Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | BERNARDINO TAVARES | ||
Descritores: | PRIVATE ENFORCEMENT CARTEL CAMIÕES PRESCRIÇÃO DANO ESTIMATIVA JUDICIAL JUROS DE MORA | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 11/27/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE/IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | - Na interpretação de uma decisão da Comissão da União Europeia, sancionadora de uma conduta violadora do art. 101.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), deve atender-se ao dispositivo e aos fundamentos, incluindo nestes os Considerandos da decisão necessários à compreensão do dispositivo; - No âmbito de uma ação de private enforcement decorrente de conduta violadora do artigo 101.º do TFUE, as ilações a que se chegou na Decisão da Comissão da EU (AT. 39824 – Trucks) sobre a mesma matéria, nomedamente em termos da existência de dano e nexo causal, podem ser válidas; - Não logrando a Autora provar a quantia exata do dano e concluindo o Tribunal, perante circunstâncias objetivas do caso, que tal determinação era praticamente impossível ou excessivamente difícil, poderá proceder ao cálculo do valor do dano com base em estimativa judicial, nos termos do artigo 9.º, n.º 2 da Lei n.º 23/2018, que transpôs o artigo 17.º, n.º 1 da Diretiva 2014/104/EU, sendo tal poder do Tribunal expressão do princípio da efetividade; - A aplicação do prazo de prescrição de 5 anos previsto no artigo 10.º da Diretiva e artigo 6.º, n.º 1, da Lei n.º 23/2018, depende de três condições: a interposição de uma ação de indemnização que tenha subjacente uma infração que cessou antes da entrada em vigor da Diretiva; que a ação tenha sido intentada após a entrada em vigor da respetiva Lei de Transposição; que o prazo de prescrição ao abrigo das regras nacionais aplicáveis ainda não se mostre esgotado na data do termo do prazo de transposição da diretiva (TJUE, C-267/20); - Em casos de private enforcement por conduta violadora do artigo 101.º do TFUE, os juros de mora contam-se a partir da ocorrência do dano, não sendo aplicável a prescrição prevista no artigo 310.º, al. d), do Código Civil. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa: * I - Relatório TN - TRANSPORTES M. SIMÕES-NOGUEIRA, S.A., intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra as requeridas AB Volvo e NORS, S.A., tendo formulado os seguintes pedidos: “(i) Requer-se que seja ordenada a citação urgente das Rés, nos termos do disposto no artigo 561.º do CPC, com os fundamentos acima invocados; (ii) Deve a presente ação ser julgada totalmente procedente, por provada, e, em consequência, devem as Rés ser solidariamente condenadas a pagar à Autora uma indemnização pelos danos patrimoniais resultantes da violação dos artigos 101.º, n.º 1 do TFUE e 53.º, n.º 1, do Acordo EEE, cuja quantificação se relega para fase posterior do processo, nos termos do artigo 569.º do Código Civil e dos artigos 358.º e 556.º do Código de Processo Civil, acrescida dos juros de mora vencidos desde a data da infração e dos que se vencerem desde a data da citação até integral pagamento.” Na pendência da ação, com a petição aperfeiçoada, e que junta aos autos em 19 de janeiro de 2021, e com o requerimento de liquidação, de 27 de abril de 2021, a Autora passou a formular o seguinte pedido: A) Ser a Ré AB Volvo condenada a pagar à Autora a quantia de € 1.242.155,36 (um milhão duzentos e quarenta e dois mil cento e cinquenta e cinco euros e trinta e seis cêntimos) acrescida dos juros de mora vencidos desde a data da infração e dos que se vencerem até integral pagamento. * Como fundamento da referida pretensão, alegou, em síntese, que adquiriu entre 1997 e 7 de janeiro de 2011 cento e quinze veículos da marca VOLVO, modelos ..., ..., ... e ..., para o exercício da sua atividade comercial, através de contratos de compra e venda e contratos de locação financeira. Contudo, em virtude da infração sancionada pela Comissão Europeia no Processo AT.39824, pagou por tais veículos um preço superior àquele que teria pago caso não se tivesse verificado a infração e que computa em 16,68% do valor de aquisição das viaturas, deduzido de um fator de correção de 10%. Mais considera serem devidos juros de mora desde a data de aquisição dos veículos. * A NORS, SA deduziu contestação, tendo concluído que deve ser: “a) julgada procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva, com a consequente absolvição da 2ª. Ré da instância; ou, subsidiariamente, b) julgada procedente a exceção perentória de prescrição, com a consequente absolvição da 2ª. Ré do pedido contra si formulado; e caso ainda assim não se entenda, c) a presente ação julgada improcedente, por não provada, com a consequente absolvição da 2ª. Ré do pedido contra si formulado.” * Como fundamento da referida pretensão, invocou: não ter tido qualquer intervenção nas práticas objeto de investigação e condenação por parte da Comissão Europeia, não havendo quaisquer relações societárias com a AB Volvo. Mais invocou a prescrição do direito invocado pela A. nos termos dos artigos 309.º e 498.º, n.º 1, ambos do Código Civil (CC). Finalmente, não estarem verificados os pressupostos do direito reclamado pela Autora. * A AB Volvo deduziu contestação, tendo concluído que deve ser: “a) A exceção perentória de prescrição ser julgada procedente, por provada, sendo a ora R. absolvida dos pedidos contra si formulados. CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA, b) Ser a presente ação julgada improcedente, por não provada, sendo a R. absolvida dos pedidos formulados nos autos.” * Como fundamento da referida pretensão, invocou: a prescrição do direito reclamado pela A. nos termos dos artigos 309.º e 498.º, n.º 1, ambos do Código Civil (CC), a prescrição dos juros de mora nos termos do artigo 310.º, alínea d), do CC, a ilegitimidade passiva da 2ª Ré (NORS, S.A). Afirmou que o alegado dano reclamado, advindo do sobrecusto dos camiões adquiridos pela A., a existir (o que não aceita) se terá repercutido, na atividade desenvolvida por aquela, junto dos seus clientes ou através das revendas dos veículos (70 veículos com as matrículas identificadas na contestação ref.ª ...38 ponto 643.º - doc. n.º 12 a n.º 81). Mais invocou a obtenção pela A. de uma poupança/vantagem fiscal e considerou não estarem verificados nenhum dos pressupostos do direito reclamado pela Autora, mais acrescentando quanto aos juros, que apenas são devidos desde a data de citação. * A ré NORS, SA conforme despacho saneador de 14 de fevereiro de 2020, que julgou procedente a ilegitimidade processual passiva, foi absolvida da instância. * A A. respondeu à exceção de prescrição, tendo pugnado pela improcedência. * A AB Volvo apresentou articulado de resposta em relação ao articulado de aperfeiçoamento formulado pela A. * Por despacho de 29 de abril de 2021, foi definido o objeto do litígio na análise das seguintes questões: - Da prescrição invocada pela Ré; - Da verificação dos pressupostos da obrigação de indemnizar – facto ilícito, nexo de causalidade, culpa e danos; - Da quantificação dos danos, incluindo a repercussão e mitigação; - Do cálculo dos juros de mora. * Realizada a audiência final, foi proferida sentença, a 31 de março de 2024, pela qual se decretou o seguinte: “Em face de todo o exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente nos seguintes termos: I. Condeno a R. a pagar à A. a quantia que se vier a liquidar correspondente ao custo adicional que a A. pagou pelas viaturas com as matrículas identificadas nas alíneas i) a kk) dos factos provados, correspondente a 5% do preço de aquisição dessas viaturas que se vier a apurar e no máximo até aos montantes indicados supra no § 494, acrescidos de juros de mora desde 31.03.2020, até efetivo e integral pagamento de acordo com a taxa legal aplicável aos juros civis (e as demais que venham a ser aprovadas); II. Condeno a R. a pagar à A. a quantia total de duzentos e setenta e oito mil e trezentos e oitenta e cinco euros (€ 278.385,00) em relação aos veículos identificados nas alíneas ll) a jjjjj) dos factos provados, acrescida de juros de mora desde 31.03.2020, até efetivo e integral pagamento de acordo com a taxa legal aplicável aos juros civis (e as demais que venham a ser aprovadas); III. Condeno a R. a pagar à A. a quantia total de trinta e cinco mil e quinhentos euros (€ 35.500,00) em relação aos veículos identificados na alínea kkkkk) dos factos provados, acrescida de juros de mora desde 07.01.2015, até efetivo e integral pagamento de acordo com a taxa legal aplicável aos juros civis (e as demais que venham a ser aprovadas); IV. Absolvo a R. de tudo o mais peticionado. *** CUSTAS: Nos termos dos artigos 527.º, n.ºs 2 e 3 e 528.º, n.º 3, ambos do CPC, condeno A. e a R. nas custas, na proporção do respetivo decaimento.” * A AB Volvo, inconformada, interpôs recurso de apelação da sentença final, em que apresenta as seguintes conclusões: A. INTRODUÇÃO 1) O Tribunal Recorrido incorreu num conjunto de erros de facto e de direito significativos e importantes, em inobservância dos princípios e regras legais vigentes em matéria de responsabilidade civil. 2) Em concreto, o Tribunal a quo errou ao: (i) decidir o prazo de prescrição aplicável ao caso sub judice, bem como aquele que terá sido o dies a quo; (ii) desconsiderar as regras sobre distribuição do ónus da prova; (iii) considerar que a Recorrida sofreu um prejuízo em consequência da Infração; (iv) determinar o nível de prova exigido e ao avaliar se a Recorrida cumpriu o seu ónus da prova; (v) aplicar uma presunção judicial (sem sustento fáctico para o efeito) para colmatar a falta de prova da Recorrida; (vi) aplicar à Partes diferentes critérios (standards) de prova; (vii) socorrer-se de uma estimativa judicial arbitrária e ilegal para quantificar o dano alegado pela Recorrida, (viii) não o fazendo, contudo, para o cálculo da medida da repercussão, assim falhando ao não tratar a Recorrente e a Recorrida em condições de igualdade; (ix) ao remeter para sede de liquidação de sentença a prova quanto ao preço de aquisição de certos veículos; (x) calcular incorretamente o montante dos juros eventualmente devidos à Recorrida; (xi) desconsiderar princípios constitucionais fundamentais, incorrendo numa interpretação das normas em presença de forma contrária à CRP. 3) Os erros em que incorreu o Tribunal Recorrido impõem a revogação da Sentença Recorrida e a sua substituição por outra que absolva a Recorrente de todos os pedidos contra si formulados. Assim: B. QUESTÃO PRÉVIA: DA RETIFICAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA NA IDENTIFICAÇÃO DOS FACTOS EM SEDE DE MOTIVAÇÃO 4) O Tribunal Recorrido incorreu em lapso na identificação dos factos em sede de motivação, quanto ao prejuízo e ao nexo de causalidade. Assim, deverá proceder-se à respetiva retificação, devendo passar a constar apenas a remissão para os factos e) e f) dos factos não provados, nos termos do artigo 614.º, n.º 1 e 2 do CPC. 5) O Tribunal Recorrido incorreu ainda em manifesto lapso, no capítulo da “Quantificação dos danos, incluindo a repercussão e mitigação”, ao remeter para o facto f) dos factos dados como provados, afirmando não ter a Recorrida provado o dano. Requer-se a devida retificação, devendo remeter-se para a alínea f) dos factos dados como não provados, onde consta que a Recorrida não provou que tenha suportado um sobrecusto de 16,68% do preço bruto das viaturas, em resultado da Infração, nos termos do artigo 614.º, n.º 1 e 2 do CPC. C. CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS: 1. A SENTENÇA É NULA POR MANIFESTA CONTRADIÇÃO ENTRE O SEU SENTIDO DECISÓRIO E A RESPETIVA FUNDAMENTAÇÃO 6) Conforme melhor se demonstrará em secções subsequentes, a fundamentação apresentada pelo Tribunal Recorrido é manifestamente contraditória e incoerente com o sentido decisório da Sentença Recorrida. 7) Na fundamentação da decisão, o Tribunal Recorrido considera um conjunto de factos como verdadeiros em ordem a concluir pela existência de dano e nexo causal. 8) No entanto, ao considerar esses factos como verdadeiros, o Tribunal assume a existência de fatores que interrompem o nexo causal. Pelo que, a fundamentação não sustenta a decisão final. Antes, revela-se discordante. 9) Tal discordância, inquina toda a decisão, já que torna incompreensível o raciocínio do Tribunal Recorrido e bem assim a decisão final. 10) Termos em que se imporá concluir pela nulidade da Sentença Recorrida, por oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, devendo o Venerando Tribunal substituir o Tribunal a quo, nos termos dos artigos 617.º e 665.º do CPC, e proceder à modificação da Sentença Recorrida, retirando a conclusão lógica dos factos dados como verdadeiros pelo Tribunal Recorrido – a inexistência do dano e do nexo causal. 2. O TRIBUNAL INTERPRETOU ERRADAMENTE O ÂMBITO E O ALCANCE DO PRINCÍPIO DA EFETIVIDADE 11) Estando o princípio da efetividade relacionado com vários dos temas erradamente abordados na Sentença Recorrida, o enquadramento geral do mesmo que ora se faz valerá quando, infra, se abordarem essas matérias específicas. 12) Ao contrário daquilo que é ínsito à Sentença Recorrida, o princípio da efetividade não gera quaisquer presunções de danos sofridos pela Recorrida, de culpa e de nexo de causalidade entre a Infração e os danos que a Recorrida alega ter sofrido. E muito menos legitima o Tribunal a fazer tábua rasa de toda a prova produzida nos autos, bem como das normas legais aplicáveis, em favor da maior ou menor “probabilidade” de uma infração anticoncorrencial produzir danos. 13) O princípio da efetividade é um princípio geral de Direito da UE que tem como propósito assegurar que as regras de direito interno dos Estados-Membros não tornam praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício de direitos conferidos aos particulares pelo ordenamento jurídico da EU. 14) O TJUE desenvolveu, ao longo do tempo, um modelo de análise contextual que implica uma avaliação em concreto, pelos tribunais nacionais, das normas de direito interno, numa perspetiva sistemática, em função do caso específico e tendo em conta todas as suas circunstâncias, para avaliar se essas normas são suficientes para assegurar a efetivação do direito subjetivo da UE que se visa proteger.[1] 15) O controlo que cabe a este princípio é de índole negativa, o que significa que o princípio da efetividade só atuará nas situações em que não é possível ou é excessivamente difícil exercer os direitos conferidos pela legislação da EU, sendo que, mesmos nesses casos, a possível utilização do princípio da efetividade está limitada pela proibição de interpretações contra legem das regras nacionais. 16) O que Tribunal a quo pretendeu foi fazer uso do princípio da efetividade para incorretamente forçar soluções que têm pouco ou nenhum cabimento dentro das regras previstas no ordenamento jurídico português. 17) Na Sentença Recorrida não se identificam justificações ou fundamentos que sustentem as invocações ali feitas das potenciais violações do princípio da efetividade. 18) Por outro lado, o princípio da efetividade não pode ser invocado para ultrapassar falhas próprias do autor da pretensão, sejam de alegação, sejam de prova, que conduzam à improcedência dessa mesma pretensão (o caso da Recorrida nos presentes autos). 19) Foi, no entanto, precisamente isso que o Tribunal a quo fez quando recorreu ao princípio da efetividade, contra aquela que foi a prova produzida nos autos, dar por provado o dano para a Recorrida (assim aplicando uma presunção de dano) com o intuito de desonerar a Recorrida do ónus de prova que sobre ela impendia – o de provar que tinham sofrido um concreto dano causado por um facto ilícito praticado pela Recorrente. 20) Esta subversão do princípio da efetividade é ilegítima e não pode, por isso, proceder. D. DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO E DA NECESSIDADE DE REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADA 3. O TRIBUNAL APLICOU INCORRETAMENTE AS REGRAS SOBRE A DISTRIBUIÇÃO DO ÓNUS DA PROVA: COMPETIA À RECORRIDA DEMONSTRAR A EXISTÊNCIA DE UM DANO 21) No presente recurso ver-se-á que o Tribunal a quo fez tábua rasa das regras sobre distribuição do ónus da prova aplicáveis in casu, exigindo standards probatórios diferentes à Recorrida e à Recorrente para dar como provados ou não provados certos factos relevantes para a boa decisão da causa. 22) Ao fazê-lo, cai num erro de julgamento que não pode ser admitido, além de votar a Recorrente a um desfavorecimento processual e substantivo, em clara violação do princípio da igualdade de armas estatuído nos artigos 13.º e 20.º da CRP (cfr. secções D.1.b) e 6). 23) O Tribunal fez tábua rasa do direito aplicável, em particular do regime de distribuição do ónus da prova. 24) Ao caso dos autos aplicar-se-ão, tão só, as regras gerais do direito civil relativamente à responsabilidade pelo facto ilícito, aos meios de prova e à repartição do ónus da prova, como sejam as estabelecidas nos artigos 341.º a 396.º e 483.º a 498.º do CC e 5.º do CPC. 25) De acordo com as referidas normas, era à Recorrida que cabia alegar e provar os factos constitutivos do direito de que se arroga titular, ou seja, os factos demonstrativos do preenchimento de cada um dos pressupostos legais de que a lei faz depender a responsabilidade civil por facto ilícito: o facto ilícito, a culpa e o dano, bem como o nexo causal entre o facto e o dano. 26) No que concerne ao pressuposto legal do dano, a Recorrida estaria sempre onerada com a demonstração de que a Infração lhe causou um dano concreto e o respetivo quantum, pelo que não bastava declarar que os Veículos foram vendidos por um “preço superior ao que seria devido” em resultado da Infração, o que aliás não ocorreu. 27) Sucede que a Recorrida não apresentou meios de prova suficientemente robustos que possam ser considerados nestes autos e, por isso, não logrou confirmar a hipótese fática que advoga. É, aliás, o próprio Tribunal a quo que o admite ao referir que “o relatório Z... e o depoimento convergente de (…) não têm valia probatória suficientemente sólida e consistente para serem considerados”, sendo que reconheceu (e de forma absolutamente correta) que “o relatório AA/BB é mais sustentado e robusto do que o relatório Z...”. 28) A conclusão evidente seria a de que a Recorrida não logrou cumprir o ónus de prova que sobre ela impendia de provar parte dos pressupostos de que depende a procedência da sua pretensão (isto é, o dano e o nexo causal). 29) Assim, à luz do regime jurídico de distribuição do ónus da prova aplicável in casu, dúvidas não restam de que a única solução a dar nos presentes autos seria a de não procedência da ação, com a consequente absolvição da Recorrente dos pedidos contra esta deduzidos. No entanto, o Tribunal a quo bastou-se simplesmente (e erradamente) com a Decisão para formular uma mera convicção e, assim, considerar provado o dano e o nexo causal alegados pela Recorrida. 30) Da Sentença Recorrida resulta claro que o Tribunal a quo aplicou erradamente as regras do ónus da prova, tratando de forma diferente a Recorrente e a Recorrida, ao arrepio das regras probatórias materiais aplicáveis, fazendo tábua rasa do facto de a Recorrida cumprido o ónus de prova do dano que sobre ela recaía, em desconformidade com o disposto nos artigos 342.º e 483.º do CC. A aplicação de um duplo standard de prova pelo Tribunal é legalmente inadmissível por violação das regras de distribuição do ónus da prova e do princípio da igualdade de armas 31) O Tribunal a quo ignorou as mais básicas regras processuais de distribuição de ónus da prova, além de exigir standards probatórios diferentes à Recorrida e à Recorrente para dar como provados ou não provados certos factos significativos para a boa decisão da causa. 32) Com efeito, o Tribunal a quo decidiu inverter em absoluto o ónus da prova que recaía sobre a Recorrida ao admitir como mais bem fundamentada a prova económica da Recorrente do que a da Recorrida, mas, ainda assim, julgar procedente a pretensão indemnizatória desta, sem qualquer prova que a sustente. 33) Além disso, o Tribunal a quo aplica à Recorrente um grau de exigência probatória diferente do exigido da Recorrida, numa dualidade que não se compreende, nem se pode aceitar: em concreto, o Tribunal a quo entende que, por um lado, é desculpável a Recorrida não carrear aos autos documentos que comprovem os preços alegadamente pagos pela aquisição de diversos veículos e, nessa medida, decide oferecer-lhe uma segunda oportunidade, relegando para sede de liquidação de sentença a possibilidade de estar vir apresentar prova quanto a algo que deveria ser provado no decurso do presente processo, assim concluindo que a falta de dados não pode ser interpretada em detrimento da Recorrida; mas, por outro lado, já condena negativamente a Recorrente pelo facto de esta não dispor de dados anteriores a 2003 que pudessem ser usados na análise levada a cabo no seu Relatório VT. 34) É inegável o desfavorecimento processual e substantivo em que fica colocada a Recorrente, sujeita a presunções judiciais quanto ao dano e nexo de causalidade, sem que se vejam razões ponderosas, objetivas e razoáveis que o justifiquem - tal demonstra a desigualdade objetiva em que a Recorrente fica colocada, contra o princípio da igualdade de armas estatuído nos artigos 13.º e 20.º da CRP, porquanto, na prática, a Recorrente fica impossibilitada de afastar as referidas presunções. A formulação de uma presunção judicial de danos como violação das regras sobre a distribuição do ónus da prova 35) O Tribunal a quo lançou mão de uma presunção judicial de danos e de nexo de causalidade, cuja formulação se revela inadmissível in casu. 36) Com efeito, o juízo presuntivo vertido na Sentença Recorrida tem na sua base factos não provados, desde logo porque parte do pressuposto de que houve efeitos no mercado derivados da Infração, quando tal nunca foi demonstrado, não tendo a Comissão aferido da existência de tais efeitos (facto que é público), o que revela a absoluta desconformidade legal da presunção judicial vertida na Sentença Recorrida. 37) Dado que os efeitos anticoncorrenciais da Infração não ficaram provados na Decisão – e muito menos ficou provado que a Infração tenha causado um dano em particular à Recorrida – então o dano tinha de ser cabalmente provado no processo, nomeadamente em audiência de julgamento. 38) Mas não é só: como é sabido, o juiz não pode simplesmente elaborar uma presunção judicial para colmatar falhas de prova, algo que tem vindo a ser confirmado pela nossa jurisprudência e pelo TJUE. É que a prova da existência de dano não pode ser assumida com base numa presunção judicial. 39) Com efeito, uma presunção de danos não diminui o nível de prova exigido para demonstrar que um lesado sofreu danos em resultado de uma infração ou o quantum desses danos, os quais devem ser aferidos à luz das disposições do Código Civil, tal como acontece no âmbito de outras ações de indemnização civil. 40) Por tudo o exposto, fica assim visto que o Tribunal a quo aplicou incorretamente as regras sobre a distribuição do ónus da prova, pelo que vem a Recorrente apresentar recurso da Sentença Recorrida por também considerar que a mesma foi proferida em violação das regras de direito probatório material, pugnando para que esta seja revogada e substituída por outra que aplique o disposto nos artigos 341.º a 396.º e 483.º a 498.º do CC e, consequentemente, dê por não provada a existência de danos e do nexo de causalidade. 4. DOS FACTOS RELATIVOS AOS “PREJUÍZOS” E AO NEXO DE CAUSALIDADE (ERRADAMENTE) DADOS COMO PROVADOS 4.1 O recurso à presunção judicial para suprir a falta de prova do dano e do nexo de causalidade é juridicamente inadmissível 41) A presunção judicial de dano e nexo causal aplicada pelo Tribunal Recorrido é inadmissível e arbitrária, em violação do artigo 349.º do CC, considerando que: a. o juiz não pode simplesmente elaborar uma presunção judicial para colmatar as falhas de prova que incumbem ao lesado; b. nenhuma presunção judicial poderá reduzir a exigência probatória a cargo da Recorrida de provar a existência do nexo de causalidade, do dano e a sua quantificação. c. o Tribunal Recorrido assenta a presunção de danos e de nexo causal em factos não provados e em raciocínios evidentemente ilógicos. d. o Tribunal Recorrido converteu uma presunção – que, pela sua natureza (judicial) sempre seria ilidível – numa presunção inilidível, o que, não é legalmente admissível. 42) Assim, deve o Tribunal ad quem reverter a decisão de que ora se recorre, extraindo todas as consequências de uma correta aplicação das regras de repartição do ónus da prova aplicadas ao caso dos presentes autos. 4.2 A presunção judicial não pode ser formulada com o objetivo de suprir a falta de prova que incumbe ao onerado 43) O Tribunal Recorrido formulou uma presunção judicial que contraria toda a prova produzida pela Recorrente e a prova produzida pela Recorrida não foi apta a quantificar o dano. 44) Assim, pela presunção judicial o Tribunal Recorrido supre as falhas probatórias da Recorrida fazendo tábua rasa das regras de ónus de prova. 4.2.1. A presunção legal prevista no artigo 17.º, n.º 2, da Diretiva não é aplicável 45) O Tribunal Recorrido considera, e bem, que a presunção legal prevista tanto na Diretiva como no artigo 8.º, n.º 3 e artigo 9.º, n.º 1 da Lei n.º 23/2018 e não são aplicáveis, mas sim as regras gerais do direito civil nacional. Assim, será de aplicar o previsto nos artigos 341.º a 396.º e 483.º a 498.º do CC. 46) Aplicando o regime geral do CC, caberia à Autora o ónus de prova e esta não logrou a prova do dano de forma suficiente . 47) Mesmo reconhecendo a insuficiente alegação da Recorrida, o Tribunal Recorrido lançou mão de uma presunção de dano e do nexo causal, com base nas regras da experiência, que se revela inadmissível. 4.2.2. A presunção judicial ultrapassa em moldes arbitrários as regras sobre a distribuição do ónus da prova 48) No presente caso, tendo a Recorrida deduzido um pedido de indemnização por uma infração ao direito da concorrência, e por isso no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, cabe à Recorrida a prova dos factos constitutivos do seu direito indemnizatório (artigo 483.º do CC): o facto ilícito, a culpa e o dano, bem como o nexo causal entre o facto e o dano. 49) Ou seja, a Recorrida é que devia ter demonstrado que a Infração tinha resultado em danos ou sequer efeitos anticoncorrenciais. Além disso, a Recorrente demonstrou a inexistência de um sobrecusto (dano). 50) Ora, cabendo o ónus à Recorrida, esta não logrou a prova do dano de forma suficiente, incumprindo o ónus. O que deveria sem mais conduzir á improcedência da presente ação. 51) No entanto, face ao insucesso da Recorrida em provar a existência do nexo de causalidade e do dano, pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, em ordem a que a causa procedesse, o Tribunal Recorrido deu uso a uma presunção judicial, cuja formulação se revela evidentemente inadmissível in casu e fá-lo em concreta violação das regras sobre a distribuição do ónus da prova que imporiam no presente caso a improcedência da ação. 52) Mais, o Tribunal Recorrido fundamenta o seu raciocínio presuntivo num juízo comparativo de “elevada probabilidade”, em regras de lógica e em regras da experiência, segundo o qual: é mais provável a hipótese dada como provada pelo Tribunal do que a hipótese contrária. É mais provável que tenha existido um dano do que a hipótese de que não tenha ocorrido um dano. 53) Mesmo que se admitisse a logicidade do raciocínio presuntivo, o que não se concede, a verdade é que o mesmo não pode proceder, já que (i) a presunção não é o meio de suprir as insuficiências probatórias, nomeadamente da prova apresentada e produzida pela Recorrida e (ii) a presunção não pode ser um meio de suprir as incertezas em que o julgador ficou, depois de produzida a prova. Esta posição é sustentada de forma unânime entre a nossa doutrina, jurisprudência nacional e europeia. 54) Se não resultou provado o nexo de causalidade e o dano, então o ónus não deve ser afastado e utilizada uma presunção judicial. 4.3 A presunção judicial também não pode ser formulada com base em danos abstratos: da necessidade de demonstração e de quantificação dos danos 55) Sendo o dano elemento constitutivo da pretensão da Recorrida, se não resultou provado, deve a ação ser julgada improcedente, segundo o princípio actore non probante réus absolvitur. 56) Quanto à quantificação do dano, recai sobre a Recorrida o correspondente ónus da prova e precisam de trazer ao tribunal elementos de prova que permitam tal quantificação. O dano a provar deverá ser certo, específico e determinável. 57) Ainda que se admitisse a aplicação de uma presunção de danos, o que não se concede, uma presunção de danos não se refere (nem pode referir) a um dano concreto causado por um cartel e também não deve servir para diminuir a exigência probatória quanto à sua quantificação. 58) Enquanto uma presunção de danos poderia referir-se à existência de um dano em abstrato, caberá sempre a quem o alega demonstrar que sofreu o específico e concreto dano. Assim, sempre seria necessário que estivessem identificados os danos concretos pelo lesado. 4.4 O nexo de causalidade não pode ser presumido: a Recorrida tinha o ónus de provar e, em qualquer caso, a Recorrente demonstrou a inexistência de nexo causal 4.4.1 A presunção judicial ultrapassa em moldes arbitrários a falta de prova sobre o nexo causal 59) Sendo a presente ação de responsabilidade civil extracontratual, rege-se pelo artigo 483.º do CC, sendo aplicáveis as regras de ónus de prova que impõe à Recorrida a prova do nexo de causalidade. Não tendo a Recorrida logrado a prova do nexo causal, não cabia ao Tribunal Recorrido o uso de uma presunção para fazer face ao incumprimento do ónus por parte da Recorrida. 60) Ainda que se admitisse a presunção judicial, o que não se concede, mas por mera cautela de patrocínio se equaciona, a própria factualidade dada como provada pelo Tribunal Recorrido não permite concluir pela existência de um nexo causal, mas imporia a conclusão contrária. DT diria eu 61) Mais ainda, é evidente a fragilidade da identificação de um processo causal por parte do Tribunal Recorrido relativamente ao alegado sobrecusto, já que não existe sequer a identificação do dano concreto, da lesão sofrida na esfera jurídica do lesado. Nem a Recorrida provou a existência do dano, nem a Comissão estabeleceu a existência de efeitos anticoncorrenciais decorrentes da conduta identificada. Não estando provado o requisito do dano, não podia o Tribunal Recorrido socorrer-se de uma presunção judicial para concluir pela existência de um nexo causal. 4.4.2 O juízo de probabilidade aplicado pelo Tribunal Recorrido é manifestamente desadequado 62) De igual modo, o juízo probabilístico aplicado pelo Tribunal Recorrido é manifestamente desadequado. De acordo com a Teoria da Causalidade Adequada, e no entendimento da nossa doutrina, o facto causa do dano tem de constituir em concreto uma condição necessária do dano e suscetível de produzir aquele resultado, segundo um juízo de probabilidade. 63) Contudo, o juízo de probabilidade do Tribunal Recorrido assenta numa presunção judicial legalmente inadmissível que parte de factos não provados e raciocínios ilógicos (cfr. secção 4.5.) 64) Não podendo proceder a presunção judicial de danos e de nexo causal tal como formulada pelo Tribunal Recorrido, mostra-se inquinado o juízo probabilístico levado a cabo pelo Tribunal Recorrido, por arbitrário e legalmente desconforme. 4.4.3 O Relatório Z... demonstra que a Recorrida não cumpriu esse ónus 65) O Tribunal Recorrido dedica uma parte considerável da Sentença Recorrida a sublinhar as fragilidades de que padece o Relatório Z..., críticas com as quais a Recorrente concorda plenamente. 66) O que leva à óbvia conclusão de que a Autora não cumpriu o ónus de alegação e demonstração que sobre si impendia – tanto quanto à existência e quantum dos danos que afirma ter sofrido como, consequentemente, ao nexo causal entre a Infração e esses mesmos (inexistentes) danos. 67) Por outro lado, a verificação destes requisitos não se pode presumir, ao contrário daquele que foi, posteriormente, o raciocínio do Tribunal Recorrido, sendo, assim, de rejeitar qualquer pretensão indemnizatória a favor da Recorrida. 4.5 A presunção judicial de danos em resultado da Infração aplicada pelo Tribunal Recorrido parte de factos não provados e de raciocínios ilógicos 68) Erradamente, o Tribunal Recorrido afirma que “resta a decisão da Comissão” para se dar como provados os efeitos da Infração “devido às características da conduta imputada”, assim recorrendo a uma ilegítima, ilegal e inadmissível presunção judicial de dano e de nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano alegadamente sofrido pela Recorrida. 69) Esta presunção parte de factos não provados e é ilógica, contrariando toda a prova produzida nos autos e a mais fundamental teoria económica. 4.5.1 O Tribunal Recorrido assenta a presunção de danos em resultado da Infração num facto base – que não existe – de que a Infração em causa correspondia predominantemente a um acordo estável e permanente de preços entre as visadas da Decisão da Comissão 70) Para chegar ao juízo presuntivo da existência de danos em resultado da Infração, a Sentença Recorrida teve de estabelecer um facto – que não existe – de que a Infração em causa correspondia predominantemente a um acordo estável e permanente de preços entre as visadas da Decisão da Comissão. 71) No entanto, e na verdade, a Infração respeita predominantemente a trocas de informações sobre preços brutos de tabela – que, como ficou demonstrado nos presentes autos, não eram pagos por qualquer entidade em Portugal (incluindo a Recorrida) –, sendo que a Decisão não determina, de modo algum, que tenha havido uma fixação generalizada dos preços de venda a final dos camiões em geral. 72) Assim, a Sentença Recorrida viola o direito probatório material, concretamente o artigo 349.º CC, pois que a presunção aplicada partiu de factos não provados, o que impõe que a Sentença Recorrida seja revogada nessa parte. 73) Pelo que se impugna a Sentença Recorrida quanto à factualidade, devendo ser incluído no elenco dos factos dados como provados que a Infração consistiu predominantemente numa troca de informações, não podendo, daí, ser retirada qualquer conclusão quanto a danos provocados à Recorrida. 4.5.2 Não resulta da Decisão que a Infração tenha resultado em danos ou sequer em efeitos anticoncorrenciais 74) Nada na Decisão poderia levar o Tribunal Recorrido a afirmar que da concreta conduta imputada à Recorrente se poderiam presumir efeitos anticoncorrenciais e, em específico, danos para a Recorrida, que é – não esqueçamos – o que aqui está em causa. O conceito de infração única e continuada não é transponível para uma ação de indemnização 75) O conceito de infração única e continuada visa abarcar uma série de comportamentos naturalisticamente autónomos entre si, que poderiam corresponder a infrações autónomas, tratando-se de uma construção jurídica destinada a sancionar uma série de condutas autónomas, aliviando as exigências probatórias relativas à identificação de cada conduta específica que seriam, por regra, exigidas a entidades públicas responsáveis pela aplicação das regras da concorrência. 76) No âmbito da aplicação privada das regras de concorrência, uma remissão para uma Decisão reveste-se de pouca (leia-se “nenhuma”) utilidade na presente ação, na medida em que não permite identificar a concreta conduta que terá dado início ao nexo de causalidade adequado à verificação do pretenso dano causado à Recorrida, como era exigido à Recorrida e, em sede de sentença, ao Tribunal Recorrido. A Decisão não conheceu da existência de efeitos ou de danos decorrentes da Infração 77) É o Tribunal a quo que reconhece – e bem – que a “Decisão não dá como provados os efeitos” anticoncorrenciais. 78) É que a Comissão não estudou nem apurou quaisquer efeitos anticoncorrenciais decorrentes da Infração imputada à Recorrente, não identificou efeitos nos mercados a jusante (de distribuição retalhista de camiões médios e pesados) em Portugal ou em qualquer outro país, e muito menos concluiu pela verificação de danos causados à Recorrida. 79) Assim, da conduta atribuída à Recorrente não se permite qualquer demonstração (ou presunção) da causalidade entre o facto ilícito e o dano alegadamente sofrido pela Recorrida. 80) Se a Decisão não dá como provados efeitos e a prova produzida pela Recorrida não conseguiu demonstrar que esta tinha, com a Infração, sofrido danos, então o Tribunal Recorrido não poderia presumir que esses danos se produziram efetivamente na esfera jurídica da Recorrida. 81) Pelo que a Sentença Recorrida viola o direito probatório material, concretamente o artigo 349.º CC, pois que a presunção extraída padece de eventual ilogicidade, o que impõe que seja revogada nessa parte. 82) Por conseguinte, impugna-se a Sentença Recorrida quanto à factualidade, devendo ser incluído no elenco dos factos dados como provados que a Infração não gerou quaisquer efeitos restritivos da concorrência, e muito menos, em concreto, quaisquer danos para a Recorrida sob a forma de um sobrecusto na aquisição dos camiões. 4.5.3 Há um conjunto de características que fazem com que esta presunção não faça sentido 83) Há um conjunto de factos, referentes i) às características do mercado dos camiões e à efetiva concorrência entre fabricantes durante o período da Infração; (ii) à cadeia de comercialização dos camiões em Portugal durante o período da Infração; (iii) às características técnicas dos camiões (iv) ao processo de negociação e fixação dos preços dos camiões; e (v) à diferença entre preços brutos de tabela e preços de venda, considerados como verdadeiros pelo Tribunal Recorrido e que imporiam a conclusão de que não existe qualquer relação linear entre preços brutos e preços líquidos e assim não é possível dar como provado a existência de um dano e de igual modo do nexo causal. 84) Ainda que considerados como verdadeiros, estes factos não foram valorados corretamente. Se o Tribunal Recorrido tivesse considerado devidamente estes factos, implicaria a sua inclusão no elenco dos factos dados como provados e a desconsideração dos factos rrrrr) e sssss), que constituem conclusão ilógica face a esta factualidade dada como verdadeira. 85) Assim, impugna-se a Sentença Recorrida quanto à matéria de facto, pugnando que os factos rrrrr) e sssss) sejam retirados dos factos dados como provados, passando a integrar a matéria de facto não provada. 86) Impugna-se ainda a lista de factos provados da Sentença Recorrida, pugnando pelo aditamento no elenco dos factos provados dos factos essenciais alegados e provados pela Recorrente que se apresentará. O mercado dos camiões pesados é caracterizado por uma concorrência intensa entre fabricantes, mesmo durante o período da Infração 87) O Tribunal Recorrido não considerou devidamente que as características do mercado em questão são muito pouco propícias à existência de efeitos anticoncorrenciais decorrentes da Infração – foi essa a conclusão da Comissão nas suas decisões relativas à concentração MAN / Scania e à concentração Volkswagen / MAN, sendo esta última posterior à Comissão ter iniciado a investigação que culminou na imputação da Infração à Recorrente. 88) É sabido que, na visão da teoria económica, para que as empresas coordenem e efetivamente estabeleçam níveis de preço supracompetitivos, torna-se necessária a adoção de estratégias que eliminem o incentivo à concorrência com base no preço, bem como de mecanismos de controlo do acordo colusivo. A Comissão não chegou a qualquer conclusão quanto à existência de tais estratégias. 89) A prova testemunhal dos autos também evidencia que esta feroz concorrência pelo preço se verificava igualmente ao nível do retalho, traduzindo-se, mais das vezes, nos descontos adicionais discricionários concedidos em função das circunstâncias concretas das transações. 90) Mais: no momento da decisão de comprar um ou mais camiões, estes compradores pediam propostas a diversos fabricantes presentes no mercado português, quer diretamente, quer aos seus importadores e/ou concessionários, e procuravam junto destes negociar o melhor preço disponível. 91) Tendo em conta essa intensa concorrência entre os fabricantes dos camiões, que o Tribunal Recorrido não considerou devidamente, é muitíssimo inverosímil que a Infração tenha tido quaisquer repercussões nos preços a jusante ao nível do retalho, e muito menos que tenha causado danos à Recorrida. 92) Estas decisões da Comissão, bem como estes factos, foram desconsiderados pelo Tribunal Recorrido sem qualquer justificação válida para tal. 93) Porque assim é, as decisões em matéria de controlo de concentrações que agora se descreveram têm de ser consideradas pelo Tribunal ad quem para, mais uma vez, se concluir que a Infração não gerou quaisquer danos à Recorrida. 94) Quanto ao exposto, impugna-se a Sentença Recorrida quanto à factualidade, devendo ser incluído no elenco dos factos dados como provados que o mercado dos camiões pesados é caracterizado por uma concorrência intensa entre fabricantes, mesmo durante o período da Infração; A própria cadeia de distribuição e comercialização dos camiões Volvo, durante o período da Infração, corrobora que a Infração não era apta a produzir, de forma automática, os danos alegadamente sofridos pela Recorrida em resultado da Infração. 95) Da prova testemunhal produzida e da prova apresentada, resultou evidente que a comercialização de camiões Volvo em Portugal não foi efetuada, em nenhum momento, por qualquer empresa do Grupo Volvo, mas sim pelo importador independente, a Auto-Sueco. 96) Resultou claro do depoimento das testemunhas da Recorrente, (…) e (…), que a Volvo negociava as condições de venda dos seus camiões à Auto-Sueco para que esta os comercializasse com autonomia no mercado português, estabelecendo os preços e condições comerciais. Assim, os preços dos camiões nos diferentes níveis da cadeia de comercialização em Portugal eram fixados de forma independente. 97) Como decorreu igualmente da prova testemunhal produzida, a Recorrente não tinha envolvimento na comercialização de camiões em Portugal, não contactando com os clientes finais nas negociações. 98) A intervenção da Recorrente limitava-se à venda de camiões à Auto-Sueco e à autorização da Auto-Sueco para concessão esporádica de descontos adicionais, tendo em vista a viabilização de uma determinada venda. 99) Assim, ao contrário do decidido pelo Tribunal Recorrido, os preços líquidos dos camiões foram determinados pelas condições locais da procura e concorrência, bem como pelas características do cliente e dos camiões adquiridos. 100) Do exposto, decorre que não existe uma ligação automática e linear entre os preços brutos de tabela, objeto da Infração, e os preços líquidos pagos pelos clientes finais da Recorrente. 101) Por conseguinte, considerando toda a prova testemunhal, pericial e documental produzida nos autos, impõe-se, ao invés do decidido pelo Tribunal a quo, dar por provados (i) que a Auto-Sueco, enquanto importadora e comercializadora, e ainda outros concessionários independentes, procediam à comercialização de camiões Volvo em Portugal, de forma exclusiva, com autonomia e independência, definindo a sua própria política comercial, descontos e preços para cada transação e (ii) Os preços que os clientes pagavam pelos camiões eram negociados com a Auto-Sueco ou com os concessionários, sendo as negociações de camiões necessariamente individualizadas pela complexidade dos produtos e pelo cliente e dependentes das condições do mercado local. Os camiões são produtos complexos e altamente heterogéneos com características técnicas específicas. 102) O que antecede fica ainda corroborado pela complexidade e heterogeneidade dos camiões, que são customizados e adaptados tecnicamente às necessidades de cada cliente e de cada atividade, como decorreu dos depoimentos das testemunhas (…), (…) e (…). 103) Existem centenas, se não milhares, de combinações possíveis num camião, as quais dependem das necessidades específicas de cada cliente e do uso pretendido para o camião, pelo que o preço numa determinada transação irá variar de acordo com as necessidades e solicitações do cliente. 104) O Tribunal Recorrido considerou como verdadeiro a heterogeneidade e complexidade dos camiões, reconhecendo a natureza e especificidades deste produto. No entanto, não o inclui no elenco dos factos provados e não o valorou devidamente. 105) Note-se ainda que sempre seria de considerar não só os extras como as superestruturas, mas também os contratos de assistência, no caso celebrados em relação a 30 veículos. 106) A multiplicidade de combinações torna cada transação única pelos veículos em si e pelo preço, não sendo possível determinar uma relação linear entre os preços brutos e líquidos, já que este é influenciado por diversos fatores. 107) Por conseguinte, impõe-se concluir como provado que (i) os camiões são produtos complexos e altamente heterogéneos com características técnicas específicas e cada cliente fazia a sua escolha entre centenas de diferentes modelos de camiões e de diferentes opções para cada modelo, resultando em diferentes especificações (e descontos) para cada cliente e (ii) Os níveis de descontos aplicados ao longo da cadeia de distribuição tinham uma grande amplitude e variavam de transação em transação, em função das características e especificidades de cada camião e transação. Os níveis de descontos aplicados ao longo da cadeia de distribuição variavam entre si e a Auto-Sueco detinha um grau de discricionariedade na definição deste desconto em cada transação 108) O Tribunal Recorrido reconheceu como verdadeiro, e bem, a existência de diferentes descontos níveis de desconto ao longo da cadeia de comercialização. 109) De tal modo, que o Tribunal Recorrido afirma que nem a Auto-Sueco, nem os clientes finais, alguma vez pagaram preços brutos de tabela. Mais, afirma que durante, em específico durante o período da infração, os preços pagos pelos clientes finais não eram preços brutos. 110) Em concreto, em decorrência da prova produzida, o Tribunal Recorrido reconheceu a existência de três níveis de descontos: (i) um desconto padrão (para todas as transações e dependente do modelo e opções), (ii) descontos adicionais (concedido em função de certos camiões, especificações e transações) e (iii) descontos ad hoc (a pedido da Auto-Sueco, para viabilizar certo negócio). 111) Mais, a Auto-Sueco, na relação com os clientes finais atuava com autonomia e independência, definindo os preços e condições comerciais. Assim, a Recorrente não tinha nem visibilidade sobre as transações realizadas, nem visibilidade nas transações realizadas, não contactando com os clientes finais. 112) Estes descontos eram significativos, estando na ordem dos 50%, como resulta dos depoimentos das testemunhas (…) e (…). De igual modo, segundo o Relatório VT e como afirmado pelo Professor (…) no seu depoimento, a diferença entre preços brutos e preços líquidos foi em média 42% por transação, divergindo entre os 32% e os 50%. 113) Evidencia-se não só a sua dimensão, mas também a variabilidade dos descontos, implicando a conclusão de que não existia uma relação estável entre preços brutos e preços líquidos. 114) Ora, a falta de relação linear entre preços brutos e líquidos impõe a conclusão da interrupção do nexo causal. O Tribunal Recorrido considerou como verdadeiros estes factos, mas não retirou deles a devida consequência. 115) Impunha-se dar como provado que (i) os níveis de descontos de descontos ao longo da cadeia de comercialização tinham grande amplitude e variavam de transação para transação, (ii) nem a Auto-Sueco, nem os clientes finais pagaram preços brutos de tabela e (iii) não existia nenhuma relação automática, linear, sistemática ou proporcional entre os preços brutos de tabela e os preços líquidos pagos pelos clientes finais. A natureza e função dos preços brutos de tabela faz com que não haja qualquer ligação automática, necessária, linear ou proporcional entre os preços brutos e os preços líquidos, e, por conseguinte, reforça a conclusão de que não existiu qualquer sobrecusto para a Recorrida 116) Ficou devidamente provado nos autos que nenhum cliente final, incluindo a Recorrida, pagou preços brutos de tabela, e que não existia e não existe uma relação automática, linear ou sistemática entre os preços brutos de tabela e os preços pagos por esses clientes finais. 117) Pelo que, ainda que tivesse havido uma fixação ou um aumento colusivo dos preços brutos de tabela – o que se rejeita –, isso não significaria que as empresas como a Recorrida tivessem sofrido um dano na aquisição dos camiões. 118) A função dos preços brutos de tabela era criar uma estrutura lógica de preços para as centenas de opções de configuração de camiões disponíveis e para assegurar uma diferenciação coerente de preços entre os produtos oferecidos, nomeadamente pela Volvo Trucks. 119) Em particular, ficou amplamente demonstrado – conforme reconhece o Tribunal a quo (cfr. para. 186 da Sentença Recorrida) – que as listas de preços brutos permitiam criar uma hierarquia de valores entre uma infinidade de extras e modelos de veículos de maior e menor valor – o que assume especial importância para produtos heterogéneos e altamente diferenciados como os camiões, dada a ampla gama de modelos, opções e acessórios disponíveis. 120) Desde janeiro de 2002, os preços brutos da Volvo Trucks eram pan-europeus e fixados centralmente ao nível da sede, na Suécia. A partir daí, os preços eram definidos e adaptados a nível local e a cada mercado para os quais os camiões se destinavam. 121) Os preços brutos foram assim definidos por referência a fatores comerciais comuns e legítimos, como sejam o valor dos extras relevantes para o cliente, os custos de produção desses extras e a sua posição na hierarquia dos extras (por exemplo, motores com maior potência terão preços brutos mais altos), custos de produção, entre outros fatores de mercado. 122) Pelo que os preços brutos eram meramente indicativos para a determinação do preço final – conforme reconhecido pelo Tribunal a quo (cfr. para. 186 da Sentença Recorrida). 123) Portanto, os preços concretamente pagos pela Auto-Sueco (importador e distribuidor independente) não eram preços brutos de tabela. 124) Todos estes factos são tidos pelo Tribunal a quo como sendo verdadeiros. 125) Espantosamente, no entanto, o Tribunal a quo faz depois tábua rasa de todos estes factos – que reconhece terem sido dados como provados – para concluir que existe uma relação necessária entre os preços brutos e os preços efetivamente pagos por entidades como a Recorrida. 126) Tentando, para justificar o desvio da conclusão que era imposta pela lógica neste caso, socorrer-se de jurisprudência comunitária que não é nem pode ser transponível para os autos. 127) Note-se, no entanto, que, nos casos referidos, não estava em causa a cadeia de distribuição de camiões Volvo em Portugal, pelo que não podia, novamente, o Tribunal Recorrido socorrer-se de casos que, nada tendo a ver com a causa dos autos, contrariam toda a prova aqui produzida. 128) Improcede igualmente o argumento do Tribunal a quo de que a sua conclusão (de que os preços brutos de tabela têm uma relação necessária e automática com os preços pagos pelos utilizadores dos camiões) é confirmada pelo Relatório Z.... 129) O Relatório Z... não revelou ter qualquer préstimo à pretensão da Recorrida, e foi o próprio Tribunal Recorrido que teceu duras e pormenorizadas críticas a cada um dos pontos desse relatório económico (cfr. paras. 81 a 112 da Sentença Recorrida), pelo que não se lhe pode ser atribuído qualquer crédito sobretudo quanto a matéria que os respetivos autores desconhecem completamente (neste caso, sobre o processo de formação dos preços líquidos dos camiões Volvo). 130) Como se deixou cabalmente provado nos autos, não existia nenhuma relação automática, linear, sistemática ou proporcional entre os preços brutos de tabela e os preços líquidos pagos pelos clientes finais: os preços pagos pelos clientes finais eram determinados em cada caso no âmbito de cada transação específica. 131) Essa relação fica imediatamente e inelutavelmente prejudicada por inúmeros fatores próprios da cadeia de distribuição dos camiões Volvo em Portugal. 132) O que significa que a existência de estabilidade na relação entre preços brutos e preços líquidos está longe de estar demonstrada ou mesmo verificada; e, com relevância central para o que aqui nos ocupa, dado o raciocínio errado do Tribunal Recorrido, não pode ser presumida, considerando-se a prova produzida nos autos pela aqui Recorrente, que infirmam de forma inelutável qualquer presunção nesse sentido. 133) Por uma razão muito simples: porque o preço final dos camiões resulta do encontro da oferta e da procura. 134) Ou seja: o comprador de camiões está disposto a pagar um determinado preço pelos veículos, e não vai pagar mais que isso, estando as empresas comercializadoras de camiões obrigadas a seguir esse preço se efetivamente quiserem fechar um negócio. 135) A Auto-Sueco tinha total independência na definição e execução da política comercial de venda de camiões Volvo no mercado português, quer na relação com concessionários independentes, quer na relação com clientes finais. 136) Podendo essas entidades independentes sacrificar parte da sua margem ou pedir a empresas do grupo da Recorrente descontos adicionais, para poderem fechar negócio. 137) E aí falece o argumento do Tribunal Recorrido de que os descontos tinham de ter sido concedidos na exata medida e por causa do aumento dos preços brutos. 138) O Tribunal a quo limita-se a afirmar que “qualquer alteração neste preço decorrente de modificações nos preços brutos de lista que serviram como ponto de partida refletiu-se também, com elevadíssima probabilidade, nos preços líquidos de venda ao cliente final por parte da Auto-Sueco”. 139) Mas não é necessário recorrer a quaisquer juízos de probabilidade neste caso. 140) Resultou da prova testemunhal produzida nos autos que os preços pagos pelos camiões Volvo nos diferentes níveis da cadeia de distribuição em Portugal eram fixados de forma independente pelas diferentes entidades envolvidas nesse processo, em função das suas próprias margens comerciais e financeiras, e sem qualquer relação necessária ou automática com os preços de tabela brutos. 141) A frequência e a magnitude dos descontos sobre os preços brutos de tabela, mas mais importante ainda o facto de serem frequentemente específicos de e a cada transação, interrompem de forma inelutável a ligação entre preços brutos e líquidos. 142) Por conseguinte, considerando toda a prova testemunhal e documental produzida nos autos e a que acima se fez referência, impõe-se concluir pela interrupção do nexo de causalidade entre a Infração e o alegado dano, e que o Tribunal a quo deveria ter dado por provado que a Volvo tinha lista de preços brutos de tabela, cuja principal função era criar uma distinção lógica entre uma infinidade de extras e modelos de camiões de maior e menor valor. 4.5.4 O Guia Prático da Comissão e os resultados do Relatório Oxera de 2009 não permitem a criação de uma presunção de danos 143) O Tribunal Recorrido assenta o seu juízo presuntivo em documentos – Guia Prático e Relatório Oxera de 2009 – fazendo, no entanto, uma leitura míope e enviesada dos mesmos. 144) Isto porque, mesmo que os documentos mencionem que é mais provável que possa existir danos de uma prática de cartel, são também os mesmos documentos que recusam a utilização destes dados probabilísticos aí presentes da forma como foram pelo Tribunal Recorrido. 145) O próprio Relatório Oxera de 2009 sublinha a necessidade de conduzir uma análise casuística para demonstrar a existência de um sobrecusto. Com efeito, pode ler-se no Relatório Oxera que “há uma proporção pequena, mas significativa de cartéis em que não há sobrecusto” e que “seria necessário explorar caso a caso se um determinado cartel pertence a esta categoria”. 146) Por outro lado, o Guia Prático afirma claramente que as estatísticas sobre cartéis anteriores (que se limitaram a uma seleção de cartéis graves, cada um com diferentes características) podem ser tendenciosas e não podem ser utilizadas para demonstrar o dano resultante de uma infração específica. 147) Sendo, ao invés, evidente que é necessária uma análise econométrica específica, conduzida com referência aos factos do caso em questão, para determinar se houve sobrecusto no caso sub judice e, em caso afirmativo, qual foi o valor desse sobrecusto. 148) O que aconteceu, neste caso, através da prova produzida pela Recorrente, mas que o Tribunal Recorrido decidiu ignorar. 149) Assim sendo, a Sentença Recorrida viola o direito probatório material, concretamente o artigo 349.º CC, pois que a presunção extraída padece de evidente ilogicidade, o que impõe que a Sentença Recorrida seja também revogada nessa parte, com todas as legais consequências. 4.5.5 A prova económica da Recorrente contraria a tese da existência de danos em resultado da Infração 150) A Recorrente não se limitou a negar a possibilidade de existência de dano em resultado da Infração, tendo produzido o Relatório VT preparado pelos Professores AA e BB, onde se concluiu, de uma forma fundamentada e credível, pela inexistência de um sobrecusto. 151) A Sentença Recorrida aponta três fragilidades ao Relatório VT da Recorrente, que se passarão a enunciar e a refutar: a. a utilização do SCOM como variável explicativa dos preços tendo em conta que os dados que permitem a sua utilização foram fornecidos pela Volvo; b. a utilização da MCAE como outra variável explicativa dos preços, que foi escolhida tendo em conta os dados da própria Recorrente e após “extensas conversas” com esta; e, por fim, c. o facto de o relatório não ter considerado dados relativos a todo o período da Infração. Dos custos como fatores relevantes na definição do preço – SCOM 152) A crítica tecida pela Sentença Recorrida quanto ao facto de os dados que conformam a variável SCOM serem dados disponibilizados pela Volvo não faz qualquer sentido. 153) A Volvo é precisamente a entidade que está em melhor posição para obter os dados necessários à conformação de uma variável (neste caso, a SCOM) que é, por definição, composta por dados internos da empresa. 154) Ao adotar uma decisão como a do caso Tráficos Manuel Ferrer, fica claro que o TJUE entende que, havendo uma assimetria informativa, uma forma de a colmatar é através da utilização de dados em posse do infrator. 155) Se o TJUE considera que esta é uma forma legítima, eficaz e capaz de reduzir a assimetria informativa, é porque nada de intrinsecamente errado pode ser imputado a dados internos de empresas demandadas, como os dados aqui em questão, independentemente do que se destinem a demonstrar e ao contrário do afirmado pelo Tribunal Recorrido. Das características dos camiões como fatores relevantes na definição do preço – MCAE 156) A segunda crítica ao Relatório VT diz respeito ao facto de o mesmo “se ter concentrado apenas em quatro características principais” (quando os camiões têm tantas especificações e componentes que podem ser combinados de forma diferente) em resultado de “extensas conversas com a Volvo”. 157) Tal como se referiu anteriormente a propósito do SCOM, é da maior importância e relevância ter presente o entendimento seguido pela Jurisprudência europeia, nomeadamente, no caso Tráficos Manuel Ferrer. 158) Independentemente da parte que os usa e do que se destinam a demonstrar, o simples facto de os dados que permitiram ao Professor (…) chegar à conclusão de que estas são as principais características a ter em conta terem sido facultados pela Volvo ou partido de “longas conversas” com esta não deve – e não pode – suscitar dúvidas ao Tribunal Recorrido quanto à sua adequação, suscetibilidade de utilização e conclusões deles derivadas, na medida em que tal consubstanciaria um pré-juízo do Tribunal Recorrido inaceitável e que ultrapassa o princípio da livre apreciação da prova. 159) Pelo que, mais uma vez, a Sentença Recorrida deve ser, neste ponto, rejeitada. Quanto ao período temporal coberto pelo Relatório VT 160) Ao contrário do que afirma Sentença Recorrida, e como confirma o Guia Prático da Comissão, o facto de o Relatório VT não cobrir todo o período da Infração está longe de ser um problema ou uma lacuna que lhe tire o seu préstimo. 161) Como explicou no seu depoimento, o Professor (…) escolheu não utilizar os danos relativos ao período 1997-2002 em posse da Volvo pelo facto de os mesmos não serem suficientemente completos e comparáveis com os dados relativos ao período posterior (2002-2011), o que demonstra bem a seriedade com que o Professor encarou o exercício que levou a cabo. 162) Assim, e apesar de não ser possível retirar uma conclusão empírica quanto à inexistência de um sobrecusto no período de 1997 a 2002, o Professor (…) foi claro e liminar quando afirmou que não faz qualquer sentido esperar a existência de um sobrecusto num período anterior (e mais precoce) da Infração perante uma demonstração de ausência de sobrecusto num período mais avançado da Infração, i.e., quanto a mesma já decorria há algum tempo. 163) Relembre-se, neste ponto, que a descrição da Infração pela Comissão não leva a crer que os efeitos da mesma (a existirem, o que se contesta veementemente) seriam diferentes ao longo da duração da mesma. 164) Tendo-se produzido prova no sentido da inexistência de sobrecusto para um segmento temporal tão significativo da Infração e não havendo elementos que sugiram uma diferença nos efeitos da Infração para um período inicial da mesma, é, em termos económicos, razoável e lógico inferir que a conclusão (de que não houve qualquer sobrecusto) se possa também aplicar ao período para o qual não existem dados suficientemente fidedignos e comparáveis. 165) O que significa que esta crítica da Sentença Recorrida ao Relatório VT não tem sustento e não pode proceder. 4.6 O Tribunal Recorrido converteu uma presunção judicial ilidível numa presunção inilidível 166) O Tribunal a quo converteu uma presunção – que, pela sua natureza (judicial), sempre seria ilidível – numa presunção inilidível, o que, como se sabe, não é legalmente admissível. 167) Desconsiderando em parte a prova apresentada pela Recorrente e suprindo inadmissivelmente o incumprimento do ónus de prova que recaía sobre a Recorrida através da presunção de um dano e nexo causal, o Tribunal Recorrido viola os direitos processuais da Recorrente e ofende evidentemente o seu direito de defesa, abrindo portas a que – sendo este o critério – todas as ações de responsabilidade civil estejam destinadas ao sucesso. 4.7 Consequências da formulação legalmente inadmissível de presunção judicial de dano e de nexo de causalidade 168) O Tribunal a quo formulou presunções judiciais de forma inadmissível, tendo aplicado incorretamente as regras sobre a distribuição do ónus da prova, pois que erradamente aliviou a Recorrida do ónus que sobre ela impendia de demonstrar que a Infração lhe causou danos e qual extensão de tais danos. 169) Uma vez que tal ónus não foi cumprido, não restava outra alternativa que não fosse julgar improcedente a presente ação, por não demonstração dos pressupostos legais de que a lei faz depender a atribuição de uma indemnização por responsabilidade civil por facto ilícito. 4.8 Conclusão: o dano não ficou provado 170) Face ao exposto e aos factos dados como verdadeiros pelo Tribuna Recorrido, é manifestamente ilógico e contraditório concluir pela existência do dano e nexo causal, como o fez o Tribunal Recorrido. 171) Deste modo, mal andou o Tribunal Recorrido ao considerar como provado o facto sssss), impugnando-se a Sentença quanto a este, e pugnando-se pela sua exclusão do elenco dos factos dados como provados. 5. DOS FACTOS (ERRADAMENTE) DADOS COMO NÃO PROVADOS 5.1 A Recorrida sempre teria repercutido o alegado sobrecusto nos preços por si praticados pelos seus serviços 172) Andou mal o Tribunal Recorrido ao dar por não provado que “A Autora repercutiu qualquer incremento dos seus custos nos preços por si praticados pelos seus serviços, aumentando esses preços” (facto não provado g)). 173) É que a conclusão que se impunha retirar da prova produzida é que, efetivamente, a existir um sobrecusto – no que não se concede e apenas por cautela de patrocínio se equaciona –, o mesmo teria sido repassado ou repercutido pela Recorrida junto dos seus clientes através dos preços cobrados pelos serviços que lhes presta. 174) Com vista a quantificar a medida da repercussão, foi ordenada uma perícia levada a cabo pelo Senhor Perito (…), cujo relatório pericial foi inconclusivo. 175) Note-se que este exercício ficou seriamente dificultado pela impossibilidade de acesso, pelo Senhor Perito, à documentação contabilística na posse da Recorrida, requisitada pela aqui Recorrente, mas que nunca foi devida e cabalmente apresentada. 176) Sem prejuízo, a verdade é que resultou provado nos autos que, ainda que tivesse existido um sobrecusto na aquisição dos camiões em causa, quod non, a Recorrida, ainda assim, não teria sofrido qualquer dano, pois, naturalmente, de forma legítima e como empresa que é, teria repercutido qualquer incremento dos seus custos nos preços por si praticados pelos seus serviços, aumentando esses preços – seria irracional, de um ponto de vista económico, não o fazer, e a Recorrida, porque é uma empresa, não é exceção. 177) Veja-se que, quanto a isto, o Tribunal Recorrido baseia a sua motivação - quanto à não verificação da repercussão - apenas na inconclusividade do Relatório Pericial, tomando como decisivas as afirmações genéricas que o Senhor Perito fez em tribunal e no seu relatório de perícia. 178) Ora, no seu testemunho, o legal representante da Recorrida, (…) – com conhecimento de causa – afirmou existirem várias tentativas ao longo dos anos no sentido de se aumentarem os preços cobrados pela Recorrida pelos seus serviços junto dos seus clientes. 179) O Tribunal Recorrido aplica, também aqui, um duplo standard de prova completamente inadmissível, pois releva asserções genéricas do Senhor Perito para dar como não provada a repercussão do sobrecusto, mas já não considera suficientes afirmações que corroboram a existência de repercussão feitas por um representante legal da Recorrida. 180) Além disso, tanto o depoimento do Professor (…) como as regras da experiência que ditam a fixação de preços por empresas permitem a conclusão pela existência da repercussão, como acabámos de ver. 181) Assim, não há nenhuma razão (seja de lei, seja de lógica) para que a Sentença Recorrida se tenha baseado apenas na inconclusividade do Relatório Pericial para chegar a uma conclusão sobre a não verificação da existência de repercussão. 182) Ante o exposto e a título subsidiário, sempre se impunha ao Tribunal a quo uma decisão com recurso à equidade quanto ao cálculo da medida da repercussão – não se confundido com a prova produzida nos autos a respeito da verificação da repercussão (a qual sempre deveria ter sido dada por provada pelo Tribunal a quo). 183) Nestes termos, deve o Tribunal ad quem alterar a decisão do Tribunal a quo no que respeita ao ponto g) da Matéria de Facto Não provada e, em consequência, considerar o facto daí constante – “A Autora repercutiu qualquer incremento dos seus custos nos preços por si praticados pelos seus serviços, aumentando esses preços” - como provado, que sempre faria com que o valor indemnizatório fosse inferior, como se verá infra. 5.2 A Recorrida sempre teria repercutido através das revendas dos veículos parte ou a totalidade do preço que pagou 184) O Tribunal a quo devia ter dado por provada a mitigação dos danos alegadamente sofridos pela Recorrida através das revendas de diversos camiões dos autos a entidades terceiras. 185) Aliás, a teoria económica sugere que a Recorrida terá repercutido qualquer eventual sobrecusto com a aquisição dos camiões (i) num primeiro momento, através da aplicação de um preço mais elevado nos serviços de transporte prestados aos seus clientes durante o período de utilização desses camiões, e (ii) num momento posterior, através de uma margem mais elevada aquando da venda desses camiões no mercado secundário, pois é muito provável, num mercado competitivo como o da Recorrida, que o custo remanescente seja recuperado através da revenda, assim se mitigando um alegado dano que a Recorrida tenha sofrido com a aquisição dos camiões. 186) De facto, verificou-se a revenda de diversos camiões dos autos a entidades terceiras pela Recorrida, bem como do camião com a matrícula ..-CT-.., cuja revenda, apesar de não ter sido incluída na alínea gggggg) da Sentença Recorrida, foi incluída na motivação[2], pelo que a Recorrente crê que a sua não inclusão na alínea gggggg) da Sentença Recorrida se deve a mero lapso do Tribunal Recorrido. 187) Qualquer indemnização arbitrada nestes autos sempre teria de ter em conta este efeito de mitigação de um eventual dano sofrido pela Recorrida, caso contrário, tal implicaria um claro e injusto enriquecimento da Recorrida, nos termos do disposto nos artigos 473.º e 474.º do Código Civil. 188) Nestes termos, deve o Tribunal ad quem alterar a decisão do Tribunal a quo no que respeita ao facto não provado identificado no § 26, alínea h) da Sentença Recorrida, considerando-o provado, o que sempre faria com que o valor indemnizatório fosse inferior. 5.3 A Recorrida sempre teria mitigado o alegado sobrecusto por força das vantagens fiscais obtidas 189) À semelhança do que se expôs nas secções anteriores, mal andou o Tribunal a quo ao dar por não provado o facto não provado i) (cfr. p. 78 da Sentença Recorrida) – de que a Recorrida mitigou o alegado sobrecusto por força das vantagens fiscais obtidas, porquanto da prova carreada aos autos, conclusão diferente se impunha, não podendo a Recorrente concordar com o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo. 190) Desde logo, requereu a Recorrente em sede de contestação que fosse a Recorrida notificada para proceder à junção de determinados documentos e informações em seu poder, para prova e/ou contraprova de diversos factos, em particular dos factos relativos à existência de vantagem fiscal que a Recorrida tenha auferido em resultado de um eventual incremento de custos e da consequente mitigação do eventual dano. 191) Pese embora o Tribunal a quo o tenha desconsiderado em absoluto, a verdade é que dos autos resultou devidamente evidenciado que, caso a Recorrida tivesse suportado um qualquer sobrecusto (não repassado aos clientes ou repassado apenas parcialmente) – o que, uma vez mais, não se concede e por mera cautela de patrocínio se equaciona –, sempre teria beneficiado de vantagens fiscais acrescidas em resultado do sobrecusto alegadamente suportado, por tal sobrecusto ser fiscalmente dedutível e reduzindo, consequentemente, o valor a pagar em sede de IRC. 192) Pese embora o Tribunal a quo tenha desconsiderado o tema por completo, a verdade é que sempre se impunha que, no cálculo da alegada indemnização tivesse sido considerada a circunstância de que a Recorrida ter beneficiado de uma vantagem (rectius, poupança) fiscal. 193) Note-se que a Recorrente empreendeu todos os esforços para obtenção de documentação em posse da Recorrida tendente à prova da mitigação de um hipotético sobrecusto. 194) Contudo, a assimetria de informação verificada dificultou a prova da Recorrente, pelo que deveria o Tribunal a quo ter-se socorrido de um juízo de equidade para a avaliação da medida da mitigação por via da obtenção de vantagens fiscais pela Recorrida. 195) Nestes termos, deve o Tribunal ad quem alterar a decisão do Tribunal a quo no que respeita a esta matéria da mitigação do sobrecusto através de vantagens fiscais e, em consequência, considerar esse facto como provado, o que sempre faria com que o valor indemnizatório arbitrado a favor da Recorrida fosse inferior àquele agora atribuído. 5.4 A Recorrida tomou conhecimento da infração em momento anterior à publicação da Decisão 196) No que respeita à prescrição, o Tribunal a quo não fez uma correta análise e ponderação da matéria de facto e dos meios de prova para efeitos de apuramento do dies quo, em particular, e no que respeita aos factos vertidos no ponto 25, alíneas ttttt) a zzzzz) dos factos provados, dos Documentos n.ºs 1 a 10 juntos pela Recorrente aos autos. 197) Resultou provado que a Recorrida teve conhecimento dos aspetos essenciais da Decisão da Comissão, pelo menos, desde 20.11.2014, data da publicação do comunicado de imprensa que tornou pública a adoção da Nota de Ilicitude. 198) Sem prejuízo, o facto dado por provado pelo Tribunal a quo no ponto 25 da Sentença Recorrida, suportado pela prova documental junta aos autos pela Recorrente, é prova suficiente de que a Recorrida estava em condições de conhecer os elementos essenciais da Decisão no próprio dia do anúncio público da Decisão, ou seja, em 19.7.2016. 199) O prazo de três anos para a prescrição do putativo direito de indemnização terá, no limite, de contar-se a partir dessa data (19.07.2016), terminando três anos depois da publicação do dito anúncio [i.e. a 19.07.2019], sem que tenha ocorrido qualquer causa de interrupção ou de prescrição do putativo direito indemnizatório da Recorrida. 200) Considerada a prova documental produzida nos autos, impunha-se ao Tribunal a quo, concluir que ficou provado que a Recorrida tomou conhecimento dos atos e notícias na data da sua publicação ou nos dias imediatamente seguintes e, consequentemente deveria o Tribunal Recorrido ter julgado procedente a exceção perentória da prescrição invocada pela Recorrente, com a consequente absolvição desta da totalidade dos pedidos. E. DA CORRETA APLICAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DO DIREITO 6. DA PRESCRIÇÃO 6.1 Do dies a quo do conhecimento da Recorrida 201) Para efeitos de apuramento do momento a partir do qual o prazo de prescrição aplicável aos presentes autos deve ser calculado há que atentar nos artigos 309.º e 498.º do CC, o que significa que o início da contagem do prazo de prescrição depende do conhecimento pelo lesado dos pressupostos de responsabilidade civil que fundamentam o seu direito indemnizatório, e do conhecimento da existência do direito a ser indemnizado. 202) Ora, no caso concreto, forçoso será concluir que a data relevante para o início da contagem do prazo de prescrição é 19.7.2016 (isto é, data em que Comissão adotou a sua Decisão, tendo, na mesma data, divulgado um comunicado de imprensa em que descreve com detalhe os elementos essenciais dessa Decisão), se não for antes, i.e. 20.11.2014 (isto é, data em que a Comissão Europeia publicou no seu sítio eletrónico um comunicado de imprensa em que deu a conhecer que tinha adotado uma Nota de Ilicitude contra fabricantes de veículos pesados[3]), pois que nesses momentos estavam já disponíveis os elementos informativos que permitiam o conhecimento dos pressupostos subjacentes à responsabilidade civil; que permitiam a tomada de consciência da existência do direito indemnizatório; e que permitiam saber que o direito podia ser exercido. 203) Em face do exposto, deve a Sentença Recorrida ser revogada e substituída por outra que considere que o dies a quo ocorreu em 19.07.2016, isto se não tiver ocorrido antes, em 20.11.2014. 6.2 Do prazo de prescrição aplicável in casu 204) A Recorrente entende ser aplicável apenas o prazo de prescrição de três anos, previsto no artigo 498.º, n.º 1 do CC, sendo certo que, essa foi também a posição assumida por este Venerando Tribunal[4] e pelo Supremo Tribunal de Justiça[5] - decidir de forma diferente no presente caso, seria na verdade uma ofensa aos princípios do caso julgado, da certeza e da segurança jurídicas, o que não pode suceder. 205) Contudo, optou o Tribunal a quo por fundamentar a sua decisão no Acórdão do TJUE proferido no âmbito do processo DAF/Volvo C-267/20 e, assim, aplicar o prazo de cinco anos, estabelecido no artigo 10.º da Diretiva, algo que no entender da Recorrente não pode proceder porque (i) o referido Acórdão não vincula o Tribunal a quo, sendo certo que não tem caráter definitivo fora do processo onde o reenvio prejudicial ocorreu; (ii) tal Acórdão foi proferido no âmbito de um enquadramento jurídico específico, que não é semelhante ao que ora se discute; e (iii) o entendimento vertido na Sentença Recorrida consubstancia uma interpretação contra legem de direito nacional. 206) Além disso, o entendimento do Tribunal a quo é violador da norma de direito transitório da Lei de Transposição, prevista no artigo 24.º, n.º 1, a qual transpôs o artigo 22.º da Diretiva e nos termos da qual as normas substantivas não se aplicam retroativamente, onde se incluem, naturalmente, as normas relativas à prescrição. Em resultado, o Tribunal a quo acabou por aplicar um regime jurídico que não estava vigente à data dos factos. 207) A Sentença Recorrida deve, por isso, ser revogada e substituída por outra que considere ser aplicável o prazo de prescrição de três anos, previsto no artigo 498.º do CC. 7. DA NÃO VERIFICAÇÃO DOS DEMAIS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL 7.1 Da não verificação do requisito da culpa 208) No entender do Tribunal Recorrido, o incumprimento de leis ou regulamentos por empresas faz presumir a culpa na produção de danos dele decorrentes, sem que para tal seja necessário fazer a comprovação da falta de diligência. 209) A simplicidade e a displicência desarmantes com que este requisito foi tratado na Sentença Recorrida torna ainda mais difícil a tarefa da Recorrente de contra-argumentar ou contrariar o raciocínio (ou a falta dele) do Tribunal a quo. 210) No entanto, não ficou demonstrado nos autos que a Recorrente atuou com culpa, pelo que a ação não poderia nunca proceder. 211) No sistema jurídico português, a culpa constitui um requisito autónomo no âmbito das ações de responsabilidade civil por infrações ao Direito da Concorrência. 212) A invocação do Tribunal a quo acerca do reconhecimento da culpa da Recorrente no contexto do procedimento administrativo não tem qualquer relevância para os autos. 213) O que o Tribunal a quo parece querer fazer quando diz que do âmbito material da Decisão decorre que a atuação da Recorrente foi “intencional” ou pelo menos que “as empresas visadas não adotaram evidentemente e no limite um comportamento diligente” é remeter para um suposto elemento probatório que, no entendimento do tribunal, seria suficiente para considerar verificada a culpa da Recorrente. Não pode ser assim. 214) Neste ponto há que relembrar que, segundo o artigo 352.º do CC, não é possível confessar um conceito legal (tal como a intenção). Ao invés, é apenas possível confessar factos que demonstrem e preencham conceitos legais. 215) De onde resulta que, mesmo que a Recorrente tivesse reconhecido a culpa para efeitos do processo administrativo/contraordenacional, isso nunca poderia significar que a culpa em relação à Recorrida e aos danos por si alegadamente sofridos, e para efeitos da presente ação, deixaria de ter de ser demonstrada nos autos. 216) A Recorrida não o fez, nem o fez (porque também não poderia suprir tal deficiência de alegação) o Tribunal a quo, pelo que a ação aqui em causa nunca poderia ter procedido. 7.2 Da não verificação do requisito da existência de um nexo causal entre o facto ilícito e o dano alegadamente sofrido pela Recorrida (remissão) 217) Não se aplicando a presunção de existência de um nexo causal, cabia à Recorrida fazer a prova do mesmo, o que não logrou fazer, já que não identificou, sequer, como se viu, qual o concreto facto ilícito que teria espoletado o dano por si alegadamente sofrido. 218) Mas mesmo que assim não se entendesse – o que apenas por mera cautela de patrocínio se equaciona –, sempre se diria que essa presunção foi ilidida pela Recorrente em tribunal, tendo esta provado, pelas razões já amplamente exploradas, a interrupção do nexo causal (cfr. secção 4.5.) – ainda que desses factos (dados como provados) o Tribunal Recorrido tenha retirado a conclusão errada, como se explicou. 219) Razões pelas quais deve o Tribunal ad quem revogar a Sentença Recorrida e substituí-la por outra que não reconheça à Recorrida um qualquer direito de indemnização. 8. DO DUPLO STANDARD DE PROVA 220) O Tribunal a quo ignorou as mais básicas regras processuais de distribuição de ónus da prova, exigindo standards probatórios diferentes à Recorrida e à Recorrente para dar como provados ou não provados certos factos significativos para a boa decisão da causa. 221) Cumpre antes de mais referir que ao caso dos autos são aplicáveis as regras gerais do direito civil relativamente à responsabilidade pelo facto ilícito, aos meios de prova e à repartição do ónus da prova, como sejam as estabelecidas nos artigos 341.º a 396.º e 483.º a 498.º do CC. 222) De acordo com as referidas normas, era à Recorrida que cabia alegar e provar os factos constitutivos do direito de que se arroga titular, ou seja, os factos demonstrativos do preenchimento de cada um dos pressupostos legais de que a lei faz depender a responsabilidade civil por facto ilícito (artigo 483.º do CC). 223) No que concerne, em especial, ao pressuposto legal do dano, a Recorrida estaria sempre onerada com a demonstração de que a Infração lhe causou um dano concreto e o respetivo quantum, sendo que saber se a esta cumpriu o standard de prova exigido neste âmbito sempre teria de ser aferido à luz dos parâmetros definidos na lei portuguesa. 224) No presente caso, a Recorrida apresentou o relatório económico Z... e arrolou a testemunha (…), a qual foi ouvida em sede de audiência de julgamento, na esperança de assim conseguir provar o concreto dano que teria alegadamente sofrido, mas segundo o Tribunal a quo, o “relatório Z... e o depoimento convergente de (…) não têm valia probatória suficientemente sólida e consistente para serem considerados”[6], tendo reconhecido (e de forma absolutamente correta) que “o relatório AA/BB é mais sustentado e robusto do que o relatório Z...” [7]. 225) Apesar de desconsiderar em toda a linha a prova apresentada pela Recorrida e de considerar como mais bem fundamentada a prova económica da Recorrente, o Tribunal a quo - de forma pouco compreensível e em incumprimento das mais básicas regras sobre ónus da prova - acaba por julgar procedente a pretensão indemnizatória da Recorrida, sem qualquer prova que a sustente, apenas com base numa mera convicção de que da Infração terão resultado os danos alegados pela Recorrida. Tal não pode proceder e é contra tal decisão que a Recorrente ora se insurge. 226) Ora, não tendo a Recorrida cumprido o standard probatório legalmente exigido, não cabia ao Tribunal a quo suprir tal falha através de presunções judiciais, ignorando por completo prova económica bem fundamentada apresentada pela Recorrente, tal como o próprio Tribunal a quo admite. 227) O Tribunal a quo devia ter baseado a sua decisão na matéria probatória apresentada nos autos (e apenas nela), e não numa qualquer intuição, suspeita, convicção ou crença de que a Infração causou danos. Aliás, uma tal decisão seria arbitrária e violadora dos princípios mais básicos do due process of law. 228) A conclusão evidente seria a de que a Recorrida não logrou cumprir o ónus de prova que sobre ela impendia de provar o dano e o nexo causal, sendo certo que a Recorrente apresentou uma hipótese alternativa à apresentada pela Recorrida, mais bem fundamentada, mais sustentada. 229) Contudo, o Tribunal a quo escuda-se nas características e natureza da Infração vertidas na Decisão para justificar por que considera verificado o dano alegado pela Recorrida. Mas a verdade é que a natureza da Infração não deveria acarretar uma dualidade de critério quanto à forma de analisar a prova trazida por cada uma das partes processuais, nem tampouco alterar as regras do ónus e standard probatórios. 230) A aplicação de um duplo standard de prova pelo Tribunal a quo verifica-se ainda no facto de este entender que, por um lado, é desculpável a Recorrida não carrear aos autos documentos que comprovem os preços alegadamente pagos pela aquisição de diversos veículos, tanto que oferece uma segunda oportunidade à Recorrida, relegando para sede de liquidação de sentença[8] a possibilidade de esta vir apresentar prova quanto a algo que deveria ser provado no decurso do presente processo, assim concluindo que a falta de dados não pode ser interpretada em detrimento da Recorrida, mas, por outro lado, já condena negativamente a Recorrente pelo facto de esta não dispor de dados anteriores a 2003 que pudessem ser usados na análise levada a cabo no Relatório VT. 231) Está a aplicar um duplo standard de prova, votando a Recorrente a um desfavorecimento processual e substantivo inadmissível, em ofensa ao princípio da igualdade de armas estatuído nos artigos 13.º e 20.º da CRP. 232) Mas não é só: para prova da repercussão de um eventual sobrecusto, a Recorrente empreendeu todos os esforços ao seu alcance, tendo o Sr. Perito requerido a apresentação de diversos documentos em posse da Recorrida, os quais seriam suscetíveis de provar a repercussão de um eventual sobrecusto nos serviços prestados por si prestados. Contudo, não foi possível obter grande parte da documentação, tendo ficado totalmente prejudicado o exercício probatório em causa sem que isso possa ser imputado à Recorrente, porquanto tais documentos se encontravam apenas na posse da Recorrida. 233) O Tribunal a quo, ao considerar que a inexistência de dados/elementos relevantes, que apenas poderiam estar na posse da Recorrida, e o seu não fornecimento não é imputável à mesma – assim prejudicando a Recorrente, por considerar que esta não cumpriu o seu ónus da prova (no que não se concede) – está a aplicar, novamente, um duplo standard de prova inaceitável. 234) Assim sendo, deve a Sentença Recorrida ser revogada e substituída por outro que aplique corretamente as regras sobre distribuição do ónus da prova e, consequentemente, absolva a Recorrente do pedido. 9. QUANTUM - DA INADMISSIBILIDADE DO RECURSO À ESTIMATIVA JUDICIAL 9.1 Não estão preenchidos os requisitos para o recurso à estimativa judicial 235) O Tribunal Recorrido recorreu à estimativa judicial sem que se encontrassem preenchidos os requisitos para a sua aplicação. 236) O recurso à estimativa judicial para a quantificação do dano depende de (i) da existência de um dano a demonstrar pelo demandante e (ii) que a quantificação desse dano com precisão se revele impossível ou excessivamente difícil. 237) O Tribunal Recorrido deu como provada a existência de dano com base numa presunção judicial ilógica e inválida. Portanto, não estando a existência do dano validamente estabelecida, o recurso à estimativa judicial revela-se, também e necessariamente, inválido. 238) O Tribunal Recorrido considera – erradamente – que o caso sub judice é um caso marcado por uma quase impossibilidade ou uma excessiva dificuldade na quantificação exata do dano. 239) Resultou dos autos e foi reconhecido pelo Tribunal a quo, que foram apresentadas e produzidas todas as provas aptas à prova do dano. Ora, assim sendo, se de toda a prova adequada não resultou a existência de um dano ou a sua quantificação, não se trata de uma dificuldade de prova, mas do incumprimento do ónus de prova pela Recorrida. 240) Assim, o Tribunal Recorrido ultrapassou os limites que lhe permitiriam recorrer à estimativa judicial, violando as regras de ónus da prova. Esta regras levariam à inevitável conclusão de que os factos alegados pela Recorrida no que diz respeito à quantificação do alegado dano não foram por esta provados, o que inviabilizaria concluir pela condenação da Recorrente no pagamento de uma indemnização. 9.1.1. A existência de dano não resultou provada 241) A Recorrida não logrou provar a existência do alegado dano, tal como reconhecido pela Sentença Recorrida. 242) Considerando que a presunção de danos é legalmente inadmissível e que o próprio Tribunal Recorrido reconhece que a Recorrida não logrou provar a existência de danos, é manifesto que o primeiro requisito para a aplicação de uma estimativa judicial de quantificação de danos não se encontra preenchido. 9.1.2 Não era excessivamente difícil ou impossível quantificar o alegado dano 243) O Tribunal Recorrido também não aplicou corretamente o requisito para o recurso a uma estimativa judicial do quantum do alegado dano, que exige que seja, no caso concreto, “na prática, impossível ou excessivamente difícil [quantificar o alegado dano] com precisão”. [9] 244) No entanto, o Tribunal Recorrido não avaliou devidamente se a hipótese de a impossibilidade prática de computar o dano resultava da inação ou das falhas metodológicas cometidas pela Recorrida, caso em que “não [caberia] ao juiz nacional substituir-se [à parte demandante] nem colmatar as suas falhas” . 245) Nenhuma das supostas dificuldades genéricas mencionadas pelo Tribunal Recorrido é suficientemente específica e particularmente importante para poder levar legitimamente à conclusão de que se encontra preenchido o requisito da impossibilidade prática ou da excessiva dificuldade. 246) O Tribunal Recorrido faz tábua rasa de jurisprudência do TJUE ao proceder a uma estimativa judicial no caso sub judice, no qual a Recorrida não logrou quantificar o alegado dano, não porque essa quantificação era praticamente impossível ou excessivamente difícil, mas porque a Recorrida não foi, efetivamente, diligente na tentativa de quantificar o alegado dano. 247) Esta falta de diligência da Recorrida é relevada pela própria apreciação do Tribunal Recorrido em relação aos relatórios económicos apresentados pelas Partes. O Tribunal Recorrido acabou por errar na identificação das consequências legais da sua própria análise, visto que identificou uma série de deficiências (supríveis) ao Relatório Z..., mas decidiu fazer uso de uma estimativa judicial inválida com o intuito de as suprir, ao invés de simplesmente aplicar as regras de direito probatório aplicáveis. O Relatório Z... poderia não partir do pressuposto de que existiu um sobrecusto 248) O Relatório Z... limita-se a quantificar o dano que simplesmente assumiu ter existido, o que inquina, desde logo, as suas conclusões quanto à própria quantificação. O Relatório Z... poderia ter tomado em consideração a complexidade dos veículos em causa para permitir a comparabilidade dos resultados ao longo do tempo e entre diferentes veículos 249) Como bem afirma o Tribunal Recorrido, o relatório Z... não tomou “em devida consideração uma característica deste mercado, que é inclusive reconhecida pela Comissão Europeia no ponto (26) da sua decisão, e que consiste na complexidade dos camiões, devido à sua heterogeneidade”, e que tem uma influência decisiva nos preços finais pagos pelos utilizadores dos camiões. O Relatório Z... poderia utilizado outros índices mais adequados para comparar a evolução dos preços dos camiões 250) Outra falha metodológica presente no Relatório Z... diz respeito à utilização dos índices escolhidos para a comparação das variações dos preços dos camiões, a saber, o IPRI para a Alemanha e para os Países Baixos, o Índice Volvo-Scania, o índice PRODCOM e o Índice Global de Preços, que agrega os três índices anteriores. 251) Sendo este um aspeto absolutamente nevrálgico no Relatório Z..., esta falha (que foi uma opção consciente dos autores deste documento) leva a que fique inelutavelmente comprometida “a sua valia probatória, porque afeta pressupostos essenciais dos cálculos efetuados, designadamente os índices de preços considerados e comparados. Trata-se, por conseguinte, de uma falha estrutural” (cfr. para. 97 da Sentença Recorrida). Ao aferir a robustez do IPRI para a Alemanha e Países Baixos, o Relatório Z... integrou o objeto comparado no próprio comparador, o que constitui uma falha metodológica grave 252) Com o intuito de aferir a robustez do IPRI para a Alemanha e Países Baixos, o Relatório Z... comparou o IPRI para o mercado dos veículos automóveis, o qual incorpora o IPRI para o mercado dos camiões. 253) Isto leva a que o Relatório Z... tenha integrado objeto comparado (IPRI para o mercado dos camiões) no próprio comparador (IPRI para o mercado dos veículos automóveis). 254) Esta opção dos autores do Relatório Z... constitui uma falha metodológica grave, ainda que suprível (bastando, para o efeito, que a opção tivesse sido distinta), já que os resultados da primeira realidade “refletem e são afetados pelos resultados da segunda, não sendo, nessa medida, realidades distintas” (cfr. para. 100 da Sentença Recorrida). O Relatório Z... utilizou como mercado comparador o mercado dos veículos automóveis 255) Por outro lado, e de forma particularmente decisiva, o mercado comparador utilizado pelo Relatório Z... é o mercado dos veículos automóveis. 256) Se assim é, seria de esperar que o comportamento da procura, a estrutura da oferta, os custos, e as demais características de ambos os mercados fossem, por um lado, semelhantes, e, por outro, não apresentassem diferenças-chave que levassem à exclusão da comparação. 257) No entanto, nem o Relatório Z... nem os seus autores (em audiência de julgamento) conseguiram explicar e convencer o Tribunal Recorrido de que o mercado dos veículos automóveis era um comparador adequado para o estudo que se propuseram realizar. 258) Como a Recorrente tem vindo a alegar desde que começou a contestar a presente ação, os camiões são produtos totalmente diferentes dos veículos ligeiros e de outros veículos pesados (como autocarros): são muito mais heterogéneos (normalmente encomendados de acordo com as especificações dos clientes), são procurados por consumidores completamente diferentes, respondendo a sua procura de forma distinta a períodos de recessão ou de crescimento económico, e respondem a necessidades totalmente diferentes. O Relatório Z... utilizou como mercado geográfico comparador o mercado mexicano 259) Para sustentar a aplicação do método das diferenças-nas-diferenças, o Relatório Z... utiliza o mercado dos camiões mexicano, que é um mercado manifestamente diferente do mercado dos camiões em Portugal. 260) Por outro lado, o Relatório Z... não tenta sequer convencer o tribunal de que os mercados são semelhantes, porque não se preocupa em demonstrar e explicar de que forma poderiam ser semelhantes, por exemplo, os fatores geradores da procura e da oferta nos mercados considerados. O Relatório Z... não explica de forma fundamentada como projetou os seus resultados para o período quanto ao qual não dispunha de dados 261) A inexistência de dados que cubram o período total da Infração não chega para inquinar as conclusões de um relatório económico deste tipo. 262) O que é importante, nesses casos, é explicar a metodologia de controlo e de projeção dos dados dos quais efetivamente se dispõe para um período para o qual não existem dados. 263) Apenas dispondo de dados relativos ao IPRI da Alemanha e Países Baixos a partir dos anos 2000 e 2005, respetivamente, o Relatório Z... teve de proceder a uma projeção “para o passado (através de um modelo econométrico) para obter uma série desde 1997”. 264) No entanto, o Relatório Z... não justificou nem esclareceu a forma como essa projeção foi feita, pelo que não se pode aferir da sua correção técnica. Assim, e em súmula, 265) Não deve considerar-se que existe uma impossibilidade prática ou uma excessiva dificuldade na quantificação do dano simplesmente porque as conclusões do Relatório Z..., apresentado pela Recorrida não foram aceites pelo Tribunal Recorrido. 266) Neste contexto, o facto de a Recorrida efetivamente ter procedido a um exercício de quantificação demonstra claramente que o critério da impossibilidade prática ou da excessiva dificuldade não se encontra preenchido no caso sub judice. 267) Como tal, se a quantificação apresentada pela Recorrida não é considerada plausível e tecnicamente suportada – como é o caso –, a consequência deve ser a rejeição do pedido da Recorrida e não o recurso a uma estimativa judicial com o intuito de colmatar as falhas metodológicas cometidas pelos autores do relatório Z... (cfr. secção 9.1.2) e, dessa forma, sanar o incumprimento do ónus da prova que impendia sobre a Recorrida. 9.2 Consequências do recurso a uma estimativa judicial legalmente inadmissível 268) Quer por via do artigo 9.º, n.º 2 da LPE, quer pelos artigos 17.º, n.º2 e 12.º, n.º5, quer pela via do artigo 566.º, n.º 3 do CC, não estavam preenchidos os requisitos para o recurso à estimativa judicial, pelo que o Tribunal Recorrido deveria ter decidido o caso através da aplicação ao caso concreto das regras sobre distribuição do ónus da prova e sobre os standards probatórios exigíveis neste âmbito, não restando outra solução ao Tribunal Recorrido que não fosse a absolvição da Recorrente do pedido. 269) De acordo com os artigos 342.º e 483.º do CC, 5.º e 414.º do CPC , era à Recorrida que cabia alegar e provar os factos demonstrativos do preenchimento de cada um dos pressupostos legais de que a depende a responsabilidade civil por facto ilícito: o facto ilícito, a culpa e o dano, bem como o nexo causal entre o facto e o dano, em concreto, a Recorrida estaria sempre onerada com a demonstração de que a Infração lhe causou um dano concreto e o respetivo quantum, sendo que a prova económica que apresentou não foi suficiente para cumprir o standard de prova exigido nesta sede. 270) Ora, entendendo o Tribunal Recorrido que a prova apresentada e produzida pela Recorrida não foi suficiente, não poderia ter recorrido à estimativa judicial nem ter dado como provado o requisito do dano. Devendo, ao invés, aplicar o regime legal de distribuição do ónus de prova. 271) Em suma, o Tribunal a quo fez tábua rasa do direito aplicável aos presentes factos e votando a Recorrente a um desfavorecimento processual e substantivo. 272) A Sentença Recorrida deve ser revogada e substituída por outra que aplique corretamente as regras sobre distribuição do ónus da prova e, consequentemente, absolva a Recorrente dos pedidos contra si formulados. 10. SUBSIDIARIAMENTE, DA INADMISSIBILIDADE DA ESTIMATIVA DO QUANTUM EM 5% 10.1 Da arbitrariedade do quantum indemnizatório estimado em 5% 273) É juridicamente inadmissível a forma como o Tribunal Recorrido chegou ao quantum indemnizatório, porquanto se limita a “[acompanhar] integralmente o entendimento exposto que consideramos transponível para o caso dos autos” (cfr. para. 453 da Sentença Recorrida). 274) O entendimento adotado pelo Tribunal Recorrido é o do Tribunal da Relação de Lisboa, plasmado no seu acórdão proferido no âmbito do processo n.º 54/19.6YQSTR.L1. 275) Entendimento que não deverá ser seguido, já que o referido acórdão ainda não transitou em julgado por do mesmo ter sido interposto recurso[10] com fundamentação muito semelhante àquela que motiva o recurso no caso sub judice. 276) A decisão do Tribunal Recorrido no sentido de fixar o sobrecusto em 5% do valor pago pelos veículos dos autos só pode ser tida como arbitrária. 277) Relembre-se que a Recorrida não logrou quantificar de forma cabal e suficiente o dano que afirma ter sofrido, razão pela qual (a par de tantas outras) não se pode sequer considerar que tenha sofrido qualquer dano. 278) E relembre-se igualmente que a Recorrente fez prova da inexistência de um sobrecusto pago pela Recorrida na aquisição dos camiões. 279) No entanto, o Tribunal Recorrido fez tábua rasa de tudo isto, numa solução salomónica inadmissível que ignora toda a prova produzida pela Recorrente (e não produzida pela Recorrida), sem qualquer justificação ou fundamentação que seja atacável pela Recorrente, assim saindo restringidas as suas vias de defesa. 10.2 Da intransponibilidade de decisões estrangeiras para o ordenamento jurídico português 280) Sem prejuízo das razões já avançadas quanto à impossibilidade do uso, neste caso, de um estimativa judicial, note-se que o Tribunal Recorrido se limita a reproduzir, sem quaisquer razões para tal, o valor da estimativa alcançada por jurisprudência (não estabilizada) espanhola e britânica com o intuito de aplicar as respetivas soluções (que consistem numa presunção judicial de 5% de sobrecusto) ao caso em apreço, em vez de ter chegado a um valor de estimativa informado pela prova produzida nos autos. 281) Pelo que a estimativa a que chegou o Tribunal Recorrido é arbitrária e juridicamente inadmissível. 282) Essas decisões estrangeiras não gozam de uma presunção de justeza porque ainda podem ser revertidas, padecendo de fragilidades inultrapassáveis que nunca seriam admissíveis no nosso ordenamento jurídico. 283) Por outro lado, tais arestos nunca poderiam ser mobilizados para se decidir a causa sub judice também porque assentam em factos, prova produzida, regras de direito e sistemas jurídicos completamente diferentes. 284) O Tribunal Recorrido pareceu procurar justificar tal solução dizendo que se trata da mesma Infração e que a aplicação do Direito da União Europeia é comum aos três países. 285) No entanto, o Tribunal Recorrido deu mais importância a essas similitudes genéricas e irrelevantes entre os casos do que às significativas e profundas diferenças materiais que os separam, tanto no domínio dos factos como no domínio do direito aplicável em sede de responsabilidade civil extracontratual. 286) Mas o Tribunal Recorrido limitou-se a usar, de forma automática e acrítica, as soluções alcançadas nessas decisões, justificando-se num exercício de justiça salomónica, mas sem avançar qualquer tipo de fundamentação ou justificação para tal, razão pela qual essa estimativa só pode ser considerada arbitrária. 287) Qualquer estimativa judicial de sobrecusto no caso sub judice (no que, novamente, não se concede) devia basear-se na prova produzida nos presentes autos, o que resultaria num valor bem mais próximo de 0% do que do valor de 5% a que o Tribunal Recorrido chegou pelo decalque de decisões que nenhuma relevância têm para o caso sub judice. 10.3 A repercussão e/ou mitigação do alegado sobrecusto deveria ter sido computada na estimativa judicial do dano 288) Conforme vem a Recorrente alegando à saciedade nos presentes autos, caso o preço efetivamente pago pela Recorrida com as aquisições de camiões Volvo fosse superior àquele que teria sido pago na ausência da Infração – que não foi o caso – a Recorrida, ainda assim, não teria sofrido qualquer dano, pois teria repercutido qualquer incremento dos seus custos nos preços por si praticados pelos seus serviços, aumentando esses preços. 289) A existência dessa repercussão ficou demonstrada, através da prova produzida em sede de audiência de julgamento, como seja o depoimento prestado pelo Professor AA. 290) Sucede que, em face da não disponibilização de documentos que permitissem levar a cabo um exercício pericial conclusivo, a quantificação dessa repercussão mostrou-se de extrema dificuldade; na verdade mostrou-se de uma impossibilidade prática que desarmou a Recorrente do seu direito de defesa, porquanto os documentos relevantes para o efeito encontravam-se exclusivamente na posse da Recorrida. 291) Assim, verificando-se a impossibilidade prática de proceder a uma fixação exata em sede de quantificação da repercussão pela Recorrente, devia o Tribunal a quo ter recorrido ao mecanismo legal previsto no artigo 9.º, n.º 2, da LPE, para o cálculo da medida da repercussão, atendendo a que a mesma não se mostrou possível por razões não imputáveis à Recorrente, do mesmo modo que a ele recorreu para quantificar o dano alegado pela Recorrida. 292) Não o fazendo, o Tribunal a quo incorre uma vez mais numa violação das regras sobre distribuição do ónus da prova, para além de injustificadamente tratar as partes de forma diferente. 293) Acresce que ignorar esta realidade repercussiva, como decide o Tribunal a quo fazer, resultará perigosamente na atribuição de uma compensação excessiva à Recorrida, algo que o sistema jurídico simplesmente não permite. 294) No que respeita à quantificação em concreto neste âmbito, sempre se imporia que o Tribunal a quo tivesse reduzido a percentagem atribuída a título de danos (5%) por forma a refletir a medida da repercussão, o que naturalmente se aproximaria de um cenário de 0%, senão mesmo de 0%. 295) Assim sendo, deve a Sentença Recorrida ser revogada e substituída por outra que efetue a devida quantificação da medida da repercussão do putativo dano, nos termos legalmente previstos. 11. DA REMISSÃO PARA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA 296) Na Sentença Recorrida, o Tribunal a quo salienta que existe um conjunto de veículos – sinalizados nas alíneas i) a kk) dos factos provados da Sentença Recorrida – em relação aos quais não foi possível apurar o preço. Em relação a tais veículos, o Tribunal a quo remete a determinação do respetivo preço para sede de liquidação de sentença[11]. 297) Desta decisão resulta que para o Tribunal a quo que a Recorrida não logrou provar o preço dos veículos que alega ter adquirido, pelo que não será possível quantificar o montante total do putativo dano com base na prova carreada aos autos, mas ao invés de decidir com base em tal prova (que é inexistente) e de acordo com as regras sobre ónus da prova, opta por dar uma segunda oportunidade à Recorrida, permitindo-lhe que venha apresentar prova adicional que permita a determinação do preço, desta vez em sede de liquidação de sentença. Tal não pode suceder. 298) Não tendo a Recorrida fornecido prova suficiente quanto ao preço que terá alegadamente pago por tais veículos, está claro que não cumpriu o ónus que sobre ela impendia e, perante tal situação, tais veículos deveriam ter sido desconsiderados. Não podia o Tribunal a quo conferir uma segunda oportunidade à parte onerada, em clara violação daquelas que são as mais basilares regras sobre direito probatório. 299) Como se sabe, existem prazos legais específicos dentro dos quais incumbe às partes apresentar elementos probatórios que sustentem o que alegam. Ultrapassados tais prazos – como, aliás, sucedeu no presente caso – preclude-se o direito de o fazer. 300) Neste caso, não tendo sido apresentados meios de prova que permitissem concluir o preço dos veículos sinalizados nas alíneas i) a kk) dos factos provados da Sentença Recorrida, a consequência natural para tal omissão à luz dos princípios da autorresponsabilidade das partes e da preclusão será a de não poderem tais aquisições ser consideradas para efeitos de arbitramento de uma eventual indemnização. 301) Tendo em conta o exposto, deve o Tribunal ad quem revogar a Sentença Recorrida e substituí-la por outra que não remeta para liquidação de sentença o apuramento do preço/valor de aquisição dos veículos identificados nas alíneas i) a kk) dos factos provados da Sentença Recorrida, ou seja, deve a Sentença Recorrida ser substituída por outra que não condene a Recorrente a pagar à Recorrida “a quantia que se vier a liquidar correspondente ao custo adicional que a A. pagou pelas viaturas com as matrículas identificadas nas alíneas i) a kk) dos factos provados, correspondente a 5% do preço de aquisição dessas viaturas que se vier a apurar”[12]. 12. DO CÁLCULO DOS JUROS 12.1. Do cômputo dos Juros Moratórios 302) Ora, com o devido respeito, que é muito, é entendimento da Recorrente que, contrariamente ao vertido pelo Tribunal a quo na Sentença Recorrida, nunca seriam devidos juros desde um momento anterior à citação da Recorrente para a presente ação. 303) Tratando-se de crédito com origem em responsabilidade por facto ilícito, “o devedor constitui-se em mora desde a citação”, conforme resulta do disposto na segunda parte do n.º 3 do artigo 805.º do CC. 304) Assim, não se encontra razão subjacente a este segmento decisório da Sentença Recorrida ao condenar a Recorrente no pagamento de juros moratórios contabilizados da ocorrência de danos – in casu, desde a data da instauração da ação, no caso dos veículos adquiridos por compra e venda, e desde a data do exercício da opção de compra, no caso dos veículos adquiridos por locação financeira. 305) Em face do exposto, a Recorrente vem recorrer da Sentença Recorrida por entender que a mesma efetuou o cálculo dos juros de forma errada, pelo que vem pugnar pela revogação da Sentença Recorrida e substituição desta por outra que efetue um eventual cálculo de juros a partir da citação da Recorrente para a presente ação e não a partir da data da instauração da presente ação e/ou do exercício da opção de compra de certos veículos, como crê erroneamente o Tribunal a quo. 12.2. Da prescrição dos juros peticionados pela Recorrida 306) Além disso, sempre estariam prescritos todos os juros vencidos em momento anterior aos cinco anos que antecederam a citação da Recorrente, à luz do artigo 310.º, alínea d) do CC. 307) O Tribunal a quo decidiu desaplicar o artigo 310.º, alínea d) do CC supostamente por ser essa a solução imposta "à luz do direito europeu”[13], mas a Lei de Transposição não prevê qualquer inaplicabilidade dessa norma - tal resultaria na ausência de prescrição quanto aos juros ou na aplicação de uma mera prescrição ordinária, nos termos gerais, o que não se admite. 308) Em face do exposto, a Recorrente vem recorrer da Sentença Recorrida contra tal segmento decisório por falta de fundamento legal, pugnando pela revogação da Sentença Recorrida e substituição desta por outra que aplique o referido preceito legal. 13. NORMAS VIOLADAS PELA SENTENÇA RECORRIDA E INCONSTITUCIONALIDADE DA SUA INTERPRETAÇÃO 309) A Sentença Recorrida procede a uma interpretação normativa dos artigos 3.º, n.º 1 da LPE, conjugada com o artigo 483.º do CC, em violação dos princípios constitucionalmente consagrados do Estado de Direito (artigo 2.º da CRP), da proporcionalidade (artigo 18.º da CRP) e do princípio da igualdade (artigo 13.º), também na vertente da igualdade de armas (artigo 20.º da CRP). 13.1 Da inconstitucionalidade da interpretação normativa do artigo 3.º, n.º 1, e 9.º, n.º 1, da LPE, por violação do princípio do Estado de Direito, do princípio da proporcionalidade e do princípio da igualdade, também na vertente da igualdade de armas 310) O entendimento da Sentença Recorrida assenta num circuito de presunções judiciais inilidíveis extraídas do artigo 3.º, n.º 1 da Lei n.º 23/2018, com base nas quais considerou a Sentença Recorrida estarem verificados todos os elementos constitutivos da responsabilidade civil extracontratual prevista no artigo 483.º do CC. 311) Este sentido decisório consubstancia uma interpretação severa e desproporcionada da responsabilidade extracontratual no domínio das infrações ao direito da concorrência, que se repercutirá em todas as ações sobre a matéria. 312) A interpretação normativa propugnada pela Sentença Recorrida é o de que, verificando-se uma infração ao direito da concorrência, existe uma presunção judicial dos danos em virtude de os mesmos serem apresentados como uma “consequência natural dessa verificação,” não sendo admissível a produção de qualquer prova em contrário. 313) Nestes termos, é inconstitucional a interpretação da norma do artigo 3.º, n.º 1 e da norma do artigo 9.º, n.º 1, ambos da Lei n.º 23/2018, de 5 de junho, por violação do princípio do Estado de Direito e da proporcionalidade, do artigo 2.º e 18.º da CRP, quando interpretada no sentido de a mera existência de uma infração objeto de decisão da Comissão Europeia redundar numa presunção judicial inilidível de danos em abstrato, bem como na presunção do referido nexo de causalidade entre a infração e os danos para efeitos de determinação da responsabilidade extracontratual. 314) É também inconstitucional a interpretação da norma do artigo 3.º, n.º 1 da LPE, por violação do princípio do Estado de Direito, da segurança jurídica e da proporcionalidade, do artigo 2.º e 18.º da CRP, quando interpretação no sentido de que a mera violação de “leis ou regulamentos” autoriza a presunção de culpa do suposto infrator, para efeitos de determinação da responsabilidade extracontratual. 315) É ainda inconstitucional a interpretação da norma do artigo 3.º, n.º 1 e da norma do artigo 9.º, n.º 1, ambos da Lei n.º 23/2018, de 5 de junho, por violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da CRP e do princípio da igualdade de armas consagrado no artigo 20.º da CRP, quando interpretada no sentido de a mera existência de uma infração objeto de decisão da Comissão Europeia em que seja visada uma pessoa jurídica fazer presumir, necessária e sequencialmente, os danos e o nexo de causalidade, determinando-se assim uma obrigação de indemnizar mediante parâmetros normativos diferenciados dos referentes ao artigo 483.º do CC e vedando-se a produção de prova destinada a elidir a presunção. 13.2 Do não-afastamento de princípios constitucionais inerentes ao Estado de Direito democrático pelos princípios do primado e da interpretação conforme ao Direito da EU 316) Não se afirme – contra as consequências jurídico-constitucionais que se expuseram – que o Tribunal a quo estaria obrigado a seguir este inusitado percurso interpretativo, porquanto lhe caberia assegurar quer o primado e a eficácia do Direito da União Europeia, quer a interpretação do direito nacional em sentido conforme ou compatível com uma Diretiva europeia, sempre de forma à “ salvaguarda dos direitos conferidos aos cidadãos pelo direito da União” (cfr. Sentença Recorrida, p. 128). 317) Desde logo, e sem prejuízo das considerações a seu tempo efetuadas no presente Recurso sobre a errada aplicação, à luz do Direito da União Europeia, do princípio da efetividade (cfr. secção C.2.) tenhamos presente que o princípio da interpretação conforme ao Direito da União Europeia – constituindo um parâmetro de interpretação do direito ordinário – não pode ser hasteado à categoria de chave de interpretação dos parâmetros constitucionais nacionais. 318) Não pode o princípio da interpretação conforme ser usado para estabelecer um sentido – tido como mais conforme ao Direito da União Europeia –, que, todavia, resulte em violação de princípios constitucionais fundamentais do Estado de Direito democrático, como sejam os princípios do Estado de Direito, da proporcionalidade e da igualdade. 319) Tal como será igualmente inadequado o recurso ao princípio do primado do Direito da União Europeia de forma a sustentar a prevalência de um sentido interpretativo que contenda com os limites fundamentais ao primado do Direito da União Europeia, estabelecidos no artigo 8.º, n.º 4 da CRP. 320) Assim, verificando-se que a interpretação normativa adotada pelo Tribunal a quo é também contrária a princípios fundamentais do Direito da UE – pelos motivos apresentados ao longo deste recurso –, poderá o juiz nacional apreciar sempre as questões de constitucionalidade normativa imputadas à interpretação normativa conduzida pelo Tribunal a quo no presente caso, sem que se divise, a este respeito, um qualquer conflito entre o Direito da UE e a CRP. 321) O Tribunal a quo excedeu-se na interpretação e nas presunções aplicadas na Sentença Recorrida, de tal modo que a fundamentação deixou de ser proporcional e não respeita (i) o direito constitucional interno português e (ii) o direito da União Europeia. Este facto constitui mais uma razão pela qual deve a Sentença Recorrida ser anulada. A. PEDIDO Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente Recurso de Apelação ser admitido e considerado procedente, nos termos expostos supra e, em consequência: (i) Ser a Sentença Recorrida declarada nula, por oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC; (ii) Ser a Sentença Recorrida revogada e substituída por outra nos termos da qual se absolva a Recorrente de todos os pedidos contra si formulados. Assim farão V. Exas. a COSTUMADA JUSTIÇA! * A TN – Transportes M. Simões Nogueira, SA, inconformada, também interpôs recurso de apelação da sentença final, em que apresenta as seguintes conclusões: I- DO OBJETO DO RECURSO 1) O presente recurso tem por objeto a douta Sentença do Tribunal a quo, datada de 31.03.2024, que considerou a ação intentada pela Recorrente parcialmente procedente, incidindo apenas sobre a parte da sentença que não reconheceu na íntegra o pedido formulado pela Autora / Recorrente (i.e., sobre o decaimento parcial daquele pedido) e versando sobre a decisão relativa à matéria de facto tomada pelo Tribunal a quo, com fundamento na reapreciação da prova gravada e na prova documental junta aos autos, e, bem assim, sobre matéria de direito. 2) Na perspetiva da Recorrente, a prova produzida em audiência de julgamento em conjugação com a prova documental junta aos autos implica uma decisão diversa da proferida quanto à decisão sobre determinados pontos da matéria de facto, designadamente no que respeita aos factos provados i) a kk), na parte em que referem “por um preço não concretamente apurado”, bem como ao facto não provado f), que deveria ter sido considerado como provado. 3) Ainda que não proceda o pedido de alteração da matéria de facto, o que não se concede e apenas por dever de patrocínio se equaciona, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na aplicação do direito à matéria de facto provada, em virtude de ter procedido ao quantum do dano com o recurso a estimativa judicial não aproximada e de ter erradamente decidido o momento a partir do qual devem ser calculados os juros de mora relativamente aos veículos adquiridos por contratos de compra e venda. II- DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE A MATÉRIA DE FACTO A. Da impugnação parcial dos factos provados i) a kk), na parte em que referem “por um preço não concretamente apurado” 4) A Recorrente considera incorretamente julgados os factos provados i) a kk), unicamente na parte em que referem “por um preço não concretamente apurado”. 5) Da alegação da Autora/Recorrente, nomeadamente na petição inicial – PI – (cfr. artigo 20.º), apresentada em 31.03.2020 e na petição inicial aperfeiçoada – PIA – (ou “concretização factual”) junta aos autos em 19.01.2021, consta o preço de cada um dos camiões em causa, designadamente os referidos nas alíneas i) a kk) dos factos provados da Sentença recorrida (os primeiros 29 camiões). 6) Em sede de produção de prova no decurso da Audiência de Julgamento, quer o legal representante da Autora, (…), quer a testemunha (…), funcionário administrativo da mesma e responsável pela organização e recolha da documentação aportada por aquela a estes autos, confirmaram, por referência à peça processual “PIA”, o respetivo preço pago por cada um dos camiões, incluindo aqueles para os quais não foi possível à Autora/Recorrente, em face da antiguidade dos documentos, encontrar as faturas tituladoras dos negócios, como sucede com os mencionados nas alíneas i) a kk) dos factos provados. 7) Tais depoimentos devem ser igualmente interpretados à luz da confissão e informações prestadas nos autos pela NORS, S.A. (anterior Auto-Sueco, Lda., entidade vendedora dos camiões à Autora/Recorrente): a mesma foi inicialmente demandada nesta ação, tendo apresentado Contestação em 07.07.2020, na qual, no artigo 38.º, aceitou expressa e especificadamente o alegado nos artigos 20.º e 21.º da Petição Inicial, que se referem precisamente à data de aquisição, preço e pagamento do preço dos camiões; além do mais, através do requerimento de 22.02.2022, a mesma NORS, SA esclareceu nos autos, de forma taxativa, que “todas as viaturas foram pagas na totalidade, encontrando-se a respetiva conta-corrente saldada”. 8) Foi a própria entidade a quem foram adquiridos todos os camiões em causa que veio aos autos (ainda para mais na qualidade de Ré) confirmar expressamente o preço de aquisição das viaturas alegado pela Autora/Recorrente, pelo que não se pode deixar de considerar tais factos como provados (na exata medida da alegação da Autora/Recorrente), tendo nomeadamente em conta que não foi produzida qualquer prova em sentido contrário. 9) As referidas provas produzidas nos autos impunham que o Tribunal a quo desse por provado o respetivo preço (cada montante) pago pela Autora/Recorrente por cada um desses 29 camiões, e não concluir, como sucedeu na Sentença recorrida, “por um preço não concretamente apurado” para cada uma dessas viaturas, pelo que, atendendo aos concretos meios probatórios referidos, os pontos de facto vertidos nas alíneas i) a kk) dos factos provados deverão ser alterados em conformidade. B. Da Impugnação do Facto Não Provado f) 10) A Recorrente considera que devia ter sido dado como provado o facto não provado f). 11) A quantificação do dano em 16,68% do preço bruto das viaturas (preço de aquisição deduzido de 10%) sofrido pela Autora/Recorrente é colocada em causa pela Sentença recorrida. 12) Salvo o devido respeito, mal andou o douto Tribunal a quo nesta parte, pois a quantificação do dano em 16,68% do preço bruto das viaturas (preço de aquisição deduzido de 10%) é fundamentada em prova de natureza técnica que a Autora/Recorrente juntou aos autos: parecer designado “Relatório de Peritagem, Avaliação de Prejuízos, Cartel dos Camiões – EU”, de 2021, tendo prestado depoimento em audiência de julgamento um dos seus co-autores, (…), que confirmou os fundamentos e conclusões extensamente explanados nesse relatório. 13) O Relatório (também apelidado de “Relatório Z...”) foi elaborado por uma equipa de peritos em economia forense – constituída por (…), (…) e (…) e, ainda, (…), doutorada em economia e professora de economia aplicada (econometria) na Universidade ..., em colaboração com uma equipa de investigação da mesma Universidade –, contendo a referência a todas as fontes em que se baseia, quer quanto à metodologia utilizada, quer quanto aos dados mobilizados, nomeadamente os índices de preços brutos ou industriais que são de acesso público. 14) Este relatório permite não só atestar a existência de um dano derivado da infração cometida pela Ré, como também proceder à estimativa da sua quantificação. 15) No que respeita à existência de um dano, tal constatação do Relatório Z... não advém de qualquer presunção de que o mesmo existe – o que também não seria reprovável por estar estabelecido e reconhecido na Decisão da Comissão, como a Sentença recorrida reconhece, e bem –, mas inclui provas reais e indiscutíveis do aumento anormal (no sentido de fora do funcionamento normal do mercado) dos preços durante o período do cartel. 16) São observados indícios em todos os índices considerados de forma agrupada no índice global, que reproduz a evolução dos preços brutos dos camiões durante o período do cartel, o que é salientado como um sinal de robustez de tais índices para servirem de contributo para o cálculo do sobrecusto verificado. 17) As provas ou evidências de ter existido um sobrecusto ou incremento dos preços como consequência do cartel são indiscutíveis, devendo destacar-se que o Relatório Z... não se limita a considerar separadamente essas evidências como justificação do cálculo final alcançado, antes utilizam-nas para assegurar a robustez dos índices de preços, que depois agrupam num índice global, ao qual aplicam as correções pertinentes para compensar os custos adicionais provocados pelas sucessivas obrigações de introdução de tecnologia antipoluição (normas Euro 3 a 6) e obtêm, finalmente, o índice que reflete a evolução dos preços brutos no Espaço Económico Europeu durante o período do cartel, claramente afetados por este no sentido ascendente, provando, assim, definitivamente a existência do dano, passando depois a quantificá-lo. 18) No que respeita à estimativa ou quantificação do dano, deve partir-se em primeiro lugar da circunstância indiscutível de ser impossível determinar de forma exata e matemática qual foi o sobrecusto provocado pelo cartel no preço de venda dos camiões afetados, já que, para tanto, seria necessário comparar-se o preço pago pela Autora/Recorrente com os que teriam sido pagos num mercado europeu que não houvesse estado distorcido pela atividade do cartel, o que é por definição algo hipotético e corresponde a um passado que não aconteceu, por praticamente a totalidade de operações de venda de camiões (milhões) na União Europeia durante um período amplíssimo (14 anos, desde 1997 a 2011), e que para além do mais contempla uma crise económica, ter estado indubitavelmente afetada pelo cartel. 19) Daí a necessidade de recorrer a métodos estimativos ou comparativos, o que é pacífica e plenamente aceite por toda a doutrina e jurisprudência existente sobre este tipo de distorções de mercado, estando mesmo consagrado pela própria União Europeia no Guia Prático: quantificação do dano nas ações de indemnização com base nas infrações aos artigos 101.º e 102.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (“Guia Prático”), cujo parágrafo 12.º faz eco de tal impossibilidade de quantificação direta. 20) O parágrafo 33 do Guia Prático enumera possíveis métodos comparativos suscetíveis de serem utilizados: i) o mesmo mercado num período anterior e/ou posterior à infração; ii) um mercado geográfico distinto, mas semelhante; iii) um mercado do produto distinto mas semelhante. 21) O que se faz no Relatório Z... é respeitar ao máximo este Guia, selecionando o único método possível dos três: a comparação com um mercado de produto distinto mas semelhante – com o cuidado de o reforçar com testes de robustez prévia baseados numa comparação diacrónica (de períodos de tempo distintos) e numa comparação de diferentes mercados geográficos –, pois a dimensão deste cartel, tanto a nível temporal como geográfico, impede a utilização válida de qualquer um dos restantes métodos. 22) Para calcular a percentagem média de sobrecusto causada pelo cartel aqui em causa, aquilo que o Relatório Z... fez foi, em primeira linha, selecionar três índices parciais – (i) IPRI (Índices de Preços Industriais) para camiões da Alemanha e Países Baixos; (ii) Índice de preços de venda unitários da Volvo e Scania; (iii) PRODCOM – lista de produtos das estatísticas de produção da Comunidade para três segmentos de camiões –, todos devidamente fundamentados no relatório, e, posteriormente, agrupá-los num índice único – o “Índice de Preços Global” – que agrega toda a informação significativa e que consiste na média dos índices parciais acima referidos e que irá replicar o comportamento dos preços brutos dos camiões durante todo o período do cartel, para toda a EU e para todos os fabricantes e modelos de camiões do cartel, índice este que é depois ajustado tendo em conta os efeitos do aumento dos custos da introdução das normas antipoluição Euro 3 a 6, e que dá origem ao “Índice Global Ajustado”. 23) Depois, o Relatório Z... procede à comparação do diferencial de crescimento deste “Índice Global Ajustado” com o produto ou mercado de produtos que foi considerado mais semelhante: o “IPRI (Índice de Preços Industriais) de veículos a motor a nível europeu”, obtido através da lista de produtos PRODCOM do Eurostat, concluindo que “[c]onvertendo estas duas séries com base 100 no ano de 1996 (o ano de 1997 é o início do cartel) e considerando as diferenças entre estes dois índices, no período colusivo a média do sobrepreço produzido pelo efeito cartel é de 16,68%” (cfr. pág. 79 do Relatório). 24) Tal como referido no relatório e explicado em audiência de julgamento pela testemunha (…), um dos seus co-subscritores, as razões para a eleição, como comparação, do mercado geral de veículos a motor a nível europeu, prende-se com o facto desse mercado incluir também os próprios camiões afetados, assim como outros veículos industriais (furgonetas, camiões ligeiros e automóveis de passageiros para uso comercial), juntamente com automóveis de passageiros para uso privado, com semelhanças óbvias em termos de fabricação dos produtos, custos e fatores que podem influenciar a procura e a oferta. 25) Aqui chegado, o Relatório Z..., a partir do referido resultado do cálculo do sobrecusto (16,68%), procedeu à sua aplicação individualizada ao caso concreto de cada camião em causa nos presentes autos, tendo em conta as características técnicas dos mesmos, que constavam na documentação oficial fornecida pela Autora/Recorrente e descontando, em todo o caso, todos os possíveis extras não suscetíveis de formar parte do preço “cartelizado” – o que pode ser comprovado nos “Certificados de Avaliação “e na “Ficha de Avaliação” individuais de cada camião anexos ao relatório –, tendo ainda, por prudência, sido descontado no cálculo efetuado 10% ao preço de venda de cada camião, constante da respetiva fatura. 26) É inquestionável que o relatório junto pela Autora/Recorrente representa um esforço probatório tremendo, oferecendo uma robustez assinalável, é fundamentado em dados extensíssimos, verificáveis e não erróneos, parte dos pressupostos corretos e segue religiosamente o Guia Prático, ou seja, este relatório formula uma hipótese razoável, legal e tecnicamente fundamentada, pelo que as suas conclusões deviam ter sido atendidas. 27) Dúvidas houvesse quanto à fiabilidade e credibilidade do referido relatório, veio a testemunha (…) evidenciar, através do seu depoimento, com isenção, credibilidade e idoneidade, o mérito das conclusões apresentadas no mesmo. 28) Por tudo o exposto, e salvo o devido respeito, mal andou a Sentença recorrida, em considerar que a Autora/Recorrente não aportou aos autos prova bastante para considerar devidamente quantificado o dano sofrido em 16,68 % do preço bruto dos camiões (preço de aquisição deduzido de 10%), pelo que, o facto não provado f) deve ser eliminado do elenco dos factos não provados e passar a constar do elenco dos factos provados, e, consequentemente, a indemnização a atribuir à Recorrente deve ser quantificada com base nesse facto que se deve considerar como provado, devendo a Ré ser condenada ao pagamento de uma indemnização à Autora/Recorrente no valor global de € 1.242.155,36 (um milhão duzentos e quarenta e dois mil cento e cinquenta e cinco euros e trinta e seis cêntimos), acrescida dos juros de mora vencidos desde a data da produção dos danos e dos que se vencerem até integral pagamento. C. DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE DIREITO 29) O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na aplicação do direito à matéria de facto provada. A. Do quantum do dano com o recurso a estimativa judicial não aproximada 30) Desconsiderando – erradamente, pelas razões que se expuseram supra, daí a impugnação factual em causa – a valia probatória do Relatório Z..., que quantificou em 16,68% o sobrecusto suportado pela Autora/Recorrente na aquisição dos camiões que se encontram no elenco dos factos provados, recorreu o Tribunal a quo a estimativa judicial para fixar esse sobrecusto em apenas 5% do preço de aquisição de cada veículo. 31) O Tribunal a quo procurou escudar a sua posição e decisão, nomeadamente no vertido no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 06-11-2023, Processo n.º 54/19.6YQSTR.L1-PICRS, disponível em www.dgsi.pt, o qual fixou igualmente o sobrecusto, nesse caso, em 5% pela via de estimativa judicial, mas – ressalve-se – relativamente a um caso em que o número de veículos era manifestamente mais reduzido (apenas 10 camiões) e o período das aquisições em causa totalizava apenas aproximadamente metade do tempo total da infração, ou seja, com manifestas diferenças relativamente ao caso sub judice. 32) Ainda assim, não deixou de reconhecer o referido Acórdão, baseando-se no estudo Oxera 2009, que “em termos de probabilidades, um cartel tem uma elevada probabilidade de implicar um sobrecusto de pelo menos 10%”, ainda para mais, atentas as “características do cartel em causa e respetiva gravidade do qual se salienta a sua longa duração, enorme extensão territorial, elevada quota de mercado e intensas trocas de informações sensíveis e coordenação para aumentos de preços, tal valor não se afigura, pelo menos prima facie, exagerado.” 33) Crê-se que o referido Acórdão apenas não decidiu fixar em 10%, por estimativa judicial, o valor do sobrecusto pelas razões que se apontaram, de onde ressalta o facto do número de veículos aí em causa ser manifestamente reduzido (apenas 10) e o período das aquisições ser apenas cerca de metade do tempo total da infração, o que é manifestamente diferente no caso sub judice, em que está em causa um total expressivo de 115 camiões e as aquisições reconduzem-se à totalidade do período da infração (ocorreram entre 29.01.1997 e 07.01.2011, sendo que, como se sabe, a infração verificou-se entre 17 de janeiro de 1997 e 18 de janeiro de 2011), daí que o Tribunal a quo devesse ter decidido por uma estimativa judicial de um sobrecusto de, pelo menos, 10% do preço de aquisição de cada camião. 34) Ao assim não decidir, o Tribunal a quo violou o artigo 9.º, n.º 2, da Lei 23/2018, de 05 de junho, pois não fez uma estimativa aproximada do concreto sobrecusto. B. Da errada decisão relativa ao momento a partir do qual devem ser calculados os juros de mora relativamente aos veículos adquiridos por contratos de compra e venda 35) Considerou a Sentença recorrida que a Autora, ora Recorrente, tem direito a juros de mora desde a data da produção dos danos e que essa data corresponde ao momento em que a Autora despendeu o custo adicional gerado pela infração. 36) Todavia, de forma contraditória com o referido, entendeu e decidiu a Sentença recorrida que em relação aos veículos adquiridos através de contratos de compra e venda terá de ser considerada, para efeitos de início do cálculo de juros, a data de instauração da petição inicial (31.03.2020). 37) A propósito da data relativamente à qual devem ser contados e calculados os juros de mora neste tipo de ação indemnizatória relativa ao denominado “cartel dos camiões”, já se pronunciou o Tribunal da Relação de Lisboa, no referido Acórdão de 06-11-2023, no âmbito do Processo n.º 54/19.6YQSTR.L1-PICRS, disponível em www.dgsi.pt, no qual se pode ler que “o dies a quo dos danos coincide com os seguintes dias: - o dia da aquisição dos veículos (ou do registo da propriedade, caso apenas conste dos autos essa data), nos casos em que a Autora celebrou contratos de compra e venda (…)”. 38) Conforme decorre deste Acórdão, nos casos em que a Autora/Recorrente celebrou contratos de compra e venda (cfr. viaturas referidas nas alíneas i) a jjjjj) dos factos provados), a data relevante para efeitos de contabilização de juros é a data da produção dos danos, a qual se reconduz às datas de aquisição dos veículos (ou do registo da propriedade, caso apenas conste dos autos essa data), uma vez que tais momentos correspondem aos factos geradores dos danos. 39) Atendendo às respetivas datas que se enunciaram nas alegações como relevantes para o início da contagem dos juros relativamente a cada camião adquirido por contrato de compra e venda (as datas de aquisição dos veículos no que respeita aos referidos nas alíneas ll) a jjjjj) da factualidade provada, ou as datas do registo da propriedade relativamente aos veículos referidos na alíneas i) a kk) da mesma factualidade) são devidos, desde essas datas e até efetivo e integral pagamento, juros de mora civis, às sucessivas taxas legais em vigor, de acordo com a Portaria n.º 1171/95, de 25 de setembro (até 16/04/1999), Portaria n.º 263/99, de 12 de abril (17/04/1999 a 30/04/2003) e com a Portaria n.º 291/2003, de 08 de abril (01/05/2003 até à presente data). 40) Decidir de modo diferente, como fez a douta Sentença recorrida, acarreta a violação do artigo 805.º, n.º 2, al. b) e n.º 3, primeira parte, do Código Civil, à luz da interpretação conforme com o Direito da União Europeia e do princípio da efetividade, além de constituir uma decisão que se revela díspar entre os diferentes Estados Membros, quebrando-se a uniformidade desejável. TERMOS EM QUE, com o douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, a Decisão Recorrida ser revogada e substituída por outra em conformidade, assim se fazendo JUSTIÇA! * A AB Volvo ofereceu contra-alegações, em que apresenta as seguintes conclusões: A. DO OBJETO DO RECURSO COMO CONFIGURADO PELA RECORRENTE 1) Nas Alegações de Recurso da TN, a Recorrente alega que (i) os factos provados i) a kk) foram incorretamente julgados, na parte em que referem “por um preço não concretamente apurado”; (ii) devia ter sido dado como provado o facto não provado f), referente à quantificação do dano em 16,68% do preço bruto das viaturas; (iii) o Tribunal Recorrido incorreu em erro de julgamento na aplicação do direito à matéria de facto provada, em particular em relação ao quantum do dano com recurso a estimativa judicial não aproximada; e (iv) que mal andou o Tribunal Recorrido ao decidir que, em relação aos veículos adquiridos através de compra e venda, terá de ser considerada, para efeitos de início do cálculo de juros, a data da instauração da petição inicial. 2) Nas presentes contra-alegações, a Recorrida limitar-se-á aos pontos da Sentença Recorrida que foram objeto das Alegações de Recurso da TN. 3) Quanto ao demais vertido na Sentença Recorrida e em relação à qual a Recorrente se opõe, remete-se para as Alegações de Recurso da VT, apresentadas em 14.5.2024, nomeadamente, quanto: (i) à inadmissibilidade do recurso a uma estimativa judicial e (ii) ao valor concretamente fixado pelo Tribunal Recorrido. B. INTRODUÇÃO 4) Nas presentes Contra-Alegações de Recurso, a Recorrida começará por demonstrar que não resultou da prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento que os preços indicados na Petição Inicial tenham sido os preços efetivamente pagos pela Recorrente, sendo que nenhuma prova documental foi carreada para os autos que permitisse confirmar o alegado pela Recorrente a este respeito, razão pela qual deve o valor de aquisição dos veículos constantes das alíneas i) a kk) do elenco dos factos provados na Sentença Recorrida manter-se como não provado, tal como decidido pelo Tribunal Recorrido. 5) A Recorrida sublinhará ainda que a Recorrente não cumpriu o ónus da prova quanto ao dano, ao nexo de causalidade e à quantificação do alegado dano, pelo que o Tribunal Recorrido julgou bem ao dar como não provado o facto f) do elenco dos factos não provados da Sentença, sempre se referindo que o Relatório Z..., para além de assentar em assunções infundadas e erradas, apresenta graves falhas metodológicas que descredibilizam os seus resultados e o tornam inapto a fazer prova das alegações da Recorrente. 6) A Recorrida sublinhará ainda que a fixação do quantum indemnizatório em 10%, por via da aplicação de uma estimativa judicial, não é admissível, não sendo também admissível o cálculo dos juros a partir da data de aquisição dos veículos adquiridos por compra e venda, como pretende fazer crer a Recorrente. C. DO (DE)MÉRITO DO RECURSO DA RECORRENTE 1. DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO 1.1. O Tribunal julgou bem ao dar como não provado o valor de aquisição dos veículos constantes das alíneas i) a kk) do elenco dos factos dados como provados na Sentença 7) Na Sentença Recorrida, o Tribunal a quo salientou que existe um conjunto de 29 veículos – identificados nas alíneas i) a kk) dos factos provados da Sentença Recorrida – em relação aos quais não foi possível apurar o preço. 8) Entende a Recorrente que as provas produzidas nos autos impunham que o Tribunal a quo desse por provado o respetivo pago por cada um desses 29 camiões, mas não resultou da prova testemunhal produzida em sede de audiência de julgamento que os preços indicados na Petição Inicial tenham sido os efetivamente pagos pela Recorrente com cada uma das aquisições dos referidos veículos, do mesmo modo que nenhuma prova documental foi carreada para os autos que permitisse confirmar o alegado pela Recorrente a este respeito. 9) De acordo com o regime legal da distribuição do ónus da prova aplicável aos autos, cabendo à Recorrente alegar e provar os factos constitutivos do direito de que se arroga titular, não bastava alegar que os veículos foram adquiridos por um determinado preço. Devia ter oferecido prova dos preços que indicou na Petição Inicial, o que não logrou fazer. Vejamos em detalhe: 1.1.1. Cabia à Recorrente o ónus de provar o preço de aquisição dos veículos 10) Ao caso dos autos aplicar-se-ão, tão só, as regras gerais do direito civil relativamente à responsabilidade pelo facto ilícito, aos meios de prova e à repartição do ónus da prova, sendo que o regime legal da distribuição do ónus da prova encontra assento geral no artigo 342.º do CC e no artigo 414.º do CPC. 11) A Recorrente estava, assim, onerada com a demonstração do preço dos veículos que alegou, desde logo porque a indemnização de que se arroga titular – a ser arbitrada (no que não se concede, mas apenas por cautela de patrocínio se equaciona) – teria de ser calculada sobre tal preço, mas a Recorrente não apresentou meios de prova suficientemente robustos que possam ser considerados nestes autos e, por isso, não logrou confirmar os preços que alegou na Petição Inicial. 12) Além disso, dar como provados os preços alegados pela Recorrente sem que tenha sido carreado para os autos elementos probatórios que permitam chegar a tal conclusão acarretaria o risco de atribuir uma compensação excessiva à Recorrente caso os veículos em questão tivessem afinal sido adquiridos por um preço inferior ao alegado, o que equivaleria a um enriquecimento sem causa que o nosso sistema simplesmente não permite. 1.1.2. A prova produzida não permite concluir qual o preço de aquisição dos veículos identificados nas alíneas i) a kk) dos factos dados como provados. 13) Em nenhum momento do depoimento das testemunhas estas terão confirmado os preços alegados pela Recorrente. Pelo contrário, e como bem nota o Tribunal Recorrido, a única prova produzida sobre esta matéria reconduziu-se ao depoimento prestado pela testemunha arrolada pela Recorrente (…) - mas, nesta parte, foi muito pouco concreto, objetivo e consistente e sem elementos de suporte, quando de acordo com as suas afirmações, deveriam existir. 14) É certo que esta testemunha referiu que os preços dos veículos dos autos estariam em faxes, notas de encomenda, extratos de conta corrente e notas de liquidação, mas não existe a mínima evidência desses documentos nos autos e, por assim ser, o depoimento da testemunha não pode merecer credibilidade nesta parte – neste sentido entendeu (e bem) o Tribunal Recorrido. 15) Do requerimento apresentado pela Nors, S.A. em 22.2.2022 (com a ref.ª Citius ...41) resulta apenas que os veículos terão sido pagos, mas não resulta qual o preço de aquisição de cada um deles, nem foi carreada para os autos qualquer documentação que permita identificar tal preço 16) Não existindo elementos probatórios no processo que permitam aferir o preço dos veículos, fica evidente que a Recorrente não cumpriu o ónus que sobre ela impendia, pelo que não poderia o Tribunal Recorrido dar como provados os preços alegados pela Recorrente na Petição Inicial. 17) A pretensão recursória da Recorrente não tem, por isso, qualquer fundamento válido. Nesse sentido, deve o valor de aquisição dos veículos constantes das alíneas i) a kk) do elenco dos factos provados na Sentença Recorrida manter-se como não provado, tal como decidido pelo Tribunal Recorrido. 1.2. O Tribunal julgou bem ao dar como não provado o facto f) do elenco dos factos não provados da Sentença 18) Na Sentença Recorrida, o Tribunal Recorrido deu como não que “[o] valor que a A. pagou a mais pelos camiões identificados nos factos provados e que não teria pago caso a infração não tivesse verificado fixou-se em 16,68% do preço bruto das viaturas (preço de aquisição deduzido de 10%) […]” – facto f) do elenco dos factos não provados da Sentença Recorrida, algo com que a Recorrente não concorda, advogando que esse facto ficou provado nos autos. Não assiste, no entanto, qualquer razão à Recorrente. . 1.2.1 Cabia à Recorrente o ónus de prova do dano e do nexo de causalidade 19) De acordo com regras da distribuição do ónus da prova aplicável ao presente caso, era à Recorrente que cabia alegar e provar o dano, o nexo de causalidade e a respetiva quantificação. 20) A Recorrente não o conseguiu fazer, pelo que bem andou o Tribunal Recorrido ao dar por não provado esse facto f) do elenco dos factos não provados. 21) No que concerne ao pressuposto legal do dano, a Recorrente estaria sempre onerada com a demonstração de que a Infração lhe causou um dano concreto e o respetivo quantum, pelo que não bastava alegar que os Veículos foram vendidos por um “preço superior ao que seria devido” em resultado da Infração, o que aliás não ocorreu. 22) Por outro, lado, a Recorrida demonstrou cabalmente (como se verá) que a prova produzida pela Recorrente sofre de imensas e inultrapassáveis fragilidades que fazem com que não sejam aptas a provar a existência de qualquer dano, uma vez que contrariam a mais básica teoria económica e assentam em pressupostos não demonstrados e não justificados. 23) Em qualquer caso, não podia o Tribunal Recorrido socorrer-se de uma presunção judicial para suprir a falta de prova do dano e nexo de causalidade da Recorrente. Além disso, conforme melhor se demonstrou, da prova produzida pela Recorrida resultou amplamente demonstrada a inexistência de dano e nexo causal. 1.2.2. Contudo, a Recorrente não cumpriu o ónus de prova quanto ao dano, ao nexo de causalidade e à quantificação do alegado dano 24) O Relatório Z..., produzido pela Recorrente nos presentes autos, não tem a valia probatória que a Recorrente pretende que tenha, nem o facto de ter sido elaborado por académicos reconhecidos e com menção da fonte dos dados em que o estudo se baseia faz com que esse relatório se torne imediata e automaticamente idóneo a provar um qualquer sobrecusto. 25) No campo das ciências sociais, a seleção do método e das variáveis utilizadas são da maior importância, devendo ser adequados à questão a que se pretende dar resposta (neste caso, o cálculo de um alegado dano sofrido pela Recorrente), e é precisamente nesses pontos que o Relatório Z... apresenta várias e inultrapassáveis fragilidades. 1.2.2.1 O Relatório Z... não prova a existência de um alegado dano derivado da Infração 26) É importante reconhecer razão à Recorrente quando alega que a existência de um dano “não advém de qualquer presunção de que o mesmo existe”. Nestes termos, como já se analisou em detalhe nas Alegações de Recurso da VT, estava vedada ao Tribunal a quo a possibilidade de recorrer a quaisquer presunções de dano. 27) Pelo que cabia à Recorrente demonstrar a existência de dano. 28) Ao contrário do que parece alegar a Recorrente, a Decisão da Comissão não “estabelece” nem “reconhece” a existência de qualquer dano suportado pela ora Recorrente a respeito dos veículos peticionados, pelo que a interpretação da Recorrente do conteúdo da Decisão se mostra, mais uma vez, abusiva. 29) Ou seja, apesar de alegar que a existência de um dano não advém de qualquer presunção, a verdade é que a Recorrente assume, pura e simplesmente, que o mesmo se verificou, e o Relatório Z... nega expressamente a possibilidade de utilização de dados, variáveis ou índices que contradigam a possibilidade de não se terem produzido danos, o que introduz um viés inultrapassável e inadmissível neste tipo de estudos, em que se selecionam cuidadosamente as fontes para que o resultado atingido seja o pretendido ab initio. 30) Por outro lado, os índices utilizados no Relatório Z..., que a Recorrente alega confirmarem a robustez dos resultados atingidos, são, na verdade, imprestáveis para o efeito. O Professor (…), na sua Refutação, já havia explicado cabalmente a impossibilidade de esses índices, pelas características que lhes são ínsitas, serem utilizados para a prova e quantificação de quaisquer danos neste caso, já que não utilizam dados comparáveis à variável que se pretende estudar: a evolução do preço líquido dos camiões num cenário em que a Infração não havia ocorrido. 31) A acrescer, o mercado mexicano, que foi utilizado como comparador, é afetado por diferentes fatores de oferta e procura, não sendo representativo de como o mercado europeu e o português se teriam comportado se a Infração não tivesse existido. 1.2.2.2. Subsidiariamente: o Relatório Z... não prova que o alegado dano se traduziu num sobrecusto fixado em 16,68% do preço bruto dos veículos 32) O Relatório Z..., para além de não permitir concluir pela existência de um dano na esfera jurídica da Recorrente em virtude da Infração, também não permite o cálculo da extensão desse suposto dano. 33) O Relatório Z... não oferece garantias de suficiente credibilidade e robustez que cumpram com o standard probatório vigente no nosso ordenamento jurídico, algo que é apontado pelo próprio Tribunal Recorrido. 34) Apesar de utilizar um método previsto no Guia Prático, a verdade é que os dados e variáveis utilizados, a forma como a metodologia foi empregue e as assunções não explicadas e não fundamentadas em que assenta o estudo inquinam inelutavelmente os resultados a que chega esse relatório. 35) De entre as assunções infundadas e erradas do Relatório Z..., destacam-se as assunções de que: e. apesar de não ter incluído dados específicos sobre Portugal, os seus resultados seriam também aplicáveis às vendas praticadas neste país; f. haveria uma ligação forte e direta ente preços brutos de tabela e preços líquidos (ainda que a Recorrente desminta expressamente esta asserção no §38 das suas Alegações de Recurso da TN); g. os veículos de motor seriam comparadores adequados do mercado dos camiões. 36) Já relativamente às falhas metodológicas, destacam-se, resumidamente: a. não obstante o Relatório Z... afirmar utilizar índices de preços brutos, a verdade é que o Índice de preços Volvo-Scania continha apenas preços líquidos (i.e., já com desconto), podendo ser eles preços de venda ao concessionário ou mesmo preços de venda ao consumidor final; b. a ausência de controlo para verificar se os valores presentes nos índices podem ser explicados por variações na procura e na oferta, no mix de camiões produzidos e vendidos a cada momento, custos, pressão concorrencial, havendo uma constante assunção inexplicada de que não houve qualquer mudança nestas variáveis explicativas do preço – o que faz com que os índices incluídos no Relatório Z... não satisfaçam critérios básicos de comparabilidade; c. o uso de um número muito pequeno de observações para operações estatísticas complexas, que normalmente exigem muitos mais dados (e.g., a regressão econométrica para obter dados para os anos em falta no IPRI para Alemanha e Países Baixos, bem como a comparação dos dados destes países com os dados mexicanos); d. a não explicitação da taxa de câmbio utilizada no contexto do índice de preços Volvo-Scania, não tendo sido possível à Recorrida perceber/replicar qual teria sido essa taxa; e. a apresentação de testes de robustez com resultados pouco razoáveis, que sugerem que o aumento da procura dos camiões levaria a descidas nos seus preços, bem como a não tomada em consideração de indicações, em sede desses testes, de que não teria existido sobrecusto no período da Infração; f. a combinação, através de uma simples média, no Índice Global de Preços de três índices parciais que dizem respeito a realidades distintas, não combináveis entre si desta forma simplista; g. o não fornecimento de quaisquer pormenores quanto ao ajuste do Índice Global de Preços aos custos relacionados com a implementação das normas de controlo de emissão. 37) Cumpre ainda notar que a Recorrente transcreveu integralmente as respostas a instâncias do mandatário da Recorrente na audiência de julgamento em que prestou depoimento (…), ficando a Recorrida sem perceber que conclusões pretende a Recorrente retirar dessa transcrição integral. 38) Se o objetivo era clarificar os pontos que são abordados nas alegações de recurso da Recorrente, então esse exercício é oco e desprovido de sentido, na medida em que o perito se limitou a repetir as frágeis conclusões a que chegou no Relatório Z.... 39) Por outro lado, a omissão da Recorrente na transcrição das respostas de (…) a instâncias do mandatário da Recorrida não será certamente inocente, já que o que fica patente dessa parte do depoimento são as enormes fragilidades metodológicas de que sofre o Relatório Z..., que não foram explicadas ou justificadas pelo perito, mas antes ficaram cabal e irremediavelmente expostas. 40) Considerando todos os erros e falhas do Relatório Z... e a consequente inexistência de valor probatório dos mesmos, não pode ter procedência a pretensão da Recorrente no sentido de “o facto não provado f) [ser] eliminado do elenco dos factos não provados e passar a constar do elenco dos factos provados, e, consequentemente, a indemnização a atribuir à Recorrente [seja] quantificada com base nesse facto que se deve considerar como provado”. 1.2.3 Pelo que bem andou o Tribunal Recorrido ao não dar como provado o sobrecusto de 16,68%, tal como pretendido pela Recorrente 41) Nem o Relatório Z... nem o depoimento de (…) provam que da Infração tenha resultado um qualquer sobrecusto para a Recorrente, e muito menos ficou provado que tal alegado sobrecusto se fixou numa percentagem de 16,68%. 42) Pelo que deve improceder, também nesta parte, a pretensão recursória da Recorrente. 2. A ESTIMATIVA DO QUANTUM EM PELO MENOS 10%, COMO ALEGADO PELA RECORRENTE, É DESADEQUADA E INADMISSÍVEL 2.1. Questão prévia: não estão preenchidos os requisitos para o recurso à estimativa judicial 43) Cumpre, a título prévio, fazer uma breve nota para esclarecer que, tanto o Tribunal Recorrido como a Recorrente partem de uma premissa errada, i.e., da admissibilidade do recurso à estimativa judicial no caso concreto. 44) A Recorrente não logrou provar de forma cabal que tivesse sofrido qualquer dano, e assim, por aplicação das regras sobre ónus de prova, resulta clara a improcedência da ação. 45) Por isso, no entender da Recorrida, o Tribunal Recorrido socorreu-se de uma estimativa judicial arbitrária e ilegal para quantificar o dano alegado pela Recorrente, ignorando as regras sobre distribuição do ónus da prova e sobre o standard probatório que era exigido a esta última. 46) A estimativa judicial não é um instrumento automático aplicável a qualquer processo de responsabilidade civil que surja na sequência de uma infração ao direito da concorrência. Na verdade, a estimativa judicial de danos é um instrumento excecional – uma ultima ratio – e, em qualquer caso, subsidiário. Há, portanto, requisitos estritos que devem ser cumpridos para que a estimativa judicial seja admissível. 47) No caso sub judice, o Tribunal Recorrido recorreu a este instrumento sem que se encontrassem preenchidos os requisitos para a sua aplicação quer por via do artigo 9.º, n.º 2 da LPE (lei especial), quer pela via do artigo 566.º, n.º 3 do CC. 48) Ao contrário do que era exigido pela Diretiva (e pela LPE) e pela jurisprudência do TJUE, o Tribunal Recorrido aplicou uma presunção de danos e recorreu a uma estimativa judicial num caso em que: (i) a demandante não demonstrou a existência de danos; (ii) a quantificação do alegado dano não se revelou, na prática, impossível ou excessivamente difícil. 2.2. Subsidiariamente, da inadmissibilidade da estimativa do quantum em 10% ou 5% 49) Neste ponto, as Recorrente e Recorrida concordam: a estimativa judicial de 5% de sobrecusto a que chegou o Tribunal a quo não é acertada ou adequada a traduzir o putativo sobrecusto suportado pela Recorrente, tendo em conta a prova produzida nos autos. 50) Claro está que Recorrente e Recorrida discordam, depois, no que diz respeito àquela que deveria ter sido a decisão tomada na Sentença Recorrida em relação ao quantum estimado de alegado sobrecusto, defendendo a Recorrente que o Tribunal a quo devia ter estimado o dano em 10% de sobrecusto, e a Recorrida que o Tribunal Recorrido devia ter estimado o putativo dano em 0% de sobrecusto. 2.2.1 Da inadmissibilidade da fixação do quantum em 10% 51) Relativamente à alegação da Recorrente de que o Tribunal Recorrido devia ter estimado o dano em 10% de sobrecusto, não assiste à Recorrente qualquer razão. 52) É que, para defender a fixação do dano em 10% de sobrecusto, a Recorrente alega que, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 6.11.2023, proferido no âmbito do processo 54/19.6YQSTR.L1-PICRS, o Tribunal da Relação apenas teria decidido pelos 5% de sobrecusto (e não pelos 10%) devido ao número reduzido de camiões nesses autos (comparativamente ao número de camiões que a Recorrente adquiriu) e ao período temporal mais reduzido (comparativamente ao período temporal mais lato no caso dos autos) em que as aquisições alegadamente ocorreram. 53) Esta é uma leitura enviesada e míope – abusiva, até – do referido Acórdão. Para além disso, não há nada na teoria económica que suporte esse raciocínio da Recorrente, pelo que o mesmo terá de ser considerado improcedente. 54) Se um lesado com uma prática anticoncorrencial adquiriu mais vezes ou durante mais tempo um tipo de bem objeto de um cartel, terá porventura suportado um eventual sobrecusto mais vezes (i.e., tantas vezes quantas as aquisições desse tipo de bem) face a um outro lesado que não tenha adquirido esse tipo de bem tantas vezes ou durante tanto tempo. 55) No entanto, a percentagem – por referência ao preço de aquisição de cada bem – do sobrecusto suportado por um e por outro lesado não depende, como é óbvio, dessa variação relativa ao número de aquisições ou ao período durante o qual os potenciais lesados adquiriram os bens. 56) Novamente, não deixa de ser sintomático que a Recorrente não cite qualquer literatura económica num sentido minimamente convergente com o que alega. 57) Na verdade, tendo a Comissão concluído por uma Infração única e continuada, e não constando da Decisão nenhuma passagem que leve a assumir que tenham existido períodos de maior ou menor cooperação entre os fabricantes de camiões, a existir sobrecusto, no que não se concede, nada indica que o mesmo variasse – no sentido do que parece pretender a Recorrente –, ao longo do período da Infração. 58) Sendo assim, só se pode concluir que a Recorrente não tem qualquer razão ao alegar que sai violado, com a Sentença Recorrida, o artigo 9.º, n.º 2, da LPE, apenas porque a estimativa a que chegou o Tribunal Recorrido ficou aquém do pedido pela Recorrente. Assim, o seu recurso deve ser considerado, também neste ponto, totalmente improcedente. 2.2.2. Em qualquer caso, da inadmissibilidade da fixação do quantum em 5% 59) Ainda que o recurso à estimativa judicial no presente caso fosse juridicamente admissível – no que não se concede e apenas por cautela de patrocínio se equaciona –, nunca poderia, em qualquer caso, o Tribunal a quo ter decidido por um quantum de sobrecusto equivalente a 5% do preço alegadamente pago por cada camião. 60) É que o entendimento adotado pelo Tribunal Recorrido mais não é do que uma espécie de translado do entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa, plasmado no seu acórdão proferido no âmbito do processo n.º 54/19.6YQSTR.L1. 61) Entendimento que não deverá ser seguido, já que o referido acórdão ainda não transitou em julgado por do mesmo ter sido interposto recurso com fundamentação muito semelhante àquela que motiva o recurso no caso sub judice. 62) Por não fundamentar o seu entendimento nas circunstâncias do caso decidendo, a decisão do Tribunal Recorrido no sentido de fixar o sobrecusto em 5% do valor pago pelos veículos dos autos só pode ser tida como arbitrária. 2.2.2.1. A repercussão e/ou mitigação do alegado sobrecusto deveria ter sido computada na estimativa judicial do dano 63) O Tribunal Recorrido andou mal ao dar por não provado que “A Autora repercutiu qualquer incremento dos seus custos nos preços por si praticados pelos seus serviços, aumentando esses preços” (facto não provado g)). 64) É que a conclusão que se impunha retirar da prova produzida é que, efetivamente, a existir um sobrecusto – no que não se concede e apenas por cautela de patrocínio se equaciona –, o mesmo teria sido repassado ou repercutido pela Recorrente junto dos seus clientes através dos preços cobrados pelos serviços que lhes presta. 65) O Tribunal Recorrido baseou a sua motivação - quanto à não verificação da repercussão - apenas na inconclusividade do Relatório Pericial, tomando como decisivas as afirmações genéricas que o Senhor Perito fez em tribunal e no seu relatório de perícia. 66) Contudo, no seu testemunho, o legal representante da Recorrente, (…) – com conhecimento de causa – afirmou existirem várias tentativas ao longo dos anos no sentido de se aumentarem os preços cobrados pela Recorrente pelos seus serviços junto dos seus clientes. 67) O Tribunal Recorrido aplicou, também aqui, um duplo standard de prova completamente inadmissível, pois releva asserções genéricas do Senhor Perito para dar como não provada a repercussão do sobrecusto, mas já não considera suficientes afirmações que corroboram a existência de repercussão feitas por um representante legal da Recorrente. 68) Além disso, tanto o depoimento do Professor (…) como as regras da experiência que ditam a fixação de preços por empresas permitem a conclusão pela existência da repercussão. 69) Acresce que, noutro processo também de natureza semelhante a estes autos (processo n.º 58/19...., pendente neste Tribunal, Juiz ...), onde também foi ordenado um exercício pericial para apurar a existência de uma eventual repercussão, o Tribunal concluiu, na sentença, no sentido de se ter verificado tal repercussão, na medida de 2%, ainda que perante um relatório pericial inconclusivo por falta de documentação (como sucedeu nos presentes autos). 70) Nesse processo, o Tribunal reconheceu a existência de tal repercussão essencialmente porque (i) aplicou o mesmo raciocínio utilizado para concluir pela existência de sobrecusto; e (ii) o Guia da Comissão sugere que se um cartel afetar todo o mercado, é muito provável que o sobrecusto seja repercutido, pelo menos em parte. 71) Tudo visto e ainda que a título subsidiário – porquanto não se concede na existência dos putativos danos supostamente resultantes da Infração e que tenham sido alegadamente causados à Recorrente – tendo o Tribunal entendido que a Recorrente sofreu o dano que alega (no que não acreditamos) e decidido recorrer à estimativa judicial para quantificar tal dano (o que achamos ser legalmente inadmissível) – então o Tribunal a quo deveria também ter tomado uma decisão com recurso à estimativa judicial quanto ao cálculo da medida da repercussão. 72) Não o fazendo, o Tribunal a quo incorre uma vez mais numa violação das regras sobre distribuição do ónus da prova, para além de injustificadamente tratar as partes de forma diferente. 73) Nestes termos, deve a Sentença Recorrida ser revogada e substituída por outra que efetue a devida quantificação da medida da repercussão do putativo dano, nos termos legalmente previstos, nos termos já requeridos nas Alegações de Recurso da VT. 3. O CÁLCULO DOS JUROS A PARTIR DA DATA DE AQUISIÇÃO DOS VEÍCULOS ADQUIRIDOS POR COMPRA E VENDA, COMO PRETENDE A RECORRENTE, É INADMISSÍVEL 3.1. Do cômputo dos juros relativos aos veículos adquiridos por compra e venda 74) Pretende a Recorrente que seja a Recorrida condenada no pagamento de juros de mora contabilizados desde a data de aquisição de cada um dos veículos adquiridos por compra e venda, mas tal não pode suceder porque, perante a insuficiência de factos quanto aos pagamentos (do preço, no caso de aquisição por compra e venda, e das rendas no caso de aquisições mediante locação financeira) – pela qual a Recorrente é a única responsável, como bem nota o Tribunal Recorrido - nunca seriam devidos juros desde um momento anterior à citação da ora Recorrida para a presente ação. 75) Nesta matéria deverá ser chamado à colação o disposto no artigo 805.º, n.º 1 e n.º 3, segunda parte, do CC: tratando-se de crédito com origem em responsabilidade por facto ilícito, como é o caso ora em apreço, “o devedor constitui-se em mora desde a citação” e, não tendo a Recorrente interpelado extrajudicialmente nunca a Recorrida, esta apenas se poderia constituir em mora no momento da citação. Por isso, a serem devidos juros nos presentes autos, no que não se concede, sempre o seriam por referência ao momento da citação da Recorrida até integral pagamento. 76) Além disso, no que respeita aos veículos identificados nas alíneas i) a kk) do elenco dos factos provados da Sentença Recorrida, o Tribunal Recorrido concluiu (e bem) que estes terão sido adquiridos “em data não concretamente apurada”, o que significa que não é possível identificar a data na qual tais veículos terão sido adquiridos pela Recorrente. Deste modo, nunca poderia proceder a pretensão da Recorrente de se contabilizarem juros desde a data de aquisição dos veículos (no caso de aquisição por compra e venda), uma vez que esta não é conhecida. 77) Nessa medida, e pelas razões acima expostas, deve a pretensão recursória da Recorrente ser rejeitada, e, por conseguinte, recusada a condenação da Recorrida no pagamento de juros. 3.2. Da prescrição dos juros peticionados pela Recorrente 78) Além disso, sempre estariam prescritos todos os juros vencidos em momento anterior aos cinco anos que antecederam a citação da Recorrida, de acordo com o disposto no artigo 310.º, alínea d) do CC. B. PEDIDO Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão: (iii) Deverá o presente recurso ser julgado totalmente improcedente (iv) Deverá o recurso apresentado pela aqui Recorrida ser considerado totalmente procedente, nos termos aí expostos, em consequência, ser a Sentença Recorrida revogada e substituída por outra, nos termos do qual se absolva a aqui Recorrida de todos os pedidos contra si formulados. Assim farão V. Exas. a COSTUMADA JUSTIÇA! * A TN – Transportes M. Simões Nogueira, SA, ofereceu contra-alegações, em que apresenta as seguintes conclusões: I. DO OBJETO DO RECURSO 1) Veio a Apelante interpor recurso da Sentença proferida pelo Tribunal recorrido em 31.03.2024, levantando uma questão prévia, formulando considerações prévias, impugnando a decisão sobre a matéria de facto e suscitando diversas questões de direito; não lhe assistindo, contudo, razão nenhuma em qualquer dos pontos que constituem o objeto do presente recurso. II. DA RESPOSTA À QUESTÃO PRÉVIA LEVANTADA PELA APELANTE (DA RETIFICAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA NA IDENTIFICAÇÃO DOS FACTOS EM SEDE DE MOTIVAÇÃO) 2)Contrariamente ao que a Apelante vem defender, a Sentença recorrida, a pp. 117 (no subtítulo que antecede o ponto 66), não pretendia [unicamente] fazer referência aos factos constantes das alíneas e) e f) dos factos não provados; o lapso existe, sim – e é suscetível de correção, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do art.º 614.º do CPC –, ao referir as alíneas ddd) a fff) dos factos provados, quando na realidade o Tribunal a quo se pretendia referir às alíneas rrrrr) e sssss) dos factos provados, que são, efetivamente, os factos que a Sentença recorrida intitula de «[f]actos relativos aos “prejuízos” e ao nexo de causalidade». III. DA RESPOSTA ÀS CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS ALEGADAS PELA APELANTE 1. A Sentença (não) é nula por manifesta contradição entre o seu sentido decisório e a respetiva fundamentação 3) A título de consideração prévia, considera a Apelante que a Sentença Recorrida deve ser declarada nula, por oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC; contudo, analisada a estrutura da decisão recorrida e as conexões existentes entre os motivos de facto e de direito a que faz apelo e o veredicto final verifica-se que existe uma lógica na arquitetura da Sentença e, dessa forma, a invocada nulidade não se verifica. 2. O Tribunal a quo (não) interpretou erradamente o âmbito e o alcance do princípio da efetividade 4) Também a título de consideração prévia, alega a Apelante que o Tribunal a quo interpretou erradamente o âmbito e o alcance do princípio da efetividade, mas razão não lhe assiste, pois o Tribunal recorrido, ao considerar que a Apelada não logrou provar a quantia exata do dano não obstante os esforços probatórios encetados – com o que não se concorda, daí ter sido interposto o competente e autónomo recurso pela aqui Apelada –, concluiu que, perante as circunstâncias objetivas do caso, tal determinação era praticamente impossível ou excessivamente difícil, daí ter feito uso do poder-dever de fixação do valor do dano com base em estimativa judicial prevista no artigo 9.º, n.º 2, da Lei n.º 23/2018, de 5 de Junho (que transpôs o artigo 17.º, n.º 1, da Diretiva 2014/104/EU), poder-dever, esse, que é expressão correta do princípio da efetividade. IV. DO RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO A. Questão Prévia: do ónus de impugnação da decisão relativa à matéria de facto a cargo da Apelante 5) No que respeita ao recurso sobre a matéria de facto da Apelante, diga-se, desde logo, que deverá ser rejeitada a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, como infra melhor se explicitará, uma vez que a Apelante falhou, de forma evidente, em cumprir o ónus legal que sobre si recaía, nos termos do artigo 640.º n.º 1 do CPC B. Da pretensão da Apelante de integração dos factos provados rrrrr) e sssss) no elenco de factos não provados 6) A Apelante impugnou a inserção dos factos provados rrrrr) e sssss), relativos ao prejuízo e ao nexo de causalidade, no elenco dos factos dados como provados, considerando que os mesmos se devem dar por não provados, porquanto alegadamente a Apelada não apresentou meios de prova suficientemente robustos que possam ser considerados nestes autos para a demonstração da existência de um dano e de nexo de causalidade entre facto e dano (alegadamente não cumprindo o ónus que sobre si impendia). 7) Primeiramente, note-se que da Decisão da Comissão é inevitável extrair a conclusão de que da infração cometida resultaram danos para a Apelada, e que esses danos resultaram (perdoe-se a redundância) da infração cometida pela Apelante: através da Decisão da Comissão, resulta demonstrada a existência de um cartel, no qual participou a Apelante, tendo a conduta sancionada consistido em acordos colusórios que, por sua vez, incluíram acordos e/ou práticas concertadas com o objetivo de alinhar os preços brutos dos camiões afetados e a subida dos mesmos no Espaço Económico Europeu, tendo em vista condicionar a determinação de preços independentes no mercado. 8) Tal como referido na Decisão, os preços dos camiões partem do preço de tabela bruto estipulado pelo fabricante e os preços líquidos pagos pelos clientes finais refletem os descontos aplicados sobre esse preço de tabela bruto inicial, então é inquestionável que um aumento na base, isto é, um aumento dos preços brutos irá refletir-se nos preços líquidos finais, independentemente dos descontos aplicados, pois que, se estes descontos são aplicados a uma base aumentada em consequência da infração, o preço líquido resultará aumentado na mesma proporção. 9) Assim, o dano sofrido pela Apelada, e, bem assim, o nexo causal entre o dano e a conduta ilícita da Apelante, é desde logo ínsito à fundamentação da Decisão da Comissão Europeia. 10) Em todo o caso, o Relatório Z... apresentado pela Apelada e o testemunho convergente de (…) demonstram, de forma evidente, que a Apelada cumpriu o ónus de alegação e demonstração que sobre si impendia, tal como considerou – e bem – a Sentença recorrida. 11) E mesmo que a Sentença recorrida não tenha concordado com a quantificação do dano sofrido pela Apelada em 16,68 % do preço bruto dos camiões (preço de aquisição deduzido de 10%) – com o que não se concorda, daí o recurso autónomo interposto pela Apelada –, o certo é que a alegação da existência de um sobrecusto – na medida cumprida pela Apelada – é bastante para a concretização do dano, na medida em que, ao ter havido um sobrecusto, resulta evidente que a Apelada suportou um montante relativo ao preço de aquisição de veículos que não teria suportado caso não tivesse havido uma infração. 12) Ademais, constate-se que há lugar à aplicação da teoria da probabilidade prevalecente, na medida em que, no que concerne ao dano, a hipótese fáctica visada – i.e., que a Apelada sofreu danos – encontra confirmação positiva nos meios de prova apresentados (desde logo, a Decisão da Comissão, o relatório Z... e o depoimento testemunhal de (…)), sendo ainda mais provável que a Apelada tenha sofrido danos do que a hipótese contrária. 13) Desta forma, conclui-se que é imperioso concluir pela manutenção dos pontos sssss) e rrrrr) no elenco dos factos dados como provados. C. Da pretensão da Apelante de aditamento de factos ao elenco dos factos dados como provados: 14) Pretende a Apelante aditar ao elenco de factos provados um conjunto de “factos”, que se enumeraram nas alegações – e que aqui nos dispensamos de reproduzir, em virtude da sua extensão –, só que, não só nenhuma prova se produziu no sentido de serem aditados esses “factos”, como nenhum dos “factos” que a Apelante pretende aditar se encontra admitido por acordo, provado plenamente por documentos ou por confissão reduzida a escrito, pelo que não cabe ao Tribunal ad quem proceder ao seu aditamento à matéria de facto. 15) É imperioso concluir, assim, que os referidos “factos” não podem ser incluídos no elenco de factos dados como provados, não devendo proceder a alegação da Apelante. D. Da pretensão da Apelante de integração de factos não provados no elenco dos factos provados: i. Da integração do facto não provado g) no elenco dos factos provados 16) Considera a Apelante que o facto g) constante do elenco de factos dados como não provados deve passar a integrar o elenco dos factos dados como provados, contudo, limita-se a tecer considerações genéricas, vagas e abstratas, não especificando os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imporiam decisão diversa sobre o ponto da matéria de facto que considera incorretamente julgado, pelo que a concreta impugnação da decisão sobre a matéria de facto deve ser rejeitada, nos termos do n.º 1 do art.º 640.º do CPC. 17) Em todo o caso, das asserções genéricas, vagas e abstratas da Apelante decorre claramente que não lhe assiste razão, dado que, o relatório e depoimento do Sr. Perito (…) afirmaram perentoriamente não ser possível fazer asserções sobre a eventual repercussão do sobrecusto por parte da Apelada, e, além disso, para que a Apelada pudesse ter repercutido o incremento dos custos nos preços por si praticados – o que não se concede –, seria necessário que a mesma tivesse conhecimento, quer da existência do aumento concertado de custos, quer da exata medida do incremento, o que seria impossível, desde logo, pelo caráter oculto do cartel ao longo de dezenas de anos. 18) Assim, deve o ponto g) dos factos não provados permanecer como tal. ii. Da integração do facto não provado h) no elenco dos factos provados 19) Considera, também, a Apelante que o facto h) constante do elenco de factos dados como não provados deve passar a integrar o elenco dos factos dados como provados (mas com uma redação diferente da constante da Sentença recorrida), no entanto, e mais uma vez, a Apelante limita-se a tecer considerações genéricas, vagas e abstratas, não especificando os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imporiam decisão diversa sobre o ponto da matéria de facto que considera incorretamente julgado, pelo que a concreta impugnação da decisão sobre a matéria de facto deve ser rejeitada, nos termos do n.º 1 do art.º 640.º do CPC. 20) Em todo o caso, nenhuma prova foi produzida pela Apelante no sentido de a Apelada ter operado uma qualquer repercussão do sobrecusto na revenda dos veículos, sendo que, das suas asserções genéricas, vagas e abstratas decorre claramente que a Apelada não poderia ter repercutido o sobrecusto por si suportado na revenda dos veículos, uma vez que o valor pelos quais os camiões são revendidos nada tem que ver com o preço de aquisição dos mesmos. 21) Assim, não pode a pretensão da Apelante proceder, devendo o ponto h) dos factos não provados permanecer como tal. iii. Da integração do facto não provado i) no elenco dos factos provados 22) Alega, ainda, a Apelante que o facto i) constante do elenco de factos dados como não provados deve passar a integrar o elenco dos factos dados como provados, todavia, também aqui a Apelante limita-se a tecer considerações genéricas, vagas e abstratas, não especificando os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imporiam decisão diversa sobre o ponto da matéria de facto que considera incorretamente julgado, pelo que a concreta impugnação da decisão sobre a matéria de facto deve ser rejeitada, nos termos do n.º 1 do art.º 640.º do CPC. 23) Em todo o caso, a Apelante não teria forma de especificar qualquer meio probatório pelo simples facto de não ter sido produzida qualquer prova quanto à eventual existência de repercussão de sobrecusto através de vantagens fiscais, tal como bem afirma a Sentença recorrida. iv. Da integração do que se pensa ser o facto não provado c) no elenco dos factos provados 24) Neste campo, a Apelante não identifica o concreto ponto de facto que considera incorretamente julgado e limita-se a tecer considerações genéricas, vagas e abstratas, não especificando os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imporiam decisão diversa sobre o ponto da matéria de facto que considera incorretamente julgado (mas que não identifica) pelo que, mais uma vez, a concreta impugnação da decisão sobre a matéria de facto deve ser rejeitada, nos termos do n.º 1 do art.º 640.º do CPC. 25) Em todo o caso, das asserções genéricas, vagas e abstratas da Apelante, crê a Apelada que a impugnação pretendia versar sobre o facto não provado c), de onde decorre claramente que não merece provimento o que a mesma pretende, pois o dies a quo da Apelada apenas poderia ocorrer a partir de 6 de abril de 2017, data da publicação de um resumo da Decisão da Comissão, dado que o comunicado de imprensa divulgado pela Comissão a 19.07.2016 não permitia à Apelada ter conhecimento de todos os elementos essenciais da Decisão nessa mesma data, ou nos dias posteriores à mesma, nem a Apelante ofereceu uma única prova nesse sentido. V. DO RECURSO DA DECISÃO DE DIREITO A. DA (INEXISTÊNCIA DE) PRESCRIÇÃO 26) A Apelante alega que se deve considerar que o dies a quo ocorreu a 19.07.2016, contudo, como se viu, a tomada de conhecimento da Apelada sobre o direito que detinha apenas poderia ter ocorrido a partir da data da publicação de um resumo da Decisão da Comissão (ou seja, a partir de 06.04.2017). 27) Alega, ainda, a Apelante que o direito indemnizatório da Apelada se encontra prescrito, no entanto, bem andou o Tribunal a quo ao considerar a exceção improcedente. 28) Considerando-se que tal prazo se iniciou a partir de 6 de abril de 2017, aplicando-se, in casu, sem conceder, o artigo 498.º n.º 1 do Código Civil, como pretende a Apelante, o direito em causa só prescreveria a 6 de abril de 2020, data na qual se findavam os três anos. 29) Tendo a presente ação sido proposta a 31 de março de 2020, considerando a regra prevista no artigo 323.º, n.º 2 do Código Civil, dúvidas não subsistem da tempestividade da propositura da ação bem como do direito indemnizatório. 30) Sem prejuízo do exposto, sempre se dirá que estando em causa uma ação de indemnização por violação de disposições do direito da concorrência dos Estados-Membros e da União Europeia, como é o caso, sempre seria de atender à Diretiva 2014/104/EU, transposta para o ordenamento jurídico nacional pela Lei n.º 23/2018, de 5 de junho, atendendo igualmente ao princípio da interpretação conforme, especialmente relevante em matéria de diretivas. 31) Em face do artigo 10.º, n.º 3, da referida Diretiva, a Autora dispunha do prazo de 5 anos para intentar a presente ação de indemnização, prazo este que, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo só começaria a correr após a demandante ter conhecimento, ou se poder razoavelmente presumir que teve conhecimento, do comportamento em causa e de que este constitui uma infração ao direito da concorrência, do facto de a infração ao direito da concorrência lhe ter causado dano e da identidade do infrator. B. DA (NÃO) VERIFICAÇÃO DOS DEMAIS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL 32) Vem a Apelante alegar, ainda, que não se encontra preenchido o requisito da culpa no presente caso, não lhe assistindo razão, pois resulta, desde logo, da Decisão da Comissão, que a Apelante, em conluio com outros fabricantes de camiões, aumentou de forma intencional, coordenada e continuada os preços brutos de determinados camiões, sendo que, a intencionalidade da infração bastará, indubitavelmente, para a formulação de um juízo de censura da conduta por ela adotada. 33) Encontram-se, assim, preenchidos in casu todos os pressupostos da responsabilidade civil, nomeadamente a culpa, o dano e o nexo de causalidade (sendo que, quanto aos últimos dois se remete para o supra exposto). C. DA QUANTIFICAÇÃO DO DANO i. Do recurso à estimativa judicial 34) Alegou a Apelante – sem razão – que o tribunal recorrido não deveria ter recorrido a uma estimativa judicial para calcular o quantum indemnizatório. 35) Sem prejuízo das considerações tecidas pela ora Apelada no recurso autónomo que interpôs, a propósito da cabal quantificação do dano sofrido, a Apelada não pode deixar de considerar que, caso tal quantificação não seja considerada pelo Tribunal ad quem, deverá lançar-se mão à estimativa judicial, tal como fez o Tribunal recorrido. 36) Deve partir-se em primeiro lugar da circunstância indiscutível de ser impossível determinar de forma exata e matemática qual foi o sobrecusto provocado pelo cartel no preço de venda dos camiões afetados, já que, para tanto, seria necessário comparar-se o preço pago pela Apelada com os que teriam sido pagos num mercado europeu que não houvesse estado distorcido pela atividade do cartel, o que é por definição algo hipotético e corresponde a um passado que não aconteceu, por praticamente a totalidade de operações de venda de camiões (milhões) na União Europeia durante um período amplíssimo (14 anos, desde 1997 a 2011), e que para além do mais contempla uma crise económica, estar indubitavelmente afetada pelo cartel. 37) Daí a necessidade de recorrer a métodos estimativos ou comparativos, o que é pacífica e plenamente aceite por toda a doutrina e jurisprudência existente sobre este tipo de distorções de mercado, estando mesmo consagrado pela própria União Europeia no Guia Prático: quantificação do dano nas ações de indemnização com base nas infrações aos artigos 101.º e 102.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (“Guia Prático”). 38) Suportado por esses métodos, do entendimento do Tribunal a quo decorre a impossibilidade prática de avaliar o dano – o que não resulta da inação da Apelada, pelo que não ficou impedido o tribunal de recorrer a uma estimativa aproximada. 39) Não obstante se discordar do valor apurado através da estimativa judicial – como melhor descrito nas alegações de recurso apresentadas pela aqui Apelada – a verdade é que, contrariamente ao defendido pela Apelante, o recurso à estimativa judicial é admissível, nos termos do artigo 17.º, n.º 1, da Diretiva e artigo 9.º, n.º 2 da Lei 23/2018. ii. Da fixação do quantum indemnizatório em 5% 40) A Apelante considera que o quantum indemnizatório não deveria ter sido fixado no valor de 5%, alegando que «sempre se imporia que o Tribunal a quo tivesse reduzido a percentagem atribuída a título de danos (5%) por forma a refletir a medida da repercussão, o que naturalmente se aproximaria de um cenário de 0%, senão mesmo de 0%» 41) A verdade é que, não só a alegação da Apelante se tem por completamente infundada, como, no entendimento da Apelada, o quantum indemnizatório não deveria ter sido determinado no valor de apenas 5%, como oportunamente invocado nas suas alegações de recurso. 42) Tendo sido demonstrado, ao longo de todo o processo, que o cartel (do qual a Apelante foi parte) resultou num aumento dos preços líquidos suportados pela Apelada durante um extenso período de tempo (e tendo por isso a Apelada sofrido consideráveis danos resultantes da aquisição de 115 veículos, que abarcam todo o período da infração, por um preço de aquisição bastante superior ao devido num cenário sem infração), o valor do quantum indemnizatório deverá ser fixado no montante de, pelo menos, 10%, o qual consistirá numa estimativa judicial mais aproximada da realidade. D. DO CÁLCULO DOS JUROS 43) Vem também a Apelante defender, nas suas alegações de recurso, que o momento da constituição em mora deverá ser a data da citação e ainda que a obrigação de juros se encontra prescrita relativamente aos juros anteriores a abril de 2020, sendo que, nenhuma razão lhe assiste. 44) Se fosse considerado que os juros eram devidos apenas desde a data da citação, estar-se-ia a incorrer numa clara violação do princípio da efetividade, pois tal entendimento ignora a oportunidade perdida pelos lesados de dispor de capital desde a data do dano até ao momento em que esse dano é reparado. 45) Por esta razão, e atendendo ao facto de que a referida falta de liquidez resulta por culpa exclusiva dos infratores, é de considerar que o momento da constituição em mora é o momento do facto danoso, ou seja, desde as datas de aquisição dos veículos (ou do registo de propriedade, caso apenas essa data conste dos autos), no caso dos veículos adquiridos por compra e venda – como defendido pela aqui Apelada nas suas alegações de recurso –, e desde a data do exercício da opção de compra, no caso dos veículos adquiridos por locação financeira, o que é subsumível no artigo 805.º, número 2, alínea b), e número 3, do Código Civil, interpretado à luz do direito comunitário. 46) O artigo 310.º alínea d) do Código Civil não deve ser aplicável no presente caso, pelo que não se encontram prescritos os juros de mora vencidos até 5 anos antes da data da propositura da presente ação. E. DAS NORMAS (NÃO) VIOLADAS PELA SENTENÇA RECORRIDA E (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA SUA INTERPRETAÇÃO 47) Por fim, alega a Apelante que a Sentença recorrida procede a uma interpretação normativa dos artigos 3.º, n.º 1 da LPE [lei de transposição da Diretiva], conjugada com o artigo 483.º do CC, em violação dos princípios constitucionalmente consagrados do Estado de Direito (artigo 2.º da CRP), da proporcionalidade (artigo 18.º da CRP) e do princípio da igualdade (artigo 13.º), também na vertente da igualdade de armas (artigo 20.º da CRP). 48) Contudo, conforme decorre de tudo quanto se expôs supra, o Tribunal a quo não violou as referidas normas, porquanto a interpretação que fez das mesmas é uma interpretação conforme à Constituição da República Portuguesa (CRP), respeitando os enunciados princípios constitucionais. Nestes termos e nos melhores de direito aplicáveis, deve o recurso apresentando pela Apelante ser considerando improcedente, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA! * O Tribunal a quo, a 12 de julho de 2024, na sequência dos pedidos de retificação, proferiu o seguinte despacho: “a. Retifico a sentença nos seguintes termos: i. Onde consta no título “Factos relativos aos “prejuízos” e nexo de causalidade – alíneas ddd) a fff) dos factos provados e alíneas e) e f) dos factos não provados” que antecede o § 66 passará a constar “Factos relativos aos “prejuízos” e nexo de causalidade – alíneas alíneas rrrrr) e sssss) dos factos provados e alíneas e) e f) dos factos não provados”; ii. Onde consta no § 440 da sentença a referência à alínea f) passa a constar na alínea f) dos factos não provados. b. Admito a correção das alegações com a ref.ª ...98;” Mais admitiu os recursos e contra-alegações. * Nesta Relação, em face da posição da Recorrida, foi a Recorrente convidada a pronunciar-se sobre o artigo 640.º do CPC. * Os autos foram à conferência. * II - Questões a decidir O objeto do recurso é balizado pelas conclusões do apelante, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito, conforme resulta dos artigos 5.º, n.º 3, 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1, e 608.º, todos do CPC. Assim, importa, no caso, apreciar e decidir: Questões processuais. - se a decisão é nula, por força do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. c), do CPC (contradição entre os fundamentos e a decisão); Impugnação da Matéria de Facto. (A. e R.) - se deve ser alterada a matéria de facto apurada na decisão (impugnação da decisão sobre a matéria de facto, conforme efetuada pelas partes); Direito. (A.) - se a fixação do quantum do dano em 5%, com recurso a estimativa judicial aproximada, violou o artigo 9.º, n.º 2, da Lei n.º 23/2018, de 5 de junho, e se deve ser alterado para 16,68% ou, pelo menos, para 10% do preço de aquisição de cada camião; - se o momento a partir do qual devem ser calculados os juros de mora relativamente aos veículos adquiridos por contrato de compra, corresponde ao dia da aquisição do veículo (ou, não apurado, do registo da propriedade); (R.) - se o direito invocado pela A., face à pugnada alteração da matéria de facto, encontra-se prescrito por força dos artigos 309.º e 498.º do CC (dies a quo do conhecimento da A.; prazo aplicável); - se não se verificam os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual previstos no artigo 483.º do CC, em particular, a culpa, o dano e o respetivo nexo causal; - subsidiariamente, se não é admissível, por arbitrária, a estimativa do quantum em 5% (se a repercussão e/ ou mitigação do alegado sobrecusto, seja por via dos preços praticados pelos seus serviços, seja pela revenda dos veículos, seja pela obtenção de vantagens fiscais, deveria ter sido computada na estimativa judicial do dano); - se a remissão para liquidação de sentença, reportada aos veículos sinalizados nas alíneas i) a kk) dos factos provados (em relação aos quais não se apurou o preço), violou o direito probatório; - se os juros de mora deveriam ser calculados a partir da citação da Ré para a presente ação, conforme dispõe o artigo 805.º, n.º 3, do CC, e não a partir da data da instauração da ação (veículos adquiridos por compra e venda) ou da data do exercício do direito de compra (veículos adquiridos por locação financeira); - se os juros de mora vencidos em momento anterior aos cinco anos que antecederam a citação da R., por força do artigo 310.º, al. d), do CC, encontram-se prescritos; - se a sentença recorrida procede a uma interpretação normativa dos artigos 3.º, n.º 1, e 9.º, n.º 1, ambos da Lei n.º 23/2018, de 5 de junho, conjugada a primeira com o artigo 483.º do CC, inconstitucional (por violar os princípios do Estado de Direito – artigo 2.º da CRP – da proporcionalidade – artigo 18.º da CRP – da igualdade – artigo 13.º da CRP – e da igualdade de armas – artigo 20.º da CRP -. * III – Fundamentação Questões Processuais Da nulidade da decisão (contradição entre os fundamentos e a decisão). A Recorrente (Volvo) veio arguir que a fundamentação da decisão em crise é “manifestamente contraditória e incoerente” com o respetivo sentido decisório. Para o efeito, alega que “Na fundamentação da decisão, o Tribunal Recorrido considera um conjunto de factos como verdadeiros em ordem a concluir pela existência de dano e nexo causal”; “No entanto, ao considerar esses factos como verdadeiros, o Tribunal assume a existência de fatores que interrompem o nexo causal. Pelo que, a fundamentação não sustenta a decisão final. Antes, revela-se discordante.” Finalmente, refere que “Tal discordância, inquina toda a decisão, já que torna incompreensível o raciocínio do Tribunal Recorrido e bem assim a decisão final.” A Apelada pugnou pela inexistência da alegada nulidade. Afirmou, na defesa da sua posição, que “analisada a estrutura da decisão recorrida e as conexões existentes entre os motivos de facto e de direito a que faz apelo e o veredicto final verifica-se que existe uma lógica na arquitetura da Sentença e, dessa forma, a invocada nulidade não se verifica.” O Tribunal a quo, em cumprimento do disposto no artigo 617.º do CPC, antes de ordenar a remessa a este Tribunal, a respeito da pugnada nulidade, consignou que: “… considera-se que a Ré não tem razão, pois esta contradição pressupõe que do próprio teor da decisão resulte que os fundamentos conduzem a uma decisão diversa. Não é o caso, pois na sentença explicitou-se a razão pela qual os factos invocados pela Ré não conduzem ao afastamento nem do sobrecusto, nem do nexo de causalidade. Vejam-se os pontos 176 a 199, 205 a 237, 243 a 251, 257 a 259 e 435 a 438 da sentença. Por conseguinte, a discordância da Ré reporta-se ao mérito da decisão, não existindo qualquer contradição interna na sentença sobre esta matéria.” Vejamos, então. Estabelece o artigo 615.º do CPC, sob a epígrafe “Causas de nulidade da sentença”, que: “1 – É nula a sentença quando: … c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; … 4 – As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.” A Recorrida invoca a alínea c) do citado artigo 615.º A respeito desta alínea, o STJ, em acórdão proferido a 9 de fevereiro de 2017, no âmbito do processo 2913/14.3TTLSB.L1.S1, considerou que “Ocorre a nulidade prevista no art. 615º, nº 1, al. c) do CPC quando os fundamentos referidos pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente, não se verificando quando a solução jurídica decorreu de interpretação dos factos, diversa da pretendida pelo arguente.” Por sua vez, a respeito da norma em apreço, no CPC Anotado por Abrantes Geraldes, é referido que “importa que se estabeleça uma separação entre nulidades de processo e nulidades de julgamento, sendo que o regime do preceito apenas a estas se aplica; as demais deverão ser arguidas pelas partes ou suscitadas oficiosamente pelo juiz, nos termos previstos noutros normativos.” Mais se refere na anotação à norma em análise que “acresce ainda uma frequente confusão entre nulidade da decisão e discordância quanto ao resultado, entre a falta de fundamentação e uma fundamentação insuficiente ou divergente da pretendida ou mesmo entre a omissão de pronúncia (relativamente a alguma questão ou pretensão) e a falta de resposta a algum argumento dos muitos que florescem nas alegações de recurso. Finalmente, reportando-se à nulidade prevista na alínea c), é ali referido que “… ocorre quando existe incompatibilidade entre os fundamentos e a decisão, ou seja, em que a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final. Situação que, sendo violadora do chamado silogismo judiciário, em que as premissas devem condizer com a conclusão, também não se confunde com um eventual erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide contrariamente aos factos apurados ou contra norma jurídica que lhe impõe uma solução jurídica diferente. A decisão judicial é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível e é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes.” (Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração, pág. 737 e 738). (destaques são nossos) Importa agora aplicar os ensinamentos referidos à reclamação apresentada pela Recorrida. É nosso entendimento que a decisão em crise não apresenta qualquer nulidade suscetível de se subsumir na citada alínea. Vejamos porquê! Em primeiro lugar, porque os fundamentos avançados pela decisão, necessariamente desembocam na decisão tomada, ou seja, em momento algum a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final. Em segundo lugar, porque as premissas assinaladas condizem com a conclusão a que se chegou. Em terceiro e último lugar, porque a mesma não contém qualquer passo cujo sentido seja ininteligível ou que se preste a interpretações diferentes. Aliás, julgamos que a síntese efetuada pelo Tribunal a quo, no cumprimento do disposto no artigo 617.º do CPC, é sobejamente explicativa do que acabamos de referir. Naturalmente que se admite que as opções efetuadas pelo Tribunal a quo sejam discutíveis, quer ao nível da seleção da matéria de facto quer da(s) solução jurídica encontrada. Porém, não descortinamos na sentença em crise – como se impunha – que o percurso apresente o apontado vício. Dito isto, o que efetivamente a R. põe em causa são os factos provados (e os não provados) e a relevância (ou falta dela) que o Tribunal a quo lhes atribuiu na subsunção legal que formulou, nomeadamente face ao nível da intensa concorrência do mercado, da heterogeneidade dos produtos dos camiões, a longa cadeia de comercialização e de descontos. Porém, não será essa a essência do ato de julgar, ou seja, analisar a prova, selecionar os factos (provados e não provados) e aplicar o direito, ponderando, naturalmente, as diferentes soluções jurídicas. Assim, a crítica efetuada pela Recorrente, legítima, reporta-se, salvo o devido respeito, antes ao próprio ato de julgar. Dito de outra forma, o que a R. aponta à sentença em crise corresponde, conforme citação que efetua (no ponto 22 das alegações) do aresto do STJ, ao “… erro de julgamento, seja de facto ou de direito, designadamente a não conformidade da sentença com o direito substantivo”, que, este mesmo aresto, deixa claro não corresponder à nulidade em análise. Em conclusão, entendemos que a decisão em crise não padece de nulidade e, como tal, indeferimos o requerido. * Impugnação da decisão de facto. Estabelece o artigo 640.º do CPC, sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão relativa à matéria de facto”, que: “1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravadas, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes. …”. “Quer isto dizer que recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus: Primeiro: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento; Segundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa; Terceiro: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas. Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão.”(cfr. Cadernos Temáticos De Jurisprudência Cível Da Relação, Impugnação da decisão sobre a matéria de facto, consultável no site do Tribunal da Relação do Porto, Jurisprudência). Vejamos então se se mostram cumpridos tais ónus e, em caso afirmativo, passemos a conhecer da pretendida impugnação da decisão sobre a matéria de facto, naturalmente, como referido supra, tendo por referência as conclusões apresentadas. Para o efeito, vamos seguir a ordem enunciada nas conclusões das Apelantes. * Comecemos pelo recurso da Autora. Defende a Apelante que os “factos provados i) a kk), na parte em que referem “um preço não concretamente apurado” devem passar a constar os valores que alegou ter liquidado. Funda a sua posição nas declarações do legal representante da A., (…), e no depoimento da testemunha (…), funcionário administrativo da mesma e responsável pela organização e recolha da documentação aportada por aquela a estes autos. Finalmente, na “confissão e informações prestadas nos autos pela NORS,SA (anterior Auto-Sueco, Lda., entidade vendedora dos camiões).” A Recorrida, a este respeito, refere que não foi produzida prova capaz de confirmar o preço dos veículos; sendo que a única prova produzida sobre esta matéria reconduziu-se ao depoimento da testemunha (…) que se revelou, nessa parte, “muito pouco concreto, objetivo e consistente e sem elementos de suporte, quando de acordo com as suas afirmações, deveriam existir. Mais refere que do requerimento apresentado pela NORS, em 22 de fevereiro de 2022, apenas se retira que os veículos terão sido pagos, mas não resulta o preço de aquisição de cada um deles. A decisão em crise, a respeito da fundamentação da matéria não provada, consignou que “Não obstante todos os meios de prova indicados não foi possível apurar os preços pagos pelos camiões em relação aos quais não foram juntas faturas, pois a única prova produzida sobre esta matéria reconduziu-se ao depoimento prestado por (…) (doravante CC, cf. ata da sessão de julgamento realizada no dia 23.10.2023, com a ref.ª ...37 e respetivo suporte de gravação), funcionário da A. desde 2002, responsável pela documentação relativa à aquisição das viaturas e pela junção de elementos para a demonstração de tais aquisições nos presentes autos. Sucede que, nesta parte, o depoimento da testemunha foi muito pouco concreto, objetivo e consistente e sem elementos de suporte, quando de acordo com as suas afirmações, deveriam existir.” Tendo concretizado que: “a testemunha começou por referir que os preços estavam nos faxes, notas de encomenda e que foram retirados desses documentos. Posteriormente, fez referência aos extratos de conta corrente e notas de liquidação. Admite-se que já tenha passado algum tempo desde que a testemunha recolheu toda a informação necessária para a instauração da ação. Contudo, estando em causa veículos sem fatura é normal que a recolha dos elementos respetivos tenha sido mais difícil e, nessa medida, seria expectável que tivesse uma memória mais precisa sobre os elementos que teve em consideração. No entanto, não é assim, pois faz referência a documentos diferentes e, para além disso, não há mínima evidência desses documentos nos autos. Nem sequer um print do extrato de conta corrente. Por estas razões não mereceu credibilidade nesta parte.” A decisão em crise, reportada ao legal representante da A., salientou as matérias em que as suas declarações foram relevantes, tais como: “Em primeiro lugar, porque corroboraram o pagamento do preço de aquisição, pois (…) referiu que o mesmo era efetuado por si no último dia útil dos meses subsequentes às aquisições através de cheque, deslocando-se às instalações da NORS para o efeito. As suas declarações, nesta parte, mereceram credibilidade, pois foram muito assertivas, seguras e concretas… “também foram relevantes em relação a outro ponto: o facto de estarem em causa camiões novos. DD não o referiu expressamente, porque também não foi questionado nesse sentido. Contudo, explicou as razões pelas quais só em poucos casos celebraram contratos de assistência de serviços prolongados no tempo, tendo referido que a marca era boa e nos primeiros anos assume sempre a responsabilidade pela avaria, razões que só fazem sentido em relação a camiões novos. DD mereceu credibilidade também nesta parte, pois efetuou estas afirmações de forma espontânea, sendo as mesmas compatíveis com práticas negociais normais e com o facto de apenas constarem nos autos contratos de assistência relativos a 30 viaturas - ref.ªs ...22, ...23 e ...24 (apresentados através de requerimentos datados de 09.07.2021). Para além disso, não foi produzida prova suscetível de as infirmar, tendo sido inclusive produzida prova que corroborou tais declarações, pelo menos, em parte, designadamente os contratos de assistência referidos dos quais resulta que as datas das matrículas precedem em muito pouco tempo o início dos contratos, o que demonstram que também esses veículos foram adquiridos em estado novo. Igualmente as certidões do registo automóvel juntas aos autos demonstram, em relação aos veículos a que respeitam, que o primeiro adquirente foi a Auto-Sueco, não havendo razões para duvidar de que não tenha sido assim em relação a todas as aquisições. Finalmente, sobre as informações prestadas pela NORS, o Tribunal a quo deu conta que: “… foram igualmente importantes para o apuramento dos factos as informações prestadas e os extratos juntos pela NORS, S.A. através do requerimento de 22.02.2022, com a ref.ª ...41. Estes meios de prova serviram especificamente para demonstrar o pagamento do preço de todos os veículos adquiridos através de contratos de compra e venda. Efetivamente, a NORS esclareceu nessa informação, de forma taxativa, o seguinte: “apesar de já não dispor dos processos de venda relativamente aos veículos em causa nos autos, atenta a antiguidade das respetivas transações que se reportam ao período compreendido entre 1997 e 2007, informar os autos de todas as viaturas foram pagas na totalidade, encontrando-se a respetiva conta-corrente saldada, não existindo registo de ter sido intentada qualquer ação judicial com vista à recuperação do preço devido pela aquisição de algum dos veículos que ao longo dos anos lhe foram adquiridos pela TN- Transportes M. Simões Nogueira, S.A.. Precisamente pelo facto de a ora Requerente já não possuir os processos de venda referentes aos veículos em causa, não pode, contudo, especificar a data concreta em que o valor de aquisição de cada um dos veículos foi efetivamente liquidado ou o período durante o qual tais valores se mantiveram em aberto na sua contabilidade, salientando, porém, que a referida sociedade não regista qualquer incidente quanto ao cumprimento das suas obrigações. Em todo o caso, a ora Requerente consegue extrair do seu sistema informático extrato de conta-corrente quanto às transações diretas realizadas após 2008, pelo que, conforme requerido, requer a sua junção aos autos, fazendo notar que aquela conta-corrente apresenta saldo nulo, inexistindo qualquer crédito pendente de pagamento”. O extrato junto comprova a existência de saldos nulos 01.01.2008 e 31.12.2018.” Do exposto, é inequívoco não se conseguir retirar das declarações do legal representante os valores de aquisição, reportados aos veículos em análise, e também da declaração da NORS – assim como dos documentos a que faz referência – o respetivo valor. O que se retira, como disso deu conta o Tribunal a quo, foi que nada é devido e, como tal, os valores dos negócios celebrados entre as duas entidades estão saldados. No que diz respeito ao depoimento da testemunha (…), secundamos a posição do Tribunal a quo, na medida em que não se compreende ou aceita que a prova desta matéria – valor das compras – seja deixada, apenas, para o depoimento de uma testemunha, por mais credível que seja, quando, como deu conta, se baseou em “faxes, notas de encomenda e que foram retirados desses documentos. Posteriormente, fez referência aos extratos de conta corrente e notas de liquidação”, sem que se mostrem juntos aos autos. Uma última nota se impõe, face à alegação de que deve ser considerada a posição processual assumida pela NORS. A NORS, como resulta do relatório dos autos, foi absolvida da instância na fase dos articulados, ou seja, sem ter sido produzida prova. Nessa medida, para efeitos da presente ação, em particular do seu julgamento, não tem a posição de parte, pelo que, naturalmente, a posição que assumiu nos articulados não pode ter o valor de confissão; esta, face à sua natureza, apenas é reconhecida às partes. Dito isto, por reporte aos factos em análise, a posição do tribunal a quo não nos merece qualquer censura. Prosseguindo. Defende a Apelante que o “facto não provado f)”“devia ter sido dado como provado”. O referido facto reporta-se ao valor pugnado pela A. de 16,68% do preço bruto das viaturas (preço de aquisição deduzido de 10%), como tendo sido pago a mais pelos camiões identificados nos factos provados e que não teria pago caso a infração não se tivesse verificado. Funda a sua posição no parecer designado “Relatório de Peritagem, Avaliação de Prejuízos, Cartel dos Camiões – EU”, de 2021, elaborado por (…), (…), (…) e (…)”, e no depoimento de (…). Relativamente ao parecer, na defesa do seu rigor, chama a atenção para a sua proveniência; a referência feita às fontes em que se baseia, à metodologia utilizada, aos dados mobilizados, nomeadamente os índices de preços brutos ou industriais que são de acesso público, à certificação final do resultado do estudo realizado e aplicado a cada um dos veículos em causa nestes autos. Mais chama a atenção para a certeza da sua aplicabilidade ao mercado de camiões em Portugal. Tendo concluído que “o relatório junto pela Autora/Recorrente representa um esforço probatório tremendo, oferecendo uma robustez assinalável, é fundamentado em dados extensíssimos, verificáveis e não erróneos, parte dos pressupostos corretos e segue religiosamente o Guia Prático” e que se “dúvidas houvesse quanto à fiabilidade e credibilidade do referido relatório, veio a testemunha (…) evidenciar, através do seu depoimento, o mérito das conclusões apresentadas no mesmo.” A Recorrida, na resposta, refere que “a Recorrente não fez prova nos autos, nem tampouco em sede de audiência final, do alegado dano sofrido e da respetiva quantificação. E, de acordo com regras da distribuição do ónus da prova aplicável ao presente caso, era à Recorrente que cabia alegar e provar o dano, o nexo de causalidade e a respetiva quantificação. Não o tendo feito, resulta claro que julgou bem o Tribunal Recorrido ao dar como não provado o facto f) do elenco dos factos não provados da Sentença Recorrida.” Mais refere que o relatório Z... tem fragilidades, desde logo por estar no âmbito das ciências sociais, acrescentando fragilidades metodológicas, das variáveis consideradas e dos dados escolhidos, nomeadamente por partir da premissa da existência de um sobrecusto. Acrescenta, com recurso a uma passagem da Refutação da autoria do Professor (…), que “O] relatório Z... não explica, a título prévio, porque esperaria que os preços pagos pela TN tivessem sido inflacionados como resultado da infração. De acordo com a teoria económica, não há razão para presumir que da conduta sujeita à infração descrita na decisão da CE teria resultado um sobrecusto. As características do mercado de camiões são tais que a conduta não teria assegurado um mecanismo eficaz de controlo dos preços ao cliente final. Tal mecanismo é, de acordo com a teoria económica, crucial para evitar que os Fabricantes de Equipamento Original (FEO) procedessem a uma redução de preços face aos rivais e competissem pelos clientes. Além disso, a conduta relaciona-se com a troca de informações sobre os preços brutos de tabela dos camiões, que são largamente utilizados como referências internas pela Volvo, enquanto os preços líquidos são impulsionados por uma série de fatores específicos de cada transação, incluindo ofertas competitivas dos FEO concorrentes e a necessidade de cobrir custos. Não existe, portanto, uma relação direta forte entre as duas métricas.” Mais acrescenta, ao longo de várias páginas, várias críticas ao relatório para concluir pelo seu afastamento. A decisão em crise, a respeito desta matéria, consignou que: “A factualidade exarada na alínea f) ficou por demonstrar, porquanto a prova produzida para a sustentar reconduziu-se ao relatório Z... e ao depoimento de (…) que, nesta parte, não mereceram credibilidade pelas razões já explicitadas.” Em termos das ditas razões, enunciou-as, resumidamente, da seguinte forma: - “o relatório assume o sobrecusto como um pressuposto implícito – não explicado – e não como uma conclusão”; (“… uma das condições de robustez dos índices de preços utilizados consiste na demonstração de um aumento de preços durante o período do cartel como consequência da infração. Neste sentido, afirma-se na pág. 75 o seguinte: “Como já indicámos neste relatório, relativamente à robustez dos índices e de um ponto de vista conceptual, consideramos que um índice é robusto se preencher as seguintes condições: (…) . – Relatam a existência de um aumento de preços durante o período do cartel como consequência da infração”. Asserções similares constam nas páginas 47, 48 e 60. - “não está suficientemente sustentado para poder ser considerado”; (“…Tal como é bem resumido no relatório apresentado pela R., com o título “Refutação do relatório pericial Z... apresentado pela TN”, de 30.08.2021, elaborado pelo Professor (…) e pela Professora (…), junto aos autos com a ref.ª ...13, de 02.09.2021, e que doravante será designado por “relatório de refutação AA/BB”, no relatório Z... são “apresentados três índices de preços diferentes para levar a cabo a análise: o Índice de Preços Industriais (IPRI) para camiões na Alemanha e nos Países Baixos; o Índice de Preços para a Volvo e a Scania; o Índice de preços PRODCOM para três categorias de produtos. O relatório Z... realiza uma “verificação de robustez” para estes índices, a fim de confirmar se são fiáveis para a sua análise. Em particular, (i) comparam-os com a evolução do Índice de Preços Industriais para o fabrico de veículos automóveis, (ii) realizam uma estimação econométrica de um modelo de procura para o mercado de camiões (comparação temporal) e (iii) uma estimação das diferenças em diferenças, sendo o México escolhido como mercado geográfico contrafactual. O relatório Z... explica que o sobrecusto obtido a partir destas “verificações de robustez” não é utilizado para efeitos de estimativa de danos. Em vez disso, estes três índices são combinados (secção J.4) num Índice de Preços Global ajustado (que resulta da média entre os três índices e um ajustamento para a introdução de normas de emissões em três momentos particulares no tempo) com o objetivo de captar a evolução dos preços dos camiões para os fabricantes envolvidos na infração. Esta evolução ao longo do tempo do Índice Global de Preços ajustado durante o período da infração é comparada com a evolução de um índice comparativo - o Índice de Preços Industriais para o fabrico de veículos automóveis - que supostamente capta o que deveria ter sido a evolução dos preços dos camiões na ausência da infração. É através da comparação destes dois índices que o relatório Z... chega a uma estimativa de sobrecusto de 16,68%.” - “fragilidade da metodologia adotada”; (… que é comum a vários dos parâmetros utilizados e que afeta a comparabilidade básica pressuposta pelos métodos utilizados. Essa fragilidade consiste no facto do relatório Z... não ter tomado em devida consideração uma característica deste mercado, que é inclusive reconhecida pela Comissão Europeia no ponto (26) da sua decisão, e que consiste na complexidade dos camiões, devido à sua heterogeneidade. Neste sentido, afirma a Comissão que “Os camiões não são produtos de base, mas são especificados de acordo com os requisitos individuais do cliente e são inerentemente complexos. Todos os Destinatários disponibilizam uma gama de camiões e centenas de opções e variantes diferentes”; “… Neste sentido, consta no capítulo 5 o seguinte: “Seguem-se os fatores de mercado que influenciaram positivamente o surgimento do Cartel de Camiões: (…) 2. HOMOGENEIDADE DOS PRODUTOS. Em princípio, a homogeneidade do produto favorece o conluio porque quanto mais homogéneo for o produto, mais fácil é chegar a um acordo para fixar os preços. No caso dos camiões, este cartel está limitado aos camiões com mais de 6 toneladas, onde todos os fabricantes oferecem produtos muito semelhantes” (pp. 19-20). Afirmação que, por sua vez contrasta, com outras que constam no relatório, designadamente na pág. 22 onde se refere que “Se considerar o veículo completo, ou seja, uma carroçaria rígida ou um trator mais um reboque, o mercado de camiões torna-se ainda mais complexo. Existem literalmente milhares de formas e tamanhos de camiões” ou na pág. 28 onde se afirma que “Os camiões não são produtos básicos, são especificados de acordo com os requisitos individuais do cliente, o que implica uma certa complexidade como produto. Todos os fabricantes oferecem uma gama de camiões e centenas de diferentes opções e variantes.”; “o relatório Z... não teve em conta este fator nos parâmetros de cálculo que considerou. E isto é muito importante, porque o parecer utiliza métodos comparativos e só se pode comparar o que é comparável, como é evidente. Ora, se temos produtos que são diferentes entre si – por terem distintas características – e se estas diferenças se refletem nos preços respetivos só conseguimos comparar esses preços se eliminarmos ou expurgarmos do preço a parte que reflete ou é provocada por essas diferentes características, sob pena da diferença ser imputável às distintas características. Exemplificando. Se tivermos um camião com uma determinada cilindrada que custa 90.000 e outro com uma cilindrada superior que custa 100.000 a diferença entre um preço e o outro pode ser devido à diferente cilindrada e não a qualquer outro fator. Consequentemente, se estivermos a fazer comparações de preços no tempo, entre o antes e o durante, entre o durante e o depois ou entre o antes, o durante e o depois, temos de perceber em que medida a diferença se deve às diferentes características da composição ou - utilizando a expressão usada no relatório de refutação AA/BB - do “mix” que considerámos em cada um dos grupos que comparámos. “Mix” esse que pode variar ao longo do tempo, devido à introdução de novos modelos ou à alteração dos existentes, e que pode variar também de fabricante para fabricante.” - A referida falha metodológica está presente no IPRI (índices de Preços Industriais) para a Alemanha e os Países Baixos para camiões, no Índice de preços de venda unitários Volvo e Scania, no PRODCOM lista de produtos das estatísticas de produção da Comunidade para três segmentos de camiões e, consequentemente, no Índice de Preços Global ajustado, que considera aqueles três primeiros índices. Efetivamente, na descrição de cada um destes índices (cf. págs. 61 e ss.) não há qualquer referência à atendibilidade do fator em análise.”; “… A agregação destes índices não elimina nem atenua as preocupações expressas anteriormente em relação a cada um deles. Acreditamos que estes índices - e consequentemente o Índice Global de Preços ajustado - não cumprem os requisitos básicos para uma comparação temporal válida. O “bem representativo” que está subjacente a cada índice é diferente em cada ano, o que torna difícil (se não impossível) fazer uma comparação temporal com base nestes índices” (págs. 25 e 26).” - Esta fragilidade do relatório Z... compromete a sua valia probatória, porque afeta pressupostos essenciais dos cálculos efetuados, designadamente os índices de preços considerados e comparados. Trata-se, por conseguinte, de uma falha estrutural”; - “o relatório Z... não se limitou a efetuar uma comparação no tempo dos índices referidos. Para além disso, tentou aferir a robustez de cada um dos índices utilizando outros parâmetros comparativos. Contudo, estes parâmetros comparativos não se mostram suficientemente adequados e fiáveis. Assim, para aferir a robustez do IPRI dos Países Baixos e da Alemanha, do o relatório Z... comparou a “taxa de crescimento anual para o período do cartel entre o IPRI genérico para veículos e o IPRI específico para camiões” (pág. 65). Esta comparação assenta na premissa de que existem “semelhanças nos fatores de oferta e procura entre os camiões e o resto dos veículos automóveis (principalmente carros e carrinhas, que representam mais de 95% da mistura de produtos do IPRI dos veículos automóveis)” (pág. 48). Acrescentou que é por isso que “o IPRI para veículos automóveis inclui o IPRI para camiões como parte integrante do mesmo, uma vez que o seu comportamento é semelhante, e é por isso que estão agrupados no IPRI genérico para veículos. Isto porque, como afirma o instituto de estatística, "os produtos (bens e serviços relacionados resultantes de uma atividade) cujos preços são recolhidos e comparados ao longo de sucessivos períodos de tempo devem ser idênticos no que respeita às suas características técnicas (físicas) e económicas (transações)" (Eurostat IPRI Guide)” pág. 51. No que respeita aos fatores de oferta tidos em conta o relatório considerou, no essencial, os custos, concluindo que “o camião é um veículo maior do que os automóveis e as carrinhas, e o custo unitário de fabrico em termos absolutos (euros) é mais elevado, mas o custo em termos percentuais em relação à sua dimensão é semelhante em relação ao consumo de fabrico” (pág. 51). No que respeita à procura o relatório entendeu que o comportamento dos compradores de camiões, automóveis de frotas/carrinhas e automóveis de uso particular se comporta basicamente da mesma forma nos períodos de crescimento económico e nos períodos recessão (págs. 51 e 52). O primeiro ponto a assinalar é que pela descrição efetuada do índice comparativo parece-nos que o mesmo integra ou incorpora, ele mesmo, o índice do mercado afetado, pois é referido como IPRI genérico para veículos, no qual se insere o índice específico dos camiões. Ora, não nos parece ser possível comparar uma realidade com outra que a integra, ainda que só parcialmente, pois os resultados da primeira refletem e são afetados pelos resultados da segunda, não sendo, nessa medida, realidades distintas. - o relatório Z... não demonstra, de forma convincente, que o IPRI genérico para veículos é um bom comparador. Um bom comparador, conforme a Comissão esclarece no Guia de Quantificação, “deve ser cuidadosamente escolhido atendendo à natureza dos produtos comparados, à sua forma de comercialização e às características do mercado, por exemplo, em termos do número de concorrentes, a estrutura de custos destes últimos e o poder de compra dos clientes” (§ 55). É muito importante que assim seja, porque a fiabilidade dos resultados decorre dos pressupostos de comparabilidade entre o mercado afetado e parâmetro comparativo. Se não existir semelhança suficiente não se poderá afirmar que a diferença obtida se deve à infração. Ora, no caso, a análise da oferta é insuficiente, pois considera apenas a estrutura de custos. Nada mais se refere ou analisa quanto à estrutura do mercado, designadamente os índices de concentração, nem se esclarece porque é que a estrutura de custos é suficiente para explicar a oferta. Para além disso, mesmo no que respeita aos custos, a análise efetuada é muito genérica e não apoiada em dados concretos, não sendo uma asserção que possa ser tida como uma evidência da experiência comum. Efetivamente, não é totalmente seguro que todos os componentes relevantes de um camião e um automóvel de passageiros se resumam às mesmas matérias-primas e/ou que a forma de fabrico e montagem impliquem os mesmos custos. No que respeita à procura é difícil aceitar, sem mais demonstração, que os fatores que impelem os consumidores a adquirirem veículos de passageiros são os mesmos que impelem as empresas a comprar camiões e outros veículos comerciais, porque satisfazem necessidades completamente distintas. Afigura-se inclusive que a decisão da Comissão assume que a procura é distinta, pois, no ponto (26), começa por referir que a “procura dos camiões é altamente cíclica”. Esta característica apresenta-se como diferenciadora, na medida em que, imediatamente de seguida, a decisão esclarece que “Enquanto aos automóveis de passageiros são adquiridos por clientes particulares e comerciais, os camiões são adquiridos exclusivamente pelos clientes comerciais”, acrescentando que “Uma vez que os camiões são bens duradouros para utilização profissional, em muitos casos os clientes adiam o investimento na renovação da frota durante os períodos de crise económica, compensado essa falta de investimento quando se verifica uma maior prosperidade nos negócios”. Nestes segmentos, a Comissão identifica claramente dois perfis de clientes distintos – o particular e o comercial. E se assim é, é porque têm padrões de atuação diferentes, o que também se intui das regras da experiência comum. Não surpreende, por isso, que as razões invocadas no relatório Z... sejam de tal forma genéricas e abrangentes que se podem aplicar a praticamente a todos os produtos de duração mais prolongada. Efetivamente, o que aí se invoca é o facto de a compra dos produtos em causa aumentar em ciclos de crescimento económico e diminuir em períodos de redução do poder de compra (cf. págs. 51 e 52). Se isto fosse suficiente então poder-se-ia utilizar os preços de aquisição dos imóveis para comparar com os preços dos camiões. Não é suficiente evidentemente, porque pese embora tais fatores tenham impacto na procura não são os únicos a interferir com as decisões de compra dos consumidores. (…) tentou desvalorizar esta crítica no seu depoimento, referindo que os fatores diferenciadores que o relatório não considerou quando muito teriam uma grandeza na ordem de 10%, que não é suficiente para por em causa os resultados alcançados. Contudo, do seu depoimento não se colhem fundamentos concretos, sustentados e sólidos para sustentar esta asserção. Por estas razões concordamos com o relatório de refutação AA/BB no sentido de que “presumir - como faz o relatório Z... - que o Índice de Preços Industrial para o fabrico de veículos automóveis pode ser utilizado como um indicador de como os preços dos camiões teriam evoluído na ausência da infração não é uma presunção razoável” (pág. 14). As críticas precedentes são igualmente válidas para a utilização do IPRI genérico de veículos para a UE como índice comparativo com o índice PRODCOM (cf. sub capítulo 26.3, pág. 68) e para a utilização do IPRI fabrico de veículos, que é o índice genérico de veículos motorizados calculado a partir da lista de produtos PRODCOM do Eurostat, com índice comparativo com o Índice Globala, que é o índice criado pelo relatório, que deriva dos índices IPRI Alemanha e Países Baixos, Índice Volvo-Scania e Índice PRODCOM (cf. capítulo 32 e pág. 78). - a fundamentação apresentada é igualmente insuficiente e consiste na escolha do mercado dos camiões mexicano como mercado do produto para sustentar a aplicação do método das diferenças-nas-diferenças (cf. pág. 48, e capítulo 29, págs. 71 a 74). Tal como resume o relatório de refutação AA/BB este método “combina uma comparação de preços temporal com uma comparação com preços noutros mercados geográficos, presumivelmente não afetados pela infração, mas suficientemente “próximos” para ser utilizados como um elemento de comparação válido para o que teria acontecido na ausência da infração. O México foi o mercado geográfico de comparação escolhido porque foi considerado um país 'orientado para a exportação' e significativo (a nível mundial) para o fabrico de camiões” (págs. 24 e 25). Também neste ponto concordamos com a crítica efetuada pelo relatório de refutação AA/BB, pois o mercado geográfico utilizado situa-se num contexto geográfico completamente distinto do europeu, onde ocorreu a prática e onde nos localizamos. Assumir, que os fatores que determinam a oferta e a procura são os mesmos apenas porque o México “é o 7º maior produtor de veículos do mundo, o 5º maior produtor de veículos pesados do mundo, o 4º maior exportador de veículos pesados, que todas as marcas representativas no mercado são fabricadas no México, e que é um mercado não afetado pelo cartel, o México é um bom contrafactual” (pág. 74), é claramente insuficiente. Desde logo, porque, conforme é afirmado pelo próprio relatório Z..., “71% das suas exportações destinam-se a países da América do Norte (EUA e Canadá)” (pág. 73). Contudo, apesar de ter noção desse facto, curiosamente e como assinala o relatório de refutação AA/BB, “não reconhece que esta é uma diferença fundamental que invalida a sua utilização como elemento de comparação relevante” (pág. 25). Efetivamente, aquilo que o relatório Z... não demonstra e devia demonstrar é que os fatores que interferem com a oferta e com a procura do mercado mexicano são similares aos do mercado europeu. E isso não se consegue inferir dos parâmetros que considerou. Se estes parâmetros fossem suficientes então porque não considerar o mercado dos EUA, que absorve 71% das exportações do México? Ou porque não considerar qualquer outro país no ranking dos produtores e exportadores? Veja-se que de acordo com o Guia de Quantificação a comparação com um mercado geográfico diferente “significa que os produtos comercializados em ambos os mercados geográficos sujeitos a comparação devem ser idênticos ou, pelo menos, suficientemente semelhantes. De igual forma, as características concorrenciais do mercado geográfico utilizado a título de comparação devem ser semelhantes às características do mercado afetado pela infração” ( § 50). Do relatório Z... não se conseguem concluir pela verificação deste pressupostos. - o relatório não se baseia também em dados relativos a todo o período de infração, verificando-se que essa lacuna foi obtida através de uma projeção, que não está suficientemente esclarecida; Por todas estas razões, considera-se que o relatório Z... e o depoimento convergente de (…) não têm valia probatória suficientemente sólida e consistente para serem considerados.” As observações imputadas ao relatório Z... e ao depoimento de (…), decorrentes, no essencial, de apreciações técnicas efetuadas por relatório elaborado no âmbito do mesmo conhecimento científico, sendo facilmente apreensíveis, em particular os exemplos apresentados, desencadeiam, objetivamente, no julgador um contrapeso bastante relevante em termos da sua valia que, no mínimo, justificam a apreciação efetuada pelo Tribunal a quo. Assim, secundando as críticas/ dúvidas relativamente àquele relatório, necessariamente que o resultado obtido fica igualmente posto em causa, e, como tal, não vemos motivo para considerar provada a quantificação do dano em 16,68% do preço bruto das viaturas (preço de aquisição deduzido 10%). * Passemos agora para o recurso da Ré. Defende a Apelante que os “factos provados rrrrr) e sssss) sejam retirados dos factos dados como provados, passando a integrar a matéria de facto não provada”. Mais defende que os factos não provados c), g), h) e i) devem passar para o elenco dos factos provados. Defende, ainda, que devem ser aditados à matéria de facto provada os seguintes factos: - A infração consiste predominantemente numa troca de informações; - A infração não gerou quaisquer efeitos restritivos da concorrência e quaisquer danos para a Recorrida sob a forma de um sobrecusto na aquisição dos camiões; - O mercado dos camiões pesados é caracterizado por uma concorrência intensa entre fabricantes, mesmo durante o período da Infração; - A Auto-Sueco, enquanto importadora e comercializadora, e, ainda, outros concessionários independentes procediam à comercialização de camiões Volvo em Portugal, de forma exclusiva, com autonomia e independência, definindo a sua própria política comercial, descontos e preços para cada transação e (ii) Os preços que os clientes pagavam pelos camiões eram negociados com a Auto-Sueco ou com os concessionários, sendo as negociações de camiões necessariamente individualizadas pela complexidade dos produtos e pelo cliente e dependentes das condições do mercado local; - Os camiões são produtos complexos e altamente heterogéneos com características técnicas específicas e cada cliente fazia a sua escolha entre centenas de diferentes modelos de camiões e de diferentes opções para cada modelo, resultando em diferentes especificações (e descontos) para cada cliente e (ii) Os níveis de descontos aplicados ao longo da cadeia de distribuição tinham uma grande amplitude e variavam de transação em transação, em função das características e especificidades de cada camião e transação; - Os níveis de descontos ao longo da cadeia de comercialização tinham grande amplitude e variavam de transação para transação, (ii) nem a Auto-Sueco, nem os clientes finais pagaram preços brutos de tabela e (iii) não existia nenhuma relação automática, linear, sistemática ou proporcional entre os preços brutos de tabela e os preços líquidos pagos pelos clientes finais; - A Volvo tinha lista de preços brutos de tabela, cuja principal função era criar uma distinção lógica entre uma infinidade de extras e modelos de camiões de maior e menor valor; - A A. tomou conhecimento dos aspetos essenciais da Decisão da Comissão, pelo menos, desde 20 de novembro de 2014, data da publicação do comunicado de imprensa que tornou pública a adoção da Nota de Ilicitude. Funda a sua pretensão em extensa e complexa alegação, apelando, para o efeito, a diversos conceitos jurídicos, na maioria também invocados pelo Tribunal a quo aquando da motivação da matéria de facto. Efetivamente, refere que o Tribunal a quo, entre outras, violou as regras de ónus de prova, do princípio da efetividade, das presunções judiciais, da igualdade de armas e que aplicou um duplo standard de prova. Finalmente, que o Tribunal a quo valorou mal a prova, em particular a prova económica que apresentou (Relatório VT preparado pelos Professores (…) e (…)). A Recorrida (A.), a este respeito, refere que deverá ser rejeitada a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, uma vez que a Apelante “falhou, de forma evidente, em cumprir o ónus legal que sobre si recaía, nos termos do artigo 640.º do CPC”. Mais refere que, relativamente aos factos provados rrrrr) e sssss), é inevitável extrair da Decisão da Comissão a conclusão de que da infração cometida resultaram danos para a Recorrida e que esses resultaram da infração cometida pela Recorrente. Acrescenta, em defesa da sua pretensão, o Relatório Z... e o testemunho “convergente de (…)”, bem como a aplicação da teoria da probabilidade prevalecente. No mais, reportando-se aos factos que a Recorrente pretende aditar aos factos provados, refere que inexiste prova para o efeito. Finalmente, reportando-se agora aos factos não provados que a Recorrente pretende reverter para provados, refere que não foi dado cumprimento ao disposto no artigo 640.º e que inexiste prova para o efeito. A decisão em crise, antes da fixação da matéria de facto, efetuou “considerações prévias sobre o Direito Europeu e parâmetros gerais aplicáveis”, que, depois, no âmbito da fundamentação da matéria de facto, chamou à colação para justificar as suas opções. Relativamente àquelas considerações destacamos a qualificação da ação em análise; a referência à Decisão da Comissão Europeia de 19 de julho de 2016, no Processo AT.39824; a legislação aplicável à matéria da concorrência, em particular o TFUE (artigos 101.º e 102.º), o Regulamento 1/2003, a Diretiva 2014/104/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de novembro de 2014, a Lei n.º 23/2018, de 5 de junho; a respetiva aplicação no tempo; a relevância e objetivos que estas ações - de indemnização por práticas proibidas pelos referidos artigos do TFUE - cumprem para a manutenção de uma concorrência efetiva no espaço da União Europeia. Mais destacamos os princípios jurídicos que enunciou como sendo norteadores da atividade de interpretação e aplicação da lei, em particular o do primado do Direito da EU e o da interpretação conforme; aos princípios da autonomia processual, da equivalência e da efetividade; a referência feita à jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), destacando o artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que, mediante a citação do Ac desta Relação de 6 de novembro de 2023, proferido no âmbito do processo n.º 54/2019.6YQSTR.L1, reputa de vinculativa não só para o tribunal requerente do reenvio prejudicial, como para todos os tribunais dos Estados Membros, “sob pena de inviabilizar-se o primado do direito da EU e o corolário da respetiva uniformidade”. Relativamente ás referidas considerações, que encontram paralelo nas “Considerações prévias” efetuadas no referido Acórdão (54/2019), sendo que parte deste coletivo o subescreveu, naturalmente que as secundamos, seja em termos de pertinência seja de significado. Dito isto, voltemos a nossa atenção para a impugnação da Recorrente. Porém, previamente, importa verificar se a Apelante deu cumprimento ao tríplice ónus a que nos referimos quando citamos o artigo 640.º do CPC. A este respeito, não podemos deixar de referir que as conclusões do respetivo recurso, apesar de esquemáticas, não facilitam a perceção da impugnação e, por isso, na sequência do articulado da Autora, justificaram a notificação da Apelante para o efeito. Não obstante, complementadas as conclusões com as alegações do recurso, julgamos que, no geral, acaba por dar cumprimento àquele ónus. Vejamos então a matéria impugnada. - os factos provados rrrrr) e sssss). A Recorrente, com base nas declarações do “Professor (…) e relatório VT” (cfr. ponto 162 das conclusões), requer que aqueles factos passem “a integrar a matéria de facto não provada”. Os factos em análise fazem parte da seção identificada por “Factos relativos aos prejuízos e ao nexo de causalidade”, sendo que o primeiro atesta o efeito da colusão no aumento dos preços (brutos) de fábrica e o segundo a repercussão que teve na cadeia comercial e, por fim, na A. A decisão em crise motivou a sua decisão referente aos factos em análise nos pontos 66) a 259). A extensão da motivação é, efetivamente, prova da complexidade da matéria em análise e reflete as respetivas opções legais/ jurisprudenciais, nomeadamente aquelas a que faz referência nas “considerações prévias sobre o Direito Europeu e parâmetros gerais aplicáveis”. Entendemos que o Tribunal a quo faz uma análise exaustiva e explicativa das razões que o levaram a considerar os factos provados, sendo coerente no percurso que encetou. Tendo começado por identificar, acertadamente, o tipo de ação, respetivos requisitos e ónus de prova, para depois explanar o processo evolutivo do seu raciocínio, devidamente apoiado na análise crítica dos elementos probatórios juntos aos autos e conjugado com a aplicação de princípios jurídicos/ interpretativos, e chegar à conclusão que a prova empírica reunida – visão no seu todo – comprova os factos em análise. Apoiou-se, para o efeito, e bem, quer nas normas legais quer em decisões jurisprudenciais, nacionais e comunitárias. Em suma, o seu raciocínio mostra-se lógico e racional, percetível e fundamentado. Naturalmente, como resulta das conclusões da Recorrente, suscetível de crítica(s). Vejamos então se estas devem proceder. Relativamente ao ónus de prova, a Recorrente pugnou que o Tribunal a quo “aplicou incorretamente as regas sobre a distribuição do ónus da prova: competia à Recorrida demonstrar a existência de um dano”, sendo que “o Tribunal a quo bastou-se simplesmente (e erradamente) com a Decisão para formular uma mera convicção e, assim, considerar provado o dano e o nexo causal alegados pela Recorrida.” Porém, salvo o devido respeito, não é isso que decorre da decisão em crise. Efetivamente, o Tribunal a quo, depois de analisar a prova técnica junta aos autos, fazendo menção das respetivas fragilidades e justificando a exclusão das suas conclusões, apelou aos factos vertidos na Decisão da Comissão e, norteado pelos princípios da equivalência e da efetividade, submeteu-os ao crivo das regras da experiência e concluiu pela verificação do dano e do nexo de causalidade. Aliás, o Tribunal a quo considerou, e bem, que não se aplica ao caso sub judice a presunção legal vertida no artigo 17.º, n.º 2, da Diretiva, aplicando-se antes as normas nacionais da responsabilidade civil extracontratual (princípio da autonomia), desde que não sejam menos favoráveis do que as das ações equiparadas (princípio da equivalência) e que não tornem praticamente impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos conferidos pela ordem jurídica comunitária (princípios da efetividade). No seguimento, citando o Ac do TRL proferido no âmbito do processo n.º 54/19.6YQSTR.L1, refere que neste tipo de ações basta “que a parte onerada com o ónus da prova demonstre “que a hipótese fáctica visada encontra confirmação positiva nos meios de prova que apresentou e é mais provável do que não (teoria da probabilidade prevalecente)” (págs. 17 e 27). (destaque é nosso) Efetivamente, no referido acórdão dá-se conta da analogia existente entre a presente ação, em que visa aquilatar da existência de responsabilidade civil extracontratual por violação dos artigos 101.º ou 102.º do TFUE, ou seja, em que se procura determinar o que teria ocorrido na ausência da infração, e aquela em que se visa apurar a existência de danos hipotéticos no âmbito da “perda de chance”, salientando que, por força do já referido princípio da equivalência, as normas nacionais que regem o seu exercício não deverão ser aplicadas de forma diversa ou, melhor, menos favorável; nomeadamente, ao nível das presunções judiciais (artigos 349.º, 351.º e 392.º do CC e 607.º, n.º 4 e 5, do CPC). Mais se dá conta que o STJ constatou “no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 2/2022, em matéria relativa a danos hipotéticos no âmbito da “perda de chance”, “para estarmos perante uma chance com probabilidade de sucesso suficiente terá, em princípio e no mínimo, o sucesso da chance (o sucesso da provável ação comprometida) que ser considerado como superior ao seu insucesso, uma vez que só a partir de tal limiar mínimo se poderá dizer que a não ocorrência do dano, sem o ato lesivo, seria mais provável que a sua ocorrência.” Assim como, que o STJ adverte que “não pode exigir-se que o dano decorrente de tal comportamento indevido seja objeto de uma certeza absoluta, ou seja, a certeza sobre a realidade hipotética do que não chegou a verificar-se tem sempre que se situar no domínio das probabilidades (das certezas relativas)”. Daí que, tendo afastado a prova de natureza técnica e afastada a necessidade de recurso à utilização de métodos económicos, reportando-se à Decisão da Comissão, donde retira elementos factuais que, analisados de acordo com as regras da experiência, concluiu “com base em conhecimentos empíricos” pela existência do dano. De entre esses elementos factuais, como disso dá conta a decisão em crise, destacam-se: a autoria e as caraterísticas da infração (natureza, duração, intencionalidade, continuidade, grau de coordenação, extensão e a menor substituibilidade dos produtos). Assinale-se que a Decisão da Comissão, decorrente do seu dispositivo e fundamentação, reportada aos termos da existência, natureza e âmbito material, subjetivo, temporal e territorial da infração, é vinculativa para os Tribunais nacionais, como resulta do artigo 16.º, n.º 2, do Regulamento n.º 1/2003, sendo, por isso, “uma presunção inilidível”. Importa, nesta matéria, recordar que a Decisão da Comissão “não demonstrou os efeitos concorrenciais reais”, (apenas) por não ser necessário, pois, como aí se referiu, o objetivo anticoncorrencial da conduta em questão ficou provada” (cfr. ponto 82 da Decisão). A decisão em crise, em forma resumida, explicou a sua posição da seguinte forma: “Por conseguinte, é possível e aceitável chegar-se a uma convicção quanto à existência de um preço adicional compatível com o referido standard da prova sem ser necessário utilizar os aludidos métodos económicos, apenas com base em inferências sustentadas nas regras da experiência a partir das características da conduta. Não sendo necessário inclusive a construção de uma teoria do dano apoiada apenas em parâmetros decorrentes da literatura económica. Uma vez que estão em causa efeitos de ações e comportamentos de pessoas é aceitável que se recorra a critérios gerais extraídos das regras da experiência comum e de padrões de normalidade e razoabilidade. A aplicação de tais parâmetros ao caso concreto conduz-nos à convicção segura de que a conduta conduziu a que os preços das referidas viaturas pagos pelos diversos intervenientes na cadeia comercial, desde os importadores, passando pela instituição financeira, no caso do contrato de locação financeira, até à A. fossem superiores àqueles que teriam sido praticados caso não tivesse ocorrido a mesma. Esta convicção sustenta-se, por um lado, nas características da infração, tendo em conta a sua natureza, a sua duração, a sua intencionalidade, a sua continuidade, o grau de coordenação, a sua extensão e a menor substituibilidade dos produtos em causa e no facto dos preços brutos serem o ponto de partida para a fixação dos preços líquidos e, por outro lado, na ausência de prova suscetível de infirmar o que resulta de tais parâmetros. Mas explicitemos cada um destes pontos. Prosseguiu o seu raciocínio dissecando as assinaladas características, interpretando-as e projetando-as em termos de relevância e impacto no âmbito anticoncorrencial, o que faz por referência a decisões jurisprudenciais ou mesmo da Comissão. Entre estas, destacamos a circunstância de estarmos perante vários “atos que tinham um objetivo comum, estavam interligados e eram complementares e que, por isso, não foram ocorrências isoladas ou esporádicas”. Relativamente ao objetivo comum, como se dá conta na Decisão da Comissão, é referido que “as práticas de colusão tinham um único objetivo económico, nomeadamente a distorção da fixação independente dos preços e do movimento normal dos preços dos camiões no EEE”(cfr. 71 da Decisão), sendo que se tratou de um “processo contínuo e não ocorrências isoladas ou esporádicas … que permaneceu o mesmo” (objetivo) “ao longo de todo o período da infração. Mais destacamos, a referência a matéria relativa à troca de informações e/ ou acordos explícitos, dando conta que, “não só a infração não se consubstanciou apenas em trocas de informações, como não se resumiu a esse e outros atos de coordenação tácita, tendo implicado acordos explícitos sobre preços e aumentos de preços; As implicações que daqui decorrem consistem no facto evidente de ser mais provável que um acordo explícito sobre preços e aumentos de preços tenha impacto nos preços do que uma troca de informações, sendo uma das práticas restritivas da concorrência mais graves e prejudiciais. Efetivamente, estes acordos explícitos, incluídos na designação de “hardcore cartels”, são, conforme caracterizou o Supremo Tribunal dos EUA, o “supreme evil of antitrust.” A este respeito, a decisão em crise deu conta que o Guia Para a Quantificação de Danos da Comissão refere que a “constatação de que os acordos explícitos sobre preços têm uma probabilidade muito elevada de gerarem efeitos anti concorrenciais, nomeadamente por via dos preços, tem subjacente evidências empíricas.” Mais deu conta que “no parágrafo 40 da decisão do TJUE no já aludido caso C-588/20, se refira “há que salientar que, segundo o artigo 1.º da decisão em causa, o cartel em questão no processo principal tinha como objeto, por um lado, a fixação de preços e o aumento dos preços brutos no EEE dos camiões médios e dos camiões pesados, e, por outro, o calendário e a repercussão dos custos relativos à introdução de tecnologias de emissões exigidas pelas normas EURO 3 a 6”. Destacamos ainda a duração da conduta, pois que decorreu de janeiro de 1997 a janeiro de 2011 (14 anos), sendo esta duração, como ali se dá conta, “um fator muito importante, na medida em que aumenta evidentemente a probabilidade de gerar efeitos anti concorrenciais. Para além disso, demonstra estabilidade entre as empresas envolvidas e capacidade de se coordenarem, mesmo sem que exista evidência de mecanismos de monitorização e punição de desvios. Adicionalmente, 14 anos é demasiado tempo para que as pessoas envolvidas não percebessem que os seus esforços não estavam a produzir benefícios ou, tendo noção disso, continuassem a tentar.” A decisão, a este respeito, deixou claro “que por mais bem elaborada que seja a literatura económica sobre comportamentos colusivos a verdade é que o senso comum simplesmente não é compatível com a possibilidade das empresas envolvidas terem procedido da forma como procederam durante 14 anos, à espera, de um dia, não se sabe quando e não se sabe como ou porquê, conseguirem obter ganhos com a sua conduta. Por não ser compatível com as regras da experiência a referida possibilidade precisava de ser explicada e explicada assumindo a infração tal como ela é e por quem nela participou. Ou seja, para que fosse possível afastar a referida inferência impunha-se que as empresas envolvidas, que sabem aquilo que fizeram, porque é que o fizeram durante tanto tempo e aquilo que conseguiram ou não conseguiram, apresentassem uma explicação minimamente plausível para que se conseguisse compreender como é que se conluiaram durante tantos anos sem sucesso. Explicação essa que não existe.” Mais destacamos, a extensão do mercado envolvido, no caso todo o território da EEE, sendo que as infratoras tinham uma quota agregada próxima dos 90%. Também a este respeito a decisão referiu que “Esta característica é muito relevante, pois quanto mais extenso for o mercado mais probabilidade há de a conduta gerar efeitos anti concorrenciais, porque significa que os clientes têm menos possibilidade de escolha. O que confere aos participantes na infração mais margem para aumentarem os preços.” Destacamos ainda, a (não) substituibilidade do produto, pois que os camiões médios e pesados não são substituíveis por outros veículos e, como se refere na decisão em crise, “quanto menos alternativas de mercado dispuserem os clientes mais probabilidades há de as práticas colusórias serem bem sucedidas.” Finalmente, destacamos a referência feita, em sede de síntese conclusiva, à decisão deste Tribunal da RL que todas estas características que sustentam esta conclusão “são específicas do concreto cartel ora em causa. Não tratam, portanto, de características genéricas atribuíveis a um qualquer cartel em abstrato.” Dito isto, salvaguardado o devido respeito, julgamos, pois, que a linha de pensamento efetivada pelo Tribunal a quo, está devidamente fundamentada na prova existente no processo, nas regras legais e nos princípios jurídicos que se aplicam, suportada ainda em jurisprudência nacional e europeia, pelo que não vemos que seja possível imputar ao raciocínio do Tribunal a quo a violação das regras sobre a distribuição do ónus da prova e que se possa concluir que “o Tribunal bastou-se simplesmente (e erradamente) com a Decisão para formular uma mera convicção e, assim, considerar provado o dano e o nexo causal alegados pela Recorrida” ou que “tenha lançado mão de uma presunção judicial de danos e de nexo de causalidade” como “violação das regras sobre a distribuição do ónus da prova”. Acresce deixar mais uma nota a respeito desta questão. Pois que, a Decisão da Comissão atesta “o reconhecimento” por parte da aqui R., “em termos inequívocos, da responsabilidade pela infração descrita … à qualificação jurídica, incluindo a sua função e a duração da sua participação na infração”; o que também contribui para a articulação do processo probatório. A Recorrente pugna ainda que o Tribunal a quo aplicou um duplo standard de prova legalmente inadmissível, tendo originado um desfavorecimento processual e substantivo, em clara violação do princípio da igualdade de armas. Relativamente ao ónus de prova, julgamos que já se mostra afastada a posição da Recorrente. Vejamos, então, se a “Recorrida” não apresentou “meios de prova suficientemente robustos que possam ser considerados nestes autos e, por isso, não logrou confirmar a hipótese fática que advoga”. Assinale-se, que a propósito da prova económica/ técnica apresentada pelas partes, seja o Relatório Z... (Peritagem, Avaliação de Prejuízos, Cartel de Camiões – EU, de 2021), sejam os Relatórios AA/BB (Refutação do Relatório Pericial Z... e Relatório de Peritagem para a Volvo Trucks/ Renault Trucks) ou seja o Estudo Oxera 2019 (Como Avaliar os efeitos da infração no Caso de Camiões), o Tribunal a quo, depois de os analisar, tendo ainda complementado com as declarações de autores dos dois primeiros, no caso de (…) e de (…), ponderou as criticas/ observações feitas àqueles e concluiu, fundamentadamente, que apresentam vícios e/ ou desconformidades que afetam a respetiva credibilidade, obstando, por isso, à sua consideração como meio de prova válido para os fins a que se propunham. Nomeadamente: - relatório Z... - a circunstância de o não ser propriamente um relatório de demonstração de danos, mas de quantificação; a circunstância de assumir o sobrecusto como um pressuposto implícito – não explicado – e não como uma conclusão; não se mostra suficientemente sustentado; fragilidade da metodologia adotada; os parâmetros de comparação utilizados não se mostram suficientemente adequados e fiáveis; o IPRI para a Alemanha e para os Países Baixos ignora completamente o mix específico das características dos camiões vendidos; o índice de preços Volvo-Scania pressupõe que o índice é comparável ao longo do tempo; o índice PRODCOM apresenta fragilidades ao nível da comparação de preços entre os veículos ligeiros e os pesados de mercadorias e da comparabilidade temporal; o índice global de preços não elimina nem atenua as criticas expressas em relação a cada índice; a escolha do mercado dos camiões mexicano para a sustentar aplicação do método é insuficiente, nomeadamente porque não demonstra e devia demonstrar que os factores que interferem com a oferta e a procura são similares aos do europeu; não se baseia em dados relativos a todo o período de infração (cfr. pontos 83 e segs. da motivação). - depoimento de (…) – do depoimento não se colhem fundamentos concretos, sustentados e sólidos (cfr. pontos 105 e 112 da motivação). - estudo Oxera – teve como pressuposto o facto de a infração ter consistido apenas em troca de informações o que, sendo “manifestamente incorreto” afasta a valia probatória deste meio de prova (cfr. pontos 202 e segs da motivação/sentença). - relatórios AA/BB – Refutação - “contém asserções gerais quanto à insusceptibilidade da conduta ter gerado um sobrecusto, que não se esgotam nas especificidades do relatório Z... e que, por isso, não são totalmente absorvidas por via da desconsideração destes meios de prova”; nomeadamente as “características do mercado tornam particularmente difícil para os fabricantes chegar a um entendimento relativamente a um comportamento colusivo específico. O preço de um camião irá refletir características altamente personalizadas e inclui muitas vezes outros serviços vendidos em paralelo. Além disso, o preço cobrado por um FEO não será visível para outros FEO” que o teor do ponto (26) da decisão da Comissão é também devido ao conteúdo da mesma que não podemos acompanhar esta asserção; a decisão da Comissão evidencia, conforme já referido, a existência de acordos explícitos de fixação de preços. E evidencia também, tal como explicitado, que todos os atos foram praticados com o objetivo comum de distorção da fixação independente dos preços e do movimento normal dos preços dos camiões no EEE, sendo complementares ente si. Para além disso, a Comissão Europeia também afirma que o setor dos camiões é caracterizado por um elevado grau de transparência devido ao seguinte conjunto de fatores alheio à infração: registos públicos; troca regular de dados com diversas associações do setor; apresentação espontânea, pelos clientes, das ofertas dos concorrentes com o objetivo de negociar os preços, e também através da metodologia do cliente mistério (cf. ponto (29)). É verdade que uma das incertezas que as empresas envolvidas “ainda tinham relativamente ao mercado dos camiões era o comportamento futuro dos produtores de camiões e, mais concretamente, as suas intenções no que diz respeito às alterações aos respetivos preços brutos e às tabelas de preços brutos” (ponto (30)). Contudo, foi sobre este foco de incerteza que incidiram os atos praticados, quer as trocas de informações (em larga medida), quer as discussões e acordos, tendo em vista, pela sua própria natureza, a superação dessa incerteza; “não é compaginável com as regras da experiência comum, conforme já explicitado, que durante 14 anos se mantivesse a conduta, dirigida intencionalmente ao objetivo referido e praticamente sem deixar margem ao consumidor para procurar alternativas, sem noção ou na expectativa de um sucesso ainda não alcançado. Para além disso, o simples facto de ter sido possível implementar a conduta, só por si, num mercado com as características assinaladas é a evidência demonstrativa de idêntica possibilidade de sucesso, pois os intervenientes – melhor do que ninguém – conheciam e conhecem o mercado em que operam.”; o preço pago pela Auto-Sueco à R. (impactado pela conduta) era o ponto de partida para a formação do seu preço aos seus clientes finais, não sendo plausível, sem evidências em sentido contrário, que aumentos dos preços de compra dos veículos à R. ou não diminuições fossem suportadas pelas margens da Auto Sueco em moldes que não se teriam verificado sem a infração, tendo em conta que a conduta envolveu fabricantes que detinham uma quota agregada de 90% do mercado, a não substituibilidade dos camiões por outros veículos e a ausência de concorrência intra marca no que respeita aos negócios efetuados pela Auto Sueco, importador nacional exclusivo dos veículos da R.; “assenta num pressuposto incorreto, designadamente que a conduta consistiu fundamentalmente em uma troca de informações. Por conseguinte, a mesma não pode ser considerada”; a respeito das diferenças significativas e não sistemáticas entre os preços resultantes dos elevados e variados níveis de descontos que os FEO precisam de oferecer a fim de atrair clientes em diferentes países e em diferentes transações” refere que “Discorda-se, tendo em conta, conforme já referido, que a conduta abrangeu a quase totalidade do mercado e, no plano intra marca, todos os camiões em causa foram vendidos pela Auto-Sueco que era o importador único e exclusivo para Portugal, não sendo plausível que os concessionários estivessem em condições de concorrer com o importador único. Por conseguinte, não se afigura plausível, sem evidências em sentido contrário (que não existem, no caso) que eventuais aumentos ou não descidas dos preços brutos tenham sido absorvidas pelas margens do importador, por via da aplicação de descontos praticados para anular esse efeito; o relatório de refutação não é suscetível de comprometer o juízo de elevadíssima probabilidade alcançado (cfr. pontos 205 e segs da motivação/ sentença). - Relatório AA/BB – assumiu o mesmo pressuposto de que partiu o estudo Oxera 2019, ou seja, que a infração consistiu em uma troca de informações, sendo este incorreto; que efetuou uma análise empírica dos preços observados nas transações dos camiões volvo cuja metodologia é agnóstica quanto à natureza da infração; considerou o método de comparação no tempo, reportado a 2003 a 2016, dando conta “não terem razões à priori para crer que o impacto da infração nos preços não teria sido diferente durante o período inicial da infração; entende-se que tem fragilidades estruturais que não permitem que o mesmo possa ser considerado, como o SCOM, as características, o período abrangido (por falta de elementos disponíveis ponto 235). O SCOM que não está suficientemente explicado, fundamentado e comprovado; as caraterísticas dos veículos, pois que apenas se concentrou em quatros delas, quando existem outras características relevantes como é reconhecido pelos mesmos Autores do relatório; Em suma, o relatório não afasta, por falta de fundamentação suficiente e sustentada, a possibilidade de existirem outras características com um impacto relevante nos preços e, nessa medida, não exclui a possibilidade de haver diferenças de preços entre o período da infração e o período pós-infração não explicadas pelas variáveis consideradas, nomeadamente a relativa às características; o “tempo” é uma mera suposição, não sustentada em dados concretos e sólidos, e, nessa medida, não afasta a possibilidade dos resultados obtidos puderem ter sido diferentes. - depoimento de (…) – que considerou convergente com os relatórios e, em conformidade, não é suscetível de comprometer a análise efetuada aos mesmos. Nessa medida, consideramos que a argumentação explanada pela Recorrente, nomeadamente nos pontos 28) e 32) das conclusões de recurso, carecem de fundamento. Aliás, a desvalorização dos referidos meios de prova e a valorização da Decisão da Comissão, nos termos referidos supra, não representa, de forma alguma, um duplo standard de prova legalmente inadmissível ou uma violação do princípio da igualdade de armas, mas antes o exercício crítico e lógico que se impõe ao julgador aquando da análise das provas. A Recorrente alega ainda que se verifica dualidade de critérios, em termos de exigência probatória, por alegadamente o Tribunal a quo entender ser desculpável a Recorrida não carrear aos autos documentos que comprovem os preços alegadamente pagos pela aquisição de diversos veículos e, nessa medida, decidir “oferecer-lhe uma segunda oportunidade”, relegando para sede de liquidação de sentença a possibilidade de esta vir apresentar prova quanto a algo que deveria ser provado no decurso do presente processo, concluindo que a falta de dados não pode ser interpretada em detrimento da Recorrida; mas, por outro lado, já condena negativamente a Recorrente pelo facto de esta não dispor de dados anteriores a 2003 que pudessem ser usados na análise levada a cabo no seu Relatório VT. Importa referir que, salvo o devido respeito, estamos perante questões diversas, pois num caso está-se a ponderar a valia de um meio de prova apresentado pela parte e no outro, perante a prova do dano, mas com a falta de elementos para fixar o “objeto ou a quantidade”, a dar cumprimento ao previsto no artigo 609.º do CPC. No primeiro caso, por se tratar de um estudo de natureza técnica encomendado e apresentado pela própria e que incidiu sobre os elementos por esta fornecidos, sem, contudo, abranger todo o período em que incidiu a prática sancionada pela Decisão da Comissão, “mereceu”, também por isso, as críticas do Tribunal a quo. No segundo caso, por se tratar de um procedimento legal, mostrando-se verificados os respetivos pressupostos, não vemos como obstar à sua aplicação ou, dito de outra forma, que a sua aplicação corresponda a um favorecimento adjetivo ou substantivo. Nessa medida, sendo questões diversas, justificam soluções igualmente diversas, pelo que improcede a pugnada pretensão da Recorrente e, naturalmente, a pugnada violação do princípio da igualdade de armas. A Recorrente pugna ainda que os preços brutos não eram pagos por qualquer entidade em Portugal (incluindo a Recorrida), ao contrário do que o Tribunal a quo considerou. O Tribunal a quo, apelando à Decisão da Comissão, constatando que esta faz referências a preços sem os limitar a “brutos de lista”, “líquidos” e “descontos”, reconhece que a conduta sancionada se reconduz, no que respeita aos preços e a acordos colusórios sobre os preços brutos da lista. Porém, e bem, também refere que “isso não significa que não tenha tido impacto nos preços líquidos praticados nos vários níveis da cadeia de comercialização. Aliás, dá conta que “antes se deve concluir o contrário, ao contrário daquilo que a R. defende, conforme se procurará explicitar.” Para o efeito, ou seja, para a explicitação, faz referência oportuna a várias decisões, donde resulta, permita-nos dizer, aquilo que resulta das regras da experiência, “os preços indicativos vertidos nas listas de preços servem de ponto de partida (“starting Point”) para as negociações subsequentes com os clientes” e que “qualquer que seja o poder de compra dos grossistas, a coordenação anual dos preços de lista entre os fabricantes é suscetível de influenciar o preço de transação pago pelos grossistas e, subsequentemente, pelo consumidor final (§ 60). Mais esclareceu o Tribunal que mesmo que as alterações dos preços de transação não seguissem as alterações introduzidas nos preços de lista isso não excluía a possibilidade de aumentos coordenados dos preços de lista serem suscetíveis de ter impacto nos preços pagos pelos consumidores, ao permitir que esses preços aumentassem ou, pelo menos, se mantivessem (§ 61).” Prossegue aquela referência, agora reportando-se à questão dos descontos, dando conta que “os preços líquidos até podem diminuir face àqueles que eram aplicados antes da coordenação de preços brutos de lista, por via de um aumento de descontos. Contudo, o que importa é que se possa concluir que esses preços líquidos são superiores àqueles que teriam sido aplicados se não tivesse ocorrido a infração.” Importa desde já referir que se concorda com a apreciação efetuada, nomeadamente pelos vários argumentos explanados nas decisões citadas pelo Tribunal a quo, sendo que admitiríamos hipótese contrária, reportado ao consumidor, caso a R. demonstrasse que quando vendia os veículos à revendedora em Portugal lhe dava ordens para os vender a baixo desse preços, o que, não só não foi alegado, como, diríamos nós, sendo esse o preço da venda inicial, não faria sentido; assim como tendo sido aplicado um desconto àquela, esse necessariamente seria refletido num preço bruto inflacionado, o que redundaria, naturalmente, num valor superior ao que seria num preço bruto não inflacionado. O Tribunal a quo, na sequência dos depoimentos prestados por (…) e (…), reportando-se ao “primeiro momento ou elo da cadeia de comercialização dos veículos consistiu na venda dos camiões pela R. à Auto-Sueco”, considera provados os seguintes factos: Relativos aos preços brutos: Ø As tabelas de preços brutos foram usadas para criar uma estrutura lógica de preços para as centenas de opções de configuração de veículos disponíveis e para garantir uma diferenciação consistente de preços entre os produtos oferecidos pela Volvo. Ø Em particular, as listas de preços brutos permitiram criar uma hierarquia lógica de valores entre uma infinidade de extras e modelos de veículos de maior e menor valor, a qual assume especial importância para produtos heterogéneos e altamente diferenciados como os camiões, dada a ampla gama de modelos, opções e acessórios disponíveis. Ø A partir de janeiro de 2002, os preços brutos da Volvo passaram a ser paneuropeus, mas eram depois adaptados de vários modos para ter em conta e refletir a realidade dos diferentes países em que eram aplicados. Ø Os preços brutos foram definidos por referência a fatores comerciais comuns, como sejam o valor dos extras relevantes para o cliente, os custos de produção desses extras e a sua posição na hierarquia dos extras (por exemplo, motores com maior potência terão preços brutos mais altos), custos de produção, entre outros fatores de mercado. Ø Ao avaliar o valor de um extra, eram tidos em consideração fatores como a potência, o motor, o tipo de cabine, a disposição dos eixos e a caixa de velocidades, fatores esses que visavam garantir que os preços brutos seriam calculados de forma consistente. Ø As listas de preços brutos ajudaram a estruturar a oferta de produtos da Volvo, incluindo preços para o modelo "base" de cada veículo (um modelo pré-especificado com um conjunto de parâmetros técnicos fixos). Ø Para além disso, dadas as diferentes funcionalidades dos veículos de carga média e pesada, as mencionadas listas de preços brutos também incluíam preços brutos para todos os extras disponíveis de cada modelo de veículo, que poderiam ser usados para construir ou complementar a configuração final de um veículo. Ø As listas de preços brutos eram, portanto, meramente indicativas para a determinação do preço final, que refletiria depois uma série de fatores adicionais. Factos relativos aos preços pagos pela Auto-Sueco: Ø Os preços brutos jamais foram pagos pelo importador (Auto-Sueco). Ø Nas negociações dos preços a que os camiões eram vendidos à Auto-Sueco, a Volvo Truck Corporation considerava uma série de fatores, incluindo inter alia a estratégia comercial global, o ambiente de mercado geral em Portugal (resultante, por exemplo, de indicadores como a situação macroeconómica) e a natureza e dimensão das aquisições, ou seja, o tipo e número de camiões adquiridos. Ø Nas negociações entre a Volvo Truck Corporation e a Auto-Sueco era aplicada uma vasta gama de descontos, entre os quais se incluíam, geralmente, os seguintes: a) Descontos padrão, que seriam aplicados a todas as transações e estabelecidos pela Volvo Truck Corporation, variando consoante o modelo do camião e o tipo e número de extras adquiridos; b) Descontos adicionais, os quais eram negociados entre a Volvo Truck Corporation e a Auto-Sueco e estavam relacionados com as características específicas de cada transação e com os camiões em questão, tais como a quantidade e o tipo de extras escolhidos; e c) Descontos de campanha, que podiam ser determinados pelo volume da transação ou envolver descontos adicionais para um modelo específico. Ø Poderia acontecer ainda, que a Auto-Sueco solicitasse descontos ad hoc à Volvo Truck Corporation em função da necessidade de assegurar uma oferta competitiva para determinadas vendas de maior dimensão ou de frotas a clientes finais portugueses. Ø Nesses casos, a Volvo Truck Corporation poderia conceder um desconto adicional à Auto-Sueco.” Não obstante, como vimos, conclui que “os preços líquidos eram apurados tendo por base os preços brutos, ou seja, os preços brutos – fosse qual fosse a sua função e utilidade – eram a base de cálculo dos preços líquidos.”(destaque é nosso) Reportando-se ao “segundo elo da cadeia de comercialização verificado no caso, entre a Auto-Sueco e a A. ou, no caso do contrato de locação financeira, a sociedade locadora”, o Tribunal a quo, deu como assentes os seguintes factos: Ø “A Auto-Sueco, quer na relação com clientes finais, quer na relação com concessionários independentes, tinha total liberdade para aplicar as condições comerciais que entendesse e para definir em que moldes pretendia apoiar esses concessionários na promoção de vendas. Ø A Auto-Sueco também tinha total discricionariedade para, enquanto importadora independente, determinar os preços que pretendia cobrar aos seus próprios clientes pelos camiões (e, por conseguinte, as suas próprias margens sobre os preços pagos à Volvo Truck Corporation). Ø A Volvo Truck Corporation - e por maioria de razão a R. - não tinha conhecimento, controlo ou visibilidade sobre os preços pagos à Auto-Sueco ou sobre qual o processo adotado pela Auto-Sueco na determinação de tais preços. Ø Habitualmente, a Volvo Truck Corporation - e por maioria de razão a R. - nem sequer tinha conhecimento relativamente a quem a Auto-Sueco estava a vender os camiões numa determinada transação. Ø Os preços pagos pelos clientes finais (Preço Líquido para o Cliente) em Portugal, durante o período em causa, não eram preços brutos. Ø O Preço Líquido para o Cliente em Portugal, durante o período em causa, resultava, isso sim, das negociações individuais entre o cliente final e a Auto-Sueco / seus concessionários e/ou os concessionários independentes. Ø Nem a R. nem qualquer das suas subsidiárias tinha qualquer envolvimento ou intervenção nestas negociações. Ø Tais negociações seriam específicas de cada transação e teriam em consideração os interesses comerciais particulares de cada parte, incluindo as circunstâncias individuais do cliente, o modelo, os extras específicos e o seu histórico na compra de camiões. Ø As vendas de camiões a clientes, pelas características próprias deste tipo de produtos e dos próprios clientes (empresas e não consumidores) envolvem geralmente um processo de negociação, que pode conduzir a diferentes desfechos quando ao preço final de aquisição. Ø O típico ponto de partida para a venda de um camião consistia na abordagem de um cliente à unidade de retalho ou ao concessionário Auto-Sueco ou a concessionário independente, solicitando um camião com determinadas características. Ø Em termos gerais, os clientes compravam camiões selecionando um dos numerosos modelos que eram oferecidos e depois especificavam quais as características e extras que pretendiam incorporar no camião quando este fosse fabricado. Ø Além de escolherem entre as opções de padrão disponíveis, os clientes podiam até solicitar ajustes feitos à medida no veículo, que não faziam parte da oferta padrão de produtos da Volvo. Ø Tendo em conta que cada cliente era diferente, os camiões precisavam de ser configurados de acordo com os requisitos específicos de cada um dos clientes. Ø Essa complexidade determinava que cada transação tivesse de ser negociada individualmente com cada cliente.” Tendo ainda deixado claro que “não se duvidando também de que é muito mais provável que os preços líquidos aplicados pela Auto-Sueco, no caso concreto, fossem superiores àqueles que teriam sido aplicados sem infração, porque o sobrecusto no preço bruto teve impacto no preço líquido pago pela Auto-Sueco e, consequentemente, afetou o preço do produto que é objeto de negócio da Auto-Sueco e que é a base para a aplicação da sua margem. Que existe esta relação entre o preço bruto e os preços líquidos pagos nos diversos elos da cadeia de comercialização é uma evidência decorrente dos descontos pontuais que a Auto-Sueco pedia à R. para determinados negócios e clientes. Estes pedidos são reveladores de como o preço líquido suportado pela Auto-Sueco impactava no preço que a própria ia cobrar aos seus clientes. Era, evidentemente, o ponto de partida. Por conseguinte, de acordo com parâmetros de normalidade e razoabilidade pode-se concluir que os preços líquidos cobrados pela Auto-Sueco aos seus clientes foram com elevadíssima probabilidade superiores àqueles que teria cobrado caso não tivesse existido infração, por refletirem os aumentos ou as não reduções dos preços brutos refletidas nos preços líquidos pelos quais a Auto-Sueco os adquiriu.”(destaque é nosso) A Recorrente pugna ainda que “o mercado dos camiões de pesados é caracterizado por uma concorrência intensa entre fabricantes, mesmo durante o período da infração”, não tendo o Tribunal a quo considerado “devidamente que as características do mercado são muito pouco propícias à existência de efeitos anticoncorrencias decorrentes da infração”. Porém, como se constata a fls. 192, a decisão em crise ponderou tal consideração, salientando, aliás, as diversas decisões proferidas pela Comissão em que essa consideração fora efetuada. Não obstante, dá conta que “nenhuma destas decisões afasta o juízo de probabilidade alcançado, por uma razão simples: a decisão da Comissão referida na alínea b) dos factos provados veio demonstrar que o juízo de probabilidade formulado nessas decisões quanto à possibilidade de virem a ocorrer efeitos coordenados estava errado. E estava errado porque assentou em pressupostos de facto incorretos. Certamente, que a Comissão não teria escrito aquilo que escreveu e não teria concluído nos termos em que concluiu se já tivesse um conhecimento seguro da realidade que veio a descrever na decisão em causa. Conhecimento esse que não tinha em 2011, pese embora já tivesse iniciado a sua investigação.” Assim, ao contrário do pugnado pela R., o Tribunal a quo ponderou a questão suscitada e fê-lo, como se viu, convenientemente, pois que se baseou na Decisão da Comissão a que nos temos vindo a referir e que sobre a matéria concorrencial não deixou dúvidas quanto aos acordos referidos e respetiva abrangência em termos de quota de mercado. A Recorrente pugna ainda que a cadeia de distribuição e comercialização dos seus camiões, que se caraterizam por produtos complexos e altamente heterogéneos com características técnicas específicas, durante o período da infração, corrobora que a infração não era apta a produzir, de forma automática, os danos alegadamente sofridos pela A. em resultado da infração. Assinale-se, novamente, que a comercialização dos camiões da R. em Portugal não foi efetuada por qualquer empresa do Grupo da R., mas antes pelo importador independente. Acresce também referir, face à alegação da R., que também resulta das regras da experiência, como, aliás, a decisão em crise não refuta, que os preços de compra pelo consumidor final são determinados – também – pelas condições locais da procura e concorrência, bem como pelas características do cliente e dos camiões adquiridos. Porém, como vimos, a “variável” objeto dos autos encontra-se a montante de todas estas circunstâncias que, não se afasta, também influenciam o preço final; e, como também já referimos, condiciona logo à partida as demais; é disso que se trata e é isso que se apurou e, permita-se-nos acrescentar que só assim se compreende que a prática que se vem a descrever, com os custos e riscos inerentes, por Grupos Económicos de vulto como os identificados na Decisão da Comissão, se tenha prolongado por cerca de 14 anos. A presente conclusão, por igualdade de razão, aplica-se ainda ao argumento que a R. formulou no ponto 108) das suas conclusões de recurso, pois que os “níveis de desconto aplicados ao nível da cadeia de distribuição”, como, aliás, já referimos, sendo variáveis e discricionários, teriam sempre de ter uma referência de partida/ incidência e esta, como vimos, estava condicionado pela infração. Face a todo o exposto, reportando-nos aos factos provados rrrrr) e sssss), quer por não se mostrarem violados os princípios que a R. alegou e também o relatório “VT” e o depoimento de (…) não se mostram capazes de infirmar a restante prova, improcede, assim, a pretensão da R. Prosseguindo. Na sequência do exposto, tal como efetuou a Recorrente, pois que ao longo da sua extensa exposição reportada ao dano e ao nexo de causalidade (factos rrrrr) e sssss), pugnou que se considerassem outros factos como provados, sendo que, também nesse âmbito, como vimos, acabamos por nos pronunciarmos sobre os mesmos. Não obstante, importa agora aquilatar se estes devem ser considerados ou, dito de outra forma, se efetivamente se mostram provados ou, ainda, se são relevantes. Naturalmente, que a análise que se segue, conforme já referimos, vai implicar a reprodução/ repetição de algumas passagens e/ ou considerações. Vejamos: - Relativamente à circunstância de “a infração consiste predominantemente numa troca de informações”(cfr. ponto 73 das conclusões do recurso). Tal como já demos conta, a decisão em crise, de forma absolutamente clara, explicou que a infração “não se resumiu a esse e outros atos de coordenação tácita, tendo implicado acordos explícitos sobre os preços e aumentos de preços”, sendo que esta consideração, decorre da Decisão da Comissão. Nessa medida, a formulação pretendida pela Recorrente, com recurso à expressão «predominantemente», partindo de um facto também apurado, torna-a absolutamente redutora, pois que também a troca de informações, sendo também apontada pela Decisão, manifestamente fica aquém do mais apurado. Face ao exposto, chamando à colação o que se referiu sobre o valor probatório da Decisão, é inquestionável que a pretensão da Recorrente terá que improceder. - No que diz respeito a saber se “A infração não gerou quaisquer efeitos restritivos da concorrência e quaisquer danos para a Recorrida sob a forma de um sobrecusto na aquisição dos camiões (ponto 82 das conclusões de recurso). Mais uma vez, tal como já demos conta, a decisão em crise explicou de forma clara, lógica e convincente como chegou ao efeito que a infração desencadeou no mercado, em particular ao aumento dos preços (brutos) de fábrica, à repercussão que teve na cadeia comercial e, por fim, na A. Assim, em termos da sua explicação, que, necessariamente, desemboca no oposto do facto agora em análise, remetemos para o que se referiu a respeito dos factos rrrrr) e sssss). - Por sua vez, saber se “O mercado dos camiões pesados é caracterizado por uma concorrência intensa entre fabricantes, mesmo durante o período da Infração” (ponto 94) das conclusões de recurso). A decisão em crise, a este respeito, também não deixa dúvidas, pois que, dando conta da evolução efetuada pela Comissão a respeito deste setor económico/ industrial, chegou à conclusão da existência dos acordos a que nos vimos referindo. Essa realidade, que se desenvolveu durante um período de cerca de 14 anos, será que é compatível com o “facto” que a Recorrente pretende levar aos factos provados? Admitimos que o seja, porém, apenas e só, na medida em que não ponha em causa a existência daqueles acordos (efeito vinculativo da decisão/ inilidíveis). Efetivamente, a constatação (conclusão) da existência de uma “concorrência intensa” não é incompatível, como, aliás, julgamos resultar da decisão em crise, com a constatação de acordos (ilegais), nomeadamente, sobre preços; pois que estamos perante um setor económico extremamente complexo, como julgamos ser do conhecimento geral, seja em termos tecnológicos seja comerciais, que importam uma vastidão da variáveis suscetíveis de efetivar a pugnada concorrência, o que, também, resulta abundantemente da prova junta aos autos e disso dá conta a sentença. Dito de outra forma, a formulação (conclusão) pretendida pela Recorrente, sendo negada, seria contraditada pela constatação empírica de que as empresas do setor procuram, nomeadamente, soluções tecnológicas que lhes permitam apresentar produtos “melhores” que a concorrência; porém, do que se trata nesta ação, como a sentença em crise disso dá conta, é da existência de acordos ilegais efetuados entre empresas do setor, nomeadamente a aqui Demandada, que distorceram os preços dos camiões, nomeadamente, os adquiridos pela aqui Demandante. Assim, o pugnado “facto”, podendo ser “compatível”, seguramente que não revela interesse para a ação em análise, cabendo, pois, na formulação exclusiva encontrada pelo Tribunal a quo nos pontos 27 (“… matéria de direito, de natureza irrelevante ou conclusiva”) e 28 (“… factos que visam contrariar os factos relativos à existência do dano, do nexo de causalidade e do respetivo montante. Por consubstanciarem uma impugnação motivada entende-se que os mesmos não têm de ser incluídos nos factos provados e não provados, pois a sua procedência ou improcedência ir-se-á refletir na inclusão nos factos provados ou não provados, conforme o caso, dos factos essenciais que visam afastar.”). Nessa medida, julgamos que o pugnado “facto”, nos termos em que é formulado, por não ser relevante para o objeto da ação, ou seja, não tendo a virtualidade de influenciar a sua discussão, não pode ser carreado para os factos. - Relativamente a saber se “a Auto-Sueco, enquanto importadora e comercializadora, e ainda outros concessionários independentes, procediam à comercialização de camiões Volvo em Portugal, de forma exclusiva, com autonomia e independência, definindo a sua própria política comercial, descontos e preços para cada transação e (ii) Os preços que os clientes pagavam pelos camiões eram negociados com a Auto-Sueco ou com os concessionários, sendo as negociações de camiões necessariamente individualizadas pela complexidade dos produtos e pelo cliente e dependentes das condições do mercado local” (ponto 101) das conclusões do recurso). A sentença em crise, no facto provado bbbbbb), salvo o devido respeito, responde à questão suscitada, pois dá como provado que “a Auto-Sueco é uma entidade totalmente independente da R., não pertencendo ao Grupo Volvo”. Porém, dúvidas houvessem, os pontos 186 e segs da decisão em crise, apelando aos depoimentos prestados por (…), (…) e (…), dá resposta cabal à questão suscitada, pois que aí se concluiu “serem verdadeiros os seguintes factos alegados pela R.: Ø A Auto-Sueco, quer na relação com clientes finais, quer na relação com concessionários independentes, tinha total liberdade para aplicar as condições comerciais que entendesse e para definir em que moldes pretendia apoiar esses concessionários na promoção de vendas. Ø A Auto-Sueco também tinha total discricionariedade para, enquanto importadora independente, determinar os preços que pretendia cobrar aos seus próprios clientes pelos camiões (e, por conseguinte, as suas próprias margens sobre os preços pagos à Volvo Truck Corporation). Ø A Volvo Truck Corporation - e por maioria de razão a R. - não tinha conhecimento, controlo ou visibilidade sobre os preços pagos à Auto-Sueco ou sobre qual o processo adotado pela Auto-Sueco na determinação de tais preços. Ø Habitualmente, a Volvo Truck Corporation - e por maioria de razão a R. - nem sequer tinha conhecimento relativamente a quem a Auto-Sueco estava a vender os camiões numa determinada transação. Ø Os preços pagos pelos clientes finais (Preço Líquido para o Cliente) em Portugal, durante o período em causa, não eram preços brutos. Ø O Preço Líquido para o Cliente em Portugal, durante o período em causa, resultava, isso sim, das negociações individuais entre o cliente final e a Auto-Sueco / seus concessionários e/ou os concessionários independentes. Ø Nem a R. nem qualquer das suas subsidiárias tinha qualquer envolvimento ou intervenção nestas negociações. Ø Tais negociações seriam específicas de cada transação e teriam em consideração os interesses comerciais particulares de cada parte, incluindo as circunstâncias individuais do cliente, o modelo, os extras específicos e o seu histórico na compra de camiões. Ø As vendas de camiões a clientes, pelas características próprias deste tipo de produtos e dos próprios clientes (empresas e não consumidores) envolvem geralmente um processo de negociação, que pode conduzir a diferentes desfechos quando ao preço final de aquisição. Ø O típico ponto de partida para a venda de um camião consistia na abordagem de um cliente à unidade de retalho ou ao concessionário Auto-Sueco ou a concessionário independente, solicitando um camião com determinadas características. Ø Em termos gerais, os clientes compravam camiões selecionando um dos numerosos modelos que eram oferecidos e depois especificavam quais as características e extras que pretendiam incorporar no camião quando este fosse fabricado. Ø Além de escolherem entre as opções de padrão disponíveis, os clientes podiam até solicitar ajustes feitos à medida no veículo, que não faziam parte da oferta padrão de produtos da Volvo. Ø Tendo em conta que cada cliente era diferente, os camiões precisavam de ser configurados de acordo com os requisitos específicos de cada um dos clientes. Ø Essa complexidade determinava que cada transação tivesse de ser negociada individualmente com cada cliente.” Admitimos que a formulação encontrada pelo Tribunal a quo, fazendo constar na “motivação da matéria de facto” factos que reputa de provados que não constam, pelo menos em toda a extensão, dos enumerados no título “matéria de facto”, suscite dificuldades de análise ao respetivo leitor. Porém, essas dificuldades, para o leitor atento, são facilmente superadas, pois que a decisão, ao nível da motivação, na sequência de os considerar provados, explica que a “demonstração dos factos referidos não conduziria a conclusões diversas daquelas que infra serão explicitadas sobre esta matéria” e “que qualquer alteração neste preço decorrente de modificações nos preços brutos de lista que serviram como ponto de partida refletiu-se também, com elevadíssima probabilidade, nos preços líquidos de venda ao cliente final por parte da Auto-Sueco, pelo que os preços sem infração teriam sido inferiores, ainda que porventura fossem inferiores a outros praticados no passado ou em relação a outros clientes”, o que, nos remete, mais uma vez, para a desnecessidade de os transpor para o “sítio” dos factos provados. Nessa medida, para o que releva para o objeto da ação, julgamos que o pugnado facto já consta da matéria de facto provada, pelo que se afigura inútil a formulação pretendida. - No que diz respeito a saber se “os camiões são produtos complexos e altamente heterogéneos com características técnicas específicas e cada cliente fazia a sua escolha entre centenas de diferentes modelos de camiões e de diferentes opções para cada modelo, resultando em diferentes especificações (e descontos) para cada cliente e (ii) Os níveis de descontos aplicados ao longo da cadeia de distribuição tinham uma grande amplitude e variavam de transação em transação, em função das características e especificidades de cada camião e transação” (ponto 107 das conclusões do recurso). A sentença em crise, nos mesmos termos em que nos referimos ao facto anterior, dá resposta positiva à pretensão da Recorrente. Efetivamente, quer dos factos já citados, reportados à motivação, quer dos demais também aí enunciados (cfr. ponto 186) da decisão em crise), resulta inequivocamente como acertada a “factualidade” invocada pela Recorrente. Porém, tendo explicado, nomeadamente que “os preços líquidos eram apurados tendo por base os preços brutos, ou seja, os preços brutos – fosse qual fosse a sua função e utilidade – eram a base de cálculo dos preços líquidos” e que a amplitude existente dos descontos estava a montante condicionada pelo valores viciados, o que, manifestamente, se compreende, tal como o fez no facto anterior, mostra ser desnecessário transpô-los para o “sítio” dos factos provados. Nessa medida, para o que releva para o objeto da ação, julgamos que os pugnados factos já constam da matéria de facto provada, pelo que se afigura inútil a formulação pretendida. - Relativamente a saber se “os níveis de descontos ao longo da cadeia de comercialização tinham grande amplitude e variavam de transação para transação, (ii) nem a Auto-Sueco, nem os clientes finais pagaram preços brutos de tabela e (iii) não existia nenhuma relação automática, linear, sistemática ou proporcional entre os preços brutos de tabela e os preços líquidos pagos pelos clientes finais” (ponto 115 das conclusões do recurso). Mais uma vez o raciocínio efetuado relativamente aos factos acima referidos, se aplica, por igualdade de razão, aos que agora enunciados. Aliás, acrescentamos ainda, como se afigura na maioria dos outros a que nos vimos referindo, que a própria Recorrente dá conta que o Tribunal Recorrido os considerou verdadeiros, ainda que afirmando que não retirou deles a devida consequência (cfr. ponto 114) das conclusões do recurso). Efetivamente, assim o fez, pois como também já demos conta, o Tribunal a quo, deixou claro que a diversidade – múltipla – existente não infirma a conclusão, que julgamos singela e acertada, de que o preço bruto representa a base/ referência (a montante) para todas e mais algumas variáveis que se coloquem ao longo do percurso comercial que termina no consumidor final. Nessa medida, para o que releva para o objeto da ação, julgamos que os pugnados factos já constam da matéria de facto provada, pelo que se afigura inútil a formulação pretendida. - No que diz respeito a saber se “a Volvo tinha lista de preços brutos de tabela, cuja principal função era criar uma distinção lógica entre uma infinidade de extras e modelos de camiões de maior e menor valor” (ponto 142 das conclusões do recurso). Invocamos novamente o raciocínio efetuado relativamente aos factos acima referidos, pois que se aplica, por igual razão, ao agora enunciado. Aliás, ainda que com formulação diversa, diríamos menos conclusiva, a sentença em crise considerou provado, com base nos depoimentos prestados por (…) e (…), nomeadamente que “as tabelas de preços brutos foram usadas para criar uma estrutura lógica de preços para as centenas de opções de configurações de veículos disponíveis e para garantir uma diferenciação consistente de preços entre os produtos oferecidos pela Volvo”, “as listas de preços brutos permitiram criar uma hierarquia lógica de valores entre uma infinidade de extras e modelos de veículos de maior e menor valor, a qual assume especial importância para produtos heterogéneos e altamente diferenciados como os camiões, dada a ampla gama de modelos, opções e acessórios disponíveis”, “foram definidos por referência a fatores comerciais comuns, como sejam o valor dos extras relevantes para o cliente, os custos de produção desses extras e a sua posição na hierarquia dos extras (por exemplo, motores com maior potência terão preços brutos mais altos), custos de produção, entre outros fatores de mercado” e “ajudaram a estruturar a oferta de produtos da Volvo, incluindo preços para o modelo "base" de cada veículo (um modelo pré-especificado com um conjunto de parâmetros técnicos fixos)”. (cfr. ponto 186 da decisão em crise). Nessa medida, para o que releva para o objeto da ação, julgamos que o pugnado “facto”, mais não sendo que a conclusão, ainda que adaptada, dos demais factos provados a que nos vimos referindo, pelo que se afigura inútil e redutora a formulação pretendida. Continuemos. A R. pugna que os factos não provados g), h) e i), que se reportam à alegada repercussão de “custos” e/ ou “proveitos” nos sobrecustos, devem ser dados como provados (cfr. pontos 172 e segs. das conclusões de recurso). O Tribunal a quo, a este respeito, consignou que “não é possível concluir no sentido da existência, no caso, de uma repercussão do sobrecusto nos preços dos serviços cobrados pela A. aos seus clientes com base nos parâmetros de natureza económica invocados pela R., porquanto foi nomeado um perito para aferir estes factos, (…), economista e revisor oficial de contas, cujo relatório pericial se mostra junto aos autos com a ref.ª ...67, e o mesmo não dispensou a necessidade de obtenção de elementos relativos à atividade da A.. Isto é demonstrativo de que os referidos parâmetros gerais não são suficientes. O que se compreende, tendo em conta que o preço do camião não é a base de fixação do preço cobrado a cada cliente, mas constitui um custo que se dilui nos serviços prestados, constituindo também um custo fixo e não variável.”(destaque é nosso) Mais deu conta das conclusões a que chegou o “o Sr. Perito”, em termos do aumento de preços”, considerou “não ser possível saber de onde advém o aumento de preços, pelo que não se pode fazer qualquer afirmação sobre o motivo que lhe dá origem e menos ainda sobre a sua quantificação”; “se tomássemos por base a variação de cada um dos componentes disponíveis nas demonstrações financeiras, diríamos que esta rubrica é a que menos influência teve no crescimento dos preços; Julgamos nós que os preços, em geral, são estabelecidos em função do que, em cada caso se consegue obter do cliente. Não terá qualquer efeito o preço maior ou menor dos bens adquiridos por parte da vontade do cliente em aceitar ou recusar um serviço, ao invés, o que pode acontecer é não se fazer um negócio porque os custos são superiores ao que o cliente está disposto a pagar ou, porventura, aos da concorrência. Neste caso, pode-se perder mercado, mas o cálculo de tais perdas não é mensurável; 4) Mas no caso dos contratos continuados, haverá dificuldade efetiva em refletir tais custos porque, tanto quanto julgamos como prática, não se aplicará o modelo de revisão de preços em vigor na construção civil;” e concluiu que “da perícia efetuada não se consegue retirar a existência de repercussão, não tendo sido produzida qualquer outra prova consistente e objetiva nesse sentido.”(destaques são nossos) Mais se reportou às declarações de (…), pois que este confirmou que “tentam repercutir os custos, aumentando os preços, que em vez de aumentarem 20, aumentam 5m não conseguindo acompanhar o valor justo dos aumentos a que estão sujeitos, sendo que afastou relevância às mesmas por “se tratam de asserções de âmbito geral, sem o mínimo de concretização e circunstanciação temporal”. Importa referir que da prova produzida, acima enunciada, não resulta a demonstração desse incremento dos custos (sobrecustos dos veículos) nos preços praticados pelos seus serviços. No entanto, como bem refere a R., é natural e até desejável, tendo em conta o fim das sociedades comercias/ industriais, a repercussão dos custos nos respetivos serviços. Porém, como resulta das declarações do perito, “será pouco relevante o efeito das depreciações para a definição dos preços”, ao que acrescentamos a circunstância de as empresas, fruto do aumento das despesas, da diminuição da procura ou de tudo junto, verem-se obrigadas a reduzir as suas margens de lucro ou mesmo a laborar, em certos períodos, abaixo da linha de água, na esperança de melhores condições de mercado, como julgamos ser do conhecimento geral, pelo que, também por isso, não podemos deixar de concordar com a conclusão do Tribunal a quo. Aliás, a este respeito, podemos ainda conceber que havendo uma repercussão total dos sobrecustos nos preços dos serviços, o que se afastou, sempre seria de se considerar o impacto que esse aumento teve na procura dos mesmos. Dito de outra forma, sendo o preço mais alto, admitindo a existência de alternativas mais económicas, se existisse uma diminuição da clientela e, consequentemente, diminuição dos proveitos (reflexo, por isso, daquele sobrecusto). No que diz respeito à repercussão “através das revendas dos veículos parte ou a totalidade do preço que pagou”, o Tribunal a quo considerou que “Os factos descritos na alínea h) ficaram por demonstrar, porquanto não foi produzida prova e não podem ser inferidos do facto de se concluir que a A. pagou pelos camiões um preço superior àquele que teria sido pago caso não tivesse ocorrido a infração, pois as revendas foram efetuadas em circunstâncias temporais distintas, tendo por objeto veículos usados e não novos e não enquanto atividade económica principal da A.” Também nesta parte concordamos com o trecho citado do Ac. do TRL proferido no âmbito do processo 54/19.6YQSTR.L1, quando refere que “cremos que, em geral, o mercado de bens em segunda mão pouco ou nada tem haver com o mercado de bens novos. Como é do conhecimento geral, qualquer veículo ligeiro ao sair do stand perde importante parte do seu valor comercial”. Aliás, não resultando da prova produzida em audiência de julgamento, julgamos que as regras da experiência, face às especificidades do mercado de bens em segunda mão, que se caracteriza por uma especial volatilidade, não permitem concluir pela pugnada repercussão. Finalmente, em termos da pugnada mitigação do alegado sobrecusto por força das vantagens fiscais, decorrente do maior preço liquidado, como pugna a R., julgamos que também inexiste prova para o demonstrar. Além de se desconhecer o regime fiscal aplicável à A., nomeadamente em termos de IVA e de IRC, mas mais importante, temos ainda o facto de o valor de eventual indemnização concedida será alvo de tributação. Pelo que, também consideramos improcedente a pretensão da R. Por último, defende a R. (196) que deve ser aditado à matéria de facto provada o seguinte facto: - “A A. tomou conhecimento dos aspetos essenciais da Decisão da Comissão, pelo menos, desde 20 de novembro de 2014, data da publicação do comunicado de imprensa que tornou pública a adoção da Nota de Ilicitude.” (cfr. ponto 197 das conclusões). A Recorrente alega que o dies quo se retira dos documentos n.ºs 1 a 10 juntos pela Recorrente aos autos. O Tribunal a quo, a respeito desse conhecimento (ainda que reportado a data posterior), referiu que “não foi produzida qualquer prova, sendo certo que, contrariamente àquilo que a R. defende, tais factos não podem ser presumidos apenas com base nas regras da experiência comum e em parâmetros de normalidade e razoabilidade, pois aquilo que está subjacente aos factos em análise é o conhecimento pela A., através dos seus representantes legais, do teor dos atos e notícias em causa, e não um qualquer conhecimento vago e impreciso de que a Comissão proferiu a decisão descrita na alínea b) dos factos provados. Que os representantes legais da A. pudessem ter tomado conhecimento, de uma forma vaga e imprecisa, da prolação da decisão admite-se que sim. O que já não é possível concluir, sem prova, é que tenham lido a decisão, os anúncios públicos descritos nos factos provados e/ou as notícias divulgadas. Tanto mais que não é inteiramente seguro que à data já existisse um conhecimento e noção consolidados no setor dos transportes em Portugal sobre a possibilidade de instauração de ações de indemnização que tornasse o interesse no conhecimento do teor destes atos e notícias por parte dos representantes legais da A. uma evidência.”(destaques são nossos) A argumentação citada, com a qual se concorda, por ser consentânea com a prova junta aos autos e com as regas da experiência, aplica-se, por maioria de razão, ao facto em análise, pois que se naquele caso já existia decisão da Comissão, neste havia apenas a publicação do comunicado de imprensa a tornar pública a adoção da Nota de Ilicitude, ou seja, uma forma mais embrionária e limitada da informação. * Pelo exposto, improcedem as pretensões das Recorrentes, mantendo-se, em conformidade, a matéria de facto considerada provada e não provada pelo Tribunal a quo. * A – Factos provados A sentença recorrida declarou como provados os seguintes factos: “Factos relativos à Decisão da Comissão: a) Em 20.11.2014, a Comissão Europeia deu início a um processo - Processo AT.39824 - ao abrigo do artigo 11.º, n.º 6, do Regulamento 1/2003. b) Em 19.07.2016, a Comissão Europeia proferiu uma decisão de 19.07.2016 nesse processo por infração do artigo 101.º do TFUE e do artigo 53.º do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu, com o conteúdo constante do documento n.º 1 junto com a petição inicial que aqui se considera integralmente reproduzido, na qual consta o seguinte (resposta aos artigos 7.º e 8.º, 11.º, 12.º e 16.º a 19.º da PI): c) A referida Decisão foi disponibilizada, mediante a publicação da sua versão sumária no Jornal Oficial da União Europeia, em 6 de abril de 2017, cuja cópia traduzida se mostra junta aos autos com a petição inicial, doc. n.º 2, dando-se aqui por integralmente reproduzido o seu teor (resposta aos artigos 13.º e 14.º da PI). Factos relativos à atividade da Autora: d) A Autora é uma sociedade comercial que se dedica à atividade de transportes de mercadorias nacionais e internacionais (artigo 1.º da PI). Factos relativos à atividade da Ré: e) A R. é uma sociedade comercial de direito sueco que constitui a “sociedade mãe” do grupo de sociedades denominado por “Volvo Group”, do qual fazem parte, entre outras, as subsidiárias, a Volvo Lastvagnar AB, a Renault Truck SAS, a Volvo Group Trucks Central Europe GmbH e a Renault Trucks Deutschland GmbH (artigo 2.º da PI). f) A Ré e as sociedades que compõem o seu grupo dedicam-se à produção, distribuição e venda de camiões, autocarros, motores e equipamento de construção e, adicionalmente, à prestação de serviços financeiros conexos com aquelas atividades (artigo 3.º da PI). g) A Nors, S.A, que até ao ano de 2018 se designava “Auto-Sueco, Lda”, é uma sociedade comercial, sob a forma de sociedade anónima, que tem por objeto a importação e comercialização de veículos automóveis pesados, respetivos motores, peças, acessórios e produtos com os mesmos relacionados (artigo 4.º da PI). h) Esta sociedade é atualmente, e era à data da aquisição dos veículos pela Autora, a importadora exclusiva para Portugal da Ré e das marcas do “Volvo Group” (artigo 5.º da PI). Factos relativos às viaturas: i) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 16.07.1997, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-IL, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 1.º da PIA). j) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 17.06.1997, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-.0-IL, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 2.º da PIA). k) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 03.07.1997 (a Autora indica 16.06.1997), a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-IN, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 3.º da PIA). l) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 11.04.1997 (A. alega 03.04.1997), a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-IF, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 4.º da PIA). m) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 11.04.1997 (A. alega 03.04.1997), a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-.3-IF, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 5.º da PIA). n) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 22.12.1997, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-JG, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 6.º da PIA). o) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 29.01.1997, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-HV, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 7.º da PIA). p) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 03.10.1997, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-IX, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 8.º da PIA). q) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 05.11.1997, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-IZ, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 9.º da PIA). r) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 02.05.1997, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-IG, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 10.º da PIA). s) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 05.11.1998, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-MC, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 11.º da PIA). t) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 09.07.1998, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-LL, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 12.º da PIA). u) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 20.05.1998, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-LD, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 13.º da PIA). v) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 14.10.1998, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-LX, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 14.º da PIA). w) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 03.04.1998, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-JU, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço. - No quadro do artigo 20.º da petição inicial refere-se, por mero lapso de escrita, ao veículo com a matrícula ....0.LX, desde já se requerendo a respetiva retificação nos termos ora alegados (resposta ao artigo 15.º da PIA). x) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 03.07.1998, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-LI, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 16.º da PIA). y) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 22.02.2001, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-RC, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 17.º da PIA). z) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 26.01.2005, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-SM, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 18.º da PIA). aa) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 12.06.2001, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-RS, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 19.º da PIA). bb) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 09.02.2001, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-RB, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 20.º da PIA). cc) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 19.03.2001, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-RG, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 21.º da PIA). dd) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 21.05.2001, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-RP, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 22.º da PIA). ee) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 21.05.2001, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-.7-RP, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 23.º da PIA). ff) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 10.05.2002, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-TL, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 24.º da PIA). gg) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 10.05.2002, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-9.-TL, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 25.º da PIA). hh) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 14.05.2002, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-1.-TL, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 26.º da PIA). ii) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 14.05.2002, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-2.-TL, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 27.º da PIA). jj) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 27.05.2002, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-TM, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 28.º da PIA). kk) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 22.05.2002, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-.6-TM, por um preço não concretamente apurado, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 29.º da PIA). ll) Em 11.09.2003, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-VL, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 30.º da PIA). mm) Em 11.09.2003, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-.1-VL, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 31.º da PIA). nn) Em 11.09.2003, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-.2-VL, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 32.º da PIA). oo) Em 07.11.2003, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-VO, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 33.º da PIA). pp) Em 07.11.2003, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-1.-VO, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 34.º da PIA). qq) Em 12.11.2003, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-VQ, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 35.º da PIA). rr) Em 12.11.2003, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-0.-VQ, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 36.º da PIA). ss) Em 05.11.2004, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-..-ZB, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 37.º da PIA). tt) Em 05.11.2004, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-.2-ZB, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 38.º da PIA). uu) Em 05.11.2004, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-.3-ZB, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 39.º da PIA). vv) Em 05.11.2004, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-.4-ZB, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 40.º da PIA). ww) Em 03.02.2006, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-BD-.., pelo preço de 72 500,00 € (setenta e dois mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 41.º da PIA). xx) Em 07.02.2006, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-BE-.., pelo preço de 72 500,00 € (setenta e dois mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 42.º da PIA). yy) Em 07.02.2006, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-BE-.1, pelo preço de 72 500,00 € (setenta e dois mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 43.º da PIA). zz) Em 07.02.2006, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-BE-.2, pelo preço de 72 500,00 € (setenta e dois mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 44.º da PIA). aaa) Em 07.02.2006, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-BE-.3, pelo preço de 72 500,00 € (setenta e dois mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 45.º da PIA). bbb) Em 07.02.2006, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-BE-.4, pelo preço de 72 500,00 € (setenta e dois mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 46.º da PIA). ccc) Em 24.03.2006, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-BI-.., pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 47.º da PIA). ddd) Em 24.03.2006, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-BI-.2, pelo preço de 70 000,00 € (setenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 48.º da PIA). eee) Em 24.01.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CR-.., pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 49.º da PIA). fff) Em 24.01.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CR-.0, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 50.º da PIA). ggg) Em 24.01.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender, o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CR-.1, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 51.º da PIA). hhh) Em 24.01.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CR-.2, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 52.º da PIA). iii) Em 24.01.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CR-.3, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 53.º da PIA). jjj) Em 24.01.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CR-.4, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 54.º da PIA). kkk) Em 25.01.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CR-.5, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 55.º da PIA). lll) Em 25.01.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CR-.6, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 56.º da PIA). mmm) Em 25.01.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CR-.7, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 57.º da PIA). nnn) Em 05.02.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CS-.., pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 58.º da PIA). ooo) Em 05.02.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CT-0., pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 59.º da PIA). ppp) Em 05.02.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-CT-.., pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 60.º da PIA). qqq) Em 15.05.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-DL-.., pelo preço de 63 000,00 € (sessenta e três mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 61.º da PIA). rrr) Em 15.05.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-DL-.2, pelo preço de 62 000,00 € (sessenta e dois mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 62.º da PIA). sss) Em 12.09.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-EH-.., pelo preço de 75 000,00 € (setenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 63.º da PIA). ttt) Em 12.09.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-EH-.3, pelo preço de 75 000,00 € (setenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 64.º da PIA). uuu) Em 12.09.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-EH-.4, pelo preço de 75 000,00 € (setenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 65.º da PIA). vvv) Em 12.09.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-EH-.5, pelo preço de 75 000,00 € (setenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 66.º da PIA). www) Em 12.09.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-EH-.1, pelo preço de 75 000,00 € (setenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 67.º da PIA). xxx) Em 12.09.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-EH-.2, pelo preço de 75 000,00 € (setenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 68.º da PIA). yyy) Em 12.09.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-EH-9., pelo preço de 75 000,00 € (setenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 69.º da PIA). zzz) Em 16.10.2007, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-EL-.., pelo preço de 75 000,00 € (setenta e cinco mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 70.º da PIA). aaaa) Em 31.01.2008, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-FD-.., pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 71.º da PIA). bbbb) Em 31.01.2008, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-FD-.2, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 72.º da PIA). cccc) Em 12.02.2008, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-FE-.., pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 73.º da PIA). dddd) Em 12.02.2008, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-FE-.5, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 74.º da PIA). eeee) Em 12.02.2008, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-FE-.3, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 75.º da PIA). ffff) Em 15.02.2008, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-FF-.., pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 76.º da PIA). gggg) Em 15.02.2008, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-FF-.3, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 77.º da PIA). hhhh) Em 15.02.2008, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-FF-.4, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 78.º da PIA). iiii) Em 22.04.2008, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-FN-.., pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 79.º da PIA). jjjj) Em 22.04.2008, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-FN-.1, pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 80.º da PIA). kkkk) Em 08.10.2009, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IG-.7, pelo preço de 70 500,00 € (setenta mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 81.º da PIA). llll) Em 08.10.2009, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IG-.8, pelo preço de 70 500,00 € (setenta e mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 82.º da PIA). mmmm) Em 08.10.2009, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IG-.9, pelo preço de 70 500,00 € (setenta e mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 83.º da PIA). nnnn) Em 08.10.2009, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IG-.0, pelo preço de 70 500,00 € (setenta mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 84.º da PIA). oooo) Em 08.10.2009, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IG-.1, pelo preço de 70 500,00 € (setenta mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 85.º da PIA). pppp) Em 08.10.2009, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IG-.2, pelo preço de 70 500,00 € (setenta mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 86.º da PIA). qqqq) Em 08.10.2009, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IG-.3, pelo preço de 70 500,00 € (setenta mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 87.º da PIA). rrrr) Em 08.10.2009, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IG-.4, pelo preço de 70 500,00 € (setenta mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 88.º da PIA). ssss) Em 14.12.2009, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IM-.., pelo preço de 70 500,00 € (setenta mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 89.º da PIA). tttt) Em 14.12.2009, Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IM-.1, pelo preço de 70 500,00 € (setenta mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 90.º da PIA). uuuu) Em 29.01.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-IR-.., pelo preço de 64 000,00 € (sessenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 91.º da PIA). vvvv) Em 30.03.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JB-.., pelo preço de 64 000,00 € (sessenta mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 92.º da PIA). wwww) Em 30.06.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JH-.., pelo preço de 78 500,00 € (setenta e oito mil e quinhentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 93.º da PIA). xxxx) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.., pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 94.º da PIA). yyyy) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.3, pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 95.º da PIA). zzzz) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.4, pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 96.º da PIA). aaaaa) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.5, pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 97.º da PIA). bbbbb) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.6, pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 98.º da PIA). ccccc) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.7, pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 99.º da PIA). ddddd) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.8, pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 100.º da PIA). eeeee) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.9, pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 101.º da PIA). fffff) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.0, pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 102.º da PIA). ggggg) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.1, pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 103.º da PIA). hhhhh) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender, o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-.2, pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 104.º da PIA). iiiii) Em 21.12.2010, a Autora declarou comprar à sociedade Auto-Sueco, Lda, atualmente designada Nors, S.A., que declarou vender o veículo pesado de mercadorias de marca Volvo, modelo ..., novo, com a matrícula ..-JX-0., pelo preço de 71 600,00 € (setenta e um mil e seiscentos euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor. jjjjj) Tendo pago o respetivo preço (resposta ao artigo 105.º da PIA). kkkkk) Em 07.01.2011, a Autora, na qualidade de locatária, celebrou com o Banco Comercial Português, S.A., na qualidade de locadora, o Contrato de Locação Financeira n.º ...01, pelo prazo de 48 meses, tendo por objeto as viaturas pesadas de mercadorias de marca Volvo, novas, modelo ..., com as matrículas ..-LF-.., ..-LF-.1, ..-LF-.2, ..-LF-.3, ..-LF-.4, ..-LF-.5, ..-LF-.6, ..-LF-.7, ..-LF-.8 e ..-LF-.9 (resposta ao artigo 106.º da PIA). lllll) As referidas viaturas foram escolhidas pela Autora e fornecidas pela Auto-Sueco, Lda., pelo preço unitário de 71 000,00 € (setenta e um mil euros), num total de 710.000,00 € (setecentos e dez mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor. (resposta ao artigo 107.º da PIA). mmmmm) Por força do referido Contrato de Locação Financeira a Autora obrigou-se a pagar à empresa locadora 48 rendas mensais no valor de 15 570,31 € (quinze mil quinhentos e setenta euros e trinta e um cêntimos), acrescidas de IVA à taxa legal em vigor, montante que compreendia o preço das viaturas, a taxa de juro aplicável ao contrato e as despesas de preparação e gestão de dossier (resposta ao artigo 108.º da PIA). nnnnn) Nos termos da cláusula 10.ª do mesmo contrato o valor residual previsto para o exercício da opção de compra das viaturas correspondia a 14 200,00 € (2 % de 710.000,00 €), acrescido de IVA à taxa legal em vigor (resposta ao artigo 109.º da PIA). ooooo) O Contrato de Locação Financeira acima referido foi integralmente cumprido pela Autora, tendo a mesma pago todas as rendas convencionadas e exercido, em 07.01.2015, o direito de opção de compra das viaturas através do pagamento do valor residual (resposta ao artigo 110.º da PIA). ppppp) A Ré é a fabricante dos veículos pesados de mercadorias da marca Volvo, modelos ..., ..., ... e ... (artigo 26.º da PI). qqqqq) Os veículos pesados da marca Volvo, modelos ..., ..., ... e ..., referidos nos artigos anteriores, são camiões tratores, pesados de mercadorias, que se enquadram no que na Decisão se denomina por camião “médio”, com um peso entre 6 e 16 toneladas (artigo 28.º da PI). Factos relativos aos “prejuízos” e ao nexo de causalidade: rrrrr) Em virtude da atuação da Ré, através dos seus representantes e funcionários, juntamente com os restantes participantes na prática descrita na decisão da Comissão, supra transcrita, na parte relativa às práticas de colusão relativamente aos preços e aos aumentos do preço bruto no EEE dos camiões de média tonelagem e pesados, o preço de fábrica dos camiões da R. foi superior àquele que se teria verificado caso não tivesse ocorrido a infração (resposta ao artigo 30.º da PI). sssss) O que se repercutiu no preço pago pela importadora Auto-Sueco à 1.ª Ré e pela A. e pela sociedade de locação financeira à Auto-Sueco e pela A. à locadora financeira em relação aos veículos supra descritos, que, por isso, foi superior àquele que se teria verificado se não tivesse ocorrido a infração descrita na decisão da Comissão (resposta aos artigos 31.º e 32.º da PI). Factos relativos à divulgação e conhecimento da infração: ttttt) A 18 de janeiro de 2011, a Comissão Europeia tornou público que havia levado a cabo diligências de busca e apreensão na sede de fabricantes de veículos pesados, notícia divulgada na comunicação social portuguesa (artigo 163º da contestação). uuuuu) Como revelado numa peça da SIC Notícias emitida no dia seguinte à divulgação das inspeções, nessa altura a Volvo surge identificada como uma das empresas que teria sido alvo de buscas, sendo aliás referido nessa peça que a empresa tinha reconhecido ter sido alvo dessa diligência (artigo 164.º da contestação). vvvvv) A 20 de novembro de 2014, a Comissão Europeia publicou no seu sítio eletrónico um comunicado de imprensa em que deu a conhecer que tinha adotado uma Nota de Ilicitude contra fabricantes de veículos pesados (artigo 165.º da contestação). wwwww) Nesse comunicado de imprensa, a Comissão tornou público que havia adotado uma Nota de Ilicitude, divulgando os seguintes elementos do processo: (i) os visados pela Nota de Ilicitude seriam fabricantes de veículos pesados; (ii) os visados estavam a ser acusados de prática de cartel; (iii) as práticas em causa teriam envolvido coordenação em matéria de preços; (iv) o espaço geográfico em causa seria o Espaço Económico Europeu; (v) as práticas em causa consubstanciariam uma violação do disposto no Artigo 101.º do TFUE e no Artigo 53 do Tratado EEA (artigo 166.º da contestação). xxxxx) Poucos dias depois desse comunicado de imprensa, a Volvo emitiu um comunicado anunciando que iria criar uma provisão de 400 milhões de euros, antecipando a possível aplicação de uma sanção no âmbito do processo, notícia também veiculada na comunicação social portuguesa (artigo 167.º da contestação). yyyyy) No dia 19.07.2016 a Comissão Europeia divulgou um comunicado de imprensa sobre a decisão proferida com as seguintes informações: (i) identidade dos responsáveis pela infração, incluindo a R. nesta Ação; (ii) a identificação dos visados que recorreram ao programa de clemência e ao programa de transação; (iii) uma descrição do comportamento em causa, incluindo o tipo de informação trocada, incluindo a identificação de trocas de informação relativas a preços brutos, os locais de reuniões e respetivos participantes, as características dos veículos objeto da prática tida como anti concorrencial, uma descrição da evolução e das alterações do comportamento dos alegados infratores durante o período relevante, o escopo temporal da alegada infração e os montantes das coimas impostas (resposta aos artigos 170.º a 172.º da contestação). zzzzz) A notícia dessa Decisão teve divulgação nos órgãos de comunicação social de todo o mundo e também em Portugal, designadamente através das notícias veiculadas através dos seguintes links: https://www.publico.pt/2016/07/19/economia/noticia/bruxelas-multa-marcas-de-camioes-em-29-mil-milhoes-de-euros-1738800; doc. 1https://www.jornaldenegocios.pt/empresas/automovel/detalhe/bruxelas_aplica_multa_historica_a_fabricantes_de_camioes; doc. 2https://sicnoticias.pt/economia/2016-07-19-Bruxelas-multa-em-293-mil-M-construtores-de-camioes-por-praticas-de-cartel; doc. 3https://www.sabado.pt/dinheiro/detalhe/20160719-1318-bruxelas-aplica-multa-historica-a-fabricantes-de-camioes; doc. 4http://www.destak.pt/artigo/273626-bruxelas-multa-em-293-mil-me-cinco-construtores-de-camioes-por-praticas-de-cartel; doc. 5 http://portocanal.sapo.pt/noticia/97013; doc. 6https://www.noticiasaominuto.com/economia/624996/bruxelas-aplica-multa- recorde-a-construtores-de-camioes; doc. 7 https://automonitor.sapo.pt/2016/07/19/comercio-e-industria/multa-de- quase-tres-mil-milhoes-para-fabricantes-de-camioes/; doc. 8 https://www.dinheirovivo.pt/empresas/bruxelas-aplica-maior-multa-de-sempre-a-cartel-de-venda-de-camioes/; doc. 9 https://observador.pt/2016/07/19/bruxelas-multa-em-293-mil-milhoes-de-euros-cinco-construtores-de-camioes-por-praticas-de-cartel/ doc. 10 (artigos 173.º e 174.º da contestação). aaaaaa) As contas da A. de 2016 (ano da decisão) revelam uma faturação de EUR 19.138.112,35 e que emprega 230 trabalhadores (artigo 182.º da contestação). bbbbbb) A Auto-Sueco é uma entidade totalmente independente da R., não pertencendo ao Grupo Volvo (artigo 226.º da contestação). cccccc) Por requerimento de 5 de setembro de 2017 a Autora requereu a Notificação Judicial Avulsa da NORS, S.A. para efeitos de interrupção do prazo de prescrição do direito de indemnização peticionado nos presentes autos, processo que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo Local Cível ..., Juiz ..., sob o processo n.º 18248/17.... (artigo 38.º da PI). dddddd) A referida notificação ocorreu no dia 8 de setembro de 2017 (artigo 39.º da PI). eeeeee) A presente ação foi instaurada em 31.03.2020, tendo a 1.ª R. sido citada no dia 27.04.2020 (artigo 12.º da contestação). Factos relativos à repercussão: ffffff) A A. utiliza os veículos pesados como fator de produção na sua atividade de prestação de serviços de transporte a clientes (artigo 633.º da contestação). gggggg) A Autora revendeu a terceiros os seguintes veículos (artigo 643.º da contestação):
B - Factos não provados A sentença recorrida declarou não provados os seguintes factos: 2. a) O valor global do contrato de locação financeira despendido pela A. foi de € 936.163,91, incluindo as 48 rendas, despesas de preparação e gestão de dossier, despesas de processamento e comissões de gestão de contrato, bem como do valor residual e que foi integralmente pago pela Autora. b) A Autora só tomou conhecimento da decisão da Comissão em data posterior a 6 de abril de 2017 (artigo 37.º da PI). c) A Autora tomou conhecimento da decisão no próprio dia 19.07.2016 ou nos dias imediatamente seguintes e tomou conhecimento dos atos e notícias descritos nas alíneas ttttt) a zzzzz) na data da sua publicação ou divulgação ou nos dias imediatamente seguintes (artigo 204.º da contestação). d) A NORS, S.A. era, em setembro de 2017, a representante da Ré em território nacional (artigo 38.º da PI) – antes se provou o que consta na alínea bbbbbb) dos factos provados. e) As práticas de colusão de transmissão dos custos relativos à introdução das tecnologias de emissões para camiões de média tonelagem e pesados conforme exigido pelas normas EURO 3 a 6 descritas na Decisão da Comissão conduziram a aumentos de gastos de combustível (artigo 35.º da PIA). f) O valor que a A. pagou a mais pelos camiões identificados nos factos provados e que não teria pago caso a infração não se tivesse verificado fixou-se em 16,68% do preço bruto das viaturas (preço de aquisição deduzido de 10%), designadamente (artigo 13.º da liquidação do pedido): - Viatura com a matrícula ..-..-IL: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-.0-IL: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-IN: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-IF: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-.3-IF: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-JG: 10 268,21 €; - Viatura com a matrícula ..-..-HV: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-IX: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-IZ: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-IG: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-MC: 10 658,52 €; - Viatura com a matrícula ..-..-LL: 10 658,52 €; - Viatura com a matrícula ..-..-LD: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-LX: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-JU: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-LI: 10 658,52 €; - Viatura com a matrícula ..-..-RC: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-SM: 6 004,80 €; - Viatura com a matrícula ..-..-RS: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-RB: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-RG: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-RP: 10 483,15 €; - Viatura com a matrícula ..-.7-RP: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-TL: 10 483,15 €; - Viatura com a matrícula ..-9.-TL: 10 483,18 €; - Viatura com a matrícula ..-1.-TL: 10 483,18 €; - Viatura com a matrícula ..-2.-TL: 10 483,18 €; - Viatura com a matrícula ..-..-TM: 10 483,63 €; - Viatura com a matrícula ..-.6-TM: 10 483,63 €; - Viatura com a matrícula ..-..-VL: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-.1-VL: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-.2-VL: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-VO: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-1.-VO: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-VQ: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-0.-VQ: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-..-ZB: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-.2-ZB: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-.3-ZB: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-.4-ZB: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-BD-..: 10 883,70 €; - Viatura com a matrícula ..-BE-..: 10 883,70 €; - Viatura com a matrícula ..-BE-.1: 10 883,70 €; - Viatura com a matrícula ..-BE-.2: 10 883,70 €; - Viatura com a matrícula ..-BE-.3: 10 883,70 €; - Viatura com a matrícula ..-BE-.4: 10 883,70 €; - Viatura com a matrícula ..-BI-..: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-BI-.2: 10 508,40 €; - Viatura com a matrícula ..-CR-..: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CR-.0: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CR-.1: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CR-.2: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CR-.3: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CR-.4: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CR-.5: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CR-.6: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CR-.7: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CS-..: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CT-0.: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-CT-..: 11 776,87 €; - Viatura com a matrícula ..-DL-..: 9 447,86 €; - Viatura com a matrícula ..-DL-.2: 9 307,44 €; - Viatura com a matrícula ..-EH-..: 11 251,45 €; - Viatura com a matrícula ..-EH-.3: 11 251,45 €; - Viatura com a matrícula ..-EH-.4: 11 251,45 €; - Viatura com a matrícula ..-EH-.5: 11 251,45 €; - Viatura com a matrícula ..-EH-.1: 11 251,45 €; - Viatura com a matrícula ..-EH-.2: 11 251,45 €; - Viatura com a matrícula ..-EH-9.: 11 251,45 €; - Viatura com a matrícula ..-EL-..: 11 251,45 €; - Viatura com a matrícula ..-FD-..: 11 776,21 €; - Viatura com a matrícula ..-FD-.2: 11 784,42 €; - Viatura com a matrícula ..-FE-..: 11 776,21 €; - Viatura com a matrícula ..-FE-.5: 11 776,21 €; - Viatura com a matrícula ..-FE-.3: 11 776,21 €; - Viatura com a matrícula ..-FF-..: 11 776,21 €; - Viatura com a matrícula ..-FF-.3: 11 776,21 €; - Viatura com a matrícula ..-FF-.4: 11 776,21 €; - Viatura com a matrícula ..-FN-..: 11 784,42 €; - Viatura com a matrícula ..-FN-.1: 11 776,21 €; - Viatura com a matrícula ..-IG-.7: 10 575,25 €; - Viatura com a matrícula ..-IG-.8: 10 575,25 €; - Viatura com a matrícula ..-IG-.9: 10 575,25 €; - Viatura com a matrícula ..-IG-.0: 10 575,25 €; - Viatura com a matrícula ..-IG-.1: 10 575,25 €; - Viatura com a matrícula ..-IG-.2: 10 575,25 €; - Viatura com a matrícula ..-IG-.3: 10 575,25 €; - Viatura com a matrícula ..-IG-.4: 10 575,25 €; - Viatura com a matrícula ..-IM-..: 10 575,25 €; - Viatura com a matrícula ..-IM-.1: 10 575,25 €; - Viatura com a matrícula ..-IR-..: 9 596,83 €; - Viatura com a matrícula ..-JB-..: 9 596,83 €; - Viatura com a matrícula ..-JH-..: 11 774,41 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-..: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-.3: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-.4: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-.5: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-.6: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-.7: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-.8: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-.9: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-.0: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-.1: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-.2: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-JX-0.: 10 740,08 €; - Viatura com a matrícula ..-LF-..: 10.650,01€; - Viatura com a matrícula ..-LF-.1: 10.650,01€; - Viatura com a matrícula ..-LF-.2: 10.650,01€; - Viatura com a matrícula ..-LF-.3: 10.650,01€; - Viatura com a matrícula ..-LF-.4: 10.650,01€; - Viatura com a matrícula ..-LF-.5: 10.650,01€; - Viatura com a matrícula ..-LF-.6: 10.650,01€; - Viatura com a matrícula ..-LF-.7: 10.650,01€; - Viatura com a matrícula ..-LF-.8: 10.650,01€; - Viatura com a matrícula ..-LF-.9: 10.650,01€. g) A Autora repercutiu qualquer incremento dos seus custos nos preços por si praticados pelos seus serviços, aumentando esses preços (artigo 632.º da contestação). h) A Autora recuperou através das revendas dos veículos identificados nos factos provados parte ou a totalidade do preço que pagou a mais e que não teria pago caso não fosse a infração (artigo 644.º da contestação). i) A Autora beneficiou de vantagens fiscais em resultado do sobrecusto (artigos 651.º, 666.º e 667.º da contestação). * 3. Tudo o mais que tenha sido alegado e não conste nos factos provados e não provados é matéria de direito, de natureza irrelevante ou conclusiva. 4. Para além desta referência geral importa referir, em particular, que na contestação são alegados vários factos que visam contrariar os factos relativos à existência do dano, do nexo de causalidade e do respetivo montante. Por consubstanciarem uma impugnação motivada entende-se que os mesmos não têm de ser incluídos nos factos provados e não provados, pois a sua procedência ou improcedência ir-se-á refletir na inclusão nos factos provados ou não provados, conforme o caso, dos factos essenciais que visam afastar.” * IV – Direito A presente ação reporta-se ao apuramento da responsabilidade extracontratual decorrente da prática de uma infração ao direito da concorrência por uma empresa ou associação de empresas, no caso a Volvo, interposta por um particular. A Volvo, bem como outras empresas do ramo dos camiões, foi alvo de uma condenação, a 19 de julho de 2016, no âmbito do processo AT.39824 – Cartel de Camiões, por violação do disposto nos artigos 101.º, n.º 1, do TFUE e 53.º, n.º 1, do Acordo EEE, durante o período de 17 de janeiro de 1997 e 18 de janeiro de 2011, pela Comissão. Importa desde já referir que os subscritores do presente acórdão intervieram noutros processos que versaram sobre a mesma matéria, ou seja, uma ação de indemnização intentada por um particular com vista ao ressarcimento de danos causados por uma infração ao direito da concorrência por uma empresa ou associação de empresas; igualmente reportada à infração declarada, no âmbito do processo do Cartel de Camiões, pela Comissão. Cumpre ainda assinalar que o agora relator foi adjunto enquanto que o agora primeiro adjunto foi relator do acórdão, de 6 de novembro de 2023, proferido no processo 54/19.6YQSTR.L1, citado quer pela sentença quer pelas partes. Acresce ainda referir que, não existindo razões para mudar de posição, quando se justificar, norteados pelo princípio da economia processual, chamaremos à colação aquela por forma a fundamentar a nossa posição. * Prescrição. A R. alega que o direito invocado pela A., face à pugnada alteração da matéria de facto, encontra-se prescrito por força dos artigos 309.º e 498.º do CC (dies a quo do conhecimento da A.; e prazo aplicável). A este respeito a A. refere que, aplicados os artigos 498.º e 323.º do CC, dúvidas não subsistem da tempestividade da propositura da ação bem como do direito indemnizatório. A decisão em crise, analisados os “tempos” da vida fáctica e processual, apelando às normas legais, quer de origem nacional quer da União Europeia, e a decisões jurisprudenciais também dos Tribunais Nacionais e da União Europeia, concluiu que o prazo de prescrição, quando foi interposta a ação, ainda não se mostrava decorrido, pelo que julga improcedente a exceção invocada. Vejamos. Considerando a factualidade apurada, podemos dar como certo que: - a infração decorreu entre 17 de janeiro de 1997 e 18 de janeiro de 2011; - a Comissão Europeia, a 18 de janeiro de 2011, tornou público que havia levado a cabo diligências de busca e apreensão na sede de fabricantes de veículos pesados, notícia divulgada na comunicação social portuguesa no dia seguinte, dando conta a SIC Notícias que a Volvo surge identificada como uma das empresas que teria sido alvo de buscas; - a Comissão Europeia deu início ao processo a 20 de novembro de 2014 (ao abrigo do disposto no artigo 11.º, n.º 6, do Regulamento 1/2003), tendo publicado no seu sítio eletrónico um comunicado de imprensa em que deu a conhecer que tinhada adotado uma Nota de Ilicitude: (i) os visados pela Nota de Ilicitude seriam fabricantes de veículos pesados; (ii) os visados estavam a ser acusados de prática de cartel; (iii) as práticas em causa teriam envolvido coordenação em matéria de preços; (iv) o espaço geográfico em causa seria o Espaço Económico Europeu; (v) as práticas em causa consubstanciariam uma violação do disposto no Artigo 101.º do TFUE e no Artigo 53 do Tratado EEA (artigo 166.º da contestação); - a Volvo, “poucos dias depois desse comunicado”, emitiu, também, um comunicado a anunciar que iria criar uma provisão de 400 milhões de euros, antecipando a possível aplicação de uma sanção no âmbito do processo; notícia que também foi veiculada na comunicação social portuguesa; - a Decisão da Comissão é de 19 de julho de 2016, sendo que nesse dia a Comissão divulgou um comunicado de imprensa sobre a decisão com as seguintes informações: (i) identidade dos responsáveis pela infração, incluindo a R., nesta Ação; (ii) a identificação dos visados que recorreram ao programa de clemência e ao programa de transação; (iii) uma descrição do comportamento em causa, incluindo o tipo de informação trocada, incluindo a identificação de trocas de informação relativas a preços brutos, os locais de reuniões e respetivos participantes, as características dos veículos objeto da prática tida como anti concorrencial, uma descrição da evolução e das alterações do comportamento dos alegados infratores durante o período relevante, o escopo temporal da alegada infração e os montantes das coimas impostas; - a notícia dessa decisão teve divulgação nos órgãos de comunicação social, nomeadamente de Portugal; - a Decisão foi publicada no jornal oficial da EU a 6 de abril de 2017; - a ação foi intentada a 31 de março de 2020; - a R. foi citada a 27 de abril de 2020. Partindo destes factos, que julgamos serem os factos relevantes para o conhecimento da questão suscitada pela R., vejamos então se tem razão. Assinale-se que a factualidade referida corresponde também àquela que o Tribunal a quo considerou, porquanto a matéria de facto, nesta parte, não sofreu alterações. Refira-se, ainda, que no âmbito da aplicação do direito o Tribunal a quo identificou convenientemente as questões suscitadas e, com recurso ao regime legal e apoiada na jurisprudência nacional e europeia, decidiu que não se mostra verificada a prescrição. Adiante-se, desde já, que concordamos com a análise efetuada pelo Tribunal a quo ao regime legal e a sua aplicação aos factos. Efetivamente, como referimos supra, reportamos a nossa posição sobre esta temática ao teor do Ac. proferido no âmbito do processo 54/19.6YQSTR.L1, reproduzindo aqui as partes relevantes: “Contudo, porque a Recorrente levanta nesta sede questões de direito relevantes, desde logo, sobre a norma aplicável em sede de prescrição – se o artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil ou o artigo 10.º da Diretiva 2014/104 – teceremos aqui as necessárias considerações para resolver esta questão. … Neste âmbito, é de destacar o seguinte raciocínio do tribunal a quo (p. 138) “embora a infracção tenha cessado antes da entrada em vigor da mencionada Directiva (cessou em 18 de Janeiro de 2011) e a acção tenha sido proposta depois da entrada em vigor da lei de transposição da Directiva, caso se conclua que o prazo de prescrição que decorre das leis anteriores àquela lei de transposição, ou seja, o prazo que decorre do n.º 1 do artigo 498.º do CC, ainda não tinha terminado antes do termo do prazo da transposição da Directiva, então o prazo a aplicar é o prazo de 5 anos e não de 3 anos, conforme decorre do já mencionado acórdão do TJ de 22.07.2022, no âmbito do Processo C-267/20, «Volvo and DAF Trucks»”. Tal raciocínio afigura-se-nos correto e em harmonia com o Ac. TJUE C-267/20 e que esclareceu esta matéria em sede de reenvio prejudicial. Conforme recordamos supra em sede de Considerações Prévias, contrariamente ao que alega a Recorrente (artigo 1376 e ss. das alegações da apelação; artigo 308 das respetivas conclusões), as decisões do TJUE, em sede de reenvios prejudiciais, são vinculativas não só para o tribunal requerente, mas para todos os tribunais dos Estados Membros, sob pena de inviabilizar-se o primado do direito da EU e o corolário da respetiva uniformidade (sobre estes aspetos, veja-se, Fausto de Quadros, Direito da União Europeia, Almedina, 2015, 3.º ed., p. 608-611). Sobre o ponto em questão, decidiu o Ac. TJUE caso C-267/20 que “O artigo 10.º da Diretiva 2014/104/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de novembro de 2014, relativa a certas regras que regem as ações de indemnização no âmbito do direito nacional por infração às disposições do direito da concorrência dos Estados-Membros e da União Europeia, deve ser interpretado no sentido de que constitui uma disposição substantiva, na aceção do artigo 22.º, n.º 1, desta diretiva, e que está abrangida pelo seu âmbito de aplicação temporal uma ação de indemnização que, embora tenha por objeto uma infração ao direito da concorrência que cessou antes da entrada em vigor da referida diretiva, foi intentada após a entrada em vigor das disposições que a transpõem para o direito nacional, na medida em que o prazo de prescrição aplicável a essa ação ao abrigo das anteriores regras não decorreu antes da data do termo do prazo de transposição da mesma diretiva”. Ou seja, de acordo com a jurisprudência ora descrita, apesar do prazo de prescrição previsto no artigo 10.º da Diretiva 2014/104/EU (cf. artigo 6.º, n.º 1, da Lei de Transposição – Lei n.º 23/2018, de 5 de junho) constituir uma disposição substantiva, será aplicável caso se verifiquem as seguintes condições: a) Interposição de uma ação de indemnização que tenha subjacente uma infração que cessou antes da entrada em vigor da Diretiva; b) A ação tenha sido intentada após a entrada em vigor da respetiva Lei de Transposição; c) O prazo de prescrição ao abrigo das regras nacionais aplicáveis ainda não se mostre esgotado na data do termo do prazo de transposição da Diretiva. No caso concreto, temos verificada a primeira condição, em concreto a interposição de uma ação de indemnização, cuja causa de pedir é constituída, além do mais, por uma infração que terminou no dia 18 de janeiro de 2011, sendo certo que o fim do prazo de transposição da Diretiva ocorreu no dia 27 de dezembro de 2016 (artigo 21.º, n.º 1, da Diretiva). Porque a presente ação foi proposta no dia 9 de julho de 2019 e a Lei de Transposição (Lei n.º 23/2018) entrou em vigor no dia 5 de agosto de 2018 (Cf. artigo 25.º da Lei em referência), mostra-se verificada a segunda condição. Passando à terceira condição que é a mais complexa. Antes da entrada em vigor da Diretiva era aqui aplicável o disposto no artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil, nos termos do qual, a prescrição ocorre no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do facto danoso. Conforme resulta da fundamentação do Ac. TJUE caso C-267/20, parágrafo 64 “Embora não esteja excluída a possibilidade de o lesado ter conhecimento dos elementos indispensáveis para a propositura da ação de indemnização muito antes da publicação no Jornal Oficial da União Europeia do resumo de uma decisão da Comissão, ou mesmo antes da publicação do comunicado de imprensa relativo a essa decisão, mesmo num processo de cartel, não resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que seja esse o caso presente.”. Tendo em conta a improcedência da impugnação do facto não provado n.º 3, nos nossos autos também não resultou provado que a aqui Recorrida tenha tido conhecimento dos elementos essenciais da Decisão da Comissão, antes da publicação no Jornal Oficial da União Europeia do resumo da Decisão da Comissão. Nestes casos, conforme a citada jurisprudência, o marco a partir do qual se pode razoavelmente considerar que um interessado obtém esse conhecimento, é a data da publicação do resumo da Decisão C(2016) final no Jornal Oficial da União Europeia , ou seja, em 6 de abril de 2017, data a partir do qual se deve contar o prazo de prescrição (cf. parágrafos 71 e 72). Esta posição resulta igualmente do Ac. STJ de 07-07-2022, proc. 2/19.3YQSTR-G.L1.S1 (disponível em www.dgsi.pt), onde se pode ler “Na perspetiva da contagem do prazo nos termos do art. 498 nº 1 do CCivil, repetimos aqui que as autoras, como lesadas, apenas a partir da data da publicação da condenação da ré pela prática de colusão tiveram conhecimento do seu direito, só nesse momento souberam ter direito à indemnização e ficaram conhecedoras da verificação dos pressupostos que condicionavam a responsabilidade”. Contando-se o prazo de 3 anos, previsto no artigo 498.º, n.º 1, a partir do dia 06 de abril de 2017 conclui-se que o prazo de prescrição terminaria a 06 de abril de 2020. Assim sendo, facilmente se conclui que o prazo de prescrição ao abrigo das regras nacionais aplicáveis, não se mostrava esgotado na data do termo do prazo de transposição, ou seja, a 27 de dezembro de 2016. Nesta sequência, devemos concluir pela aplicabilidade do prazo de cinco anos previsto no artigo 10.º, da Diretiva 2014/104/EU e artigo 6.º, n.º 1, da Lei n.º 23/2018. O prazo de prescrição em causa apenas terminou, assim, em 07 de abril de 2022, tal como concluiu a sentença recorrida. Contra este raciocínio não se pode argumentar, como faz a Recorrente (v. artigo 309 das Conclusões), que assim se viola o artigo 24.º, n.º 1, da Lei de Transposição, que proíbe a retroatividade das normas de natureza substantiva. Tal proibição, aliás, também se encontra prevista no artigo 22.º, n.º 1, da Diretiva. É a proibição da retroatividade de normas de direito substantivo que explica que o TJUE impusesse aqui, como condição de aplicabilidade do prazo previsto no artigo 10.º, a terceira condição supra descrita, ou seja, que o prazo de prescrição ao abrigo das regras nacionais aplicáveis ainda não se mostre esgotado na data do termo do prazo de transposição da Diretiva. Assim se compreende o afirmado no parágrafo 74 do Ac. TJUE C-267/20 “Verifica‑se, portanto, que a situação em causa no processo principal continuava a produzir efeitos após o termo do prazo de transposição da Diretiva 2014/104 e mesmo após a data de entrada em vigor do Real Decreto‑Lei n.º 9/2017 que a transpõe”. Transpondo este raciocínio para o nosso caso, a situação em causa no processo (a infração), continuava a produzir efeitos jurídicos após o termo do prazo de transposição da Diretiva 2014/104, porquanto o prazo de prescrição, ao abrigo do disposto na lei nacional, no nosso caso, do artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil, ainda não se tinha esgotado em 27 de dezembro de 2016, fim do prazo de transposição da Diretiva. Nestes termos, não se pode concluir, em casos como o presente, que a aplicação do prazo de cinco anos previsto no artigo 10.º da Diretiva e na nossa Lei de Transposição, seja retroativa. Não ocorre, portanto, a violação do princípio da não retroatividade de normas de direito substantivo (artigo 12.º, do Código Civil). A alegação, nesta sede, terá assim que improceder.”(destaques são nossos) * Pressupostos da responsabilidade civil extracontratual. A R. alega que não se verificam os demais pressupostos da responsabilidade civil, previstos no artigo 483.º do CC, em particular a culpa, o dano e o respetivo nexo causal. A este respeito a A. refere que se mostram provados os demais pressupostos da responsabilidade civil, sendo que, destaca, a respeito da ilicitude e da culpa, a existência de conluio entre os fabricantes, nomeadamente a Demandada, aumentando de forma intencional, coordenado e continuada, os preços brutos dos camiões. A decisão em crise, reiterando o âmbito da ação, nomeadamente a sua ligação à prática restritiva da concorrência por violação do artigo 101.º do TFUE e do artigo 53.º do Acordo sobre EEE, identifica e conhece da verificação dos pressupostos da obrigação de indemnizar, ou seja, do facto ilícito, da culpa, do dano e do nexo causal. Considerando o âmbito do recurso, delimitado pelas conclusões, importa conhecer da verificação da culpa, do dano e do nexo causal. Comecemos pela culpa. A Recorrente pugna que não ficou demonstrado nos autos que atuou com culpa, pelo que a “ação não poderia nunca proceder”. Alega ainda que a invocação efetuada pelo Tribunal a quo acerca do reconhecimento da culpa da Recorrente, no contexto do procedimento administrativo, não tem qualquer relevância para os presentes autos, nomeadamente face ao disposto no artigo 352.º do CC. Mas será assim? No Ac. 54/19.6YQSTR.L1, proferido por este Tribunal, também foi colocada a mesma questão e, em resposta, aí se decidiu que: “… o princípio da culpa é absolutamente basilar no direito português, traduzindo um juízo de censura da conduta do agente, quando este podia e devia ter agido de forma distinta. Se o agente não puder ser censurado pela forma como agiu no caso concreto, não há responsabilidade, salvo nas situações em que a lei admite responsabilidade independentemente de culpa – o que não é o caso”. O juízo de censura, ou seja, o juízo de valoração negativa, subjacente à culpa incide, obviamente, sobre factos (internos). Desta conclusão retira-se que o juízo de censura, como juízo normativo que é, é algo diverso de factos. Quanto a este último ponto, conclui a Recorrente (artigo 341) “não é possível confessar um conceito legal (tal como a intenção). Antes, é apenas possível confessar factos que demonstrem e preencham conceitos legais”. Esta última proposição adiantada pela Recorrente não é inteiramente correta, pois se podemos concordar que não é possível a uma pessoa confessar um conceito legal, neste caso, a culpa, ou melhor, o juízo de censura em que esta se consubstancia, obviamente que se pode confessar uma intenção, no nosso caso, a intenção de acordar com outros a subida de determinados preços. A intenção de praticar determinado facto ilícito é um facto psicológico. Já o juízo e censura é uma valoração normativa. Nesta sede, resulta desde logo do facto provado 30, que “[a] Ré, em conluio com outros fabricantes de camiões e por força das condutas que foram consideradas provadas em sede da Decisão da Comissão, aumentou intencional, coordenada e continuadamente, com os seus concorrentes, os preços brutos dos camiões de peso superior a 6 toneladas, que fabricou e comercializou, diretamente ou através da sua rede de distribuição, no período de 17.01.1997 a 18.01.2011”. Conforme resulta do supra exposto em sede de considerações sobre os factos provados 30 e 31, esta factualidade infere-se da própria Decisão da Comissão. Ora, se a Recorrente se coordenou com as demais empresas infratoras durante cerca de 14 anos, com vista a aumentar os preços brutos dos camiões de peso superior a 6 toneladas, de forma intencional, tanto basta para o tribunal poder formar um juízo de censura da sua conduta, neste caso por uma conduta manifestamente dolosa. Tal juízo de censura poderia ser afastado caso a Recorrente tivesse alegado e provado, nomeadamente, que durante os 14 anos em causa, tinha agido ao abrigo de uma causa de exclusão da culpa, não lhe sendo exigível outra conduta, o que obviamente não ocorreu nestes autos. Conclui-se, como concluiu a sentença recorrida, pela verificação da culpa no caso concreto.” (destaques são nosso) É, pois, este o entendimento que seguimos - também - para estes autos. Ainda assim, julgamos que se impõe acrescentar uma breve nota, face à posição da Recorrente, por reporte à «culpa em relação à Recorrida» (A) e «aos danos por si alegadamente sofridos», e que para efeitos da presente ação, teria de ser demonstrada nos autos. A pugnada «culpa em relação à Recorrida», face à natureza dos factos em análise, é evidente, na medida em que esta, de forma intencional e coordenada, continuamente aumentou os preços brutos dos veículos que fabricou e comercializou. Aliás, salvo o devido respeito, não se pode equiparar e ou estabelecer como se se tratasse do juízo da culpa relativo a um comportamento dirigido a uma determinada pessoa, porquanto neste tipo de condutas o (destinatário) último da cadeia comercial que sofre o sobrecusto não é, por reporte à prática do facto, identificável pelo respetivo responsável. Porém, esta não o pode negar, dito de outra forma, a R. sabia que aquele sobrecusto se ia refletir e atingir aqueles que interviessem na cadeia de comercialização dos mesmos, como foi o caso da A., e, nos termos em que agiu, ou seja, ao longo de cerca de 14 anos, em violação de regras de concorrência, fê-lo de forma “intencional”. Aqui já começamos a entrar na questão seguinte levantada pela R., ou seja, a existência de um dano e de um nexo causal entre o facto ilícito e o dano alegadamente sofrido pela A. Nexo causal e o dano. Está, pois, provado que a R., com as demais infratoras, participou em acordos colusórios que implicaram o aumento de preços de camiões pesados, inclusivé, os preços pelos quais a Recorrida adquiriu os camiões em causa nestes autos. Resulta, portanto, evidente que a Recorrida “adquiriu camiões pesados a um preço mais elevado (dano), preços estes aumentados devido à infração em causa, ou seja, devido aos referidos acordos colusórios (nexo causal).”(cfr. Ac citado, pág. 79)(destaques são nossos) Naturalmente que a circunstância de ser discutível o quantum do dano não afasta a sua existência e, como tal, é seguro afirmar, como efetuado pelo Tribunal a quo, que os preços pelos quais a Recorrida adquiriu os camiões foram superiores aos que teria pago caso não existissem os referidos acordos colusórios entre empresas. Sempre se dirá, ainda, que a R., ao contrário do que pugna, não logrou provar a interrupção do nexo causal. Nessa medida, mostram-se, pois, verificados o dano e respetivo nexo causal. * Quantum do dano. Relativamente a esta temática temos as duas Recorrentes a pugnar pela alteração da decisão do Tribunal a quo. A A. alega que a fixação do quantum do dano em 5%, com recurso a estimativa judicial aproximada, violou o artigo 9.º, n.º 2, da Lei n.º 23/2018, de 5 de junho, e pugna pela sua alteração para 16,68% ou, pelo menos, para 10% do preço de aquisição de cada camião. Por sua vez, a R., subsidiariamente, alega não ser admissível, por arbitrária, a estimativa do quantum em 5% (se a repercussão e/ ou mitigação do alegado sobrecusto, seja por via dos preços praticados pelos seus serviços seja pela revenda dos veículos seja pela obtenção de vantagens fiscais, deveria ter sido computada na estimativa judicial do dano). A decisão em crise, a este respeito, constatando que a A. não fez prova do montante dos prejuízos sofridos, convoca o regime previsto no artigo 9.º, n.º 2, da Lei 23/2018, que corresponde ao artigo 17.º, n.º 1, da Diretiva 2014/104/EU, por considerar aplicável ao caso sub judice, face a jurisprudência comunitária que cita, para os quantificar. O referido artigo, sob a epígrafe “quantificação dos danos e do valor da repercussão”, prevê que “se for praticamente impossível ou excessivamente difícil calcular com exatidão os danos totais sofridos pelo lesado ou o valor da repercussão a que se refere o artigo anterior, tendo em conta os meios de prova disponíveis, o tribunal procede a esse cálculo por recurso a uma estimativa aproximada, podendo, para o efeito, ter em conta a Comunicação da Comissão (2013/C 167/079, de 13 de junho de 2013, sobre a quantificação dos danos nas ações de indemnização que tenham por fundamento as infrações aos artigos 101.º e 102.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.”(destaques são nossos) A sua aplicação ao caso, como disso deu conta, face à natureza processual/ adjetiva daquela disposição, decorre do artigo 24.º, n.º 2, do mesmo diploma legal, que regula a respetiva aplicação no tempo. Vejamos então. Importa, pois, ter presente que a existência do dano (provado, como vimos) é diferente da sua quantificação (não provada). Mais importa ter presente que, a esse respeito, em sede de apreciação da prova, se concluiu pela insuficiência da prova, seja a versão da A. seja a da R., sendo num caso da existência de um sobrecusto de 16,68% e noutro da sua inexistência. Importa ainda recordar que as duas posições se suportaram em prova técnica, no caso da A. no Relatório Z... (Peritagem, Avaliação de Prejuízos, Cartel de Camiões – EU, de 2021) e no depoimento de um dos seus autores; no caso da R. nos Relatórios AA/BB (Refutação do Relatório Pericial Z... e Relatório de Peritagem para a Volvo Trucks/ Renault Trucks) e também do depoimento de um dos seus autores, sendo que, como referido em sede de motivação, nenhuma das provas logrou convencer; sendo de destacar a complexidade das variantes e dos respetivos resultados. Acresce referir que o Tribunal considerou ainda o Estudo Oxera 2019 (Como Avaliar os efeitos da infração no Caso de Camiões), o Guia Prático e a Peritagem elaborada por (…) que, na prática, confirmam aquela complexidade/ dificuldade. Finalmente, importa salientar as especificidades do processo, das quais se destacam a natureza da infração, o período envolvido, a diversidade de camiões e a quota de mercado das “envolvidas”. Dito isto, coloca-se a questão de saber se de facto é praticamente impossível ou excessivamente difícil calcular o dano ou, pelo contrário, como alega a R., se estamos antes perante o incumprimento do ónus de prova pela A. Mais uma vez, perante a similitude dos casos, julgamos adequado fazer apelo ao decidido no citado Ac 54/19 deste Tribunal, nomeadamente quando refere que: “apesar de todo o intenso debate contraditório encetado pelas partes sobre a quantificação do dano, quer em primeira instância quer na presente instância, que estávamos perante a quase impossibilidade ou uma excessiva dificuldade na quantificação exata do dano.” Julgamos que, não obstante as especificidades de cada processo, a questão de fundo que se coloca em termos de quantificação dos danos é a mesma, pois que estamos perante a mesma vastidão de condicionantes, essencialmente de natureza económico/ financeira, complexa, reportada a um período longo, e que, por isso, em termos de dificuldade/ impossibilidade de prova, merece as mesmas considerações. Aliás, a este respeito, o Tribunal a quo concluiu que “não se vê que outras diligências pudessem ser feitas para recolher elementos tendentes à quantificação do dano de acordo com os métodos de cálculo explicitados pela Comissão no Guia de Quantificação, no essencial pelas mesmas razões de âmbito geral salientadas pelo TRL e pelo Supremo Tribunal de Espanha.”(destaque é nosso) Assim, em face da resposta dada àquela pergunta, importa, agora, materializar a dita estimativa aproximada. Prosseguindo. O Tribunal a quo, tendo citado variada jurisprudência, nacional e estrangeira, da qual se destaca o Ac 54/19 e as referências por este efetuadas a decisões proferidas em ações similares no Reino Unido e no Reino de Espanha, manifestou concordância com o aí decidido e transponível para o caso em análise, tendo fixado a indemnização no montante de 5% do preço de aquisição de cada veículo. Será assim/ adequado? A resposta a esta questão também já nos foi dada pelo citado Ac 54/19 e, por isso, passamos a reproduzi-la: “Neste contexto, não se tendo apurado o montante exato do sobrecusto apesar do esforço das partes, julga-se que há que recorrer à estimativa judicial para a determinação do quantum do dano (que, neste caso, coincide com o sobrecusto). Ou seja, devemos recorrer ao poder conferido aos tribunais pelo artigo 17.º, n.º 1, da Diretiva e artigo 9.º, n.º 2 da Lei 23/2018. A possibilidade de recurso à estimativa judicial não é afastada pelo facto de a Autora não ter recorrido ao mecanismo de apresentação de provas previsto no artigo 5.º da Diretiva e artigo 9.º da Lei de transposição, de forma a ultrapassar dificuldades inerentes a uma assimetria de informações entre si e a Ré. Como deixamos supra sublinhado, mesmo que a ora Autora tivesse recorrido à previsão do artigo 5.º da Diretiva (artigo 12.º da Lei n.º 23/2018) e solicitasse o acesso aos dados titulados pela Ré, ao que tudo indica, não teria obtido dados suficientes para apurar, de forma exata, o valor do sobrecusto em causa. Resulta do supra citado Ac. TJUE C-312/21 (Tráficos Ferrer), que embora a assimetria de informação esteja na origem da adoção do artigo 17.º, n.º 1 da Diretiva, não intervêm na aplicação deste (parágrafo 54), sendo antes pressuposto da sua aplicação ser praticamente impossível ou excessivamente difícil quantificar o dano de forma exata. Ou seja, se bem que o tribunal não deva colmatar falhas das partes, maxime do Autor (parágrafo 57 do acórdão), não é requisito essencial da aplicação da estimativa judicial, ter-se recorrido anteriormente àquele mecanismo. … De notar, que a igual impasse quanto ao quantum do dano, chegaram outros tribunais europeus no âmbito do mesmo cartel dos camiões. Neste âmbito destacamos uma decisão proferida no Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte (doravante, Reino Unido) e decisões proferidas no Reino de Espanha, por exemplo o Acórdão do Tribunal Supremo de 14-06-2023, STS 2479/2023 - ECLI:ES:TS:2023:248030 (doravante, Ac. STS 2479/2023). A este respeito, pode ler-se no Ac. STS 2479/2023: “Así, la extensa duración del cártel, que se inició en el año 1997 y se prolongó durante al menos 14 años, dificulta seriamente realizar un análisis diacrónico. El ámbito geográfico del cártel, que afectó a todo el EEE, y la singularidad de los productos afectados, hacen en la práctica muy difícil realizar un análisis sincrónico de comparación con otros mercados geográficos (pues las circunstancias concurrentes en otros ámbitos geográficos son muy diferentes) o con otros productos, que no son aptos para realizar la comparación. Y esas mismas características del cártel también dificultan mucho aplicar con éxito otros métodos de cuantificación de daños, como los basados en costes y análisis financieros. En este contexto, las propias características de este cártel contribuyen a considerar que, en este caso, la falta de idoneidad del informe presentado por el demandante para cuantificar el sobreprecio no supone una inactividad que impida la estimación judicial. Se trata de un cártel de 14 años de duración, que abarcaba todo el EEE y en el que los participantes en el cártel eran los mayores fabricantes europeos con una cuota de mercado de aproximadamente el 90%; con documentos redactados en varios idiomas distintos del propio del demandante; con una solicitud de clemencia y una transacción que obstaculizan aún más la obtención de los documentos relevantes ( art. 283.bis.i. 6 LEC)” (p. 17). Resulta, portanto, no seguimento destas passagens, que perante as características concretas da infração, que é a mesma destes autos, na vizinha Espanha, em aplicação de Direito da União que nos é comum, concluiu-se que, apesar dos esforços das partes, era praticamente impossível ou excessivamente difícil calcular o dano de forma exata, devendo-se recorrer à estimativa judicial. De notar que na vizinha Espanha, ao que tudo indica, pendem milhares de processos de private enforcement ligados com o mesmo cartel e já foram decididos inúmeros casos, inclusive, pelo respetivo Tribunal Supremo. As decisões do Tribunal Supremo em Espanha, que já envolviam 15 casos no passado mês de junho, confirmaram indemnizações fixadas, com recurso a estimativas judiciais, em 5% do preço de venda de camiões efetivamente pago pelos demandantes (a título de sobrecusto), em casos onde inexiste prova suficiente a sustentar um sobrecusto menor ou maior àquele valor. O estudo Oxera 2019 junto a estes autos com a contestação, já revelava conhecimento sobre diversos processos na Europa, quando mencionou que “em alguns processos que correm termos nos tribunais nacionais, os demandantes basearam os custos adicionais alegados nos níveis típicos ou médios dos custos adicionais identificados nos estudos empíricos sobre cartéis anteriores. O estudo da Oxera de 2009 continha uma visão global desses estudos anteriores e sabemos que alguns demandantes se referiram a esse nosso estudo de 2009” (ponto 1.7 do estudo). Obviamente que tais meta-estudos (estudos incidentes sobre outros estudos) sobre os efeitos de cartéis, nos quais se inclui o estudo Oxera 2009, jamais poderiam servir para fixar uma quantia precisa do dano verificado num caso concreto, leia-se, em sede de facto (neste sentido, Oxera 2019, ponto 1.8). Contudo, em sede de estimativa judicial, ou seja, em sede de direito, tais estudos foram considerados como elementos úteis e válidos pelos respetivos tribunais espanhóis, inclusive pelo Tribunal Supremo, para determinarem o quantum do dano. A este respeito, a decisão de segunda instância proferida em 20-12-2019, pela Audiencia Provincial de Valencia (SAP V 5941/2019 - ECLI:ES:APV:2019:5941),33 subjacente ao citado Ac. STS 2479/2023, refere “La sentencia apelada, ante la falta de prueba pericial apta para cuantificar el daño, estima en el 5% del precio de adquisición de los camiones, el daño sufrido por la demandante y asume los argumentos que resultan de la Sentencia del Juzgado Mercantil 3 de Valencia de 27 de febrero de 2019, que se sustenta en el informe Oxera, y en la que, con elección de la estimación más conservadora del muestreo estadístico, estima razonable un porcentaje de sobreprecio del 5% como media de compromiso entre los umbrales mínimos y máximos que intervienen como común denominador del 93% de los cárteles que aplican sobreprecios” (p. 19-20, com sublinhados nossos). Tal acórdão de segunda instância acabaria também ele por fixar a indemnização em 5% do preço de venda de cada camião efetivamente pago pela respetiva demandante, tendo sido este acórdão confirmado pelo Ac. TS 14-06-2023. No entanto, o acórdão de segunda instância, ou seja, da Audiencia Provincial de Valencia, não deixa de sublinhar a necessidade de acorrer, para além de dados estatísticos, a outras circunstâncias como os elementos presentes na Decisão da Comissão, tal como a natureza do cartel, a critérios jurisprudenciais e à prova produzida nos autos. Por sua vez, pode ler-se no Ac. STS 2479/2023 “… 5% del precio del camión, que es el porcentaje que el tribunal de segunda instancia considera como importe mínimo del daño, atendidas las referidas circunstancias del cártel y los datos estadísticos sobre los porcentajes de sobreprecio que suelen causar los cárteles, en aplicación de las facultades estimativas que el ordenamiento jurídico le atribuía antes incluso de la trasposición de la Directiva, como consecuencia directa del principio de indemnidad derivado de los arts. 1902 CC y 101 TFUE.” (p. 19). Dada a importância que tem assumido aqui o estudo da Oxera 2009, será de recordar as principais conclusões do Oxera 2009 aqui relevantes (inclusive citadas no Guia Prático e no Oxera 2019) e que são representadas na seguinte representação visual (p. 91 do estudo Oxera 2009, p. 51 do Guia Prático): Mais se acrescenta no Guia Prático “[d]e acordo com o referido estudo, verifica-se portanto um diferencial significativo a nível dos preços adicionais registados (mais de 50% no caso de alguns cartéis). Cerca de 70% dos cartéis examinados neste estudo resultaram num preço adicional compreendido entre 10% e 40%, situando-se a média em torno dos 20%” (Guia Prático, loc. cit.). De acordo com o citado gráfico temos, portanto, enormes oscilações entre os sobrecustos verificados nos cartéis estudados (amostra de 114 casos). Os tribunais na vizinha Espanha, através de médias entre os limites mínimos e máximos dos sobrecustos, chegam a um limite mínimo de 5%. Tal montante equivale ao ponto médio entre 0% e 10%, dos efeitos dos cartéis com sobrecustos mais conservadores. Por sua vez, curiosamente o Ac. STS 2479/2023 não deixou de fazer, a respeito do valor mínimo de 5%, a seguinte observação “No deja de ser significativo que incluso en el caso Royal Mail/British Telecom, enjuiciado por el Competition Appeal Tribunal británico [CAT, Case nº : 1290/5/7/18 (T)], en el que sí hubo un amplio acceso a los documentos de la demandada y a la información reservada del expediente de la Comisión y se aportaron detallados informes periciales elaborados por prestigiosos peritos, no ha sido posible la cuantificación exacta del daño con base en esas pruebas documentales y periciales y el tribunal ha debido recurrir a la estimación del daño, que ha fijado en un 5% del precio de los camiones” (p. 19). Efetivamente, o Acórdão proferido pelo Tribunal de Concorrência Britânico (doravante, CAT),34 chegou ao mesmo valor de 5%, mas por uma via diferente do que na vizinha Espanha.35 Cremos que é de algum interesse analisar o acórdão emitido nas terras de Sua Majestade. Efetivamente, apesar das diferenças entre o sistema de Common Law e os sistemas, como o nosso, de Civil Law, o certo é que em matérias de Concorrência existem ainda muitas semelhanças entre o nosso sistema e o britânico. É de reparar, neste âmbito, que mesmo após o conhecido Brexit, as decisões sancionatórias da Comissão anteriores a 20 de dezembro de 2020 (o chamado “IP completion day”) vinculam as autoridades do Reino Unido,36 sendo certo que os direitos subjacentes a ações de follow-up, no âmbito do private enforcement, foram mantidos.37 Obviamente que nem os acórdãos proferidos por Tribunais do Reino de Espanha nem o citado acórdão proferido por tribunal do Reino Unido, possuem força jurídica para além-fronteiras. Assumem aqui, portanto, um valor sempre relativo. Servirão, além do mais, para revelar que perante o mesmo cartel dos camiões, no quadro do mesmo Direito da União, têm sido avançadas, no seio dos sistemas nacionais em referência, argumentações diversas, mas com resultados coincidentes. Com estas reservas, vejamos, pois, mais de perto o acórdão britânico em referência. No extenso acórdão com 301 páginas (processo acessível ao público por via do link supra), é desde logo notório o esforço probatório feito pelas partes, nomeadamente com vista à quantificação do sobrecusto ou “overcharge”. Efetivamente, foram apresentados 48 relatórios periciais com milhares de páginas, visando, entre outros, a quantificação exata do sobrecusto derivado do cartel dos camiões. Os relatórios principais eram naturalmente do domínio da economia (p. 100). Grande parte do acórdão é dedicado a analisar os relatórios principais, de forma muito detalhada, quer no que concerne à existência do dano, quer, no que nos interessa aqui, no seu quantum (capítulo denominado “Overcharge” ou Sobrecusto). Denota-se que foram essencialmente utilizados, pelos respetivos demandantes (Royal Mail Group Limited e British Telecommunications PLC), vários modelos de regressão para avaliar o sobrecusto, chegando a diferentes resultados, em concreto, um sobrecusto entre 11,3% e 11,6% usando o modelo B-D (antes e durante o período cartel) e modelo D-A (durante e pós-cartel), onde se estimou um sobrecusto entre 6,7% e 14,7% (p. 147-148). Da parte das demandadas (entre outros a DAF/ PACCAR Inc.), foram usados modelos durante e pós-cartel (D-A) e também antes-durante-pós(cartel), nas iniciais inglesas B-D-A (before, during, after). De acordo com estes estudos as conclusões apontavam, à semelhança dos estudos aqui apresentados pelo Professor AA, para a inexistência de sobrecusto, ou seja, 0% (p. 150). Para além de problemas relativos aos dados usados, foram apontados pelo tribunal Britânico 3 problemas adicionais para a quantificação em causa, uma delas específica do Reino Unido (taxas de câmbio entre Libra e Euro), uma de ordem geral, a crise económica mundial de 2008-2010 (denominado de GFC), e uma terceira relativa às especificidades do cartel em causa, os aumentos de preços (emissions premia) ligados a novas tecnologias relativas a emissões (p. 147 a 152). Após uma análise minuciosa destes aspetos (e outros conexos), e “apesar da enorme quantidade de trabalho investido no processo pericial deste caso”, o tribunal do Reino Unido concluiu que não era possível traduzir o sobrecusto numa quantidade exata, adiantando, aliás, a sua convicção que nenhum modelo de análise de regressão seria adequado para tal efeito. Mais concluiu, aplicando o princípio do direito britânico denominado de “Broad Axe Approach” que, no nosso sistema pode ser comparado à figura da equidade prevista no artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil ou à estimativa judicial agora prevista no artigo 17.º, n.º 1 da Diretiva, fixando a indemnização nos já referidos 5% do preço de aquisição efetivamente pago para cada camião (p. 187-189). Tal valor corresponde a aproximadamente metade do que era pedido por cada demandante. Curiosamente, o juízo final baseou-se, pelo menos em parte, nos relatórios periciais apresentados pelas partes em oposição, pois, apesar das perícias não convencerem na quantificação exata do sobrecusto, revelaram-se úteis e ajudaram na compreensão das razões por detrás dos diferentes resultados (veja-se, p. 186, parágrafo 476 e p. 187, parágrafo 479). Conforme se infere do exposto, são diversas as abordagens do tribunal britânico e dos tribunais espanhóis. Em Espanha a estimativa judicial baseia-se, em importante medida, em estatísticas retiradas de meta-estudos sobre cartéis, conjugadas com circunstâncias factuais retiradas da Decisão da Comissão, critérios jurisprudenciais e provas produzidas em cada caso. As decisões do Reino de Espanha não deixam também de realçar e expressar prudência quando o tribunal se substitui às partes no exercício da estimativa judicial. No Reino Unido a solução apresenta-se como de cariz casuística, como é apanágio dos sistemas de Common Law. Não se recorreu a dados estatísticos alheios ao processo. A solução encontrada, mais do que conservadora, apresenta-se como equitativa perante o trabalho e esforços de ambas partes, em particular dos respetivos peritos, para o esclarecimento das dificuldades do processo. Outras soluções legais existem para casos como o presente, onde o apuramento exato do dano se apresenta como praticamente impossível ou excessivamente difícil. Por exemplo, como nos dá conta o estudo Oxera 2009, na Hungria estabelecia-se uma presunção ilidível de um sobrecusto de 10% em casos que envolviam violações ao artigo 101.º TFUE (Oxera 2009, p. 94). O valor de 10% aplicável por defeito na Hungria, é porventura compreensível se olharmos aos dados científicos presentes no aludido estudo Oxera 2009, citado no Guia Prático. Efetivamente, conduzindo-nos pelo gráfico supra ilustrado, se excluirmos os 7% de cartéis estudados que não implicaram um sobrecusto, e os cerca de 16% que implicaram um sobrecusto até 10%, restam aproximadamente 77% que implicaram um sobrecusto de pelo menos 10%. De acordo com tal estudo, portanto, em termos de probabilidades, um cartel tem uma elevada probabilidade de implicar um sobrecusto de pelo menos 10%. Tendo em conta tal elevada probabilidade poderíamos ser aqui tentados a seguir tal via, estabelecendo no nosso caso, por via de estimativa judicial, o valor do dano em 10%. Se olharmos, aliás, às características do cartel em causa e respetiva gravidade, do qual se salienta a sua longa duração, enorme extensão territorial, elevada quota de mercado e intensas trocas de informações sensíveis e coordenação para aumentos de preços, tal valor não se afigura, pelo menos prima facie, exagerado. Dentro do nosso sistema, contudo, cremos que a solução final também deverá fixar o montante do sobrecusto em 5% do preço de aquisição de cada camião, efetivamente pago pela Recorrida. Para além de circunstâncias da infração já aludidas, no nosso caso temos a aquisição pela Recorrida de 10 camiões, tendo o preço de venda mais baixo sido igual a 67.337,72 € e o mais elevado 86.203,00 €, confirmando as diferenças de preços entre camiões. Os preços de venda reportam-se a um período desde 25-09-2001 a Julho 2008. Tal período totaliza aproximadamente metade do tempo total da infração. A data da última fixação de peço de venda calha (julho 2008) já no período da crise financeira mundial. Em sede de prova, como vimos na resposta à impugnação de factos atinentes ao quantum do dano, o Relatório EE revelou-se opaco no tratamento efetivamente conferido aos dados, apresentando quase exclusivamente meras médias finais de preços, relativas a longos períodos de tempo com elevadas observações. O trabalho da equipa do Professor AA foi mais transparente, permitindo-nos, aliás, colocar em causa as conclusões do próprio Relatório de Análise inclusive com informação constante do mesmo, informação esta relativa a condicionantes internas da Recorrente verificadas nos anos de 2012-2014 e exteriores, portanto, aos próprios dados. O tratamento de dados realizado por esta equipa também permitiu observar algumas das expectáveis implicações da crise financeira mundial de 2008-2010, tal como a queda abrupta de vendas de camiões e o declínio de margens brutas médias da Recorrente. Mas também este trabalho se revelou em alguns aspetos opaco, por exemplo na ausência de qualquer análise das possíveis relações entre preços brutos e líquidos, quando confessadamente tinham dados para o efeito. Neste contexto, onde cada parte se defrontou com dificuldades próprias, o referido valor de 5% apresenta-se como prudente e razoável. É certo que a quantia assim fixada poderá não responder ao objetivo da reparação integral do dano. Contudo, não nos parece que seja irrelevante prevenir uma indemnização excessiva e o enriquecimento sem causa inerente. Aliás, o artigo 3.º, n.º 2 e 3 da Diretiva, que reflete jurisprudência anteriormente emitida pelo TJUE, salienta os dois interesses. De qualquer forma, na realidade desconhece-se qual o efetivo quantum do dano. Por último, justifica-se que seja adotada esta posição conservadora, porquanto, em última análise, o ónus de prova da prova da quantificação do dano pertencia à Autora, ora Recorrida. Nesta conformidade, como afirmamos supra, haverá que revogar a sentença recorrida e exercer os poderes de substituição inerentes a este tribunal, fixando-se o dano em 5% do preço de venda de cada camião adquirido pela Recorrida.” Por uma questão de precedência lógica, faremos o cálculo dos valores efetivamente fixados a título de indemnização, após a resposta às demais questões.” (destaques são nossos) Assim, não obstante as especificidades do caso sub judice, nomeadamente por se reportar a um período mais longo e a maior número de veículos, entendemos que continua a ser adequado/ proporcional aquele entendimento, não justificando, por isso, um entendimento diverso. Nessa medida, julgamos, nesta parte, improcedentes os dois recursos e, em consequência, mantemos a decisão do Tribunal a quo que quantificou o dano em 5% do preço de venda de cada camião adquirido pela Recorrida. * Repercussão e/ ou mitigação. A R., reportada a esta temática, pugna pela “repercussão e/ ou mitigação do alegado sobrecusto, seja por via dos preços praticados pelos seus serviços, seja pela revenda dos veículos, seja pela obtenção de vantagens fiscais, deveria ter sido computada na estimativa judicial do dano.” A A., em resposta, pugna pela sua não demonstração, chamando a atenção para o relatório e depoimento do Sr. Perito (…), em particular a impossibilidade de se fazer asserções sobre a eventual repercussão do sobrecusto por parte da R. A este respeito, a decisão em crise, tendo qualificado a repercussão do dano como uma exceção, “pois aceita que o direito se formou na esfera jurídica do autor, mas, devido à repercussão e/ou revenda, se extinguiu por via da sua transferência para outra pessoa”, face à matéria de facto apurada, porque a R. não logrou efetuar a sua prova, conclui pela respetiva improcedência. Cumpre decidir: Recorde-se que a matéria de facto relativa a esta temática, identificada nas alíneas g) a i), dos factos não provados, não sofreu alterações. Dito isto, o pugnado recurso ao mecanismo legal previsto no artigo 9.º, n.º 2, da Lei 23/2018, salvo o devido respeito, não se mostra viável. Efetivamente, como referimos supra, é prévio à sua aplicação, que visa a quantificação, que o mesmo seja dado como provado. Dito de outra forma, não se tendo provado a repercussão e/ou mitigação do sobrecusto, por via dos custos dos serviços prestados pela aqui A., de benefícios fiscais, da venda dos veículos a terceiros ou de outras, não faz sentido recorrer àquele mecanismo legal de quantificação, pois nada existe para quantificar. Deste modo, improcede a pretensão da R. de ver aplicado ao sobrecusto “que se vier a apurar” a repercussão e/ou mitigação. * Liquidação de sentença. A R., relativamente à decisão do Tribunal a quo que a condena no pagamento do valor que se vier a liquidar em execução de sentença, por reporte aos veículos sinalizados nas alíneas i) a kk) dos factos provados (em relação aos quais não se apurou o preço), considera que “viola o direito probatório” e, por isso, pugna pela sua absolvição. O Tribunal a quo, sobre essa temática, decidiu que “no caso, das viaturas em relação às quais não se apurou o valor de aquisição terá de ser efetuado em liquidação da sentença, impondo-se o recurso ao artigo 609.º, n.º 2, 1.ª parte, do CPC, nos termos do qual se não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado.” Quid juris. A respeito da presente matéria, além do que já se referiu em sede de impugnação da matéria de facto, sobre putativa violação do duplo sdantand de prova, julgamos oportuno recordar que se provou a aquisição de veículos sem, contudo, se ter logrado provar o respetivo preço/ valor de aquisição. Mais julgamos oportuno chamar à colação o número 2 do artigo 609.º do CPC que, sob a epígrafe “Limites da condenação”, estabelece que “se não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja liquidada.” O Tribunal a quo, em reforço da sua posição, citou o aresto do STJ de 18 de setembro de 2018, proferido no âmbito do processo n.º 4174/16.0T8LRS.L1.S1, donde resulta a obrigação de “condenar no que se liquidar em execução de sentença sempre que se encontrem reunidas duas condições: (i) que o réu tenha efetivamente causado danos ao autor; e (ii) que o montante desses danos não esteja determinado na ação declarativa por não ter sido concretamente apurados (art. 609.º do CPC).” (destaques são nossos) Resulta ainda do citado aresto que “o tribunal deve (e estamos aqui perante um poder dever do Juiz e não perante um poder discricionário) condenar no que se liquidar em execução de sentença sempre que se encontrem reunidas” aquelas condições. Em anotação à citada norma, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, depois de referirem casos suscetíveis de culminar com uma condenação genérica, nomeadamente “em casos em que o autor tenha quantificado a sua pretensão, a ação pode com uma sentença de teor genérico ou ilíquido desde que, sendo apurada a existência do direito e da correspondente obrigação, os elementos de facto se revelem insuficientes para a quantificação, mesmo com recurso à equidade.” Acrescentando que “esta é, aliás, uma posição que encontra na jurisprudência um larguíssimo consenso, rejeitando uma argumentação formal que valorizasse o facto de, assim, se conceder ao autor uma dupla oportunidade para o conhecimento do mesmo direito. Tal não é verdade se considerarmos, como se impõe, que uma sentença de condenação ilíquida pressupõe a demonstração de que existe um direito que apenas carece de concretização suscetível de ser conseguida ainda através do subsequente incidente de liquidação”(cfr. CPC Anotado, Vol. I, pág. 729). (destaques são nossos) Finalmente, também secundamos a última consideração do Tribunal a quo, quando refere que “Estas condições estão verificadas, sendo certo que não se mostram verificadas, neste momento, as condições para aplicar também o artigo 9.º, n.º 2, da Lei n.º 23/2018 para efeitos de determinação do preço de tais veículos, pois considera-se que não está afastada a possibilidade de se apurar um preço mínimo através de informações a obter junto da R. ou de outros operadores de mercado.” Assim, face ao exposto, improcede, pois, a pretensão da R. * Juros de mora. A A. pugna que o momento a partir do qual devem ser calculados os juros de mora relativamente aos veículos adquiridos por contrato de compra corresponde ao dia da aquisição do veículo (ou, não apurado, do registo da propriedade). Por sua vez, a R. entende que os juros de mora devem ser calculados a partir da citação da Ré para a presente ação, conforme dispõe o artigo 805.º, n.º 3, do CC, e não a partir da data da instauração da ação (veículos adquiridos por compra e venda) ou da data do exercício do direito de compra (veículos adquiridos por locação financeira). Finalmente, a R. pugna que os juros de mora vencidos em momento anterior aos cinco anos que antecederam a citação da R., por força do artigo 310.º, al. d), do CC, encontram-se prescritos; A decisão em crise, a respeito dos juros de mora, considerou serem devidos desde o momento em que a A. despendeu o custo adicional gerado pela infração. Porém, em face da insuficiência dos factos apurados, considerou, para efeito dos veículos adquiridos através dos contratos de compra e venda, a data de instauração da petição inicial (31 de março de 2020); “pois os factos relativos ao cumprimento dos contratos, no sentido de a A. ter pago o preço, foram apurados por referência ao momento da sua alegação.”(destaques são nossos) Relativamente aos veículos adquiridos através do contrato de locação financeira, considerou a data de exercício da opção de compra, por a mesma pressupor o pagamento da totalidade das quantias acordadas (7 de janeiro de 2015). Vejamos. O Tribunal a quo, na defesa da posição, invoca o “Guia para quantificação de danos” da Comissão Europeia, designadamente ao ponto 20, donde resulta que a “concessão de juros constitui uma componente essencial da indemnização. Como salientado pelo Tribunal de Justiça, a plena reparação dos danos sofridos deve incluir a reparação das consequências desfavoráveis resultantes do lapso de tempo decorrido desde a produção dos danos causados pela infração. Estes efeitos consistem numa desvalorização monetária e na oportunidade perdida para a parte lesada de dispor desse capital”, bem como jurisprudência comunitária. Mais faz referência à Diretiva 2014/104/EU e à transposição operada por força da Lei n.º 23/2018, reportada ao artigo 4.º, concluindo, e bem, que tratando-se de uma norma de natureza substantiva, conforme decorre do artigo 24.º, n.º 1, que estabelece o âmbito de aplicação temporal do referido diploma, concluindo pela sua não aplicação. Tendo concluído pela aplicação do artigo 566.º, n.º 2, do CC, considerando que este acautela “o pagamento de juros enquanto parte integrante da indemnização, como forma de compensação do tempo e nessa medida, desde a produção dos danos.” Porém, a respeito desta matéria, este Tribunal (RL), no âmbito do citado processo 54/19, tomou posição, referindo que: “… independentemente do nomen iuris que se dê aos juros e da sua qualificação como compensatórios ou moratórios (ou como um dano emergente ou lucro cessante), o que é certo é que apenas sendo devidos desde a data do facto ilícito (quando o dano coincide com este no tempo), é que se obtém a reparação efetiva do lesado e, assim, a concordância entre o direito nacional e o Direito da União. Concluímos, pois, que quanto à data a partir do qual se devem contar os juros de mora, em concreto, a data da ocorrência do dano, o tribunal a quo fez uma correta interpretação dos normativos nacionais, lidos à luz do Direito da UE.”(destaques são nossos) Aliás, na defesa da posição adotada, que coincidiu, relativamente ao início da contagem do prazo, com a decisão objeto do recurso, foi consignado que: “A argumentação da sentença recorrida pode ser sintetizada da seguinte forma: a) O acervo comunitário, inclusive resultante da jurisprudência do TJUE, sustenta que o pagamento de juros é uma componente essencial da reparação para compensar os danos sofridos, tendo em conta o decorrer do tempo, e deverá ser devido desde o momento em que ocorreu o dano até ao momento do pagamento da reparação, sem prejuízo da sua qualificação como juros compensatórios ou juros de mora no âmbito do direito nacional; b) Esta posição, que resultava já do acervo comunitário, encontra-se agora positivada no artigo 3.º, da Diretiva, lido à luz do respetivo considerando 12; c) Ao nível do direito interno, são aqui aplicáveis os artigos 483.º, 566.º, n.º 2, 805.º e 806.º, do Código Civil, segundo os quais, prima facie, os juros seriam computados a partir da citação, porquanto se trata de responsabilidade civil extracontratual e de um crédito ilíquido (v. artigos 805.º, n.º 3, 806.º, n.º 1, do Código Civil); d) Contudo, tais normativos devem ser interpretados à luz do dito acervo comunitário, desde logo porque se os juros aplicados se reportarem apenas à data da citação da Ré, o princípio da efetividade sairia beliscado, pois não tem em conta a remuneração da oportunidade perdida para a parte lesada de dispor do capital, apurado desde a data em que ocorreu o dano, até ao momento do pagamento da reparação, não sendo o lesado compensado pela perda da oportunidade do capital à disposição. e) Nesta senda, considera-se que os infratores das normas dos artigos 101.º e 102.º do TFUE entram em mora no pagamento dos juros, a partir do facto danoso, pois a falta de liquidez acaba por provir de culpa dos próprios, na medida em que, sabendo da infração e estando mais próximos do mercado que os lesados, têm a obrigação de saber o valor do sobrecusto dos produtos afetados pela infração. f) Nestes termos, em harmonia com o princípio da interpretação conforme, a situação subsume-se antes à previsão do artigo 805.º, n.º 2, al. b) e n.º 3, primeira parte, do Código Civil, porquanto a iliquidez do crédito é imputável aos infratores. A argumentação ora exposta encontra efetivo sustento no Direito da UE. O Ac. TJUE de 2 de agosto de 1993, caso C-271/91 (M. H. Marshall, ECLI:EU:C:1993:335), esclareceu que perante uma violação do Direito da UE (em tal caso do princípio da igualdade de tratamento entre homens e mulheres), uma indemnização, devendo proceder à reparação integral do prejuízo, não poderia ignorar, em sede de juros, elementos “como o decurso do tempo, que são suscetíveis de reduzir, de facto, o seu montante” (parágrafo 35). Os efeitos nefastos do tempo, consistem, mais concretamente, numa desvalorização monetária (cf. Ac. TJUE de 3 de Fevereiro de 1994, C-308/87 Grifoni II, ECLI:EU:C:1994:38, parágrafo 40) e na oportunidade perdida para a parte lesada de dispor desse capital (Parecer do Advogado-Geral Saggio nos processos apensos C-104/89 e C-37/90, Mulder e outros/Conselho e Comissão, Coletânea 2000, p. I-203, parágrafo 105, citado no Guia Prático, p. 13, nota 20). Tal posição no sentido de que os juros deveriam contar-se, portanto, a partir da data da ocorrência do dano, foi ulteriormente reiterada, no âmbito do Direito da Concorrência, no Acórdão de 13 de julho de 2006, nos casos conexos C‑295/04 a C‑298/04 (Manfredi e o., EU:C:2006:461, parágrafos 95 e 97). Neste último acórdão do TJUE, parágrafo 97, afirmou-se que “[q]uanto ao pagamento de juros, o Tribunal de Justiça lembrou no n.º 31 do acórdão de 2 de Agosto de 1993, Marshall (C-271/91, Colect., p. I-4367), que a sua atribuição, nos termos das normas nacionais aplicáveis, deve ser considerada uma componente indispensável da indemnização”. Neste contexto, não surpreende que o considerando 12 da Diretiva ao mencionar o direito à reparação, refira que a Diretiva “reafirma o acervo comunitário”. Mais recorda aquele considerando que o “pagamento de juros é uma componente essencial da reparação para compensar os danos sofridos, tendo em conta o decorrer do tempo, e deverá ser devido desde o momento em que ocorreu o dano até ao momento do pagamento da reparação, sem prejuízo da sua qualificação como juros compensatórios ou juros de mora no âmbito do direito nacional e da questão de saber se o decorrer do tempo é tido em conta como uma categoria separada (juros) ou como uma parte constitutiva dos danos emergentes ou dos lucros cessantes. Cabe aos Estados-Membros estabelecer as regras a aplicar para o efeito”.(destaques são nossos) Dito isto, adaptando aos factos objeto dos presentes autos, consideramos que são devidos juros de mora, relativamente aos veículos adquiridos através dos contratos de compra e venda, desde a data do respetivo pagamento, que, na falta da respetiva data, se deve reportar ao dia do respetivo contrato. Efetivamente, “o efeito translativo da propriedade no contrato de compra e venda opera mediante o acordo de vontades dos outorgantes, por mero efeito do contrato, sem prejuízo da observância da forma legal que no caso couber, exceto se tiver sido estipulada reserva de propriedade ou qualquer condição suspensiva” (Ac TRL, de 3 de março de 2018, proc. n.º 1896/15.7T8SXL.L1-7, in www.dgsi.pt); o contrato de compra e venda de veículos automóveis encontra-se submetido ao princípio da liberdade de forma ou da consensualidade, pelo que pode ser celebrado verbalmente ou por escrito; no primeiro caso fica concluído mal se forme o mútuo consenso entre o vendedor e o comprador e no segundo quando assinado por estes o respetivo contrato. Por sua vez, o registo não tem natureza constitutiva dos direitos que a ele se encontram sujeitos, constituindo mera presunção ilidível, de que o direito registado existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define. Acresce que “a reserva de propriedade é uma figura atípica, de natureza mista, com elementos obrigacionais e reais, a qual, apesar da designação de “propriedade”, não confere ao titular o poder de uso, fruição ou disposição de um verdadeiro proprietário, visando antes assegurar ao vendedor o pagamento do preço” (cfr. Ac STJ, de 30 de setembro de 2014, proferido no âmbito do proc. n.º 844/09.8TVLSB.L1.S1, in www.dgsi.pt). Finalmente, que é prática corrente que para aquisição de bens móveis sujeitos a registo, quando o comprador não dispõe ou não pretende efetuar logo o pagamento integral do preço, fique inscrito no registo a reserva de propriedade a favor do vendedor ou do financiador. Dito isto, temos para nós que os juros são, pois, devidos desde a data em que foi celebrado o contrato de compra e venda e, quando este não está apurado, desde a data limite conhecida para o efeito (cfr., por exemplo, o facto provado j). Por sua vez, relativamente aos veículos adquiridos através do contrato de locação financeira, tal como decidido pelo Tribunal a quo, os juros de mora são devidos desde a data de exercício da opção de compra, por pressupor o pagamento da totalidade das quantias acordadas (7 de janeiro de 2015). Em todo o caso, a taxa de juro a considerar é a legalmente prevista para os juros civis, conforme dispõe o artigo 559.º, n.º 1, do CC. * Prescrição. A R. pugna estarem prescritos todos os juros vencidos em momento anterior aos cinco anos que antecederam a sua citação, à luz do artigo 310.º, alínea d), do CC. A A., por sua vez, defende que o artigo 310.º, alínea d), do CC não pode ser aplicável no presente caso, pelo que não se mostram prescritos os juros de mora vencidos até 5 anos antes da data da propositura da presente ação. A decisão em crise, reportada à citada norma nacional, considera que a sua aplicação ao caso em análise é “ostensivamente contrária ao princípio da efetividade, pois, conforme referido, os juros consubstanciam, de acordo com a jurisprudência do TJ, uma componente indispensável da indemnização.” Não obstante, considera que da conjugação dos artigos 566.º, n.º 2, 498.º, n.º 1, 562.º e 566.º, n.º 2, todos do CC, se obtém o desiderato imposto pelo TJ, e, em consequência, julga improcedente a exceção. Cumpre decidir. Entendemos, pois, que por força do princípio da efetividade, da interpretação conforme e do desiderato do direito comunitário, sobejamente referido supra, impõe-se afastar o regime do referido artigo 310.º do CC. Aliás, a não ser assim, estaríamos a limitar um direito reconhecido, ao abrigo daqueles princípios, aplicados em função da salvaguarda dos artigos 101.º e 102.º do TFUE, sem, contudo, haver justificação para tal distinção. Dito de outra forma, tendo sido reconhecido o direito a uma indemnização (direito maior) mediante recurso a normas comunitárias e a normas nacionais interpretadas de forma a alcançar os fins do direito comunitário, não fazia sentido limitá-lo, na sua vertente de juros (direito menor), com base em normas nacionais, sem serem estas, também, devidamente adaptada àquele direito, sob pena de se frustrar os objetivos do Direito da União. Finalmente, na defesa desta solução, tal como referido no Ac 54/19, julgamos que também importa referir que a circunstância de não ser imputável ao A., enquanto credor, o atraso da exigência dos créditos em análise, “tornando excessivamente pesada a prestação a cargo do devedor – vide Manuel de Andrade, in Teoria Geral, II, pág. 452), prosseguindo essa ratio nesta sede não faz qualquer sentido, pois falamos de condutas cartelizadas, normalmente com caráter secreto, em que o retardamento na propositura da ação absorve aquele caráter secreto da conduta ilícita e não é imputável aos credores, mas sim aos devedores”. Assim, também nesta parte, não se concede provimento ao recurso da R. * Inconstitucionalidade(s). A R. pugna que a sentença recorrida procede a uma interpretação normativa dos artigos 3.º, n.º 1, e 9.º, n.º 1, ambos da Lei n.º 23/2018, de 5 de junho, conjugada a primeira com o artigo 483.º do CC, inconstitucional (por violar os princípios do Estado de Direito – artigo 2.º da CRP – da proporcionalidade – artigo 18.º da CRP – da igualdade – artigo 13.º da CRP – e da igualdade de armas – artigo 20.º da CRP -. A A., a este respeito, refere que o Tribunal a quo não violou as referidas normas, porquanto a interpretação que fez das mesmas é uma interpretação conforme à CRP. Quid juris. Este Tribunal, no âmbito do citado Ac. 54/19, a respeito das mesmas questões, decidiu que: “Não se vislumbra que a sentença recorrida (ou o presente acórdão) tenha aplicado diretamente os específicos normativos invocados pela Recorrente e muito menos que os tenha aplicado numa interpretação que deva ser considerada inconstitucional. Mas independentemente da aplicação ou não dos normativos invocados pela Recorrente (artigos 3.º, n.º 1 e 9.º, n.º 1 da Lei n.º 23/2018), o certo é que não vemos como se violou o princípio do Estado de Direito, consagrado no artigo 2.º da Constituição, através de presunções judiciais aplicadas em sede de prova do dano e nexo causal. No âmbito dos factos provados 30 e 31, relativos ao dano e nexo causal, não foi realizada qualquer “presunção de danos em abstrato” (artigo 1628 das alegações de recurso), atentou-se, sim, quer em primeira instância, quer nesta segunda, nas características concretas e específicas da infração em causa. Nem tal presunção judicial foi concebida como inilidível, conforme alega a Recorrente. Simplesmente, perante as características concretas e específicas do cartel em questão, no contexto das probabilidades sérias da efetiva afetação do mercado, recordando-se que, segundo estudos de reconhecida idoneidade, somente 7% dos cartéis não acarretavam subidas de preços, a prova da hipótese contrária apresentava-se como sendo complexa e difícil. Não se deixou, no entanto, de analisar em detalhe, a contraprova produzida neste âmbito (em especial o estudo Oxera 2019 e os relatórios técnicos da autoria principal do Senhor Professor Doutor AA), revelando-se, deste modo, de forma manifesta, que não estávamos, nem nunca poderíamos estar, perante uma presunção inilidível. Também é manifesto que, em substância, não foram violados os princípios da proporcionalidade, da igualdade, inclusive, na vertente de igualdade de armas, pois respeitou-se, de forma rigorosa as regras de direito probatório material, inclusive, as regras relativas ao ónus da prova. Em sede probatória é desde logo de sublinhar, que os relatórios técnicos apresentados pelas partes e depoimentos dos respetivos autores, foram analisados com igual rigor. Aliás, nesta sede de recurso, chegou-se à conclusão que quer a conclusão sobre um sobrecusto de 15,4% sustentada pelo Senhor Professor Doutor EE, quer a inexistência de sobrecusto sustentada pelo Senhor Doutor AA, não poderiam ser aceites por este tribunal. Quanto ao princípio da proporcionalidade na sua vertente de proibição de excesso (princípio da necessidade) e o alegado “princípio da razoabilidade” (artigo 1642 e ss., das alegações de recurso), também não se vislumbra como podem ter sido violados nestes autos e muito menos em sede deste recurso de apelação. Neste âmbito, perante a quase impossibilidade ou excessiva dificuldade na quantificação precisa do dano, optou-se por realizar-se a estimativa judicial prevista no artigo 17.º, n.º 1, da Diretiva e artigo 9.º, n.º 2 da Lei 23/2018, de forma a que o quantum correspondesse a um montante razoável e prudente, situando-se muito aquém dos 15,4% pedidos pela Autora.”(destaques nossos) A argumentação explanada, à qual aderimos, aplica-se mutuatis mutandis ao caso sub judice. Acresce referir, por reporte aos princípios do primado e da interpretação conforme ao Direito da EU, que não se vislumbra terem sido desrespeitados no âmbito do percurso interpretativo levado a cabo pelo Tribunal a quo e secundado por este Tribunal ad quem. Aliás, salvo o devido respeito, a defesa desses princípios mostra-se consignada e fundamentada naquele percurso interpretativo, com recurso aos diversos princípios interpretativos e reportados a jurisprudência comunitária. Finalmente, importa deixar claro que, estando em causa o apuramento da responsabilidade civil decorrente da violação de regras comunitárias de concorrência, não se vislumbra de que forma o recurso ao primado do Direito da União Europeia viole seja normas/ princípios comunitários e/ ou de direito constitucional nacional, nomeadamente os estabelecidos no artigo 8.º, n.º 4, da CRP, ou que a fundamentação adiantada seja desproporcional e não respeite o direito constitucional nacional e o da União Europeia. Pelo contrário, julgamos, antes, que a decisão em crise procurou e logrou respeitar os referidos ordenamentos, sendo evidente a procura de compatibilizar as normas nacionais com as da EU, respeitando, naturalmente, a CRP e o valor dos tratados da EU. * Cálculo da indemnização e respetivos juros. Resulta da matéria de facto que a Autora teve de pagar pelos camiões que adquiriu um valor superior ao que lhe seria exigido caso não tivesse ocorrido a infração, valor esse que, porque não resultou apurado o valor concreto do sobrecusto pago pela Autora, se estimou, ao abrigo do artigo 9.º, n.º 2, da Lei n.º 23/2018, em 5% do preço de venda. Por sua vez, relativamente às viaturas com as matrículas identificadas nas alíneas i) a kk) dos factos provados, considerando que não se mostra apurado o respetivo valor da compra, tal como decidido pelo Tribunal a quo, aquela percentagem decorrente do custo adicional que a A. pagou pelas viaturas, terá em consideração o valor que se vier a apurar em sede de liquidação, sendo no máximo até aos montantes de sobrecusto invocados pela Autora, acrescido dos juros de mora vencidos, desde a data de celebração do respetivo contrato de compra e venda que, face à factualidade apurada, se reporta à data indicada como tendo sido o limite temporal em que tal aconteceu (ex. “…mas não posterior a 16.07.1997”), até efetivo e integral pagamento, à taxa legal aplicável aos juros civis. No que diz respeito às demais viaturas, adquiridas por contrato de compra e venda, ou seja as identificadas nas alíneas ll) a jjjjj) dos factos provados, o valor estimado de 5% sobre o valor das compras, tal como apurado pelo Tribunal a quo, corresponde a Euros 278.385,00, acrescido de juros de mora, vencidos desde as datas em que foram celebrados os respetivos contratos de compra e venda e vincendos até efetivo e integral pagamento, à taxa legal aplicável aos juros civis. Relativamente às viaturas adquiridas por contrato de locação financeira, ou seja as identificadas na alínea kkkkk) dos factos provados, o valor estimado de 5% sobre o valor das compras, tal como apurado pelo Tribunal a quo, corresponde a Euros 35.500,00, acrescido de juros de mora, vencidos desde 7 de janeiro de 2015, que corresponde à data em que foi exercido o direito de opção de compra das viaturas através do pagamento do valor residual, até efetivo e integral pagamento, à taxa legal aplicável aos juros civis. A citação da Recorrente ocorreu em 27 de abril de 2020, data a partir da qual serão devidos juros de mora vincendos até integral pagamento da indemnização. Há, assim, que reformular o cálculo da indemnização devida nos termos fixados. * Pelo exposto, indeferimos o recurso apresentado pela R. e deferimos, parcialmente, o recurso apresentado pela A. * V - Decisão Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pela A. e improcedente o recurso interposto pela R., revogando parcialmente a sentença recorrida e decidindo em sua substituição: a) Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de que se vier a liquidar correspondente ao custo adicional que esta pagou pelas viaturas com as matrículas identificadas nas alíneas i) a kk) dos factos provados, correspondente a 5% do preço de aquisição dessas viaturas que se vier a apurar e no máximo até aos montantes de sobrecusto invocados pela Autora, acrescida dos juros de mora vencidos desde a data de celebração do respetivo contrato de compra e venda que, face à factualidade apurada, se reporta à data indicada como tendo sido o limite temporal em que tal aconteceu (ex. “…mas não posterior a 16.07.1997”), até efetivo e integral pagamento, à taxa legal aplicável aos juros civis; b) Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de Euros 278.385,00 (duzentos e setenta e oito mil e trezentos e oitenta e cinco), acrescida de juros de mora, vencidos desde as datas em que foram celebrados os respetivos contratos de compra e venda (identificados nas alíneas ll) a jjjjj) dos factos provados) e vincendos até efetivo e integral pagamento, à taxa legal aplicável aos juros civis; c) Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de Euros 35.500,00 (trinta e cinco mil e quinhentos), acrescida de juros de mora, vencidos desde 7 de janeiro de 2015, que corresponde à data em que foi exercido o direito de opção de compra das viaturas através do pagamento do valor residual, até efetivo e integral pagamento, à taxa legal aplicável aos juros civis; d) Absolver a Ré de tudo o mais peticionado. Custas pelas Recorrentes, na proporção dos respetivos decaimentos, que se fixam em 30% da A. e 70% da R. (artigo 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC). * Lisboa, 27 de novembro de 2024 Bernardino Tavares Alexandre Au-Yong Oliveira Eleonora Viegas _______________________________________________________ [1] Cfr. n.º 14 dos Acórdãos Peterbroeck, C-312/93. [2] Cfr. tabela da p. 104 da Sentença Recorrida. [3]Disponível em https://europa.eu/rapid/press-release_IP-14-2002_en.htm. [4] Cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa em 23.09.2021, no âmbito do processo n.º 6/19.6YQSTR-C.L1-PICRS, disponível em www.dgsi.pt. [5] Cfr. Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em 07.07.2022, no âmbito do processo n.º 2/19.3YQSTR-G.L1.S1, disponível em www.dgsi.pt. [6] Cfr. § 112 da Sentença Recorrida. [7] Cfr. § 228 da Sentença Recorrida. [8] Cfr. §§ 465 e 494 e ponto I. do § 499 da Sentença Recorrida. [9] Cfr. §65, Processo C-312/21, Tráficos Manuel Ferrer, ECLI:EU:C:2023:99. [10] Tal recurso de revista já foi admitido e encontra-se, na presente data, pendente na 7ª secção do STJ (processo n.º 54/19.6YQSTR.L1.S1). [11] Cfr. §§ 465 e 494 e ponto I. do § 499 da Sentença Recorrida. [12] Cfr. Ponto I. do § 499 da Sentença Recorrida. [13] Cfr. § 493 da Sentença Recorrida. |