes
Jorge Manuel Leitão Leal
Pedro Martins
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[1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pelo DL 303/2007 de 24/08, entrado em vigor a 1/1/08,  atenta a circunstância de a acção ter dado entrado em juízo e ter sido distribuída à 1.ª Vara de Competência Mista do Tribunal da Comarca de Sintra em 06/06/2008, entretanto redistribuída ao novel Juízo de Grande Instância Cível, 1.ª secção, juiz 1 da Grande Lisboa-Noroeste, como resulta dos autos e o disposto no art.º 11 e 12 do mencionado diploma; ao Código referido pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem.