Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | JOSÉ CAPACETE | ||
Descritores: | ARRESTO APARÊNCIA DE DIREITO JUSTO RECEIO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 01/08/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I – São requisitos do arresto preventivo, cumulativamente, a probabilidade da existência de um crédito do requerente, definido por um juízo sumário de verosimilhança e aparência do direito desse crédito e o justo receio ou perigo de insatisfação de tal crédito. II – Assim, sempre que o requerente pretende a apreensão judicial de bens com vista a assegurar o “statu quo”, para que ele não se altere em condições tais que não seja susceptível a reintegração, formulará tal pretensão ao tribunal com a alegação dos factos que tornem provável a existência do crédito do requerente - crédito esse que deverá ser actual - e justifiquem o receio da perda de garantia patrimonial. III - Quanto ao requisito da existência do direito, apenas se pede ao Tribunal uma apreciação ou um juízo de mera probabilidade ou verosimilhança, não sendo necessário que o direito esteja plenamente comprovado, mas apenas que dele exista um mero «fumus boni iuris», ou seja, que o direito se apresente como verosímil. IV - Todavia, para o preenchimento do requisito atinente à probabilidade da existência do crédito, terá de estar em causa um crédito já constituído, actual, e não de crédito futuro, hipotético ou meramente eventual. V - Relativamente ao justo receio de perda da garantia patrimonial exige-se um juízo, senão de certeza e segurança absoluta, ao menos de probabilidade muito forte, não bastando qualquer receio, que pode corresponder a um estado de espírito que derivou de uma apreciação ligeira da realidade, num exame precipitado das circunstâncias. VI - O critério de avaliação deste requisito não pode assentar em simples conjecturas, devendo, ao invés, basear-se em factos ou em circunstâncias que, de acordo com as regras de experiência, aconselhem uma decisão cautelar imediata, como factor potenciador da eficácia da ação pendente ou a instaurar posteriormente. Trata-se, em todo o caso, de um juízo provisório que terá de assentar em critérios de mera verosimilhança. VII - Assim, só existe justificado receio da perda da garantia patrimonial do crédito, quando as circunstâncias se apresentam de modo a convencer que está iminente a lesão do direito, a perspetivar, justificada e plausivelmente, o perigo de ser vir a tornar inviável, ou altamente precária, a realização da garantia patrimonial do crédito do requerente. VIII - Mas, pese embora a maior simplicidade que se impõe pelas regras próprias e pelos objetivos específicos de qualquer procedimento cautelar, o juízo acerca do justificado receio de perda da garantia patrimonial não deve ser fruto de arbitrariedade, antes deve ser tomado a partir de factos. IX – Não constitui factualidade suscetível de provar esse justo receio a simples alegação de que o requerido está a publicitar a locação de um imóvel, ou de um determinado espaço do mesmo. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 7.ª Secção do Tribunal de Relação de Lisboa: I – RELATÓRIO: A, Lda., instaurou o presente procedimento cautelar de arresto contra D, pedindo que seja decretado o arresto sobre determinada fração. No requerimento inicial com que introduziu em juízo o procedimento cautelar, peça processual que, salvo o devido respeito, não prima pelo apuro técnico, e onde é enunciada vasta matéria sem qualquer interesse para a decisão da causa, alega a requerente, em suma, que tem direito a haver do requerido, ao que se percebe, a importância de € 35.114,13[1], por gastos que realizou na sequência de um contrato de arrendamento que celebrou com a requerida, tendo por objeto um espaço do imóvel acima identificado, que não chegou a utilizar para os fins a que se destinava. Os bens, que não identifica, antes deixando a pairar a dúvida se se reporta a bens pertença da requerida ou do seu legal representante, não só são escassos para fazer face à dívida, como há fortes probabilidades de este, ao ter conhecimento da propositura da ação declarativa de condenação, providenciar pela alienação do único bem conhecido da requerida[2]. * Após a inquirição da testemunha arrolada pela requerente, foi proferida a decisão de fls. __, datada de 29 de junho de 2018, de cuja parte dispositiva consta o seguinte: «Por todo o exposto, julga-se o presente procedimento procedente e, em consequência, ordena-se o arresto da fração “A”, correspondente a r/c e cave do prédio urbano, sito na Rua CJB, n.º __ e __-A e Rua APC, n.ºs __a __, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número 0000/000000-A da freguesia de SJA.» * Notificado, o arrestado deduziu desnecessariamente extenso articulado de oposição, o qual conclui pedindo que seja determinado o levantamento do arresto, por inexistirem fundamentos para o seu decretamento. * A oposição foi recebida e, após produção de prova, por decisão de fls. 570-572, datada de 12 de outubro de 2018, foi a mesma julgada procedente, por provada e, consequentemente, determinado o levantamento do arresto. * A requerente não se conformou com esta decisão e dela interpôs o presente recurso de agravo, cujas alegações conclui assim: 1. O Recorrido manifesta conduta reprovável desde cedo, na fase da negociação, aquando da celebração do contrato, sendo que nunca comunica ou informa a Recorrente que o local já estava arrendado a terceiros, que o arrendamento dizia respeito a parte do imóvel e não à sua totalidade, que se trata de um espaço único e indivisível, e sabendo que o imóvel nunca poderia albergar um Centro de Formação, atendendo às alterações ilegais efectuadas. 2. Mais, actua de má-fé na celebração do contrato de arrendamento, porquanto omite o regime de casamento e sendo que foi ele quem providenciou tudo, tratou com vista à formalização das vontades, não procurou atender os formalismos legais e fazer constar à assinatura da esposa (…), no Contrato, e classificá-lo como de arrendamento habitacional. 3. A existência de um só imóvel sem fracções com dois inquilinos no mesmo local é sem dúvida factor impeditivo do funcionamento da actividade da Recorrente. 4. Foram apresentados em sede de oposição na Providencia Cautelar, documentos ilegíveis e não perceptíveis. Os testemunhos foram confusos e contraditórios. 5. A tentativa de venda do património do Recorrido e a penhora, hipoteca e venda de património da empresa é motivo suficiente para demonstrar o justo receio de perda de garantia patrimonial. 6. Igualmente a prova carreada para os autos, é demonstrativa da probabilidade da existência do crédito da Recorrente. – Fundamentos de direito – “Quem negoceia com outrem para a conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa-fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte” (Artigo 227º, nº1 do CC). Os deveres inscritos neste preceito não podem afastar ou diminuir a liberdade negocial, desde o início da negociação até à conclusão do contrato (Artigo 405º do CC). Cai no âmbito desta responsabilidade todo percurso negocial, desde a fase negociaria (do início desta até à emissão das propostas contratuais) à fase da decisão (que decorre entre e emissão dessas propostas e a conclusão do contrato). Tanto na constituição das relações entre eles como no desempenho das relações constituídas, os sujeitos de direito devem actuar como pessoas de bem, segundo as regras da boa-fé, com honestidade e probidade, evitando causar lesão nos interesses daqueles com quem estabelecem relações. Termos em que, nos melhores de direito e sempre com o mui douto suprimento de V.Exª. deve ser concedido provimento ao presente recurso revogando-se a decisão do tribunal de 1ª instância e substituir-se por outra que decida manter o arresto do bem, com todas as consequências legais, como é‚ aliás, de inteira JUSTIÇA. * O requerido contra-alegou, pugnando, no essencial, pela improcedência do recurso, com a consequente manutenção da decisão recorrida. * II – ÂMBITO DO RECURSO: Como se sabe, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 639.º, n.º 1, do C.P.C. de 2013) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem. Efetivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 635.º, n.º 3, do C.P.C. de 2013), esse objeto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (n.º 4 do mesmo art. 635.º). Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso. Por outro lado, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim, ius novarum, i.é., a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo. Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação, mas apenas – e com liberdade no respeitante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 5.º, n.º 3, do C.P.C. de 2013) – de todas as “questões” suscitadas, e que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, excetuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras (art. 608.º, n.º 2, do C.P.C. de 2013, ex vi do art. 663.º, n.º 2, do mesmo diploma). No caso sub judice, a única questão a decidir consiste em saber se se verificam os pressupostos que fundamentam o arresto do identificado imóvel, a saber, a probabilidade da existência do crédito e o justo receio da perda da garantia patrimonial. * III – FUNDAMENTOS: 3.1 – Fundamentação de facto: A decisão que decretou o arresto, datada de 29 de junho de 2018, considerou indiciariamente provados os seguintes factos: 1. A Requerente é uma sociedade comercial por quotas, constituída em Março de 2017, que se dedica a conceber e ministrar cursos de formação profissional; prestação de serviços na área da educação, e formação profissional, clube de divulgação e utilização de novas tecnologias; 2. O Requerido é proprietário da fracção correspondente a r/c e cave do prédio urbano, sito na Rua CJB, nºs __ e __ e Rua APC, nºs __a __, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número 0000/000000-A da freguesia de SJA.; 3. Este prédio urbano tem licença de utilização n° 000, emitida pela CML em 1969; 4. A fim de poder dar início à sua actividade, a Requerente procurou um espaço, que pudesse comportar todos os seus serviços num só local, pretendendo abrir um Centro de Formação na área informática na freguesia de Arroios. 5. Encontrou perto da Praça do Chile, um espaço que pelas características de localização se adequava ao que pretendia, espaço esse que tinha uma placa, com o escrito “aluga-se loja” e com um telefone de contacto. 6. A Requerente contactou então o Requerido D, através do nº de telefone referido em 5., o qual se apresentou como dono do espaço. 7. Foi marcado dia e hora para a visita do espaço, tendo a Requerente visitado o espaço no dia 6 de Julho de 2017. 8. O Requerido informou que existiam 2 entradas: uma, com acesso pela Rua APC nºs __ e __, e outra, pela Rua CJB nºs __ e __. 9. A visita iniciou-se acedendo ao nº __ pela Rua APC. 10. A requerente verificou que o espaço se encontrava sem luz e cheio de móveis. 11. Depois visitaram o nº __-A acedendo pela Rua CJB, onde funcionava um salão de cabeleireiro, com um espaço à frente visível, e outro por trás, com um patamar mais alto. 12. De seguida, a Requerente visitou o nº __, que estava cheio de materiais de construção, nomeadamente, entulho e areias, entre outros. Esse espaço tinha uma cave também com bastante material de construção e entulho. 13. A Requerente para a sua actividade pretendia ter um espaço grande, de forma a ter o máximo de salas de formação. 14. Nesse sentido, a Requerente optou por ficar com os nºs __ e __, aos quais se acedia pela Rua CJB. 15. Uma vez que a Requerente tinha o máximo de urgência em ter o espaço disponível, a concretização do Contrato de Arrendamento, ficou marcada para o dia seguinte. 16. Assim, o Requerido encontrou-se com a Requerente levando consigo 4 cópias do Contrato de Arrendamento, tendo ficado 3 cópias com o Requerido e 1 com a Requerente; 17. Das três cópias que ficaram com o Requerido, segundo o mesmo, uma seria para dar entrada nas Finanças, do respectivo contrato. 18. Nessa mesma altura, a Requerente entregou ao Requerido a quantia de 3.000,00 Euros, correspondentes a dois meses de renda e um de caução (fixada em € 1000,00 no 1º ano de vigência do contrato), tendo o Requerido emitido e assinado a declaração junta como doc.5 com a p.i., cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 19. Ficou ainda combinado, que no dia seguinte, o Requerido entregaria as chaves à Requerente. 20. No dia combinado, o Requerido apenas entregou o espaço correspondente à cave, com entrada pelo nº__, ficando acordado entregar o outro em data posterior, pelo motivo de ainda não o ter esvaziado. 21. No dia seguinte (…), a Requerente deslocou-se ao local e fez o levantamento das obras necessárias. 22. Com base na observação das condições do espaço, o estado de conservação do imóvel era péssimo; 23. Tendo presente o estado geral do imóvel, era patente que o mesmo se encontrava sem uso e desabitado há muito tempo, de forma a ser possível a sua utilização imediata, necessitando de obras de reestruturação e remodelação de elevado montante. 24. A Requerente contactou de imediato o Requerido, a fim de informar que estando o espaço com essas condições, que não eram visíveis aquando da visita inicial, não teria interesse em ficar com o mesmo, solicitando a devolução da quantia paga no dia anterior. 25. No entanto, o Requerido informou já ter utilizado o dinheiro entregue pela Requerente, para fazer face a dívidas que tinha, não podendo devolver o mesmo, e, em contrapartida sugeriu oferecer a renda respeitante a 2 meses (Setembro e Outubro), para que a Requerente tivesse tempo para finalizar as obras, as quais seriam interrompidas no mês de Agosto por motivo de férias. 26. Assim, seriam devidas as rendas apenas a partir do mês de Novembro de 2017, o que a Requerente aceitou. 27. A Requerente, efectuou com a EPAL e a EDP, um contrato de água e de electricidade respectivamente, para o espaço arrendado; 28. E iniciou as obras no espaço da cave que lhe tinha sido entregue, conforme referido em 20., as quais foram interrompidas em finais de Julho de 2017, por motivo de férias. 29. Em Setembro, após regressar das férias, a Requerente teve necessidade de desligar a luz e a água, e quando tal aconteceu, apareceu um Senhor que se identificou como sendo arrendatário da loja nº 27A, a informar que tinha ficado sem luz e sem água, tendo-se então a requerente apercebido que estavam a utilizar a sua energia eléctrica e a sua água, fornecidas através dos contratos referidos em 27. 30. A Requerente contactou o requerido, tendo este ido ao seu encontro, pedindo desculpa, e dizendo que estava a tratar com os Serviços da EDP e EPAL, para fazer a separação dos espaços. 31. Informou ainda, que pagaria todas as despesas que a Requerente tivesse com os serviços de água e luz utilizados por outros arrendatários. 32. A Requerente solicitou ainda ao Requerido que lhe entregasse o espaço em falta com entrada pelo nº __. 33. Ao que o Requerido respondeu que não se mostrava disponível para entregar tal espaço na sua totalidade mas apenas a parte da frente, correspondente a uma pequena sala. 34. Por esse motivo, a Requerente requereu as plantas do imóvel, junto da Camara Municipal de Lisboa. 35. Após ter as plantas na sua posse, verificou que o constante do processo camarário não correspondia à construção existente no local. 36. E após a consulta do Registo Predial, verificou que o espaço arrendado fazia parte da fracção designada como “A” com o nº __ da freguesia de SJA, conforme descrição referida em 2. 37. Verificou ainda que a descrição da fracção constante no Contrato de Arrendamento, não se encontrava completa. 38. A Requerente falou com o Requerido acerca desta situação, tendo o mesmo informado, que sempre arrendou o espaço em espaços pequenos, sem que ninguém reclamasse. 39. Entretanto, a Requerente recebe as facturas de electricidade da EDP, nos valores de € 81,61, € 76,08, € 132,79, € 126,17, € 112,25, € 106,63, e de € 31,38 correspondentes respectivamente aos meses de Julho, Agosto, (em que esteve de férias e sem ir ao arrendado), Setembro, Outubro, Novembro, Dezembro de 2017, e Janeiro de 2018; 40. A Requerente combinou com o filho do Requerido resolver todas as questões pendentes, até ao final de Novembro, sendo assinado novo contrato de arrendamento. 41. No dia 30 de Outubro, o filho do Requerido desloca-se às instalações arrendadas à Requerente e entrega uma das partes do espaço em falta, tendo assinado a declaração junta como doc.12 com a p.i.. 42. Nessa mesma data, a Requerente solicitou a entrega da cópia do contrato selado pelas Finanças, pois até à data não lhe tinha sido entregue, uma vez que necessitava desse comprovativo para a obtenção da certificação por parte da DGERT, processo esse, indispensável, para a realização da sua actividade. 43. A Requerente, para exercer a actividade de formação profissional certificada, teria de providenciar pela autorização de funcionamento junto da DGERT. 44. Esse pedido de Certificação de Entidade Formadora requer o cumprimento de uma serie de requisitos, nomeadamente quanto às condições físicas e legais do espaço. 45. O pedido da requerente foi recusado, por falta de elementos, tais como comprovativos de recibos das rendas de arrendamento, e ainda pelo facto de as instalações não cumprirem as normas de Segurança exigidas por lei. 46. A Requerente fez um depósito na CGD, no valor de € 400,00 a título de renda de Dez.2017. 47. Desde Novembro de 2017, a Requerente fez diversas tentativas de contacto com o Requerido, tendo no entanto, sido todas elas sem sucesso. 48. Enviou várias cartas registadas, tendo todas sido devolvidas. 49. A Requerente concluiu a obra, para a qual adquiriu vários materiais de construção, tendo despendido o valor global de € 34.304,13; 50. Contudo, e apesar das obras efetuadas, a Requerente tem tido vários problemas pois constantemente, os esgotos inundam todo o espaço, na cave. 51. Assim, mesmo estando a suportar todas as despesas inerentes ao espaço, a Requerente nunca chegou a utilizar o espaço para os fins pretendidos. 52. Dada a inercia e desinteresse do Requerido, a Requerente não pode beneficiar dos gastos em que incorreu com as obras, obras essas que levaram a um aumento do valor patrimonial da fracção. 53. O Requerido está a publicitar o aluguer do espaço, a terceiros. 54. Não lhe são conhecidos outros bens, para além da fracção supra identificada. 55. O requerido foi sócio e gerente de empresas, que se encontram inactivas ou falidas. A decisão datada de 12 de outubro de 2018, que conheceu da oposição do requerido, considerou indiciariamente provado o seguinte: 1. Dou por reproduzido o teor da escritura notarial datada de 16.12.1991, junta aos autos como doc.4 com a oposição, correspondente à aquisição por compra da fracção aí id. como loja de 2 pisos (r/c e cave), por parte do opoente. 2. O opoente tem uma situação financeira estável, estando reformado. 3. Para além do valor da pensão de reforma, o opoente tem rendimentos provenientes de rendas relativas a várias fracções que mantém arrendadas. 4. Apesar de reformado, mantém a gerência da sua empresa, a qual já não se dedica à actividade da construção civil, mas apenas à gestão do património adquirido. 5. Na liquidação de IRS do opoente e de sua esposa do ano passado, consta um rendimento colectável superior a € 25.000,00. 6. O opoente é proprietário de inúmeros imóveis, em várias regiões de Portugal, incluindo em várias freguesias da área Metropolitana e da Cidade de Lisboa, com um valor global superior a €1.600.000,00, correspondente à soma dos VPT de tais prédios. 7. Por seu turno, a empresa de que o opoente mantém a gerência, tem um património imobiliário de valor superior a € 3.800.000,00. * 3.1 – Do mérito do recurso: O que imediatamente resulta da análise destes autos é que o presente procedimento cautelar nunca deveria ter passado a sua fase liminar, quanto mais ser objeto de apreciação por este tribunal da Relação, nos termos em que tal ocorre neste momento. Dispõe o art. 391º do CPC: «1. O credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor. 2. O arresto consiste numa apreensão judicial de bens, à qual são aplicáveis as disposições relativas à penhora, em tudo quanto não contrariar o preceituado nesta subsecção.». Acrescenta o art. 392º, nº 1 do código que «o requerente do arresto deduz os factos que tornam provável a existência do crédito e justificam o receio invocado, relacionando os bens que devem ser apreendidos, com todas as indicações necessárias à realização da diligência.». São os arts. 619º, nº 1 do CC e 392º, nº 1 do Cód. Proc. Civil que definem os requisitos para se decretar o arresto. Como se sabe, são requisitos do arresto preventivo, cumulativamente, a probabilidade da existência de um crédito do requerente, definido por um juízo sumário de verosimilhança e aparência do direito desse crédito e o justo receio ou perigo de insatisfação de tal crédito. Assim, sempre que o requerente pretende a apreensão judicial de bens com vista a assegurar o “statu quo”, para que ele não se altere em condições tais que não seja susceptível a reintegração, formulará tal pretensão ao tribunal com a alegação dos factos que tornem provável a existência do crédito do requerente - crédito esse que deverá ser actual - e justifiquem o receio da perda de garantia patrimonial. São tais factos que devem constituir a causa de pedir de uma providência cautelar de arresto preventivo. Quanto ao requisito da existência do direito, apenas se pede ao Tribunal uma apreciação ou um juízo de mera probabilidade ou verosimilhança. Não é, com efeito, necessário que o direito esteja plenamente comprovado, mas apenas que dele exista um mero «fumus boni iuris», ou seja, que o direito se apresente como verosímil. Todavia, para o preenchimento do requisito atinente à probabilidade da existência do crédito, terá de estar em causa um crédito já constituído, actual, e não de crédito futuro, hipotético ou meramente eventual. Relativamente ao justo receio de perda da garantia patrimonial exige-se um juízo, senão de certeza e segurança absoluta, ao menos de probabilidade muito forte, não bastando qualquer receio, que pode corresponder a um estado de espírito que derivou de uma apreciação ligeira da realidade, num exame precipitado das circunstâncias. É, assim, essencial a alegação e prova de um circunstancialismo fáctico que faça antever o perigo de se tornar difícil ou impossível a cobrança desse provável crédito já constituído. O critério de avaliação deste requisito não pode assentar em simples conjecturas mas, ao invés, basear-se em factos ou em circunstâncias que, de acordo com as regras de experiência, aconselhem uma decisão cautelar imediata, como factor potenciador da eficácia da ação pendente ou a instaurar posteriormente. Trata-se, em todo o caso, de um juízo provisório que terá de assentar em critérios de mera verosimilhança. Com efeito, a jurisprudência tem considerado a verificação de «periculum in mora», para efeitos de decretamento do arresto, em situações em que existe, nomeadamente, a tentativa do devedor de alienar bens imóveis; o risco de o devedor ficar em situação de insolvência por dissipação ou oneração do seu património; a demonstração de que o devedor se furta aos contactos e pretende vender o património conhecido; o acentuado défice entre o crédito exigido e o valor do património conhecido do devedor, juntamente com a circunstância de o mesmo ser facilmente ocultável; a descapitalização de empresas, através da transferência dos ativos, ou a prática de atos de alienação gratuita a favor de terceiros ou actos simulados de alienação ou de oneração. Assim, só existe justificado receio da perda da garantia patrimonial do crédito, quando as circunstâncias se apresentam de modo a convencer que está iminente a lesão do direito, a perspetivar, justificada e plausivelmente, o perigo de ser vir a tornar inviável, ou altamente precária, a realização da garantia patrimonial do crédito do requerente. Mas, pese embora a maior simplicidade que se impõe pelas regras próprias e pelos objetivos específicos de qualquer procedimento cautelar, o juízo acerca do justificado receio de perda da garantia patrimonial não deve ser fruto de arbitrariedade, antes deve ser tomado a partir de factos[3]. Dispõe o art. 590º, nº 1, do CPC, que «nos casos em que, por determinação legal ou do juiz, seja apresentada a despacho liminar, a petição é indeferida quando o pedido seja manifestamente improcedente ou ocorram, de forma evidente, exceções dilatórias insupríveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente (...)». O desnecessariamente extenso requerimento inicial com que foi introduzido em juízo o presente procedimento cautelar de arresto, contendo abundante matéria de todo irrelevante para a decisão da causa, foi liminarmente indeferido, pelas razões que constam do despacho de fls. 389-391, datado de 4 de junho de 2018, ou seja, por no entender do tribunal a quo, além do mais: - não se mostrar minimamente alegado o crédito da requerente, nem quanto à sua origem, nem quanto ao seu montante; - não ter sido minimamente alegado que o devedor, aqui requerido, não tem património ou outros rendimentos, que não aquele imóvel cujo arresto é requerido. Notificada dessa decisão, a requerente apresentou novo requerimento inicial, ao abrigo do disposto nos arts. 590.º, n.º 1 e 560.º, do C.P.C., também ele desnecessariamente extenso e contendo abundante matéria de todo irrelevante para a decisão da causa, tendo, então, sido designada data para inquirição da única testemunha por arrolada. Acontece que o novo requerimento inicial, que consta de fls. 391-406, apresentado ao abrigo das mencionadas disposições legais, não deveria ter tido melhor sorte que o primeiro, pois que o pedido nele formulado continuou a ser manifestamente improcedente. É que a requerente continuou a não alegar um único concreto facto jurídico, material, suscetível de, uma vez provado, ainda que indiciariamente, como é próprio dos procedimentos cautelares, permitir concluir no sentido da verificação do justificado receio da perda da garantia patrimonial. Na verdade, a requerente limita-se a alegar, a este propósito, que o requerido está «a publicitar o aluguer do espaço, a terceiros», o que, em seu entender, «evidencia que não pretenderá a resolução do diferendo, mas beneficiará dos melhoramentos efetuados pela Requerente. Esta não pretensão, a elisão aos contactos, o facto de não serem conhecidos outros bens, que possam responder pelo crédito da Requerente, porquanto, a Requerente efectuou pesquisas nos diversos organismos, tendo apurado que o Requerido já fora sócio e gerente de 3 empresas, mas as mesmas encontram-se extintas ou inactivas. Conhece o Requerente que neste momento, o Requerido é sócio de uma empresa denominada por SCNB, LDA, NIF 501952039, sita na RUA APC, n.º __, 1000-046 LISBOA, no entanto, nesta morada o local encontra-se vazio, e para arrendar, o que demonstra à partida a inactividade desta sociedade. Porquanto, não só os bens são escassos, para fazer face à divida, como há fortes probabilidades do Requerido, ao ter conhecimento da propositura da acção declarativa de condenação, providenciar pela alienação ou ocultação do único bem conhecido da Requerente.» Ora, alegar tal, ou nada alegar, para efeitos de demonstração do justificado receio da perda da garantia patrimonial, é, salvo o devido respeito, a mesma coisa. Como se sabe, não basta o receio subjetivo de ver insatisfeita a pretensão a que tem ou se julga ter direito. O que é decisivo é que o credor fique ameaçado de lesão por ato do devedor e seja razoável e compreensível o seu receio de ver frustrado o pagamento do seu crédito. Numa palavra, o receio, para ser considerado justificado (por exigência da lei), há-de assentar em factos concretos, que o revelem, à luz de uma prudente apreciação[4]. A este propósito, refere Abrantes Geraldes, que o justo receio «pressupõe a alegação e prova, ainda que perfunctória, de um circunstancialismo fáctico que faça antever o perigo de se tornar difícil ou impossível a cobrança do crédito. (…). Como é natural, o critério de avaliação deste requisito não deve assentar em juízos puramente subjectivos do juiz ou do credor (isto é, em simples conjecturas, como refere Alberto dos Reis), antes deve basear-se em factos ou em circunstâncias que, de acordo com as regras da experiência, aconselhem uma decisão cautelar imediata como factor potenciador da eficácia da acção declarativa ou executiva»[5]. O justificado receio de perda da garantia patrimonial identifica-se com o chamado periculum in mora inerente a todo o procedimento cautelar - evitar a lesão grave e dificilmente reparável proveniente da demora na tutela da situação jurídica. Periculum in mora esse para o qual o legislador exige a formação de um juízo de segurança de iminência de sofrer um dano, isto é, o justo receio de prejuízo terá de se apresentar evidente e real. É lógico que o critério de avaliação de tal requisito não deve conduzir à certeza inequívoca quanto à existência da situação de perigo, dificilmente obtida em processos com as características das providências cautelares. Mas é necessário que se mostre suficientemente fundado esse pressuposto. Significa isto que o requerente tem de alegar e provar factos concretos, objetivos e precisos que o revelem à luz de uma prudente apreciação, não bastando o receio subjetivo, fundado em simples conjeturas. Como refere o Ac. da R.P. de 18-05-1993, Proc nº 9220796 (acessível em www.dgsi.pt), «o justo receio de extravio ou dissipação dos bens a arrolar é uma conclusão de facto, sendo necessário que os factos alegados e provados denotem que tal receio é sério e real”, pois não basta a componente subjectiva do justo receio de extravio ou dissipação para se detetar o arrolamento». De igual modo, como decidiu o Ac. da R. C. de 30-04-2002 (Proc. nº 1448/02, acessível em www.dgsi.pt): «O justo receio de perda da garantia patrimonial do credor tem que assentar em factos reais, em índices apreensíveis pelo comum das pessoas, que mostrem que o alegado receio é objectivamente fundado. Para que seja decretado o arresto é indispensável que o devedor tenha praticado actos ou assumido atitudes que inculquem a suspeita de que ele pretende subtrair os seus bens à acção dos credores»[6]. Ora, a verdade é que, in casu, não vem sequer alegado qualquer facto jurídico concreto suscetível de, uma vez provado, permitir a conclusão de que o requerido vem praticando atos ou assumindo atitudes no sentido do extravio ou delapidação do seu património, e que inculquem a suspeita de que pretende subtrair os seus bens, nomeadamente o indicado pela requerente no requerimento inicial, à ação dos seus credores, no caso concreto, da requerente. Seja como for, a juíza a quo entendeu designar data para inquirição da testemunha arrolada pela requerente. Após a realização da audiência onde tal inquirição teve lugar, foi proferida a referida decisão de fls. 410-415, datada de 29 de junho de 2018, que decretou o arresto da fração “A”, acima identificada. Uma primeira palavra para referir que se é certo que recai sobre as partes recai o dever de alegação de factos essenciais que constituem a causa de pedir e em que se baseiam as exceções invocadas (arts. 5.º, n.º 1, 552.º, n.º 1, al. d) e 572.º, al. c), do C.P.C.)[7], também na sentença, a enunciação linear, lógica e cronológica dos factos, tanto dos provados, como dos não provados, dentro dos limites dos temas da prova anteriormente enunciados, deve ater-se igualmente aos factos essenciais alegados no processo por cada uma das partes, de modo a cobrir todas as soluções plausíveis da questão ou questões de direito; ou seja, a enunciação factológica efetuada pelo juiz na sentença deve abarcar necessariamente uma pronúncia (positiva, negativa, restritiva ou explicativa), linear, lógica e cronológica, sobre factos essenciais (nucleares) que foram alegados para sustentar a causa de pedir ou fundar as exceções, e de outros factos, também essenciais, ainda que de natureza complementar que, de acordo com a fattispecie da norma jurídica aplicável, se revelem necessários para a procedência da ação ou da exceção. Além de que, sendo necessária, deve ainda fazer-se a enunciação dos factos concretizadores, também eles essenciais, da factualidade que se apresente difusa, sendo importante referir que a enunciação dos factos complementares e/ou concretizadores, repete-se, também eles essenciais, deve fazer-se desde que se apresentem como imprescindíveis para a procedência da ação ou da defesa, à luz dos diversos segmentos normativos relevantes para a decisão do caso concreto[8]. Acresce que, aquilo que deve constar da fundamentação de facto de uma sentença não são juízos valorativos, conclusivos ou de direito, mas verdadeiros enunciados de facto, no sentido de factos jurídicos ou juridicamente relevantes atinentes sobretudo, ainda que não em exclusivo, conforme afirma Antunes Varela[9], a ocorrências da vida real, assim como ao estado, à qualidade ou à situação real das pessoas ou das coisas. Os termos e condições em que tais factos assumem relevo no processo civil é decorrência da tipologia com que são delineados na fatiispecie do quadro normativo que serve de fundamento à pretensão deduzida em juízo. Rosenberg[10] definiu factos jurídicos como os acontecimentos (e circunstâncias) concretos, determinados no espaço e no tempo, passados e presentes, do mundo exterior e da vida anímica humana que o direito objetivo converteu em pressuposto de um efeito jurídico. Para Alberto dos Reis, juridicamente relevantes são os factos que constituem «ocorrências da vida real, isto é, os fenómenos da natureza, ou as manifestações concretas dos seres vivos, nomeadamente os actos e factos humanos (…) vistos à luz das normas e critérios do direito»[11]. Ora, aquela decisão de fls. 410-415, datada de 29 de junho de 2018, contém: - em sede de fundamentação de facto, fruto da transcrição acrítica do alegado pela requerente no requerimento inicial, e da desconsideração da fattispecie do tipo legal aplicável, contém abundante matéria irrelevante para a decisão do procedimento cautelar; - matéria de cariz vago e conclusiva, como é o caso, por exemplo, do ponto de facto 52. («O requerido foi sócio e gerente de empresas, que se encontram inativas ou falidas)[12]. Seja como for, o certo, no entanto, é o tribunal a quo considerou que a matéria alegada pela requerente e que indiciariamente considerou provada, era suscetível de preencher todos os pressupostos acima elencados, de que a lei faz depender o decretamento do procedimento cautelar de arresto. No entanto, na sequência da oposição apresentada pelo requerido após ter sido notificado da decisão que decretou o arresto da fração acima identificada, veio a ser proferida a sobredita decisão datada de 12 de outubro de 2018 (fls. 570-572), que determinou «o levantamento do arresto decretado nestes autos por decisão de 29.6.2018 da fracção id. no Auto de Arresto datado de 11.7.2018, junto a fls. 442 e 443.» Impõe-se, no que à decisão ora sob recurso diz respeito, começar por referir que se trata de uma velha e inadequada técnica processual que deve, em definitivo, ser erradicada da prática judiciária, aquela que consiste em dar por reproduzido o teor de documentos[13]. Acresce que tal decisão contém, também ela, matéria de cariz conclusivo, como é o caso: a) do segundo ponto da matéria considerada provada[14]: «O opoente tem uma situação financeira estável»; b) do terceiro ponto da matéria considerada provada: «Para além do valor da pensão de reforma, o opoente tem rendimentos provenientes das rendas relativas a várias fracções que mantém arrendadas». Ora, a lida a decisão recorrida, ficamos sem saber: - qual o valor da pensão de reforma auferido pelo requerido; - quais as frações que o requerido tem arrendadas na qualidade de senhorio; - qual o valor mensal que, a título de renda, aufere de cada uma das frações. c) do quarto ponto da matéria da matéria considerada provada: «Apesar de reformado, mantém a gerência da sua empresa, a qual já não se dedica à actividade de construção civil, mas apenas à gestão do património adquirido». Não se descortina, salvo o devido respeito, o interesse desta matéria, pois, além de não se identificar a empresa, desconhece-se se o requerido retira algum provento da gerência da empresa. d) do ponto sexto da matéria considerada provada: «O opoente é proprietário de inúmeros[15] imóveis, em várias regiões de Portugal, incluindo em várias freguesias da área Metropolitana e da cidade de Lisboa (...)». Afirmar-se, numa decisão judicial, que alguém é proprietário de inúmeros imóveis, ou nada dizer, é, salvo o devido respeito, exatamente a mesma coisa. Não tendo a decisão sobre a matéria de facto sido objeto de impugnação por parte da requerente, fica-se, no entanto, a saber que o requerido é titular de património imobiliário cujo valor patrimonial tributário global é superior a € 1.600.000,00. Nos termos do art. 372.º, ex vi do art. 376.º, n.º 1, ambos do C.P.C.: «1 - Quando o requerido não tiver sido ouvido antes do decretamento da providência, é-lhe lícito, em alternativa, na sequência da notificação prevista no n.º 6 do artigo 366.º: a) Recorrer, nos termos gerais, do despacho que a decretou, quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido deferida; b) Deduzir oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinem a sua redução, aplicando-se, com as adaptações necessárias, o disposto nos artigos 367.º e 368.º. 2 - O requerido pode impugnar, por qualquer dos meios referidos no número anterior, a decisão que tenha invertido o contencioso. 3 - No caso a que se refere a alínea b) do n.º 1, o juiz decide da manutenção, redução ou revogação da providência anteriormente decretada, cabendo recurso desta decisão, e, se for o caso, da manutenção ou revogação da inversão do contencioso; qualquer das decisões constitui complemento e parte integrante da inicialmente proferida.» Resulta da citada disposição legal que uma vez confrontado com uma decisão cautelar proferida sem audição contraditória, o requerido pode, em alternativa: a) recorrer da decisão, nos termos gerais, se a discordância se fundamentar em razões puramente jurídicas; b) deduzir oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova suscetíveis de infirmar os fundamentos da anterior decisão ou reduzir os seus limites. Assim, o mecanismo da oposição pressupõe sempre a alegação de factos ou meios de prova que colidam com os fundamentos da providência em que o juiz se arrimou. Conforme refere António Geraldes, «a oposição pressupõe sempre a alegação de novos factos ou de novos meios de prova não considerados pelo tribunal no primeiro momento e que tenham a virtualidade de, uma vez provados, determinarem o afastamento ou a redução da medida cautelar decretada. (…) o objetivo fundamental deste meio de defesa não é o de proceder à reponderação dos primeiros, atividade que se ajusta ao recurso de agravo da decisão em cujo âmbito se inscreva a reapreciação do julgamento sobre a matéria de facto.»[16]. Segundo o mesmo Autor, a utilização de um ou outro dos meios de impugnação (recurso ou oposição) da decisão que, sem audição prévia do requerido, decretou o procedimento cautelar, é feita em alternativa. Assim, confrontado com uma tal decisão, o requerido é colocado perante um dilema, cabendo-lhe optar por um dos meios de defesa que a lei coloca ao seu dispor, estando-lhe vedado, por exemplo, interpor recurso com fundamento em discordância quanto à solução jurídica do caso ou por entender que os meios de prova produzidos conduzem a uma conclusão diferente quanto à decisão da matéria de facto e, ao mesmo tempo, deduzir oposição em que, além de alegar factos novos, pretenda a produção de novos meios de prova sobre os mesmos[17]. Ainda segundo o mesmo Autor, não está em causa, no incidente de oposição, facultar ao mesmo tribunal a reapreciação da decisão, a partir de novos elementos, mas de conferir a possibilidade de revisão da convicção anteriormente formada, agora através de novos meios de prova ou de novos factos, com que o tribunal não pôde contar[18]. Na situação presente, notificado da decisão que decretou o arresto da fração autónoma acima identificada, que com base em factos que o tribunal a quo entendeu preenchentes de todos os pressupostos de que a lei faz depender o decretamento de tal providência, mas que, na verdade, não o eram, nomeadamente no que respeita ao justo receio de perda da garantia patrimonial do credor, o requerido optou por deduzir oposição, alegando novos factos e indicando novos meios de prova suscetíveis de permitirem ao jugador da primeira instância a revisão da convicção anteriormente formada. E a verdade é que o conseguiu, pois a factualidade alegada pelo requerido e indiciariamente considerada provada pelo tribunal recorrido não poderiam deixar de conduzir à revisão da convicção antes formada pelo juiz a quo[19] e, consequentemente, ao levantamento do arresto. Com efeito, provando-se que: - na liquidação de IRS do opoente e de sua esposa do ano passado, consta um rendimento colectável superior a € 25.000,00; - o opoente é titular de património imobiliário cujo valor patrimonial tributário superior a €1.600.000,00; - é gerente de uma empresa cujo património imobiliário tem um valor superior a € 3.800.000,00, é uma reforçada evidência a não verificação do justo receio de perda da garantia patrimonial da requerente. *** IV – DECISÃO: Por todo o exposto, acordam os juízes desta 7.ª Secção do Tribunal de Relação de Lisboa, em julgar a apelação improcedente, mantendo, em consequência, a decisão recorrida que determinou o levantamento do arresto decretado nestes autos por anterior decisão de 29 de junho de 2018, da fração autónoma identificada no auto de arresto datado de 11 de julho de 2018, e que consta de fls. 442-443. Custas pela requerente do procedimento cautelar – art. 527.º, n.ºs 1 e 2, do C.P.C. (Acórdão assinado digitalmente) Relator José Capacete Adjuntos Carlos Oliveira Diogo Ravara [1] Razão pela qual não se compreende ao abrigo de que critério atribuiu ao procedimento cautelar o valor de € 50.000,00, pois, nos termos do art. 304.º, n.º 3, al. e), do C.P.C., nos procedimentos cautelares de arresto o valor é determinado pelo montante do crédito que se pretende garantir. [2] Por lapso escreveu “Requerente”. [3] Cfr., neste sentido, o Ac. da R.L. de 20.05.2010, Proc. n.º 52/105T2MFR.L1-2 (Ondina Carmo Alves), in www.dgsi.pt. [4] Cfr. Cons. Jacinto Rodrigues Bastos, Notas, Vol. I, p. 268). [5] Temas da Reforma do Processo Civil, IV Volume, pp. 176 e 177. [6] Cfr. Ac. da R.L. de 06/21/2011, Proc. nº 1909/10.9TBPDL-A.L1-1 (Ana Grácio), in www.dgsi.pt, que nesta parte viemos acompanhando e em parte transcrevemos. [7] Dever que as partes, no caso concreto, estiveram longe de respeitar. [8] Cfr. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2018, pp. 717-719. [9] Cfr. Antunes Varela et al., Manual cit., pp. 406 e 407, e RLJ, Ano 122º, nº 3784, p. 219. [10] Cfr. Leo Rosenberg, Tratado de Derecho Procesal Civil, tomo II, tradução espanhola de Angela Romera Vera, 1995, apud Montalvão Machado, ob. cit., p. 113, nota 210. [11] Código de Processo Civil Anotado, Vol. III, 4ª Ed., 1985, p. 209. [12] Importaria, isso sim, que se identificassem: - quais as empresas de que o requerido foi sócio e gerente e que se encontram falidas/insolventes; - quais as empresas de que o requerido é sócio e gerente e que se encontram inativas e enunciassem factos que permitissem concluir no sentido da respetiva inatividade, e daí retirar as eventuais consequências jurídicas à luz da previsão do normativo jurídico aplicável ao caso. [13] Cfr. o primeiro ponto de facto da decisão recorrida. [14] A decisão recorrida não discrimina, por números ou alíneas, a matéria que considera indiciariamente provada. [15] O destacado a negrito é da nossa autoria. [16] Temas da Reforma do Processo Civil, III Volume (2ª Edição), Almedina, p. 232. [17] Ob. Cit., pp. 252-253. [18] Ob. Cit., p. 256. [19] Convicção essa de que, conforme afirmado, se discorda. |