Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
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| Relator: | JOÃO ABRUNHOSA | ||
| Descritores: | PROCESSO PENAL DEPOIMENTO DE PARTE PESSOA COLECTIVA DANOS NÃO PATRIMONIAIS ASSOCIAÇÃO SINDICAL SINDICATO | ||
| Nº do Documento: | RL | ||
| Data do Acordão: | 11/22/2012 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
| Sumário: | I - A condenação do arguido por uma qualificação diferente dos factos constantes da acusação ou da pronúncia, sem o cumprimento do disposto no art.º 358º/1 do CPP, não integra a nulidade prevista no art.º 379º/1-b) do CPP. II - Em processo penal não têm aplicação as regras relativas ao depoimento de parte em processo civil, quando se tomam declarações ao assistente ou às partes civis. III - A honra das pessoas colectivas merece tutela civilística por danos não patrimoniais. | ||
| Decisão Texto Parcial: | |||
| Decisão Texto Integral: | Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: No 5º Juízo Criminal de Lisboa, por sentença de 07/05/2012, constante de fls. 894 a 918, foi o Arg. Arguido/a/s. E…, com os restantes sinais dos autos (cf. TIR Termo/s de Identidade e Residência. de fls. 289 Prestado em 03/03/2011.) condenado pela seguinte forma: “Pelo exposto, julga-se a pronúncia procedente por provada, e, em consequência, decide-se: a) condenar E… pela prática, como autor material, de dois crimes de ofensa a pessoa colectiva, p. e p. pelos art. s 187º, nº1 e 183º, nº1, a) e b), e nº2 do C. Penal, respectiva e relativamente a cada um dos crimes, na pena de 200 dias de multa, com o quantitativo diário de 20€, e, em cúmulo jurídico, na pena de 300 dias de multa, á taxa diária de 20€, no montante de 6.000€; b) fixar, subsidiariamente, 200 dias de prisão (art. 49º, nº1 do C. Penal); c) condenar o Arguido/demandado E… no pagamento ao Assistente/demandante Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, da quantia de 50.000€, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal que se vencerem desde a data da presente decisão e até integral pagamento; d) condenar o Arguido/demandado E… no pagamento à Assistente/demandante Associação Sindical dos Juízes Portugueses, da quantia de 50.000€, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal que se vencerem desde a data da presente decisão e até integral pagamento; e) condenar o arguido na taxa de justiça que se fixa em duas UC, e nas legais custas; f) condenar o demandado nas custas dos pedidos cíveis, em face do seu decaimento; …”. * Não se conformando, o Arg. interpôs recurso da referida decisão, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 925 a 1008, com as seguintes conclusões: “…CONCLUSÃO I: APENAS PODE SER OUVIDO NA QUALIDADE DE LEGAL REPRESENTANTE DE CADA UM DOS ASSISTENTES, UM REPRESENTANTE, POR NOS SEUS ESTATUTOS NÃO ESTAR ESTIPULADA UMA REPRESENTAÇÃO COLETIVA; CONCLUSÃO II: AS TESTEMUNHAS J…, R…, E O…, OUVIDAS SOBRE MATÉRIA CÍVEL, FAZEM PARTE DOS CORPOS SOCIAIS DOS ASSISTENTES, PELO QUE, NEM ELAS, NEM OS LEGAIS REPRESENTANTES, PODERÃO SER OUVIDOS SOBRE MATÉRIA FAVORÁVEL AOS ASSISTENTES, UMA VEZ QUE AO SEU DEPOIMENTO SÃO APLICÁVEIS AS REGRAS DA PROVA POR CONFISSÃO; CONCLUSÃO III: TENDO SIDO OUVIDOS DIVERSOS LEGAIS REPRESENTANTES DE CADA UM DOS ASSISTENTES, FOI PRODUZIDA PROVA QUE A LEI NÃO PERMITE; TENDO SIDO OUVIDOS COMO TESTEMUNHAS, MEMBROS DOS CORPOS SOCIAIS DOS ASSISTENTES, OS QUAIS DEPUSERAM SOBRE MATÉRIA CÍVEL FAVORÁVEL AOS ASSISTENTES, FOI PRODUZIDA EM JULGAMENTO PROVA QUE A LEI NÃO PERMITE; PELO QUE DEVE O JULGAMENTO SER ANULADO E REPETIDO, · TUDO EM VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 25.º DOS ESTATUTOS DA ASJP; 19.º, N.º 1, DOS ESTATUTOS DO SMMP; 163.º, E 353.º, DO CÓDIGO CIVIL; 4.º do CÓDIGO DE PROCESSO PENAL; 553.º, n.º 2, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL; E 13.º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA. E caso não colham as conclusões que se seguem, sobre a questão da legitimidade dos Assistentes, sempre se concluirá, ainda, o seguinte: CONCLUSÃO IV: VERIFICA-SE NOS AUTOS A CONFUSÃO ENTRE MAGISTRADOS JUDICIAIS E DO MINISTÉRIO PÚBLICO, QUE, EVENTUALMENTE, SE ACHEM ASSOCIADOS NOS ASSISTENTES E OS PRÓPRIOS ASSISTENTES; CONCLUSÃO V: PESSOAS COLETIVAS COM FUNÇÕES SINDICAIS E MAGISTRADOS JUDICIAIS OU DO MINISTÉRIO PÚBLICO NELAS ASSOCIADOS, NÃO SÃO CONFUNDÍVEIS, CONCLUSÃO VI: AS PRIMEIRAS NÃO EXERCERAM FUNÇÕES CONSTITUCIONALMENTE PROTEGIDAS COMO ÓRGÃO DE PODER DO ESTADO E OS SEGUNDOS NÃO SE QUEIXARAM DAS PALAVRAS PROFERIDAS PELO RECORRENTE, COMO RESULTA DOS AUTOS E DA NATUREZA PARTICULAR DOS CRIMES WM CAUSA; CONCLUSÃO VII: OS ASSISTENTES SÃO PARTES ILEGÍTIMAS, NÃO DISPONDO DE PODERES SUFICIENTES PARA AGIR NOS AUTOS, TENDO EM CONTA A FALTA DE DELIBERAÇÃO EM ASSEMBLEIA GERAL DE CADA UMA DAS ASSOCIAÇÕES, QUE APONTASSE PARA TANTO E/OU AUTORIZASSE TAL ATIVIDADE, LEGITIMANDO-A E TENDO EM CONTA A FALTA DE INICIATIVA DOS SEUS ASSOCIADOS, NO SENTIDO DE ESTAS ASSOCIAÇÕES OS PATROCINAREM, REPRESENTANDO-OS, NO PRESENTE PROCESSO; CONCLUSÃO VIII: A VERIFICAÇÃO DA LEGITIMIDADE JÁ OCORRIDA, AQUANDO DOS PEDIDOS DE CONSTITUIÇÃO DE ASSISTENTE, NÃO FAZ CASO JULGADO; CONCLUSÃO IX: A VERIFICAÇÃO DA FALTA DE LEGITIMIDADE DOS ASSISTENTES, LEVARÁ NECESSARIAMENTE AO ARQUIVAMENTO DOS AUTOS; · DO CONTRÁRIO AO SENTIDO DAS CONCLUSÕES IV. A IX. SUPRA, RESULTA A VIOLAÇÃO, POR ERRÓNEA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO AOS FACTOS, DO QUE DISPÕEM OS ARTIGOS 2.º, 3.º, N.º 1, ALINEA B), 15.º, N.º 1, ALINEA B), 25.º, N.º 2, ALINEA A), DOS ESTATUTOS DA ASJP; 6.º, N.º 1, 19.º, N.º 1, DOS ESTATUTOS DO SMMP; 172.º, N.º 1, DO CÓDIGO CIVIL; E 49.º, N.º 3, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CONCLUSÃO X: OS ASSISTENTES NÃO GOZAM DE MATERIALIDADE SUFICIENTE PARA SE SENTAREM EM CADEIRAS DE CAFÉS OU FOTOCOPIAREM, POR ELES, DOCUMENTOS QUE ANTERIORMENTE EXTRAIRAM, PELAS SUAS PRÓPRIAS MÃOS E ÀS ESCONDIDAS, DE PROCESSOS, POR TAL LHES SER FISICAMENTE IMPOSSÍVEL, O QUE RETIRA ÀS FRASES EM APRECIAÇÃO, PROFERIDAS PELO RECORRENTE, TODA A IDONEIDADE PARA LESAREM O BOM NOME DAQUELES ASSISTENTES, E ANULAM TODA A POSSIBILIDADE DE PREENCHIMENTO DO ELEMENTO OBJETIVO DO TIPO PREVISTO NO ARTIGO 187.º, DO CÓDIGO PENAL; CONCLUSÃO XI: OS COMPORTAMENTOS QUE PODEM RETIRAR-SE DA FRASE EM APRECIAÇÃO, SÃO APENAS EXECUTÁVEIS POR MÃOS HUMANAS, ISTO É, SE EXECUTADOS, SERIAM REFERIDOS AOS MAGISTRADOS QUE SE ENCONTRARIAM À FRENTE DESTAS ASSOCIAÇÕES, OS QUAIS NÃO SE QUEIXARAM. CONCLUSÕES XII: AS DECLARAÇÕES DO RECORRENTE DEVEM SER COMPREENDIDAS À LUZ DAS CIRCUNSTÂNCIAS HISTÓRICAS, SOCIAIS E CULTURAIS, ANTERIORES AO MOMENTO EM QUE DECORREU A REFERIDA COMISSÃO DE ÉTICA E À LUZ DAS QUE LHE ERAM CONTEMPORÂNEAS E NÃO ULTRAPASSAM O DIREITO AO EXERCÍCIO DE MERA OPINIÃO E CRÍTICA, NÃO SE ENCONTRANDO VERIFICADAS NOS AUTOS QUAISQUER RESTRIÇÕES LEGAIS AO REGIME DE EXERCÍCIO DA LIBERDADE DE PENSAMENTO, EXPRESSÃO, OPINIÃO E CRÍTICA, RESPETIVAMENTE CONSAGRADAS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA E NA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM; · DO CONTRÁRIO AO SENTIDO DAS CONCLUSÕES X. A XIII. SUPRA, RESULTA A VIOLAÇÃO, POR ERRÓNEA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO AOS FACTOS, DO QUE DISPÕEM OS ARTIGOS 187.º, DO CÓDIGO PENAL; 37.º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA; E 10.º, DA CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM. CONCLUSÃO XIII: · OS FACTOS CONSTANTES DAS ALÍNEAS T, W, X, Y, CC, DD, KK A WW, DOS FACTOS JULGADOS COMO PROVADOS NA SENTENÇA RECORRIDA, DEVEM SER CONSIDERADOS NÃO PROVADOS, DETERMINANDO-SE QUE OS ASSISTENTES NÃO LOGRARAM PROVAR QUALQUER DANO RELEVANTE OU SEQUER, IRRELEVANTE, PARA A CREDIBILIDADE, BOM NOME E CONFIANÇA QUE LHES SÃO, EM TEORIA, DEVIDAS. · ALÉM DISSO, EXISTE CONTRADIÇÃO PATENTE ENTRES OS FACTOS PROVADOS NA ALÍNEA U) E CC), PELO QUE DEVERÁ SER JULGADA NÃO PROVADA A MATÉRIA DA ALÍNEA U). · A MATÉRIA DADA COMO PROVADA NAS ALÍNEAS R) E S) DA SENTENÇA, EXTRAVASAM O OBJETO DO PROCESSO, DEVENDO SER CONSIDERADA A SUA MATÉRIA NÃO ESCRITA. CONCLUSÃO XIV: AS ALÍNEAS T), W), X), Y), GG) A KK) E SS) DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA, CONTÊM ASSERÇÕES E CONCLUSÕES DE DIREITO, QUE NÃO DEVEM CONSTAR DESSA MATÉRIA, DESTINADA APENAS A APURAR OS FACTOS QUE RESULTARAM PROVADOS EM JULGAMENTO. CONCLUSÃO XV: INEXISTEM PROVADOS NOS AUTOS QUAISQUER DANOS PROVOCADAS AOS ASSISTENTES, NÃO TENDO, TAMBÉM E POR ISSO, FICADO PROVADO QUE AS FRASES EM ANÁLISE FOSSEM IDÓNEAS PARA OS PROVOCAR, O QUE IMPLICA, ALÉM DA ABSOLVIÇÃO NOS MONTANTES CÍVEIS PETICIONADOS, CONCLUSÃO XVI: A NÃO VERIFICAÇÃO DO ELEMENTO OBJETIVO DO TIPO. CONCLUSÃO XVII: DEVEM OS MONTANTES INDEMNIZATÓRIOS, SER REDUZIDOS, CASO HAJA CONDENAÇÃO CRIMINAL, POR VIA DA VERIFICAÇÃO DO ELEMENTO OBJETIVO DO TIPO, PARA VALORES MERAMENTE SIMBÓLICOS, ASSIM TAMBÉM SE INTERPRETANDO E APLICANDO CORRETAMENTE O QUE DISPÕE O ARTIGO 496 NºS. 1 E 3 DO CC. POR TODO O EXPOSTO, O presente recurso deve ser julgado integralmente procedente e, em consequência, ser proferido Acórdão que: · REVOGUE A SENTENÇA PROFERIDA E A SUBSTITUA POR OUTRA QUE o CONSIDERE ILEGÍTIMAS AS PARTES ATIVAS NO PRESENTE PROCESSO, PROCEDENDO AO SEU ARQUIVAMENTO; Se assim não se entender, o CONSIDERE NULA A PROVA PRODUZIDA COM SUPORTE QUER NAS DECLARAÇÕES, QUER NOS DEPOIMENTOS DAS PESSOAS DOS REPRESENTANTES LEGAIS DOS ASSISTENTES, ORDENANDO DAÍ EXTRAINDO AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS; o DÊ COMO NÃO VERIFICADOS OS ELEMENTOS OBJETIVO E SUBLETIVO DO TIPO E, EM CONSEQUÊNCIA, ABSOLVENDO O RECORRENTE DOS CRIMES DE QUE VEM CONDENADO; Caso assim se não entenda, o FAÇA INTERPRETAÇAÕ E APLICAÇÃO DO ARTIGO 37 DA CRP, CONFORME AO ARTIGO 10º. DA CEDH, COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS, o DETERMINE A NÃO APLICAÇÃO DAS DUAS AGRAVANTES VERIFICADAS, o DÊ COMO NÃO PROVADOS OS DANOS APURADOS NA SENTENÇA, ABSOLVENDO, EM CONSEQUÊNCIA, O RECORRENTE, DOS PEDIDOS CÍVEIS FORMULADOS; E caso considere apurados tais danos, o PROCEDA À REDUÇÃO DAS INDEMNIZAÇÕES COM BASE EM CRITÉRIOS DE EQUIDADE E JUSTIÇA, QUE A DECISÃO RECORRIDA NÃO CONTEMPLOU. Assim decidindo, farão Vs. Ex.ªs a costumada JUSTIÇA!!! ...”. * A Exm.ª Magistrada do MP Ministério Público. respondeu ao recurso nos termos de fls. 1015 a 1022, com as seguintes conclusões: “…1 - Determina o artº 68º nº 1 do CPP que “ Podem constituir-se assistentes no processo penal, além das pessoas e entidades a quem leis especiais conferirem esse direito: (……) al. b) As pessoas de cuja queixa ou acusação particular depender o procedimento.”; 2 – Ao Recorrente vinham imputados dois crimes atentatórios da credibilidade, honra e prestígio da Associação Sindical de Juízes Portugueses e do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, pelas expressões por si proferidas, visando estas entidades, na Comissão de Ética, Sociedade e Cultura da Assembleia da República, os quais revestem natureza particular, artº 188º nº 1 do CP ; 3 – Foi pois na esfera jurídica das referidas entidades que se fez sentir a lesão dos valores salvaguardados pela norma penal, donde, é a estas, através dos seus legais representantes, e nos termos das competências a eles atribuídas pelos respectivos Estatutos ( artº 19º nº 1, e 20º nº 1 do E. S. M. M. P., e 25º nº 1 e nº 2 al. a) do E. A. S. J. P. ), que cabe a legitimidade para se constituírem assistentes, e deduzirem acusação particular, artº 50º nº 1 do Código de Processo Penal. 4 – A capacidade para testemunhar é regulada no artº 131 do Código de Processo Penal, ocorrendo as excepções à previsão geral de tal capacidade no artº 133º do mesmo diploma, que consagra os seguintes impedimentos, a saber: - al. b) As pessoas que se tiverem constituído assistentes a partir do momento da constituição; - al. c) As partes civis. 5 – Apenas estão impedidos de depor na qualidade de testemunhas nos presentes autos os legais representantes das assistentes, nos termos do normativo já citado, sendo perfeitamente válidos os depoimentos como testemunhas das demais pessoas individuais que compõe os seus órgãos, mas não as representam; 6 – Não existe pois qualquer suporte legal para serem postos em crise os depoimentos das testemunhas magistrados do Ministério Público J…, R… e O…, porquanto não se enquadram nas excepções do artº 133º nº 1 als. b) e c) do Código de Processo Penal; 7 - Por tudo o que ficou exposto consideramos que a sentença, foi justa ao condenar o arguido, não tendo em nosso entender quaisquer contradições nos depoimentos das testemunhas que se mostrem relevantes. 8 - Por outro lado, nas alegações de recurso, compele-se o necessário grau de certeza para prova do facto em julgamento em detrimento do princípio “in dubio pro reo”, com a pretensão de utilização da regra indutiva de argumentação da inferência a favor da melhor explicação. 9 - Pelo que em nosso entender a Meritíssima Juiz julgou correctamente os factos, indicou e valorou correctamente toda a prova relevante produzida em audiência, e não proibida por lei, expondo de forma adequada os motivos da sua decisão, fazendo um exame crítico da prova, de forma clara, e explicando-se de forma inteligível a qualquer destinatário, concluindo de acordo com as regras da lógica e da experiência a fundamentação da sentença formulada. - Deve pois manter-se a sentença por justa e adequada. …” * Respondeu a Assistente ASJP “Associação Sindical do Juízes Portugueses”., nos termos de fls. 1023 a 1042, com as seguintes conclusões: “… i. Os representantes legais da Recorrida ASJP no presente processo: Presidente da ASJP à data do julgamento, A... , e o Secretário-Geral da ASJP à data do julgamento, M… , são legítimos representantes da referida Recorrida, nos termos e para os efeitos do artigo 25º dos Estatutos da ASJP, e dos artigos 163º e 353º, nº 1,do CC. ii. Quanto aos depoimentos alegadamente inválidos das testemunhas por reportarem-se a matéria cível favorável (conclusões II e III do recurso), nenhuma das testemunhas citadas foi indicada pela Recorrida ASJP, pelo que o juízo do mérito que venha a ser realizado sobre esta questão em nada afecta a posição processual específica da Recorrida ASJP. iii. A ASJP tem legitimidade própria e autónoma para se constituir como Recorrida no presente processo, uma vez que o objecto do mesmo insere-se claramente no âmbito dos seus princípios e objecto, respectivamente, artigos 2º e 3º dos Estatutos ASJP, assim como no âmbito dos direitos das Associações Sindicais em geral, previsto no artigo 310º, nº 2, da Lei nº 59/2008, de 11 de Setembro. iv. Existe plena correspondência entre o crime imputado (artigo 187º do CP) e respectivo agravamento (artigo 183º) e a factualidade subjacente dada como provada no presente processo, pelo que verificando-se, como se verificam, o elemento objectivo e subjectivo do crime imputado, foi o Recorrente e ora Recorrente justa e correctamente condenado “pela prática, como autor material, de dois crimes de ofensa a pessoa colectiva”. v. Em função da prova produzida em audiência de julgamento não merece censura ou qualquer modificação os factos dados como provados na sentença ora recorrida, com excepção do facto u) dado que as declarações foram produzidas na Comissão Parlamentar de Ética, Sociedade e Cultura da AR e não na Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias da AR. Sendo que, no entanto, este facto é meramente circunstancial ou acessório, pelo que é completamente irrelevante para alterar a decisão do tribunal a quo. vi. Contrariamente ao referido pelo Recorrente, não é verdade que o valor máximo judicialmente atribuído para indemnizações por danos morais seja de 25.000,00 € (cf, a título de exemplo, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 08.03.2007, processo 07B566 (disponível em www.dgsi.pt), no qual foi arbitrado o pagamento de 75.000 € ao lesado. vii. O valor do pedido cível atribuído pelo tribunal a quo, face i) à gravidade dos factos imputados; ii) à relevância institucional dos sujeitos a quem os mesmos foram imputados num Estado de Direito Democrático baseado na separação de poderes; iii) às fortíssimas e amplas repercussões e reacções que a imputação dos factos em questão suscitaram a nível nacional; iv) ao prestígio e honorabilidade que a Recorrida ASJP gozava junto da sociedade portuguesa em geral (cf. z), aa) e bb) dos factos dados como provados); v) e à condição económica do Recorrente, é um valor equilibrado e proporcional, pelo que deve ser mantido na íntegra pelo tribunal ad quem. Em suma, face a tudo o que ficou exposto, deve este tribunal superior manter in totum a decisão do tribunal ora Recorrido, com o que V. Exas. Farão JUSTIÇA! …”. * Respondeu a Assistente SMMP “Sindicato dos Magistrados do Ministério Público”, nos termos de fls. 1043 a 1046, nos seguintes termos: “…1. O recorrente impugna matéria de facto e de Direito e diz manter interesse num recurso interlocutório, já respondido. 2. Reportemo-nos às conclusões do recurso [pois são o que delimita o objecto do processo], aludindo também por dever de ofício ao local onde se encontram compendiadas na motivação [devido a erro na numeração que contamina a perceptibilidade das mesmas]: 3. Conclusões 1ª a 3ª [segundo a motivação, página 4]: (i) a questão da prova proibida que aqui se coloca, a ser verdadeira, implicaria invalidade processual que deveria ter sido arguida em tempo [quando da produção da prova respectiva, conforme o artigo 120º, n.º 3, a) do CPP] pelo que, ao não tê-lo sido, está sanada (ii) além de que o recorrente prevalece-se do direito que considera violado, ao citar como relevante precisamente a mesma prova [motivação páginas 56 a 68 quanto ao SMMP], o que implica convalidação, nos termos do artigo 121º, n.º 1, c) do CPP (iii) e independentemente disso, mesmo que houvesse lacuna de previsão [a integrar por força do artigo 4º do CPP] e o recorrente não o demonstra, sempre se trataria de prova permitida, pois que, ao contrário do que o recorrente sugere, o n.º 2 do artigo 553º do CPC não impede a audição de representantes de pessoas colectivas, mas apenas restringe o seu valor confessório, enquanto demandados [e aqui são demandantes!] à situação que ali enuncia, precisamente em execução do artigo 353º, n.º 1 do CCv. 4. Conclusões 4ª a 9ª [mencionadas nas páginas 15-16 da motivação]: inexiste a alegada confusão, pois (i) o assistente é uma pessoa colectiva sindical, que representa os associados e não a totalidade do corpo dos magistrados do MP, nem isso foi sequer suscitado (ii) além de que, nos poderes estatutários de representação conferidos à Direcção [precisamente o artigo 19º, n.º 1 do Estatutos] está prevista a representação ampla do Sindicato «em todos os actos e instâncias, em quaisquer tribunais ou repartições ou perante qualquer autoridade», pelo que nem se entende onde está a falta de legitimação (iii) sucedendo que das declarações citadas truncadamente [páginas 56 a 68] não se retira que à valoração pessoal feita da situação não tenha correspondido uma avaliação daquilo que a conduta imputada pelo arguido significou em termos dos valores prosseguidos pelo SMMP e da lesão assim produzida quanto aos mesmos [basta ouvir a integralidade dos depoimentos e não a parte recortada]. 5. Conclusões 10ª e 11ª [referidas na página 19 da motivação]: são asserções conclusivas falaciosas, porquanto o comportamento que se impute a uma pessoa colectiva tem de ser a decorrência de uma acção de pessoas físicas que a representem, sendo, aliás, extraordinário que quem imputou em público uma grave conduta a uma pessoa colectiva venha agora tentar demonstrar que essa entidade não tinha capacidade de agir no sentido que o autor da proeza afirmativa o afirmou! 6. Conclusão 12ª [referida na motivação, página 41]: as declarações em causa foram compreendidas nesse contexto todo, para o que contribuiu o próprio arguido com a sua defesa, convocando inclusivamente políticos e figuras notórias da sociedade como testemunhas. 7. Conclusão 13ª, agora segundo a motivação [assim numerada na página 47, mas mencionada a final como 12ª]: seguramente não se encontram essas restricções, nem se entende a conclusão que, contradiz, aliás, salvo errada percepção, o arrazoado que tenta resumir. 8. Conclusão 14ª segundo a motivação [página 72], numerada como 13ª, a final [página 82]: (i) a conclusão enferma de erro de Direito, por incumprimento do estatuído na alínea b) do n.º 3 do artigo 412º do CPP, porquanto omite em sede de conclusões «as provas que impõem decisão diversa da recorrida» (ii) alega [página 48] haver contradição «patente» na designação da Comissão Parlamentar em cuja sede o arguido falou, mas não demonstra a sua insanabilidade, contra o que exige o artigo 410º, n.º 2, alínea b) do CPP e é patente que se trata de lapso de escrita (iii) alega [página 50] que os factos dados como provados sob as alíneas r) e s) «extravasam o objecto do processo» mas não diz, em sede conclusiva, porque motivo o afirma, sendo que o factos [consciência da inverdade] se não é relevante como requisito típico essencial, é-o seguramente para graduar a culpa. Além disso, na motivação em relação ao que justificaria a não prova dos factos T, W, X, Y, CC, DD, KK a WW, releva considerar que o recorrente apenas valora a questão no que se reporta [palavras suas] aos «danos conhecidos na sentença» [página 50 em sede de motivação e página 82 das conclusões, concretamente conclusão 13ª] e não em sede de verificação dos elementos típicos do crime, pelo que a impugnação da matéria de facto é processualmente irrelevante porque sem objecto admissível. É que «a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos a organismo ou serviço que exerçam autoridade pública, pessoa colectiva, instituição ou corporação» são requisitos típicos essenciais do crime previsto e punido pelo artigo 187º do Código Penal, o qual integra o objecto destes autos. Ora o recorrente não coloca em crise esses factos nesta dimensão jurídico-penal, sim meramente jurídico-civil. 9. Conclusão 15ª da motivação [página 73], numerada a final como 14ª: não se acompanha o afirmado por não se tratar nem de conclusões nem se asserções de Direito, afirmação que o recorrente não demonstra, limitando-se a proferi-la. 10. Conclusão 16ª da motivação [página 74], mencionada a final sem numeração na página 83: trata-se de afirmação desprovida de demonstração, porque alega erro de Direito mas não cumpre o ónus a que está adstrito, conforme o estatuído no artigo 412º, n.º 2, alínea b) do CPP, pois não indica «o sentido em que, no entendimento do recorrente, o tribunal recorrido interpretou cada norma ou que a aplicou e o sentido em que ela devia ter sido interpretada ou com que deveria ter sido aplicada» 11. Conclusão 17ª da motivação [página 75]: não levada à conclusão, pelo que não pode ser conhecida. 12. Conclusão 18ª da motivação [página 77], numerada a final como 17ª: (i) reportando-se a alegado erro de Direito na interpretação e aplicação de preceito legal, no caso o artigo 496º, nsºs 1 e 3 do CCv, mas o recorrente, em violação do estatuído no artigo 412º, n.º 2, alínea b) do CPP não indica «o sentido em que, no entendimento do recorrente, o tribunal recorrido interpretou cada norma ou que a aplicou e o sentido em que ela devia ter sido interpretada ou com que deveria ter sido aplicada», limitando-se a uma asserção genérica. 13. Conclusão 19ª [página 77] numerada a final como 16ª: não se entende o que pretende esta frase para além de uma negativa sem contexto explanatório nem demonstração. 14. Conclusão 20ª [página 78], numerada a final como 17ª: reitera-se o afirmado em relação à conclusão em que se pedia a absolvição cível, e acrescenta-se que o recorrente esquece o carácter gravíssimo do por ele propalado [e que a matéria fáctica provada adquiriu] e que põe em causa um dos pilares do Estado de Direito, afinal, o modo como funcionaria, a ser verdade a sua emporcalhante visão, a Justiça Criminal. Nestes termos deve ser confirmada, pois que legal, a sentença recorrida, como é de JUSTIÇA …”. * Neste tribunal a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta apôs o seu visto (fls. 1056). * A sentença (ou acórdão) proferida em processo penal integra três partes distintas: o relatório, a fundamentação e o dispositivo. A fundamentação abrange a enumeração dos factos provados e não provados relevantes para a decisão e que o tribunal podia e devia investigar; expõe os motivos de facto e de direito que fundamentam a mesma decisão e indica, procedendo ao seu exame crítico e explanando o processo de formação da sua convicção, as provas que serviram para fundamentar a decisão do tribunal. Tais provas terão de ser produzidas de acordo com os princípios fundamentais aplicáveis ou seja o princípio da verdade material; da livre apreciação da prova e o princípio “in dubio pro reo”. Igualmente é certo que, no caso vertente, tendo a prova sido produzida em sede de audiência de julgamento, está sujeita aos princípios da publicidade bem como da oralidade e da imediação. A decisão em crise fixou da seguinte forma a matéria de facto: “2.1 Factos provados a) A Assistente Associação Sindical dos Juízes Portugueses é uma associação sindical que age em representação dos interesses do Juízes Portugueses, pugnando pelo aperfeiçoamento de dignificação da Justiça e da função judiciária. b) O Arguido é Jornalista e tem tido funções directivas na área da Comunicação Social, nomeadamente da rádio e da televisão, e intervenção pública exprimindo opiniões que são relevadas, sobre as problemáticas subjacentes a tais áreas. c) A Assembleia da República, através da sua Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, levou a cabo um conjunto de audições subordinadas ao tema «exercício da liberdade de expressão em Portugal». d) No dia 6 de Abril de 2010, no âmbito da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura da Assembleia da República, o Arguido foi chamado a prestar declarações. e) Antes de responder às perguntas dos Senhores Deputados, o Arguido fez uma declaração prévia, lendo um texto manuscrito. f) No âmbito dessas declarações prévias, proferiu as seguintes afirmações: «Nesta roda entraram há pouco tempo – e este é o modismo de agora – a Associação Sindical dos Juízes e o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público. São duas centrais de gestão de informação processual, concretizada através da promiscuidade com os jornalistas. Obtêm documentos de processos para os jornalistas publicarem, trocam esses documentos nos cafés, às escâncaras, se puderem ajudar a violar o segredo de justiça, fornecem mesmo documentos. Isto vai acabar mal, Senhor Presidente, Senhores Deputados, se não voltarmos ao período de regras em que a Justiça não faz política.». g) Na sequência destas afirmações, foi feita a seguinte pergunta por parte do Senhor Deputado J, do Partido Comunista Português: «(…) se ouvi bem as suas afirmações quanto a factos de que terá conhecimento sobre a informação prestada a jornalistas violando o segredo de justiça, informação constante dos processos judiciais, não sei se já fez alguma coisa, se já utilizou esses factos, se já deu algum encaminhamento a esses factos ou não; mas se tem conhecimento desses factos que consubstanciam um crime de violação do segredo de justiça, eu não sei que destino é que lhes pretende dar, mas julgo que factos dessa gravidade devem ser devidamente registados e deve-lhes ser dado o encaminhamento que lhes deve ser dado pelas autoridades judiciárias. E, portanto, se ainda não fez deles utilização, eu confesso que aguardarei com expectativa a sua actuação relativamente a isso, porque isso é matéria de grande gravidade e as afirmações que fez relativamente ao papel quer do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público quer da Associação Sindical dos Juízes Portugueses – julgo que foram essas duas entidades que indicou como sendo fonte de violação do segredo de justiça – julgo que deverá ser dado algum encaminhamento a essa informação, porque se teve de facto conhecimento dessa situação, julgo que a sua gravidade merece que assim seja.». h) O Arguido, apesar de ter usado da palavra, na sequência da colocação desta questão, não respondeu à mesma. i) Em resposta às afirmações proferidas pelo Arguido, a Direcção Nacional da Assistente A.S.J.P. emitiu um comunicado, datado de 6 de Abril de 2010, no qual é possível ler o seguinte: «Na audição que teve lugar hoje na Comissão de Ética, Sociedade e Cultura da Assembleia da República, o jornalista E… afirmou, além do mais, que a Associação Sindical dos Juízes Portugueses está ligada a violações do segredo de justiça “obtendo processos para os jornalistas publicarem” e “trocando esses documentos nos cafés, às escâncaras”.». Tal afirmação é completamente falsa e difamatória, ofendendo, de maneira grave e gratuita, o bom nome de uma Associação com 35 anos de história dedicada ao fortalecimento do prestígio e dignidade do poder judicial, assim como a honra dos mais de 2050 juízes associados. O jornalista E… não identificou nem conseguirá identificar nenhum membro dos órgãos dirigentes da A.S.J.P. que tenha facultado um processo, um documento, uma informação, ou o que quer que seja em violação do segredo de justiça ou das regras deontológicas e éticas por que se regem os juízes portugueses, pela simples razão que isso não aconteceu. A A.S.J.P. está inteiramente disponível para prestar os esclarecimentos que os Srs. Deputados da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura da Assembleia da República tenham por bem obter, para que nenhuma dúvida reste sobre a falsidade das declarações feitas pelo jornalista E.... A A.S.J.P irá fazer valer os direitos que a lei lhe confere para repor a verdade e o seu bom nome, através de uma queixa-crime e indemnização cível, pedindo essas responsabilidades ao jornalista E....”». j) À saída da Comissão de Ética, o Arguido proferiu ainda as seguintes afirmações ao Jornal Público: «De onde sai a matéria que está em segredo de justiça? Só pode vir da justiça? (…) Se estivessem a resolver questões de natureza sindical, mas não: o que tenho visto é uma intervenção mais extensa e larga de intervenção política, com efeitos nocivos. (…) Tentam condicionar decisões do Procurador-Geral da República e a opinião pública, e têm relações privilegiadas com jornalistas a quem, de vez em quando, vão passando documentos de natureza diversa.». k) As afirmações do Arguido foram amplamente divulgadas pela Comunicação Social, nomeadamente, no dia 6 de Abril de 2010, na Agência Lusa, pelas 18h45 e pelas 21h23, na tvi24.iol.pt, no Jornal Nacional da TVI, pelas 20h17, na TSF Online, no Bloco Noticioso da TSF, pelas 20h00, na SIC Online, no programa À Noite, as Notícias, da RTPN, pelas 21h33, no Jornal 2, da RTP2, pelas 22h00, no Telejornal, da RTP1, pelas 20h23, na Rádio Renascença Online, pelas 18h44 e 23h00, no Bloco Noticioso da Rádio Renascença, pelas 18h00, no Bloco Noticioso da Rádio Clube Português, pelas 19h00, no Portugal Diário, na Lusa no Sapo, no ionline, no Económico, no Diário Digital, na Agência Financeira. l) Esta divulgação continuou, ainda, em 7 de Abril de 2010, na Tvnet, no Diário da Manhã da TVI, pelas 09h00, 09h01, 09h02 e 09h50, no Jornal da Uma da TVI, pelas 13h15, nos Blocos Noticiosos da TSF, pelas 07h00, 08h00 e 09h00, no Sol Online, pelas 07h44, no Primeiro Jornal da SIC, pelas 13h15, nas Notícias da RTPN, pelas 09h04, 09h35 e 10h04, no Bom Dia Portugal, pelas 09h13, no Jornal da Tarde, pelas 13h00, na RTP Online, pelas 07h20 e 08h58, no Jornal Público, no Jornal Digital, no Jornal de Notícias, no JN Online, no DN Online, no Destak Online, no Correio da Manhã, nos Blocos Noticiosos da Antena1, pelas 08h00, 09h00 e 10h00, na Agência Financeira, no Diário Sul. m) O Jornal de Negócios publicou, ainda, em 9 de Abril de 2010, a crónica da autoria de Leonel Moura sobre o assunto. n) Após o anúncio, por parte da Assistente Associação Sindical dos Juízes Portugueses e do Assistente Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, de que iriam apresentar queixa-crime contra o Arguido, este, em declarações à Agência Lusa, reiterou as aclarações que prestou no âmbito da referida Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, dizendo, para o efeito, o seguinte: «Mantenho tudo o que disse ontem. A Justiça deve ser prudente e exercer com recato as suas funções, algo que estas instituições não permitem que aconteça.» o) À semelhança do que tinha sucedido com as suas primeiras declarações, estas afirmações tiveram cobertura nacional, por parte da Comunicação Social, nomeadamente, em 7 de Abril de 2010, na tvi24 online, na SIC Online, no Jornal da Noite da SIC, pelas 20h12, no Telejornal da RTP1, no Jornal da RTP2, pelas 22h06, na Rádio Renascença Online, no Portugal Diário, no jornal briefing, no Diário Digital, no Destak Online. p) A esta notícia foi, ainda, dada cobertura, em 8 de Abril de 2010, no Jornal de Notícias, no Jornal da Madeira, no Correio da Manhã, no Meios e Publicidade Online. q) Além do mais, também na blogosfera, estas afirmações foram debatidas. r) Nunca nenhum membro da Assistente A.S.J.P. facultou a qualquer jornalista processos, documentos ou informações em violação do segredo de justiça ou das regras deontológicas e éticas por que se regem os juízes. s) E esta falta de veracidade das suas afirmações é do conhecimento do arguido. t) As afirmações do Arguido ofenderam de forma séria a credibilidade, prestígio, confiança e bom nome da Assistente Associação Sindical dos Juízes Portugueses. u) As afirmações do Arguido foram proferidas na Assembleia da República, mormente na 1ª Comissão (Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias), espaço de eleição no relacionamento da A.S.J.P. com os Senhores Deputados da 1ª Comissão, e também mediante audiências com os Grupos Parlamentares. v) É neste espaço – Assembleia da República e 1ª Comissão – que a A.S.J.P. procura fazer valer os argumentos relativos aos direitos sócio-profissionais dos seus associados e, ainda, o ponto de vista dos juízes acerca da melhoria do sistema de Justiça, aquando da apresentação e discussão de alterações legislativas, designadamente mediante a apresentação de frequentes pareceres sobre diplomas legislativos. w) A honorabilidade da Assistente Associação Sindical dos Juízes Portugueses foi fortemente afectada pela acusação que lhe foi feita pelo Arguido de violação do segredo de justiça. x) As imputações feitas à A.S.J.P. pelo Arguido eram aptas a denegrir e denegriram a imagem, credibilidade, prestígio, confiança e bom nome da Assistente perante a Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, na Assembleia da República. y) As imputações feitas à A.S.J.P. pelo Arguido eram aptas a denegrir e denegriram a imagem, credibilidade, prestígio, confiança e bom nome da Assistente perante o País, pois a sua divulgação pelos órgãos de Comunicação Social foi imediata, bem sabendo o Arguido estarem estes presentes na referida Comissão. z) A Assistente Associação Sindical dos Juízes Portugueses é uma instituição com grande prestígio, com 35 anos de história, sendo que 95% dos Magistrados Judiciais são por si representados. aa) A Assistente Associação Sindical dos Juízes Portugueses é, frequentemente, chamada a pronunciar-se sobre temas de grande relevância para o País, nas mais diversas áreas sociais. bb) A Assistente Associação Sindical dos Juízes Portugueses é pessoa colectiva de idoneidade insuspeita, e como tal publicamente considerada quer pelos seus Associados quer pela Sociedade Civil, desempenhando há 35 anos com zelo e honradez a sua função que considera digna e de relevante orientação pública e social. cc) O Arguido bem sabia que as palavras que proferiu, lendo-as, em sede de Comissão de Ética, com pertinência à Assistente A.S.J.P., eram ofensivas da honra e consideração devidas à mesma. dd) Ciente disso, ainda assim proferiu-as e reiterou-as por diversas vezes, de novo perante órgãos de Comunicação Social, agindo livre, voluntária e conscientemente, com intenção de ofender a Assistente Associação Sindical dos Juízes Portugueses, o que logrou conseguir, não obstante saber que a sua conduta era prevista e punível por lei. ee) O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público é um organismo sindical cujos objectivos integram, segundo o respectivo Estatuto, a «defesa dos direitos e interesses dos sócios, no plano profissional, por todos os meios permitidos, incluindo o patrocínio judiciário», a «defesa dos interesses dos magistrados do MºPº, nomeadamente no âmbito do estatuto socioprofissional», «pugnar pela dignificação da magistratura do Ministério Público e pelo aperfeiçoamento e democratização do aparelho judiciário», «participação, com organizações congéneres de outros países, na defesa, no âmbito internacional, de uma justiça democrática», «fomento do aperfeiçoamento técnico e cultural dos sócios, da solidariedade e convivência entre eles, bem como d sua consciência sindical» e «ser ouvido na elaboração das leis do âmbito judiciário e propor aos órgãos competentes as reformas necessárias à melhoria do sistema judiciário e à realização da justiça.». ff) No que respeita ao Assistente Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, as afirmações do Arguido visaram claramente este Sindicato considerando-o, ao lado da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, uma das «duas centrais de gestão de informação processual concretizada através da promiscuidade com os jornalistas» e uma das duas que «obtêm documentos de processos para os jornalistas publicarem, trocam esses documentos nos cafés às escâncaras, se puderem ajudar a violar o segredo de justiça fornecem mesmo documentos.». gg) O Arguido não imputou factos a este ou àquele magistrado do M.P. ou, numa fórmula genérica e indiscriminada, ao M.P. na sua globalidade; atribuiu-os directa e especificamente ao Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, citando-o pelo nome. hh) O Arguido imputou tais factos sem individualizar quem é que no S.M.M.P. pratica os actos em si. ii) O Arguido manteve o mesmo propósito, nas declarações que foi prestando, referindo-se ao Sindicato em si, enquanto pessoa colectiva. jj) Os actos imputados, no que tange à violação do segredo de justiça, são crime, e a menção ao Sindicato dos Magistrados do Ministério Público como uma das “centrais” ligadas à comissão de tais actos inculca a ideia de que seria uma associação destinada à prática de crimes, uma associação criminosa. kk) Tais declarações são objectivamente atentatórias e, na verdade, atingiram a credibilidade, o prestígio e a confiança devidas à pessoa colectiva, ora Assistente S.M.M.P., e de que esta goza. ll) O M.P. está adstrito, por dever estatutário e por previsão processual, a obrigações de objectividade e isenção, incompatíveis com a referida «promiscuidade com os jornalistas», e o Sindicato deve garantir que os seus membros prossigam esse dever. mm) Trata-se de uma magistratura adstrita também a deveres de defesa da dignidade e de salvaguarda do prestígio da função, inconciliáveis com actos como trocarem «esses documentos nos cafés às escâncaras», fazendo-o criminosamente. nn) A haver o mínimo fundo de verdade no afirmado pelo Arguido, o S.M.M.P. estaria a desvirtuar de modo gravíssimo a sua função e a entrar por zonas de séria ilicitude e desrespeito pela sua natureza e perfil dos membros que o integram como filiados e dirigentes. oo) As imputações em causa ofenderam a credibilidade, o prestígio e a confiança que são devidos à pessoa colectiva Sindicato dos Magistrados do Ministério Público. pp) O Arguido não tinha qualquer fundamento para, em boa-fé, reputar como verdadeiros os factos que afirmou, pois que as condutas em causa nunca existiram, nem há o mais ténue indício de que actos com tal gravidade pudessem alguma vez ter existido. qq) O Arguido conhecia a falsidade das suas afirmações, pois não ignorava que o S.M.M.P. não praticou os factos que ele referiu. rr) A ofensa foi praticada numa comissão parlamentar, cujas audições são públicas, e foram difundidas pela Comunicação Social em directo, tendo o teor das afirmações do arguido tido projecção mediática consequente; o que o mesmo sabia que iria acontecer. ss) O bom nome do Assistente Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, a imagem real agregadora dos valores credibilidade, prestígio e confiança, e indubitavelmente reconhecido pela comunidade, são definitivamente postos em causa pelas afirmações que foram propaladas pelo Arguido. tt) O meio escolhido pelo Arguido, para proferir as afirmações já descritas, facilita a divulgação em massa do que inveridicamente afirmou. uu) O Arguido representou na sua mente os factos que iria imputar, a natureza falsa dos mesmos, a circunstância de tais factos ofenderem os valores da credibilidade, prestígio e confiança devidos ao S.M.M.P., e desejou precisamente tudo o que pensou, o mesmo sucedendo quanto ao modo público como praticou a sua conduta, e o facto de assim lograr efeito através da Comunicação Social. vv) A conduta do Arguido atentou contra o bom-nome e prestígio do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, fazendo crer que era uma entidade que estava ligada à prática de crimes, nomeadamente de violação de segredo de justiça e uso abusivo de informação processual penal. ww) O Arguido não tem antecedentes criminais. xx) O Arguido é uma pessoa frontal quando intervém no debate público. zz) O arguido é Jornalista e empresário, tendo declarado auferir cerca de 5.000€ por mês; vive em casa própria, pagando uma amortização mensal de cerca de 1.500€; tem filhos, de 39 e 22 anos de idade, sendo que o mais novo ainda se encontra na sua dependência. 2.2. - Matéria de facto não provada Com efectivo e real interesse para a decisão da causa, não foi feita qualquer prova de que o Arguido tenha proferido as afirmações supra descritas sem pretender atingir ou, no mínimo, sem equacionar que elas pudessem atingir o bom-nome, o prestígio, o crédito, e o reconhecimento devidos aos Assistentes Associação Sindical dos Juízes Portugueses e Sindicato dos Magistrados do Ministério Público. Não resultou, igualmente, provado que o Arguido não tenha pretendido, ou não tenha equacionado como possível, que as afirmações que proferiu tivessem ampla divulgação pública.”. * Como dissemos, o art.º 374º/2 do CPP determina que, na sentença, ao relatório se segue a fundamentação que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal. A redacção deste preceito inculca a ideia, que a obediência a regras de bom senso, clareza e precisão apoiam, de que a fundamentação da decisão se repartirá pela enumeração dos factos provados, depois dos não provados e, seguidamente, pela exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão com o exame crítico das provas. Necessário e imprescindível é que o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência se possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado Relativamente à fundamentação de facto, cf. a jurisprudência plasmada no Ac. STJ de 17/11/1999, relatado por Martins Ramires, in CJSTJ, III, p. 200 e ss., do qual citamos: “O entendimento do STJ sobre o cumprimento deste preceito encontra-se sedimentado: trata-se de exposição tanto quanto possível completa, mas concisa, dos motivos de facto e indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, sem necessidade de esgotar todas as induções ou critérios de valoração das provas e contraprovas, mas permitindo verificar que a decisão seguiu um processo lógico e racional na apreciação da prova, não sendo ilógica, arbitrária contraditória ou violadora das regras da experiência comum ... .”. Também neste sentido, ver Maria do Carmo Silva Dias, in “Particularidades da Prova em Processo Penal. Algumas Questões Ligadas à Prova Pericial”, Revista do CEJ, 2º Semestre de 2005, pp. 178 e ss., bem como a doutrina e a jurisprudência constitucional citadas. No mesmo sentido, cf. Sérgio Gonçalves Poças, in “Da sentença penal – Fundamentação de facto”, revista “Julgar”, n.º 3, Coimbra Editora, p. 21 e ss.. Ver ainda José I. M. Rainho, in “Decisão da matéria de facto – exame crítico das provas”, Revista do CEJ, 1º Semestre de 2006, pp. 145 e ss. donde citamos: “Em que consiste portanto a especificação dos fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção? Consiste simplesmente na indicação das razões fundamentais, retiradas a partir das provas segundo a análise que delas fez o julgador, que levaram o tribunal a assumir como real certo facto. Ou, se se quiser, consiste em dizer por que motivo ou razão as provas produzidas se revelam credíveis e decisivas ou não credíveis ou não decisivas. No primeiro caso o tribunal explica por que julgou provado o facto; no segundo explica por que não julgou provado o facto. … a motivação não tem porque ser extensa, de modo a significar tudo o que foi probatoriamente percepcionado pelo julgador. Pelo contrário, deve ser concisa, como é próprio do que é instrumental, conquanto não possa deixar de ser completa.”. Ver, por último, o acórdão do Tribunal Constitucional de 17/01/2007, in DR, 2ª Série, n.º 39, de 23/02/2007, que decidiu, além do mais, “Não julgar inconstitucional a norma dos artigos 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal, interpretados no sentido de que não é sempre necessária menção específica na sentença do conteúdo dos depoimentos da arguida e das testemunhas de defesa.”.. No cumprimento desse dever, o tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de facto seguinte forma: “O Tribunal formou a sua convicção com base nas declarações dos representantes legais dos Assistentes, o Sr. Juiz Desembargador A… (então, Presidente da A.S.J.P.), o Sr. Juiz de Círculo M… (então, Secretário da A.S.J.P.), o Sr. Procurador da República J… (então, Presidente do S.M.M.P.), o Sr. Procurador da República J… (então, a desempenhar funções no S.M.M.P.), os quais descreveram os factos de que tomaram conhecimento, mormente as afirmações do Arguido, num registo coerente e sereno, afigurando-se isentos e objectivos. De tal modo que, de um modo semelhante e reportando-se a cada um dos Sindicatos a que pertencem, deram a perceber ao Tribunal que um “mínimo denominador comum” aqui se verificou: no universo dos Magistrados de cada uma das duas Magistraturas, as reacções de Juízes e Magistrados do M.P. não se fizeram esperar e estes, assim que tomaram conhecimento do declarado pelo Arguido em sede de Comissão de Ética, e ultrapassado um primeiro momento de estupefacção, interpelaram os respectivos Sindicatos, manifestando a sua preocupação, a sua indignação, e pedindo que os Assistentes reagissem às afirmações do Arguido. O Tribunal, através das declarações destes Juízes e Magistrados do M.P., não teve qualquer dificuldade em apreender o incómodo sentido pelos mesmos e pelos respectivos associados (sendo que são as pessoas físicas que dão “corpo” às pessoas colectivas), a perturbação gerada, os contactos sucessivos com interpelações e questões, tanto mais que imediatamente alastrou, através da Comunicação Social, o propalado pelo Arguido; o qual todos consideraram inverídico mas profundamente lesivo do crédito e do bom-nome dos dois Assistentes, pela grave suspeição criada. Das palavras dos representantes legais dos Assistentes resultou, também, a percepção de que ficou “a pairar” uma imagem negativa relativamente aos mesmos que não deixou, nem deixa ainda hoje, de indignar e perturbar os Magistrados das duas Magistraturas, mormente os que se encontram sindicalizados. Os Assistentes, através dos seus representantes legais, deram sinais do quanto sentiram ter sido o bom-nome, o crédito e o prestígio dos mesmos atingidos pelas palavras proferidas pelo Arguido, e a mais do que suspeição pelo mesmo lançada sobre a conduta dos mesmos. O Tribunal atendeu aos depoimentos igualmente serenos, objectivos e isentos das testemunhas J.. (Procuradora da República e membro do S.M.M.P.), R.. (Procurador da República e actual Presidente do S.M.M.P.), O… (Procuradora da República e membro do S.M.M.P.), A… (Juiz Desembargador e antigo Presidente da A.S.J.P.), e J… (Juiz Desembargador e membro da A.S.J.P.). Também nos seus depoimentos encontrou o Tribunal um “mínimo denominador comum”: todos revelaram o impacto negativo que as graves declarações do Arguido tiveram na imagem dos dois Assistentes. As testemunhas recordaram, sem grandes diferenças de registo, a surpresa e o choque inicial que sentiram ao ouvir ou ao tomar conhecimento daquelas declarações, as quais sentiram como absolutamente injustificadas e ofensivas, e que os levaram, à semelhança do que fizeram muitos outros Magistrados, a interpelar cada uma das direcções dos Assistentes, pedindo uma resposta. Foi perceptível a “onda” de reacções que as palavras do Arguido geraram, e a indignação pelas mesmas provocadas no seio do universo dos filiados nos dois Assistentes. O Sr. Procurador R… relatou, ainda, que, em sede de Assembleia da República e na sequência, os Magistrados ouviram algumas expressões jocosas, o que tornou evidente que as declarações do Arguido um efectivo dano na reputação dos Assistentes havia causado. Pelas testemunhas, nomeadamente pela Sra. Procuradora J…, foi colocado em destaque o modo “solene, numa pose de Estado” como o Arguido proferiu as suas declarações, o seu tom sério, lendo o seu texto de modo a que este ficasse bem vincado na mente de todos. Sendo que utilizou uma sede – a Comissão de Ética da A.R. – ciente de que as suas palavras teriam ampla divulgação. O que permitiu ao Tribunal concluir que, para além de o meio utilizado (a referida Comissão, pela sua dignidade intrínseca) ser particularmente apto a conseguir uma difusão explosiva do que pelo Arguido foi escrito e lido, não foi deixada qualquer dúvida às testemunhas (e assim o transmitiram ao Tribunal) que se verificou o propósito reflectido, por parte do Arguido, de fazer chegar as suas declarações a um universo tão vasto quanto possível, e assim expor os Assistentes a uma ofensa apta a perdurar no tempo, pela suspeição criada. O Tribunal reputou os depoimentos destas testemunhas como credíveis e consistentes. A testemunha Dra. C…, Procuradora da República, testemunha indicada pela Defesa do Arguido, quando questionada sobre se existiria verosimilhança na afirmação de que os Assistentes se teriam transformado em “centrais de informação”, organizadas para transmitir dados de processos a jornalistas, numa relação de promiscuidade e, se necessário, violando o segredo de justiça, negou-o; negando também existir, neste contexto, qualquer “gestão política”. Respondeu, ainda, a questões sobre o segredo de justiça, mas que, e como de imediato se explicitará, já caem fora daquele que é o objecto do presente processo. Ainda no que respeita às testemunhas arroladas pela Defesa do Arguido, do depoimento escrito do Ex.mo Sr. Dr. MS… colheu o Tribunal ser o Arguido um homem consabidamente frontal, na exposição dos seus pontos de vista, o que fez dele uma referência do jornalismo em Portugal. E tal constitui facto notório. Aqui chegados, e continuando a explicitar os fundamentos da convicção do Tribunal, cumpre delimitar o objecto do presente processo e, à sua luz, valorar os depoimentos e o contributo das demais testemunhas arroladas pela Defesa. Sendo que, às mesmas, foi solicitado pronunciarem-se sobre as violações do segredo de justiça que, amiúde, se verificam. Mas não é esse o objecto deste processo. Circunscreve-se tal objecto ao segmento da comunicação feita pelo Arguido, na referida Comissão de Ética, mais uma vez a saber: «Nesta roda entraram há pouco tempo – e este é o modismo de agora – a Associação Sindical dos Juízes e o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público. São duas centrais de gestão de informação processual, concretizada através da promiscuidade com os jornalistas. Obtêm documentos de processos para os jornalistas publicarem, trocam esses documentos nos cafés, às escâncaras, se puderem ajudar a violar o segredo de justiça, fornecem mesmo documentos. Isto vai acabar mal, Senhor Presidente, Senhores Deputados, se não voltarmos ao período de regras em que a Justiça não faz política.». O objecto do presente processo é este, e apenas este, cumprindo decidir se tais afirmações têm, ou não, relevância criminal. Assim sendo, o contributo das testemunhas arroladas pela Defesa que, por escrito ou presencialmente, com a maior correcção, vieram a Juízo partilhar as suas experiências e legítimas concepções e opiniões, não lograram, porém, ajudar o Tribunal na formação da sua convicção. Na verdade e porque assim lhes foi pedido, versaram um tema – relevante, é certo -, o da violação do segredo de justiça; o qual, no entanto, se situa fora do que, nestes autos, cumpre decidir. Não curamos, aqui, das opções editoriais do “Correio da Manhã”, ou de qualquer outro meio de Comunicação Social. Não curamos, aqui, de saber se todas, muitas, poucas ou nenhumas das notícias pelo mesmo ou outros publicadas violam, ou não, o segredo de justiça. Não curamos, aqui, de saber se as violações do segredo de justiça têm, ou não, motivações recônditas, nomeadamente de natureza política. Curamos, apenas, de analisar as concretas imputações que pelo Arguido foram feitas à Associação Sindical dos Juízes Portugueses e ao Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, e decidir se as mesmas têm, ou não, relevância criminal. Delimitado o objecto do processo nos termos sobreditos e pelas razões que - julgamos que claramente - acabamos de enunciar, não lograram, por um lado, os depoimentos escritos do Ex.mo Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e do Ex.mo Sr. Procurador Geral da República, e por outro lado, os depoimentos presenciais da Sra. Dra. So…, do Sr. Bastonário da O.A. Dr. Ant…o, do Sr. Dr. Ant…, do Sr. Dr. Cé…, do Sr. Arquitecto Car…, e do Sr. Dr. Pau…, constituir “arrimo” no qual o Tribunal pudesse fundar a sua convicção. Atendeu o Tribunal às declarações do Arguido, relativamente ao que lhe foi imputado em sede de pronúncia, por referência às acusações particulares. Quando lhe foi pedido que enunciasse factos concretos, susceptíveis de sustentar as suas declarações, descreveu o Arguido (parcialmente) um alegado episódio ocorrido num café da Avª Fontes Pereira de Melo, em que o Jornalista E… (do Correio da Manhã) estaria sentado a uma mesa, na companhia de um membro do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, encontrando-se pousado sobre a mesma um volumoso processo. Questionado sobre se teria presenciado algum episódio semelhante, envolvendo algum Juiz pertencente à Associação Sindical dos Juízes Portugueses, o Arguido respondeu negativamente. O Tribunal ouviu a descrição (parcial, pois não indicou quem seria o Magistrado do S.M.M.P. em questão) que o Arguido fez do alegado episódio, e entendeu que, atenta a normalidade do acontecer, tal episódio não é verosímil. Repugna ao Tribunal acreditar (e não acredita) que os Srs. Magistrados do Ministério Público, mormente os membros do seu Sindicato, carreguem consigo processos volumosos para cafés, em vias públicas altamente frequentadas, para, perante quem esteja, trocar com os Srs. Jornalistas documentos existentes nesses processos. Não é crível. No mais, ouviu o Tribunal as declarações do Arguido referentes a frequentes violações do segredo de justiça, com as quais procura justificar o que disse a respeito dos dois Sindicatos Assistentes. Porém, a argumentação do Arguido traduz um “salto” lógico e ontológico, a que faltam “elos intermédios” quando, a final e à semelhança do que fez na Comissão de Ética, imputa os comportamentos reprováveis de promiscuidade com jornalistas e até criminosos de violação do segredo de justiça aos dois Sindicatos, aqui Assistentes. Tal “salto” lógico e ontológico, tendo em conta que o Arguido não logrou enunciar, para sustentar a sua tese, mais do que o referido “esboço” de episódio no café da Fontes Pereira de Melo, não permite “casar” a sua argumentação, por referência às violações do segredo de justiça, com qualquer comportamento dos Assistentes, levado a cabo por dirigentes destes. Quanto às demais concepções do Arguido, a respeito do Sindicalismo Judiciário, do papel dos Jornalistas por referência à Justiça e aos Tribunais, são legítimas opiniões suas sobre matérias largamente debatidas, nada se oferecendo dizer a tal respeito. O Tribunal atendeu, ainda, às suas declarações relativas às respectivas condições pessoais, familiares e profissionais. O Tribunal ouviu, por fim, o depoimento do Jornalista Eduardo, o qual negou ter ocorrido o alegado episódio do café da Avª Fontes Pereira de Melo. O Tribunal não encontrou qualquer fundamento para duvidar das suas palavras. Ainda atendeu o Tribunal aos documentos juntos com as participações criminais, os quais dão base de sustentação ao declarado pelos Assistentes, através dos seus legais representantes; bem como ao vídeo no qual se encontra registada a intervenção do Arguido na Comissão de Ética, o qual foi visionado em audiência de julgamento. Antecedentes criminais: C.R.C. de fls. 479.”. * É pacífica a jurisprudência do STJ Supremo Tribunal de Justiça. no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso. Da leitura dessas conclusões, conjugada com as de conhecimento oficioso, afigura-se-nos que as questões fundamentais a decidir são as seguintes: I – As assistentes carecem de legitimidade para apresentarem as queixas e subscreverem as respectivas acusações particulares; II – Nulidade resultante do não cumprimento do disposto no art.º 358º/1/3 do CPP; (questão de conhecimento oficioso) III – A decisão recorrida padece do vício de contradição insanável; IV – Foram ouvidos como declarantes mais do que um representante de cada uma das Assistentes e foram ouvidas como testemunhas pessoas pertencentes aos corpos sociais da Assistentes e essas declarações e depoimentos foram valoradas para a prova dos danos, o que implica a nulidade do julgamento; V – Devem considerar-se não escritas as alíneas r) e s) dos factos provados, porque extravasam o objecto do processo; VI – As alíneas t), w), x), y), gg) a kk) e ss) dos factos dados como provados contêm asserções e conclusões de direito que não devem constar da matéria provada, pelo que delas devem ser expurgadas; VII – A decisão recorrida não devia ter dado como provados os factos constantes das alíneas t), w), x), y), cc), dd) e kk) a ww), porque não foi isso que resultou da prova produzida em audiência; VIII – Os factos dados como provados não preenchem os elementos do tipo de crime por que veio condenado, nem de qualquer outro; IX – Os crimes porque o Recorrente veio condenado não podem ser duplamente qualificados; X – Mesmo que se mantenha a condenação criminal do Recorrente, este deve ser absolvido dos pedidos cíveis, porque se não provou que as Assistentes tenham sofrido danos e, em qualquer dos casos, as indemnizações fixadas são exageradas e devem ser reduzidas. * Cumpre decidir. I – Entende o Recorrente que as Assistentes carecem de legitimidade porque as actividades que lhes imputou teriam, necessariamente que ser levadas a cabo por magistrados seus sócios em concreto, sendo que estes não se confundem com as Assistentes e não apresentaram queixa. Mas não lhe assiste razão. Na verdade, o Recorrente imputou às Assistentes a prática de determinados factos. Naturalmente que, sendo as pessoas colectivas criações do direito, destinadas à protecção de interesses comuns ou colectivos Nesse sentido, ver Manuel de Andrade, in “Teoria Geral da Relação Jurídica”, vol. I, Livraria Almedina, Coimbra, 1974, a págs. 49 e 50., todos os seus actos têm que ser materialmente praticados por pessoas humanas, mas isso não obsta a que tais actos sejam simultaneamente actos das pessoas jurídicas Nesse sentido, ver Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, II, Verbo, 2008, pág. 286, que, a propósito da responsabilidade penal das pessoas colectivas, afirma: “… É que a pessoa colectiva não actua por si mesma, mas sempre por intermédio de outrem, seu órgão ou representante. Nessa medida o facto pelo qual a pessoa colectiva responde penalmente é um facto de outrem que actua por ela e frequentemente sucede que só porque a pessoa física actua em lugar da pessoa jurídica é que é também responsável, pois há elementos do tipo que só se verificam na pessoa jurídica e não na pessoa física. …”.. Por outro lado, entende o Recorrente que as Assistentes carecem de legitimidade para subscreverem as respectivas acusações particulares, uma vez que não existem deliberações das respectivas assembleias gerais nesse sentido. Independentemente de se qualificarem os factos imputados ao Recorrente como difamação ou como ofensa a pessoa colectiva, sempre as Assistentes seriam consideradas ofendidas Cf. Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Coimbra Editora, 2º reimpressão, 2009, pág. 668, donde citamos: “… Titular do direito de queixa é, em princípio e apenas, «a pessoa ofendida, considerando-se como tal o titular dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação» (…). O que significa, por seu lado, que como tal deve ser considerado o portador do bem jurídico, para determinação do qual se apresenta como decisiva a interpretação do tipo-de-ilícito respectivo. “., nos termos do disposto no art.º 113º/1 do CP Código Penal.. E, como escreve Figueiredo Dias In “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Coimbra Editora, 2º reimpressão, 2009, pág. 663., quando o ofendido é uma pessoa colectiva, “… Nem por isso há que modificar a doutrina geral que acabou de expor-se, devendo considerar-se que, nessas hipóteses, se o portador do bem jurídico respectivo for só a pessoa colectiva (e não também pessoas individuais) e, por isso, só ela tiver sido directamente ofendida, o exercício do direito de queixa cabe – e cabe só – aos órgãos sociais para ela capacitados pelo regulamento interno respectivo. Isto deve valer mesmo para pessoas jurídicas irregulares ou jurídico-civilmente incapazes. …”. Posto que os despachos que admitiram as Assistentes a intervirem como tal não formam caso julgado Nesse sentido, veja-se a seguinte jurisprudência: Acórdão do STJ de 03/10/2002, no proc. 02P2519, relatado por Simas Santos, in www.gde.mj.pt, do qual citamos: “… Foi, pois, colocada e resolvida no despacho recorrido a questão de saber se a admissão da requerente como assistente, advogando em causa própria, constitui caso julgado impeditivo de nova pronuncia sobre a matéria. Essa leitura foi, não obstante, impugnada pela recorrente, como se vê do texto da motivação e das conclusões 2:ª a 4.ª, pelo que pode (e deve) ser aqui abordada previamente à restantes questões que acima se equacionaram. Já entendeu este Tribunal, em acórdão com o mesmo relator (de 8.2.01, Acs STJ IX, 1, 229) que: «(6) Sendo o estatuto do assistente dinâmico e reversível, o despacho que admite a sua intervenção apenas faz caso julgado rebus sic standibus. (7) O julgamento sobre a legitimidade do requerente para intervir como assistente, só garante o exercício formal dos poderes e direitos que lhe são cometidos por tal qualidade, mas que não dispensa ou impossibilita o(s) julgamento(s) que a lei processual penal prescreva, designadamente no momento em que deduz acusação ou requer a instrução, ou interpõe recurso da decisão final.» Vejamos pois se o despacho que a admitiu a intervir como assistente faz caso julgado formal quando a este estatuto. Já reconheceu o Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 11.7.91 (CJ XVI, 4, 21) que, no domínio do CPP de 1929 e legislação complementar, era entendimento unânime de o despacho que admitia alguém a intervir como assistente não constituía caso julgado, mas concluiu-se que, de acordo com o CPP de 1987, o despacho que admita alguém como assistente, ainda que se refira de forma genérica à legitimidade do requerente faz caso julgado quanto a essa mesma legitimidade, entendida como a qualidade que lhe permite exercer adequada e atempadamente os direitos processuais conferidos à figura do assistente (posição criticada por José António Barreiros, Sistema e Estrutura do Processo Penal Português, II, pág. 164). Para chegar a este resultado essa douta decisão ponderou expressamente que o despacho de admissão como assistente se encontra «em perfeita sintonia com a parte do despacho saneador que, no processo civil, aprecia obrigatoriamente, ainda que de maneira genérica, a legitimidade das partes, e que faz, quanto a esse ponto, caso julgado, em harmonia com o Assento deste Supremo de 1 de Fevereiro de 1963, no Boletim 124, 414». Mas esse pressuposto não se mantém. Com efeito, este Tribunal fixou, no Acórdão n.º 2/95 (Acórdão n.º 2/95 do STJ de 16.5.95, DR IS-A de 12-6-95), a seguinte jurisprudência: «a decisão judicial genérica transitada e proferida ao abrigo do artigo 311º, n.º 1, do Código de Processo Penal, sobre a legitimidade do Ministério Público, não tem o valor de caso julgado formal, podendo até à decisão final ser dela tomado conhecimento». E nas conclusões que aí se formularam a anteceder imediatamente o «assento» teve-se expressamente inaplicável ao processo penal o referido Assento de 1 de Fevereiro de 1963. São as seguintes essas conclusões: 1 - A falta de regulamentação sistemática e específica do caso julgado no Código de Processo Penal (cfr o Ac. de STJ de 31.10.91, CJ XVI, 4, 5) não permite, por si própria, o recurso nos termos do artigo 4.° deste Código aos preceitos sobre tal matéria constantes do Código de Processo Civil. 2 - Em matéria de caso julgado formal, quanto ao despacho previsto no artigo 311.°, n.° 1, do Código de Processo Penal, não existe qualquer lacuna que imponha por indício normativo o recurso à analogia para aplicação do regime constante do artigo 672.° do Código de Processo Civil e do Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Fevereiro de 1963, ex vi do artigo 4.° do Código de Processo Penal. 3 - Se se verificasse a existência de lacuna, a sua integração, com base no artigo 4.° do Código de Processo Penal, só se poderia operar desde que se não produzisse uma diminuição dos direitos processuais dos arguidos. 4 - A aplicação ao processo penal dos normativos processuais civis acima referidos implica uma manifesta diminuição relativa ao estatuto processual dos arguidos; 5 - Também a aplicação neste caso dos referenciados normativos processuais civis infringe o princípio da igualdade jurídica, essencial entre o caso regulado e o caso a regular, e o princípio da harmonização contido no artigo 4.° do Código de Processo Penal. 6 - Isto porque não existe a mesma identidade de natureza e finalidade entre o despacho saneador contemplado no artigo 510°, n.°s 1, al.s a) e b), e 2, do Código de Processo Civil e o despacho de saneamento a que se refere o artigo 311.°, n.° 1, do Código de Processo Penal. 7 - Igualmente a aplicação da doutrina do Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Fevereiro de 1963 colide e não se harmoniza com os princípios fundamentais do processo penal, tais como o princípio da verdade material, do favor rei e do favor libertatis, sendo nessa parte irrelevante a ressalva contida no mesmo assento que condiciona o efeito de caso julgado formal sobre a legitimidade à superveniência de factos que nela se repercutam. 8 - O artigo 368.°, n.° 1, do Código de Processo Penal (como, de resto, o artigo 338,°, n.° 1) não tem, quanto à sua preclusão, o valor de estabelecer força de caso julgado formal para o despacho genérico sobre a legitimidade do Ministério Público, proferido anteriormente, mas tem apenas por finalidade estabelecer uma ordem de análise das várias questões, pretendendo evitar a duplicação da sua apreciação. 9 - Assim, o despacho sobre a legitimidade do Ministério Público, proferido em termos genéricos, ao abrigo do artigo 311.°, n.° 1, do Código de Processo Penal, não reveste o valor de caso julgado formal. Na sequência, decidiu este Tribunal que «tendo-se afirmado no exame preliminar que "os recursos haviam sido interpostos por quem tinha legitimidade", não significa isso, que fique resolvida em definitivo a questão relativa a este pressuposto processual, por analogia com a situação contemplada no acórdão obrigatório n.º 2/95 de 16.5.95» (Ac. do STJ de 11.6.97, proc. n.º 123/97). À luz desta jurisprudência fixada, e das suas razões que se acompanham, entende-se que se não deve afastar do entendimento desenvolvido perante o CPP de 1929 de que o despacho que admite a intervenção como assistente não faz caso julgado formal sobre a legitimidade deste. E se podem postular os princípios de segurança jurídica e da estabilidade da instância impõem-se, neste domínio e em contrário, os já referidos princípios fundamentais do processo penal, da verdade material, do favor rei e do favor libertatis. Refere a propósito, José António Barreiros (ob. cit. II, 164): «contrariamente ao que se passa com o estatuto do arguido, o do assistente é caracteristicamente dinâmico, é reversível. Daí que possa acontecer que um indivíduo seja admitido como tal e, em momento subsequente a essa admissão, ver revogada essa qualidade por verificação de não existência de requisitos formais para tanto. Tal despacho apenas faz caso julgado rebus sic standibus». O julgamento sobre a legitimidade do requerente para intervir como assistente, só garante o exercício formal dos poderes e direitos que lhe são cometidos por tal qualidade, mas que não dispensa ou impossibilita o(s) julgamento(s) que a lei processual penal prescreva, designadamente no momento em que deduz acusação ou requer a instrução, ou interpõe recurso da decisão final. Assim como a legitimidade para intervir como assistente se afere pela denúncia, a legitimidade a apreciar subsequentemente prende-se com a natureza do crime a que se refere a acusação ou requerimento para instrução e com a decisão recorrida, em caso de recurso. …”. O acórdão da RL de 15/01/2008, no proc. 5738/2007-5ª, relatado por Ricardo Cardoso, in www.gde.mj.pt, do qual citamos: “… Sendo a legitimidade pressuposto do exercício de um direito, sem o qual o mecanismo do procedimento criminal não pode ser accionado, no caso dos crimes semi-públicos, não pode o exercício de tal direito (o que significa “realizar as possibilidades de acção que constituem o seu conteúdo” P. Jorge), por pessoa diversa do titular, ser considerada como irregularidade, porque a lei considera tal excepção como ilegitimidade nos termos gerais do direito, o que determinava a absolvição da instância nos termos processuais civis. De igual modo, no processo penal (art.ºs 48 e 49 do CPP) nenhum acto pode ser praticado sem que se verifique a legitimidade do impulso penal (vulgo queixa ou participação) sendo os actos subsequentes, ofendidos pela falta de tal pressuposto, nulos, e por isso nunca irregulares por totalmente inaproveitáveis. Por outro lado, da admitida constituição da queixosa como assistente não resulta caso julgado formal, uma vez que os elementos constantes dos autos não só demonstram que se não podia constituir como tal, por o titular do direito de queixa ser o sócio gerente D… , como que tal decisão contrariava a realidade de facto (e com o consequente erro na aplicação do direito) em que tal despacho se fundamentou, podendo tal erro ser corrigido sempre de acordo com o escopo do procedimento que é o da averiguação da verdade. O despacho de admissão de intervenção nos autos como assistente tem natureza tabelar, porque declara a legitimidade para intervir como assistente, mas não se pronuncia sobre os respectivos fundamentos, razão por que não tem a virtualidade de conduzir à formação de caso julgado sobre essa questão, o que pressupõe apreciação dos respectivos fundamentos e decisão sobre os mesmos. Neste sentido veja-se o Acórdão deste Tribunal de 30 de Novembro de 2006 (Proc.º nº 3104/06.9, Relator Cid Geraldo, in www.pgdl.pt) : “Embora a questão de saber se o despacho a admitir a constituição como assistente forma ou não caso julgado formal tenha sido abordada em várias decisões jurisprudenciais, o certo é que a jurisprudência se inclina maioritariamente no sentido de que não se forma caso julgado formal com as decisões que admitem a constituição como assistente em processo penal, designadamente com o reforço que lhe advém da posição tomada no acórdão do STJ, para fixação de jurisprudência, proferido em 16/05/2005, in DR, de 12/06/05, já que a legitimidade é do conhecimento oficioso e tal despacho não conhece, em concreto da questão da legitimidade, limitando-se a pressupô-la em termos genéricos ou tabelares, podendo tal decisão ser livremente revista e alterada.” Tem por isso pleno acerto a decisão recorrida, não só na sua totalidade, como em especial na parte em que refere a jurisprudência deste Tribunal da Relação ao referir a irrelevância do despacho de admissão da queixosa como assistente (“… mesmo tendo havido despacho judicial a admitir o ofendido na qualidade de assistente” (cfr. Ac. do TRL de 08/07/2004, Proc.º nº 6323/2004-9, in www.dgsi.pt)). …”. O acórdão da RL de 08/07/2004, no proc. 6323/2004-9ª, relatado por Cid Geraldo, in www.gde.mj.pt, do qual citamos: “… Assim sendo e, tendo em conta os factos denunciados (e apenas estes), o recorrente não tem legitimidade "ad causam" para se constituir assistente nos autos, mesmo apesar de ter havido despacho judicial a admitir o ofendido na qualidade de assistente, uma vez que apenas faz caso julgado formal junto do tribunal que proferiu tal despacho (se não houver recurso), só não se impondo ao tribunal superior, funcionando, naquele contexto, em 1ª instância, o princípio "rebus sic standibus" – neste sentido cfr. entre outros, Ac. Rel. Lisboa, de 2004/03/11 (Rec. n° 29/04), Ac. Rel. Lx. de 2002/06/25 (Rec. n° 1790/02, in www.dgsi.pt). Idem: Ac. Po. de 2000/10/18 (Rec. n° 40711/2000); Ac. Rel. Lx. de 2001/12/04 (Rec. n° 8531/01). …”. O acórdão da RL de 30/11/2006, no proc. 3104/06 9ª, relatado por Cid Geraldo, in www. pgdlisboa.pt, cujo sumário citamos: “I – Assim, não obstante a queixa ter sido apresentada pela pessoa colectiva “R. & Q., Lda”, representada pelo seu sócio gerente T. R., aquela, titular do interesse ofendido, nunca foi admitida nos autos como assistente. II – Quanto ao recorrente T. R., embora intervenha nos autos como assistente, falece-lhe legitimidade para tal, já que o ofendido sempre será a pessoa colectiva, a qual se apresenta juridicamente autónoma em relação às pessoas dos sócios. III – Invoca, porém, o recorrente que a primeira decisão que o havia admitido a constituir-se como assistente, constitui caso julgado formal, pelo que a decisão recorrida (rejeição do requerimento de abertura de instrução) é nula e inválida nos termos do artigo 122º, n.º 1, do Código Processo Penal. IV – Embora a questão de saber se o despacho a admitir a constituição de assistente forma ou não caso julgado formal tenha sido abordada em várias decisões jurisprudenciais, o certo é que a Jurisprudência se inclina maioritariamente no sentido de que não se forma caso julgado formal com as decisões que admitem a constituição como assistente em processo penal, designadamente com o reforço que lhe advém da posição tomada no Acórdão do STJ, para fixação de jurisprudência, proferido em 16/05/2005, in D:R. , de 12/06/95, já que a ilegitimidade é de conhecimento oficioso e tal despacho não conhece, em concreto da questão da legitimidade, limitando-se a pressupô-la em termos genéricos ou tabelares, podendo tal decisão ser livremente revista e alterada.”., importa averiguar se os respectivos representantes tinham os poderes necessários para, em sua representação, apresentar as queixas e deduzir as acusações particulares. Nos termos do disposto no art.º 163º/1 do CC Código Civil., a representação das pessoas colectivas cabe, sucessivamente, (1º) a quem nos respectivos estatutos for designado para tal; (2º) à administração; (3º) a quem esta designe Cf. Pires de Lima e Antunes Varela, in “CC Anot.”, I, Coimbra Editora, 1987, pág. 166.. Como bem refere o MP na sua resposta, “…Dispõe o artº 19º Cremos que se trata de lapso a referência ao art.º 19º, já que actualmente o conteúdo referido e que para nós é relevante, consta do art.º 18º, dos referidos estatutos, tal como são apresentados no sítio do SMMP. do Estatuto do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, que trata das competências da Direcção, no seu nº 1 o seguinte “ Representar o Sindicato em todos os seus actos e instâncias, em quaisquer tribunais ou repartições e perante quaisquer autoridades.” O artº 20º Cremos que se trata, de novo, de um lapso, já que actualmente o conteúdo referido consta do art.º 19º. do mesmo diploma, que estabelece as atribuições dos membros da Direcção, postula no seu nº 1 “ O presidente representa o sindicato… .”. Da conjugação dos dois normativos facilmente se conclui que o presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público tem poderes estatutários para representar o sindicato em quaisquer tribunais ou quaisquer autoridades, e que é à pessoa do presidente, que é atribuída essa representação. … Resulta do artº 25º dos Estatutos da Associação Sindical de Juízes Portugueses no seu nº 1 que “A Direcção Nacional é o órgão colegial de representação e administração das ASPJ…” E no nº 2 al. a) do mesmo normativo reza que “Compete à Direcção Nacional: a) Representar, por intermédio do seu Presidente a ASPJ;“ …”. Acrescentamos que nem o art.º 15º dos Estatutos da ASJP, nem o art.º 15º dos Estatutos do SMMP reservam para as respectivas assembleias gerais o poder de decidir pleitear em juízo. Forçoso é, pois, concluir que os Presidentes do SMMP e da ASJP tinham poderes para apresentar as queixas e deduzir as acusações particulares aqui em causa, o que fizeram através dos respectivos Mandatários. Improcede, assim, nesta parte o recurso. * II – Verificamos que vindo o Recorrente pronunciado pela prática de 2 crimes de difamação qualificada, p. e p. pelos art.ºs 180º/1 e 183º/1-a)/2 do CP, a decisão recorrida o veio a condenar pelos mesmos factos, mas pela prática de 2 crimes de ofensa a pessoa colectiva, p. e p. pelos art.ºs 187º e 183º/1-a) e b)/2 do CP, sem que tenha feito a advertência prevista no art.º 358º/1/3 do CPP. A condenação do Arg. por factos diversos dos constantes da acusação, fora dos casos previstos nos art.°s 358º e 359º do CPP, constitui nulidade da sentença (art.º 379º/1-b) do CPP). Essa nulidade deve ser arguida e conhecida em sede de recurso (art.º 379º/2 do CPP), sendo de conhecimento oficioso Neste sentido, cf. o ac. da RP de 21/01/2002, relatado por Ernesto Nascimento, in www.gde.mj.pt, processo 0846847, do qual citamos: “…Antes das alterações introduzidas pela Lei 59/98, não havia dúvidas de que as nulidades da sentença constantes das alíneas a) e b) (as únicas então existentes) do artigo 379º C P Penal, eram nulidades sanáveis e, portanto, dependentes de arguição. Nesta conformidade, de resto, sobre o caso particular da nulidade prevista na alínea a) do art. 379º C P Penal, consistente na falta de indicação, na sentença penal, das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, ordenada pelo art. 374º nº 2, do mesmo diploma, decidiu o STJ, pelo Assento de 6.5.1992, in DR-I Série-A, de 6.8.1992, com dois votos de vencido, que tal nulidade não era insanável, por isso não lhe sendo aplicável a disciplina do corpo do artigo 119º C P Penal. Na mesma linha, pressupondo a necessidade de arguição, veio o Acórdão 1/94 do Plenário das secções criminais do STJ, in DR-I Série-A, de 11.2.1994, dispor apenas sobre a tempestividade dessa arguição, firmando jurisprudência no sentido de que as nulidades da sentença, previstas então nas alíneas a) e b) do artigo 379º C P Penal, poderiam ser ainda arguidas em motivação de recurso para o tribunal superior, à semelhança do que para o processo civil resulta da 2ª regra da 1ª parte do nº 3 do artigo 668º do C P Civil. No entanto, o enquadramento legal da questão sofreu modificação. Com a alteração introduzida através da Lei 59/98 de 25.8, no C P Penal, foi o artigo 379º foi reformulado, tendo-se aditando-se uma nova alínea, c) ao nº 1, bem como o nº 2, com a seguinte redacção: “as nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso, sendo lícito ao tribunal supri-las, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no art. 414º, nº 4”. Se a nova alínea introduzida no nº. 1 do artigo 379º C P Penal, tem redacção semelhante à contida na alínea d) do nº 1 do artigo 668º C P Civil, já o novo nº. 2 do artigo 379º C P Penal corresponde a uma transposição parcial do nº 3 do art. 668º CPC e à adopção da doutrina contida no Acórdão 1/94, indo, porém, mais longe. Enquanto no regime do C P Civil, a arguição das nulidades pode ser feita em sede de motivação de recurso, no nº 2 do artigo 379º, impõe-se essa arguição nessa altura, “as nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso”. A parte final desta expressão só pode significar o conhecimento oficioso dessas nulidades, justificando-se o afastamento do regime previsto no processo civil, que diversamente do penal, é enformado pelo princípio da livre disponibilidade das partes processuais, neste sentido cfr. Ac. STJ de 12.9.2007, relator Silva Flor, consultável no site da dgsi. No sentido de que a nulidade do alínea a) do nº. 1 do artigo 379º C P Penal é do conhecimento oficioso, decidiram, entre outros, os Acs STJ de 12.9.2007, relator Raul Borges e de 17.10.2007….”. E o ac. da RP de 25/03/2009, relatado por Cravo Roxo, in www.gde.mj.pt, processo 0740063, do qual citamos: “…É aqui que a jurisprudência se tem dividido, entendendo uma parte que tais vícios não são de conhecimento oficioso e uma outra, não menos importante, que os considera passíveis de ser conhecidos em recurso, mesmo que não alegados. No sentido do conhecimento oficioso das nulidades da sentença, vejam-se os Ac. desta Relação, de 29.9.2994, processo nº 0442419, relatado por António Gama (dgsi.pt) e da Relação de Coimbra, de 24.2.2004, processo nº 2701/04, relatado por João Trindade, entre muitos outros, ainda inéditos (sendo mesmo hoje a posição maioritária no Supremo Tribunal de Justiça). E tem razão de ser tal conclusão, desde logo em sede de interpretação hermenêutica: a norma explicita, taxativamente, que as nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso, argumento fundamental no sentido do seu conhecimento oficioso; de outra forma, o termo “conhecidas” não faria qualquer sentido, ao surgir depois do termo “arguidas”. Propendemos, decididamente, para o conhecimento oficioso das nulidades da sentença, previstas no citado Art. 379º do Código de Processo Penal. …”.. Mas, neste caso, não estamos em face da referida nulidade, prevista no art.º 379º/1-b) do CPP, porque esta só se verifica quando a condenação o for por factos diversos dos constantes da acusação, que não por uma qualificação diferente dos mesmos Neste sentido, cf. o acórdão do STJ de 06/04/2006, relatado por Simas Santos, in CJSTJ, tomo II, pág. 161 e segs., do qual citamos: “…Como se disse, o recorrente suscita a questão da nulidade da decisão recorrida, nos termos do art. 379º, nº.1 b) do CPP, com um duplo fundamento: violação do disposto nos arts. 358º e 359º do CPP (conclusão 7ª). A violação do art. 358º do CPP consubstanciar-se-ia na sua condenação pela prática de crimes de falsificação de documento do art. 256º, nº.1 a) e nº. 3 do CP, quando se encontrava pronunciada pela prática de tais crimes, mas pela al. c) do nº. 1, assim tendo sido alterada a qualificação jurídica dos factos descritos na pronúncia, sem contudo se observar o disposto no art. 358º do CPP (conclusões 1ª a 4ª). Já a violação do art. 359º do CPP resultaria da circunstância de, tendo sido pronunciado pela prática de dois crimes de burla qualificada dos arts. 217º, nº.1 e 218º, nº. 1, al. b) do CP, ter sido condenado pela prática de dois crimes de burla dos arts. 217º, nº.1 do CP, com base em factos novos, diversos dos descritos na pronúncia, sem que tivesse sido dado cumprimento ao disposto no art. 359º do CPP (conclusões 1º, 2ª,5ª e 6ª). Dispõe-se na al. b) do nº.1 do art. 379º, invocada pelo recorrente, que é nula a sentença que condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstos nos arts. 358º e 359º do mesmo diploma. Remete-nos, pois, esta norma para a disciplina da alteração (substancial e não substancial) dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, como rezam as epígrafes daqueles dois arts. De acordo com o art. 358º, se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, que não derive de factos alegados pela defesa, com relevo para a decisão da causa, o presidente comunica a alteração ao arguido e concede-lhe (se requerido) o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa (nºs. 1 e 2). Segundo o art. 359º, tratando-se de uma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia (aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis - al. f) do art. 1º) não pode ser tomada em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em que se verificar, salvo se o arguido e o assistente estiverem de acordo com a continuação do julgamento pelos novos factos e se estes não determinarem a incompetência do tribunal (nºs 1 e 2). O grau e importância da novidade, que constitui para o arguido a imputação de outros factos, no quadro de uma mesma incriminação (art. 358º), ou no quadro de uma nova incriminação (art. 359º), impõe que o mesmo se possa deles defender, com uma latitude diversa e crescente, conforme a sua importância e significado. Ponto é que se trate de alteração de factos e não só de incriminação, como resulta bem do referencial que, nesta matéria, constitui essa expressão (cfr. o Ac. STJ de 19.9.96, proc. nº. 48891). …”., como acontece no presente caso. * III – Entende o Recorrente que a decisão recorrida padece do vício de contradição insanável entre os factos dados como provados em u) e cc), porque “…como resulta dos autos, em especial das acusações particulares deduzidas, o Recorrente não proferiu quaisquer afirmações perante a Primeira Comissão (Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República), mas sim em sede de Comissão de Ética Esta contradição não é, de todo, irrelevante, pois que vem o Recorrente condenado por, alegadamente, ter provocado dano no bem “prestígio dos Assistentes”, isto é, no domínio específico da sua atuação sindical, perante a Comissão de DLG da AR, O QUE É FALSO. É assim que, não foi feita prova suficiente de modo a que se pudesse considerar provado que: Alínea r) dos factos provados: Nunca nenhum membro da Assistente ASJP facultou a qualquer jornalista processos, documentos ou informações, em violação do segredo de justiça ou das regras deontológicas e éticas por que se regem os juízes. …”. Os vícios de apreciação da prova, previstos no art.º 410º/2 do CPP são de conhecimento oficioso Cf. Ac. do STJ de 19/10/1995, in DR 1ª Série A, de 12/28/1995, que fixou jurisprudência no sentido de que é oficioso o conhecimento, pelo tribunal de recurso, dos vícios indicados no citado art.º 410.º/2 CPP. e têm que resultar do próprio texto da decisão recorrida por si só ou conjugada com as regras da experiência comum Assim o Ac. do STJ de 19/12/1990, proc. 413271/3.ª Secção: " I - Como resulta expressis verbis do art. 410.° do C.P.Penal, os vícios nele referidos têm que resultar da própria decisão recorrida, na sua globalidade, mas sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, designadamente declarações ou depoimentos exarados no processo durante o inquérito ou a instrução ou até mesmo no julgamento (...). IV É portanto inoperante alegar o que os declarantes afirmaram no inquérito, na instrução ou no julgamento em motivação de recursos interpostos".. “… há contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou, quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face à colisão entre os fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os provados e os não provados se contradigam entre si ou por forma a excluírem-se mutuamente.” Simas Santos e Leal-Henriques, in “Recursos em Processo Penal”, 7ª edição, 2008, p. 75.. É o seguinte o teor de tais alíneas: “u) As afirmações do Arguido foram proferidas na Assembleia da República, mormente na 1ª Comissão (Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias), espaço de eleição no relacionamento da A.S.J.P. com os Senhores Deputados da 1ª Comissão, e também mediante audiências com os Grupos Parlamentares. cc) O Arguido bem sabia que as palavras que proferiu, lendo-as, em sede de Comissão de Ética, com pertinência à Assistente A.S.J.P., eram ofensivas da honra e consideração devidas à mesma.”. Além destas, a alínea d) dos factos provados tem o seguinte teor: “d) No dia 6 de Abril de 2010, no âmbito da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura da Assembleia da República, o Arguido foi chamado a prestar declarações.”. É forçoso concluir que existe uma contradição entre estes factos dados como provados, porque se contradizem entre si, excluindo-se mutuamente. Na verdade, naquela ocasião, o Arg. não podia ter proferido as expressões em causa numa e noutra Comissões, salvo se tivessem funcionado conjuntamente, o que não foi o caso. Mas quando se verifica este tipo de vício, o processo só deve ser devolvido à 1.ª Instância se o tribunal superior não dispuser dos elementos necessários à sua sanação (art.ºs 430º e 431º/a) do CPP). Ora dos autos e da sentença resulta inequívoco que as declarações iniciais do Arg. forma proferidas na Comissão de Ética, Sociedade e Cultura e não na Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, pelo que a contradição se sana excluindo da alínea u) o segmento “…mormente na 1ª Comissão (Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias), …”, o que faremos. Procedente, pois, nesta parte o recurso. * Aproveitamos o ensejo para consignar que não vislumbramos a decisão recorrida qualquer outro dos vícios de apreciação da prova, previstos no art.º 410º/2 do CPP. * IV – Entende o Recorrente que o tribunal recorrido ouviu, como declarantes, mais do que um representante de cada uma das Assistentes e, como testemunhas, pessoas pertencentes aos corpos sociais da Assistentes e essas declarações e depoimentos foram valoradas para a prova dos danos, o que implica a nulidade do julgamento. Antes do mais, importa realçar que o que o Recorrente suscita são questões relativas à violação das regras da produção da prova e não à valoração de prova proibida Nesse sentido, ver Luís Bértolo Rosa, in “Consequências Processuais das Proibições de Prova”, RPCC 20 (2010), págs. 219 a 277, donde citamos: “…Dentro das proibições de prova, distinguem-se tradicionalmente três categorias. As proibições de tema de prova têm no segredo de Estado, previsto no artigo 137.°, o seu exemplo paradigmático. As proibições de meios de prova vêm previstas nos artigos 129.°, n.° 1, 130.°, n.° 1, 134.°, n.°2, e 356.°, v. g. proibição do depoimento indirecto e do depoimento de testemunhas não esclarecidas acerca da faculdade de recusa, proibição de reprodução de vozes e rumores públicos e proibição de leitura em audiência de autos ou declarações. Por fim, as proibições de métodos de obtenção de prova encontram a sua sede no artigo 126.°, cabendo distinguir as proibições absolutas do artigo 126.°, n.os 1 e 2, das proibições relativas do artigo 126.°, n.° 3. …”.. Tratando-se de questões atinentes às regras de produção de prova, a sua violação não tem o efeito de impedir a sua valoração Nesse sentido, ver o acórdão do STJ de 02/04/2008, relatado por Santos Cabral, in www.gde.mj.pt, processo 08P578, do qual citamos: “…Reportando-nos ao ensinamento de Costa Andrade entende-se que a necessária delimitação temática e precisão conceitual obriga a referenciar e tentar clarificar a fronteira separa as proibições de prova das meras regras de produção da prova (Beweisregelungen ou Beweisverfahrensregeln). Invocando Gossel, acentua o mesmo Autor, que as proibições de prova são «barreiras colocadas à determinação dos factos que constituem objecto do processo». Mais do que a modalidade do seu enunciado, o que define proibição de prova é a prescrição de um limite à descoberta da verdade. Normalmente formulada como proibição, a proibição de prova pode igualmente ser ditada através de uma imposição e, mesmo, de uma permissão. É que, como assinala, toda a regra relativa à averiguação dos factos proíbe ao mesmo tempo as vias não permitidas de averiguação. Diferentemente, as regras de produção da prova - cfr. v. g. o artigo 341.° do CPP - visam apenas disciplinar o procedimento exterior da realização da prova na diversidade dos seus meios e métodos, não determinando a sua violação a reafirmação contrafáctica através da proibição de valoração. As regras de produção da prova configuram, na caracterização de FIGUEIREDO DIAS, «meras prescrições ordenativas de produção da prova, cuja violação não poderia acarretar a proibição de valorar como prova ( ... ) mas unicamente a eventual responsabilidade (disciplinar, interna) do seu autor». Umas vezes pré-ordenadas à maximização da verdade material (como forma de assegurar a solvabilidade técnico-científica do meio de prova em causa), as regras de produção da prova podem igualmente ser ditadas para obviar ao sacrifício desnecessário e desproporcionado de determinados bens jurídicos. Resumidamente, e como afirma Peters, as regras de produção prova são «ordenações do processo que devem possibilitar e assegurar a realização da prova. Elas visam dirigir o curso da obtenção da prova sem excluir a prova. As regras de produção da prova têm assim a tendência oposta à das proibições de prova. Do que aqui se trata não é de estabelecer limites à prova como sucede com as proibições prova, mas apenas de disciplinar os processos e modos como a prova deve ser regularmente levada a cabo». Na caracterização convergente de Amelung: «muitas normas de conduta que os órgãos perseguição penal têm de observar nos actos de intromissão na informação, não tutelam, porém, o domínio sobre a informação do portador do direito atingido, mas outros interesses. Daí que a inobservância de tais normas de conduta não determine, só por si, uma distribuição ilícita da informação.…”. No mesmo sentido, ver Luís Bértolo Rosa, in “Consequências Processuais das Proibições de Prova”, RPCC 20 (2010), págs. 219 a 277, donde citamos: “…As proibições de prova dizem-se distintas das regras de produção de prova, meras formalidades que «visam disciplinar o procedimento exterior da realização da prova» e que por isso não geram uma proibição de valoração.…”.. Ouvir determinado indivíduo como assistente, parte civil ou testemunha em processo penal tem muito pouca relevância, uma vez que a única diferença de procedimento é a de que as declarações daqueles não são precedidas de juramento (art.º 145º/4 do CPP), sendo sempre livremente apreciadas Nesse sentido, ver Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, II, Verbo, 2008, pág. 209, e Maia Gonçalves, in “CPP Anot.”, Almedina, 1997, pág. 304., tendo, naturalmente, o julgador em conta o seu interesse na causa. Por isso, independentemente de determinarmos se aquelas pessoas em concreto deveriam ter sido ouvidas como testemunhas ou como assistentes ou partes civis, sempre o teor do que disseram podia ter sido valorado pelo tribunal recorrido. Por outro lado, no processo penal não têm aplicação as regras relativas ao depoimento de parte em processo civil, contrariamente ao que pretende o Recorrente. Na verdade, “Se tiver lugar pedido civil, constituem igualmente objecto da prova os factos relevantes para a determinação da responsabilidade civil.” (art.º124º/2 do CPP), “A prestação de declarações pelo assistente e pelas partes civis fica sujeita ao regime de prestação da prova testemunhal, salvo no que lhe for manifestamente inaplicável e no que a lei dispuser diferentemente.” (art.º 145º/3 do CPP) e “A testemunha é inquirida sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto da prova.” (art.º 128º/1 do CPP), pelo que, em processo penal, os assistentes e partes civis prestam declarações sobre todo o objecto da prova, mesmo sobre a matéria dos pedidos cíveis que tenham formulado, sem as limitações eventualmente existentes no regime do depoimento de parte em processo civil Nesse sentido, ver Simas Santos/Leal-Henriques, in “CPP Anot.”, I, Rei dos Livros, 1999, pág. 785, donde citamos: “… sendo certo que tais declarações serão sempre livremente apreciadas e valoradas, nos termos e no quadro do princípio genérico da livre apreciação da prova consagrado no art.º 127º. …”.. Improcede, pois, nesta parte o recurso. * V – Entende o Recorrente que se devem considerar não escritas as alíneas r) e s) dos factos provados, porque extravasam o objecto do processo, uma vez que o Arg. não vem acusado de ter imputado a qualquer magistrado membro das Assistentes os comportamentos aqui em causa. Mas não lhe assiste razão, uma vez que, como vimos, as acções das pessoas colectivas são sempre materialmente praticadas por pessoas físicas e, portanto, os factos que o Arg. imputou às Assistentes teriam sempre que ter sido praticados por magistrados seus membros. * VI – Entende o Recorrente que as alíneas t), w), x), y), gg) a kk) e ss) dos factos dados como provados contêm asserções e conclusões de direito (que não especificou) que não devem constar da matéria provada, pelo que delas devem ser expurgadas. Como vimos, a fundamentação da matéria de facto, nos termos do disposto no art.º 374º/2 do CPP, implica a “…enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto …”. Factos são as ocorrências concretas da vida real, bem como o estado, a qualidade ou a situação real das pessoas ou das coisas Antunes Varela/J. Miguel Bezerra/Sampaio e Nora, in “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1984, a págs. 391 e ss.. Ou, como diz Alberto dos Reis, “… É questão de facto tudo o que tende a apurar quaisquer ocorrências da vida real, quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças operadas no mundo exterior; …”, in “CPC Anot.”, vol. III, 4ª ed., Coimbra editora, 1985, pág. 206., mas importa precisar que, do ponto de vista jurisdicional, facto é o objecto da prova, pelo que é impossível falar de facto separando-o completamente do direito, sendo que corresponde à enunciação de um facto e não ao objecto empírico que é enunciado e está dependente do sujeito que realiza a enunciação Nesse sentido, ver Mouraz Lopes, in “A fundamentação da Sentença no Sistema Português”, Almedina, 2011, págs. 223 a 227, donde citamos: “… Os factos são «acontecimentos, circunstâncias, relações, objectos e estados, todos eles situados no passado, espácio-temporalmente ou mesmo só temporalmente determinados, pertencentes ao domínio da percepção externa ou interna e ordenados de forma natural»(…). Uma definição deste tipo não é suficiente, em termos operativos, para efeitos da decisão. Daí que o conceito utilizado no âmbito da teoria da prova, ou seja, aquele entendimento de que os factos consubstanciam os «eventos» cm torno dos quais é possível articular um discurso de verdade ou falsidade sobre um determinado enunciado empírico(…) pode afirmar-se como pragmaticamente vantajoso, constituindo um dado comum nas diversas culturas jurídicas, no sentido de que «o facto é o "objecto" da prova ou a sua finalidade fundamental»(…). Esta definição aparentemente simples não omite a complexidade da questão da prova dos factos e os múltiplos problemas que suscita ao tribunal, bem como a sua abordagem dogmática. Cingindo-nos ao objecto do trabalho, atente-se desde logo na constatação de que «no processo se demonstrarem factos não para satisfazer exigências de conhecimento em estado puro, mas antes para resolver controvérsias jurídicas»(…), devendo essa circunstância estar bem presente no processo de construção da decisão. Como primeira consequência do que ficou referido é, desde logo, impossível falar do facto separando-o completamente do «direito», esquecendo as suas implicações jurídicas(…). Trabalhar o facto de um ponto de vista jurisdicional comporta sempre um efeito jurídico vinculante. Os factos não existem por si e para si mesmos mas sim em função das suas consequências jurídicas. Na construção da narrativa judicial aqueles que aí intervêm devem assumir aquela vinculação. Num segundo momento e já assumindo o conceito «probatório» de facto constata-se a dificuldade de definição de um modo não superficial do que se entende por «facto», enquanto objecto de prova, tendo em conta a «extrema variabilidade e indeterminação dos fenómenos do mundo real»(…). Uma resposta à determinabilidade do facto para efeitos da prova no processo começa, desde logo, segundo Taruffo, pela compreensão do «facto que constitui o objecto da prova em função do contexto que determina a descrição (o tipo de descrição) apropriada a esse facto»(…). Esse contexto de descrição é, no âmbito do processo, a decisão. Ou seja, segundo Taruffo, a «determinação do facto situa-se no interior da decisão judicial e a prova está dirigida à determinação do facto»(…). O objecto da prova é o facto que deve ser determinado. Ora a individualização do contexto de decisão como esquema de referência em função do qual se define o facto como objecto de prova, permite determinar duas perspectivas distintas mas convergentes para a individualização do que constitui o objecto de prova. A primeira perspectiva refere-se directamente ao contexto de decisão, «no sentido de que obtém dele as coordenadas que definem teoricamente o objecto da prova. A segunda perspectiva refere-se às modalidades através das quais o objecto de prova é concretamente individualizado e fixado no processo com referência ao concreto suposto de facto controvertido»(…). Uma aproximação ao facto, como elemento operativo fundamental no domínio do processo (e do processo penal em particular), leva-nos num terceiro momento à constatação de que o facto objecto do conhecimento processual é «o que se disse acerca do facto». Ou seja, quando se fala de factos trata-se «da enunciação de um facto e não o objecto empírico que é enunciado»(…). No processo de decisão, segundo Jackson, «quando os juízes e o júri têm que decidir questões de facto estão sujeitos (como notou Jerome Frank) a uma dupla refracção: estão sujeitos à percepção original, pelas testemunhas, dos acontecimentos que relatam; e à percepção, pelo tribunal, do comportamento das testemunhas»(…). A identificação dos conceitos epistemológicos e empíricos é relevante na medida em que permite a enunciação operativa de tipologias de factos diversificados, nomeadamente a distinção entre factos simples e complexos, individuais e colectivos, positivos ou negativos cuja repercussão, no domínio procedimental, surge como pragmaticamente útil. Sublinhe-se, no entanto, que todas estas distinções referem-se à forma como os factos são definidos e não à sua realidade empírica(…). O conjunto de dicotomias identificado assume uma especial relevância no próprio modo de produção de prova e naturalmente, no modo como a sua fundamentação pode ou deve ser efectuada na decisão. A prova de factos simples pode ser diversa da prova de factos complexos e consequentemente pode ser diferente a fundamentação exigida relativamente à justificação da prova de factos complexos ou à justificação da prova de factos simples. De igual forma os factos principais e os factos secundários podem ter uma diversa exigência de prova e uma fundamentação também ela diferenciada. Pode assim concluir-se que «todo o enunciado fáctico é um entre muitos enunciados possíveis acerca do mesmo facto, que é seleccionado e «preferido» em relação aos demais enunciados possíveis em função de elementos do contexto em que é empregue. Isto é, depende do sujeito que realiza a enunciação (definição, hipótese, descrição, etc.), dos critérios que emprega para individualizar o facto (grau de precisão, presença ou ausência de valoração ou de qualificação jurídica) e da linguagem que se usa (comum ou jurídica, vaga ou precisa, etc.)»(…). Uma outra consequência relevante da constatação da contextualização dos factos entendidos como «enunciados» de facto e não apenas como realidades empíricas, tem a ver com a questão da verdade(…). Quando se fala de «factos» verdadeiros ou falsos, no âmbito do processo, é aos «enunciados» de factos que se aplicam aquelas qualificações. «Os factos materiais existem ou não existem, mas não tem sentido dizer que são falsos ou verdadeiros; só os enunciados fácticos podem ser verdadeiros, se se referirem a i actos materiais que ocorreram ou falsos, se afirmam factos materiais não ocorridos. Em consequência, a «verdade do facto» é unicamente uma fórmula elíptica para se referir à verdade do enunciado que tem por objecto um facto»(…). São os factos, no sentido de enunciados fácticos, o objecto principal do processo de decisão, vinculadamente adstritos à hipótese acusatória, sobre os quais irá reconduzir-se o processo probatório. São os factos que constituem a acusação e a defesa que são objecto de prova num procedimento público e contraditório (e que por isso podem vir a ser alterados por virtude da própria hipótese defensiva ou pelo impulso «inquisitório» do juiz na busca da verdade material) que irão constituir a decisão final. …”.. Os factos a enumerar na sentença penal “… são todos os constantes da acusação e da contestação, quer sejam substanciais quer instrumentais ou acidentais, e ainda os não substanciais que resultarem da discussão da causa e que sejam relevantes para a decisão e também os substanciais que resultarem da discussão da causa, quando aceites nos termos do art. 359º, n.º 2. …” Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, III, Verbo, 2009, pág. 287., ou seja, factos relativos aos elementos (quer objectivos, quer subjectivos) do crime, ao circunstancialismo que deva ser tido em conta na escolha e determinação da medida concreta da pena, nos termos do disposto no art. 71º/1/2 do CP, e à determinação da indemnização, conforme decorre da conjugação do disposto nos art.ºs 71º do CP, 283º/3-b), 368º/2, 369º e 374º/2 do CPP Nesse sentido é pacífica a jurisprudência do STJ, conforme anotação de Vinício Ribeiro, in “CPP – Notas e comentários”, Coimbra editora, 2008, p. 786. Dessa jurisprudência citamos o acórdão do STJ de 28/09/1994, relatado por Teixeira do Carmo, in CJSTJ, III, donde citamos: “…Estatui-se no nº 2 do artº 374º citado que "Ao relatório (parte que começa a sentença) segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal". E logo no artº 379º, al. a), também citado, se comina que é nula a sentença "que não contiver as menções referidas no artº 374º, nºs 2 e 3, al. b)...". Correspondendo aquele artº 374º ao artº 450º do Cód. de Proc. Penal de 1929, temos que neste último se preceituava, além do mais, que a sentença condenatória deveria conter "Os factos que se julgaram provados, distinguindo os que constituem a infracção dos que são circunstâncias agravantes ou atenuantes" (nº 3). Sendo o Cód. de Proc. Penal - 6ª Edição, de Maia G., a pág. 535, em anotação ao referido artº 450º, aí se refere que a enumeração dos factos feita no nº 3 não está completa, pois que, "Como resulta de outras disposições, nomeadamente dos artºs 446º e 448º, a sentença deve incluir todos os factos relevantes para a decisão de mérito, e não só os aludidos no nº 3". (o sublinhado é nosso). Entende ou sustenta a Ilustre Magistrada do Ministério Público junto da 1ª Instância, na sua Resposta, que o preceito do Cód. de Proc. Penal vigente, a que vimos de aludir, tem de ser interpretado como aludindo a "todos os factos relevantes para a decisão de mérito" e só eles. Dos factos provados só se indicarão os que vêm a influir na decisão, sendo que o mesmo entendimento há-de ser observado ou mantido quanto aos factos não provados. E adianta: "Se se pretendesse que fossem indicados "todos" os factos provados e "os factos não provados" a redacção seria diferente" dizendo-se, então, "... consta da enumeração de todos os factos provados e todos os factos não provados". Concordamos com tal posição. O nº 2 do artº 374º do Cód. Proc. Penal vigente deve, nesta parte, ser entendido ou interpretado por forma a significar que a fundamentação - 2ª parte da sentença - consta da indicação dos factos que influam na proferição da decisão, sejam os provados ou os não provados, e não de todos os factos provados e de todos os não provados. …”.. Pode-se corrigir a linguagem usada na alegação de factos na acusação e noutras peças processuais Nesse sentido, ver acórdão da RE de 08/11/2011, relatado por Ana Brito, no processo 411/05.5TALGS.E1, in www.gde.mj.pt, de cujo sumário citamos: “… VII. Mas, embora a acusação limite o objecto do processo, fixando também, em consequência, os limites dos poderes de cognição do tribunal, tal não implica que o julgador fique prisioneiro da linguagem utilizada pelo MP na acusação, podendo aperfeiçoá-la e completá-la, desde que não acrescente ou altere factos, no sentido de novos factos (fora do quadro legal previsto nos arts 358º e 359º do CPP). …”. No mesmo sentido, ver o acórdão da RG de 17/05/2010, relatado por Maria Augusta, no processo 248/07.7GAFLG.G1, in www.gde.mj.pt, donde citamos: “…Não é, obviamente, exigível que os factos provados e não provados sejam ipsis verbis os da acusação ou da contestação. …”.. Só os factos relevantes devem constar da fundamentação de facto Nesse sentido, ver o acórdão do STJ de 29/06/1995, relatado por Lopes Pinto, in CJSTJ, tomo II, pág. 254 e ss., donde citamos: “… Esses factos (provados e não-provados) hão-de ser os essenciais à caracterização do crime e suas circunstâncias relevantes juridicamente, que influenciam na determinação da medida da pena - os factos inócuos, ainda que incluídos na acusação e/ou contestação não têm de ser enumerados (vd., entre outros, acs. STJ in CJ XVI/2/19 e CJ STJ 11/1/246). …”. No mesmo sentido, ver o acórdão do STJ de 15/01/1997, relatado por Rosa Ribeiro Coelho, in CJSTJ, tomo I, pág. 181 e ss., donde citamos: “…Esta exigência visa garantir que o tribunal contemplou todos os factos que foram submetidos à sua apreciação; como se disse no acórdão deste STJ de 26/3/92, BMJ nº 415, pág. 499, "a lei visa assegurar ou garantir o desempenho da exaustiva cognição, abranger a totalidade do "thema probandum"". Porém, esta garantia tem que ser articulada com o fim em vista - a decisão de uma causa-, só tendo sentido enquanto se refere a factos úteis a essa decisão, na aplicação da ideia de que compete ao tribunal proceder a uma condensação que expurgue aquilo que não interessa. Assim, tem igualmente este STJ entendido que a descrição dos factos provados e não provados se refere aos que são essenciais à caracterização do crime e suas circunstância juridicamente relevantes, o que exclui os factos inócuos, irrelevantes para a qualificação do crime ou para a graduação da responsabilidade do arguido, mesmo que descritos na acusação - acórdão de 3/4/91, Col. Jur. 1991-II-19-, e não compreende os factos que não influam no proferimento da decisão - acórdão de 28/9/94, Col. Jur. - S.T.J. 1994/III/206, que apreciou um caso em que, como sucedeu nos presentes autos, nada se mencionou quanto aos factos não provados. Isto é igualmente de entender quanto aos factos alegados na contestação, já que as garantias de defesa apenas obrigam a que se considere o que foi alegado utilmente na sua óptica, e não o que é matéria irrelevante e excrescente. …”. No mesmo sentido, ver o acórdão da RG de 17/05/2010, relatado por Maria Augusta, no processo 248/07.7GAFLG.G1, in www.gde.mj.pt, donde citamos: “…Quanto aos factos provados e não provados, devem indicar-se todos os que constam da acusação e da contestação, “quer sejam substanciais quer instrumentais ou acidentais, e ainda os não substanciais que resultarem da discussão da causa e que sejam relevantes para a decisão e também os substanciais que resultarem da discussão da causa, quando aceites nos termos do art.359º, nº2”. O que importa é que os factos sejam relevantes para a decisão da causa. E relevantes serão todos os factos essenciais à caracterização do crime ou integradores de causas de exclusão. Como é óbvio, os factos inócuos não têm que fazer parte dessa indicação e os conceitos de direito e as conclusões de facto, quer constem da acusação quer da contestação, não podem dela fazer parte. …”. No mesmo sentido, ver o acórdão da RC de 08/02/2012, relatado por Alberto Mira, no processo 38/10.0TAFIG.C1, in www.gde.mj.pt, donde citamos: “…Contudo, a razão de ser do art. 374.º, n.º 2, na vertente que ora importa ter em conta, tem de ser conexionada com o fim do processo penal, ou seja, só tem sentido a aplicação daquela da norma enquanto estiverem em causa, como se disse, factos relevantes para a decisão de mérito[…]. Como reiteradamente vem acentuando o Supremo Tribunal de Justiça, o cumprimento do art. 374.º, n.º 2, do CPP, não impõe a enumeração dos factos provados e não provados que sejam irrelevantes para a caracterização do crime e/ou para a medida da pena[…], sendo certo que essa irrelevância deve ser vista com rigor, em função do factualismo inerente às posições da acusação e da defesa e bem assim aos contornos das diversas possibilidades de aplicação do direito ao caso concreto – seja quanto à imputabilidade, seja relativamente à qualificação jurídico-criminal dos factos, seja quanto às consequências jurídicas do crime, designadamente quanto à espécie e medida da pena –, tendo em conta os termos das referidas posições assumidas pela acusação e pela defesa e os poderes de cognição oficiosa que cabem ao tribunal. Só pode por isso decidir-se no sentido dessa inocuidade ou irrelevância no caso de a sua verificação resultar suficientemente segura à luz destas considerações, essenciais à prossecução cuidada da justiça penal concreta. …”.. Atentos estes parâmetros, analisemos as referidas alíneas: A expressão “… ofenderam … a credibilidade…” (al. t)), embora contenha uma dimensão fáctica e tenha o sentido de afectar, contém já um juízo, que, ainda por cima, corresponde à expressão contida no tipo legal, pelo que a substituiremos por esta expressão (afectaram); Já as expressões “A honorabilidade … foi fortemente afectada…” (al. w)), “… aptas a denegrir e denegriram…” (als. x) e y)), embora tenham uma dimensão valorativa, inarredável quando estão em causa bens imateriais e, portanto, incomensuráveis, correspondem a factos, pelo que as manteremos inalteradas; Não vislumbramos nas als. gg), hh) e ii) qualquer expressão de direito ou valorativa que deva ser eliminada; As als. jj) e kk) são conclusões de direito, perfeitamente legítimas, mas que devem constar da fundamentação de direito e não na de facto, pelo que as consideraremos não escritas nesta sede; Por último, “… são definitivamente postos em causa pelas afirmações propaladas pelo Arguido…” (al. ss)) é uma conclusão de direito, pelo que a consideraremos não escrita nesta sede. * VII – Entende o Recorrente que a decisão recorrida não devia ter dado como provados os factos constantes das alíneas t), w), x), y), cc), dd) e kk) a ww), porque não foi isso que resultou da prova produzida em audiência. Antes do mais, consideramos que a impugnação do facto constante da al. ww) dos factos dados como provados se deverá a lapso, uma vez que se refere à primariedade do Arg. e essa resulta, como da decisão recorrida consta, do CRC Certificado do Registo Criminal. de fls. 479. Por outro lado, as als. kk), ll), mm), nn) e vv) dos factos dados como provados contêm conclusões de direito, perfeitamente legítimas, mas que devem constar da fundamentação de direito e não na de facto, pelo que, nos termos já supra referidos, as consideraremos não escritas nesta sede. A expressão “… ofenderam … a credibilidade…” (al. oo)), embora contenha uma dimensão fáctica e tenha o sentido de afectar, contém já um juízo, que, ainda por cima, corresponde à expressão contida no tipo legal, pelo que a substituiremos por esta expressão (afectaram), nos termos já supra referidos para a al. t). Quanto às restantes alíneas, o que invoca, pois, é a existência de erro na avaliação dos depoimentos e declarações dos intervenientes, bem como da restante prova produzida em audiência ou constante dos autos. A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação da prova pelo juiz. Este princípio da livre apreciação da prova está consagrado no art. 127º do CPP nos seguintes termos «... a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente». E embora este Tribunal da Relação tenha poderes de intromissão em aspectos fácticos, e que são os referidos no art. 410º/2/3 do CPP, não pode sindicar a valoração das provas feitas pelo tribunal em termos de o criticar por ter dado prevalência a uma em detrimento de outra, salvo se houver erros de julgamento e as provas produzidas impuserem outras conclusões de facto Importa considerar que, como se afirma no Ac. do STJ de 17/02/2005, relatado por Simas Santos, in www.dgsi.pt, processo 04P4324, “1 - O recurso em matéria de facto para a Relação não constitui um novo julgamento em que toda a prova documentada é reapreciada pelo Tribunal Superior que, como se não tivesse havido o julgamento em 1.ª Instância, estabeleceria os factos provados e não provados e assim indirectamente validaria ou a factualidade anteriormente assente, mas é antes um remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa e específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados, ou com referência à regra de direito respeitante à prova que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e qual o sentido com que devia ter sido aplicada. 2 - Se o recorrente aceita que o teor expresso dos depoimentos prestados permite que a 1.ª Instância tenha estabelecido a factualidade apurada da forma como o fez e questiona tão só a credibilidade que, no seu entender, (não) deveria ter-lhes sido concedida, sem indicar elementos objectivos que imponham a sua posição, a sua pretensão fracassa pois a credibilidade dos depoimentos, quando estribadas elementos subjectivos e não objectivos é um sector especialmente dependente da imediação do Tribunal, dado que só o contacto directo com os depoentes situados na audiência de julgamento, perante os outros intervenientes é que permite formar uma convicção que não pode ser reproduzidas na documentação da prova e logo reexaminada em recurso. 3 - Se apesar de se esforçar, a 1.ª Instância não consegue estabelecer o motivo que levou o arguido a agir, mas estão presentes todos os elementos do respectivo tipo legal de crime, nenhuma dúvida se pode levantar sobre a culpabilidade do agente. …”. E no Ac. do STJ de 12/06/2008, relatado por Raul Borges, in www.dgsi.pt, processo 07P4375, de cujo sumário citamos: “I - A partir da reforma de 1998 passou a ser possível impugnar (para a Relação) a matéria de facto de duas formas: a já existente revista (então cognominada de ampliada ou alargada) com invocação dos vícios decisórios do art. 410.º, n.º 2, do CPP, com a possibilidade de sindicar as anomalias ou disfunções emergentes do texto da decisão, e uma outra, mais ampla e abrangente – porque não confinada ao texto da decisão –, com base nos elementos de documentação da prova produzida em julgamento, permitindo um efectivo grau de recurso em matéria de facto, mas impondo-se na sua adopção a observância de certas formalidades. II - No primeiro caso estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas als. a), b) e c) do n.º 2 do art. 410.º do CPP, cuja indagação, como resulta do preceito, apenas se poderá fazer através da leitura do texto da decisão recorrida, circunscrevendo-se a apreciação da matéria de facto ao que consta desse texto, por si só considerado ou em conjugação com as regras da experiência comum, sem possibilidade de apelo a outros elementos estranhos ao texto, mesmo que constem do processo. Nesta forma de impugnação os vícios da decisão têm de emergir, resultar do próprio texto, o que significa que os mesmos têm de ser intrínsecos à própria decisão como peça autónoma. III - No segundo caso, a apreciação já não se restringe ao texto da decisão, mas à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre a partir de balizas fornecidas pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus imposto pelos n.ºs 3 e 4 do art. 412.º do CPP, tendo em vista o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento e visando a modificação da matéria de facto, nos termos do art. 431.º, al. b), do mesmo diploma. IV - A alteração do art. 412.º do CPP operada em 1998 visou tornar admissível o recurso para a Relação da matéria de facto fixada pelo colectivo, dando seguimento à consagração do direito ao recurso resultante do aditamento da parte final do art. 32.º, n.º 1, da CRP na revisão da Lei Constitucional n.º 1/97, vindo a ser “confirmada” pelo acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 10/2005, de 20-10-2005 (in DR, I Série-A, de 07-12-2005), que estabeleceu: «Após as alterações ao Código de Processo Penal, introduzidas pela Lei n.º 59/98, de 25/08, em matéria de recursos, é admissível recurso para o Tribunal da Relação da matéria de facto fixada pelo tribunal colectivo». V - Esta possibilidade de sindicância de matéria de facto, não sendo tão restrita como a operada através da análise dos vícios decisórios – que se circunscreve ao texto da decisão em reapreciação –, por se debruçar sobre a prova produzida em audiência de julgamento, sofre, no entanto, quatro tipos de limitações: - desde logo, uma limitação decorrente da necessidade de observância, por parte do recorrente, de requisitos formais da motivação de recurso face à imposta delimitação precisa e concretizada dos pontos da matéria de facto controvertidos, que o recorrente considera incorrectamente julgados, com especificação das provas e referência ao conteúdo concreto dos depoimentos que o levam a concluir que o tribunal julgou incorrectamente e que impõem decisão diversa da recorrida, com o que se opera a delimitação do âmbito do recurso; - já ao nível do poder cognitivo do tribunal de recurso, temos a limitação decorrente da natural falta de oralidade e de imediação com as provas produzidas em audiência, circunscrevendo-se o “contacto” com as provas ao que consta das gravações e/ou, ainda, das transcrições; - por outro lado, há limites à pretendida reponderação de facto, já que a Relação não fará um segundo/novo julgamento, pois o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em 2.ª instância; a actividade da Relação cingir-se-á a uma intervenção cirúrgica, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação; - a jusante impor-se-á um último limite, que tem a ver com o facto de a reapreciação só poder determinar alteração à matéria de facto se se concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitem uma outra decisão. …”., Neste sentido, cf. ainda o Ac. do STJ de 25/03/1998, in BMJ 475/502, com anotação de que neste sentido se vinham orientando a doutrina e a jurisprudência., Neste sentido, ver também o Ac. RL, de 10/10/2007, relatado por Carlos Almeida, in www.dgsi.pt, processo 8428/2007-3, de cujo sumário citamos: “…XVII – No caso, embora a prova produzida e examinada na audiência permitisse, eventualmente, uma decisão em sentido diferente, ela não impunha decisão diversa da proferida, razão pela qual o recurso não pode ter provimento.”.. A garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência - visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto No mesmo sentido, cf. o Ac. do STJ de 20/11/2008, relatado por Santos Carvalho, in www.dgsi.pt, processo 08P3269, de cujo sumário citamos: “I - O STJ tem reafirmado que o recurso da matéria de facto perante a Relação não é um novo julgamento em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes é um remédio jurídico destinado a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros. II - Conhecendo-se pela fundamentação da sentença o caminho lógico que, segundo a 1ª instância, levou à condenação do recorrente, deveria este ter-se limitado a sindicar os pontos de facto que nesse percurso foram erradamente avaliados, com a indicação das provas que impunham uma decisão diversa e com referência aos respectivos suportes técnicos. …”.. Na formação da convicção do juiz não intervêm apenas factores racionalmente demonstráveis, referindo-se a relevância que têm para a formação da convicção do julgador «elementos intraduzíveis e subtis», tais como «a mímica e todo o aspecto exterior do depoente» e «as próprias reacções, por vezes quase imperceptíveis, do auditório» que vão agitando o espírito de quem julga (no mesmo sentido Castro Mendes, Direito Processual Civil, 1980, vol. III, pág. 211, para acrescentar depois, a págs. 271, que «existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percebidos, apreendidos, interiorizados ou valorizados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores»). O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique «os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado». E convém referir que quando o tribunal recorrido forma a sua convicção com provas não proibidas por lei, prevalece a convicção do tribunal sobre aquela que formule o Recorrente. Entendemos que “O recorrente não impugna de modo processualmente válido a decisão proferida sobre matéria de facto se se limita a procurar abalar a convicção assumida pelo tribunal recorrido, questionando a relevância dada aos depoimentos prestados em audiência. …” Acórdão da RP de 06/10/2010, relatado por Eduarda Lobo, in www.gde.mj.pt, processo 463/09.9JELSB.P1., No mesmo sentido, cf. o acórdão da RG de 28/06/2004, relatado por Heitor Gonçalves, in www.gde.mj.pt, processo 575/04-1, do qual citamos: “… Cremos que o recorrente pretende substituir essa convicção do julgador pela sua própria convicção, “escolhendo” os depoimentos que vão de encontro aos seus interesses processuais, quando é sabido que são os julgadores em primeira instância que detêm o poder/dever de apreciar livremente a prova, apreciação que, de todo o modo, no dizer do Prof. Figueiredo Dias, há-de ser, como foi no caso concreto, “recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e controlo”. Uma decisão errada, ilegal ou arbitrária não pode ser sustentada numa simples alegação da discordância entre a convicção do recorrente e a convicção que o julgador livremente formou com base na prova produzida em audiência de julgamento, antes passa necessariamente pela demonstração inequívoca de que o tribunal que a proferiu contrariou as regras da experiência e desrespeitou princípios basilares do direito probatório (v.g. prova legalmente vinculada, provas proibidas etc.). Quando o recorrente pretende apenas por em causa a livre apreciação da prova, o recurso estará irremediavelmente destinado à improcedência. É que, como se referiu, o tribunal é livre de dar credibilidade a determinados depoimentos, em detrimento de outros, desde que essa opção seja explicitada e convincente, como é o caso. Cumprida essa exigência, a livre convicção do juiz torna-se insindicável, até porque a documentação dos actos da audiência não se destina a substituir, nem substitui, a oralidade e a imediação da prova. Defender-se uma outra solução, o tribunal de recurso acabaria “por proceder a um juízo, mas com inversão das regras da audiência de julgamento ou então, numa espécie de juízos por parâmetros” (Damião da Cunha, O caso julgado Parcial, 2002, pág. 37). …”., como foi o caso, uma vez que o Recorrente se limitou a pôr em causa a convicção do tribunal, considerando que da prova produzida não resultam provados tais factos. Para além disso, o Recorrente não deu cumprimento ao disposto no art.º 412º/2/3 do CPP, porque não fez nas conclusões a especificação prevista no art.º 412º/2-b) do CPP. Está, pois, este tribunal impedido de reapreciar a matéria de facto fixada pelo tribunal recorrido. Sempre diremos, no entanto, que tendo em conta as passagens dos depoimentos e declarações transcritos pelo Recorrente no corpo da sua motivação, entendemos que as mesmas permitem mas não impõem que os referidos factos se dêem como não provados. O tribunal, na fundamentação da matéria de facto explicou claramente o caminho lógico que percorreu para dar como provada aquela matéria e, importa realçar, esse caminho foi razoável e corresponde a uma das soluções plausíveis segundo as regras da experiência, pelo que é inatacável Neste sentido, cf. o acórdão da RP de 10/05/2006, relatado por Paulo Valério, in www.gde.mj.pt, processo 0315948, do qual citamos: “… Como se diz no Ac. Rel. Coimbra de 6/12/2000 (www.dgsi.pt - Acórdãos da Relação de Coimbra) «o tribunal superior só em casos de excepção poderá afastar o juízo valorativo das provas feito pelo tribunal a quo, pois a análise do valor daquelas depende de atributos (carácter; probidade moral) que só são verdadeiramente apreensíveis pelo julgador de 1.ªinstância». Ou, consoante se escreveu no igualmente douto Ac. RelCoimbra de 3-11-2004 (recurso penal n.° 1417/04) «... é evidente que a valoração da prova por declarações e testemunhal depende, para além do conteúdo das declarações e dos depoimentos prestados, do modo como os mesmos são assumidos pelo declarante e pela testemunha e da forma como são transmitidos ao tribunal, circunstâncias que relevam, a par da postura e do comportamento geral do declarante e da testemunha, para efeitos de determinação da credibilidade deste meio de prova, por via da amostragem ou indiciação da personalidade, do carácter, da probidade moral e da isenção de quem declara ou testemunha » (Cfr. no mesmo sentido, entre outros: Ac de 02.06.19 e de 04.02.04, recursos n°s 1770/02 e 3960/03; Ac de. 02.06.19 e de 04.02.04, recursos n°s 1770/02 e 3960/03, todos da Relação de Coimbra). É que o juízo sobre a valoração da prova tem vários níveis. Num primeiro aspecto trata-se da credibilidade que merecem ao tribunal os meios de prova e depende substancialmente da imediação, e aqui intervêm elementos não racionais explicáveis. Num segundo nível, inerente à valoração da prova intervêm as deduções e induções que o julgador realiza a partir dos factos probatórios e, agora já as inferências não dependem substancialmente da imediação, mas hão-de basear-se na correcção do raciocínio que há-de fundamentar-se nas regras da lógica, princípio da experiência e conhecimentos científicos, tudo se podendo englobar na expressão regras da experiência. …”. Ora, sendo os factos dados como provados na sentença conclusões lógicas da prova produzida produzidas em audiência e plausíveis face a essas provas, a convicção assim formada pelo julgador não pode ser censurada, sob pena de se aniquilar a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade, como refere o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/09/2005 (em www.dgsi.pt/jstj.nsf/ com o nº 05A2007). Na verdade, refere o mesmo acórdão, «a convicção do tribunal é construída dialecticamente, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e das lacunas, das contradições, hesitações, inflexões de voz, (im)parcialidade, serenidade, olhares, "linguagem silenciosa e do comportamento", coerência do raciocínio e de atitude, seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, coincidências e inverosimilhanças que, por ventura, transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos ». Elementos que a transcrição não fornece e de que a reapreciação em sede de recurso não dispõe. “…”.. Para além disso, as alíneas t) a y) são matéria relativa aos danos sofridos pelas assistentes, tratando-se de danos não patrimoniais, pelo que sempre seria de considerar facto notório, que não carece de prova (art.º 514º/1 do CPC Código de Processo Civil.), que a imputação de factos torpes ou criminosos e não verdadeiros causa esse tipo de danos No mesmo sentido, cf. o acórdão do STJ de 09/02/1989, relatado por Ferreira da Silva, in www.gde.mj.pt, proc. 076718, de cujo sumário citamos: “…VI - Os factos integradores do dano não patrimonial quando forem do consenso geral, dispensam alegação e prova. …”. Também, ainda que relativamente a diferentes danos não patrimoniais, o acórdão do STJ de 25/11/1993, relatado por Folque Gouveia, in CJ, III, donde citamos: “… Como bem se frisa no aresto do Tribunal da Relação, basta que se prove a existência de um evento que normalmente signifique um dano que objectivamente ofenda o bem imaterial do crédito e reputação. O que, quanto aos factos mencionados no Acórdão - o de que a pessoa em causa, sendo um político, anda conforme o tocam, obedece onde julga que estão os seus interesses e que é uma pessoa sem carácter - faz ocorrer tal dano objectivo, pelo que, como as testemunhas puderam indiciariamente admitir que, face a tais factos, se mostram verificadas as ofensas ao crédito e reputação do recorrido, também através de dados naturais ou de experiência, o tribunal pode presumir a existência desses mesmos danos. Além de que o princípio consignado no art.º 566.º, n.º 3, do Cód. Civil para a impossibilidade de se averiguar o montante exacto dos danos, deve também valer, com as necessárias adaptações, para os casos de não ser possível demonstrar a existência de danos, podendo o Tribunal fixá-las equitativamente (art.º 496.º, n.º 3), dentro dos limites que os tiver como provados, pois seria violento que, em qualquer dos casos, o titular da indemnização ficasse dela privado. E, acresce que o art.º 514.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil dispensa de alegação e de prova os factos notórios, isto é, do conhecimento geral. Por conseguinte, desde que as circunstâncias fazem presumir a existência desses danos, no caso em apreço, não há obstáculo a que o tribunal equitativamente os julgue existentes e fixe o montante da indemnização, uma vez que esses danos são objectivamente graves, devido à intensidade das ofensas e atenta a personalidade e actividade profissional que o lesado exerce, como salienta a Relação. (Cfr. Acórdão deste Supremo Tribunal de 5 de Novembro de 1974 e a anotação que a este aresto lhe faz Vaz Serra, na Rev. Leg. e Jurisp., ano 108.º, pág. 315 e segs., e anotações do mesmo Professor, na mesma Revista, ano 105.º, pág. 44). …”. E o acórdão da RC de 30/01/2007, relatado por Tavares Mendes, in JusNet 7716/2007, do qual citamos: “… Quanto aos alegados danos não patrimoniais verificamos que relativamente ao pedido de indemnização formulado pelos AA nada foi referido na sentença recorrida para além da genérica referencia à inexistência de danos passíveis de indemnização. Entendendo-se, como entendemos, que existem factos suficientes para dar como provada, nesta sede, a prática pelos RR menores dos factos ilícitos geradores da obrigação de indemnizar e consubstanciando esses factos a previsão tipificada (pelo menos, abstracta) de um crime de furto, perpetrado através de uma introdução ilegítima na residência dos AA, é óbvio, resulta da experiência comum, pertence ao consenso geral, que tais factos são em si mesmos geradores de perturbação, incomodidade, angustia, desgosto nas vitimas desses mesmos factos, de uma forma merecedora da tutela do direito. Não está apenas em causa a privação de objectos, a violação da propriedade, mas, mais do que isso a invasão do domicílio, a devassa ilegítima do local da residência familiar que interfere violentamente no domínio da privacidade do intimo de uma família. É do senso comum que ninguém fica indiferente a actos como estes tenha o dano patrimonial a expressão que tiver. E se é certo que nada está provado quanto aos sofrimentos, aos sentimentos negativos, sofridos pelos AA em consequência dos actos praticados pelos RR menores verdade é, também, que tem a nossa jurisprudência entendido (por todos o Acórdão do STJ, de 9/2/89, in www.dgsi.pt, relator Conselheiro Ferreira da Silva) que os factos integradores do dano não patrimonial quando forem do consenso geral (quase factos notórios) não carecem de alegação e prova. Justifica-se, assim, uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos. …”.. Por outro lado, as alíneas cc), dd), rr) e uu) são matéria relativa à consciência da ilicitude e ao dolo, sendo que estes quando não confessados, porque elementos da subjectividade humana, podem ser revelados por outros elementos objectivos apurados Neste sentido cf. Ac. RP de 23/02/1993, in BMJ 324/620: “Dado que o dolo pertence à vida interior de cada um, é portanto de natureza subjectiva, insusceptível de directa apreensão. Só é possível captar a sua existência através de factos materiais comuns de que o mesmo se possa concluir, entre os quais surge com maior representação o preenchimento dos elementos integrantes da infracção. Pode comprovar-se a verificação do dolo por meio de presunções, ligadas ao princípio da normalidade ou das regras da experiência.”. Ainda no mesmo sentido decidiu o Ac. do STJ de 11/12/1996, relatado por Joaquim Dias, in BMJ 462/207, de cujo sumário citamos: “Sendo o dolo um acto psíquico, porque ocorre no interior do sujeito, só é revelado indirectamente através de actos exteriores. Se a natureza do instrumento utilizado, a zona atingida e as características da lesão consentirem a ilação de que o arguido, agredindo a vítima, representou a morte desta como consequência possível da sua acção e agiu conformando-se com tal evento, estará fundamentada a existência de dolo eventual.”. Ver também o acórdão da RC de 27/10/2010, relatado por Alice Santos, in www.gde.mj.pt, processo 132/08.7TASRE.C1, de cujo sumário citamos: “…2.Os factos integradores do tipo subjectivo de ilícito, v.g. relativos à intenção criminosa, normalmente não resultam provados através de prova directa, mas de prova indiciária. Na normalidade das situações, é da prova de factos materiais e objectivos, que não fazendo parte dos concretos factos integradores do tipo de ilícito que o tribunal, por inferência, no respeito das regras da lógica e da experiência comum, dará ou não como provados factos integradores do tipo subjectivo de ilícito.”., ou seja por presunção Presunções judiciais são as que, assentando no simples raciocínio de quem julga, decorrem das máximas da experiência, dos juízos correntes de probabilidade, dos princípios da lógica ou dos próprios dados da intuição humana – art.º 349º e 351º do CC (Cf. P. Lima e A. Varela, in "CC Anot.", I Vol., 4ª Ed., p. 312), e estas presunções são perfeitamente legítimas em processo penal. Ver, neste sentido, Ac. do STJ de 11/11/2004, relatado por Simas Santos, in www.gde.mj.pt, processo 04P3182, do qual citamos: “… O juízo valorativo do tribunal tanto pode assentar em prova directa do facto, como em prova indiciária da qual se infere o facto probando, não estando excluída a possibilidade do julgador, face à credibilidade que a prova lhe mereça e as circunstancias do caso, valorar preferencialmente a prova indiciária, podendo esta só por si conduzir à sua convicção. Por isso que, em sede de apreciação, não dispensa a prova testemunhal um tratamento cognitivo por parte de restantes meios de prova, sendo que a mesma, tal qual a prova indiciária de qualquer natureza, pode ser objecto de formulação de deduções ou induções correcção de raciocínio mediante a utilização das regras da experiência. Desde logo, é legítimo o recurso a tais presunções, uma vez que são admissíveis em processo penal as provas que não forem proibidas por lei (art. 125.º do CPP) e o art. 349.º do C. Civil prescreve que presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, sendo admitidas as presunções judiciais nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (art. 351.º). Depois, as presunções simples ou naturais (as aqui em causa) são simples meios de convicção, pois que se encontram na base de qualquer juízo. O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto conhecido para um facto desconhecido; toda a prova indirecta se faz valer através desta espécie de presunções. As presunções simples ou naturais são, assim, meios lógicos de apreciação das provas, são meios de convicção. Cedem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto (cfr. Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, I, 333 e segs.). O que vale por dizer que as presunções naturais não violam o princípio in dubio pro reo. Este princípio é que constitui o limite daquelas. No caso, o próprio recorrente aceita que a decisão recorrida não ficou em estado de dúvida, mas entende que deveria ter ficado, o que como vimos é agora insindicável pelo Tribunal de Revista.”. Ver também o acórdão da RC de 28/10/2009, Processo 31/01, relatado por Jorge Jacob, no processo 31/01, in JusNet 6710/2009, donde citamos: “…Esta afirmação não colide, no entanto, com a validade da prova obtida através de presunção judicial. Não oferece dúvida que são admissíveis em processo penal as provas que não sejam proibidas por lei (art. 125º), aí incluídas as presunções judiciais, que são as ilações que o julgador retira de factos conhecidos para firmar outros factos, desconhecidos (art. 349º do Código Civil), sem que daí resulte prejuízo para o princípio da livre apreciação da prova. Não sendo meio de prova proibido por lei, pode o julgador, à luz das regras da experiência e da sua livre convicção, retirar dos factos conhecidos as ilações que se ofereçam como evidentes ou como razoáveis e firmá-las como factos provados. De resto, este é um mecanismo recorrente na formação da convicção. Basta pensar na prova da intenção criminosa. A intenção, enquanto elemento volitivo do dolo (enquanto decisão pela conduta, suposto serem conhecidos pelo agente os elementos do tipo legal de crime), na medida em que traduz um acontecimento da vida psicológica, da vivência interna, não é facto directamente percepcionável pelos sentidos do espectador, havendo que inferi-la a partir da exteriorização da conduta. Só por recurso à presunção judicial, diluída naquilo que em processo penal se designa por "livre convicção", é possível determiná-la, através de outros factos susceptíveis de percepção directa e das máximas da experiência, extraindo-se como conclusão o facto presumido, que assim se pode ter como provado. Desde que as máximas da experiência (a chamada "experiência comum", assente na razoabilidade e na normalidade das situações da vida), não sejam postas em causa, desde que através de um raciocínio lógico e motivável seja possível compreender a opção do julgador, nada obsta ao funcionamento da presunção judicial como meio de prova, observadas que sejam as necessárias cautelas: - Desde logo, é necessário que haja uma relação directa e segura, claramente perceptível, sem necessidade de elaboradas conjecturas, entre o facto que serve de base à presunção e o facto que por presunção se atinge (sendo inadmissíveis "saltos" lógicos ou premissas indemonstradas para o estabelecimento dessa relação); - Por outro lado, há-de exigir-se que a presunção conduza a um facto real, que se desconhece, mas que assim se firma (por exemplo, a autoria - desconhecida - de um facto conhecido, sendo conhecidas também circunstâncias que permitem fazer funcionar a presunção, sem que concomitantemente se verifiquem circunstâncias de facto ou sejam de admitir hipóteses consistentes que permitam pôr em causa o resultado assim atingido); - Por fim, a presunção não poderá colidir com o princípio in dubio pro reo (é esse, aliás, o sentido da restrição referida na parte final do exemplo que antecede). …”. Quanto às condições em que operam as presunções, ver o acórdão do STJ de 07/01/2004, relatado por Henriques Gaspar, in www.gde.mj.pt, processo 03P3213, donde citamos: “…Importam, neste âmbito, as chamadas presunções naturais ou hominis, que permitem ao juiz retirar de um facto conhecido ilações para adquirir um facto desconhecido. As presunções naturais são, afinal, o produto das regras de experiência; o juiz, valendo-se de um certo facto e das regras da experiência, conclui que esse facto denuncia a existência de outro facto. «Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede então mediante uma presunção ou regra da experiência [ou de uma prova de primeira aparência». (cfr, v. g., Vaz Serra, "Direito Probatório Material", BMJ, n° 112 pág, 190). Em formulação doutrinariamente bem marcada e soldada pelo tempo, as presunções devem ser «graves, precisas e concordantes». «São graves, quando as relações do facto desconhecido com o facto conhecido são tais, que a existência de um estabelece, por indução necessária, a existência do outro. São precisas, quando as induções, resultando do facto conhecido, tendem a estabelecer, directa e particularmente, o facto desconhecido e contestado. São concordantes, quando, tendo todas uma origem comum ou diferente, tendem, pelo conjunto e harmonia, a firmar o facto que se quer provar» (cfr. Carlos Maluf, "As Presunções na Teoria da Prova", in "Revista da Faculdade de Direito", Universidade de São Paulo, volume LXXIX, pág. 207). A presunção permite, deste modo, que perante os factos (ou um facto preciso) conhecidos, se adquira ou se admita a realidade de um facto não demonstrado, na convicção, determinada pelas regras da experiência, de que normal e tipicamente (id quod plerum que accidit) certos factos são a consequência de outros. No valor da credibilidade do id quod, e na força da conexão causal entre dois acontecimentos, está o fundamento racional da presunção, e na medida desse valor está o rigor da presunção. A consequência tem de ser credível; se o facto base ou pressuposto não é seguro, ou a relação entre o indício e o facto adquirido é demasiado longínqua, existe um vício de raciocínio que inutiliza a presunção (cfr. Vaz Serra, ibidem). Deste modo, na passagem do facto conhecido para a aquisição (ou para a prova) do facto desconhecido, têm de intervir, pois, juízos de avaliação através de procedimentos lógicos e intelectuais, que permitam fundadamente afirmar, segundo as regras da experiência, que determinada facto, não anteriormente conhecido nem directamente provado, é a natural consequência, ou resulta com toda a probabilidade próxima da certeza, ou para além de toda a dúvida razoável, de um facto conhecido. A presunção intervém, assim, quando as máximas da experiência da vida e das coisas, baseadas também nos conhecimentos retirados da observação empírica dos factos, permitem afirmar que certo facto é a consequência típica de outro ou outros. A ilação derivada de uma presunção natural não pode, porém, formular-se sem exigências de relativa segurança, especialmente em matéria de prova em processo penal em que é necessária a comprovação da existência dos factos para além de toda a dúvida razoável. Há-de, pois, existir e ser revelado um percurso intelectual, lógico, sem soluções de continuidade, e sem uma relação demasiado longínqua entre o facto conhecido e o facto adquirido. A existência de espaços vazios no percurso lógico de congruência experimental típica determina um corte na continuidade do raciocínio, e retira o juízo do domínio da presunção, remetendo-o para o campo já da mera possibilidade física mais ou menos arbitrária ou dominada pelas impressões. A compreensão e a possibilidade de acompanhamento do percurso lógico e intelectual seguido na fundamentação de uma decisão sobre a matéria de facto, quando respeite a factos que só podem ter sido deduzidos ou adquiridos segundo as regras próprias das presunções naturais, constitui um elemento relevante para o exercício da competência de verificação da (in)existência dos vícios do artigo 410º, n°2, do CPP, especialmente do erro notório na apreciação da prova, referido na alínea b). …”. No sentido de que o recurso à presunção judicial em processo penal não põe em causa o princípio da presunção da inocência consagrado no art.º 32º da CRP, cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, in “CRP Anotada”, tomo I, Coimbra Editora, 2005, a págs. 356 e 357.. Ora, se o Arg., sendo quem é, proferiu e reiterou aquelas expressões naquelas circunstâncias, que outra conclusão se poderia tirar senão as de que queria produzir os efeitos que produziu, sabendo que o não podia fazer? Por último, entende o Recorrente que o tribunal recorrido desconsiderou, isto é, não deu como provado, o episódio que referiu ter presenciado, entre um membro da direcção da Assistente SMMP e um jornalista, com um processo em cima da mesa de um café. O tribunal recorrido explicou, profusa e claramente, porque, no confronto da versão do Arg. com a do jornalista em causa e na ausência de outros meios de prova, não deu credibilidade àquela versão. Ora, como já referimos, a credibilidade subjectiva atribuída pelo tribunal recorrido às declarações e depoimentos perante si prestados, está fora da sindicância dos tribunais de recurso, salvo se houver elementos objectivos que ponham em causa essa credibilidade, o que não é o caso. É pois, improcedente nesta parte o recurso. * VIII – Entende o Recorrente que os factos dados como provados não preenchem os elementos do tipo de crime por que veio condenado, nem de qualquer outro. “… A legitimidade da intervenção do direito penal assenta na sua imprescindível vocação para a protecção dos bens jurídicos fundamentais, essenciais ao livre desenvolvimento da personalidade ético-jurídica da pessoa e à preservação do bom funcionamento de uma sociedade democrática. …” Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, pág. 244., sendo a essa intervenção sujeita ao princípio da subsidiariedade ou da última ratio do direito penal. Nas ofensas à honra estão sempre em causa dois valores constitucionais de igual valor – a honra e a liberdade de expressão (art.ºs 26º e 37º da CRP Constituição da República Portuguesa.) -, sendo que a prevalência de um deles em cada caso tem sempre que resultar de uma ponderação das circunstâncias do caso concreto, encontrando um equilíbrio que preserve sempre a liberdade de expressão, indispensável à subsistência de uma sociedade democrática, limitada pela proibição do aniquilamento da honra. Atendendo a que a CEDH Convenção Europeia dos Direitos do Homem., como todo o direito convencional de que Portugal é parte contratante, tem valor infra-constitucional, mas supra-legal Ver Mário M. Serrano, in “Extradição – Regime e Praxis”, inserido no Volume I de “Cooperação Internacional Penal – Extradição – Transferência de Pessoas Condenadas”, Centro de Estudos Judiciários, 2000, págs. 27 a 29; Jorge Miranda e Rui Medeiros, in “Constituição Portuguesa Anotada”, vol. I, Coimbra Editora, 2005, págs. 91 a 96; Ireneu Cabral Barreto, in “A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada”, Coimbra Editora, 2005, págs. 31 e 32; Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 103 a 109, nestes dois últimos casos especificamente para a CEDH., na indagação sobre se determinada conduta constitui crime contra a honra há que ter em atenção o disposto nesta convenção, interpretada pela jurisprudência do TEDH Tribunal Europeu dos Direitos do Homem., nomeadamente a produzida a propósito do art.º 10º (Liberdade de expressão). Nos termos da jurisprudência deste tribunal, “… as excepções à liberdade de expressão, nomeadamente para proteger a honra de outrem, devem ser interpretadas restritivamente e a necessidade das restrições deve ser determinada de modo convincente. …” Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, pág. 80.. Assim, quando estão em causa figuras públicas, os limites da crítica admissível são mais amplos, admitindo-se, no âmbito de controvérsias políticas e públicas, o uso de linguagem forte, exagerada e mordaz. Posto que as pessoas colectivas podem ser sujeitos passivos de qualquer dos tipos de crimes contra a honra Nesse sentido, ver Maia Gonçalves, in “CP Anot.”, Almedina, 11ª ed., 1997, pág. 575, e Faria e Costa in “Comentário Conimbricense ao Código Penal”, tomo I, pág. 675 e 676. Contra este entendimento, ver, por todos, o acórdão da RP de 14/09/2011, relatado por Ernesto Nascimento, in JusNet 5057/2011, do qual citamos: “…Outra questão respeita a saber se as pessoas colectivas podem ser, em simultâneo, sujeitos passivos de crime de difamação ou injuria a par do crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva. Há divergência de opiniões, mas vingando a nível jurisprudencial a tese de que após a revisão do CP de 1995 e com os esclarecimentos da revisão de 2007, a "honra", prestígio e confiança das pessoas colectivas são protegidas pelo disposto no art. 187 do CP, respeitando os arts. 180 e 181 às pessoas singulares, pessoas físicas. Isto apesar de anteriormente a 1995 se entender que as pessoas colectivas podiam ser (alvos) sujeitos passivos de difamação ou injuria. Nomeadamente a partir do Assento do STJ de 24-02-1960 (JusNet 99/1960). A honra é vista como um bem jurídico complexo que inclui, quer o valor pessoal e interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade, quer a própria reputação ou consideração exterior - Faria Costa Comentário Conimbricense, Tomo I-607. Consideração é o merecimento que o indivíduo tem no meio social, isto é, o bom nome, o crédito, a confiança, a estima, a reputação, que constitui a dignidade objectiva, o juízo que a sociedade faz de cada cidadão, em suma, a opinião pública -Cfr. Ac. da R. Lx de 06-02-1996, in Col. Jurisp. tomo I, pág. 156 (JusNet 995/1996). Porque se vinha entendendo que a "honra e consideração" são atributos das pessoas singulares, por serem valores eminentemente pessoais e ligados à condição humana, mas porque também havia necessidade de proteger as pessoas colectivas no seu prestígio, a revisão penal de 1995 veio introduzir o art. 187. O legislador autonomizou a protecção dos valores inerentes à pessoa colectiva -credibilidade, prestígio e confiança- e reservou para as pessoas singulares, pessoa humana a previsão dos arts. 180 e 181, onde se consagram e protegem os valores tradicionais da honra e da consideração social que lhes são devidos. Neste sentido, Ac. da R. Porto de 15-10-2007 in Col. Jurisp. tomo IV, pág. 227 (JusNet 6019/2007). Neste aresto se refere, "de facto a pessoa humana tem uma essência e uma grandeza únicas, é figura central da modernidade civilizacional, e como tal, agrega em torno de si valores que merecem um tratamento exclusivo e singular que a destacam em relação à protecção também merecida por entidades de natureza distinta". Defensores desta tese são os Cons. Leal Henriques e Simas Santos que no seu Código Penal defendem que a honra e a consideração são requisitos exclusivos das pessoas singulares, sendo que às pessoas jurídicas apenas se adequam outras realidades, tais como, o crédito e a confiança, razão porque é inaceitável a tese de que a pessoa jurídica pode, sob o ponto de vista jurídico-penal, ser ofendida na sua "honra". Que a distinção entre pessoa física e pessoa colectiva apenas se faz para fins patrimoniais e económicos, e que as ofensas dirigidas a um ente colectivo são, na realidade, dirigidas às pessoas físicas que o compõem, dirigem ou administram, assim sufragando o entendimento de Nelson Hungria (Comentário ao Código Penal Brasileiro VI, 44ª 46). Esta é a tese que seguimos, sabendo que é discutível e controversa, tendo entendimento contrário o Prof. Figueiredo Dias expresso nas actas de revisão do CP, Maia Gonçalves no seu Código Penal anotado e comentado, Cons. O. Mendes in "O Direito à Honra e a sua Tutela Penal" onde refere, a pág. 115 que se conclui que "as pessoas jurídicas podem ser sujeito passivo não só do tipo legal do crime do art. 187, mas também do crime de difamação do art. 180".…”., os âmbitos de aplicação dos tipos dos art.º 180º (difamação) e 187º (ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva) determinam-se pelos diferentes bens jurídicos que cada um deles protege Novamente Maia Gonçalves, in “CP Anot.”, Almedina, 11ª ed., 1997, pág. 575, e Faria e Costa in “Comentário Conimbricense ao Código Penal”, I, Coimbra Editora, 2001, pág. 676.. Assim, na difamação, o bem jurídico protegido é a honra e consideração da vítima (na concepção dominante dual fático-normativa, isto é, “… vista como um bem jurídico complexo que inclui, quer o valor pessoal ou interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade, quer a própria reputação ou consideração exterior …”) e, na ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva, é a credibilidade, o prestígio e a confiança, ou seja o bom nome, que corresponde à valoração que a comunidade faz da actuação da pessoa colectiva ou instituição Cf. Faria e Costa, in “Comentário Conimbricense ao Código Penal”, I, Coimbra Editora, 2001, págs. 607 e 681. Como referiu o acórdão do STJ de 10/07/2008, relatado por Henriques Gaspar, in www.gde.mj.pt, processo 08P1410 “…O crédito ou o bom nome são, pois, elementos que compõem e integram os direitos inerentes à personalidade, tanto no plano da seriedade e honestidade negocial, como na reputação, que é «a consideração dos outros na qual se reflecte a dignidade pessoal» e que pode ser afectada «independentemente de se atribuírem qualidades eticamente aviltantes». A reputação «representa a visão exterior sobre a dignidade de cada um, o apreço social, o bom-nome de que cada um goza no círculo das suas relações» ou da comunidade onde se insere (ac. do STJ de 12/01/2000, proc. 761/99). A ofensa ao crédito resultará da divulgação de facto que tenha como consequência a diminuição ou a afectação da confiança sobre a capacidade de cumprimento das obrigações da pessoa visada; a ofensa ao bom-nome abala o prestígio e a consideração social de que uma pessoa goze, perturbando o conceito e a apreciação positiva com que alguém é considerado no meio social onde se insere e se desenvolve a sua vida: o prestígio coincide, assim, com a consideração social das pessoas, que se projecta em perspectiva relacional entre a pessoa e o meio social. …”.. No presente caso, o Recorrente imputou às Assistentes a passagem de informação, sobre matérias que se encontravam em segredo de justiça, a jornalistas, através de membros seus. Sendo as Assistentes pessoas colectivas cujos membros são exclusivamente magistrados, sobre quem impendem especiais deveres de conformação com as obrigações legais, uma tal actuação seria gravíssima, quer criminal quer deontologicamente, pelo que a imputação de tais factos põem seriamente em crise o bom nome das Assistentes. Não se trata de opiniões sobre a existência ou actuação das Assistentes, mas da imputação de factos Quanto à distinção entre factos e juízos de valor, ver o acórdão do STJ de 14/02/2012, relatado por Hélder Roque, in www.gde.mj.pt, processo 5817/07.2TBOER.L1.S1, do qual citamos: “…A distinção entre afirmações de facto e juízos de valor, entendidos estes últimos, em sentido amplo, de modo a abranger opiniões, crenças e convicções pessoais, incluindo sobre situações de facto, embora seja meramente tendencial, na medida em que, do ponto de vista teorético-cognitivo, as primeiras podem conter elementos subjectivos e os segundos são susceptíveis de se basear em realidades objectivas[…], permite registar que os juízos de valor resultam de uma apreciação subjectiva incontornável, de um elemento de tomada de posição ideológica ou emocional, enquanto que as afirmações de facto ou são verdadeiras ou falsas, pressupondo a indispensabilidade da sua prova, ao contrário do que sucede com os juízos de valor, em que já não haverá, em princípio, lugar à averiguação da sua verdade ou falsidade, ou do seu escoramento emocional ou racional, desde que a génese subjectiva do juízo de valor seja, imediatamente, perceptível junto dos destinatários[…]. Com efeito, a prova da exactidão dos juízos de valor é impossível de realizar e seria atentatória da liberdade de expressão, importando, tão-só, que os mesmos não se encontrem, totalmente, desprovidos de base factual, sob pena de poderem ser considerados excessivos, devendo, então, ser sujeitos a apreciação, de acordo com um critério de proporcionalidade[…]. A opinião é uma posição parcial, sustentada numa argumentação que pretende convencer e arregimentar, mas que deve corresponder a uma convicção séria e fundada, uma apreciação, um ponto de vista sobre qualquer espécie de questão ou assunto, na qual o seu autor exprime pontos de vista subjectivos, aduzindo argumentos a esse favor, relativamente a temas que, por qualquer razão, despertam o seu interesse, podendo ser de análise de acontecimentos ou de formulação de um juízo sobre determinada pessoa ou coisa, retirando dos factos deduções e conclusões, e induzindo os receptores a aderirem a essas teses e conclusões. O objectivo da opinião, que se distingue, claramente, da notícia, é lançar o debate e esclarecer o público, procurando, por vezes, chamar a atenção para determinados aspectos das notícias que passam ao lado de pessoas mais despercebidas, sendo textos pessoais e, inteiramente, subjectivos que trazem em si uma pretensão de validade, se não universal, pelo menos, intersubjectivamente, alargada[…]. Enquanto que a crónica é marcada por uma relação de fidelidade com o objecto descrito ou figurado, assumindo o narrador uma posição de neutralidade, para dar relevo ao acontecimento, a opinião introduz a marca da subjectividade, do parcial, razão pela qual esta nunca exclui a possibilidade do erro e a do confronto com outros pontos de vista, tendo como limites lógicos a intolerância, o fanatismo e o dogma. A crítica consiste numa actividade caracterizada pela emissão de juízos de valor e, por isso, em larga medida, recobre os domínios em que pode formar-se uma opinião, exigindo seriedade de propósitos, motivação de juízos, apreciação racional e coerente do objecto analisado, ainda que, aparentemente, seja destruidora, violenta ou até truculenta, mas de onde se exclui o espírito de maledicência, revanche, desforço, ajuste de contas ou até cegueira ideológica[…]. O que distingue a opinião das imputações de factos é o elemento da tomada de posição de ser a favor ou contra, isto é, do opinar, sendo certo que estas ultimas, devido à sua pretensão de objectividade, são, por via de regra, entendidas mais a sério, configurando, por isso, no debate de ideias, uma espada mais cortante do que os juízos de valor, cuja subjectividade é sempre, exteriormente, reconhecível[…]. A possível confundibilidade entre imputações de facto e juízos de valor, para efeitos de eventual restrição da liberdade de expressão quanto a estes últimos, deve ser entendida, em termos hábeis, apenas sendo aceite, em casos limite, em que os juízos de valor são apresentados com manifesta má fé, contra todas as evidências empíricas e circunstanciais, garantindo-se, ao invés, em maior medida, a protecção à comunicação de factos errados, sendo certo que, não raro, os juízos de valor se transformam em juízos de facto e as afirmações de facto em afirmações de valor[…]. É, por isso, que o direito fundamental à liberdade de opinião não pretende estar apenas ao serviço da verdade, mas, também, garantir a todo o cidadão a possibilidade de exprimir, livremente, o que pensa, mesmo quando não ofereça nem possa oferecer qualquer razão controlável para o seu juízo, contrariamente ao que acontece com a tutela constitucional da liberdade da imputação de factos que pode depender da verdade da respectiva comunicação. Porém, quando a opinião sobre uma pessoa se traduz num juízo desfavorável é sempre mais fácil o resvalamento para o domínio do ilícito, podendo invadir-se a esfera de tutela jurídico-constitucional dos direitos da mesma. Assim sendo, o sentido da decisão quanto à ilicitude ou justificação do exercício concreto do direito à liberdade de imprensa acaba por ficar prejudicado pela qualificação como juízo de valor ou imputação de factos[…]. …”. graves inverídicos, não tendo o Recorrente sequer provado que tinha razões para, de boa-fé, crer na sua veracidade, pelo que foi, sem dúvida, ultrapassado o limite da liberdade de expressão, e se mostram preenchidos os elementos objectivos do tipo do art.º 187º do CP Quanto a estes elementos, citamos o sumário do acórdão da RC de 04/05/2011, relatado por Jorge Dias, in www.gde.mj.pt, processo 983/09.5TATNV.C1: “1.- Constituem elementos objectivos do crime de ofensa a pessoa colectiva pública: a) a afirmação ou propalação de factos inverídicos; b) susceptíveis de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança da pessoa colectiva, corporação, organismo ou serviço; c) não tendo o agente fundamento para, em boa fé, reputar tais factos de verdadeiros. 2.- O bem jurídico protegido não é a honra, enquanto interesse essencialmente intrínseco e inerente à dignidade da pessoa, mas antes a credibilidade dos entes aí previstos.”.. Se já antes da alteração introduzida no art.º 187º/1 do CP pela Lei n.º 59/2007, de 04/09, divergindo de Faria e Costa, entendíamos que podiam ser sujeitos passivos deste crime pessoas colectivas que não exercessem autoridade pública Nesse sentido, ver o acórdão da RP de 06/2/2006, relatado por Cravo Roxo, in JusNet 6610/2006, do qual citamos: “…Nesta perspectiva, reza o Art. 188º do mesmo diploma legal que o procedimento criminal pelos crimes contra a honra depende de acusação particular, com excepção dos crimes previstos no Art. 187º, sempre que o ofendido exerça autoridade pública, casos em que é suficiente a queixa ou participação: nº 1, alínea b) desse aresto; o que se compreende, atendendo à natureza do lesado, que condiciona o modo de presença do facto em juízo. Em resumo dir-se-á que, quando se trata de pessoa colectiva que não exerça autoridade pública, o procedimento criminal depende de acusação particular; quando exerce essa autoridade, o procedimento criminal dependerá de queixa. Esta norma ficará sem conteúdo, se se considerar que só as pessoas colectivas que exercem essa autoridade podem ser objecto desse tipo de crime e só esta interpretação garante alguma utilidade, validade e perenidade da norma referida, sob pena de se tornar anódina e inócua. E tal interpretação surge na sequência, quer da discussão em sede de comissão revisora (veja-se a acta da 45ª sessão da Comissão Revisora do Código Penal, de 11 de Dezembro de 1990), quer da jurisprudência do STJ. Não repugna que assim seja, considerando que uma empresa prossegue outros valores que não apenas o lucro e merece, enquanto pessoa jurídica, protecção penal, sem com isso se estar a invadir aquele campo reservado a que se chama a mínima intervenção criminal.…”., esse entendimento passou a impor-se claramente após a referida alteração, conforme resulta do simples confronto entre ambas as redacções Vejam-se ambas as redacções: A actual: “Quem, sem ter fundamento para, em boa fé, os reputar verdadeiros, afirmar ou propalar factos inverídicos, capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos a organismo ou serviço que exerçam autoridade pública, pessoa colectiva, instituição ou corporação, é punido com pena de prisão até seis meses ou com pena de multa até 240 dias.”. A anterior: “Quem, sem ter fundamento para, em boa fé, os reputar verdadeiros, afirmar ou propalar factos inverídicos, capazes de ofenderem a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos a pessoa colectiva, instituição, corporação, organismo ou serviço que exerça autoridade pública, é punido com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até 240 dias.”.. Por outro lado, tendo em conta o que se deu como provado em s), cc), dd), pp), qq) e uu), forçoso é concluir que o Arg. agiu com dolo directo, pelo que também se mostram preenchidos os elementos subjectivos do tipo em causa. Por isso, há que concluir que se deve manter a decisão recorrida, quanto à condenação do Recorrente pela prática de dois crimes de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva (art.º 187º do CP), pelo que improcede, nesta parte o recurso. * IX – Entende o Recorrente que o crime porque veio condenado não pode ser duplamente qualificado, pelo disposto nas normas dos art.ºs 183º/1-a) e 183º/2. E nessa matéria assiste-lhe razão. Na verdade, num primeiro momento, o Arg. fez a referida declaração na Assembleia da República, no âmbito de uma audição de grande repercussão mediática, pelo que a sua conduta preencheu o disposto no art.º 183º/1-a) (o disposto na al. b) deste n.º já estava preenchido, uma vez que se provou que conhecia a falsidade da afirmação Alínea qq) da matéria de facto provada.). Posteriormente, por duas vezes, reiterou perante órgãos de comunicação social as mesmas imputações, pelo que sua conduta preencheu o disposto no art.º 183º/2. A punição estabelecida pelo disposto no art.º 183º/2 é mais grave do que a estabelecida pelo disposto no art.º 183º/1-a) e b), pelo que há que punir o Arg. nos termos daquela disposição Neste sentido, ver Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 351 a 355., isto é pela prática de dois crimes p. e p. pelos art.ºs 187º/1/2-a) e 183º/2 do CP, ficando consumida a outra agravação menos grave. Apesar disso, esta alteração da incriminação não tem qualquer efeito nas penas fixadas, uma vez que estas o foram tendo em conta os limites fixados nos termos deste art.º 183º/2. * X – Ainda assim, entende o Recorrente que deve ser absolvido do pedido cível, porque se não provou que as Assistentes tenham sofrido danos, e que, em qualquer dos casos, as indemnizações fixadas são exageradas e devem ser reduzidas. Nos termos do art.º 129º do CP, a indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil. As ofensas à honra merecem a tutela do direito como resulta, desde logo e para além do mais, das tutelas penal (art.ºs 180º a 189º do CP) e civil (art.ºs 483º e 484º do CC Código Civil.) que lhes são conferidas. Tanto basta para concluir que estas ofensas ao bom nome, em concreto, pela sua gravidade, merecem a tutela do direito, nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 496º/1/3 do CC. Entendemos que também a honra das pessoas colectivas, entendida como dignidade social e não como «dignitas humana» merece esta tutela juscivilística Nesse sentido, ver R.V.A. Capelo de Sousa, in “O direito Geral de Personalidade”, Coimbra editora, 1995, págs. 596 a 599. No mesmo sentido se pronunciou o acórdão do STJ de 10/07/2008, relatado por Henriques Gaspar, in www.gde.mj.pt, processo 08P1410, donde citamos: “…Os direitos de personalidade não estão, por seu lado, excluídos da capacidade de gozo das pessoas colectivas, que têm direito ao bom-nome e à honra e consideração social – artigos 26º, nº 1 da Constituição e 70º, nº 1 e 72º, nº 1 do CCv. O direito ao bom-nome das pessoas colectivas está, assim, protegido por lei, entendido no quadro da actividade que desenvolvem, ou seja, na imagem e consideração exterior, na honestidade da acção, na credibilidade e no prestígio social (cfr. ac, do STJ, de 8/3/07, proc. 566/07). …”., Veja-se também a este propósito a resenha jurisprudencial feita no acórdão do STJ de 06/07/2011, relatado por Gabriel Catarino, in www.gde.mj.pt, processo 2619/05.4TVLSB.L1.S1, que considera que “…VII - O desânimo e a falta de iniciativa provocada pelo estado de espírito de um sócio gerente, momentaneamente, quebrado na sua iniciativa por condicionalismos determinados por uma notícia, desde que não se tenham repercutido, de forma indelével e inarredável, na imagem da empresa, não podem servir como factor indutor de um ressarcimento por danos não patrimoniais desta.” (do respectivo sumário), do qual citamos: “…Permitimo-nos transcrever, por comodidade e data vénia, e ainda porque os arestos citados aportam um significativo número de decisões que coonestam cada uma das teses, o tramo do acórdão da Relação de Lisboa, sob critica. “Se não há dúvida que as pessoas singulares têm direito a ser indemnizadas por danos não patrimoniais, já não é pacífico que as pessoas colectivas possam também ser ressarcidas a esse título pois não têm afectos nem sofrimento físico ou moral. Assim, para uma corrente jurisprudencial a ofensa do bom nome e reputação das sociedades comerciais apenas releva como dano patrimonial indirecto, não sendo por isso susceptível de indemnização por danos não patrimoniais, invocando-se que o bom nome e reputação das sociedades comerciais apenas interessam na medida da vantagem económica que deles podem retirar (cfr Ac do STJ de 27/11/2003 – P. 03B3692, Ac do STJ de 9/6/2005 – P. 05B1616 e Ac do STJ de 23/1/2007 – P. 06A4001 – in www.dgsi.pt). Diferentemente, para outra corrente, é possível reconhecer às sociedades comerciais o direito a indemnização por danos não patrimoniais pois são sujeitos autónomos de direito, dotados de personalidade jurídica e têm interesse em defender o seu bom nome comercial, o seu prestígio, a sua credibilidade, enfim, a sua imagem, pois daí pode depender em grande medida o sucesso da sua actividade (cfr Ac do STJ de 5/10/2003 – P. 03B1581, Ac do STJ de 9/2/2006 – P. 05B4048, Ac do STJ de 8/3/2007 – P. 07B566, Ac do STJ de 17/4/2007 – P. 07B755, Ac do STJ de 12/2/2008 – P. 07A4618, Ac do STJ de 19/6/2008 – P. 08B1079, Ac do STJ de 21/5/2009 - P. 09A0643, Ac do STJ de 12/5/2010 – P. 88/08.6TATBU.C1 e Ac do STJ de 17/6/2010 – P. 806/03.TBMGR.C1.S1 – in www.dgsi.pt)…”.. Os danos foram dados como provados nas alíneas t) a y) e oo), donde resulta que as afirmações do Arg. afectaram a credibilidade, o prestígio e a confiança das Assistentes, e essa matéria de facto foi mantida inalterada, pelo que, quanto a isso, improcede a pretensão do Recorrente. O que está agora em causa são os montantes das indemnizações arbitradas. Nos termos do art.° 496° do C. Civil, “1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. 2. Por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes; e, por último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem. 3. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos do número anterior.”. Na perspectiva da responsabilidade civil pode afirmar-se que dano ou prejuízo é toda a ofensa de bens ou interesses alheios protegidos pela ordem jurídica. Como refere Galvão Teles in “Direito das Obrigações”, 6ª ed., pág. 570, “O prejuízo ou dano consiste em se sofrer um sacrifício tenha ou não um conteúdo económico.... A pessoa é afectada num bem, que deixa de poder gozar de todo ou de que passa a ter um gozo mais reduzido ou precário.”. Ou, como se diz no Ac. da RP de 07/04/1997, in CJ, II, pág. 206. “Esse prejuízo é o prejuízo concreto, ou seja, o dano real, o dano como se apresenta in natura, consistente na privação ou diminuição do gozo de bens, materiais ou espirituais. Distingue-se entre danos patrimoniais e danos não patrimoniais, consoante sejam ou não susceptíveis de avaliação pecuniária. Os primeiros, porque incidem sobre interesses de natureza material ou económica, reflectem-se no património do lesado, ao contrário dos últimos, que se reportam a valores de ordem espiritual, ideal ou moral. Os danos não patrimoniais são prejuízos «(como as dores físicas, os desgostos morais, os vexames, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem-estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização» (Antunes Varela, ‘Das Obrigações “, 5ª ed., Vol I, pág. 561). A dificuldade em quantificar os danos de natureza não patrimonial anda sempre ligada à sua dimensão imaterial, por atingirem valores de carácter espiritual ou moral. A sua ressarcibilidade baseia-se, actualmente, diz o Prof. Pessoa Jorge. in “Ensaio Sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil”. pág. 376, na generosa formulação do art.° 496° do C. Civil, que confia ao julgador a tarefa de determinar o que é equitativo e justo em cada caso, no que fundamentalmente releva, não o rigor algébrico de quem faz a adição de custos, despesas, ou de ganhos (como acontece no cálculo da maior parte dos danos de natureza patrimonial), mas antes o desiderato de, prudentemente, dar alguma correspondência compensatória ou satisfatória entre uma maior ou menor quantia de dinheiro a arbitrar à vítima e a importância dos valores de natureza não patrimonial em que ela se viu afectada. Também o STJ, no Ac. de 23/03/1995, in CJ, 1, pág. 233, se refere nos mesmos moldes, em sugestiva passagem: “Considerando a natureza e função da indemnização por danos não patrimoniais, estes não podem sujeitar-se a uma medição, mas tão só a valoração”. Como se refere no Ac. do STJ de 08/06/1999, in BMJ 488(1999)/323. “A compensação dos danos não patrimoniais, para responder actualizadamente ao comando do artigo 496° do Código Civil e constituir uma efectividade possibilidade compensatória, tem de ser significativa, viabilizando um lenitivo para os danos suportados e, porventura, a suportar.”. Na fixação da indemnização, diz a lei (art.° 496°/3 do CC), que se devem ter em conta as circunstâncias referidas no art.° 494° do CC. Isto é, deve ter-se em conta o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso que o justifiquem, e ainda as “regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas, da criteriosa ponderação das realidades da vida” - Pires de Lima e Antunes Varela, in ‘Código Civil Anotado”. 4 edição, vol. I, pág. 501, ou, como decidiu o referido Ac. do STJ de 08/06/1999, “O juiz para a decisão a proferir no que respeita à valoração pecuniária dos danos não patrimoniais, em cumprimento da prescrição legal que o manda julgar de harmonia com a equidade, deverá atender aos factores expressamente referidos na lei e, bem assim, a outras circunstâncias que emergem da factualidade provada. Tudo com o objectivo de, após a adequada ponderação, poder concluir a respeito do valor pecuniário que considere justo para, no caso concreto, compensar o lesado dos danos não patrimoniais que sofreu.”. Como já vimos, há que ter em atenção o disposto na CEDH, interpretado pela jurisprudência do TEDH Como se diz no já citado acórdão do STJ de 10/07/2008, relatado por Henriques Gaspar, in www.gde.mj.pt, processo 08P1410 : “…A complexidade da ponderação de valores no confronto entre expressões comunicacionais que formal e substancialmente se assumem como exercício da liberdade de expressão na comunicação social, e as consequências no plano dos direitos individuais das pessoas afectadas, tem sido objecto de variadas intervenções do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) na interpretação e aplicação do artigo 10º da CEDH, construindo e densificando uma doutrina que, dada a força vinculante da Convenção (artigos 1º e 46º, par. 1), tem relevante valor de referente no círculo hermenêutico do complexo normativo (interno e internacional, com aplicação directa) que deve ser considerado. O artigo 10º da CEDH garante a “liberdade de expressão”, dispondo no par. 1 que «Qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de transmitir informações e ideias sem que possa haver ingerência de quaisquer autoridades públicas e sem consideração de fronteiras. […]». Mas no par 2, reconhecendo o carácter não absoluto do direito enunciado, prescreve que «o exercício destas liberdades, porquanto implica deveres e responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas na lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a integridade territorial, ou a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a protecção da saúde ou da moral, a protecção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais, ou para garantir a autoridade e a imparcialidade do poder judicial». Na interpretação e aplicação desta disposição no que respeita à liberdade de imprensa, a jurisprudência do TEDH tem revelado acentuada coerência em registo de protecção forte, por vezes numa função de verdadeira quarta instância. Os princípios e a definição dos critérios inscrevem-se em fórmulas verdadeiramente tabelares, recorrentemente utilizadas. Tomem-se, em síntese, como exemplo, algumas recentes formulações (v. g. nos acórdãos LOPES GOMES DA SILVA c. Portugal, de 28 de Setembro de 2000; ROSEIRO BENTO c. Portugal, de 18 de Abril de 2008 e AZEVEDO c. Portugal, de 27 de Março de 2008, para só referir caos portugueses). «A liberdade de expressão constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e uma das condições primordiais do seu progresso e do desenvolvimento de cada pessoa. Sob reserva do parágrafo 2º, a liberdade de expressão vale não só para as "informações" ou "ideias" acolhidas com favor ou consideradas como inofensivas ou indiferentes, mas também para aquelas que melindram, chocam ou inquietam. Assim é exigido pelo pluralismo, pela tolerância e espírito de abertura sem os quais não existe "sociedade democrática". Como determina o artigo 10º, esta liberdade está sujeita a excepções que devem, contudo, ser interpretadas restritivamente, e a necessidade de qualquer restrição deve ser demonstrada de maneira convincente». «Estes princípios revestem uma particular importância para a imprensa. Se esta não deve ultrapassar os limites fixados em vista, nomeadamente, "da protecção de reputação de outrem", incumbe-lhe contudo transmitir informações e ideias sobre questões políticas bem como sobre outros temas de interesse geral. Quanto aos limites da crítica admissível eles são mais amplos em relação a um homem político, agindo na sua qualidade de personagem pública, que um simples particular. O homem político expõe-se inevitável e conscientemente a um controlo atento dos seus factos e gestos, tanto pelos jornalistas como pela generalidade dos cidadãos, e deve revelar uma maior tolerância sobretudo quando ele próprio profere declarações públicas susceptíveis de crítica. Certamente tem direito à protecção da sua reputação mesmo fora do âmbito da sua vida privada, mas os imperativos de tal protecção devem ser comparados com os interesses da livre discussão das questões políticas, impondo as excepções à liberdade de expressão uma interpretação restritiva». «A liberdade do jornalista compreende também o recurso possível a uma certa dose de exagero ou mesmo de provocação». «O adjectivo "necessária", com o sentido do artigo 10º, § 2º, pressupõe a existência de uma "necessidade social imperiosa". Os Estados contratantes gozam de uma certa margem de apreciação para julgar sobre a existência de uma tal necessidade, mas esta margem deve ser acompanhada por um controlo europeu que tem por objecto simultaneamente a lei e as decisões que a aplicam, mesmo quando tais decisões emanem de uma jurisdição independente. O Tribunal tem, pois, competência para estatuir em última instância sobre a questão de saber se uma "restrição" se concilia com a liberdade de expressão protegida pelo artigo 10º.» «No exercício do seu poder de controlo, o Tribunal deve apreciar a ingerência à luz das circunstâncias do caso tomado no seu conjunto, incluindo o conteúdo das críticas que são censuradas ao requerente e o contexto em que as produziu. Compete ao Tribunal determinar nomeadamente se a ingerência criticada era "proporcionada às finalidades legítimas prosseguidas" e se os motivos invocados pelas autoridades nacionais para justificar a ingerência se mostram "pertinentes e suficientes". Neste julgamento, o Tribunal deve estar convencido de que as autoridades nacionais aplicaram regras conformes aos princípios consagrados no artigo 10º e, além disso, fundamentando-se numa apreciação aceitável dos factos pertinentes». «Uma opinião, por definição, não se presta a uma demonstração de veracidade. Pode, no entanto, revelar-se excessiva, nomeadamente na ausência de qualquer base factual». Nesta perspectiva, expressões por vezes marcadas, capazes de se constituir isoladamente como ofensivas, podem ser complexivamente consideradas como estando no mesmo patamar («à medida») da indignação causada por anteriores conteúdos expressivos da pessoa a quem a expressão contestada foi dirigida (v. g. , o termo “imbecil” [“Trotel”] objecto de apreciação no caso OBERSCHLICK c. Áustria, de 1 de Julho de 1997). Uma determinada expressão, com efeito, não obstante uma primeira interpretação ou sentido desvaliosos, pode não constituir um ataque pessoal gratuito ou injustificado, quando seja fornecida uma explicação objectivamente compreensível, resultante de propósitos e intervenções directamente provocatórios da pessoa visada, inseridos no contexto de uma discussão de interesse público ou de debate de natureza política (v., de certo modo, o acórdão do TEDH no caso GOMES DA SILVA c. Portugal, cit., publicado na “Revista Portuguesa de Ciência Criminal”, Ano 11 (2001), Fasc. 1, Janeiro-Março 2001, p. 131).…”.. Assim, nas ofensas à honra estão sempre em causa dois valores constitucionais de igual valor – a honra e a liberdade de expressão (art.ºs 26º e 37º da CRP Constituição da República Portuguesa.) -, sendo que a prevalência de um deles em cada caso tem sempre que resultar de uma ponderação das circunstâncias do caso concreto, encontrando um equilíbrio que preserve sempre a liberdade de expressão, limitada pela proibição do aniquilamento da honra, de forma a que, na determinação das indemnizações por este tipo de danos, há que ter especial cuidado para se evitar tanto a fixação de valores censórios, geradores de uma negativa auto-censura futura, como a fixação de valores irrisórios, incapazes de produzir o desejável efeito positivamente inibidor do discurso público e gerador de uma autocensura positiva Neste sentido, ver Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 215 a 229.. Nas decisões a proferir, há ainda que ter em conta as decisões que vêm sendo tomadas pelos tribunais de recurso para casos similares Relevantes nos termos do disposto no art.º 8º/3 do Código Civil, com o seguinte teor: “Nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito.”.. Assim, antes do mais, haverá que ter em conta, como limite superior das indemnizações por danos não patrimoniais, salvo circunstâncias excepcionais relativas ao poder económico do agente (art.ºs 496º/3 e 494º do CC), as fixadas pela perda do direito à vida, que é, sem dúvida, o maior dos danos não patrimoniais. Tal dano é hoje valorizado pela jurisprudência dos tribunais de recurso, com valores médios que rondam os €60.000,00 Veja-se, quanto a esses valores, a resenha feita no acórdão do STJ de 17/12/2009, relatado por Garcia Calejo, no processo 77/06.5TBAND.C1.S1, in JusNet 7598/2009, que fixou a indemnização pela perda da vida em €50.000,00: “…Como temos vindo a entender o valor de uma indemnização neste âmbito, deve compensar realmente o lesado pelo mal causado, donde resulta que o valor da indemnização deve ter um alcance significativo e não ser meramente simbólico (neste sentido, entre muitos, os Acórdãos deste Supremo Tribunal de 17-1-2008 (JusNet 51/2008) relator Conselheiro Pereira da Silva e de 29-1-2008 (JusNet 386/2008) relator o do presente acórdão, ambos in www.djsi.pt/jstj.nsf). Por isso se tem vindo a esboçar neste Supremo Tribunal a doutrina de aumentar as indemnizações, designadamente as fixadas na sequência de acidentes de viação. Compulsando a jurisprudência mais recente deste STJ concluiu-se que o dano morte (supressão da vida) tem vindo a ser ressarcido, no geral, entre 50.000 e 60.000 EUR, havendo decisões (raras) em que foi atribuída uma indemnização em quantia superior (por exemplo nos Acórdãos de 10-1-2008 relatado pelo Conselheiro Nuno Cameira -75.000 EUR - e de 16-10-2008 relatado pelo Conselheiro Oliveira Vasconcelos - 70.000 EUR), mas também em montante inferior (por exemplo nos acórdãos de 29-3-2007 (JusNet 2489/2007) relatado pelo Conselheiro Oliveira Vasconcelos - 40.000 EUR e de 13-9-2007 relatado pelo Conselheiro Salvador da Costa -40.000 EUR). De sublinhar que maioritariamente se vindo a fixar esse dano na importância de 50.000 EUR (vide acórdãos de 14-5-2009 relatado pelo Conselheiro Moreira Alves, de 19-3-2009 relatado pelo Conselheiro Lázaro Faria, de 12-2-2009 (JusNet 665/2009) relatado pela Conselheira Maria dos Prazeres Beleza, de 24-1-2008 relatado pelo Conselheiro Duarte Soares, de 29-1-2008 relatado pelo Conselheiro relatado pelo Conselheiro Cardoso de Albuquerque, de 21-2-2008 relatado pelo Conselheiro Pires da Rosa, de 24-4-2008 relatado pelo Conselheiro João Bernardo, de 27-5-2008 relatado pelo Conselheiro Custódio Montes, de 5-6-2008 relatado pelo Conselheiro Mário Mendes, de 24-6-2008 relatado pelo Conselheiro Nuno Cameira, de 10-7-2008 (JusNet 5291/2008)relatado pelo Conselheiro Salreta Pereira, de 9-9-2008 (JusNet 8138/2008) relatado pelo relator desta acórdão, de 30-10-2008 relatado pelo Conselheiro Santos Bernardino, de 4-12-2008 relatado pelo Conselheiro Lázaro Faria, todos constantes dos sumários internos deste STJ. …”.. Este valor há-de ainda ser referencial para o necessário exercício de proporcionalidade na determinação das indemnizações por danos não patrimoniais de menor gravidade relativa. Assim, quanto à indemnização a fixar por danos não patrimoniais causados por ofensas à honra, realçamos os seguintes acórdãos: - do STJ de 10/07/2008 Relatado por Henriques Gaspar, in www.gde.mj.pt, processo 08P1410., que fixou uma indemnização de €10.000,00, por ofensa à honra de pessoa colectiva, praticada através de um jornal, em que, apesar do conteúdo da notícia ser verdadeiro, os respectivos títulos eram desvaliosos; - do STJ de 18/11/2008 Relatado por João Bernardo, in www.gde.mj.pt, processo 08B3227., que confirmou uma indemnização de €10.000,00, por ofensa à honra, praticada por pessoa singular contra pessoa singular, por imputação de factos criminosos; - da RC de 11/02/2009 Relatado por Ribeiro Martins, in JusNet 1158/2009., que fixou uma indemnização de €10.000,00, por ofensa à honra, praticada por pessoa singular contra pessoa singular, através da denúncia de que estaria a ser perseguida no seu emprego; - do STJ de 18/06/2009 Relatado por Alberto Sobrinho, in www.gde.mj.pt, processo 159/09.1YFLSB., que fixou uma indemnização de €40.000,00, por ofensa à honra, praticada por empresa de comunicação social contra pessoa singular, através de notícia que afirmava que a vítima beneficiava de pensões milionárias; - do STJ de 14/01/2010 Relatado por Pires da Rosa, in JusNet 203/2010, do qual citamos” … É inadequado concluir, como fazem os recorrentes, pela inadequação de uma indemnização de 50 000,00 euros, quando se vem fixando comummente nos tribunais portugueses a indemnização de 25 000,00 euros por "dano de morte". Nem isto é assim - o tal "dano de morte" há muito tem sido tratado no montante mínimo de 50 000,00 / 60 000,00 euros; nem aquilo é assim - os 50 000,00 euros são o somatório das indemnizações e os RR não se coibiram de atingir o património moral de três pessoas distintas. Na fixação do(s) montante(s) indemnizatório(s) haveremos que manter o quantitativo fixado nas instâncias. Porque nos parecem perfeitamente adequados dentro dos parâmetros de equidade que aqui nos devem guiar - art.566º, nº3 do CCivil - os quantitativos fixados, porque o acórdão recorrido mantém os valores fixados em 1ª instância por apelo à remissão prevista no art.713º, nº5 do CCivil ( à qual também nós fazemos apelo para importar aqui as considerações que suportam a quantificação desses danos ), porque - como se escreveu no acórdão deste STJ ( Lopes do Rego ) que o ora Relator também subscreveu, no proc. nº381/2002.S1, de 5 de Novembro de 2009 - « o juízo de equidade das instâncias, assente numa ponderação, prudencial e casuística, das circunstâncias do caso - e não na aplicação de critérios normativos - deve ser mantido sempre que - situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida - se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade ».”.., que confirmou indemnizações de €30.000,00, €15.000,00 e €5.000,00, por ofensa à honra, praticada por empresa de comunicação social contra pessoas singulares, através de notícia que associava as vítimas as tentativa de apropriação indevida de bens no contexto de partilhas de uma herança; - do STJ de 04/05/2010 Relatado por Urbano Lopes Dias, in JusNet 2168/2010, do qual citamos: “… A dificuldade na determinação do quantum indemnizatório por ofensa ao direito à honra (a par de ofensas à privacidade, à imagem, ou outras que causem à vítima sofrimento interior) é particularmente sentida por Pedro Pais de Vasconcelos, quando diz que ela "reside, por um lado, na demonstração da ocorrência desse sofrimento e, por outro, no da sua intensidade" (Direito de Personalidade, página 152). Traçadas, a traços largos, as ideias motivadoras deste tipo de indemnização por danos não patrimoniais, realçado que, no essencial, se deve atender, antes de tudo, à gravidade dos danos, eis-nos perante a tarefa de ditarmos o direito aplicável ao caso concreto, que passa, necessariamente, pela apreciação crítica dos factos provados e pela análise da tutela jurídica que os mesmos possam merecer. … A Declaração Universal dos Direitos do Homem consagra, no artigo 12º, o do direito à honra. O artigo 26º, nº 1, da Constituição, garante que a todos é reconhecido, entre outros, o direito ao bom nome e reputação. Por outro lado, o nº 1 do artigo 70º, do Código Civil, assegura que "a lei protege os indivíduos contra ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral". A honra juscivilisticamente tutelada abrange a projecção do valor da dignidade humana, a qual é inata a todos os seres humanos. Em sentido lato, ela abrange o bom nome e reputação, enquanto sínteses do apreço social pelas qualidades determinantes da unicidade de cada indivíduo e pelos demais valores pessoais adquiridos pelo indivíduo no plano moral, intelectual, sexual, familiar, profissional ou político, engloba o simples decoro, como projecção dos valores comportamentais do indivíduo no que se prende ao trato social, e envolve o crédito pessoal, como projecção social das aptidões e capacidades económicas desenvolvidas por cada homem (Rabindranath V. A. Capelo de Sousa, O Direito Geral da Personalidade, páginas 301 e ss.). A honra significa tanto o valor moral íntimo do homem, como a estima dos outros, ou a consideração social, o bom nome ou a boa fama, o sentimento, ou consciência, da própria dignidade humana. Para o Cardeal Saraiva, "tem honra o homem que constantemente, e por hum sentimento habitual, procura alcançar a estima, a boa opinião e o louvor dos outros homens e trabalha por o merecer", certo que "o sentimento de honra nasce de hum bem sucedido amor de nós mesmos, e nos leva directamente à virtude e às acções generosas, como único meio de alcançarmos boa opinião e louvor dos outros homens" (Obras completas, tomo VII, páginas 186 e 187, citado por José Augusto Sacadura Garcia Marques, A Tutela Geral da Personalidade e o Sentido ao Bom Nome na Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, apud Comemorações dos 35 Anos do Código Civil e dos 25 da Reforma de 1977, Volume II, página 111). No campo jurídico ela pode definir-se como a dignidade pessoal reflectida na consideração dos outros e no sentimento da própria pessoa. Tal direito é um direito inato da personalidade: pelo simples facto do nascimento toda a criatura tem, em si mesma, o bem da própria honra. "Posteriormente, a posição que o indivíduo adquire na sociedade, o género de actividade que pratica, as qualidades pessoais que se desenvolvem com a idade, são todos os elementos que a honra individual pode sofrer maior ou menor desenvolvimento, revelando-se por um modo ou por outro. ... Mesmo o sexo, a raça, a nacionalidade, conferem à honra outros tantos aspectos especiais, mas, no entanto, o conceito de honra, ainda que proteiforme, conserva a sua fundamental unidade. O direito à honra é, portanto, único (Adriano De Cupis, Os Direitos da Personalidade, página 111 e ss.) O direito à honra é uma das mais importantes concretizações da tutela e do direito da personalidade. A honra é a dignidade pessoal pertencente à pessoa enquanto tal, e reconhecida na comunidade em que se insere e em que coabita e convive com outras pessoas. A honra existe numa vertente pessoal e subjectiva, e noutra vertente social, objectiva. Na primeira, traduz-se no respeito e consideração que cada pessoa tem de si própria, na segunda, traduz-se no respeito e consideração que cada pessoa merece ou de que goza na comunidade a que pertence. "Todas as pessoas têm direito à honra pelo simples facto de existirem, isto é, de serem pessoas" (Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª edição, página 62, e Direito de Personalidade, página 76). A honra será interior - opinião ou sentimento de uma pessoa sobre o seu próprio valor, ou exterior - representação que os outros têm sobre o valor de uma pessoa, a chamada reputação ou bom nome (Manuel da Costa Andrade, Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal, página 79). Para este consagrado penalista coimbrão, citando Rudolphi, "a dignidade penal da honra radica na convicção de que «a pessoa só pode viver e desenvolver-se de forma adequada numa comunidade quando os outros membros da comunidade lhe reconhecem a qualidade de pessoa e a tratam em conformidade com o seu Geltungswert. Se se recusa à pessoa este valor, através da divulgação de expressões de não-respeito ou de desrespeito, tal equivale a reduzir as possibilidades de viver e de se desenvolver no interior da sociedade". E, em consonância, remata, dizendo que "a honra terá, assim, de representar a merecida ou fundada pretensão de respeito da pessoa no contexto das relações de comunicação e interacção social em que é chamada a viver" (obra citada, página 81). Orlando de Carvalho sustenta que "o valor da honra, enquanto dignitas humana, «é mais importante que qualquer outro (valor do direito à projecção moral, ou seja, o direito à honra em sentido amplo) e transige menos facilmente com os demais em sede de ponderação de interesses" (Teoria Geral da Relação Jurídica, página 65). … Com pertinência, Fernando Pessoa Jorge, avisa-nos de que "o dano considerar-se-á efeito lesivo se, à luz das regras práticas da experiência e a partir do caso, era provável que o primeiro decorresse do segundo, de harmonia com a evolução normal (e, portanto, previsível) dos acontecimentos" (Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, páginas 392 e 393). Pertinentemente, Pedro Pais de Vasconcelos avisa-nos que "nem todo o dano da personalidade é ilícito por si mesmo e sem mais. A sua ilicitude é a resposta a uma interrogação sobre se, naquelas circunstâncias concretas, é exigível àquela pessoa que sofra aquele dano concreto. É lícito se lhe for exigível que o sofra; é ilícito no caso contrário". Mas, logo de seguida, adverte que "esta conclusão não é arbitrária e exige um critério de decisão", o qual "decorre da «natureza das coisas», dos condicionamentos inerentes aos entia physica e dos entia moralia, principalmente do ethos imanente na vida da comunidade, que influenciam e dirigem, quer o legislador na formulação da lei, quer o julgador na decisão" (Destituição de Administrador, Direito de Personalidade e Providência de Esclarecimento Público, Separata de Estudos em Honra de Ruy Albuquerque, página 582). A normalidade da vida diz-nos que era previsível que aqueles factos, praticados pelo R./Recorrente, naquelas circunstâncias, produzissem aqueles danos. Pretender questionar as consequências da agressão a um dos bem mais preciosos da Pessoa, o direito à honra, mais importante que qualquer outro, enquanto dignitas humana, é, repetindo as palavras condensadas e sábias de Orlando de Carvalho, no fundo, negar-se a si próprio. Carece, portanto, de sentido a alegação do R./Recorrente no que tange ao chamado nexo causal, na medida em que pretendeu defender que as suas "agressões" não seriam causa adequada das "lesões" sofridas pela A./Recorrida. A sua condição humana não lhe permite, sequer, tal tipo de insinuações. Que não apenas na sua dimensão de liberdade (em primeiro lugar, o homem é "um originário"; em segundo, porque é também autor, não só se assumindo como um eu, mas também perante os outros, "naquela «distância originária» ou diferença entre o «eu» e o «tu» pela qual cada um descobre a sua identidade, sem esquecer a dimensão temporal, ou seja, a identidade do "eu" na diferença do tempo), mas também no reconhecimento do homem enquanto pessoa, o qual terá de "ser recíproco: os outros só me podem reconhecer como pessoa se eu os reconhecer a eles como pessoa". Ou seja, "o reconhecimento é assim um diálogo ético - um diálogo entre pessoas". Só assim, reconhecendo esta realidade, afirmando-se a pessoa como pessoa, atingiremos o fundamento à sua qualidade ética de sujeito ético e, "então, não podemos também deixar de reconhecer, segundo o enunciado de Hegel, que «o imperativo do direito é este: sê pessoa e respeita os outros como pessoas" Castanheira Neves, Digesta, Volume 3º, Sobre o Direito, Coordenadas de uma reflexão sobre o problema universal do direito, páginas 32 a 36). Nesta perspectiva, personalista, não podemos acreditar na autenticidade da proposta do R./Recorrente que traduz uma negação da sua própria Pessoa: não só na sua dimensão pessoal, mas também na relação (necessária) com os outros. Como pessoa livre e responsável deverá o R./Recorrente, de uma vez por todas, pensar e repensar, nos seus actos e nas suas consequências que, no concreto caso da A./recorrida, foram, sem dúvida alguma, trágicas. É dentro deste ponto de vista, que temos como sendo o certo, que não podemos deixar de dizer que 10.000 EUR é um nada. Melhor: representa aquele quid mínimo que, indo ao encontro das exigências contidas no já citado artigo 496º do Código Civil, poderá ajudar a minorar todo o extenso sofrimento a que a A./Recorrida, foi, injustamente, sujeita. É que, vistas bem as cousas, a dor de alma é, sem receios de exageros, incomensurável, mau grado os esforços (louváveis) da Psiquiatria em tentar medi-la.”.., que confirmou uma indemnização de €10.000,00, por ofensa à honra, praticada por pessoa singular contra pessoa singular, por insultos e imputação de factos a uma professora numa reunião escolar; - do STJ de 09/09/2010 Relatado por Gonçalo Xavier Silvano, in JusNet 4278/2010, do qual citamos: “…Ficou provado que após a publicação do artigo com a fotografia em causa iam pessoas ver o local e comentavam que era a casa da Drª V..., presa na Venezuela, chegando a abordar a Autora questionando-a sobre a situação do processo de droga na Venezuela, afirmando com isto o seu envolvimento e sentindo-se, por isso, a autora envergonhada e humilhada. Esta publicação da referida fotografia acarretou para a Autora uma perturbação, uma perda de paz e de tranquilidade individual, sentimentos que não podem deixar de ser associados à ofensa à honra própria e que se traduzem nas referidas vergonha e humilhação. No contexto em que foi inserido o nome da autora relacionado com a casa que lhe pertence e onde vive, com todas as referências do meios de Arroiolos que se seguiram, traduzem, sem dúvida alguma, uma forte e intensa ofensa à honra da autora ,pessoa conhecida no meio e dados os cargos públicos que havia desempenhado. … Trata-se de danos não patrimoniais efectivamente graves pela associação da autora ao envolvimento no negócio da droga, que merecem a tutela do direito, de harmonia com o art. 496º nº1 CC. Seguindo os ensinamentos da doutrina (Antunes Varela-Das Obrigações em Geral-Vol.I-3ª ed.pág.497 e ss.e Almeida e Costa-Direito das Obrigações,5ª ed.pág.483 e ss)que ,reconhecem que a indemnização de danos não patrimoniais não reveste natureza exclusivamente ressarcitória, desempenhando também uma função preventiva e uma função punitiva, sendo o montante a atribuir fixado com recurso à equidade ,ponderando-se as circunstâncias concretas do lesante e do lesado nos termos do artº 494º do CC, entendemos que a indemnização de EUR 20.000 euros atribuída no acórdão se mostra ajustada à ofensa que feita à honra e bom nome da autora com a publicação da fotografia no contexto factual apurado. …”., que confirmou uma indemnização de €20.000,00, por ofensa à honra, praticada por empresa de comunicação social contra pessoa singular, através de notícia que associava a vítima ao tráfico de droga; - do STJ de 26/01/2011 Relatado por Armindo Monteiro, in www.gde.mj.pt, processo 417/09.5YRPTR., que fixou uma indemnização de €5.000,00, por ofensa à honra, praticada por pessoa singular contra pessoa singular (ambas magistradas), através de associação da vítima a suspeitas de corrupção; - do STJ de 06/07/2011 Já antes citado, a propósito da honra das pessoas colectivas, relatado por Gabriel Catarino, in www.gde.mj.pt, processo 2619/05.4TVLSB.L1.S1., que fixou uma indemnização de €10.000,00, por ofensa à honra, praticada por empresa de comunicação social contra pessoa singular, através de notícia que associava a vítima a “negócios obscuros na Expo 98”; - do STJ de 14/02/2012 Relatado por Hélder Roque, in www.gde.mj.pt, processo 5817/07.2TBOER.L1.S1., que fixou uma indemnização de €30.000,00, por ofensa à honra, praticada por empresa de comunicação social contra pessoa singular pública, através de artigo de opinião sobre uma tentativa de interferir com os comentários de um comentador televisivo; - do STJ de 15/03/2012 Relatado por Hélder Roque, in www.gde.mj.pt, processo 3976/06.0TBCSC.L1.S1., que fixou uma indemnização de €15.000,00, por ofensa à honra, praticada por empresa de comunicação social contra pessoa singular pública, através de notícia que associava a vítima, treinador de futebol, ao uso de “doping”, - e do STJ de 23/10/2012 Relatado por Mário Mendes, in www.gde.mj.pt, processo 2398/06.8TBPDL.L1.S1, do qual citamos: “…De acordo com a posição que vimos defendendo em todas as situações em que a questão se coloca, os danos morais ou prejuízos de natureza não patrimonial são, por natureza, insusceptíveis de avaliação pecuniária, uma vez que atingem bens que não integram o património material do lesado e, exactamente porque assim é, o seu ressarcimento deve assumir uma natureza fundamentalmente compensatória e acessoriamente sancionatória[…], não servindo para aqui o chamado dano de cálculo. No nosso ordenamento jurídico estabeleceu-se um critério de fixação do quantum indemnizatório devido por danos não patrimoniais que se encontra fundado no recurso à equidade, haja dolo ou culpa, (artigo 496º nº 3 CCivil) e que, com respeito por padrões de dignidade humana, manda atender aos factores referidos no artigo 494º (entre os quais se conta a situação económica do lesante e do lesado) como factores contributivos para a formação do juízo ou juízos de equidade. No entanto, a ausência de factos que possam servir para determinar a aplicação de um ou mais dos factores indicativos referidos no artigo 494º não impede por si a formulação do juízo de equidade de que depende a fixação do quantum desde que os demais elementos de facto disponíveis permitam ao julgador a sua formulação, que deve, sempre e em qualquer circunstancia, ter em conta as regras da boa prudência, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida, sem esquecer a tal (já referida) natureza mista – compensatória/sancionatória – que deve revestir a indemnização[…] Na verdade, devendo a fixação da indemnização decorrer de um julgamento de equidade (artigo 496 nº 3), que dispensa o julgador da inteira subordinação a critérios puros e rigorosos de carácter normativo, não existe, nesse preciso contexto, um obrigação absoluta de recurso aos factores indicativamente referidos no artigo 494º, antes devendo ser ponderadas as todas as circunstancias concretas e disponíveis do caso que sejam atendíveis para fixação de uma indemnização em montante justo[…]. Posto isto, e ponderadas todas as circunstancias relevantes que nos são fornecidas pelos factos provados, circunstancias que indiscutivelmente que apontam para uma ofensa grave dos direitos fundamentais à honra e bom nome do A[…], uma ofensa que naturalmente provocou sofrimento tanto a ele como aos seus familiares mais directos (v. os pontos DZ a EE dos factos provados), dentro dos critérios enunciados[…] e ponderados os montantes que para situações similares, ainda que menos graves, vêem sendo atribuídos pela nossa jurisprudência mais recente (v. acórdãos deste STJ de 18/6/2009, relator Alberto Sobrinho, de 25/3/2010, relatora Maria dos Prazeres Beleza, 14/5/2002, relator Ferreira Ramos, que contemplam situações menos graves), julga-se adequado fixar a indemnização devida por danos não patrimoniais sofridos pelo A em € 50.000,00, assim se concedendo, neste segmento e parcialmente a revista ao recurso do recorrente AA. …”., que fixou uma indemnização de €50.000,00, por ofensa à honra, praticada por empresa de comunicação social (televisão) contra pessoa singular pública, através de notícia que associava a vítima a um conhecido caso de pedofilia. Por outro lado, subscrevemos inteiramente a jurisprudência do acórdão do STJ de 20/05/2010 Relatado por Lopes do Rego, in www.gde.mj.pt, processo 103/2002.L1.S1. Subscreveu esta posição o já citado acórdão do STJ de 14/01/2010, relatado por Pires da Rosa, in JusNet 203/2010., que tem aplicação a qualquer caso de recurso sobre indemnizações fixadas equitativamente: “O juízo de equidade das instâncias, concretizador do montante a arbitrar a título de dano biológico, assente numa ponderação, prudencial e casuística, das circunstâncias do caso – e não na aplicação de critérios normativos – deve ser mantido sempre que – situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida - se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade.”. Tendo em conta aqueles parâmetros e este entendimento, importa atentar nos factos dados como provados, relevantes para este efeito: - Os danos sofridos, consubstanciam-se na afectação da credibilidade, do prestígio e da confiança das Assistentes (factos t) a y) e oo)); - O Arg. é jornalista (facto b)), mas não fez as imputações em causa no exercício da sua profissão (facto d)); - Tanto o Arg. como as Assistentes são figuras públicas Quanto ao conceito de figura pública, ver, Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 44 a 49. Bem como o citado acórdão do STJ de 14/02/2012, relatado por Hélder Roque, in www.gde.mj.pt, processo 5817/07.2TBOER.L1.S1, do qual citamos: “…Figura pública é alguém que conseguiu, pelos seus próprios esforços voluntários, colocar-se “in the public eye”, o indivíduo que chegou a uma posição na qual a atenção pública está focada para si como pessoa[…], aquela pessoa que emerge, dentro de cada um dos subsistemas sociais, numa posição de especial protagonismo, mas sem esquecer que este estatuto tem, obviamente, de ser anterior à divulgação da notícia, exigindo-se, igualmente, um conceito normativo de «figura pública», na perspectiva do «interesse público» e não, apenas, «de um interesse do público»[…]. Este conflito de direitos, em torno das «figuras públicas», deve ser resolvido, sem sacrifício total de qualquer um dos bens em tensão, mas antes de acordo com o fundamento teleológico das eventuais restrições – direito ao bom-nome e reputação ou liberdade de expressão e informação – só podendo justificar-se uma limitação ao interesse público da protecção dos direitos de personalidade quando pela imprensa for exercida a função informativa, e não já no âmbito de outras funções, como a recreativa ou publicitária[…]. De todo o modo, deve existir uma conexão entre a pessoa e a matéria de interesse público, no quadro de uma relação entre a importância da figura pública e a ocasião da divulgação para o interesse público, por um lado, e a natureza dos factos revelados, por outro. A consideração do motivo e da medida da relevância pública ou social da notícia, de acordo com o critério geral do interesse legítimo na revelação, impõe que se tenha em conta a causa da notoriedade da pessoa e a correspondência entre esta e os factos noticiados, designadamente, questionando se estes são relevantes para uma valoração, ainda que apenas global, da pessoa, justificada à luz do interesse geral[…]. Quando, por vezes, a invectiva extravasa para o plano pessoal, em virtude das contingências do debate livre das ideias, garantes de uma sociedade democrática, as expressões utilizadas não têm de ser, necessariamente, interpretadas como referidas, também, à personalidade da pessoa visada, mas antes a essa personalidade enquanto actor de um cenário politico[…]. Por outro lado, a crítica aos titulares de cargos públicos, «maxime», aos titulares de órgãos de soberania, em especial, a crítica política, tem de admitir-se com toda a latitude, desde que não haja mero espírito de revanche, de cegueira ideológica, de ataque imotivado. O político que, no desempenho das suas actividades privadas ou oficiais, tem de se sujeitar à crítica do público, nem, por isso, merece uma menor exigência de protecção contra o insulto, não tendo, neste particular, de suportar uma exposição à discussão pública maior do que acontece com as pessoas privadas[…]. Se, na esfera privada, as figuras públicas gozam de protecção da honra igual à do cidadão comum[…], já na esfera pública, quando se trata de combater o pensamento, as palavras, as atitudes e as condutas das figuras públicas, no âmbito da publicidade, ganha projecção a terceira dimensão da liberdade de expressão, ou seja, a liberdade de crítica ou de criação artística, como forma de esconjurar o fantasma de uma atmosfera de intimidação capaz de induzir uma auto-censura da imprensa que seria, particularmente, perigosa para a subsistência da democracia[63], sendo certo que o controlo público das figuras públicas representa o fundamento irrenunciável da vida política em liberdade[…], sem esquecer a proximidade destes personagens, em relação aos meios de comunicação social, nem os sistemas de contacto que com eles logram estabelecer ou manter[…]. Por isso, tem vindo a aumentar o número daqueles que defendem que estes conflitos devem ser encaminhados mais para a arena política do que para as salas dos tribunais[…], considerando-se, a este propósito, que se a sua exposição à publicidade se traduz numa maior visibilidade e vulnerabilidade, as figuras públicas têm um acesso privilegiado aos meios de comunicação social, podendo mais, facilmente, responder com “mais discurso” às agressões de que considerem ter sido vítimas[…]. A fronteira do permitido só é ultrapassada quando a valoração negativa deixa de se dirigir contra a específica pretensão de mérito, v. g., a imagem construída, de forma mais ou menos planificada, de uma «public figure», e passa a atingir, directamente, a substância pessoal, isto é, passa a denegar aquele respeito de que toda a pessoa é credora, por força da sua dignidade humana[…]. Assim, não pode aceitar-se que, a pretexto de uma crítica institucional, se ataque a pessoa do visado, para além do juízo, eventualmente, negativo que se faça da sua obra, deste modo se evitando uma intenção lateral de ofensa injusta e, logo, não justificada pela crítica, ou que não se respeitem os limites de valoração objectiva e de consciência crítica, inflectindo-se o discurso para considerações desnecessárias à personalidade do ofendido, susceptíveis de o degradar como pessoa. Porém, a necessidade da criação de uma esfera de discurso público, aberta e pluralista, e o valor da liberdade de comunicação para a auto-determinação democrática da comunidade e para o controlo público do funcionamento das instituições, apontam no sentido da protecção constitucional de um número significativo de afirmações que tenham como exteriorização negativa a agressão ao bom-nome, à reputação ou à privacidade dos titulares de cargos públicos, a propósito das patologias do sistema político, independentemente de daí resultarem danos colaterais, em matéria de bom-nome e reputação[…]. Os cidadãos, em geral, e os jornalistas, em particular, devem poder debater, abertamente, as questões de interesse público, sob pena de a crítica pública deixar de ser um direito para se tornar num risco[…], independentemente do choque, da amargura, do trauma, ou do distúrbio emocional que daí possam resultar. Com efeito, a protecção do direito ao respeito da reputação de outros é, automaticamente, reduzida quando se trata de homens políticos[…] …”. (factos b), z), aa), bb), ee) e xx)); - O Arg. é uma pessoa singular e as Assistentes são pessoas colectivas (quando o agente é uma empresa de comunicação social, a indemnização deve ser agravada, de forma a evitar que os lucros obtidos com a notícia ofensiva da honra de outrem compensem as respectivas consequências Neste sentido, ver Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 222 a 227, bem como a doutrina e a jurisprudência aí citadas.; por outro lado, como já vimos, a honra das pessoas colectivas deriva da dignidade social e não da «dignitas humana», pelo que não há sofrimento como na pessoa humana, o que atenua o dever indemnizatório); - O Arg. tem um rendimento mensal de cerca de €5.000,00 (facto zz)) e não se provou qualquer facto quanto à situação económica das Assistentes, sendo a situação económica do agente e do lesado relevante nos termos do disposto nos art.º 496º/3 e 494º do CC; - No entanto, o Arg. não tinha qualquer fundamento para, em boa-fé, reputar como verdadeiros os factos que imputou às Assistentes (facto pp)), pelo que a indemnização não deve ser reduzida nos termos do disposto no art.º 494º do CC Neste sentido, ver Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, pág. 229.; - As imputações foram feitas perante terceiros (caso em que a indemnização deve ser superior à que se fixa para o caso das imputações serem feitas só perante a vítima), a partir de um texto escrito (facto e)), logo ponderado (o que torna mais extenso o dever de indemnizar), e foram várias vezes reiteradas (factos j) e n)), tendo tido uma enorme repercussão mediática (factos k), l), m), o), p) e q)), o que também actua no sentido de agravar o dever de indemnizar Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 228.; Os factos imputados constituem crime, o que torna mais extenso o dever de indemnizar Idem, ibidem.; Tendo em conta todos estes elementos e parâmetros, entendemos que a indemnização ajustada seria a de €10.000,00 para cada uma das Assistentes, pelo que há que concluir que, tendo sido fixadas em €50.000.00, o tribunal recorrido ultrapassou a margem de discricionariedade de que dispunha e os critérios jurisprudenciais que generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade, a merecer intervenção correctiva deste tribunal. É, pois, procedente nesta parte o recurso. ***** Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, julgamos parcialmente provido o recurso e, consequentemente, decidimos: a) A alínea u) dos factos dados como provados passa a ter o seguinte teor: “As afirmações do Arguido foram proferidas na Assembleia da República, espaço de eleição no relacionamento da A.S.J.P. com os Senhores Deputados da 1ª Comissão, e também mediante audiências com os Grupos Parlamentares.”; b) A alínea t) dos factos dados como provados passa a ter o seguinte teor: “As afirmações do Arguido afectaram de forma séria a credibilidade, prestígio, confiança e bom nome da Assistente Associação Sindical dos Juízes Portugueses.”; c) A alínea oo) dos factos dados como provados passa a ter o seguinte teor: “As imputações em causa afectaram a credibilidade, o prestígio e a confiança que são devidos à pessoa colectiva Sindicato dos Magistrados do Ministério Público.”; d) Considerar não escritas em sede de matéria de facto provada as alíneas jj), kk) e ss); e) Fixar as indemnizações arbitradas às Assistentes em €10.000,00 (dez mil euros), para cada uma delas; f) No mais, confirmar a decisão recorrida; g) Condenar o Recorrente nas custas crime, com taxa de justiça que se fixa em 3 (três) UC; h) Condenar o Arg. e as Assistentes nas custas cíveis, na proporção do decaimento. * Notifique. D.N.. ***** Elaborado em computador e integralmente revisto pelo relator (art.º 94º/2 do CPP). ***** Lisboa, 22/11/2012 ______________________ (João Abrunhosa) __________________________ (Maria do Carmo Ferreira) _______________________________________________________ 1. Arguido/a/s. 2. Termo/s de Identidade e Residência. 3. Prestado em 03/03/2011. 4. Ministério Público. 5. “Associação Sindical do Juízes Portugueses”. 6. “Sindicato dos Magistrados do Ministério Público” 7. Relativamente à fundamentação de facto, cf. a jurisprudência plasmada no Ac. STJ de 17/11/1999, relatado por Martins Ramires, in CJSTJ, III, p. 200 e ss., do qual citamos: “O entendimento do STJ sobre o cumprimento deste preceito encontra-se sedimentado: trata-se de exposição tanto quanto possível completa, mas concisa, dos motivos de facto e indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, sem necessidade de esgotar todas as induções ou critérios de valoração das provas e contraprovas, mas permitindo verificar que a decisão seguiu um processo lógico e racional na apreciação da prova, não sendo ilógica, arbitrária contraditória ou violadora das regras da experiência comum ... .”. Também neste sentido, ver Maria do Carmo Silva Dias, in “Particularidades da Prova em Processo Penal. Algumas Questões Ligadas à Prova Pericial”, Revista do CEJ, 2º Semestre de 2005, pp. 178 e ss., bem como a doutrina e a jurisprudência constitucional citadas. No mesmo sentido, cf. Sérgio Gonçalves Poças, in “Da sentença penal – Fundamentação de facto”, revista “Julgar”, n.º 3, Coimbra Editora, p. 21 e ss.. Ver ainda José I. M. Rainho, in “Decisão da matéria de facto – exame crítico das provas”, Revista do CEJ, 1º Semestre de 2006, pp. 145 e ss. donde citamos: “Em que consiste portanto a especificação dos fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção? Consiste simplesmente na indicação das razões fundamentais, retiradas a partir das provas segundo a análise que delas fez o julgador, que levaram o tribunal a assumir como real certo facto. Ou, se se quiser, consiste em dizer por que motivo ou razão as provas produzidas se revelam credíveis e decisivas ou não credíveis ou não decisivas. No primeiro caso o tribunal explica por que julgou provado o facto; no segundo explica por que não julgou provado o facto. … a motivação não tem porque ser extensa, de modo a significar tudo o que foi probatoriamente percepcionado pelo julgador. Pelo contrário, deve ser concisa, como é próprio do que é instrumental, conquanto não possa deixar de ser completa.”. Ver, por último, o acórdão do Tribunal Constitucional de 17/01/2007, in DR, 2ª Série, n.º 39, de 23/02/2007, que decidiu, além do mais, “Não julgar inconstitucional a norma dos artigos 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal, interpretados no sentido de que não é sempre necessária menção específica na sentença do conteúdo dos depoimentos da arguida e das testemunhas de defesa.”. 8. Supremo Tribunal de Justiça. 9. Nesse sentido, ver Manuel de Andrade, in “Teoria Geral da Relação Jurídica”, vol. I, Livraria Almedina, Coimbra, 1974, a págs. 49 e 50. 10. Nesse sentido, ver Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, II, Verbo, 2008, pág. 286, que, a propósito da responsabilidade penal das pessoas colectivas, afirma: “… É que a pessoa colectiva não actua por si mesma, mas sempre por intermédio de outrem, seu órgão ou representante. Nessa medida o facto pelo qual a pessoa colectiva responde penalmente é um facto de outrem que actua por ela e frequentemente sucede que só porque a pessoa física actua em lugar da pessoa jurídica é que é também responsável, pois há elementos do tipo que só se verificam na pessoa jurídica e não na pessoa física. …”. 11. Cf. Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Coimbra Editora, 2º reimpressão, 2009, pág. 668, donde citamos: “… Titular do direito de queixa é, em princípio e apenas, «a pessoa ofendida, considerando-se como tal o titular dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação» (…). O que significa, por seu lado, que como tal deve ser considerado o portador do bem jurídico, para determinação do qual se apresenta como decisiva a interpretação do tipo-de-ilícito respectivo. “. 12. Código Penal. 13. In “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, Coimbra Editora, 2º reimpressão, 2009, pág. 663. 14. Nesse sentido, veja-se a seguinte jurisprudência: Acórdão do STJ de 03/10/2002, no proc. 02P2519, relatado por Simas Santos, in www.gde.mj.pt, do qual citamos: “… Foi, pois, colocada e resolvida no despacho recorrido a questão de saber se a admissão da requerente como assistente, advogando em causa própria, constitui caso julgado impeditivo de nova pronuncia sobre a matéria. Essa leitura foi, não obstante, impugnada pela recorrente, como se vê do texto da motivação e das conclusões 2:ª a 4.ª, pelo que pode (e deve) ser aqui abordada previamente à restantes questões que acima se equacionaram. Já entendeu este Tribunal, em acórdão com o mesmo relator (de 8.2.01, Acs STJ IX, 1, 229) que: «(6) Sendo o estatuto do assistente dinâmico e reversível, o despacho que admite a sua intervenção apenas faz caso julgado rebus sic standibus. (7) O julgamento sobre a legitimidade do requerente para intervir como assistente, só garante o exercício formal dos poderes e direitos que lhe são cometidos por tal qualidade, mas que não dispensa ou impossibilita o(s) julgamento(s) que a lei processual penal prescreva, designadamente no momento em que deduz acusação ou requer a instrução, ou interpõe recurso da decisão final.» Vejamos pois se o despacho que a admitiu a intervir como assistente faz caso julgado formal quando a este estatuto. Já reconheceu o Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 11.7.91 (CJ XVI, 4, 21) que, no domínio do CPP de 1929 e legislação complementar, era entendimento unânime de o despacho que admitia alguém a intervir como assistente não constituía caso julgado, mas concluiu-se que, de acordo com o CPP de 1987, o despacho que admita alguém como assistente, ainda que se refira de forma genérica à legitimidade do requerente faz caso julgado quanto a essa mesma legitimidade, entendida como a qualidade que lhe permite exercer adequada e atempadamente os direitos processuais conferidos à figura do assistente (posição criticada por José António Barreiros, Sistema e Estrutura do Processo Penal Português, II, pág. 164). Para chegar a este resultado essa douta decisão ponderou expressamente que o despacho de admissão como assistente se encontra «em perfeita sintonia com a parte do despacho saneador que, no processo civil, aprecia obrigatoriamente, ainda que de maneira genérica, a legitimidade das partes, e que faz, quanto a esse ponto, caso julgado, em harmonia com o Assento deste Supremo de 1 de Fevereiro de 1963, no Boletim 124, 414». Mas esse pressuposto não se mantém. Com efeito, este Tribunal fixou, no Acórdão n.º 2/95 (Acórdão n.º 2/95 do STJ de 16.5.95, DR IS-A de 12-6-95), a seguinte jurisprudência: «a decisão judicial genérica transitada e proferida ao abrigo do artigo 311º, n.º 1, do Código de Processo Penal, sobre a legitimidade do Ministério Público, não tem o valor de caso julgado formal, podendo até à decisão final ser dela tomado conhecimento». E nas conclusões que aí se formularam a anteceder imediatamente o «assento» teve-se expressamente inaplicável ao processo penal o referido Assento de 1 de Fevereiro de 1963. São as seguintes essas conclusões: 1 - A falta de regulamentação sistemática e específica do caso julgado no Código de Processo Penal (cfr o Ac. de STJ de 31.10.91, CJ XVI, 4, 5) não permite, por si própria, o recurso nos termos do artigo 4.° deste Código aos preceitos sobre tal matéria constantes do Código de Processo Civil. 2 - Em matéria de caso julgado formal, quanto ao despacho previsto no artigo 311.°, n.° 1, do Código de Processo Penal, não existe qualquer lacuna que imponha por indício normativo o recurso à analogia para aplicação do regime constante do artigo 672.° do Código de Processo Civil e do Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Fevereiro de 1963, ex vi do artigo 4.° do Código de Processo Penal. 3 - Se se verificasse a existência de lacuna, a sua integração, com base no artigo 4.° do Código de Processo Penal, só se poderia operar desde que se não produzisse uma diminuição dos direitos processuais dos arguidos. 4 - A aplicação ao processo penal dos normativos processuais civis acima referidos implica uma manifesta diminuição relativa ao estatuto processual dos arguidos; 5 - Também a aplicação neste caso dos referenciados normativos processuais civis infringe o princípio da igualdade jurídica, essencial entre o caso regulado e o caso a regular, e o princípio da harmonização contido no artigo 4.° do Código de Processo Penal. 6 - Isto porque não existe a mesma identidade de natureza e finalidade entre o despacho saneador contemplado no artigo 510°, n.°s 1, al.s a) e b), e 2, do Código de Processo Civil e o despacho de saneamento a que se refere o artigo 311.°, n.° 1, do Código de Processo Penal. 7 - Igualmente a aplicação da doutrina do Assento do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Fevereiro de 1963 colide e não se harmoniza com os princípios fundamentais do processo penal, tais como o princípio da verdade material, do favor rei e do favor libertatis, sendo nessa parte irrelevante a ressalva contida no mesmo assento que condiciona o efeito de caso julgado formal sobre a legitimidade à superveniência de factos que nela se repercutam. 8 - O artigo 368.°, n.° 1, do Código de Processo Penal (como, de resto, o artigo 338,°, n.° 1) não tem, quanto à sua preclusão, o valor de estabelecer força de caso julgado formal para o despacho genérico sobre a legitimidade do Ministério Público, proferido anteriormente, mas tem apenas por finalidade estabelecer uma ordem de análise das várias questões, pretendendo evitar a duplicação da sua apreciação. 9 - Assim, o despacho sobre a legitimidade do Ministério Público, proferido em termos genéricos, ao abrigo do artigo 311.°, n.° 1, do Código de Processo Penal, não reveste o valor de caso julgado formal. Na sequência, decidiu este Tribunal que «tendo-se afirmado no exame preliminar que "os recursos haviam sido interpostos por quem tinha legitimidade", não significa isso, que fique resolvida em definitivo a questão relativa a este pressuposto processual, por analogia com a situação contemplada no acórdão obrigatório n.º 2/95 de 16.5.95» (Ac. do STJ de 11.6.97, proc. n.º 123/97). À luz desta jurisprudência fixada, e das suas razões que se acompanham, entende-se que se não deve afastar do entendimento desenvolvido perante o CPP de 1929 de que o despacho que admite a intervenção como assistente não faz caso julgado formal sobre a legitimidade deste. E se podem postular os princípios de segurança jurídica e da estabilidade da instância impõem-se, neste domínio e em contrário, os já referidos princípios fundamentais do processo penal, da verdade material, do favor rei e do favor libertatis. Refere a propósito, José António Barreiros (ob. cit. II, 164): «contrariamente ao que se passa com o estatuto do arguido, o do assistente é caracteristicamente dinâmico, é reversível. Daí que possa acontecer que um indivíduo seja admitido como tal e, em momento subsequente a essa admissão, ver revogada essa qualidade por verificação de não existência de requisitos formais para tanto. Tal despacho apenas faz caso julgado rebus sic standibus». O julgamento sobre a legitimidade do requerente para intervir como assistente, só garante o exercício formal dos poderes e direitos que lhe são cometidos por tal qualidade, mas que não dispensa ou impossibilita o(s) julgamento(s) que a lei processual penal prescreva, designadamente no momento em que deduz acusação ou requer a instrução, ou interpõe recurso da decisão final. Assim como a legitimidade para intervir como assistente se afere pela denúncia, a legitimidade a apreciar subsequentemente prende-se com a natureza do crime a que se refere a acusação ou requerimento para instrução e com a decisão recorrida, em caso de recurso. …”. O acórdão da RL de 15/01/2008, no proc. 5738/2007-5ª, relatado por Ricardo Cardoso, in www.gde.mj.pt, do qual citamos: “… Sendo a legitimidade pressuposto do exercício de um direito, sem o qual o mecanismo do procedimento criminal não pode ser accionado, no caso dos crimes semi-públicos, não pode o exercício de tal direito (o que significa “realizar as possibilidades de acção que constituem o seu conteúdo” P. Jorge), por pessoa diversa do titular, ser considerada como irregularidade, porque a lei considera tal excepção como ilegitimidade nos termos gerais do direito, o que determinava a absolvição da instância nos termos processuais civis. De igual modo, no processo penal (art.ºs 48 e 49 do CPP) nenhum acto pode ser praticado sem que se verifique a legitimidade do impulso penal (vulgo queixa ou participação) sendo os actos subsequentes, ofendidos pela falta de tal pressuposto, nulos, e por isso nunca irregulares por totalmente inaproveitáveis. Por outro lado, da admitida constituição da queixosa como assistente não resulta caso julgado formal, uma vez que os elementos constantes dos autos não só demonstram que se não podia constituir como tal, por o titular do direito de queixa ser o sócio gerente D… , como que tal decisão contrariava a realidade de facto (e com o consequente erro na aplicação do direito) em que tal despacho se fundamentou, podendo tal erro ser corrigido sempre de acordo com o escopo do procedimento que é o da averiguação da verdade. O despacho de admissão de intervenção nos autos como assistente tem natureza tabelar, porque declara a legitimidade para intervir como assistente, mas não se pronuncia sobre os respectivos fundamentos, razão por que não tem a virtualidade de conduzir à formação de caso julgado sobre essa questão, o que pressupõe apreciação dos respectivos fundamentos e decisão sobre os mesmos. Neste sentido veja-se o Acórdão deste Tribunal de 30 de Novembro de 2006 (Proc.º nº 3104/06.9, Relator Cid Geraldo, in www.pgdl.pt) : “Embora a questão de saber se o despacho a admitir a constituição como assistente forma ou não caso julgado formal tenha sido abordada em várias decisões jurisprudenciais, o certo é que a jurisprudência se inclina maioritariamente no sentido de que não se forma caso julgado formal com as decisões que admitem a constituição como assistente em processo penal, designadamente com o reforço que lhe advém da posição tomada no acórdão do STJ, para fixação de jurisprudência, proferido em 16/05/2005, in DR, de 12/06/05, já que a legitimidade é do conhecimento oficioso e tal despacho não conhece, em concreto da questão da legitimidade, limitando-se a pressupô-la em termos genéricos ou tabelares, podendo tal decisão ser livremente revista e alterada.” Tem por isso pleno acerto a decisão recorrida, não só na sua totalidade, como em especial na parte em que refere a jurisprudência deste Tribunal da Relação ao referir a irrelevância do despacho de admissão da queixosa como assistente (“… mesmo tendo havido despacho judicial a admitir o ofendido na qualidade de assistente” (cfr. Ac. do TRL de 08/07/2004, Proc.º nº 6323/2004-9, in www.dgsi.pt)). …”. O acórdão da RL de 08/07/2004, no proc. 6323/2004-9ª, relatado por Cid Geraldo, in www.gde.mj.pt, do qual citamos: “… Assim sendo e, tendo em conta os factos denunciados (e apenas estes), o recorrente não tem legitimidade "ad causam" para se constituir assistente nos autos, mesmo apesar de ter havido despacho judicial a admitir o ofendido na qualidade de assistente, uma vez que apenas faz caso julgado formal junto do tribunal que proferiu tal despacho (se não houver recurso), só não se impondo ao tribunal superior, funcionando, naquele contexto, em 1ª instância, o princípio "rebus sic standibus" – neste sentido cfr. entre outros, Ac. Rel. Lisboa, de 2004/03/11 (Rec. n° 29/04), Ac. Rel. Lx. de 2002/06/25 (Rec. n° 1790/02, in www.dgsi.pt). Idem: Ac. Po. de 2000/10/18 (Rec. n° 40711/2000); Ac. Rel. Lx. de 2001/12/04 (Rec. n° 8531/01). …”. O acórdão da RL de 30/11/2006, no proc. 3104/06 9ª, relatado por Cid Geraldo, in www. pgdlisboa.pt, cujo sumário citamos: “I – Assim, não obstante a queixa ter sido apresentada pela pessoa colectiva “R. & Q., Lda”, representada pelo seu sócio gerente T. R., aquela, titular do interesse ofendido, nunca foi admitida nos autos como assistente. II – Quanto ao recorrente T. R., embora intervenha nos autos como assistente, falece-lhe legitimidade para tal, já que o ofendido sempre será a pessoa colectiva, a qual se apresenta juridicamente autónoma em relação às pessoas dos sócios. III – Invoca, porém, o recorrente que a primeira decisão que o havia admitido a constituir-se como assistente, constitui caso julgado formal, pelo que a decisão recorrida (rejeição do requerimento de abertura de instrução) é nula e inválida nos termos do artigo 122º, n.º 1, do Código Processo Penal. IV – Embora a questão de saber se o despacho a admitir a constituição de assistente forma ou não caso julgado formal tenha sido abordada em várias decisões jurisprudenciais, o certo é que a Jurisprudência se inclina maioritariamente no sentido de que não se forma caso julgado formal com as decisões que admitem a constituição como assistente em processo penal, designadamente com o reforço que lhe advém da posição tomada no Acórdão do STJ, para fixação de jurisprudência, proferido em 16/05/2005, in D:R. , de 12/06/95, já que a ilegitimidade é de conhecimento oficioso e tal despacho não conhece, em concreto da questão da legitimidade, limitando-se a pressupô-la em termos genéricos ou tabelares, podendo tal decisão ser livremente revista e alterada.”. 15. Código Civil. 16. Cf. Pires de Lima e Antunes Varela, in “CC Anot.”, I, Coimbra Editora, 1987, pág. 166. 17. Cremos que se trata de lapso a referência ao art.º 19º, já que actualmente o conteúdo referido e que para nós é relevante, consta do art.º 18º, dos referidos estatutos, tal como são apresentados no sítio do SMMP. 18. Cremos que se trata, de novo, de um lapso, já que actualmente o conteúdo referido consta do art.º 19º. 19. Neste sentido, cf. o ac. da RP de 21/01/2002, relatado por Ernesto Nascimento, in www.gde.mj.pt, processo 0846847, do qual citamos: “…Antes das alterações introduzidas pela Lei 59/98, não havia dúvidas de que as nulidades da sentença constantes das alíneas a) e b) (as únicas então existentes) do artigo 379º C P Penal, eram nulidades sanáveis e, portanto, dependentes de arguição. Nesta conformidade, de resto, sobre o caso particular da nulidade prevista na alínea a) do art. 379º C P Penal, consistente na falta de indicação, na sentença penal, das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, ordenada pelo art. 374º nº 2, do mesmo diploma, decidiu o STJ, pelo Assento de 6.5.1992, in DR-I Série-A, de 6.8.1992, com dois votos de vencido, que tal nulidade não era insanável, por isso não lhe sendo aplicável a disciplina do corpo do artigo 119º C P Penal. Na mesma linha, pressupondo a necessidade de arguição, veio o Acórdão 1/94 do Plenário das secções criminais do STJ, in DR-I Série-A, de 11.2.1994, dispor apenas sobre a tempestividade dessa arguição, firmando jurisprudência no sentido de que as nulidades da sentença, previstas então nas alíneas a) e b) do artigo 379º C P Penal, poderiam ser ainda arguidas em motivação de recurso para o tribunal superior, à semelhança do que para o processo civil resulta da 2ª regra da 1ª parte do nº 3 do artigo 668º do C P Civil. No entanto, o enquadramento legal da questão sofreu modificação. Com a alteração introduzida através da Lei 59/98 de 25.8, no C P Penal, foi o artigo 379º foi reformulado, tendo-se aditando-se uma nova alínea, c) ao nº 1, bem como o nº 2, com a seguinte redacção: “as nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso, sendo lícito ao tribunal supri-las, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no art. 414º, nº 4”. Se a nova alínea introduzida no nº. 1 do artigo 379º C P Penal, tem redacção semelhante à contida na alínea d) do nº 1 do artigo 668º C P Civil, já o novo nº. 2 do artigo 379º C P Penal corresponde a uma transposição parcial do nº 3 do art. 668º CPC e à adopção da doutrina contida no Acórdão 1/94, indo, porém, mais longe. Enquanto no regime do C P Civil, a arguição das nulidades pode ser feita em sede de motivação de recurso, no nº 2 do artigo 379º, impõe-se essa arguição nessa altura, “as nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso”. A parte final desta expressão só pode significar o conhecimento oficioso dessas nulidades, justificando-se o afastamento do regime previsto no processo civil, que diversamente do penal, é enformado pelo princípio da livre disponibilidade das partes processuais, neste sentido cfr. Ac. STJ de 12.9.2007, relator Silva Flor, consultável no site da dgsi. No sentido de que a nulidade do alínea a) do nº. 1 do artigo 379º C P Penal é do conhecimento oficioso, decidiram, entre outros, os Acs STJ de 12.9.2007, relator Raul Borges e de 17.10.2007….”. E o ac. da RP de 25/03/2009, relatado por Cravo Roxo, in www.gde.mj.pt, processo 0740063, do qual citamos: “…É aqui que a jurisprudência se tem dividido, entendendo uma parte que tais vícios não são de conhecimento oficioso e uma outra, não menos importante, que os considera passíveis de ser conhecidos em recurso, mesmo que não alegados. No sentido do conhecimento oficioso das nulidades da sentença, vejam-se os Ac. desta Relação, de 29.9.2994, processo nº 0442419, relatado por António Gama (dgsi.pt) e da Relação de Coimbra, de 24.2.2004, processo nº 2701/04, relatado por João Trindade, entre muitos outros, ainda inéditos (sendo mesmo hoje a posição maioritária no Supremo Tribunal de Justiça). E tem razão de ser tal conclusão, desde logo em sede de interpretação hermenêutica: a norma explicita, taxativamente, que as nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso, argumento fundamental no sentido do seu conhecimento oficioso; de outra forma, o termo “conhecidas” não faria qualquer sentido, ao surgir depois do termo “arguidas”. Propendemos, decididamente, para o conhecimento oficioso das nulidades da sentença, previstas no citado Art. 379º do Código de Processo Penal. …”. 20. Neste sentido, cf. o acórdão do STJ de 06/04/2006, relatado por Simas Santos, in CJSTJ, tomo II, pág. 161 e segs., do qual citamos: “…Como se disse, o recorrente suscita a questão da nulidade da decisão recorrida, nos termos do art. 379º, nº.1 b) do CPP, com um duplo fundamento: violação do disposto nos arts. 358º e 359º do CPP (conclusão 7ª). A violação do art. 358º do CPP consubstanciar-se-ia na sua condenação pela prática de crimes de falsificação de documento do art. 256º, nº.1 a) e nº. 3 do CP, quando se encontrava pronunciada pela prática de tais crimes, mas pela al. c) do nº. 1, assim tendo sido alterada a qualificação jurídica dos factos descritos na pronúncia, sem contudo se observar o disposto no art. 358º do CPP (conclusões 1ª a 4ª). Já a violação do art. 359º do CPP resultaria da circunstância de, tendo sido pronunciado pela prática de dois crimes de burla qualificada dos arts. 217º, nº.1 e 218º, nº. 1, al. b) do CP, ter sido condenado pela prática de dois crimes de burla dos arts. 217º, nº.1 do CP, com base em factos novos, diversos dos descritos na pronúncia, sem que tivesse sido dado cumprimento ao disposto no art. 359º do CPP (conclusões 1º, 2ª,5ª e 6ª). Dispõe-se na al. b) do nº.1 do art. 379º, invocada pelo recorrente, que é nula a sentença que condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstos nos arts. 358º e 359º do mesmo diploma. Remete-nos, pois, esta norma para a disciplina da alteração (substancial e não substancial) dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, como rezam as epígrafes daqueles dois arts. De acordo com o art. 358º, se no decurso da audiência se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia, que não derive de factos alegados pela defesa, com relevo para a decisão da causa, o presidente comunica a alteração ao arguido e concede-lhe (se requerido) o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa (nºs. 1 e 2). Segundo o art. 359º, tratando-se de uma alteração substancial dos factos descritos na acusação ou na pronúncia (aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis - al. f) do art. 1º) não pode ser tomada em conta pelo tribunal para o efeito de condenação no processo em que se verificar, salvo se o arguido e o assistente estiverem de acordo com a continuação do julgamento pelos novos factos e se estes não determinarem a incompetência do tribunal (nºs 1 e 2). O grau e importância da novidade, que constitui para o arguido a imputação de outros factos, no quadro de uma mesma incriminação (art. 358º), ou no quadro de uma nova incriminação (art. 359º), impõe que o mesmo se possa deles defender, com uma latitude diversa e crescente, conforme a sua importância e significado. Ponto é que se trate de alteração de factos e não só de incriminação, como resulta bem do referencial que, nesta matéria, constitui essa expressão (cfr. o Ac. STJ de 19.9.96, proc. nº. 48891). …”. 21. Cf. Ac. do STJ de 19/10/1995, in DR 1ª Série A, de 12/28/1995, que fixou jurisprudência no sentido de que é oficioso o conhecimento, pelo tribunal de recurso, dos vícios indicados no citado art.º 410.º/2 CPP. 22. Assim o Ac. do STJ de 19/12/1990, proc. 413271/3.ª Secção: " I - Como resulta expressis verbis do art. 410.° do C.P.Penal, os vícios nele referidos têm que resultar da própria decisão recorrida, na sua globalidade, mas sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, designadamente declarações ou depoimentos exarados no processo durante o inquérito ou a instrução ou até mesmo no julgamento (...). IV É portanto inoperante alegar o que os declarantes afirmaram no inquérito, na instrução ou no julgamento em motivação de recursos interpostos". 23. Simas Santos e Leal-Henriques, in “Recursos em Processo Penal”, 7ª edição, 2008, p. 75. 24. Nesse sentido, ver Luís Bértolo Rosa, in “Consequências Processuais das Proibições de Prova”, RPCC 20 (2010), págs. 219 a 277, donde citamos: “…Dentro das proibições de prova, distinguem-se tradicionalmente três categorias. As proibições de tema de prova têm no segredo de Estado, previsto no artigo 137.°, o seu exemplo paradigmático. As proibições de meios de prova vêm previstas nos artigos 129.°, n.° 1, 130.°, n.° 1, 134.°, n.°2, e 356.°, v. g. proibição do depoimento indirecto e do depoimento de testemunhas não esclarecidas acerca da faculdade de recusa, proibição de reprodução de vozes e rumores públicos e proibição de leitura em audiência de autos ou declarações. Por fim, as proibições de métodos de obtenção de prova encontram a sua sede no artigo 126.°, cabendo distinguir as proibições absolutas do artigo 126.°, n.os 1 e 2, das proibições relativas do artigo 126.°, n.° 3. …”. 25. Nesse sentido, ver o acórdão do STJ de 02/04/2008, relatado por Santos Cabral, in www.gde.mj.pt, processo 08P578, do qual citamos: “…Reportando-nos ao ensinamento de Costa Andrade entende-se que a necessária delimitação temática e precisão conceitual obriga a referenciar e tentar clarificar a fronteira separa as proibições de prova das meras regras de produção da prova (Beweisregelungen ou Beweisverfahrensregeln). Invocando Gossel, acentua o mesmo Autor, que as proibições de prova são «barreiras colocadas à determinação dos factos que constituem objecto do processo». Mais do que a modalidade do seu enunciado, o que define proibição de prova é a prescrição de um limite à descoberta da verdade. Normalmente formulada como proibição, a proibição de prova pode igualmente ser ditada através de uma imposição e, mesmo, de uma permissão. É que, como assinala, toda a regra relativa à averiguação dos factos proíbe ao mesmo tempo as vias não permitidas de averiguação. Diferentemente, as regras de produção da prova - cfr. v. g. o artigo 341.° do CPP - visam apenas disciplinar o procedimento exterior da realização da prova na diversidade dos seus meios e métodos, não determinando a sua violação a reafirmação contrafáctica através da proibição de valoração. As regras de produção da prova configuram, na caracterização de FIGUEIREDO DIAS, «meras prescrições ordenativas de produção da prova, cuja violação não poderia acarretar a proibição de valorar como prova ( ... ) mas unicamente a eventual responsabilidade (disciplinar, interna) do seu autor». Umas vezes pré-ordenadas à maximização da verdade material (como forma de assegurar a solvabilidade técnico-científica do meio de prova em causa), as regras de produção da prova podem igualmente ser ditadas para obviar ao sacrifício desnecessário e desproporcionado de determinados bens jurídicos. Resumidamente, e como afirma Peters, as regras de produção prova são «ordenações do processo que devem possibilitar e assegurar a realização da prova. Elas visam dirigir o curso da obtenção da prova sem excluir a prova. As regras de produção da prova têm assim a tendência oposta à das proibições de prova. Do que aqui se trata não é de estabelecer limites à prova como sucede com as proibições prova, mas apenas de disciplinar os processos e modos como a prova deve ser regularmente levada a cabo». Na caracterização convergente de Amelung: «muitas normas de conduta que os órgãos perseguição penal têm de observar nos actos de intromissão na informação, não tutelam, porém, o domínio sobre a informação do portador do direito atingido, mas outros interesses. Daí que a inobservância de tais normas de conduta não determine, só por si, uma distribuição ilícita da informação.…”. No mesmo sentido, ver Luís Bértolo Rosa, in “Consequências Processuais das Proibições de Prova”, RPCC 20 (2010), págs. 219 a 277, donde citamos: “…As proibições de prova dizem-se distintas das regras de produção de prova, meras formalidades que «visam disciplinar o procedimento exterior da realização da prova» e que por isso não geram uma proibição de valoração.…”. 26. Nesse sentido, ver Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, II, Verbo, 2008, pág. 209, e Maia Gonçalves, in “CPP Anot.”, Almedina, 1997, pág. 304. 27. Nesse sentido, ver Simas Santos/Leal-Henriques, in “CPP Anot.”, I, Rei dos Livros, 1999, pág. 785, donde citamos: “… sendo certo que tais declarações serão sempre livremente apreciadas e valoradas, nos termos e no quadro do princípio genérico da livre apreciação da prova consagrado no art.º 127º. …”. 28. Antunes Varela/J. Miguel Bezerra/Sampaio e Nora, in “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1984, a págs. 391 e ss.. Ou, como diz Alberto dos Reis, “… É questão de facto tudo o que tende a apurar quaisquer ocorrências da vida real, quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças operadas no mundo exterior; …”, in “CPC Anot.”, vol. III, 4ª ed., Coimbra editora, 1985, pág. 206. 29. Nesse sentido, ver Mouraz Lopes, in “A fundamentação da Sentença no Sistema Português”, Almedina, 2011, págs. 223 a 227, donde citamos: “… Os factos são «acontecimentos, circunstâncias, relações, objectos e estados, todos eles situados no passado, espácio-temporalmente ou mesmo só temporalmente determinados, pertencentes ao domínio da percepção externa ou interna e ordenados de forma natural»(…). Uma definição deste tipo não é suficiente, em termos operativos, para efeitos da decisão. Daí que o conceito utilizado no âmbito da teoria da prova, ou seja, aquele entendimento de que os factos consubstanciam os «eventos» cm torno dos quais é possível articular um discurso de verdade ou falsidade sobre um determinado enunciado empírico(…) pode afirmar-se como pragmaticamente vantajoso, constituindo um dado comum nas diversas culturas jurídicas, no sentido de que «o facto é o "objecto" da prova ou a sua finalidade fundamental»(…). Esta definição aparentemente simples não omite a complexidade da questão da prova dos factos e os múltiplos problemas que suscita ao tribunal, bem como a sua abordagem dogmática. Cingindo-nos ao objecto do trabalho, atente-se desde logo na constatação de que «no processo se demonstrarem factos não para satisfazer exigências de conhecimento em estado puro, mas antes para resolver controvérsias jurídicas»(…), devendo essa circunstância estar bem presente no processo de construção da decisão. Como primeira consequência do que ficou referido é, desde logo, impossível falar do facto separando-o completamente do «direito», esquecendo as suas implicações jurídicas(…). Trabalhar o facto de um ponto de vista jurisdicional comporta sempre um efeito jurídico vinculante. Os factos não existem por si e para si mesmos mas sim em função das suas consequências jurídicas. Na construção da narrativa judicial aqueles que aí intervêm devem assumir aquela vinculação. Num segundo momento e já assumindo o conceito «probatório» de facto constata-se a dificuldade de definição de um modo não superficial do que se entende por «facto», enquanto objecto de prova, tendo em conta a «extrema variabilidade e indeterminação dos fenómenos do mundo real»(…). Uma resposta à determinabilidade do facto para efeitos da prova no processo começa, desde logo, segundo Taruffo, pela compreensão do «facto que constitui o objecto da prova em função do contexto que determina a descrição (o tipo de descrição) apropriada a esse facto»(…). Esse contexto de descrição é, no âmbito do processo, a decisão. Ou seja, segundo Taruffo, a «determinação do facto situa-se no interior da decisão judicial e a prova está dirigida à determinação do facto»(…). O objecto da prova é o facto que deve ser determinado. Ora a individualização do contexto de decisão como esquema de referência em função do qual se define o facto como objecto de prova, permite determinar duas perspectivas distintas mas convergentes para a individualização do que constitui o objecto de prova. A primeira perspectiva refere-se directamente ao contexto de decisão, «no sentido de que obtém dele as coordenadas que definem teoricamente o objecto da prova. A segunda perspectiva refere-se às modalidades através das quais o objecto de prova é concretamente individualizado e fixado no processo com referência ao concreto suposto de facto controvertido»(…). Uma aproximação ao facto, como elemento operativo fundamental no domínio do processo (e do processo penal em particular), leva-nos num terceiro momento à constatação de que o facto objecto do conhecimento processual é «o que se disse acerca do facto». Ou seja, quando se fala de factos trata-se «da enunciação de um facto e não o objecto empírico que é enunciado»(…). No processo de decisão, segundo Jackson, «quando os juízes e o júri têm que decidir questões de facto estão sujeitos (como notou Jerome Frank) a uma dupla refracção: estão sujeitos à percepção original, pelas testemunhas, dos acontecimentos que relatam; e à percepção, pelo tribunal, do comportamento das testemunhas»(…). A identificação dos conceitos epistemológicos e empíricos é relevante na medida em que permite a enunciação operativa de tipologias de factos diversificados, nomeadamente a distinção entre factos simples e complexos, individuais e colectivos, positivos ou negativos cuja repercussão, no domínio procedimental, surge como pragmaticamente útil. Sublinhe-se, no entanto, que todas estas distinções referem-se à forma como os factos são definidos e não à sua realidade empírica(…). O conjunto de dicotomias identificado assume uma especial relevância no próprio modo de produção de prova e naturalmente, no modo como a sua fundamentação pode ou deve ser efectuada na decisão. A prova de factos simples pode ser diversa da prova de factos complexos e consequentemente pode ser diferente a fundamentação exigida relativamente à justificação da prova de factos complexos ou à justificação da prova de factos simples. De igual forma os factos principais e os factos secundários podem ter uma diversa exigência de prova e uma fundamentação também ela diferenciada. Pode assim concluir-se que «todo o enunciado fáctico é um entre muitos enunciados possíveis acerca do mesmo facto, que é seleccionado e «preferido» em relação aos demais enunciados possíveis em função de elementos do contexto em que é empregue. Isto é, depende do sujeito que realiza a enunciação (definição, hipótese, descrição, etc.), dos critérios que emprega para individualizar o facto (grau de precisão, presença ou ausência de valoração ou de qualificação jurídica) e da linguagem que se usa (comum ou jurídica, vaga ou precisa, etc.)»(…). Uma outra consequência relevante da constatação da contextualização dos factos entendidos como «enunciados» de facto e não apenas como realidades empíricas, tem a ver com a questão da verdade(…). Quando se fala de «factos» verdadeiros ou falsos, no âmbito do processo, é aos «enunciados» de factos que se aplicam aquelas qualificações. «Os factos materiais existem ou não existem, mas não tem sentido dizer que são falsos ou verdadeiros; só os enunciados fácticos podem ser verdadeiros, se se referirem a i actos materiais que ocorreram ou falsos, se afirmam factos materiais não ocorridos. Em consequência, a «verdade do facto» é unicamente uma fórmula elíptica para se referir à verdade do enunciado que tem por objecto um facto»(…). São os factos, no sentido de enunciados fácticos, o objecto principal do processo de decisão, vinculadamente adstritos à hipótese acusatória, sobre os quais irá reconduzir-se o processo probatório. São os factos que constituem a acusação e a defesa que são objecto de prova num procedimento público e contraditório (e que por isso podem vir a ser alterados por virtude da própria hipótese defensiva ou pelo impulso «inquisitório» do juiz na busca da verdade material) que irão constituir a decisão final. …”. 30. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal”, III, Verbo, 2009, pág. 287. 31. Nesse sentido é pacífica a jurisprudência do STJ, conforme anotação de Vinício Ribeiro, in “CPP – Notas e comentários”, Coimbra editora, 2008, p. 786. Dessa jurisprudência citamos o acórdão do STJ de 28/09/1994, relatado por Teixeira do Carmo, in CJSTJ, III, donde citamos: “…Estatui-se no nº 2 do artº 374º citado que "Ao relatório (parte que começa a sentença) segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal". E logo no artº 379º, al. a), também citado, se comina que é nula a sentença "que não contiver as menções referidas no artº 374º, nºs 2 e 3, al. b)...". Correspondendo aquele artº 374º ao artº 450º do Cód. de Proc. Penal de 1929, temos que neste último se preceituava, além do mais, que a sentença condenatória deveria conter "Os factos que se julgaram provados, distinguindo os que constituem a infracção dos que são circunstâncias agravantes ou atenuantes" (nº 3). Sendo o Cód. de Proc. Penal - 6ª Edição, de Maia G., a pág. 535, em anotação ao referido artº 450º, aí se refere que a enumeração dos factos feita no nº 3 não está completa, pois que, "Como resulta de outras disposições, nomeadamente dos artºs 446º e 448º, a sentença deve incluir todos os factos relevantes para a decisão de mérito, e não só os aludidos no nº 3". (o sublinhado é nosso). Entende ou sustenta a Ilustre Magistrada do Ministério Público junto da 1ª Instância, na sua Resposta, que o preceito do Cód. de Proc. Penal vigente, a que vimos de aludir, tem de ser interpretado como aludindo a "todos os factos relevantes para a decisão de mérito" e só eles. Dos factos provados só se indicarão os que vêm a influir na decisão, sendo que o mesmo entendimento há-de ser observado ou mantido quanto aos factos não provados. E adianta: "Se se pretendesse que fossem indicados "todos" os factos provados e "os factos não provados" a redacção seria diferente" dizendo-se, então, "... consta da enumeração de todos os factos provados e todos os factos não provados". Concordamos com tal posição. O nº 2 do artº 374º do Cód. Proc. Penal vigente deve, nesta parte, ser entendido ou interpretado por forma a significar que a fundamentação - 2ª parte da sentença - consta da indicação dos factos que influam na proferição da decisão, sejam os provados ou os não provados, e não de todos os factos provados e de todos os não provados. …”. 32. Nesse sentido, ver acórdão da RE de 08/11/2011, relatado por Ana Brito, no processo 411/05.5TALGS.E1, in www.gde.mj.pt, de cujo sumário citamos: “… VII. Mas, embora a acusação limite o objecto do processo, fixando também, em consequência, os limites dos poderes de cognição do tribunal, tal não implica que o julgador fique prisioneiro da linguagem utilizada pelo MP na acusação, podendo aperfeiçoá-la e completá-la, desde que não acrescente ou altere factos, no sentido de novos factos (fora do quadro legal previsto nos arts 358º e 359º do CPP). …”. No mesmo sentido, ver o acórdão da RG de 17/05/2010, relatado por Maria Augusta, no processo 248/07.7GAFLG.G1, in www.gde.mj.pt, donde citamos: “…Não é, obviamente, exigível que os factos provados e não provados sejam ipsis verbis os da acusação ou da contestação. …”. Nesse sentido, ver o acórdão do STJ de 29/06/1995, relatado por Lopes Pinto, in CJSTJ, tomo II, pág. 254 e ss., donde citamos: “… Esses factos (provados e não-provados) hão-de ser os essenciais à caracterização do crime e suas circunstâncias relevantes juridicamente, que influenciam na determinação da medida da pena - os factos inócuos, ainda que incluídos na acusação e/ou contestação não têm de ser enumerados (vd., entre outros, acs. STJ in CJ XVI/2/19 e CJ STJ 11/1/246). …”. No mesmo sentido, ver o acórdão do STJ de 15/01/1997, relatado por Rosa Ribeiro Coelho, in CJSTJ, tomo I, pág. 181 e ss., donde citamos: “…Esta exigência visa garantir que o tribunal contemplou todos os factos que foram submetidos à sua apreciação; como se disse no acórdão deste STJ de 26/3/92, BMJ nº 415, pág. 499, "a lei visa assegurar ou garantir o desempenho da exaustiva cognição, abranger a totalidade do "thema probandum"". Porém, esta garantia tem que ser articulada com o fim em vista - a decisão de uma causa-, só tendo sentido enquanto se refere a factos úteis a essa decisão, na aplicação da ideia de que compete ao tribunal proceder a uma condensação que expurgue aquilo que não interessa. Assim, tem igualmente este STJ entendido que a descrição dos factos provados e não provados se refere aos que são essenciais à caracterização do crime e suas circunstância juridicamente relevantes, o que exclui os factos inócuos, irrelevantes para a qualificação do crime ou para a graduação da responsabilidade do arguido, mesmo que descritos na acusação - acórdão de 3/4/91, Col. Jur. 1991-II-19-, e não compreende os factos que não influam no proferimento da decisão - acórdão de 28/9/94, Col. Jur. - S.T.J. 1994/III/206, que apreciou um caso em que, como sucedeu nos presentes autos, nada se mencionou quanto aos factos não provados. Isto é igualmente de entender quanto aos factos alegados na contestação, já que as garantias de defesa apenas obrigam a que se considere o que foi alegado utilmente na sua óptica, e não o que é matéria irrelevante e excrescente. …”. No mesmo sentido, ver o acórdão da RG de 17/05/2010, relatado por Maria Augusta, no processo 248/07.7GAFLG.G1, in www.gde.mj.pt, donde citamos: “…Quanto aos factos provados e não provados, devem indicar-se todos os que constam da acusação e da contestação, “quer sejam substanciais quer instrumentais ou acidentais, e ainda os não substanciais que resultarem da discussão da causa e que sejam relevantes para a decisão e também os substanciais que resultarem da discussão da causa, quando aceites nos termos do art.359º, nº2”. O que importa é que os factos sejam relevantes para a decisão da causa. E relevantes serão todos os factos essenciais à caracterização do crime ou integradores de causas de exclusão. Como é óbvio, os factos inócuos não têm que fazer parte dessa indicação e os conceitos de direito e as conclusões de facto, quer constem da acusação quer da contestação, não podem dela fazer parte. …”. No mesmo sentido, ver o acórdão da RC de 08/02/2012, relatado por Alberto Mira, no processo 38/10.0TAFIG.C1, in www.gde.mj.pt, donde citamos: “…Contudo, a razão de ser do art. 374.º, n.º 2, na vertente que ora importa ter em conta, tem de ser conexionada com o fim do processo penal, ou seja, só tem sentido a aplicação daquela da norma enquanto estiverem em causa, como se disse, factos relevantes para a decisão de mérito[…]. Como reiteradamente vem acentuando o Supremo Tribunal de Justiça, o cumprimento do art. 374.º, n.º 2, do CPP, não impõe a enumeração dos factos provados e não provados que sejam irrelevantes para a caracterização do crime e/ou para a medida da pena[…], sendo certo que essa irrelevância deve ser vista com rigor, em função do factualismo inerente às posições da acusação e da defesa e bem assim aos contornos das diversas possibilidades de aplicação do direito ao caso concreto – seja quanto à imputabilidade, seja relativamente à qualificação jurídico-criminal dos factos, seja quanto às consequências jurídicas do crime, designadamente quanto à espécie e medida da pena –, tendo em conta os termos das referidas posições assumidas pela acusação e pela defesa e os poderes de cognição oficiosa que cabem ao tribunal. Só pode por isso decidir-se no sentido dessa inocuidade ou irrelevância no caso de a sua verificação resultar suficientemente segura à luz destas considerações, essenciais à prossecução cuidada da justiça penal concreta. …”. 34. Certificado do Registo Criminal. 35. Importa considerar que, como se afirma no Ac. do STJ de 17/02/2005, relatado por Simas Santos, in www.dgsi.pt, processo 04P4324, “1 - O recurso em matéria de facto para a Relação não constitui um novo julgamento em que toda a prova documentada é reapreciada pelo Tribunal Superior que, como se não tivesse havido o julgamento em 1.ª Instância, estabeleceria os factos provados e não provados e assim indirectamente validaria ou a factualidade anteriormente assente, mas é antes um remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa e específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados, ou com referência à regra de direito respeitante à prova que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e qual o sentido com que devia ter sido aplicada. 2 - Se o recorrente aceita que o teor expresso dos depoimentos prestados permite que a 1.ª Instância tenha estabelecido a factualidade apurada da forma como o fez e questiona tão só a credibilidade que, no seu entender, (não) deveria ter-lhes sido concedida, sem indicar elementos objectivos que imponham a sua posição, a sua pretensão fracassa pois a credibilidade dos depoimentos, quando estribadas elementos subjectivos e não objectivos é um sector especialmente dependente da imediação do Tribunal, dado que só o contacto directo com os depoentes situados na audiência de julgamento, perante os outros intervenientes é que permite formar uma convicção que não pode ser reproduzidas na documentação da prova e logo reexaminada em recurso. 3 - Se apesar de se esforçar, a 1.ª Instância não consegue estabelecer o motivo que levou o arguido a agir, mas estão presentes todos os elementos do respectivo tipo legal de crime, nenhuma dúvida se pode levantar sobre a culpabilidade do agente. …”. E no Ac. do STJ de 12/06/2008, relatado por Raul Borges, in www.dgsi.pt, processo 07P4375, de cujo sumário citamos: “I - A partir da reforma de 1998 passou a ser possível impugnar (para a Relação) a matéria de facto de duas formas: a já existente revista (então cognominada de ampliada ou alargada) com invocação dos vícios decisórios do art. 410.º, n.º 2, do CPP, com a possibilidade de sindicar as anomalias ou disfunções emergentes do texto da decisão, e uma outra, mais ampla e abrangente – porque não confinada ao texto da decisão –, com base nos elementos de documentação da prova produzida em julgamento, permitindo um efectivo grau de recurso em matéria de facto, mas impondo-se na sua adopção a observância de certas formalidades. II - No primeiro caso estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas als. a), b) e c) do n.º 2 do art. 410.º do CPP, cuja indagação, como resulta do preceito, apenas se poderá fazer através da leitura do texto da decisão recorrida, circunscrevendo-se a apreciação da matéria de facto ao que consta desse texto, por si só considerado ou em conjugação com as regras da experiência comum, sem possibilidade de apelo a outros elementos estranhos ao texto, mesmo que constem do processo. Nesta forma de impugnação os vícios da decisão têm de emergir, resultar do próprio texto, o que significa que os mesmos têm de ser intrínsecos à própria decisão como peça autónoma. III - No segundo caso, a apreciação já não se restringe ao texto da decisão, mas à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre a partir de balizas fornecidas pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus imposto pelos n.ºs 3 e 4 do art. 412.º do CPP, tendo em vista o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento e visando a modificação da matéria de facto, nos termos do art. 431.º, al. b), do mesmo diploma. IV - A alteração do art. 412.º do CPP operada em 1998 visou tornar admissível o recurso para a Relação da matéria de facto fixada pelo colectivo, dando seguimento à consagração do direito ao recurso resultante do aditamento da parte final do art. 32.º, n.º 1, da CRP na revisão da Lei Constitucional n.º 1/97, vindo a ser “confirmada” pelo acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 10/2005, de 20-10-2005 (in DR, I Série-A, de 07-12-2005), que estabeleceu: «Após as alterações ao Código de Processo Penal, introduzidas pela Lei n.º 59/98, de 25/08, em matéria de recursos, é admissível recurso para o Tribunal da Relação da matéria de facto fixada pelo tribunal colectivo». V - Esta possibilidade de sindicância de matéria de facto, não sendo tão restrita como a operada através da análise dos vícios decisórios – que se circunscreve ao texto da decisão em reapreciação –, por se debruçar sobre a prova produzida em audiência de julgamento, sofre, no entanto, quatro tipos de limitações: - desde logo, uma limitação decorrente da necessidade de observância, por parte do recorrente, de requisitos formais da motivação de recurso face à imposta delimitação precisa e concretizada dos pontos da matéria de facto controvertidos, que o recorrente considera incorrectamente julgados, com especificação das provas e referência ao conteúdo concreto dos depoimentos que o levam a concluir que o tribunal julgou incorrectamente e que impõem decisão diversa da recorrida, com o que se opera a delimitação do âmbito do recurso; - já ao nível do poder cognitivo do tribunal de recurso, temos a limitação decorrente da natural falta de oralidade e de imediação com as provas produzidas em audiência, circunscrevendo-se o “contacto” com as provas ao que consta das gravações e/ou, ainda, das transcrições; - por outro lado, há limites à pretendida reponderação de facto, já que a Relação não fará um segundo/novo julgamento, pois o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em 2.ª instância; a actividade da Relação cingir-se-á a uma intervenção cirúrgica, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação; - a jusante impor-se-á um último limite, que tem a ver com o facto de a reapreciação só poder determinar alteração à matéria de facto se se concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitem uma outra decisão. …”. 36. Neste sentido, cf. ainda o Ac. do STJ de 25/03/1998, in BMJ 475/502, com anotação de que neste sentido se vinham orientando a doutrina e a jurisprudência. 37. Neste sentido, ver também o Ac. RL, de 10/10/2007, relatado por Carlos Almeida, in www.dgsi.pt, processo 8428/2007-3, de cujo sumário citamos: “…XVII – No caso, embora a prova produzida e examinada na audiência permitisse, eventualmente, uma decisão em sentido diferente, ela não impunha decisão diversa da proferida, razão pela qual o recurso não pode ter provimento.”. 38. No mesmo sentido, cf. o Ac. do STJ de 20/11/2008, relatado por Santos Carvalho, in www.dgsi.pt, processo 08P3269, de cujo sumário citamos: “I - O STJ tem reafirmado que o recurso da matéria de facto perante a Relação não é um novo julgamento em que a 2.ª instância aprecia toda a prova produzida e documentada em 1.ª instância, como se o julgamento ali realizado não existisse; antes é um remédio jurídico destinado a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros. II - Conhecendo-se pela fundamentação da sentença o caminho lógico que, segundo a 1ª instância, levou à condenação do recorrente, deveria este ter-se limitado a sindicar os pontos de facto que nesse percurso foram erradamente avaliados, com a indicação das provas que impunham uma decisão diversa e com referência aos respectivos suportes técnicos. …”. 39. Acórdão da RP de 06/10/2010, relatado por Eduarda Lobo, in www.gde.mj.pt, processo 463/09.9JELSB.P1. 40. No mesmo sentido, cf. o acórdão da RG de 28/06/2004, relatado por Heitor Gonçalves, in www.gde.mj.pt, processo 575/04-1, do qual citamos: “… Cremos que o recorrente pretende substituir essa convicção do julgador pela sua própria convicção, “escolhendo” os depoimentos que vão de encontro aos seus interesses processuais, quando é sabido que são os julgadores em primeira instância que detêm o poder/dever de apreciar livremente a prova, apreciação que, de todo o modo, no dizer do Prof. Figueiredo Dias, há-de ser, como foi no caso concreto, “recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e controlo”. Uma decisão errada, ilegal ou arbitrária não pode ser sustentada numa simples alegação da discordância entre a convicção do recorrente e a convicção que o julgador livremente formou com base na prova produzida em audiência de julgamento, antes passa necessariamente pela demonstração inequívoca de que o tribunal que a proferiu contrariou as regras da experiência e desrespeitou princípios basilares do direito probatório (v.g. prova legalmente vinculada, provas proibidas etc.). Quando o recorrente pretende apenas por em causa a livre apreciação da prova, o recurso estará irremediavelmente destinado à improcedência. É que, como se referiu, o tribunal é livre de dar credibilidade a determinados depoimentos, em detrimento de outros, desde que essa opção seja explicitada e convincente, como é o caso. Cumprida essa exigência, a livre convicção do juiz torna-se insindicável, até porque a documentação dos actos da audiência não se destina a substituir, nem substitui, a oralidade e a imediação da prova. Defender-se uma outra solução, o tribunal de recurso acabaria “por proceder a um juízo, mas com inversão das regras da audiência de julgamento ou então, numa espécie de juízos por parâmetros” (Damião da Cunha, O caso julgado Parcial, 2002, pág. 37). …”. 41. Neste sentido, cf. o acórdão da RP de 10/05/2006, relatado por Paulo Valério, in www.gde.mj.pt, processo 0315948, do qual citamos: “… Como se diz no Ac. Rel. Coimbra de 6/12/2000 (www.dgsi.pt - Acórdãos da Relação de Coimbra) «o tribunal superior só em casos de excepção poderá afastar o juízo valorativo das provas feito pelo tribunal a quo, pois a análise do valor daquelas depende de atributos (carácter; probidade moral) que só são verdadeiramente apreensíveis pelo julgador de 1.ªinstância». Ou, consoante se escreveu no igualmente douto Ac. RelCoimbra de 3-11-2004 (recurso penal n.° 1417/04) «... é evidente que a valoração da prova por declarações e testemunhal depende, para além do conteúdo das declarações e dos depoimentos prestados, do modo como os mesmos são assumidos pelo declarante e pela testemunha e da forma como são transmitidos ao tribunal, circunstâncias que relevam, a par da postura e do comportamento geral do declarante e da testemunha, para efeitos de determinação da credibilidade deste meio de prova, por via da amostragem ou indiciação da personalidade, do carácter, da probidade moral e da isenção de quem declara ou testemunha » (Cfr. no mesmo sentido, entre outros: Ac de 02.06.19 e de 04.02.04, recursos n°s 1770/02 e 3960/03; Ac de. 02.06.19 e de 04.02.04, recursos n°s 1770/02 e 3960/03, todos da Relação de Coimbra). É que o juízo sobre a valoração da prova tem vários níveis. Num primeiro aspecto trata-se da credibilidade que merecem ao tribunal os meios de prova e depende substancialmente da imediação, e aqui intervêm elementos não racionais explicáveis. Num segundo nível, inerente à valoração da prova intervêm as deduções e induções que o julgador realiza a partir dos factos probatórios e, agora já as inferências não dependem substancialmente da imediação, mas hão-de basear-se na correcção do raciocínio que há-de fundamentar-se nas regras da lógica, princípio da experiência e conhecimentos científicos, tudo se podendo englobar na expressão regras da experiência. …”. Ora, sendo os factos dados como provados na sentença conclusões lógicas da prova produzida produzidas em audiência e plausíveis face a essas provas, a convicção assim formada pelo julgador não pode ser censurada, sob pena de se aniquilar a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade, como refere o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/09/2005 (em www.dgsi.pt/jstj.nsf/ com o nº 05A2007). Na verdade, refere o mesmo acórdão, «a convicção do tribunal é construída dialecticamente, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas constituídas, também pela análise conjugada das declarações e depoimentos, em função das razões de ciência, das certezas e das lacunas, das contradições, hesitações, inflexões de voz, (im)parcialidade, serenidade, olhares, "linguagem silenciosa e do comportamento", coerência do raciocínio e de atitude, seriedade e sentido de responsabilidade manifestados, coincidências e inverosimilhanças que, por ventura, transpareçam em audiência, das mesmas declarações e depoimentos ». Elementos que a transcrição não fornece e de que a reapreciação em sede de recurso não dispõe. “…”. 42. Código de Processo Civil. 43. No mesmo sentido, cf. o acórdão do STJ de 09/02/1989, relatado por Ferreira da Silva, in www.gde.mj.pt, proc. 076718, de cujo sumário citamos: “…VI - Os factos integradores do dano não patrimonial quando forem do consenso geral, dispensam alegação e prova. …”. Também, ainda que relativamente a diferentes danos não patrimoniais, o acórdão do STJ de 25/11/1993, relatado por Folque Gouveia, in CJ, III, donde citamos: “… Como bem se frisa no aresto do Tribunal da Relação, basta que se prove a existência de um evento que normalmente signifique um dano que objectivamente ofenda o bem imaterial do crédito e reputação. O que, quanto aos factos mencionados no Acórdão - o de que a pessoa em causa, sendo um político, anda conforme o tocam, obedece onde julga que estão os seus interesses e que é uma pessoa sem carácter - faz ocorrer tal dano objectivo, pelo que, como as testemunhas puderam indiciariamente admitir que, face a tais factos, se mostram verificadas as ofensas ao crédito e reputação do recorrido, também através de dados naturais ou de experiência, o tribunal pode presumir a existência desses mesmos danos. Além de que o princípio consignado no art.º 566.º, n.º 3, do Cód. Civil para a impossibilidade de se averiguar o montante exacto dos danos, deve também valer, com as necessárias adaptações, para os casos de não ser possível demonstrar a existência de danos, podendo o Tribunal fixá-las equitativamente (art.º 496.º, n.º 3), dentro dos limites que os tiver como provados, pois seria violento que, em qualquer dos casos, o titular da indemnização ficasse dela privado. E, acresce que o art.º 514.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil dispensa de alegação e de prova os factos notórios, isto é, do conhecimento geral. Por conseguinte, desde que as circunstâncias fazem presumir a existência desses danos, no caso em apreço, não há obstáculo a que o tribunal equitativamente os julgue existentes e fixe o montante da indemnização, uma vez que esses danos são objectivamente graves, devido à intensidade das ofensas e atenta a personalidade e actividade profissional que o lesado exerce, como salienta a Relação. (Cfr. Acórdão deste Supremo Tribunal de 5 de Novembro de 1974 e a anotação que a este aresto lhe faz Vaz Serra, na Rev. Leg. e Jurisp., ano 108.º, pág. 315 e segs., e anotações do mesmo Professor, na mesma Revista, ano 105.º, pág. 44). …”. E o acórdão da RC de 30/01/2007, relatado por Tavares Mendes, in JusNet 7716/2007, do qual citamos: “… Quanto aos alegados danos não patrimoniais verificamos que relativamente ao pedido de indemnização formulado pelos AA nada foi referido na sentença recorrida para além da genérica referencia à inexistência de danos passíveis de indemnização. Entendendo-se, como entendemos, que existem factos suficientes para dar como provada, nesta sede, a prática pelos RR menores dos factos ilícitos geradores da obrigação de indemnizar e consubstanciando esses factos a previsão tipificada (pelo menos, abstracta) de um crime de furto, perpetrado através de uma introdução ilegítima na residência dos AA, é óbvio, resulta da experiência comum, pertence ao consenso geral, que tais factos são em si mesmos geradores de perturbação, incomodidade, angustia, desgosto nas vitimas desses mesmos factos, de uma forma merecedora da tutela do direito. Não está apenas em causa a privação de objectos, a violação da propriedade, mas, mais do que isso a invasão do domicílio, a devassa ilegítima do local da residência familiar que interfere violentamente no domínio da privacidade do intimo de uma família. É do senso comum que ninguém fica indiferente a actos como estes tenha o dano patrimonial a expressão que tiver. E se é certo que nada está provado quanto aos sofrimentos, aos sentimentos negativos, sofridos pelos AA em consequência dos actos praticados pelos RR menores verdade é, também, que tem a nossa jurisprudência entendido (por todos o Acórdão do STJ, de 9/2/89, in www.dgsi.pt, relator Conselheiro Ferreira da Silva) que os factos integradores do dano não patrimonial quando forem do consenso geral (quase factos notórios) não carecem de alegação e prova. Justifica-se, assim, uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos. …”. 44. Neste sentido cf. Ac. RP de 23/02/1993, in BMJ 324/620: “Dado que o dolo pertence à vida interior de cada um, é portanto de natureza subjectiva, insusceptível de directa apreensão. Só é possível captar a sua existência através de factos materiais comuns de que o mesmo se possa concluir, entre os quais surge com maior representação o preenchimento dos elementos integrantes da infracção. Pode comprovar-se a verificação do dolo por meio de presunções, ligadas ao princípio da normalidade ou das regras da experiência.”. Ainda no mesmo sentido decidiu o Ac. do STJ de 11/12/1996, relatado por Joaquim Dias, in BMJ 462/207, de cujo sumário citamos: “Sendo o dolo um acto psíquico, porque ocorre no interior do sujeito, só é revelado indirectamente através de actos exteriores. Se a natureza do instrumento utilizado, a zona atingida e as características da lesão consentirem a ilação de que o arguido, agredindo a vítima, representou a morte desta como consequência possível da sua acção e agiu conformando-se com tal evento, estará fundamentada a existência de dolo eventual.”. Ver também o acórdão da RC de 27/10/2010, relatado por Alice Santos, in www.gde.mj.pt, processo 132/08.7TASRE.C1, de cujo sumário citamos: “…2.Os factos integradores do tipo subjectivo de ilícito, v.g. relativos à intenção criminosa, normalmente não resultam provados através de prova directa, mas de prova indiciária. Na normalidade das situações, é da prova de factos materiais e objectivos, que não fazendo parte dos concretos factos integradores do tipo de ilícito que o tribunal, por inferência, no respeito das regras da lógica e da experiência comum, dará ou não como provados factos integradores do tipo subjectivo de ilícito.”. 45. Presunções judiciais são as que, assentando no simples raciocínio de quem julga, decorrem das máximas da experiência, dos juízos correntes de probabilidade, dos princípios da lógica ou dos próprios dados da intuição humana – art.º 349º e 351º do CC (Cf. P. Lima e A. Varela, in "CC Anot.", I Vol., 4ª Ed., p. 312), e estas presunções são perfeitamente legítimas em processo penal. Ver, neste sentido, Ac. do STJ de 11/11/2004, relatado por Simas Santos, in www.gde.mj.pt, processo 04P3182, do qual citamos: “… O juízo valorativo do tribunal tanto pode assentar em prova directa do facto, como em prova indiciária da qual se infere o facto probando, não estando excluída a possibilidade do julgador, face à credibilidade que a prova lhe mereça e as circunstancias do caso, valorar preferencialmente a prova indiciária, podendo esta só por si conduzir à sua convicção. Por isso que, em sede de apreciação, não dispensa a prova testemunhal um tratamento cognitivo por parte de restantes meios de prova, sendo que a mesma, tal qual a prova indiciária de qualquer natureza, pode ser objecto de formulação de deduções ou induções correcção de raciocínio mediante a utilização das regras da experiência. Desde logo, é legítimo o recurso a tais presunções, uma vez que são admissíveis em processo penal as provas que não forem proibidas por lei (art. 125.º do CPP) e o art. 349.º do C. Civil prescreve que presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, sendo admitidas as presunções judiciais nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (art. 351.º). Depois, as presunções simples ou naturais (as aqui em causa) são simples meios de convicção, pois que se encontram na base de qualquer juízo. O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto conhecido para um facto desconhecido; toda a prova indirecta se faz valer através desta espécie de presunções. As presunções simples ou naturais são, assim, meios lógicos de apreciação das provas, são meios de convicção. Cedem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto (cfr. Cavaleiro de Ferreira, Curso de Processo Penal, I, 333 e segs.). O que vale por dizer que as presunções naturais não violam o princípio in dubio pro reo. Este princípio é que constitui o limite daquelas. No caso, o próprio recorrente aceita que a decisão recorrida não ficou em estado de dúvida, mas entende que deveria ter ficado, o que como vimos é agora insindicável pelo Tribunal de Revista.”. Ver também o acórdão da RC de 28/10/2009, Processo 31/01, relatado por Jorge Jacob, no processo 31/01, in JusNet 6710/2009, donde citamos: “…Esta afirmação não colide, no entanto, com a validade da prova obtida através de presunção judicial. Não oferece dúvida que são admissíveis em processo penal as provas que não sejam proibidas por lei (art. 125º), aí incluídas as presunções judiciais, que são as ilações que o julgador retira de factos conhecidos para firmar outros factos, desconhecidos (art. 349º do Código Civil), sem que daí resulte prejuízo para o princípio da livre apreciação da prova. Não sendo meio de prova proibido por lei, pode o julgador, à luz das regras da experiência e da sua livre convicção, retirar dos factos conhecidos as ilações que se ofereçam como evidentes ou como razoáveis e firmá-las como factos provados. De resto, este é um mecanismo recorrente na formação da convicção. Basta pensar na prova da intenção criminosa. A intenção, enquanto elemento volitivo do dolo (enquanto decisão pela conduta, suposto serem conhecidos pelo agente os elementos do tipo legal de crime), na medida em que traduz um acontecimento da vida psicológica, da vivência interna, não é facto directamente percepcionável pelos sentidos do espectador, havendo que inferi-la a partir da exteriorização da conduta. Só por recurso à presunção judicial, diluída naquilo que em processo penal se designa por "livre convicção", é possível determiná-la, através de outros factos susceptíveis de percepção directa e das máximas da experiência, extraindo-se como conclusão o facto presumido, que assim se pode ter como provado. Desde que as máximas da experiência (a chamada "experiência comum", assente na razoabilidade e na normalidade das situações da vida), não sejam postas em causa, desde que através de um raciocínio lógico e motivável seja possível compreender a opção do julgador, nada obsta ao funcionamento da presunção judicial como meio de prova, observadas que sejam as necessárias cautelas: - Desde logo, é necessário que haja uma relação directa e segura, claramente perceptível, sem necessidade de elaboradas conjecturas, entre o facto que serve de base à presunção e o facto que por presunção se atinge (sendo inadmissíveis "saltos" lógicos ou premissas indemonstradas para o estabelecimento dessa relação); - Por outro lado, há-de exigir-se que a presunção conduza a um facto real, que se desconhece, mas que assim se firma (por exemplo, a autoria - desconhecida - de um facto conhecido, sendo conhecidas também circunstâncias que permitem fazer funcionar a presunção, sem que concomitantemente se verifiquem circunstâncias de facto ou sejam de admitir hipóteses consistentes que permitam pôr em causa o resultado assim atingido); - Por fim, a presunção não poderá colidir com o princípio in dubio pro reo (é esse, aliás, o sentido da restrição referida na parte final do exemplo que antecede). …”. Quanto às condições em que operam as presunções, ver o acórdão do STJ de 07/01/2004, relatado por Henriques Gaspar, in www.gde.mj.pt, processo 03P3213, donde citamos: “…Importam, neste âmbito, as chamadas presunções naturais ou hominis, que permitem ao juiz retirar de um facto conhecido ilações para adquirir um facto desconhecido. As presunções naturais são, afinal, o produto das regras de experiência; o juiz, valendo-se de um certo facto e das regras da experiência, conclui que esse facto denuncia a existência de outro facto. «Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede então mediante uma presunção ou regra da experiência [ou de uma prova de primeira aparência». (cfr, v. g., Vaz Serra, "Direito Probatório Material", BMJ, n° 112 pág, 190). Em formulação doutrinariamente bem marcada e soldada pelo tempo, as presunções devem ser «graves, precisas e concordantes». «São graves, quando as relações do facto desconhecido com o facto conhecido são tais, que a existência de um estabelece, por indução necessária, a existência do outro. São precisas, quando as induções, resultando do facto conhecido, tendem a estabelecer, directa e particularmente, o facto desconhecido e contestado. São concordantes, quando, tendo todas uma origem comum ou diferente, tendem, pelo conjunto e harmonia, a firmar o facto que se quer provar» (cfr. Carlos Maluf, "As Presunções na Teoria da Prova", in "Revista da Faculdade de Direito", Universidade de São Paulo, volume LXXIX, pág. 207). A presunção permite, deste modo, que perante os factos (ou um facto preciso) conhecidos, se adquira ou se admita a realidade de um facto não demonstrado, na convicção, determinada pelas regras da experiência, de que normal e tipicamente (id quod plerum que accidit) certos factos são a consequência de outros. No valor da credibilidade do id quod, e na força da conexão causal entre dois acontecimentos, está o fundamento racional da presunção, e na medida desse valor está o rigor da presunção. A consequência tem de ser credível; se o facto base ou pressuposto não é seguro, ou a relação entre o indício e o facto adquirido é demasiado longínqua, existe um vício de raciocínio que inutiliza a presunção (cfr. Vaz Serra, ibidem). Deste modo, na passagem do facto conhecido para a aquisição (ou para a prova) do facto desconhecido, têm de intervir, pois, juízos de avaliação através de procedimentos lógicos e intelectuais, que permitam fundadamente afirmar, segundo as regras da experiência, que determinada facto, não anteriormente conhecido nem directamente provado, é a natural consequência, ou resulta com toda a probabilidade próxima da certeza, ou para além de toda a dúvida razoável, de um facto conhecido. A presunção intervém, assim, quando as máximas da experiência da vida e das coisas, baseadas também nos conhecimentos retirados da observação empírica dos factos, permitem afirmar que certo facto é a consequência típica de outro ou outros. A ilação derivada de uma presunção natural não pode, porém, formular-se sem exigências de relativa segurança, especialmente em matéria de prova em processo penal em que é necessária a comprovação da existência dos factos para além de toda a dúvida razoável. Há-de, pois, existir e ser revelado um percurso intelectual, lógico, sem soluções de continuidade, e sem uma relação demasiado longínqua entre o facto conhecido e o facto adquirido. A existência de espaços vazios no percurso lógico de congruência experimental típica determina um corte na continuidade do raciocínio, e retira o juízo do domínio da presunção, remetendo-o para o campo já da mera possibilidade física mais ou menos arbitrária ou dominada pelas impressões. A compreensão e a possibilidade de acompanhamento do percurso lógico e intelectual seguido na fundamentação de uma decisão sobre a matéria de facto, quando respeite a factos que só podem ter sido deduzidos ou adquiridos segundo as regras próprias das presunções naturais, constitui um elemento relevante para o exercício da competência de verificação da (in)existência dos vícios do artigo 410º, n°2, do CPP, especialmente do erro notório na apreciação da prova, referido na alínea b). …”. No sentido de que o recurso à presunção judicial em processo penal não põe em causa o princípio da presunção da inocência consagrado no art.º 32º da CRP, cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, in “CRP Anotada”, tomo I, Coimbra Editora, 2005, a págs. 356 e 357. 46. Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, pág. 244. 47. Constituição da República Portuguesa. 48. Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 49. Ver Mário M. Serrano, in “Extradição – Regime e Praxis”, inserido no Volume I de “Cooperação Internacional Penal – Extradição – Transferência de Pessoas Condenadas”, Centro de Estudos Judiciários, 2000, págs. 27 a 29; Jorge Miranda e Rui Medeiros, in “Constituição Portuguesa Anotada”, vol. I, Coimbra Editora, 2005, págs. 91 a 96; Ireneu Cabral Barreto, in “A Convenção Europeia dos Direitos do Homem Anotada”, Coimbra Editora, 2005, págs. 31 e 32; Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 103 a 109, nestes dois últimos casos especificamente para a CEDH. 50. Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. 51. Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, pág. 80. 52. Nesse sentido, ver Maia Gonçalves, in “CP Anot.”, Almedina, 11ª ed., 1997, pág. 575, e Faria e Costa in “Comentário Conimbricense ao Código Penal”, tomo I, pág. 675 e 676. Contra este entendimento, ver, por todos, o acórdão da RP de 14/09/2011, relatado por Ernesto Nascimento, in JusNet 5057/2011, do qual citamos: “…Outra questão respeita a saber se as pessoas colectivas podem ser, em simultâneo, sujeitos passivos de crime de difamação ou injuria a par do crime de ofensa a organismo, serviço ou pessoa colectiva. Há divergência de opiniões, mas vingando a nível jurisprudencial a tese de que após a revisão do CP de 1995 e com os esclarecimentos da revisão de 2007, a "honra", prestígio e confiança das pessoas colectivas são protegidas pelo disposto no art. 187 do CP, respeitando os arts. 180 e 181 às pessoas singulares, pessoas físicas. Isto apesar de anteriormente a 1995 se entender que as pessoas colectivas podiam ser (alvos) sujeitos passivos de difamação ou injuria. Nomeadamente a partir do Assento do STJ de 24-02-1960 (JusNet 99/1960). A honra é vista como um bem jurídico complexo que inclui, quer o valor pessoal e interior de cada indivíduo, radicado na sua dignidade, quer a própria reputação ou consideração exterior - Faria Costa Comentário Conimbricense, Tomo I-607. Consideração é o merecimento que o indivíduo tem no meio social, isto é, o bom nome, o crédito, a confiança, a estima, a reputação, que constitui a dignidade objectiva, o juízo que a sociedade faz de cada cidadão, em suma, a opinião pública -Cfr. Ac. da R. Lx de 06-02-1996, in Col. Jurisp. tomo I, pág. 156 (JusNet 995/1996). Porque se vinha entendendo que a "honra e consideração" são atributos das pessoas singulares, por serem valores eminentemente pessoais e ligados à condição humana, mas porque também havia necessidade de proteger as pessoas colectivas no seu prestígio, a revisão penal de 1995 veio introduzir o art. 187. O legislador autonomizou a protecção dos valores inerentes à pessoa colectiva -credibilidade, prestígio e confiança- e reservou para as pessoas singulares, pessoa humana a previsão dos arts. 180 e 181, onde se consagram e protegem os valores tradicionais da honra e da consideração social que lhes são devidos. Neste sentido, Ac. da R. Porto de 15-10-2007 in Col. Jurisp. tomo IV, pág. 227 (JusNet 6019/2007). Neste aresto se refere, "de facto a pessoa humana tem uma essência e uma grandeza únicas, é figura central da modernidade civilizacional, e como tal, agrega em torno de si valores que merecem um tratamento exclusivo e singular que a destacam em relação à protecção também merecida por entidades de natureza distinta". Defensores desta tese são os Cons. Leal Henriques e Simas Santos que no seu Código Penal defendem que a honra e a consideração são requisitos exclusivos das pessoas singulares, sendo que às pessoas jurídicas apenas se adequam outras realidades, tais como, o crédito e a confiança, razão porque é inaceitável a tese de que a pessoa jurídica pode, sob o ponto de vista jurídico-penal, ser ofendida na sua "honra". Que a distinção entre pessoa física e pessoa colectiva apenas se faz para fins patrimoniais e económicos, e que as ofensas dirigidas a um ente colectivo são, na realidade, dirigidas às pessoas físicas que o compõem, dirigem ou administram, assim sufragando o entendimento de Nelson Hungria (Comentário ao Código Penal Brasileiro VI, 44ª 46). Esta é a tese que seguimos, sabendo que é discutível e controversa, tendo entendimento contrário o Prof. Figueiredo Dias expresso nas actas de revisão do CP, Maia Gonçalves no seu Código Penal anotado e comentado, Cons. O. Mendes in "O Direito à Honra e a sua Tutela Penal" onde refere, a pág. 115 que se conclui que "as pessoas jurídicas podem ser sujeito passivo não só do tipo legal do crime do art. 187, mas também do crime de difamação do art. 180".…”. 53. Novamente Maia Gonçalves, in “CP Anot.”, Almedina, 11ª ed., 1997, pág. 575, e 54. Faria e Costa in “Comentário Conimbricense ao Código Penal”, I, Coimbra Editora, 2001, pág. 676. Cf. Faria e Costa, in “Comentário Conimbricense ao Código Penal”, I, Coimbra Editora, 2001, págs. 607 e 681. Como referiu o acórdão do STJ de 10/07/2008, relatado por Henriques Gaspar, in www.gde.mj.pt, processo 08P1410 “…O crédito ou o bom nome são, pois, elementos que compõem e integram os direitos inerentes à personalidade, tanto no plano da seriedade e honestidade negocial, como na reputação, que é «a consideração dos outros na qual se reflecte a dignidade pessoal» e que pode ser afectada «independentemente de se atribuírem qualidades eticamente aviltantes». A reputação «representa a visão exterior sobre a dignidade de cada um, o apreço social, o bom-nome de que cada um goza no círculo das suas relações» ou da comunidade onde se insere (ac. do STJ de 12/01/2000, proc. 761/99). A ofensa ao crédito resultará da divulgação de facto que tenha como consequência a diminuição ou a afectação da confiança sobre a capacidade de cumprimento das obrigações da pessoa visada; a ofensa ao bom-nome abala o prestígio e a consideração social de que uma pessoa goze, perturbando o conceito e a apreciação positiva com que alguém é considerado no meio social onde se insere e se desenvolve a sua vida: o prestígio coincide, assim, com a consideração social das pessoas, que se projecta em perspectiva relacional entre a pessoa e o meio social. …”. 55. Quanto à distinção entre factos e juízos de valor, ver o acórdão do STJ de 14/02/2012, relatado por Hélder Roque, in www.gde.mj.pt, processo 5817/07.2TBOER.L1.S1, do qual citamos: “…A distinção entre afirmações de facto e juízos de valor, entendidos estes últimos, em sentido amplo, de modo a abranger opiniões, crenças e convicções pessoais, incluindo sobre situações de facto, embora seja meramente tendencial, na medida em que, do ponto de vista teorético-cognitivo, as primeiras podem conter elementos subjectivos e os segundos são susceptíveis de se basear em realidades objectivas[…], permite registar que os juízos de valor resultam de uma apreciação subjectiva incontornável, de um elemento de tomada de posição ideológica ou emocional, enquanto que as afirmações de facto ou são verdadeiras ou falsas, pressupondo a indispensabilidade da sua prova, ao contrário do que sucede com os juízos de valor, em que já não haverá, em princípio, lugar à averiguação da sua verdade ou falsidade, ou do seu escoramento emocional ou racional, desde que a génese subjectiva do juízo de valor seja, imediatamente, perceptível junto dos destinatários[…]. Com efeito, a prova da exactidão dos juízos de valor é impossível de realizar e seria atentatória da liberdade de expressão, importando, tão-só, que os mesmos não se encontrem, totalmente, desprovidos de base factual, sob pena de poderem ser considerados excessivos, devendo, então, ser sujeitos a apreciação, de acordo com um critério de proporcionalidade[…]. A opinião é uma posição parcial, sustentada numa argumentação que pretende convencer e arregimentar, mas que deve corresponder a uma convicção séria e fundada, uma apreciação, um ponto de vista sobre qualquer espécie de questão ou assunto, na qual o seu autor exprime pontos de vista subjectivos, aduzindo argumentos a esse favor, relativamente a temas que, por qualquer razão, despertam o seu interesse, podendo ser de análise de acontecimentos ou de formulação de um juízo sobre determinada pessoa ou coisa, retirando dos factos deduções e conclusões, e induzindo os receptores a aderirem a essas teses e conclusões. O objectivo da opinião, que se distingue, claramente, da notícia, é lançar o debate e esclarecer o público, procurando, por vezes, chamar a atenção para determinados aspectos das notícias que passam ao lado de pessoas mais despercebidas, sendo textos pessoais e, inteiramente, subjectivos que trazem em si uma pretensão de validade, se não universal, pelo menos, intersubjectivamente, alargada[…]. Enquanto que a crónica é marcada por uma relação de fidelidade com o objecto descrito ou figurado, assumindo o narrador uma posição de neutralidade, para dar relevo ao acontecimento, a opinião introduz a marca da subjectividade, do parcial, razão pela qual esta nunca exclui a possibilidade do erro e a do confronto com outros pontos de vista, tendo como limites lógicos a intolerância, o fanatismo e o dogma. A crítica consiste numa actividade caracterizada pela emissão de juízos de valor e, por isso, em larga medida, recobre os domínios em que pode formar-se uma opinião, exigindo seriedade de propósitos, motivação de juízos, apreciação racional e coerente do objecto analisado, ainda que, aparentemente, seja destruidora, violenta ou até truculenta, mas de onde se exclui o espírito de maledicência, revanche, desforço, ajuste de contas ou até cegueira ideológica[…]. O que distingue a opinião das imputações de factos é o elemento da tomada de posição de ser a favor ou contra, isto é, do opinar, sendo certo que estas ultimas, devido à sua pretensão de objectividade, são, por via de regra, entendidas mais a sério, configurando, por isso, no debate de ideias, uma espada mais cortante do que os juízos de valor, cuja subjectividade é sempre, exteriormente, reconhecível[…]. A possível confundibilidade entre imputações de facto e juízos de valor, para efeitos de eventual restrição da liberdade de expressão quanto a estes últimos, deve ser entendida, em termos hábeis, apenas sendo aceite, em casos limite, em que os juízos de valor são apresentados com manifesta má fé, contra todas as evidências empíricas e circunstanciais, garantindo-se, ao invés, em maior medida, a protecção à comunicação de factos errados, sendo certo que, não raro, os juízos de valor se transformam em juízos de facto e as afirmações de facto em afirmações de valor[…]. É, por isso, que o direito fundamental à liberdade de opinião não pretende estar apenas ao serviço da verdade, mas, também, garantir a todo o cidadão a possibilidade de exprimir, livremente, o que pensa, mesmo quando não ofereça nem possa oferecer qualquer razão controlável para o seu juízo, contrariamente ao que acontece com a tutela constitucional da liberdade da imputação de factos que pode depender da verdade da respectiva comunicação. Porém, quando a opinião sobre uma pessoa se traduz num juízo desfavorável é sempre mais fácil o resvalamento para o domínio do ilícito, podendo invadir-se a esfera de tutela jurídico-constitucional dos direitos da mesma. Assim sendo, o sentido da decisão quanto à ilicitude ou justificação do exercício concreto do direito à liberdade de imprensa acaba por ficar prejudicado pela qualificação como juízo de valor ou imputação de factos[…]. …”. 56. Quanto a estes elementos, citamos o sumário do acórdão da RC de 04/05/2011, relatado por Jorge Dias, in www.gde.mj.pt, processo 983/09.5TATNV.C1: “1.- Constituem elementos objectivos do crime de ofensa a pessoa colectiva pública: a) a afirmação ou propalação de factos inverídicos; b) susceptíveis de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança da pessoa colectiva, corporação, organismo ou serviço; c) não tendo o agente fundamento para, em boa fé, reputar tais factos de verdadeiros. 2.- O bem jurídico protegido não é a honra, enquanto interesse essencialmente intrínseco e inerente à dignidade da pessoa, mas antes a credibilidade dos entes aí previstos.”. 57. Nesse sentido, ver o acórdão da RP de 06/2/2006, relatado por Cravo Roxo, in JusNet 6610/2006, do qual citamos: “…Nesta perspectiva, reza o Art. 188º do mesmo diploma legal que o procedimento criminal pelos crimes contra a honra depende de acusação particular, com excepção dos crimes previstos no Art. 187º, sempre que o ofendido exerça autoridade pública, casos em que é suficiente a queixa ou participação: nº 1, alínea b) desse aresto; o que se compreende, atendendo à natureza do lesado, que condiciona o modo de presença do facto em juízo. Em resumo dir-se-á que, quando se trata de pessoa colectiva que não exerça autoridade pública, o procedimento criminal depende de acusação particular; quando exerce essa autoridade, o procedimento criminal dependerá de queixa. Esta norma ficará sem conteúdo, se se considerar que só as pessoas colectivas que exercem essa autoridade podem ser objecto desse tipo de crime e só esta interpretação garante alguma utilidade, validade e perenidade da norma referida, sob pena de se tornar anódina e inócua. E tal interpretação surge na sequência, quer da discussão em sede de comissão revisora (veja-se a acta da 45ª sessão da Comissão Revisora do Código Penal, de 11 de Dezembro de 1990), quer da jurisprudência do STJ. Não repugna que assim seja, considerando que uma empresa prossegue outros valores que não apenas o lucro e merece, enquanto pessoa jurídica, protecção penal, sem com isso se estar a invadir aquele campo reservado a que se chama a mínima intervenção criminal.…”. 58. Vejam-se ambas as redacções: A actual: “Quem, sem ter fundamento para, em boa fé, os reputar verdadeiros, afirmar ou propalar factos inverídicos, capazes de ofender a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos a organismo ou serviço que exerçam autoridade pública, pessoa colectiva, instituição ou corporação, é punido com pena de prisão até seis meses ou com pena de multa até 240 dias.”. A anterior: “Quem, sem ter fundamento para, em boa fé, os reputar verdadeiros, afirmar ou propalar factos inverídicos, capazes de ofenderem a credibilidade, o prestígio ou a confiança que sejam devidos a pessoa colectiva, instituição, corporação, organismo ou serviço que exerça autoridade pública, é punido com pena de prisão até 6 meses ou com pena de multa até 240 dias.”. 59. Alínea qq) da matéria de facto provada. 60. Neste sentido, ver Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 351 a 355. 61. Código Civil. 62. Nesse sentido, ver R.V.A. Capelo de Sousa, in “O direito Geral de Personalidade”, Coimbra editora, 1995, págs. 596 a 599. No mesmo sentido se pronunciou o acórdão do STJ de 10/07/2008, relatado por Henriques Gaspar, in www.gde.mj.pt, processo 08P1410, donde citamos: “…Os direitos de personalidade não estão, por seu lado, excluídos da capacidade de gozo das pessoas colectivas, que têm direito ao bom-nome e à honra e consideração social – artigos 26º, nº 1 da Constituição e 70º, nº 1 e 72º, nº 1 do CCv. O direito ao bom-nome das pessoas colectivas está, assim, protegido por lei, entendido no quadro da actividade que desenvolvem, ou seja, na imagem e consideração exterior, na honestidade da acção, na credibilidade e no prestígio social (cfr. ac, do STJ, de 8/3/07, proc. 566/07). …”. 63. Veja-se também a este propósito a resenha jurisprudencial feita no acórdão do STJ de 06/07/2011, relatado por Gabriel Catarino, in www.gde.mj.pt, processo 2619/05.4TVLSB.L1.S1, que considera que “…VII - O desânimo e a falta de iniciativa provocada pelo estado de espírito de um sócio gerente, momentaneamente, quebrado na sua iniciativa por condicionalismos determinados por uma notícia, desde que não se tenham repercutido, de forma indelével e inarredável, na imagem da empresa, não podem servir como factor indutor de um ressarcimento por danos não patrimoniais desta.” (do respectivo sumário), do qual citamos: “…Permitimo-nos transcrever, por comodidade e data vénia, e ainda porque os arestos citados aportam um significativo número de decisões que coonestam cada uma das teses, o tramo do acórdão da Relação de Lisboa, sob critica. “Se não há dúvida que as pessoas singulares têm direito a ser indemnizadas por danos não patrimoniais, já não é pacífico que as pessoas colectivas possam também ser ressarcidas a esse título pois não têm afectos nem sofrimento físico ou moral. Assim, para uma corrente jurisprudencial a ofensa do bom nome e reputação das sociedades comerciais apenas releva como dano patrimonial indirecto, não sendo por isso susceptível de indemnização por danos não patrimoniais, invocando-se que o bom nome e reputação das sociedades comerciais apenas interessam na medida da vantagem económica que deles podem retirar (cfr Ac do STJ de 27/11/2003 – P. 03B3692, Ac do STJ de 9/6/2005 – P. 05B1616 e Ac do STJ de 23/1/2007 – P. 06A4001 – in www.dgsi.pt). Diferentemente, para outra corrente, é possível reconhecer às sociedades comerciais o direito a indemnização por danos não patrimoniais pois são sujeitos autónomos de direito, dotados de personalidade jurídica e têm interesse em defender o seu bom nome comercial, o seu prestígio, a sua credibilidade, enfim, a sua imagem, pois daí pode depender em grande medida o sucesso da sua actividade (cfr Ac do STJ de 5/10/2003 – P. 03B1581, Ac do STJ de 9/2/2006 – P. 05B4048, Ac do STJ de 8/3/2007 – P. 07B566, Ac do STJ de 17/4/2007 – P. 07B755, Ac do STJ de 12/2/2008 – P. 07A4618, Ac do STJ de 19/6/2008 – P. 08B1079, Ac do STJ de 21/5/2009 - P. 09A0643, Ac do STJ de 12/5/2010 – P. 88/08.6TATBU.C1 e Ac do STJ de 17/6/2010 – P. 806/03.TBMGR.C1.S1 – in www.dgsi.pt)…”. 64. Como se diz no já citado acórdão do STJ de 10/07/2008, relatado por Henriques Gaspar, in www.gde.mj.pt, processo 08P1410 : “…A complexidade da ponderação de valores no confronto entre expressões comunicacionais que formal e substancialmente se assumem como exercício da liberdade de expressão na comunicação social, e as consequências no plano dos direitos individuais das pessoas afectadas, tem sido objecto de variadas intervenções do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) na interpretação e aplicação do artigo 10º da CEDH, construindo e densificando uma doutrina que, dada a força vinculante da Convenção (artigos 1º e 46º, par. 1), tem relevante valor de referente no círculo hermenêutico do complexo normativo (interno e internacional, com aplicação directa) que deve ser considerado. O artigo 10º da CEDH garante a “liberdade de expressão”, dispondo no par. 1 que «Qualquer pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de transmitir informações e ideias sem que possa haver ingerência de quaisquer autoridades públicas e sem consideração de fronteiras. […]». Mas no par 2, reconhecendo o carácter não absoluto do direito enunciado, prescreve que «o exercício destas liberdades, porquanto implica deveres e responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas na lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a integridade territorial, ou a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a protecção da saúde ou da moral, a protecção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais, ou para garantir a autoridade e a imparcialidade do poder judicial». Na interpretação e aplicação desta disposição no que respeita à liberdade de imprensa, a jurisprudência do TEDH tem revelado acentuada coerência em registo de protecção forte, por vezes numa função de verdadeira quarta instância. Os princípios e a definição dos critérios inscrevem-se em fórmulas verdadeiramente tabelares, recorrentemente utilizadas. Tomem-se, em síntese, como exemplo, algumas recentes formulações (v. g. nos acórdãos LOPES GOMES DA SILVA c. Portugal, de 28 de Setembro de 2000; ROSEIRO BENTO c. Portugal, de 18 de Abril de 2008 e AZEVEDO c. Portugal, de 27 de Março de 2008, para só referir caos portugueses). «A liberdade de expressão constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática e uma das condições primordiais do seu progresso e do desenvolvimento de cada pessoa. Sob reserva do parágrafo 2º, a liberdade de expressão vale não só para as "informações" ou "ideias" acolhidas com favor ou consideradas como inofensivas ou indiferentes, mas também para aquelas que melindram, chocam ou inquietam. Assim é exigido pelo pluralismo, pela tolerância e espírito de abertura sem os quais não existe "sociedade democrática". Como determina o artigo 10º, esta liberdade está sujeita a excepções que devem, contudo, ser interpretadas restritivamente, e a necessidade de qualquer restrição deve ser demonstrada de maneira convincente». «Estes princípios revestem uma particular importância para a imprensa. Se esta não deve ultrapassar os limites fixados em vista, nomeadamente, "da protecção de reputação de outrem", incumbe-lhe contudo transmitir informações e ideias sobre questões políticas bem como sobre outros temas de interesse geral. Quanto aos limites da crítica admissível eles são mais amplos em relação a um homem político, agindo na sua qualidade de personagem pública, que um simples particular. O homem político expõe-se inevitável e conscientemente a um controlo atento dos seus factos e gestos, tanto pelos jornalistas como pela generalidade dos cidadãos, e deve revelar uma maior tolerância sobretudo quando ele próprio profere declarações públicas susceptíveis de crítica. Certamente tem direito à protecção da sua reputação mesmo fora do âmbito da sua vida privada, mas os imperativos de tal protecção devem ser comparados com os interesses da livre discussão das questões políticas, impondo as excepções à liberdade de expressão uma interpretação restritiva». «A liberdade do jornalista compreende também o recurso possível a uma certa dose de exagero ou mesmo de provocação». «O adjectivo "necessária", com o sentido do artigo 10º, § 2º, pressupõe a existência de uma "necessidade social imperiosa". Os Estados contratantes gozam de uma certa margem de apreciação para julgar sobre a existência de uma tal necessidade, mas esta margem deve ser acompanhada por um controlo europeu que tem por objecto simultaneamente a lei e as decisões que a aplicam, mesmo quando tais decisões emanem de uma jurisdição independente. O Tribunal tem, pois, competência para estatuir em última instância sobre a questão de saber se uma "restrição" se concilia com a liberdade de expressão protegida pelo artigo 10º.» «No exercício do seu poder de controlo, o Tribunal deve apreciar a ingerência à luz das circunstâncias do caso tomado no seu conjunto, incluindo o conteúdo das críticas que são censuradas ao requerente e o contexto em que as produziu. Compete ao Tribunal determinar nomeadamente se a ingerência criticada era "proporcionada às finalidades legítimas prosseguidas" e se os motivos invocados pelas autoridades nacionais para justificar a ingerência se mostram "pertinentes e suficientes". Neste julgamento, o Tribunal deve estar convencido de que as autoridades nacionais aplicaram regras conformes aos princípios consagrados no artigo 10º e, além disso, fundamentando-se numa apreciação aceitável dos factos pertinentes». «Uma opinião, por definição, não se presta a uma demonstração de veracidade. Pode, no entanto, revelar-se excessiva, nomeadamente na ausência de qualquer base factual». Nesta perspectiva, expressões por vezes marcadas, capazes de se constituir isoladamente como ofensivas, podem ser complexivamente consideradas como estando no mesmo patamar («à medida») da indignação causada por anteriores conteúdos expressivos da pessoa a quem a expressão contestada foi dirigida (v. g. , o termo “imbecil” [“Trotel”] objecto de apreciação no caso OBERSCHLICK c. Áustria, de 1 de Julho de 1997). Uma determinada expressão, com efeito, não obstante uma primeira interpretação ou sentido desvaliosos, pode não constituir um ataque pessoal gratuito ou injustificado, quando seja fornecida uma explicação objectivamente compreensível, resultante de propósitos e intervenções directamente provocatórios da pessoa visada, inseridos no contexto de uma discussão de interesse público ou de debate de natureza política (v., de certo modo, o acórdão do TEDH no caso GOMES DA SILVA c. Portugal, cit., publicado na “Revista Portuguesa de Ciência Criminal”, Ano 11 (2001), Fasc. 1, Janeiro-Março 2001, p. 131).…”. 65. Constituição da República Portuguesa. 66. Neste sentido, ver Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 215 a 229. 67. Relevantes nos termos do disposto no art.º 8º/3 do Código Civil, com o seguinte teor: “Nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito.”. 68. Veja-se, quanto a esses valores, a resenha feita no acórdão do STJ de 17/12/2009, relatado por Garcia Calejo, no processo 77/06.5TBAND.C1.S1, in JusNet 7598/2009, que fixou a indemnização pela perda da vida em €50.000,00: “…Como temos vindo a entender o valor de uma indemnização neste âmbito, deve compensar realmente o lesado pelo mal causado, donde resulta que o valor da indemnização deve ter um alcance significativo e não ser meramente simbólico (neste sentido, entre muitos, os Acórdãos deste Supremo Tribunal de 17-1-2008 (JusNet 51/2008) relator Conselheiro Pereira da Silva e de 29-1-2008 (JusNet 386/2008) relator o do presente acórdão, ambos in www.djsi.pt/jstj.nsf). Por isso se tem vindo a esboçar neste Supremo Tribunal a doutrina de aumentar as indemnizações, designadamente as fixadas na sequência de acidentes de viação. Compulsando a jurisprudência mais recente deste STJ concluiu-se que o dano morte (supressão da vida) tem vindo a ser ressarcido, no geral, entre 50.000 e 60.000 EUR, havendo decisões (raras) em que foi atribuída uma indemnização em quantia superior (por exemplo nos Acórdãos de 10-1-2008 relatado pelo Conselheiro Nuno Cameira -75.000 EUR - e de 16-10-2008 relatado pelo Conselheiro Oliveira Vasconcelos - 70.000 EUR), mas também em montante inferior (por exemplo nos acórdãos de 29-3-2007 (JusNet 2489/2007) relatado pelo Conselheiro Oliveira Vasconcelos - 40.000 EUR e de 13-9-2007 relatado pelo Conselheiro Salvador da Costa -40.000 EUR). De sublinhar que maioritariamente se vindo a fixar esse dano na importância de 50.000 EUR (vide acórdãos de 14-5-2009 relatado pelo Conselheiro Moreira Alves, de 19-3-2009 relatado pelo Conselheiro Lázaro Faria, de 12-2-2009 (JusNet 665/2009) relatado pela Conselheira Maria dos Prazeres Beleza, de 24-1-2008 relatado pelo Conselheiro Duarte Soares, de 29-1-2008 relatado pelo Conselheiro relatado pelo Conselheiro Cardoso de Albuquerque, de 21-2-2008 relatado pelo Conselheiro Pires da Rosa, de 24-4-2008 relatado pelo Conselheiro João Bernardo, de 27-5-2008 relatado pelo Conselheiro Custódio Montes, de 5-6-2008 relatado pelo Conselheiro Mário Mendes, de 24-6-2008 relatado pelo Conselheiro Nuno Cameira, de 10-7-2008 (JusNet 5291/2008)relatado pelo Conselheiro Salreta Pereira, de 9-9-2008 (JusNet 8138/2008) relatado pelo relator desta acórdão, de 30-10-2008 relatado pelo Conselheiro Santos Bernardino, de 4-12-2008 relatado pelo Conselheiro Lázaro Faria, todos constantes dos sumários internos deste STJ. …”. 69. Relatado por Henriques Gaspar, in www.gde.mj.pt, processo 08P1410. 70. Relatado por João Bernardo, in www.gde.mj.pt, processo 08B3227. 71. Relatado por Ribeiro Martins, in JusNet 1158/2009. 72. Relatado por Alberto Sobrinho, in www.gde.mj.pt, processo 159/09.1YFLSB. 73. Relatado por Pires da Rosa, in JusNet 203/2010, do qual citamos” … É inadequado concluir, como fazem os recorrentes, pela inadequação de uma indemnização de 50 000,00 euros, quando se vem fixando comummente nos tribunais portugueses a indemnização de 25 000,00 euros por "dano de morte". Nem isto é assim - o tal "dano de morte" há muito tem sido tratado no montante mínimo de 50 000,00 / 60 000,00 euros; nem aquilo é assim - os 50 000,00 euros são o somatório das indemnizações e os RR não se coibiram de atingir o património moral de três pessoas distintas. Na fixação do(s) montante(s) indemnizatório(s) haveremos que manter o quantitativo fixado nas instâncias. Porque nos parecem perfeitamente adequados dentro dos parâmetros de equidade que aqui nos devem guiar - art.566º, nº3 do CCivil - os quantitativos fixados, porque o acórdão recorrido mantém os valores fixados em 1ª instância por apelo à remissão prevista no art.713º, nº5 do CCivil ( à qual também nós fazemos apelo para importar aqui as considerações que suportam a quantificação desses danos ), porque - como se escreveu no acórdão deste STJ ( Lopes do Rego ) que o ora Relator também subscreveu, no proc. nº381/2002.S1, de 5 de Novembro de 2009 - « o juízo de equidade das instâncias, assente numa ponderação, prudencial e casuística, das circunstâncias do caso - e não na aplicação de critérios normativos - deve ser mantido sempre que - situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida - se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade ».”.. 74. Relatado por Urbano Lopes Dias, in JusNet 2168/2010, do qual citamos: “… A dificuldade na determinação do quantum indemnizatório por ofensa ao direito à honra (a par de ofensas à privacidade, à imagem, ou outras que causem à vítima sofrimento interior) é particularmente sentida por Pedro Pais de Vasconcelos, quando diz que ela "reside, por um lado, na demonstração da ocorrência desse sofrimento e, por outro, no da sua intensidade" (Direito de Personalidade, página 152). Traçadas, a traços largos, as ideias motivadoras deste tipo de indemnização por danos não patrimoniais, realçado que, no essencial, se deve atender, antes de tudo, à gravidade dos danos, eis-nos perante a tarefa de ditarmos o direito aplicável ao caso concreto, que passa, necessariamente, pela apreciação crítica dos factos provados e pela análise da tutela jurídica que os mesmos possam merecer. … A Declaração Universal dos Direitos do Homem consagra, no artigo 12º, o do direito à honra. O artigo 26º, nº 1, da Constituição, garante que a todos é reconhecido, entre outros, o direito ao bom nome e reputação. Por outro lado, o nº 1 do artigo 70º, do Código Civil, assegura que "a lei protege os indivíduos contra ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral". A honra juscivilisticamente tutelada abrange a projecção do valor da dignidade humana, a qual é inata a todos os seres humanos. Em sentido lato, ela abrange o bom nome e reputação, enquanto sínteses do apreço social pelas qualidades determinantes da unicidade de cada indivíduo e pelos demais valores pessoais adquiridos pelo indivíduo no plano moral, intelectual, sexual, familiar, profissional ou político, engloba o simples decoro, como projecção dos valores comportamentais do indivíduo no que se prende ao trato social, e envolve o crédito pessoal, como projecção social das aptidões e capacidades económicas desenvolvidas por cada homem (Rabindranath V. A. Capelo de Sousa, O Direito Geral da Personalidade, páginas 301 e ss.). A honra significa tanto o valor moral íntimo do homem, como a estima dos outros, ou a consideração social, o bom nome ou a boa fama, o sentimento, ou consciência, da própria dignidade humana. Para o Cardeal Saraiva, "tem honra o homem que constantemente, e por hum sentimento habitual, procura alcançar a estima, a boa opinião e o louvor dos outros homens e trabalha por o merecer", certo que "o sentimento de honra nasce de hum bem sucedido amor de nós mesmos, e nos leva directamente à virtude e às acções generosas, como único meio de alcançarmos boa opinião e louvor dos outros homens" (Obras completas, tomo VII, páginas 186 e 187, citado por José Augusto Sacadura Garcia Marques, A Tutela Geral da Personalidade e o Sentido ao Bom Nome na Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, apud Comemorações dos 35 Anos do Código Civil e dos 25 da Reforma de 1977, Volume II, página 111). No campo jurídico ela pode definir-se como a dignidade pessoal reflectida na consideração dos outros e no sentimento da própria pessoa. Tal direito é um direito inato da personalidade: pelo simples facto do nascimento toda a criatura tem, em si mesma, o bem da própria honra. "Posteriormente, a posição que o indivíduo adquire na sociedade, o género de actividade que pratica, as qualidades pessoais que se desenvolvem com a idade, são todos os elementos que a honra individual pode sofrer maior ou menor desenvolvimento, revelando-se por um modo ou por outro. ... Mesmo o sexo, a raça, a nacionalidade, conferem à honra outros tantos aspectos especiais, mas, no entanto, o conceito de honra, ainda que proteiforme, conserva a sua fundamental unidade. O direito à honra é, portanto, único (Adriano De Cupis, Os Direitos da Personalidade, página 111 e ss.) O direito à honra é uma das mais importantes concretizações da tutela e do direito da personalidade. A honra é a dignidade pessoal pertencente à pessoa enquanto tal, e reconhecida na comunidade em que se insere e em que coabita e convive com outras pessoas. A honra existe numa vertente pessoal e subjectiva, e noutra vertente social, objectiva. Na primeira, traduz-se no respeito e consideração que cada pessoa tem de si própria, na segunda, traduz-se no respeito e consideração que cada pessoa merece ou de que goza na comunidade a que pertence. "Todas as pessoas têm direito à honra pelo simples facto de existirem, isto é, de serem pessoas" (Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª edição, página 62, e Direito de Personalidade, página 76). A honra será interior - opinião ou sentimento de uma pessoa sobre o seu próprio valor, ou exterior - representação que os outros têm sobre o valor de uma pessoa, a chamada reputação ou bom nome (Manuel da Costa Andrade, Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal, página 79). Para este consagrado penalista coimbrão, citando Rudolphi, "a dignidade penal da honra radica na convicção de que «a pessoa só pode viver e desenvolver-se de forma adequada numa comunidade quando os outros membros da comunidade lhe reconhecem a qualidade de pessoa e a tratam em conformidade com o seu Geltungswert. Se se recusa à pessoa este valor, através da divulgação de expressões de não-respeito ou de desrespeito, tal equivale a reduzir as possibilidades de viver e de se desenvolver no interior da sociedade". E, em consonância, remata, dizendo que "a honra terá, assim, de representar a merecida ou fundada pretensão de respeito da pessoa no contexto das relações de comunicação e interacção social em que é chamada a viver" (obra citada, página 81). Orlando de Carvalho sustenta que "o valor da honra, enquanto dignitas humana, «é mais importante que qualquer outro (valor do direito à projecção moral, ou seja, o direito à honra em sentido amplo) e transige menos facilmente com os demais em sede de ponderação de interesses" (Teoria Geral da Relação Jurídica, página 65). … Com pertinência, Fernando Pessoa Jorge, avisa-nos de que "o dano considerar-se-á efeito lesivo se, à luz das regras práticas da experiência e a partir do caso, era provável que o primeiro decorresse do segundo, de harmonia com a evolução normal (e, portanto, previsível) dos acontecimentos" (Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, páginas 392 e 393). Pertinentemente, Pedro Pais de Vasconcelos avisa-nos que "nem todo o dano da personalidade é ilícito por si mesmo e sem mais. A sua ilicitude é a resposta a uma interrogação sobre se, naquelas circunstâncias concretas, é exigível àquela pessoa que sofra aquele dano concreto. É lícito se lhe for exigível que o sofra; é ilícito no caso contrário". Mas, logo de seguida, adverte que "esta conclusão não é arbitrária e exige um critério de decisão", o qual "decorre da «natureza das coisas», dos condicionamentos inerentes aos entia physica e dos entia moralia, principalmente do ethos imanente na vida da comunidade, que influenciam e dirigem, quer o legislador na formulação da lei, quer o julgador na decisão" (Destituição de Administrador, Direito de Personalidade e Providência de Esclarecimento Público, Separata de Estudos em Honra de Ruy Albuquerque, página 582). A normalidade da vida diz-nos que era previsível que aqueles factos, praticados pelo R./Recorrente, naquelas circunstâncias, produzissem aqueles danos. Pretender questionar as consequências da agressão a um dos bem mais preciosos da Pessoa, o direito à honra, mais importante que qualquer outro, enquanto dignitas humana, é, repetindo as palavras condensadas e sábias de Orlando de Carvalho, no fundo, negar-se a si próprio. Carece, portanto, de sentido a alegação do R./Recorrente no que tange ao chamado nexo causal, na medida em que pretendeu defender que as suas "agressões" não seriam causa adequada das "lesões" sofridas pela A./Recorrida. A sua condição humana não lhe permite, sequer, tal tipo de insinuações. Que não apenas na sua dimensão de liberdade (em primeiro lugar, o homem é "um originário"; em segundo, porque é também autor, não só se assumindo como um eu, mas também perante os outros, "naquela «distância originária» ou diferença entre o «eu» e o «tu» pela qual cada um descobre a sua identidade, sem esquecer a dimensão temporal, ou seja, a identidade do "eu" na diferença do tempo), mas também no reconhecimento do homem enquanto pessoa, o qual terá de "ser recíproco: os outros só me podem reconhecer como pessoa se eu os reconhecer a eles como pessoa". Ou seja, "o reconhecimento é assim um diálogo ético - um diálogo entre pessoas". Só assim, reconhecendo esta realidade, afirmando-se a pessoa como pessoa, atingiremos o fundamento à sua qualidade ética de sujeito ético e, "então, não podemos também deixar de reconhecer, segundo o enunciado de Hegel, que «o imperativo do direito é este: sê pessoa e respeita os outros como pessoas" Castanheira Neves, Digesta, Volume 3º, Sobre o Direito, Coordenadas de uma reflexão sobre o problema universal do direito, páginas 32 a 36). Nesta perspectiva, personalista, não podemos acreditar na autenticidade da proposta do R./Recorrente que traduz uma negação da sua própria Pessoa: não só na sua dimensão pessoal, mas também na relação (necessária) com os outros. Como pessoa livre e responsável deverá o R./Recorrente, de uma vez por todas, pensar e repensar, nos seus actos e nas suas consequências que, no concreto caso da A./recorrida, foram, sem dúvida alguma, trágicas. É dentro deste ponto de vista, que temos como sendo o certo, que não podemos deixar de dizer que 10.000 EUR é um nada. Melhor: representa aquele quid mínimo que, indo ao encontro das exigências contidas no já citado artigo 496º do Código Civil, poderá ajudar a minorar todo o extenso sofrimento a que a A./Recorrida, foi, injustamente, sujeita. É que, vistas bem as cousas, a dor de alma é, sem receios de exageros, incomensurável, mau grado os esforços (louváveis) da Psiquiatria em tentar medi-la.”.. 75. Relatado por Gonçalo Xavier Silvano, in JusNet 4278/2010, do qual citamos: “…Ficou provado que após a publicação do artigo com a fotografia em causa iam pessoas ver o local e comentavam que era a casa da Drª V..., presa na Venezuela, chegando a abordar a Autora questionando-a sobre a situação do processo de droga na Venezuela, afirmando com isto o seu envolvimento e sentindo-se, por isso, a autora envergonhada e humilhada. Esta publicação da referida fotografia acarretou para a Autora uma perturbação, uma perda de paz e de tranquilidade individual, sentimentos que não podem deixar de ser associados à ofensa à honra própria e que se traduzem nas referidas vergonha e humilhação. No contexto em que foi inserido o nome da autora relacionado com a casa que lhe pertence e onde vive, com todas as referências do meios de Arroiolos que se seguiram, traduzem, sem dúvida alguma, uma forte e intensa ofensa à honra da autora ,pessoa conhecida no meio e dados os cargos públicos que havia desempenhado. … Trata-se de danos não patrimoniais efectivamente graves pela associação da autora ao envolvimento no negócio da droga, que merecem a tutela do direito, de harmonia com o art. 496º nº1 CC. Seguindo os ensinamentos da doutrina (Antunes Varela-Das Obrigações em Geral-Vol.I-3ª ed.pág.497 e ss.e Almeida e Costa-Direito das Obrigações,5ª ed.pág.483 e ss)que ,reconhecem que a indemnização de danos não patrimoniais não reveste natureza exclusivamente ressarcitória, desempenhando também uma função preventiva e uma função punitiva, sendo o montante a atribuir fixado com recurso à equidade ,ponderando-se as circunstâncias concretas do lesante e do lesado nos termos do artº 494º do CC, entendemos que a indemnização de EUR 20.000 euros atribuída no acórdão se mostra ajustada à ofensa que feita à honra e bom nome da autora com a publicação da fotografia no contexto factual apurado. …”. 76. Relatado por Armindo Monteiro, in www.gde.mj.pt, processo 417/09.5YRPTR. 77. Já antes citado, a propósito da honra das pessoas colectivas, relatado por Gabriel Catarino, in www.gde.mj.pt, processo 2619/05.4TVLSB.L1.S1. 78. Relatado por Hélder Roque, in www.gde.mj.pt, processo 5817/07.2TBOER.L1.S1. 79. Relatado por Hélder Roque, in www.gde.mj.pt, processo 3976/06.0TBCSC.L1.S1. 80. Relatado por Mário Mendes, in www.gde.mj.pt, processo 2398/06.8TBPDL.L1.S1, do qual citamos: “…De acordo com a posição que vimos defendendo em todas as situações em que a questão se coloca, os danos morais ou prejuízos de natureza não patrimonial são, por natureza, insusceptíveis de avaliação pecuniária, uma vez que atingem bens que não integram o património material do lesado e, exactamente porque assim é, o seu ressarcimento deve assumir uma natureza fundamentalmente compensatória e acessoriamente sancionatória[…], não servindo para aqui o chamado dano de cálculo. No nosso ordenamento jurídico estabeleceu-se um critério de fixação do quantum indemnizatório devido por danos não patrimoniais que se encontra fundado no recurso à equidade, haja dolo ou culpa, (artigo 496º nº 3 CCivil) e que, com respeito por padrões de dignidade humana, manda atender aos factores referidos no artigo 494º (entre os quais se conta a situação económica do lesante e do lesado) como factores contributivos para a formação do juízo ou juízos de equidade. No entanto, a ausência de factos que possam servir para determinar a aplicação de um ou mais dos factores indicativos referidos no artigo 494º não impede por si a formulação do juízo de equidade de que depende a fixação do quantum desde que os demais elementos de facto disponíveis permitam ao julgador a sua formulação, que deve, sempre e em qualquer circunstancia, ter em conta as regras da boa prudência, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida, sem esquecer a tal (já referida) natureza mista – compensatória/sancionatória – que deve revestir a indemnização[…] Na verdade, devendo a fixação da indemnização decorrer de um julgamento de equidade (artigo 496 nº 3), que dispensa o julgador da inteira subordinação a critérios puros e rigorosos de carácter normativo, não existe, nesse preciso contexto, um obrigação absoluta de recurso aos factores indicativamente referidos no artigo 494º, antes devendo ser ponderadas as todas as circunstancias concretas e disponíveis do caso que sejam atendíveis para fixação de uma indemnização em montante justo[…]. Posto isto, e ponderadas todas as circunstancias relevantes que nos são fornecidas pelos factos provados, circunstancias que indiscutivelmente que apontam para uma ofensa grave dos direitos fundamentais à honra e bom nome do A[…], uma ofensa que naturalmente provocou sofrimento tanto a ele como aos seus familiares mais directos (v. os pontos DZ a EE dos factos provados), dentro dos critérios enunciados[…] e ponderados os montantes que para situações similares, ainda que menos graves, vêem sendo atribuídos pela nossa jurisprudência mais recente (v. acórdãos deste STJ de 18/6/2009, relator Alberto Sobrinho, de 25/3/2010, relatora Maria dos Prazeres Beleza, 14/5/2002, relator Ferreira Ramos, que contemplam situações menos graves), julga-se adequado fixar a indemnização devida por danos não patrimoniais sofridos pelo A em € 50.000,00, assim se concedendo, neste segmento e parcialmente a revista ao recurso do recorrente AA. …”. 81. Relatado por Lopes do Rego, in www.gde.mj.pt, processo 103/2002.L1.S1. Subscreveu esta posição o já citado acórdão do STJ de 14/01/2010, relatado por Pires da Rosa, in JusNet 203/2010. 82. Quanto ao conceito de figura pública, ver, Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 44 a 49. Bem como o citado acórdão do STJ de 14/02/2012, relatado por Hélder Roque, in www.gde.mj.pt, processo 5817/07.2TBOER.L1.S1, do qual citamos: “…Figura pública é alguém que conseguiu, pelos seus próprios esforços voluntários, colocar-se “in the public eye”, o indivíduo que chegou a uma posição na qual a atenção pública está focada para si como pessoa[…], aquela pessoa que emerge, dentro de cada um dos subsistemas sociais, numa posição de especial protagonismo, mas sem esquecer que este estatuto tem, obviamente, de ser anterior à divulgação da notícia, exigindo-se, igualmente, um conceito normativo de «figura pública», na perspectiva do «interesse público» e não, apenas, «de um interesse do público»[…]. Este conflito de direitos, em torno das «figuras públicas», deve ser resolvido, sem sacrifício total de qualquer um dos bens em tensão, mas antes de acordo com o fundamento teleológico das eventuais restrições – direito ao bom-nome e reputação ou liberdade de expressão e informação – só podendo justificar-se uma limitação ao interesse público da protecção dos direitos de personalidade quando pela imprensa for exercida a função informativa, e não já no âmbito de outras funções, como a recreativa ou publicitária[…]. De todo o modo, deve existir uma conexão entre a pessoa e a matéria de interesse público, no quadro de uma relação entre a importância da figura pública e a ocasião da divulgação para o interesse público, por um lado, e a natureza dos factos revelados, por outro. A consideração do motivo e da medida da relevância pública ou social da notícia, de acordo com o critério geral do interesse legítimo na revelação, impõe que se tenha em conta a causa da notoriedade da pessoa e a correspondência entre esta e os factos noticiados, designadamente, questionando se estes são relevantes para uma valoração, ainda que apenas global, da pessoa, justificada à luz do interesse geral[…]. Quando, por vezes, a invectiva extravasa para o plano pessoal, em virtude das contingências do debate livre das ideias, garantes de uma sociedade democrática, as expressões utilizadas não têm de ser, necessariamente, interpretadas como referidas, também, à personalidade da pessoa visada, mas antes a essa personalidade enquanto actor de um cenário politico[…]. Por outro lado, a crítica aos titulares de cargos públicos, «maxime», aos titulares de órgãos de soberania, em especial, a crítica política, tem de admitir-se com toda a latitude, desde que não haja mero espírito de revanche, de cegueira ideológica, de ataque imotivado. O político que, no desempenho das suas actividades privadas ou oficiais, tem de se sujeitar à crítica do público, nem, por isso, merece uma menor exigência de protecção contra o insulto, não tendo, neste particular, de suportar uma exposição à discussão pública maior do que acontece com as pessoas privadas[…]. Se, na esfera privada, as figuras públicas gozam de protecção da honra igual à do cidadão comum[…], já na esfera pública, quando se trata de combater o pensamento, as palavras, as atitudes e as condutas das figuras públicas, no âmbito da publicidade, ganha projecção a terceira dimensão da liberdade de expressão, ou seja, a liberdade de crítica ou de criação artística, como forma de esconjurar o fantasma de uma atmosfera de intimidação capaz de induzir uma auto-censura da imprensa que seria, particularmente, perigosa para a subsistência da democracia[63], sendo certo que o controlo público das figuras públicas representa o fundamento irrenunciável da vida política em liberdade[…], sem esquecer a proximidade destes personagens, em relação aos meios de comunicação social, nem os sistemas de contacto que com eles logram estabelecer ou manter[…]. Por isso, tem vindo a aumentar o número daqueles que defendem que estes conflitos devem ser encaminhados mais para a arena política do que para as salas dos tribunais[…], considerando-se, a este propósito, que se a sua exposição à publicidade se traduz numa maior visibilidade e vulnerabilidade, as figuras públicas têm um acesso privilegiado aos meios de comunicação social, podendo mais, facilmente, responder com “mais discurso” às agressões de que considerem ter sido vítimas[…]. A fronteira do permitido só é ultrapassada quando a valoração negativa deixa de se dirigir contra a específica pretensão de mérito, v. g., a imagem construída, de forma mais ou menos planificada, de uma «public figure», e passa a atingir, directamente, a substância pessoal, isto é, passa a denegar aquele respeito de que toda a pessoa é credora, por força da sua dignidade humana[…]. Assim, não pode aceitar-se que, a pretexto de uma crítica institucional, se ataque a pessoa do visado, para além do juízo, eventualmente, negativo que se faça da sua obra, deste modo se evitando uma intenção lateral de ofensa injusta e, logo, não justificada pela crítica, ou que não se respeitem os limites de valoração objectiva e de consciência crítica, inflectindo-se o discurso para considerações desnecessárias à personalidade do ofendido, susceptíveis de o degradar como pessoa. Porém, a necessidade da criação de uma esfera de discurso público, aberta e pluralista, e o valor da liberdade de comunicação para a auto-determinação democrática da comunidade e para o controlo público do funcionamento das instituições, apontam no sentido da protecção constitucional de um número significativo de afirmações que tenham como exteriorização negativa a agressão ao bom-nome, à reputação ou à privacidade dos titulares de cargos públicos, a propósito das patologias do sistema político, independentemente de daí resultarem danos colaterais, em matéria de bom-nome e reputação[…]. Os cidadãos, em geral, e os jornalistas, em particular, devem poder debater, abertamente, as questões de interesse público, sob pena de a crítica pública deixar de ser um direito para se tornar num risco[…], independentemente do choque, da amargura, do trauma, ou do distúrbio emocional que daí possam resultar. Com efeito, a protecção do direito ao respeito da reputação de outros é, automaticamente, reduzida quando se trata de homens políticos[…] …”. 83. Neste sentido, ver Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 222 a 227, bem como a doutrina e a jurisprudência aí citadas. 84. Neste sentido, ver Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, pág. 229. 85. Iolanda A.S. Rodrigues de Brito, in “Liberdade de Expressão e Honra das Figuras Públicas”, Coimbra Editora, 2010, págs. 228. 86. Idem, ibidem. |