Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4/19.0PTCSC.L1-9
Relator: EDUARDO DE SOUSA PAIVA
Descritores: OMISSÃO DE AUXÍLIO
CONSUMAÇÃO
MEDIDA DA PENA
GRAU DE ILICITUDE ELEVADO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/16/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: I. O crime de omissão de auxílio consuma-se quando, em caso de grave necessidade provocada por acidente que ponham em perigo a vida ou a integridade física da vítima, o agente não lhe presta o auxílio necessário ao afastamento do perigo, por ação pessoal ou promovendo o socorro, fugindo do local.
II. A vítima, embatida pelo veículo que a arguida conduzia, foi projetada por cima do veículo automóvel desta, acabando por cair no solo, onde ficou até ser assistida, em estado grave, com múltiplos traumatismos e com múltiplas fraturas, ou seja, em situação de grave perigo, pelo menos para a integridade física, senão mesmo para a vida, carecida de auxílio.
III. O facto de à vítima ter sido, a seguir, prestado o auxílio necessário não afasta o cometimento, pela arguida, do crime de omissão de auxílio, já que o crime se consumou quando a arguida fugiu do local após a colisão, ou seja, num momento anterior à prestação do socorro, à vítima, por terceiros.
IV. Considerando o estado grave em que se encontrava a vítima, o seu abandono e omissão de auxílio pela arguida reveste-se de elevada gravidade, sendo, portando, elevado o grau de ilicitude dos factos.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. RELATÓRIO
No processo comum singular nº 4/19.0PTCSC, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Criminal de Cascais – Juiz 3, por sentença proferida a 26/04/2024, a arguida M.M… foi condenada, pela prática de um crime de omissão de auxílio previsto e punido pelos arts 200º, nºs 1 e 2 do Código Penal, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis euros) perfazendo a quantia total de €900,00 (novecentos euros).
Por despacho anteriormente proferido nos autos e transitado em julgado, tinha sido declarado amnistiado o crime de ofensa à integridade física por negligência de que a arguida também estava pronunciada.
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Inconformada, a arguida interpôs o presente recurso, concluindo:
«I. A Arguida nos Autos, ora Recorrente, discorda que o tipo esteja preenchido.
II. De facto em momento algum ocorre “perigo a vida, a integridade física ou a liberdade de outra pessoa”.
III. Por outro lado, a vítima sempre teve “o auxílio necessário ao afastamento do perigo” e socorro.
IV. Pelo que não há crime.
(…)
VI. Por outro lado este processo reporta-se a factos de 2019, ou seja, os factos têm 5 anos.
VII. Desde então a arguida não voltou a praticar qualquer crime, bem como, não tem registos de práticas de crimes passados.
VIII. Por outro lado, a Arguida, é uma cidadã exemplar e trabalhadora.
IX. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo o tribunal a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor ou contra o agente, conforme vem determinado no Art.º 71º do Código Penal.
X. Nos termos do Art.º 40º do mesmo diploma a pena não pode ultrapassar a medida da culpa.
XI. Em consonância, segundo o Art.º 71º do Código Penal a medida da pena é determinada em função da culpa do agente e das exigências de prevenção e tendendo ainda às circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, revelem a favor ou contra o arguido, nomeadamente as aludidas no nº 2 desse preceito legal.
XII. No que concerne à prevenção especial de socialização é de considerar e em sentido favorável a circunstância de se encontra socialmente bem inserido.
XIII. Por conseguinte e com vista a garantir a satisfação das finalidades preventivas a pena deverá situar-se no mínimo da moldura. XIV. Ponderando todas as circunstâncias, entende-se adequada, proporcionada, e bastante, a condenação da Recorrente a multa pelo mínimo.»
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O recurso foi admitido com subida imediata, nos autos e efeito suspensivo.
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O Ministério Público respondeu, pugnando pela improcedência do recurso, concluindo que:
«1. A recorrente não indica, no seu instrumento recursivo, a norma ou as normas pretensamente violadas, limitando-se a convocar, ao longo de toda a sua motivação e conclusões, o disposto nos artigos 40.º e 71.º, do Código Penal.
2. Tal pena de multa foi fixada ligeiramente acima do primeiro terço da moldura penal abstratamente aplicável ao tipo legal de crime em causa, não se afigurando excessiva, sendo que o quantitativo diário de tal pena de multa foi fixado 1,00 € (um euro) acima do limite mínimo legal e atendendo à situação socioeconómica do arguido.
3. Deverá, pois, ser mantida a sentença recorrida».
Termina pugnando pela improcedência do recurso com a manutenção da sentença recorrida.
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A Digna Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da confirmação da decisão recorrida.
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Foi proferido despacho a efetuar o exame preliminar, mantendo o efeito e regime de subida do recurso e a indeferir a realização de audiência.
Corridos os vistos, foram os autos à conferência.
Nada obsta à prolação de acórdão.
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II. OBJETO DO RECURSO
Em conformidade com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das Secções do S.T.J. de 19/10/1995 (in D.R., série I-A, de 28/12/1995), o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que a recorrente extrai da respetiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
Atendendo às conclusões apresentadas, são as seguintes as questões a apreciar:
1. Qualificação jurídico-penal (preenchimento do tipo);
2. Medida concreta da pena.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
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A) DECISÃO RECORRIDA
A sentença recorrida estabeleceu os seguintes factos provados:
«1. No dia 1 de janeiro de 2019, pelas 16h15m, a arguida circulava com o veículo automóvel de matrícula ??-??-?? na Estrada do Guincho (N247), em Cascais, no sentido Nascente - Poente.
2. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, as condições atmosféricas eram boas, existia boa visibilidade e luminosidade, e o pavimento encontrava-se seco e limpo.
3. Nessa ocasião, a arguida ao chegar junto do entroncamento da referida estrada com a Rua da Areia, decidiu mudar de direção à esquerda com vista a entrar nesta Rua, sem parar a viatura em que circulava, sem abrandar a marcha ou ceder prioridade aos veículos que circulavam no sentido Poente – Nascente.
4. Assim, nessas circunstâncias, a arguida avançou com o veículo automóvel de matrícula ??-??-??, ocupando a faixa de trânsito de sentido contrário, Poente – Nascente, onde, na ocasião, circulava A.L…, com o seu velocípede.
5. Nesse momento, A.L…, sem que lhe fosse possível imobilizar ou desviar o seu velocípede, embateu com o mesmo contra a zona lateral direita junto à roda da frente e espelho retrovisor do veículo automóvel de matrícula ??-??-?? conduzido pela arguida.
6. Como efeito do embate, A.L… foi projetado por cima do veículo automóvel de matrícula ??-??-?? conduzido pela arguida acabando por cair no solo do lado esquerdo deste veículo, ficando o seu velocípede caído do lado direito do mesmo.
7. Não obstante o embate, a arguida encetou a fuga pela Rua da Areia, em direção a Sul, não prestando socorro a A.L… nem promovendo a prestação de socorro por terceiros, não fornecendo os seus elementos de identificação e não aguardando pela chegada das autoridades.
8. Nessa sequência, A.L… ficou caído no chão até ser assistido por terceiros não concretamente identificados, os quais chamaram os Bombeiros de Cascais que o transportaram para o Hospital Dr. José Almeida, em Cascais.
9. Como consequência direta do embate, A.L… sofreu dores, traumatismo do ombro esquerdo, tórax, região dorso-lombar, traumatismo de ambos os punhos com fratura bilateral do rádio, fratura multifragmentar lateral direita do manúbrio proximal com desalinhamento da respetiva articulação condro-esternal, fratura alinhada posterior da segunda à nona costelas esquerdas, tendo sido submetido a cirurgia e período de internamento de 1 a 3 de janeiro de 2019.
10. Lesões que demandaram um período de doença de 1 de janeiro de 2019 a 20 de Maio de 2020, data da consolidação das lesões, correspondendo a 139 dias de doença, sendo 2 dias com afetação da capacidade para o trabalho geral e 139 dias com afetação da capacidade para o trabalho profissional.
11. A arguida seguia distraída e desatenta na sua condução, não tendo tomado o devido cuidado e atenção ao realizar a manobra de mudança de direção.
12. A arguida ao mudar de direção sem abrandar, parar nem ceder prioridade aos veículos que circulavam no sentido oposto àquele em que circulava, atuou em violação das normas estradais e deu causa ao acidente.
13. A arguida, ao fugir após a colisão com o velocípede no qual seguia A.L…, sem querer saber do estado em que este ficou, sem lhe prestar o socorro necessário, por si ou por terceiros, ao afastamento do perigo para a vida e integridade física que o embate lhe causou, atuou conformando-se com essa decisão.
14. A arguida atuou livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
15. A arguida não tem antecedentes criminais.
16. A arguida é tida por aqueles que com ela privam como uma pessoa disponível para ajudar, e faz voluntariado.
17. É monitora de equitação e aufere € 740 euros mensais.
18. É solteira e vive só.
19. Paga 350 euros de renda de casa.
20. Possui como habilitações literárias Licenciatura em G…H…»
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B) APRECIAÇÃO DO RECURSO
Conforme acima enunciado, face às conclusões da recorrente, são as seguintes as questões a apreciar:
1. Qualificação jurídico-penal (quanto ao preenchimento do tipo);
2. Medida concreta da pena.
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1. Qualificação jurídico penal
Entende a recorrente que não está preenchimento o tipo objetivo do crime uma vez que em momento algum ocorreu perigo para a vida, para a integridade física ou para a liberdade de outra pessoa, já que a vítima sempre teve o auxílio necessário ao afastamento do perigo e socorro.
Comete o crime de omissão de auxílio, “quem, em caso de grave necessidade, nomeadamente provocada por (…) acidente, que ponha em perigo a vida, a integridade física ou a liberdade de outra pessoa, deixar de lhe prestar o auxílio necessário ao afastamento do perigo, seja por ação pessoal, seja promovendo o socorro” (art.º 200º, nº 1 do Código Penal), sendo que, se essa situação de perigo tiver sido criado por quem omite o auxílio devido, a conduta é punida com pena de prisão até dois anos ou pena de multa até 240 dias (nº 2 do mesmo artigo).
Resulta da factualidade provada que foi a arguida, com a sua conduta, que provocou o acidente que causou as lesões sofridas pela vítima.
Por outro lado, a vítima, embatida pelo veículo que a arguida conduzia, foi projetada por cima do veículo automóvel desta, acabando por cair no solo do lado esquerdo deste veículo, ficando o seu velocípede caído do lado direito do mesmo, tendo a vítima ficado caída no chão até ser assistida, e em estado grave, com múltiplos traumatismos (do ombro esquerdo, tórax, região dorso-lombar e de ambos os punhos) e com múltiplas fraturas (fratura bilateral do rádio, fratura multifragmentar lateral direita do manúbrio proximal com desalinhamento da respetiva articulação condro-esternal, fratura alinhada posterior da segunda à nona costelas esquerdas), ou seja, em situação de grave perigo, pelo menos para a integridade física, senão mesmo para a vida. E, não obstante a situação de grave perigo em que a arguida colocou a vítima, abanou o local sem lhe prestar auxílio.
Efetivamente, e conforme resultou provado (no ponto 13. dos factos provados constantes da sentença recorrida), “a arguida, ao fugir após a colisão com o velocípede no qual seguia A.L…, sem querer saber do estado em que este ficou, sem lhe prestar o socorro necessário, por si ou por terceiros, ao afastamento do perigo para a vida e integridade física que o embate lhe causou, atuou conformando-se com essa decisão”.
Por outro lado, e como bem se refere na decisão recorrida (citando o AC do TRE de 13/04/2021, in dgsi), «a “grave necessidade” pressupõe a incapacidade da vítima para, por si só, afastar o perigo iminente de lesão importante dos bens jurídicos – a vida, a integridade física ou a liberdade –, “revelada pela existência de sinais apreensíveis por qualquer pessoa, da necessidade urgente de atuação na prestação de auxílio” (…). Outro dos elementos do tipo objetivo é o de que o auxílio omitido se mostre “necessário” a afastar o perigo concreto».
Estão, assim, preenchidos todos os elementos objetivos do crime de omissão de auxílio previsto no art.º 200º, nº 1 e 2 do Código Penal, incluindo aquele – perigo para a integridade física - que a arguida, nas suas alegações defende não ter ocorrido.
Por outro lado, e diversamente do que defende o recorrente, o facto de à vítima ter sido a seguir prestado o auxílio necessário não afasta o cometimento, pela arguida, do crime de omissão de auxílio, já que o crime se consumou quando a arguida fugiu do local após a colisão, ou seja, num momento anterior à prestação do socorro, à vítima, por terceiros.
Conforme refere Paulo Pinto de Albuquerque (in Comentário do Código Penal, em anotação ao art.º 200º), “o auxílio prestado por uma pessoa não desobriga os demais do dever de auxílio, mantendo-se esse dever até que o carecido de auxílio dele não careça, nomeadamente por ter sido socorrido”. Vale por dizer que, quando a arguida fugiu do local, a vítima carecia de auxílio, só vindo a deixar de necessitar posteriormente, quando o crime cometido pela arguida já estava consumado.
Improcede, assim, nesta parte, o recurso interposto.
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2. Da determinação da medida da pena
A sentença recorrida condenou a arguida na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis euros), perfazendo a quantia total de €900,00 (novecentos euros).
Entende a recorrente que a pena de multa deve ser fixada no mínimo legal, ou seja, em 10 (dez) dias à taxa diária de €5,00 (cinco euros), por a aplicada ser “uma sanção demasiado pesada”.
O crime de omissão de auxílio cometido pela arguida é punido com pena de prisão de 1 (um) mês a 2 (dois) anos ou com pena de multa de 10 (dez) a 240 (duzentos e quarenta) dias (arts 200º, nº 2, 41º, nº 1, e 47º, nº 1, todos do Código Penal).
A sentença recorrida deu preferência à pena de multa.
Na determinação da medida concreta da pena importa atender à culpa do agente, às exigências de prevenção de futuros crimes e a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele (art.º 71º do Código Penal).
Pela via da culpa, segundo refere o Prof. Figueiredo Dias (“As Consequências Jurídicas do Crime”, 1993, pág. 239), releva para a medida da pena a consideração do ilícito típico, ou seja, “o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente”, conforme prevê o art.º 71º, nº 2, al. a) do Código Penal.
A culpa, como fundamento último da pena, funcionará como limite máximo inultrapassável da pena a determinar (art.º 40º, nº 2 do Código Penal). A prevenção geral positiva (“proteção de bens jurídicos”), fornecerá o limite mínimo que permita a reposição da confiança comunitária na validade da norma violada. Por último, é dentro daqueles limites que devem atuar considerações de prevenção especial, isto é, de ressocialização do agente (F. Dias, ob. cit., págs. 227 e segs.; Anabela Rodrigues, in R.P.C.C., 2, 1991, pág. 248 e segs.; e Ac. S.T.J. de 9/11/94, B.M.J. nº 441, pág. 145).
A sentença recorrida entendeu que “as exigências de prevenção geral são medianas/altas, atenta a elevada sinistralidade rodoviária que existe em Portugal, com um número significativo de condutores que abandonam o local do acidente”.
Ao nível das necessidades de prevenção especial considerou “a intensidade do dolo”, a ausência de arrependimento, “a ausência de antecedentes criminais”, “o tempo entretanto decorrido” e “o facto de a arguida estar familiar, social e profissionalmente inserida”.
Ao nível do grau de ilicitude do facto, importa considerar que a arguida atuou com dolo intenso e abandonou uma pessoa que, embatida pelo veículo que conduzia, foi projetada por cima desse veículo, acabando por cair no solo do lado esquerdo da viatura, ficando o seu velocípede caído do lado direito da mesma, tendo ficado caída no chão até ser assistida e em estado grave, com múltiplos traumatismos (do ombro esquerdo, tórax, região dorso-lombar e de ambos os punhos) e com múltiplas fraturas (fratura bilateral do rádio, fratura multifragmentar lateral direita do manúbrio proximal com desalinhamento da respetiva articulação condro-esternal, fratura alinhada posterior da segunda à nona costelas esquerdas), tendo sido transportada por ambulância ao hospital.
Ora, considerando o estado grave em que se encontrava a vítima, o seu abandono e omissão de auxílio pela arguida reveste-se de elevada gravidade, sendo, portando, elevado o grau de ilicitude dos factos. Já não tanto assim quanto às consequências da conduta da arguida, uma vez que a vítima acabou por ser socorrida por terceiros.
Nestes termos, entendemos ser adequada e proporcional a aplicação à arguida da pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, conforme decidiu a douta sentença recorrida, assim se repondo na comunidade a confiança na validade e eficácia da norma violada, se acautelando a proteção dos bens jurídicos, satisfazendo-se as exigências de prevenção geral e especial que o caso demanda.
A fixação, em €6,00 (seis euros), do quantitativo diário da multa, nada tem de excessiva, antes sendo de elevada moderação (considerando que o mínimo legal é de €5,00 e o máximo é de €500,00), face aos rendimentos da arguida e por o mínimo legal estar mais vocacionado para situações de indigência, o que não é o caso.
Como bem refere o douto acórdão do STJ de 19/05/2021 (Proc. 10/18.1PELRA.S1., acessível em http://www.dgsi.pt), «no que respeita à decisão sobre a pena, mormente à sua medida, começa por lembrar-se que os recursos não são [novos] julgamentos da causa, mas tão só remédios jurídicos. Assim, também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico.
Daqui resulta que o tribunal de recurso intervém na pena, alterando-a, quando deteta incorreções ou distorções no processo aplicativo desenvolvido em primeira instância, na interpretação e aplicação das normas legais e constitucionais que regem a pena. Não decide como se o fizesse ex novo, como se inexistisse uma decisão de primeira instância. O recurso não visa, não pretende e não pode eliminar alguma margem de atuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do ato de julgar.»
Improcede, pois, também nesta parte, o recurso interposto.
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IV. DECISÃO
Pelo exposto, acordamos em negar provimento ao recurso, confirmando, na íntegra, a douta sentença recorrida.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça por si devida em 3 (três) UC.
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Lisboa, 16 de janeiro de 2025
Os Juízes Desembargadores,
Eduardo de Sousa Paiva
Ivo Nelson Caires B. Rosa
Diogo Coelho de Sousa Leitão