Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | SEARA PAIXÃO | ||
Descritores: | DESPEDIMENTO COLECTIVO SUSPENSÃO DO DESPEDIMENTO COMPENSAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 11/21/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Parcial: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO | ||
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Sumário: | O despedimento colectivo é ilícito, nos termos do art. 383º al. c) do Código de Trabalho de 2009, se o empregador não tiver posto à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo do aviso prévio, a compensação devida. Num juízo de mera probabilidade, havendo fundadas dúvidas acerca na natureza jurídica acerca de determinada verba que era processada mensalmente como ajuda de custo, não se pode reputar de ilícito o despedimento em virtude da compensação não integrar essa importância auferida pelo trabalhador, sobretudo quando a remuneração estabelecida contratualmente era de €137.000,00 anuais e a referida importância de €1.020,00 mensais. No âmbito da providência cautelar de despedimento está vedada ao tribunal a sindicância dos fundamentos que justificam o despedimento colectivo, por esta normalmente ser uma matéria complexa que mesma na acção definitiva o juiz só pode conhecer após o relatório do assessor nomeado para o efeito. (Elaborado pelo Relator) | ||
Decisão Texto Parcial: | Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório AA, intentou a presente providência cautelar de suspensão de despedimento colectivo contra BB, S.A., pedindo seja decretada a suspensão do seu despedimento. Regularmente citada, juntou a requerida o respectivo processo de despedimento colectivo e deduziu oposição escrita. Teve lugar audiência final, com observância de todos os formalismos legais conforme da respectiva acta consta, relegando-se para ulterior momento a decisão, conforme despacho naquela audiência proferido. Foi proferida decisão que julgou improcedente a providência cautelar. O Autor interpôs recurso desta decisão, juntando alegações e o Réu contra-alegou. E, por acórdão desta Relação de 14.07.2011, foi aquela decisão anulada, a fim de serem supridas certas deficiências da matéria de facto. Regressados os autos à 1ª Instância foi elaborada nova sentença e proferida a seguinte decisão: “Face ao exposto, julgamos o presente procedimento cautelar improcedente e em consequência não decretamos a suspensão do despedimento do Requerente”. O Autor, inconformado, interpôs o presente recurso e termina as suas alegações formulando as seguintes conclusões: (…) A Recorrida contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso. Remetidos os autos a este Tribunal, foram colhidos os vistos legais. Cumpre apreciar e decidir. Fundamentação de facto O tribunal recorrido considerou indiciariamente assentes os seguintes factos: 1. A Requerida comunicou ao Requerente, por carta datada de 30 de Dezembro de 2010, recebida por este a 6 de Janeiro de 2011, a decisão de fazer cessar o contrato de trabalho com fundamento em despedimento colectivo, carta essa que se encontra junta a fls. 27, dando-se aqui por transcrita. 2. Requerente e Requerida celebraram em 25 de Maio de 2006 o contrato de trabalho que se mostra junto a fls. 40 e cujo teor damos aqui por integralmente reproduzido. 3. O Requerente foi admitido com a categoria profissional de Director, categoria que manteve ao longo da sua relação laboral. 4. Durante a execução do contrato de trabalho, o Requerente colaborou, entre outros, nos seguintes projectos: • Centro de Estágio Estorial-Cascais; • Pista Gelo Artificial – Gare do Oriente; • Estoril Open Ticketing; • Sport TV – negociação e contratualização para assegurar presença em TV de alguns eventos; • Estoril Open – camarotes; • Comemorações Centenário da República – Jogos do Centenário; • Volvo Ocean Race. 5. Como complemento do pacote remuneratório estabelecido no contrato, foi acordado um conjunto de condições, as quais estão plasmadas na side letter que se encontra junta a fls. 48 e cujo conteúdo damos aqui por integralmente reproduzido. 6. Era o A quem coordenava o Projecto C: Centenário da República Portuguesa, desde 2009. 7. Simultaneamente, continuou a colaborar em outros projecto da Requerida. 8. No âmbito do processo de despedimento colectivo foi entregue individualmente aos trabalhadores abrangidos, em 25 de Novembro de 2010, a comunicação escrita da intenção de proceder ao despedimento colectivo a que alude o n.º 3 do artigo 360.º do Código do Trabalho (tendo a última destas comunicações sido recebida em 30 de Novembro de 2010 – in casu pela trabalhadora Maria ...). 9. Não existindo na Requerida qualquer estrutura representativa dos trabalhadores, foram os trabalhadores abrangidos convidados a designar, no prazo de 5 dias úteis, uma comissão representativa, com o máximo de cinco elementos. 10. Na mesma data, a Requerida remeteu informação ao serviço do ministério responsável pela área laboral com competência para o acompanhamento e fomento da contratação colectiva, in casu a Direcção-Geral do Emprego e Relações de Trabalho (DGERT), informando que nessa data havia sido iniciado um processo de despedimento colectivo e que a Requerida havia convidado os trabalhadores envolvidos no processo a constituírem uma comissão representativa. 11. No dia 30 de Novembro de 2010, a Requerida foi informada da constituição da comissão ad hoc representativa dos trabalhadores, a qual seria constituída pelos trabalhadores CC, DD, EE, FF e pelo Requerente. 12. Após ter sido informada da constituição da aludida comissão, a Requerida, no dia 3 de Dezembro de 2010, facultou os elementos adicionais a que alude o n.º 2 do artigo 360.º do Código do Trabalho, aos cinco elementos que a constituíram. 13. Na mesma data, a Requerida remeteu idêntica informação à DGERT. 14. No dia 15 de Dezembro de 2010, e após confirmação de disponibilidade de agenda pela DGERT, a Requerida informou os membros da comissão ad hoc a respeito da data da reunião de negociação, a realizar dia 17 de Dezembro de 2010, pelas 15:30 horas, nas instalações da sede da Requerida. 15. Neste contexto, realizou-se nas instalações da Requerida, no dia 17 de Dezembro de 2010, pelas 15:30 horas, reunião de negociação, na qual esteve presente a Requerida, acompanhada pelos seus peritos, os cinco membros da comissão representativa dos trabalhadores, acompanhados pelo seu perito, e o representante da DGERT, em cumprimento ao disposto nos artigos 361.º, n.ºs 1, 4 e 5 e 362.º, n.º 1, ambos do Código do Trabalho. 16. Em sede de reunião de negociações, foi solicitado à Requerida pela comissão representativa dos trabalhadores, na pessoa do seu perito, alguns documentos, a requerer formalmente e por escrito em momento posterior, o que veio a suceder em 20 de Dezembro de 2010, mediante mensagem de correio electrónico enviada pelo perito da comissão representativa aos peritos da Requerida. 17. Em 28 de Dezembro de 2010, pelas 11:30 horas, realizou-se nova reunião de negociação, na qual estiveram presentes a Requerida, acompanhada pelos seus peritos, a Sra. EE, acompanhada pelo perito da comissão representativa dos trabalhadores, e o representante da DGERT, na qual foi entregue à comissão representativa dos trabalhadores e à DGERT a documentação que havia sido por aquela solicitada. 18. A pedido da comissão representativa dos trabalhadores, e a fim de ser concedido prazo para análise da documentação entregue, foi acordada a suspensão dos trabalhos e agendada a realização de nova reunião de negociação, a ocorrer em 30 de Dezembro de 2010, pelas 14:30 horas. 19. Em 30 de Dezembro de 2010, pelas 15:00 horas, realizou-se nova reunião de negociação, na qual estiveram presentes a Requerida, acompanhada pelos seus peritos, o perito da comissão representativa dos trabalhadores em representação da mesma, e o representante da DGERT, tendo nessa reunião sido formalmente encerrada a fase de informações e negociação a que alude o artigo 361.º do Código do Trabalho. 20. As comunicações das decisões finais de despedimento foram remetidas pela Requerida aos trabalhadores em 30 de Dezembro de 2010. 21. A Requerida comunicou ao Requerente, em 30 de Dezembro de 2010, que a data de cessação do respectivo contrato de trabalho seria o dia 2 de Fevereiro de 2011. 22. O Requerente, mediante carta datada de 7 de Janeiro de 2011, declarou à Requerida que: «Relativamente à decisão de despedimento colectivo, comunico a V.Exas., nos termos e para os efeitos do disposto no Art. 366º n.ºs 4 e 5 do Código do Trabalho, revisto pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que não aceito o despedimento, que reputo de ilícito, motivo pelo qual não deverão transferir o montante da compensação para a conta bancária que consta dos vossos registos, ilidindo, deste modo, a presunção de aceitação do despedimento. Mais informo, para o caso da referida transferência vir a ser realizada, que foram dadas instruções ao gestor de conta para proceder à sua imediata devolução». 23. Tendo a Requerida respondido ao Requerente que: «Relativamente à sua declaração de não-aceitação do despedimento, e salvo indicação em contrário por parte de V.Exa., vem a BB informar que, de acordo com o expressamente solicitado por V.Exa na carta a que ora se responde, não irá transferir o montante da compensação legal que lhe é devida para a conta bancária que consta dos registos desta Empresa. Mais se informa e reitera que, o referido pagamento só não será realizado atento o solicitado na sua carta, a pedido e em exclusivo interesse de V.Exa., termos em que, não poderá tal circunstância vir a ser considerada e/ou invocada, a nenhum título, como motivo de ilicitude do seu despedimento.». 24. A actividade da Requerida assenta, essencialmente, na angariação de patrocínios para os diversos eventos desportivos, recreativos, culturais ou sociais que promove. 25. Mediante o referido patrocínio, as empresas patrocinadoras beneficiam da publicidade e divulgação da sua imagem, marcas, produtos e/ou serviços, em eventos com elevada visibilidade junto do público. 26. Atendendo a que os orçamentos e custos despendidos pelas empresas em acções de comunicação e marketing são dos primeiros a serem afectados pela crise, em virtude da já mencionada concentração de recursos nas actividades produtivas nucleares e primárias, a principal fonte de receitas da Requerida consubstanciada na angariação de patrocínios foi fortemente afectada. 27. Se por um lado diversas empresas optaram por diminuir os investimentos em publicidade e promoção, por seu turno outras empresas acometeram aos seus departamentos internos as funções de comunicação, imagem e marketing, reduzindo custos com acções externas, como seja o patrocínio de eventos. 28. A progressiva selectividade dos custos associados ao patrocínio de competições ou eventos desportivos tende a privilegiar os desportos de massa, com notório prejuízo para algumas das actividades que a Requerida tem vindo a patrocinar, com menor expressão junto do público em geral. 29. Todas estas circunstâncias têm afectado fortemente a actividade da Requerida, o que é bem evidenciado pela degradação dos seus indicadores de aferição dos níveis de serviços prestados, rácios de autonomia financeira, rácios de solvabilidade e rácios de liquidez geral, pondo em causa o seu equilíbrio económico-financeiro e forçando à adopção de medidas de redução de custos, em particular custos com pessoal. 30. O Projecto C: Centenário da R.P. foi constituído como uma estrutura autónoma equiparável a um departamento com objectivos específicos associados ao desenvolvimento das especificações do Caderno de Encargos inerentes ao contrato com o estado e com alocação própria de receitas e despesas. 31. Incumbia ao Requerente o desenvolvimento do Projecto C: Centenário da R.P. 32. O Projecto C: Centenário da R.P. detinha uma natureza temporária e delimitada no tempo, com termo a 31 de Dezembro de 2010, porque dependente do período de concessão do referido Projecto. 33. O Requerente foi contratado para um projecto muito específico e relevante para a actividade da Requerida, consubstanciado na concepção, desenvolvimento e gestão de uma infra-estrutura desportiva definitiva para sede do Estoril Open na Doca Pesca, atenta a sua experiência profissional no Pavilhão Atlântico. 34. Não foi construída, ou sequer aprovada em projecto, qualquer estrutura definitiva para a sede do Estoril Open, em cuja concepção e desenvolvimento o Requerente pudesse intervir. 35. A Requerida tentou encontrar funções alternativas que o Requerente pudesse vir desempenhando, chamando-o a intervir em diversas iniciativas ou potenciais negócios. 36. Com o surgimento do Projecto C: Centenário da R.P. foi o Requerente alocado ao mesmo por forma a que a Requerida ainda pudesse aproveitar a sua força de trabalho, dado não se mostrar viável a manutenção de um posto de trabalho que se subsumia à mencionadas intervenções. A Recorrida contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso. Remetidos os autos a este Tribunal da Relação e colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. As questões que emergem das conclusões do recurso são as seguintes: - nulidade da sentença por omissão de pronúncia em virtude da compensação não ter sido calculado de acordo com a cls. 11ª do contrato de trabalho; - ilicitude do despedimento em virtude da compensação não incluir a totalidade da retribuição do Requerente; - alteração dos fundamentos do despedimento colectivo; - apreciação dos fundamentos invocados para o despedimento colectivo . Fundamentação de direito Quanto à nulidade de sentença por omissão de pronúncia relativamente ao montante da indemnização resultante da cls. 11ª do contrato de trabalho celebrado pelas partes. Antes de mais importa referir que na data do despedimento, bem como do início do procedimento que a ele conduziu, estava em vigor o CT/2009, aprovado pela Lei nº 7/2009 de 12 de Fevereiro, sendo esse código o aplicável. Na referida cls. 11ª do contrato de trabalho celebrado entre a Recorrida e o Recorrente, as partes acordaram o seguinte: 1. Caso a primeira contratante denuncie, rescinda ou faça cessar por qualquer forma o presente contrato de trabalho, obriga-se a pagar ao segundo contraente uma compensação de valor correspondente a todas as remunerações que este teria direito a receber durante cinco anos de duração efectiva do presente contrato. 2. Exceptua-se do disposto no número anterior a situação de despedimento do segundo contraente com qualquer um dos fundamentos de justa causa previstos na lei do contrato de trabalho”. O Recorrente entende que a recorrida se encontrava obrigada a colocar à disposição do recorrente a indemnização correspondente à retribuição base X 14 meses X 5 anos, o que não fez, omitindo a existência daquele crédito exigível em virtude da cessação do contrato de trabalho, o que gera a ilicitude do despedimento nos termos do disposto no art. 383 a) do CT. O Recorrente alega que a sentença recorrida não tomou posição sobre esta questão, sendo, por isso, nula, nos termos do art. 668º nº 1 al. d) do CPC. Acontece que a sentença recorrida sobre essa questão referiu o seguinte: “A cls. 11ª do contrato de trabalho celebrado entre as partes que estipula o que poderemos, porventura de forma imprópria, apelidar de cláusula penal pela denúncia unilateral do contrato de trabalho, suscita muitas dúvidas quanto à sua validade face ao preceituado no art. 339º do Código do Trabalho”. E, depois de fazer referência a um acórdão desta Relação onde se decidiu que “a compensação a pagar aos trabalhadores nos termos do art. 401º nº 1 do CT/2003 deve ser calculada através da retribuição base tal como é definida no art. 250 nº 2 al. al. d) e das diuturnidades, com exclusão de todas as outras prestações, ainda que sejam fixas, regulares e periódicas e que havendo dúvidas aceitáveis quanto ao montante da compensação devida posta à disposição do trabalhador, resultantes da contagem do tempo de serviço, não se verifica a ilicitude do despedimento” refere o seguinte: “Mas pese embora este nosso entendimento, continuamos a pôr a tónica na recusa liminar do requerente em perceber toda e qualquer compensação que a requerida pudesse querer pagar-lhe, nem sequer discutindo em sede própria o correcto cálculo a atender, pelo que não poderá agora, somos em crer, socorrer-se do respectivo vício, para o qual, a verificar-se, no mínimo concorreu.” Vemos assim que a sentença recorrida, bem ou mal, pronunciou-se sobre a referida questão e percebe-se que o sentido da decisão é o de que o referido vício, a existir, não acarreta a ilicitude do despedimento. Inexiste, pois, a alegada nulidade de sentença por omissão de pronúncia. Mas mesmo que se entendesse que a sentença recorrida não fundamentou devidamente a decisão, nos termos do art. 715º do CPC pode este tribunal da Relação conhecer da questão para efeitos de saber se em termos de mera probabilidade, como é próprio das providências cautelares, se poderia considerar ilícito o despedimento em virtude do empregador não ter calculado a compensação devida pelo despedimento colectivo de acordo com a referida cláusula 11ª. O regime da cessação do contrato de trabalho tem natureza imperativa, como dispõe o art. 339º nº 1 do CT/2009, permitindo contudo que os critérios de definição de indemnizações ou os valores das indemnizações possam ser regulados por instrumento de regulamentação colectiva – nº 2 e 3 do mesmo artigo. Dispõe o art. 3º nº 5 do mesmo código que “sempre que uma norma legal reguladora do contrato de trabalho determine que a mesma pode ser afastada por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho entende-se que o não pode ser por contrato de trabalho. Daqui resulta claramente que a cls. 11 do contrato de trabalho, que fixa o montante da indemnização em caso de cessação do contrato de trabalho promovido pelo empregador, na interpretação de que a mesma é aplicável ao caso do despedimento colectivo, ofende preceitos imperativos que subtraem à vontade das partes a definição do valor da indemnização pela cessação ilícita do contrato de trabalho. Mas, analisando melhor a cláusula em questão, verifica-se que o seu nº 2, exclui da previsão a que se refere o nº 1 “a situação de despedimento do segundo contraente com qualquer um dos fundamentos de justa causa previstos na lei do contrato de trabalho”. Ora, no caso vertente, estamos perante uma situação de despedimento com base em fundamento de justa causa, pois o despedimento colectivo pressupõe uma justa causa prevista na lei do trabalho, embora de natureza objectiva, o que desde logo exclui a obrigatoriedade do cálculo da compensação ter de ser efectuado de acordo com a referida cls. 11º. Podemos, assim, concluir, que não existe a probabilidade séria de ilicitude do despedimento em virtude da compensação devida pelo despedimento colectivo não ter sido calculada de acordo com o disposto na cls. 11ª do contrato de trabalho celebrado pelas partes. Quanto ao objecto do recurso Da impugnação da matéria de facto O Recorrente nas suas alegações – mas não nas conclusões - refere que não deviam ser dados como provados os factos constantes dos pontos 30 a 36, que foram expressamente impugnados no requerimento inicial. A decisão recorrida fundamentou a matéria de facto indiciariamente provada nos seguintes termos “com base no processo de despedimento colectivo apenso a estes autos, nos documentos juntos pelo requerente e nas testemunhas inquiridas”. Acontece que o recorrente não impugnou a matéria de facto nos termos previstos no art. 685º-B nº 1 b) e nº 2 do CPC, não indicando quais os concretos meios de prova que impunham decisão diversa, razão pela qual se rejeita o recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto. E igual consequência resultaria do facto de não ter levado esta questão às conclusões do recurso, nos termos exigidos pelo art. 685º-A do CPC. Não se conhece, pois, da impugnação da matéria de facto. Do montante da compensação O Recorrente invoca, ainda, a ilicitude do despedimento por não ter sido colocada à sua disposição a totalidade da compensação legal, pois que a sua retribuição base era integrada pelo vencimento base de €10.103,80, que consta dos recibos, acrescida do montante de €1.020,00, a que alude a side letter junta aos autos, que lhe era pago todos os meses por cheque. A fls. 48 foi junto um documento constituído por uma carta da Recorrida dirigida ao Recorrente, na qual são propostas as condições remuneratórias que acrescem ao contrato de trabalho celebrado entre ambos. Aí se refere, na parte que aqui interessa, o seguinte: I. Remuneração base – fixada no contrato II. Remuneração extra – A título de “ajudas de custo”, 12 meses ao ano, receberá ainda a importância mensal de €1.020,00 (mil e dez euros, de forma a perfazer uma remuneração anual líquida de €91.000,00. A Recorrida atribuiu ao Recorrente, através desse documento, um complemento remuneratório, a título e ajudas de custo, de €1020,00 mensais, doze meses ao ano. Coloca-se agora a questão de saber se essa importância integrava a retribuição base para efeitos de cálculo da compensação devida pelo despedimento colectivo. Dispõe o art. 366º do CT o seguinte: “1. Em caso de despedimento colectivo, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade. 2. Em caso de fracção de ano, a compensação é calculada proporcionalmente. 3. A compensação não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.” Por sua vez o art. 383º al. c) do mesmo código refere que “o despedimento colectivo é ainda ilícito se o empregador não tiver posto à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo do aviso prévio, a compensação a que se refere o art. 366º e os créditos exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho, sem prejuízo do disposto na parte final do nº 4 do art. 363º”. A lei exige, pois, que a compensação e demais créditos laborais exigíveis pela cessação do contrato de trabalho, sejam postos à disposição do trabalhador na sua totalidade até ao termo do aviso prévio. Mas a compensação a que se refere o art. 366º reporta-se à retribuição base e diuturnidades, tal como estas são definidas no art. 262º do CT. Aí se refere que “se entende por retribuição base a prestação correspondente à actividade do trabalhador no período normal de trabalho”. Ou seja, retribuição base é aquela que corresponde ao montante fixo mensal auferido pelo trabalhador e que nos termos do contrato ou do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho aplicável, corresponde ao exercício da actividade por ele desempenhada no período normal de trabalho que tenha sido acordado; é aquela que está apenas relacionada com a actividade desempenhada e não com as circunstâncias desse desempenho – Ac RL de 16.01.2008 Proc. 7884/2007 em www.dgsi.pt. Ora, no caso vertente, a referida importância de €1020,00 mensais, doze meses ao ano, foi fixada numa side letter, documento que definia condições complementares da retribuição e atribuída a título de “ajudas de custo”. Ao passo que no contrato de trabalho foi fixada a retribuição anual ilíquida de 137.200,00, dividida em catorze prestações mensais de igual valor que incluem os subsídios de férias e de Natal, importância que era actualizável de acordo com o índice de inflação oficial - cls. 2ª do contrato. Parece assim que aquela importância de €1.020,00 mensais a que alude a side letter, era uma remuneração complementar atribuída a título de ajudas de custo que não integrava a retribuição base mensal. Note-se que segundo alega o recorrente a retribuição base era paga através de recibo, enquanto a aquela importância referida na side letter era paga mensalmente por cheque, o que claramente inculca a ideia de que se tratava de prestações de diferente natureza. Pode assim afirmar-se que a Recorrida não estava necessariamente obrigada a incluir aquela importância no cálculo da compensação em virtude de ser juridicamente duvidoso que aquela importância integrasse a retribuição base do Recorrente. E como refere Pedro Furtado Martins, em Cessação do contrato de trabalho 3ª ed. pag. 365 “esta condição de licitude do despedimento só exige a colocação à disposição do trabalhador do valor que o empregador legitimamente e de boa-fé tem razões para entender como devido”. Assim, não se verifica a probabilidade séria de ilicitude do despedimento pelo facto da compensação posta à disposição do trabalhador não integrar a quantia mensal de €1.020,00, a que aludia a side letter. Dos pontos 20 a 23 dos factos provados resulta que a Recorrida comunicou a sua decisão de despedimento ao ora Recorrente em 30 de Dezembro de 2010 e que a data de cessação do respectivo contrato de trabalho seria o dia 2 de Fevereiro de 2011. Nessa comunicação a Recorrida indicou o valor da compensação como sendo de €43.847,72, correspondente a um mês de retribuição base por cada ano de antiguidade de antiguidade sendo a fracção calculada proporcionalmente – doc. junto a fls. 27 a 30. Nessa comunicação a Recorrida afirmou: “caso detecte algum erro material neste cálculo, ou seus pressupostos, por favor comunique-nos, a fim de sendo o caso se promover a respectiva rectificação”. O ora Recorrente mediante carta datada de 7 de Janeiro de 2011, dirigida à Recorrida, declarou: «Relativamente à decisão de despedimento colectivo, comunico a V.Exas., nos termos e para os efeitos do disposto no Art. 366º n.ºs 4 e 5 do Código do Trabalho, revisto pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que não aceito o despedimento, que reputo de ilícito, motivo pelo qual não deverão transferir o montante da compensação para a conta bancária que consta dos vossos registos, ilidindo, deste modo, a presunção de aceitação do despedimento. Mais informo, para o caso da referida transferência vir a ser realizada, que foram dadas instruções ao gestor de conta para proceder à sua imediata devolução». Nesta sua missiva o recorrente não invocou a existência de qualquer lapso no cálculo da compensação, tendo recusado a compensação por reputar de ilícito o despedimento, afirmando expressamente pretendia, dessa forma ilidir a presunção de aceitação do despedimento. Em lado algum dessa sua missiva alegou que a recusa do pagamento da compensação se ficava a dever ao facto desta ser inferior à compensação legalmente devida. Por isso, não se compreende a alegação do Recorrente quando refere que “se limitou a recusar a transferência do montante da compensação indicada na comunicação do despedimento, por este ter sido, de forma querida e intencional, mal calculado pela Recorrida e por ser inferior à compensação legalmente devida”. Aliás, se o Recorrente entendia que a compensação estava mal calculada, nomeadamente por não integrar a importância referida na side letter, sempre podia ter recusado o recebimento da compensação que lhe era oferecida (para ilidir a aceitação do despedimento, como fez), mas simultaneamente reclamar do montante da mesma, até porque a compensação podia ser paga até ao fim do aviso prévio que terminava em 2 de Fevereiro de 2011, havendo, assim, tempo suficiente para o empregador corrigir o eventual lapso. Mas como já referimos, num juízo de mera probabilidade, havendo fundadas dúvidas acerca na natureza jurídica da importância referida na side letter, não se pode reputar de ilícito o despedimento em virtude da compensação não integrar essa importância auferida pelo trabalhador. Improcedem, assim, as al. B) a G) das conclusões do recurso. Quanto à alteração dos fundamentos do despedimento colectivo. O Recorrente discorda da Sentença Recorrida, por esta ter referido a dado passo que “em ponto algum da lei está vedado ao empregador, no decurso do processo de despedimento colectivo, completar ou acrescentar fundamentos aos inicialmente avançados”, permitindo à Recorrida, em consequência, adaptar, alterar ou corrigir os fundamentos e factos que a levaram a seleccionar o Recorrente para integrar o procedimento de despedimento colectivo, pelo que teria violado o disposto nos Artigos 3600 n.o 2 e 3630 do CT. O que está em causa é o facto de a descrição dos motivos invocados para o despedimento colectivo (Ponto V - Motivos Estruturais - Reestruturação da Organização do Anexo I), ter referido o seguinte: "Em particular, a estrutura de pessoal da BB mostra-se excessiva e desajustada face ao actual contexto económico nos seguintes departamentos da empresa: Departamento Administrativo, Departamento de Comunicação e Imagem e Projecto C; Centenário da RP. ( ... ) Por seu turno, será igualmente extinto o posto de trabalho especificamente criado para o desenvolvimento do Projecto C: Centenário da RP., dado o fracasso deste último e, consequentemente, a inutilidade superveniente do referido posto, cujos custos não se justificam face à difícil situação económico-financeira da BB. Em face do exposto, o procedimento de despedimento colectivo tem, assim, por fundamento motivos de mercado e estruturais, sendo realizado ao abrigo do disposto no artigo 359°, n. ° 1 e n. ° 2, alíneas a) e b) do Código do Trabalho. n E na comunicação da decisão do despedimento ter referido o seguinte: "Por seu turno foi extinto o posto de trabalho especificamente criado para o desenvolvimento do Projecto C: Centenário da R.P. Com efeito, atendendo a que o referido projecto, adjudicado pelo Estado Português à BB, assumia uma natureza provisória e temporalmente delimitada, a conclusão do mesmo findo o período de adjudicação determinou a extinção do posto de trabalho que lhe estava associado. Por outro lado, os projectos para os quais o Trabalhador foi inicialmente contratado, designadamente a construção, desenvolvimento e gestão de estruturas desportivas no âmbito do projecto de reconversão da Doca Pesca associado à nova competição World Sailing League, não chegaram a ter o desenvolvimento esperado em virtude do cancelamento do referido evento desportivo, não existindo no actual contexto da empresa qualquer outro posto de trabalho compatível com as suas competências. Em face do exposto, o procedimento de despedimento colectivo teve, assim, por fundamento motivos de mercado e estruturais, tendo sido realizado ao abrigo do disposto no Art. 359° n.º 1. O Recorrente alega que a Recorrida não pode adaptar, alterar ou corrigir os factos que levaram à selecção do Recorrente para integrar o despedimento colectivo, alegando concretamente, que o Projecto C: Centenário da RP, “não é afinal um departamento, mas antes um projecto dotado de autonomia, com alocação de receitas e despesas próprias”. Em primeiro lugar, a comunicação inicial alude a “Departamento de Comunicação e Imagem e Projecto C; Centenário da RP”, o que pode ter dois entendimentos, ou o “projecto C, centenário da RP” integrava o departamento de Comunicação e Imagem” ou era um serviço distinto, sendo que em nenhuma destas hipóteses se refere que o Projecto C; Centenário da RP”, fosse um departamento, como o recorrente pretende fazer crer. Em segundo lugar, não cremos que haja uma alteração, ou correcção ou sequer adaptação dos fundamentos que levaram à selecção do recorrente para integrar o despedimento colectivo, porquanto, quer na comunicação inicial, quer na decisão inicial, alude-se “ao posto de trabalho especificamente criado para o desenvolvimento do Projecto C: Centenário da R.P.” referindo-se na primeira “vais ser extinto…” e na segundo “foi extinto…” Acresce que a referência a “Departamento” feita no início da frase da comunicação inicial, podia perfeitamente ser alterada posteriormente, sem que isso acarretasse qualquer irregularidade do procedimento do despedimento colectivo. O Recorrente alega, ainda, que a Recorrida também não podia acrescentar novos factos aos que constam da comunicação inicial remetida aos trabalhadores selecionados para o despedimento colectivo, referindo-se designadamente ao seguinte trecho da decisão final de despedimento que não constava da comunicação inicial: Por outro lado, os projectos para os quais o Trabalhador foi inicialmente contratado, designadamente a construção, desenvolvimento e gestão de estruturas desportivas no âmbito do projecto de reconversão da Doca Pesca associado à nova competição World Sailing League, não chegaram a ter o desenvolvimento esperado em virtude do cancelamento do referido evento desportivo, não existindo no actual contexto da empresa qualquer outro posto de trabalho compatível com as suas competências. Também quanto a este ponto carece de razão o Recorrente. Pois, como bem refere Pedro Furtado Martins ([1]), “no despedimento colectivo, ao contrário do que sucede no despedimento por facto imputável ao trabalhador, não tem sentido exigir que a motivação constante das decisões finais coincida de modo pleno e exacto com as razões determinantes do despedimento colectivo que o empregador enunciou na comunicação inicial a que se refere o art. 360º e que poderão ser posteriormente desenvolvidas e melhor explicitadas, quando não mesmo alteradas em função do resultado da fase de informações e negociação”. Assim, nada obstava a que a Recorrida pudesse na decisão final invocar aquela motivação que é meramente explicativa, e que, aliás, não se revela de grande importância face aos restantes factos provados. De qualquer modo, quer a referência a departamento na comunicação inicial, quer a inclusão daquele fundamento na decisão final, não constituem fundamento que pudesse determinar a ilicitude do despedimento colectivo, uma vez que nos termos da al. a) do art. 383º do CT apenas constituem fundamento da ilicitude do despedimento a falta da comunicação inicial, prevista nos nº 1 e 4 do art. 360º ou se o empregador não tiver promovido as negociações a que alude o nº 1 do art. 361º do CT. Estes requisitos foram cumpridos pela Recorrida, razão pela qual o despedimento colectivo não padece de ilicitude do despedimento pelos alegados fundamentos. Quanto à apreciação dos fundamentos do despedimento colectivo. Alega o Recorrente que a sentença recorrida estava obrigada, nos termos do Art. 39º do CPT, a proceder a uma análise sumária dos fundamentos do despedimento colectivo, que permitisse ou possibilitasse a verificação dos factos que levaram à selecção e inclusão do Recorrente no procedimento de despedimento colectivo. Refere o art. 381º al. b) do CT que o despedimento por iniciativa do empregador é ilícito se o motivo justificativo for julgado improcedente. Porém, no âmbito da providência cautelar de suspensão de despedimento colectivo, o Código do Processo de Trabalho, com as alterações introduzidas pelo DL nº 295/2009 de 13.10, que entraram em vigor em 1.01.2010, refere no seu artigo 39º o seguinte: 1 A suspensão é decretada se o tribunal, ponderadas todas as circunstâncias relevantes, concluir pela probabilidade séria de ilicitude do despedimento, designadamente quando o juiz conclua: a) Pela provável inexistência de processo disciplinar ou pela sua nulidade; b) Pela provável inexistência de justa causa; ou c) Nos casos de despedimento colectivo, pela provável inobservância das formalidades constantes do art. 383º do Código do Trabalho. Ora da contraposição entre a al. b) e c) deste preceito, com a locução adversativa OU a separá-las, parece resultar que o legislador, nos casos de despedimento colectivo, pretendeu que se contemplem apenas situações de natureza formal, por incumprimento das formalidades previstas no art. 383º do CT, afastando a apreciação os fundamentos do despedimento colectivo, certamente por essa ser matéria complexa que não se compadece com a natureza perfunctória própria de uma providência cautelar ([2]). No sentido de que a providência cautelar de suspensão de despedimento colectivo só é decretada por razões procedimentais, assentes na inobservância das formalidades legalmente prescritas, se pronunciou Albino Mendes Baptista ([3]). Também Bernardo Lobo Xavier, propende para solução semelhante, restringindo a possibilidade de suspensão no despedimento colectivo ao incumprimento de formalidades e aos casos de “ flagrantíssima improcedência dos motivos apresentadas ([4]). Face a este entendimento, bem andou o Mº Juiz do tribunal a quo, que defendeu “estar vedado ao tribunal em sede providência cautelar a sindicância dos fundamentos que justificam o despedimento colectivo” e “só quando salte à vista a impertinência dos fundamentos invocados poderá e deverá o tribunal formular um juízo de séria probabilidade de ilicitude do despedimento”. Assim, conclui-se não haver lugar à apreciação cautelar dos fundamentos invocados para o despedimento colectivo. Apesar disso, a decisão recorrida fez uma análise sumária e perfunctótia dos fundamentos do despedimento colectivo, referindo a este propósito o seguinte: “a Requerida fundamenta o despedimento do requerente com base na extinção das funções que vinha desempenhando, a par de uma acentuada quebra nos seus resultados, tudo isto documentalmente suportado” e acrescenta “por outro lado, da prova testemunhal não resultaram tais motivos inquinados, pelo menos em tal grau que aponte para a necessária probabilidade séria da ilicitude do despedimento”. E, na verdade, este é o entendimento que resulta dos factos considerados indiciariamente provados, nomeadamente dos constantes dos nº 24 a 36. Em suma, face aos factos provados, não se verifica a probabilidade séria de inexistência de justa causa, sendo que se mostram cumpridas todas as formalidades previstas no art. 383º do CT. Improcedem, assim, todas as conclusões do presente recurso. Decisão: Nos termos expostos, acorda-se em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida. Lisboa, 21 de Novembro de 2012 Claudino Seara Paixão Ferreira Marques Maria João Romba ---------------------------------------------------------------------------------------- [1] Cfr. Cessação do Contrato de Trabalho, Principia, 3ª ed. pág. 330. [2] Neste sentido, cfr. P. Furtado Martins, Cessação do Contrato de Trabalho, ob.cit. pág. 426. [3] A Nova Acção de Impugnação de Despedimento e a Revisão do Código de Processo do Trabalho, Coimbra Editora, pág. 138. [4] Manual de Direito do Trabalho, pag. 777e 795. | ||
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Decisão Texto Integral: |