Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | INÊS MOURA | ||
Descritores: | CONTRATO DE ARRENDAMENTO RURAL SUB-ARRENDAMENTO RESOLUÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 09/28/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
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Sumário: | 1. O contrato de subarrendamento rural é um negócio jurídico formal, estando a sua validade dependente da redução a escrito, nos termos exigidos pelos art.º 6.º e 7.º do Decreto Lei 294/2009 de 13 de Outubro - Regime do Arrendamento Rural, o que também se aplica às alterações ao contrato, de acordo com o art.º 6.º n.º 5 de tal diploma. 2. A regra do art.º 394.º n.º 1 C.Civil que não admite a prova testemunhal se tiver por objeto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou de documentos particulares, comporta restrições, designadamente quando há um começo de forma escrita ou quando as circunstâncias do caso tornem verosímil a existência da convenção. 3. Não obstante o art.º 466.º do CPC, referindo-se às declarações de parte, enquanto meio probatório, estabeleça no seu n.º 3 que “o tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão”, estas têm de ser ponderadas com todas as cautelas pelo tribunal, não podendo olvidar-se que as partes são diretamente interessadas no desfecho da ação e que por isso, não raras vezes, prestam declarações de forma não isenta e comprometida. 4. O abuso de direito na modalidade denominada venire contra factum proprium tem sempre como pressuposto a criação de uma situação objetiva de confiança – uma conduta de alguém que lhe irá ser vinculativa no futuro, apresentando-se o exercício do direito como contraditório em face da conduta anterior, frustrando as expectativas associadas a esse comportamento. 5. Não se afigura correto dizer que a A. ao ter permitido que a R. usasse a água do terreno, com recurso à bomba e ao furo do seu prédio, lhe tenha criado a firme convicção de que podia usar tais infraestruturas sem qualquer condicionamento ou limitação, atenta a existência de uma cláusula contratual que expressamente menciona a não inclusão de infraestruturas no contrato e dá à R. autorização para realizar aquelas de que necessite, não sendo razoável que a R. supusesse que a A. não iria rentabilizar o seu terreno com uma produção agrícola para a qual necessitaria de usar tais infraestruturas e quando até uns meses antes já lhe havia proposto uma reunião para falarem sobre a forma da utilização do furo. 6. A comunicação da A. no sentido de avisar a R. de que findos 90 dias sem que esta concretizasse uma solução deixaria de ter a possibilidade de usar a bomba artesiana, não é suscetível de só por si configurar um incumprimento do contrato de subarrendamento, na medida em que se tratou de uma comunicação sem concretização efetiva, na afirmação de uma mera intenção futura, que se apresenta sem relevância jurídica, já que não foi realizado qualquer corte no fornecimento da água como vinha sendo feito até aí. 7. Uma vez que a água do terreno e o uso da infraestrutura continuava e continuou a ser disponibilizada à R., não tem esta o direito a resolver o contrato, por não haver uma situação de mora suscetível de poder motivar uma interpelação admonitória do devedor ou uma falta de interesse na prestação que tem de ser apreciada objetivamente, na previsão da 1ª parte do n.º 1 do art.º 808.º do C.Civil. 8. A comunicação da R. à A. de que havia deslocalizado a produção, por considerar inexistirem as condições mínimas indispensáveis para a produção informando que “no final deste mês serão devolvidas todas as chaves associadas”, tendo no final de janeiro desocupado a parcela de terreno subarrendada e enviado à A. uma carta em que lhe comunicou ter resolvido o contrato, representa a vontade unilateral da R. em pôr fim ao contrato de subarrendamento o que deve ser equiparado à sua denuncia, admitida pelo art.º 19.º do Regime do Arrendamento Urbano. 9. A A. tem o direito a haver o pagamento das rendas que não foram pagas e relativas ao prazo do pré aviso não observado, acrescido da indemnização igual a 50% do que for devido nos termos do art.º 13.º do Decreto Lei 294/2009 que prevê tal indemnização no caso de mora do arrendatário, só excluída se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento das rendas, o que não foi o caso. 10. Não são devidos juros de mora sobre a data de vencimento de cada renda até integral pagamento, uma vez que o prejuízo resultante da mora no pagamento da renda já é ressarcido através da indemnização especial prevista no art.º 13.º n.º 1 do Decreto Lei 294/2009, o que sempre implicaria uma duplicação da indemnização pela mora. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório Vem a A. Doce Baga, Ld.ª instaurar a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra a Acini, Unipessoal, Ld.ª, pedindo que se declare que à R. não assistia o direito a proceder à resolução unilateral do contrato de subarrendamento rural celebrado com a A., condenando a R. a pagar-lhe: a quantia de € 14.798,90, acrescida de juros moratórios à taxa legal, desde a data de vencimento da obrigação de pagamento de cada uma das rendas até integral pagamento, que à data de entrada da ação ascendem a € 750,00; a quantia de € 7.399,45 de indemnização pela mora no pagamento de rendas; a quantia de € 2.500,00 por ter tido de limpar o terreno após a saída da R., acrescida de juros moratórios à taxa legal de 4 % ao ano, desde a citação até integral pagamento. Alega, em síntese, para fundamentar o seu pedido, que em 25.04.2014 celebrou com a R. um contrato de subarrendamento rural, mediante o qual lhe concedeu durante o período de seis anos e com início nessa data, a utilização de uma parcela de terreno para exploração agrícola e transformação de produto agrícola, mediante pagamento de uma contrapartida pecuniária anual de € 5.950,00 no primeiro ano e de € 6.400,00 nos subsequentes. A A. na vigência do contrato, em 23.11.2017 comunicou-lhe que iria passar a utilizar as infraestruturas de que a R. se servia gratuitamente, incluindo o furo e bomba, do que decorreu que a R. deslocalizou a produção instalada no terreno, o que lhe comunicou em 07.12.2017, tendo comunicado em 09.01.2018 a sua concretização e que as respetivas chaves seriam devolvidas no fim do mês, assim tendo resolvido o contrato por entender que a A. iria impedir o fornecimento de água, o que não se verificou, dado a R. utilizar aquelas infraestruturas por mera tolerância da A. não havendo razão para deslocalizar a produção, nem para resolver o contrato, porquanto as partes nele não ajustaram a utilização das infraestruturas destinadas ao fornecimento de água. Conclui que são devidas as rendas que se venceram desde janeiro de 2018 até 31.12.1019, no montante total de € 12.800,00, bem como é devido o valor necessário à limpeza do terreno pela qual a R. não providenciou, na quantia de € 2.500,00 que teve de suportar. Devidamente citada, a R. veio contestar, impugnando a matéria alegada e defendendo que as partes ajustaram a utilização da água através das infraestruturas para o efeito existentes no terreno, pois caso contrário à R. não seria viável a plantação e colheita de framboesas em estufa a que se dedicou, sendo ela quem pagava a energia elétrica necessária à captação de água, que sempre utilizou entre 25.04.2014 até 21.10.2017. Não sendo viável encontrar outra solução para o fornecimento de água nos 90 dias que a A. lhe concedeu para o efeito, não teve outra alternativa que não fosse a de deslocalizar a sua produção, atuando a A. em abuso de direito ao proibir injustificadamente a R. de utilizar a água que sempre usou na sua produção com a anuência daquela, tal como usou as instalações sanitárias mediante autorização verbal, sabendo a A. que a R. não tinha alternativa para fazer chegar água à sua produção no prazo concedido. Veio ainda a R. deduzir reconvenção, alegando que o incumprimento da A. determinou a obrigatoriedade de súbita deslocalização de toda a produção tendo sofrido perdas, incluindo com o material que não pôde reaproveitar, e o material e mão de obra utilizados na montagem de novas estufas, noutro terreno, previamente preparado, além da perda de subsídio do IFAP e PRODER, face à instalação da exploração em terreno com distinto apoio financeiro. Concluiu pela improcedência da ação, reconhecendo-se o seu direito a resolver o contrato de subarrendamento, e pela procedência do pedido reconvencional, condenando-se a A. a pagar-lhe o montante de € 40.623,08, acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos, até integral pagamento. A A. replicou, impugnando os fundamentos da reconvenção, invocando que não subarrendou o furo artesiano existente na parte do terreno, apenas permitiu a utilização da água nele recolhida temporariamente, em prazo não superior a seis meses, para a R. instalar um posto de transformação mais potente, para bombagem de maior volume de água, dado que a R. pretendia instalar na parcela subarrendada uma unidade de transformação de frutos vermelhos, que de tal carecia, o que não concretizou, tendo alternativas ao seu dispor. Conclui pela improcedência do pedido reconvencional, com a sua absolvição do mesmo. Teve lugar a realização da audiência prévia, na qual foi a reconvenção admitida, e foi proferido despacho saneador, julgando-se válidos os pressupostos processuais da instância, tendo-se procedido à delimitação do objeto do litígio e à fixação dos temas de prova. Realizou-se a audiência de julgamento com observância do formalismo legal. Foi proferida sentença que julgou improcedente a ação e procedente a reconvenção e em consequência absolveu a R. do pedido e condenou a A. reconvinda a pagar à R. a quantia de € 40.623,08 acrescida de juros de mora à taxa de 4%, desde a notificação da reconvenção e até pagamento. É com esta sentença que a A. não se conforma e dela vem interpor recurso, pedindo a sua revogação e substituição por outra que julgue procedente o seu pedido e improcedente o pedido reconvencional, apresentando para o efeito as seguintes conclusões que se reproduzem: 1. O presente recurso é interposto da douta sentença proferida nos autos, na parte em que foi desfavorável à ora Recorrente - improcedência do pedido e procedência da reconvenção. 2. O ónus da prova dos factos que serviram de fundamento à resolução contratual impendia sobre a Ré, por força do disposto no art. 343.º, n.º 1 e 342.º, n.º 1 do Cód. Civil e no art. 17.º, n.º 1 do Regime do Arrendamento Rural. 3. O Recorrente discorda da inclusão, no leque dos factos provados, do ponto 14 da factualidade provada, por entender que tal facto deveria ter sido dado como provado com a seguinte redacção: “Desde 25.04.2014, a ré sempre utilizou a água existente no terreno” - os meios de prova que impunham decisão diversa são o doc. n.º 2, junto com a p.i. as declarações prestadas pela legal representante da Autora – SA – na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 34:15 a 42:00, as declarações prestadas pela testemunha JP, proprietário do arrendado, na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 01:58:00 a 02:09:30, as declarações prestadas pela testemunha AF, na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 02:30:10 a 02:33:00 e as declarações prestadas pela gerente da Autora – AC – na sessão de 15/12/2022 da audiência final, no excerto de 00:11:08 a 00:15:50. 4. Por força do teor da cláusula quarta do contrato de subarrendamento, estava vedado ao Tribunal recorrido dar como provado um acordo verbal contemporâneo àquele contrato que não tivesse respaldo em documento escrito, atento o disposto no art. 364.º, n.º 1 do Cód. Civil. 5. Não constando dos autos, como não consta, qualquer prova documental que ateste o acordo no sentido de a Ré utilizar “a água existente no terreno, por ambas as partes nisso terem acordado e por estar excluído do contrato apenas o uso das infraestruturas existentes no terreno”, estava vedado ao Tribunal recorrido dar esse facto como provado, como o fez no ponto 14 dos factos provados. 6. O ponto 14 dos factos provados constituía um facto-índice invocado como fundamento para operar a resolução contratual, pelo que as regras do ónus da prova impunham à Ré o ónus probatório do mesmo. 7. Estando a posição da Autora sustentada em documento particular com valor probatório pleno (porque não impugnado – art. 376.º, n.º 1 do Cód. Civil) e nas suas próprias declarações, a mera prova por declarações de parte dos legais representantes da Ré poderia era inidónea a dar como provado o teor do ponto 14 dos factos provados. 8. E isso impõe a procedência do recurso, que expressamente se requer, com a consequente alteração da redacção do ponto 14 dos factos provados, que deverá passar a ser a seguinte: “Desde 25.04.2014, a ré sempre utilizou a água existente no terreno.” 9. No ponto 16 dos factos provados foi dado como provado que “A autora enviou a comunicação referida em 5. após a ré, em data não apurada de Setembro 2017, ter deixado de vender a sua produção de fruta à sociedade «Red Fields», da qual a gerente da autora, SA, é uma das sócias.” 10. Esse facto deveria ter sido complementado com a inclusão de um outro (que designará como ponto 16-A) dos factos provados, com a seguinte redacção: “Em 4 de Maio de 2017, ou seja, antes da a Ré ter deixando de vender a sua produção de fruta à sociedade «Red Fields», a Autora enviou à Ré mensagem de correio electrónico em que, entre o mais, referiu o seguinte: “Em breve irá existir nova cultura naquele espaço e teremos de fazer reunião para falar sobre a forma de utilização do furo existente.” 11. O meio de prova que impunha tal decisão é o doc. n.º 3, junto com a réplica (e-mail enviado pela Autora à Ré em 04/05/2017), que não foi impugnado pela Ré e que goza, por isso, de força probatória plena, atento o disposto no art. 376.º, n.º 1 do Cód. Civil. 12. Quanto à relevância desse facto, recorda-se que a Ré, na prova produzida, desenvolveu a tese de que o anúncio da Autora da necessidade de encontrar alternativas ao fornecimento de água teria sido um acto de revanchismo pelo facto de a Ré ter deixado de vender a sua produção a uma empresa da qual era sócia SA, gerente da Autora. 13. Resulta já do ponto 16 dos factos provados que a Ré deixou de vender a sua produção em Setembro de 2017, pelo que, tendo a Autora enviado, 4 (quatro) meses antes, um e-mail em que já se referia à necessidade futura de encontrar soluções para o fornecimento de água, esse documento infirma a tese da Ré, na medida em que, previamente àquela cessação de relações comerciais, já tinha sido anunciada pela Autora a necessidade de água, o que exclui a tese do revanchismo, porque cronologicamente incompatível. 14. Daí que se requeira que, julgando-se procedente o recurso da decisão da matéria de facto, se determine o aditamento à decisão da matéria de facto do ponto 16-A, com a seguinte redacção: “Em 4 de Maio de 2017, ou seja, antes da a Ré ter deixando de vender a sua produção de fruta à sociedade «Red Fields», a Autora enviou à Ré mensagem de correio electrónico em que, entre o mais, referiu o seguinte: “Em breve irá existir nova cultura naquele espaço e teremos de fazer reunião para falar sobre a forma de utilização do furo existente.” 15. Os pontos 17 e 18 dos factos provados deveriam ter sido dados como não provados e, ainda, que o ponto 19 dos factos provados deverá passar a ter a seguinte redacção: Por força dos factos descritos nos pontos 5. e 16, a ré deslocalizou a sua produção” - os meios de prova que impunham decisão diversa são as declarações prestadas pela legal representante da Autora – SA – na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 00:48:50 a 00:53:30, as declarações prestadas pela testemunha JP, proprietário do arrendado, na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 02:10:00 a 02:17:00, as declarações prestadas pela gerente da Autora – AC – na sessão de 15/12/2022 da audiência final, no excerto de 00:33:40 a 00:38:50e as declarações prestadas por LS na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 01:16:00 a 01:19:30. 16. Perante o balanço da prova produzida, terá de se concluir que o Tribunal recorrido errou na apreciação dos pontos 17, 18 e 19 dos factos provados, o que impõe a procedência do recurso e a sua alteração, dando-se como não provados os pontos 17 e 18 dos factos provados deveriam ter sido dados como não provados e conferindo-se ao ponto 19 dos factos provados a seguinte redacção: “Por força dos factos descritos nos pontos 5. e 16, a ré deslocalizou a sua produção.” 17. Estando em causa a apreciação da validade de uma resolução contratual operada pela Ré, teria, por um lado, de existir uma comunicação formal de resolução contratual e, por outro, os fundamentos invocados na p.i. para sustentar essa resolução teriam necessariamente de se reconduzir aos invocados nessa comunicação. 18. Já extravasa o objecto do processo a potencial consideração de outros factos não invocados pelos Réus na comunicação formal de resolução, pois se assim não fosse estar-se-ia a violar o disposto no art. 436.º, n.º 1 do Cód. Civil. 19. Mesmo tomando como válida a matéria de facto alegada pela Ré (o que obviamente não se aceita), os factos acima relatados não importariam nem importam a violação de qualquer obrigação contratual, na medida em que, para que houvesse incumprimento, seria necessário que a Autora violasse alguma obrigação assumida, o que, no caso, pressupunha que esta cortasse o fornecimento de água à Ré. 20. A Autora solicitou à Ré que arranjasse soluções alternativas para o uso das infraestruturas mas em momento algum lhe cortou o fornecimento de água. 21. Se não houve corte no fornecimento de água, não houve incumprimento de nenhuma obrigação contratual por parte da Autora; e se não houve incumprimento de obrigações contratuais, muito menos houve mora ou incumprimento definitivo. 22. Em síntese: a Autora, mesmo na tese da Ré, não chegou a incumprir o acordado com esta, pelo que, ao concluir em sentido contrário, validando a resolução contratual operada pela Ré, a douta sentença recorrida violou, desde logo, o disposto no art. 798.º, n.º 1 do Cód. Civil e no art. 17.º, n.º 1 do Regime do Arrendamento Rural. 23. A resolução contratual não se basta com a mora do devedor, pois pressupõe que a mora do devedor se converta em cumprimento definitivo, tal como resulta do disposto no art. 808.º, n.º 1 do Cód. Civil. 24. A conversão da mora em incumprimento definitivo dá-se através da interpelação admonitória, que pressupõe a fixação de um prazo razoável para o devedor cumprir a obrigação, sob pena de operar a resolução contratual. 25. Como resulta da documentação junta aos autos, a resolução contratual operada pelos Réus não foi precedida de interpelação admonitória, o que significa que uma suposta mora do Autor não foi convertida em incumprimento definitivo. 26. E se não houve conversão da mora em incumprimento definitivo, não poderia haver lugar à resolução contratual operada pelos Réus. 27. O que significa que a douta sentença recorrida violou, além de outras, a disposição do art. 808.º, n.º 1 do Cód. Civil. 28. No caso dos autos, para além de alguma trocas de e-mails, não consta qualquer comunicação formal da resolução contratual operada pela Ré, o que significa que, ao pretender pôr termo ao contrato sem fazer a comunicação formal de resolução, esta violou o n.º 1 do art. 436.º do Cód. Civil. 29. O Tribunal recorrido, ao julgar válida a resolução, violou também o regime do art. 436.º, n.º 1 do Cód. Civil, o que impõe a revogação da douta sentença recorrida. 30. Mesmo num cenário de improcedência do recurso da decisão da matéria de facto e de manutenção da redacção do ponto 14 dos factos provados, o acordo das partes quanto ao fornecimento de água nunca poderia ser oponível à Autora, e muito menos constituir fundamento de resolução contratual. 31. Com efeito, mesmo nesse cenário, estaria em causa um acordo verbal quanto ao fornecimento de água à parcela subarrendada, paralelo ao contrato de subarrendamento rural. 32. Volvendo ao caso dos autos, ainda que tal acordo quanto ao uso da água tivesse existido (o que obviamente não se aceita), o mesmo teria de ter sido reduzido a escrito, sob pena de nulidade. 33. Não tendo sido reduzido a escrito, o mesmo sempre seria nulo e, por essa razão, a violação de tal acordo nunca poderia ser invocada como fundamento de resolução contratual. 34. O que significa que, ao adoptar entendimento contrário, a Douta Sentença recorrida violou, além de outras, as normas do art. 6.º, n.º 2 e 5 do Regime do Arrendamento Rural. 35. Como decorre de tudo o exposto, a douta sentença recorrida, ao julgar improcedente a al. a) do petitório, violou, além de outras, as normas dos arts. 436.º, n.º 1, 798.º, n.º 1 e 808.º, n.º 1 do Cód. Civil e dos arts. 6.º, n.º 2 e 5 e 17.º, n.º 1 do Regime do Arrendamento Rural. 36. Deve, pois, ser revogada, na parte em que julgou improcedente a al. a) do petitório, e substituída por Douto Acórdão que julgue esse pedido integralmente procedente. 37. Por outro lado, declarada inválida a resolução contratual operada pelos Réus, assiste aos Autores o direito às quantias reclamadas nas als. b) e c) do petitório, correspondentes às rendas respeitantes ao período de pré-aviso não cumprido para denúncia do contrato por iniciativa da Ré, acrescidas da indemnização prevista no art. 1041.º, n.º 1 do Cód. Civil – que é devida em virtude de o contrato não ter cessado por iniciativa da Autora, com fundamento na falta de pagamento de rendas (como resulta da citada disposição legal, a contrario). 38. Nessa parte foram violadas, além de outras, as normas dos arts. 1041.º, n.º 1 e 1098.º, n.º 3 do Cód. Civil. 39. Pelo que se impõe julgar procedente o recurso, substituindo-se a douta sentença recorrida, na parte em que julgou improcedentes as als. b) e c) do pedido, por Douto Acórdão que julgue esses pedidos integralmente procedentes. 40. Os pedidos reconvencionais estavam dependentes da violação, por banda da Autora, das obrigações contratualmente assumidas perante a Ré, o que, como decorre de tudo o acima exposto (e que aqui se dá por reproduzido), não ocorreu. 41. Daí que, ao julgar procedente o pedido reconvencional, a douta sentença recorrida tenha violado, além de outras, as disposições dos arts. arts. 436.º, n.º 1, 798.º, n.º 1 e 808.º, n.º 1 do Cód. Civil e dos arts. 6.º, n.º 2 e 5 e 17.º, n.º 1 do Regime do Arrendamento Rural, o que impõe a revogação desse segmento da douta sentença e substituição por Douto Acórdão que julgue totalmente improcedentes os pedidos reconvencionais. A R. veio responder ao recurso, pugnando pela sua improcedência. II. Questões a decidir São as seguintes as questões a decidir, tendo em conta o objeto do recurso delimitado pela Recorrente nas suas conclusões- art.º 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do CPC - salvo questões de conhecimento oficioso- art.º 608 n.º 2 in fine: - da impugnação da decisão sobre a matéria de facto; - da (in)válida resolução do contrato de subarrendamento pela R. e suas consequências. IV. Fundamentos de Facto - da impugnação da decisão sobre a matéria de facto Vem a A. impugnar a decisão da matéria de facto quanto aos pontos, 14, 17, 18 e 19 dos factos provados, mais requerendo o aditamento de um novo ponto aos factos provados com o n.º 16-A. Por terem sido observados pela A. os requisitos previstos no art.º 640.º n.º 1 al. a), b) e c) e n.º 2 al. a) do CPC, procede-se à avaliação da impugnação da decisão de facto apresentada. - o ponto 14 dos factos provados tem a seguinte redação: 14. Desde 25.04.2014, a ré sempre utilizou a água existente no terreno, por ambas as partes nisso terem acordado e por estar excluído do contrato apenas o uso das infraestruturas existentes no terreno. Entende a Recorrente que nos factos provados deve constar apenas a primeira premissa, ou seja: “Desde 25.04.2014 a ré sempre utilizou a água existente no terreno”, eliminando-se dos factos provados a restante matéria. Alega que o tribunal está a dar como provado um acordo adicional ao clausulado no contrato, violando o art.º 364.º n.º 1 e 376.º n.º 1 do C.Civil, uma vez que o contrato de arrendamento rural tem obrigatoriamente de ser reduzido a escrito, como foi, só podendo fazer-se uso de um meio de prova de valor igual ou superior ao documento particular, não sendo idóneo para o efeito a prova por testemunhas ou por declarações de parte. Mais refere que de qualquer modo a prova produzida não admite que se tenha tal facto como provado, invocando como meios de prova suscetíveis de determinar a alteração pretendida: a) o contrato de subarrendamento, que constitui o doc. n.º 2, junto com a p.i.; b) declarações prestadas pela legal representante da Autora – SA – na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 34:15 a 42:00; c) declarações prestadas pela testemunha JP, proprietário do arrendado, na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 01:58:00 a 02:09:30; d) declarações prestadas pela testemunha AF, na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 02:30:10 a 02:33:00; e) declarações prestadas pela legal representante da Autora – AC – na sessão de 15/12/2022 da audiência final, no excerto de minutos 00:11:08 a 00:15:50. A Recorrida pronuncia-se no sentido da manutenção deste facto provado, socorrendo-se da motivação apresentada pelo tribunal a quo e invocando os seguintes meios de prova: - a cláusula 4ª do contrato de arrendamento; - o depoimento das testemunhas PC, LS e JP nos excertos de gravação que indica; - as declarações de parte de HC, legal representante da R. nos excertos de gravação que indica. Na sentença é apresentada a seguinte motivação para dar este facto como provado: “Acresce, no que toca muito em particular ao facto 14., o qual constitui o cerne do dissídio nestes autos estabelecido entre as partes, que, sendo inequívoco que a ré utilizou efectivamente na sua exploração a água extraída do furo artesiano e bomba existentes na parcela de terreno que não subarrendou à autora, o que fez com o consentimento desta, pois que nisso ambas as partes concordaram no decurso das respectivas declarações dos seus representantes, o tribunal não teve qualquer dúvida em julgar demonstrada a existência de um acordo (ainda que se possa reputar tácito) celebrado entre as partes sobre a utilização de água proveniente da outra parte do terreno que não foi dado em subarrendamento à ré, mas antes dada em arrendamento à autora, tal como existia esse acordo no que respeitava à utilização do armazém, instalações sanitárias e câmara frigorífica, pois que foi a própria autora quem instalou o sistema de rega utilizado pela ré e que provinha do dito furo, não fazendo qualquer sentido que a ré iniciasse uma exploração que tinha como cerne a produção e venda de framboesas sem ter a segurança de poder utilizar a água que era disponibilizada para a parcela subarrendada através de um sistema previamente montado para esse preciso efeito pela própria autora, a qual, diga-se, jamais colocou óbice algum ou limitação à utilização da água até à comunicação de 21 de Outubro de 2017, tanto mais que a ré suportava os custos com a energia eléctrica inerente à extração da água, dizendo-nos as regras da experiência comum que nenhum agricultor sensato iniciaria uma exploração que depende substancial e constantemente de água sob condição de ter que vir a diligenciar pela obtenção futura de um outro sistema apto ao seu fornecimento, com um encargo de montante e viabilidade incertos, quando já existem no terreno todos os meios instalados para o efeito e quando adquiriu o sistema de rega que permite a disponibilização da água, além de suportar os encargos inerentes a essa utilização, tendo, por isso, o tribunal ficado plenamente convicto de que, não obstante a cláusula 4.ª do documento de fls. 11 verso, na qual as partes declararam que ficam excluídas do arrendamento as infraestruturas, as mesmas acabaram por consensualizar na sua utilização e esta foi efectiva e incessantemente permitida ao longo de mais de três anos, assim tendo também as regras da experiência comum consolidado a convicção do tribunal no que concerne à consideração da factualidade vertida sob 14. como provada.”. Para melhor análise desta questão, importa em primeiro lugar decompor o teor deste ponto 14 dos factos provados que integra 3 questões diferentes: (i) desde 25.04.2014, a ré sempre utilizou a água existente no terreno; (ii) por ambas as partes nisso terem acordado; (iii) está excluído do contrato apenas o uso das infraestruturas existentes no terreno. A primeira parte do ponto 14 reporta-se a uma situação de facto: “desde 25.04.2014 a ré sempre utilizou a água existente no terreno”, o que não é contestado pela Recorrente, que propõe a manutenção deste segmento nos factos provados. A última parte do ponto 14 também é pacífica, já que o contrato de arrendamento celebrado não incluiu qualquer infraestrutura existente no terreno da A., conforme expressamente resulta da sua cláusula 4ª que a R. aceita, constando também da cláusula 5ª do contrato a autorização da A. para que a R. realize todas as benfeitorias bem como alterações ao nível de infraestruturas, no que diz respeito à melhoria das condições de trabalho, segurança, prosperidade, produtividade e funcionamento da exploração – esta matéria já consta do ponto 2 dos factos provados, que reproduz o contrato celebrado entre as partes nas suas diversas cláusulas, não se vendo por isso qualquer utilidade em que neste ponto 14 dos factos provados volte a mencionar-se que foi excluído do contrato de arrendamento o uso das infraestruturas do terreno. A questão controvertida está no segmento que se reporta a um eventual acordo das partes que não ficou a constar do contrato de arrendamento, no sentido da R. poder utilizar a água existente no terreno através do furo artesiano com o respetivo sistema de bombagem existente no prédio da A. que se situava fora da parcela do terreno subarrendado à R. Importa previamente apreciar e decidir se o tribunal pode valorar o depoimento das testemunhas e as declarações das partes sobre esta matéria, como fez o tribunal a quo, em face do documento particular com força probatória plena que constitui o contrato de subarrendamento, por estar em causa um acordo complementar ou acessório de contrato titulado por documento escrito, ou antes se tal não pode ocorrer, por se tratar de matéria não sujeita à livre apreciação do tribunal, nos termos do art.º 607 n.º 5 do CPC que estabelece que a livre apreciação não abrange factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documento ou que estejam plenamente provados. Como resulta dos factos provados as partes celebraram um contrato de subarrendamento agrícola que se encontra sujeito ao regime do Decreto Lei 294/2009 de 13 de outubro, que no seu art.º 2.º n.º 1 nos dá a noção de arrendamento rural, prevendo no art.º 3.º os diversos tipos de arrendamento rural, com expressa referência no n.º 1 al. a) ao arrendamento agrícola. Ao subarrendamento rural aplica-se, com as devidas adaptações, o disposto neste mesmo diploma, como regula o seu art.º 10.º n.º 1 e n.º 2. O art.º 6.º do Decreto Lei 294/2009 com a epígrafe “forma do contrato” estipula nos seus n.º 1 e 2: “1- Os arrendamentos rurais são obrigatoriamente reduzidos a escrito, constando dos mesmos a identificação completa das partes contratantes, a indicação do número de identificação fiscal e respectiva morada de residência ou sede social, bem como a identificação completa do prédio ou prédios objecto do arrendamento. 2 - A não redução a escrito dos contratos de arrendamento rural celebrados ou renovados na vigência do presente decreto-lei gera a sua nulidade.” O contrato de arrendamento rural, é um negócio jurídico formal, estando a sua validade dependente da sua redução a escrito, nos termos exigidos pelos art.º 6.º e 7.º do diploma mencionado, o que também se aplica às alterações ao contrato, nos termos do art.º 6.º n.º 5. O contrato de subarrendamento agrícola celebrado pelas partes e constante do documento junto aos autos, por elas assinado e com o teor que conta do ponto 2 dos factos provados constitui um documento particular, nos termos previstos no art.º 373.º n.º 1 do C.Civil. Sobre a força probatória dos documentos particulares rege o art.º 376.º n.º 1 do C.Civil, no sentido de que o documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova de falsidade do documento. O art.º 394.º n.º 1 do C.Civil estabelece, por seu turno: “É inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objeto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos documentos particulares mencionados nos artigos 373º a 379º, quer as convenções sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores.” A razão de ser desta norma prende-se com a diferente fiabilidade dos diversos meios de prova, pretendendo o legislador evitar que possa prevalecer a prova testemunhal que se sabe ter menor fiabilidade do que a prova por documentos que em princípio é mais segura, atenta a sua natureza. No entanto, esta norma não tem um sentido absoluto. Ensina Mota Pinto, in. Col. Jur. 1985, Tomo III, pág. 9: “Constitui excepção à regra do art. 394º e, por isso, deve ser permitida a prova por testemunhas, no caso de o facto a provar estar já tornado verosímil por um começo de prova por escrito. Também deve ser admitida tal prova testemunhal, existindo já prova documental susceptível de formar a convicção da verificação do facto alegado, quando se trate de interpretar o conteúdo de documentos ou completar a prova documental”. Tem vindo a ser entendido que a regra do art.º 394.º n.º 1 C.Civil comporta restrições, designadamente quando há um começo de forma escrita ou quando as circunstâncias do caso tornem verosímil a existência da convenção - neste sentido, vd. a título de exemplo o Acórdão do STJ de 5 de junho de 2012, no proc. 805/07.1TCFUN.L1.S1 in. www.dgsi.pt quando refere: “A regra do art. 394º do CC que estabelece a inadmissibilidade da prova por testemunhas, se tiver por objecto convenção contrária ou adicional ao conteúdo de documento particular mencionado nos arts. 373º a 379º, não tem um valor absoluto, sendo admitida a prova testemunhal quando houver um começo ou princípio de prova por escrito, ou mesmo quando as circunstâncias do caso concreto tornam verosímil a convenção”. No caso em apreço, está em causa um alegado acordo das partes no sentido da R. usar a água do terreno da A. através da infraestrutura existente no terreno desta que é a bomba de extração de água do furo artesiano, quando a cláusula 4ª do contrato expressamente estipula que o arrendamento não inclui qualquer infraestrutura existente naquele prédio, como decorre do documento subscrito por ambas, ainda que desde logo, na cláusula 5ª, a A. conceda à R. autorização para efetuar as benfeitorias úteis ou necessárias na parcela de terreno subarrendado, bem como as alterações ao nível das infraestruturas. No caso deparamo-nos com um princípio de prova documental, que aponta para a existência de um acordo das partes no sentido da R. poder usar a água do tereno através do furo artesiano do terreno da A., que constitui o email junto aos autos pela A. com a réplica como doc. 3, datado de 4 de maio de 2017, enviado pela A. à R. onde consta designadamente: “Em breve irá existir nova cultura naquele espaço e teremos de fazer reunião para falar sobre a forma de utilização do furo existente.”. É a própria A. que aqui propõe à R. uma reunião para falar sobre a forma de utilização do furo, o que apenas faz sentido a partir do momento em que permitiu que a mesma procedesse à extração da água através daquele furo, que não se situava na parcela de terreno por ela subarrendada. As circunstâncias do caso, também apresentam como verosímil que as partes possam ter acordado verbalmente que a R. usasse o furo para a captação da água, através da infraestrutura que ficava fora do terreno subarrendado, uma vez que de outra forma não tinha maneira de imediato de captar a água de que necessitava para a sua exploração, ainda que a A. tivesse desde logo autorizado no contrato que a R. fizesse na sua parcela de terreno as alterações ao nível das infraestruras necessárias. De outra forma não se vê como é que a R. podia ter utilizado a água existente no terreno, o que sempre fez desde 25.04.2014 o que a A. aceita, não fazendo sentido a celebração de um contrato de arrendamento para exploração agrícola sem que haja a possibilidade de obter a água necessária para o efeito, Em conclusão, considera-se que é admissível a prova testemunhal ou por declarações de parte sobre esta matéria, não se verificando a violação pelo tribunal a quo, dos art.º 364.º n.º 1 e n.º 2, 371.º n.º 1, 373.º n.º 1, 376.º n.º 1 e 394.º n.º 1 do C.Civil e 607.º n.º 5 do CPC. Vejamos então se os elementos de prova indicados pelo Recorrente impõem a alteração deste ponto 14 dos factos provados. Como se viu o contrato de arrendamento celebrado entre as partes, que constitui o doc. 2 junto com a pi., não incluía qualquer infraestrutura existente no terreno da A. como previsto na sua cláusula 4ª, embora autorize a R. a realizá-las na medida das suas necessidades - cláusula 5ª. As infraestruturas existentes no terreno da A. não se situavam na parcela de terreno subarrendada à R., como decorre da planta do imóvel que consta da última página do contrato de subarrendamento e conforme foi explicitado no depoimento das testemunhas indicadas pela Recorrente a cuja audição se procedeu: JP, proprietário do terreno que ali as colocou e AF que conhece o local por ali ter trabalhado em tempos, sendo este um facto não controvertido. Também as declarações de parte, nos excertos de gravação indicados pela Recorrente apontam para a existência de um acordo das partes na utilização da água do terreno da A. através do furo que nele existia. A legal representante da A. SA refere que foi permitida a captação de água pela R. no seu terreno se ela fizesse a infraestrutura necessária no terreno subarrendado, o que passava pela instalação de um contador de energia elétrica, mais referindo que a dada altura lhe pediu que contribuísse para o pagamento da eletricidade, por fazer uso das suas infraestruturas. Também a legal representante da A. AC diz que foi permitido à R. que usasse a bomba da extração da água até ela ter a sua autonomia com a energia elétrica e água, tendo ficado claro que teriam dotar o terreno de infraestruturas se queriam manter o projeto, o que passava pela extensão da energia elétrica para a sua parcela de terreno. O legal representante da R. HC e a sua mulher referem que utilizavam a água e pagavam a energia elétrica como lhes era pedido pela A., sendo que mais ninguém utilizava o terreno, não tendo sido fixado prazo para o efeito, tendo o primeiro referido que o aumento de potência com um posto de transformação implicaria um investimento de cerca de 10 mil euros, e que só precisavam de energia para retirar a água. Destes depoimentos e declarações é possível concluir que não obstante as infraestruturas do terreno da A. não se situarem na parcela subarrendada à R., existiu um acordo das partes que permitiu que esta utilizasse a água do terreno através da bomba artesiana da A., tanto que a A. lhe cobrava a eletricidade necessária para o efeito, como consta do ponto 15 dos factos provados que a Recorrente não contesta, ainda que não tenha resultado provado se tal acordo foi provisório e até a R. diligenciar pelas suas próprias infraestruturas ou não, no que diverge a posição das partes. Em consequência deve manter-se a existência do acordo das partes no ponto 14 dos factos provados, dele se eliminando apenas a sua parte final, por inútil, passando o mesmo a ter a seguinte redação: 14. Desde 25.04.2014 a ré sempre utilizou a água existente no terreno, por ambas as partes nisso terem acordado. - aditamento de um ponto 16-A aos factos provados Requer a Recorrente que o ponto 16 dos factos provados seja complementado com um outro com a seguinte redação: 16-A. Em 4 de maio de 2017, ou seja, antes da A. ter deixado de vender a sua produção de fruta à sociedade “Red Fields” a A. enviou à R. mensagem de correio eletrónico em que entre o mais referiu o seguinte: “Em breve irá existir nova cultura naquele espaço e teremos de fazer reunião para falar sobre a forma de utilização do furo existente.”. Invoca para o efeito o doc. 3 junto com a réplica que se reporta a esse email, documento que não foi impugnado pela R. Alega que tal facto é importante para infirmar a ideia apresentada pela R. de que a comunicação que lhe fez para a necessidade de encontrar alternativas ao uso das infraestruturas, seria uma retaliação pelo facto da R. ter deixado de vender a sua produção a uma empresa da qual era sócia uma gerente da A. O ponto 16 dos factos provados tem o seguinte teor: 16. A autora enviou a comunicação referida em 5. após a ré, em data não apurada de Setembro 2017, ter deixado de vender a sua produção de fruta à sociedade «Red Fields», da qual a gerente da autora, SA, é uma das sócias. Na verdade, na apreciação jurídica da causa e na fundamentação do abuso de direito, a sentença releva a circunstância da comunicação da A. à R. para arranjar alternativas ao uso das infraestruturas ter tido lugar após esta ter deixado de lhe vender a sua produção. A Recorrida não vem opor-se ao aditamento deste facto, antes referindo que o mesmo reforça a sua posição por evidenciar a procura de solução conjunta para a o uso da bomba de extração da água do furo. Assim sendo, tratando-se de facto que tem o acordo das partes, que está atestado pelo doc. 3 junto com a réplica e considerando a sua possível relevância para a apreciação da posição das partes no âmbito da execução do contrato, defere-se o seu aditamento aos factos provados, conforme requerido pela Recorrente, deles ficando a constar um novo ponto com o n.º 16-A e a seguinte redação: 16-A. Em 4 de maio de 2017 a A. enviou à R. mensagem de correio eletrónico que consta do doc. 3 junto com a réplica, em que entre o mais referiu o seguinte: “Em breve irá existir nova cultura naquele espaço e teremos de fazer reunião para falar sobre a forma de utilização do furo existente.”. - quanto aos pontos 17, 18 e 19 dos factos provados têm o seguinte teor: 17. Para que fosse viável à ré continuar a explorar o terreno, após o termo do prazo de 90 dias estabelecido na comunicação da autora de 21.10.2017, aquela teria que executar um (novo) furo artesiano e celebrar contrato de fornecimento de energia eléctrica, com custos estimados de € 10.000,00. 18. O que a ré não conseguiria concretizar no prazo de 90 dias. 19. Por força dos factos descritos nos pontos 5. e 16. a 18., a ré deslocalizou a sua produção. Pretende a Recorrente que a matéria dos pontos 17 e 18 seja considerada não provada e que seja alterada a redação do ponto 19 dos factos provados, de forma que dele passe a constar: 19. Por força dos factos descritos nos pontos 5. e 16., a ré deslocalizou a sua produção. Invoca como meios de prova suscetíveis de fundamentar a alteração pretendida: - as declarações prestadas pela legal representante da Autora – SA – na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 48:50 a 53:30; - as declarações prestadas pela legal representante da Autora – AC – na sessão de 15/12/2022 da audiência final, no excerto de minutos 33:40 a 38:50. - as declarações prestadas pelo legal representante da Ré – HC – na sessão de 15/12/2022 da audiência final, no excerto de minutos 01:15:08 a 01:19:07; - declarações prestadas pela testemunha JP, proprietário do arrendado, na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 02:10:00 a 02:17:00; - declarações prestadas pela testemunha LS, na sessão de 27/10/2022 da audiência final, no excerto de minutos 01:16:10 a 01:19:30; Refere que destes elementos resulta que existiam outras soluções menos onerosas e mais céleres a que estavam ao dispor da R. e que esta nunca contactou a A. no sentido de procurar uma solução. Pugnando pela manutenção destes factos provados, contrapõe a Recorrida com os seguintes meios de provada: - depoimento da testemunha LS nos excertos de gravação 59m a 1h02; - depoimento da testemunha PC nos excertos de gravação 01h43 a 01h49 da sessão de 27/10/2022; - declarações do legal representante da R. HC, nos excertos de gravação 01h36 a 01h41 da sessão de 15/12/2022. O tribunal a quo fundamentou esta matéria nos depoimentos das testemunhas PC mulher do legal representante da R., LS, sócio da empresa a quem a R. passou a vender a sua produção e que acompanhou a deslocalização da mesma e quanto aos pontos 18 e 19 e nas declarações de HC legal representante da R. Procedeu-se à audição dos depoimentos das testemunhas e das declarações de parte da A. e da R. Está assente e não é contrariado que a R. deslocalizou a sua produção por força da comunicação que a A. lhe fez e a que alude o ponto 5 dos factos provados a que também se faz menção no ponto 16 dos factos provados. O que está aqui em causa é apenas saber se podemos ter como certo que para que fosse viável à R. continuar com a exploração do terreno, teria que executar um (novo) furo artesiano e celebrar um contrato de fornecimento de energia elétrica, com custos estimados de € 10.000,00, o que não conseguiria concretizar no prazo de 90 dias. Começando pelo depoimento da testemunha LS, que ambas as partes invocam, com quem a R. foi ter quando se incompatibilizou com a A., e que a terá ajudado sobre a forma de deslocalizar a sua produção e sobre a venda do seu produto, verifica-se que sobre o relacionamento das partes no âmbito do contrato de subarrendamento, esta testemunha mostrou não ter qualquer conhecimento direto, apenas revelando saber o que lhe foi relatado pela R. afirmando que esta lhe referiu sentir-se explorada, apresentando-se nesta parte o seu depoimento como totalmente irrelevante. Sobre a questão das soluções para a rega, a testemunha referiu que “soluções há sempre”, avançando como alternativa a construção de um depósito de água, mais referindo que é preciso é haver “harmonia entre as partes”. A testemunha JP é o proprietário do prédio arrendado à A., tendo autorizando o subarrendamento de uma parcela do mesmo à R., apresentando um depoimento que se considerou totalmente isento e credível, referindo ter sido ele quem anteriormente colocou as infraestruturas no terreno, designadamente o furo e a bomba artesiana. Quanto à questão do aumento das possibilidades da rega, o mesmo referiu que isso é possível com um pedido de aumento de potência à EDP e disse já ter autorizado que fosse pedido um novo PT (posto de transformação) à EDP. Mais esclareceu que uma forma comum e muito utilizada para o aumento da rega é o armazenamento de água num depósito para o qual se extrai a água à noite e se retira para a rega durante o dia. Quanto à testemunha PC, mulher do gerente da R., a mesma teve um depoimento que a nosso ver se apresentou como totalmente comprometida com a posição defendida pela R. neste processo, não só evidenciando a existência de um litígio pessoal com as gerentes da A., mas ainda falando em nome da R. mencionando o “nosso negócio” e assumindo-se como parte interessada no processo, no qual mostra estar envolvida como R., embora o gerente desta seja o seu marido. A mesma procurou fazer crer que foi o facto da R. ter deixado de vender a sua fruta à A. que determinou que esta viesse a colocar entraves ao uso do furo para a captação da água, quando aquele facto ocorreu em setembro de 2017 e já uns meses antes, em maio de 2017, em email enviado pela A. à R. (doc. de fls. 311 dos autos) a A dizia: “Em breve irá existir nova cultura naquele espaço e teremos de fazer reunião para falar sobre a forma de utilização do furo existente.”, o que mostra a intenção da A. passar a fazer uso da parcela de terreno que no momento estava parada de modo a rentabilizá-la, com a inerente necessidade usar a bomba de extração de água do mesmo. Também as suas declarações no sentido de terem tentado encontrar uma alternativa no prazo de 90 dias para a captação da água, ainda que a mesma refira que “tentaram arranjar soluções” e “esgotamos todas as hipóteses”, em concreto a mesma só fala de alegadas diligências para realizar outro furo, referindo a complicação para que o mesmo fosse aprovado em 3 meses pela APA, não existindo ainda qualquer suporte documental que evidencie a efetiva realização de tais diligências da R., nem a procura de outra alternativa. O legal representante da R. HC, nas suas declarações fala numa comunicação de “chofre” da A. em setembro, para encontrarem uma solução para a rega, quando daquela mesma comunicação consta “Recordando que a Acini não nos voltou a informar sobre o aumento de potência energética no local que em tempos tinha previsto e de modo a resolver um problema futuro, a Doce Baga Lda não tem alternativas para a Acini e vai avançar com a utilização do terreno para produção, pelo que no prazo de 90 dias a Acini ter concretizada uma solução para a situação apresentada.”. O declarante refere também que a R. começou por ponderar um outro furo, mencionando as suas condicionantes e dificuldades, mas reconheceu existirem outras soluções para a gestão da água existente, ainda que diga que não lhes foram colocadas pela A., constatando-se porém que desta comunicação da A. resulta que já havia sido falada a questão da R. diligenciar por obter um aumento da potência da energia elétrica, para possibilitar uma maior extração do volume de água do furo, o que é compatível com a comunicação da A. de maio de 2017 - doc. 3 junto com a réplica, em que a A. informa sobre a breve existência de um nova cultura no seu terreno e a necessidade de falarem sobre a forma de utilização do furo. As declarações das legais representantes da A. SA e AC foram no sentido de que esta questão do uso da bomba e do furo estiveram em cima da mesa logo quando da realização do contrato, referindo a primeira que no início do contrato havia a expectativa de que em 60 dias a EDP autorizasse o aumento de potência elétrica. Evidenciam que a eletricidade está lá e que não seria necessário um novo furo, mas apenas um aumento da potência elétrica para bombear uma maior quantidade de água; referem não haver necessidade de outro furo, por existirem outras soluções mais rápidas, mais simples e mais baratas, como ligações de canalização, subligação da rega, com partilha da máquina de computação da rega ou a colocação de um depósito, referindo que apenas seria necessário conversar sobre as possíveis soluções, o que a R. não se dispôs a fazer. Da avaliação destes elementos probatórios resulta que havia outras soluções viáveis para potenciar a captação de água ou a rega de modo a viabilizar a exploração da R. que não a realização de um novo furo. As declarações das partes apresentam-se como contraditórias, refletindo o seu interesse no desfecho da ação e evidenciando o litígio que as divide, agravado por ligações familiares entre elas. Pelas razões que se referiram, a testemunha PC apresentou-se como verdadeira parte no processo. O art.º 466.º do CPC referindo-se às declarações de parte, enquanto meio probatório, estabelecendo no seu n.º 3 que “o tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão.” Como nos diz, a respeito da valoração deste meio prova, o Acórdão do TRP de 18 de maio de 2017, no proc. 3456/16.6T8VNG.P1: “A norma não fornece, contudo, qualquer pista sobre o modo como essa apreciação deverá ser feita, designadamente se as declarações da parte apenas devem ser aceites como prova complementar ou supletiva dos demais meios de prova, se devem ser aceites como mero princípio de prova ou se podem ser suficientes para permitir ao tribunal julgar provados factos favoráveis é apenas demonstrados através das suas declarações. Não tendo o legislador tomado posição sobre esse aspecto parece que o intérprete não deve assumir aí uma atitude dogmática, de puro princípio, seja ela qual for. Se não basta à parte alegar um facto para que o tribunal o tenha de aceitar e se o direito ao contraditório implica que tendo um facto sido impugnado pela parte contrária ele deve ser objecto de produção de prova que o demonstre, parece adequado entender que, em condições normais, para fazer a prova de um facto favorável a uma das partes não será suficiente que esse facto seja afirmado pela própria parte no decurso das suas declarações de parte.” As declarações das partes, enquanto meio de prova, têm de ser ponderadas com todas as cautelas pelo tribunal, não podendo olvidar-se que as partes estão diretamente interessadas no desfecho da ação e que, por isso, não raras vezes prestam declarações de forma não isenta e comprometida. Na medida em que incidem muitas vezes sobre factos controvertidos que lhes são favoráveis, as declarações da parte não podem, em regra, ser consideradas como suficientes para determinar a verificação desses mesmos factos, a menos que a sua conjugação com outros elementos de prova permita conclui-lo. Na situação em presença, as declarações do legal representante da R. HC e da testemunha PC, na afirmação de que para ser viável a continuação da exploração teria que ser executado um novo furo e celebrado novo contrato de energia elétrica, com o custo estimado de 10 mil euros, o que não podia ser feito em 90 dias, apresentam-se com muito escasso ou mesmo sem valor probatório, sendo patente o seu comprometimento com a posição que a R. assume nos autos, evidenciando os restantes elementos probatórios, mesmo sem levar em conta as declarações de parte da A., que existiam outras soluções. Considera-se, por isso, que os elementos probatórios constantes dos autos e nos quais o tribunal a quo baseou a sua convicção para dar estes factos como provados são insuficientes para o efeito, sendo matéria que é infirmada, designadamente, pelo depoimento das testemunhas JP e LS, não podendo concluir-se que foi esta a principal motivação para a R. deslocalizar a sua produção. Em consequência, procede a impugnação destes pontos dos factos provados, resultando não provada a matéria dos pontos 17 e 18 dos factos provados, cujo ónus da prova era da R. e alterando-se a redação do ponto 19 que passa a ser a seguinte: 19. Por força dos factos descritos nos pontos 5 e 16 a R. deslocalizou a sua produção. Em conclusão, julga-se procedente a impugnação da decisão de facto apresentada pela Recorrente, na sequência do que: (i) altera-se a redação do ponto 14 dos factos provados; (ii) adita-se um novo ponto aos factos provados com o n.º 16-A; (iii) elimina-se dos factos provados os pontos 17 e 18; (iv) altera-se a redação do ponto 19 dos factos provados. * Resultaram provados e não provados os seguintes os factos com interesse para a decisão da causa: Factos Provados 1. Em 30/04/2013, JP, designado de “primeiro outorgante e senhorio”, e a autora «Doce Baga, Ld.ª», designada de “segundo outorgante e locatário”, subscreveram o documento escrito intitulado de “Contrato de Arrendamento Agrícola”, no qual declararam o seguinte: “É acordado no presente Contrato de Arrendamento Agrícola, que se rege pelo estipulado nas cláusulas seguintes: CLÁUSULA 1ª 1-Que Primeiro Outorgante é proprietário e legítimo possuidor do prédio denominado “Quintas” com a área de 3,45 ha, inscrito na predial da Freguesia de Canha, Concelho de Montijo, sob o artigo matricial número ….º, secção AG da Matriz Predial Rústica. 2- Que o referido imóvel foi por ele adquirido, por escritura pública de doação outorgada no cartório do Notário AB, sito em Vendas Novas, em 24-04-2013, cuja cópia se anexa como doc. 1. CLÁUSULA 2ª 1. O Primeiro Outorgante dá de arrendamento agrícola, em locação total, à sociedade Doce Baga, Lda representada dos Segundo Outorgante, o prédio rústico identificado na cláusula primeira. CLÁUSULA 3ª 1. O presente contrato é celebrado pelo prazo de sete anos, renovável por iguais períodos, desde que haja acordo expresso entre ambas as partes, e terá início em 01 de Maio de 2013. 2. As partes convencionam que ao segundo outorgante é conferido o direito de exercício preferência de compra, do prédio supra melhor identificado na Cláusula 1.ª, a partir da entrada em vigor do presente contrato. CLÁUSULA 4ª As partes acordam em afastar a caducidade prevista no n.º 3 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro, prevalecendo o direito de preferência do arrendatário perante o exercício do mesmo direito pelo primeiro outorgante, por co-herdeiro ou comproprietário. CLÁUSULA 5ª O arrendamento inclui as infra-estruturas, existentes no prédio identificado na cláusula 1ª, designadamente dois armazéns, o WC e o furo artesiano com o respetivo sistema de bombagem. CLÁUSULA 6ª 1. O Primeiro Outorgante autoriza e concorda com todas as benfeitorias necessárias bem como as alterações ao nível de infra-estruturas, que possam ser efetuadas pelo Segundo Outorgante, no prédio descrito em cláusula 1.ª, e no que diz respeito à melhoria das condições de trabalho, segurança, prosperidade, produtividade e funcionamento da exploração agrícola. 2. Acordam as partes, que as benfeitorias úteis, serão comunicadas previamente ao 1º outorgante, para sua autorização. CLÁUSULA 7ª 1. O valor da renda anual no primeiro ano de contrato é de 9.000,00€ (nove mil euros) e paga anualmente. 2. O valor da renda anual no segundo ano de contrato é de 13.200,00€, devendo ser paga mensalmente a prestação de €1100. 3. O valor da renda anual no terceiro ano de contrato e restantes até ao último inclusive é de 14.400,00€, devendo ser paga mensalmente a prestação de €1200. 4. A prestação deverá ser paga até ao dia 8 (oito) do mês anterior ao mês a que disser respeito; CLÁUSULA 8ª Verificando-se a ocorrência de circunstâncias imprevisíveis e anormais, as partes convencionam a possibilidade de alterações constantes no artigo n.º 12 do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro. CLÁUSULA 9ª O prédio arrendado é destinado a exploração agrícola do arrendatário, não lhe podendo dar outro uso, salvo se houver acordo expresso com o senhorio. CLÁUSULA 10ª Qualquer incumprimento das cláusulas constantes no presente contrato, obriga o Outorgante responsável pelo incumprimento de indemnizar o Outorgante lesado, pelo valor dos danos e prejuízos causados. CLÁUSULA 11ª Em tudo o que estiver omisso regulam as disposições legais aplicáveis, nomeadamente as do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro. (...)” 2. Em 25.04.2014, a autora «Doce Baga, Ld.ª», designada de “primeiro outorgante e senhorio” e a ré «Acini, Unipessoal, Ld.ª», designada de “segundo outorgante e locatário”, subscreveram o documento escrito intitulado de “Contrato de Subarrendamento Agrícola”, no qual declararam: “É acordado no presente Contrato de Arrendamento Agrícola, que se rege pelo estipulado nas cláusulas seguintes: CLÁUSULA 1ª O Primeiro Outorgante é arrendatário do prédio denominado “Quintas” com a área de 3,60 ha, inscrito na predial da Freguesia de Canha, Concelho de Montijo, sob o artigo matricial número 5.º, secção AG da Matriz Predial Rústica. CLÁUSULA 2ª O Primeiro Outorgante dá de arrendamento agrícola, em locação total 1,2 ha, ao Segundo Outorgante, o prédio rústico identificado na cláusula primeira, conforme polígono assinalado a verde na planta em anexo. CLÁUSULA 3ª O presente contrato é celebrado pelo prazo de seis anos, renovável por iguais períodos, desde que haja acordo entre ambas as partes, e terá início em 25 de Abril de 2014. CLÁUSULA 4ª O arrendamento não inclui qualquer infraestruturas, existentes no prédio identificado na cláusula 1ª. CLÁUSULA 5ª 1. O Primeiro Outorgante autoriza e concorda com todas as benfeitorias necessárias bem como as alterações ao nível de infraestruturas, que possam ser efetuadas pelo Segundo Outorgante, no prédio descrito em cláusula 1.ª, e no que diz respeito à melhoria das condições de trabalho, segurança, prosperidade, produtividade e funcionamento da exploração agrícola. 2. Acordam as partes, que as benfeitorias úteis, serão comunicadas previamente ao 1º outorgante. CLÁUSULA 6ª 1. O valor da renda anual no primeiro ano de contrato é de 5.950,00€ (cinco mil e novecentos e cinquenta euros). 2. O valor da renda anual no segundo ano de contrato e restantes até ao último inclusive é de 6.400,00€ (seis mil e quatrocentos euros). 3. Deverá ser paga até ao dia 8 (oito) do mês anterior ao ano a que disser respeito; CLÁUSULA 7ª Verificando-se a ocorrência de circunstâncias imprevisíveis e anormais, as partes convencionam a possibilidade de alterações constantes no artigo n.º 12 do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro. CLÁUSULA 8ª O prédio arrendado é destinado a exploração agrícola e transformação do produto agrícola do subarrendatário, não lhe podendo dar outro uso nem subarrenda-lo, salvo se houver acordo expresso com o senhorio. CLÁUSULA 9ª Qualquer incumprimento das cláusulas constantes no presente contrato, obriga o Outorgante responsável pelo incumprimento de indemnizar o Outorgante lesado, pelo valor dos danos e prejuízos causados. CLÁUSULA 10ª Em tudo o que estiver omisso regulam as disposições legais aplicáveis, nomeadamente as do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro. (...)” 3. A partir de 25.04.2014, a ré ocupou a referida parcela de terreno e passou a explorá-la, designadamente, através da plantação e colheita de framboesa em estufa para transformação de produto agrícola. 4. Em 07.11.2015, o dono do prédio, JP, e a autora «Doce Baga, Ld.ª», durante a vigência do acordo referido em 2., declararam que o primeiro consente, autoriza e tem conhecimento e que a ré «Acini, Unipessoal, Ld.ª», na qualidade de subarrendatária, colocasse no espaço que lhe foi cedido o seguinte: - uma estrutura em madeira ou metálica, para apoio à actividade da exploração agrícola e para integrar uma cozinha industrial para transformação, uma câmara de refrigeração, uma câmara de congelação, uma zona de armazenamento e embalamento, um bloco sanitário e de balneário e um espaço para escritório, no máximo com 163m2, com ligação eléctrica, abastecimento de água e fossa séptica; - um monobloco pré-fabricado, no mínimo com 18m2, para apoio à exploração agrícola na fase prévia à construção da estrutura principal de apoio prevista. 5. Em 21.10.2017, a autora enviou uma mensagem para o endereço de correio electrónico da ré – acini.lda@sapo.pt –, cujo teor integral consta dos documentos juntos com a petição sob o n.º 4 e o n.º 5 e que aqui se dão por integralmente reproduzidos, comunicando-lhe o seguinte: “(...) Vimos por este meio informar que ainda no decorrer deste ano civil a Doce Baga irá dar uso ao terreno das Taipadas com produção agrícola. Para o efeito as infraestruturas que estão a ser utilizadas pela Acini a título gratuito (Furo, bomba, wc, fossa, etc) vão passar a ter utilização efectiva pela Doce Baga Lda, pelo que a Acini deverá encontrar uma solução para a rega, consumo energético e Wc. A ter em conta: 1. A limitação energética do terreno; 2. A produção necessitar de várias regas ao dia; 3. A capacidade da bomba de furo; Recordando que a Acini não nos voltou a informar sobre o aumento de potência energética no local que em tempos tinha previsto e de modo a resolver um problema futuro, a Doce Baga Lda não tem alternativas para a Acini e vai avançar com a utilização do terreno para produção, pelo que no prazo de 90 dias a Acini ter concretizada uma solução para a situação apresentada. Findo esse prazo a Doce Baga irá proceder às alterações para ligação e alimentação da nova produção. (...)” 6. Em 23.11.2017, a ré enviou à autora uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor: “Tendo em conta que as alterações das condições de utilização do terreno anunciadas comprometem a sua exploração para o fim consagrado (produção agrícola), estamos a equacionar diversas soluções, entre as quais a deslocalização da exploração”. 7. Em 07.12.2017, a ré comunicou à autora o seguinte: “Considerando as limitações impostas na utilização do terreno impossibilitam o prosseguimento da atividade agrícola, vimos indicar que a produção será deslocalizada dentro do prazo estabelecido para o corte de fornecimento de energia elétrica e de água.” 8. Em 09.01.2018, a ré remeteu à autora nova mensagem de correio electrónico com o seguinte teor: “Na sequência do nosso último e-mail, através do qual comunicámos a V.Exas. que, considerando as limitações por V. impostas à utilização do terreno, que impossibilitam o prosseguimento da atividade agrícola nos termos contratualizados, iríamos deslocalizar a produção dentro do prazo estabelecido por V. para o corte de fornecimento de energia elétrica e de água. Deste modo, vimos agora comunicar que já deslocalizámos a exploração. Reiteramos, ainda, que tal situação deveu-se ao facto de, por causa imputável a V. Exas., inexistir condições mínimas e indispensáveis para a produção para a qual foi efectuado o arrendamento do terreno em apreço. Nesse sentido, no final deste mês serão devolvidas todas as chaves associadas. (...)” 9. Em 17.01.2018 a autora enviou à ré a mensagem de correio electrónico junta como documento n.º 8, cujo conteúdo se dá por reproduzido, no qual declarou, entre o mais, que não estabeleceu qualquer prazo para o corte de energia elétrica e água na comunicação mencionada em 5., que existiam alternativas para o fornecimento de energia eléctrica e água para a parcela descrita em 2., incluindo a colocação de um depósito, a colocação de painéis solares, a colocação de um transformador EDP e a partilha de equipamentos de rega existentes, bem como comunicou entender que o acordo mencionado em 2. se mantinha em vigor até 25 de Abril de 2020 e que continuava a ser devido o pagamento da renda. 10. Em 24.01.2018, a ré respondeu a essa mensagem através do documento junto sob o n.º 9 cujo teor integral se dá aqui por reproduzido, no qual declarou, entre o mais, que as alternativas apresentadas pela autora na precedente comunicação eram extemporâneas, comportavam “investimentos avultados”, cujo retorno não se encontrava assegurado dentro da vigência do acordo mencionado em 2. e que não conseguiria garantir a subsistência da produção agrícola sem água. 11. Em 27.02.2018, a autora enviou à ré nova mensagem de correio electrónico, mediante a qual lhe comunicou que considerava que o contrato estava a ser incumprido e que o considerava em vigor até 2020 (data do termo do período de seis anos fixado para duração do contrato), correspondente ao documento junto sob o n.º 10 e cujo teor se considera reproduzido. 12. Em final de Janeiro de 2018, a ré desocupou a parcela de terreno objecto do acordo firmado entre esta e a autora descrito em 2.. 13. A ré não entregou à autora as rendas respeitantes ao período de 01.01.2018 a 31.12.2018 que totalizam € 12.800,00. 14. Desde 25.04.2014, a ré sempre utilizou a água existente no terreno, por ambas as partes nisso terem acordado. (alterado). 15. Nessa sequência, o consumo de energia eléctrica necessário à utilização do furo artesiano sempre foi pago pela ré à autora. 16. A autora enviou a comunicação referida em 5. após a ré, em data não apurada de Setembro 2017, ter deixado de vender a sua produção de fruta à sociedade «Red Fields», da qual a gerente da autora, SA, é uma das sócias. 16-A. Em 4 de maio de 2017 a A. enviou à R. mensagem de correio eletrónico que consta do doc. 3 junto com a réplica, em que entre o mais referiu o seguinte: “Em breve irá existir nova cultura naquele espaço e teremos de fazer reunião para falar sobre a forma de utilização do furo existente.”. (aditado) 17. (eliminado) 18. (eliminado) 19. Por força dos factos descritos nos pontos 5. e 16., a ré deslocalizou a sua produção. (alterado) 20. A ré concluiu a limpeza do terreno no dia 30 do mês de Janeiro de 2018, data em que foi efectuada uma queimada, que comunicou à Câmara Municipal do Montijo e à Junta de Freguesia de Canha, apenas tendo ficado no espaço 4m3 de algumas raízes biodegradáveis. 21. Tendo o terreno ficado nivelado e sem ervas. 22. Em 30 de Janeiro de 2018, a ré enviou à autora, para a sua sede, a carta junta sob o documento n.º 3 com a contestação, cujo teor se dá por reproduzido, na qual lhe comunicava ter resolvido o acordo escrito mencionado em 2., carta essa que foi devolvida ao remetente, com a menção “não atendeu”. 23. Por força da comunicação mencionada em 5., no dia 1 de Dezembro de 2017, a ré tomou de arrendamento uma outra parcela de terreno, sita na Atalaia, Alcochete, a qual apetrechou com os equipamentos necessários ao prosseguimento da sua exploração agrícola. 24. Entre Dezembro de 2017 e Março de 2018 a ré, a fim de dar continuidade à sua plantação adquiriu: i. arames de sustentação das plantas, no valor global de € 237,94; ii. cordas de sustentação dos plásticos das estufas, despendendo neste material o montante global de € 1.560,26; 25. No período de tempo que mediou entre a desmontagem das estufas do terreno subarrendado à autora e a montagem das mesmas no novo terreno, a ré teve necessidade de armazenar as plantas em ambiente refrigerado, o que implicou um custo global de, pelo menos, € 1.080,43. 26. E a ré procedeu, igualmente, ao nivelamento de terras e respectiva gradagem, com um custo de € 583,00. 27. Para proceder ao cravamento da tutoragem, a ré adquiriu uma máquina perfuradora, no montante de € 225,89. 28. Na desmontagem da estrutura das estufas da parcela de terreno descrita em 2. foi gasto pela ré o valor de € 942,18 e no cravamento de pilares e respectivas marcações despendeu a ré € 1.047,96. 29. Para a instalação no novo terreno de condutas de abastecimento e respectivos acessórios de rega, despendeu a ré na aquisição de tubagens e respectivos acessórios € 714,97 e em válvulas de rega despendeu € 50,48. 30. Em mão-de-obra do instalador qualificado para realizar as ligações, afinações e testes de rega, suportou a ré o pagamento de € 723,42. 31. A ré teve de adquirir filme plástico para colocar na cobertura de algumas das estufas instaladas no novo terreno sito na Atalaia, despendendo para o efeito € 3.834,55. 32. O transporte do material existente no terreno das Taipadas para o terreno da Atalaia orçou em € 178,35. 33. O transporte de palotes, bem como o transporte de plantas das Taipadas para Montemor-o-Novo, comportou uma despesa para a ré de € 504,30. 34. O transporte do material do terreno das Taipadas para a Atalaia só se completou em Janeiro de 2018, com um custo de € 615,00. 35. O custo do transporte das plantas de Montemor-o-Novo para a Atalaia orçou em € 332,10. 36. Em mão-de-obra aos funcionários da ré, esta pagou € 6.135,41. 37. Após a ré ter comunicado a deslocalização da exploração para o novo terreno e esta ter sido autorizada pelo IFAP e PRODER, encontrando-se este novo terreno ‘’fora do limite das Zonas Desfavorecidas”, esta entidade procedeu à adequação da taxa de apoio anteriormente concedida, reduzindo-a de 60% para 50%, obrigando, assim, a ré a devolver o montante de € 18.148,58, o que esta fez. Factos Não Provados: 17. Para que fosse viável à ré continuar a explorar o terreno, após o termo do prazo de 90 dias estabelecido na comunicação da autora de 21.10.2017, aquela teria que executar um (novo) furo artesiano e celebrar contrato de fornecimento de energia eléctrica, com custos estimados de € 10.000,00. (aditado) 18. O que a ré não conseguiria concretizar no prazo de 90 dias. (aditado) 38. A referida parcela foi entregue pela ré à autora com raízes, detritos inerentes à colheita de framboesa, fruta podre, silvas e mato, o que obrigou a autora a contratar os serviços de uma empresa para proceder à limpeza e desmatação do terreno, com recurso a máquina retroescavadora, no que despendeu a quantia de € 2.500,00. 39. Em 17.01.2018 a ré comunicou à autora a intenção de pôr termo ao acordo descrito em 2.. 40. Foi no dia 18 de Setembro de 2017 que ocorreu o evento descrito em 16., sendo a sociedade autora uma das sócias da «Red Fields». 41. A autora recusou receber a carta mencionada em 22.. 42. A autora permitiu à ré, pelo prazo de seis meses, a utilização da água e da bomba, mediante o compromisso da ré de instalar na parcela referida em 2. um posto de transformação de energia eléctrica, para lhe proporcionar a bombagem de maior volume de água. IV. Razões de Direito - da (in)válida resolução do contrato de subarrendamento pela R. e suas consequências Alega a Recorrente que não existiu incumprimento do contrato da sua parte, já que nunca teve lugar qualquer corte de fornecimento de água, nem a R. a interpelou para cumprir qualquer obrigação que estivesse em falta nos termos do art.º 808.º n.º 1 do C.Civil, nem tão pouco houve uma comunicação formal de resolução do contrato pela R. como prevê o art.º 436.º n.º 1 do C.Civil, além de que, a ter existido um acordo sobre o uso das infraestruturas o mesmo seria nulo de acordo com o art.º 6.º n.º 2 e 5 do Regime do Arrendamento Rural. Conclui que a invalidade da resolução do contrato pela R. lhe dá o direito a haver o pagamento das rendas não pagas e a indemnização peticionada, carecendo de fundamento a procedência do pedido reconvencional. No que se refere ao direito aplicável e à interpretação das normas jurídicas de que se socorre, a sentença recorrida decidiu algumas questões em termos que a Recorrente não contesta e que se considera terem sido adequadamente ponderadas e expostas, constituindo por isso o ponto de partida para a decisão por este tribunal da questão controvertida, sem necessidade de qualquer reavaliação, que são as seguintes: (i) estamos perante um contrato de subarrendamento rural formalmente válido, por expressamente autorizado pelo proprietário/senhorio, sujeito ao regime do Decreto Lei 294/2009 de 13 de outubro, que por acordo das partes não incluiu as infraestruturas o que é admitido pelo art.º 4.º n.º 1 de tal diploma; (ii) a resolução do contrato pelo subarrendatário não está sujeita às condições taxativamente enunciadas no art.º 17.º n.º 4 de tal diploma; (iii)a resolução do contrato tem de observar a forma escrita e de ser feita por carta registada com AR, nos termos dos art.º 26.º e 29.º do DL 284/2009, (iv)a exigência de forma escrita para o contrato traduz uma formalidade ad substantiam, pelo que a cláusula verbal acessória relativa ao uso das infraestruturas é essencial e nula de acordo com o art.º 221.º do C.Civil, por contrariar a cláusula 4ª do contrato e não observar a forma legalmente exigida para o contrato; (v)só uma situação de incumprimento definitivo permite a resolução do contrato nos termos dos art.º 808.º 1 e 432.º n.º 1 do C.Civil. Mais foi decidido, em termos com os quais a Recorrente não se conforma, que com a comunicação que a A. fez à R. em 21 de outubro de 2017, a mesma agiu em abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium ao prevalecer-se da cláusula 4ª do contrato, o que representa o seu incumprimento definitivo, afirmando-se na sentença recorrida: “Termos em que, tendo embora ficado excluída a utilização de infraestruturas no contrato de subarrendamento, o direito consagrado em tal cláusula não podia ter sido pela autora exercido nos moldes em que se demonstrou tê-lo feito, isto é, de uma forma não admitida pela boa-fé que deve reger a conduta das partes na celebração e cumprimento dos negócios jurídicos que celebram, ficando esse direito “paralisado”, pois, caso contrário, estaria a permitir-se o exercício inadmissível de uma posição jurídica por parte da autora, pelo que a mesma não se pode prevalecer de tal cláusula quarta para intimar a ré nos moldes sobreditos. Decorrência da conduta da autora, a ré veio a deslocalizar a sua produção, dentro do prazo de 90 dias que a autora lhe concedeu, porquanto naturalmente receosa de ficar privada da utilização de água, essencial à manutenção e sobrevivência da sua produção agrícola e veio subsequentemente a resolver o contrato de subarrendamento. Como se deixou já expresso, a ré podia resolver o contrato de subarrendamento, com base em incumprimento pela outra parte, que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, ou alteração significativa da natureza e, ou, da capacidade produtiva do prédio (art.º 17.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro), para tanto tendo que comunicar a sua vontade resolutiva por carta registada com aviso de recepção enviada para a sede da autora ou por correio electrónico (art.ºs 26.º, 27.º e 29.º, do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro).(…) Essa conduta da autora é grave e desleal e evidencia que a mesma não pretendia continuar a assegurar o fornecimento de água à exploração da ré através das infraestruturas que esta sempre utilizou para o efeito com a sua anuência, já se tendo decidido que a autora não se pode prevalecer do teor da cláusula quarta do contrato de subarrendamento, pelas razões que ficaram previamente expressas, assim estando verificado o incumprimento definitivo da autora, fundado na sua descrita conduta concludente no sentido de não permitir subitamente a continuidade na utilização da água essencial à manutenção e subsistência da exploração da ré que constitui o fim do contrato de subarrendamento, conduta que, pela sua gravidade e consequências, tornou inexigível à ré a manutenção do contrato de subarrendamento (art.º 17.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro), para tanto tendo que comunicar a sua vontade resolutiva por carta registada com aviso de recepção enviada para a sede da autora indicada no contrato ou por correio electrónico (art.ºs 26.º, 27.º e 29.º, do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro). Assim, na sequência da concludente conduta da autora, de que não pretendia continuar a permitir a utilização da água nos moldes em que sempre o fez, teremos que concluir que a ré optou, por obter a resolução o contrato, conforme lhe permitem as disposições conjugadas do art.º 17.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro, com os art.ºs 432.º, n.º 1, 436.º, 801.º, n.º 2 e 808.º, do Código Civil.”. Vejamos então se pode dizer-se que a comunicação enviada pela A. à R. em 21.10.2017 representa uma recusa de cumprimento de uma obrigação contratual, no exercício abusivo do direito consagrado na clausula 4ª do contrato, reveladora do incumprimento definitivo do contrato pela A., suscetível de poder fundamentar a resolução do contrato pela R. Está em causa um contrato de arrendamento rural celebrado entre as partes, na modalidade de arrendamento agrícola, cujo regime legal é previsto no Decreto Lei 294/2009 de 13 de outubro O art.º 17.º do Decreto Lei 294/2009 de 13 de outubro reportando-se à cessação do contrato por resolução, estabelece no seu n.º 1: “Qualquer das partes pode resolver o contrato com base em incumprimento pela outra parte, que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, ou alteração significativa da natureza e, ou, da capacidade produtiva do prédio.” O incumprimento definitivo do contrato por parte senhorio não está especialmente previsto, pelo que temos de socorrer-nos do regime geral do incumprimento das obrigações, em particular do art.º 808.º do C.Civil, de acordo com o qual é considerada definitivamente não cumprida a obrigação, se o credor na sequência da mora perder o interesse que tinha na prestação, o que tem de ser apreciado objetivamente, ou se esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, no que comumente é designado por “interpelação admonitória”. O incumprimento de qualquer contrato pode assumir um caráter provisório, quando há simples mora, nos termos do art.º 804.º do C.Civil ou um carater definitivo, de acordo com o art.º 808.º n.º 1 do mesmo diploma. Tanto num caso como no outro, para que o incumprimento seja gerador de responsabilidades é necessário que haja culpa do devedor, nos termos, respetivamente, do disposto nos art.º 798.º e 804.º n.º 2 do C.Civil, mas só o incumprimento definitivo pode fundamentar a resolução do contrato, que se concretiza por declaração à outra parte, nos termos do art.º 436.º n.º 1 do C.Civil. A respeito dos fundamentos da resolução contratual diz-nos de forma sintética o Acórdão do TRP de 2 de maio de 2013 no proc. 1434/10.8TBGDM.P1 in www.dgsi.pt : “O fundamento legal de resolução de um contrato é, nos termos do art. 801º, a impossibilidade de cumprimento decorrente de incumprimento definitivo. O incumprimento definitivo de um contrato pode ocorrer em qualquer destas situações: -Inobservância de prazo fixo essencial para a prestação; -Comportamento do devedor que exprima inequivocamente a vontade de não querer cumprir o contrato; -Se o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação; -Se o devedor, caído em mora, não realizar a prestação dentro do prazo que razoavelmente lhe for fixado pelo credor.” O incumprimento do contrato é provisório, quando há simples mora do devedor, nos termos do art.º 804.º do C.Civil, correspondendo esta a um atraso culposo no cumprimento da obrigação, quando o devedor, na concreta estatuição do art.º 804.º n.º 2 C.Civil, por causa que lhe seja imputável, não realiza a prestação no tempo devido, continuando a prestação a ser ainda possível. E pode assumir também um caráter definitivo, de acordo com o art.º 808.º n.º 1 do C.Civil, quando o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, considerando-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação. Deixando de ter interesse na prestação o credor pode resolver o contrato como se houvesse impossibilidade de cumprimento, nos termos do art.º 801.º do CPC – neste sentido vd. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Vol. II, pág. 55. Esta perda de interesse do credor na prestação tem de verificar-se em resultado da mora do devedor e tem de ser apreciada objetivamente, como estabelece o art.º 808.º n.º 2 do CPC, referindo aqueles autores a pág. 56 da ob. cit.: “pretendendo-se evitar que o devedor fique sujeito aos caprichos daquele ou à perda infundada de interesse”. Independentemente da perda de interesse, o credor pode ainda resolver o contrato se o devedor não cumprir a prestação no prazo razoável que lhe tenha fixado – é a chamada interpelação admonitória a que alude o art.º 808.º n.º 1 do C.Civil que representa uma forma de converter a mora em incumprimento definitivo, consistindo na notificação formal dirigida ao devedor para que cumpra a sua obrigação num certo prazo, sob pena de incumprimento definitivo. Esta interpelação deve conter a intimação para o cumprimento; a fixação de um prazo perentório para o cumprimento e a cominação da obrigação se ter definitivamente por não cumprida se o cumprimento não ocorrer nesse prazo. Diz-nos o Acórdão do STJ de 31 de março de 2004 no proc. 03B4465 in www.dgsi.pt : “a interpelação para o contraente em mora cumprir - conhecida por interpelação admonitória - não é uma interpelação qualquer. Ela constitui uma expressa e formal intimação ou advertência ao devedor moroso de que, se não cumprir dentro do prazo razoável que o credor lhe fixar, incumpre definitivamente o contrato.” Importa então avaliar, em face dos factos que resultaram provados, se existia fundamento válido para a resolução do contrato de subarrendamento por parte da R. O art.º 4.º n.º 1 do Decreto Lei 294/2009 de 13 de outubro, admite que as partes convencionem expressamente que o contrato de arrendamento rural pode abarcar o uso de construções ou infraestruturas destinadas aos fins próprios da exploração, sendo certo que, no caso, ficou a constar do contrato celebrado entre as partes que o arrendamento não incluía quaisquer infraestruturas. Não obstante essa circunstância, desde o início do contrato em 25.04.2014 que a R. utilizou a água existente no terreno através do furo artesiano e da bomba que se situava no terreno da A., que não na parcela arrendada, com o acordo desta e pagando-lhe a eletricidade necessária à sua utilização, nada mais se tendo apurado quanto aos termos de tal acordo, designadamente se as partes acordaram em tal uso para toda a duração do contrato, em contrário do que ficou a constar da cláusula 4ª do contrato, sendo certo, no entanto, tal como considerou a sentença sob recurso, não pode conferir-se validade a tal acordo que é nulo, por inobservância da forma legal escrita. Verifica-se ainda, que em maio de 2017 a A. comunicou à R. que iria ter uma nova cultura no seu terreno, mais referindo “teremos de fazer uma reunião para falar sobre a forma de utilização do furo existente”. Mais tarde, com a comunicação de 21.10.2017, que representa na ótica da sentença o incumprimento contratual definitivo da A., esta informa a R. que ainda no decurso desse ano vai dar uso ao seu terreno, com produção agrícola, mais referindo a respeito das infraestruturas o seguinte: “Para o efeito as infraestruturas que estão a ser utilizadas pela Acini a título gratuito (Furo, bomba, wc, fossa, etc) vão passar a ter utilização efectiva pela Doce Baga Lda, pelo que a Acini deverá encontrar uma solução para a rega, consumo energético e Wc. A ter em conta: 1. A limitação energética do terreno; 2. A produção necessitar de várias regas ao dia; 3. A capacidade da bomba de furo; Recordando que a Acini não nos voltou a informar sobre o aumento de potência energética no local que em tempos tinha previsto e de modo a resolver um problema futuro, a Doce Baga Lda não tem alternativas para a Acini e vai avançar com a utilização do terreno para produção, pelo que no prazo de 90 dias a Acini ter concretizada uma solução para a situação apresentada. Findo esse prazo a Doce Baga irá proceder às alterações para ligação e alimentação da nova produção. (...)” Nesta comunicação a A. informou a R. de que iria passar a usar as infraestruturas do seu terreno que até então estavam a ser utilizadas exclusivamente pela R., pelo facto de ir passar a ter produção própria na restante parte do terreno, mencionando a necessidade da R. encontrar uma solução para a rega e consumo de energia, chamando a atenção para capacidade da bomba com a limitação energética existente no terreno, no significado desta poder não ser suficiente para retirar a água necessária à rega da produção de ambas. Mais alude a um aumento da potência elétrica no local que a R. teria ficado de diligenciar para resolver o problema do furo, de que não teve informação, afirmando que no prazo de 90 dias, ainda que não haja solução vai proceder à ligação para alimentar a sua nova produção. Entendeu a sentença recorrida, ser um abuso de direito por parte A. socorrer-se da cláusula 4ª do contrato ao intimar subitamente a R. a obter uma forma alternativa de extração e fornecimento de água, num curto espaço de tempo, sob pena de ficar privada de água na sua exploração. O instituto do abuso de direito tem a sua previsão no art.º 334.º do C.Civil que estabelece que é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito. Está em causa o exercício anormal de um direito em termos reprovados pela lei, ou seja, é respeitada a estrutura formal do direito, mas violada a sua afetação substancial, funcional ou teleológica. Não é qualquer conduta que é suscetível de integrar o conceito de abuso de direito, já que a norma em questão impõe que o titular do direito exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. Dizem-nos a este propósito, com grande propriedade, Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil anotado, pág. 217, em anotação a esta norma: «Exige-se, no entanto, que o excesso cometido seja manifesto. Os tribunais só podem pois fiscalizar a moralidade dos actos praticados no exercício de direitos ou a sua conformidade com as razões sociais ou económicas que os legitimam, se houver manifesto abuso. É esta a lição de todos os autores e de todas as legislações. Manuel de Andrade refere-se aos direitos “exercidos em termos clamorosamente ofensivos da justiça (Teoria Geral das Obrigações, pág. 63). O Prof. Vaz Serra refere-se, igualmente, à “clamorosa ofensa do sentimento jurídico socialmente dominante” (Abuso do direito, no Bol. N.º 85, pág. 253).» O Acórdão do STJ de 15 de fevereiro de 2002, in www.dgsi.pt refere a este respeito: “a teoria do abuso de direito serve, como se sabe, de válvula de segurança para casos de pressão violenta da nossa consciência jurídica contra a rígida estruturação, geral e abstracta, de normas legais, obstando a injustiças clamorosas que o próprio legislador não hesitaria em repudiar se as tivesse vislumbrado.” Razões de lealdade e confiança são inerentes ao princípio da boa fé, que se impõe, quer na negociação dos contratos, quer na sua execução, conforme dispõem, respetivamente o art.º 227.º e 762.º n.º 2 do C.Civil. O legislador vem impor através destas normas que as partes orientem o seu comportamento pelos princípios da boa fé, surgindo esta como regra normativa de conduta humana, dirigida para a colaboração entre as partes em qualquer relação negocial. Tal princípio de colaboração no âmbito das obrigações, tal como nos ensina Menezes Cordeiro, in Direito das Obrigações, 1º vol., pág. 145, determina, por um lado, um non facere, traduzido num dever geral de não prejudicar a parte contrária, do que decorre que está de má fé aquele que age com o objetivo direto ou necessário de lesar os interesses de outrem; e por outro lado, impõe a tomada de posições concretas por quem é parte no contrato, de acordo com as circunstâncias, com vista à satisfação do interesse da parte contrária, do que emergem diversos deveres acessórios como sejam os deveres de lealdade, honestidade, notificação, informação, etc. Pondo-se a questão de saber qual a “medida de colaboração” entre os contratantes, na execução do contrato que é exigida, pelo princípio da boa fé que se impõe por força do art.º 762.º n.º 2 do C.Civil, podemos socorrer-nos da norma legal que constitui o art.º 487 nº 2 do C.Civil que faz referência ao bonus pater familias e que nos diz que a culpa, na falta de outro critério legal, é apreciada pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso. A este respeito, ensina-nos Menezes Cordeiro, in ob. cit. pág. 153: “Não obstante a referência legal citada surgir, em sede de culpa, na responsabilidade civil, a figura do bom pai de família deve ser tratada, primordialmente, no campo da diligência devida, em termos de boa fé.” Uma das modalidades de que pode revestir-se o abuso de direito é o denominado venire contra factum proprium que tem sempre como pressuposto a criação de uma situação objetiva de confiança – uma conduta de alguém que lhe irá ser vinculativa no futuro, apresentando-se o exercício do direito como contraditório em face de conduta anterior, frustrando as expectativas associadas ao comportamento anterior. Refere Baptista Machado, in Obra Dispersa, vol. I, pág. 415 que o ponto de partida do venire é “uma anterior conduta de um sujeito jurídico que, objectivamente considerada, é de molde a despertar noutrem a convicção de que ele também, no futuro, se comportará, coerentemente, de determinada maneira”, podendo “tratar-se de uma mera conduta de facto ou de uma declaração jurídico-negocial que, por qualquer razão, seja ineficaz e, como tal, não vincule no plano do negócio jurídico. É sempre necessário que a conduta anterior tenha criado na contraparte uma situação de confiança, que essa situação de confiança seja justificada e que, com base nessa situação de confiança, a contraparte tenha tomado disposições ou organizado planos de vida de que lhe surgirão danos irreversíveis.” Visto sumariamente este regime, à luz do qual importa avaliar a situação concreta, verifica-se que os factos provados não permitem considerar que a referida comunicação da A. representou uma intimação súbita, nem tão pouco que pudesse constituir uma surpresa para a R. com o confronto de uma situação com a qual não podia razoavelmente contar. Por um lado, do contrato constava expressamente a não inclusão no arrendamento das infraestruturas do terreno da A., mais dele constando na cláusula 5ª a autorização prévia para que a R. pudesse realizar as benfeitorias que pretendesse para melhorar a sua produção, não podendo olvidar-se a invalidade do acordo das partes em sentido contrário; por outro lado, já cerca de 5 meses antes, a A. tinha referido à R. a necessidade de fazer uma reunião para falarem sobre a forma de utilização do furo informando que iria avançar com uma nova produção no seu terreno. Não se afigura por isso correto dizer que a A. com a sua conduta criou na R. a firme convicção de que podia usar na sua exploração a água fornecida pelas infraestruturas do seu prédio sem qualquer condicionamento ou limitação, não sendo também razoável que supusesse que a A. não iria rentabilizar o seu terreno com uma produção agrícola para a qual necessitaria de usar tais infraestruturas. Além do mais, o que a A. ali afirma é que se a R. não concretizar uma solução para a rega no prazo de 90 dias, iria fazer a ligação da rega para a sua produção findo tal prazo, afirmando que a potência energética no local, que condicionava o funcionamento da bomba e o volume de extração de água teria de ser levado em conta. Dali não pode retirar-se que findos os 90 dias referidos a R. deixaria em absoluto de poder utilizar o furo ou de ter água para a rega, o que dali resulta certo é que a A. tinha intenção de nessa data fazer a ligação da rega para a sua produção, devendo a R. no prazo de 90 dias concretizar uma solução uma vez que não voltou a informar a A. sobre o aumento da potência energética no local e atenta a limitada capacidade daquela infraestrutura. Em face desta realidade, não pode dizer-se que com a comunicação que a A. enviou à R. em 27.10.2017 a mesma excedeu manifestamente os limites da boa fé e que procurou exercer o direito que lhe era conferido pela cláusula 4ª do contrato, atuando em abuso de direito na modalidade de “venire conra factum proprium”, não estando preenchido o conceito de abuso de direito previsto no art.º 334.º do C.Civil. Mas ainda que assim não se entendesse, interpretando a comunicação da A. no sentido da mesma estar a avisar a R. de que findos os 90 dias sem que esta concretizasse uma solução deixaria de ter a possibilidade de usar a bomba artesiana da A., tal afirmação não é suscetível de só por si configurar um incumprimento do contrato, nem sequer na modalidade de mora ou incumprimento provisório, na medida em que se tratou de uma comunicação sem concretização efetiva, na afirmação de uma mera intenção futura, que se apresenta sem relevância jurídica, já que não foi realizado qualquer corte no fornecimento da água como vinha sendo feito até aí. Em razão dos factos que resultam provados é possível verificar que não estamos perante um caso de incumprimento do contrato de subarrendamento pela A., por a comunicação de 27/10/2017 não configurar uma imediata recusa do uso da bomba de água ou a colocação de um impedimento a que R. utilizasse a água do terreno, mas apenas a afirmação de uma intenção futura sem que se possa concluir pela sua concretização. Constata-se não haver uma qualquer situação de mora suscetível de poder motivar uma interpelação admonitória do devedor ou uma falta de interesse da R. na prestação, na previsão da 1ª parte do n.º 1 do art.º 808.º do C.Civil, já que a água do terreno e o uso da infraestrutura continuava e continuou a ser disponibilizado à R. Com respeito ao alegado incumprimento do contrato por parte da A., de acordo com o regime legal que se expôs, antes de resolver o contrato sempre a R. teria de intimar a A. a cumprir a obrigação que considerava em falta, não tendo resultado sequer provado que tenha procurado chegar a um entendimento com a mesma, no sentido de considerar soluções alternativas. Os factos mostram que perante a necessidade de concretizar soluções em 90 dias, houve por parte da R. uma alteração da sua vontade em manter o contrato de subarrendamento. A questão é que para o legislador a perda de interesse na prestação tem de resultar de uma situação de mora do devedor e ainda tem de fundamentar-se em qualquer coisa mais de relevante, já que o legislador não admite a resolução do contrato quando há apenas mora na prestação, impondo que a falta de interesse do credor seja avaliada de um ponto de vista objetivo, como estabelece o art.º 808.º n.º 2 do CPC. Não existindo sequer mora da A., a deslocalização da produção pela R. como ato unilateral, decidido e concretizado na sequência daquela comunicação de 17/10/2017, sem tentar falar com a A. para resolver a situação da rega da sua produção, configura um comportamento desleal e contrário ao princípio da boa fé que as partes devem ter sempre presente na execução do contrato, como previsto no art.º 762.º n.º 2 do C.Civil Não decorrendo dos factos provados qualquer incumprimento do contrato de subarrendamento pela A., conclui-se pela inválida resolução do contrato pela R. Resta ver a implicação desta questão na decisão sobre o pedido da A. e sobre o pedido reconvencional da R., que desde já se adiante ter de ser revogada. Sendo inoperante a resolução do contrato pela R., por inválida, este não se extinguiu por esta via. Reclama a A. a condenação da R. no pagamento das rendas em falta respeitantes ao período de vigência do contrato de janeiro de 2018 a 24 de abril de 2020, num total de € 14.798,90 acrescido da indemnização pela mora no valor de 50% de tal quantia e dos juros vencidos desde a data do vencimento de cada renda até integral pagamento. Mantendo-se o contrato de subarrendamento, mantém-se a obrigação de pagamento da renda por parte da R., estabelecendo o art.º 11.º n.º 1 do Regime do Arrendamento Rural que a renda é anual, tendo as partes estipulado, na cláusula 6ª do contrato, o seu pagamento até ao dia 8 do mês anterior do ano a que disser respeito. Conforme resultou provado (ponto 13 dos factos provados) a R. não pagou as rendas relativas ao período de 01.01.2018 a 31.12.2019. Sobre a mora do arrendatário rege o art.º 13.º que no seu n.º 1 prevê que: “Constituindo-se o arrendatário em mora, o senhorio tem o direito de exigir, além das rendas em atraso, uma indemnização igual a 50 % do que seja devido, salvo se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento.”. Embora a A. reclame o pagamento das rendas vencidas até ao fim do prazo contratualmente previsto para a vigência do contrato de subarrendamento, ou seja, até 24 de abril de 2020, importa ter em conta que em 09.01.2018 a R. comunicou à A. que havia deslocalizado a produção, por considerar inexistirem as condições mínimas indispensáveis para a produção (ponto 8 dos factos provados) informando que “no final deste mês serão devolvidas todas as chaves associadas”, tendo no final de janeiro desocupado a parcela de terreno subarrendada (ponto 12 dos factos provados), e em 30 de janeiro enviado à A. uma carta em que lhe comunicou ter resolvido o contrato (ponto 22 dos factos provados). Não obstante a R. não ter fundamento legal para proceder à resolução do contrato de subarrendamento, em face dos factos enunciados tem de entender-se que com aquela comunicação pretendeu pôr fim ao contrato, denunciando o mesmo o que é admitido pelo art.º 19.º do Regime do Arrendamento Urbano, que com a epígrafe “Cessação por oposição à renovação ou por denúncia”, estabelece na parte que à denúncia do arrendatário respeita: “1-O contrato de arrendamento cessa por oposição à renovação ou por denúncia de uma das partes, mediante comunicação escrita. 2 - A oposição à renovação ou a denúncia do contrato de arrendamento inclui obrigatoriamente todo o seu objecto. 3 – (…) 4 – (…) 5 - O arrendatário pode denunciar o contrato, sem possibilidade de oposição por parte do senhorio, nos casos de abandono da actividade agrícola ou florestal, ou quando o prédio ou prédios objecto do arrendamento, por motivos alheios à sua vontade, não permitam o desenvolvimento das actividades agrícolas ou florestais de forma economicamente equilibrada e sustentável. 6 - No caso previsto no número anterior, o arrendatário deve notificar o senhorio com a antecedência de um ano. 7 – (…) 8 – (…) 9 – (…) 10 – (…) 11 – (…).”. No sentido da equiparação da inválida resolução do contrato de arrendamento pelo arrendatário à denúncia unilateral do contrato, pronunciou-se já o Acórdão do TRG de 15 de setembro de 2022, no proc. 534/20.0T8VCT.G1 in www.dgsi.pt, nos seguintes termos: “Não assistindo aos recorridos/réus o direito de resolver o contrato através de comunicação enviada em 02-05-2019 na qual, além do mais, comunicaram a entrega do imóvel a efetivar no dia 30 de maio de 2019, a resolução do contrato de arrendamento é infundada pelo que a mesma deve equiparar-se à denúncia unilateral do contrato pelos arrendatários.”. Estando em causa um contrato de arrendamento rural com prazo certo, para efetivar a pretendida denuncia do contrato o arrendatário deve notificar o senhorio com a antecedência de um ano, de acordo com o mencionado art.º 19.º n.º 6 do Regime do Arrendamento Rural, no que constitui uma especificidade, designadamente no que respeita ao prazo do pré aviso, do regime do arrendamento urbano para a habitação previsto no art.º 1098.º do C.Civil, norma que a Recorrente invoca no seu recurso, afirmando ter o direito a haver da R. as rendas respeitantes ao prazo do pré-aviso, mas requerendo o pagamento das rendas durante todo o período de vigência do contrato. Sendo o prazo do pré aviso de um ano e tendo a R. notificado a senhoria em janeiro de 2018, já se vê que só pode ter-se como extinto o contrato de subarrendamento por denúncia da R. a partir de fevereiro de 2019, tendo por isso a A. o direito a haver a renda de janeiro de 2018 que a R. não pagou, bem como um ano de renda relativo ao prazo do pré aviso não observado de um ano, o que importa a quantia total de € 6.933,00 (€ 533,30 + € 6.400,00) a título de rendas vencidas e não pagas. Pede ainda a A. a condenação da R. no pagamento da indemnização correspondente a 50% do valor em falta, o que se admite com base no mencionado art.º 13.º do Decreto Lei 294/2009 que prevê que no caso de mora do arrendatário no pagamento das rendas, além destas o senhorio pode exigir uma indemnização igual a 50% do que for devido, exceto se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento das rendas, o que não foi o caso. Assim, tem a A. direito a haver da R. também a quantia de € 3.466,50 que corresponde a 50% do valor das rendas em dívida, a título de indemnização pela mora no pagamento destas. Como tem vindo a ser entendido pela nossa jurisprudência a cessão do contrato por denúncia do arrendatário não obsta a que seja devida tal indemnização – vd. a título de exemplo os Acórdãos do STJ de 10 de abril de 2014 no proc. 1301/11.8 TBFLG.G1.S1 in www.dgsi.pt que nos diz a respeito de caso semelhante: “Não se mostram, deste modo, violadas as disposições do CC enunciadas pelos recorrentes pela interpretação, realizada pelas instâncias, da norma constante do nº1 do art. 1041º do CC, ao não ter por postergado o direito do senhorio à indemnização agravada, ali prevista, no caso de mora no pagamento das rendas num caso em que – não tendo o locador peticionado a resolução do contrato - este cessou por iniciativa do próprio locatário (que, por razões pessoais, entendeu que era economicamente inviável o prosseguimento da actividade comercial que exercia no locado, entregando a respectiva chave ao senhorio, que prescindiu do prazo legalmente estabelecido para a denúncia do contrato de arrendamento).” Na situação em presença o contrato não foi resolvido pela A. com base na falta de pagamento das rendas, pelos que, nos termos do disposto nos art.º 11.º n.º 1, 13.º n.º 1 e 19.º n.º 4 do Regime do Arrendamento Rural e 762.º e 798.º do C.Civil, está a R. obrigada a pagar à A. a quantia de € 6.933,00 a título de rendas em falta, acrescido de 50% a título de indemnização pela mora, no valor de € 3.466,50, ascendendo o valor em dívida pela R. a € 10.399,50. No que respeita aos juros de mora que a A. também vem reclamar, sobre a data de vencimento de cada renda até integral pagamento, entende-se que os mesmo não são devidos, uma vez que o prejuízo resultante da mora no pagamento da renda já é ressarcido através da indemnização especial prevista no art.º 13.º n.º 1 do Decreto Lei 294/2009, o que sempre implicaria uma duplicação da indemnização pela mora que os juros também se destinam a ressarcir, nos termos do disposto no art.º 806.º n.º 1 do C.Civil. No sentido de que, sendo essa indemnização pela mora das rendas em falta já agravada, não há lugar a juros moratórios, pronunciou-se o Acórdão do STJ de 19 de setembro de 2019 no proc. 3493/16.0T8LRA.C1.S1 in www.dgsi.pt Resta apenas a questão do pedido reconvencional formulado pela R., uma vez que a sentença condenou a A. a ressarci-la dos prejuízos sofridos com a deslocalização da sua exploração. Como já ficou evidenciado, não podemos concluir pela existência de qualquer incumprimento do contrato por parte da A. que possa ter determinado a decisão da R. em deslocalizar a sua exploração. Na verdade, ainda que esta decisão tenha sido tomada na sequência da comunicação que a A. lhe fez a 27/10/2018, não pode deixar de entender-se que tal correspondeu a uma opção da R. em face do seu teor que afirmava a necessidade da R. concretizar uma solução no prazo de 90 dias, não tendo a mesma sequer logrado provar que tal não seria possível ou que seria inviável economicamente. Na ausência do ilícito contratual imputado pela R. à A., o que não permite que se tenha como integrada a previsão do art.º 798.º do C.Civil, já se vê que esta não pode ser responsabilizada pelos prejuízos e pelos custos que a R. teve com a deslocalização da sua produção, que nestes autos vem reclamar no âmbito do pedido reconvencional que formula e que àquela não são imputáveis, contrariamente ao que entendeu a sentença sob recurso, daí se impondo a revogação da decisão nesta parte e a consequente improcedência do pedido reconvencional, com a absolvição da A. do mesmo. Resta concluir pela parcial procedência da apelação, revogando-se a sentença recorrida que se substitui por decisão que condena a R. a pagar à A. a quantia total de € 10.399,50 a título de rendas vencidas e não pagas e respetiva indemnização, absolvendo a R. da restante parte do pedido, mais julgando improcedente o pedido reconvencional, absolvendo a A. de tal pedido contra ela formulado pela R. IV. Decisão: Em face do exposto, julga-se apelação parcialmente procedente revogando-se a sentença recorrida que se substitui por decisão que condena a R. a pagar à A. a quantia total de € 10.399,50 (dez mil trezentos e noventa e nove euros e cinquenta cêntimos) a título de rendas vencidas e não pagas e respetiva indemnização, absolvendo a R. da restante parte do pedido, mais julgando improcedente o pedido reconvencional, absolvendo a A. de tal pedido contra ela formulado pela R. Custas da ação e do recurso por ambas as partes na proporção do decaimento – art.º 527.º n.º 1 e n.º 2 do CPC. Notifique. * Lisboa, 28 de setembro de 2023 Inês Moura António Moreira Carlos Castelo Branco |