Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5/10.3IFLSB.L1-5
Relator: JOÃO CARROLA
Descritores: ABUSO DE CONFIANÇA
SEGURANÇA SOCIAL
CONCURSO REAL DE INFRACÇÕES
VANTAGEM PATRIMONIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/17/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: O princípio «ne bis in idem» não constitui obstáculo a que alguém possa ser julgado por factos naturalísticos, total ou parcialmente coincidentes com aqueles, pelos quais já tenha respondido no âmbito de outro processo, desde que os factos sejam subsumidos a um tipo criminal diverso, que se encontre numa relação de concurso efectivo para com aquele que motivou o primeiro processo.
A pedra de toque, que permite distinguir entre as relações de concurso efectivo e outras realidades, reside na não identidade dos bens jurídicos tutelados por cada uma das normas incriminadoras em confronto.
O bem jurídico tutelado pela norma que prevê e pune o crime de abuso de confiança contra a Segurança Social é integrado, antes do mais, pelas receitas da Segurança Social, nunca poderá perder-se de vista a singularidade do financiamento desta. Singularidade que assenta em princípios como o da sustentabilidade, autonomia orçamental, reserva de lei, ou contributividade, e que não interessam da mesma maneira na área da fiscalidade.
Diferentemente, aquilo que se pretende garantir, com a punição da fraude fiscal, é a efectiva arrecadação dos impostos por parte do erário público.
A condição estabelecida na al. b) do n.º 4 do art.º 105º RGIT é uma condição objectiva de punibilidade [Os factos descritos nos números anteriores só são puníveis se… ] mas cuja aplicação não se estende ao crime de nos ocupamos nos presentes autos.
A propósito da questão da agravação determinada pelo valor da vantagem patrimonial obtida pelos arguidos, o que se mostra relevante não é a concreta determinação da prestação tributária que se mostra em divida, ou passível de vir a ser apurada como sendo devida.
O resultado vantagem patrimonial ilegítima, visado ou alcançado com as condutas, não constitui um elemento objectivo do tipo de ilícito, não importando, por conseguinte, para determinar o momento da consumação do crime (não obstante, não ser crime de resultado o desvalor de resultado, se o houver pode ser relevante, designadamente para efeitos de determinação da medida da pena, e outros).
De acordo com o disposto no art.º 103º, nº 2, do RGIT, os factos não são puníveis se a vantagem patrimonial ilegítima for inferior a €15.000,00.
O tipo não exige que o perigo venha efectivamente a verificar-se, mas permite que seja objecto de um juízo negativo que exclui a responsabilidade penal, no caso em que o comportamento proibido não seja idóneo a provocar uma vantagem patrimonial igual ou superior a €15.000,00.
O relato de agentes de investigação (OPC) sobre dados, informações ou contribuições de que tomaram conhecimento fora do âmbito de diligências produzidas sob a égide da oralidade (interrogatórios, acareações, tomadas de declarações, conversas formais) e que não o devessem ser sobre tal formalismo, bem como no âmbito das demais diligências, actos de investigação e meios de obtenção de prova (actos de investigação proactiva, buscas e revistas, exames ao lugar do crime, reconstituição do crime, reconhecimentos presenciais, entregas controladas, etc) que tenham autonomia técnico-jurídica constituem depoimento válido e eficaz por se mostrarem alheias ao âmbito de tutela dos Art.ºs 129.º e 357.º, ambos do CPPenal.
Não tendo sido levadas a recurso, oportunamente, pelo M.º P.º, as questões da nulidade invocada acerca da sujeição da suspensão de execução da pena decretada aos arguidos LT e LG à condição de “pagamento da prestação tributária prestação tributária que vier a ser apurada, após liquidação pelos tribunais tributários, devendo o arguido apresentar documento comprovativo desse pagamento.”, e a de não se mostrar estabelecido um prazo para a respectiva comprovação do pagamento, trazer estas questões em sede de parecer mais não representa que um alargamento das questões a conhecer por parte de sujeito processual que, tendo legitimidade para o mesmo, não o quis interpor atempadamente, o que representaria para estes uma efectiva reformatio in pejus na medida em que o quadro sancionatório, que não se esgota apenas na pena privativa de liberdade ou da sua substituta fixada, se mostraria mais exigente e penoso, o que se mostra proibido por força do disposto no art.º 409º CPP.
Decisão Texto Parcial:Acordam, em conferência, na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:


I.–

No processo 5/10.3IFLSB do Juízo Central Criminal de Lisboa, Comarca de Lisboa, os arguidos JMG , MAG , JTG , FMA , AJE , JMR , “AJ , S.A.”, “ARH , Lda.”, “AXXI , Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal”, “CSL – Sucursal em Portugal” e “APSCF , Lda.”, actualmente denominada de “G. , Lda.”, foram submetidos a julgamento depois de terem sido os mesmos pronunciados:

– os arguidos JMG , em co-autoria, sob a forma consumada e em concurso real, um crime de fraude fiscal, previsto e punido, pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a) e d), n.º 2, alínea a) e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, e um crime de associação criminosa, previsto e punido pelo artigo 89.º, n.º 1, e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro.

– os arguidos MAG , JTG , FMA , AJE  e JMR , em co-autoria, sob a forma consumada e em concurso real, um crime de fraude fiscal, previsto e punido pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2 , alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro e um crime de associação criminosa, previsto e punido pelo artigo 89.º, n.º 1, e 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro.

– as sociedades “AJ, SA”, “ARH , Lda.”, “AXXI , Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal” e pela “CSL – Sucursal em Portugal” em responsabilidade criminal pela prática de um crime de fraude fiscal, previsto e punido, pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro e de um crime de associação criminosa, previsto e punido pelo artigo 89.º, n.º 1, e 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n. º64-B/2011, de 30 de Dezembro.

O Ministério Público, em representação do Estado Português, na sequência da dedução da acusação, apresentou pedido de indemnização civil contra todos os arguidos, no valor de 5.250.487,26 €, acrescido de juros à taxa legal, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

Realizada audiência, foi proferida decisão final em que se decidiu, na parte agora relevante.
“…

4.– Condenar o arguido JMG  pela prática em co-autoria de um crime de fraude fiscal, previsto e punido pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão.

5.– Nos termos do disposto no artº 14 do RGIT conjugado com o artº 50 do C. Penal, suspender a execução da pena de prisão por igual período.

6.– Esta suspensão fica condicionada ao pagamento da prestação tributária que vier a ser apurada, após liquidação pelos tribunais tributários, devendo o arguido apresentar documento comprovativo desse pagamento. 

7.– Condenar o arguido JTG  pela prática em co-autoria de um crime de fraude fiscal, previsto e punido pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 3 anos e 9 meses de prisão.

8.– Nos termos do disposto no artº 14 do RGIT conjugado com o artº 50 do C. Penal, suspender a execução da pena de prisão por igual período condicionando esta suspensão ao pagamento da prestação tributária prestação tributária que vier a ser apurada, após liquidação pelos tribunais tributários, devendo o arguido apresentar documento comprovativo desse pagamento.

9.– Condenar o arguido FMA , pela prática em co-autoria de um crime de fraude fiscal, previsto e punido pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 4 anos de prisão;

10.– Nos termos do disposto no artº 14 do RGIT conjugado com o artº 50 do C. Penal, suspender a execução da pena de prisão por igual período.

11.– Condenar o arguido AJE  pela prática em co-autoria de um crime de fraude fiscal, previsto e punido pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 2 anos e 9 meses de prisão.

12.– Nos termos do disposto no artº 14 do RGIT conjugado com o artº 50 do C. Penal, suspender a execução da pena de prisão por igual período.

13.– Condenar a sociedade arguida “AJ SA” pela prática de um crime de fraude fiscal, previsto e punido, pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 900 dias de multa à taxa diária de 80 €, o que perfaz a multa de 72.000€.

14.– Condenar a sociedade arguida “ARH , Lda.”, pela prática de um crime de fraude fiscal, previsto e punido, pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 580 dias de multa, à taxa diária de 10€, o que perfaz a multa de 5.800€.

15.– Condenar a sociedade “AXXI , Lda.”, pela prática de um crime de fraude fiscal, previsto e punido, pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 580 dias de multa, à taxa diária de 10€, o que perfaz a multa de 5.800€.

16.– Condenar a sociedade “AI, S.A.”, pela prática de um crime de fraude fiscal, previsto e punido, pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 580 dias de multa, à taxa diária de 10€, o que perfaz a multa de 5.800€.

17.– Condenar a sociedade “AJ, Lda.”, pela prática de um crime de fraude fiscal, previsto e punido, pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 580 dias de multa, à taxa diária de 10€, o que perfaz a multa de 5.800€.

18.– Condenar a sociedade “AHL – Sucursal em Portugal” pela prática de um crime de fraude fiscal, previsto e punido, pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 580 dias de multa, à taxa diária de 10€, o que perfaz a multa de 5.800€.

19.– Condenar a sociedade “CSL” pela prática de um crime de fraude fiscal, previsto e punido, pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 550 dias de multa, à taxa diária de 20€, o que perfaz a multa de 11.000€.

20.– Condenar a sociedade “G. , Lda.” pela prática de um crime de fraude fiscal, previsto e punido, pelos artigos 7.º, n.º 1, 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, na pena de 500 dias, à taxa diária de 7€, o que perfaz a multa de 3.500€.

21.– Declarar a incompetência deste tribunal, em razão da matéria, para apreciar o pedido de indemnização civil formulado nestes autos e consequentemente absolver os arguidos/demandados da instância civil.
…”

Desta decisão condenatória vieram recorrer os seguintes arguidos, por ordem de entrada dos recursos, fundamentando a sua discordância nas seguintes conclusões, respectivamente:

1.– Os arguidos AJE  e G. , Lda.:

“1.– Os arguidos, aqui Recorrentes, foram condenados pela prática em co-autoria de um crime de fraude fiscal p. e p. pelos artigos 7o, n°1, 103°, n°1, alínea a) e 104°, n°1, alíneas a) e d), n°2, alínea a) e n°3 do RGIT.
2.– A enumeração dos factos provados e dos factos não provados, segundo decorre das disposições conjugadas dos citados artigos 339°, n° 4 e 368°, n° 2 do CPP, deve traduzir-se na tomada de posição por parte do tribunal sobre todos os factos sujeitos à sua apreciação e sobre os quais a decisão terá de incidir, e que são os factos constantes da acusação ou da pronúncia, da contestação e do pedido de indemnização, e ainda sobre os factos com relevância para a decisão que, embora não constem de nenhuma daquelas peças processuais, tenham resultado da discussão da causa.
3.–Ao longo da audiência de julgamento foram ficando demonstrados diversos factos alegados pelo arguidos, aqui Recorrentes, na sua contestação, aos quais, não obstante terem sido profundamente debatidos, o Tribunal a quo não deu relevância, devendo tê-lo feito.
4.–Assim aconteceu com o alegado nos artigos 2o, 3o e 54° da contestação, cujo teor resulta provado pelo documento de fls. 4 deste processo, pelos depoimentos gravados no Sistema Integrado de Gravação Digital em uso no Tribunal (adiante SIGD) de RC [dias: 23/02/2017 (início às 11h48 e termo às 12h58), 09/03/2017 (início às 10h22 e termo às 12h50; reinício às 16h28 e termo às 18h18) e 30/03/2017 (início às 09h22 e termo às 12h50)], inspector tributário, relevando, neste caso o que disse entre os minutos 7:29 e 9:40; IES [dias: 06/04/2017 (início às 10h23 e termo às 12h34); 04/05/2017 (início às 15h23 e termo às 17h49) e 19/05/2017 (início às 10h21 e termo às 12H15)], inspectora tributária, relevando neste caso o que disse entre 1h05:46 e 1h06:03; JC [dia 29/09/2017 (início às 16h01 e termo às 16h42)], contabilista certificado, relevando neste caso o que disse entre os minutos 37:58 e 38:55; RO [dia 10/11/2017 (início às 10h44 e termo às 11 h14)], contabilista certificado, relevando neste caso o que disse entre os minutos 17:00 e 18:55 e as declarações do próprio arguido AJE , também ele contabilista certificado [dias 15/12/2017 (início às 10h50 e termo às 12h49) e 08/01/2018 (início às 10h32 e termo às 12h02), relevando neste caso o que disse no dia 15/12/2017 entre os minutos 11:05 e 12:43.
5.–Mais: o próprio Tribunal invocou conhecer a origem deste processo ao referir "(...) se é certo que as divergências entre os dois anexos (...) poderia dar origem a uma inspecção por parte da AT, não é menos certo que estas divergências só foram verificadas cerca de quatro anos depois (....)" (fls. 92 do Acórdão posto em crise).
6.– Por sua vez, a confirmação do alerta que a discrepância entre os Anexos O e P da IES gera na Autoridade Tributária resulta dos já identificados depoimentos de RC (minuto 1h10:44 a 1h12:48 do seu depoimento do dia 30/03/2017), RO (minuto 18:55 a 20:58 do seu depoimento do dia 10/11/2017).
7.– Tais factos têm extrema importância, concretamente (mas não só), para efeitos de apuramento da vontade de todos os arguidos, do grau de culpa (havendo-a), da existência de causa de exclusão de ilicitude ou culpa e da verificação de outros pressupostos da punibilidade, pelo que os factos constantes dos artigos 2º, 3º e 54° da contestação dos arguidos, aqui Recorrentes, não podem deixar de se considerar relevantes e de ser incluídos na matéria de facto provada.
8.– A omissão do Tribunal a quo de incluir tais factos no rol de factos provados redunda em nulidade do acórdão, nesta parte, nos termos do artigo 379°, n° 1, alíneas a) e c) do CPP, que aqui se argui e que deverá ser declarada e suprida por este Venerando Tribunal da Relação nos termos do disposto no n° 2 do artigo 379° do CPP, no sentido de os factos constantes dos artigos 2º, 3º e 54° da contestação serem considerados relevantes e incluídos ipsis verbis na matéria de facto provada.
9.– Assim aconteceu, também, com o alegado nos artigos 43° e 55° da contestação referentes aos extractos bancários das contas da co-arguida AJ, SA, matéria que foi amplamente debatida na audiência de julgamento e que se afigura de extrema importância para o apuramento do conhecimento do arguido AJE  do alegado esquema fraudulento.
10.– A esta matéria foram ouvidas testemunhas, cujos depoimentos ficaram gravados no SIGD e que demonstram a veracidade do alegado na contestação, a saber: RC (dia 23/02/2017, início às 11h48 e termo às 12h58, concretamente entre o minuto 41:30 e o minuto 43:47); IES (dia 19/05/2017, início às 10h21 e termo às 12h15, concretamente entre o os minutos 1h44:20 e 1h45:02); JC (dia 12/09/2017, início às 10h33 e termo às 10h50, concretamente entre os minutos 15:50 e 16:27 e o próprio arguido AJE  (dias 15/12/2017, início às 10h50 e termo às 12h49, concretamente entre os minutos 1h50:15 e 1h51:30).
11.– Acresce ainda a busca realizada, no dia 09/05/2012, ao gabinete de contabilidade do arguido AJE , da qual resultou apreensão de diversa documentação da arguida Ambiente e Jardim, SA, conforme auto de busca e apreensão de fls. 471 a 476 e 519 e seguintes do processo e da qual resulta, sem margem para dúvidas, a inexistência de extractos bancários nos dossiers da AJ, SA.
12.– Aliás, o próprio Tribunal a quo admite tal facto, a fls. 42 do Acórdão, ao afirmar que "(..) o arguido não tinha acesso às contas bancárias - tudo indica que, efectivamente não tinha acesso a essas informações (...)", embora, mesmo assim, tenha omitido do rol de factos provados com relevo para a tomada de decisão este facto, o que redunda em nulidade do acórdão nesta parte, nos termos do artigo 379°, n°1, alíneas a) e c) do CPP, que aqui se argui e se requer seja declarada e suprida por esse Venerando Tribunal que deverá dar como provado o seguinte facto "O arguido AJE  não tinha acesso aos extractos bancários da AJ, SA e não efectuava a reconciliação bancária."
13.– Na livre apreciação, o tribunal tem liberdade de formar a sua convicção, desde que essa apreciação não contrarie as regras comuns da lógica, da razão e as máximas da experiência e dos conhecimentos científicos.
14.– No caso concreto, os arguidos, aqui Recorrentes consideram, ao abrigo do disposto no artigo 412° do CPP, existir erro de julgamento no que toca aos pontos de facto provados i) 11, 23, 34, 47, 58 e 82; ii) 28; iii) 29; iv) 30 e 31; v) 38, 50, 63, 74, 85, 95, 102 e vi) 40, 41, 43, 51, 52, 54, 64, 65, 66, 67, 75, 76, 77, 78, 86, 87, 88, 89, 96, 103, 104, 105, 106, 107, 140, 141, 142, 143, 147 e 148.
15.– No que respeita aos pontos de factos provados 11, 23, 34, 47, 58 e 82, entendem os arguidos/ Recorrentes que o facto de o arguido AJE  ter assinado as declarações de início de actividade das sociedades «Aj Lda», «ARH, Lda», «AXXI , Lda», «A. Lda», «AHL» e «CSL » desacompanhado de qualquer outra acção própria de TOC impede que o mesmo seja considerado TOC 'de facto' das aludidas sociedades.
16.– Tal conclusão resulta directamente do depoimento já identificado da inspectora IES (dia 19/05/2017, entre os minutos 1h30:17 e 1h31:56) e das declarações também já identificadas do arguido AJE  do dia 15/12/2017, entre os minutos 31:50 e 32:50, 39:00 e 39:30, 44:15 e 44:48, bem como dos autos de busca e apreensão realizadas à residência e ao escritório do Recorrentes no dia 09/05/2012 (lavrados a 471/476 e 519 e seguintes destes autos) onde inexistiam pastas de contabilidade das ditas Sociedades na posse do arguido AJE, o que é demonstrativo de actividade do arguido AJE  a favor daquelas Sociedades, ao contrário do que acontecia com as pastas da contabilidade da AJ, que aí se encontravam e foram apreendidas.
17.– Por último e naturalmente sem conceder, é criticável que o Tribunal a quo utilize conceitos de direito para caracterizar a gerência, designando, de um lado, o arguido JMG  como 'gerente de facto' e o arguido FMA  como 'gerente de direito' e designe, do outro, o arguido AJE peremptoriamente como TOC, como se fosse suficiente a inscrição nessa qualidade para sobre ele impender toda a responsabilidade contabilística e fiscal das ditas empresas no decurso de todo o período em causa nestes autos.
18.– Do que se deixou dito, entende o arguido/recorrente que os factos provados 11, 23, 34, 47, 58 e 82 devem ser alterados, passando a considerar-se provado que: Facto provado 11: "O arguido AJE  assinou, como TOC, as declarações de início de actividade das sociedades «ALJ, Lda», «ARH, Lda», «AXXI, Lda», «Aj Lda», «AHL» e «CSL »"; Facto provado 23: "O arguido AJE  desempenhava funções de Técnico Oficial de Contas (TOC) da AJ , SA"; Facto provado 34: "A «ALJ, Lda» tinha como gerente de facto e de direito o arguido JMG e teve como TOC inscrito até data não apurada o arguido AJE "; Facto provado 47: "Aquela sociedade [«ARH, Lda»] tinha como gerente de direito o arguido FMA  e o arguido AJE  esteve inscrito como seu TOC até 19.07.2007"; Facto provado 58: "Aquela sociedade [«AXXI , Lda»] tinha como gerente de direito o arguido FMA  e, como TOC inscrito até 03.04.2008, o arguido AJE "; Facto provado 82: "A gerência de direito [da «Aj, Lda"] pertencia ao arguido FMA , sendo que AJE  esteve inscrito como respectivo TOC até 22.04.2009".
19.– Os arguidos, aqui Recorrentes, consideram que o ponto de facto provado 28 não resulta da correcta análise conjugada da prova documental com a prova testemunhal e que a prova produzida impõe decisão diversa, devendo ser alterado.
20.– Com relevância para o ponto 28 destacam-se os seguintes depoimentos, todos gravados no SIGD: Declarações do co-arguido JF (dia 16/06/2017, com início às 10h45 e termo às 12h58, relevando aqui os minutos 1h35:07 e 1h35:30) Declarações do co-arguido, aqui Recorrente, AJE , já identificadas (dia 15/12/2017, relevando aqui os minutos 1h28:40 e o minuto 1h30:35); Testemunha VC (dia 12/09/2017, com início às 11h08 e termo às 11h36, relevando aqui os minutos 4:10 a 4:30) e a testemunha FA (dia 29/09/2017, com início às 16h42 e termo às 16h56, relevando neste caso os minutos 1:54 e 1:59, 8:52 e 9:23, 9:50 e 10:20, 12:44 e 13:31), de onde, apenas, se apurou que o trabalhador da Aj, Lda - VC - tinha acordo com o Sr. FMA  no sentido de processar os salários dos trabalhadores das limpezas e não a AJ, como se diz no Acórdão e que as supervisoras da AJ, Lda supervisionavam a actividade dos trabalhadores das limpezas.
21.– Do que se deixou dito, entendem os arguidos/Recorrentes que o ponto de facto 28 deve ser alterado, passando a considerar-se provado com o seguinte teor: Um trabalhador da AJ, Lda - VC - processava os salários de trabalhadores das limpezas, e funcionários pertencentes ao quadro próprio de pessoal da Aj, Lda supervisionavam o trabalho daqueles trabalhadores das limpezas.
22.– Neste processo, está em causa, primeiro, a apreciação da existência de contratos de cedência e gestão de pessoal, depois a licitude da utilização de facturas emergentes desses contratos e, depois, a licitude da inclusão dos respectivos valores na contabilidade da sociedade "AJ, Lda".
23.– Assim, quando o Tribunal a quo, no ponto de facto 29, afirma, pura e simplesmente, que os contratos não foram efectuados e que não corresponderam a serviços efectivamente prestados, está a decidir (dir-se-á antes do tempo) sobre os factos submetidos à sua apreciação, o que não é possível nem se afigura correcto.
24.– As conclusões jurídicas, que encerram juízos sobre a responsabilidade, ou seja, que, só por si decidem a questão relativa ao facto ilícito e à culpa, só podem constar da fundamentação e das respectivas conclusões na sentença recorrida e não já do elenco factual provado, pelo que deve o ponto de facto 29 deve ser arredado da matéria de facto provada.
25.– Acresce que, o ponto de facto 29 contraria os seguintes documentos juntos pela própria acusação: Apenso 33 (does. 47, 48, 52, 53 e 54); Apenso 34 (doe. 78); Apenso 59; Apenso 73 (does. 20 e 28), contratos de seguro com sociedades ditas fictícias, contas bancárias e contratos de arrendamento, todos debatidos na audiência de julgamento.
26.– Também entre o minuto 07:19 e o minuto 8:58 das suas identificadas declarações de 16/06/2017, o co-arguido JF confirmou ter, a pedido dos co-arguidos JMG  e FMA , revisto os contratos de prestação de serviços em causa nos autos e o Inspector RC, no já identificado depoimento do dia 09/03/2017, entre o minuto 1h56:01 e o minuto 1h58:21 confirmou ter visto alguns desses contratos.
27.– Por seu turno, a testemunha FA, no dia 29/09/2017, confirmou entre o minuto 12:44 e o 13:31 do seu depoimento que a AJ  contratava outras empresas em regime de outsourcing que pertenciam ao co-arguido FMA  e o co-arguido AJE  confirmou nas suas já identificadas declarações de 15/12/2017, entre o minuto 1h05:40 e o minuto 1h06:37, que, por falta de pessoal, a AJ  tinha que subcontratar.
28.– Assim, mesmo que se entenda que o teor do ponto 29 dos factos provados não constitui uma conclusão e que, nesse sentido, poderá manter-se - o que, apenas por mera hipótese académica se admite - o certo é que contraria toda a prova produzida, pois os contratos foram efectuados e compreendiam os serviços prestados já que a AJ  não tinha estrutura para cumprir as adjudicações que lhe eram feitas, pelo que o teor daquele ponto não corresponde à realidade, motivo pelo qual deverá, em qualquer caso, ser suprimido.
29.– O teor dos pontos de facto provados 30 e 31 não correspondem integralmente ao que resultou provado.
30.– No tocante aos manuscritos, destacam-se as declarações do arguido AJE  prestadas no dia 15/12/2017 entre os minutos 21:20 e 27:00, conjugadas com o depoimento de MFE no dia 13/07/2017 (gravado no SIGD entre as 15h18 e as 15h45, relevando, neste caso os minutos 17:02 a 18:53) e com o depoimento RO de 10/11/2017, entre o minuto 21:02 e 23:13, que permitem perceber que se tratavam de meros rascunhos, transitórios, a serem retirados quando os originais fossem entregues pela AJ .
31.– Por outro lado, o lançamento contabilístico de documentos e a entrega de declarações fiscais é uma questão respeitante apenas ao TOC e ao respectivo Cliente, pelo que são excessivas as referências no ponto 31 aos demais arguidos.
32.– Do que se deixou dito, entendem os arguidos/Recorrentes que factos provados 30 e 31 do acórdão devem ser alterados, passando a considerar-se provado que: "Facto provado 30. O arguido AJE contabilizava facturas emitidas em nome das sociedades acima mencionadas - ponto 17 - à AJ, SA e, no lugar de facturas que não lhe eram entregues, e enquanto esperava que o fossem, manuscritos, por si redigidos, com os elementos das facturas, com o valor contabilizado com base no acordo celebrado entre a Ambiente e Jardim SA e cada uma das restantes sociedades. "Facto provado 31. Com base nos elementos supramencionados o arguido AJE , com o conhecimento e o acordo da AJ, SA, efectuava lançamentos contabilísticos, preenchia as declarações fiscais da "AJ, SA» e remetia-as à Autoridade Tributária."
33.– Os pontos de facto provados 38, 50, 63, 74, 85, 95 e 102 encerram conclusões, o que só por si justifica a sua supressão do elenco de factos provados.
34.– Assim, quando o Tribunal a quo, nos pontos de facto atrás enunciados afirma, pura e simplesmente, que os serviços constantes das facturas não foram prestados, tudo desagregado de uma sequência lógica que permita tal conclusão e que tal conclusão seja, ainda assim, um facto, ter-se-á que expurgar do elenco dos factos provados tais afirmações.
35.– Com efeito, as conclusões jurídicas, que encerram juízos sobre a responsabilidade, ou seja, que, só por si decidem a questão relativa ao facto ilícito e à culpa, não podem integrar a factualidade dada como provada.
36.– Ademais, a prova documental desmente o teor dos factos dados por provados 38, 50, 63, 74, 85, 95 e 102, a saber: Contratos de trabalho celebrados entre trabalhadoras e as empresas fornecedoras (Apenso 33, does 48 e 52); inscrição dos trabalhadores na Segurança Social em nome das empresas fornecedoras; cartas de trabalhadoras dirigidas às empresas fornecedoras, contratos de prestação de serviços (Apenso 73), correspondência com companhia de seguros (Apensos 57 e 58).
37.– Também a testemunha RC referiu expressamente no dia 30/03/2017, entre o minuto 2h35:56 e o minuto 2h26:26 do seu depoimento, que não consegue explicar como é que se justifica a consolidação de situações na segurança social de inúmeros trabalhadores, que entretanto já estão reformados, tiveram licenças de parto, que tiveram benefícios sociais associados à sua condição de trabalhadores de outras entidades (conforme resulta do depoimento de FA, no dia 29/09/2017, entre os minutos 12:44 e 13:21 e das declarações do arguido AJE  no dia 15/12/2017, entres os minutos 1h05:40 e 1h06:37), quando, neste processo, a Autoridade Tributária os integra como trabalhadores da AJ .
38.– Em suma, consideram os Recorrentes que os pontos 38, 50, 63, 74, 85, 95 e 102 dos factos provados devem ser suprimidos, por encerrarem conclusões e não poderem, como tal, integrar os factos provados e mesmo que se entenda que não constituem uma conclusão - o que, apenas por mera hipótese académica se admite - o certo é que contrariam toda a prova produzida e atrás enunciada, pelo que o teor daquele ponto não corresponde à realidade, motivo pelo qual deverá, em qualquer caso, ser suprimido.
39.– Neste processo, está em causa, primeiro, a apreciação da existência de contratos de cedência e gestão de pessoal, depois a licitude da utilização de facturas emergentes desses contratos e, depois, a licitude da inclusão dos respectivos valores na contabilidade da sociedade "AJ, SA".
40.– Somente, depois, repete-se, depois, e já em sede de conclusão, é que é possível proceder ao apuramento de valores alegadamente indevidos.
41.– Sucede que, nos pontos de facto provados 40, 41, 43, 51, 52, 54, 64, 65, 66, 67, 75, 76, 77, 78, 86, 87, 88, 89, 96, 103, 104, 105, 106, 107, 140, 141,142, 143, 144 148 o Tribunal a quo vem afirmar que determinada dedução de IVA é indevida e que os arguidos obtiveram uma vantagem patrimonial também indevida.
42.– Dizer-se que foi deduzido um montante indevido é, por si só, e sem necessidade de mais, atributivo de responsabilidade, pelo que tais afirmações contidas nos pontos de facto 40, 41, 43, 51, 52, 54, 64, 65, 66, 67, 75, 76, 77, 78, 86, 87, 88, 89, 96, 103, 104, 105, 106, 107, 140, 141, 142, 143, 144 e 147 devem ser excluídas dos factos provados.
43.– E mesmo que assim se não entenda, o que apenas por mera hipótese académica se admite, o certo é que tais pontos de facto contrariam frontalmente a prova documental, por declarações e testemunhal produzida, ao invés do que o Tribunal a quo afirmou.
44.– Basicamente, o que a Autoridade Tributária invocou e que foi aceite pelo Tribunal a quo e plasmou no acórdão de que se recorre foi o seguinte: As empresas fornecedoras são fictícias; Os serviços de limpeza em causa não foram prestados por estas empresas, mas sim desenvolvidos pela própria AJ ; As facturas emitidas pelas empresas fornecedoras são falsas (por inexistência dos serviços) e por isso não podem ser consideradas; O IVA deduzido dessas facturas pela AJ  deve ser entregue ao Estado; A AJ  pagou os salários líquidos dos trabalhadores que efectuaram as limpezas no período em causa; Deduzindo esse custo, dito efectivo, às facturas incluídas na contabilidade da Aj, resulta haver IRC a pagar.
45.– O certo é que as liquidações feitas pela Autoridade Tributária e que o Ministério Público acolheu para a acusação e o Tribunal a quo acolheu para o acórdão foram impugnadas não só junto dos Tribunais Tributários, mas também na audiência de julgamento deste processo.
46.– Com efeito, por despacho datado de 23/02/2017 (2a sessão da audiência de julgamento), o Tribunal a quo, recusando o pedido de suspensão deste processo, confirmou estar em curso, pelo menos, uma impugnação judicial de liquidação de IVA e IRC, na qual é impugnante a AJ, SA.
47.– Ou seja, não há dúvida de que há dúvidas sobre o montante de imposto a pagar pela AJ  e pelas empresas fornecedoras, se é que existe imposto a pagar pela AJ .
48.– Por outro lado, há processos a correr contra as empresas fornecedoras pelo crime de abuso de confiança, tendo por base a falta de pagamento dos descontos para a Segurança Social, entre os quais os seguintes: 411/11.6TDLSB, 2400/10.9TDLSB, 3781/10.0TDLSB, 297/08.8TDLSB, 4921/11.7TDLSB, cujas acusações constam de fls. 3067 a 3099 deste processo e que quer o Tribunal a quo quer a Autoridade Tributária conhecem bem, tendo sido expressamente abordados na audiência de julgamento.
49.– Ora, se a Autoridade Tributária contabilizou montantes pagos em valor correspondente a salários e os qualificou como salários (mesmo sem ter recibos de salário e mesmo sem ter contratos de trabalho), não poderia deixar de levar em conta os encargos sociais decorrentes desses alegados salários (independentemente de terem ou não terem sido pagos)
50.– É que, a não ser assim, o Estado estará a duplicar o pedido, porquanto, neste processo, reclama um montante à AJ  e aos demais arguidos que considera vantagem patrimonial e ao qual não deduz os encargos que decorrem dos contratos de trabalho que considera existirem e nos processos-crime atrás mencionados e noutros em curso reclama às empresas fornecedoras (aqui ditas fictícias) o mesmo valor, mas, dando-lhe outro nome (encargos sociais), por as considerar entidades empregadoras daqueles trabalhadores...
51.– Já se vê que as contas da Autoridade Tributária e acolhidas pelo Tribunal recorrido não podem vingar.
52.– Do mesmo modo, a Autoridade Tributária teria que ter levado em conta nos seus cálculos outros encargos que teriam decorrido para a AJ , fosse esta a entidade empregadora daqueles trabalhadores, tais como seguros de acidentes de trabalho, formação profissional, caducidades, indemnizações e outros.
53.– A estas questões, as testemunhas vindas da Autoridade Tributária e autoras do relatório que deu base ao entendimento do Estado e também do Tribunal recorrido, não deram resposta minimamente cabal, conforme resulta do já identificado depoimento de RC no dia 30/03/2017, entre os minutos 2h21:40 e 2h25:29 e do também já identificado depoimento de IES, entre os minutos 44:34 e 48:30 que assumem que só os encargos sociais referentes a todos os trabalhadores que consideraram pertencer à AJ  no período de 2006 a Março de 2012 seria de 3.252.704,00 € e que tal valor influenciaria o IRC a pagar pela AJ .
54.– No Acórdão recorrido, o Tribunal a quo afirmou "(...) estando em causa, no pedido de indemnização civil, o pagamento de prestações tributárias - IVA indevidamente deduzido e IRC - sujeitas a impugnações e eventuais liquidações adicionais feitas pela AT, este tribunal, na fase em que se encontra, não é competente para aferir tal prestação", e declarou-se, em consequência, materialmente incompetente para apreciar tal pedido, (fls. 129 do Acórdão)
55.– Vale dizer que o Tribunal a quo não está declaradamente munido de elementos para poder afirmar que os valores deduzidos a título de IVA são indevidos nem pode afirmar convictamente que os valores alegadamente devidos a título de IRC estão correctos.
56.– Tendo havido correspondência exacta entre o valor que a Autoridade Tributária considerou ser vantagem patrimonial e o valor do imposto que considera devido, não há como manter provados os factos agora postos em crise.
57.– Do que se deixou dito, entendem os arguidos/Recorrentes que os factos 40, 41, 42 43, 51, 52, 53, 54, 64, 65, 66, 67, 75, 76, 77, 78, 86, 87, 88, 89, 96, 103, 105 e 106 devem ser alterados, passando a considerar-se provado apenas o seguinte: "Facto provado 40. No exercício de 2006, a sociedade AJ, SA, em função das facturas e/ou dos manuscritos com elementos das facturas, deduziu IVA no valor global de 599.660,90 €; "Facto provado 41. Em sede de IRC, no exercício de 2006, a AJ, SA contabilizou como custos as facturas e manuscritos com elementos das facturas emitidos pela ALJ Lda; "Facto provado 42. No ano 2006, a ALJ, Lda facturou à AJ  o montante de 2.855.517,92 €, dos quais esta pagou 1.013.333,27 € em cheque ou transferência bancária directamente aos trabalhadores das limpezas, montante correspondente aos salários líquidos respectivos e que foi imputado àquela sociedade; "Facto provado 43. A diferença entre o valor facturado e o valor pago é de 1.842.186,65 €, o que aplicando a taxa de IRC de 25%, resulta um montante de 460.546,66 € de IRC"; "Facto provado 51. No exercício de 2007, a sociedade AJ, SA, em função das facturas e/ou dos manuscritos com elementos das facturas, deduziu IVA no valor de 450.042,46 €; "Facto provado 52. Em sede de IRC, no exercício de 2007, a AJ, SA contabilizou, como custos as facturas e manuscritos com elementos das facturas emitidos pela ALJ, Lda; "Facto provado 53. No ano 2007, a ARH, Lda facturou à AJ  o montante de 2.143.059,40 €, dos quais esta pagou 1.506.616,77 € em cheque ou transferência bancária directamente aos trabalhadores das limpezas, montante correspondente aos salários líquidos respectivos e que foi imputado àquela sociedade; "Facto provado 54. A diferença entre o valor facturado e o valor pago é de 636.442,63 €, o que aplicando a taxa de IRC de 25%, resulta o montante de 159.110,66 € de IRC"; "Facto provado 64. No exercício de 2008, a sociedade AJ, SA, em função das facturas e/ou dos manuscritos com elementos das facturas, deduziu IVA no valor global de 531.083,01
€; "Facto provado 65. Em sede de IRC, no exercício de 2008, a AJ, SA contabilizou, como custos as facturas e manuscritos com elementos das facturas emitidos pela AXXI ;"Facto provado 66.No ano 2008, a AXXI, Lda facturou à AJ  o montante de 2.591.557,85 €, dos quais esta pagou 1.732.169,72 € em cheque ou transferência bancária directamente aos trabalhadores das limpezas, montante correspondente aos salários líquidos respectivos e que foi imputado àquela sociedade; "Facto provado 67. A diferença entre o valor facturado e o valor pago é de 825.221,79 €, o que aplicando a taxa de IRC de 25%, resulta o montante de 206.305,45 € de IRC; "Facto provado 75. No exercício de 2009, a sociedade AJ, SA, em função das facturas e/ou dos manuscritos com elementos das facturas, deduziu IVA no valor global de 567.976,57 €; "Facto provado 76. Em sede de IRC, no exercício de 2009, a AJ, SA contabilizou, como custos aquelas facturas ou manuscritos com elementos das facturas emitidas pela AI, SA; "Facto provado 77. No ano 2009, a AI, SA facturou à AJ , SA o montante de 2.839.882,78 €, dos quais esta pagou 2.060.898,47 € directamente aos trabalhadores das limpezas, montante correspondente aos salários líquidos respectivos e que foi imputado àquela sociedade; "Facto provado 78. A diferença entre o valor facturado e o valor pago é de 758.848,50 €, o que aplicando a taxa de IRC de 25%, resulta o montante de 189.621,13 € de IRC; "Facto provado 86. No exercício de 2010, a sociedade AJ, SA deduziu IVA no valor global de 754.826,30 €; "Facto provado 87.Em sede de IRC, no exercício de 2010, a AJ, SA contabilizou, como custos as facturas e manuscritos com elementos das facturas emitidos pela Aj, Lda; "Facto provado 88. No ano 2010, a Aj, Lda facturou à AJ, SA o montante de 3.673.319,36 €, dos quais esta pagou 1.997.153,60 € directamente aos trabalhadores das limpezas, montante correspondente aos salários líquidos respectivos e que foi imputado àquela sociedade; "Facto provado 89. A diferença entre o valor facturado e o valor pago é de 1.676.165,76 €, o que aplicando a taxa de IRC de 25%, resulta o montante de 419.041,44 € de IRC; "Facto provado 96. No exercício de 2011, a sociedade AJ, SA, em função das facturas e/ou dos manuscritos com elementos das facturas, deduziu IVA no valor global de 823.572,23 €; 'Facto provado 103. No exercício de 2012, a sociedade AJ, SA, relativamente ao período compreendido entre Janeiro e Março, deduziu IVA no valor global de 88.700,46 €; "Facto provado 105. A AJ , SA no período compreendido entre Janeiro de 2006 e Março de 2012 deduziu o montante de 3.815.861,93 € de IVA; "Facto provado 106. No período compreendido entre Janeiro de 2006 e Março de 2012, a diferença entre o total das facturas e o total pago nos termos acima descritos importam, mediante aplicação da taxa de IRC de 25%, um montante de 1.434.625,33 € de IRC; "140. Os arguidos JMG, AJE  e FMA  utilizaram na «AJ, SA» facturas emitidas pelas sociedades «ALJ, Lda», «ARH, Lda», «AXXI, Lda», «AI, SA", «Aj Lda», «AHL - sucursal em Portugal» e «CSL - Sucursal em Portugal», que introduziram na contabilidade e nas declarações fiscais da «AJ, SA»; "142. Deste modo, as referidas facturas foram inscritas na escrita da sociedade «AJ, SA» quer nas declarações periódicas de IVA, quer nas declarações anuais de IRC, nos exercícios a que as mesmas respeitavam como custos efectivos.
58.– Já os factos anteriormente provados 104, 107, 141, 143, 144 e 148 devem ser suprimidos, por não existir redacção que se lhes possa dar, que não seja conclusiva, sendo certo que o respectivo teor não ficou demonstrado.
59.– À cautela e caso a nulidade invocada venha a ser indeferida por motivo processual, deverá a matéria em causa ser incluída no rol dos factos provados, ao abrigo dos mesmos dispositivos legais atrás invocados, e com os mesmos fundamentos aduzidos e que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
60.– A decisão de procedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto conduzirá necessariamente a uma decisão de absolvição dos arguidos, aqui Recorrentes.
61.– Expurgando do rol dos factos provados, pelo menos, e sem conceder, todos os juízos conclusivos, sempre terá que se decidir no sentido da absolvição dos arguidos.
62.– Dos factos primeiramente imputados ao arguido AJE  e após audiência de julgamento, sobraram na decisão os seguintes: Assinatura das declarações de início de actividade das sociedades ditas fictícias (ponto de facto provado 11); Ser TOC da AJ  e das sociedades ditas fictícias (pontos de facto provados 11, 23, 34, 47, 58 e 82); Preenchimento das declarações fiscais da AJ  com inclusão das facturas emitidas pelas empresas ditas fictícias (pontos de facto provados 24, 30 e 31); Não entrega das declarações fiscais das empresas ditas fictícias, fazendo delas não declarantes (pontos de facto provados 25); Renúncia do TOC ao cargo nas sociedades referidas (ponto de facto provado 26); O arguido AJE  sabia que as sociedades constituídas por JMG  e FMA eram fictícias e que não tinham actividade.
63.– Nenhum destes comportamentos preenche os elementos do tipo, por si só nem mesmo conjugadamente.
64.– Ficou a saber-se que, o arguido AJE : Era (e é) um TOC experiente e maduro e reconhecido entre os seus; Enquanto TOC tinha (e tem) como funções a organização da contabilidade e a elaboração das declarações fiscais nos termos do artigo 6o do Estatuto da, então, OTOC; Na sua qualidade de TOC da AJ, SA procedeu à entrega atempada das respectivas declarações fiscais; Enquanto TOC assinou as declarações de início de actividade das sociedades «ALJ, Lda», «ARH, Lda», «AXXI , Lda», «Aj Lda», «AHL» e «CSL ;
65.– Sobre a participação do arguido AJE  na constituição das sociedades «AJ, SA», «ALJ, Lda», «ARH, Lda», «AXXI , Lda», «Aj Lda», «AHL» e «CSL» sabe-se que o arguido AJE : Não foi nem é sócio das sociedades acima identificadas, conforme resulta das certidões comerciais juntas aos autos; Não participou em qualquer acto de constituição dessas mesmas sociedades; Não é representante de nenhum sócio dessas sociedades nem sócio de nenhuma sócia colectiva dessas sociedades; Não dispõe de qualquer poder de decisão no seio dessas sociedades, não sendo membro da gerência nem da administração de nenhuma delas.
66.– Estão em causa neste processo, por um lado, as declarações de início de actividade das sociedades ditas fictícias; Por outro lado e em relação a todas as sociedades:
As declarações de IVA, mensais, entregues até ao dia 10 do segundo mês seguinte àquele a que respeitam - cfr. artigo 41° do CIVA; As declarações anuais - modelo 22 de IRC entregue em Maio do ano seguinte àquele a que respeita, cfr. artigo 120° CIRC; A IES entregue em Julho do ano seguinte àquele a que respeita, cfr. artigo 121°CIRC.
67.– Da declaração fiscal de início de actividade sabe-se que: As pessoas singulares ou colectivas que pretendam exercer uma actividade devem declarar o seu início (artigo 31° do CIVA, artigo 112° do CIRS e artigo 118° do CIRC), verbalmente ou através da entrega da respectiva Declaração; Os prazos legais para a apresentação da declaração de inscrição no registo são os seguintes: 15 dias a partir da data de apresentação a registo na Conservatória do Registo Comercial, para os sujeitos passivos obrigados a esse registo; 90 dias a partir da data de inscrição no Registo Nacional de Pessoas Colectivas, sempre que esta seja legalmente exigida e o sujeito passivo não esteja obrigado a registo comercial; Antes de iniciar a actividade para os sujeitos passivos não sujeitos a inscrição no RNPC ou cuja inscrição não é possível, por não possuírem, por exemplo, personalidade.
68.– Da IES (Informação Empresarial Simplificada) sabe-se que é uma declaração anual obrigatória das empresas, destinada a dar cumprimento às quatro seguintes obrigações: Depósito das contas anuais e o correspondente registo junto das conservatórias o registo comercial; Entrega da declaração anual de informação contabilística e fiscal à Autoridade Tributária; Entrega da informação anual de natureza contabilística sobre as suas contas ao INE para efeitos estatísticos; Entrega da informação anual de natureza estatística sobre as suas contas ao Banco de Portugal e que pode ser acompanhada de vários anexos, entre os quais o anexo P (identifica fornecedores de serviços que individualmente considerados tenham facturado no ano valor superior a 25.000 €) e o anexo O (identifica clientes, a quem, individualmente considerados, tenham sido prestados serviços no ano de valor superior a 25.000 €).
69.– A entrega das declarações fiscais é uma obrigação acessória do sujeito passivo, no caso das pessoas colectivas, na pessoa do seu gerente ou do seu administrador, conforme disposto nos artigos 109° do CIRC, 28° do CIVA e 113° do CIRS.
70.– O artigo 51°, n° 3 do ETOC, então em vigor, conferia ao TOC o direito de proceder à entrega das declarações fiscais junto dos serviços da Administração Fiscal.
71.– Dispunha o n°1 do artigo 6º do ETOC, aprovado pelo Decreto-Lei n° 452/99 de 5 de Novembro, que o TOC tinha a função de "assinar, conjuntamente com o representante legal das entidades referidas na alínea a), as respectivas declarações fiscais, as demonstrações financeiras e seus anexos (...)".
72.– Por sua vez, dispunha a alínea a) do n° 1 do artigo 51° do ETOC que "1- Os técnicos oficiais de contas têm, relativamente a quem prestam serviços, os seguintes direitos: a) Obter todos os documentos, informações e demais elementos de que necessitem para o exercício das suas funções".
73.– O não cumprimento destes deveres por parte do contribuinte em relação ao seu TOC, conferia (e ainda confere) a este o direito à recusa de assinatura das declarações fiscais, desresponsabilizando-o das consequências que daí possam advir, nomeadamente o não cumprimento dos prazos legais, e aplicação de coimas, conforme artigo 12° do Código Deontológico então em vigor
74.– Conforme resulta de fls. 4 deste processo "A presente acção teve origem na Informação n° 805/2009 da Divisão de Estudos e Informações da DSIFAE elaborada na sequência das divergências apuradas no cruzamento entre os valores constantes nos Anexos O e P e da Informação Empresarial Simplificada (IES) do ano 2007. A empresa ARH, Lda não entregou o Anexo O -Clientes. No entanto, a AJ, SA, NIPC 5.......8 declarou, no Anexo P, a A. como fornecedor, no valor de € 2.353.000,00", facto confirmado pelos Inspectores Tributários e aceite pelo Tribunal a quo na sua fundamentação de facto.
75.– Em suma: O arguido AJE  e a sua cliente AJ,  SA cumpriram o dever de entrega atempada e completa das declarações fiscais.
76.– Por sua vez, o arguido AJE  aceitou, sucessivamente, ao longo de 6 anos ser TOC daquelas sociedades «AJ, SA», «ALJ, Lda», «ARH, Lda», «AXXI , Lda», «Aj Lda», «AHL» e «CSL, uma em cada ano, para o que assinou a respectiva declaração de início de actividade e que, dois a três meses depois, renunciou ao cargo de TOC de cada uma, por ausência de contacto e de fornecimento de documentação e informação.
77.– Conforme explicado, não só não lhe eram fornecidos documentos e elementos para o efeito (demonstrou-se, na audiência de julgamento, e resulta da prova documental que o arguido nem possuía a password das sociedades para aceder ao portal das finanças), como, após, a renúncia, qualquer acto lhe estava vedado.
78.– Acresce que, os motivos do arguido para aceitar o cargo de TOC não são muito diferentes (como o próprio relatou) daqueles que levaram o arguido JF  (advogado, absolvido) a dar assistência jurídica ao co-arguido FMA  na constituição das aludidas sociedades e que resultavam do facto de o Sr. FMA  pretender manter actividade para pagar dívidas.
79.– Mal se compreende, pois, que um TOC seja punido por ter assinado a declaração de início de actividade de cada sociedade, quando é certo que, é esta declaração de início de actividade que coloca essa Sociedade / contribuinte sob a alçada da Autoridade Tributária.
80.– A declaração de início de actividade é de entrega obrigatória, em termos fiscais, mas não é necessária para a prática do crime aqui imputado aos arguidos, já que para a constituição de sociedades, os interessados obtêm previamente o número de identificação de pessoa colectiva (NIPC) e que tal número se mantém independentemente de a entidade ter um TOC activo ou não junto da Autoridade Tributária!
81.– Cada empresa manteve actividade (alegadamente criminosa) mesmo depois de a renúncia do arguido AJE  estar registada no portal da Autoridade Tributária!
82.– O arguido foi, pois, condenado por "simples" convicção do Tribunal, desapoiada de factos, sequer indiciários, que a sustentem.
83.– É que, não se provou que AJE  tenha participado na constituição de nenhuma das sociedades comerciais; AJE  não é nem nunca foi sócio de nenhuma das sociedades em causa (nem da AJ  e nem de nenhuma das sociedades ditas fictícias); AJE  não é sequer sócio de nenhuma das sócias (colectivas) da AJ  nem de nenhuma das sócias das sociedades ditas fictícias; Com excepção da AJ, AJE  nunca foi nem é TOC de nenhuma das sócias das sociedades em causa neste processo, tendo, apenas, assinado as respectivas declarações de início de actividade; AJE trabalhava no seu escritório, sito na Av. A... R... em Lisboa, onde não foi encontrada qualquer documentação atinente às sociedades ditas fictícias; A AJ  tem instalações em Sacavém, de onde (conforme acórdão recorrido) eram praticados os alegados actos criminosos; As sociedades ditas fictícias têm sedes noutras moradas, que não pertencem a AJE ; Os serviços de limpeza em causa eram desenvolvidos em entidades privadas e públicas que nada têm que ver consigo e em locais onde o arguido AJE  não estava.
84.– Não faz sentido a ninguém que um TOC experiente e maduro, conhecedor do alerta gerado pelas discrepâncias das declarações fiscais, envie uma IES com o Anexo P, sabendo que o correspondente Anexo O não iria ser remetido e que tal ausência causaria uma inspecção, praticasse actos tendentes à prática da fraude e, depois, abrisse a porta à sua própria condenação (penal e, consequentemente disciplinar) e à da sua cliente.
85.– É evidente que quem pratica ou pretenda praticar um crime de fraude fiscal (doloso, como só pode ser) com os contornos descritos no acórdão recorrido não se coloca à mercê da Autoridade Tributaria.
86.– E sendo assim, até pelas regras de experiência comum, seria fácil e exigível concluir que AJE  não teve qualquer envolvimento no esquema descrito pela Autoridade Tributária, seguido pelo Ministério Público e acolhido pelo Tribunal a quo.
87.– Não se diga, como fez o Tribunal a quo que "(...) se é certo que as divergências entre os dois anexos ou a entrega de um e a não entrega do outro, poderia dar origem a uma inspecção por parte da AT, não é menos certo que estas divergências só foram verificadas cerca de quatro anos depois e que esta verificação tardia se deve ao facto , certamente não ignorado pelo arguido de, como referiram os inspectores tributários , a imagem d incumprimento das obrigações fiscais ter sido transferida para as sociedades, individualmente consideradas, o que fez com que a investigação que só mais tarde se tivesse apercebido que a «AJ » e as suas principais fornecedoras integravam um esquema de fraude", (fls. 92 do Acórdão posto em crise)
88.– A inércia da Administração Tributária no pronto tratamento da informação fornecida pelo contribuinte e na realização atempada de cruzamentos de informação (permitidos pela conduta do arguido) através dos alertas do sistema quer através de eficaz investigação não pode servir de fundamento da condenação, como parece ter sido o caso!
89.– Por tudo quanto se deixou dito, consideram os aqui Recorrentes que não poderiam nem podem deixar de ser absolvidos.
90.– Não tendo os aqui Recorrentes sido absolvidos e atendendo a tudo quanto foi dito, o Tribunal a quo violou por erro de interpretação e aplicação os seguintes dispositivos legais: artigo 127° do CPP, os artigos 28°, 31° e 41° do CIVA, os artigos 109°, 118°, 120°, 121° do CIRC, os artigos 6º e 51° do ETOC e o artigo 12° do Código Deontológico da OTOC, já que, em lugar de os interpretar e aplicar no sentido acima exposto, desprezou os mencionados normativos e baseou a condenação numa simples convicção ilógica, no que o Acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que acolha as razões acima expendidas.
91.– O Tribunal a quo entendeu que os arguidos conseguiram diminuir a matéria tributável da AJ  SA e o imposto a entregar à Fazenda Nacional correspondente, em sede de IVA, ao valor apurado pela AT de 3.815.861,93 € e em sede de IRC ao valor apurado de 1.434.625,33 €.
92.– Dispõe o artigo 104°, n° 3 do RGIT que "Se a vantagem patrimonial for de valor superior a 200.000 € a pena de prisão é de 2 a 8 anos para as pessoas singulares e multa de 480 a 1920 dias para as pessoas colectivas".
93.– A vantagem patrimonial não faz parte do tipo e, por isso, a verificação de um crime de fraude fiscal não depende da liquidação dessa (alegada) vantagem.
94.– Não já assim, quando se estabelece que a moldura penal abstractamente aplicável é a prevista no n° 3 do artigo 104° do RGIT.
95.– Como já se referiu, no Acórdão recorrido, o Tribunal a quo afirmou "(...) estando em causa, no pedido de indemnização civil, o pagamento de prestações tributárias -IVA indevidamente deduzido e IRC - sujeitas a impugnações e eventuais liquidações adicionais feitas pela AT, este tribunal, na fase em que se encontra, não é competente para aferir tal prestação", e declarou-se, em consequência, materialmente incompetente para apreciar tal pedido, (fls. 129 do Acórdão recorrido)
96.– O Tribunal a quo assume desconhecer, ainda, o valor do tributo alegadamente em falta e da correspondente alegada vantagem patrimonial, o que gera a impossibilidade de albergar a moldura penal no n°3 do citado dispositivo legal.
97.– Tendo-o feito, o Tribunal a quo violou por erro de interpretação e aplicação o disposto nos artigos 104°, n°2 e 3o do RGIT.
98.– Atento o exposto, e sempre sem conceder, deverá a decisão ser, nesta parte, revogada e substituída por outra que enquadre os comportamentos dos arguidos no artigo 104°, n°2, alínea a) do RGIT, com as legais consequências de necessária redução das penas aplicadas na devida proporção.
99.– Caso se entenda que o Acórdão recorrido deve ser mantido, o que, considerando tudo quanto se deixou dito, apenas por mera hipótese académica se admite, sempre se dirá que a pena aplicada ao arguido AJE  é, apesar de próxima do limite mínimo do artigo 104°, n° 3 do RGIT, exagerada, com o que viola os princípios da adequação e proporcionalidade, transversais a todo o Direito Penal e Direito Processual Penal.
100.– Esqueceu-se o Tribunal a quo de considerar que passaram já mais de 6 (seis) anos sobre a data dos factos alegadamente praticados entre 2006 e 2012 bem como de considerar a manifesta ausência de vantagem patrimonial para os aqui Recorrentes.
101.– Atendendo a todas as circunstâncias referidas pelo Tribunal a quo, ao decurso do tempo e à ausência de vantagem patrimonial, a atenuação especial da pena consubstancia um poder-dever do Julgador, a que este se encontra vinculado na determinação das consequências jurídicas do crime, requerendo-se, por isso, seja tida em conta, devendo o Acórdão recorrido ser revogado na parte relativa à determinação da pena aplicada e ser substituído por outro que diminua a pena e a multa aplicadas em conformidade com o exposto.”

2.–O arguido JMG :

“1.– A AJ, Ld.a, depois AJ, S.A., é uma sociedade familiar criada por iniciativa do recorrente cuja administração, por decisão deste último, é composta por si, por sua mulher - que formalmente preside - e pelo filho de ambos, o arguido JTG, embora as decisões lhe caibam sempre a si, recorrente.
2.– O arguido JTG  apenas formalmente é o director financeiro da AJ, S.A., e, substancialmente, não assume no meio desta qualquer função de chefia ou de direcção, antes se limitando a ser um colega dos demais trabalhadores e a elaborar, a título principal a partir do início de 2011, as propostas que a sociedade apresenta às entidades adjudicantes de serviços públicos nos concursos abertos para o efeito.
3.– Desde meados de 2006, quando o recorrente concluiu não lhe interessar economicamente a prossecução da actividade da ALJ, Ld.a, cedeu esta última sociedade ao arguido FMA que, por entender ser o respectivo negócio interessante, a assumiu e geriu.
4.– Desde a mesma altura, o recorrente desligou-se da prestação directa dos serviços às entidades públicas adjudicantes, primeiro pela Aj, Ld.a e, depois, pelas sociedades para o efeito criadas e desenvolvidas por FMA, sem prejuízo de, para cumprimento dos contratos públicos celebrados com aquelas entidades, manter que a imagem da prestação de serviços seria sempre a da adjudicatária nos contratos e assegurar toda uma gama de matérias de cujo incumprimento, nos termos contratados com as primeiras, originaria a aplicação, à AJ , de pesadas multas.
5.– O recorrente, por conseguinte, não apenas não promoveu a constituição, por FMA , de qualquer das sociedades de que este é ou foi gerente como nunca as geriu de facto.
6.– É perfeitamente compreensível que a cessação da sua actividade, por uma sociedade, leve igualmente à cessação de qualquer actividade na respectiva sede social.
7.– Por assim ser, a circunstância de, após o decurso de alguns anos sobre aquela cessação, na respectiva sede social não ser encontrada qualquer actividade não significa nem pode ser interpretada no sentido de que a sociedade em questão nunca teve sede efectiva.
8.– O facto de não se encontrarem registos bancários que atestem o pagamento, pela sociedade cliente, administrada pelo recorrente - a AJ  -, às sociedades fornecedoras (as geridas por FMA ), não permite a conclusão de tais pagamentos não terem sido efectivamente realizados.
9.– O processamento dos salários dos trabalhadores de cada uma das sociedades prestadoras de serviços à AJ  feito por um trabalhador desta, num seu computador e de acordo com instruções dadas por outro trabalhador sem funções de administração, não permite a afirmação de que o mesmo processamento correspondia à vontade da administração desta sociedade nem, sequer, que esse processamento era do conhecimento dos titulares desta administração.
10.– A iniciativa de inspecção que necessariamente decorre da desconformidade entre os elementos constantes do anexo "P" à IES apresentado pela sociedade cliente e o anexo "0" apresentado - ou nem sequer apresentado - pela sociedade fornecedora, perfeitamente conhecida tanto da Administração Tributária, que a leva a efeito como de qualquer contabilista tem que ser interpretado como indício da ausência de conluio ou plano fraudulento da autoria e da vontade da administração daquela primeira sociedade, mormente do recorrente.
11.– Por conseguinte, dos "FACTOS PROVADOS" no douto acórdão recorrido deverão ser expurgados os elencados sob os n.ºs 3., 5., 16., 17., 18., 19., 20., 21., 22., 27., 28., 29., 104., 105., 106., 107., 108., 140., 141., 143., 144., 14., 146 e 148 e, também, todos os demais que deles dependam.
12.– Os depoimentos - designadamente os trechos para que se remeteu e que se transcreveram - do Senhor Inspector aposentado Dr. RC, do Senhor Dr. JF, da Senhora D. IMP e do Senhor VC, para além dos elementos constantes do douto acórdão e a que, igualmente se fez directa referência impõem a derrogação da matéria de facto dada como provada neste último, conforme indicado na conclusão anterior.
13.– O recorrente é administrador e conduz efectivamente os destinos da AJ, S.A., sociedade escrupulosamente cumpridora das suas obrigações declarativas e fiscais, pelo que, sob este prisma, a sua conduta e a da sociedade que administra e dirige não preenchem o tipo legal de fraude fiscal nem, por conseguinte, de fraude fiscal qualificada, que constitui um tipo agravado do primeiro - cfr. art.ºs 103.º e 104.º do RGIT.
14.– Nada tendo o recorrente que ver com os destinos ou com a administração das sociedades que, no período considerado no processo - 2006 a MAR12 -, prestaram serviços de cedência e administração de pessoal à AJ, S.A., por eventuais responsabilidades tributárias ou criminais destas não pode aquele ser responsabilizado.
15.– Em conformidade, deverá o recorrente, como se impetra, ser objecto de douto aresto que, em derrogação do douto acórdão do Tribunal a quo, o absolva da prática dos factos por que foi condenado.”
Termina no sentido de serem julgados não provados os factos vertidos no douto acórdão recorrido sob os n.ºs 3., 5., 16., 17., 18., 19., 20., 21., 22., 27., 28., 29., 104., 105., 106., 107., 108., 140., 141., 143., 144., 14., 146 e 148 e, também, todos os demais que deles dependam e, conseguintemente, julgando não provado o cometimento pelo recorrente do crime por que foi condenado, absolvendo-o.

3.– Os arguidos FMA , “ARH , Lda.”, “AXXI , Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL - Sucursal em Portugal”, “CSL – Sucursal em Portugal”:

“1.– A excepção de caso julgado materializa o disposto no art. 29.°, n.° 5 da CRP quando se estabelece como princípio a proibição de reviver processos já julgados com resolução executória afirmando "Ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime".
2.– Esta garantia visa limitar o poder de perseguição e de julgamento, autolimitando-se o Estado e proibindo-se o legislador e demais poderes estaduais à perseguição penal múltipla e, consequentemente, que exista um julgamento plural.
3.– Para que a excepção funcione e produza o seu efeito impeditivo característico, a imputação tem que ser idêntica, e a imputação é idêntica quando tem por objecto o mesmo comportamento atribuído à mesma pessoa (identidade de objecto - eadem res).
4.– Estando em causa um crime continuado — por a factualidade provada e objecto de decisão na sentença proferida no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Processo n.° 93/15.6T9SXL, Juízo Local Criminal do Seixal - Juiz 1, bem como, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Processo n.° 16/14.0TAOER, Juízo Local Criminal de Oeiras - Juiz 1 e a constante dos presentes autos constituírem a realização plúrima de um mesmo tipo de crime, no quadro da permanência de um mesmo circunstancialismo - nos termos do artigo 79.° do CP, a infracção mais grave já foi julgada, não podendo o arguido ser novamente julgado e condenado, já que, a apurar-se alguma coisa, sempre seria, necessariamente, de menor gravidade, o que implicaria manter a pena anterior aplicada.
5.– O douto Tribunal a quo, considerou que o recorrente era gerente, de facto e de direito, das sociedades aqui também arguidas e recorrente, no entanto e admitindo tal realidade ao longo de toda a exposição do acórdão ora em crise, vem na decisão, invertendo toda a lógica que até então deu por confirmada.
6.– o entanto, condena o arguido recorrente, porquanto limitou-se a ser um "testa de ferro".
7.– Se de facto (e de direito) bem andou o douto Tribunal a quo ao identificar o arguido recorrente como gerente de direito e de facto das sociedades arguidas, não pode depois vir indicar que o mesmo é um "testa de ferro".
8.– Estamos assim perante uma contradição insanável, que não pode senão determinar a nulidade do douto acórdão proferido (que determina a formação defeituosa da conclusão) o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais.
9.– Os arguidos ora recorrentes, procuraram junto deste douto Tribunal, fazer uso da disposição contida no artigo 47.° RGIT uma vez que, a haver uma decisão de mérito no processo fiscal determinará, se estiver em discussão situação tributária de cuja definição dependa a qualificação criminal dos factos imputados no processo criminal, na qualidade de próprio ou de revertido.
10.– No entanto, o referido entendimento não mereceu colhimento por parte do tribunal a quo que, contrariamente ao decidido, deveria ter suspendido os autos de processo crime enquanto os tribunais tributários se não houvessem pronunciado.
11.– Estamos assim perante uma CLARA e CENSURÁVEL VIOLAÇÃO do PRINCÍPIO DA PROIBIÇÃO DA PRÁTICA DE ACTOS INÚTEIS, uma vez que apesar das várias diligências praticadas para se chegar à conclusão — em acórdão ora recorrido —, não se pode pronunciar sobre o "quantum".
12.– Desta forma, há uma eventual decisão de inexistência de obrigação tributária, por se apresentar a mesma como um acto praticado pela administração tributária em plena desconformidade com o Direito e em clara Violação do Princípio da Legalidade, importava assim acautelar os direitos dos aqui arguidos recorrentes.
13.– A violação do princípio da prática de actos inúteis determina de forma IMEDIATA e ABSOLUTA, a nulidade do acórdão proferido.
14.– Os presentes autos encontram-se inquinados de vícios de violação de Lei vários que sempre terão de determinar a procedência do presente recurso, por nulidade do acórdão proferido e por manifesta contradição entre os factos dados por provados e a decisão proferida.
15.– Não existe concretamente qualquer valor elevado EFECTIVAMENTE PROVADO E RECONHECIDO pelo douto Tribunal a quo.
16.– A douta aplicação da JUSTIÇA não se compadece com "intuições" ou sequer com "suposições" mas sim com factos concretos e objectivos.
17.– Assim e não estando qualquer valor objectivamente quantificado, não pode o douto Tribunal a quo vir determinar e sentenciar um qualquer arguido pela prática de um crime de fraude fiscal qualificada, p.p. artigo 104.°/2, a) RGIT que tem implícito precisamente a o montante em causa.
18.– Muito menos podem os arguidos recorrentes verem quaisquer penas agravadas atendendo ao valor da vantagem patrimonial.
19.– A própria competência desse douto Tribunal a quo, para proceder ao julgamento - em colectivo - depende do valor em questão.
20.– O que teria o douto Tribunal a quo de averiguar é se, atendendo ao objecto da impugnação, a procedência desta importaria ou não, responsabilidade criminal do arguido no processo penal tributário ou até uma menos intensa responsabilização dele nesse processo, mas que neste momento processual, não o foi capaz de fazer.
21.– Desta forma, não se encontrando concretizado o QUANTUM para efeitos de pedido de indemnização cível, consequentemente não se encontra concretizado o QUANTUM para efeitos de imputação de crime de fraude fiscal qualificada, importando assim a procedência do presente recurso e à determinação de incompetência do douto Tribunal a quo, para de mérito julgar sobre os presentes autos.
22.– Na verdade, em sede de audiência, foram devidamente escalpelizados os valores apresentados, de forma crítica e analítica, dai resultando a descoberta de erros vários que não poderiam deixar de ter sido reconhecidos pelo próprio douto Tribunal.
23.–  Quer a acusação, quer o acórdão proferido, têm por base o relatório elaborado pelos Inspectores RC e IS que se limitaram a replicar o relatório que nunca seria admitido em juízo como prova documental.
24.– O depoimento das testemunhas Inspectores da AT (RC e IS) não podem ser valorados porquanto não passam depoimentos indirectos.
25.– Com efeito, admitir que o inspector RC (testemunha) recorra ao relatório para se "lembrar" ou avivar a memória, para depois replicar o que consta desse relatório, mais não é que parafrasear o mesmo e dar esta "paráfrase" por assente como prova.
26.– Ambos os inspectores limitaram-se a remeter para o relatório, NÃO RESPONDENDO às questões que lhes eram colocadas de forma imediata e directa.
27.– Ora se o relatório não é admissível como prova e se as referidas testemunhas (inspectores AT) se limitaram a remeter para ao mesmo, então em juízo e nos autos, NÃO É FEITA QUALQUER PROVA por estas duas testemunhas.
28.– Devidamente compulsado o teor do depoimento destas duas testemunhas, sobressai uma dúvida razoável que origina a descredibilização do depoimento destas.
29.– A testemunha em causa (inspectora da AT) revela um conhecimento dos autos melhor que o próprio mandatário, tendo demonstrado um total conhecimento dos apensos que constituem os autos judiciais, inclusivamente o seu teor PELO NÚMERO DE FOLHAS.
30.–Todo o seu depoimento se revelou completamente insustentável e sem qualquer objectividade, devendo ser totalmente desconsiderado para efeitos de prova.
31.– Toda a tese da acusação vem assente na premissa de que existe um estratega com base na criação de sociedades fictícias, com o intuito único, de se enganar o Estado.
32.– Ao contrário do que o douto Tribunal a quo deu por provado, o arguido recorrente FMA , não era mero gerente de direito das referidas sociedades arguidas mas sim de facto e de Direito.
33.– E MANIFESTAMENTE FALSO que as sociedades arguidas, propriedade do arguido recorrente FMA  e nas quais o mesmo consta como gerente, fossem geridas de facto pelo arguido JMG .
34.– Não foi produzida qualquer prova testemunhal— a não ser a prova testemunhal dos Inspectores RC e IS - ou documental no sentido de indicar que as sociedades não eram geridas pelo arguido FMA .
35.– Conforme a prova documental junta aos presentes auto (requerida oportunamente), ficou demonstrando que as sociedades aqui arguidas e recorrentes, de fictício nada têm, uma vez que se encontram identificadas por entidades administrativas e entidades judiciais nacionais.
36.– Gozam assim de personalidade jurídica e existem como tais a partir da data do registo definitivo do contrato pelo qual se constituem.
37.– Assim, o argumento usado pela AT e pela douta acusação padece de coerência, porquanto in casu reputa as arguidas como fictícias, mas não se inibe de a sociedades fictícias imputar contra ordenações várias, como é o exemplo dos documentos juntos aos autos, respeitante aos processos 861/16.1BESNT e 662/17.0BESNT.
38.– Ficou demonstrando de forma cabal que as sociedades jurídicas existentes, nunca tendo o douto Tribunal questionado a validade jurídica das sociedades aqui arguidas.
39.– Existe assim uma violação dos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança e que implicam um mínimo de certeza e segurança nos direitos das pessoas e nas expectativas juridicamente criadas a que está imanente uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado (Acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 287/90, 303/90,625/98, 634/98, 186/2009, disponíveis em www.tobunalconsntacional.pt).
40.– Desta forma e sendo falso os factos dados como provados no ponto 6, 16, 17, 18, deve o presente recurso ser determinado procedente, e revogado o acórdão proferido.
41.– E mais é falso o ponto 19 uma vez que no concerne à "amizade" entre os arguidos FMA  e JMG , que apenas mantêm um trato profissional.
42.– Nunca dentro dos normais parâmetros da "amizade".
43.– E falso o facto dado por provado no ponto 20, porquanto nunca o arguido recorrente FMA  ou qualquer uma das suas sociedades fez parte de qualquer estratagema.
44.– É falso o facto dado por provado no ponto 22, ou pelo menos é parcialmente falso uma vez que o arguido recorrente FMA obviamente que sempre participou na constituição das suas sociedades.
45.– E falso o facto dado por provado no ponto 28 uma vez que nunca a sociedade AJ  era — no contexto que pretende criar o acórdão ora em crise — responsável quer pelo pagamento dos salários, processamento dos salários (tarefa confiada ao funcionário VC agia de forma independente e remunerada para o arguido FMA ) e muito menos supervisionava o trabalho com funcionários do seu próprio quadro.
46.– As empreitadas não eram supervisionadas por funcionários do quadro da AJ  mas pelas próprias funcionárias que se encontravam nos locais adjudicados, funcionárias das sociedades aqui arguidas e recorrentes.
47.– É falso o facto dado por provado no ponto 29, 31, 38, 50, 63, 74, 85, 95 e 102, por decorrência lógica de tudo o quanto se disse tendo ficado sobejamente provado em Tribunal, que tais serviços foram efectivamente prestados, não existiu qualquer queixa relativamente à prestação dos mesmos (facto provado pela produção de prova testemunhal do próprio inspector da AT).
48.– É falso o facto dado por provado nos pontos 47, 58 e 82, porquanto o arguido recorrente FMA , não só é gerente de direito, como o é ainda de facto da sociedade ARH, LDA.
49.– São verdadeiros os factos descritos no ponto 91 e 99 i e, por referência à sucursal AHL,LTD - SUCURSAL EM PORTUGAL e por referência à sucursal CSL,LTD - SUCURSAL EM PORTUGAL, o seu procurador em Portugal, era o arguido recorrente FMA .
50.– Cumpre distinguir dois planos: o plano do "dever ser" (de facto não era possível a subcontratação nos termos em que a mesma efectivamente operou), do plano do "ser", (onde tal subcontratação foi efectivamente outorgada e efectivamente executada pelas sociedades arguidas aqui recorrentes).
51.– In casu, inexiste qualquer situação de abuso de Direito, o contrato público foi adjudicado, foi objecto de subcontratação e foi efectivamente cumprido.
52.– Pelo que assim só resta concluir que a irregularidade da subcontratação em nada afecta a execução da mesma e a produção de efeitos imputável na esfera jurídica de todos os demais intervenientes.
53.– Na verdade, de tão parco e insuficiente que foi a investigação da AT, as testemunhas inspectoras da AT admitiram que desconheciam se tinha existido ou não consentimento dos trabalhadores, com as necessárias consequências legais, de falta de produção de prova.
54.– Pelo que relevância alguma tem o facto de ser ou não ser admitida a subcontratação nos moldes em que efectivamente ocorreu.
55.– Toda a acusação e facto provados que dão origem ao acórdão ora em crise, resvalam na falsidade de crer que tudo não passou de um esquema engendrado com o intuito de lesar o estado e obter uma vantagem patrimonial ilegítimo para todos os arguidos.
56.– Não existe qualquer estratagema, organização, não existe qualquer comunhão de esforços para obter um qualquer outro fim.
57.– O que alegadamente poderá existir nos presentes autos, não é um crime de fraude fiscal, mas outrossim, um crime de abuso de confiança fiscal, p.p. art. 105.° RGIT.
58.– O crime de abuso de confiança fiscal, previsto no art.° 24.° n.° 1 do RJIFNA, tem como pressupostos objectivos a apropriação total ou parcial de prestação tributária, que essa prestação tenha sido deduzida pelo agente nos termos da lei e que o agente estivesse obrigado a entregá-la ao credor tributário.
59.– O crime de fraude fiscal e de abuso de confiança fiscal tutelam bens jurídicos diversos: o primeiro, a verdade nas relações entre o contribuinte e o Fisco; o segundo, a confiança do Fisco em relação a quem a lei impõe a obrigação de deduzir prestação tributária.
60.– Dúvidas inexistem que o que temos em termos de Verdade Material dos Factos, é uma situação de confiança do Fisco em relação a quem a lei impõe a obrigação de deduzir prestação tributária, e que alegadamente o não fez.
61.– Não existe qualquer intenção das sociedades arguidas recorrentes supra indicadas de se unirem em qualquer comunhão de esforços ou em qualquer esquema, para efeitos de defraudar o Estado, nem tão pouco qualquer esquema entre as várias sociedades arguidas com a sociedade arguida AJ  para o Estado não receber IVA.
62.– Conforme decorre (quase que de forma excepcional) a tese da acusação, "Nesse caso o imposto — ex. o IVA dedutível - e restantes contribuições sociais deviam ser assumidos e pagos pelos fornecedores.", ou seja, o imposto e restantes contribuições sociais deviam ser assumidos e pagos pelas sociedades arguidas aqui recorrentes e, ao não o terem sido — sem estarmos na presença de qualquer esquema — as mesmas terão incorrido, indiciariamente, num crime de Abuso de Confiança Fiscal, p.p. pelo artigo 105° RGIT.”

Termina pedindo a revogação do acórdão.

4.–A arguida sociedade AJ , SA:

“1.–A recorrente, no início do julgamento, requereu que, se encontrando impugnadas judicialmente dividas dos presentes autos criminais fiscais, nomeadamente IVA e IRC de 2007, 2008, 2009 e 2010, fosse suspenso o presente processo criminal tributário, cfr. art. 47.º e 48.º RGIT.
2.–Mal andou a decisão então proferida, que entendeu a largueza do princípio da suficiência do processo criminal para apreciar as referidas questões tributárias controvertidas,
3.–Para apenas no final se vir a considerar incompetente para apreciar do pedido de indemnização cível,
4.–Assim confessando de forma tão clara como censurável, que não conseguiu apurar o "quanto",
5.–"Quanto" esse que apenas será apurado em sede de Tribunal Tributário,
6.–Mais que ainda assim no final da sentença proferida decidiu aplicar a muitos dos arguidos penas suspensas mediante o pagamento dos tributos que vierem a ser liquidados em sede de IVA e IRC, nos períodos de 2007 a março de 2012, à sociedade ora recorrente,
7.–Reitere-se: que vierem a ser liquidados, porquanto não estão ainda fixados objectivamente.
8.–Na verdade, outra não pode ser a conclusão, senão a de que, a decisão proferida violou de forma directa e expressa o disposto nos artºs. 46 e 47º do RG1T, pelo que se impõe de imediato a sua revogação.
9.–Requer-se a revogação da sentença proferida por violação do requerimento inicial e prejudicial da recorrente na audiência de julgamento, e por preterição do disposto nos artºs. 47º e 48º do RGIT.
10.–Considerando que o crime em causa, por manifesta não fixação do "quanto", sempre em benefício do arguido, como assim o deverá ser, poderia ter uma moldura penal de punição com pena até 5 (cinco) anos de prisão (considerando o montante mais elevado de cada prestação mensal retributiva - superior a €7.500,00 mas inferior a €5.000,00) o prazo prescricional do procedimento criminal é de 5 (cinco) anos e iniciou-se em Janeiro de 2007, sendo interrompido com na constituição de arguido e notificação da acusação, que constitui simultaneamente causa de suspensão do prazo prescricional, nas datas referidas na douta sentença.
11.–Não obstante, mesmo considerando as demais causas interruptivas e suspensivas do prazo prescricional do procedimento criminal, suspensão esta com uma duração máxima de 3 (três) anos, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 e 2 do artigo 120.2 do Código Penal, reinicíando-se novo prazo prescricional, com a duração máxima de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses - prazo máximo de prescrição do procedimento criminal, salvaguardando de suspensão supra referido, significa que tal prazo esgotar-se-ia com o decurso do hiato temporal de um prazo de 10 (dez) anos e 6 (seis) meses sobre a consumação dos factos.
12.–Impõe-se, por conseguinte, declarar a prescrição do procedimento criminal quanto aos factos praticados no ano de 2007.
13.–Resulta da correção de valores, conforme melhor indicado de forma exaustiva nas alegações de recurso, mesmo seguindo os critérios dos inspectores da AT, que no ano de 2006 deveria ter sido deduzido o valor de €361.633,01; no ano de 2007 deveria ter sido deduzido o valor de €12.046,24; no ano de 2008 deveria ter sido deduzido o valor de €37.224,28; no ano de 2009 deveria ter sido deduzido o valor de €54.196,29 e, por fim, relativamente ao ano de 2010 deveria ter sido deduzido o valor de €210.545.49.
14.–Ademais considerando os devidos custos, os valores considerados como salários de 2006 a 2010, perante as correcções efectuadas, conforme melhor indicado de forma fundamentada nas alegações de recurso, perfazem a quantia de €2.223.070,00 de valores que deveria ter sido deduzida fiscalmente.
15.–Desta forma e descontando os valores dedutíveis quer em sede de salários, quer em sede de IRC (que perfazem um total global de €2.790.322,00), a haver uma condenação, sempre seria pelo valor de €2.459.698,00 e nunca pelo valor de €5.250.000,00.”

Termina pela revogação do acórdão recorrido.
 
5.–O arguido JTG :

“i.–Entende o Recorrente, salvo o devido respeito por melhor opinião, que é muito, que a presente alteração de redacção dos dois (2) artigos - 8.9 ll.9 -se não limitou a afastar os factos que, no entendimento da Acusação Pública, sustentavam o pedido de condenação pelo Crime de Associação Criminosa, p. e p. pelo Art. 89.º, n.ºs 1 e 3, do R.G.I.T., na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, por que vinham todos os Arguidos acusados e do qual acabaram todos, invariável e inquestionavelmente, absolvidos.
ii.–Terá de, necessariamente, se reconhecer, com a alteração operada em crise, não só o afastamento do dolo do Recorrente, ainda que em co-autoria, do Crime de Associação Criminosa em que vinha acusado e que culminou na (também) sua absolvição, como, bem assim, não delineou um plano ou aderiu a uma organização, ainda que em co-autoria, que visasse obter vantagens patrimoniais ilegítimas à custa do Estado, provocando a diminuição das receitas tributárias, mediante a criação artificial de IVA dedutível, através de um circuito documental baseado na prestação de serviços inexistentes, ou seja,
iii.–Deixou de se encontrar factualmente acusado de cometimento do Crime de Fraude Fiscal Qualificada, em que acabou condenado!
iv.–Da conjugação da matéria de facto dada como provada e da motivação da decisão de facto, resultam divergências claras quanto à prática de factos imputados ao Recorrente, com consequência, directa, no douto Acórdão em xeque. Neste sentido, desde já se impugnam, liminarmente, toda a factualidade dada como provada, mas, muito em particular, os factos dados como provados n.es 20, 21, 31, 108, 109, 109-A, 110-A, 111-A, 121, 122, 140, 141, 142, 143, 144, 145, 146, 148 e 156.
v.–Os factos pelos quais o Recorrente vem condenado referem-se aos anos de 2006 ao primeiro trimestre de 2012; mas, não obstante, considerou este Colectivo correcto, justo e honesto dar como provado que o Recorrente era membro do Conselho de Administração, se eximindo a fazer qualquer destrinça quanto à qualidade do Recorrente dos anos em que vem condenado.
vi.–Qualquer testemunha ouvida, sejam elas ROC, TOC, fornecedores ou trabalhadores, em momento algum, referiu-se ao Recorrente como Administrador ou Director Financeiro; a função do Recorrente resumiu-se -e resume-se! - a integrar a equipa que formula os projectos levados a concurso, e tão somente isso, nada mais.
vii.–Na senda do anteriormente afirmado, dão-se por integralmente impugnados os factos 108 a 111-A, na medida em que, por um lado, não era ao Recorrente que competia emitir quaisquer cheques ou proceder às transferências de que vem acusado,
viii.–Tendo ficado de sobremaneira evidenciado, por ser verdade, que tudo o que respeitava à Sociedade "AJ, Ld.a" - ou, posteriormente, "AJ , S.A." -, era da inteira responsabilidade do Arguido JMG .
ix.–Não pode deixar de se estranhar a afirmação constante no facto 109., dado que foi ponto de ordem - quase de honra -, inclusive para os Srs. Inspectores, que a Sociedade "AJ , S.A.", era e sempre foi, em termos de contabilidade, uma Sociedade sem ponta de mácula.
x.–Como resulta do exposto, a Sentença condenatória que, salvo o devido respeito e que é muito, resulta de uma apreciação incorrecta da prova, (art.º 127º e art. 412.º n.º 3, ambos do C.P.P.), apreciação essa que a ser feita de uma forma correcta impunha uma decisão diferente daquela que foi proferida, designadamente quanto aos factos dados como provados.
xi.–Violou igualmente o princípio constitucionalmente consagrado do In Dúbio Pro Reo, previsto no art. 32.º daquele diploma, ao fundamentar a decisão condenatória ora recorrida, em factos manifestamente, por provar.
xii.–Acontece, porém, que o crime de fraude fiscal qualificada p.p. pelos Art. 104.º, do R.G.I.T., até dia 31.12.2011, gozava de uma moldura penal abstrata de pena de prisão entre os 1 e 5 anos, ao passo que,
xiii.–Desde a entrada em vigor da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro - v.g., Lei do Orçamento de Estado para 2012 -, e com alteração operada ao referido Art. 104.° do R.G.I.T., o mesmo crime passou a prever uma moldura penal abstrata de pena de prisão entre os 2 e 8 anos.
xiv.–Assim, face a todo o exposto, entende o Recorrente que o douto Acórdão em Recurso é ilegal, por violação do disposto nos Arts 29.º, n.º 4, 32.º, n.ºs 1 e 2., devendo o Recorrente ser absolvido da errada condenação em que vem sentenciado”.

A todos estes recursos veio o M.º P.º responder, concluindo nessa única resposta:
“1–Carecem de razão os recorrentes, nos fundamentos de facto e de direito aduzidos nas suas doutas motivações e sendo que o Tribunal recorrido, não só não violou qualquer das diversas normas - substantivas e adjetivas indicadas, como também fez uma criteriosa apreciação e valoração da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, e uma judiciosa aplicação do direito;
2–Contrariamente ao sustentado pelos recorrentes, da leitura do acórdão recorrido ressalta a enorme clareza do texto e do sentido da decisão, não existindo a mais pequena obscuridade ou contradição, daí que o texto da decisão se mostre integralmente lógico, bem estruturado e devidamente fundamentado, sendo que o mesmo não enferma de qualquer vício, nomeadamente, dos previstos no n.º 2 do art. 410.° do Código de Processo Penal;
3–O Acórdão recorrido fundamentou devidamente os factos que deu como assentes, nada resultando que tenha apreciado a prova produzida em julgamento de forma discricionária e subjetiva; nem está ferido de qualquer vício que o invalide; não colhendo assim a impugnação feita em sede de matéria de facto, que traduz apenas uma divergência subjetiva e genérica quanto à valoração das provas feita pelo Tribunal;
4–Da leitura do Acórdão recorrido constata-se igualmente que no exame crítico levado a efeito se seguiu um processo lógico e racional na valoração da prova e que esta foi apreciada segundo as regras da experiência e a livre apreciação do Tribunal, nos termos do disposto no art. 127.° do Código de Processo Penal, nomeadamente, quanto à valoração das declarações prestadas pelos arguidos, em conjugação com a prova testemunhal, a prova pericial e a abundante prova documental carreada para os autos, como se verifica pela profusa fundamentação exibida;
5–O Acórdão recorrido de forma alguma pode ser tido como uma decisão arbitrária e contrária às regras da experiência, sendo que a prova foi corretamente apreciada e não ocorreu qualquer erro de julgamento, não colhendo a argumentaria apresentada pelos recorrentes, quer em sede de impugnação de matéria de facto, quer quanto à impugnação em sede de matéria de direito;
6–Outrossim, não colhe a argumentaria apresentada pelos recorrentes, nomeadamente, no inerente à alegada prescrição do procedimento criminal relativamente ao exercício fiscal do ano de 2007 e quanto à alegada violação dos princípios do ne bis in idem e da proibição da prática de atos processuais inúteis;
7–Por fim, entendemos não merecer reparo a determinação do quantum das penas aplicadas, tendo em consideração a pluralidade de atos realizados ao longo do tempo em análise, o modo de execução dos mesmos, o dolo direto verificado, o prejuízo causado ao Estado, as condições pessoais e a situação económica dos arguidos, sem perder de vista as elevadíssimas exigências de prevenção geral;
8–Consequentemente, entendemos que deve ser negado provimento aos recursos interpostos e que deve ser mantido o bem fundamentado acórdão recorrido.”

Neste Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto elaborou parecer em que suscita a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia do art.º 379º n.º 1 al. c) do CPP e erro de julgamento de direito quanto à não observância do disposto no art.º 14º RGIT.

Pugna, no entanto, pela improcedência dos recursos e pela sanação do vício de erro notório e da nulidade invocada.

Dado cumprimento ao disposto no art.º 417º n.º 2 CPP, vieram responder ao parecer, os recorrentes:
1.- AJE , em que termina no sentido de não ser dada razão ao Exmo. PGA;
2.- FMA  e outros, em que defendem a inexistência da nulidade do acórdão e a não aplicação de qualquer condição de pagamento a subordinar a suspensão da pena, inexistindo também qualquer erro de julgamento de direito.
                     
II.–
Colhidos os vistos legais e efectuada conferência, cumpre agora apreciar e decidir.

Do acórdão recorrido consta o seguinte:

“FACTOS PROVADOS

Discutida a causa apurou-se o seguinte:
1.–A arguida “AJ, S.A.” é uma sociedade anónima, constituída em Agosto de 1994, com sede na Avenida …, em Lisboa cujo objecto social consiste na prestação de serviços de higiene e controlo de ambiente, criação e manutenção de espaços verdes, recolha e transporte de resíduos sólidos identificados a destino próprio, comércio de equipamento e consumíveis afins à actividade.
2.–A “AJ , SA” encontra-se enquadrada no regime geral, para efeitos de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), e no regime normal, de periodicidade mensal, no que respeita ao Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA).
3.–Os arguidos MAG , JTG  e JMG , são, desde 2009, respectivamente presidente e vogais do Conselho de Administração da sociedade arguida “AJ, S.A.”.
4.– Data em que a “AJ ” se transformou em sociedade anónima.
5.–Porém, desde a constituição da sociedade, a presidência do Conselho de Administração tem vindo a ser exercida, de facto, pelo arguido JMG, sendo este que toma todas as decisões, no domínio da gestão comercial e financeira da sociedade, cumprimento das obrigações desta perante e administração tributária, organização da contabilidade e apresentação das declarações necessárias à liquidação dos impostos devidos pela “AJ ”.
6.–O arguido FMA , por sua vez, era gerente de direito das sociedades “ARH , Lda.”, “AXXI , Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.” e representante em Portugal da “AHL – Sucursal em Portugal” e da “CSL – Sucursal em Portugal”.
7.–O arguido AJE  é Técnico Oficial de Contas (TOC) desde 1995 e, desde esta data, encontra-se inscrito na respectiva Ordem (actualmente Ordem dos Contabilistas Certificados).
8.–Este arguido, em 1997, constituiu a sociedade de prestação de serviços de contabilidade “APSCF Lda.”, com sede na Av. … Lisboa, actualmente denominada “G., Lda.”, com sede na R. .., nº 20, 5º dto., desenvolvendo a actividade profissional de TOC através dessa empresa.
9.–Entre 1999 e 14.05.2012, o arguido AJE  exerceu as funções de TOC da “AJ, Lda.”.
10.–No início de 2002 o arguido JMG  cedeu ao arguido AJE  a utilização de uma divisão na morada da sede da “AJ, Lda” local onde este último arguido passou a desenvolver a actividade da “AJFE, Lda.”/ “G., Lda.”.
11.–O arguido AJE exerceu ainda funções de TOC das sociedades “ALJ, Lda.”, “ARH , Lda.”, “AXXI , Lda”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL” e “CSL ”, tendo assinado as respectivas declarações de início de actividade.
12.–Os clientes da “AJ” eram predominantemente o Estado e empresas públicas.
13.–O arguido JMR  exerce as funções de advogado desde 1996.
14.–Este arguido em 1998/1999 começou por exercer as funções de advogado do arguido FMA e passou a prestar apoio jurídico e a exercer funções de advogado do arguido JMG  a partir de 2002.
15.–O arguido JF , nas escrituras de constituição das sociedades “Aj, Lda.”, “ARH ” e “AI, SA”, representou, na qualidade de procurador com poderes para o acto, as sociedades”, “VIL ”, MIL” e “DHL” accionistas daquelas sociedades.
16.–Em data concretamente não apurada, necessariamente anterior a Janeiro de 2006, o arguido JMG delineou um plano visando obter vantagens patrimoniais ilegítimas à custa do Estado, provocando a diminuição das receitas tributárias, mediante a criação artificial de IVA dedutível, através de facturação emitida em nome das sociedades “ALJ, Lda.”, “ARH , Lda.”, “AXXI , Lda”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal” e “CSL ”, baseada na cedência de pessoal para a “AJ , S.A. ”, sem que, na verdade, tais serviços fossem prestados pelas referidas sociedades.
17.–Para tanto, o arguido JMG  promoveu a constituição dessas sociedades, entre 2006 e 2012, as quais, nas circunstâncias adiante descritas, emitiram facturas à “AJ, S.A.”, como se fossem suas fornecedoras, permitindo àquela deduzir indevidamente o IVA constante dessas facturas e também reduzir o valor do lucro tributável em cada exercício e, consequentemente, o valor do IRC a pagar ao Estado.
18.–Tais sociedades, sem património e não declarantes fiscais, tendo a primeira como gerente de facto e de direito o arguido JMG  e as restantes, como gerente de direito, o arguido FMA, amigo do arguido JMG, foram utilizadas entre Janeiro de 2006 e Março de 2012, conforme acima referido, uma por cada ano e por cada um dos exercícios.
19.–Na realidade, a gerência de facto dessas sociedades pertencia ao arguido JMG, que a exercia na sede da “AJ, S.A.”, não sendo desenvolvida qualquer actividade real nos demais locais indicados como sedes daquelas sociedades.
20.–Para a concretização dos objectivos supramencionados o arguido JMG  contou com a colaboração dos arguidos JTG, FMA e AJE, nas circunstâncias adiante descritas.
21.–O arguido JTG , na qualidade de membro do Conselho de Administração da “AJ, S.A.” e de seu director financeiro, controlava a facturação emitida por aquela, a facturação dos fornecedores, e era responsável pelos pagamentos aos trabalhadores, ao Estado e aos fornecedores.
22.–O arguido FMA  participou na constituição de cada uma das sociedades criadas, assumindo formalmente a qualidade de seu gerente de direito, pese embora a gerência, de facto, fosse exercida pelo arguido JMG .
23.–O arguido AJE  desempenhava as funções de Técnico Oficial de Contas (TOC) da “AJ, S.A.” e de cada uma das sociedades criadas, cujo início de actividade declarou junto da Administração Tributária.
24.–O arguido AJE  preenchia o IES (informação empresarial simplificada) e, para efeitos de IRC o modelo 22 aos quais juntava os anexos respectivos, preenchia as declarações fiscais da “AJ, SA” e remetia-as à Autoridade Tributária.
25.–No que respeita às sociedades “ARH , Lda.”, “AXXI , Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal”, “CSL – Sucursal em Portugal” e da sociedade “ALJ, Lda.”, o arguido AJE  nunca entregou qualquer declaração fiscal das mesmas.
26.–Sucessivamente, depois do início de actividade de cada uma das mencionadas sociedades, invocando o facto de não lhe terem sido entregues quaisquer documentos contabilísticos, nem paga qualquer avença e a ausência de contactos pelos sócios e/ou gerentes das mesmas, renunciou à qualidade de TOC dessas sociedades, em 19.07.2007 (“ARH”); 3.04.2008 (“AXXI ”) ; 22.04.2009 (“AI”); 22.02.2010 (“Aj”); 19.05.2011 (“AHL”) e 23.03.2012 (“CSL ”), e deu conhecimento dessas renúncias à autoridade tributária.
27.–No período de Janeiro de 2006 a Março de 2012, eram facturados à “AJ, S.A.”, em nome das sociedades acima mencionadas, valores que oscilavam entre 80%/90% da facturação da “AJ, S.A.”, como se os mesmos dissessem respeito à cedência/administração de pessoal.
28.–No entanto, a “Aj, SA era responsável pelo processamento e pagamento dos salários de todos os trabalhadores e supervisionava o seu trabalho através de funcionários pertencentes ao seu quadro próprio de pessoal.
29.–Pelo que tais contratos de cedência de trabalhadores/administração de pessoal não foram na verdade efectuados e não correspondiam a serviços efectivamente prestados.
30.–O arguido AJE contabilizava facturas emitidas em nome das sociedades acima mencionadas - ponto 17 - à “AJ, SA”, e, no lugar de facturas que não lhe eram entregues, manuscritos, por si redigidos, com os elementos das facturas, com o valor contabilizado com base em acordo, acima referido - ponto 28 - entre a “AJ ” e cada uma das sociedades.
31.–Com base nos elementos supramencionados o arguido AJE, com o conhecimento e o acordo dos restantes arguidos, efectuava os lançamentos contabilísticos, preenchia as declarações fiscais da “AJ, SA” e remetia-as à Autoridade Tributária.

2006

32.–Assim, no ano de 2006, a sociedade “AJ, S.A.” contabilizou como seu principal fornecedor a sociedade “ALJ , Lda.”, constituída em 3.11.2003, com sede na Av. … em Lisboa.
33.–Aquela sociedade tinha como objecto social a prestação de serviços de limpeza, criação e manutenção de jardins, recolha e transporte de lixos e resíduos sólidos e comercialização de equipamentos e produtos afectos àquela actividade.
34.–A “ALJ, Lda.” tinha, como gerente de facto e de direito, o arguido JMG e como TOC o arguido AJE .
35.–A referida sociedade “ALJ, Lda.” nunca entregou qualquer declaração de IVA ou de IRC.
36.–Em 2006, por despacho do Secretário de Estado, foi cessada oficiosamente com efeitos a 31 de Dezembro de 2004 e em 27.02.2012 foi dissolvida administrativamente tendo o registo do encerramento da liquidação e o cancelamento da matrícula sido efectuados em 12.11.2012.
37.–No entanto, no ano de 2006, foram emitidas as seguintes facturas ou manuscritos com os elementos das facturas, em nome da “ALJ, Lda.”, e registadas na contabilidade da “AJ, S.A.” como facturas, como se de efectiva prestação de serviços se tratasse:


DescriçãoDoc. InternoValorIVACrédito Valor
Prestação de serviços
(01/2006)
6013009
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.150)
146.048,73€30.670,24€176.718,97€
Prestação de serviços
(02/2006)
6023011
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.155)
238.675,13€50.121,78€288.796,91€
Prestação de serviços
(03/2006)
6033021
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.157)
21.000,00€4.410,00€25.410,00€
Prestação de serviços
(03/2006)
6033022
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.158)
303.217,40€63.675,66€366.893,06€
Prestação de serviços
(04/2006)
6043011
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.160)
36.857,15€7.740,01€44.597,16€
Prestação de serviços
(04/2006)
6043012
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.161)
208.829,06€43.856,21€252.685,27€
Prestação de serviços
(05/2006)
6053011
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.163)
191.518,60€40.218,91€231.737,51€
Prestação de serviços
(05/2006)
6053012
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.164)
30.870,00€6.482,70€37.352,70€
Prestação de serviços
(06/2006)
6063011
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.166)
42.000,00€8.820,00€50.820,00€
Prestação de serviços
(06/2006)
6063012
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.167)
230.712,00€48.449,63€279.162,13€
Prestação de serviços
(07/2006)
6073023
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.169)
223.955,04€47.030,56€270.985,60€
Prestação de serviços
(07/2006)
6073024
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.170)
44.730,00€9.393,30€54.123,30€
Prestação de serviços
(08/2006)
6083011
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.173)
207.907,30€43.660,53€251.567,83€
Prestação de serviços
(08/2006)
6083012
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.174)
28.610,00€6.008,10€34.618,10€
Prestação de serviços
(09/2006)
6093007(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.176)16.274,19€3.417,58€19.691,77€
Prestação de serviços
(09/2006)
6093008
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.177)
189.388,74€39.771,64€229.160,38€
Prestação de serviços
(10/2006)
6103018
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.180)
7.600,00€1.596,00€9.196,00€
Prestação de serviços
(10/2006)
6103019
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.181)
204.788,83€43.005,65€247.794,48€
Prestação de serviços
(11/2006)
6113012
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.183)
197.000,00€41.370,00€238.370,00€
Prestação de serviços
(11/2006)
6113013
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.184)
28.000,00€5.880,00€33.880,00€
Prestação de serviços
(11/2006)
6113015
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.187)
25.018,83€5.253,95€30.272,78€
Prestação de serviços
(12/2006)
6123014
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.189)
28.450,00€5.974,50€34.424,50€
Prestação de serviços
(12/2006)
6123015
204.066,42€42.853,95€246.920,37€
Total 2.855.517,92€599.660,90€3.455.178,82€


38.–Os serviços constantes de tais facturas ou manuscritos com os elementos das facturas nunca foram prestados pela “ALJ , Lda.”.
39.–Por sua vez a “ALJ, Lda.”, não efectuou o pagamento do IVA supostamente liquidado à “AJ, S.A.”.
40.–Pelo que, no exercício de 2006, a sociedade “AJ, S.A.”, em função das mesmas, deduziu indevidamente IVA no valor global de 599.660,90 €.
41.–Também em sede de IRC, no exercício de 2006, a “AJ, S.A.” obteve uma vantagem patrimonial indevida à custa da diminuição das receitas tributárias, uma vez que contabilizou, como custos, as facturas e manuscritos com elementos das facturas emitidos pela “ALJ, Lda.” que não correspondem a efectivos serviços prestados.
42.–Assim, no ano de 2006, a “ALJ, Lda.”, nas circunstâncias referidas, facturou à “AJ, S.A.” o montante de 2.855.517,92 €, dos quais apenas 1.013.333,27 € foram pagos em cheque ou transferência bancária e correspondem a custos efectivamente suportados pela “AJ, S.A.” com trabalhadores próprios, mas que imputou àquela sociedade.
43.–De onde decorre um acréscimo à matéria colectável de 1.842.186,65 €, o que, aplicando a taxa de IRC de 25%, resulta o montante de 460.546,66 € de IRC em falta, assim discriminado:


AnoDescriçãoValor
2006Custos não aceites (a)2.855.517,92€
Custos Aceites (pagamento de salários) (b)1.013.331,27€
Acréscimo de Matéria Colectável (a-b)1.842.186,65€
IRC460.546,66€


2007

44.–No ano de 2007, a sociedade “AJ, S.A.” contabilizou como seu principal fornecedor a sociedade “ARH, Lda.”, constituída em 19.03.2007 (com sede na Av. ..., nº ..., ...º, Lisboa).
45.–A sociedade “ARH, Lda.” tinha como objecto social a gestão de recursos humanos de pessoal técnico de limpezas industriais e hospitalares.
46.–O capital social da referida sociedade é de 5.000,00 €, sendo uma quota, no valor de 4.000,00 €, pertencente à “VIL ”, com sede em Gibraltar, cujo representante em Portugal é FMA  e outra, de 1.000,00 €, pertencente a este mesmo arguido.
47.–Aquela sociedade tinha como gerente de direito o arguido FMA , e o arguido AJE  era o seu TOC.
48.–A “ARH, Lda.”, entre 2007 e 2012 não entregou qualquer declaração de IVA ou de IRC, enquanto teve actividade registada e foi cessada oficiosamente em 31 de Dezembro de 2011, mas ainda não se encontra liquidada.
49.–No ano de 2007, foram emitidas em nome da “ARH, Lda.” as seguintes facturas ou manuscritos com os elementos das facturas, registadas na contabilidade da “AJ, S.A.” como se de efectiva prestação de serviços se tratasse:


DescriçãoDoc. InternoValorIVACrédito Valor
Prestação de serviços
(01/2007)
7013010
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.193)
217.912,96€45.761,72€263.674,68€
Prestação de serviços
(02/2007)
7023001
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.194)
11.850,00€2.488,50€14.338,50€
Prestação de serviços
(02/2007)
7023002
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.197)
122.848,00€25.798,08€148.646,08€
Prestação de serviços
(03/2007)
7033008
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.198)
135.890,62€28.537,03€164.427,65€
Prestação de serviços
(03/2007)
7033009
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.199)
27.000,00€5.670,00€32.670,00€
Prestação de serviços
(04/2007)
7043002
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.205)
129.584,39€27.212,72€156.797,11€
Prestação de serviços
(05/2007)
7053015
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.211)
17.000,00€3.570,00€20.570,00€
Prestação de serviços
(05/2007)
7053016
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.212)
152.628,94€32.052,08€184.681,02€
Prestação de serviços
(06/2007)
7063007
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.220)
14.280,00€2.998,80€17.278,80€
Prestação de serviços
(06/2007)
7063008
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.221)
154.789,30€32.505,75€187.295,05€
Prestação de serviços
(07/2007)
7073010
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.222)
175.710,40€36.899,18€212.609,58€
Prestação de serviços
(08/2007)
7083004
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.223)
159.608,40€33.517,76€193.126,16€
Prestação de serviços
(08/2007)
7083005
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.224)
23.000,00€4.830,00€27.830,00€
Prestação de serviços
(09/2007)
7093016
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.225)
160.167,09€33.635,09€193.802,18€
Prestação de serviços
(10/2007)
7103008
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.226)
194.490,65€40.843,04€235.333,69€
Prestação de serviços
(10/2007)
7103009
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.227)
24.274,04€5.097,55€29.371,59€
Prestação de serviços
(11/2007)
7113012
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.234)
208.646,45€43.815,75€252.462,20€
Prestação de serviços
(12/2007)
7123917
(Apenso 60, Pasta 1/5, fls.237)
213.378,16€44.809,41€258.187,57€
Total 2.143.059,40€450.042,46€2.593.101,86€


50.–Os serviços constantes de tais facturas ou manuscritos com os elementos das facturas nunca foram prestados pela “ARH, Lda.”.
51.–Pelo que, no exercício de 2007, a sociedade “AJ, S.A.”, em função das mesmas, deduziu indevidamente IVA no valor de 450.042,46 €.
52.–Também em sede de IRC, no exercício de 2007, a “AJ, S.A.” obteve uma vantagem patrimonial indevida à custa da diminuição das receitas tributárias, uma vez que contabilizou como custos aquelas facturas e manuscritos com os elementos das facturas emitidos pela “ARH, Lda.” e que não correspondem a efectivos serviços prestados.
53.–No ano de 2007, a “ARH, Lda.” facturou à “AJ, S.A.” o montante de 2.143.059,40 €, dos quais apenas 1.506.616,77 € foram pagos em cheque ou transferência bancária e correspondem a custos efectivamente suportados pela “AJ, S.A.” com trabalhadores próprios, mas que imputou àquela sociedade.
54.–De onde decorre um acréscimo à matéria colectável de 636.442,63 €, o que, aplicando a taxa de IRC de 25%, resulta o montante de 159.110,66 € de IRC em falta, assim discriminado:


AnoDescriçãoValor
2007Custos não aceites (a)2.143.059,40€
Custos Aceites (pagamento de salários) (b)1.506.616,77€
Acréscimo de Matéria Colectável (a-b)636.442,63€
IRC159.110,66€


2008

55.–No ano de 2008, a sociedade “AJ, S.A.” contabilizou como principal fornecedor a sociedade “AXXI, Lda.”, constituída em 24.01.2008.
56.–Aquela sociedade tinha como objecto social a prestação de serviços de limpeza, limpezas industriais, técnicas e hospitalares e gestão de recursos humanos.
57.–O capital social da referida sociedade é de 5.000,00 €, sendo uma quota, no valor de 4.000,00 €, pertencente à “MIL ” (cujo representante em Portugal é FMA ) e outra de 1.000,00 € pertencente à “ARH, Lda.”.
58.–Aquela sociedade tinha como gerente de direito o arguido FMA e, como TOC, o arguido AJE .
59.–O registo de constituição da “AXXI, Lda.” não foi efectuado junto da Conservatória do Registo Comercial.
60.–No entanto, FMA  e AJE  declararam o início da actividade daquela sociedade junto da Autoridade Tributária, juntando para o efeito um Pedido/Talão comprovativo de registo da 1.ª Secção da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, que dizia respeito ao registo da sociedade “ARH, Lda.” e não à sociedade cujo início de actividade declaravam, ou seja, a “AXXI, Lda.”.
61.–A “AXXI, Lda.” foi cessada oficiosamente em 31.12.2011 e nunca entregou qualquer declaração de IVA ou de IRC.
62.–No ano de 2008, foram emitidos, em nome da “AXXI, Lda.”, as seguintes facturas e manuscritos com os elementos das facturas, registados na contabilidade da “AJ, S.A.” como se de efectiva prestação de serviços se tratasse:


DescriçãoDoc. InternoValorIVACrédito Valor
Prestação de serviços
(01/2008)
8013012
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.2 e 3)
193.496,36€40.634,24€234.130,60€
Prestação de serviços
(02/2008)
8023010
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.40 e 41)
128.554,94€26.996,54€155.551,48€
Prestação de serviços
(03/2008)
8033014
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.98 e 99)
191.047,40€40.119,95€231.167,35€
Prestação de serviços
(04/2008)
8043016
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.100 e 101)
229.179,23€48.127,64€277.306,87€
Prestação de serviços
(05/2008)
8053019
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.195 e 196)
280.692,38€58.945,40€339.637,78€
Prestação de serviços
(06/2008)
6063014
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.197 e 198)
254.173,66€53.376,47€307.550,13€
Prestação de serviços
(07/2008)
8073007
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.239 e 240)
219.303,71€43.860,74€263.164,45€
Nota de débito
(08/2008)
8083004
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.281 e 282)
190.048,24€38.009,65€228.057,89€
Prestação de serviços
(09/2008)
8093013
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.326)
237.607,67€47.521,53€285.129,20€
Nota de crédito
(09/2008)
8093014
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.327)
- 9.795,63€- 1.959,13€-11.754,76€
Prestação de serviços
(10/2008)
8103004
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.334 e 335)
220.545,21€44.109,44€264.654,25€
Prestação de serviços
(10/2008)
8103005
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.376 e 377)
17.083,17€3.416,63€20.499,80€
Prestação de serviços
(11/2008)
8113006
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.374 e 375)
180.605,46€36.121,09€216.726,55€
Prestação de serviços
(11/2008)
8113013
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.336 e 377)
- 15.424,55€- 3.084,91€- 18.509,46€
Prestação de serviços
(12/2008)
8123008
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.481 e 482)
260.940,60€52.188,13€313.128,73€
Prestação de serviços
(12/2008)
8123009
(Apenso 60, Pasta 2/5, fls.483 e 484)
13.500,00€2.700,00€16.200,00€
Total 2.591.557,85€531.083,01€3.122.640, 86€


63.–Os serviços constantes de tais facturas ou manuscritos com os elementos das facturas nunca foram prestados pela “AXXI, Lda.”.
64.–Pelo que, no exercício de 2008, a sociedade “AJ, S.A.” deduziu indevidamente IVA no valor global de 531.083,01 €.
65.–Também em sede de IRC, no exercício de 2008, a “AJ, S.A.” obteve uma vantagem patrimonial indevida à custa da diminuição das receitas tributárias, uma vez que contabilizou como custos aquelas facturas e manuscritos com os elementos das facturas emitidos em nome da “AXXI, Lda.” e que não correspondiam a efectivos serviços prestados.
66.–Assim, no ano de 2008, a “AXXI, Lda.” facturou à “AJ, S.A.” o montante de 2.591.557,85€, dos quais apenas 1.732.169,72 € foram pagos em cheque ou transferência bancária e correspondem a custos efectivamente suportados pela “AJ, S.A.” com trabalhadores próprios, mas que imputou àquela sociedade.
67.–De onde decorre um acréscimo à matéria colectável de 825.221,79 € o que, aplicando a taxa de IRC de 25%, resulta no montante de 206.305,45 € de IRC em falta, assim discriminado:


AnoDescriçãoValor
2008Custos não aceites (a)2.591.557, 85€
Custos Aceites (pagamento de salários) (b)1.732.169,72€
Acréscimo de Matéria Colectável (a-b)825.221,79€
IRC206.305,45€


2009

68.–No ano de 2009, a sociedade “AJ, S.A.” contabilizou como principal fornecedor a sociedade “, S.A.”, constituída em 21.01.2009, com sede na R. …., Lisboa.
69.–A sociedade “AI” tinha como objecto social a prestação de serviços de limpeza.
70.–O capital social da referida sociedade é de 50.000,00 euros, cujas acções pertencem, na sua totalidade, à “DHL”, com sede em Gibraltar.
71.–Aquela sociedade tem como administrador único o arguido FMA .
72.–A “AI, S.A.” não entregou qualquer declaração de IVA ou de IRC nos exercícios de 2009 a 2012.
73.–No entanto, no ano de 2009, a “AI, S.A.” emitiu as seguintes facturas, ou manuscritos com os elementos das facturas, registadas na contabilidade da “AJ, S.A.” como se de efectiva prestação de serviços se tratasse:


DescriçãoDoc. InternoValorIVACrédito Valor
Prestação de serviços
(01/2009)
9013012
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.2)
203.162,59€40.632,52€243.795,11€
Nota de Crédito
(01/2009)
9013013
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.3)
- 8750,00€- 1.750,00€- 10.500,00€
Prestação de serviços
(02/2009)
9023009
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.4)
216.194,81€43.238,96€259.433,77€
Prestação de serviços
(03/2009)
9033006
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.6)
249.925,11€49.985,02€299.910,13€
Nota de Crédito
(03/2009)
9033007
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.7)
- 45.620,00€- 9.124,00€- 54.744,00€
Prestação de serviços
(04/2009)
9043013
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.53)
285.244,20€57.048,84€342.293,04€
Nota de Crédito
(05/2009)
9053007
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.56)
- 15.621,50€- 3.124,30€- 18.745,80€
Prestação de serviços
(05/2009)
9053006
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.57)
285.990,39€57.198,08€343.188,47€
Nota de Crédito
(06/2009)
9063016
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.58)
- 10.105,00€- 2.021,00€- 12.126,00€
Prestação de serviços
(06/2009)
9063015
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.59)
245.183,57€49.036,71€294.220,28€
Prestação de serviços
(07/2009)
9073018
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.140)
248.454,16€49.690,84€298.145,00€
Prestação de serviços
(08/2009)
9083007
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.190)
245.492,04€49.098,41€€294.590,45
Prestação de serviços
(09/2009)
9093012
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.241)
252.847,38€50.569,48€303.416,86€
Prestação de serviços
(10/2009)
9103007
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.313)
208.784,28€41.756,86€250.541,14€
Prestação de serviços
(11/2009)
9113014
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.377)
217.148,16€43.429,63€260.577,79€
Nota de Crédito
(11/2009)
9113015
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.378)
- 65.500,00€- 13.100,00€-78.600,00€
Prestação de serviços
(12/2009)
9123018
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.483 e 489)
341.427,59€68.285,52€409.713,11€
Nota de Crédito
(12/2009)
9123019
(Apenso 60, Pasta 3/5, fls.464 e 490)
- 14.375,00€- 2.875,00€- 17.250,00€
Total 2.839.882,78€567.976,57€3.497.859,35€


74.–Os serviços constantes de tais facturas ou manuscritos com os elementos das facturas nunca foram prestados pela “AI, S.A.”.
75.–Pelo que, no exercício de 2009, a sociedade “AJ, S.A.” deduziu indevidamente IVA no valor global de 567.976,57 €.
76.–Também em sede de IRC, no exercício de 2009, a “AJ, S.A.” obteve uma vantagem patrimonial indevida à custa da diminuição das receitas tributárias, uma vez que contabilizou como custos aquelas facturas ou projectos de facturas emitidas pela “AI, S.A.” e que não correspondem a efectivos serviços prestados.
77.–Assim, no ano de 2009, a “AI, S.A.” facturou à “AJ, S.A.” o montante de 2.839.882,78 €, dos quais apenas 2.060.898,47 € foram pagos em cheque ou transferência bancária e que correspondem a custos efectivamente suportados pela “AJ, S.A.” com trabalhadores próprios, mas que imputou àquela sociedade.
78.–De onde decorre um acréscimo à matéria colectável de 758.848,50 €, o que, aplicando a taxa de IRC de 25%, resulta o montante de 189.621,13 € de IRC em falta, assim discriminado:


AnoDescriçãoValor
2009Custos não aceites (a)2.839.882,78€
Custos Aceites (pagamento de salários) (b)2.060.398,28
Acréscimo de Matéria Colectável (a-b)758.848,50€
IRC189.621,13€


2010

79.–No ano de 2010, a sociedade “AJ, S.A.” contabilizou como principal fornecedor a sociedade “Aj, Lda.”, constituída em 9.12.2009, com sede na R. …., em Lisboa.
80.–Aquela sociedade tinha como objecto social a prestação de serviços de limpeza.
81.–O capital social da referida sociedade é de 5.000,00 €, sendo uma quota, no valor de 4.000,00 €, pertencente ao arguido FMA e uma quota de 1.000,00 € pertencente a “VIL ”, com sede em Gibraltar.
82.–A gerência de direito pertencia ao arguido FMA , sendo que AJE  exerceu as funções de TOC.
83.–Aquela sociedade não entregou qualquer declaração de IVA ou de IRC nos exercícios de 2010 a 2012.
84.–No entanto, no ano de 2010, a “Aj, Lda.” emitiu as seguintes facturas ou manuscritos com os elementos das facturas, registadas na contabilidade da “AJ, S.A.” como se de efectiva prestação de serviços se tratasse:


DescriçãoDoc. InternoValorIVACrédito Valor
Prestação de serviços
(01/2010)
10013013
(Apenso 60, Pasta 4/5, fls.2)
220.996,02€44.199,21€265.195,23€
Prestação de serviços
(02/2010)
10023014
(Apenso 60, Pasta 4/5, fls.3)
301.842,75€60.368,55€362.211,30€
Nota de Crédito
(02/2010)
10025015
(Apenso 60, Pasta 4/5, fls.4)
- 7.520,00€- 1.540,00€- 9.024,00€
Prestação de serviços
(03/2010)
10033007
(Apenso 60, Pasta 4/5, fls.69)
269.930,84€53.986,17€323.917,01€
Prestação de serviços
(04/2010)
10043013
(Apenso 60, Pasta 4/5, fls.114)
240.398,79€48.079,76€288.478,55€
Prestação de serviços
(05/2010)
10053013
(Apenso 60, Pasta 4/5, fls.188)
307.412,79€61.482,56€368.895,35€
Nota de Crédito
(05/2010)
10053014
(Apenso 60, Pasta 4/5, fls.189)
- 34.620,00€- 6.924,00€- 41.544,00€
Prestação de serviços
(06/2010)
10063001
(Apenso 60, Pasta 4/5, fls.258)
358.636,80€71.727,36€430.364,16€
Prestação de serviços
(07/2010)
10073030
(Apenso 60, Pasta 4/5, fls.341)
218.620,09€45.91022€264.530,31€
Prestação de serviços
(08/2010)
10083029
(Apenso 60, Pasta 5/5, fls.1)
423.245,37€88.881,53€512.126,90€
Prestação de serviços
(09/2010)
10093016
(Apenso 60, Pasta 5/5, fls.140)
19.000,00€3.990,00€22.990,00€
Prestação de serviços
(10/2010)
10103016
(Apenso 60, Pasta 5/5, fls.142)
627.151,29€131.701,77€758.853,06€
Prestação de serviços
(11/2010)
10113013
(Apenso 60, Pasta 5/5, fls.215)
398.000,00€83.580,00€481.580,00€
Prestação de serviços
(12/2010)
10123006
(Apenso 60, Pasta 5/5, fls.218)
330.224,62€69.347,17€399.571,79€
Total 3.673.319,36€754.826,30€4.428.145,66€


85.–Os serviços constantes de tais facturas ou manuscritos com os elementos das facturas nunca foram prestados pela “Aj, Lda.”
86.–Pelo que, no exercício de 2010, a sociedade “AJ, S.A.” deduziu indevidamente IVA no valor global de 754.826,30 €.
87.–Também em sede de IRC, no exercício de 2010, a “AJ, S.A.” obteve uma vantagem patrimonial indevida à custa da diminuição das receitas tributárias, uma vez que contabilizou como custos aquelas facturas ou projectos de facturas emitidas pela “Aj, Lda.” e que não correspondem a efectivos serviços prestados.
88.–Assim, no ano de 2010, a “Aj, Lda.” facturou à “AJ, S.A.” o montante de 3.673.319,36 €, dos quais apenas 1.997.153,60 € foram pagos em cheque ou transferência bancária e que correspondem a custos efectivamente suportados pela “AJ, S.A.” com trabalhadores próprios, mas que imputou àquela sociedade.
89.–De onde decorre um acréscimo à matéria colectável de 1.676.165,76 €, o que, aplicando a taxa de IRC de 25%, resulta o montante de 419.041,44 € de IRC em falta, assim discriminado:


AnoDescriçãoValor
2010Custos não aceites (a)3.673.319,36€
Custos Aceites (pagamento de salários) (b)1.997.153,60€
Acréscimo de Matéria Colectável (a-b)1.676.165,76€
IRC419.041,44€


2011

90.–No ano de 2011, a sociedade “AJ, S.A.” contabilizou como principal fornecedor a sociedade “AHL – Sucursal em Portugal”, a qual é uma representante, em Portugal, da sociedade, com sede no Reino Unido, “AHL” e que teve inicialmente sede na R. …. (escritório do arguido JF ).
91.–Aquela sociedade foi registada em 30.12.2010 e tinha como procurador, no nosso país, o arguido FMA .
92.–Em 15.07.2014 foi declarada insolvente.
93.–A “AHL – Sucursal em Portugal” não entregou qualquer declaração de IVA ou de IRC nos exercícios de 2011 e 2012.
94.–No entanto, no ano de 2011, a “AHL – Sucursal em Portugal” emitiu as seguintes facturas, ou manuscritos com os elementos das facturas, registadas na contabilidade da “AJ, S.A.” como se de efectiva prestação de serviços se tratasse:


DescriçãoDoc. InternoValorIVACrédito Valor
Prestação de serviços
(01/2011)
2011013009
(Apenso 24,fls.309)
300.585,00€69.134,55€369.719,55€
Prestação de serviços
(02/2011)
2011023001
(Apenso 24,fls.212)
358.795,30€82.522,92€441.318,22€
Nota de Crédito
(03/2011)
2011033002
(Apenso 24,fls.101)
- 41.073,00€-9.446,79€- 50.519,79€
Prestação de serviços
(03/2011)
2011033001
(Apenso 24,fls.102)
342.691,61€78.819,07€421.510,68€
Prestação de serviços
(04/2011)
2011043012
(Apenso 25,fls.205)
307.682,87€70.767,67€378.450,54€
Nota de Crédito
(04/2011)
201104013
(Apenso 25, fls.204)
- 7.695,65€- 1.770,00€- 9.465,65€
Prestação de serviços
(05/2011)
2011053007
(Apenso 25,f ls.158)
265.165,78€60.988,13€326.153,91€
Nota de Crédito
(05/2011)
2011053008
(Apenso 25, fls.157)
- 11.740,00 €- 2.799,20€- 14.440,20€
Prestação de serviços
(06/2011)
2011063005
(Apenso 25, fls.77)
437.840,00€100.703,20€538.543,20€
Prestação de serviços
(07/2011)
Doc. Int.
(Apenso 18, fls.319)
309.100,00€71.093,00€380.193,00€
Prestação de serviços
(08/2011)
Doc. Int.
(Apenso 18, fls.325)
344.627,90€79.264,42€423.892,32€
Prestação de serviços
(09/2011)
Doc. Int.
(Apenso 29,fls.120)
288.893,00€66.445,39€355.338,39€
Nota de Crédito
(09/2011)
(Apenso 29,fls.121)- 11.826,92€- 2.720,19€- 14.547,11€
Prestação de serviços
(10/2011)
Doc. Int.
(Apenso 29, fls.215)
167.653,30€38.560,26€206.213,56€
Nota de Crédito
(10/2011)
(Apenso 29, fls.216)- 9.500,00€- 2.185,00€- 11.685,00€
Prestação de serviços
(11/2011)
Doc. Int.
(Apenso 29,fls.285)
141.259,22€32.489,62€173.748,84€
Nota de Crédito
(11/2011)
(Apenso 29,fls.286)-8.390,00€- 1.929,70€- 10.319,70€
Prestação de serviços
(12/2011)
Doc. Int.
(Apenso 27,fls.204)
406.677,72€93.535,88€500.213,60€
Total 3.580.746,13€823.572,23€4.404.318,36€


95.–Os serviços constantes de tais facturas ou manuscritos com os elementos das facturas nunca foram prestados pela “AHL – Sucursal em Portugal”.
96.–Pelo que, no exercício de 2011, a sociedade “AJ, S.A.” deduziu indevidamente IVA no valor global de 823.572,23 €.

2012

97.–No ano de 2012, a sociedade “AJ, S.A.” contabilizou facturas da sociedade “CSL – Sucursal em Portugal”, representante, no nosso país, da sociedade, com sede em Gibraltar, “CSL ”.
98.–Aquela sociedade foi registada em 2.01.2012 e tem como objecto social a prestação de serviços de limpezas técnicas e industriais, gestão e detenção de participações sociais em empresas de limpezas técnicas e industriais.
99.–O seu procurador em Portugal é o arguido FMA .
100.–A sociedade não declarou como cliente a “AJ, S.A.”.
101.–No entanto, nos meses de Janeiro a Março de 2012, a “CSL – Sucursal em Portugal” emitiu as seguintes facturas, ou manuscritos com os elementos das facturas, registadas na contabilidade da “AJ, S.A.” como se de efectiva prestação de serviços se tratasse:


DescriçãoDoc. InternoValorIVACrédito Valor
Prestação de serviços
(01/2012)
s/ Doc. Int.
(Apenso 18, fls.179)
116.984,48€26.906,43€143.890,91€
Nota de Crédito
(01/2012)
s/ Doc. Int.
- 9.815,00€- 2.257,45€- 12.072,45€
Prestação de serviços
(02/2012)
Doc. Int.
(Apenso 18, fls.183)
172.681,81€39.716,77€212.398,58€
Nota de Crédito
(02/2012)
Doc. Int.
(Apenso 18, fls.182)
- 8.650,00€-1.989,50€- 10.639,50€
Prestação de serviços
(03/2012)
Doc. Int. (Apenso 18, fls.187)123.158,08€28.326,36€151.484,44€
Nota de Crédito
(03/2012)
Doc. Int. (Apenso 18, fls.186)- 8.705,00€- 2.002,15€- 10.707,15€
Total 385.654,37€88.700,46€474.354,83€


102.–Os serviços constantes de tais facturas ou manuscritos com os elementos das facturas nunca foram prestados pela “CSL – Sucursal em Portugal”.
103.–Pelo que, no exercício de 2012, a sociedade “AJ, S.A.”, relativamente ao período compreendido entre Janeiro e Março, deduziu indevidamente IVA no valor global de 88.700,46 €.
104.–Em consequência da actuação descrita a “AJ, S.A.”, no período compreendido entre Janeiro de 2006 e Março de 2012, visou e conseguiu obter, em seu benefício e em prejuízo do erário público, uma vantagem patrimonial indevida no valor global de 5.250.487,26 €.
105.–Sendo o montante de 3.815.861,93 €, decorrente da dedução indevida de IVA, valor esse que assim não foi entregue nos cofres do Estado.
106.–E o montante de 1.434.625,33 € de IRC devido e não entregue.
107.–Causando o correspondente prejuízo aos cofres do Estado.
108.–Os arguidos JMG, JTG  integraram os montantes assim obtidos na esfera patrimonial da sociedade “AJ, S.A.”, e também no seu próprio património ou de outros.
109.–Já que, no período compreendido entre os anos de 2006 a 2011, existiram diversas saídas de meios financeiros da Aj, SA, designadamente cheques e transferências bancárias sem que essas saídas se mostrem justificadas por qualquer suporte documental ou tenham registadas na contabilidade da sociedade arguida.
110.–Com efeito, em 2006, o arguido JMG  declarou auferir um rendimento anual da Categoria A de IRS no valor de 20.932,50 € e, nos anos de 2007 a 2010, declarou ter auferido zero de rendimentos.
111.–No entanto, a “AJ , S.A.” emitiu, no período compreendido entre 2006 e 2010, setenta e sete cheques à ordem de JMG, no valor global de 565.500,00 €, os quais não se mostram justificados por qualquer suporte documental.
112.–O arguido JTG  declarou auferir os seguintes rendimentos anuais da Categoria A de IRS:
- no ano de 2006, 13.571,40 €;
- no ano de 2007, 14.574,00 €;
- no ano de 2008, 14.574,00 €;
- no ano de 2009, 13.533,00 €;
- no ano de 2010, 14.574,00 €.
113.–A arguida MAG declarou auferir os seguintes rendimentos anuais da Categoria A de IRS:
- no ano de 2006, 22.782,50 €;
- no ano de 2007, 24.050,00 €;
- no ano de 2008, 24.050,00 €;
- no ano de 2009, 24.050,00 €;
- no ano de 2010, 25.900,00 €.
109.–No entanto, o arguido JTG, naqueles anos, ordenou, via internet, a realização de várias transferências, do valor global de 371.198,67 euros, para a conta com o n.º 018.000.04036871300, sedeada no Banco Santander Totta, titulada por aquele e pela arguida MAG .
110.–Com efeito,
- no ano de 2006, foram efectuados dez movimentos bancários com o descritivo “trf/AJ  Lda.”, no valor global de 29.557,56 €;
- no ano de 2007, foram efectuados, seis movimentos bancários com o descritivo “trf/AJ  Lda.” e dez com o descritivo “despesas”, no valor global de 49.994,00 €;
- no ano de 2008, foram efectuados, um movimento bancário com o descritivo “trf/AJ  Lda.” e dezasseis com o descritivo “despesas”, no valor global de 83.249,11€;
- no ano de 2009, foram efectuados catorze movimentos com o descritivo “despesas”, no valor global de 91.480,00 €;
- no ano de 2010, foram efectuados catorze movimentos com o descritivo “despesas”, no valor global de 117.198,67 €.
111.–Valores estes todos superiores aos rendimentos declarados anualmente por cada arguido.
112.–No período compreendido entre 2006 e 2010 foram emitidos vinte e três cheques pela “AJ, S.A.” a favor do arguido JF , no valor global de 67.728,35 €, os quais não foram registados nas contas de depósitos à ordem da contabilidade daquela sociedade, assim como não foram registados designadamente a título de honorários.
113.–A “AJ, S.A.” emitiu ainda o cheque n.º 5040618084, no valor de 2.000,00 €, a favor de LR , pai de JF .
114.–No período compreendido entre 2006 e 2010, a “AJ , S.A.” emitiu, doze cheques à ordem de FMA , no valor global de 292.500,00 €, sem qualquer documento contabilístico que justificasse a sua emissão.
115.–Com efeito,
- em 02.03.2006, foi emitido o cheque sacado sobre o Banco BPN, no valor de 5.000,00 €.
- em 24.05.2006, foi emitido o cheque sacado sobre o Banco BPN, no valor de 130.000,00 €.
- em 25.10.2006, foi emitido o cheque sacado sobre o Banco Santander Totta, no valor de 5.000,00 €.
- em 04.01.2007, foi emitido o cheque sacado sobre o Banco Santander Totta, no valor de 5.000,00 €.
- em 04.04.2007 foi emitido o cheque sacado sobre o Banco BPN, no valor de 55.000,00 €.
- em 26.04.2007 foi emitido o cheque sacado sobre o Banco BPN, no valor de 55.000,00 €.
- em 11.09.2008 foi emitido o cheque sacado sobre o Banco BPN, no valor de 5.000,00 €.
- em 28.11.2008 foi emitido o cheque sacado sobre o Banco BPN, no valor de 10.000,00 €.
- em 31.03.2009 foi emitido o cheque sacado sobre o Banco BPN, no valor de 10.000,00 €.
- em 17.04.2009 foi emitido o cheque sacado sobre o Banco BPN, no valor de 5.000,00 €.
- em 13.01.2010 foi emitido o cheque sacado sobre o Banco Santander Totta, no valor de 5.000,00 €.
- em 26.05.2010 foi emitido o cheque sacado sobre o Banco BPN, no valor de 2.500,00 €.
116.–Os arguidos JMG  e JTG , entre os anos de 2006 a 2011 adquiriram mobiliário, objectos de decoração, electrodomésticos, viagens, tratamento de piscinas, de carros, de obras de arte e de antiguidades, bem como serviços de construção civil que pagaram com cheques da “AJ” que não se encontram registados na contabilidade da sociedade.
117.–Com efeito, para pagamento da factura com o n.º1003/2005, emitida pela sociedade “E. ” a favor de JMG , na qual é indicada a morada na Rua … no Seixal e como serviço prestado a venda de mobiliário para casa, foram emitidos, pela “AJ , S.A.” os seguintes:
- no dia 09.09.2005, o cheque n.º2600007513, sacado sobre o “Banto Santander Totta”, no valor de 1.557,00 €;
- no dia 17.05.2006, o cheque n.º5100012713, sacado sobre o “Banto Santander Totta”, no valor de 700,00 €;
- no dia 30.01.2007, o cheque n.º7700012713, sacado sobre o “Banto Santander Totta”, no valor de 7.000,00 €.
118.–Para pagamento da factura com o n.º600235/2006, emitida pela sociedade “E. ” a favor de JMG , na qual é indicada a morada na Avenida …em Lisboa, e como serviço prestado a venda de mobília de quarto, foram emitidos, pela “AJ, S.A.” os seguintes cheques :
- no dia 01.06.2006, o cheque n.º7600012767, sacado sobre o “Banco Santander Totta”, no valor de 3.215,00 €.
- no dia 28.07.2006, o cheque n.º30695101, sacado sobre o “Banco BPN”, no valor de 7.035,00 €.
119.–Para pagamento da factura com o n.º507006234, emitida pela “Worten” a favor da sociedade “AJ, Lda.”, em 17.03.2007, no valor de 4.999,00 €, referente à aquisição de um plasma e de um sistema home cinema, foi emitido pela “AJ, S.A.” o cheque n.º16154222521, no valor de 4.998,00 €.
120.–Tanto o cheque, como a factura, não foram registados na contabilidade da sociedade arguida.
121.–Para pagamento do veículo de marca Jaguar, com a matrícula 75, no valor de 52.000,00 €, vendido pela sociedade “ÁM, Lda.” a JMG , foi entregue o veículo de marca “Bentley”, com a matrícula 15 (propriedade de JTG ), com o valor de 20.000,00 €, e emitido pela “AJ, S.A.”, em 09.06.2010, o cheque n.º9500018714, sacado sobre o “Banco Santander Totta”, no valor de 32.0000,00 €, assinado no verso por AAVV (sócio da aludida sociedade).
122.–Em 28.07.2008 e 25.11.2008 foram emitidos pela “AJ, S.A.” os cheques n.º8947658372 e n.º6340618061, sacados sobre o “Banco BPN”, no valor de 87.000,00 € e 115.000,00 €, respectivamente, a favor da sociedade “EII, Lda.”, cujos sócios são MAG , SSG, JTG , “PI, LLC.” e JF .
123.–Aqueles títulos de crédito não foram registados na contabilidade da “AJ, S.A.”.
124.–Tais cheques foram depositados em 28.07.2008 e 26.11.2008 na conta da referida sociedade, sedeada no “Banco BPN”, sendo que em 26.11.2008 foi emitido o cheque n.º3039865799, sacado sobre a referida conta e assinado por JMG  para aquisição do veículo da marca Porsche, com a matrícula 62….
125.–Para pagamento de uma reparação automóvel, serviço prestado pela sociedade “AG, Lda.” foi emitido pela “AJ, S.A.”, em 03.03.2009, o cheque n.º3647658421, sacado sobre o Banco BPN, no valor de 10.000,00 €, o qual foi assinado por JMG .
126.–Aquele título de crédito não foi registado na contabilidade da “AJ, S.A.”.
127.–Para pagamento de serviços à Agência de Viagens Abreu, foi emitido, em 21.11.2008, pela “AJ, S.A.” o cheque n.º5802351634, sacado sobre o Banco BES, no valor de 13.889,00 €.
128.–Para pagamento da venda a dinheiro n.º26800104, datada de 21/01/2008, referente a quatro viagens aéreas Lisboa/Salvador/Lisboa, a “AJ, S.A.” emitiu o cheque n.º6040618000, sacado sobre a conta n.º14631041101 do Banco BPN, no valor de 7.223,28 €.
129.–Aquele título de crédito não foi registado na contabilidade da “AJ , S.A.”.
130.–Para pagamento da venda a dinheiro n.º43201143, datada de 02.10.2012, referente a duas viagens aéreas Lisboa/Salvador/Lisboa, a “AJ, S.A.” emitiu o cheque n.º8658118917, sacado sobre a conta n.º14631041101 do Banco BPN, no valor de 4.672,00 €.
131.–Para pagamento da factura n.º37848 emitida pela sociedade “IOMIT, Lda.”, em nome da “AJ, S.A.”, referente a uma viagem a Larnaca e alojamento em hotel, aquela sociedade emitiu, em 09.06.2006, o cheque n.º6215422462, assinado por JMG , sacado sobre a conta daquela sedeada no Banco BPN, no valor de 3.436,00 €.
132.–Aquele título de crédito não foi registado na contabilidade da “AJ, S.A.”
133.–Para pagamento da factura com o n.º2008/2800706 emitida, em 30.06.2008, pela sociedade “RP Industries, S.A.” à “Vila Santiago, S.A.” (cuja gerente é MAG ) no valor de 57.445,00 €, referente a diverso material de aplicação em piscinas, foi emitido o cheque n.º7640618038, datado de 05.05.2006, no valor de 17.230,00 €, sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
134.–Para pagamento da factura com o n.º2008/281051 emitida, em 14.08.2008, pela sociedade “RP Industries, S.A.” a JMG, no valor de 5.088,33 €, referente a diverso material de aplicação em piscinas, foi emitido o cheque n.º7540618092, datado de 30.09.2008, no valor de 6.106,00 €, sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
135.–Os referidos títulos de crédito não foram registados na contabilidade da “AJ, S.A.”.
136.–Para pagamento da factura com o n.º2368 emitida, em 02.10.2006, pelo Palácio do Correio Velho a JMG , no valor de 5.665,00 €, referente à aquisição de artigos com a designação “António Mariana, Rita e Tânia e Vaca”, foi emitido o cheque n.º3115422487, datado de 09.06.2006, no valor de 5.665,00 €, sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
137.–Para pagamento da factura com o n.ºA107 foi emitida, em 21.05.2007, pela sociedade “P.A. L., Lda.” à “AJ, S.A.”, no valor de 3.950,00€, referente à aquisição de uma escultura, foi emitido o cheque n.º6615422537, datado de 21.05.2007, no valor de 3.950,00 €, sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
138.–Os referidos títulos de crédito não foram registados na contabilidade da “AJ, S.A.”.
139.–Para pagamento das facturas com os n.º638, 652, 666, 684 e 691 emitidas por CMB à sociedade “Vila S., S.A.”, referente a serviços efectuadas na quinta de Alcáçovas, incluindo material e mão-de-obra, foram emitidos os seguintes cheques:
- o cheque n.º8840618069, datado de 31.07.2008, no valor de 15.000,00 €, a favor de CMBa, sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
- o cheque n.º2340618087, datado de 22.09.2008, no valor de 15.000,00 €, a favor de APB, sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
- o cheque n.º8347658405, datado de 25.01.2009, no valor de 20.000,00 €, a favor de CMB, sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
- o cheque n.º1047658467, datado de 29.06.2009, no valor de 15.000,00 €, a favor de APB, sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
- o cheque n.º23476584444, , datado de 27.04.2009, no valor de 5.000,00 €, a favor de CMB , sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
- o cheque n.º1747658477, datado de 09.07.2009, no valor de 10.000,00 €, a favor de CMB , sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
- o cheque n.º7052089097, datado de 03.10.2009, no valor de 5.000,00 €, a favor de CMB , sacado sobre a conta do BPN, titulada pela “AJ, S.A.” e assinado por JMG .
140.–Os arguidos JMG, JTG, AJE  e FMA  agiram em comunhão de esforços e de comum acordo, nas circunstâncias descritas, utilizando na “AJ, S.A.” facturas emitidas pelas sociedades “ALJ, Lda.”, “ARH , Lda.”, “AXXI , Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal” e pela “CSL – Sucursal em Portugal”, que introduziram na contabilidade e nas declarações fiscais da “AJ, S.A.” para fazer crer que esta suportara os valores nelas constantes.
141.–Não obstante os arguidos saberem que as respectivas facturas não correspondiam a quaisquer transacções ou prestações de serviços efectivas.
142.–Deste modo, os arguidos integraram e contabilizaram as referidas facturas na escrita da sociedade “AJ, S.A.”, inscrevendo-as quer nas declarações periódicas de IVA, quer nas declarações anuais de IRC, nos exercícios a que as mesmas se reportavam, como custos efectivos.
143.–Conseguindo assim diminuir a matéria tributável da sociedade “AJ, S.A.” e o imposto a entregar à Fazenda Nacional, quer em sede de IVA, no valor global de 3.815.861,93 €, quer em sede de IRC, no valor global 1.434.625,33 €, e assim alcançando a correspondente vantagem patrimonial que sabiam ser indevida.
144.–Agiram os arguidos também com a intenção de alcançar para si e para os demais, benefícios económicos que sabiam ser indevidos, causando o consequente prejuízo para o Estado.
145.–Os arguidos JMG  e JTG  e FMA  agiram, por si e em nome das sociedades que representaram com supra exposto, “AJ, S.A.”, “ALJ, Lda.”, “ARH, Lda.”, “AXXI, Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal” e pela “CSL – Sucursal em Portugal”.
146.–E no interesse da sociedade “AJ, S.A.”, bem como no seu próprio interesse.
147.–O arguido AJE  agiu ainda por si e em nome e no interesse da sociedade arguida “APSCF, Lda.”, actualmente denominada de “G., Lda.”.
148.–Todos actuaram de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
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149.–Os arguidos, pessoas singulares e colectivas, não têm condenações averbadas nos seus certificados de registo criminal.
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150.–Sobre as condições pessoais dos arguidos apurou-se que:
151.–O arguido JMG  terminou o curso de agente técnico de engenharia e arquitectura em 1982.
Frequentou outros cursos que, porém, não completou (ex. António Arroio).
Introduziu-se no sector de limpeza através da empresa “EG”, pertencente à sua mãe.
Em 1984 autonomizou-se e formou uma empresa, no mesmo ramo, chamada “CLT” e posteriormente constituiu a sociedade “AJ ”.
Actualmente detém ainda a empresa “G.” de catering, e a sociedade  imobiliária “Vila S.”.
Aufere um rendimento anual não inferior a 25.000€.
Tem casa própria.
Casou com a arguida MAG  em 1981 e desse casamento nasceram dois filhos, o arguido JTG  e uma irmã.
152.–A arguida MAG  tem o 9º ano de escolaridade.
Trabalhou na Direcção - Geral do Tesouro como administrativa.
Deixou de trabalhar no Estado em 1991 para se dedicar à educação dos filhos e ajudar o marido nas empresas.
Em 2009, quando integrou os corpos gerentes da “AJ ” passou a deslocar-se ao escritório e recebia uma remuneração de valor não apurado (variável).
153.–O arguido JF licenciou-se na Faculdade de Direito de Lisboa em 31.07.1995.
Estagiou na PLMJ e em 1998/1999 constituiu uma sociedade de advogados.
Em 1997 foi trabalhar para um escritório na R. da Trindade, onde se mantém.
É divorciado. Tem três filhos, o mais velho com dezassete anos de idade e o mais novo com nove anos de idade e exerce as obrigações parentais em regime de “guarda partilhada”.
Recebe, por ano, entre 50/70.000€ líquidos.
Tem casa própria, adquirida com empréstimo bancário, pagando por mês uma amortização no valor de 800€.
154.–O arguido AJE é oriundo da Covilhã de uma família com modestos recursos económicos que contudo permitiram assegurar as despesas elementares de todos os elementos do agregado.
Concluiu o 4º ano de escolaridade aos 11 anos de idade.
Já na idade adulta licenciou-se em biologia e posteriormente em contabilidade e administração, tendo ainda feito estudos pós-graduado na área da economia.
Depois de ter abandonado a escola iniciou actividade laboral tendo trabalhado como empregado de comércio cerca de cinco anos e depois como empregado de escritório até aos 20 anos, altura em que iniciou o SMO.
Cumpriu o serviço militar obrigatório durante 3 anos findo os quais começou a trabalhar como técnico oficial de contas para a empresa “RC”, trabalho que manteve durante 7 anos.
Posteriormente ingressou na RTP com as mesmas funções na qual se manteve até aos 54 anos de idade donde saiu com reforma antecipada.
Casou aos 27 anos de idade e deste casamento, que se mantém, teve dois filhos, com 35 e 37 anos de idade.
Vive em casa própria adquirida com empréstimo bancário por cuja amortização paga mensalmente 660€.
Recebe uma reforma no valor de 1900€.
A mulher recebe uma pensão no valor de 600€.
Ambos possuíam um escritório de contabilidade que tinha uma rentabilidade mensal correspondente a 2000€.
Na sequência deste processo encerrou o escritório e mantém actividade de contabilidade reduzida.
155.–O arguido FMA  provém de núcleo familiar enquadrado num estrato social mediano, sem registo de dificuldades económicas (pai era oficial da marinha de guerra e a mãe dedicava-se ao trabalho doméstico e à supervisão parental permanente do arguido e do seu irmão mais velho).
Interrompeu os estudos depois de ter concluído o ensino secundário aos dezanove anos de idade e começou com essa idade a trabalhar.
Aos 24 anos de idade constituiu-se como empresário em regime societário tendo criado a “ICEI” na qual exerceu o cargo de gerente durante cerca de seis anos.
Posteriormente desempenhou tarefas diversificadas ao nível da gestão empresarial, por conta própria, no sector têxtil e publicidade, e exerceu ainda funções de programador informático e de consultor imobiliário.
Casou aos 32 anos de idade.
Deste casamento, que terminou dezasseis anos depois, nasceu uma filha que tem actualmente 33 anos de idade.
Integrou uma equipa de futebol federado durante vários anos.
Aufere cerca de 1500€/mês.
Vive sozinho em habitação própria.
É portador de doença do foro renal e cardíaco tendo sido submetido a duas cirurgias.
156.–O arguido JTG  é oriundo de uma família com um enquadramento económico satisfatório (filho dos arguidos JMG  e MAG ).
Concluiu em 2004 a licenciatura de gestão de empresas na Universidade Moderna;
Depois de terminar o curso passou a exercer funções como gestor financeiro, em regime de exclusividade, na “AJ ”, para a qual já colaborava desde 2000, acumulando essas funções com os estudos.
À data dos factos desempenhava funções como gestor financeiro na “Aj”.
À data dos factos recebia, a título de remuneração, cerca de 800€ e vivia numa moradia dos pais.
Aufere 1600€ por mês.
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FACTOS NÃO PROVADOS

Da acusação/pronúncia e das contestações não foram considerados os factos irrelevantes para a decisão da causa, os factos conclusivos e redundantes bem como os factos contrários ou diversos dos acima descritos.

Dos factos relevantes o Tribunal não considerou provados os restantes factos, nomeadamente:

– Os arguidos (todos) se tivessem associado nos termos supra descritos, unindo os seus esforços no desenvolvimento de um plano que, congregando recursos, conhecimentos, contactos e demais competências de cada um, de forma estável, lhes proporcionasse vantagens patrimoniais indevidas à custa dos cofres do Estado;
– Todos os arguidos sabiam que os benefícios alcançados na concretização do plano traçado seriam, como foram, repartidos por todos, sendo certo que sabiam que faziam parte de uma estrutura organizada, nos termos supra descritos, em que as respectivas funções estavam interligadas, sem autonomia própria, todos assim contribuindo para a concretização do plano comum, cujo objectivo passava pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas à custa dos cofres do Estado, o que só seria alcançado com a contribuição de todos;
– Mais sabiam as funções que a cada um competia desempenhar para tanto em tal plano, tendo o arguido JMG consciência do seu papel de chefia;
– E sabendo e aceitando os demais que as suas próprias funções eram essenciais à concretização do plano, bem como sabiam que as outras funções, que conheciam, também o eram;
– O arguido JMG quis, e conseguiu, criar uma estrutura delineada como supra descrito, dirigida à prática de actos que sabia serem ilícitos e penalmente puníveis, para a qual conseguiu a adesão dos demais arguidos, sabendo que, uma vez nela inseridos, agiriam dentro da mesma para atingirem o fim proposto;
– Em data não apurada, necessariamente anterior a 2006, os arguidos MAG  e JF  tivessem delineado um plano em conjunto com o arguido JMG  para obter vantagens patrimoniais ilegítimas à custa do Estado, provocando a diminuição (…);
– O arguido FMA  fosse gerente de direito da sociedade “ALJ, Lda”
– O arguido JF  exercesse as funções de advogado do arguido AJE e que participasse nas tomadas de decisão das sociedades supramencionadas;
– A arguida MAG, administradora da “AJ, S.A.”, participava de todas as tomadas de decisão, celebração de contratos e demais actos da vida corrente daquela sociedade, assim participando activamente na implementação do esquema supra descrito.
– Os arguidos MAG  e JF  agiram em comunhão de esforços e de comum acordo com os restantes arguidos, utilizando na “AJ, S.A.” facturas emitidas pelas sociedades “ALJ, Lda.”, “ARH, Lda.”, “AXXI , Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal” e pela “CSL – Sucursal em Portugal”, as quais introduziram na contabilidade e nas declarações fiscais da “AJ, S.A.” para fazer crer que esta suportara os valores nelas constantes.
– Não obstante os arguidos MAG  e JF  saberem que as respectivas facturas não tinham correspondência a quaisquer transacções ou prestações de serviços efectivas.
– Deste modo, os arguidos integraram e contabilizaram as referidas facturas na escrita da Sociedade “AJ, S.A.”, inscrevendo-as quer nas declarações periódicas de IVA, quer nas declarações anuais de IRC, nos exercícios a que as mesmas se reportavam, como custos efectivos.

Da contestação do arguido AJE  não se provou que:
– A “AJ, SA” não tinha pessoal de limpeza a seu cargo em número suficiente para fazer face aos contratos que tinha em vigor;

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MOTIVAÇÃO DE FACTO


O Tribunal fundou a sua convicção com base no conjunto da prova produzida e examinada em audiência, depois de criticamente apreciada de acordo com as regras da experiência e da livre convicção (artº 127 do C.P.P.).
Destacam-se os seguintes elementos probatórios:
Declarações de arguidos
Prestaram declarações os arguidos JF  e AJE .
Os arguidos JMG  e MAG  prestaram declarações sobre as suas condições pessoais.

Prova testemunhal
(…)

Prova pericial
Relatório de exame pericial (fls. 576 a 578)
Relatório de análise pericial efectuada a equipamentos/dispositivos informáticos (fls. 676 e seg.);
Relatório pericial (administração tributária) (fls. 3841 e seg.);

Prova documental mais relevante

Relatos de diligência externa (RDE) (fls. 69, 368, 369, 381 a 392, 394 a 398, 698 e 699);
Documentos (fls. 72 a 88, 266, 267, 327 a 333, 441, 460, 1141 a 1144, 2411 a 2453, 3731 a 3743, 3744 a 3756, 3758 a 3763, 3786 a 3790, 3792 a 3795, 3840 a 3817, 3819 a 3823, 3866 a 3870).

Ofício do Banco de Portugal (fls. 102 a 114).
- Elementos Bancários fornecidos pelo Banco BES (fls.114 a 259, 418, 439, 2095 a 2134, 2484 a 2569, 2809 a 2821, 2984, 2985, 3617 a 3644 e Apenso 2C e 15B).
- Elementos Bancários fornecidos pela Caixa Geral de Depósitos (fls.408, 409, 420, 421, 425 e 2595 a 2599, 3012 a 3048, 3764 a 3779 e Apensos 12A, 3B, 13A, 17 e 2D).
- Elementos Bancários fornecidos pelo Banco Santander Totta (fls. 414, 423, 2005 a 2094, 2135 a 2194, 2209 a 2236, 2325 a 2396, 2711 a 2718, 2734 a 2801, 2842 a 2935, 2943, 3116 a 3118, 3609 a 3617 e Apensos 2A, 3A, 4A, 13B, 14 e 16).
- Elementos Bancários fornecidos pelo BPN (fls.414, 415, 2695 a 2706, do CD de fls.416 e Apensos 2B, 4B, 5, 6, 10, 11, 12B, 15ª).
- Elementos Bancários fornecidos pelo BBVA (fls.437, 2472 a 2474 e Apenso 4C).
- Elementos Bancários fornecidos pelo Banco Millennium BCP (fls.455, 595 a 653, 2601 a 2629, 3645 a 3654 e Apenso 18).

Documentos que constam dos 86 apensos;
- Elementos Bancários fornecidos pelo BPN (fls.274 e dos Apensos 7, 8 e 9).
- Autos de Busca e Apreensão e folhas de suporte (fls.471 a 477, 490 a 511, 521 a 523, 526 a 528, 555 a 558, 1430, 1431, 1436 e 1437, 1448 a 1453, 1459 a 1465, 1470 a 1473).
- Auto de Apreensão Cautelar (fls.512 e 513).
-Auto de Abertura e Verificação de Correio Electrónico e respectivos CD (fls.581, 582, 592 593, 594, 682, 688 e 689).
- Elementos Fornecidos pela Fidelidade Mundial (fls.720 a 475).
- Elementos Fornecidos pela Lusitânia (fls.747 a 930).
- Certidões Permanentes das Sociedades “AJ, S.A.”, “ARH , Lda.” (fls.1054 a 1076, 4354 a 4396)
- Certidão Permanente da “EII, Lda.” (fls.1149)
- Facturas, de fls.1077 a 1090;
- Recibos de Vencimento (fls.1260 a 1264, 1269, 1270, 1275 a 1281, 1286 a 1291).
- Extracto de Remunerações (fls.1296 a 1402).
- Auto de Abertura e Verificação de Correspondência (fls.1519 e 1520).
- Auto de Abertura e Verificação de Correspondência Electrónica e DVD (fls.1521 e 1522 e DVD’s agrafados à contracapa do V volume).
- Extracto bancário da conta da “AJ, S.A.” junto do Banco Santander Totta (fls.1645 a 1903).
- Elementos Bancários Fornecidos pelo Banco Montepio (fls.2478 a 2483, 3698 a 3702).
- Elementos Bancários Fornecidos pelo Banco BIC (fls.2571 a 2589, 3131 a 3501).
- Elementos Bancários Fornecidos pelo Banif (fls.2590, 2591, 3703, 3704).
- Elementos Bancários Fornecidos pelo Barclays (fls.2592 a 2594, 3607 e 3608).
- Factura emitida pela “ÁM, Lda.” e elementos contabilísticos (fls.2632 a 2691).
- Elementos Bancários Fornecidos pelo BPI, de fls.2825 a 2841, 2986 a 3007, 3800 a 3809).
- Elementos Fornecidos pela Agência de Viagens Abreu (fls.2958 a 2961).
- Cópia de facturas (fls.2966 a 2968).
- Elementos Bancários Fornecidos pela Caixa de Crédito Agrícola (fls.3860 a 3864).
- Assentos de Nascimento de MAC e de JTG  ( fls.4292 e 4293).
- Certidões Permanentes das sociedades “Vila S,, S.A.”, “G. , Lda.”, “ALJ , Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal”, “CSL – Sucursal em Portugal”, “ACVA Ldª.” (fls.4354 a 4386 )
- Print referente ao histórico de proprietários do veículo de matrícula 15....
- Documentos constantes dos 86 Apensos, designadamente:
- Apenso 60, Pasta 1/5; 2/5; 3/5; 4/5; 5/5 ;  Apenso 20, Pasta 7/7
- Facturas e “projectos de facturas”, constantes do Apenso 18, fls. 179, 182, 183, 186, 187, 319, 325; Apenso 24, fls. 101, 102, 212, 309; Apenso 25, fls. 77, 157, 158, 204, 205; Apenso 27, fls.204, Apenso 29, fls.120, 121, 215, 216, 285, 286; Apenso 60, Pasta 1/5 ; 2/5, 3/5, 4/5, 5/5.
Certificados de registo criminal dos arguidos (fls. 4262 e seg).
Relatórios sociais dos arguidos (fls. 4958, 4971);

Documentos juntos no decurso da audiência de julgamento (mais relevantes)
- requerimento apresentado pela “AJ” sobre suspensão do processo por estar pendente no Tribunal Tributário de Lisboa processo de impugnação da liquidação de IRC e IVA;
- critérios de apuramento da vantagem patrimonial e custos aceites e não aceites em IRC e IVA indevidamente deduzido (fls. 5202/5203);
- cartas do arguido AJE , dirigidas às sociedades “ARH, Lda.”, “AXXI ”, “AI”, “Aj, Lda.”, “AHL”, “CSL ” sobre a não entrega de documentos contabilísticos e advertindo para eventuais renúncias ou renunciando ( fls. 5216 e seg.);
- carta de renúncia , datada de 2.04.2012, e remetida à sociedade “CSL ” (fls. 5244).
- IES da “CSL, junto pelo arguido JTG , correspondente ao período compreendido entre 1.01.2013 e 31.12.2013, apresentado em 9.08.2016 (fls. 5251);
- IRC (modelo 22 da “CSL ” período compreendido entre 2.01.2012 e 31.12.2012, apresentado em 12.02.2014 (fls. 5310);
- IRC (modelo 22) da “CSL ” período entre 2.01.2013 e 31.12.2013 (fls. 5315);
- sentenças e acordos (fls. 5336 a 5458);
- notificação da AT a JF  sobre liquidação de IRS relativo a 2012
- notificações da “CSL ” em recursos de contra-ordenação (fls. 5594 a 5610 e seg.);
- sentença de trabalhador contra “CSL , Limited”;  
- acção posta pela “AJ ” contra a sociedade “AI” por alegadamente lhe dever 884.618,36€ na sequência de um contrato de prestação de serviços celebrado com a Ré de prestação de serviços de administração de pessoal técnico de limpeza que a ré não cumpriu. A Ré não contestou. A A., por sua vez, notificada, inúmeras vezes, para juntar documento comprovativo do contrato e facturas não juntou. Ré absolvida. 6ª Vara de Lisboa (sentença de 19.04.2011) (fls. 5769);
- Sentença do T. Administrativo e Fiscal de Sintra no âmbito do recurso de contra-ordenação apresentado pela “CSL ” (coima de aplicada à “CSL ” pelo Chefe de Finanças de Oeiras por não pagamento de IVA no valor de 39.716,77 € (fls. 5610 e ss) ;
Processos pendentes no Tribunal de Trabalho de Faro - de 2010 - por abuso de confiança contra a segurança social. Demandante Instituto da segurança social.
Sentença contra a “AXXI, Lda.” – acção intentada por trabalhadora de limpeza contra a “AJ” e a  “AXXI, Lda.” por créditos laborais de 2008 ( fls. 5762).
Processo de contra-ordenação contra “AXXI, Lda.”- fls. 5778/5779
Contrato de promessa de cessão de quotas entre AA e FMA  de 3.02.3007 (fls. 5784)
Documentos apresentados pelo arguido AJE - fls. 5788
Falta de entrega de IVA – notificação de 8.01.2018
Liquidação oficiosa de IRC – fls. 5836
Contrato de prestação de serviços entre “AJ ” e “Aj” – fls. 5840

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Exame crítico da prova

Por facilidade de exposição e, espera-se, maior clareza da fundamentação da matéria de facto, começaremos por analisar a prova relacionada com o crime de fraude fiscal, a responsabilidade dos arguidos por esse crime e, por fim, o crime de associação criminosa.
Escusado será dizer que a existência das sociedades, o seu objecto e constituição e participação dos vários arguidos nessas sociedades nos termos dados como provados, não só não foi contestada como resulta das certidões das respectivas Conservatórias.

I- Fraude fiscal
Tese da acusação  
Sustentava-se na acusação/pronúncia que os arguidos tinham constituído sociedades fictícias, entre 2006 e 2012, uma por cada um dos exercícios, que utilizaram como falsos fornecedores da “AJ ” – hipoteticamente “forneciam” trabalhadores de limpeza à “AJ ” - permitindo a esta sociedade deduzir indevidamente IVA e reduzir o valor do lucro tributável e do IRC a pagar ao Estado.
Em todos os anos a “AJ” tinha registado, na sua contabilidade, um fornecedor diferente, que lhe facturava valores elevados relativos à “cedência/administração de pessoal”, que oscilava entre os 80 e 95% da facturação da “Ambiente e Jardim” aos seus clientes.
Em resultado deste esquema, o Estado não recebia o IVA que as sociedades fornecedoras deviam entregar, caso se tratasse de um verdadeiro outsourcing.
Corroborando esta tese, os inspectores tributários, em julgamento, explicaram que o sector de actividade de prestação de serviços de limpeza se caracterizava por elevado recurso a mão-de-obra, os gastos com pessoal constituíam a maior parte dos custos das sociedades, e que o valor do IVA a entregar ao Estado, por parte das empresas deste ramo, era, regra geral, elevado.
Isto porque, apesar de liquidarem IVA nas prestações de serviços que efectuavam, apenas podiam deduzir IVA referente à aquisição de materiais e/ou equipamentos necessários para o desenvolvimento da sua actividade e não podiam deduzir os custos com os trabalhadores próprios.
Já no regime de “outsourcing” o IVA dedutível aumentava consideravelmente porque a empresa que subcontratava pagava o IVA ao que lhe prestava o serviço (ao fornecedor), e a seguir podia deduzir esse valor.
Nesse caso o imposto - ex. o IVA dedutível - e restantes contribuições sociais deviam ser assumidos e pagos pelos fornecedores.
No caso em apreço, verificaram, ao cruzarem informações com base nos anexos O (clientes) e P (fornecedores), que as empresas que supostamente forneciam mão-de-obra à “AJ” eram não declarantes fiscais e consequentemente não entregavam IVA ao Estado, não obstante a “AJ” o deduzir.
Fizeram circularização de clientes e cruzamento de informações e concluíram que a “AJ” era uma empresa cumpridora mas as suas principais fornecedoras, uma diferente por ano, eram sempre não declarantes (à administração tributária e à segurança social).
Acrescentaram que o serviço de limpeza foi prestado mas não o foi no âmbito daquela relação subjacente. 

Refutou a defesa esta tese argumentando que:

As sociedades não eram fictícias. Geriam trabalhadores e cediam-nos à “AJ” em regime de “outsourcing”, os trabalhadores dessas empresas eram subcontratados pela “AJ” para prestação de serviços de limpeza nos locais pertencentes às entidades públicas que lhe adjudicavam esses serviços.
As empresas subcontratadas pela “AJ” dispunham dos seus próprios trabalhadores e cediam-nos, seleccionavam-nos e geriam-nos libertando a empresa adjudicatária dessa responsabilidade. 
_____ 

Acontece que a prova produzida em julgamento e a vasta prova documental existente no processo desmente, de forma categórica, a tese da defesa e confirma, nesta parte, a acusação/pronúncia.

O que, na realidade, se apurou
a)- Sobre as empresas prestadoras de serviços (questões mais relevantes)
Sobre a “ARH, Lda.”, “AXXI, Lda”, “AI, SA”, “Aj, Lda.”; “AHL” e “CSL ” apurou-se, desde logo, que estas sociedades tinham o mesmo objecto e o mesmo gerente de direito, representante ou procurador – arguido FMA  –, não tinham património, não apresentavam declarações à autoridade tributária – a não apresentação de declarações fiscais e do anexo O da IES (Informação Empresarial Simplificada), anexo destinado à identificação dos clientes e dos valores das vendas superiores a 25.000€, e a apresentação, pela “AJ, SA”, do correspondente anexo P, que identificava os fornecedores e os valores anuais de compras superiores a 25.000€, esteve aliás na origem destes autos – e, entre Janeiro de 2006 e Março de 2012, sucederam-se anualmente - as certidões das Conservatórias constantes de fls. 4357 a 4386, as declarações de início de actividade, os contratos de seguro com uma única apólice titulada anualmente pelas várias sociedades, conforme doc. de fls. 720 a 729  e depoimento do mediador da companhia de seguros, põem em evidência esta sucessão anual das empresas - , cada uma tomando o lugar da anterior, enquanto principais fornecedoras da “AJ”.
Sobre os seguros resulta designadamente da informação da “Companhia de Seguros Fidelidade – fls. 1538 – que a primeira apólice teve início em 1.03.2005 e foi subscrita por “ALJ, Lda., em 1.06.2007 passou a ser titulada pela “ARH ”, em 27.03.2008 pela “AXXI, Lda.”, em 1.01.2009 por “AI,” - esta apólice foi anulada em 31.01.2010 - a “ Aj” subscreveu a segunda apólice que vigorou entre 1.02.2010 a 1.12.2010. De acordo com informação da Companhia de Seguros Lusitânia - fls. 1405 a 1407 – a da” AHL”, subscreveu um contrato de seguro em 1.02.2011, este seguro foi anulado por falta de pagamento em 31.12.2011 e a mesma apólice em 5.03.2012 passou a ser titulada pela “CSL ”.
Como resulta do relatório da autoridade tributária, corroborado pelos dois técnicos tributários, da prova documental junta aos autos e das declarações do arguido AJE , a “AJ ”, por ano, tinha registado na sua contabilidade um fornecedor, ou principal fornecedor, diferente – as empresas supramencionadas pela ordem aí indicada - que supostamente lhe facturava valores relativos a cedência de pessoal – tinha por base um hipotético contrato de prestação de serviços de cedência ou administração de pessoal - que variavam entre os 80% e 90% da facturação aos seus clientes.
Por sua vez, resulta de toda a prova produzida, e não apenas das certidões permanentes, que as sociedades se “substituíam” umas às outras. Quando uma nova sociedade se constituía a anterior deixava de ser a principal fornecedora da “AJ ”.
Como referiram os inspectores tributários, cada ano aparecia uma empresa diferente, como principal fornecedora da “AJ ”, e a anterior não deixava de existir mas, na maior parte dos casos, acabou por ser cessada oficiosamente pela autoridade tributária por falta de actividade (depoimento da Inspectora IS).
Referiram ainda que não localizaram a totalidade das facturas. Só encontraram facturas emitidas em nome das sociedades “Aj”, “AXXI ” e “AI” (exercícios de 2007 a 2009).
Nos restantes anos apenas foram encontrados “documentos manuscritos que continham todos os elementos das facturas” - expressão que adoptámos, na matéria de facto, em substituição de “projectos de factura”, por nos parecer menos conclusiva – e que constituíam basicamente documentos de suporte dos respectivos lançamentos contabilísticos em nome de cada uma das fornecedoras (ex. Apenso 60, pasta 1/5).
As datas de constituição, ou de registo em Portugal, de cada uma das sociedades, conjugadas com a análise da contabilidade da “AJ ” e da facturação emitida pelos seus principais fornecedores, puserem em evidência a sucessão de empresas no tempo, e os propósitos que estavam subjacentes à criação dessas empresas. Vejamos.
A sociedade “ALJ, Lda.” foi constituída em 3.11.2003 e em 2006 estavam registadas, na contabilidade da “AJ”, facturas emitidas em nome daquela sociedade entre Janeiro e Dezembro de 2006 (pontos 32 a 43 da matéria de facto).  
A sociedade “ARH , Lda.” foi constituída em 19.03.2007 e em 2007 estavam registadas, na contabilidade da “AJ”, facturas emitidas em nome daquela sociedade entre Janeiro e Dezembro de 2007 (pontos 44 a 54 da matéria de facto).  
Em 2008 – entre Janeiro e Dezembro – passaram a estar registadas, na contabilidade da “AJ”, facturas em nome da sociedade “AXXI, Lda”, constituída em 24.01.2008 (pontos 55 a 67 da matéria de facto).
Em 2009 – entre Janeiro e Dezembro - passaram a estar registadas, na contabilidade da “AJ”, facturas em nome da sociedade “AI, SA”, constituída em 21.01.2009 (pontos 68 a 78 da matéria de facto).
Em 2010 – entre Janeiro e Dezembro - passaram a estar registadas, na contabilidade da “AJ”, facturas em nome da sociedade “Aj, Lda.”, constituída em 9.12.2009 (pontos 79 a 89 da matéria de facto).
Em 2011 – entre Janeiro e Dezembro - passaram a estar registadas, na contabilidade da “AJ”, facturas em nome da sociedade “AHL – Sucursal em Portugal”, registada em Portugal em 30.12.2010 (pontos 90 a 96 da matéria de facto).
Por fim, em 2012 – entre Janeiro e Março - passaram a estar registadas, na contabilidade da “AJ ”, facturas em nome da sociedade “CSL” registada em Portugal em 2.01.2012 (pontos 97 a 103 da matéria de facto).
Como se refere no relatório da Administração Tributária, e como foi corroborado pelos inspectores tributários e pelo arguido AJE , os clientes da “AJ” eram predominantemente o Estado e empresas públicas.
De acordo com documento apresentado pelo arguido AJE  na sua contestação - doc. 3 - entre Janeiro de 2009 e Maio de 2012 , a “AJ, SA” celebrou noventa contratos públicos, a que correspondeu uma receita bruta de 4.815.316,61€.
Consta, por sua vez, do relatório da A.T. que, entre 2007 e 2011, figuram como principais clientes da “AJ” a Câmara Municipal de Loures, a Casa Pia de Lisboa, os Centros Regionais de Segurança Social, a GNR, Universidade do Algarve, SMAS de Sintra, ISEG, Instituto da Droga e Toxicodependência, Município de Faro, Instituto Politécnico de Leiria.
Já vimos que nenhuma das sociedades acima mencionadas apresentou declarações fiscais – as dívidas à segurança social constam de processo próprio - facto que esteve aliás na origem do presente processo, pelo que não podiam legalmente ser subcontratadas pela “Aj”.
A “AJ” para poder ser candidata, no âmbito de um procedimento destinado à celebração de um contrato público, tinha de ter a sua situação regularizada relativamente a contribuições para a segurança social em Portugal e a impostos.
Resulta do artº 55 do código dos contratos públicos, aprovado pelo DL 18/2008, de 29 de Janeiro - este preceito legal fixa os impedimentos dos candidatos à contratação pública -, que não podem ser candidatos, concorrentes ou integrar qualquer agrupamento, designadamente as entidades que não tenham a sua situação regularizada relativamente a impostos devidos em Portugal ou, se for o caso, no Estado de que sejam nacionais ou no qual se situe o seu estabelecimento principal (al. e).
Por outro lado, o artº 81 do mesmo diploma legal prevê que, nos procedimentos de formação de quaisquer contratos, o adjudicatário apresente documentos comprovativos de que não se encontra abrangido pelos impedimentos fixados na al. e) do artº 55.
Por último, quanto às condições em que pode ser efectuada a subcontratação, de acordo com o disposto no artº 317, nº 1, al. b) do mencionado diploma - estabelece os limites à subcontratação pelo co-contratante – aplicam-se à subcontratação os impedimentos previstos no artº 55, o que significa que o subcontratante, tal como o candidato, tem de ter a sua situação fiscal regularizada, o que manifestamente não sucedeu com as supostas fornecedoras da “AJ ”.
Na verdade, ficou claro que essas sociedades, ao abrigo do Código dos Contratos Públicos - DL nº 18/2008 de 29 de Janeiro - não preenchiam os requisitos necessários para serem subcontratadas pela “AJ” e que esta estava legalmente impedida de as subcontratar e de lhes ceder a sua posição.
E, de facto, não foram.
Outros elementos probatórios demonstram que estas sociedades eram totalmente dependentes da “AJ” – careciam de autonomia técnica e financeira –, facto que foi parcialmente admitido pelo arguido JF , não possuíam estrutura empresarial compatível com o volume de facturação apresentado, não podiam, por isso ter prestado serviços ou cedido pessoal à “AJ”.
Acresce que essas sociedades, embora fossem, ano a ano, os maiores “fornecedores” da “AJ”, cerca de 80 a 90% do valor da facturação de clientes desta última, não recebiam o valor correspondente à facturação que emitiam.
Com efeito, eram emitidas facturas em seu nome, sem os correspondentes pagamentos como resulta da prova documental em particular dos extractos bancários das sociedades e da “AJ”.
Disse o inspector RC, acompanhando de perto o relatório pericial, que analisaram as contas bancárias das sociedades e só encontraram dois a três registos.
Em geral, nos extractos das contas bancárias das sociedades não constavam os valores “facturados” e as contas bancárias não reflectiam os pagamentos que a “AJ” dizia que fazia.
Por outro lado, após análise aos extractos de contas da “Ambiente e Jardim”, de 2006 a 2011, concluíram que os valores constantes a débito, a título de pagamento de facturas às “sociedades instrumentais”, na realidade, não tinham sido efectuados (exemplificações a fls. 35 a 61 do relatório).
A título de exemplo, referiu dois manuscritos intitulados “recibo” de 2006, passados pela “AR,H Lda”, no valor de 350.000€, cada, um reportado a 31.07.2006 e outro 31.10.2006. Desses documentos resultava que a “ARJ,Lda”, teria recebido da “AJ” esse valor.
Porém esta movimentação contabilística, registada como pagamentos à “ARH , Lda.”, não constava nos extractos das contas bancárias da sociedade, ou seja a “ARH , Lda.” efectivamente não tinha recebido esse valor (anexo 60, pasta 1.5, fls. 171).
E sucedem-se, no relatório, muitos outros exemplos de teor idêntico.
As diligências externas efectuadas pelos inspectores da autoridade tributária.
Dessas diligências, conforme relatado pelos inspectores nos respectivos “relatos de diligência externa” e no julgamento, resultou que as sedes ou não existiam, ou as moradas indicadas funcionavam apenas como posto de recebimento de correspondência. Ex. RDE de fls. 3592 de dia 15.01.2014, na Cruz de Pau, na morada indicada como sede da “AHL.”, no qual consta que o arguido FMA  tinha arrendado aquele espaço pequeno e com reduzido movimento.
Num outro relato de diligência, numa morada em Linda-a-Velha, indicada como sede da “CSL” diz-se que o arguido FMA  se desloca ocasionalmente àquela morada (fls. 3593).
Temos ainda a indicada sede da “ARH ”, na Av. … em Lisboa, onde estava sedeada a sociedade “ICEI”, e que de acordo com o seu gerente, a testemunha AA, teria sido abusivamente indicada como sede da primeira sociedade.
Esta questão gerou alguma controvérsia em julgamento tendo o arguido JF  apresentado um documento intitulado “contrato-promessa de cessão de quotas”, celebrado entre o gerente da “ICEI” e FMA , mediante o qual o primeiro prometia ceder ao segundo a quota da sociedade, o que teria levado o arguido FMA  a sentir-se legitimado para indicar aquele sede. No seguimento da apresentação deste contrato – o arguido JF  justificou a apresentação tardia do documento com o facto de o seu escritório ter sido alvo de uma busca e apreensão de documentos e de ter localizado o contrato no arquivo morto do escritório - a testemunha Acácio de Almeida foi reinquirida e admitiu que pensou vender a “ICEI” comunicou ao arguido JF  esse propósito confiando-lhe a chave do escritório e que houve diligências no sentido da cedência e confrontado com o contrato promessa admitiu que o podia ter assinado
A prova foi inconclusiva mas certo é que a “ARH ” nunca teve sede nessa morada e que apenas foi para aí remetida correspondência que o gerente da “ICEI ”entregou ao arguido JF.

As buscas efectuadas à sede da “AJ” demonstraram que toda a “gestão administrativa” dessas sociedades estava concentrada na sede desta sociedade, assunto que desenvolveremos mais adiante quando nos debruçarmos sobre a questão dos trabalhadores.

A EDP informou que as empresas não eram titulares de contratos (fls. 82).

a)- Sobre os trabalhadores alegadamente pertencentes a essas empresas e subcontratados pela “AJ ”

Face ao que se concluiu sobre a natureza e características destas empresas parece evidente que os contratos de cedência de pessoal não podiam ser verdadeiros e que os trabalhadores que prestaram serviços de limpeza, alegadamente no âmbito de contratos de cedência de pessoas celebrados entre a “AJ” e essas sociedades, nunca deixaram de ser trabalhadores da “Aj”.
Claro está que, se as empresas não desenvolviam qualquer actividade, não podiam dispor de trabalhadores e os contratos de cedência de pessoal ou de “administração de pessoal” não eram verdadeiros, ou, pura e simplesmente, não existiam.
Tanto assim é que esses intitulados contratos de cessão de pessoal não foram encontrados pelos inspectores tributários durante as buscas e o inquérito – as declarações do arguido AJE sobre esses contratos serão analisadas mais à frente – e como resulta da maioria das sentenças juntas aos autos pela defesa dos arguidos não foram apresentados pela “AJ” e /ou pelas sociedades que intervieram como “demandadas” ou “chamadas” nos processos que correram termos nos tribunais de trabalho e nalguns tribunais cíveis, razão pela qual a maioria das sentenças proferidas no âmbito desses processos deu como não provado designadamente que a “AJ ” “tivesse subcontratado na R. “CSL” a contratação da trabalhadora e que tivesse ficado provada a realização da contratação de outsourcing”. 
A reforçar esta conclusão temos muitos outros elementos probatórios que não nos deixam dúvidas sobre a inquestionável ligação dos trabalhadores à “AJ ” e à sua estrutura de gestão.

Destacam-se:

I.– Em primeiro lugar a regulamentação colectiva de trabalho para o sector – ex. cláusula 17 do CCT - questão que em julgamento foi desenvolvida pela Inspectora Tributária IS, que se mostra analisada, pela mesma inspectora tributária, no relatório da autoridade tributária e é mencionada na motivação de direito das várias sentenças juntas aos autos (ex. sentença que consta do apenso 65, pasta 4 e outras que foram juntas aos autos designadamente pela defesa do arguido FMA ).
Resulta dessa regulamentação de trabalho que os trabalhadores que normalmente prestam serviço num determinado local são transferidos, automática e obrigatoriamente, para a entidade patronal que tiver celebrado o novo contrato de prestação de serviços para aquele mesmo local.
De acordo com a cláusula 17 do CCT a perda de um local de trabalho por parte da entidade patronal não integra o conceito de caducidade nem justa causa de despedimento; em caso de perda de um local de trabalho, a entidade patronal que tiver obtido a nova empreitada obriga-se a ficar com todos os trabalhadores que ali normalmente prestavam serviço; o trabalhador mantém ao serviço da nova empresa todos os seus direitos, regalias e antiguidade, transmitindo-se para a nova empresa as obrigações que impendiam sobre a anterior directamente decorrentes da prestação de trabalho tal como se não tivesse havido qualquer mudança de entidade patronal, salvo créditos que nos termos deste CCT e das leis em geral já deveriam ter sido pagos.
Daqui decorre que, se a “AJ” se candidatava e ganhava um concurso público para a prestação de serviços de limpeza num determinado local, os trabalhadores que prestavam serviço, nesse local, eram transferidos, imediata e obrigatoriamente, para a empresa vencedora.
Em novo concurso, se a “AJ” perdia e deixava de prestar os serviços de limpeza, esses mesmos trabalhadores, caso ainda estivessem a trabalhar por conta da “AJ”, e outros que tivessem sido contratados nesse espaço de tempo, eram transferidos para a nova empresa vencedora.
Este “circuito” de trabalhadores foi aliás verificado pelos inspectores tributários no decurso do inquérito e está evidenciado na correspondência trocada entre a “AJ” e as empresas vencidas, ou vencedoras (ex. fax de fls. 3736 da “AJ” para a Escola Superior de Educação de Leiria, ofícios de fls. 3738 a 3742 da “Limpôpo” para a “AJ ”, de fls. 3813 a 3815, e de fls. 3819 a 3822 da “AJ” para a “Servilimpe” e desta para a “AJ”).
Retira-se destes faxes e ofícios que os trabalhadores aí indicados passaram de uma empresa para outra não tendo havido, de facto, qualquer cedência de pessoal a outras empresas nem tendo estas prestado serviços em regime de “outsourcing”.
Como se refere designadamente em sentença de 3.10.2016:
“(…) ao abrigo da cláusula 17 do CCT a trabalhadora foi continuamente transferida pelas sucessivas empresas de limpeza adjudicatárias dos serviços de limpeza até transitar para a “AJ” até Dezembro de 2013.
Aquela cláusula visa, no essencial, proteger a prestação de trabalho num dado espaço físico e, em última instância, o próprio emprego, sabendo-se que, à partida, os trabalhadores organizam a sua vida pessoal e social (v.g. escolha de casa, de escola para os filhos, de clubes recreativos) à volta daquele espaço. Por outro lado e parafraseando o Acórdão do Tribunal da Relação de Porto de 22.09.2014 “esta cláusula visa proporcionar (…) às empresas de limpeza a sua viabilidade económica. Na verdade, tendo as empreitadas de serviços de limpeza, por regra, a duração de um ano, se a duração dos contratos de trabalho tivesse a mesma cadência, estaria ameaçada a segurança no emprego.
Por outro lado, se a desvinculação dos contratos de trabalho coincidisse com a cessação das empreitadas, as empresas de prestação de serviços poderiam concorrer, entre si, de forma desleal, pois poderiam conseguir trabalhadores novos que se deixassem contratar por retribuição inferior à praticada na última empreitada, levando a empresa que perdesse a empreitada a ficar com os trabalhadores, mas sem local de trabalho de limpeza para os ocupar e com a obrigação de lhes pagar retribuição superior à que ora se teria passado a processar pela sua sucessora”
De realçar que, quanto à sociedade “CSL ” e à “AJ”, diz-se na sentença em apreço que:
“A Ré “AJ” como lhe competia não provou que um dos locais que “cedeu” à chamada – a “CSL ” -, por força do mencionado contrato de 1.10.2012 tenha sido a estação da REFER, no Porto. Por outro lado não se provou que a REFER tivesse, no período em apreço, ou em qualquer outro, adjudicado à chamada - “CSL ” - a efectivação dos serviços de limpeza naquela estação. A única responsável pela liquidação dos valores reclamados pela Ré é a “Ambiente e Jardim, S.A.”
Mais à frente analisaremos outras sentenças de teor idêntico juntas designadamente pela defesa dos arguidos FMA  e “CSL”, através das quais as arguidas pretendiam demonstrar que as sociedades não só tinham actividade como assumiam as responsabilidades pelo pagamento de remunerações ou outras prestações em divida, a trabalhadores que intentavam acções nos tribunais de trabalho.
Como veremos essas sentenças além de, em geral, se reportarem a factos posteriores a Março de 2012 - data das últimas facturas registadas na contabilidade da “AJ” – e analisarem litígios que envolviam sobretudo a “CSL”, estão longe de corroborar a tese da defesa e, face às considerações aí expendidas em torno da questão de saber se a “AJ” efectivamente celebrou contratos de cedência de pessoal com as sociedades aqui em causa, em momento algum são conclusivas.

II.–As trabalhadores, ouvidas audiência de julgamento, corroboraram e reforçaram aquilo que resultava das buscas aos escritórios da “AJ” e que indiciava fortemente que a administração do pessoal, supostamente efectuada pelas sociedades fornecedoras, era feita pela “AJ”.
Com efeito, todos as trabalhadores disseram que trabalhavam para a “AJ”, - muitos destes trabalhadores encontravam-se na situação já descrita, tendo anteriormente trabalhado para empresas que tinham perdido os concursos -, vestiam batas da “AJ”, os carros e os materiais eram da empresa, as supervisoras eram da “AJ” e, regra geral, não conheciam o arguido FMA , mas, ao invés, conheciam, ou tinham ouvido falar, do arguido JMG  (ex. depoimentos das testemunhas …).
Confrontadas com recibos emitidos por outras empresas – ex. “CSL” – admitiram que descobriram essa situação mais tarde quando se inscreveram no sindicato e tiveram de mostrar o recibo do vencimento. Nalguns casos foram informadas pelo Sindicato que os recibos estavam passados por entidade distinta. Até aí não se tinham apercebido, “nunca as tinham informado de que passavam a trabalhar para outra empresa diferente da que tinha ganho o concurso”.
A Inspectora IS deu o exemplo da trabalhadora RBR, que trabalhava na sociedade “FC, Lda.” e quando esta perdeu o concurso foi transferida para a “AJ”, onde trabalhou durante seis anos, nessa altura os recibos de remuneração passaram a ser emitidos em nome de outras empresas – a trabalhadora RBR confirmou em julgamento que se apercebeu que os recibos eram emitidos em nome de outras empresas e questionou o encarregado – quando a “AJ ” perdeu o concurso a trabalhadora RBR  foi transferida para a empresa vencedora mas como trabalhadora da “AJ”.
O processamento dos salários dos trabalhadores era feito na “AJ ”.
Como referiram os inspectores tributários e resulta da análise conjugada dos apensos 35 a 38 e 40, doc. 37, 38, 39, 40 e 42, o processamento de salários de todos os trabalhadores entre 2006 e 2012 era efectuado no computador do posto de trabalho de VC, os recibos gerados pelo programa correspondiam, em valor, aos recibos assinados pelos trabalhadores e que se encontravam arquivados no escritório da “AJ”, em Sacavém, por número/nome de funcionário e por ano (sequencial) (relatório da autoridade tributária e depoimento dos Inspectores RC e IS).
Em julgamento a testemunha VC confirmou que fazia o processamento dos salários para a “AJ” e que a partir de certa altura passou a processar os salários para as outras empresas recebendo ordens do arguido JMG , depois de o seu chefe directo, A., ter falecido, em 2011. Ninguém lhe explicou porque é que fazia o processamento dos salários dos trabalhadores dessas empresas, mas não tinha dúvidas que o A. lhe disse que o arguido FMA  era o gerente dessas sociedades. 
Os documentos de suporte dos lançamentos da maior parte dos pagamentos dos vencimentos - notas de crédito que serviam de suporte contabilístico aos pagamentos dos salários dos trabalhadores - supostamente emitidos pelas sociedades “fornecedoras” referem “Valor que V. Ex. pagaram de n/conta e ordem a funcionários de n/empresa ao v/ serviço conforme relação de pagamento e cópia de cheques em anexo (ex. doze  notas de crédito relativas a 2006 que constam de  fls. 151, 156, 159, 162, 165, 168, 172, 175, 178, 179, 186, 191 do apenso 60, pasta 1/5; catorze notas de crédito, relativas a 2007, que constam do apenso 60, pasta 7/7; quinze notas de crédito, relativas a 2008, que constam do apenso 60, pasta 2/5; dezanove notas de crédito, relativas a 2009, que constam do apenso 60, pasta 3/5; doze notas de crédito, relativas a 2010, que constam do apenso 60, pasta 4/5; três notas de crédito, relativas a 2011, que constam do apenso 30, fls. 317 ).
Neste particular, concluiu a Inspectora IS que perante estes elementos a “AJ” não podia ter feito um contrato de administração de pessoal com cada uma das sociedades porque o controlo dos horários, a supervisão, o pagamento dos salários, a verificação dos materiais era feito pela própria “AJ” e também não foi detectado qualquer acto de administração dessas sociedades.

Perante prova tão irrefutável a defesa dos arguidos sustentou nomeadamente que:
- a “AJ” era uma das partes nos contratos de prestação de serviços, nessa qualidade estava sujeita a regimes sancionatórios pesados e não se podia alhear da actividade exercida pelas empresas razão pela qual  “adiantava” os pagamentos aos trabalhadores para garantir que eram pagos, “reduzindo os riscos” acautelando faltas ao trabalho por não pagamento de remunerações.
- não era exigível que os trabalhadores conhecessem o arguido FMA,
- os trabalhadores usavam as batas da “AJ” por questões de publicidade e “mau seria se trajassem batas de outras empresas que não tivessem contrato com a entidade administrativa”.
- é um fardo significativo gerir o pessoal. Se outras empresas se encarregam disso porque não há-de a “AJ” deixar esse trabalho para terceiros.
Perante estes argumentos colocam-se, desde logo, sérias dúvidas sobre a racionalidade económica de uma cedência ou administração de pessoal com estes contornos, quando, na verdade, a gestão e a administração do pessoal estava comprovadamente a cargo da “AJ” ou por manifesta falta de confiança nas empresas que cediam a mão-de-obra, ou por questões de publicidade da “AJ”.
A falta de racionalidade económica desta cedência torna-se ainda mais notória se pensarmos que a “AJ” pagava às fornecedoras o valor médio de 90% da facturação ao cliente, por um serviço que, ao fim e ao cabo, era realizado por si nos seus escritórios.

III.–Resta referir que a documentação, constituída na sua maioria por sentenças dos tribunais de trabalho, apresentada pelos arguidos no decurso do julgamento não contrariou nem informou esta realidade.
Das sentenças juntas pela defesa retira-se que na maioria dos casos as acções foram intentadas contra as sociedades “AJ” e “CSL ”, e contra esta última porque, como se refere nas sentenças, os recibos das remunerações estavam em nome desta sociedade – corrobora inteiramente a prova produzida  nestes autos acima analisada - e o tribunal, em todas elas, deu como não provado que a “AJ” tivesse subcontratado na R. “CSL” a contratação da trabalhadora e que tivesse ficado provada a realização da contratação de outsourcing entre as duas RR por não terem juntado qualquer documentação comprovativa dessa contratação. As duas sociedades são condenadas solidariamente por aplicação do artº 101/1/2/5 do Código de Trabalho (situação irregular de pluralidade de empregadores) (ex. fls. 5371, 5382, 5434, 5458).
Note-se que também outras sociedades, para além da “CSL”, foram demandadas em acções de reclamação de créditos laborais – ex. “AXXI ”,  - e em todas as sentenças se refere que as autoras intentaram as acções contra essas sociedades porque figuram como suas empregadoras nos recibos de remunerações ou nos extractos da segurança social (ex. fls. 5762) .
O TRL em acórdão de 15.12.2016 – fls. 5409 – refere que “(…) De facto apenas se provou que a partir de Janeiro de 2012 a “CSL ” passou a processar os vencimentos figurando neles como empregadora (…)
Ora, tendo em conta o mais que ficou provado é manifesto que não se pode concluir que a A. deixou de ser trabalhadora da “AJ” para passar a ser trabalhadora da “CSL” antes da transmissão da empreitada. Também não ficou apurado o integral conteúdo do contrato celebrado entre a R. “Aj” e a “CSL”. Os serviços de limpeza passaram a ser feitos com pessoal próprio da CSL? Ou com pessoal da AJ  cedido à CSL? Ou de outra forma qualquer. Não se sabe (…)”.
Num outra sentença da Instância Central, secção de Trabalho de Setúbal – fls. 5371 – depois de se dar como não provado que a “Ambiente e Jardim” tivesse subcontratado na R. “CSL” a contratação da A. (trabalhadora), refere-se que:
(…) nos recibos de vencimento surge a indicação da “CSL”. No entanto quem ganhou o contrato de empreitada de limpeza do Hospital, foi a “AJ” e a posição de empregadora transferiu-se da ISS para a 1ª Ré, por força das cláusulas dos instrumentos de regulamentação colectiva. Todavia, certo é que a 2ª Ré surge a pagar as retribuições da trabalhadora, exercendo funções típicas de empregador. Mais alegou a R. “Ambiente e Jardim” a realização de contratação de outsourcing entre as RR, sem que, no entanto, tenham junto qualquer documento referente e tal contratação”. Conclui como as anteriores pela existência de uma situação irregular de pluralidade de empregadores e condena solidariamente as duas (…)”.
Numa outra sentença do mesmo tribunal – fls. 5434 – intentada contra as duas sociedades deu-se como não provado que a “CSL ” se dedicasse a serviços de limpeza; que a “AJ” tivesse subcontratado na “CSL” a contratação da autora, que a “AJ” tivesse solicitado à “CSL” recursos humanos para dar cumprimento ao contrato celebrado com o Hospital de Setúbal.
E sucedem-se outras sentenças de igual teor que confirmam, além do mais, que a “AJ” e/ou as sociedades acima mencionadas, durante o período em causa – reportamo-nos ao período compreendido entre Janeiro de 2006 e Março de 2012 - não apresentaram o contrato comprovativo do alegado “outsoursing”.
Neste sentido cabe destacar uma sentença da 6ª Vara Cível de Lisboa de 19.04.2011, proferida no âmbito de uma acção posta pela “AJ” contra a “AI” nos termos da qual a primeira reclama um determinado valor que alegadamente lhe é devido pela segunda na sequência de um contrato de prestação de serviços de administração de pessoal técnico de limpeza que não terá cumprido.
Resulta da sentença que a Ré “AI” não contestou mas como a autora - “AJ” -, “notificada, inúmeras vezes, para juntar documento comprovativo do contrato e facturas não o fez” a ré foi absolvida (fls. 5769).
A documentação analisada que, na sua maioria diz respeito à sociedade “CSL” e reporta-se a factos posteriores a Março de 2012, não infirma a prova produzida e menos ainda o que se disse sobre a inexistência do alegado “outsourcing” e a natureza e características das várias sociedades no período compreendido entre Janeiro de 2006 e Março de 2012, tanto mais que, quanto à “CSL” estão em causa nestes autos os três primeiros meses de 2012, desconhecendo-se se depois disso e face a tudo o que aconteceu na sequência do inquérito foram adoptadas outros procedimentos e estratégias.
O certo é que a “CSL” foi constituída em termos idênticos às restantes, tal como as sociedades que a precederam ocupou o lugar deixado pela última – a “AHL” – entre Janeiro e Março de 2012, passou a figurar como a principal fornecedora da “AJ” e à semelhança das outras sociedades não apresentou declarações fiscais.
Também neste caso o arguido AJE , em carta de renúncia, datada de 2.04.2012 e remetida à sociedade “CSL” diz que “das cartas que enviou não lhe responderam nem enviaram qualquer documentação que o habilitasse a cumprir as responsabilidades e não lhe pagaram as avenças” (fls. 5244).
Resta referir que a pouca documentação que diz respeito a outras sociedades e que se reporta ao período aqui em causa é pouco expressiva, totalmente inconclusiva e sem significado.
A circunstância, só por si, de algumas dessas sociedades serem demandadas em processos judiciais e terem sido notificadas para pagamento de coimas não contraria as evidências resultantes de toda a prova produzida em julgamento e da prova documental, com especial destaque para a análise bancária e contabilística, tanto mais que a maior delas acabou por ser cessada oficiosamente por não ter cumprido as suas obrigações fiscais.
Como foi dito pelos inspectores tributários a A.T. só instaurou inquérito em 28.10.2010 quando se apercebeu de divergências apuradas no cruzamento entre os dois anexos da IES.
Antes disso, as empresas estavam a ser investigadas e, nalguns casos, demandadas de forma isolada e descontextualizada, por dívidas fiscais e à segurança social porque a A.T e o ISS não se tinham apercebido das relações entre elas e de tudo o mais que vieram a apurar na sequência da investigação e de uma análise global.

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Conclusões

Como resulta desta breve súmula da prova produzida em julgamento não restam dúvidas de que, ao contrário do que sustentou a defesa nas alegações finais existem muitas evidências de que as sociedades “ALJ, Lda. II”, “ARH ”, AXXI ” “AI”, “Aj”, “AHL e “CSL ” no período compreendido entre Janeiro de 2006 e Março de 2012 eram meras emitentes de facturação falsa e não cumpriam as suas obrigações fiscais.
A gerência de todas as sociedades pertencia de facto ao arguido JMG  e era, no essencial, exercida a partir do mesmo local, em Sacavém.
Nem a documentação inconclusiva apresentada pela defesa, nem os depoimentos das testemunhas NFP, representante da REFER, e ACC, técnica de contabilidade, tão citados pela defesa, contrariaram estas evidências.
O primeiro referiu que teve de recorrer, em duas situações, à “CSL ” e o contacto mais directo foi a “AJ ” que conhecia a “CSL ” dos recibos de vencimento dos trabalhadores e o FMA  por ser responsável pela “CSL”.
A segunda fez afirmações incoerentes e ilógicas afirmando designadamente que as sociedades eram controladas pelo arguido FMA  e que a “AJ” era fornecedora da “CSL”.
Ficámos plenamente convencidos de que os serviços de limpeza eram prestados por trabalhadores da “Aj” e os alegados e não comprovados contratos de cessão/administração tinham o propósito de ficcionar a existência de serviços e consequente emissão de facturas com o nome dessas sociedades gerando IVA dedutível, com o único objectivo de fazer com que a “AJ” entregasse menos IVA ao Estado.
Assim se explica que os valores constantes a débito, a título de pagamento de facturas às sociedades fornecedoras aqui em causa, na realidade, não tenham sido efectuados.
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Valores de IVA indevidamente deduzidos pela “AJ  entre Janeiro de 2006 e Março de 2012 (pontos 32 a 107 da matéria de facto)
A matéria constante dos pontos 32 a 107 baseou-se na análise efectuado pelos Inspectores Tributários RC e IS e que consta de relatório e parecer junto aos autos.
O apuramento dos valores de IVA indevidamente deduzido consta de fls. fls. 102 a 143 e 123 a 162 do parecer.
Sobre os critérios de determinação desse valor explicou o inspector RC que verificaram, mês a mês e período a período, e que, como aliás resulta da matéria de facto dada como provada, aceitaram, na liquidação do valor em falta, os custos, designadamente pagamentos de vencimentos devidamente comprovados, isto é, pagamentos que tinham subjacentes serviços efectivamente prestados.
Quanto aos manuscritos com os elementos das facturas explicou, por seu turno, a Inspectora IS que consideraram esses documentos como verdadeiras facturas  explicando que se assim não fosse, se não se considerasse um documento, que na sua substância corresponde a uma factura, por preterição de formalismos legais, e, consequentemente, não se pudesse qualificar tal documento, como factura falsa ficaria o caminho aberto para que qualquer sujeito, com intenção de se apropriar de uma vantagem patrimonial ilegítima, obtida às custas dos Cofres do Estado, mediante a utilização de facturas falsas, não respeitasse, propositadamente, os formalismos legais estabelecidos no CIVA e deste modo não incorrer na prática do crime de fraude fiscal.
A título de exemplo, remete-se para os pontos 32 a 43 da matéria de facto e respectivos quadros (“ALJ , Lda.”)
Dos quadros consta a descrição das facturas, a identificação, o valor total facturado e o IVA indevidamente deduzido.
Noutros quadros foi feito o apuramento da vantagem patrimonial obtida em sede de IRC pela “AJ ”.
Foram deduzidos valores pagos em cheque ou transferência bancária e que correspondiam a custos efectivamente suportados com trabalhadores próprios mas que imputou àquela sociedade.
Este apuramento repete-se nos vários anos e nos mesmos moldes nos pontos subsequentes da matéria de facto.
De referir ainda que, como resulta do despacho prévio à dedução da acusação “ no que concerne ao IRC de 2011 e 2012, não foi possível apurar o valor do lucro obtido pela “AJ ” em 2011 e 2012 e consequentemente não foi determinada a vantagem patrimonial por ela alcançada, a título de IRC, fruto da utilização dos projectos de facturas emitidas pela “AHL – Sucursal em Portugal” e pela “CSL ”.
Por último, o apuramento da vantagem patrimonial obtida em sede de IRC pela “AJ” consta de fls. 143 a 152 e 163 a 172 do parecer dos técnicos tributários.
De realçar que para efeitos de IRC os montantes das facturas não foram considerados mas tiveram em consideração os custos.
Sobre os custos considerados e desconsiderados pela administração tributária, com incidência no apuramento da vantagem patrimonial, foram suscitadas pela defesa dos arguidos várias objecções e reservas, tendo o arguido AJE  feito uma exposição sobre custos que deviam ter sido considerados, questão que face às impugnações apresentadas pelos arguidos nos tribunais tributários será relegada a final para essa sede.
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Análise da utilização dos montantes retirados das contas da “Ambiente e Jardim” não registados na contabilidade desta e recebidos pelos arguidos JMG, JTG  e outros ou que foram utilizados para pagamento de serviços e bens daqueles arguidos nomeadamente viagens, veículos, mobiliário (pontos 108 a 139 da matéria de facto)
A matéria de facto dada como provada resulta de prova documental inequívoca baseada designadamente em declarações de rendimentos apresentadas pelos arguidos e na análise das várias contas bancárias tituladas pela “AJ  e pelos arguidos, nas cópias dos cheques, em transferências bancárias, facturas e pagamentos.
De notar que estas diversas saídas de meios financeiros da sociedade arguida “AJ” não foram postas em causa pelos arguidos.
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II.–Responsabilidade dos arguidos e dolo

a)-arguidos JMG , JTG  e FMA

Quanto aos arguidos JMG, JTG  e FMA, afigura-se-nos inequívoco, em resultado da prova produzida e analisada em audiência - realce especial para o que se concluiu sobre as características e funcionamento das várias sociedades (fictícias), as relações entre essas sociedades e a “AJ”, a facturação emitida, os movimentos bancários e contabilísticos - que qualquer um destes arguidos, com responsabilidades e culpas distintas, estava concertado nos já referidos objectivos de defraudar o Estado. Todos eles estavam no centro das operações.
Basta atentar no facto de os dois primeiros arguidos pertenceram ao Conselho de Administração da “Aj” e, como se verá, ao contrário da arguida MAG , também membro do Conselho de Administração da empresa, estarem directa e activamente envolvidos na actividade da empresa.
O arguido JMG  dirigia-a, o arguido JTG  era o seu director financeiro e tinha-se licenciado em gestão de empresas em 2004, passando, a partir desse ano, a exercer funções como gestor financeiro em regime de exclusividade na “AJ”.
Nesta qualidade, como foi dito por várias testemunhas e como, aliás, decorre das respectivas funções, controlava a facturação e os movimentos bancários e autorizava pagamentos.
Perante tudo o que se disse atrás sobre estas duas realidades o arguido JTG, na qualidade de membro do Conselho de Administração da “AJ, S.A.” e de seu director financeiro, ao controlar a facturação emitida por aquela, a facturação dos fornecedores, os pagamentos aos trabalhadores, ao Estado e aos fornecedores, não podia estar alheado do que se estava a passar e jamais podia desconhecer que as subcontratações eram fictícias tanto mais que sabia que as empresas fornecedoras não recebiam os valores facturados.
Como referiu o inspector RC, corroborando o que resulta do relatório pericial, o arguido JTG , dadas as suas funções na “AJ ” tinha de ter conhecimento que as intituladas “cedências de pessoal” não tinham sido efectuadas e que as facturas existentes eram falsas e, nos casos em que não existia factura, não devia sequer ter dada autorização de pagamento, nem comunicado à contabilidade esse pagamento.
Apesar de este arguido ser bastante jovem quando começou a trabalhar na “AJ” e de ser filho do principal responsável da sociedade - admite-se que as principais decisões fossem tomadas pelo pai – resultou da prova produzida – esta prova não está sustentada apenas nas certidões da Conservatória mas igualmente na prova testemunhal e nas declarações do arguido AJE  - que o arguido exercia, de facto, as funções de director financeiro da empresa e designadamente autorizava pagamentos a fornecedores.
Para tal tinha necessariamente de confirmar a prestação efectiva do serviço e o valor facturado.
Resta referir que, como já se sublinhava no despacho de pronúncia – fls. 4594 – todas estas circunstâncias não são compagináveis com uma eventual ausência de responsabilidade, não era crível, nem agora é, em resultado da prova produzida em audiência, que o arguido JTG  se limitasse a elaborar propostas para os concursos - ideia que foi veiculada por algumas testemunhas que trabalham na “AJ” - sem atender às regras e obrigações decorrentes do Código de Contratação Pública e da contratação colectiva, no que diz respeito às transferências de trabalhadores, e não exercesse qualquer controlo sobre a facturação emitida, ao pagamentos, os movimentos bancários e contabilísticos.
O mesmo se dirá relativamente ao arguido FMA . É inegável que este arguido era o gerente das várias sociedades – resulta das certidões de constituição das sociedades, de toda a prova produzida em julgamento e das declarações dos arguido JF  e AJE -, não se limitando, além do mais, a constituí-las.
Também aqui a prova produzida evidencia que este arguido assumiu conscientemente e de forma integral o papel de “testa-de-ferro” das várias sociedades, representando-as nos julgamentos designadamente nos tribunais de trabalho e comparecendo algumas vezes nos locais onde eram prestados os serviços de limpeza (ex. depoimento da testemunha NP).
Porém, como vimos, todos os assuntos relacionados com a gestão diária das sociedades eram, no essencial, assegurados pelo arguido JMG  ou por outros responsáveis e/ou funcionários – ex. supervisores – da “AJ”.
Apesar de o arguido FMA  não ter prestado declarações – usou de um direito que lhe assistia – ficámos convencidos que o envolvimento do arguido se deveu ao facto de ser amigo pessoal do arguido JMG  e de ter estado ligado ao ramo empresarial. Também não será despiciendo observar que, no período compreendido entre 2006 e 2010, a “AJ  emitiu doze cheques à ordem do arguido FMA , no valor global de 292.500€ - valor correspondente a 58.000€ por ano ou 4.800€ por mês -, sem qualquer documento contabilístico que justificasse a sua emissão.

b)–arguida MAG .

Sobre esta arguida a prova produzida foi muito escassa.
O arguido JF  disse que a arguida tinha funções administrativas – “fazia arquivo” - e que o arguido JMG  era o seu interlocutor em representação da “AJ”.
As restantes testemunhas, ou não conheciam a arguida, ou pelo menos afirmavam não a conhecer, ou desvalorizaram a sua posição na empresa e a sua capacidade de decisão e de gestão remetendo-a, bem ou mal, para o papel de “mulher do patrão” com presença irregular e discreta nos escritórios da “AJ”.
Assim o facto, só por si, de, a partir de 1999, a arguida MAG  ter passado a integrar o Conselho de Administração da “AJ” e a ocupar a posição de presidente desse Conselho não nos permite concluir que a mesma tenha participado na fraude praticada quando, na verdade, nenhuma prova foi validamente produzida a tal propósito.
Não pode, neste caso, o tribunal concluir a partir de um juízo meramente probabilístico.

c)–arguido JF
 
A prova produzida em julgamento, as declarações do arguido JF  ao longo do processo – na instrução e em julgamento - e das testemunhas, analisadas conjugadamente à luz das regras da experiência comum, apresentaram resultados contraditórios, que nos deixaram dúvidas sobre se os fortes indícios que apontavam para a participação do arguido no esquema fraudulento aqui em causa eram suficientemente consistentes para fundamentar uma condenação.
Colocava-se desde logo a questão de saber se o arguido JF, profissional da advocacia e a patrocinar empresas e respectivos gerentes, que ao longo de pouco mais de seis anos levaram a cabo um plano que lhes permitiu defraudar o Estado, não pagando impostos devidos, se limitou a agir no exercício das suas funções, prestando a assistência jurídica que lhe era solicitada, a troco de uma remuneração, ou se existiam factos e evidências que revelassem que o arguido participava conscientemente nesse plano, sabendo, e querendo que as empresas tivessem a finalidade apurada.
E, por isso, antes de passar à análise da responsabilidade do arguido JF, devemos deixar claro que a conduta deste arguido, não pode ser dissociada da circunstância de os factos que lhe são imputados terem sido praticados no quadro do exercício da advocacia.
O arguido negou os factos de que se encontrava acusado e defendeu-se invocando justamente a qualidade de mandatário dos arguidos FMA  e JMG  e das empresas que este último geria e referindo que a sua intervenção se limitou e esgotou no âmbito do mandato forense.
Começou por dizer que conheceu o arguido FMA  muito antes de conhecer o arguido JMG, representou-o entre meados de 1998/1999 quando ele geria a empresa “Tex.”, sedeada no Porto, em 2000 o arguido FMA  convidou-o para trabalhar com ele no sector das limpezas industriais e em 2002 apresentou-lhe o arguido JMG   dizendo-lhe  que a “AJ” era a sua maior cliente.
O arguido JMG  nessa altura convidou-o para lhe prestar apoio jurídico.
Em meados de 2004 teve uma reunião conjunta com os arguidos JMG  e FMA .
O arguido JMG  quis transferir a responsabilidade da gestão do pessoal para outras empresas por se ter apercebido das curtas margens de lucro que obtinha com essa actividade e, a pedido dos dois arguidos, elaborou minutas de contratos de subempreitada – estas minutas foram encontradas no computador do arguido nas buscas realizadas ao seu escritório e constam do Apenso 73 –, tendo percebido, através do processo, que as minutas que fez nessa reunião foram sendo readaptadas.
Sobre a constituição das empresas e a rotatividade destas, questionou o arguido FMA  e este disse-lhe que queria pagar as dívidas da primeira sociedade – o FMA  tinha dívidas, constituía nova sociedade na expectativa de com essa nova sociedade pagar as dívidas da anterior que entretanto ficava “parada” – e que o aconselhou, várias vezes, a “apresentá-las à insolvência”, coisa que o arguido FMA  nunca quis fazer, nunca tendo “largado” a primeira empresa e dizendo-lhe que não conseguia trabalhar de outra forma. 
Nos tribunais de trabalho, onde esteve a representar a “AJ”, sempre ouviu os trabalhadores dizerem que a “CSL   “ lhes pagava e sempre viu o arguido FMA  fazer os pagamentos.
Em 2009 foi pedida a sua colaboração para fazer um aumento de capital social da “AJ” para que esta pudesse apresentar uma candidatura a um concurso.
Precisavam de dois novos accionistas. Aceitou subscrever com a
APR, funcionária do seu escritório na proporção de 100€ cada, como resulta da certidão da Conservatória.
A testemunha APR confirmou que adquiriu a quota por 100€, não fez qualquer pagamento e assinou, na mesma altura, o contrato de cessão da quota à “Ambiente&Jardim” a pedido do arguido JMG . Da certidão permanente da “AJ” consta que efectivamente as duas quotas, de 100€ cada, foram transmitidas no mesmo dia para a MPL (fls. 4363).
Esclareceu ainda que esta sociedade offshore é detida pelos arguidos JMG  e MAG  em percentagens iguais (50% cada um) e é accionista da “Ambiente e Jardim, SA”, que não tinha qualquer participação nessa sociedade e que, para além da assembleia em que se discutiu o aumento de capital e a transformação da “AJ” em SA, não participou em quaisquer outras reuniões ou assembleias nem nas respectivas decisões, rejeitando o teor da acta de fls. 1076 e do artº 19 da acusação.
De resto, referiu que não conhecia os fluxos financeiros das várias sociedades, nunca as representou fiscalmente, tinha procurações com poderes específicos para as constituir em Portugal – esta afirmação do arguido JF  está corroborada nas escrituras de fls. 1061, 1065 e 1070, das quais resulta que o arguido interveio, na qualidade de procurador da “VIL”, “MIL e “DHL” com poderes para o acto - praticando unicamente actos de advocacia, nunca viu as contas das sociedades – era “pelouro do arguido AJE” -, nunca recebeu lucros, jamais lhe pediram para participar num esquema de fuga aos impostos e, por isso, ficou surpreendido quando leu a acusação.
O arguido FMA  tinha interesse em subdelegar na “AJ” essas questões. O VC trabalhava mais para o FMA  do que para a “Aj”. Havia uma preocupação de aliviar os custos.
Admitiu que o arguido FMA se apoiava no arguido JMG  mas não se apercebeu de que fosse seu empregado.
Por fim, quanto aos cheques que recebeu e ao que foi emitido a favor do seu pai, no valor de 2.000€, disse que eram pagamentos de honorários – apresentou a respectiva declaração de rendimentos - e que pediu ao arguido JMG  para emitir um dos cheques a favor do seu pai como forma de pagamento de uma dívida.
O arguido JMG  disse-lhe que entregava os recibos ao arguido AJE  para os declarar. Este arguido, por seu turno, disse que o arguido JMG  não lhos entregou.
Não sabe porque é que o arguido JMG  não entregava os recibos ao arguido Jorge Emídio. Sede na residência do pai. Outras empresas. Era o escritório dele. O pai teve um infortúnio e ficou a viver naquela casa.
Quanto às renúncias do arguido AJE disse que só teve conhecimento dessas renúncias depois das buscas no escritório.

Conclusões
 
A conduta do arguido JF não está isenta de críticas e reparos. Ressalta da prova produzida que o arguido JF teve uma participação activa, muito activa, na constituição das sociedades e na escolha das respectivas sedes, disponibilizando instalações suas para sedes de algumas sociedades.
A justificação que lhe terá sido dada pelo arguido FMA  para a rotatividade das empresas, do mesmo ramo de actividade, também lhe deviam ter suscitado dúvidas. Estão aqui em causa seis empresas, criadas num espaço de seis anos, todas no ramo das limpezas.
A intervenção nos tribunais quando se colocava a necessidade de apresentar prova sobre a existência de contratos de cedência de pessoal também lhe devia ter suscitado dúvidas.
Como resulta das suas declarações o arguido apercebeu-se que o arguido FMA  tinha interesse em subdelegar na “AJ” as questões relacionadas com a gestão do pessoal admitindo que havia uma preocupação de aliviar os custos, que o VC trabalhava mais para o FMA  do que para a “Ambiente & Jardim” e que o arguido FMA se apoiava no arguido JMG .
Nestas circunstâncias, seria de esperar que o arguido se questionasse, ou questionasse os arguidos que representava há vários anos e com quem criou certamente laços de confiança, sobre o tipo de sociedades que tinham sido criadas e a relação entre estas e a “AJ” e não tivesse sido apanhado de surpresa quando leu a acusação.
Estas considerações não nos permitem contudo concluir, com segurança - a que se exige da prova em julgamento - que o arguido JF tivesse conhecimento do plano engendrado pelo arguido JMG  e, mais ainda, que tivesse aderido e participado nesse plano e colaborado ou participado na constituição das várias sociedades, sabendo que se destinavam a defraudar o Estado.
Neste caso particular, sendo o arguido advogado e estando acusado de factos praticados no exercício dessas funções e do mandato forense, exigir-se-iam mais evidências da participação do arguido no esquema fraudulento, evidências que não surgiram e as que se indiciavam foram em grande parte esclarecidas pelo arguido e corroboradas por outros elementos probatórios (ex. participação em sociedades).
E, assim, sem prejuízo das críticas que se possam fazer quanto ao modo de actuação do arguido, chegados a esta parte da motivação da matéria de facto, teremos de concluir que falece a demonstração da intenção criminosa do arguido, que é o sustentáculo da imputação efectuada, uma vez que os actos praticados pelo arguido estavam, no essencial, incluídos no leque de competências do exercício da advocacia.
A prova da acusação/pronúncia não permite, repete-se, com a certeza e segurança que são exigidas em direito penal, concluir pela existência de um propósito do arguido de defraudar o Estado.
Perante a dúvida instalada, face à prova produzida e enunciada, restou apenas à maioria dos Juízes do Tribunal Colectivo, à luz do princípio in dubio pro reo fundado constitucionalmente no princípio da presunção da inocência – artº 32/2 da CRP – dar como não provados os factos incriminadores do arguido.

d)–arguido AJE

Diferente é contudo a posição e a responsabilidade do arguido AJE .
Ao analisarmos a conduta do arguido AJE e as justificações que apresentou em audiência de julgamento para o facto de ter adoptado determinados comportamentos não podemos naturalmente alhear-nos da condição profissional deste arguido.
Aliás, tal ponderação já esteve presente em duas situações, ainda que em planos e contextos diferentes, a saber: do arguido JTG enquanto Director Financeiro da “AJ” e do arguido JF  na qualidade de mandatário dos arguidos JMG e FMA .
No caso em apreço estamos perante o facto inquestionável de o arguido AJE ter sido TOC de todas as sociedades, exercer a actividade de técnico oficial de contas desde 1995 encontrando-se desde essa data inscrito na actual Ordem dos Contabilistas Certificados.
Na verdade embora o arguido negue que tenha sido TOC de algumas das sociedades invocando o facto de ter renunciado o certo é que apresentou cartas de renúncia porque efectivamente aceitou não só apresentar, ano a ano, as declarações de início de actividade de cada uma dessas sociedades como figurar como TOC das mesmas.
As funções e deveres profissionais dos técnicos e dos revisores oficiais de contas encontram-se previstos nos estatutos das respectivas ordens profissionais, aprovados pelos Decreto-Lei n.º 452/99, de 05.11, revisto pelo Decreto-lei n.º 310/2009, de 26.10 no que respeita à Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas e no Decreto-Lei n.º 487/99, de 16.11, alterado pelo Decreto-lei n.º 224/2008, de 20.11, no que concerne à Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (ROC).
Além de estatutariamente estar reconhecido o carácter público da função de TOC – a natureza pública desta função decorre expressamente do artº 1 do Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados - e de o técnico oficial de contas ser considerado interlocutor privilegiado entre a administração fiscal e os contribuintes, o Decreto-Lei n.º 452/99, de 05.11, no seguimento de diplomas anteriores, estabelece um conjunto de deveres e obrigações que devem ser seguidos pelos TOC no exercício das suas funções.
“Ao assinar as declarações fiscais, as demonstrações financeiras ou os seus anexos o técnico oficial de contas assegura a Administração Fiscal a sua regularidade e veracidade, garantindo a sua realidade face à situação contabilística do seu cliente. Na medida em que o técnico oficial de contas assuma a responsabilidade pelo dever tributário de entrega dos valores deduzidos a título de retenção na fonte do IRS ou das contribuições para a Segurança Social dos trabalhadores do seu cliente, poderá, com a não entrega destes valores à Administração Fiscal ou à Segurança Social incorrer na prática de um crime de abuso de confiança fiscal ou contra à segurança social, se preenchidos os restantes pressupostos do tipo previstos, respectivamente, nos artigos 105.º e 107.º do RGIT, assim como as condições objectivas de punibilidade.
Por sua vez, o técnico oficial de contas, na medida em que assuma responsabilidades e deveres da competência do órgão de administração, como o são as obrigações tributárias declarativas – posto que tal lhe é permitido pelo seu Estatuto, constituindo hoje em dia prática corrente – não poderá deixar de ser responsabilizado pelas infracções que, dolosamente, praticar ou determinar o órgão de administração, e com ele a sociedade, a cometer (…)
Quando se assista a uma actuação concertada entre o técnico oficial de contas e o órgão de administração da sociedade – por sua iniciativa e com o conhecimento e/ou aprovação do último ou em cumprimento de uma decisão tomada por este órgão –, sendo falsificada a escrituração e as declarações fiscais da sociedade ou não sendo entregues as quantias retidas e devidas à Administração Fiscal pela sociedade, enquanto substituta tributária, coloca-se a questão de, se praticando o TOC tais actos e agindo em representação da sociedade, poderá ser punido por tais infracções ao nível da autoria (e aqui, de uma co-autoria)” ( in “A responsabilidade penal do ROC e do TOC no contexto empresarial, Universidade Católica, Faculdade de Direito, Dissertação de Mestrado  de Maria Madalena Ataíde Afra Rosa (30.04.2014).
Refere-se no preâmbulo do já mencionado Estatuto da Câmara dos Técnicos Oficiais de Contas que “(…) a regularidade fiscal das entidades servidas só pode ser realmente assumida desde que aqueles profissionais assegurem, igualmente, a função primordial de garantir a exactidão da contabilidade que lhe serve de suporte (…) e que “ (…) tem-se em vista reforçar junto dos agentes económicos a credibilização dos técnicos oficiais de contas, enquanto interlocutores privilegiados com a administração fiscal , para o que se determina uma maior exigência da sua formação académica e profissional (…)”
Do que se deixa dito decorre, sem margem para dúvidas, que o TOC tem deveres específicos perante a administração tributária – artº 73 do já citado DL 452/99 com as alterações entretanto introduzidas – devendo pautar a sua conduta por critérios de ética profissional tendo o direito e o dever de exigir às entidades a quem presta os seus serviços todos os documentos e informações de que necessite para assegurar que todas as operações contabilísticas e fiscais estão devidamente suportadas e lhe foram integralmente transmitidas.
Dito isto, analisemos agora a conduta do arguido AJE .
Desde logo salta à vista uma relação comprometedora entre o arguido AJE e as sociedades arguidas (todas).
O arguido era simultaneamente técnico oficial de contas da “AJ” e das sociedades, não declarantes fiscais, pretensamente fornecedoras daquela.
O arguido, na qualidade de TOC da “AJ” quando contabilizava as facturas ou os manuscritos com os elementos das facturas – o arguido admitiu que nem sempre a “AJ” lhe entregava as facturas e, nessas situações, sabendo de antemão que o valor da facturação mensal das fornecedoras correspondia contratualmente a 90% da facturação emitida, no mês, pela “AJ” aos seus clientes redigia esses manuscritos, por mera questão de organização e como lembrete, de modo que quando lhe fossem entregues os originais substituía os rascunhos – sabia que as outras sociedades, em nome de quem eram emitidas as facturas, não lhe tinham disponibilizado quaisquer documentos contabilísticos pois era, ou tinha sido, igualmente TOC dessas sociedades.
Razão pela qual terá apresentado sucessivamente as renúncias a TOC dessas sociedades, invocando, nas cartas de renúncia, justamente a não apresentação de documentos contabilísticos, a falta de pagamento de qualquer avença e a ausência de contactos por parte dos sócios e /ou gerentes das sociedades.
Perguntar-se-á, desde logo, por que razão, sabendo o arguido que as sociedades eram incumpridoras, confiava na palavra do arguido JMG  e não só contabilizava as facturas que lhe eram entregues como redigia manuscritos com os elementos das facturas, sem qualquer suporte documental e sem ter garantias de que esses documentos tinham subjacentes verdadeiras prestações de serviços.
Acresce que o arguido AJE, durante seis anos, ano a ano, aceitou ser TOC de empresas geridas pela mesma pessoa não obstante esta, anteriormente, não ter respondido às solicitações que lhe fazia no exercício das suas funções de TOC e não lhe ter disponibilizado documentação contabilística nem pago as avenças.
Apesar daquela situação se repetir todos os anos, durante seis anos, repita-se, seis anos, o arguido AJE  foi sempre aceitando a proposta feita pelo mesmo gerente, que antes nem sequer se dignara responder às suas cartas, e ao mesmo tempo, preenchia as declarações da “AJ”, contabilizando facturas dessa nova sociedade.
Perante as explicações do arguido em audiência de julgamento e as tentativas de se desculpar com a ingenuidade, boa fé e excessiva confiança no arguido JMG, perguntámo-nos como poderia um técnico oficial de contas maduro, experiente e responsável cair num engodo destes.
É manifesto que o arguido AJE  não caiu em qualquer engodo, pois sabia o que estava a acontecer com as sociedades e com a facturação emitida em nome destas e aceitou colaborar com o arguido JMG . 
Esta colaboração com o arguido JMG  poderá dever-se ao facto de lhe estar grato por o ter ajudado quando saiu da RTP, cedendo-lhe instalações para desenvolver a sua actividade de TOC.
Ficámos, em suma, convencidos que, com ou sem divida de gratidão, o arguido aceitou fazer aquilo que o arguido JMG  lhe pediu, ou não teve coragem de recusar o que lhe foi pedido e, violando os seus deveres profissionais e estatutários prestou-se a apresentar à A.T as declarações da “AJ” com os elementos já referidos, sem as quais esta sociedade não poderia candidatar-se aos concursos públicos. Não temos dúvidas que o arguido AJE  estava consciente de toda a situação e aceitou-a sem reservas.
O arguido AJE  defendeu-se dizendo nomeadamente que não tinha acesso às contas bancárias da "AJ”, e portanto não sabia se os pagamentos eram efectuados, apresentava cartas de renúncia quando verificava que não havia qualquer colaboração por parte das sociedades e não enviavam a documentação necessária e solicitada e, por fim, aquilo a que o arguido mais enfatizou para tentar demonstrar que não conhecia nem participava na fraude, o facto de preencher e enviar para a autoridade tributária o já referido anexo P, sabendo que este anexo, sem o correspondente anexo O, iria dar origem a uma inspecção da A.T. por divergências na informação (IES).
Admitindo-se que o arguido não tinha acesso às contas bancárias – tudo indica que efectivamente não tinha acesso a essas informações – afigura-se-nos esse facto, só por si, não põe em causa tudo o que já foi dito sobre a relação comprometedora do arguido com as várias sociedades e a forma ligeira e pouco responsável com que contabilizou as facturas que lhe foram sendo apresentadas e elaborou manuscritos com os elementos das facturas, sabendo o que se passava com as sociedades e não cuidando de fazer a confirmação entre o que era contabilizado e o que era declarado com a realidade da actividade da sociedade arguida “AJ”. Este dever de confirmação, que lhe é imposto pelo estatuto profissional, neste caso era indispensável, imprescindível, pois o arguido sabia, por experiência própria, que as sociedades emitentes das facturas não cumpriam as suas obrigações para com o TOC.
As cartas de renúncia, nas circunstâncias em que foram apresentadas mostram-se pouco relevantes e estão longe de isentar o arguido de responsabilidades. Basta ver que o arguido AJE , ano a ano apresentava uma carta de renúncia e, logo de seguida, aceitava ser TOC de novas empresas do mesmo ramo e geridas pela mesma pessoa (a pessoa que o contactava para ser TOC).
Por fim, quanto aos anexos, se é certo que as divergências entre os dois anexos, ou a entrega de um e a não entrega do outro, poderia dar origem a uma inspecção por parte da A.T., não é menos certo que estas divergências só foram verificadas cerca de quatro anos depois e que esta verificação tardia se deve ao facto, certamente não ignorado pelo arguido, de, como referiram os inspectores tributários, a imagem do incumprimento das obrigações fiscais ter sido transferida para as sociedades, individualmente consideradas, o que fez com que a investigação que só mais tarde se tivesse apercebido que a “AJ” e as suas principais fornecedoras integravam um esquema de fraude.
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III.–Associação criminosa

Na primeira parte da acusação é imputada ao arguido JMG a responsabilidade pela criação de uma estrutura dirigida à prática de actos criminosos visando obter à custa do Estado Português benefícios económicos que sabia não lhe serem devidos.
Ainda de acordo com a acusação teriam aderido voluntariamente a esse plano, e integrado a referida estrutura, os restantes arguidos.
Por fim, no modelo da estrutura associativa mencionado na acusação, transposto para a pronúncia, patenteava-se uma arquitectura organizativa onde seria de distinguir um primeiro patamar formado pelo núcleo liderado pelo arguido JMG  e do qual fariam parte o filho, arguido JTG  e a mulher MAG  todos eles fazendo parte do Conselho de Administração da “AJ, SA”, e o arguido FMA  “testa- de- ferro” das sociedades e um outro, diferentemente posicionado, integrado pelo Técnico Oficial de Contas, arguido AJE  e pelo advogado, arguido JF .
Da prova produzida em julgamento resultou uma realidade distinta da vertida na acusação sobre os contactos entre os arguidos e a natureza das relações que mantinham entre si e, ainda, sobre a responsabilidade criminal de alguns dos arguidos, resultando do ponto anterior elementos probatórios escassos e contraditórios que não permitem responsabilizar criminalmente os arguidos MAG  e JF  pelo crime de fraude fiscal de que se encontravam acusados. 
O mesmo se dirá quanto à associação criminosa. No caso da arguida MAG  a imputação deste crime à arguida tem implícita a sua posição no Conselho de Administração da sociedade “AJ” – cargo de topo - e a sua relação familiar com os restantes membros.
Sucede que a gestão, de facto, da sociedade “AJ”, como ficou sobejamente provado, era exercida pelo arguido JMG  e as relações entre os arguidos, designadamente entre a arguida e os arguidos JMG  e JTG, tinham motivações estritamente pessoais e familiares, não havendo uma vontade comum resultante de qualquer acordo, plano ou combinação conjunta.
No caso do arguido JF , advogado dos arguidos FMA  e JMG  há vários anos e com uma intervenção activa e regular, no âmbito das suas funções de advogado, em processos judiciais em que aqueles arguidos intervieram, as considerações feitas no ponto anterior mantêm-se inteiramente válidas, concluindo-se pela inexistência de factos ou evidências que revelem que o arguido participava conscientemente em qualquer plano e menos ainda em qualquer acordo continuado no tempo, expresso em contactos donde resultasse, ainda que de forma implícita, uma vontade comum e autónoma de praticar crimes.
Também quanto ao arguido AJE, não obstante, pelas razões já referidas, se ter dado como provada a sua participação no plano gizado pelo arguido JMG, ainda assim, ficámos convencidos que as suas motivações eram estritamente pessoais- amizade e gratidão - e profissionais.
Resta referir que ficámos com a convicção de que as relações de todos os arguidos, entre si, no exercício das suas funções e com o arguido JMG  e a “AJ” tinham motivações estritamente familiares, pessoais e profissionais, não havendo qualquer evidência de adesão, de todos ou alguns, a um plano criminoso organizado.
Valem para os arguidos JMG, JTG e FMA as mesmas considerações. Estas relações entre os três arguidos permitiram uma intervenção concertada entre si, mas sem evidência da existência de qualquer vontade ou consciência de que, com a sua actuação, poderiam estar a participar num plano criminoso estruturado e organizado.
Não é possível, partindo exclusivamente da realidade objectiva da existência de conluio ou concertação entre vários agentes considerar verificado um acordo de vontades que configure uma associação criminosa.
Concluir-se, a partir dessa realidade objectiva, pela existência de uma associação criminosa seria, além do mais, operar uma presunção de culpa num domínio em que vigora uma presunção de inocência.

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Dolo

São raros os casos em que o elemento subjectivo se prova directamente. Com efeito, os actos interiores que respeitam à vida psíquica, a maior parte das vezes não se provam directamente, mas antes por ilação de indícios ou factos exteriores e de acordo com as regras da lógica, da razão e da experiência.
Essas regras estiveram subjacentes à motivação da decisão de toda a matéria de facto.
Resulta claro da prova produzida que os arguidos JMG, JTG, FMA  e AJE conscientemente deram materialidade fáctica a um plano concebido pelo primeiro arguido e no qual os restantes arguidos participaram nas circunstâncias já referidas.
Sobre os arguidos MAG, JF  não se afiguram necessárias mais considerações.
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Quanto às condições pessoais e económicas dos arguidos o tribunal baseou-se nos relatórios sociais – arguidos JTG, FMA  e AJE-, nas declarações dos arguidos – arguidos JMG, MAG  e JF .
Quanto aos antecedentes criminais, nos CRC.”

Face às conclusões das motivações apresentadas que definem o objecto do processo nos termos do art.° 412.°, n.º 1, do CPP., as questões postas pelos diversos recorrentes e que se impõe serem decididas são as seguintes:

1.–Pelos recorrentes AJE  e G. , Lda:

1.1.– Nulidade do acórdão por omissão de pronuncia nos termos do art.º 379º n.ºs 1 al.s a) e c) CPP;
1.2.– Impugnação da matéria de facto provada relativa aos pontos provados i) 11, 23, 34, 47, 58 e 82; ii) 28; iii) 29; iv) 30 e 31; v) 38, 50, 63, 74, 85, 95, 102 e vi) 40, 41, 43, 51, 52, 54, 64, 65, 66, 67, 75, 76, 77, 78, 86, 87, 88, 89, 96, 103, 104, 105, 1C6, 107, 140, 141, 142, 143, 147 e 148;
1.3.– Integração/qualificação jurídica dos factos;
1.4.– Medida da pena.

2.–Pelo recorrente JMG :
2.1- Impugnação da matéria de facto provada nos pontos 3., 5., 16., 17., 18., 19., 20., 21., 22., 27., 28., 29., 104., 105., 106., 107., 108., 140., 141., 143., 144., 14., 146 e 148;
2.2.- Preenchimento do tipo legal do crime de fraude fiscal do art.º 104º RGIT.

3.–Pelos recorrentes FMA  e sociedades ARH, Lda.”, “AXXI , Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL - Sucursal em Portugal” e pela “CSL - Sucursal em Portugal:

3.1.-Violação do principio ne bis in idem;
3.2.-Nulidade do acórdão por vício de contradição insanável entre factos provados e a decisão;
3.3.-Se existe a condição objectiva de procedibilidade do art.º 105º n.º 1 RGIT;
3.4.-Se existe violação do principio da proibição de actos inúteis;
3.5.-Se se verifica preenchida a circunstância agravativa/qualificativa do crime de fraude fiscal declarada no acórdão;
3.6.-Impugnação da matéria de facto provada nos pontos 6, 16 a 20, 22, 28, 29, 31, 38, 47, 50, 58, 63, 71, 74, 82, 85, 91, 95, 99 e 102;
3.7.-Se se verificam os elementos típicos do crime de fraude fiscal.

4.–Pelo recorrente AJ , SA:
4.1.-A questão prévia da suspensão do procedimento criminal;
4.2.-Se ocorreu a prescrição do procedimento criminal quando ao exercício fiscal de 2007;
4.3.-Impugnação da matéria de facto provada quanto ao valor considerado a final na circunstância qualificativa do ilícito.

5.–Pelo recorrente JTG :
5.1.-Rectificação de erro material e escrita (numeração sequencial dos factos);
5.2.-Se da alteração não substancial dos factos comunicada resulta a absolvição do arguido;  
5.3.-Impugnação dos factos provados 20, 21, 31, 108, 109, 109A, 110A, 111ª, 121, 122, 140 a 146, 148 e 156:
5.4.-Se existiu violação do principio in dubio pro reo;
5.5.-Se houve violação do principio da aplicação da lei penal mais favorável.
*

Começando pela análise do primeiro dos recursos, o interposto pelos recorrentes AJE  e G., Lda, suscitam os mesmos, como primeira questão, a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia nos termos do art.º 379º n.ºs 1 al.s a) e c) CPP.
(…)

A discordância dos recorrentes passa também pela questão da qualificação jurídica dos factos no tipo de ilícito de fraude fiscal qualificada p.º e p.º nos art.ºs 7º n.º 1, 103º n.º 1 al. a) e 104º n.ºs 1 al.s a) e d), 2 al. a) e 3 do RGIT, defendendo que, na procedência da impugnação da matéria de facto que antecedeu, impor-se-á a uma decisão de absolvição do arguido, sem contudo fazer distinção se o arguido pessoa singular ou pessoa colectiva. Chegam os recorrentes à pretendida absolvição fazendo, primeiramente, um expurgo da matéria de facto provada os factos que entenderem trazer à impugnação e de que nos ocupámos atrás e, depois, fazendo uma leitura restritiva da mesma matéria no sentido de afirmar que a condutas que o arguido AJE  manteve enquanto TOC da AJ, SA, e limitando a sua relação quanto às demais sociedades somente à declaração de inicio de actividade com renúncia posterior dessas funções.
A primeira das causas conducentes à absolvição não obteve, como atrás afirmámos, vencimento na medida em que a matéria de facto dada como assente na decisão recorrida não foi objecto de qualquer alteração.
E por relação à determinação da responsabilidade penal pelo ilícito objecto de condenação dos, agora, recorrentes mencionou-se no acórdão recorrido:
”…

Resulta do artº 103 do RGIT, que a fraude fiscal se consuma quando o agente, com a intenção de lesar patrimonialmente o Estado, atenta contra a verdade e transparência exigidas na relação Fisco-contribuinte, através de qualquer das modalidades de falsificação e omissão acima referidas ainda que nenhum dano/enriquecimento indevido venha a ter lugar.

A conduta do agente tem de ser susceptível de causar diminuição das receitas tributárias. Pode não as vir a causar.

Como refere Paulo Dá Mesquita “O crime de fraude fiscal caracteriza-se essencialmente por ser um crime de aptidão ou perigo abstracto-concreto, pois o tipo não se limita a descrever uma conduta genericamente perigosa nem exige a comprovação concreta de uma situação de perigo, mas exige a comprovação de uma aptidão concreta da acção para diminuir as receitas tributárias. A conduta tem de ser susceptível de causar diminuição das receitas tributárias”.

Trata-se, conclui Dá Mesquita, de um crime de resultado cortado pois se no plano objectivo basta o preenchimento de uma das condutas prevista no tipo e a susceptibilidade de causar diminuição das receitas tributárias, no plano subjectivo exige-se uma intenção de diminuir as receitas fiscais do Estado. Daí a referência, no tipo, a condutas que “visem” vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias (“A tutela penal das deduções e reembolsos indevidos do imposto. Contributo para uma leitura da protecção dos interesses financeiros do Estado pelos tipos de fraude fiscal e burla tributária “Rev. do Ministério Público”, pág. 59 ).

Ou seja, neste tipo de crimes o elemento subjectivo do tipo é mais exigente do que o elemento objectivo uma vez que exige a intenção de obter um resultado que na prática pode não se verificar.

Com efeito, como referem Figueiredo Dias e Costa Andrade “a lei penal fiscal não inscreve o dano patrimonial entre os pressupostos objectivos da factualidade típica (...) no que ao chamado tipo objectivo concerne, necessário, e suficiente, ao preenchimento da factualidade típica da fraude fiscal é apenas o atentado à verdade ou transparência corporizado nas diferentes modalidades de falsificação (“O crime de fraude fiscal no novo direito penal tributário português” Revista de Ciência Criminal, ano 6, fas. 1º, Jan. Mar 1996,  pág. 91).

Os valores de transparência e verdade exigidos na relação Fisco-contribuinte constituem o bem jurídico imediatamente tutelado pela incriminação.

“No crime de fraude fiscal, todas as condutas relevam de um mesmo significado material-típico: todas configuram atentados aos valores da verdade e da transparência. Todas representam a violação dos deveres de colaboração com a Administração, assegurando-lhe o cabal e ajustado conhecimento dos factos fiscalmente relevantes, preordenados a assegurar a realização do património necessário ao exercício das funções estaduais.

As condutas tipificadas no artº 103 do RGIT podem revestir a forma de acção ou de omissão. A realização da conduta de modo activo corresponde à alteração de factos ou valores que devam constar da escrita contabilística ou de declarações apresentadas à administração tributária ou ainda através da celebração de contrato simulado” (Ac. do TRL de 18.07.2013, relator Rui Gonçalves proc. nº 1/05.2JFLSB)

Ao nível do elemento subjectivo, o crime de fraude fiscal exige o dolo, em qualquer uma das modalidades previstas no artº 14 do C. Penal, dirigido integralmente a todos os elementos do tipo.

Através da emissão de facturas falsas, o agente visa documentar operações económicas que não são verdadeiras, porque não existem ou pelo menos não existem nos exactos termos que aparentam. O objectivo que subjaz à emissão de facturas falsas radica frequentemente na documentação falsa de custos fiscais, assegurando, deste modo, a diminuição de lucros com consequências na determinação da matéria colectável (IRC) ou mesmo a obtenção ilícita de reembolsos (IVA).

Apurada a utilização de documento falso para efeitos de determinação da matéria colectável ou de obtenção de reembolso fiscal, acompanhado da consciência e vontade da realização do tipo de ilícito, tanto basta para responsabilizar o utilizador pelo crime de fraude fiscal, verificados que se mostrem os restantes elementos objectivos do tipo.

Nestes autos, face à matéria dada como provada estão essencialmente em causa situações de fraude ao IVA traduzidas em deduções indevidas desta prestação tributária, sustentadas em facturas falsas emitidas por sociedades criadas com essa finalidade.

No caso vertente provou-se que:
O arguido JMG delineou um plano visando obter vantagens patrimoniais ilegítimas à custa do Estado, provocando a diminuição das receitas tributárias, mediante a criação artificial de IVA dedutível, através de facturação emitida em nome das sociedades “ALJ, Lda.”, “ARH , Lda.”, “AXXI , Lda”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal” e “CSL ”, baseada na cedência de pessoal para a “AJ, S.A. ”, sem que, na verdade, tais serviços fossem prestados pelas referidas sociedades.

Para tanto, o arguido promoveu a constituição dessas sociedades, entre 2006 e 2012.

Tais sociedades, que tinham como gerente de direito o arguido FMA, amigo do arguido JMG, foram utilizadas entre Janeiro de 2006 e Março de 2012, conforme acima referido, uma por cada ano e por cada um dos exercícios.

Mais se provou que a gerência de facto dessas sociedades pertencia ao arguido JMG, que a exercia na sede da “AJ, S.A.”, não sendo desenvolvida qualquer actividade real nos demais locais indicados como sedes daquelas sociedades.

E que, para a concretização dos objectivos supramencionados, o arguido JMG  contou com a colaboração dos arguidos JTG, FMA  e AJE.

Desta factualidade decorre que, com o esquema que os arguidos criaram e implementaram, nas condições referidas, os serviços de limpeza eram prestados por trabalhadores da “AJ ” e os contratos de cessão/administração eram celebrados com o propósito de ficcionar a existência de serviços e consequente emissão de facturas em nome das sociedades criadas para esse efeito, gerando IVA dedutível, com o único objectivo de fazer com que a “AJ” entregasse menos IVA ao Estado.

Provou-se, ainda, que os arguidos tinham consciência de que as facturas e os manuscritos com os elementos das facturas, inseridos no registo contabilístico da “AJ” eram elementos fiscalmente relevantes.

Os arguidos sabiam igualmente que para exercer o direito à dedução não é condição suficiente ser detentor de uma factura ou documento equivalente, mas ter subjacente a realização de operações no âmbito das actividades empresariais, o que não se verificava neste caso.

E, assim, com esta actuação concertada, os arguidos conseguiram diminuir a matéria tributável da “AJ e o imposto a entregar à Fazenda Nacional, correspondentes, em sede de IVA, ao valor apurado pela A.T. de 3.815,861, 93€ e, em sede de IRC, ao valor apurado de 1.434,625,33€. 

Por fim, provou-se que os arguidos JMG, JTG, FMA  e AJE actuaram com a intenção de realizar o facto típico e com conhecimento dos elementos típicos do crime de fraude fiscal.

Ao nível do elemento subjectivo o crime de fraude fiscal exige o dolo em qualquer uma das modalidades previstas no artº 14 do C. Penal dirigido integralmente a todos os elementos do tipo.

E o dolo, no caso vertente, consiste na intenção de diminuir as receitas do Estado.

Tal como resulta da matéria de facto provada e pelas razões expostas na respectiva motivação é inquestionável que, embora com participações e responsabilidades diferentes, os arguidos JMG, JTG, FMA  e AJE cometeram o crime de fraude fiscal na forma agravada (vantagem patrimonial for de valor superior a 200.000€).”
         
Ora, diferentemente do que os recorrentes, mormente o arguido AJE , pretendem fazer ressaltar na argumentação especulativa que desenvolve na motivação de recurso, no sentido de não ter qualquer ligação/intervenção à constituição das sociedades e ter apenas um relacionamento ocasional e pontual com as mesmas decorrente do exercício de funções de TOC na primeira das sociedades, como refere o acórdão: “Na verdade, embora os arguidos FMA  e AJE  não tivessem a qualidade de sujeitos passivos, para efeitos fiscais, e consequentemente a obrigação de pagarem os impostos em causa, a verdade é que todos eles de forma concertada e cada um com os actos concretos que praticou com vista ao resultado final, actuaram em conjunto, pelo que se mostram verificados os requisitos da co-autoria.

Efectivamente, apesar de alguns deles não terem intervenção directa em alguns casos, como seja a elaboração e apresentação das declarações fiscais onde aqueles valores foram introduzidos, o comparticipante não tem que praticar todos os factos que integram a conduta delituosa, bastando que a sua participação se ajuste à dos restantes, de forma co-decisiva, para produzir o resultado que a norma incriminadora quer evitar (cfr. acordão do STJ de 7.05.2009, CJ STJ II, pág. 193 a 203)”.


O arguido AJE  desempenhava as funções de Técnico Oficial de Contas (TOC) da “AJ, S.A.” e de cada uma das sociedades criadas, cujo início de actividade declarou junto da Administração Tributária nas datas acima indicadas.

Assim, os factos provados conduzem, claramente, à conclusão que os arguidos, com actuações e responsabilidades diferentes, mas plenamente concertados, visavam defraudar a administração fiscal nas circunstâncias dadas como provadas constituindo-se co-autores materiais de um crime de fraude fiscal agravada (neste sentido entre outros acórdãos do STJ de 14/4/1983, publicado no BMJ, 32º, pág. 322, de 2/5/1991, de 20/1/19994 no processo nº 45265, de 21/4/1993, no proc. nº 4396, todos mencionados nos Comentários Conimbricenses do C. Penal, Tomo II, pág. 165).”

Trazemos a esta discussão as afirmações constantes da análise crítica da prova feita pelo Colectivo acerca da conduta do arguido AJE :

“Desde logo salta à vista uma relação comprometedora entre o arguido AJE e as sociedades arguidas (todas).

O arguido era simultaneamente técnico oficial de contas da “AJ” e das sociedades, não declarantes fiscais, pretensamente fornecedoras daquela.

O arguido, na qualidade de TOC da “AJ” quando contabilizava as facturas ou os manuscritos com os elementos das facturas – o arguido admitiu que nem sempre a “AJ” lhe entregava as facturas e, nessas situações, sabendo de antemão que o valor da facturação mensal das fornecedoras correspondia contratualmente a 90% da facturação emitida, no mês, pela “AJ” aos seus clientes redigia esses manuscritos, por mera questão de organização e como lembrete, de modo que quando lhe fossem entregues os originais substituía os rascunhos – sabia que as outras sociedades, em nome de quem eram emitidas as facturas, não lhe tinham disponibilizado quaisquer documentos contabilísticos pois era, ou tinha sido, igualmente TOC dessas sociedades.

Razão pela qual terá apresentado sucessivamente as renúncias a TOC dessas sociedades, invocando, nas cartas de renúncia, justamente a não apresentação de documentos contabilísticos, a falta de pagamento de qualquer avença e a ausência de contactos por parte dos sócios e /ou gerentes das sociedades.

Perguntar-se-á, desde logo, porque razão, sabendo o arguido que as sociedades eram incumpridoras, confiava na palavra do arguido JMG  e não só contabilizava as facturas que lhe eram entregues como redigia manuscritos com os elementos das facturas, sem qualquer suporte documental e sem ter garantias de que esses documentos tinham subjacentes verdadeiras prestações de serviços.

Acresce que o arguido AJE , durante seis anos, ano a ano, aceitou ser TOC de empresas geridas pela mesma pessoa não obstante esta, anteriormente, não ter respondido às solicitações que lhe fazia no exercício das suas funções de TOC e não lhe ter disponibilizado documentação contabilística nem pago as avenças.

Apesar daquela situação se repetir todos os anos, durante seis anos, repita-se, seis anos, o arguido AJE  foi sempre aceitando a proposta feita pelo mesmo gerente, que antes nem sequer se dignara responder às suas cartas, e ao mesmo tempo, preenchia as declarações da “AJ”, contabilizando facturas dessa nova sociedade.

Perante as explicações do arguido em audiência de julgamento e as tentativas de se desculpar com a ingenuidade, boa fé e excessiva confiança no arguido JMG, perguntámo-nos como poderia um técnico oficial de contas maduro, experiente e responsável cair num engodo destes.

É manifesto que o arguido AJE  não caiu em qualquer engodo, pois sabia o que estava a acontecer com as sociedades e com a facturação emitida em nome destas e aceitou colaborar com o arguido JMG . 

Esta colaboração com o arguido JMG  poderá dever-se ao facto de lhe estar grato por o ter ajudado quando saiu da RTP, cedendo-lhe instalações para desenvolver a sua actividade de TOC.

Ficámos, em suma, convencidos que, com ou sem divida de gratidão, o arguido aceitou fazer aquilo que o arguido JMG  lhe pediu, ou não teve coragem de recusar o que lhe foi pedido e, violando os seus deveres profissionais e estatutários prestou-se a apresentar à A.T as declarações da “AJ” com os elementos já referidos, sem as quais esta sociedade não poderia candidatar-se aos concursos públicos. Não temos dúvidas que o arguido AJE  estava consciente de toda a situação e aceitou-a sem reservas.

O arguido AJE  defendeu-se dizendo nomeadamente que não tinha acesso às contas bancárias da "AJ”, e portanto não sabia se os pagamentos eram efectuados, apresentava cartas de renúncia quando verificava que não havia qualquer colaboração por parte das sociedades e não enviavam a documentação necessária e solicitada e, por fim, aquilo a que o arguido mais enfatizou para tentar demonstrar que não conhecia nem participava na fraude, o facto de preencher e enviar para a autoridade tributária o já referido anexo P , sabendo que este anexo , sem o correspondente anexo O, iria dar origem a uma inspecção da A.T. por divergências na informação  (IES).

Admitindo-se que o arguido não tinha acesso às contas bancárias – tudo indica que efectivamente não tinha acesso a essas informações – afigura-se-nos esse facto, só por si, não põe em causa tudo o que já foi dito sobre a relação comprometedora do arguido com as várias sociedades  e a forma ligeira e pouco responsável com que contabilizou as facturas que lhe foram sendo apresentadas e elaborou manuscritos com os elementos das facturas, sabendo o que se passava com as sociedades e não cuidando de fazer a confirmação entre o que era contabilizado e o que era declarado com a realidade da actividade da sociedade arguida “AJ ”. Este dever de confirmação, que lhe é imposto pelo estatuto profissional, neste caso era indispensável, imprescindível, pois o arguido sabia, por experiência própria, que as sociedades emitentes das facturas não cumpriam as suas obrigações para com o TOC.

As cartas de renúncia, nas circunstâncias em que foram apresentadas mostram-se pouco relevantes e estão longe de isentar o arguido de responsabilidades. Basta ver que o arguido AJE , ano a ano apresentava uma carta de renúncia e, logo de seguida, aceitava ser TOC de novas empresas do mesmo ramo e geridas pela mesma pessoa ( a pessoa que o contactava para ser TOC).

Por fim, quanto aos anexos, se é certo que as divergências entre os dois anexos, ou a entrega de um e a não entrega do outro, poderia dar origem a uma inspecção por parte da A.T., não é menos certo que estas divergências só foram verificadas cerca de quatro anos depois e que esta verificação tardia se deve ao facto, certamente não ignorado pelo arguido, de, como referiram os inspectores tributários, a imagem do incumprimento das obrigações fiscais ter sido transferida para as sociedades, individualmente consideradas, o que fez com que a investigação que só mais tarde se tivesse apercebido que a “AJ” e as suas principais fornecedoras integravam um esquema de fraude.”

Desta citação importa fazer destaque ao seu último parágrafo demonstrativo que a crítica que os recorrentes fazem da incompreensão do tribunal acerca do funcionamento dos Apensos O e P não tem o mínimo fundamento, nem obviamente a condenação do arguido AJE  resulta de qualquer inércia da autoridade tributária.

Finalmente e como questão subsidiária à proposta de absolvição feita pelos recorrentes, manifestam os recorrentes a sua discordância quanto à qualificação jurídica dos factos e à medida da pena alegando que, nessa tarefa, o Colectivo violou, por erro de interpretação, o disposto no art.º 104º n.ºs 2 e 3 RGIT.
Os moldes em que a questão se mostra posta respeitam, primeiramente e afinal à qualificação jurídica dos factos, isto em termos de se mostrar preenchida a qualificativa do n.º 3 do art.º 104º RGIT.
A linha argumentativa dos recorrentes inicia-se pela análise da afirmação pelo Colectivo da respectiva incompetência material na apreciação do pedido de indemnização civil por o montante das prestações decorrentes de uma diminuição da matéria tributável da sociedade “AJ”, por força deduções indevidas de IVA e aumento de custos (IRC), isto pela consideração de que tais valores, como foi sustentado pela defesa dos arguidos, não terão contemplado custos que deviam ter sido considerados, encontrando-se tal questão a ser discutida em sede das impugnações apresentadas nos tribunais tributários. Daqui concluem os recorrentes que o tribunal assume desconhecer, ainda, o valor do tributo alegadamente em falta e da correspondente alegada vantagem patrimonial, o que gera a impossibilidade de albergar a moldura penal no n° 3 do citado dispositivo legal.
Dispõe o art.º 104º referido que “2 - A mesma pena [prisão de um a cinco anos para as pessoas singulares e multa de 240 a 1200 dias para as pessoas colectivas] é aplicável quando:
a)- A fraude tiver lugar mediante a utilização de facturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes ou por valores diferentes ou ainda com a intervenção de pessoas ou entidades diversas das da operação subjacente; ou
b)- A vantagem patrimonial for de valor superior a (euro) 50 000.
3–Se a vantagem patrimonial for de valor superior a (euro) 200 000, a pena é a de prisão de 2 a 8 anos para as pessoas singulares e a de multa de 480 a 1920 dias para as pessoas colectivas.”

Da citação do preceito invocado pelos recorrentes e na decisão recorrida, constata-se que o factor quantitativo referido no seu n.º 3 diz respeito a “vantagem patrimonial” e não a imposto ou prestação tributária em divida, realidades que não se confundem e nem sempre necessariamente coincidentes.
A decisão recorrida teve a possibilidade de afirmar qual o valor da “vantagem patrimonial” que a actuação conjunta dos arguidos conseguiu obter [143.Conseguindo assim diminuir a matéria tributável da sociedade “AJ , S.A.” e o imposto a entregar à Fazenda Nacional, quer em sede de IVA, no valor global de 3.815.861,93 €, quer em sede de IRC, no valor global 1.434.625,33 €, e assim alcançando a correspondente vantagem patrimonial que sabiam ser indevida.] correspondente à matéria tributável da sociedade AJ, S.A. que se mostrou diminuída por essa via.
Não deixamos de notar que o montante indemnizatório peticionado pelo M.º P.º coincide, antes dos juros à taxa legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento também peticionados, com o somatório das verbas ali tidas como calculadas a titulo de IVA e de IRC, mas o que se mostra relevante para a qualificação do ilícito (n.º 3) é o montante da vantagem patrimonial obtida e não o montante do(s) imposto(s) devido(s) e não pago(s), este(s) eventualmente a necessitar de operações mais complexas, como seja a aferição de parcelas ou custos a deduzir, para o respectivo cálculo.
Continuando a análise da impugnação da medida da pena formulada pelos agora recorrentes, estes qualificam-na de exagerada, apesar de próxima do limite mínimo do artigo 104°, n° 3 do RGIT, com o que consideram ter-se violado os princípios da adequação e proporcionalidade, isto porque não foi considerado que passaram já mais de 6 (seis) anos sobre a data dos factos alegadamente praticados entre 2006 e 2012 bem como não considerada a manifesta ausência de vantagem patrimonial para os aqui Recorrentes, terminando pelo entendimento de que a pena e a multa aplicadas deverão ser diminuídas.

Fazendo apelo à decisão recorrida, ali se mostra referido quanto à determinação da medida da pena:

“I–Apreciação Geral

Em termos de ilícitos, valorou-se:

Quanto ao crime, em geral, a pluralidade de actos realizados, o lapso de tempo considerado (seis anos e 3 meses) o estratagema usado pelos arguidos que envolveu alguma astúcia, o valor elevado do prejuízo patrimonial causado ao Estado, o modo de execução com alguma sofisticação, apenas detectável através do cruzamento de informações que nem sempre é feita designadamente por falta de meios técnicos e de recursos humanos.

O dolo foi sempre directo, ou seja, na sua modalidade mais grave, destacando-se, neste particular, dada a maior intensidade do dolo a actuação dos três primeiros arguidos (JMG em primeiro lugar, JTG  e FMA  de seguida).

O grau de ilicitude dos factos, elevado face ao valor do prejuízo causado ao Estado – 5.250.487,26€ - e à duração da conduta dos arguidos (seis anos e três meses).

A duração da actividade ilícita levada a cabo pelos arguidos (6 anos e 3 meses).

A gravidade das consequências para o Estado que ainda perduram.

As condições pessoais e a situação económica dos arguidos, em geral, todos estão plenamente integrados na sociedade e na família e desenvolvem actividade profissional regular. Destaque, neste ponto para o arguido AJE  que apresenta uma longa carreira profissional. 

Em geral, todos os arguidos gozam de bom estatuto social e boa integração familiar.
Não têm antecedentes criminais.
As exigências de prevenção geral são muito elevadas e prementes, face à proliferação deste tipo de crimes, à natureza do bem jurídico protegido com a presente incriminação e à prática reiterada e generalizada da fuga aos impostos. São crimes de grande danosidade social que lesam de forma deplorável as finanças públicas (o bem público).

II–Individualizando situações:
(…)

O arguido AJE

Tem um envolvimento distinto e inferior ao dos arguidos JMG, JTG  e FMA
Também este arguido começou a trabalhar muito cedo – aos catorze anos de idade – na área do comércio de produtos congelados tendo alcançado algum sucesso a trabalhar nesta área.
É tido como uma pessoa empenhada e responsável.
As suas motivações ficaram igualmente por esclarecer, admitindo-se, porém, que a sua relação de amizade e de gratidão para com o arguido JMG , tenham condicionado as suas opções e decisões e o tenham feito esquecer deveres profissionais que seguramente não desconhecia.
Tem uma longa vida activa. Este processo teve um forte impacto na sua pessoal e profissional  como resulta das suas declarações e do relatório social.
Factores que nos levam a concluir que a culpa do arguido é mediana e as exigências de prevenção especial não são muito elevadas.
Terá uma pena inferior à dos arguidos JTG  e FMA .
Assim, tudo ponderado, julgam-se adequadas as seguintes penas:
(…)
Arguido AJE – 2 anos e 9 meses de prisão.
(…)

Penas aplicáveis às pessoas colectivas ( ..) “G. , Lda”.

As sociedades arguidas não têm antecedentes criminais.
Na determinação da pena tem-se em conta, por um lado, a actividade desenvolvida por cada uma das sociedades, o grau de frustração das expectativas do Estado na obtenção das suas receitas e, por outro, o grau de vantagem obtida - neste caso é inquestionável que a “AJ ” foi a principal beneficiária - a ausência de antecedentes criminais, comum a todas, as exigências de prevenção geral, que são elevadas, as exigências de prevenção especial, que são mais intensas para as sociedades “AJ ”, “CSL” que, conforme resulta dos autos, se tem mantido activa, e G. ; Lda.”
As restantes sociedades, face ao que se apurou, estão inactivas e cessaram a sua actividade. Nestas circunstâncias as exigências de prevenção especial são mais reduzidas.
Tudo ponderado, julgam-se adequadas as seguintes penas:
(…) 
- “G. , Lda.” – 500 dias de multa, à taxa diária de 7€, o que perfaz a multa de 3.500€. “

Seguindo o percurso argumentativo dos recorrentes, a discordância dos recorrentes centra-se na consideração do princípio da proporcionalidade que conjugado com a circunstância de não ter sido valorado terem decorrido mais de seis anos sobre a data dos factos alegadamente praticados entre 2006 e 2012 bem como a manifesta ausência de vantagem patrimonial para os recorrentes.
Relativamente a este último pressuposto factual invocado pelos recorrentes importa referir que a sua responsabilização não decorre de uma qualquer vantagem patrimonial própria resulta da conduta ilícita mas sim, da co-autoria no ilícito de que resultou uma vantagem económica para terceiros, pelo que se mostra deslocada a sua invocação.
Ficamo-nos pela constatação de que de uma forma expressa não foi valorado o tempo decorrido desde os factos até ao momento da condenação. Porém, da leitura da decisão recorrida constata-se que este concreto factor veio a ser considerado na opção seguida pelo Colectivo de aplicação da pena substitutiva de suspensão de execução da pena de prisão quando ali afirma “não se lhes conhecem outros crimes posteriores à data da prática dos factos destes autos.”
A propósito do princípio da proporcionalidade considerado como violado com a medida da pena, refere-se no Ac. STJ de 18/12/2013, in www.gde.mj.pt/stj: “Em sede de violação do princípio da proporcionalidade, como pretende o recorrente, torna-se fundamental a necessidade de ponderação entre a gravidade da culpa expressa no facto e a gravidade da pena. Ao cometer um crime, o agente incorre na sanção do Estado, no exercício do seu direito de punir e esta sanção poderá importar uma limitação de sua liberdade.

Uma das principais ideias presente no princípio da proporcionalidade é justamente, invadir o menos possível a esfera de liberdade do indivíduo, isto é, invadir na medida do estritamente necessário à finalidade da pena que se aplica porquanto se trata de um direito fundamental que será atingido.

É certo que a determinação da concreta medida definitiva da pena tem sempre presente pontos de vista preventivos. Dado que o parâmetro da culpa representa um estádio na determinação da medida definitiva da pena a sua dimensão final fixa-se, também, de acordo com critérios preventivos dentro dos limites impostos pela culpa.

Também neste contexto a proibição de excesso tem uma importância determinante. Segundo o mesmo importa eleger a forma de intervenção menos gravosa que ofereça perspectivas de êxito e, assim, é possível que a dimensão concreta da pena varie dentro dos limites da culpa segundo a forma como se apresenta a concreta imagem de prevenção do autor. É justa aquela medida que se limita estritamente á obtenção da finalidade imprescindível. Como refere Liszt: "A pena necessária, neste sentido, é também a pena justa" .

Para Anabela Rodrigues a finalidade de prevenção geral que aqui está em causa é limitada pela referência ao bem jurídico e sua importância. Com o que o conteúdo da prevenção geral que aqui está em causa começa a ganhar contornos: a gravidade do facto cometido deve integrar esse conteúdo, servindo, além do mais, de limite à prevenção (A determinação da medida da pena privativa de liberdade pag 371.) Adianta a mesma Autora que O que se diz, pois, é que, exactamente do ponto de vista de um controlo racional preventivo da criminalidade que se justifique a partir da necessidade social da intervenção penal jurídico-constitucionalmente consagrada (artigo 18.°-2), é possível assinalar à prevenção geral um conteúdo que a impeça de excessos. Via a exigir que o efeito preventivo, a obter-se (apenas) mediante a confirmação da validade da norma jurídica violada, se realize em consonância com a função de protecção de bens jurídicos que cabe ao direito penal assegurar. Só assim, e ainda na medida em que esta função apenas se legitima se e enquanto não há outros meios para possibilitar a convivência pacifica dos homens em sociedade, a realização daquela finalidade de prevenção postulará a sua limitação pelo princípio da proporcionalidade. Princípio que não é mais do que um limite à intervenção penal derivado do fundamento da prevenção geral na necessidade social e que implica, no âmbito da medida da pena, que a sua gravidade seja adequada à gravidade da lesão do bem jurídico ocorrida. O que significa que, com isto, o efeito de prevenção geral que se quer obter - protecção de bens jurídicos -, radicado na necessidade, mediante o limite que constitui a própria referência ao bem jurídico, postula um limite à sua própria realização - a proporcionalidade -, com que nunca correrá o risco de se transformar numa prevenção geral de intimidação.

Na verdade, e atribuindo consistência prática ao exposto, as penas têm de ser proporcionadas à transcendência social- mais que ao dano social - que assume a violação do bem jurídico cuja tutela interessa prever. O critério principal para valorar a proporção da intervenção penal é o da importância do bem jurídico protegido porquanto a sua garantia é o principal fundamento da referida intervenção. (Norbert Barranco “El principio de proporcionalidad” pag 211)

A necessidade de proporcionalidade constitui também uma exigência do Estado democrático: um direito penal democrático deve ajustar a gravidade das penas á transcendência que para a sociedade têm os factos a que se ligam. Exigir uma proporção entre delitos e penas não é, com efeito, mais que pedir que a dureza da pena não exceda a gravidade que para a sociedade possui o facto punido.

Em termos redutores dir-se-á que a proporcionalidade entre a medida da pena e o crime a qual implica uma retribuição pelo Mal praticado pelo arguido é uma exigência da comunidade que só assim pode, e deve, aceitar a justiça encontrada no caso concreto.

Porém, a necessidade de respeito pelo ditame constitucional da proporcionalidade não pode postergar o facto de que o mesmo se consubstancia quando da determinação da medida da pena como imposição da dimensão da ilicitude e da culpa e da pena aplicável.
Na verdade, em termos dogmáticos é fundamento da individualização da pena a importância do crime para a ordem jurídica violada (conteúdo da ilicitude) e a gravidade da reprovação que deve dirigir-se ao agente do crime por ter praticado o mesmo delito (conteúdo da culpa).

A questão da proporcionalidade é, assim, uma questão de avaliar se a medida da pena valoriza devidamente a dimensão que a ilicitude e culpa apresentam no caso concreto, ou seja, saber se a pena aplicada é proporcional àqueles dois vectores que convergem na sua medida.”

Retomando o caso concreto, não é despiciendo relembrar o grau de ilicitude dos factos e à duração prolongada da conduta dos arguidos, as consequências para o Estado que ainda perduram, o dolo directo, ou seja, na sua modalidade mais grave, o modo de execução com alguma sofisticação, apenas detectável através do cruzamento de informações que nem sempre é feita designadamente por falta de meios técnicos e de recursos humanos, os bens jurídicos que estão em questão no caso do ilícito e cuja protecção se impõe seja reforçada na medida em que o sistema fiscal visa a repartição justa dos rendimentos e da riqueza, a diminuição das desigualdades dos cidadãos e a justiça social.
Com estes vectores em presença, podemos afirmar que as penas concretas, ligeiramente acima dos limites mínimos das molduras penais aplicáveis ao recorrente pessoa singular e à pessoa colectiva, reflectem uma ajustada fixação por relação ao grau de culpa e um equilíbrio para a reposição das expectativas comunitárias para a repressão quanto ao tipo de ilícito de que nos ocupamos, tudo em perfeita conformidade com o invocado princípio constitucional.

Decaem, assim, na totalidade os recursos interpostos pelos arguidos AJE  e G. , Lda.

2.–Recurso do arguido JMG :
(…)

Manifesta ainda o recorrente a sua divergência da decisão condenatória quanto à integração jurídica dos factos ali feita no tipo legal do crime de fraude fiscal do art.º 104º RGIT, mormente quanto ao preenchimento da circunstância qualificativa referida no n.º 3 do mesmo preceito incriminador, embora essa concreta questão não se mostre reflectida nas conclusões do recurso.
No entanto, sempre diremos:
Dispõe o art.º 104º referido que “ 3 - Se a vantagem patrimonial for de valor superior a (euro) 200 000, a pena é a de prisão de 2 a 8 anos para as pessoas singulares e a de multa de 480 a 1920 dias para as pessoas colectivas.”
O argumento que o recorrente invoca para concluir que a circunstância agravativa em questão não se mostra preenchida assenta na alegação de que o tribunal não fez a liquidação de qualquer vantagem patrimonial e determinou a remessa para os tribunais tributários para estes apurarem qual o valor da pretensa prestação tributária não cumprida, admitindo contudo que prestação tributária e vantagem patrimonial não são a mesma realidade.
Como já se mencionou na apreciação do recurso interposto pelo arguido AJE  acerca deste concreto aspecto “Da citação do preceito invocado pelos recorrentes e na decisão recorrida, constata-se que o factor quantitativo referido no seu n.º 3 diz respeito a “vantagem patrimonial” e não a imposto ou prestação tributária em divida, realidades que não se confundem e nem sempre coincidentes.
A decisão recorrida teve a possibilidade de afirmar qual o valor da “vantagem patrimonial” que a actuação conjunta dos arguidos conseguiu obter [143.Conseguindo assim diminuir a matéria tributável da sociedade “AJ , S.A.” e o imposto a entregar à Fazenda Nacional, quer em sede de IVA, no valor global de 3.815.861,93 €, quer em sede de IRC, no valor global 1.434.625,33 €, e assim alcançando a correspondente vantagem patrimonial que sabiam ser indevida.] correspondente à matéria tributável da sociedade AJ , S.A. que se mostrou diminuída por essa via.
Não deixamos de notar que o montante indemnizatório peticionado pelo M.º P.º coincide, antes dos juros à taxa legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento também peticionados, com o somatório das verbas ali tidas como calculadas a titulo de IVA e de IRC, mas o que se mostra relevante para a qualificação do ilícito (n.º 3) é o montante da vantagem patrimonial obtida e não o montante do(s) imposto(s) devido(s) e não pago(s), este(s) eventualmente a necessitar de operações mais complexas, como seja a aferição de parcelas ou custos a deduzir, para o respectivo cálculo.”,
Tal como ali, também aqui somos de concluir que a circunstância qualificativa de o montante da vantagem patrimonial exceder 200 000 euros se mostra preenchida.
Decai também o recurso nesta parte.

3.–Passando a conhecer dos recursos interposto pelos arguidos FMA  e sociedades ARH , Lda.”, “AXXI , Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal” e pela “CSL – Sucursal em Portugal:

A primeira das questões mostra-se dirigida a uma pretensa violação do principio ne bis in idem, centrando os recorrentes essa violação no facto de o arguido FMA e a sociedade AHL – Sucursal em Portugal terem sido julgados no P.º 93/15.6T9SXL do Juízo Local Criminal de Seixal, Comarca de Lisboa, e condenados por crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social e, o arguido Francisco Adão e a sociedade CSL – Sucursal em Portugal, no P.º 16/14.0TAOER do Juízo Local Criminal de Oeiras, Comarca de Lisboa Oeste, e condenados por crime de abuso de confiança agravado. Continuam argumentando que, estando em causa um crime continuado - por a factualidade provada e objecto das decisão atrás identificadas e a constante dos presentes autos constituírem a realização plúrima de um mesmo tipo de crime no quadro de permanência de um mesmo circunstancialismo – a infracção mais grave já foi julgada, pelo que não pode o arguido ser novamente julgado e condenado.
Acerca das condenações sofridas pelos recorrentes nos processos nº 2/99.8IDBJA, sabemos apenas o que consta do ponto 45 da matéria de facto provada: que o arguido FAPS foi condenado nesses autos, por decisão transitada em julgado no dia 19/9/05, pela prática, no dia 28/3/98, de um crime de fraude fiscal p. e p. pelo art. 103º, n.º 1, al. c) do RJIT, na pena de 160 dias de multa à taxa diária de € 6.

Não consta da factualidade julgada provada, na sentença recorrida, qualquer elemento relativo aos factos dados como provados na sentença proferida no processo nº 93/15.6T9SXL e 16/14.0TAOER e que motivaram a condenação então infligida aos, alguns, ora recorrentes. Ao invés, dá-se como provado: “149.      Os arguidos, pessoas singulares e colectivas, não têm condenações averbadas nos seus certificados de registo criminal.”
Contudo, o conhecimento desses factos concretos não se mostra indispensável para dirimir a questão jurídica que nos ocupa.
No P.º 51/04.6TABJA.E2 que foi objecto de acórdão da Relação de Évora datado de 16.06.2015, disponível em www.gde.mj.pt/jtre, mostra-se citado o parecer ali emitido pela Exma. PGA em funções junto desse Tribunal que tratou de forma aprofundada as implicações do princípio invocado nos seguintes moldes:
“A lei fundamental ao referir-se ao duplo julgamento e ao mesmo crime carece, contudo, de interpretação, a qual, conforme referem Gomes Canotilho e Vital Moreira em Constituição da República Portuguesa Anotada (1978), 21 e 55, deverá ter em especial atenção que os preceitos constitucionais não podem ser considerados isoladamente e interpretados a partir de si próprios, devendo assim considerar-se as conexões de sentido que se estabelecem entre os seus preceitos, bem como a "arquitectura sistemática" de cada divisão da Constituição.
Por outro lado, certo é também que a tarefa interpretativa dos preceitos constitucionais não prescinde igualmente de uma visão global dos ramos de direito em que se projectam e que ao fim e ao cabo pretendem nortear.
A expressão "mesmo crime" não deve ser interpretado, no discurso constitucional, no seu estrito sentido técnico-jurídico, "mas antes entendido como uma certa conduta ou comportamento, melhor como um dado de facto ou acontecimento histórico que, porque subsumível em determinados pressupostos de que depende a aplicação da lei penal, constitui um crime. É a dupla apreciação jurídico-penal de um determinado facto já julgado - e não tanto de um crime - que se quer evitar. O que o n.º 5 do art. 29.° da C.R.P. proíbe, é no fundo, que um mesmo concreto objecto do processo possa fundar um segundo processo penal" Frederico Isasca, Alteração Substancial dos Factos e sua Relevância no Processo Penal Português, pág 221, citando Gomes Canotilho e Vital Moreira,
"Na base do instituto em questão, está, no fundo a própria dignidade da pessoa humana, base da soberania de um Estado Democrático em que o indivíduo é credor do respeito pelos seus direitos e liberdades fundamentais - art°s 1 ° e 2° da CRP. Ao impedir um segundo julgamento - portanto, as decisões judiciais, quer condenatórias quer absolutórias - pelo mesmo crime está a garantir-se, àquele que viveu a dramática experiência de um processo penal, que não possa mais, por aquele acontecimento, voltar a ser incomodado, assegurando-se, assim,
ad futurum, a paz jurídica ao cidadão". Frederico Isasca, mesma obra, pág. 220 e ss.
E acrescenta ainda o referido autor que" o caso julgado se fundamenta, também num postulado axiológico, qual seja o da justiça da decisão do caso concreto. Parte-se do pressuposto de que a verdade apurada corresponde à verdade material na qual assenta a decisão jurídica que, uma vez transitada em julgado, se cristaliza como verdade absoluta.
Os limites do instituto do caso julgado estão condicionados pelo objecto do processo.
O objecto do processo é fixado pela acusação ou pelo despacho de pronúncia, sendo estes que, à partida, delimitam os poderes de cognição do tribunal - art. 1º, n.º 1, al. f), 283.°, 303º, 308º, 358º, 359.°, 379.°, n.º 1, al. b); Figueiredo Dias, "Direito Processual Penal", Vol. I (1981), pág. 145.
Mas o que se deve entender por objecto de um processo? O mesmo crime, sua qualificação jurídica? Os mesmos factos?
Tem de haver "identidade ou coincidência fundamental dos bens jurídicos - logo, dos tipos legais de crime.
Estaremos, em regra, "perante o mesmo crime quando os factos provados em julgamento, no seu relacionamento com os acusados, dão lugar a uma situação de concurso aparente ou de continuação criminosa, formando com eles uma unidade jurídico-normativo ( ... ); e bem assim nos casos em que se mantém firme a incriminação, embora com alteração de factos que lhe servem de apoio: alteração, entenda-se, não essencial, por forma que continuam passíveis do mesmo juízo de valoração social".
Mas já haverá uma diversidade de crimes "quando o material fáctico colhido em julgamento redunde numa situação de concurso efectivo, real ou ideal (...); e ainda quando, diferindo essencial ou estruturalmente do que serviu de suporte à acusação, transmite agora uma realidade diferente e impõe, em consequência, uma diferente avaliação social, sem prejuízo de manter-se eventualmente a sua qualificação jurídica". Robalo Cordeiro "o Novo Código Processo Penal" (1997), p. 304/5, sobre "A audiência de julgamento".
Vem-se entendendo na jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores: «O artigo 29°, n.º 5, da Constituição dispõe que "ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime".
Segundo J. J. GOMES CANOTlLHO e VITAL MOREIRA (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3a edição, Coimbra, 1993, página 194), este preceito constitucional "proíbe rigorosamente o duplo julgamento e não a dupla penalização, mas é óbvio que a proibição do duplo julgamento pretende evitar tanto a condenação de alguém que já tenha sido definitivamente absolvido pela prática da infracção, como a aplicação renovada de sanções jurídico-penais pela prática do mesmo crime" [Sobre uma aplicação do principio ne bis in idem e a sua conjugação com o direito à revisão de sentenças condenatórias - n.º 6 do artigo 29° -, cf. o acórdão n.º 158 da Comissão Constitucional (publicado no Apêndice ao Diário da República, de 31 de Dezembro de 1979, página 68 a 71)].
Verdadeiramente, pois, o que importa é saber se se está perante a "prática do mesmo crime" ou perante um concurso efectivo de infracções, quer este concurso seja real, quer seja ideal (Sobre todos estes conceitos, cf. EDUARDO CORREIA, Unidade e Pluralidade de Infracções, Coimbra,).
É que, sendo o concurso de crimes efectivo, e não meramente aparente, a dupla penalização não viola o princípio constitucional do ne bis in idem. E isto, porque as sanções, que cada uma das normas penais que se encontram em concurso prevê, se destinam, cada uma delas, a punir a violação de um bem jurídico diferente; ou, então, porque o bem jurídico, que a mesma conduta viola por mais do que uma vez, é um bem jurídico eminentemente pessoal. Em ambos os casos, não se está em presença do mesmo crime, embora se esteja em presença do mesmo facto ou da mesma acção delituosa. O que vale por dizer de uma mesma conduta naturalística.
Para decidir se existe um único crime ou um concurso efectivo de crimes, há que recorrer - recordam aqueles autores (ob. e loco cit.) - "aos conceitos jurídico-processuais e jurídico-materiais desenvolvidos pela doutrina do direito e processo penais". AcTConstitucional n° 102/99
«( ... ) o n° 5 do artigo 29° da Constituição, ao determinar que "ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime", tem em vista não apenas o duplo julgamento mas ainda a dupla incriminação ou penalização (cf. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portuguesa anotada, 33 ed., Coimbra, 1993, pág. 194).
Na sua vertente substantiva (cf. GERMANO MARQUES DA SILVA, Direito Penal Português, I, Lisboa, 1997, pág. 305, nota 2), o princípio "ne bis in idem" proíbe a plúrima punição da mesma infracção. Este princípio não é, porém, incompatível com a valoração plural do mesmo facto ou da mesma acção.
A doutrina penalista portuguesa, na esteira de EDUARDO CORREIA (Unidade e pluralidade de infracções, passim, in A teoria do concurso em Direito Criminal, reimp., Coimbra, 1983) defendeu a aplicação do regime do concurso efectivo de crimes - com o inerente afastamento do chamado concurso aparente, ou concurso de normas -, que se traduz entre nós na realização de um cúmulo jurídico das respectivas penas (v. artigos 77° e 78° do Código Penal), quer ao chamado concurso real, quer ao denominado concurso ideal de crimes. O n.° 1 do artigo 30° do Código Penal de 1982 veio justamente consagrar tal aplicação, mediante uma equiparação das duas modalidades de concurso de crimes. No último caso (concurso ideal), um único facto ou acção é multiplamente qualificado como crime, quer por força da violação simultânea de mais do que uma norma incriminadora (concurso ideal heterogéneo), quer por força da ofensa plural da mesma norma incriminadora (concurso ideal homogéneo).
É muito complexa a questão de saber quais os limites que constitucionalmente condicionam a possibilidade de tratar como concurso efectivo e não como mero concurso aparente determinado comportamento tipificado na lei penal. Mas não basta evidentemente invocar a punição plural de um facto ou acção unitários para se ter como demonstrada uma violação do n.° 5 do artigo 29° da Constituição.
O apuramento de tal violação pressupõe que as normas em causa sancionem - de modo duplo ou múltiplo - substancialmente a mesma infracção.
A contrariedade ao princípio "ne bis in idem" depende assim da identidade do bem jurídico tutelado pelas normas sancionadoras concorrentes, ou do desvalor pressuposto por cada uma delas. Ac T Constitucional n° 244/99.

Do douto parecer transcrito extrai-se que o princípio «ne bis in idem» não constitui obstáculo a que alguém possa ser julgado por factos naturalísticos, total ou parcialmente coincidentes com aqueles, pelos quais já tenha respondido no âmbito de outro processo, desde que os factos sejam subsumidos a um tipo criminal diverso, que se encontre numa relação de concurso efectivo para com aquele que motivou o primeiro processo.
A pedra de toque, que permite distinguir entre as relações de concurso efectivo e outras realidades, reside na não identidade dos bens jurídicos tutelados por cada uma das normas incriminadoras em confronto.

O crime de fraude fiscal, pelo qual o recorrente foi condenado no presente processo é tipificado pelo n.º 1 do art.º 103º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT):
1– Constituem fraude fiscal, punível com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias, as condutas ilegítimas tipificadas no presente artigo que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a obtenção indevida de benefícios fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias. A fraude fiscal pode ter lugar por:
a)- Ocultação ou alteração de factos ou valores que devam constar dos livros de contabilidade ou escrituração, ou das declarações apresentadas ou prestadas a fim de que a administração fiscal especificamente fiscalize, determine, avalie ou controle a matéria colectável;
b)- Ocultação de factos ou valores não declarados e que devam ser revelados à administração tributária;
c)- Celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas.

Por sua vez, o tipo criminal de abuso de confiança contra a Segurança Social, objecto dos P.ºs 93/15.6T9SXL e 16/14.0TAOER nos quais o recorrente afirma ter sido julgado e condenado, mostra-se definido pelos artigos 107.º, número 1, e 105.º, números 1 e 5, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) nos seguintes termos:

Art.º 107º
“1- As entidades empregadoras que, tendo deduzido do valor das remunerações devidas a trabalhadores e membros dos órgãos sociais o montante das contribuições por estes legalmente devidas, não o entreguem, total ou parcialmente, às instituições de segurança social, são punidas com as penas previstas nos n.os 1 e 5 do artigo 105.º
2- É aplicável o disposto nos n.os 4 e 7 do artigo 105.º”

E do art.º 105º
“4– Os factos descritos nos números anteriores só são puníveis se:
a)- Tiverem decorrido mais de 90 dias sobre o termo do prazo legal de entrega da prestação;
b)- A prestação comunicada à administração tributária através da correspondente declaração não for paga, acrescida dos juros respectivos e do valor da coima aplicável, no prazo de 30 dias após notificação para o efeito.
(…)
7–Para efeitos do disposto nos números anteriores, os valores a considerar são os que, nos termos da legislação aplicável, devam constar de cada declaração a apresentar à administração tributária.”

Como pode verificar-se, o bem jurídico tutelado pela norma que prevê e pune o crime de abuso de confiança contra a Segurança Social é integrado, antes do mais, pelas receitas da Segurança Social, nunca poderá perder-se de vista a singularidade do financiamento desta. Singularidade que assenta em princípios como o da sustentabilidade, autonomia orçamental, reserva de lei, ou contributividade, e que não interessam da mesma maneira na área da fiscalidade.

Diferentemente, aquilo que se pretende garantir, com a punição da fraude fiscal, é a efectiva arrecadação dos impostos por parte
do erário público.

É certo que estão em causa, em ambos os casos, dinheiros públicos, mas em momentos e perspectivas completamente diferentes: no momento da sua cobrança pelo Estado, quanto à fraude fiscal; no momento da sua aplicação no apoio à actividade económica, no que se refere à fraude na obtenção de subsídio ou subvenção.


Nesta conformidade, teremos de concluir que os factos objecto da condenação recorrida, em relação aos factos já julgados nos processos anteriores, preenchem assim um novo tipo de crime que com aqueles concorre efectivamente e, consequentemente, pela inexistência de identidade entre os bens jurídicos tutelados por cada um dos tipos de crime em confronto, pelo que os dois se encontram numa relação de concurso efectivo.
Acrescentamos ainda que a diversidade de bem jurídico em relação aos crimes já julgados nos outros processos (de abuso de confiança fiscal), mais precisamente a ausência identitária de bem jurídico ao nível exigido pelo n.º 2 do art.º 30º do Código Penal, obsta a que seja juridicamente admissível uma continuação criminosa que pudesse abarcar todas as condutas.
Assim, mesmo na hipótese de a conduta naturalística pela qual o recorrente responde no presente processo coincidir com aquela por que ele respondeu no âmbito dos por si mencionados processos, o julgamento do arguido e a condenação contra ele proferida nestes autos não é ofensiva do princípio constitucional ne bis in idem.

Como segunda questão, apontam os arguidos que o acórdão enferma de nulidade por vício de contradição insanável entre factos provados e a decisão, fazendo incidir essa nulidade sobre a consideração ali feita, em sede de matéria de facto provada - pontos 6 e 22 -, de que o recorrente FMA  era gerente, de facto e de direito, das sociedades aqui também arguidas e recorrente, vindo na decisão e invertendo toda a lógica que até então deu por confirmada, a condenar o recorrente porquanto se limitou a ser um “testa de ferro”.
Com o devido respeito pelo entendimento seguido pelo recorrente “que o recorrente FMA  era gerente, de facto e de direito, das sociedades aqui também arguidas”, a primeira nota correctiva que se impõe seja feita reporta-se aos factos provados trazidos à discussão pelo recorrente que não dizem exactamente o que refere. Na realidade, no ponto provado 6 refere-se a qualidade de gerente de direito pelo recorrente por relação às sociedades co-arguidas em cuja constituição interveio, qualidade essa reafirmada no ponto provado 22, ao passo que a gerência de facto das mesmas se mostra atribuída ao arguido JMG . 
Assim, desse mero aspecto correctivo se conclui que nenhuma contradição insanável se verifica, tanto mais que não se mostra explicado onde se mostra dito na decisão recorrida que o recorrente é testa de ferro de alguém ou em que consiste essa qualidade.
O vício previsto no art.º 410.°, n.º 2, al. b), do C.P.P., só existe "quando, de acordo com um raciocínio lógico na base do texto da decisão, por si só ou conjugado com regras da experiência comum, seja de concluir que a fundamentação justifica decisão oposta, ou não justifica a decisão, ou torna-a fundamentalmente insuficiente, por contradição insanável entre factos provados, entre factos provados e não provados, entre uns e outros e a indicação e a análise dos meios de prova fundamentos da convicção do tribunal" - Ac. do STJ de 6/10/1999 e 13/10/1999, in "A Tramitação Processual Penal", 1058, Tolda Pinto - ou, ainda segundo acórdão do mesmo STJ, de 2/12/1999, Proc. n.° 1046/99, 5.a Secção, "quando se dá como provado e como não provado o mesmo facto, quando se afirma e se nega a mesma coisa, ao mesmo tempo, ou quando, simultaneamente, se dão como provados factos contraditórios ou quando a contradição se estabelece entre a fundamentação probatória da matéria de facto, sendo ainda de considerar a existência de contradição entre a fundamentação e a decisão, tendo este vício de resultar do próprio texto da decisão recorrida, por si ou conjugada com as regras da experiência comum".
Ora, o cerne da responsabilização penal do recorrente mostra-se mencionado na decisão recorrida nos seguintes moldes: “Resulta da matéria de facto provada que os arguidos, praticando embora actos diversos - actuaram com um desígnio comum.
A responsabilidade do arguido FMA  advém da sua intervenção em tais factos, em representação de sociedades que sabia que não eram efectivas prestadoras de serviço e que a facturação emitida em seu nome não tinha subjacente qualquer prestação de serviço. 
Na verdade, embora os arguidos FMA  e AJE  não tivessem a qualidade de sujeitos passivos, para efeitos fiscais, e consequentemente a obrigação de pagarem os impostos em causa, a verdade é que todos eles de forma concertada e cada um com os actos concretos que praticou com vista ao resultado final, actuaram em conjunto, pelo que se mostram verificados os requisitos da co-autoria.

O arguido FMA  participou na constituição de cada uma das sociedades criadas, assumindo formalmente a qualidade de seu gerente de direito, pese embora a gerência, de facto, fosse exercida pelo arguido JMG . ”, isto em termos de definição do tipo de responsabilização pessoal, ou seja, com que qualidade, de autoria ou de cumplicidade, se lhe mostram imputados os factos.
Inexiste o apontado vício.

Um segundo tipo de argumentação a propósito de nulidades apontadas ao acórdão condenatória diz respeito à não suspensão do procedimento criminal, oportunamente requerida pelos arguidos, ou parte deles, por virtude de se mostrarem pendentes impugnações junto dos tribunais tributários e cuja decisão se mostrou veio a ser considerada essencial pelo tribunal quando admitiu não poder julgar o pedido de indemnização civil.
Já tivemos oportunidade de anteriormente referir que o indeferimento da suspensão por despacho, proferido a 23.02.2017 (fls. 5152 e seguintes), não foi objecto de qualquer recurso, pelo que a argumentação tecida acerca desse assunto se mostra ultrapassada.
Na medida em que não houve qualquer recurso quanto à (não) decisão sobre o pedido de indemnização civil, mormente por parte do M.º P.º que o deduziu, não nos vamos pronunciar sobre a bondade da solução tida no acórdão quanto ao respectivo não conhecimento.
Porém, porque o recorrente extrai desse não conhecimento de mérito do pedido que não se mostra preenchida a condição objectiva de procedibilidade do art.º 105º n.º 4 al. b) RGIT o que conduzirá forçosamente à impossibilidade de condenação dos arguidos, sempre diremos:
A condição estabelecida na al. b) do n.º 4 do art.º 105º RGIT é uma condição objectiva de punibilidade [Os factos descritos nos números anteriores só são puníveis se… ] mas cuja aplicação não se estende ao crime de nos ocupamos nos presentes autos.
Na realidade, a respectiva inserção mostra-se feita por relação ao tipo legal do crime de abuso de confiança fiscal descrito no n.º 1 do mesmo preceito, mostrando-se omissa a respectiva exigência no tipo legal definidor do crime de fraude fiscal, o que se mostra compreensível uma vez que na primeira dos ilícitos referidos, a prestação fiscal em divida mostra-se determinada e, daí, a notificação para o respectivo pagamento, ao passo que, no segundo dos ilícitos, essa determinação não se mostra possível por desconformidade/não verdade da declaração fiscal feita pelo contribuinte. 
Não sendo aplicável ao crime em questão nos autos a apontada condição de punibilidade não ocorre, pois, a invocada nulidade.

Invocam ainda os recorrentes que existe violação do princípio da proibição de actos inúteis na medida em que, apesar das várias diligências praticadas, o tribunal chegou à conclusão de que não se pode pronunciar sobre o "quantum" do montante indemnizatório em cujo pagamento havia sido requerido no pedido de indemnização civil os arguidos fossem condenados.
A primeira observação que se nos oferece dizer diz respeito à natureza taxativa das nulidades em processo penal, seja por relação ao processo em si, estipuladas no art.º 120 CPP, seja por relação às sentenças, constantes do art.º 379º CPP, em que claramente não se vislumbra a agora invocada.
Defendem os recorrentes que existe uma eventual decisão de inexistência de obrigação tributária, por se apresentar a mesma como um acto praticado pela administração tributária em plena desconformidade com o Direito e em clara Violação do Princípio da Legalidade, importava assim acautelar os direitos dos aqui arguidos recorrentes, sem contudo conseguirem adiantar onde descortinam essa possível inexistência, nem se mostram capazes de apontar que direitos dos recorrentes em concreto importava serem acautelados.
No entanto, sempre diremos que, pelos termos como se desenvolve a invocada violação, existe uma confusão dos recorrentes entre o que é um acto inútil e a não prova de qualquer facto, no caso, do concreto dano causado ao erário público. Na realidade, o que se constata da decisão recorrida quanto a este aspecto é que o tribunal, mesmo depois de produzida toda a prova, chegou à conclusão de que não foi possível determinar o montante indemnizatório, ou seja, a prova não se mostrou suficiente para essa quantificação. Não vemos, por outro lado, que actos processuais em concreto foram praticados e se mostraram inúteis. Seria o próprio julgamento?!
Se a alegação assenta no argumento de que não estando qualquer valor objectivamente quantificado, não pode o douto Tribunal a quo vir determinar e sentenciar um qualquer arguido pela prática de um crime de fraude fiscal qualificada, p.p. artigo 104.°/2, a) RGIT, na medida em que tem implícito precisamente o montante em causa, então só podemos afirmar que a leitura que os recorrentes fazem da alínea a) do preceito invocado se mostra deslocada dos seus próprios termos pois aquela forma agravada do crime de fraude fiscal não se mostra ligada ao valor da vantagem patrimonial obtida, mas apenas por decorrência do modo como a fraude em si é cometida, ou seja, depois de afirmado a forma agravada por preenchimento das circunstâncias agravativas do art.º 104º n.º 1, alíneas a) e d), também a do n.º 2, alínea a) se verifica. Daqui retiramos que qualquer referência a valores ou montantes teriam de ser entendidos como referindo-se ao montante indicado no n.º 2 do art.º 103º RGIT na medida em que o valor de 15.000 euros ali previsto integra o tipo de ilícito e estende-se ao tipo qualificado do art.º 104º do RGIT, que não prevê um tipo autónomo mas um conjunto de circunstâncias qualificadoras do ilícito base.
A propósito da questão da agravação determinada pelo valor da vantagem patrimonial obtida pelos arguidos, o que se mostra relevante não é a concreta determinação da prestação tributária que se mostra em divida, ou passível de vir a ser apurada como sendo devida.
O resultado vantagem patrimonial ilegítima, visado ou alcançado com as condutas, não constitui um elemento objectivo do tipo de ilícito, não importando, por conseguinte, para determinar o momento da consumação do crime (não obstante, não ser crime de resultado o desvalor de resultado, se o houver pode ser relevante, designadamente para efeitos de determinação da medida da pena, e outros).
De acordo com o disposto no art.º 103º, nº 2, do RGIT, os factos não são puníveis se a vantagem patrimonial ilegítima for inferior a €15.000,00.
O tipo não exige que o perigo venha efectivamente a verificar-se, mas permite que seja objecto de um juízo negativo que exclui a responsabilidade penal, no caso em que o comportamento proibido não seja idóneo a provocar uma vantagem patrimonial igual ou superior a €15.000,00.
A cláusula de valor monetário surge, assim, para objectivar a perigosidade merecedora de pena. Através dela o legislador delimita com segurança o patamar mínimo de ofensividade do facto, pela associação de tal valor à sua aptidão lesiva (trata-se de um referente valorativo que delimita o facto proibido); e, ao mesmo tempo, separa o ilícito penal do ilícito de mera ordenação social.
O sujeito passivo poderá, a dado momento, não saber com exactidão se ultrapassa os €15.000,00, mas será difícil de conceber que uma pessoa que representa a sua conduta como proibida e que pode originar uma diminuição de receitas não aja conformando-se com essa realização, dado o risco que assume, ou seja, que pelo menos não actue com dolo eventual, mormente quando decorre dos factos provados que com a integração e contabilização das facturas emitidas pelas agora recorrentes na escrita da sociedade arguida “AJ, S.A.”, inscrevendo-as quer nas declarações periódicas de IVA, quer nas declarações anuais de IRC, nos exercícios a que as mesmas se reportavam, como custos efectivos, conseguiram, por essa via, diminuir a matéria tributável da sociedade “AJ, S.A.” e o imposto a entregar à Fazenda Nacional, quer em sede de IVA, no valor global de 3.815.861,93 €, quer em sede de IRC, no valor global 1.434.625,33 €, e assim alcançando a correspondente vantagem patrimonial que sabiam ser indevida, muito superior à vantagem patrimonial ilegítima de 15.000,00€ referida no n.º 2 do art.º 103º e do valor referido no n.º 3 do art.º 104º RGIT.
O que acabamos de afirmar esvazia de fundamento o que se mostra alegado pelos recorrentes na conclusão 19, acerca da composição do tribunal para o julgamento do processo.

Desenvolvem ainda os recorrentes argumentos relativos à valoração dos depoimentos das testemunhas Inspectores da autoridade Tributária na parte em que os mesmos se remetiam para o conteúdo do relatório que haviam elaborado no final do inquérito, classificando tais depoimentos como testemunhos de “ouvir dizer” e não aceitando a respectiva utilização enquanto meio de avivar memória das testemunhas.
Neste concreto aspecto, convém relembrar que, conforme dos autos resulta (audiência de julgamento e acórdão recorrido), as referidas testemunhas Inspector RC e IS , são os autores do relatório em questão e realizaram diligências externas que vieram a ser consignadas no mesmo tudo produzido durante a pendência e dentro do inquérito.
Nos depoimentos que prestaram em audiência relataram as diligências realizadas no âmbito do inquérito e os elementos que recolheram.
Relatou o resultado das informações e documentação obtidas junto de diversas sociedades, quanto à existência ou não de trabalhadores ao serviço das sociedades arguidas.
Deram ainda conta das indagações feitas junto das inspeccionadas, averiguando se as mesmas dispunham de contabilidade/escrituração e se tinham cumprido qualquer obrigação fiscal perante a administração tributária. E ainda se dispunham de instalações, funcionários ou equipamentos que permitissem desenvolver a actividade declarada na facturação emitida em nome delas.
Ora, seria conatural a essas diligências investigatórias que as referidas testemunhas, no âmbito das acções de investigação levadas a cabo, tenham recolhido depoimentos e ouvido em declarações indivíduos que ora assumem a qualidade de arguidos e testemunhas, o que não torna inválidos os seus depoimentos.
O seu depoimento foi prestado de forma clara, coerente e objectiva, baseada nos elementos objectivos que recolheram junto de diversas entidades e recolhidos nas contabilidades das sociedades arguidas inspeccionadas. Vale pelo enquadramento da investigação criminal e pela descrição das acções levadas a cabo, sistematizando-as e dando relato das diversas diligências do inquérito. As suas declarações não valem por si próprias relativamente a nenhum dos factos a comprovar, tal como foi expressamente referido pelo acórdão aqui impugnado: a sua valoração não assentou em quaisquer afirmações baseadas em depoimentos ou declarações recolhidos no âmbito de qualquer acção inspectivas que levaram a cabo, mas no relato que fizeram e no conhecimento que demonstraram com base nos elementos objectivos que recolheram no inquérito e no por si directamente percepcionado aquando de deslocações a instalações ou locais referidos nos autos, quanto às características destas, por conseguinte respeitando o disposto nos artigos 124º, 125º, 355º e 356º, º 7 do CPP”.
Por outro lado, a lei processual penal não deixa de prever a tomada de providências cautelares quanto aos meios de prova por parte dos órgãos de polícia criminal, competindo-lhes, designadamente, "colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime e a sua reconstituição" (Art.º 249.º, n.ºs 1 e 2, alínea b), do CPPenal), providências essas em cujo âmbito a acção aqui em causa se inseriu.
No Acórdão do STJ de 15/2/2007, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj refere-se “I - Relativamente ao alcance da proibição do testemunho de "ouvir dizer", pode considerar-se adquirido, por um lado, que os agentes policiais não estão impedidos de depor sobre factos por eles detectados e constatados durante a investigação e, por outro lado, que são irrelevantes as provas extraídas de "conversas informais" mantidas entre esses mesmos agentes e os arguidos, ou seja, declarações obtidas à margem das formalidades e das garantias que a lei processual impõe. II - Pretenderá, assim, a lei impedir, com a proibição destas "conversas", que se frustre o direito do arguido ao silêncio, silêncio esse que seria "colmatado" ilegitimamente através da "confissão por ouvir dizer" relatada pelas testemunhas. III - Pressuposto desse direito ao silêncio é, no entanto, a existência de um inquérito e a condição de arguido: a partir de então, as suas declarações só podem ser recolhidas e valoradas nos estritos termos indicados na lei, sendo irrelevantes todas as conversas ou quaisquer outras provas recolhidas informalmente. IV- De forma diferente se passam as coisas quando se está no plano da recolha de indícios de uma infracção de que a autoridade policial acaba de ter notícia: compete-lhe praticar "os actos necessários e urgentes para assegurar os meios de prova", entre os quais, "colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime" (art. 249.º do CPP). V- Esta é uma fase de pura recolha informal de indícios, que não é dirigida contra ninguém em concreto; as informações que então forem recolhidas pelas autoridades policiais são necessariamente informais, dada a inexistência de inquérito. Ainda que provenham de eventual suspeito, essas informações não são declarações em sentido processual, precisamente porque não há ainda processo. VI - Completamente diferente é o que se passa com as ditas "conversas informais" ocorridas já durante o inquérito, quando já há arguido constituído, e se pretende "suprir" o seu silêncio, mantido em auto de declarações, por depoimentos de agentes policiais testemunhando a "confissão" informal ou qualquer outro tipo de declaração prestada pelo arguido à margem dos formalismos impostos pela lei processual para os actos a realizar no inquérito. VII - O que o art. 129.º do CPP proíbe são estes testemunhos que visam suprir o silêncio do arguido, não os depoimentos de agentes de autoridade que relatam o conteúdo de diligências de investigação, nomeadamente a prática das providências cautelares a que se refere o art. 249° do CPP.".
No mesmo sentido, o Ac. da RL de 24/1/2012, processo n.° 35/07.2PJAMD.L1-5, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrl. Neste acórdão faz-se referência a doutrina e jurisprudência no mesmo sentido da seguinte transcrição: "(...)Na mente de algumas pessoas, persiste a ideia de que os órgãos de polícia criminal (OPC) sofrem de uma espécie de capitis diminutio que os excluiria da prova testemunhal (no seu "Código de Processo Penal Anotado", 9.a edição, o Sr. Conselheiro Maia Gonçalves, dá-nos notícia dessa tese peregrina). É óbvio que nada impede um inspector da Polícia Judiciária, um agente da PSP, um soldado da GNR, efe, de depor sobre factos de que tomou conhecimento. Por outro lado, é, igualmente, claro que não se questiona aqui a proibição de um órgão de polícia criminal depor sobre o conteúdo de declarações que recolheu, quer de testemunhas, quer de pessoas já constituídas arguidas, e que foram formalizadas em auto (n.° 7 do art.° 356.° do Cód. Proc. Penal). A questão coloca-se em relação às declarações não formalizadas em auto prestadas perante um órgão de polícia criminal: é admissível e poderá ser valorado o depoimento de um agente da polícia que reproduz o que ouviu dizer à vítima de um crime ou a uma pessoa que depois vem a ser constituída arguida?
(...) É evidente que aos órgãos de polícia criminal não está vedado ter com determinadas pessoas conversas que não são formalizadas em auto. Essas conversas podem reportar-se a factos que estão em investigação e a fonte de informação pode até ser um suspeito do crime investigado.
Aliás, ao abrigo do disposto nos artigos 55.°, n.º 2, 249.º e 250.º do Código de Processo Penal, os órgãos de polícia criminal podem e devem colher notícias do crime, descobrir os seus agentes e praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova, nomeadamente colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime e a sua reconstituição.
Nada impede que os agentes de investigação, em audiência, deponham sobre o conteúdo dessas diligências, incluindo sobre o conteúdo das conversas havidas com suspeitos que, entretanto, foram constituídos arguidos e mesmo que estes, na audiência, se remetam ao silêncio.
Essencial é, no entanto, que as conversas não visem contornar ou iludir a proibição contida no n.º 7 do art.° 356° do Cód. Proc. Penal e que seja respeitado o comando do art.° 59° do mesmo diploma legal.".
Nessa perspectiva não se vislumbram, assim, qualquer impedimento, ou proibição de depoimento que incide sobre aspectos, orais ou materiais, descritivos ou impressivos, narrativos ou conclusivos, que a lei não obriga a estar registados em auto ou, ainda, relativamente a diligências ou meios de obtenção de prova que tenham autonomia material e jurídica (v.g. apreensões, buscas, etc….), quer quanto ao meio de prova que geram (por exemplo escutas telefónicas de declarações de arguido, transcritas, cuja leitura do auto é permitida, não obstante no original da declaração estar a oralidade), bem como quanto a afirmações não retratáveis em auto que o arguido tenha proferido na ocasião da realização de diligências e meios de obtenção de prova (e que contextualizam ou explicitam uma infinitude de pormenores, aparentemente, de ínfima relevância).
Tal como decorre da doutrina afirmada pelos Acs. do STJ de 22/4/2004, 5/1/2005 e 26/6/2006, disponíveis em http://www.dgsi.pt/jstj e também Santos Cabral em António Henriques Gaspar e outros, Código de Processo Penal Comentado, Coimbra: Almedina, 2014, pp. 494-495.
Segundo os mesmos acórdãos, vista a dimensão da reconstituição do facto como meio de prova autonomamente adquirido para o processo, e a integração (ou confundibilidade) na concretização da reconstituição de todas as contribuições parcelares, incluindo do arguido, que permitiram, em concreto, os termos em que a reconstituição decorreu e os respectivos resultados, os órgãos de polícia criminal que tenham acompanhado a reconstituição podem prestar declarações sobre os modo e os termos em que decorreu; tais declarações referem-se a elementos que ganham autonomia, e como tal diversos das declarações do arguido ou de outros intervenientes no acto, não estando abrangidas na proibição do art.º 356.º, n.º 7 do CPPenal.
Ora, o que decorre deste art.º 356.º, n.º 7, do CPP, é que, “Os órgãos de polícia criminal que tiverem recebido declarações cuja leitura não for permitida, bem como quaisquer pessoas que, a qualquer título, tiverem participado na sua recolha, não podem ser inquiridas como testemunhas sobre o conteúdo daquelas”.
Trata-se de prevenir a fraude à lei, ou seja, de impedir que através do OPC ou outras pessoas que participaram na recolha, se façam valer em audiência declarações cuja leitura não era permitida.
Daqui se conclui que o relato de agentes de investigação (OPC) sobre dados, informações ou contribuições de que tomaram conhecimento fora do âmbito de diligências produzidas sob a égide da oralidade (interrogatórios, acareações, tomadas de declarações, conversas formais) e que não o devessem ser sobre tal formalismo, bem como no âmbito das demais diligências, actos de investigação e meios de obtenção de prova (actos de investigação proactiva, buscas e revistas, exames ao lugar do crime, reconstituição do crime, reconhecimentos presenciais, entregas controladas, etc) que tenham autonomia técnico-jurídica constituem depoimento válido e eficaz por se mostrarem alheias ao âmbito de tutela dos Art.ºs 129.º e 357.º, ambos do CPPenal.
Conforme referido, tal circunstância - referência a autos de declarações de arguidos e de testemunhas lavrados pelos inspectores tributários - não ocorreu nos autos, pelo que, nada impede a valoração dos depoimentos prestados pelas testemunhas inspectores tributários.
De qualquer forma, como se vê da fundamentação – documentada no acórdão a págs. respectivas 54 a 95 - o depoimento destas testemunhas foram valorados na parte em que se referiram aos elementos, essencial e predominantemente documentais, recolhidos nas diligências de investigação a que procederam e isso nada tem a ver com declarações dos arguidos ou outros intervenientes processuais, tomadas formalmente em autos de declarações. O mesmo se diga no que respeita ao mencionado relatório de inspecção elaborado pelas mesmas testemunhas.
Não se demonstra, assim, que o tribunal a quo tenha valorado depoimento indirecto, prova proibida ou documento que tem por base essa violação.
Não assiste qualquer razão aos recorrentes.

No recurso interposto impugnam os recorrentes a matéria de facto provada argumentando quanto aos pontos 6, 16, 17, 18, 20 e 22 (relativas à constituição das sociedades ora recorrentes e à finalidade que presidiu à sua criação] em momento algum se afirma que as mesmas eram fictícias, antes se limitando a atribuir-lhes uma natureza instrumental ou de servirem de veículo de apresentação de uma realidade de actividade económica cruzada entre essas empresas e a arguida AJ, SA, tudo com vista à diminuição das receitas tributárias, mediante a criação artificial de IVA dedutível, através de facturação emitida em nome das sociedades ora recorrentes.
De resto, a afirmação produzida pelos recorrentes de que “nunca fizeram parte de qualquer esquema ou estratagema e prova em contrário não existe nos autos“ mostra-se demasiado simplista por pretender ignorar e fazer esquecer as realidades da vida económica das sociedades recorrentes quando, primeiramente, nunca apresentaram qualquer declaração fiscal demonstrativa, perante o fisco, da efectiva actividade que, pretendem dizer agora, efectivamente desempenharam e das relações comerciais que mantiveram com a arguida AJ, SA, e, depois, acabam por pretender demonstrar estas com a inserção na contabilidade e declarações fiscais apresentadas pela última sociedade referida. Mas vamos mais longe nessa simplicidade argumentativa quando consideramos a sucessão de sociedades no tempo e na ligação com a primeira delas, sendo que por relação a todas elas a deficiência era sempre repetida: não apresentação de declarações fiscais demonstrativas da sua efectiva actividade comercial, mas emissão de facturas de cobranças perante a sociedade AJ, SA.
Por sua vez, a qualidade de gerente de direito atribuída ao arguido recorrente no facto provado 6 mais não é que o reflexo extraído da prova documental trazida aos autos e consistente nos actos formais de constituição das sociedades em questão ali referidas.
Já quanto ao exercício da gerência de facto por parte do arguido JMG , não podemos deixar de remeter os recorrentes para o que se mostra afirmado na fundamentação da matéria de facto:
- das declarações do arguido JF  : “referiu que não conhecia os fluxos financeiros das várias sociedades, nunca as representou fiscalmente, tinha procurações com poderes específicos para as constituir em Portugal – esta afirmação do arguido JF  está corroborada nas escrituras de fls. 1061, 1065 e 1070, das quais resulta que o arguido interveio, na qualidade de procurador da “VIL ”, “MIL” e “DHL” com poderes para o acto - praticando unicamente actos de advocacia, nunca viu as contas das sociedades – era “ pelouro do arguido AJE ” -, nunca recebeu lucros, jamais lhe pediram para participar num esquema de fuga aos impostos e, por isso, ficou surpreendido quando leu a acusação.
O arguido FMA  tinha interesse em subdelegar na “AJ ” essas questões. O VC trabalhava mais para o FMA  do que para a “Aj”. Havia uma preocupação de aliviar os custos.”
- das declarações da testemunha VC: “Em julgamento a testemunha VC confirmou que fazia o processamento dos salários para a “AJ ” e que a partir de certa altura passou a processar os salários para as outras empresas recebendo ordens do arguido JMG , depois de o seu chefe directo, ter falecido, em 2011. Ninguém lhe explicou porque é que fazia o processamento dos salários dos A., trabalhadores dessas empresas, mas não tinha dúvidas que o A. lhe disse que o arguido FMA  era o gerente dessas sociedades. “
- “Os trabalhadores, ouvidos em audiência de julgamento, corroboraram e reforçaram aquilo que resultava das buscas aos escritórios da “AJ ” e que indiciava fortemente que a administração do pessoal, supostamente efectuada pelas sociedades fornecedoras, era feita pela “AJ ”.
Com efeito, todas as trabalhadores disseram que trabalhavam para a “AJ ”, - muitos destes trabalhadores encontravam-se na situação já descrita, tendo anteriormente trabalhado para empresas que tinham perdido os concursos -, vestiam batas da “AJ ”, os carros e os materiais eram da empresa, as supervisoras eram da “AJ ” e, regra geral, não conheciam o arguido FMA , mas, ao invés, conheciam, ou tinham ouvido falar, do arguido JMG  .

- das declarações do arguido AJE  e conclusões retiradas das mesmas:

“O arguido, na qualidade de TOC da “AJ ” quando contabilizava as facturas ou os manuscritos com os elementos das facturas – o arguido admitiu que nem sempre a “AJ ” lhe entregava as facturas e, nessas situações, sabendo de antemão que o valor da facturação mensal das fornecedoras correspondia contratualmente a 90% da facturação emitida, no mês, pela “AJ ” aos seus clientes redigia esses manuscritos, por mera questão de organização e como lembrete, de modo que quando lhe fossem entregues os originais substituía os rascunhos – sabia que as outras sociedades, em nome de quem eram emitidas as facturas, não lhe tinham disponibilizado quaisquer documentos contabilísticos pois era, ou tinha sido, igualmente TOC dessas sociedades.
Razão pela qual terá apresentado sucessivamente as renúncias a TOC dessas sociedades, invocando, nas cartas de renúncia, justamente a não apresentação de documentos contabilísticos, a falta de pagamento de qualquer avença e a ausência de contactos por parte dos sócios e /ou gerentes das sociedades.
Perguntar-se-á, desde logo, por que razão, sabendo o arguido que as sociedades eram incumpridoras, confiava na palavra do arguido JMG  e não só contabilizava as facturas que lhe eram entregues como redigia manuscritos com os elementos das facturas, sem qualquer suporte documental e sem ter garantias de que esses documentos tinham subjacentes verdadeiras prestações de serviços.
Acresce que o arguido AJE , durante seis anos, ano a ano, aceitou ser TOC de empresas geridas pela mesma pessoa não obstante esta, anteriormente, não ter respondido às solicitações que lhe fazia no exercício das suas funções de TOC e não lhe ter disponibilizado documentação contabilística nem pago as avenças.
Apesar daquela situação se repetir todos os anos, durante seis anos, repita-se, seis anos, o arguido AJE  foi sempre aceitando a proposta feita pelo mesmo gerente, que antes nem sequer se dignara responder às suas cartas, e ao mesmo tempo, preenchia as declarações da “AJ ”, contabilizando facturas dessa nova sociedade.
Perante as explicações do arguido em audiência de julgamento e as tentativas de se desculpar com a ingenuidade, boa fé e excessiva confiança no arguido JMG , perguntámo-nos como poderia um técnico oficial de contas maduro, experiente e responsável cair num engodo destes.
É manifesto que o arguido AJE  não caiu em qualquer engodo, pois sabia o que estava a acontecer com as sociedades e com a facturação emitida em nome destas e aceitou colaborar com o arguido JMG .” 

Daqui se conclui que as referências dos recorrentes visando essencialmente a definição da intervenção dos arguidos pessoas singulares na vida diária das diversas pessoas colectivas, não se mostram infirmados pelas indicações probatórias trazidas à discussão pelos agora recorrentes, mormente os citados excertos das testemunhas SM  e JLA , antes representado uma tentativa de ajuste ou adequação a uma qualquer versão do recorrente FMA  não transmitida ao tribunal recorrido.
Os factos provados 29 e 31 não merecem qualquer reparo na medida em o seu suporte probatório documental não oferece qualquer dúvidas e mostra-se devidamente explicado na fundamentação – no segmento “Sobre os trabalhadores alegadamente pertencentes a essas empresas e subcontratados pela “AJ ”” que nos abstemos aqui de reproduzir – seja por referência ao regime legal de cedência de pessoal neste tipo de actividade seja pela informação extraída das diversas decisões judiciais em que estavam em causa relações laborais.
A alegação de inexistência de acções judiciais por indemnização ou incumprimento contratual – de resto, apenas alegada – também não impõe a conclusão de que a prestação dos serviços para com as entidades adjudicantes foram efectivamente desenvolvidas pelas sociedades ora recorrentes, sendo que, contrapomos nós, para aquelas entidades adjudicantes o que interessava era que o serviço tivesse sido prestado.
Os pontos de factos provados sob os n.ºs 47, 58, 71, 82, 91 e 99, dizendo respeito ao cargo ou ligação legal que o recorrente arguido FMA  estatuariamente mantinha com as diversas sociedades ora recorrentes, seja a qualidade de gerente de direito seja a de procurador/representante, resulta de prova documental trazida aos autos e que se mostra enunciada na fundamentação da convicção do Colectivo, mais especificamente das certidões permanentes do registo comercial de fls. 4374 e seguintes. Nestas mostra-se exceptuada a relativa à AXXI , Lda., que não foi registada na conservatória respectiva mas cujos elementos foram extraídos da declaração de início de actividade comunicada à autoridade tributária, como se mostra provado nos factos 59 e 60 não impugnados, e como resulta da cópia da escritura da respectiva constituição constante de fls. 4878 e seguintes.
Os pontos 38 [Os serviços constantes de tais facturas ou manuscritos com os elementos das facturas nunca foram prestados pela “ALJ , Lda.”.], 50., idem quanto à “ARH , Lda.”, 63., idem quanto à “AXXI , Lda.”, 74., idem quanto à “AI, S.A.”, 85., idem quanto à “Aj, Lda.”, 95., idem quanto à “AHL – Sucursal em Portugal”, 102., idem quanto à  “CSL – Sucursal em Portugal”,  não podem deixar de ser extraídos, por um lado, do regime legal estabelecido no Código dos Contratos Públicos - DL nº 18/2008 de 29 de Janeiro – que impõe, no seu artº 55, que o subcontratante, tal como o candidato, tem de ter a sua situação fiscal regularizada, o que manifestamente não sucedeu com as supostas fornecedoras da “AJ ”, ora recorrentes na medida em que estas não preenchiam os requisitos necessários para serem subcontratadas pela “AJ ” por falta de regularidade da respectiva situação fiscal pelo que a primeira estava legalmente impedida de as subcontratar e de lhes ceder a sua posição.
Acresce que estas sociedades, ora recorrentes, careciam de autonomia técnica e financeira, sendo pois totalmente dependentes da “AJ ”, o que foi parcialmente admitido pelo arguido JF , não possuíam estrutura empresarial compatível com o volume de facturação apresentado, não podiam, por isso ter prestado serviços ou cedido pessoal à “AJ ”.
Sem pretender ser exaustivo acerca dos elementos probatórios de onde se extrai a ausência de prestação dos serviços relativos aos pagamentos que surgem na contabilidade da primeira das sociedades, temos a apontar a ausência completa de prova documental, demonstrativa dos correspondentes pagamentos, nos extractos das contas bancárias das sociedades, deles não constando os valores “facturados” e os pagamentos que a “AJ ” dizia contabilisticamente que fazia.
Nenhuma censura ou alteração merece a matéria de facto impugnada, a qual se mostra fundamentada em meios de prova não proibidos, na sequência de uma valoração desses mesmos de prova feita por via de uma análise crítica da mesma, reveladora do percurso lógico seguido pelo Colectivo e não revelando qualquer deformação das regras e princípios da prova, sendo que as provas que os recorrentes trazem ao palco dessa impugnação não impõem qualquer decisão diversa quanto a essa concreta factualidade.  

Nas respectivas conclusões manifestam-se os recorrentes quanto à integração jurídica dos factos provados no tipo de ilícito de fraude fiscal defendendo, primeiramente, que “O que alegadamente poderá existir nos presentes autos, não é um crime de fraude fiscal, mas outrossim, um crime de abuso dc confiança fiscal, p.p. art. 105.° RGIT.”, para, depois, fazer apelo “ao crime de abuso de confiança fiscal, previsto no art.º 24.° n.º 1 do RJIFNA” sem que concretamente manifeste, a final, se considera preenchido algum dos tipos de crime.
Valendo-nos das considerações tecidas no acórdão recorrido pelo Colectivo em matéria de integração jurídica dos factos provados, ali se consignou, depois de citar os preceitos do RGIT pertinentes:
“Resulta do artº 103 do RGIT, que a fraude fiscal se consuma quando o agente, com a intenção de lesar patrimonialmente o Estado, atenta contra a verdade e transparência exigidas na relação Fisco-contribuinte, através de qualquer das modalidades de falsificação e omissão acima referidas ainda que nenhum dano/enriquecimento indevido venha a ter lugar.
A conduta do agente tem de ser susceptível de causar diminuição das receitas tributárias. Pode não as vir a causar.
Como refere Paulo Dá Mesquita “O crime de fraude fiscal caracteriza-se essencialmente por ser um crime de aptidão ou perigo abstracto-concreto, pois o tipo não se limita a descrever uma conduta genericamente perigosa nem exige a comprovação concreta de uma situação de perigo, mas exige a comprovação de uma aptidão concreta da acção para diminuir as receitas tributárias. A conduta tem de ser susceptível de causar diminuição das receitas tributárias”.
Trata-se, conclui Dá Mesquita, de um crime de resultado cortado pois se no plano objectivo basta o preenchimento de uma das condutas prevista no tipo e a susceptibilidade de causar diminuição das receitas tributárias, no plano subjectivo exige-se uma intenção de diminuir as receitas fiscais do Estado. Daí a referência, no tipo, a condutas que “visem” vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias (“A tutela penal das deduções e reembolsos indevidos do imposto. Contributo para uma leitura da protecção dos interesses financeiros do Estado pelos tipos de fraude fiscal e burla tributária “Rev. do Ministério Público”, pág. 59).
Ou seja, neste tipo de crimes o elemento subjectivo do tipo é mais exigente do que o elemento objectivo uma vez que exige a intenção de obter um resultado que na prática pode não se verificar.
Com efeito, como referem Figueiredo Dias e Costa Andrade “a lei penal fiscal não inscreve o dano patrimonial entre os pressupostos objectivos da factualidade típica (...) no que ao chamado tipo objectivo concerne, necessário, e suficiente, ao preenchimento da factualidade típica da fraude fiscal é apenas o atentado à verdade ou transparência corporizado nas diferentes modalidades de falsificação (“O crime de fraude fiscal no novo direito penal tributário português” Revista de Ciência Criminal, ano 6, fas. 1º, Jan. Mar 1996, pág. 91).
Os valores de transparência e verdade exigidos na relação Fisco-contribuinte constituem o bem jurídico imediatamente tutelado pela incriminação.
 “No crime de fraude fiscal, todas as condutas relevam de um mesmo significado material-típico: todas configuram atentados aos valores da verdade e da transparência. Todas representam a violação dos deveres de colaboração com a Administração, assegurando-lhe o cabal e ajustado conhecimento dos factos fiscalmente relevantes, preordenados a assegurar a realização do património necessário ao exercício das funções estaduais.
As condutas tipificadas no artº 103 do RGIT podem revestir a forma de acção ou de omissão. A realização da conduta de modo activo corresponde à alteração de factos ou valores que devam constar da escrita contabilística ou de declarações apresentadas à administração tributária ou ainda através da celebração de contrato simulado” (Ac. do TRL de 18.07.2013, relator Rui Gonçalves proc. nº 1/05.2JFLSB)
Ao nível do elemento subjectivo, o crime de fraude fiscal exige o dolo, em qualquer uma das modalidades previstas no artº 14 do C. Penal, dirigido integralmente a todos os elementos do tipo.
Através da emissão de facturas falsas, o agente visa documentar operações económicas que não são verdadeiras, porque não existem ou pelo menos não existem nos exactos termos que aparentam. O objectivo que subjaz à emissão de facturas falsas radica frequentemente na documentação falsa de custos fiscais, assegurando, deste modo, a diminuição de lucros com consequências na determinação da matéria colectável (IRC) ou mesmo a obtenção ilícita de reembolsos (IVA).
Apurada a utilização de documento falso para efeitos de determinação da matéria colectável ou de obtenção de reembolso fiscal, acompanhado da consciência e vontade da realização do tipo de ilícito, tanto basta para responsabilizar o utilizador pelo crime de fraude fiscal, verificados que se mostrem os restantes elementos objectivos do tipo.
Nestes autos, face à matéria dada como provada estão essencialmente em causa situações de fraude ao IVA traduzidas em deduções indevidas desta prestação tributária, sustentadas em facturas falsas emitidas por sociedades criadas com essa finalidade.
No caso vertente provou-se que:
O arguido JMG delineou um plano visando obter vantagens patrimoniais ilegítimas à custa do Estado, provocando a diminuição das receitas tributárias, mediante a criação artificial de IVA dedutível, através de facturação emitida em nome das sociedades “ALJ, Lda.”, “ARH , Lda.”, “AXXI , Lda”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal” e “CSL ”, baseada na cedência de pessoal para a “AJ , S.A. ”, sem que, na verdade, tais serviços fossem prestados pelas referidas sociedades.
Para tanto, o arguido promoveu a constituição dessas sociedades, entre 2006 e 2012.
Tais sociedades, que tinham como gerente de direito o arguido FMA , amigo do arguido JMG , foram utilizadas entre Janeiro de 2006 e Março de 2012, conforme acima referido, uma por cada ano e por cada um dos exercícios.
Mais se provou que a gerência de facto dessas sociedades pertencia ao arguido JMG , que a exercia na sede da “AJ, S.A.”, não sendo desenvolvida qualquer actividade real nos demais locais indicados como sedes daquelas sociedades.
E que, para a concretização dos objectivos supramencionados, o arguido JMG  contou com a colaboração dos arguidos JTG, FMA e AJE .
Desta factualidade decorre que, com o esquema que os arguidos criaram e implementaram, nas condições referidas, os serviços de limpeza eram prestados por trabalhadores da “AJ ” e os contratos de cessão/administração eram celebrados com o propósito de ficcionar a existência de serviços e consequente emissão de facturas em nome das sociedades criadas para esse efeito, gerando IVA dedutível, com o único objectivo de fazer com que a “AJ ” entregasse menos IVA ao Estado.
Provou-se, ainda, que os arguidos tinham consciência de que as facturas e os manuscritos com os elementos das facturas, inseridos no registo contabilístico da “AJ” eram elementos fiscalmente relevantes.
Os arguidos sabiam igualmente que para exercer o direito à dedução não é condição suficiente ser detentor de uma factura ou documento equivalente, mas ter subjacente a realização de operações no âmbito das actividades empresariais, o que não se verificava neste caso.
E, assim, com esta actuação concertada, os arguidos conseguiram diminuir a matéria tributável da “AJ” e o imposto a entregar à Fazenda Nacional, correspondentes, em sede de IVA, ao valor apurado pela A.T. de 3.815,861, 93€ e, em sede de IRC, ao valor apurado de 1.434,625,33€. 
Por fim, provou-se que os arguidos JMG , JTG , FMA  e AJE actuaram com a intenção de realizar o facto típico e com conhecimento dos elementos típicos do crime de fraude fiscal
Ao nível do elemento subjectivo o crime de fraude fiscal exige o dolo em qualquer uma das modalidades previstas no artº 14 do C. Penal dirigido integralmente a todos os elementos do tipo.
E o dolo, no caso vertente, consiste na intenção de diminuir as receitas do Estado.
Tal como resulta da matéria de facto provada e pelas razões expostas na respectiva motivação é inquestionável que, embora com participações e responsabilidades diferentes, os arguidos JMG , JTG , FMA  e AJE cometeram o crime de fraude fiscal na forma agravada (vantagem patrimonial for de valor superior a 200.000€).”

Salientam Carlos Adérito Teixeira e Sofia Gaspar, Comentário das Leis Penais Extravagantes, volume II, UCE, 2011, pág. 454, que “o tipo objectivo do crime de fraude traduz-se, grosso modo, nos modelos de conduta típicos que, visando a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária, se traduzam na violação de deveres de colaboração (informação e lealdade) com a administração tributária, através da ocultação de factos ou valores, por via da sua não declaração à administração tributária ou por via da sua não escrituração ou integração na documentação contabilística passível de fiscalização, ou ainda, por via da celebração de negócios simulados (…) susceptíveis de causarem diminuição das receitas fiscais”.
E, no dizer de António Tolda Pinto e Jorge Manuel Bravo, Regime Geral das Infracções Tributárias, anotado, em anotação ao artigo 103º, “este crime classificado doutrinalmente como um crime de resultado cortado ou de tendência interna transcendente, o mesmo consuma-se ainda que nenhum dano ou vantagem patrimonial indevida venha a ocorrer efectivamente, bastando-se a lei com a circunstância de "as condutas ilegítimas tipificadas" visem ou sejam preordenadas à obtenção de vantagens patrimoniais "susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias". Isto é, será suficiente que a conduta seja preordenada a tal fim, sendo a eventual verificação do resultado lesivo apenas relevante em sede de aplicação concreta e medida da pena.” – assim, vd. também Ac. do STJ de 27/11/2007, Proc. n.º 07P3324, Ac. deste Tribunal da Relação e Secção de 13/07/2010, Proc. n.º 712/00.9JFLSB.L1-5 e Ac. R. do Porto de 05/01/2011, Proc. n.º 110/98.2IDAVR.P1, consultáveis em www.dgsi.pt.
A fraude fiscal consiste, assim, quer na ocultação ou alteração de factos ou valores declarados ou que devam ser declarados, porque sujeitos a tributação, quer na celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas.
Do mesmo modo, e porque necessariamente interligadas, também não é necessário que o agente obtenha efectivamente a vantagem patrimonial ilegítima que pretende obter, uma vez que o crime foi configurado como um crime de perigo, tendo o legislador optado "por privilegiar o desvalor da acção”[Vide Alfredo José de Sousa, Infracções Fiscais (não aduaneiras), 3,1 ed., pág. 92).], pelo que o crime consuma-se “mesmo que nenhum enriquecimento venha a ter lugar" e não ocorra "o resultado lesivo para o património fiscal".[ Ac. da Rel. Porto de 03/04/2002, in em www.dgsi.pt/.]
No que concerne ao elemento subjectivo do crime em apreço, estamos perante um crime doloso - art. 14º do C. Penal.
Com interesse para o caso em apreço releva o n.º 2 do art. 104° do RGIT que dispõe que é punida com a pena estipulada para o n.°1 a fraude que tiver lugar mediante a utilização de facturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes ou por valores diferentes ou ainda com a intervenção de pessoas ou entidades diversas das da operação subjacente.
Entre as novas infracções fiscais previstas pelo RGIT neste preceito encontra-se, precisamente, a prevista no n.º 2 do art.º 104° que se refere em especial à utilização de facturas falsas, situação esta que constitui por si só uma qualificação da fraude fiscal, sem necessidade de realização cumulativa de qualquer outra circunstância.
Por contraponto à integração proposta no tipo legal do crime de abuso de confiança fiscal, como dispõe o art.º 105º n.º 1 da Lei 15/2001 de 5 de Junho pratica o crime de abuso de confiança fiscal quem não entregar à administração tributária, total ou parcialmente, prestações tributárias deduzidas nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar e, como resulta do seu n.º 5 esse crime é agravado quando a entrega não efectuada for superior a €50.000,00.
Para o cometimento do crime de abuso de confiança fiscal, quando se trate de prestações tributárias referentes a IVA, é necessário que fique demonstrado o efectivo recebimento do correspondente montante pelo sujeito passivo obrigado à sua entrega ao Estado até ao momento da entrega das respectivas declarações periódicas à Autoridade Tributária.
Ora, por relação aos ora recorrentes, mais especificamente às sociedades recorrentes, mostra-se provado que nenhum pagamento lhes foi feito pela sociedade AJ, SA., e daí se extrai pela inexistência de qualquer concreta obrigação de entrega aos Estado de quantia recebida desta como IVA cobrado. Ao invés, ficou demonstrado que os arguidos criaram e implementaram um esquema em que os serviços de limpeza eram prestados por trabalhadores da “AJ” e os contratos de cessão/administração eram celebrados com o propósito de ficcionar a existência de serviços e consequente emissão de facturas em nome das sociedades criadas para esse efeito, gerando IVA dedutível, com o único objectivo de fazer com que a “AJ” entregasse menos IVA ao Estado.
Provou-se, ainda, que os arguidos tinham consciência de que as facturas e os manuscritos com os elementos das facturas, inseridos no registo contabilístico da “AJ” eram elementos fiscalmente relevantes.
Os arguidos sabiam igualmente que para exercer o direito à dedução não é condição suficiente ser detentor de uma factura ou documento equivalente, mas ter subjacente a realização de operações no âmbito das actividades empresariais, o que não se verificava neste caso.
E, assim, com esta actuação concertada, os arguidos conseguiram diminuir a matéria tributável da “AJ” e o imposto a entregar à Fazenda Nacional, correspondentes, em sede de IVA, ao valor apurado pela A.T. de 3.815,861, 93€ e, em sede de IRC, ao valor apurado de 1.434,625,33€.
Provou-se ainda que os arguidos agiram livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas respectivas condutas eram proibidas e punidas por lei.
Donde resulta que estão preenchidos os elementos objectivos do tipo legal de crime por que vieram a ser condenados, ocorrendo a situação descrita no n.° 3 do art. 104° do RGIT, sendo em todas as situações a vantagem patrimonial obtida superior a 200.000,00€.
Por outro lado, como o Colectivo explicita, tendo os arguidos actuado conluiados e em comunhão de esforços verifica-se uma situação de co-autoria, pelo que se considera terem, todos, participado na conduta integradora do ilícito.
Nenhum reparo merece a decisão não assistindo razão aos recorrentes.
*

4.–Passando a conhecer o recurso interposto pela recorrente AJ, SA.:
Suscita a mesma a questão prévia da suspensão do procedimento criminal, agora com o enfoque consequencial de que a decisão proferida violou de forma directa e expressa o disposto nos art.ºs 46 e 47 do RG1T, pelo que se impõe de imediato a sua revogação.
Se bem entendemos a alegação e a respectiva incidência bem como a consequência pretendida, a pretensão da recorrente mais não é que o ressuscitar da questão, então posta, da suspensão do procedimento criminal por força da existência de impugnações nos tribunais tributários das dívidas dos presentes autos criminais fiscais, nomeadamente IVA e IRC de 2007, 2008, 2009 e 2010.
Limitamo-nos a citar o que já referimos em sede de apreciação do recurso apresentado pelo arguido AJE : “Percorridos os autos constata-se que o tribunal indeferiu o pedido de suspensão do presente procedimento, formulado por dois arguidos, por despacho de 23.02.2017 (fls. 5152 e seguintes) que não foi objecto de qualquer recurso, pelo que a argumentação tecida acerca desse assunto se mostra ultrapassada.”
E mais á frente, aquando da apreciação do recurso do arguido FMA  e outras sociedades:
“Na medida em que não houve qualquer recurso quanto à (não) decisão sobre o pedido de indemnização civil, mormente por parte do M.º P.º que o deduziu, não nos vamos pronunciar sobre a bondade da solução tida no acórdão quanto ao respectivo não conhecimento.”  
Não deixamos no entanto de fazer notar à recorrente que a suspensão do processo penal tributário, em caso de impugnação judicial tributária ou oposição á execução, não é automática, tornando-se necessário analisar se na impugnação judicial apresentada está em causa matéria «em que se discuta situação tributária de cuja definição dependa a qualificação criminal dos factos imputados». A suspensão do processo penal tributário ocorrerá se a questão em discussão na impugnação judicial tributária se apresentar como uma verdadeira questão prejudicial no processo penal em curso.
Ora, no caso dos autos, a exigida correspondência entre a matéria objecto dos presentes autos e a matéria objecto das impugnações invocadas pela recorrentes não ocorrer, sendo estas, pelo modo como se mostram referidas/identificada pela recorrentes, apenas um aspecto parcelar da matéria dos presentes autos, mas cuja definição em concreto não se mostra como prejudicial para a perfectibilidade do crime de fraude objecto dos presentes, tal como se infere do último parágrafo do despacho transitado em julgado que decidiu não suspender o procedimento criminal (fls. 5155 dos autos).
Não ocorre, pois, a invocada violação.
 
Como segunda questão, invoca a recorrente sociedade que ocorreu a prescrição do procedimento criminal quando ao exercício fiscal de 2007, seguindo um pressuposto de manifesta não fixação do "quanto", sempre em benefício do arguido, o crime só poderia ter uma moldura penal de punição com pena até 5 (cinco) anos de prisão (considerando o montante mais elevado de cada prestação mensal retributiva - superior a €7.500,00 mas inferior a €5.000,00) o prazo prescricional do procedimento criminal é de 5 (cinco) anos e iniciou-se em Janeiro de 2007, sendo interrompido com na constituição de arguido e notificação da acusação, que constitui simultaneamente causa de suspensão do prazo prescricional, nas datas referidas na douta sentença.
A primeira nota dissonante da argumentação da recorrente diz respeito ao que considera não ter sido determinado o “quanto”, o que só podemos entender como querendo referir-se a montante do(s) imposto(s), quando o aspecto quantitativo relevante para o crime de fraude se dirige a “vantagem patrimonial”. Depois, os montantes em questão, mesmo que considerados só os relativos a impostos susceptíveis de serem liquidados como resulta do facto provado 50., apontam para IVA deduzido indevidamente no montante de 450.042,46€ e    IRC no montante de 159.110,66 €.
Bastam estas premissas para afastar o quadro punitivo chamado pela recorrente à determinação do prazo de prescrição do procedimento criminal.
Ora, sendo a imputação feita por crime qualificado do fraude fiscal dos art.ºs 103.º, n.º 1, alínea a), e 104.º, n.º 1, alíneas a), e d), n.º 2, alínea a), e n.º 3, do RGIT a moldura penal é a de prisão de 2 a 8 anos para as pessoas singulares e a de multa de 480 a 1920 dias para as pessoas colectiva, sendo a aplicável, para efeitos de aferição do prazo de prescrição, a privativa de liberdade por força do disposto no n.º 2 do art.º 21º RGIT e n.º 3 do art.º 118º CP [O disposto no número anterior não prejudica os prazos de prescrição estabelecidos no Código Penal quando o limite máximo da pena de prisão for igual ou superior a cinco anos.] e não o prazo geral invocado pela recorrente consignado no n.º 1 do mesmo preceito [O procedimento criminal por crime tributário extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a sua prática sejam decorridos cinco anos.], isto para além das consequências que sobre o mesmo se reflectem em resultado de causas de suspensão ou de interrupção aplicáveis.
Claramente o prazo de prescrição ainda não se mostra decorrido atento o seu prazo normal aplicável 10 anos (art.º 118º n.º 1 al. b) CP), ressalvado o tempo de suspensão cujo máximo será de 3 anos (por força do n.º 2 do art.º 120º CP), acrescido de metade nos termos do art.º 121º n.º 3 CP.
Não assiste minimamente razão à recorrente.
 
Finalmente, a recorrente impugna a matéria de facto provada, nos pontos de facto não identificados pela recorrente, quanto ao valor considerado, a final, na circunstância qualificativa do ilícito, mas relativos aos custos dos salários nos exercícios dos anos de 2006 a 2010 e por relação aos quais não se mostram fiscalmente deduzidos os correspondentes anuais relativos aos encargos sociais que sobre tais salários incidiriam.
Se bem entendemos a linha argumentativa da recorrente, a qual parte do relatório dos Srs. Inspectores Tributários e referidos pelos mesmos na respectiva audição em julgamento, uma vez que se mostram aceites como custos da recorrente os salários dos trabalhadores de limpeza e por essa via aumentada a matéria colectável para IRC nos anos de 2006 a 2010, então dessa matéria colectável deveria também ter sido deduzida a parte relativa aos encargos sociais desses mesmos trabalhadores.
A linearidade da explicação desenvolvida pelos Srs. Inspectores Tributários no relatório que se mostra junto aos autos e que o Colectivo teve presente como meio de prova valorado em sede de formação da respectiva convicção assenta na prova documental que foi encontrada na contabilidade da recorrente e que se mostra concretamente identificada naquele relatório.
Diferentemente do que refere a recorrente e com a sua pretendida finalidade de ver alterados os valores rectificativos que, então (relatório) e agora (decisão recorrida) da matéria colectável para efeitos de IRC, foram considerados, importaria que a recorrente fizesse menção da prova produzida ou existente nos autos que suporta o efectivo pagamento, a suas expensas, desses encargos sociais, sendo que nenhuma indicação concreta dessa prova se mostra feita, nem mesmo de qual a taxa social que a recorrente fez uso para os valores que avançou como devendo ser abatidos a titulo de custos.
Daqui se retira que os valores [“em sede de IVA, ao valor apurado pela A.T. de 3.815,861, 93€ e, em sede de IRC, ao valor apurado de 1.434,625,33€”- cfr. pág. 104 do acórdão] que o tribunal teve em atenção para efeitos de aferir da verificação da circunstância qualificativa do crime de fraude não merecem qualquer alteração. Independentemente disso, mesmo o valor final que a própria recorrente indica como a real expressão que a condenação deveria assumir - “pelo valor de €2.459.698,00 e nunca pelo valor de €5.250.000,00” - se mostra suficiente para constatar a verificação da circunstância qualificativa eleita pelo Colectivo do n.º 3 do art.º 104 RGIT: “a vantagem patrimonial for de valor superior a 200.000€ “
Decai, assim, na totalidade o recurso da arguida AJ , SA.
*

Resta-nos a apreciação do recurso interposto pelo arguido JTG .
Inicia o recorrente a sua motivação de recurso pela invocação de erro material de escrita, cuja rectificação propor, incidente sobre a numeração sequencial dos factos provados, mais precisamente, a duplicação dos números 109 a 113, pelo que optou pela indicação dos segundos idênticos com a aposição da letra “A” aos mesmos.
Por uma questão de coerência de leitura do acórdão, até quanto aos demais arguidos, consideraremos as “correcções” feitas pelo ora recorrente na análise do seu recurso, mas deixaremos o original nos termos em que se mostra redigido, isto apesar do disposto no art.º 380º n.º 2 CPP.

Manifesta o recorrente que a declarada e comunicada a alteração não substancial dos factos comunicada em sede de audiência de julgamento – relativa à redacção do texto da acusação de dois factos, os 8.º e 11º - resulta a absolvição do arguido pois, argumenta, essa alteração se não limitou a afastar os factos que, no entendimento da acusação pública, sustentavam o pedido de condenação pelo crime de associação criminosa (que vieram todos a ser absolvidos), mas também a concluir que não delineou um plano ou aderiu a uma organização, ainda que em co-autoria, que visasse obter vantagens patrimoniais ilegítimas à custa do Estado, provocando a diminuição das receitas tributárias, mediante a criação artificial de IVA dedutível, através de um circuito documental baseado na prestação de serviços inexistentes.
Com o devido respeito pela simplicidade argumentativa do recorrente, não só a realidade factual que se mostrava inserida naqueles factos da acusação pública acabou por ser reduzida em termos de ser imputada a comportamento unicamente do arguido JMG – o delinear de um plano visando obter vantagens patrimoniais ilegítimas à custa do Estado – como a atribuição da responsabilidade penal do recorrente resulta do que se encontra consignado na matéria de facto assente como provada nos pontos 20, 21, 108, 116, 121, 140 a 146 e 147, os quais se mostram trazidos a essa aferição de responsabilidade pessoal no acórdão recorrido no capítulo “II. Responsabilidade dos arguidos e dolo” da fundamentação da convicção do Colectivo e, depois, no desenvolvimento relativo à qualificação jurídica daqueles factos no tipo de ilícito bem como da qualidade a nível da co-autoria que lhe é atribuída.
Concluir, como o recorrente pretende, que se imporia pela mera decorrência dessa alteração não substancial a sua absolvição do crime de fraude fiscal é um juízo precipitado que não tem em conta a realidade factual provada acima descrita.
  
O percurso recursivo do arguido passa, depois, pela impugnação dos factos provados 20, 21, 31, 108, 109, 109A, 110A, 111A, 121, 122, 140 a 146, 148 e 156, que na sua perspectiva nunca poderiam ser dados como provados na medida em que da prova testemunhal e por referência ao facto provado 21,em momento algum, foi referido como Administrador ou Director Financeiro, adiantando que a respectiva função se resumiu e resume-se a integrar a equipa que formula os projectos levados a concurso.
Em abono da sua pretensão impugnativa citou depoimentos do arguido JF e das testemunhas IP e PS, aquele pela explicação da transformação da sociedade AJ  em SA, e estas, pela qualidade com que o viam na sede da sociedade.
Esta matéria mostra-se especificamente tratada pelo Colectivo em sede de fundamentação da respectiva convicção e análise crítica da prova nos seguintes termos que se mostram suficientemente explícitos: “Quanto aos arguidos JMG , JTG  e FMA , afigura-se-nos inequívoco, em resultado da prova produzida e analisada em audiência - realce especial para o que se concluiu sobre as características e funcionamento das várias sociedades (fictícias), as relações entre essas sociedades e a “AJ ”, a facturação emitida, os movimentos bancários e contabilísticos - que qualquer um destes arguidos, com responsabilidades e culpas distintas, estava concertado nos já referidos objectivos de defraudar o Estado. Todos eles estavam no centro das operações.
Basta atentar no facto de os dois primeiros arguidos pertenceram ao Conselho de Administração da “Ambiente e Jardim” e, como se verá, ao contrário da arguida MAG , também membro do Conselho de Administração da empresa, estarem directa e activamente envolvidos na actividade da empresa.
O arguido JMG  dirigia-a, o arguido JTG  era o seu director financeiro e tinha-se licenciado em gestão de empresas em 2004, passando, a partir desse ano, a exercer funções como gestor financeiro em regime de exclusividade na “AJ”.
Nesta qualidade, como foi dito por várias testemunhas e como, aliás, decorre das respectivas funções, controlava a facturação e os movimentos bancários e autorizava pagamentos.
Perante tudo o que se disse atrás sobre estas duas realidades o arguido JTG , na qualidade de membro do Conselho de Administração da “AJ , S.A.” e de seu director financeiro, ao controlar a facturação emitida por aquela, a facturação dos fornecedores, os pagamentos aos trabalhadores, ao Estado e aos fornecedores, não podia estar alheado do que se estava a passar e jamais podia desconhecer que as subcontratações eram fictícias tanto mais que sabia que as empresas fornecedoras não recebiam os valores facturados.
Como referiu o inspector RC, corroborando o que resulta do relatório pericial, o arguido JTG , dadas as suas funções na “AJ” tinha de ter conhecimento que as intituladas “cedências de pessoal” não tinham sido efectuadas e que as facturas existentes eram falsas e, nos casos em que não existia factura, não devia sequer ter dada autorização de pagamento, nem comunicado à contabilidade esse pagamento.
Apesar de este arguido ser bastante jovem quando começou a trabalhar na “AJ ” e de ser filho do principal responsável da sociedade - admite-se que as principais decisões fossem tomadas pelo pai – resultou da prova produzida – esta prova não está sustentada apenas nas certidões da Conservatória mas igualmente na prova testemunhal e nas declarações do arguido AJE  - que o arguido exercia, de facto, as funções de director financeiro da empresa e designadamente autorizava pagamentos a fornecedores.
Para tal tinha necessariamente de confirmar a prestação efectiva do serviço e o valor facturado.
Resta referir que, como já se sublinhava no despacho de pronúncia – fls. 4594 – todas estas circunstâncias não são compagináveis com uma eventual ausência de responsabilidade, não era crível, nem agora é, em resultado da prova produzida em audiência, que o arguido JTG  se limitasse a elaborar propostas para os concursos - ideia que foi veiculada por algumas testemunhas que trabalham na “AJ” - sem atender às regras e obrigações decorrentes do Código de Contratação Pública e da contratação colectiva, no que diz respeito às transferências de trabalhadores, e não exercesse qualquer controlo sobre a facturação emitida, ao pagamentos, os movimentos bancários e contabilísticos.

Resulta claro da prova produzida que os arguidos JMG , JTG , FMA  e AJE conscientemente deram materialidade fáctica a um plano concebido pelo primeiro arguido e no qual os restantes arguidos participaram nas circunstâncias já referidas. “

Note-se que as referências a meios de prova feitas no excerto citado se mostram bem mais acutilantes que as meras indicações feitas pelas testemunhas invocadas pelo recorrente na motivação, não demonstrando que o colectivo se tenha desviado dos deveres de objectividade da valoração da prova.
Quanto aos factos 108, 109, 109A, 110A, 111A impugnados e que o recorrente manifesta, na senda do anteriormente afirmado, de que não seria o director financeiro e, portanto, não era da sua competência emitir quaisquer cheques ou proceder às transferências de que vem acusado, já vimos que a qualidade de intervenção do recorrente na vida da sociedade se mostra consolidada na qualidade de membro do Conselho de Administração da “AJ, S.A.” e de seu director financeiro, não poderia deixar de ter conhecimento que as intituladas “cedências de pessoal” não tinham sido efectuadas e que as facturas existentes eram falsas e, nos casos em que não existia factura, não devia sequer ter dada autorização de pagamento, nem comunicado à contabilidade esse pagamento.
Quanto ao conjunto dos factos 121, 122, 140 a 146, 148 e 156, convenhamos que as explicações, avançadas pelo recorrente na sua motivação, para a finalidade impugnativa dos mesmos se mostram votadas ao fracasso na medida em que assentam numa aparente subserviência à vontade do seu pai, o arguido JMG .
No entanto, os cheques descritos nos factos em questão mostram-se documentalmente provados no tocante à respectiva emissão, finalidade e não inserção na contabilidade da sociedade, nem claramente dizem respeito a pagamentos de bens ou serviços adquiridos pela sociedade arguida, antes demonstram ser a sociedade a suportar despesas contraídas em benefício pessoal de sócios.

Invoca ainda o recorrente que a decisão recorrida viola o princípio in dubio pro reo, retirando o recorrente essa constatação pela afirmação de que ali se fundamenta a decisão condenatória em factos manifestamente por provar.
Com o devido respeito, a questão mostra-se posta em termos desajustados porque remetido pelo recorrente para a questão da decisão condenatória, tal quale.
Ora, o princípio in dubio pro reo [Seguimos, de muito perto, a síntese conclusiva de Cristina Líbano Monteiro, Perigosidade de inimputáveis e in dubio pro reo, pág. 165 e segts], como regra de decisão da prova, é solução que resulta de um conjunto de factores em verificação cumulativa:
– Necessidade de pôr fim ao processo, com decisão definitiva que não represente, do ponto de vista da paz jurídica do arguido, uma demora intolerável;
– A inadmissibilidade da pena de suspeição;
– A opção pelo modus probandi de livre apreciação da prova ou livre convicção do tribunal, necessariamente objectivável e motivável.
– A possibilidade do surgimento de dúvidas, resistentes à prova e impeditivas da tal convicção, na verificação dos enunciados factuais abrangidos pelo objecto do processo;
– A consciência da diferença entre o processo criminal e a lide civilística, que impede a transferência para o primeiro da solução do ónus de prova, típica de um processo de partes;
– A convicção de que o Estado não deve exercer o seu ius puniendi quando não obtiver a certeza de o fazer legitimamente.
Daí que, o princípio in dubio pro reo, deve ser perspectivado e entendido, como remate da prova irredutivelmente dúbia, destinado a salvaguardar a legitimidade da intervenção criminal do poder público. O Estado não deve exercer o seu ius puniendi quando não obtiver a certeza de o fazer legitimamente. Consequentemente, só releva e restringe o seu âmbito de aplicação à questão de facto, é mais do que o equivalente processual do princípio da culpa, desligando-se, quanto ao fundamento, da presunção de inocência e abarcando, quer as dúvidas sobre o facto crime, quer a incerteza quanto à perseguibilidade do agente. E finalmente o controle da sua efectiva boa ou má aplicação está dependente de os tribunais cumprirem a obrigação de fundamentarem a sua convicção.
A aplicação de tal princípio incide, como se disse, em matéria de prova e não significa dar relevância às dúvidas que as partes encontram na decisão ou na sua interpretação da factualidade descrita e revelada nos autos. É, antes, uma imposição dirigida ao juiz, no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não houver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa. Mas daqui não resulta que, tendo havido versões díspares e até contraditórias sobre factos relevantes, o arguido deva ser absolvido em obediência a tal princípio. A violação deste princípio pressupõe um estado de dúvida no espírito do julgador, só podendo ser afirmada, quando, do texto da decisão recorrida, decorrer, por forma evidente, que o tribunal, na dúvida, optou por decidir contra o arguido.
Lendo a decisão recorrida, designadamente na parte da indicação e do exame crítico das provas em que se baseou a convicção do tribunal a quo, não se vislumbra que esse mesmo tribunal tivesse dado como provado qualquer um dos factos que, como tal, enumerou tendo dúvidas sobre a sua verificação.
Assim sendo, não foi violado, ao contrário do que sustenta o recorrente, o princípio in dubio pro reo.

Discorre ainda o recorrente sobre se houve violação do princípio da aplicação da lei penal mais favorável, manifestando-se pela positiva na medida em que o crime de fraude fiscal qualificada p.p. pelo art.º 104.2, do R.G.I.T., até dia 31.12.2011, gozava de uma moldura penal abstracta de pena de prisão entre os 1 e 5 anos, ao passo que, desde a entrada em vigor da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro - v.g., Lei do Orçamento de Estado para 2012 -, e com alteração operada ao referido art.º 104.° do R.G.I.T., o mesmo crime passou a prever uma moldura penal abstracta de pena de prisão entre os 2 e 8 anos, tendo sido esta a utilizada pelo Colectivo.
Este concreto aspecto da evolução legislativa que operou no espaço temporal abrangido pelos factos provados mostra-se especificamente tratado na decisão recorrida, seguindo o Colectivo a seguinte argumentação:

“Sucessão de leis – Aplicação da lei penal no tempo
Aos arguidos, como vimos, estava imputada, e deu-se como provada, a prática de um único crime de fraude fiscal qualificada p. e p. pelo artº 104, nº 2, alíneas a) e d), nº 2, al. a) e nº 3 do RGIT na redacção resultante da alteração introduzida pela Lei nº 64-B/2011, de 30 de Dezembro, que entrou em vigor em 1.01.2012 (alteração ao OE para 2012).
A lei nº 64-B/2011 de 30.12 introduziu alterações ao RGIT e agravou as penas aplicáveis ao crime de fraude fiscal em função do valor da vantagem patrimonial obtida pelos agentes em resultado do crime praticado.
De acordo com esse novo regime legal se a vantagem patrimonial for de valor superior a 200.000€ o crime de fraude fiscal é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos para as pessoas singulares e multa de 480 a 1920 dias para as pessoas colectivas.
Na redacção anterior, no crime de fraude fiscal, qualificado por qualquer uma das circunstâncias previstas no artº 204, não era feita distinção, em razão do valor da vantagem patrimonial, aplicando-se a mesma moldura penal – de um a cinco anos de prisão para as pessoas singulares e de 240 a 1200 dias de multa para as pessoas colectivas – independentemente do valor dessa vantagem e desde que não fosse inferior a 15.000€, caso em que a condutas descritas no artº 203 não eram sequer punidas.

Dispõe-se no artº 2 do C. Penal que:
1.- As penas e medidas de segurança são determinadas pela lei vigente no momento da prática do facto ou do preenchimento dos pressupostos de que dependem.
2.- (…)
3.- (…)
4.- Quando as disposições penais vigentes no momento da prática do facto punível forem diferentes das estabelecidas em leis posteriores, é sempre aplicado o regime que concretamente se mostrar mais favorável ao agente (…).
Por sua vez dispõe-se no artº 4 do mesmo Código que “ O facto considera-se praticado no momento em que o agente actuou ou, no caso de omissão, deveria ter actuado, independentemente do momento em que o resultado típico se tenha produzido”.
Sobre o lugar e momento da prática da infracção tributária dispõe-se no artº 5 do RGIT:
1.- As infracções tributárias consideram-se praticadas no momento e no lugar em que, total ou parcialmente, e sob qualquer forma de comparticipação, o agente actuou, ou, no caso de omissão, devia ter actuado, ou naqueles em que o resultado típico se tiver produzido, sem prejuízo do disposto no nº 3.
2.- As infracções tributárias omissivas consideram-se praticadas na data em que termine o prazo para o cumprimento dos respectivos deveres tributários.
3.- Em caso de deveres tributários que possam ser cumpridos em qualquer serviço da administração tributária ou junto de outros organismos, a respectiva infracção considera-se praticada no serviço ou organismo do domicílio ou sede do agente
E sendo assim, estando em causa, como concluímos no ponto anterior, um único crime de fraude fiscal agravada, que se prolongou ao longo de vários anos e cessou em Março de 2012 cujos factos tiveram início em Janeiro de 2006 e terminaram em Março de 2012, depois da entrada em vigor da lei nº 64-B/2011 não haverá dúvidas, face aos citados dispositivos legais que se aplica a lei vigente nessa data. “

Porque acabado de referir no último parágrafo citado, o Colectivo considerou a integração jurídica dos factos provados no cometimento de um único crime de fraude fiscal agravada com a seguinte argumentação:

“No caso vertente provou-se que foi desenvolvida pelos arguidos, nas circunstâncias acima descritas, ao longo do tempo - seis anos e três meses - e de forma homogénea uma actividade que tinha em vista a obtenção de vantagens patrimoniais ilegítimas à custa do Estado, mediante a criação artificial de IVA dedutível.
Para esse efeito, ao longo desses anos, foi emitida facturação em nome de várias sociedades, baseada na cedência de pessoal para a sociedade “AJ ”, sem que esses serviços fossem prestados pelas sociedades.
Do exposto parece resultar que toda a actividade desenvolvida pelos arguidos e que perdurou no tempo foi presidida por um dolo inicial, único e unificador, ou seja, obedeceu a uma única resolução criminosa que foi sendo concretizada, em múltiplos actos, ao longo do tempo, tal como previamente gizado e acordado entre os seus agentes.
O circunstancialismo apurado, designadamente a proximidade temporal e a uniformidade de procedimentos, conduz à formulação de um único juízo de censura pelo que a conduta dos arguidos deve ser subsumida a um único crime de fraude fiscal, como já resultava da acusação.
Neste mesmo sentido o acórdão do Tribunal da Relação de Porto de 11.04.2012, relatado por Maria do Carmo Silva Dias.
“Consubstancia a prática, em co-autoria, de um só crime de fraude fiscal, através de facturas falsas, a execução concertada entre os arguidos, gerentes de duas sociedades, de integrarem nos anos de 2001 e 2002, na contabilidade de uma as facturas emitidas pela outra, com o objectivo comum de obterem benefícios fiscais à custa do Estado-Fisco.
A resolução única – envolvendo quer a emissão das facturas falsas, quer a sua utilização visando a obtenção de vantagens indevidas de IVA e IRC – cuja execução se prolongou no tempo, não é posta em causa por as vantagens indevidas se relacionarem com tipos de impostos diferentes, nem mesmo com a circunstância de terem sido apresentadas as respectivas declarações fiscais em momentos distintos (…) ” (proc. nº proc. nº 43/07.3IDPRT.P1).”
Assim, tendo-se considerado o ilícito como cometido em obediência de uma única resolução criminosa que foi sendo concretizada, em múltiplos actos, ao longo do tempo, tal como previamente gizado e acordado entre os seus agentes, o mesmo mostra-se passível de ser enquadrado ao abrigo da lei actual - Lei nº 64-B/2011de 30.12 – porque a respectiva comissão também ocorreu já na vigência deste regime legal.
Não assiste razão ao recorrente quando invoca violação do principio da aplicação da lei penal mais favorável do art.º 2º n.º 4 CP.
Decai, por este motivo, o seu recurso na totalidade.
*

Como acima se enunciou no relatório, o Exmo. PGA elaborou parecer em que suscita a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia do art.º 379º n.º 1 al. c) do CPP e erro de julgamento de direito quanto à não observância do disposto no art.º 14º RGIT.
Consiste, na sua perspectiva, a nulidade invocada pela sujeição da suspensão de execução da pena decretada aos arguidos Luis MG e Luis TG à condição de “pagamento da prestação tributária prestação tributária que vier a ser apurada, após liquidação pelos tribunais tributários, devendo o arguido apresentar documento comprovativo desse pagamento.”, isto porque pode , a final, vir-se a considerar que os montantes “fixados” venham a revelar-se de impossível cumprimento pelos arguidos, em violação do disposto no art.º 51º n.º 2 CP, e não se mostrar estabelecido um prazo para a respectiva comprovação do pagamento.
Como nota prévia, diremos que não percebemos a razão destas concretas questões não terem sido levadas a recurso que, oportunamente, o M.º P.º poderia ter interposto na sequência da publicação do acórdão condenatório.
Não o tendo feito, trazer estas questões em sede de parecer mais não representa que um alargamento das questões a conhecer por parte de sujeito processual que, tendo legitimidade opara o mesmo, não o quis interpor atempadamente.
De qualquer modo, sempre diremos:
Na primeira das acepções referidas pelo Exmo. PGA, a afirmação da nulidade de omissão de pronúncia refere-se à não apreciação da prognose exigida pela interpretação obrigatória do Ac. de Fixação de Jurisprudência 8/2012 quando a a suspensão da execução das penas impostas aos arguidos Luís MG e Luís JTG  fica sujeita à condição de provarem nos autos o pagamento dos montantes indemnizatórios que, pela futuridade da liquidação nos tribunais tributários, pode ser em montantes que podem impossibilitar os arguidos de os pagar, com manifesta violação do disposto no art.° 51.°, n.º 1, al. a) do C. Penal.
Com o devido respeito pela linha argumentativa desenvolvida, a omissão de pronúncia invocada e a necessidade de apreciação da prognose exigida pelo AFJ referido, também se mostra posta no condicional na medida em que, só após se conhecerem as efectivas quantias liquidadas e a pagar pelos arguidos, se poderá aferir da efectiva necessidade de fazer a omissa prognose. Seria o caso de se chegar à conclusão, por via da intervenção dos tribunais tributários, que nenhuma quantia seria devida, ou seja, seria sempre uma apreciação à condição.
No caso sub judice, o tribunal reconheceu a sua “incompetência” para aferir prestações tributárias – IVA indevidamente deduzido e IRC – sujeitas a impugnações e eventuais liquidações adicionais feitas pela A.T., sendo que, por outro lado, “o artº 14 do RGIT não supõe relativamente à suspensão da pena, a dedução /satisfação do pedido de indemnização, impondo antes como condição dessa suspensão o pagamento ao Estado da prestação tributária e acréscimos legais, do montante dos benefícios indevidamente obtidos, ou seja do imposto, acréscimos legais, montante dos benefícios indevidos.”, ou seja, diferentemente do ponto de partida (pagamento da indemnização civil) referido no parecer em questão.
Perante essa impossibilidade de determinação das prestações tributárias em falta, apesar das referências que se mostram feitas na matéria de facto (facto provado 143) quanto ao tipo de impostos (IVA e IRC) que se mostram em falta mas sem indicação concreta qual o montante global da divida fiscal na medida em que faltam as indicações dos legais acréscimos que sobre as prestações tributárias poderão incidir.
Nessa perspectiva, essa necessidade de apreciação não pode ser conhecida neste momento e, portanto, a violação do enunciado AFJ e a nulidade da sentença invocada não têm razão de ser.
A segunda das acepções postas no parecer diz respeito a invocado erro de julgamento, será a de saber se as suspensões das execuções das penas impostas aos arguidos FMA  e AJE  podem sê-lo, contra o expressamente estabelecido pelo art.° 14.° do RGIT, sem a imposição da condição ali exigida, ou seja, sem o pagamento (ainda que parcial) da indemnização devida ao Estado, vindo a desembocar essa questão na invocação de erro de julgamento e/ou erro notório, entendendo que existem factos provados que o permitem (vd. factos 154 e 155), impondo-se-lhes a obrigatoriedade de pagamento de uma parte (mesmo substancialmente pequena) a título de indemnização a favor do Estado, cumprindo-se, dessa forma o estatuído no aludido art.° 14.°.
Sobre a desnecessidade/ilegalidade do estabelecimento de condição à suspensão da execução da pena de prisão, nos termos do nº 1 do art. 14º do RGIT «a suspensão da execução da pena de prisão aplicada é sempre condicionada ao pagamento, em prazo a fixar até ao limite de cinco anos subsequentes à condenação, da prestação tributária e acréscimos legais, do montante dos benefícios indevidamente obtidos e, caso o juiz o entenda, ao pagamento de quantia até ao limite máximo estabelecido para a pena de multa».
Conforme já referimos, o artigo 14º, nº 1, do R.G.I.T. impõe obrigatoriamente a sujeição da suspensão de execução da pena de prisão relativa a crimes tributários, ao pagamento das quantias acima referidas. Para além de ser esta norma que estabelece o limite máximo aplicável ao período de suspensão.
Da pretensão agora formulada decorre que, por ausência de interposição do recurso por parte do M.º P.º, a definição nesta sede recursiva de qualquer montante cujo pagamento condicione a suspensão de execução das penas destes dois arguidos identificados, representaria para estes uma efectiva reformatio in pejus na medida em que o quadro sancionatório, que não se esgota apenas na pena privativa de liberdade ou da sua substituta fixada, se mostraria mais exigente e penoso, o que se mostra proibido por força do disposto no art.º 409º CPP.
Assim, sendo, nenhum erro de julgamento se mostra cometido.
    
 
III.–
Face ao exposto, decide-se negar provimento aos recursos interposto pelos arguidos JMG, JTG, FMA, AJE, “AJ, S.A.”, “ARH, Lda.”, “AXXI, Lda.”, “AI, S.A.”, “Aj, Lda.”, “AHL – Sucursal em Portugal”, “CSL – Sucursal em Portugal” e “APSCF, Lda.”, actualmente denominada de “G., Lda.” confirmando o acórdão recorrido.
Custas a cargo dos recorrentes, fixando a taxa de justiça individual em 5 UC.
                  

 
Lisboa, 17 de Dezembro de 2019.

                                                                  
João Carrola                           
Luís Gominho


  
           
Decisão Texto Integral: