Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
| Processo: |
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| Relator: | ARLINDO CRUA | ||
| Descritores: | ADMISSIBILIDADE DE PROVA DOCUMENTAL PRAZO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 06/22/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Texto Parcial: | N | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
| Sumário: | I – Não sendo os documentos juntos com os articulados, nos quais se aleguem os correspondentes factos – o nº. 1, do art.º 423º, do Cód. de Processo Civil -, podem ainda ser juntos no precedente prazo de 20 dias relativamente à data em que se realize a audiência final – o nº. 2, do mesmo art.º 423º; II - caso, na data designada, e apesar de aberta, a audiência final venha a ser adiada, dada sem efeito ou suspensa, sem que ocorra a actividade processual probatória inscrita no nº. 3, do art.º 604º, do Cód. de Processo Civil, tal prazo não se tem por exaurido ou esgotado, transpondo-se para a nova data designada para a audiência final, desde que esta designação salvaguarde a dilação de 20 dias legalmente imposta; III - ou seja, a legal expressão “até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final”, deve ser entendida e interpretada como a data em que efectiva e realmente se inicie/realize a audiência final, com a prática dos actos inscritos naquele nº. 3, do art.º 604º; IV - todavia, uma vez iniciada a audiência final, com a produção de actividade probatória, e ainda que tenham sido designadas várias sessões temporalmente escalonadas por mais de 20 dias, já não legalmente admissível, nas sessões contínuas, a junção de prova documental nos quadros do nº. 2, do art.º 423º; V - nesta situação, aquele prazo regressivo de 20 dias tem como início de contagem a data designada para a primeira sessão, não se replicando em relação a cada uma das demais sessões agendadas. Sumário elaborado pelo Relator – cf., nº. 7 do art.º 663º, do Cód. de Processo Civil | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]: I – RELATÓRIO 1 – No dia 05/09/2022, N… e R…, Autores na acção 2855/17.0T8PTM, na qual figura como Réu J…, apresentaram nos autos o seguinte requerimento: “Por requerimento aos autos em 11/11/2020 foi requerido fosse o Réu instado a juntar aos autos nos termos e para os efeitos conjugados do art.º 429 (que por lapso se enunciou como art.º 427) e art.º 417 nº 2 do CPC, o documento objecto do reconhecimento presencial de assinatura dos aqui AA e R e outorgado no dia 28 de Março de 2016 na sequência da outorga da escritura publica em causa nos presentes autos e registado no Livro de Reconhecimento do Cartório Notarial de DB sob o nº … e pagos pelo R como melhor decorre dos Docs 16 e 17 e a fls 4676 da certidão junta sob Doc 22 à PI. Reitera-se que de tal documento que é um contrato promessa de compra e venda, resultam factos indispensáveis à descoberta da verdade material nos presentes autos. Por requerimento aos autos datado de 7/04/2022 os AA reiteraram o enunciado e requerido de V a VII do requerimento apresentado em 11/11/2020. Até esta data o Réu não procedeu à junção do documento que se conhece estar na sua posse. Como se peticionou e resulta inequívoco dos factos controvertidos nos autos e se reiterou nos requerimentos enunciados de tal documento resultam factos indispensáveis à descoberta da verdade material nos presentes autos, pelo que se insiste e requer seja o Réu instado à sua junção nos termos e para os efeitos do preceituado art.º 429 e art.º 417 nº 2 e sob a cominação do art.º 344 do CC- Não obstante, a mandatária signatária diligenciou pela consulta dos autos de processo crime que corre termos sob o PROC 5627/15.3TDLSB Juízo Central Criminal- Juiz 2, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, e tomou conhecimento da junção do referido documento pela aí arguida M…, do que requereu certidão ainda não disponibilizada. Nestes termos e conforme ao preceituado no art.º 423 nº 3 do CPC requer-se a junção aos autos do referido documento que é como se disse e resulta inequívoco da matéria controvertida nos autos, indispensável à descoberta da verdade material nos autos, e cuja junção só agora se torna possível pelo conhecimento da sua junção aos enunciados autos de processo crime pela arguida M…. Ainda atenta a proximidade da data de julgamento dá-se cumprimento à junção do documento por meio de cópia simples uma vez que a requerida certidão judicial ainda não foi disponibilizada pelo Tribunal, e que se protesta juntar. O que se requer V. Exa admita”. 2 – No dia 06/09/2022, os mesmos Autores, apresentaram nos autos o seguinte requerimento: “(…) vêm proceder à junção da Certidão emitida hoje nos autos que correm termos sob o PROC 5627/15.3TDLSB Juízo Central Criminal- Juiz 2, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, como protestado juntar em anterior requerimento, o que requer V. Exa admita”. 3 – Por despacho datado de 07/09/2022, proferido em sede de audiência de julgamento, consignou-se, relativamente àquela junção, o seguinte: “No que respeita à junção de documentos efetuada pelos Autores no dia 06/09/2022 aguardem os autos o prazo para o Réu se pronunciar quer sobre a admissibilidade de tal junção quer sobre o seu conteúdo, após o que se proferirá despacho”. 4 – O Réu, por requerimento datado de 19/09/2022, veio referenciar o seguinte: “J…, réu nos autos à margem identificados, notificado da junção de um documento denominado “Contrato Promessa de Compra e Venda e de Cedência do Gozo e Fruição de Imóvel”, vem no exercício do direito ao contraditório pronunciar-se sobre o mesmo, nos termos e fundamentos seguintes: A. EXTEMPORANEIDADE DA JUNÇÃO DO DOCUMENTO: 1. O documento ora junto é uma certidão judicial consistente na cópia fiel do documento 186, constante de fls. 10819 a 10812 v.º junto aos autos [n.º 5627/15.3TDLSB que corre trâmites no Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 2] pelo ilustre mandatário da arguida A…. 2. A referida certidão foi pedida pela mandatária dos assistentes N… e R… (sic), Dra. MV, igualmente mandatária dos Autores nestes autos, no dia 14.07.2022 – (documento n.º 1). 3. Os Autores constituíram-se assistentes naquele processo crime no dia 27 de setembro de 2019, quando requereram a abertura de instrução após o despacho de arquivamento no que ao ora Réu, consistia. 4. Pelo que desde o dia 27 de setembro de 2019 que os Autores tiveram livre acesso ao referido processo, quer praticando os actos processuais quer consultando os referidos autos. 5. Sendo certo que no dia 06 de Maio de 2022 a mandatária dos autores N… e R… foi expressa e pessoalmente notificada da junção de documentos pelo mandatário da arguida A... através da plataforma citius com a referência 415537972 – documento n.º 2. 6. Da referida notificação constava a advertência que seria enviada cópia via CTT, para o caso da digitalização de algum documento não estar visível. 7. Sucede que o documento junto autos agora no pretérito dia 06 de Setembro de 2022, estava perfeitamente visível, pelo que desde o dia 9 de Maio de 2022 os Autores não só tomaram conhecimento do referido documento denominado “documento 186, constante de fls. 10819 a 10812 v.º junto aos autos n.º 5627/15.3TDLSB que corre trâmites no Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 2” como estavam na posse de cópia do mesmo e podiam logo nesse dia ter solicitado uma certidão, o que não fizeram. 8. Dispõe o artigo 423.º que os documentos devem ser juntos com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes. Se não forem juntos, podem-no ser ainda, até 20 dias antes da data em que se realize a audiência de julgamento de julgamento – cf. artigo 423.º, n.º 2 do CPC. 9. Após este limite temporal de vinte dias anteriores à data em que se realize a audiência de julgamento de julgamento, só são possível de ser juntos aqueles cuja apresentação não tenha sido possível em momento anterior ou cuja apresentação se torne necessária em virtude de ocorrência posterior – cf. artigo 423.º, n.º 3 do CPC. 10. É bom de verificar que os Autores tomaram conhecimento da existência do “documento 186, constante de fls. 10819 a 10812 v.º junto aos autos n.º 5627/15.3TDLSB que corre trâmites no Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 2” no dia 9 de maio de 2022 e não solicitaram qualquer certidão do mesmo nem juntaram qualquer cópia a estes autos. 11. Preferiram aguardar pela véspera do início das férias judiciais – dia 14 de Julho de 2022 – para requererem a passagem de certidão deste documento – cf. documento n.º 3. 12. E procederam à sua junção aos autos no dia 6 de setembro de 2022 na sequência da junção de uma fotocópia do mesmo no dia anterior 5 de setembro de 2022, quando desde o dia 9 de maio os Autores podiam ter requerido essa junção. 13. Para além da óbvia extemporaneidade da junção do documento, releva ainda, o estratagema usado pelo Autores para obstarem ao exato e efetivo apuramento dos factos quanto à sua obtenção e até veracidade. 14. Com efeito a sua apresentação na véspera do início do julgamento, (06-09-2022) quando a mandatária dos Autores já tinha na sua posse o referido documento - ou pelo menos cópia dele - desde 9 de maio de 2022 – demonstra apenas que se visou coartar o direito de contraditório do Réu impedindo-o com essa junção tardia de analisar o documento e exercer cabalmente os seus Direitos processuais. 15. Com a agravante de ter impedido o início da audiência de julgamento, e assim retardar mais uma vez, o normal andamento dos autos, o que não pode deixar de ter as legais consequências em sede da providencia cautelar decretada. B. Do documento: 16. Os Autores alegam que requereram aos “autos em 11/11/2020 (…) [que] fosse o Réu instado a juntar aos autos nos termos e para os efeitos conjugados do art.º 429 ( que por lapso se enunciou como art.º 427) e art.º 417 nº 2 do CPC, o documento objecto do reconhecimento presencial de assinatura dos aqui AA e R e outorgado no dia 28 de Março de 2016 na sequência da outorga da escritura publica em causa nos presentes autos e registado no Livro de Reconhecimento do Cartório Notarial de DB sob o nº … e pagos pelo R como melhor decorre dos Docs 16 e 17 e a fls 4676 da certidão junta sob Doc 22 à PI”. (sic) 17. Os Autores dizem também que por “requerimento aos autos datado de 7/04/2022 os AA reiteraram o enunciado e requerido de V a VII do requerimento apresentado em 11/11/2020.” (sic). 18. Dizem também os Autores que até “esta data o Réu não procedeu à junção do documento que se conhece estar na sua posse. Como se peticionou e resulta inequívoco dos factos controvertidos nos autos e se reiterou nos requerimentos enunciados de tal documento resultam factos indispensáveis à descoberta da verdade material nos presentes autos, pelo que se insiste e requer seja o Réu instado à sua junção nos termos e para os efeitos do preceituado art.º 429 e art.º 417 nº 2 e sob a cominação do art.º 344 do CC.” (sic). 19. E dizem ainda que, “não obstante, a mandatária signatária diligenciou pela consulta dos autos de processo crime que corre termos sob o PROC 5627/15.3TDLSB Juízo Central Criminal- Juiz 2, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, e tomou conhecimento da junção do referido documento pela aí arguida M…, do que requereu certidão ainda não disponibilizada” (sic). 20. Para além dos factos relativos ao conhecimento e consulta dos autos do processo crime não corresponderem à realidade, resulta também perplexidade no próprio Réu pelo pedido dos Autores. 21. O documento ora junto não corresponde ao alegado contrato promessa, desde logo, porque os Autores sempre se referiram a ele como um documento com as assinaturas reconhecidas notarialmente, caso que não é manifestamente o do documento agora juntos aos autos. 22. Por outro lado, dizem que o obtiveram por ter sido junto aos autos n.º 5627/15.3TDLSB que corre trâmites no Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 2, pela arguida A... que está acusada pela autoria de 22 crimes de falsificação ou contrafacção de documento, p. p. pelo artigo 256.º, n.º alínea a), c), d) e e) do Código Penal. 23. Pelo que não pode o Réu tomar posição sobre a veracidade da sua assinatura com base numa fotocópia do referido documento. 24. Sendo de qualquer modo indesmentível que não se trata do documento alegado existir pelos Autores uma vez que, o mesmo não tem as assinaturas notarialmente reconhecidas. 25. De qualquer modo, dir-se-á sempre que este documento a existir e a ser verdadeiro deitará por terra todas as teses dos Autores designadamente, que não pretendiam alienar os seus imóveis e que não sabiam que documentos estavam a assinar. 26. Não só sabiam e queriam vender os seus imóveis como ao que parece, estavam a prometer adquiri-los 365 dias depois. A tese da simulação do negócio cai por terra. Este documento a ser verdadeiro, prova que existiu uma compra e venda de imóveis e a promessa para a sua compra posterior. 27. A ser verdadeiro falecem as despudoradas tentativas do imputarem putativos vícios da vontade aos negócios celebrados. Sobra uma promessa que não foi cumprida”. 5 – Por DESPACHO de 18/11/2022, decidiu-se o seguinte: “Junção de documentos pelos Autores: Veio o Réu insurgir-se quanto à tempestividade dessa mesma junção, na medida em que em data muito anterior ao julgamento estavam na posse do mesmo, podendo assim efectuá-la com a antecedência de 20 dias antes do julgamento conforme disposto pelo art.º 423.º, n.º 2, do CPC. A razão de ser do prazo constante do art.º 423.º n.º 2 do CPC resulta clara da exposição de motivos do CPC. Ele teve como objectivo permitir o contraditório sobre o documento junto atempadamente, por forma a que a sua junção não determinasse – como era hábito no passado determinar – o adiamento da audiência de julgamento com fundamento na circunstância de a parte não prescindir de prazo para se pronunciar sobre o mesmo e opor-se ao início do julgamento sem que tivesse essa possibilidade. Ora no caso dos autos não foi a junção do documento que obstaculizou à realização do julgamento. Aquilo que determinou o adiamento da audiência de julgamento foi o facto de o Réu, notificado para comparecer e prestar depoimento de parte, não ter comparecido, tendo toda a pertinência neste processo, assim como em qualquer outro, que o julgamento – como estatuído por lei – se inicie pelo depoimento de parte do qual poderá resultar a confissão. Assim sendo, por tempestivo e por ter eventual relevância para a prova a produzir nos autos relativamente aos temas de prova, admite-se a junção aos autos do documento junto pelos Autores. Vão os mesmos condenados em 1 Uc de multa pela sua junção nos termos do art.º 423.º, n.º 2, do CPC, uma vez que “não ter o documento na sua posse” não equivale à impossibilidade de junção em momento anterior a que alude o referido artigo. Notifique”. 6 - Inconformado com o decidido, o Réu interpôs recurso de apelação, por referência à decisão prolatada. No âmbito de tal recurso, formulou as seguintes CONCLUSÕES (que ora integralmente se transcrevem): “I. Os Autores juntaram aos autos no dia 05-09-2022, através de requerimento com ref. CITIUS 21688742 um documento e no dia 06-09-2022 com a ref. CITIUS 217011714 a respectiva certidão judicial da fotocopia do documento, tendo o Réu através do requerimento de 19-09-2022 alegado a extemporaneidade da sua junção. II. O Tribunal a quo decidiu pela oportunidade da sua junção, conforme despacho com a referência CITIUS 140677666, pelo que é contra este despacho que admitiu a junção do documento que se reage, atenta a ilegitimidade e ilicitude da junção documento e por conseguinte, do despacho que a admitiu. III. O documento junto é uma certidão judicial consistente na cópia fiel do documento 186, constante de fls. 10819 a 10812 v.º junto aos autos n.º 5627/15.3TDLSB que corre trâmites no Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 2, pelo ilustre mandatário da, lá arguida A... e aqui nestes autos testemunha dos Autores, que foi expressamente notificado à mandatária dos autores naqueles autos e nestes também, no dia 06 de maio de 2022. IV. Sucede que o documento junto autos agora, estava perfeitamente disponível, pelo menos desde o dia 9 de maio de 2022 para os Autores que dele tomaram conhecimento como estavam na posse de cópia do mesmo e podiam logo nesse dia, ter solicitado uma certidão, o que não fizeram e tão pouco o juntaram a estes autos. V. Como excecionalmente explicou o tribunal a quo “A regra consta do n.º 1 do art.º 423.º é a de que os documentos deverão ser juntos com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes aos fundamentos, sejam eles da acção ou da defesa.” VI. “A regra especial consta do n.º 2 e permite que os documentos sejam juntos até 20 dia antes da audiência de discussão e julgamento, condicionando essa junção à alegação de impossibilidade atempada nos termos do n.º 1 e condicionando a sua junção à condenação em multa. VII. “O regime excepcional consta do n.º 3 nos termos do qual os documentos podem ser juntos aos autos no período de 20 dias até à audiência de discussão e julgamento, mas condicionando essa admissibilidade de junção a pressupostos apertados cujo ónus de alegação recai sobre quem se pretende fazer valer dos mesmos. Assim, quem pretenda juntar documentos aos autos depois dos 20 dias que antecedem a data do julgamento terá que não só alegar, mas também provar uma de duas circunstâncias: que a apresentação não tenha sido possível (objectivamente possível) até aquele momento ou que a apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior. VIII. Não se verifica nenhum dos pressupostos de aplicabilidade do n.º 3 do artigo 423.º do CPC, a junção teria sido possível desde o dia 9 de maio de 2022, portanto muito antes do término do prazo de do n.º 2 do mesmo preceito legal. IX. Nem a apresentação se tornou necessária por ocorrência posterior. X. O despacho recorrido violou o disposto no artigo 423.º, n.º 3 do CPC.”. Conclui, no sentido da revogação do despacho recorrido, o qual deve ser substituído “por despacho que indefira, por extemporânea, a junção do documento”. 7 – Os Autores Apelados apresentaram resposta às alegações, na qual formularam as seguintes CONCLUSÕES: “I – O Recorrente instado a juntar aos autos nos termos e para os efeitos conjugados do art.º 429 e art.º 417 nº 2 do CPC e sob a cominação do art.º 340 do CC , o documento objecto do reconhecimento presencial de assinatura dos AA e R, ora Recorridos e Recorrente, outorgado no dia 28 de Março de 2016 na sequência da outorga da escritura publica em causa nos presentes autos e registado no Livro de Reconhecimento do Cartório Notarial de DB sob o nº … e pagos pelo R como melhor decorre dos Docs 16 e 17 e a flls 4676 da certidão junta sob Doc 22 à PI. não procedeu à junção do documento que se conhece estar na sua posse. II-. Como se peticionou e resulta inequívoco dos factos controvertidos nos autos e se reiterou nos requerimentos enunciados de tal documento resultam factos indispensáveis à descoberta da verdade material nos presentes autos. III- Conhecendo os AA e ora Recorridos da junção de tal documento pela arguida nos autos de processo crime que correm termos sob o PROC 5627/15.3TDLSB Juízo Central Criminal- Juiz 2, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, requereram certidão só disponibilizada em 6.09.2022, ainda que requerida pelos Recorridos em Julho de 2022 e logo que a junção de tal documentos se mostrou junto legivelmente e admitida a sua junção aos referidos autos de processo crime. IV- A referida certidão foi emitida em 06.09.2022 (ainda que requerida em Julho de 2022) e de imediato e na mesma data junta aos autos pelos Recorridos com a referencia CITIUS 21701714, o que fizeram tempestiva e legitimamente nos termos e conforme ao preceituado no art.º 423 nº 3 do CPC porquanto resulta inequívoco da matéria controvertida nos autos, indispensável à descoberta da verdade material nos autos, V- O Réu e Recorrente ao exercer o contraditório sobre a admitida junção do documento, circunscreveu a sua oposição à junção tão só alegando que teria sido intenção dos AA obstaculizar o contraditório do Réu e impedir a realização da audiência designada para o dia 07.09.2022, os mesmos exactos termos em que o ora Recorrente mantém e a que circunscreve o âmbito do presente recurso. VI- Falta o Réu e ora Recorrente à verdade na sua alegação como volta a faltar à verdade nas suas alegações de recurso reiterando tal junção ter obstaculizado a realização da audiência de julgamento, porquanto conhece que foi a sua falta reiterada às sessões agendadas que determinaram o adiamento da audiência designada para o referido dia, porquanto haveria e se impunha iniciar a audiência de discussão e julgamento pelo seu Depoimento de Parte requerido pelos AA e ora Recorridos, o que não foi possível em virtude de não ter comparecido. – Cfr acta de audiência de discussão e julgamento de 18.11.2022 com a Refª CITIUS 140677666 VII-. Aliás pelas faltas sucessivas do Réu e ora Recorrido o julgamento só teve inicio no dia 14 de Dezembro de 2022, mais de 60 dias após a junção pelos AA e Recorridos do referido documento. VIII-. Neste sentido andou bem o aliás douto Tribunal a quo ao apreciar da junção do documento e do que foi efectivamente os termos do exercício do contraditório pelo Réu ao entender que “A razão de ser do prazo constante do art.º 423 nº 2 do CPC resulta clara da exposição de motivos do CPC. Ele teve como objectivo permitir o contraditório sobre o documento junto atempadamente, por forma a que a sua junção não determinasse – como era hábito no passado determinar- o adiamento da audiência de julgamento com fundamento na circunstância de a parte não prescindir de prazo para se pronunciar sobre o mesmo e opor-se ao inicio do julgamento sem que tivesse essa possibilidade. Ora no caso dos autos não foi a junção do documento que obstaculizou à realização do julgamento. Aquilo que determinou o adiamento da audiência de julgamento foi o facto de o Réu, notificado para comparecer e prestar depoimento de parte, não ter comparecido, tendo toda a pertinência neste processo, assim como em qualquer outro, que o julgamento- como estatuído por lei- se inicie pelo depoimento de parte do qual poderá resultar a confissão” (negrito e sublinhado nosso ) – Cfr acta de audiência de discussão e julgamento de 18.11.2022 com a refª CITIUS 140677666 IX.. Assim e em conformidade decidiu bem o aliás douto Tribunal a quo ao determinar que “tempestivo e por eventual relevância para a prova a produzir nos autos relativamente aos temas de prova, o aliás douto Tribunal Recorrido admitiu a junção aos autos do documento juntos pelos AA e ora Recorridos”. Cfr- Despacho recorrido datado de 18.11.2022 com a Referência CITIUS 140677666 X-- O Réu e ora Recorrente exerceu o seu direito de contraditório e como conhece a junção de tal documento efectuada legitima e tempestivamente pelos ora Recorridos só aproveita (o que parece temer) à descoberta verdade material nos autos e em nada obstaculizou ou retardou o seu exercício de contraditório ou o normal andamento do processo”. Concluem, no sentido da total improcedência do recurso, com consequente confirmação do despacho apelado. 8 – O recurso foi admitido por despacho datado de 23/01/2023, como apelação, a subir de imediato e em separado, tendo efeito meramente devolutivo. 9 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir. ** II – ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO Prescrevem os nºs. 1 e 2, do art.º 639º do Cód. de Processo Civil [2], estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que: “1 – o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. 2 – Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar: a) As normas jurídicas violadas; b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas; c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”. Por sua vez, na esteira do prescrito no n.º 4 do art.º 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação do Recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. Pelo que, na ponderação do objecto do recurso interposto pelo Recorrente Réu, delimitado pelo teor das conclusões expostas, e tendo ainda em consideração o teor da decisão apelada, a apreciação a efectuar na presente sede consubstancia-se em aferir se deve ser admitido nos autos o documento cuja junção foi requerida pelos Autores por requerimento datado de 05/09/2022, e cuja certidão do mesmo foi requerida juntar no dia imediato, ou seja, 06/09/2022 (data da sua emissão). ** III - FUNDAMENTAÇÃO A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A factualidade a ponderar é a que decorre do iter processual supra exposto, à qual se acrescenta a seguinte, tendo por base a análise dos vários actos processuais: 1) Na presente acção declarativa sob a forma de processo comum foi designada para a audiência final o dia 17/09/2019; 2) Nessa data, aberta a audiência, e após requerimentos apresentados pelas partes, foi proferido despacho, o qual findou nos seguintes termos: “(…..) Assim sendo, e antes de se iniciar a audiência de discussão e julgamento, afigura-se-nos fundamental que se oficie ao processo com o nº. 5627/15.3TDLSB do DIAP de Lisboa com vista a que informe os presentes autos se nos mesmos já foi proferido despacho de acusação e, na afirmativa, se remeta cópia desse mesmo despacho. Afigura-se ao Tribunal ser destituído de sentido iniciar a presente audiência de discussão e julgamento, com a respectiva produção de prova agendada, sem que este elemento conste dos autos, sendo certo que, só agora com o requerimento de junção de documentos efectuados em 13 e 15 de Setembro tomou o Tribunal consciência do número de implicados no processo crime e da circunstância das diligências de investigação estarem perto do fim. Em face do exposto dá-se sem efeito a audiência de discussão e julgamento agendada para o dia de hoje e de amanhã”; 3) Posteriormente, foi designado para a realização da audiência final do dia 07/09/2022; 4) Nessa data, constatada a ausência do Réu, que se encontrava devidamente notificado, após a abertura da audiência e apresentação de requerimentos por parte dos Autores e Réu, foi proferido despacho com o seguinte teor: “Uma vez nos termos do C.P.C. o julgamento se inicia pela prestação de depoimentos de parte sendo que apenas após será produzida a prova testemunhal, e tendo toda a razão de ser a abertura de produção de prova por este meio do qual poderá resultar a confissão de fatos suspende-se a presente audiência de julgamento, ficando desde já o Ilustre Mandatário do Réu notificado, para no prazo de 5 dias juntar aos autos os documentos que atestam a justificação para a falta do Réu, designando-se par a sua continuação (….) as seguintes datas: - 7 de Dezembro de 2022 (…)”. ** B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO A - Do enquadramento do litígio O despacho apelado enuncia, basicamente, o seguinte: § A razão de ser do n.º 2 do art.º 423º, do Cód. de Processo Civil teve como desiderato “permitir o contraditório sobre o documento junto atempadamente”, de forma a que a sua junção não determinasse o adiamento da audiência de julgamento, com fundamento na circunstância da parte não prescindir de prazo para se pronunciar sobre o mesmo e opor-se ao início do julgamento sem que tivesse essa possibilidade; § In casu, não foi a junção do documento que obstaculizou à realização do julgamento; § O que determinou o adiamento da audiência de julgamento foi o facto do Réu, notificado para comparecer e prestar depoimento de parte, não ter comparecido; § Tendo efectiva pertinência que o julgamento de inicie pelo depoimento de parte, do qual poderá resultar a confissão; § Pelo que, sendo tempestivo e por ter eventual relevância para a prova a produzir, admite-se a junção aos autos do documento pelos Autores. O Apelante Réu fundamenta a sua pretensão recursória, basicamente, nos seguintes argumentos: 1) Os Autores tiveram conhecimento do documento cuja junção é requerida pelo menos desde o dia 09/05/2022, tendo o mesmo sido notificado, em 06/05/2022, à sua mandatária nos autos nº. 5627/15.3TDLSB, a tramitar no Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 2, no qual figuram como assistentes; 2) A sua junção teria, assim, sido possível desde o dia 09/05/2022, ou seja, antes do terminus do prazo inscrito no n.º 2, do art.º 423º, do Cód. de Processo Civil; 3) Não se verificando, deste modo, nenhum dos pressupostos de aplicabilidade do nº. 3, do art.º 423º, do Cód. de Processo Civil, nomeadamente: * Que não tenha sido possível tal apresentação até àquele momento; * Que a apresentação de tal documento se tenha tornado necessária em virtude ocorrência posterior. Na resposta contra alegacional apresentada, os Recorridos Autores argumentaram, em súmula, nos seguintes termos: I. No requerimento de oposição à junção do documento, por intempestividade, o Réu limitou a sua oposição tão-só alegando que tinha sido intenção dos Autores obstaculizar o contraditório do Réu e impedir a realização da audiência designada para o dia 07/09/2022; II. Todavia, não foi tal junção que obstaculizou a realização da audiência de julgamento, mas antes a reiterada falta do Réu às sessões de julgamento agendadas; III. Sendo que, devido às sucessivas faltas do Réu, tal julgamento só teve início em 14/12/2022; IV. Assim, a junção de tal documento em nada obstaculizou ou retardou: - O exercício do contraditório por parte do Réu; - O normal andamento do processo. Circunscrito e enquadrado o teor da controvérsia sob sindicância, analisemos o quadro legislativo em equação. B - Do quadro legislativo Relativamente ao momento da apresentação da prova documental, prescreve o art.º 423º, do Cód. de Processo Civil, que: “1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes. 2 - Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado. 3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior”. O presente normativo, corresponde, com alterações, ao art.º 523º, do antecedente Cód. de Processo Civil (CPC 95/96), nomeadamente no que concerne ao limite temporal da apresentação da prova documental, “o que se conjuga com o propósito de assegurar que a audiência final se realize na data marcada e que, uma vez iniciada, decorra sem perturbações de maior quanto à entrada de documentos” – Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, 2ª Edição, Almedina, pág. 381. Assim, a redacção conferida a tal normativo pretendeu “contrariar uma certa tendência, que se constituíra em verdadeira estratégia processual, traduzida em protelar a junção de documentos para o decurso da audiência final”. Desta forma, constatando os efeitos negativos que daí decorriam, “com o arrastamento das audiências e perturbação do decurso dos depoimentos, levaram o legislador a adotar uma solução mais rígida, sem que daí resulte, todavia, prejuízo para descoberta da verdade”. Com efeito, “vigorando, embora, o ónus de apresentação da prova documental com o articulado em que são alegados os factos correspondentes, foi definido um termo ad quem no vigésimo dia anterior à data designada para a realização da audiência final, significando isso que as partes podem apresentar documentos até àquele momento, sujeitando-se ao pagamento de multa, a fixar entre 0,5 UC e 5 UC (art.º 27º, nº 1, do RCP), salvo se a apresentação extemporânea for considerada justificada” – Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2019, Reimpressão, pág. 499. Resulta, assim, do presente normativo existirem três distintos momentos de apresentação da prova documental. No primeiro momento, enunciado no nº. 1, os documentos são apresentados com os articulados, o que corresponde à solução consagrada no antecedente art.º 523º do anterior Cód. de Processo Civil. Num segundo momento, alterando o anteriormente previsto no nº. 2 daquele art.º 523º, é estabelecido como termo final para a apresentação dos documentos o vigésimo dia antecedente à data em que se realize a audiência final, “numa manifestação de efetividade do princípio da boa-fé processual (art.º 8º)”, operando-se, deste modo, “um paralelismo com o limite temporal previsto para a alteração do rol de testemunhas (art.º 598º, nº. 2), assim se densificando uma regra de estabilização dos meios de instrução a partir do vigésimo dia que antecede a audiência final”. Por fim, um terceiro momento, que pode ocorrer até ao encerramento da discussão, reunindo agora este nº. 3 do normativo algumas das excepções “anteriormente previstas na lei: impossibilidade de apresentação em momento anterior (art.º 523º, nº. 2, do CPC-95/96) e necessidade de junção ulteriormente verificada (art.º 524º, nº 2, do CPC-95/96)”. Todavia, a primeira das enunciadas ressalvas tem agora “um desenvolvimento. Anteriormente, a impossibilidade de apresentação com os articulados implicava a não sujeição do apresentante à regra prevista no nº 1, podendo então apresentar o documento em qualquer altura até ao derradeiro momento previsto na norma de dilação - regra transposta para o nº 2 -; atualmente, na norma de dilação prevista no nº 3, esse impedimento (que se prolongou para além do prazo previsto no nº. 2) apena legitima a apresentação imediata, logo que cesse a impossibilidade de apresentação, não podendo a parte aguardar pelo derradeiro momento pressuposto pela norma de dilação - o encerramento da discussão em primeira instância (art.º 425º). Trata-se da antecipação, para a fase anterior ao encerramento da discussão, da solução prevista no art.º 425º (art.º 524º, nº 1, do CPC-95/96). A segunda ressalva estava abrangida pela norma constante do nº 2 do art.º 524º do CPC-95/96. A apresentação torna-se necessária em virtude de ocorrência posterior, nomeadamente, no caso (expressamente previsto na lei antiga) de se destinar à prova ou contraprova de factos ocorridos após o termo do prazo previsto no número anterior” – Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, Vol. I, 2014, 2ª Edição, Almedina, pág. 370. Aqui chegados, e tendo em consideração a situação concreta em equação, impõe-se indagar acerca da eventual admissibilidade da junção de prova documental na situação em que, tendo sido designada data para a audiência de julgamento, e aberta esta, não vieram a realizar-se quaisquer dos actos enunciados no nº. 3, do art.º 604º, do Cód. de Processo Civil, em virtude da mesma ter sido adiada ou suspensa. Analisemos. C - Do quadro doutrinário Aludindo acerca do disposto no transcrito nº. 2, do art.º 423º, referenciam João de Castro Mendes e Miguel Teixeira de Sousa – Manual de Processo Civil, Vol. I, AAFDL, 2022, pág. 531 – que se não forem apresentados com o articulado respectivo, “os documentos podem ser apresentados até 20 dias da realização (efectiva) da audiência final (…)” (sublinhado nosso). Em idêntico sentido, referenciam José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre – Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª Edição, Almedina, pág. 241 – que o cômputo daquele prazo de 20 dias previsto no nº. 2, “idêntico ao estabelecido para o aditamento ou alteração do rol de testemunhas (art.º 598-2), está sujeito às regras gerais dos art.ºs 138 a 140, o que implica nomeadamente que se suspenda em férias judiciais (art.º 138-1), de modo que os 20 dias se contam excluindo-as”. Todavia, “não se realizando a audiência na data designada, o prazo conta em função da nova data, pois o que importa é a data em que a audiência se realiza e não aquela em que era suposto realizar-se” (sublinhado nosso). Tal entendimento é reafirmado por José Lebre de Freitas (a solo) – A Ação Declarativa Comum à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 4ª Edição, Gestlegal, Junho de 2017, pág. 290 -, consignando que a violação do dever de junção dos documentos com os articulados dá lugar ao pagamento de multa. Porém, não se estando perante um ónus, “as partes continuam a poder apresentar os documentos que provem os factos principais da causa, tal como os que provem factos instrumentais, até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final (art.º 423-2)”. Acrescenta, em nota de rodapé, que se a audiência final “não se realizar na data designada, a apresentação continua a ser possível até 20 dias antes da nova data. O que interessa é a realização efetiva da audiência, que uma apresentação em data mais próxima poderia perturbar, inclusivamente na sua realização. Trata-se de norma paralela à do art.º 598-2, relativa ao requerimento da prova testemunhal” (sublinhado nosso). Partilhando idêntica posição, enuncia Paulo Pimenta – Ob. Cit., pág. 381 – permitir o nº. 2, do art.º 523º a “apresentação posterior daqueles documentos até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sujeitando-se a parte à multa respectiva, salvo se justificar a apresentação tardia”. Porém, ressalva, em nota de rodapé (nota 896), que “esta antecedência fixada na lei deve ser entendida como reportada à data em que a audiência final se realize efectivamente. Assim, em caso de eventual adiamento (art.º 603º), reabre-se a hipótese de apresentar documentos até 20 dias antes da nova data” (sublinhado nosso). Este mesmo Autor, todavia, em diferenciada obra, juntamente com Abrantes Geraldes e Luís Filipe Pires de Sousa – Ob. Cit., pág. 499 -, parece perfilhar entendimento diferenciado, aduzindo que a teleologia do preceito, no sentido de visar “evitar a perturbação resultante da apresentação extemporânea de documentos, leva-nos a considerar que o limite para a sua apresentação (e também para a alteração do rol de testemunhas, ao abrigo do art.º 598º, nº 2, com semelhante redação) tem como referência a data designada para a audiência final ou para a primeira sessão, independentemente de qualquer adiamento ou continuação C neste sentido, reportando-se à alteração do rol de testemunhas admitida pela norma do art.º 598º, nº 2, cf. Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, 2ª ed., p. 327, nota 750, e RP 12-5-15, 7724/10). No entanto, alguma jurisprudência C assim também Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC anot., vol. II, 3ª ed., pp_ 675-676) vem entendendo que a antecedência de 20 dias se reporta à realização efetiva da audiência final e não a sua simples abertura, aplicando o preceito mesmo que haja adiamento ou continuação da audiência noutra sessão (RG 17-12-15,3070/09, RC 8-9-15, 2035/09 e RC 14-12-16, 3669/14) ou mesmo a repetição da audiência para ampliação da matéria de facto (RP 17-12-14,436/13; contra: RC 6-6-17,2890/13)” (sublinhado nosso). D - Do quadro jurisprudencial Em termos jurisprudenciais, e para além dos arestos já citados nas transcrições doutrinárias, enunciemos, exemplificativamente, os seguintes: - O Acórdão desta Relação e Secção de 06/06/2019 – Relatora: Laurinda Gemas, Processo nº. 18561/17.3T8LSB-A.L1-2, no qual o ora Relator figura como 2º Adjunto, in www.dgsi.pt -, no qual se exarou, para além do mais, o seguinte: “(…) tendo em conta a letra da lei e a sua ratio, como emerge da passagem citada, o sentido da expressão “até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final” é, em nosso entender, até à data em que efetivamente se inicie a audiência final. Ante a possibilidade de a data inicialmente designada para audiência final ser dada sem efeito (como sucedeu no presente processo) ou de adiamento propriamente dito da audiência (cf. art.º 603.º do CPC), a data a considerar é a data concreta em que a audiência final se venha a iniciar/realizar. A nosso ver, o sentido da norma não é o de permitir a “livre junção documental” (ainda que com eventual condenação em multa) até 20 dias antes da data em que se encerre a audiência final ou até 20 dias antes da data em que se conclua uma sessão da mesma. Este entendimento, que nos parece ser maioritário, na doutrina e na jurisprudência, encontra, aliás, paralelismo com o que foi defendido na vigência do anterior Código de Processo Civil relativamente ao art.º 512.º-A, que previa a possibilidade de aditamento ou alteração do rol de testemunhas até 20 dias antes da data em que se realizasse a audiência de julgamento. Reconhecendo este paralelismo, Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, referem a respeito do regime do n.º 2 do art.º 423.º do CPC tratar-se de densificação de “uma regra de estabilização dos meios de instrução a partir do vigésimo dia que antecede a audiência final” - in “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2.ª edição, Almedina, pág. 370. Em sentido em parte coincidente com o que defendemos pronunciam-se Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, obra citada, pág. 499 (sublinhado nosso): “A teleologia do preceito, que visa evitar a perturbação resultante da apresentação extemporânea de documentos, leva-nos a considerar que o limite para a sua apresentação (e também para a alteração do rol de testemunhas, ao abrigo do art.º 598º, nº 2, com semelhante redação) tem como referência a data designada para a audiência final ou para a primeira sessão, independentemente de qualquer adiamento ou continuação (neste sentido, reportando-se à alteração do rol de testemunhas admitida pela norma do art.º 598º, nº 2, cf. Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo", 2ª ed., p. 327, e RP 12-5-15, 7724/10).” Discordamos destes autores apenas na desconsideração que fazem do adiamento da audiência final (embora irrelevante para o caso em apreço). E nesta discordância estamos acompanhados por Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume 2.º, 3.ª edição, Almedina, pág. 241: “O cômputo do prazo do n.º 2, idêntico ao estabelecido para o aditamento ou alteração do rol de testemunhas (art.º 598-2), está sujeito às regras gerais dos art.ºs 138 a 140, (…). A razão de ser do prazo estipulado (a preparação, nas melhores condições, da audiência final) conduz a esta interpretação. Não se realizando a audiência na data designada, o prazo conta em função da nova data, pois o que importa é a data em que a audiência se realiza e não aquela em que era suposto realizar-se.” E mais adiante, na pág. 675, em anotação ao art.º 598.º: “O n.º 2 permite o adiamento ou a alteração (…) do rol de testemunhas até 20 dias antes da data em que efetivamente se realize a audiência final. A fixação duma primeira data, havendo depois adiamento da audiência, ainda que depois de aberta, nos termos do art.º 151-4 ou do art.º 603-1, ou a suspensão da instância, nos termos do art.º 269, não releva para o efeito, uma vez verificado o adiamento ou a suspensão”. Referem-se, pois, estes autores, se bem interpretamos a sua posição, apenas aos casos de adiamento, em que não chegou, pelas razões previstas nos citados normativos ou em virtude da suspensão da instância, a iniciar a prática de atos previstos no n.º 3 do art.º 604.º do CPC. Admitimos que possam também ser abrangidas pelo preceito (sendo, pois, de admitir a junção documental) certos casos de anulação da audiência final: se a audiência final tiver sido anulada, porque não foi adiada quando o devia ter sido; se houver uma anulação parcial do julgamento para ampliação da matéria de facto (tendo sido impugnado com êxito o despacho que inferiu uma reclamação apresentada relativamente ao despacho de enunciação dos temas da prova, com o aditamento de novo tema da prova – cf. art.º 596.º, n.º 3, do CPC). Não falta, é certo, quem defenda a possibilidade de junção documental até 20 dias antes do início de uma das sessões da audiência final. Neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 15-11-2018, no processo n.º 11465/17.1T8PRT-B.P1, disponível em www.dgsi.pt, em cujo sumário se afirma: O prazo limite para a apresentação de documentos (bem como o da alteração do rol de testemunhas) tem por referência não a data inicialmente designada para a audiência final mas a data da efetiva realização da audiência, quer haja adiamento ou continuação da audiência). Pensamos, todavia, tratar-se de posição minoritária, que não se coaduna com o espírito da norma, nem com o princípio da continuidade da audiência (cf. art.º 606.º do CPC), potenciando o risco de manobras dilatórias para atrasar a conclusão da audiência final e até a necessidade de reinquirição das partes/testemunhas já ouvidas em anteriores sessões a fim de serem confrontadas com os novos documentos, sendo certo que, com o novo regime de junção documental consagrado no CPC de 2013 se pretendeu, precisamente, contrariar o risco de tal acontecer, limitando-se, pois, a possibilidade de apresentação de documentos no decurso da audiência final (até ao encerramento da discussão) às situações previstas no n.º 3 do art.º 423.º do CPC, que adiante iremos analisar”. Perante este entendimento, sumariou-se, então, que: “II - Tendo em conta a letra da lei e a sua ratio no art.º 423.º, n.º 2, do CPC, a expressão “até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final” significa “até à data em que efetivamente se inicie a audiência final”. Atenta a possibilidade de a data inicialmente designada para audiência final ser dada sem efeito ou de adiamento propriamente dito da audiência, releva apenas a data concreta em que a audiência final se venha a iniciar/realizar. III - Mas uma vez iniciada, se tiver várias sessões, ainda que entre as mesmas decorram mais de 20 dias, não é admissível a junção documental ao abrigo do referido preceito”; - desta mesma Relação de 12/10/2021 – Relatora: Cristina Silva Maximiano, Processo nº. 5984/18.0T8FNC-B.L1-7, in www.dgsi.pt -, onde se consignou considerar-se “na situação em apreço, já ter decorrido o aludido prazo regressivo de vinte dias, por referência à data designada para audiência final, uma vez que o requerimento dos Autores foi formulado na quarta sessão da audiência final ocorrida em 19/05/2021, sendo certo que a audiência final teve início no dia 30/09/2020, com produção de prova, inclusive, seguindo-se as demais sessões (todas, também com produção de prova) nos dias 18/11/2020, 20/01/2021, 19/05/2021 (onde foi apresentado o aludido requerimento) e 16/06/2021 (encontrando-se agendada a sexta sessão para o dia 13/10/2021). Na verdade, entendemos que a data a considerar, para o efeito da contagem regressiva dos aludidos 20 dias, é a que designa dia para audiência final, independentemente de terem sido agendadas mais sessões em função do volume de prova a produzir. Cremos, por isso, que, nas situações em que hajam sido programadas várias sessões de julgamento – como no caso dos autos –, não é aceitável que o prazo de 20 dias se conte tendo como referência o início de qualquer uma delas, pois isso, além de criar instabilidade no processo, poderia interferir negativamente nos interesses da parte contrária”. Donde, ter-se sumariado que “o prazo regressivo de 20 dias mencionado no artigo 423º, nº 2 do Código de Processo Civil, conta-se, no caso de uma audiência final marcada para várias sessões, em relação à primeira sessão, e não em relação a cada sessão”. Efectuado este breve excurso jurisprudencial, é tempo de concluirmos pela posição adoptada, concatenando-a com o caso sob sindicância. E - Da posição adoptada e do caso concreto Em primeiro lugar, urge referenciar que o despacho apelado admitiu a junção do documento apresentado pelos Autores com base no momento processual inscrito no citado nº. 2, do art.º 423º, do Cód. de Processo Civil (o enunciado segundo momento), enquanto que a argumentação do Recorrente Réu tem por base, essencialmente, o não preenchimento de qualquer dos pressupostos de admissibilidade inscritos no nº. 3, do mesmo normativo (o referenciado terceiro momento). Ponderando o exposto, enunciemos as conclusões ou directrizes consideráveis: - não sendo os documentos juntos com os articulados, nos quais se aleguem os correspondentes factos – o nº. 1, do art.º 423º, do CPC -, podem ainda ser juntos no precedente prazo de 20 dias relativamente à data em que se realize a audiência final – o n.º 2, do mesmo art.º 423º; - caso, na data designada, e apesar de aberta, a audiência final venha a ser adiada, dada sem efeito ou suspensa, sem que ocorra a actividade processual probatória inscrita no nº. 3, do art.º 604º, do CPC, tal prazo não se tem por exaurido ou esgotado, transpondo-se para a nova data designada para a audiência final, desde que esta designação salvaguarde a dilação de 20 dias legalmente imposta ; - ou seja, a legal expressão “até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final”, deve ser entendida e interpretada como a data em que efectiva e realmente se inicie/realize a audiência final, com a prática dos actos inscritos naquele nº. 3, do art.º 604º; - todavia, uma vez iniciada a audiência final, com a produção de actividade probatória, e ainda que tenham sido designadas várias sessões temporalmente escalonadas por mais de 20 dias, já não legalmente admissível, nas sessões contínuas, a junção de prova documental nos quadros do nº. 2, do art.º 423º; - nesta situação, aquele prazo regressivo de 20 dias tem como início de contagem a data designada para a primeira sessão, não se replicando em relação a cada uma das demais sessões agendadas. Aplicando tais critérios ou directrizes ao caso sub judice, podemos consignar o seguinte: - nas audiências finais designadas para os dias 17/09/2019 e 07/09/2022, apesar de abertas, não foram produzidos quaisquer actos probatórios, nos termos do n.º 3, do art.º 604º, do Cód. de Processo Civil; - na primeira, entendeu-se dar “sem efeito a audiência de discussão e julgamento agendada para o dia de hoje (…)”, enquanto na segunda das datas foi determinada a sua suspensão e designadas datas para a sua continuação, sendo a primeira data 07/12/2022; - pelo exposto, tinham as partes (e, nomeadamente os Autores) a faculdade de juntarem aos autos prova documental no prazo regressivo de 20 dias relativamente à data em que efectiva e realmente se viesse a iniciar/realizar a audiência final, o que, na melhor das hipóteses, apenas terá ocorrido em 07/12/2022; - donde, tendo sido tal junção requerida em 05/09/2022 (documento particular) e 06/09/2022 (certidão), a mesma é legalmente acolhível nos quadros do citado nº. 2, do art.º 423º, do Cód. de Processo Civil; - e, não sendo ultrapassado tal limite temporal, o juízo da sua tempestividade não é aferível nos termos do nº. 3, do mesmo normativo; - donde, o despacho apelado não se encontra embuído de qualquer mácula, urgindo sustentá-lo e corroborá-lo. Pelo que, sem ulteriores delongas, improcedem as conclusões recursórias apresentadas, com consequente confirmação do despacho apelado/recorrido. * Nos quadros do art.º 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, tendo o Apelante/Recorrente/Réu decaído no recurso interposto, suporta as custas devidas. *** IV. DECISÃO Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em: a) Julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelo Réu/Apelante/Recorrente J…, figurando nos presentes autos como Autores/Apelados/Recorridos N… e R…; b) Em consequência, confirma-se – por que bem decidido - o despacho recorrido/apelado; c) Nos quadros do art.º 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, tendo o Apelante/Recorrente/Réu decaído no recurso interposto, suporta as custas devidas. -------- Lisboa, 22 de Junho de 2023 Arlindo Crua António Moreira Carlos Gabriel Castelo Branco _______________________________________________________ [1] A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original. [2] Todas as referências legais infra, salvo expressa menção em contrário, reportam-se ao presente diploma. |