Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | DIOGO RAVARA | ||
Descritores: | INVENTÁRIO DOAÇÃO INOFICIOSA REDUÇÃO MEIO E MOMENTO PROCESSUAL AVALIAÇÃO DE IMÓVEL REMESSA PARA OS MEIOS COMUNS | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 04/08/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | Sumário: 1-2-3 I. Nada obsta a que a inoficiosidade de doações feitas pelo de cujos a favor de um filho (herdeiro) e de uma neta (que não o é) seja invocada por uma interessada na partilha no mesmo requerimento em que reclama da relação de bens apresentada pela cabeça-de-casal; II. Ainda que a interessada reclamante não invoque o disposto no art.º 1118º do CPC, nada obsta a que o Tribunal adeque a pretensão da reclamante ao meio processual adequado (art.º 193º, nº 3 do CPC); III. A questão da inoficiosidade invocada nos termos referidos em I- e II- pode e deve ser apreciada pelo Tribunal a quo no despacho de saneamento do processo; IV. A avaliação dos imóveis alegadamente doados constitui um meio de prova relevante para a decisão referida em III-, razão pela qual pode e deve ter lugar antes de esta ser proferida. V. O momento próprio para o Tribunal se pronunciar sobre a eventual remessa dos interessados para os meios comuns, nos termos previstos no art.º 1093º do CPC é o despacho de saneamento do processo (art.º 1110º do CPC). VI. Não tendo o Tribunal a quo proferido qualquer decisão sobre tal matéria, nem prolatado despacho de saneamento, não tem o Tribunal da Relação que se pronunciar ex novo sobre essa questão. _______________________________________________________ 1. Da responsabilidade do relator - art.º 663º nº 7 do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26-06, e adiante designado pela sigla “CPC”. 2. Neste acórdão utilizar-se-á a grafia decorrente do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, respeitando-se, no entanto, nas citações, a grafia do texto original. 3. Todos os acórdãos citados no presente aresto se acham publicados em http://www.dgsi.pt/ e/ou em https://jurisprudencia.csm.org.pt/. A versão eletrónica deste acórdão contém hiperligações para todos os arestos nele citados. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: 1. Relatório No Juízo Local Cível de ... (J2) corre termos o processo de inventário nº ..., para partilha da herança de FF em que são interessados a viúva, AA (cabeça de casal), e os filhos do falecido, EE (requerente), BB, CC, sendo também interessada, na qualidade donatária, DD. No decurso de tal processo, tendo o Tribunal a quo determinado a realização da audiência prévia de interessados a que alude o art.º 1109º do CPC, no decurso de tal diligência, a requerente, através do seu ilustre mandatário, requereu “a avaliação do imóvel que consta da verba 7 da relação de bens e dos imóveis indicados na sua petição inicial”, diligência que na mesma ocasião, foi deferida pelo Tribunal a quo através de despacho com o seguinte teor: “ (…) Nos termos do requerido pela requerente no sentido de se proceder à avaliação do bem que integra a verba 7, bem como dos dois imóveis que pretende que integrem a relação de bens, por o apuramento do valor dos mesmos se mostrar necessário para aferir se os mesmos integram ou não a quota disponível do inventariado (e sem prejuízo da ulterior produção da demais prova indicada), determino que se proceda à avaliação dos seguintes imóveis: Prédio urbano sito na ..., inscrito na matriz predial da ..., concelho de ..., distrito de ..., sob o artigo 4052 e descrito na ..., sob o artigo 2195, correspondente à fração C. Prédio sito na ..., inscrito na matriz predial urbana da ..., sob o artigo 15674 e descrito na ..., sob o artigo 16784. Prédio sito na ... ..., inscrito na matriz predial urbana da ..., sob o artigo 1370, descrito na ..., sob o artigo 178. Tal avaliação deverá ser reportada à data do óbito do inventariado, ou seja, a 23 de junho de 2020. A liquidação antecipada dos encargos com a avaliação será suportada pela requerente uma vez que foi a mesma quem requereu a avaliação e que o fez para a fundamentar o alegado na oposição à relação de bens.” Inconformada, a cabeça-de-casal interpôs recurso deste despacho, cuja motivação sintetizou nas seguintes conclusões:4 “ 32. Vem o presente recurso interposto do despacho da Sra. Juiz Estagiária a quo, que nos autos à margem identificados, entendeu rejeitar a produção de prova, tendo por fim decidido proceder com a avaliação do imóvel, descrito em ponto 2 al b) da ATA de 19.06.2024, sem antes apurar se o mesmo faz parte ou não do acervo hereditário do De Cujus. 33. Ou seja, entendeu a meritíssima juíza estagiária a quo e sem qualquer produção de prova, partindo do pressuposto que tal bem integra o acervo hereditário, sem nenhum fundamento. 34. O imóvel é fruto de uma doação feita pela avó de BB, tendo o seu pai (De Cujus) assinado, apenas porque era seu representante legal, visto que BB, era menor na época 4 anos de idade) e como a avó materna não era proprietária do referido terreno descrito em ponto 2 al b) da respetiva ATA de 19.06.2024, fê-lo por meio de escritura pública de compra e venda diretamente para o seu único neto da altura, representado por seu pai, aqui De Cujus. 35. BB, carecia e ainda carece de representação legal, pois o mesmo sofre de incapacidade psiquiátrica (esquizofrenia) conforme documentos juntos). 36. Com a decisão recorrida, foram violados os pressupostos definidos nos artigos 1092º, n.º 1, al) b) e n.º 2 e 1093º do CPC. 37. Há justificação a remessa dos interessados para os meios comuns quando, estando em causa a complexidade da matéria de facto, a tramitação do processo de inventário se revele inadequada, por implicar uma efetiva diminuição das normais garantias que estão asseguradas às partes no processo declarativo comum. 38. Em face da análise da questão decidenda, respetiva natureza e complexidade da respetiva prova, pode desde logo o Juiz formular um juízo sobre a possibilidade de ela poder ser dirimida no processo de inventário e, na negativa, maxime por ela carecer de alta indagação, deve de imediato o julgador remeter os interessados para os meios ordinários, abstendo-se de decidir. Única forma de não causar despesas às partes, de apreciar o andamento do processo de inventário e de não praticar actos inúteis que a lei de processo proíbe. (Lopes Cardoso, ibidem, pág. 540, e Ac. RG, de 6.11.2012). 39. Não temos dúvidas em afirmar de que foi a pensar nas partes e na redução das suas garantias, que a lei, excecionalmente, previu a remessa das mesmas para os meios comuns, para aí verem debatidas, amplamente, e com recurso a todos os meios de prova legalmente admissíveis, as suas pretensões (Ac. STJ de 13.10.2009 – Revista n.º 1038-B/1993. S1 – 1ª Secção), ainda que com o sacrifício que essa remessa lhe possa acarretar. 40. Escreveu o Ac. o Tribunal da Relação do Porto, de 15.12.2021: “Requerendo a questão mais aprofundada instrução, averiguação e análise, que não pôde ser objeto suficiente indagação incidental no processo de inventário, deve o juiz remeter os interessados para os meios comuns, que oferecerem garantias processuais acrescidas, permitindo-se às partes, de modo mais ativo e eficaz influenciar a decisão – quer ao nível da alegação fáctica e contradição, quer ao nível das provas quer ao enquadramento jurídico – nos moldes consagrados para as ações declarativas comuns, não balizadas pelos termos simplificados do incidente, e, assim, ser alcançada uma solução mais justa, por fruto da comparticipação colaborante de todos os interessados. Embora uma decisão para ser justa tenha de ser empreendida com celeridade, nunca os interesses de celeridade se podem impor, de modo absoluto, à verdade material, sempre desejável, mesmo necessária e a buscar, para alcançar a justiça do caso concreto”. 41. "(…)No modelo ora instituído, o processo de inventário para fazer cessar a comunhão hereditária, comporta as seguintes fases: - Uma fase dos articulados na qual as partes, para além de requererem instauração do processo, têm de suscitar e discutir todas as questões que condicionam a partilha, alegando e sustentando quem são os interessados e respectivas quotas ideais e qual o acervo patrimonial, activo e passivo, que constitui objecto da sucessão. Esta fase abrange a subfase inicial (arts. 1097º a 1002º) e a subfase da oposição (arts. 1104º a 1107º). No articulado de oposição devem os interessados impugnar concentradamente todas as questões que podem condicionar a partilha, nomeadamente, apresentar reclamação à relação de bens (vd. art.º 1104º do CPC). Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 11.01.2024 42. Facto esse que a aqui recorrente impugnou, conforme seu requerimento junto aos autos a 10.12.2021, com a refª 31087449, com documentos em anexo. 43. "(…)A come de saneamento, na qual o juiz, após a realização das diligências necessárias – entre as quais se inclui a possibilidade de realizar uma audiência prévia – deve decidir, em princípio, todas as questões ou matérias litigiosas que condicionam a partilha e a definição do património a partilhar e também proferir despacho sobre a forma da partilha.(…)" Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 11.01.2024. 44. Ora, a meritíssima Juiz estagiária a quo, ao proferir o despacho em sede de audiência prévia o qual agora se recorre, ao requerer a avaliação do imóvel em causa o qual foi reclamado pela cabeça de casal como não pertencendo ao acervo hereditário conforme e supra se expos, é já partir do princípio, no entendimento do tribunal, que o mesmo integra a eventual quota disponível, o que não se pode aceitar. 45. Ou seja, a Exma. Sra. Dra. Juiz a quo, partiu do princípio e decidiu imediatamente de que o bem faz parte da relação de bens deixada por morte do De Cujus. 46. Quanto ao bem indicado no artigo 12º do requerimento inicial apresentado pela requerente, que o De Cujus doou a sua neta, DD, com reserva de usufruto simultâneo a favor dos avós, o De Cujus e a sua mulher, aqui cabeça de casal, deve seguir os termos previstos no artigo 1118º do CPC. 47. Pois havendo um processo de inventário, é aí que caberá proceder-se à averiguação sobre se a liberalidade é inoficiosa bem como à respetiva redução. (Dizem-se inoficiosas as liberalidades, entre vivos ou por morte, que ofendam a legítima (quota indisponível) dos herdeiros legitimários. A legítima consiste na “porção de bens que o testador não pode dispor, por ser legalmente destinada aos herdeiros legitimários”). 48. Portanto, decisão sobre a inoficiosidade destinada a aferir da existência ou inexistência da mesma e a determinar eventual restituição dos bens para a herança aqui no caso concreto, entenda-se a cabeça de casal, que teria de ser exercitado pela via de incidente no processo de inventário, seguindo-se os termos previstos no artigo 1118º do CPC. 49. É na fase da partilha onde ocorrerá a conferência de interessados na qual se devem realizar todas as diligências que culminam na realização da partilha.” Rematou as suas conclusões nos seguintes termos: “Termos em que se requer a Vª Ex.ªs, D e A, a que o despacho proferido pela M.ª Juiz estagiária a quo: • Deva ser revogado por V. Exas e substituído por outro, que admita o esclarecimento para apurar, no âmbito dos meios comuns, se o imóvel indicado pela requerente no seu artigo 7º, do requerimento inicial, ou seja, o imóvel adquirido por escritura de compra e venda a 20 de março de 1972, faz parte ou não do acervo hereditário do De Cujus, bem como, Quanto ao bem indicado no artigo 12º do requerimento inicial apresentado pela requerente, que o De Cujus doou a sua neta, DD, com reserva de usufruto simultâneo a favor dos avós, o De Cujus e a sua mulher, aqui cabeça de casal, • Deva seguir os termos previstos no artigo 1118º do CPC.” A apelada apresentou resposta à alegação da apelante, alinhando as seguintes conclusões: 1. Trazem as Requeridas e ora Apelantes o presente recurso da decisão da M.ª Juiz “a quo” no sentido de que a averiguação de se o imóvel que constitui a verba n.º 7 (adquirido por escritura de compra e venda de 20/03/1972) faz parte ou não do acervo hereditário e bem assim como se o prédio que constitui a verba 12 (que constitui uma doação do de cujus e sua mulher à neta DD) o é efectivamente. 2. Entretanto, com as suas alegações as Apelantes juntam documentos. Ora, dispõe o n.º1 do art.º 651º do CPC que: “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1. ª instância”. 3. Sucede que, no caso dos autos as Apelantes nada dizem sobre a oportunidade da junção dos aludidos documentos, o que naturalmente conduz à sua rejeição. 4. Com efeito, para que os mesmos fossem aceites, era mister que a razão da sua apresentação constasse já das alegações, apresentadas como dispõe o aludido n.º 1 do art.º 425º do CPC, razão pela qual se entende que V. Exa. deverá mandar previamente, a apreciação das alegações de recurso, desentranhar os documentos e devolvê-los à parte contrária. 5. Abordada esta questão prévia importa analisar a questão de fundo. 6. Como já se disse em sede de audiência prévia, a doação que consta dos autos para justificar a transmissão da verba n.º12, constitui, uma doação feita por conta da quota disponível, razão pela qual neste campo nenhuma dúvida assiste ao Tribunal para classificar tal acto, restando apenas saber se, em razão do valor do resto dos bens a mesma é inoficiosa ou não! Por isso bem, andou a M.ª Juíza “a quo” ao determinar a avaliação de todos os bens. 7. E porque se afigura que uma criança de 4 anos de idade, não tem capacidade económica, que lhe permita efectuar uma compra do terreno pelo valor que consta da escritura, e, menos ainda, de sobre ele construir, como as próprias Apelantes confessam, é absolutamente indispensável averiguar o valor desse bem, a fim de também, nesse caso, se aferir se, também aqui, ocorre inoficiosidade. 8. E razão teve, pois, a M.ª Juíza “a quo” para determinar a realização da avaliação em causa, porquanto manifesto é que se trata de verdadeiras doações! 9. Se a averiguação desse valor deve/pode ser feita no próprio Inventário ou nos meios comuns é outra ordem de questão. 10. Primando-se pela economia processual a M.ª Juíza entendeu que tal matéria poderia/deveria ser apreciada em sede de Inventário. Pretendem as Apelantes que o seja em processo comum para onde as partes deveriam ser remetidas. 11. Afigura-se-nos que essa é uma decisão do Juiz “em seu prudente arbítrio” e que não compete às partes impôr ao Juiz a remessa para os meios comuns. 12. Consequentemente, não se nos afigura que, nesta fase, a apreciação deste assunto deva ser remetida para os meios comuns, sendo certo que em qualquer momento do processo o Juiz o pode fazer pelo que se nos afigura que a pretensão das Apelantes deve improceder.” Admitido o recurso, e remetidos os autos a este tribunal, o relator proferiu despacho indeferindo a junção dos documentos juntos pelos apelantes com a sua alegação. 2. Objeto do recurso Conforme resulta das disposições conjugadas dos arts. 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do CPC, é pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso, seja quanto à pretensão dos recorrentes, seja quanto às questões de facto e de Direito que colocam.5 Esta limitação dos poderes de cognição do Tribunal da Relação não se verifica em sede de qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cfr. art.º 5º n.º 3 do CPC). Não obstante, excetuadas as questões de conhecimento oficioso, não pode este Tribunal conhecer de questões que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas6. Assim sendo, a única questão a equacionar e decidir reside em determinar se os dois imóveis cuja omissão foi invocada pela apelada devem ser avaliados. 3. Fundamentação 3.1. Os factos Os factos a considerar são os que constam do relatório que antecede, considerando ainda que a tramitação do processo de inventário em apreço conheceu os seguintes desenvolvimentos: 1. Em 10-12-2021 a cabeça-de-casal AA apresentou requerimento7, no qual incluiu uma relação de bens com o seguinte teor: “Verba 1 Conta Bancária titulada pela aqui Cabeça de Casal, por CC, e pelo De Cujos, com o nº ...-1, junto do Banco Montepio Geral, com a quantia à data do falecimento, de 2.624,02€, cfr. Doc. 1. Sendo 1/3 desta quantia total que deve integrar o acervo patrimonial hereditário por morte do De Cujus pelo que, o montante a partilhar será de 874,67€ (oitocentos e setenta e quatro euros e sessenta e sete cêntimos). Verba 2 Conta Bancária titulada pela aqui Cabeça de Casal, por CC, e pelo De Cujos, com o nº ...-8, junto do Banco Montepio Geral, com a quantia à data do falecimento, de 1.200,13€, cfr. Doc. 1. Sendo 1/3 desta quantia total que deve integrar o acervo patrimonial hereditário por morte do De Cujus pelo que, o montante a partilhar será de 400,04€ (quatrocentos euros e quatro cêntimos). Verba 3 Conta Bancária titulada pela aqui Cabeça de Casal, por CC, por BB e pelo De Cujos, com o nº ..., junto do Banco Santander, com a quantia à data do falecimento, de 236,55€, cfr. Doc. 1. Sendo 1/4 desta quantia total que deve integrar o acervo patrimonial hereditário por morte do De Cujus pelo que, o montante a partilhar será de 59,14€ (cinquenta e nove euros e catorze cêntimos). Verba 4 Conta Bancária Plano Poupança titulada pela aqui Cabeça de Casal, por CC, por BB e pelo De Cujos, com o nº ..., junto do Banco Santander, com a quantia à data do falecimento, de 5.000,53€, cfr. Doc. 1. Sendo 1/4 desta quantia total que deve integrar o acervo patrimonial hereditário por morte do De Cujus pelo que, o montante a partilhar será de 1.250,13€ (mil duzentos e cinquenta euros e treze cêntimos). Verba 5 Conta Bancária Plano Poupança titulada pela aqui Cabeça de Casal, por CC, por BB e pelo De Cujos, com o nº ..., junto do Banco Santander, com a quantia à data do falecimento, de 14.100,42€, cfr. Doc. 1. Sendo 1/4 desta quantia total que deve integrar o acervo patrimonial hereditário por morte do De Cujus pelo que, o montante a partilhar será de 3.525,11€ (três mil quinhentos e vinte e cinco euros e onze cêntimos). Verba 6 Prédio Rústico sito na ..., inscrito na respetiva matriz predial da ..., sob o art.º 23 da Secção T, com o valor patrimonial atual de 120,92 € (cento e vinte euros e noventa e dois cêntimos) cfr. Doc. 2. Sendo a quota-parte transmitida de 1/4 pelo que, o montante a partilhar será de 30,23€ (trinta euros e vinte e três cêntimos). No entanto, quanto a esta verba correspondente ao prédio rústico sabe a cabeça de casal que, o mesmo integrava uma parcela de um terreno que o De Cujus havia vendido. No entanto, não sabia por que motivo o NIF do De Cujus continuava associado a tal prédio. Verba 7 Prédio Urbano sito na ..., inscrito na respetiva matriz predial da ..., sob o art.º 4052, correspondente à fração C, com o valor patrimonial de 63.559,30€ (sessenta e três mil quinhentos e cinquenta e nove euros e trinta cêntimos) cfr. Doc. 3. Sendo a quota-parte transmitida de 1/2 pelo que, o montante a partilhar será de 31.779,65€ (trinta e um mil euros setecentos e setenta e nove euros e sessenta e cinco cêntimos). Total de ativo: 37.918,97€ (trinta e sete mil euros novecentos e dezoito euros e noventa e sete cêntimos). PASSIVO: Verba 8 Despesa de funeral na quantia total de 2.850,00€ (dois mil oitocentos e cinquenta euros), cfr. Doc. 4. A este montante é deduzida a quantia de 1.316,43€ (mil trezentos e dezasseis euros e quarenta e três cêntimos) liquidada pela Segurança Social a título de subsídio de funeral, pelo que, a herança responde por 1.533,86€ (mil quinhentos e trinta e três euros e oitenta e seis euros). Verba 9 Despesa com a escritura pública de habilitação de herdeiros, no montante total de 270,00€ (duzentos e setenta euros), cfr. Doc. 5. Verba 10 Despesa com a Caixa Montepio Geral que totalizam o montante de 92,50€ (noventa e dois euros e cinquenta cêntimos), cfr. Doc. 6. Verba 11 Despesa com o Banco Santander Totta no montante de 92,50€ (noventa e dois euros e cinquenta cêntimos), cfr. Doc. 6. (Protesta juntar comprovativos de verba 12 que consubstancia os valores liquidados a título de Imposto Municipal de Imóveis) Total do passivo: 1.988,86€ (mil novecentos e oitenta e oito euros e oitenta e seis cêntimos).”8 2. Em 14-01-2022 a requerente EE apresentou reclamação à relação de bens referida em 1., com o seguinte teor:9 “1º No seu requerimento de 10/12/2021 a cabeça de casal identifica os herdeiros, apresenta a relação de bens, impugna a factualidade apresentada pela Requerente no seu requerimento inicial e requer, a final, diligências de prova a este Tribunal. Vejamos: 2º Da relação de bens apresentada e nomeadamente das suas verbas n.º 1, 2, 3, 4 e 5, constam contas bancárias tituladas apenas pelo "de cujus” pela cabeça de casal e ainda pela filha de ambos CC, contas identificadas nas verbas 1 e 2 sendo que nas contas identificadas nas verbas 3, 4 e 5, constam além do “de cujus” e da cabeça de casal, também os filhos do casal CC e BB, sem que em nenhuma dessas contas figure a ora Requerente e também filha do “de cujus” EE! 3º Isso faz com que a parte a receber pela aqui Requerente seja bem mais pequena do que a que recebe cada um dos seus irmãos, porquanto, estes não se limitam a quinhoar na quota-parte do “de cujus” mas antes quinhoam na quota-parte que, alegadamente, já lhes pertencia! 4º Sucede, porém, que nas contas de titularidade comum há que se averiguar o que cada um desses titulares aportou a essas contas para que a divisão se faça de um modo justo e equitativo. 5º Ora, o que sucede é que só abstratamente existe uma cotitularidade em igualdade de partes nas contas comuns, já que a presunção de igualdade nas quotas de cada um, pode ser ilidida! 6º E é o que a ora Requerente pretende fazer, porquanto sendo também filha do “de cujus”, nunca foi cotitular com ele de qualquer conta. 7º Mas ainda que o fosse – que seguramente não foi – o que é necessário é saber quanto é que cada um dos cotitulares, filhos do falecido aportaram em valores e em que data a essas mencionadas contas, já que não basta para o efeito “inseri-los” como, a titulo de exemplo, refere a cabeça de casal no ponto 10 do seu articulado. 8º E quando é que as mesmas contas foram constituídas, factos que a cabeça de casal não esclarece, mas tem de esclarecer! 9º Impugna assim a Requerente, pelas razões apontadas os valores que constam como acervo a partilhar entre os herdeiros de cada um dos montantes, constantes das contas identificadas nas verbas n.º 1, 2, 3, 4 e 5, o que deverá ser averiguado nos termos do que é requerido a final. 10º Quanto à verba n.º6 (o terreno rústico nela identificado) compete à cabeça de casal nos termos da conjugação dos art.º 2019º e 2087º e neste particular o n.º1 do art.º 2088º todos do Código Civil, averiguar da sua situação actual, porquanto não há nos autos evidência de que o mesmo tenha sido vendido e tal facto só pode ser comprovado pelo título próprio respectivo, como se sabe. 11º Quanto ao andar sito na ... que constitui a verba n.º 7, não tem presentemente o valor indicado pelo que, oportunamente, se requererá avaliação por perito a indicar por este Tribunal. Entretanto, 12º A cabeça de casal omite na relação de bens as doações feitas em vida do “de cujus” quer ao filho comum de ambos BB, quer à neta de ambos DD, porquanto, tais doações – porque de verdadeiras doações se trata – não foram realizadas nem por conta da quota disponível, nem com dispensa de colação, referência que delas não consta! Aliás, 13º Quanto à doação do lote de terreno (que o “de cujus” em escritura pública para a sua aquisição coloca em nome do menor de 4 anos, seu filho) não tem o processo qualquer evidência de a mesma atribuição ter sido feita por alegada “doação” da avó materna (“porque sempre foi funcionária pública”!). 14º Na verdade, a referida pessoa nem sequer é referida na escritura em causa como tendo feito essa doação. 15º Pelo que se terá de interpretar o documento – a dita escritura de compra e venda – através do que dele expressamente consta! Aliás, 16º O próprio pagamento da Sisa devida foi feito pelo “de cujus”. 17º E a construção nesse terreno de um prédio de rendimento – vide doc.1 – e não de uma casa como ingenuamente pretende classificá-la a cabeça de casal com materiais e mão-de-obra suportada pelo “de cujus” e não por “muitos familiares”, relativamente ao filho BB, constitui uma doação. 18º Devendo extrair-se do exposto que o valor actual do imóvel, na data de abertura de sucessão constitui uma doação do Pai ao filho, do prédio em causa, cuja avaliação igualmente se vai requerer a este Tribunal. 19º Também quanto à doação da loja identificada nos autos à neta DD, a mesma deve ser relacionada nestes autos porquanto não foi, como dela consta, feita nem por conta da quota disponível, nem com dispensa de colação, sendo certo que também quanto a ela haverá de ser feita a respectiva avaliação na actualidade. 20º Como já se disse, o património do “de cujus” era vastíssimo e tanto assim é que a própria cabeça de casal reconhece no ponto 7 do articulado da relação de bens que o mesmo esteve sem trabalhar durante 10 anos, subsistindo com o que havia guardado anteriormente (sic), facto que a Requerente desconhecia, bem como que o seu Pai tinha, alegadamente, o vício do jogo. 21º Sabe, porém, a Requerente que o seu Pai vendeu uma excelente moradia que tinha na zona de lazer da ..., alegadamente para pagar dívidas, como lhe confidenciou, sua irmã CC. 22º Ora, o facto, é que apesar de seu Pai nada lhe ter referido sobre estes factos, o certo é que a moradia em causa existiu, como lhe informou uma sua tia, irmã do Pai, GG, e hoje internada num lar, infelizmente com Alzheimer! 23º Salvo o que revelaria seguramente coisas muito importantes para a descoberta da verdade, quanto a património desviado e dissipado!!! 24º O certo é que a tal moradia foi vendida sem que da importância da sua venda, se saiba nem o montante nem o seu destino, o que se requer seja esclarecido pela cabeça de casal, nestes autos. 25º Aliás, é a própria cabeça de casal que no ponto 18 do articulado da relação de bens expressamente confessa que o “de cujus” “e foi adquirindo tantos outros prédios, em seu nome e da cabeça de casal”. 26º Prédios que, seguramente, se desfez antes da morte por ele ou através da sua representante sua filha CC, que tinha procuração para esse efeito. 27º Refere ainda a cabeça de casal que é falso que o Requerido BB tenha vindo a receber rendas daquele imóvel em ... na ..., quando o certo é que estando o imóvel registado na ... de ... e inscrito em nome dele, no ... a ele seguramente forem imputados, como se vai apurar. 28º Embora, não constituindo matéria que interesse à apreciação do fundo da questão neste processo – a partilha da herança do “de cujus” – sempre se dirá, repondo a verdade que: a. A Requerente EE não estava de relações cortadas com seu Pai, porquanto sempre que podia convivia com ele; b. Simplesmente desde 2017, última conversa que tiveram, nunca mais falaram quer em 2018, 2019 e 2020, já que, apesar dos telefonemas feitos para a sua residência na ... em ... a ora cabeça de casal informava sempre que não estava! c. Aliás, no dia 13/05/2020 no dia de aniversário do “de cujus” a Requerente, tendo ligado para lhe dar os parabéns, foi atendida pela cabeça de casal que informou que o mesmo estava a dormir (ocultando-lhe a situação grave de doença do Pai) e que guardaria o numero de telefone e lho daria, sendo certo que a Requerente nunca recebeu qualquer chamada do Pai, a não ser uma chamada da filha CC no dia 23/06/2020 a informar que o Pai tinha falecido! d. É falso que os interesses da Requerente (que, aliás, a cabeça de casal não explicita quais) tenham afastado a Requerente de seu Pai, e que isso o levasse a não atender as chamadas da Requerente; e. Esclarece-se que a contradição que a cabeça de casal diz verificar no ponto n.º36 do seu requerimento com a relação de bens não tem razão de ser já que essa promessa constante do ponto n.º17 nunca foi, como agora se vê, minimamente concretizada, o que só demonstra que a promessa do Pai em ser considerada como qualquer outra filha foi frustrada com a atribuição de um prédio ao irmão BB e à própria neta DD! 29º Verifica-se assim por tudo o mais que vem de ser exposto que a Requerente tem todas as razões para requerer o presente Inventário, requerendo a final a realização dos meios de prova a fim de se apurar toda a verdade material. Termos em que a presente reclamação deve ser admitida e a relação de bens aditada dos bens anteriormente indicados a fim de serem partilhados de um modo justo e equitativo. (…)” 3. Em 10-02-2022 a cabeça-de-casal apresentou requerimento no qual consignou o que segue10: “AA, na qualidade de cabeça de casal, tendo sido notificada da reclamação à relação de bens a 14 de janeiro de 2022, apresentada pela requerente EE, vem nos termos do disposto do art.º 1105.º do CPC, apresentar a competente resposta, O que faz nos seguintes termos e fundamentos: 1. Nos pontos 1º a 9º da reclamação, veio a requerente impugnar os montantes constantes das verbas 1 a 5 da relação de bens e que consubstanciam valores depositados em contas bancárias registadas em nome do De Cujus e outros. 2. Ora, nos termos dos artigos 512.º e 516.º, ambos do CC, há uma presunção de igualdade de partes nas contas comuns. 3. Presunção que beneficia a ora cabeça-de-casal, bem como os outros filhos do De Cujus, BB e CC. 4. Nesta senda, e nos termos do artigo 350.º do CC, à requerente compete a prova de que, a propriedade das quantias monetárias constantes das referidas contas bancárias não corresponde de forma equitativa a todos os titulares. 5. Devendo demonstrar que, os montantes ali depositados eram propriedade do De Cujus para que, a totalidade de tais quantias ingressem no acervo patrimonial a partilhar, como pretende a requerente. 6. Quanto ao terreno rústico alegado no ponto 10, irá ser requerida uma certidão do registo predial que se protesta juntar. 7. Veio a requerente novamente querer colocar no acervo patrimonial a partilhar nesta sede, o terreno registado em nome do irmão BB. 8. Querendo reverter o constante do documento de escritura pública pois, repare-se que, o De Cujus surge enquanto representante legal do seu filho, à data menor de idade. 9. Como poderia ter sido a ora cabeça-de-casal a estar presente e em representação do seu filho. 10. A escritura pública de compra e venda é clara, o De Cujus figura como representante legal e o terreno é vendido ao representado do segundo outorgante, De Cujus. 11. Pelo que aqui não há dúvidas de que tal bem não deve integrar o acervo patrimonial a partilhar. 12. Já quanto à doação da loja efetuada à neta do De Cujus, a mesma foi feita por conta da quota disponível, por ser essa a sua vontade. 13. Mas ainda que assim não se entenda, e que posteriormente venha a ser considerado um bem a partilhar, o valor a restituir à massa da herança não será com base numa avaliação atual, como pretende a requerente, mas com base na natureza e o valor que tinha à data da morte do inventariado (momento de abertura da sucessão), artigo 2109º nº 1 e 2 do CC. 14. Sendo que, a considerar tal bem na herança, apenas será 50% do valor que tinha à data da morte do inventariado, uma vez que, o bem doado era pertença da aqui cabeça-de-casal e do De Cujus. 15. Sendo o valor dos bens doados o que eles tiverem à data da abertura da sucessão, nele não se compreende a valorização económica resultante das benfeitorias feitas, entretanto. 16. É verdade que ao longo da sua vida, o De Cujus e a ora cabeça-de-casal conseguiram adquirir algum património. 17. Mas também é verdade que dispuseram de parte desse património livre e conscientemente, consoante as suas necessidades. 18. A requerente vem agora pretender justificação perante a cabeça-de-casal, de bens que, o seu pai dispôs livremente ao longo da sua vida. 19. A requerente tem de se consciencializar de que, em determinada altura da sua vida, o De Cujus viu-se obrigado a alienar bens para poder subsistir e fazer face às despesas com o seu problema de saúde. 20. Sendo livre para dispor em vida, de todo o património, caso necessitasse. 21. Mais, a requerente tem vindo constantemente, insinuar nos presentes autos que, quer a cabeça de casal, quer a sua irmã CC ocultaram bens por forma a prejudicar a sua quota respetiva na herança. 22. Sucede que, tais afirmações consubstanciam insinuações gravíssimas que cabe a si provar nos presentes autos. 23. Não basta alegar e não provar aquilo que afirma. 24. Por fim cumpre esclarecer que, a cabeça-de-casal opõe-se a que o tribunal oficie as entidades bancárias, a fim de serem dissipadas as dúvidas quanto às contas bancárias constantes das verbas 1 a 5 da relação de bens, uma vez que tomou a liberdade de solicitar junto das mesmas a respectiva informação por via documental, protestando juntar a mesma. 25. Já quanto ao ofício requerido a este Tribunal junto do Serviço de Finanças de Almada, deve o mesmo ser indeferido uma vez que respeita a um bem imóvel que não integra o acervo patrimonial a partilhar. Nestes termos e nos mais de direito, deve a reclamação apresentada pela requerente contra a relação de bens indicada pela ora cabeça-de-casal ser indeferida, pelos fundamentos supra expostos.” 4. Em 23-05-2024 o Tribunal a quo proferiu despacho com o seguinte teor:11 “(…) Afigurando-se possível a obtenção de acordo sobre a partilha e sendo conveniente ouvir as partes relativamente às questões controvertidas, para a realização da audiência prévia prevista no art.º 1109.º do Cód. Proc. Civil, designo o dia 19 de Junho de 2024, pelas 15h30m, neste Tribunal. A audiência terá como objectivo a obtenção de acordo sobre a partilha e ouvir as partes quanto às questões controvertidas (reclamação à relação de bens). Notifique nos termos do art.º 1110.º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil.” 3.2. Os factos e o direito 3.2.1. Do mérito da decisão apelada Conforme resulta do relatório e do elenco de factos provados, notificada da relação de bens apresentada pela cabeça de casal, a requerente apresentou reclamação, na qual, entre outros fundamentos, invocou a omissão do relacionamento de dois imóveis doados pelo falecido, a saber, um lote de terreno, no qual foi construído um edifício adquirido pelo falecido em nome do se filho e ora interessado BB (o que em seu entender consubstancia uma doação), e de uma loja, doada à sua neta (arts. 12º a 19º do mencionado articulado). Na sequência de tal reclamação o Tribunal a quo decidiu promover a realização da audiência prévia a que alude o art.º 1109º do CPC. Esta disposição legal tem o seguinte teor: “Artigo 1109.º Audiência prévia 1 - O juiz pode convocar uma audiência prévia se o considerar conveniente, nomeadamente por se lhe afigurar possível a obtenção de acordo sobre a partilha ou acerca de alguma ou algumas das questões controvertidas, ou quando entenda útil ouvir pessoalmente os interessados sobre alguma questão. 2 - Na convocatória, o juiz indica o objetivo da diligência e as matérias a tratar. 3 - Na falta de acordo dos interessados sobre as questões controvertidas, o juiz procede à realização das diligências instrutórias necessárias para decidir as matérias que tenham sido objeto de oposição ou de impugnação.” Como decorre do nº 2 do preceito supracitado, a audiência prévia pode destinar-se a discutir questões controvertidas, e que deverão ser subsequentemente dirimidas no despacho de saneamento do processo, ou seja, como refere o art.º 1110º, nº 1, al. a) do mesmo código, as “questões suscetíveis de influir na partilha e na determinação dos bens a partilhar.” No caso em apreço, o despacho determinativo da realização da audiência prévia delimitou o objeto desta diligência nos seguintes termos: “A audiência terá como objectivo a obtenção de acordo sobre a partilha e ouvir as partes quanto às questões controvertidas (reclamação à relação de bens)”. Na referida audiência, o Tribunal a quo determinou a avaliação de três imóveis, a saber, o imóvel que constitui a verba nº 7 do ativo (al. a) do despacho apelado), e dois imóveis não relacionados, cuja omissão foi assinalada na reclamação apresentada pela apelada (als. b) e c) do mesmo despacho). Os apelantes sustentam que a avaliação dos dois imóveis não relacionados não deve ter lugar, invocando para tanto razões distintas. Com efeito: • relativamente ao imóvel a que se reporta a al. b) do nº 2 do despacho apelado, argumentam que não deve ser avaliado, porque se discute se o mesmo integra ou não o acervo de bens a partilhar, pelo que a decisão de o avaliar é prematura; antes devem as partes ser remetidas para os meios comuns; • no tocante ao imóvel a que se reporta a al. c) do nº 2 do mesmo despacho, sustenta que o contexto adequado para a sua determinação é o incidente a que se refere o art.º 1118º do CPC. No que diz respeito ao imóvel que se reporta a al. b), sito na ... não cabe a este Tribunal pronunciar-se sobre a remessa para os meios comuns porquanto o Tribunal a quo ainda não se pronunciou sobre a questão de saber se a aquisição do mesmo e subsequente construção de um edifício ali implantado consubstancia uma doação feita pelo de cujos a favor do seu filho e ora interessado BB, nem tinha de o fazer, dado que, como adiante exporemos, o momento próprio para tal é o despacho de saneamento do processo. É, pois em tal despacho que o Tribunal a quo deve determinar se os elementos constantes dos autos são ou não suficientes para se pronunciar sobre tal questão, ou se, pelo contrário, se impõe a suspensão da instância e a remessa das partes para os meios comuns – art.º 1093º, nº 1, do CPC. Donde, não cabe ao Tribunal da Relação, no âmbito do presente recurso, pronunciar-se sobre a questão da remessa para os meios comuns. Por outro lado, e no tocante ao imóvel a que se reporta a al. c) do despacho apelado, isto é, a loja correspondente à fração AF do imóvel sito na Av. D. Nuno Álvares Pereira, Lote 6, ..., sustentam os apelantes que a sede própria para apreciar a invocada inoficiosidade da doação do mesmo à interessada DD deve ser o incidente a que se reporta o art.º 1118º do CPC. Vejamos então. Estabelece o art.º 2168º, nº 1 do CC que se dizem “inoficiosas as liberalidades, entre vivos ou por morte, que ofendam a legítima dos herdeiros legitimário”. No caso vertente a liberalidade em questão consiste numa doação feita pelo de cuius a favor da sua neta, pelo que sendo os herdeiros a sua cônjuge e filhos, aquela doação será inoficiosa se o seu valor exceder o da quota disponível.12 A determinação do valor do bem doado é, por isso essencial para se aferir se a doação é ou não inoficiosa. Por outro lado, o bem doado é uma fração autónoma de um imóvel, pelo que é de considerar que tem natureza indivisível. Tal releva porquanto nos termos do disposto no art.º 2174º, nº 2 do CC se a importância da redução exceder metade do valor do bem doado este deve ser integrar o acervo de bens a partilhar, sendo o donatário compensado em dinheiro, ao passo que na hipótese inversa deve o donatário pagar em dinheiro a quantia correspondente à redução. Assim sendo, e considerando a relação de bens, na primeira hipótese, o imóvel doado deve ser relacionado no ativo, inscrevendo-se um crédito a favor do donatário no passivo; ao passo que na segunda hipótese se inscreve no ativo um crédito da herança sobre o donatário.13 No plano processual, a redução de doações inoficiosas processa-se através de um incidente previsto e regulado no art.º 1118º do CPC, cuja redação é a seguinte: “Artigo 1118.º Requerimento de redução de legados ou doações inoficiosas 1 - Qualquer herdeiro legitimário pode requerer, no confronto do donatário ou legatário visado, até à abertura das licitações, a redução das doações ou legados que considere viciadas por inoficiosidade. 2 - No requerimento apresentado, o interessado fundamenta a sua pretensão e especifica os valores, quer dos bens da herança, quer dos doados ou legados, que justificam a redução pretendida e, de seguida, são ouvidos, quer os restantes herdeiros legitimários, quer o donatário ou legatário requerido. 3 - Para apreciação do incidente, pode proceder-se, oficiosamente ou a requerimento de qualquer das partes, à avaliação dos bens da herança e dos bens doados ou legados, se a mesma já não tiver sido realizada no processo. 4 - A decisão incide sobre a existência ou inexistência de inoficiosidade e sobre a restituição dos bens, no todo ou em parte, ao património hereditário.” Como decorre do preceito supratranscrito, o incidente em questão pode ser deduzido até à abertura das licitações, o que significa que nada obsta a que a questão da redução da inoficiosidade não possa ser suscitada aquando da reclamação que incide sobre a relação de bens. Por outro lado, e apesar de a requerente não ter invocado expressamente o disposto nesta disposição legal, é inequívoco que pretende a redução das inoficiosidades que invocou14, nada obstando, por isso, a que o Tribunal a quo enquadre tal pretensão no meio processual adequado (art.º 193º, nº 3 do CPC). Daqui resulta que o incidente de redução de inoficiosidades pode ser apreciado e decidido na fase de saneamento do processo. Sendo a avaliação dos imóveis em questão um meio de prova relevante para a decisão do referido incidente, (vd. nº 3 do preceito supracitado), não vemos qualquer razão que impeça a sua concretização no momento em que foi determinada. Termos em que se conclui pela total improcedência da presente apelação. 3.2.2. Das custas Nos termos do disposto no art.º 527º, nº 1 do CPC, “A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito.” A interpretação desta disposição legal, no contexto dos recursos, deve atender ao elemento sistemático da interpretação. Com efeito, o conceito de custas comporta um sentido amplo e um sentido restrito. No sentido amplo, tal conceito inclui a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte (cf. arts. 529º, nº1, do CPC e 3º, nº1, do RCP). Já em sentido restrito, as custas são sinónimo de taxa de justiça, sendo esta devida pelo impulso do processo, seja em que instância for (arts. 529º, nº 2 e 642º, do CPC e 1º, nº 1, e 6º, nºs 2, 5 e 6 do RCP). O pagamento da taxa de justiça não se correlaciona com o decaimento da parte, mas sim com o impulso do processo (vd. arts. 529º, nº 2, e 530º, nº 1, do CPC). Por isso é devido quer na 1ª instância, quer na Relação, quer no STJ. Assim sendo, a condenação em custas a que se reportam os arts. 527º, 607º, nº 6, e 663º, nº 2, do CPC, só respeita aos encargos, quando devidos (arts. 532º do CPC e 16º, 20º e 24º, nº 2, do RCP), e às custas de parte (arts. 533º do CPC e 25º e 26º do RCP). Tecidas estas considerações, resta aplicar o preceito supracitado. No caso dos autos, face à total improcedência da presente apelação, é inegável que os apelantes decaíram, devendo por isso suportar as custas do presente recurso (na modalidade de custas de parte). 4. Decisão Pelo exposto, acordam os juízes nesta 7ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar a presente apelação totalmente improcedente, confirmando integralmente a decisão recorrida. Custas pelos apelantes. Lisboa, 08 de abril de 2025 Diogo Ravara Cristina Silva Maximiano Ana Rodrigues da Silva _______________________________________________________ 1. Da responsabilidade do relator - art.º 663º nº 7 do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26-06, e adiante designado pela sigla “CPC”. 2. Neste acórdão utilizar-se-á a grafia decorrente do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, respeitando-se, no entanto, nas citações, a grafia do texto original. 3. Todos os acórdãos citados no presente aresto se acham publicados em http://www.dgsi.pt/ e/ou em https://jurisprudencia.csm.org.pt/. A versão eletrónica deste acórdão contém hiperligações para todos os arestos nele citados. 4. Refª 353273/44967168, de 10-03-2023. 5. Neste sentido cfr. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 5ª Ed., Almedina, 2018, pp. 114-117 6. Vd. Abrantes Geraldes, ob. cit., p. 119 7. Refª 31087449/ 40719817. 8. Refª 31087449/40719817. 9. Refª 31368466/40998673. 10. Refª 31641237/41285741. 11. Refª 405769381. 12. O mesmo se passa também no tocante ao imóvel sito na ..., em ... 13. Todas estas considerações são aplicáveis, mutatis mutandis, à inoficiosidade da alegada doação a favor do interessado BB, visto que também se afigura que o imóvel sito em ... tem natureza indivisível. A diferença residirá na medida da inoficiosidade, dado que neste caso o donatário é herdeiro legitimário. 14. Seja a relativa a este imóvel, seja aqueloutra que se refere ao imóvel sito em ... 15. Acórdão assinado digitalmente – cfr. certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página. |