Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | CONCEIÇÃO SAAVEDRA | ||
| Descritores: | CITAÇÃO FALTA TRAMITAÇÃO ELECTRÓNICA JUNÇÃO DE PROCURAÇÃO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/05/2019 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | PROCEDENTE | ||
| Sumário: | I- Ainda que exista um processo físico em suporte de papel, o acesso à tramitação electrónica do mesmo – indispensável a uma análise completa e detalhada do processo – implicará a junção de uma procuração forense que, nessa medida, constitui, em si mesma, o pressuposto de qualquer intervenção nos autos; II- Encontrando-se a execução sujeita a tramitação electrónica, não pode considerar-se que a mera junção de procuração forense a mandatário judicial é suficiente para pôr termo à revelia absoluta, constituindo intervenção processual que faz pressupor o conhecimento do processo, nos termos e para os efeitos do art. 189 do C.P.C.. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa. I- Relatório: A [ Paulo ….. ] , na execução para pagamento de quantia certa, com o valor de € 11.479,57, que contra si e outro foi instaurada então por B [ ……banco, S.A.,] veio, em 2018, deduzir incidente de omissão de citação e nulidade do processado. Alega, no essencial, que não foi devidamente citado, tendo havido emprego indevido da citação edital e não se encontrando sanada a referida nulidade. Em 19.1.2018, foi, sobre aquele requerimento, proferido despacho nos seguintes termos: “(...) Veio o executado arguir a nulidade da citação edital realizada, alegando, em suma, que a citação edital foi devidamente empregue, por não se verificarem os pressupostos previstos, não resultando dos autos ser desconhecido o paradeiro do executado, e que este não teve conhecimento da citação por facto que lhe seja imputável.-- A Exequente pronunciou-se alegando: - Em 13/09/2005 foi intentada a presente execução para pagamento da quantia de 11.479,57€ contra Paulo …… e Teldita Telecomunicações e Tecnologias de Informática Lda.;-- - Em 14 de Fevereiro de 2006 foi requerida a penhora com dispensa de citação prévia tendo sido deferida. - prosseguiram as diligências de penhora, tendo, em 07/09/2011, sido concretizada a penhora de saldos bancários;- - aquando da penhora de saldos bancários o Senhor Agente de Execução elaborou o autode penhora e citou o ora Executado A;- - Sucede que, conforme se verifica da informação constante do processo a citação do executado na morada sita na Rua Engenheiro Dom António Camilo Castelo Branco, no — 10 F, 2750-155 Cascais revelou-se frustrada. - O Senhor Agente de Execução deslocou-se à morada e ninguém atendeu e segundo informações colhidas no local o executado já não residia na morada supra referida - Cf. Informação do AE de 04/04/2012. - Uma vez que Senhor Agente de Execução nunca conseguiu concretizar a citação do executado não restou outra opção se não a de recorrer à citação edital do mesmo, a qual foi requerida, e em 01/03/2013 foi deferida a citação edital pelo Meritíssimo Juiz do Processo. Conclui pela inexistência de nulidade de citação do executado. Notificada a Sra AE para informar e juntar aos autos o expediente destinado à citação do executado, veio dizer «• No âmbito da presente execução, o Agente de Execução substituído Dr. Francisco …., procedeu à junção aos autos de requerimento a informar que se revelou negativa a tentativa de citação do executado na Rua Engenheiro António Castelo Branco no …. frente, em Cascais, uma vez que ninguém atendeu e segundo informações colhidas o executado não reside na morada, residindo algures em Sintra; • Posteriormente, atento à nomeação da ora Agente de Execução, em sede de pré-diligências, em Setembro de 2015, apurou-se junto dos vizinhos, que a morada indicada se encontra habitada por inquilinos e que o executado ali não residia; • Nesse seguimento, em Dezembro de 2015, procedeu-se à tentativa de penhora de rendas através de notificação pela via postal; • As quais vieram devolvidas com a indicação "objeto não reclamado”; • Pelo que, se procedeu à tentativa de notificação por contacto pessoal a 22/03/2016, a qual se revelou negativa, por após várias tentativas em dias e horas diferentes nunca foi possível contactar com os moradores da referida morada; • foi ainda efetuada na morada indicada, a afixação do edital de citação após penhora do executado, conforme deferido pelo Douto Tribunal, a 22/06/2016. • Das tentativas supra identificadas, não foi contactada a ora Agente de Execução.» Resulta dos autos, ainda com relevância para a decisão a proferir, o seguinte: - O Executado juntou procuração forense à Ilustre mandatária que o representa por requerimento de 22/02/2018; - O Executado juntou requerimento arguindo a nulidade da citação por requerimento de 28/02/2018; - O Executado alegou ter tomado conhecimento do processo através de carta que lhe foi remetida por instituição bancária datada de 08/02/2018, onde se dá conhecimento da penhora realizada e se identifica este processo (cfr. documentos que se encontram juntos aos autos e que se consideram aqui por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais).-- Cumpre decidir: A citação é o ato pelo qual se dá conhecimento ao réu que contra ele foi proposta determinada ação e chama-se ao processo para se defender; emprega-se ainda para chamar, pela primeira vez, ao processo alguma pessoa interessada na causa (artigo 219.° do CPC). - Resulta dos autos que foi tentada a citação pessoal do executado na morada que este reconhece pertencer-lhe, a qual não veio a ser conseguida por ninguém ter atendido naquela morada, e que, obtendo-se despacho judicial para autorização para citação edital, veio aquela a ser efetuada em 22/06/2016. O executado alega que não foram efectuadas as diligências necessárias a que se considerasse desconhecido o paradeiro do executado, por forma a possibilitar-se a citação edital.- Tal vício reconduzir-se-ia a verdadeira falta de citação – cfr. artigo 188.º, n.° 1, alínea c) do Código de Processo Civil, o que determinaria a invalidade de todo o processado, com exclusão do requerimento executivo. Porém, o executado não arguiu a falta de citação logo quando interveio no processo. Na verdade, o executado juntou procuração forense a este processo aos 22/02/2018, e apenas veio com o requerimento arguindo a nulidade aos 28/02/2018. E não pode proceder aqui o argumento segundo a qual a Ilustre mandatária para ter acesso aos autos tinha que juntar procuração forense, porquanto nada impedia o executado (ou pelo menos não o alegou), de consultar o processo (já instaurado em 2005) na secretaria do Tribunal, e assim logo arguir a falta de citação (de que o mesmo estaria seguro) aquando da junção do requerimento juntando procuração. Dispõe o artigo 189.° do CPC «Se o réu ou o Mninistério Público intervier no processo sem arguir logo a falta de citação, considera-se sanada a nulidade». Em face do exposto, considera-se sanada a falta de citação alegada e, nessa medida, indefere-se ao requerido pelo executado.-- Custas de incidente pelo executado, que se fixam em 1 (uma) UC..” Inconformado, interpôs recurso o executado, apresentando as respetivas alegações que culmina com as seguintes conclusões que se transcrevem: “ A. Invocou o ora Apelante omissão de citação e nulidade do processado nos termos do artigo 851° do CPC, consubstanciado no disposto no artigo 188°, n° 1, alínea e) do CPC. B. Interpretou o tribunal a quo a norma do CPC, artigo 189°, no sentido literal, que ao juntar mera procuração forense ao processo, esta intervenção sanaria a falta de citação. C. Nos autos sub judice, no seu atual sistema processual de desmaterialização de processos, estão aqueles sujeitos aos termos da Portaria 280/2013, artigo 27°, em que o acesso ao processo obriga ao registo prévio do mandatário com junção de Procuração forense — " O acesso ao sistema informático de suporte atividade dos tribunais para efeitos de consulta de processos, requer o prévio registo dos advogados". D. É inequívoco, que os presentes autos são de tramitação eletrônica, contrariamente à argumentação do tribunal a quo, de que nada impedia o executado de consultar o processo na secretaria do tribunal. E. Não era legalmente possível ao Apelante e seu mandatário, conhecerem do conteúdo, dos atos praticados, assim como invocar a omissão da citação sem registo prévio e consulta cuidadosa de todo o processado. F. A verdadeira intervenção no processo, pressupõe o seu conhecimento prévio, o que não ocorreu com a junção de mera procuração. G. O presente processo tem 28 "páginas" no sistema eletrônico! H. Os secretários judiciais, nas secretariais judiciais, não disponibilizam o seu acesso informático aos sujeitos processuais para consulta do processo! I. Mesmo sendo a presente execução de 2005, a mesma encontram-se sujeita ao regime de tramitação eletrônica. J. Mais alegou e demonstrou o ora Agravante que só teve conhecimento da existência de um "processo" através de documento bancário e não de citação ou notificação. K. Para se invocar qualquer vício processual, é necessário primeiro analisar cuidadosamente os atos praticados e o conteúdo dos mesmos, pelo que, quer o Executado, quer o mandatário não conseguiriam aferir das omissões ou nulidades processuais sem previamente juntar procuração. L. Não se podendo aceitar que a junção de procuração ao processo executivo constitua a prática de um ato de processo relevante para efeitos de preclusão da possibilidade de arguição de vício de nulidade por omissão de citação. M. O tribunal a quo ignorou a interpretação atualistica dos artigos 189º, 191° n° 2, 199° n°1, 2ª parte e 196°, incorrendo em erro quer na apreciação dos factos, quer na aplicação meramente literal dos preceitos legais. N. O tribunal a quo não aplicou na decisão recorrida as regras de hermenêutica jurídica constantes do artigo 9° do Código Civil. O. Já se pronunciaram neste sentido e a este propósito, tribunais superiores, nomeadamente em recentes acórdãos, V.g., Ac. do Tribunal da Relação de Évora de 03.11.2016 (Proc. 1573/10.5TBLLE-C.E1), in www.dgsi,pt e Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 06.07.2017 (Proc. 21296/12.0YYLSB-A11-6 in www.dgsi.pt. P. Assentam que, a junção ao processo de “mera” procuração, sem mais, não pressupõe pleno conhecimento do processado como decorreria da citação, não podendo este ato ser atendivel para efeitos de sanação de falta de citação. Q. Para além de que, a interpretação literal das normas supra referidas, constituem clara violação do principio do acesso ao direito e aos tribunais, (artigo 20 n° 1 e 4 da CRP), por serem restritivas do direito de defesa, assim como violação do artigo 9° n° 1 do Código Civil. R. Situação que o tribunal não poderia ignorar aquando da sua decisão, devendo ajuizar a precedência dos dois atos, o tempo que mediou entre a junção da procuração e o requerimento de Reclamação e a constatação da necessidade de análise diligente prévia do processo. S. A citação é o ato mais relevante para assegurar o direito à defesa. T. O tribunal violou as normas relativas ao disposto nos artigos 9° do Código Civil, dos artigos 851°, 189°, 191°, 196° do Código de Processo Civil e artigo 27° da Portaria 280/2013. U. Violação que impede o Apelante de assegurar o cumprimento do princípio do contraditório em condições de igualdade com a outra parte.” Pede a procedência do recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-se a mesma por outra que reconheça a tempestividade da arguição da falta de citação do ora apelante. Não se mostram oferecidas contra-alegações. O recurso foi admitido como apelação, com subida em separado e efeito devolutivo. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. *** II- Fundamentos de Facto: A decisão da 1ª instância fixou como provada a seguinte factualidade: - O Executado juntou procuração forense à Ilustre mandatária que o representa por requerimento de 22/02/2018; - O Executado juntou requerimento arguindo a nulidade da citação por requerimento de 28/02/2018; - O Executado alegou ter tomado conhecimento do processo através de carta que lhe foi remetida por instituição bancária datada de 08/02/2018, onde se dá conhecimento da penhora realizada e se identifica este processo. *** III- Fundamentos de Direito: Como é sabido, são as conclusões que delimitam o âmbito do recurso. Por outro lado, não deve o tribunal de recurso conhecer de questões que não tenham sido suscitadas no tribunal recorrido e de que, por isso, este não cuidou nem tinha que cuidar, a não ser que sejam de conhecimento oficioso. Compulsadas as conclusões acima transcritas, verificamos que a única questão a ponderar respeita à tempestividade da arguição da falta de citação do executado, aqui apelante, por emprego indevido da citação edital. Na decisão recorrida, acima transcrita, julgou-se sanada a invocada falta de citação, visto que o executado juntou procuração aos autos em 22.2.2018 e apenas arguiu a nulidade respetiva em 28.2.2018. Já no recurso, sustenta-se que a arguição é tempestiva, posto que apenas com a junção da procuração forense aos autos a mandatária poderia consultar o processo elétronico e detetar eventuais vícios processuais. Vejamos, adiantando-se, desde já, que assiste razão ao apelante. A lei distingue duas modalidades de nulidade da citação, em sentido lato, que se traduzem na falta de citação, prevista no art. 188 do C.P.C., e na nulidade da citação (em sentido estrito), aludida no art. 191 do mesmo Código. A primeira constitui uma nulidade principal que pode ser invocada em qualquer estado do processo, é de conhecimento oficioso e só se sana com a intervenção do interessado nos autos (cfr. arts. 189, 196 e 198, nº 2, do C.P.C.), enquanto a segunda tem, em princípio, de ser invocada e dentro do prazo da contestação, exceto nos casos de citação edital e de não indicação do prazo para contestar (cfr. arts. 191, nº 2, 196 e 198, nº 1, do C.P.C.). Sendo a citação edital, a nulidade pode ser arguida quando da primeira intervenção do citado no processo (art. 191, nº 2). Se tal não ocorrer, já não poderá ser mais tarde invocada nem conhecida oficiosamente, considerando-se sanada, como expressamente prevê o art. 189 do C.P.C.: “Se o réu ou o Ministério Público intervier no processo sem arguir logo a falta da sua citação, considera-se sanada a nulidade.” No caso, o executado ora apelante foi citado editalmente, e é esse ato que precisamente contesta. Relevante será, por isso e antes de mais, definir o que deve entender-se por intervenção da parte na causa, sendo que é na primeira intervenção processual que deve ser “logo” arguida a falta de citação. Referia Lebre de Freitas, a propósito do anterior art. 196 do C.C. de 1961 (hoje reproduzido no citado art. 189 do C.P.C. de 2013), que: “(…) Ao intervir, o réu ou o Ministério Público tem, ou pode logo ter, pleno conhecimento do processado, pelo que optando pela não arguição da falta, não pode deixar de se presumir iuris et de jure que dela não quer, porque não precisa, prevalecer-se. A exigência da imediata arguição da nulidade evita processados posteriores que o interesse da defesa, confrontado com o do autor e com o interesse geral, não justificaria que viessem a ser anulados. (…).([1]) Por sua vez, afirmam António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, comentando o atual art. 189 do C.P.C.: “A solução aqui consagrada radica no seguinte entendimento: se, não obstante o vício, quem deveria ter sido citado está no processo, o intuito informativo típico da citação está, afinal, assegurado. Mas para o efeito, «intervir no processo» pressupõe que o réu ou o Ministério Público estão em condições que permitem concluir que está superada uma situação de revelia absoluta. (…).”([2]) Retiramos das posições indicadas que a intervenção relevante será aquela que pressupõe o conhecimento do processo pelo demandado que lhe seria dado pela citação. Ou, como se disse no Ac. da RP de 17.12.2008([3]): “(…) A intervenção relevante deve, como acima se referiu, preencher as finalidades da citação; pressupõe, portanto, o conhecimento do processo que esta propiciaria. Só assim seria legítimo presumir que o réu prescindiu conscientemente de arguir a falta de citação.(…).” Na tramitação dos processos em suporte de papel, afigura-se adequado concluir que a simples junção de procuração a mandatário judicial seria suficiente para pôr termo à revelia absoluta, constituindo intervenção processual que faz pressupor o conhecimento do processo, de modo a presumir-se que o réu prescindiu conscientemente de arguir a falta de citação([4]). No entanto, a realidade processual é hoje diversa e, apesar da presente execução ter sido instaurada em 2005, a mesma encontra-se sujeita a tramitação eletrónica de acordo com a Portaria nº 280/2013, de 26.8 (que entrou em vigor em 1.9.2013). Veja-se que a citação edital eletrónica do aqui executado terá ocorrido em 29.6.2016 (cfr. fls. 29 deste Apenso), e a procuração forense foi junta aos autos em 22.2.2018. Ora, estabelece o art. 27 da referida Portaria nº 280/2013, na redação então vigente conferida pela Portaria nº 170/2017, de 25.5, que: “1- A consulta de processos por parte de advogados e solicitadores é efetuada: a) Relativamente à informação processual, incluindo as peças e os documentos, existentes em suporte eletrónico, através do sistema informático de suporte à atividade dos tribunais, com base no número identificador do processo; ou b) Junto da secretaria. 2 - O acesso ao sistema informático de suporte à atividade dos tribunais para efeitos de consulta de processos requer o prévio registo dos advogados e solicitadores, nos termos do n.º 2 do artigo 5.º 3 - À consulta eletrónica de processos aplicam-se as restrições de acesso e consulta legalmente previstas.” Por sua vez, nos termos do art. 5, nº 2, da mesma Portaria, o registo e a gestão de acessos ao sistema informático, designadamente por advogados, são realizados pela entidade responsável pela gestão de acessos ao sistema informático, com base na informação transmitida pela Ordem dos Advogados, respeitante à validade e às vicissitudes da inscrição junto da mesma. Assim, ainda que exista um processo físico em suporte de papel, o acesso à tramitação eletrónica do mesmo – indispensável a uma análise completa e detalhada do processo – implicará a junção de uma procuração forense que, nessa medida, constitui, em si mesma, o pressuposto de qualquer intervenção nos autos. Deste modo, subscrevemos, no essencial, o entendimento seguido na mais recente jurisprudência([5]), no sentido de que a intervenção relevante da parte na causa, designadamente para os efeitos previstos no art. 189 do C.P.C., pressupõe um acesso ao processo eletrónico que a mera junção de procuração forense a mandatário judicial hoje não garante. Ou seja, não deverá, no atual quadro normativo, considerar-se que a simples junção da procuração forense afasta a possibilidade de ulterior arguição de vício de nulidade por falta de citação. Pelo menos nos 10 dias subsequentes (cfr. art. 149 do C.P.C.). Conforme se concluiu no Ac. da RE de 3.11.2016, citado em rodapé: “(…) Tendo presente a realidade social, económica e a própria evolução tecnológica, inclusivamente na dimensão do acesso ao direito através do recurso a ferramentas informáticas, de acordo com os cânones de uma boa interpretação, estando a hermenêutica actualista legitimada pelo Código Civil e pela Teoria do Direito, o julgador tem de tomar em consideração as circunstância de tempo e de modo em que a lei deve ser aplicada e, como corolário lógico, no domínio da Tramitação Electrónica dos Processos Judiciais preconizada pela Portaria nº280/2013, de 26/08, não é legítima a conclusão que a simples apresentação de uma procuração, que é condição de acesso ao sistema electrónico e constitui pressuposto de qualquer actuação processual futura, implica a sanação de eventual falta de citação de uma das partes e preclude a hipótese de suscitar a competente nulidade.(…).” Ora, na situação aqui em análise, o executado juntou procuração forense a favor da mandatária que o representa em 22.2.2018, e juntou requerimento arguindo a nulidade da citação em 28.2.2018([6]). Não se mostrando, como dissemos, a junção da referida procuração suficiente para pôr termo à revelia absoluta, nem meio idóneo de tomar conhecimento do processo, de modo a presumir-se que logo aí o executado prescindiu, conscientemente, de arguir a falta de citação, é de concluir que não ficou então sanada a eventual nulidade da citação, como se entendeu em 1ª instância. A circunstância do executado ter alegado que tomou conhecimento do processo através de carta que lhe foi remetida por instituição bancária datada de 8.2.2018, onde se dá conhecimento da penhora realizada e se identifica este processo (último ponto acima julgado assente), não invalida tal raciocínio, pois, como vimos, apenas a intervenção do executado no processo releva enquanto referência para a arguição da nulidade. Assim, é de considerar tempestiva a arguição pelo executado da falta de citação na ação executiva. Constituindo este o objeto único do recurso, e não também a apreciação da existência do vício, cumpre revogar o decidido, devendo em 1ª instância apreciar-se agora da nulidade da citação arguida. *** IV- Decisão: Termos em que e face ao exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar procedente a apelação, revogando, por consequência, o despacho recorrido e determinando se aprecie em 1ª instância da nulidade de citação arguida pelo executado A. Sem custas. Notifique. *** Lisboa, 5.11.2019 Maria da Conceição Saavedra Cristina Coelho Luís Filipe Pires de Sousa *** Sumário do Acordão (da exclusiva responsabilidade da relatora – art. 663, nº 7, do C.P.C.) *** I- Ainda que exista um processo físico em suporte de papel, o acesso à tramitação eletrónica do mesmo – indispensável a uma análise completa e detalhada do processo – implicará a junção de uma procuração forense que, nessa medida, constitui, em si mesma, o pressuposto de qualquer intervenção nos autos; II- Encontrando-se a execução sujeita a tramitação eletrónica, não pode considerar-se que a mera junção de procuração forense a mandatário judicial é suficiente para pôr termo à revelia absoluta, constituindo intervenção processual que faz pressupor o conhecimento do processo, nos termos e para os efeitos do art. 189 do C.P.C.. _______________________________________________________ [1] “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. 1º, 1999, pág. 335. [2] “Código de Processo Civil Anotado”, Almedina, 2018, Vol. I, pág. 228. [3] Proc. 0835621, disponível em www.dgsi.pt. [4] Neste sentido, ver o Ac. da RG de 5.4.2011, Proc. 172/10.6TBC-C.G1, e o Ac. da RP de 25.11.2013, Proc. 192/12.6TBBAO-B.P1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt. [5] Ver o Ac. da RE de 3.11.2016, Proc. 1573/10.5TBLLE-C.E1, o Ac. da RG de 29.6.2017, Proc. 1762/16.9T8VNF-I.G1, e o Ac. da RL de 6.7.2017, 21296/12.0YYLSB-A.L1-6, todos disponíveis em www.dgsi.pt. [6] Não obstante o respetivo ponto dado acima como assente, de acordo com o registo informático de fls. 54 deste Apenso (“Certificação digital da Peça Processual”), o aludido requerimento terá sido introduzido no sistema em 27.2.2018, pelas 23:11.27 GMT. |