Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
22507/20.3T8LSB.L1-2
Relator: LAURINDA GEMAS
Descritores: ARRENDAMENTO COMERCIAL
DANOS
INUNDAÇÃO
RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL
INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/24/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: (da exclusiva responsabilidade da Relatora – art.º 663.º, n.º 7, do CPC)
I – Provando-se que, na loja de que a Autora é arrendatária, foram causados danos por causa de uma inundação que foi ocasionada pela água proveniente da tubagem de abastecimento de água da fração de que a Ré era proprietária, é de considerar que esta incorreu em responsabilidade civil extracontratual, sendo aplicável o disposto no art.º 493.º do CC, a tanto não obstando a circunstância desse evento ter ocorrido de noite e numa altura em que decorriam trabalhos de empreitada de remodelação dessa fração e haviam sido tamponados os pontos de ligação à tubagem de abastecimento de água, tendo sido apurado que, pelo menos, um dos tampões dos pontos de ligação não impediu o vazamento de água, não sendo a mera intervenção de terceiro (“uma empresa” desconhecida) na realização de trabalhos de remodelação suficiente para afastar a presunção de ilicitude e de culpa consagrada naqueles artigo.
II – Considerando que na fração onde a Autora tem a sua sede e desenvolve a sua atividade, por causa da água proveniente da fração da Ré, se verificou a degradação do teto falso, em gesso cartonado, e uma avaria do detetor de fumo e duas baterias recarregáveis, danos esses que não incidiram sobre elementos estruturais da fração autónoma e cuja reparação importa em 2.162 € (mais IVA), dos quais a Autora já recebeu (da Seguradora, após participação do sinistro feita pela Ré) a quantia de 700 €, é de concluir que o ressarcimento de tais danos importa ainda na quantia de 1.462 €, assistindo à Autora o direito a ser indemnizada pelos mesmos, não obstante não seja proprietária da fração inundada, mas apenas arrendatária.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, os Juízes Desembargadores abaixo identificados

I - RELATÓRIO

A …, LD.ª, Autora na ação declarativa que, sob a forma de processo comum, intentou (em coligação com H …) contra B …, LD.ª, interpôs o presente recurso de apelação da sentença na parte em que julgou a ação improcedente.
Na Petição Inicial, apresentada em 27-10-2020, os Autores peticionaram que a Ré fosse condenada a:
a) indemnizar o 2.º Autor pelos danos patrimoniais no valor de 12.500 € e ainda no pagamento de indemnização no valor de 15.600 € a título de danos não patrimoniais;
b) a indemnizar a 1.ª Autora pelos danos patrimoniais no valor de 5.000 € e ainda no pagamento de indemnização no montante de 8.000 € a título de danos não patrimoniais.
Para tanto alegaram (considerando a Petição Inicial aperfeiçoada que apresentaram a 28-03-2022), designadamente que:
1º A 1.ª A. tem por arrendamento uma loja (piso 0) que é a sua sede social e o 2.º Autor tem a sua residência própria e permanente (1.º Dt.º) no prédio onde a R. adquiriu um apartamento (2.º Dt.º), sito na Calçada … n.º (…) Lisboa.
2º A R. contratou uma empresa/empreiteiros para proceder a obras de remodelação na sua fração sita na …, nº. (…), Lisboa.
3º No dia 24 de julho de 2020, a 1.ª A. deslocou-se ao escritório para verificar a correspondência, dado que a empresa se encontrava em período de férias.
4º Ao entrar no locado deparou-se com a queda do respetivo teto falso e uma quantidade grande de água vinda do piso superior em vários pontos da loja sendo visível, à primeira vista, danos em materiais e equipamentos de escritório.
5º Como era do conhecimento da 1.ª Autora, que estavam a decorrer obras na fração da R., deslocou-se à mesma, não sem antes avisar o 2.º A. que padecia do mesmo, uma vez que a obra era na fração acima do 2.º A. deveria também ter o mesmo problema, coisa que aliás se confirmou.
6º Ao informar da inundação e dos respetivos estragos reparou que houve algum espanto por parte dos empreiteiros, que até então nem tinham dado por qualquer problema, os trabalhadores não sabiam onde se encontrava a torneira de segurança para fechar a água, acabando por ser a própria 1.ª A. a ajudar na sua localização e a dar instruções de como a fechar.
7º Após o sucedido, à conversa com um dos empreiteiros, concluíram que a origem teria sido uma bicha de uma torneira que terá ficado a deitar água durante toda a noite.
8º Junto do responsável pela obra foi questionado se existia algum seguro que cobrisse os danos causados.
9º O mesmo informou que não tinha seguro, mas que a R. teria contratado, dias antes do início das obras, um seguro de responsabilidade civil.
10º Deste modo, e face ao exposto, entrou a 1.ª A. de imediato em contacto com o 2.º A. e com a R.
11º A R. reconheceu toda a responsabilidade pelos danos causados, demonstrando compreensão e interesse na resolução do problema o mais breve possível.
12º Foi também comunicado pela R. que só lhe era possível participar ao seguro no dia 27 de julho de 2020 (segunda-feira) por razões pessoais, tendo o sinistro ocorrido na noite do dia 23 para 24 de julho 2020 (noite de quinta para sexta feira).
13º No dia 6 de agosto, (dez dias após o sinistro) deslocaram-se dois peritos para averiguação dos danos causados.
14º Após a verificação geral haver incertezas sobre a origem do sinistro e a participação da R., sendo que os peritos solicitaram aos AA. que enviassem por e-mail diversas documentações acerca da inundação como fotos e descrições escritas.
(…)
22º É de salientar que durante este período temporal, os AA. encontram-se na pendência da reparação, pela R., dos danos causados pela inundação, nomeadamente, com alagamento de pavimento, danificação de portas e as suas estruturas, estantes, colapso de tectos, quedas de placas de pladur e outras partes integrantes das frações danificadas, discriminados nos orçamentos oferecidos para reparação que se juntam.
 23º A 1ª A., em virtude de se tratar de uma empresa, tendo o seu escritório e sua sede social na morada, ficou impedida da exercer a sua atividade profissional, ficou lesada no espaço da sua oficina como no respetivo escritório, tendo vários materiais danificados bem como as respetivas infraestruturas do imóvel, a saber:
- queda de tecto falso, com reparação no valor de 2.398,50 € (dois mil, trezentos e noventa e oito euros e cinquenta cêntimos). (vide orçamento de C …, Lda.)
- danos no sistema de deteção de incêndio, com reparação no valor de € 167,00 (cento e sessenta e sete euros) e valor de 55,35 € (cinquenta e cinco euros e trinta e cinco cêntimos) vide fatura da D …, Lda.
- material danificado e documentação onde continha projetos, esquemas e propostas de orçamentos na qual estima um prejuízo de 1.000,00 € (mil euros)
24º O 2º A., tem a sua habitação própria e permanente, bem como do seu agregado familiar, composto por quatros pessoas sendo duas delas menores, ficou impossibilitado da sua utilização em virtude de terem ocorrido danos significativos, a saber:
- Wc da suite, com valor de reparação orçado em 1.870,00 € (mil, oitocentos e setenta euros)
- Wc principal, com valor de reparação orçado em 1.880,00 € (mil, oitocentos e oitenta euros)
- Quarto casal, com valor de reparação orçado em 1.680,00 € (mil, seiscentos e oitenta euros)
- Quarto 1, com valor de reparação orçado em 1.260,00 € (mil duzentos e sessenta euros)
- Quarto 2, com valor de reparação orçado em 1.085,00 € (mil e oitenta e cinco euros)
- Hall, com valor de reparação orçado em 220,00 € (duzentos e vinte euros)
- Despensa e casa das máquinas, com valor de reparação orçado em 313,00 € (trezentos e treze euros)
A todos estes valores acresce IVA à taxa legal.
impossibilitando a sua total e prudente utilização.
25º Danos que se contabilizam, objecto de ressarcimento, no que concerne ao escritório da 1.ª A., no valor de 3.620,85 € (três mil, seiscentos e vinte euros e oitenta e cinco cêntimos)
26º Danos que se contabilizam, objecto de ressarcimento, no que concerne à casa de habitação própria e permanente do 2.º A, bem como do seu agregado familiar, no valor de 10.218,84 € (dez mil, duzentos e dezoito euros e oitenta e quatro cêntimos).
31º Assim, e pelo alegado em 23º e 24º, os Autores reclamam da R., o pagamento dos danos patrimoniais que terá de suportar, no montante de 13.839,69 €.
32º É lógico e fácil de perceber, que o estado psicológico dos Autores foi muito afetado por toda a situação criada pela R..
33º Entendem os Autores que os 20.000,00 € (vinte mil euros) que pedem a título de danos não patrimoniais é pouco, levando em conta o enorme e grave desgaste psicológico que têm sofrido desde o 1.º dia que ocorreu o sinistro, uma vez que o apartamento ficou sem as mínimas condições de habitabilidade para si e para a sua família no caso do 2.º A., e sem as condições mínimas necessárias ao desenvolvimento da atividade profissional da 1.ª A..
Concluíram, na Petição Inicial aperfeiçoada, pedindo que a Ré fosse condenada a:
a) indemnizar o 2.º Autor pelos danos patrimoniais provocados pela inundação no valor de 10.218,84 € (dez mil, duzentos e dezoito euros e oitenta e quatro cêntimos) e no valor de 10.000,00 € (dez mil euros) a título de danos não patrimoniais;
b) indemnizar a 1.ª Autora a título de danos patrimoniais no montante de 3.620,85 € (três mil, seiscentos e vinte euros e oitenta e cinco cêntimos) e no valor de 10.000,00 € (dez mil euros) a título de danos não patrimoniais.
A Ré apresentou Contestação, em que se defendeu por exceção e por impugnação, invocando designadamente a falta de constituição de advogado e a ilegitimidade processual da Autora, bem como já ter sido efetuado pela Seguradora E …, S.A. o pagamento das indemnizações devidas, considerando os danos que efetivamente decorrem do sinistro, conforme peritagem ordenada pela referida Seguradora.
Os Autores juntaram procurações constituindo advogado nos autos, com ratificação do processado.
Os Autores, no seguimento de despacho que os convidou nesse sentido, vieram responder à matéria de exceção da Contestação.
A Ré respondeu à Petição Inicial aperfeiçoada.
Foi dispensada a realização de audiência prévia, proferido despacho saneador, em que se fixou o valor da causa em 41.100 € e julgou não verificada a exceção de ilegitimidade processual da Autora, o que se fundamentou nos seguintes termos:
“A ré exceciona a ilegitimidade da autora A …, Lda., por ser arrendatária e não proprietária da fração que identifica.
A legitimidade processual consiste num pressuposto processual que se avalia pela relação material controvertida, tal como é configurada pelo autor (n.º 3 do artigo 30.º do Código de Processo Civil). Assim, verifica-se que, no caso dos autos, a autora alega ser arrendatária da fração e, nessa qualidade e nessa medida, alega ter sofrido danos.
Saber se a autora sofreu efetivamente os danos que alega constitui já questão substancial a decidir em função da prova que seja produzida nos autos. Do ponto de vista da admissibilidade da ação, considerando a relação material controvertida, tal como os autores a configuram, a sociedade autora tem interesse direto em demandar (n.º 1 do artigo 30.º) e é, portanto, parte legítima nos autos.
Nos termos e pelos fundamentos expostos, julgo não verificada a invocada exceção dilatória de ilegitimidade ativa.”
Mais foi proferido despacho identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova.
No que ora importa, foi admitido o que se qualificou como uma redução do pedido deduzido pela Autora quanto à parcela atinente aos danos patrimoniais (de 5.000 € para 3.620,85 €), e não foi admitida a ampliação do seu pedido na parte atinente aos danos não patrimoniais (de 8.000 € para 10.000 €), pelo que se considerou ser o pedido da Autora correspondente à soma das parcelas 3.620,85 € e 8.000 €.
Realizou-se a audiência final de julgamento, no decurso da qual a Ré se confessou devedora da quantia de 1.250,00 € ao Autor H ….
Foi proferida a sentença recorrida cujo segmento decisório tem o seguinte teor:
“Face ao exposto, julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência, condeno a ré a pagar ao autor H … a quantia de € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros), absolvendo-a de todo o mais peticionado nos autos.
Custas por ambas as partes, na proporção do decaimento, que é de 5% para a ré.
Registe”.
É com esta decisão absolutória que a Autora não se conforma, tendo interposto o presente recurso de apelação, em cuja alegação formulou as seguintes conclusões:
“Os pontos de facto concretos que se consideram incorretamente julgados são, em relação aos que se entende terem sido incorretamente dados como não provados, todos os supra indicados em A, B, e C, os quais se entende que deveriam ter sido considerados provados, e ainda a omissão do Mm Juiz a quo quanto à responsabilidade da Ré para com a fração.
E em particular:
i)          deveria ter ficado provado que
A. A sociedade autora utilize a loja identificada acima no n.º 1 como arrendatária (artigo 1.º da petição inicial aperfeiçoada);
B. A água proveniente da fração da ré tenha danificado material e documentação (projetos, esquemas e propostas de orçamentos) da sociedade autora, em valor de € 1 000,00 (artigo 23.º da petição inicial aperfeiçoada);
C. Em virtude dos danos acima mencionados em 7. a sociedade autora tenha ficado impedida de exercer a sua atividade comercial (artigo 33.º da petição inicial aperfeiçoada);
ii) deveria o Mmo Juiz a quo ter considerado provado que:
O acidente que causou danos nas frações inferiores ocorreu no dia 24 de julho de 2020;
O seguro de responsabilidade era da responsabilidade da Ré, devendo o mesmo vigorar antes do início das obras, o que não se sucedeu;
Termos em que deve a douta sentença proferida pelo tribunal a quo ser alterada e substituída por outra que julgue totalmente procedente o pedido formulado pela Autora, por provado, e que em consequência condene a Réu do pedido”.
Foi apresentada alegação de resposta pela Apelada, em que requereu, além do mais, a ampliação do âmbito do recurso, concluindo nos seguintes termos:
I. INSUFICIÊNCIA DAS CONCLUSÕES E INOBSERVÂNCIA DOS ÓNUS NA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
A. Da leitura das conclusões constantes das Alegações da Recorrente (que delimitam o objeto do recurso), bem como de qualquer outra parte das alegações, não se extrai quais sejam os concretos meios de prova que determinam a alteração da decisão sobre a matéria de facto.
B. Resulta do artigo 639.º/1 do Código de Processo Civil que o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
C. Ao longo das alegações da Recorrente, nunca são indicados quais os meios probatórios constantes do processo que impunham uma decisão diferente sobre os pontos da matéria de facto impugnados. No recurso em apreço são apenas indicados diversos factos que, na ótica da Recorrente, foram erradamente dados como não provados, no entanto, não indica os meios probatórios concretos que fazem prova destes mesmos factos.
D. No recurso apresentado consta uma transcrição quase integral dos depoimentos de duas testemunhas por si arroladas, sem nunca ter sido esclarecido pela Recorrente que parte destes depoimentos determinaria decisão diversa da proferida pelo Tribunal a quo.
E. De igual modo, a Recorrente não especificou os fundamentos, as razões que determinariam a formação de convicção diversa da alcançada.
F. O Recurso da Recorrente pode sumariar-se no seguinte: identificação das alegações de facto, que no seu entender, deveriam ter sido julgados provados e transcrição do depoimento de duas testemunhas.
G. O ónus de impugnação previsto no artigo 640.º, n.º 1, al. b) do C.P.C. exige, sob pena de rejeição, que o recorrente especifique os meios probatórios que determinariam decisão diversa da tomada em primeira Instância para cada um dos factos que pretende impugnar, não sendo suficiente a genérica indicação dos ditos meios de prova.
H. Acresce que nos termos do artigo 640.º, n.º 2 al. a) do CPC, quando os meios de prova tenham sido gravados, “incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso (...)”. Este ónus não foi, claramente, cumprido.
I. Face o aqui exposto, conclui-se que a Recorrente, por um lado, não cumpriu o ónus de apresentar conclusões completas, pois das mesmas não decorre a mais pequena referência a quaisquer meios de prova que justifiquem da alteração da decisão de facto (artigo 639.º/1 CPC).
J. Por outro lado, também incumpriu o ónus previsto no artigo 640.º/1-b) e 640.º/2-a) do CPC.
K. Estes vícios determinam a rejeição imediata do recurso, a qual se requer.
II. ERRO DE JULGAMENTO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO
L. Pretende a Recorrente trazer para a matéria de facto provado proposições que os vários depoimentos e a prova documental produzida infirmam.
M. A Recorrente, por considerar que os testemunhos de F … e G … fazem prova cabal, pugna pelo aditamento ao elenco dos factos provados das seguintes proposições: A. A sociedade autora utilize a loja identificada acima no n.º 1 como arrendatária (artigo 1.º da petição inicial aperfeiçoada); B. A água proveniente da fração da ré tenha danificado material e documentação (projetos, esquemas e propostas de orçamentos) da sociedade autora em valor de € 1 000,00 (artigo 23.º da petição inicial aperfeiçoada); C. Em virtude dos danos acima mencionados em 7. A sociedade autora tenha ficado impedida de exercer a sua atividade comercial (artigo 33.º da petição inicial aperfeiçoada).
N. Sucede que o depoimento transcrito de F …, que é marido e pai dos sócios da sociedade aqui Recorrente, limita-se apenas a descrever o processo de descoberta do sinistro e, consequentemente, dos danos que foram provocados. Todavia, sem referir o valor dos danos referente ao material e documentação danificados, nem tão pouco que a Requerente tenha estado impossibilitada de exercer a sua atividade na fração loja.
O. No que concerne ao depoimento transcrito de G …, que é cônjuge do 2.º Autor (H …), limita-se também apenas a narrar a descoberta do sinistro e, consequentemente, os danos que foram provocados, desta feita na fração da propriedade do 2.º Autor (1.º andar direito), que não se encontra em discussão no presente recurso.
P. Pelo que não foi possível à Recorrida compreender o que a Recorrente pretende alcançar com a transcrição dos depoimentos destas duas testemunhas. Atente-se que, na verdade, em sede de audiência de julgamento foi produzida prova em sentido contrário ao que foi alegado pela Recorrente.
Q. No que diz respeito ao facto B que consta na lista de factos não provados da Sentença, a saber: “A água proveniente da fração da ré tenha danificado material e documentação (projetos, esquemas e propostas de orçamentos) da sociedade autora em valor de € 1.000,00”, verificou-se que a Recorrente não ofereceu aos autos prova suficiente que demonstrasse a computação do dano.
R. Neste ponto, requer-se que sejam valoradas as declarações de parte da própria representante da Recorrente, pois foi possível concluir que o montante deste dano não foi objeto de um cálculo exato, com base em despesas contabilizadas. Vejamos,
S. Por um lado, apurou-se que a Recorrente nunca chegou a enviar ao perito N …, nem tão pouco a juntar aos presentes autos, qualquer fatura de aquisição dos produtos que componham o stock alegadamente danificado – minuto 11:52 da gravação das declarações de parte da Recorrente, na pessoa da legal representante I …, que se iniciaram às 11:52 e terminaram às 12:04. Por outro lado, também se apurou que os dossiers de contabilidade geral danificados não representaram qualquer transtorno para a Recorrente – minuto 10:56 da gravação das declarações de parte da Recorrente, que se iniciaram às 11:52 e terminaram às 12:04.
T. Conclui-se, também, que andou bem o Tribunal, quando fez constar da lista de factos não provados da Sentença o facto C: “Em virtude dos danos acima mencionados em 7.a sociedade autora tenha ficado impedida de exercer a sua atividade comercial (artigo 33.º da petição inicial aperfeiçoada)”.
U. Para este efeito considere-se as declarações de parte da legal representante da Recorrente (gravadas entre as 11:52 e 12:04, a partir do minuto 09:47) provaram que a Sociedade nunca esteve impedida de exercer a sua atividade comercial, tendo continuado a sua atividade ininterruptamente.
V. A Recorrente pretende, ainda, que seja aditada ao elenco dos factos provados a seguinte proposição: “O seguro de responsabilidade era da responsabilidade da Ré, devendo o mesmo vigorar antes do início das obras, o que não se sucedeu”.
W. Este facto afigura-se, salvo o devido respeito, absolutamente irrelevante para a decisão da causa. Desde logo porque a validade do contrato de seguro nunca foi matéria de discussão nos presentes autos, e porque a seguradora realizou o pagamento de indeminização à Recorrida.
X. Não obstante, salientou-se que os legais representantes da Recorrida encetaram as diligências necessárias para apurar o sucedido e participar o sinistro à E …, S.A. Esta participação foi, como bem sabe a Recorrente, oportunamente realizada, como aliás o demonstra a circunstância de a Recorrida já ter sido ressarcida pela seguradora. Inexistindo, assim, qualquer dúvida sobre a validade do contrato celebrado.
Y. Sublinhamos que a Recorrente nada consegue extrair desta sua alegação.
III. DA IMPUGNAÇÃO DE DIREITO
(a) O enquadramento jurídico da questão, o ónus da prova e a responsabilidade da Recorrida
Z. Apesar de não se encontrar vertido nas conclusões das alegações, e por essa razão não fazer parte do objeto do presente recurso, a Recorrente procura impugnar a matéria de Direito ao longo da sua peça. Todavia, sempre se entendeu que,
AA. Veio a Recorrente alegar em sede de recurso que “Cabia, pois, à Ré o ónus de alegar, existindo assim uma inversão do ónus da prova nos termos do artigo 344º nº 1 e nº2 do Código Civil, sendo apenas possível à Ré juntar aos autos o alegado contrato de empreitada, que viria a eventualmente provar a não relação de comissão subjaz pelo ilustre Mmo Juiz a quo, coisa que nunca o fez.”
BB. Como a Recorrente tem inteiro conhecimento, e afirmou no artigo 2.º da sua Petição Inicial aperfeiçoada, não foi a Recorrida a responsável por executar os trabalhos da obra de remodelação, mas sim um empreiteiro. Nunca tendo sido objeto de discussão a existência, ou não, de um contrato de empreitada.
CC. Da matéria de facto provada resultou claro, evidente e inequívoco que a infiltração e os danos subsequentes em apreço foram resultado do comportamento omissivo do empreiteiro, que por não ter tamponado a tubagem de abastecimento de água da casa de banho, provocou danos na fração loja. Pelo que não existe responsabilidade subjetiva que possa ser imputada à Recorrida.
DD. De igual modo, também não existe responsabilidade objetiva da Recorrida (artigo 483.º/2 do Código Civil), porquanto estamos perante um contrato de empreitada (1207.º do Código Civil) e, por isso, não se verifica qualquer relação de comissão (artigo 500.º do Código Civil).
EE. Andou bem o Tribunal a quo quando concluiu que “Impõe-se, assim, concluir que os autores não conseguiram, relativamente a nenhuma das pretensões que trouxeram aos autos, demonstrar, como lhe competia (n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil), os pressupostos do seu direito, que impusessem uma condenação da ré”.
(b) Do pagamento da indemnização à Recorrente
FF. Conforme foi provado em audiência julgamento, a sociedade Recorrente recebeu da E …, S.A. o montante de 700,00 €.
GG. Entende a Recorrente, no artigo 42.º do seu recurso, que “Quanto ao valor pago pela seguradora a título de compensação, reconhecendo a aqui apelante como titular do direito de indeminização, sempre se dirá que o valor pago não corresponde como real apurado pela própria seguradora, existindo um valor de franquia que por ser parte integrante dos moldes do seguro de contrato viu-se a Autora privada (36030565), (...)”
HH. Sucede que, tal como tivemos oportunidade de verificar, uma vez que a Recorrente é arrendatária e não a proprietária, a mesma jamais poderá ser ressarcida por danos provocados numa fração que não a sua.
II. Não poderá ser o lapso da E …, S.A. a provar a responsabilidade civil extracontratual da Recorrida.
IV. SUBSIDIARIAMENTE (AMPLIAÇÃO DO ÂMBITO DO RECURSO – ARTIGO 636.º CPC)
JJ. Apesar de a Recorrida se encontrar convencida da falta de fundamento do recurso interposto e ao qual ora se responde, e, portanto, do seu insucesso, cumpre teorizar, por mera cautela de patrocínio, a procedência do mesmo, peticionando então, ainda que subsidariamente, a apreciação dos danos, efetivamente, sofridos pela Recorrente.
KK. Caso dos factos e do Direito aplicável resultasse a responsabilidade da Recorrida por algum dano sofrido pela Recorrente, é forço concluir que essa responsabilidade não excede 1.462,00 € (mil, quatrocentos e sessenta e dois euros).
LL. O Tribunal a quo, na pág. 3 da Sentença, deu como provado o facto de que “A reparação dos danos acima mencionados em 7. [danos provocados na fração onde a sociedade autora tem a sua sede.] tenha um custo de € 3 620,85 (artigo 25.º da petição inicial aperfeiçoada).”
MM. Indicando, posteriormente, como motivação que “Quanto aos eventos descritos nos n.ºs 4, 5 6, 7 e 8, o tribunal atentou, essencialmente, no teor do documento junto como n.º 1 de ref.ª …”.
NN. Sucede que, consultando este documento n.º 1, que diz respeito ao relatório pericial, e concluímos que o valor total dos danos sofridos na Fração Loja é de 2.162,00 €, a saber: 1.950,00 € reparação do teto falso e 212,00 € para a reparação da avaria de detetor de fumo e 2 baterias recarregáveis.
OO. Neste ponto, importa ter em consideração as declarações da legal representante da Recorrente, que foram gravadas entre as 11:52 e 12:04, a partir do minuto 6:21, pois esta confirmou que o valor do orçamento para a reparação do teto falso era de 1.950,00 €, contradizendo o valor alegado no artigo 23.º petição inicial aperfeiçoada.
PP. Adicionalmente, refira-se que o montante de 3.620,85 € resulta de um cálculo aritmético, que está realizado no artigo 23.º da PI, que inclui, entre outros valores, os custos com “material danificado e documentação onde continha projetos, esquemas e propostas de orçamentos na qual estima um prejuízo de €. 1.000,00 (mil euros)”
QQ. Ora, como já tivemos oportunidade de verificar, não foi provado que a água proveniente da fração da Recorrida tenha danificado material e documentação da sociedade Recorrente no valor de 1.000,00 €.
RR. Com efeito, ao contrário do que consta na decisão do Tribunal, não foi provado que o custo dos danos seja o total de 3.620,85 € (três mil, seiscentos e vinte euros e oitenta e cinco cêntimos), mas sim, o montante total de 2.162,00 € (dois mil, cento e sessenta e dois euros).
SS. Como tal, parte da prova produzida nos autos permite alterar a proposição constante no artigo 8.º da matéria de facto provado (pág. 3 da Sentença), que deve passar a ter a seguinte redação: “A reparação dos danos acima mencionados em 7. tenha um custo de 2.162,00 € (dois mil cento sessenta e dois)”, o que subsidiariamente se requer.
TT. Considerando que a seguradora já realizou o pagamento de 700,00 € (setecentos euros), pela regularização do sinistro, encontra-se somente por ressarcir à Recorrente o montante de 1.462,00 € (mil, quatrocentos e sessenta e dois euros), a título de danos patrimoniais.
Terminou requerendo que:
1. O recurso seja rejeitado nos termos dos artigos 639.º, n.º 1, e 640.º, n.ºs 1, al. b), e n.º 2, al. a), todos do CPC; se assim não se entender,
2. O recurso seja julgado totalmente improcedente;
3. Subsidiariamente, deverá ser ampliado o âmbito do recurso, alterando o vertido no n.º 8 da matéria de facto provada - passando a ter a seguinte redação: “A reparação dos danos acima mencionados em 7. tenha um custo de 2.162,00 € (dois mil cento sessenta e dois)” -, o que resultará na condenação da Apelada ao pagamento da quantia de 1.462,00 € (mil, quatrocentos e sessenta e dois euros), a título de danos patrimoniais.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

***

II - FUNDAMENTAÇÃO

Como é consabido, as conclusões da alegação do recorrente delimitam o objeto do recurso, ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal, bem como as questões suscitadas em ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido (artigos 608.º, n.º 2, parte final, ex vi 663.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, 636.º e 639.º, n.º 1, do CPC).
Identificamos as seguintes questões a decidir:
1.ª) Se deve ser modificada a decisão da matéria de facto, dando como provados os factos vertidos nas alíneas A, B e C do elenco dos factos não provados e ainda considerando provado que:
- O acidente que causou danos nas frações inferiores ocorreu no dia 24 de julho de 2020;
- O seguro de responsabilidade era da responsabilidade da Ré, devendo o mesmo vigorar antes do início das obras, o que não se sucedeu;
2.ª) Subsidiariamente, se deve ser modificada a decisão da matéria de facto quanto ao ponto 7 do elenco dos factos provados;
3.ª) Se a Ré está obrigada a pagar à Autora a indemnização peticionada.

Dos Factos

Na sentença foram considerados provados os seguintes factos (mencionando-se na sentença que, por facilidade de leitura, do confronto com os articulados e da sindicância dos factos selecionados, se indicam os artigos da peça processual em que tiveram origem, não correspondendo necessariamente à sua transcrição integral ou exata; foi ora aditado, por este Tribunal da Relação, o que consta entre parenteses retos no ponto 5):
1. A sociedade Autora tem instalações na …, n.º …-…/…, Lisboa (artigo 1.º da petição inicial aperfeiçoada).
2. O Autor é proprietário da fração autónoma a que corresponde o 1.º direito do prédio sito na …, n.º …/…/…, Bloco …, Lisboa (artigo 1.º da petição inicial aperfeiçoada).
3. A Ré contratou uma empresa para proceder a obras de remodelação na fração sita na …, n.º …-…/ …/… – 2.º direito, Lisboa (artigo 2.º da petição inicial aperfeiçoada, artigo 12.º da contestação à petição inicial aperfeiçoada).
4. No âmbito da referida empreitada de remodelação, em julho de 2020 foram tamponados os pontos de ligação à tubagem de abastecimento de água (artigo 7.º da petição inicial; alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º do Código de Processo Civil).
5. Pelo menos um dos tampões dos pontos de ligação não impediu o vazamento de água (artigo 7.º da petição inicial; alínea a) do n.º 2 do artigo 5.º do Código de Processo Civil) [na noite do dia 23 para 24 de julho 2020 (noite de quinta para sexta feira) – aditado por se tratar de facto plenamente provado, conforme se explica infra].
6. O débito de água decorrente do tamponamento referido no número anterior, provocou na fração sita no 1.º direito (artigo 24.º da petição inicial aperfeiçoada):
a. Degradação de pintura em teto de 2 casas de banho;
b. Empolamento de ombreiras de porta de 2 casas de banho;
c. Empolamento de rodapé de quarto e corredor;
d. Degradação de pintura em paredes de 2 quartos e corredor;
e. Empolamento de pavimento de quarto e corredor;
f. Empolamento de móvel de lavatório de duas casas de banho;
g. Degradação de pintura em paredes de despensa.
7. O débito de água decorrente do tamponamento deficiente referido no número anterior, provocou na fração onde a sociedade Autora tem a sua sede (artigo 23.º da petição inicial aperfeiçoada):
a. Degradação de teto falso, em gesso cartonado;
b. Avaria de detetor de fumo e 2 baterias recarregáveis.
8. A reparação dos danos acima mencionados em 7. tenha um custo de 3.620,85 € (artigo 25.º da petição inicial aperfeiçoada).
9. A Ré participou à sua seguradora – E …, SA – o sinistro (artigo 2.º da contestação à petição inicial aperfeiçoada).
10. O Autor H … recebeu da E …, SA, em dezembro de 2020, o montante de 3.250,00, pela regularização do sinistro (artigo 7.º da contestação à petição inicial aperfeiçoada).
11. A sociedade Autora recebeu da E …, SA, em dezembro de 2020, o montante de 700,00 €, pela regularização do sinistro (artigo 8.º da contestação à petição inicial aperfeiçoada).
12. O Autor sentiu-se agastado com o sinistro em causa nos autos (artigo 33.º da petição inicial aperfeiçoada).

Na sentença foram considerados não provados os seguintes factos:
A. A sociedade Autora utilize a loja identificada acima no n.º 1 como arrendatária (artigo 1.º da petição inicial aperfeiçoada).
B. A água proveniente da fração da Ré tenha danificado material e documentação (projetos, esquemas e propostas de orçamentos) da sociedade Autora, em valor de 1.000,00 (artigo 23.º da petição inicial aperfeiçoada).
C. Em virtude dos danos acima mencionados em 7. a sociedade Autora tenha ficado impedida de exercer a sua atividade comercial (artigo 33.º da petição inicial aperfeiçoada).
D. Em virtude dos danos acima mencionados em 6., a fração do Autor tenha ficado sem condições de habitabilidade (artigo 33.º da petição inicial aperfeiçoada).
E. A reparação dos danos acima mencionados em 6. tenha um custo de 10.218,84 € (artigo 26.º da petição inicial aperfeiçoada).
F. A sociedade Autora tenha sofrido desgaste psicológico com o sinistro em causa nos autos (artigo 33.º da petição inicial aperfeiçoada).

Da modificação da decisão da matéria de facto

Antes de mais, importa apreciar se deve ser rejeitado o conhecimento do objeto do recurso no que concerne à impugnação da decisão da matéria de facto, nos termos dos artigos 639.º, n.º 1, e 640.º, n.ºs 1, al. b), 2, al. a), do CPC, como defende a Apelada.
Conforme previsto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
Dispõe o artigo 640.º do CPC, sobre o ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, que:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”
É conhecida a divergência jurisprudencial que existiu a respeito da aplicação deste normativo e da sua conjugação com o disposto no n.º 1 do art.º 639.º do CPC, atinente ao ónus de alegar e formular conclusões, vindo o STJ a firmar jurisprudência no sentido do “conteúdo minimalista” das conclusões da alegação, conforme espelhado no acórdão do STJ de 06-12-2016 proferido na Revista n.º 2373/11.0TBFAR.E1.S1 (sumário citado na compilação de acórdãos do STJ, “Ónus de Impugnação da Matéria de Facto, Jurisprudência do STJ”, disponível em www.stj.pt), bem como o acórdão do STJ de 01-10-2015, proferido no processo n.º 824/11.3TTLRS.L1.S1 (disponível em www.dgsi.pt) e mais recentemente no AUJ do STJ de 17-10-2023 proferido no processo n.º 8344/17.6T8STB.E1-A.S1 (acórdão n.º 12/2023, publicado no Diário da República n.º 220/2023, Série I, de 14-11-2023, com Declaração de Retificação n.º 25/2023), em que se decidiu uniformizar a jurisprudência considerando que “(N)os termos da alínea c), do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações”, afirmando-se na síntese final designadamente que:
“(…) decorre do art.º 640, n.º 1, que sobre o impugnante impende o dever de especificar, obrigatoriamente, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera julgados de modo incorreto, os concretos meios de probatórios constantes do processo, de registo ou de gravação nele realizado, que imponham decisão diversa da recorrida, bem como aludir a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Tais exigências, traduzidas num ónus tripartido sobre o recorrente, estribam-se nos princípios da cooperação, adequação, ónus de alegação e boa-fé processuais, garantindo a seriedade do recurso, num efetivo segundo grau de jurisdição quanto à matéria de facto, necessariamente avaliado de modo rigoroso, mas sem deixar de ter em vista a adequada proporcionalidade e razoabilidade, de modo a que não seja sacrificado um direito das partes em função de um rigorismo formal, desconsiderando aspetos substanciais das alegações, numa prevalência da formalidade sobre a substância que se pretende arredada.”
Nesta linha, conclui-se resultar da conjugação do disposto nos artigos 635.º, 639.º e 640.º do CPC que o ónus principal a cargo do recorrente exige que, pelo menos, sejam indicados nas conclusões da alegação do recurso, com precisão, os concretos pontos de facto da sentença que são objeto de impugnação, sem o que não é possível ao tribunal de recurso sindicar eventuais erros no julgamento da matéria de facto.
Já a alínea a) do n.º 2 do citado art.º 640.º do CPC consagra um ónus secundário, cujo cumprimento, quanto aos invocados erros de julgamento das concretas questões de facto, não tendo de estar refletido nas conclusões da alegação recursória, deverá igualmente ser observado, sob pena de rejeição do recurso, na parte respetiva. Assim, a título exemplificativo, veja-se o acórdão do STJ de 16-12-2020, no processo n.º 8640/18.5YIPRT.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt, citando-se, pelo seu interesse e clareza, as seguintes passagens do respetivo sumário:
“I - No âmbito do recurso de apelação visando a impugnação da decisão de facto podem distinguir-se dois ónus que incidem sobre o recorrente:
Um ónus principal, consistente na delimitação do objecto da impugnação (indicação dos pontos de facto que considera incorrectamente julgados) e na fundamentação desse erro (com indicação dos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação que impunham decisão diversa e o sentido dessa decisão) – Art.º 640º nº 1 do CPC;
E
Um ónus secundário, consistente na indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados – art.º 640º nº 2 al. a) do CPC.
II - Este ónus secundário não visa propriamente fundamentar e delimitar o recurso, mas sim facilitar o trabalho da Relação no acesso aos meios de prova achados relevantes.
III - O controlo do cumprimento deste ónus secundário deve ser feito pela Relação em termos funcionalmente adequados e em conformidade com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.”
Destaca-se ainda, para ilustrar a jurisprudência do STJ, o acórdão de 30-11-2023, proferido no processo n.º 23356/17.1T8SNT.L2.S1, na parte em que se refere que:
«O STJ vem reiteradamente afirmando (ver por todos o acórdão de 29.10.2015 no processo nº 233/09.4TBVNG.G1.S1 in www.dgsi.pt), – que o regime do art.º 640º consagra:
- um ónus primário ou fundamental de delimitação do objeto do recurso e de fundamentação concludente da impugnação e um ónus secundário, tendente a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida. O ónus primário é integrado pela exigência de concretização dos pontos de facto incorretamente julgados, da especificação dos concretos meios probatórios convocados e da indicação da decisão a proferir, previstas nas als. a), b) e c) do nº1 do citado art.º 640º, na medida em que têm por função delimitar o objeto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto;
- um ónus secundário que se traduz na exigência de indicação das exatas passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, contemplada na al. a) do nº 2 do mesmo art.º 640 tendo por finalidade facilitar a localização dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação da audiência.
De acordo com esta delimitação tem-se entendido que, não sendo consentida a  formulação ao recorrente de um convite ao aperfeiçoamento de eventuais deficiências, deverá ter-se atenção se as eventuais irregularidades se situam no cumprimento de um ou outro ónus uma vez que a falta de especificação dos requisitos enunciados no nº 1 do referido art.º 640º implica a imediata rejeição do recurso na parte infirmada, enquanto a falta ou imprecisão da indicação das passagens da gravação dos depoimentos a que alude o nº 2, al. a) terá como sanção a rejeição apenas quando essa omissão ou inexatidão dificulte,  gravemente, o exercício do contraditório pela parte contrária e/ou o exame pelo do  tribunal de recurso – vd. Abrantes Geraldes in “ Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2018, 5ª ed. , págs. 169 a 175.
(…) Ora, como se diz no Acórdão do STJ de 07.09.2020, P. 2180/16.4T8CBR.C1.S1, “os concretos pontos de facto que se querem impugnar são de inscrição obrigatória nas conclusões do recurso de apelação.”
No mesmo sentido decidiu o recente Acórdão do STJ de 16.11.2023, P. 31206/15 (António Barateiro Martins): “Deve ser rejeitada a impugnação de facto quando, nas conclusões, o recorrente não concretize os pontos de facto que considera incorrectamente julgados”, bem como os Acórdãos de 27.04.2023, P. 4696/15 (João Cura Mariano), e de 19.01.2023, P. 3160/16 (Nuno Pinto Oliveira), todos acessíveis em www.dgsi.pt.
A circunstância de as conclusões do recurso de apelação não fazerem referência aos concretos pontos de facto que a Recorrente julgou incorrectamente julgados afecta a inteligibilidade do objecto do recurso, dificultando o exercício do contraditório pela parte contrária e a tarefa do julgador.»
A este respeito, na doutrina, avultam os ensinamentos de Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5.ª edição, Almedina, págs. 165-166, em particular a síntese que faz do sistema que vigora sempre que o recurso de apelação envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, referindo designadamente que:
“a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos;
c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exatidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;
(…) e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deverá ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente;”.
De referir, por último, que, na decisão da matéria de facto, o Tribunal apenas pode considerar os factos essenciais que integram a causa de pedir e as exceções (incluindo as contra-exceções) alegados pelas partes, bem como os factos instrumentais (muito embora estes, pela sua função probatória, não tenham de constar do elenco dos factos provados), complementares ou concretizadores que resultem da instrução da causa, e os factos de que tem conhecimento por via do exercício das suas funções (art.º 5.º do CPC), estando vedado ao Tribunal, por força do princípio da limitação dos atos consagrado no art.º 130.º do CPC, conhecer de matéria que, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, se mostra irrelevante para a decisão de mérito. São manifestações do princípio dispositivo e do princípio da economia processual que se impõem ao juiz da 1.ª instância aquando da seleção da matéria de facto provada / não provada na sentença, mas também na 2.ª instância, no tocante à apreciação da impugnação da decisão sobre a matéria de facto. Assim, conforme referido no acórdão da Relação de Lisboa de 27-11-2018, proferido no processo n.º 1660/14.0T8OER-E.L1, a jurisprudência dos Tribunais superiores vem reconhecendo que “a reapreciação da matéria de facto não constitui um fim em si mesma, mas um meio para atingir um determinado objetivo, que é a alteração da decisão da causa, pelo que sempre que se conclua que a reapreciação pretendida é inútil – seja porque a decisão sobre matéria de facto proferida pela primeira instância já permite sustentar a interpretação do direito aplicável ao caso nos termos sustentados pelo recorrente, seja porque ainda que proceda a impugnação da matéria de facto, nos termos requeridos, a decisão da causa não deixará de ser a mesma – a reapreciação sobre matéria de facto não deve ter lugar, por constituir um ato absolutamente inútil, contrariando os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2.º, n.º 1, 137.º, e 138.º do CPC).” Neste sentido, além dos acórdãos aí citados (acórdãos da Relação de Guimarães de 10-09-2015, no proc. 639/13.4TTBRG.G1, e 11-07-2017, no proc. n.º 5527/16.0T8GMR.G1, da Relação do Porto de 01-06-2017, no proc. n.º 35/16.1T8AMT-A.P1, e do STJ de 13-07-2017, no proc. 442/15.7T8PVZ.P1.S1) -, destacamos ainda os acórdãos (todos disponíveis em www.dgsi.pt, embora com omissão de algumas passagens), da Relação de Lisboa de 24-09-2020, no processo n.º 35708/19.8YIPRT.L1, em cujo coletivo também interveio a ora Relatora, da Relação do Porto de 07-05-2012, no processo n.º 2317/09.0TBVLG.P1, da Relação de Coimbra de 12-06- 2012, no processo 4541/08.3TBLRA.C1, do STJ de 17-05-2017, no processo n.º 4111/13.4TBBRG.G1.S1, do STJ de 14-10-2021, no processo n.º 5985/13.4TBMAI.P1.S1.
Transpondo estas considerações para o caso em análise, desde já adiantamos que não se nos afigura assistir razão à Apelada quando clama pela rejeição do recurso por inobservância do disposto nos artigos 639.º, n.º 1, e 640.º, n.ºs 1, al. b), e 2, al. a), do CPC. Aliás, até se nos afigura que da própria alegação de resposta resulta evidenciado que a Apelada foi capaz de compreender quais os meios de prova em que a Apelante (bem ou mal, para já não importa) se baseou na impugnação que fez da decisão da matéria de facto, bem como as diferentes passagens da gravação dos depoimentos mencionados.
Na verdade, embora de forma pouco elaborada, não deixou a Apelante de especificar, no corpo da sua alegação recursória, os concretos meios probatórios constantes do processo que, no seu entender, impunham uma decisão diferente, mormente quanto aos factos vertidos em A, B e C, indicando também as diferentes passagens da gravação que considerou relevantes, seguidas da respetiva transcrição dos depoimentos, referindo designadamente que:
“(…) resulta provado pelos testemunhos de F … e de G … que estes estiveram no prédio no dia do acidente, e também que nessa altura observaram e fotografaram os danos causados.
23. E estes testemunhos comprovaram igualmente que aquando ocorrido o acidente, notificaram a Ré e a respetiva seguradora, e que as mesmas não valoraram os danos por estes sofridos, conforme aliás o mostram as referidas fotografias Docs 2, 4, 5, 6 e 7 com a Petição Inicial.
24. A testemunha F … disse:
(gravação com o nome da testemunha inicial – J …) [é o nome que, efetivamente, se pode ler aquando da consulta do processo no Media Studio do Citius, muito embora o depoimento gravado seja o da testemunha F …)
[00:02:36] F …: (…)
[00:03:07] F …: (…)
[00:06:07] F …: (…)
[00:06:18] F …: (…)
[00:07:12] F …: (…)
[00:07:17] F …: (…)
[00:07:57] F …: (…)
[00:08:13] F …: (…)
[00:09:50] F …: (…)
[00:10:38] F …: (…)
[00:12:19] F …: (…)
[00:13:01] F …: (…)
[00:13:25] F …: (…)
 [00:13:49] F …: (…)
[00:14:56] F …: (…)
[00:15:00] F …: (…)
[00:15:13] F …: (…)
[00:15:20] F …: (…)
[00:15:30] F …: (…)
25. A testemunha G … disse:
(…) [00:02:40] G …: (…)
[00:04:17] G …: (…)
[00:05:05] G …: (…)
[00:07:05] G …: (…)
[00:14:38] G …: (…)
[00:14:40] G …: (...)
26. Pelo que deveria o Mmo Juiz a quo ter considerado provado que:
A. A sociedade autora utilize a loja identificada acima no n.º 1 como arrendatária (artigo 1.º da petição inicial aperfeiçoada);
B. A água proveniente da fração da ré tenha danificado material e documentação (projetos, esquemas e propostas de orçamentos) da sociedade autora, em valor de € 1.000,00 (artigo 23.º da petição inicial aperfeiçoada);
C. Em virtude dos danos acima mencionados em 7. a sociedade autora tenha ficado impedida de exercer a sua atividade comercial (artigo 33.º da petição inicial aperfeiçoada);”
Ademais, quanto ao facto (cujo aditamento a Apelante pretende) de o acidente ocorrido ter em 24 de julho de 2020, a Apelante refere expressamente, no art.º 28 da sua alegação, que se trata de matéria (a data) confessada pela Ré no art.º 1.º da sua Contestação, pelo que se mostra cumprido o ónus principal consagrado no art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC. Pode, pois, este Tribunal da Relação, ao abrigo do disposto no art.º 662.º, n.º 1, do CPC, apreciar se assim é e, desde já o fazemos, reconhecendo que assiste razão à Autora-Apelante, pois a Ré não impugnou na sua Contestação (cf. art.º 14.º e ss.) o alegado no art.º 12.º da Petição Inicial, pelo que tal facto está provado, sendo aditado ao elenco dos factos provados, no ponto 5.
Finalmente, quanto à última alegação feita pela Apelante, de que “O seguro de responsabilidade era da responsabilidade da Ré, devendo o mesmo vigorar antes do início das obras, o que não se sucedeu”, retira-se da mesma, pelo menos, a alegação de que a Ré não havia feito, antes de dar início às obras na sua fração, um seguro de responsabilidade civil. A esse respeito a Apelante, conforme resulta dos artigos 32 e 33 da sua alegação, estriba-se no documento enviado aos autos pela Seguradora com o comprovativo da celebração do contrato de seguro, anexo a emails trocados entre a Ré e a mediadora de seguros, citando parte da mensagem enviada no dia 24 de julho de 2020 pelas 10 horas e 39 minutos (Ref. …), e duas passagens com a gravação do depoimento da testemunha F …. Portanto, também quanto a este ponto se impõe considerar que a Apelante cumpriu os referidos ónus.
A Apelada refere que este último facto se mostra absolutamente irrelevante para a decisão da causa, porque a validade do contrato de seguro nunca foi matéria de discussão nos presentes autos, uma vez que a seguradora realizou o pagamento de indemnização à Autora, na sequência da participação do sinistro.
Ora, nisto assiste razão à Apelada, pois estamos perante matéria de facto que não se reconduz à previsão do art.º 5.º do CPC, sendo substantivamente irrelevante para a decisão da causa. Se a Seguradora tivesse sido demandada nos presentes autos (ou chamada a intervir) poderia ter interesse saber se, antes da inundação em apreço, vigorava (ou não) um tal seguro (não se podendo concluir que assim era apenas pelo facto de antes do início das obras ainda não ter sido contratado). Além disso, está provado que a Seguradora aceitou cumprir o contrato de seguro, pagando à Autora a quantia de 700 € (adiante se perceberá o porquê dessa quantia). Não se revestindo o facto em questão de qualquer relevância jurídica para o caso, mostra-se inútil apreciar a impugnação da decisão da matéria de facto a este respeito, pelo que nos abstemos de o fazer, mantendo-se, nessa parte, inalterada a decisão da matéria de facto.
Passamos, pois, a apreciar se assiste razão à Apelante quanto à restante impugnação da decisão da matéria de facto.

Alínea A
Foi considerado não provado que: A sociedade Autora utilize a loja identificada acima no n.º 1 como arrendatária.
Na sentença motivou-se o assim decidido referindo designadamente que (inclui-se, para melhor compreensão, a motivação quanto ao ponto 1):
“O endereço vertido no n.º 1 é o que consta nos autos associado à sociedade autora. Pese embora não decorra de prova documental – como se impunha – que a sociedade ali tenha sede, nem que utilize esse espaço como arrendatária (A.), não suscitam dúvidas nos autos que o local correspondente ao endereço mencionado é utilizado pela sociedade autora.
(…) Já no que respeita à matéria não provada, como já mencionado, o disposto em A. não foi objeto de prova, salientando-se, em especial, que o contrato de arrendamento junto pelos autores com a petição inicial não permite concluir pela sua vigência no momento dos factos em causa nos autos.”
A Apelante, pelas razões acima indicadas, pretende que este facto seja dado como provado.
A Apelada, por sua vez, defende, em síntese, que: no depoimento transcrito de F …, que é marido e pai dos sócios da sociedade Autora, apenas se descreve o processo de descoberta do sinistro e dos danos que foram provocados, sem referir o valor dos danos referente ao material e documentação danificados, nem tão pouco que a Autora tenha estado impossibilitada de exercer a sua atividade na fração loja; no depoimento transcrito de G …, que é mulher do 2.º Autor, apenas é narrada a descoberta do sinistro e dos danos que foram provocados na fração da propriedade do 2.º Autor (1.º andar direito).
Vejamos.
Não nos parece que o facto em questão se prove por via dos depoimentos das testemunhas.
Porém, entendemos que o mesmo resultou provado pelos documentos juntos aos autos, em particular o contrato de arrendamento junto com a Petição Inicial (em que figuram como senhorios L … e mulher, M …) e a caderneta predial (em que constam os referidos L … e M … como titulares do rendimento, embora como cabeça de casal de herança e numa situação de compropriedade), bem como o próprio relatório elaborado pela empresa RISER a pedido da Seguradora E …, S.A. (como foi explicado pela testemunha N …), aí se identificando como “lesado 2” o referido “L …”, figurando a Autora como “lesado 3 Arrendatários Fração loja”.
A tanto não obsta a circunstância de o referido contrato de arrendamento estar datado de 1 de junho de 2015 e ter sido celebrado pelo prazo de dois anos, pois está inclusivamente previsto no contrato que será renovado no caso de não ser denunciado por parte dos senhorios, por períodos de dois anos. Não se alcança, face a essa prova documental e tendo em atenção regras de experiência e juízos de normalidade, que outra relação pudesse existir para justificar o facto de a Autora ter a sua sede e instalações na fração/loja em causa, sendo certo que na sentença se afirma expressamente que a Autora não é a proprietária da fração em apreço.
Muito embora nesse relatório se tenha indicado que o valor dos danos do “lesado 2” ascendia a 1.950,00 € - correspondente ao valor do orçamento (sem IVA) para “Desmonte de teto falso e transporte a vazadouro Fornecimento e aplicação de teto falso Pintura de teto falso” - e que, face ao valor da franquia de 1.250,00 €, o valor a indemnizar era de 700,00 €, o certo é que este montante acabou por ser pago à Autora e não ao (referido) “lesado 2”, conforme ficou provado nos autos (cf. ponto 11).
Ora, parece-nos que isso estará relacionado com a circunstância, também evidenciada no relatório, de, apesar de estar devidamente identificado o Sr. L …, o mesmo não ter sido ouvido – apenas consta terem sido ouvidos a Sr.ª O …, gerente da Ré/segurada, o Sr. P …, empreiteiro desta, a Sr.ª G …, proprietária da fração do 1.º Dt.º (e que, conforme resulta do seu depoimento, é mulher do Autor) e o Sr. F … (de cujo depoimento resulta ser marido da gerente da Autora e trabalhador desta sociedade). O que evidencia não ter existido da parte dos senhorios da loja onde a Autora tem a sua sede e instalações interesse em reclamarem uma indemnização, já que a Autora tomou essa iniciativa, inclusivamente solicitando orçamentos para reparação dos estragos na fração arrendada, apresentando-se como lesada, incluindo quanto aos danos na própria fração.
Assim, decide-se eliminar a Alínea A do elenco dos factos não provados e aditar o facto aí vertido como ponto 1-A.

Alínea B
Foi também dado como não provado que: A água proveniente da fração da Ré tenha danificado material e documentação (projetos, esquemas e propostas de orçamentos) da sociedade Autora, em valor de 1.000,00.
A motivação da sentença a esse respeito é a seguinte:
“Quanto ao descrito em B., desde logo não decorre do documento acima já mencionado em que o tribunal se arrimou (documento junto como n.º 1 de ref.ª  …). Ademais, o tribunal considerou com muitas reservas o depoimento prestado pela testemunha F …, já referida, e as declarações da legal representante da autora. Com efeito, não só a testemunha se apresentou, na verdade, como parte diretamente interessada na ação, como ambos depuseram de forma comprometida e sem espontaneidade, num depoimento a que o tribunal não conferiu credibilidade.
Assim, na ausência de outra prova que pudesse demonstrar o alegado, o tribunal considerou nãos provados os danos em material e documentação, em montante de € 1.000,00.”
A Apelante, pelas razões acima referidas, pretende que este facto seja considerado provado.
A Apelada, por sua vez, sustenta que: a Autora não ofereceu prova suficiente que demonstrasse a computação do dano; devem ser valoradas as declarações de parte da própria representante da Autora, pois foi possível concluir que o montante deste dano não foi objeto de um cálculo exato, com base em despesas contabilizadas; a Autora nunca chegou a enviar ao perito N …, nem tão pouco a juntar aos autos, qualquer fatura de aquisição dos produtos do stock alegadamente danificado; e referiu a legal representante da Autora que os dossiers de contabilidade geral danificados não representaram qualquer transtorno para a Autora.
Apreciando.
Ouvidos na íntegra os depoimentos das testemunhas F … e G …, bem como, aliás, toda a gravação da prova produzida em audiência de julgamento, não ficámos convictos da ocorrência de estragos em material e documentação, muito menos no valor indicado de 1.000 €.
Na verdade, apenas a legal representante da Autora, nas suas declarações, referiu de forma vaga terem ficado danificadas algumas caixas com acessórios, que não explicitou quais fossem, muito menos tendo sido juntas aos autos faturas comprovativas da aquisição desses acessórios. Além disso, pela forma como disse que o sucedido não tido consequência no funcionamento da sociedade, pareceu-nos que nada com utilidade ou valor económico ficou danificado.
Mantem-se inalterada neste particular a decisão da matéria de facto.

Alínea C
Finalmente, foi dado como não provado que: Em virtude dos danos acima mencionados em 7. a sociedade Autora tenha ficado impedida de exercer a sua atividade comercial.
O Tribunal recorrido referiu, para motivar a decisão a respeito deste facto, que: “No que respeita ao teor de C., não decorreu de nenhuma prova produzida; em especial, saliente-se que tanto a legal representante da sociedade autora, como a testemunha F …, não só não mencionaram qualquer encerramento, ainda que temporário, da atividade da autora, como afirmaram que a loja se mantém no estado em que ficou na sequência do descrito e 6., funcionando ininterruptamente”.
A Apelante, pelas razões acima indicadas, alega que este facto deverá ser considerado provado.
A Apelada, por seu turno, sustenta que: há que valorar as declarações de parte da legal representante da Autora, das quais resulta que a Sociedade nunca esteve impedida de exercer a sua atividade comercial, tendo continuado a sua atividade ininterruptamente.
Vejamos.
Também, neste particular, improcede a pretensão da Autora, pois dos depoimentos das testemunhas F … e G … não resultou que tenha sucedido um tal facto. Aliás, a testemunha F … até disse “todos nós estávamos de férias, a empresa teve ali um período de paragem”. A legal representante da Autora, nas declarações que prestou, afirmou que foi possível “salvarem os equipamentos” e que o sucedido não teve consequência no funcionamento da sociedade, apesar de alguns dossiers com documentação terem ficado inutilizados.
Por isso, e atentando ainda nas fotografias juntas aos autos, apenas nos parece que, além do referido no ponto 7, o sucedido perturbou, como não podia deixar de ser, o normal funcionamento da sociedade, obrigando a que fossem tomadas medidas no sentido de proteger, da água que se infiltrava, os equipamentos existentes nas instalações da Autora, o que foi feito, mas sem que a mesma tenha ficado impedida de exercer a sua atividade.
Mantem-se inalterada a decisão da matéria de facto neste particular.

Ponto 8
Foi dado como provado que: A reparação dos danos acima mencionados em 7. tenha um custo de 3.620,85 €.
Na sentença motivou-se nos seguintes termos decisão a esse respeito:
“Quanto aos eventos descritos nos n.ºs 4, 5 6, 7 e 8, o tribunal atentou, essencialmente, no teor do documento junto como n.º 1 de ref.ª …, conjugado com o depoimento da testemunha N …, que o elaborou, e que de forma descomprometida, espontânea e natural, descreveu os eventos de que se recordava e os termos em que elaborou o sobredito documento, cuja autoria reconheceu. O tribunal valorou como credível o depoimento desta testemunha, estendendo a apreciação de credibilidade ao documento por si produzido, que, pela sua completude, clareza e coerência, não suscitou dúvidas ou reservas ao tribunal.”
A Apelada defende, subsidiariamente, que se dê como provado que: A reparação dos danos acima mencionados em 7. tenha um custo de 2.162,00 € (dois mil cento sessenta e dois).
Em face da procedência parcial da impugnação da decisão da matéria de facto, impõe-se apreciar desta sua pretensão.
Ora, é evidente o lapso em que incorreu o Tribunal recorrido.
Efetivamente, conforme acima referimos, consta do relatório da RISER que o custo da reparação dos danos atinentes à degradação do teto falso em gesso cartonado importa em 1.950 € (sem IVA). Além disso, resulta desse relatório que a avaria do detetor de fumo e duas baterias recarregáveis são danos do “lesado 3” (a ora Autora) e que o custo da sua reparação ascende ao valor total de 212 € (sem IVA), referindo-se que, para o “Fornecimento de 2 baterias recarregáveis 12V, 1 detetor de incêndio, 1 fusível de vidro, incluindo deslocação e instalação Intervenção para desativação de sistema de incêndio”, se atendia o orçamento de 167 € da D …, Lda. apresentado, bem como a fatura no valor de 55,35€ (45,00€ + IVA) emitida por “D …, Lda”, esta última sem IVA, por se tratar de um imposto dedutível pela Autora.
Daí que, considerando a soma dos dois referidos valores (1.950 € + 212 €) se obtenha o valor indicado de 2.162 €, parecendo-nos que não pode deixar de ser este o valor a considerar.
Assim, decide-se alterar o ponto 8, passando a ter o seguinte teor: A reparação dos danos acima mencionados em 7 tem um custo de 2.162 € + IVA.
Mais se decide julgar não provado, passando a ficar vertido na (nova) alínea A, que: O custo da reparação dos danos mencionados em 7 ascenda a 3.620,85 €.

Da obrigação de indemnizar

Na sentença teceram-se a este respeito as seguintes considerações de direito:
“A pretensão dos autores convoca aos autos o instituto da responsabilidade civil extracontratual, fonte de obrigações que tem como fundamento subjacente a reparação patrimonial de um dano privado (cfr. Mário Júlio Almeida Costa, Direito das Obrigações, 12.ª ed., Coimbra, Almedina, 2011, p. 521).
A obrigação de indemnizar, isto é, de reparar o dano, pode assentar na culpa do agente que tenha violado determinada norma de proteção ou direito subjetivo – em que estaremos no domínio da responsabilidade por factos ilícitos, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 483.º do Código Civil – ou na necessidade ou conveniência social de reparar o dano sofrido pelo lesado, independentemente da culpa do agente – responsabilidade objetiva, excecional nos termos do disposto no n.º 2 daquele artigo 483.º.
O acionamento do instituto da responsabilidade por factos ilícitos depende da verificação dos respetivos pressupostos, previstos no referido n.º 1 do artigo 483.º, a saber: a demonstração de um (i) facto, (ii) ilícito, (iii) culposo, ligado (iv) causalmente aos (v) danos.
A responsabilidade pelo risco, que é excecional, é, como se disse, objetiva, ou seja, independente da culpa do agente, funcionando a obrigação de indemnizar os danos decorrentes de uma atividade perigosa como contrapartida das vantagens que se retiram do exercício dessa atividade (cfr. Mário Júlio de Almeida Costa, cit., p. 613). Prescindindo da culpa do agente e do juízo de ilicitude sobre a conduta, o surgimento da obrigação de indemnizar neste âmbito depende, assim, (i) da expressa previsão da lei e, depois, da demonstração (ii) do nexo causal entre (iii) o facto e (iv) os danos.
No caso em apreço nos autos, ficou demonstrado que o mau tamponamento de um ponto de ligação à tubagem e abastecimento de água na fração intervencionada a mando da ré causou o débito de água que veio a infiltrar a fração do autor e a fração utilizada pela autora (n.ºs 3, 4, 5 6 e 7), provocando os danos descritos nos n.ºs 6 e 7.
Assim, o facto que originou os danos em questão é atribuível a terceiro contratado pela ré (n.º 3), nada havendo nos autos que permita alargar à ré a imputação ao abrigo do disposto no artigo 490.º do Código Civil.
Por outro lado, a responsabilidade da ré enquanto dona da obra dependeria da demonstração, pelos autores (n.º 1 do artigo 342º do Código Civil), de relação de comissão com o empreiteiro, situação que permitiria acionar a responsabilidade objetiva da ré, ao abrigo do disposto no artigo 500.º do Código Civil. Tal relação de comissão (isto é, em que o comitente tem um poder de direção efetivo, dando ordens e instruções), não se presume, sendo, aliás, a relação dono da obra – empreiteiro o típico exemplo de relação que, pela falta de dependência, não se considerada de comissão (neste sentido, cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª ed., p. 508).
Acresce que, contrariamente ao alegado pelos autores, não se trata aqui nos autos de obra que haja ruído, para os efeitos de aplicação da previsão contida no n.º 1 do artigo 492.º do Código Civil (sendo certo que, de todo o modo obra, na norma em apreço, se refere a edificação, e não a trabalhos).
Sendo o facto atribuível a terceiro, também o disposto no artigo 493.º do Código Civil não tem aplicação.
Impõe-se, assim, concluir que os autores não conseguiram, relativamente a nenhuma das pretensões que trouxeram aos autos, demonstrar, como lhe competia (n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil), os pressupostos do seu direito, que impusessem uma condenação da ré.
De todo o modo, sempre cumpre salientar que, ainda que se concluísse nos autos por uma obrigação de indemnizar a cargo da ré, sempre haveria que considerar que os autores receberam, no âmbito do vazamento de água em causa nestes autos, pagamentos pela seguradora da ré (n.ºs 10 e 11), não tendo demonstrado danos em montante superior ao valor recebido (E. e F.).
Aliás, ainda quanto aos danos demonstrados, relativamente à reparação do teto falso da loja utilizada pela sociedade autora (n.º 7 a.), tratando-se de prejuízo na estrutura da fração, o custo com a respetiva reparação, isto é, o dano, sempre seria do respetivo proprietário – que a autora não é.
Quanto aos danos de natureza não patrimonial sofridos pelo autor, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 496.º do Código Civil, apenas são indemnizáveis os danos de natureza não patrimonial que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. No caso em apreço, a matéria adquirida quanto aos incómodos suportado pelo autor não configura a gravidade necessária para reclamar a tutela do direito.”
A Autora discorda deste entendimento, imputando à Ré a responsabilidade pelos danos que diz ter sofrido, argumentando designadamente que: é defensável a aplicação ao caso do disposto no art.º 492.º, n.º 1, do CC, citando o acórdão da Relação do Porto proferido no processo n.º 18783/18.0T8PRT.P1; à Ré incumbia provar a inexistência de uma relação de comissão; independentemente de ser da obrigação do empreiteiro o correto tamponamento dos pontos de ligação de água, não deve a Ré ser exonerada de responsabilidades para com a fração, cabendo-lhe assegurar que as obras de remodelação eram fiscalizadas ou vigiadas as obras por alguém competente, nos termos dos artigos 492.º e 493.º, ambos do CC; foi ignorado o valor dos danos provados nos pontos 7 e 8; além disso, o valor pago pela seguradora a título de compensação, que assim reconheceu a Apelante como titular do direito de indemnização, não corresponde ao que foi apurado pela própria seguradora, existindo um valor de franquia, nos termos do seguro contratado, de que a Autora ficou privada e a que tem direito, conforme acórdão da Relação do Porto proferido no processo n.º 28/16.9T8FLG.P1.
A Apelada pugna pelo acerto da sentença recorrida, alegando, em síntese, que: da matéria de facto provada resultou que a infiltração e os danos subsequentes foram resultado do comportamento omissivo do empreiteiro, que por não ter tamponado a tubagem de abastecimento de água da casa de banho, provocou danos na fração loja, pelo que não existe responsabilidade subjetiva que possa ser imputada à Ré; de igual modo, também não existe responsabilidade objetiva (art.º 483.º, n.º 2, do CC), porquanto estamos perante um contrato de empreitada (art.º 1207.º do CC) e, por isso, não se verifica qualquer relação de comissão (art.º 500.º do CC); é irrelevante a circunstância de a Autora ter recebido da E …, S.A. o montante de 700,00 € relativo à indemnização dos danos em apreço, pois a Autora é arrendatária e não a proprietária, não podendo ser ressarcida por danos provocados numa fração que não a sua.
Vejamos a qual das partes assiste razão.
A Autora estriba a sua pretensão no instituto da responsabilidade civil extracontratual – artigos 483.º e ss. do CC.
O princípio geral no domínio da responsabilidade civil por factos ilícitos está consagrado no n.º 1 do art.º 483.º do CC, segundo o qual “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”. Assim, para que alguém incorra em responsabilidade civil extracontratual, suportando a respetiva obrigação de indemnizar, é necessário que estejam verificados os seguintes pressupostos:
a) o facto voluntário do agente, conduta humana (que pode traduzir-se numa ação ou numa omissão) dominada ou dominável pela vontade;
b) a ilicitude desse facto, que pode revestir a modalidade de violação de direito alheio (direito subjetivo) ou de violação de uma disposição legal destinada a proteger interesses alheios;
c) o nexo de imputação do facto ao lesante, ou culpa do agente, em sentido amplo, que se traduz num juízo de censura ou reprovação da sua conduta, e que pode revestir a forma de dolo ou de negligência;
d) o dano ou prejuízo;
e) o nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima.
Quanto a este último pressuposto, está consagrada no nosso ordenamento jurídico a doutrina da causalidade adequada: “a obrigação de indemnizar só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão” (art.º 563.º do CC). Ou seja, “determinada acção ou omissão será causa de certo prejuízo se, tomadas em conta todas as circunstâncias conhecidas do agente e as mais que um homem normal poderia conhecer, essa acção ou omissão se mostrava, à face da experiência comum, como adequada à produção do referido prejuízo, havendo fortes probabilidades de o originar” (Galvão Telles, citado por Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, Volume I, 4.ª edição, Coimbra Editora, pág. 578).
No quadro da responsabilidade civil por factos ilícitos, todo aquele que intenta uma ação de indemnização nela fundada tem de demonstrar que estão verificados todos os pressupostos acima referidos para que o Tribunal possa concluir pela titularidade do direito à indemnização, constituindo tais pressupostos factos constitutivos do direito que o lesado se arroga (art.º 342.º, n.º 1, do CC). Nesta conformidade, preceitua o art.º 487.º, n.º 1, do CC que é ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo se existir uma presunção legal de culpa, com a consequente inversão do ónus da prova (art.º 344.º, n.º 1, do CC).
Com relevância para o caso dos autos, começamos por considerar o disposto no art.º 492.º do CC, com a epígrafe “Danos causados por edifícios ou outras obras”, nos termos do qual:
“1. O proprietário ou possuidor de edifício ou outra obra que ruir, no todo ou em parte, por vício de construção ou defeito de conservação, responde pelos danos causados, salvo se provar que não houve culpa da sua parte ou que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado os danos.
2. A pessoa obrigada, por lei ou negócio jurídico, a conservar o edifício ou obra responde, em lugar do proprietário ou possuidor, quando os danos forem devidos exclusivamente a defeito de conservação.”
Em anotação a este artigo, explicavam Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, pág. 493, “Estabelece-se neste artigo, como no anterior e no seguinte, uma mera presunção de culpa, e não a responsabilidade objectiva do proprietário ou possuidor. Estes podem fazer a prova de que não tiveram culpa ou de que, mesmo com a diligência devida, se não teriam evitado os danos. Cessa, nestes casos, a sua responsabilidade (…)
A responsabilidade prevista neste artigo não exclui a responsabilidade que derive dos princípios gerais, pois aqueça tem o fim de aumentar, e não diminuir as garantias dos lesados.
Por conseguinte, se alguém, embora não seja o proprietário ou possuidor do edifício ou obra, tiver ilicitamente e com culpa causado o dano, é responsável por este, nos termos gerais”.
Tendemos a concordar com a sentença recorrida na parte em que afasta a aplicação deste preceito legal.
Porém, já não quando descarta a possibilidade de se aplicar ao caso o disposto no art.º 493.º, n.º 1, do CC, o qual, sob a epígrafe “Danos causados por coisas, animais ou actividades”, tem o seguinte teor: “Quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar, e bem assim quem tiver assumido o encargo da vigilância de quaisquer animais, responde pelos danos que a coisa ou os animais causarem, salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua.”
Lembramos, a propósito, as palavras de Pires de Lima e Antunes Varela, na anotação a este artigo, in “Código Civil Anotado”, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, pág. 495: “Estabelece-se neste artigo, como nos dois anteriores, a inversão do ónus da prova ou seja, uma presunção de culpa por parte de quem tem a seu cargo a vigilância de coisas ou de animais ou exerce uma actividade perigosa. Abre-se mais uma exceção à regra do n.º 1 do artigo 487.º, mas não se altera o princípio do artigo 483.º de que a responsabilidade depende da culpa. Trata-se, portanto, de responsabilidade delitual e não de responsabilidade pelo risco ou objectiva.
(…) No n.º 1 estabelece-se uma importante restrição à responsabilidade. Ela só existe se a pessoa que tem em seu poder a coisa móvel ou imóvel (a caldeira, o paiol, o depósito de combustível ou de artigos de pirotécnica, armas, substâncias radioactivas ou insalubres, instrumentos cortantes, etc.) está obrigada a vigiá-la. Pode tratar-se do proprietário da coisa ou do animal (…) É a pessoa que tem as coisas ou animais à sua guarda quem deve tomar as providências indispensáveis para evitar a lesão.”.
A este respeito, e a título meramente exemplificativo, veja-se o acórdão da Relação de Coimbra de 03-03-2020, proferido no processo n.º 441/16.1T8FIG.C1, disponível em www.dgsi.pt:
1 – Em caso de danos resultantes de infiltrações de água provenientes de fracção superior à do lesado presume-se a culpa dos proprietários de tal fracção, isto porque o proprietário que tenha o imóvel em seu poder tem o dever de vigiar o seu estado de conservação e responde pelos danos originados no imóvel (infiltrações de águas, incêndios, etc.) salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa (art.º 493.º, nº 1, do C.Civil).
2 – Assim, se o autor (lesado) prova que as águas que inundaram e danificaram o seu apartamento provieram do interior do apartamento do réu (lesante), mostra-se preenchido o ónus da prova (art.º 342º do C.Civil) de que o facto danoso teve origem ou causa na coisa sob vigilância do réu (art.º 493º, nº 1, do C.Civil), não lhe cumprindo provar ainda a razão (sub-causa) da inundação (uma eventual rutura da canalização, uma torneira deixada a correr por mera incúria ou distração, etc.).
É bem certo que a presunção de culpa consagrada no art.º 493.º do CC, ainda que possa ter também o alcance de fazer presumir a ilicitude (do facto), não faz presumir os demais pressupostos da responsabilidade civil, designadamente o(s) dano(s) e o nexo de causalidade adequada entre o facto e o(s) dano(s). Neste sentido, destacamos os seguintes acórdãos do STJ (disponíveis em www.dgsi.pt):
- de 02-03-2011, proferido no processo n.º 1639/03.8TBBNV.L1.S1, em particular a seguinte passagem do respetivo sumário: “I - A presunção de culpa estabelecida no art.º 493.º, n.º 1, do CC é, simultaneamente, uma presunção de ilicitude, de tal modo que, face à ocorrência de danos, se presume ter existido incumprimento do dever de vigiar; por isso, provando-se que uma árvore que se abateu sobre a viatura em que seguia a 1.ª autora pertencia à ré, esta responde civilmente pelos danos ocasionados se não ilidir aquela presunção.”;
- de 10-12-2013, proferido no processo n.º 68/10.1TBFAG.C1.S1, de que citamos, pelo seu interesse, parte do respetivo sumário:
II - A norma do art.º 493.º, n.º 1, do CC estabelece uma presunção de culpa que, em bom rigor, é, simultaneamente, uma presunção de ilicitude, de tal modo que, face à ocorrência de danos, se presume ter existido, por parte da pessoa que detém a coisa, incumprimento do dever de vigiar. 
(…) V - O ónus da prova de que o facto danoso ocorreu ou foi causado pela coisa sob vigilância incumbe ao autor, nos termos do art.º 342.º, n.º 1, do CC, e mostra-se cumprido com a prova de que o incêndio que destruiu o imóvel teve origem na casa das rés, mais precisamente, na sala onde a salamandra estava colocada e foi acesa; não é exigível a prova da sub-causa que, em concreto, originou o incêndio (sobreaquecimento ou rebentamento da salamandra, inopinada libertação duma acha do seu interior, etc.);
- 30-09-2014, proferido no processo n.º 368/04.0TCSNT.L1.S1, em particular a seguinte passagem do respetivo sumário:
“II - O dever de vigilância tem um conteúdo indeterminado, dependente das circunstâncias do caso e integra-se num dever geral de prevenção do perigo ou nos deveres de segurança do tráfego. 
III - A norma do art.º 493.º, n.º 1, do CC, estabelece uma presunção de culpa que é, simultaneamente, uma presunção de ilicitude, de tal modo que, em face da ocorrência de danos, se presume ter existido, por parte da pessoa que detém a coisa, incumprimento do dever de vigiar.”
Registe-se, todavia, em sentido não inteiramente coincidente quanto ao alcance da presunção, o acórdão do STJ de 14-10-2014, proferido na Revista n.º 731/05.9TBARC.P1.S1, sumário disponível em www.stj.pt: “A presunção, contida no art.º 493.º, n.º 2, importa a inversão do ónus da prova, isto é, a presunção de culpa de imputação subjetiva do facto ao dever de diligência do agente, por parte de quem exerce uma atividade perigosa, e não uma presunção de ilicitude, pressupondo, indistintamente, um facto ilícito e que o mesmo tenha sido a causa dos danos, pelo que não implica qualquer alteração à regra geral constante do art.º 483.º, ambos do CC, segundo a qual a responsabilidade depende de culpa.”
Lembramos, por último, o acórdão do STJ de 13-04-2023, proferido no processo n.º 23707/19.4T8LSB.L1.S1 (disponível em www.dgsi.pt), que ilustra bem a jurisprudência do STJ a propósito de casos próximos do que nos ocupa: “Esta responsabilidade civil especial, designadamente quanto aos danos causados por coisas, assente numa presunção de culpa, cabe a quem tiver em seu poder coisa, com o dever de a vigiar. Ao atribuir a responsabilidade a quem tiver a guarda coisa, o legislador admitiu o a presunção daquele que guarda a coisa ter culpa no facto causador do dano, quer por ter o dever de providenciar que tal não venha a verificar-se, quer também por estar em melhor posição para fazer a prova da culpa, pois estando à sua disposição deve saber se realmente foi cauteloso na sua guarda (Vaz Serra BMJ, nº 101, pág. 130 e sgs.)
O dever que tem o proprietário de vigiar o estado de conservação do imóvel que é sua propriedade de sorte a impedir que nele se ocasionem focos danosos, sob pena de incorrer na obrigação de indemnizar os danos causados pelo mau estado de conservação do imóvel, tem sido afirmada em múltiplos arestos do STJ.
Sem preocupação de ser exaustivo, citam-se os seguintes:
Ac. 15.02.2005, P. 05B214 (Lucas Coelho):
Resultando dos factos provados que a produção dos danos na fracção autónoma dos autores foi devida a infiltrações de água a partir da contínua fracção dos réus, conclui-se terem estes actuado com negligência, uma vez que face aos indícios da proveniência das infiltrações, deviam e podiam ter averiguado a origem das mesmas e proceder às reparações necessárias, o que só não aconteceu por descuido e, até, desrespeito para com o demandante.
Ac. 14.09.2010. P.403/2001 (Salazar Casanova):
I - Se o autor prova que as águas que inundaram e danificaram o seu apartamento provieram do interior do apartamento dos réus, mostra-se preenchido o ónus da prova (art.º 342º do CC), de que o facto danoso teve origem ou causa na coisa sob vigilância dos réus (art.º 493º/1 do CC), não lhe cumprindo provar ainda que a razão (sub-causa) da inundação (uma eventual ruptura da canalização, uma torneira deixada a correr por incúria ou distracção, etc.)
II - O proprietário que tenha o imóvel em seu poder tem o dever de vigiar o seu estado de conservação e responde pelos danos originados no imóvel (infiltrações de água, incêndios, etc), salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa (art.º 493º, nº1 do CC).
Ac. 10.11.2016, P. 472/10 (Olindo Geraldes):
A responsabilidade civil especial, prevista no art.º 493º, nº1 do CC, designadamente quanto aos danos causados por coisas, móveis ou imóveis, assente numa presunção de culpa, cabe a quem tiver em seu poder a coisa, com o dever de a vigiar.”
Transpondo estas considerações para a situação em apreço e atentando nos factos provados descritos em 4, 5, 6 e 7, parece-nos inevitável concluir pela responsabilidade civil extracontratual da Ré pelos danos causados pela inundação na loja de que a Autora é arrendatária, já que essa inundação foi, sem dúvida alguma, ocasionada pela água proveniente da tubagem de abastecimento de água da fração de que era proprietária, a tanto não obstando a circunstância de tal evento ter ocorrido de noite e numa altura em que decorriam trabalhos de empreitada de remodelação dessa fração, em que foram tamponados os pontos de ligação à tubagem de abastecimento de água, apenas tendo sido apurado que, pelo menos, um dos tampões dos pontos de ligação não impediu o vazamento de água.
De salientar que, contrariamente ao que a Apelada refere - quando diz que isso resultou do comportamento omissivo do empreiteiro, por não ter tamponado a tubagem de abastecimento de água da casa de banho - não se apurou o motivo concreto pelo qual sucedeu a referida fuga de água, não sendo a mera intervenção de terceiro (no caso, “uma empresa” desconhecida) na realização de trabalhos de remodelação suficiente para afastar a presunção de ilicitude e de culpa consagrada no citado artigo.
Sendo indiscutível que sobre a Ré recaia o dever de vigiar a fração de que era proprietária, não resulta dos factos provados que tenha logrado demonstrar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua, sendo certo que não lhe basta, para ilidir a presunção de culpa consagrada no art.º 493.º, n.º 1, do CC, provar que contratou uma empresa para realizar os trabalhos de remodelação da sua fração e ter sido enquanto decorria essa remodelação que foram tamponados os pontos de ligação à tubagem de abastecimento de água, não impedindo um dos tampões dos pontos de ligação o vazamento de água.
Basta ver que a Ré nem sequer provou que a empresa que contratou estava, nos termos da lei, devidamente habilitada para o exercício da atividade de empreiteiro de construção civil de obras particulares, designadamente se detinha alvará de empreiteiro de obras particulares – cf. art.º 24.º da Lei n.º 41/2015, de 03-06 (que estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício da atividade da construção).
É irrelevante para o caso o entendimento da doutrina e da jurisprudência (ilustrado, exemplificativamente, pelo acórdão do STJ de 14-09-2006, proferido no processo n.º 06B2337, disponível em www.dgsi.pt) segundo o qual na empreitada não existe comissão (por na relação entre dono da obra e empreiteiro inexistir o elemento da subordinação, não sendo o dono da obra um comitente do empreiteiro – cf. art.º 500.º do CC). Com efeito, não se está a discutir se a Ré incorreu em responsabilidade objetiva solidária com a responsabilidade por facto ilícito da empreiteira, até porque não se provou se foram ou não observados pela empresa em causa os cuidados devidos, de acordo com as legis artis, destinados a evitar fugas de água.
Numa situação próxima da que nos ocupa (embora nesse caso tenha sido apurado o motivo concreto da fuga de água), veja-se o voto de vencido no acórdão da Relação de Évora de 28-02-2019, proferido no processo n.º 989/17.0T8PTM.E1 (disponível em www.dgsi.pt): estava provado que os danos ocorridos no apartamento, suportados pela Autora/Seguradora (que havia celebrado contrato de seguro multirriscos habitação com o respetivo proprietário), foram causados pela água proveniente da canalização do apartamento pertencente ao Réu, em consequência da rotura por apodrecimento do ralo da banheira e em consequência da fuga de água proveniente da rede de esgotos do mesmo apartamento, em consequência da reparação por ele mandada efetuar e que não foi corretamente realizada); afirma-se que o proprietário “O que não pode, com o devido respeito, para ilidir a presunção de culpa inscrita no n.º1 do art.º 493.º do C.C., é alegar e provar que mandou fazer a reparação e que esta não foi bem-feita, lavando daí as suas mãos, exigindo-se ao Autor a demanda desta terceira entidade pela reparação do prejuízo.”
Dos factos provados resulta que existiram danos na fração onde a Autora tem as suas instalações, quantificados, face ao valor da respetiva reparação, em 2.162 €, dos quais a Autora apenas recebeu (da Seguradora) a quantia de 700 €, pelo que o ressarcimento desses danos importa ainda na quantia de 1.462 €.
A única dúvida é a de saber se a Autora pode ser considerada titular do direito a essa indemnização, atenta a sua qualidade de arrendatária da loja onde se situa a sua sede e instalações.
Sendo certo que legitimidade processual e substantiva não se confundem, não deixa de causar alguma estranheza que, tendo o Tribunal a quo, no despacho saneador, julgado totalmente improcedente a exceção de ilegitimidade processual (nem equacionando a hipótese de absolvição parcial da instância quanto à parcela do pedido relativa ao custo da reparação do teto falso), com a fundamentação acima reproduzida, tenha depois entendido, na sentença, que só ao proprietário assistia o direito a indemnização pelos danos atinentes à reparação do teto falso da loja utilizada pela sociedade Autora, por se tratar de prejuízo na estrutura da fração (não deixando assim de perspetivar o proprietário como o titular da relação material controvertida quanto a essa parte do pedido).
Ora, não podemos acompanhar este entendimento, pois um teto falso em gesso cartonado e um sistema de alarme de incêndio não constituem elementos estruturais da fração autónoma, servindo apenas um propósito estético no caso do teto falso (em regra, a ocultação de sistemas de ar condicionado ou componentes da rede elétrica), e de prevenção contra incêndios no caso do detetor de fumo e das baterias.
No contexto dos factos apurados, nada indica que esses componentes já existissem na fração aquando do seu arrendamento à Autora, antes pelo contrário, sendo possível ver no desinteresse dos referidos senhorios um indicador de que se tratam de benfeitorias introduzidas no locado.
Assim, tal como entendeu a Seguradora (muito embora não esteja o Tribunal vinculado à posição adotada pela mesma), tudo aponta para que tenha sido a Autora a ficar diretamente afetada/lesada pela circunstância de, na fração onde tem a sua sede e desenvolve a sua atividade, se verificar, por causa da água proveniente da fração da Ré, a degradação do teto falso, em gesso cartonado, e uma avaria do detetor de fumo e duas baterias recarregáveis.
Ademais, é bom não esquecer que, se o teto falso e sistema de alarme de incêndio já existissem na fração, aquando do arrendamento, a Autora continuava a ter todo o interesse em manter a fração em bom estado quanto a esses elementos da mesma, prevenindo até um possível conflito com os senhorios ante o disposto nos artigos 1043.º e 1044.º do CC. Acresce ainda que a lei reconhece ao locatário a possibilidade de fazer reparações ou outras despesas urgentes, com direito ao seu reembolso (cf. art.º 1036.º do CC). Portanto, mesmo que esses elementos devessem ser reparados pelos senhorios (o que não é possível concluir dos factos provados, porque, como já referimos, nada indica que fizessem parte da fração aquando da celebração do contrato), compreende-se a iniciativa da Autora em obter da Ré os fundos necessários para assegurar a realização dos trabalhos de reparação, dada a premência da reparação dos estragos causados pela inundação.
Daí que, nesta parte, se nos afigure ser a Autora titular do direito à indemnização pelos referidos danos.
Não estão provados quaisquer factos que justifiquem a atribuição de indemnização por outros danos patrimoniais ou não patrimoniais, sendo certo que, quanto a estes últimos, nem a Apelante alegou fosse o que fosse para justificar a procedência da sua pretensão indemnizatória.
Assim, procedem em parte as conclusões da alegação de recurso.

Autora e Ré são responsáveis pelo pagamento das custas processuais, em ambas as instâncias, na proporção do decaimento, que se fixa em 89% para a Autora-Apelante e 11% para a Ré-Apelada (artigos 527.º e 529.º, ambos do CPC).

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III - DECISÃO

Pelo exposto, decide-se conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida, decidindo-se, em substituição, julgar parcialmente procedente a ação, condenando a Ré a pagar à Autora a quantia de 1.462 € (mil quatrocentos e sessenta e dois euros), absolvendo a Ré do mais peticionado.
Decide-se ainda condenar Autora-Apelante e Ré-Apelada no pagamento das custas da ação e do recurso, na proporção de 89% e 11%, respetivamente.
D.N.

Lisboa, 24-10-2024
Laurinda Gemas
António Moreira
Pedro Martins