Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
866/12.1TVLSB.L1-8
Relator: ANTONIO VALENTE
Descritores: SOCIEDADE DE ADVOGADOS
DEPOIMENTO
MANDATO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/27/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: - Os sócios de uma sociedade de advogados que não desempenham quaisquer funções de administração da sociedade, podem depor como testemunhas em sede de julgamento.
- O facto de poderem ter interesse no desfecho da causa não os torna partes no processo; com efeito as partes definem-se não pelo interesse pessoal que detenham no resultado do pleito, mas pela possibilidade de representarem a pessoa colectiva, de expressarem por si a vontade desta.
- O benefício que o sócio possa vir a obter de uma procedência da causa é apenas um dos factores que deverão ser ponderados na avaliação do seu depoimento, a par de outros tais como o parentesco, a subordinação económica ou a subordinação jurídica.
- Num contrato de mandato celebrado com prazo de um ano, com a expressa possibilidade de qualquer das partes o denunciar no seu termo, a comunicação tempestivamente efectuado pelo mandante expressando a intenção de denunciar o contrato no seu termo não gera o direito a qualquer indemnização ao mandatário, nos termos do art. 1172º c) do Código Civil.
(sumário elaborado pelo relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

A..., N..., M..., F... & ASSOCIADOS - SOCIEDADE DE ADVOGADOS RL intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra BANCO .... pedindo a condenação deste:

A) NO PAGAMENTO À A. DA QUANTIA DE 23.711,99 €, ACRESCIDA DOS JUROS DE MORA À TAXA LEGAL VENCIDOS E VINCENDOS DESDE 23 DE SETEMBRO DE 2011 ATÉ AO SEU EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO;

B) ASSIM COMO A QUANTIA QUE RESULTAR DA APLICAÇÃO DOS ALUDIDOS CRITÉRIOS DE DETERMINAÇÃO DA REMUNERAÇÃO VARIÁVEL AOS VALORES QUE VIEREM A SER APURADOS JUNTO DOS AGENTES DE EXECUÇÃO CONFORME REQUERIDO, ACRESCIDA DOS JUROS DE MORA À TAXA LEGAL VINCENDOS DESDE A CITAÇÃO ATÉ AO SEU EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO;

C) E AINDA DA QUANTIA DE 80.120,17 € A TÍTULO DE INDEMNIZAÇÃO DEVIDA NOS TERMOS DA AL.C) DO N°2 DO ART.1172° DO CÓDIGO CIVIL.;

OU SUBSIDIARIAMENTE:

D) NA RESTITUIÇÃO À A. DA QUANTIA 23.711,99 €, BEM COMO DA QUE RESULTAR DA APLICAÇÃO DO MESMO CRITÉRIO À QUE SE VIER A APURAR CONFORME REQUERIDO A FINAL, E AINDA DO VALOR DE 80.120,17 € PELO TRABALHO JÁ REALIZADO, COM QUE A R. INJUSTIFICADAMENTE SE LOCUPLETOU À CUSTA DAQUELA, NOS TERMOS DO ART.473° DO CÓDIGO CIVIL, ACRESCIDA DOS JUROS DE MORA QUE SE VIEREM A VENCER À TAXA LEGAL DESDE A CITAÇÃO ATÉ AO SEU EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO, OU ENTÃO, SE SE ENTENDER NÃO SEREM APLICÁVEIS À DERTERMINAÇÃO DO VALOR DO ENRIQUECIMENTO E CORRESPONDENTE EMPOBRECIMENTO OS CRITÉRIOS CONTRATUAIS DE FIXAÇÃO DA REMUNERAÇÃO VARIÁVEL, DEVERÁ A MEDIDA DO ENRIQUECIMENTO SER DEFINIDA NOS TERMOS DO ART.l00° DO E.O.A.

Alegou, para tanto e em síntese, ter celebrado com o antecessor do Réu, em 2000, um contrato de prestação de serviços de advocacia destinado à recuperação pela Autora de créditos da Ré, mediante determinada retribuição que foi sendo alterada ao longo do tempo na medida em que o contrato foi sendo sucessivamente renovado.

Mais alegou que o Banco Réu denunciou tal contrato para produzir efeitos a 9 de Maio de 2011, tendo as partes ajustado, para efeitos remuneratórios, que a Autora iria proceder ao levantamento do valor que se encontra já cobrado nos processos judiciais quer junto dos solicitadores de execução quer junto do tribunal até aquele momento, tarefa que se revelou morosa mas que culminou no apuramento da quantia de € 45.851,67 que a Ré se dispôs a remunerar apenas pela quantia de € 3.000,00, que a Autora não aceitou por não resultar de um factor de ponderação discutido nem dos critérios de cálculo de honorários vigentes ao longo do contrato.

Alega igualmente ter direito a ser indemnizada à luz do art. 1172º nº 1 c) do Código Civil pela “revogação/ denúncia" do contrato.

Contestou a Ré , pugnando pela improcedência do peticionado.

Realizou-se julgamento com observância do legal formalismo, vindo a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente condenando o Banco Réu a pagar à Autora  a quantia que resultar da aplicação dos critérios de remuneração variável contratualizados em 24/01/2011, reduzidos em 2% sobre o valor de € 67.613,89 e sobre os valores em poder dos solicitadores de execução deduzidos dos respectivos honorários.

 

O valor mencionado de € 67.613,89 resultou do despacho de rectificação de fls. 794, no qual se considerou existir erro de cálculo, alterando-se a verba inicialmente mencionada de € 98.168,07 para 67.613,89.

Foram dados como provados os seguintes factos:

A) A e R, à data denominada I..., SA, celebraram em 2000 um contrato de prestação de serviços, no âmbito do qual a A, por intermédio dos seus sócios e demais colaboradores, se obrigou a prestar à R a atividade decorrente do exercício do mandato forense.

B) O principal objeto da prestação de serviços contratada consistia na recuperação dos créditos da R emergentes do exercício da sua atividade.

C) Os honorários pelos serviços prestados consistiam no pagamento de uma quantia fixa por cada processo confiado à A e numa parcela variável em função da recuperação daqueles créditos.                                                                                                                                                  

D) Efetivamente, desde 2000 até 2011, a A, no desempenho do mandato conferido pela R, interveio em múltiplos procedimentos extrajudiciais e processos judiciais, de forma ininterrupta e ao abrigo de sucessivos contratos, alguns dos quais foram objeto de renovação e outros de aditamentos/ alterações.

E) Não obstante a sucessão de instrumentos a titular a prestação de serviços, o seu objeto principal bem como o modo de determinação dos honorários devidos foi sempre o mesmo, o referido em C);

F) Em janeiro de 2011 estava em vigor o contrato celebrado em maio de 2009 e renovado em maio de 2010, junto a fls. 22 a 33 dos autos.

G) A 24 de janeiro de 2011, por iniciativa da R, foi aquele contrato alterado nos termos do aditamento junto a fls. 34 a 38 dos autos.

H) Nos termos do citado Aditamento, as partes acordaram" alterar a Cláusula Quarta, nº 1 alínea a), a Cláusula Sexta nº 2, a Cláusula Sétima e a Cláusula Oitava do Contrato de Prestação de Serviços" (cfr. Doc. de fls. 34 a 38, Condição Primeira).

I) As partes acordaram também que "as restantes cláusulas e condições do Contrato de Prestação de Serviços a que o presente ADITAMENTO se reporta, mantêm-se em vigor sem qualquer alteração" e que" o presente ADITAMENTO entra em vigor em 01 de fevereiro de 2011 e faz parte integrante do Contrato de Prestação de Serviços celebrado entre as partes em 06 de maio de 2009 pelo que a sua vigência é pendência daquele" (cfr. Doc. de fls. 34 a 38, Condição Terceira).

J) A partir de 01.02.2011, as partes estipularam o pagamento pela R. à A., de uma" remuneração fixa determinada da seguinte forma: Por processo entregue ao segundo outorgante € 60.00 com exceção dos dossiers entregues com substabelecimento de outro Advogado, em relação aos quais não existe remuneração fixa; caso o primeiro outorgante assim o entenda e como forma de compensação dos dossiers entregues com substabelecimento de outro Advogado poderá ser acordada com o segundo outorgante uma entrega extraordinária de dossiers novos;

Por cada propositura de providência cautelar: € 30.00;

Por cada apreensão de veículo, para contratos de Locação financeira e Aluguer de Veículo Automóvel sem Condutor: € 30.00;

Por cada recuperação extrajudicial de veículo com toda a documentação necessária para se proceder à sua venda: € 50.00" (cfr. Doc. fls. 34 a 38 , Cláusula Oitava).

K) As partes acordaram, ainda, que "adicionalmente à Remuneração Fixa estipulada na cláusula anterior será paga ao segundo outorgante uma quantia a título de Remuneração Variável de acordo com a natureza e timings dos créditos efetivamente cobrados em fase de procedimento judicial tudo de acordo com as condições constantes das alíneas a), b) e c) do Anexo I. Porém e no caso da cobrança se efetuar por motivo alheio ao acionamento judicial tal quantia só será paga se o segundo outorgante demonstrar a sua intervenção" (cfr. doc. fls. 34 a 38 Cláusula Oitava).

L) Nas alíneas b) a e) do Parágrafo Único da mencionada Cláusula Oitava, as partes acordaram que:

"b) No caso de utilização de cheques pré-datados como meio de pagamento do crédito em dívida a data da contagem para efeitos de determinação da quantia a pagar será a data valor de cada cheque quando confirmada a sua boa cobrança;

c) No caso dos acordos de pagamento diferido, a quantia prestacional devida será paga mês a mês sobre os valores efetivamente cobrados, nos termos da Tabela do Anexo I, alínea b) ( ... );

d) Nos Processos Especiais de Recuperação de Empresas e Falências/ insolvência cujos intervenientes não tenham sido acionados os presentes honorários não serão devidos em relação aos correspondentes créditos;

e) As percentagens e valores previstos no Anexo I podem a todo o momento ser incrementados por percentagens e valores adicionais que venham a ser definidos pelo primeiro outorgante no âmbito de campanhas de recuperação" (cfr. Doc. fls. 34 a 38, Cláusula Oitava, Parágrafo Único, alíneas b) a e)).

M)No dia 25 de fevereiro de 2011, e um mês após a celebração do aditamento referido, a R. comunicou verbalmente a cessação do contrato.

N) A 9 de março de 2011, a A. recebeu a comunicação escrita da denúncia do contrato, junta a fls. 42 dos autos.

O) À qual a A. respondeu com a sua comunicação de 14 de março de 2011, na qual suscitava a questão da regularidade da denúncia - cfr. Doc de fls. 43- e na qual comunicou à R. que:

"1. ( ... ) confiámos que V. Exas quando comunicaram a "denúncia", o estavam a fazer corretamente do ponto de vista jurídico, ou seja, manifestando a vontade de não renovar o contrato para o respetivo termo, pressuposto no qual foi enviado o nosso email em 11.03.2011( ... ).

2. Não foi o que sucedeu, o que se constatou após análise cuidada do contrato.

3.  Com efeito, resulta da cláusula décima do contrato em vigor, assinado no dia 9 de maio de 2009, que o mesmo tem a validade de 1 ano e é renovado por idênticos e iguais períodos, salvo denúncia com a antecedência mínima de 30 dias em relação ao termo do prazo em curso;

4. Em consequência do exposto, a denúncia deveria ter sido feita para produzir efeitos a partir do dia 9 de maio de 2011 e não a 2 de abril, como manifestado;

5. A não ser assim, teremos de entender que V. Exas pretenderam, efetivamente, revogar o contrato e não denunciar o mesmo.

6. Ora, a revogação, nos termos da alínea c) do artigo 1172° do Código Civil, constituirá o BSCP no dever de indemnizar a PCMS pelos prejuízos causados ( ... ).

7. Assim, aguardamos uma clarificação da Vossa pretensão, sendo que, caso nada digam, o contrato permanece em vigor atento o disposto na mencionada cláusula décima do contrato,"

P) Vindo a R. a enviar a carta de confirmação da denúncia, agora para produzir efeitos a 9 de maio de 2011 - cfr. Doc.de fls. 44.

Q) Na sequência desta, a 24 de março de 2011, realizou-se uma reunião entre os sócios da A., M..., A... e M..., e os representantes da R., Dr. J... , Sr. P... e Drª S..., da qual resultaram acordados os pontos constantes da ata junta a fls. 45 a 47 dos autos.

R) Da mesma acta consta sob o ponto nº 2 o seguinte: 11  Deverá contabilizar-se, ao abrigo das condições remuneratórias contratualizadas, todo o valor referente aos "success  fee"pelos valores cobrados em fevereiro e março os quais deverão ser pagos ou garantidos atempadamente".

De acordo com a data de efeito da denúncia do contrato de prestação de serviços , ficou esclarecido que o valor referente aos success fee será devido pelos valores cobrados até ao dia 09 de Maio de 2011".

S) E sob o ponto nº 3 o seguinte : "  Deverá apurar-se todo o valor que se encontra já cobrado nos processos judiciais em curso quer junto dos solicitadores de execução, quer no próprio tribunal e que resulta do evidente trabalho desenvolvido pela PCMS no âmbito do contrato ora rescindido, o qual será comunicado ao BSCP e por este pago à PCMS de acordo com as condições remuneratórias contratualizadas.                                                                                                                                                               

Ficou acordado que a PCMS irá proceder , num prazo ideal fixado até 30 de Abril de 2011, ao levantamento do valor que se encontra já cobrado nos processos judiciais quer junto dos solicitadores de execução quer junto do tribunal.

Após este levantamento será analisada por ambas as partes a viabilidade de aplicação de um factor de ponderação, para efeitos de remuneração do escritório pelo trabalho desenvolvido".

T) A Autora comunicou à Ré o valor de € 245.851,67 que já tinha apurado, por correio electrónico de fls. 143 dos autos.

U) A Ré comunicou à A. que apenas estaria disponível para pagar a quantia de 3.000,00 € conforme doc. de fls. 54.

S) O que a A. não aceitou, cfr. doc. de fls. 55 dos autos.

T) Perante a posição da A., a Ré veio a retirar aquela proposta, cfr. doc. de fls. 56/57 dos autos.

U) A A. enviou nota dos honorários à R., que a recebeu a 23 de setembro de 2011.

V) A Ré devolveu-a à A. e nunca procedeu ao pagamento dos honorários em questão à A.

W) Em resposta à carta de denúncia da Ré, por correio eletrónico de 11.03.2011, a A. suscitou diversas questões que, no seu entender, deveriam ser acauteladas no âmbito da cessação de efeitos do contrato, referindo nomeadamente, nos pontos 2 e 3, que" deverá contabilizar-se, ao abrigo das condições remuneratórias contratualizadas, todo o valor referente ao "success fee" pelos valores cobrados em fevereiro e março os quais deverão ser pagos ou garantidos atempadamente" e que" deverá apurar-se todo o valor que se encontra já cobrado nos processos judiciais em curso quer junto dos solicitadores de execução, quer no próprio tribunal e que resulta do evidente trabalho desenvolvido pela PCMS no âmbito do contrato ora rescindido, o qual será comunicado ao BSCP e por este pago à PCMS de acordo com as condições remuneratórias contratualizadas" (cfr. doc. de fls. 141 e 142 dos autos).

X) A partir do dia 9.05.2011, a A. deixou de prestar quaisquer serviços à R. ao abrigo do mencionado contrato.

Y) Tendo, entre maio e setembro de 2011, a A. procedido à entrega à R. dos processos que lhe estavam confiados.

Z) No dia 24.06.2011, a R. comunicou à A. que "embora não decorra do contrato de prestação de serviços denunciado a obrigação de pagamento de uma remuneração variável sobre valores que não tenham sido efetivamente cobrados até à data da denúncia do mesmo, ficou vertido em ata de reunião, realizada em 2011/04/23, que iria ser efetuado pela PCMS um levantamento global do valor que já se encontrava cobrado nos processos judiciais, para efeitos de análise da viabilidade de aplicação de um fator de ponderação para remuneração do escritório pelo trabalho desenvolvido" (cfr. Doc. de fls. 48 a 52 dos autos).

AA) Mais comunicou que "torna-se determinante para efeitos da aludida análise o envio de comprovativo escrito (carta do SE ou certidão do Tribunal) que ateste a existência em cada uma das entidades dos valores indicados no ficheiro, bem como a data previsível para a efetiva transferência para o BSCP (quando aplicável, no caso dos SE)" (cfr.doc. fls. 48 a 52 dos autos).  

BB) A 20 de janeiro de 2011 a R. enviou para o escritório da A. 18 novos processos, a fim desta diligenciar pela recuperação dos respetivos créditos.

CC) Tal como estabelecido, a A. procedeu, no que lhe foi possível, ao apuramento das quantias já cobradas aos devedores em processos judiciais e que já se encontravam depositadas à ordem dos Agentes de Execução e dos Tribunais.

EE) Do moroso trabalho desenvolvido pela A., que encontrou inúmeros obstáculos e demoras, resultou que, pelo menos, já se encontrava efectivamente retirado da esfera jurídica dos devedores no âmbito dos processos judiciais e aí penhorados, o valor global de € 67.613,89, assim como já estavam, mercê de penhoras, em poder dos solicitadores de execução J... € 38. 700,73, € 35.479,80, M..., €10.993,7 , B... € 10.993,77 , € 905,86 C..., H... €14.026,67, R... € 461,30, C... € 4261,40, P... € 1539,72 , J... € 12233,86 e I... € 6.909,45, como quantias penhoradas e entregues aos agentes de execução.

 FF) Este valor não inclui quantias igualmente penhoradas cujo montante não foi possível apurar por falta de colaboração dos Agentes de Execução que não forneceram a respetiva informação em tempo útil, designadamente os Agentes de Execução  P..., M... e I...

GG) Estes Agentes de Execução possuíam (em 9.5.2011) em seu poder valores penhorados em inúmeros processos que estavam confiados à A.

HH) Nos valores referidos em EE) não estão incluídos valores relativos àqueles contratos em que foram feitos acordos de regularização das dívidas e cujas prestações continuaram e ainda hoje continuam a ser efetuadas pontualmente todos os meses, sendo que alguns dos correspondentes comprovativos ainda são presentemente enviados para o escritório desta e semanalmente levantados por estafeta da R. 

II) A A. na ausência de vontade da R. em estabelecer qualquer outro critério de fixação de honorários recorreu ao constante de contrato.

JJ) Utilizou, pois, o mesmo ficheiro informático mensalmente utilizado até aí para o efeito e que permitia o cálculo automático da parcela variável a pagar por cada dívida recuperada com respeito de todos os termos do critério, ou seja, consoante, por um lado, a antiguidade do crédito e, por outro, a recuperação fosse integral ou apenas parcial e, neste caso, houvesse ou não acordo.

                                                                                                               KK) A A. emitiu a referida Nota de Honorários 2011/00122 - cfr. documento de fls. 61 dos autos - no valor de 23.711,99 €, no cálculo dos honorários da referida A., utilizou o mesmo critério que vinha utilizando e que era o convencionado entre as partes para a retribuição de tais serviços / resultados.

LL) Há trabalho desenvolvido pela A. que só dará resultados (cobranças) já depois de o contrato ter deixado de produzir efeitos, como execuções, providências cautelares e ações já instauradas, contactos com devedores e negociações de dívidas para acordos, para além da existência de inúmeros acordos de pagamento de dívidas em prestações em cumprimento que, por se estenderem por vários anos, continuaria a R. a beneficiar com o seu trabalho.

MM) Os processos para os quais a A. foi mandatada só estarão concluídos com a recuperação do crédito ou declaração de incobrabilidade, sendo certo que quando cessou o contrato de mandato existiam inúmeros processos a correr  termos e ainda não concluídos.

NN) Parte do trabalho que a Autora efectua já havia sido realizado à data da denúncia.

OO) Do universo dos processos recebidos pela Autora durante a vigência do contrato de prestação de serviços, já se recuperaram 1.118.276,84 € (valor que inclui designadamente os acima referidos já apenas penhorados ) e as livranças nos processos não findos somam 10.165.269,59 €, e o valor não recuperado nos processos não findos ascende a 9.046.992,75 €.

PP) Considerando um valor global de livranças de 14.634.512,48 € e tendo-se recuperado um total de 5.233.243,80 €, por aplicação de uma regra de três simples resulta que o percentual médio de recuperação da A. é de 36 %.

QQ) Por aplicação da mesma regra entre os valores totais recuperados nos meses de Fevereiro, Março, Abril e Maio de 2011 e o total da remuneração variável correspondente paga à A., esta recebeu em média 8,2 % dos valores recuperados.

RR) No âmbito dos contratos que sucessivamente vigoraram no período decorrido entre o ano 2000 e o dia 9.05.2011, a R. foi confiando à A. o tratamento quer de novos processos de cobrança de créditos sobre clientes quer de processos inicialmente entregues a outros escritórios de advogados, mas que, em virtude da denúncia dos respetivos contratos de prestação de serviços, foram sendo substabelecidos na A.

SS) Entre 2006 e 2007 a R. entregou também à A. um conjunto 270 processos de cobrança inicialmente confiados a outro escritório de Advogados e que, por esse motivo, já se encontravam em fase mais ou menos avançada de cobrança, nomeadamente no que respeita a diligências judiciais já efetuadas, acordos de pagamento, penhoras realizadas.

TT) Relativamente a esses processos, a A. limitou-se a prosseguir as diligências já iniciadas, aproveitando nomeadamente todo o trabalho já efetuado relacionado com a interposição de providências cautelares e respetivas ações judiciais, as diligências de penhora, os acordos e planos de pagamento já existentes, procedendo à cobrança e entrega à R dos respetivos créditos e recebendo, sobre os valores em cada momento entregues à R, a correspondente remuneração variável.

UU) Idêntico aditamento ( ao referido em G) foi igualmente assinado com todos os restantes escritórios de advogados contratados pela R.

VV) Desde o início das relações entre A. e R, no ano 2000, a prática habitual seguida pelas partes, para efeito de cálculo da remuneração variável, foi a de considerar apenas os valores de créditos sobre clientes que, em cada momento, iam sendo entregues à R, no âmbito das diligências de cobrança realizadas.

WW) Para esse efeito, a A. comunicava mensalmente à Ré os montantes efetivamente cobrados nesse período, sendo, sobre esses montantes, aplicadas as diversas taxas acordadas, assim se obtendo o valor da remuneração variável devida em cada momento.

XX) Atendendo-se, ainda, ao momento da entrega à R, para apurar a percentagem a utilizar para efeito de cálculo dessa remuneração, a qual variava consoante a antiguidade do crédito cobrado.

YY) Esta prática, e os correspondentes benefícios daí resultantes para a A., nomeadamente de considerar para efeitos de cálculo da remuneração variável os valores recebidos nos processos substabelecidos a seu favor, constituía uma das regras do funcionamento do contrato que as partes aceitaram e com a qual se conformaram durante todo o período em que se mantiveram as relações entre ambas.

ZZ) Dos processos devolvidos pela A à R que não haviam sido substabelecidos, a A recebeu a remuneração fixa relativa ( e devida) a cada um.

AAA) Feitas as contas respeitantes apenas aos processos restituídos no final do contrato, temos que a R. pagou à A, e esta recebeu, o valor de € 64.240,00, ao qual acresceram, ainda, os valores pagos por cada diligência realizada, bem como os valores pagos a título de remuneração variável por valores efetivamente recebidos no seu âmbito.

BBB) A A. não chegou a enviar à Ré até 30/04/2011, o levantamento que havia proposto efetuar.

CCC) Do montante em poder dos solicitadores a que se alude em EE) a Ré não receberá as quantias devidas aos solicitadores de execução a título de honorários.

                                                                                                                                                                      

Inconformado, recorre o Banco Réu, concluindo que:

 - A A. é uma sociedade de advogados sujeita ao regime da transparência fiscal, previsto no artigo 6° do Código do IRC, de que decorre a imputação aos respectivos sócios de qualquer vantagem patrimonial atribuída à sociedade, nomeadamente em virtude da eventual procedência da presente acção.

- Em virtude do mencionado regime fiscal, as testemunhas Dra. A... e Dr. M..., oferecidas pela A., enquanto sócios da sociedade, têm interesse directo no resultado da acção, uma vez que do seu desfecho favorável lhes advirá necessariamente um benefício patrimonial, encontrando-se, assim, impedidas para depor, pelo que nos despachos lavrados nas actas de fls., das sessões de 15.01.2014 e 16.01.2014, que indeferiram o incidente de impedimento suscitado pela R., o Tribunal "a quo" violou o disposto no artigo 513°, número 2, do C.P.C.

- O Tribunal "a quo" procedeu, na sentença recorrida, a uma errada apreciação sobre a prova produzida relativamente a aspectos concretos da matéria de facto, devendo ser alterada a decisão proferida sobre os mesmos, nos termos previstos no artigo 640° do C.P.C;

- Concretamente, deverá ser alterada a decisão proferida sobre a matéria de facto constante do artigo 5° da base instrutória, o qual, face à prova produzida, não poderá deixar de ter uma resposta mais restritiva, com reflexo na redacção da alínea EE) dos Factos Provados, que deverá ser alterada de modo a que dela passe a constar apenas que "do trabalho desenvolvido pela A. resultou que, pelo menos, já se encontrava efectivamente retirado da esfera jurídica dos devedores no âmbito dos processos judiciais e aí penhorado um valor não concretamente apurado, assim como já estavam, mercê de penhoras, em poder dos solicitadores de execução J..., M..., B..., C..., H..., R..., C..., P... e J... importâncias não concretamente apuradas, como quantias penhoradas e entregues aos agentes de execução".

- A redacção da alínea FFF) dos Factos Provados deverá ser alterada, por forma a que dela passe a constar que "do montante em poder dos tribunais e dos solicitadores de execução, a ré não receberá as quantias devidas a título de custas e honorários dos solicitadores de execução, bem como as quantias a restituir em virtude de oposições ou incidentes julgados procedentes ou de penhoras realizadas em excesso".

- O Tribunal "a quo" deveria ter dado como provada a matéria de facto constante dos artigos 26° e 27° da base instrutória do despacho de fls., tendo em conta o que resulta quer do depoimento da testemunha da R., Dr" S..., que confirmou esta matéria de facto, quer do documento junto aos autos pela própria A., a fls. 475, e que evidencia que em 79,74% dos processos confiados à A. não havia qualquer montante cobrado, pelo que deverão ser adicionadas, aos Factos Provados, duas novas alíneas, com as letras GGG) e HHH) correspondentes a esta matéria, com a redacção:

"GGG) Como mais tarde a Ré veio a apurar, em mais de metade desses processos, correspondentes a mais de metade do valor total dos créditos ainda por cobrar, não existia qualquer tipo de penhora ou pagamento desde 2007" e

"HHH) E muitos outros processos encontravam-se parados a aguardar impulso processual por parte da A".

- No que respeita à decisão de direito, o Tribunal "a quo" julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a R. ora Recorrente no pagamento à A. Recorrida dos montantes devidos a título de remuneração, por aplicação dos critérios de remuneração variável previstos no contrato aos montantes em poder dos tribunais e dos agentes de execução a título de penhoras realizadas, assim se compadecendo com a teoria sustentada pela A. de que, relativamente a tais montantes, se encontrava realizado quase todo o trabalho de cobrança, mas escamoteando o facto de que tal como foi executado entre as partes, durante mais de dez anos, o contrato apenas previa o pagamento de tal remuneração no momento em que tais montantes fossem efectivamente entregues, ou seja quando estivesse efectuado todo o trabalho de cobrança, e não antes, pois só nesse momento se poderia considerar prestado o serviço e, por consequência, devida a correspondente remuneração;

- A denúncia comunicada pela R teve por efeito a cessação do contrato celebrado entre as partes, por caducidade, em 9.05.2011, termo do período contratual em curso, data a partir da qual cessaram, em consequência desse facto, todos os direitos e obrigações das partes nele fundados, nomeadamente a obrigação da A. de prestar quaisquer serviços, bem como o direito a qualquer remuneração, incluindo o direito à remuneração variável peticionada nos autos, nos termos do artigo 406º do Código Civil, de que decorre necessariamente a improcedência dos pedidos;

- Ainda que assim não se entenda, a cláusula 8ª do contrato apenas prevê o pagamento da remuneração variável, calculada de acordo com os critérios nela indicados, por "créditos efectivamente cobrados", inexistindo qualquer disposição ou cláusula contratual que estabeleça qualquer direito remuneratório após a sua extinção;

- Todos os elementos de interpretação, nomeadamente o elemento literal, o elemento económico e o elemento histórico da actuação das partes durante toda a sua vigência, permitem concluir que, de acordo com a mencionada cláusula 8ª do contrato, a remuneração variável apenas incide sobre os montantes que em cada momento forem entregues à R, a título de cobranças de créditos, não sendo de considerar para esse efeito os montantes em poder dos tribunais e agentes de execução mas ainda não entregues, fosse por que motivo fosse;

- Em consequência, não decorrendo do contrato o direito a qualquer remuneração variável por montantes não entregues à R até à data da cessação de efeitos do contrato em virtude da sua denúncia, não podia deixar de improceder o pedido respectivo, nos termos previstos, uma vez mais, no artigo 406º do Código Civil;

- Do mesmo modo, da acta da reunião realizada entre as partes, em 24.03.2011, para discussão de questões suscitadas pela A em consequência da cessação de efeitos do contrato, não decorre qualquer compromisso de pagamento de qualquer remuneração sobre montantes em poder dos tribunais ou dos agentes de execução;

- Nos termos daquela acta, foi acordado pelas partes que a A realizaria, num prazo ideal que as partes fixaram em 30.04.2011, ao levantamento dos montantes em poder dos Tribunais e dos agentes de execução, após o que ambas as partes analisariam "a viabilidade de aplicação de um factor" de ponderação pelo trabalho desenvolvido;

- Conforme expressamente referido pelas testemunhas da A e da R, as partes tinham apenas em vista apurar montantes já liquidados e prontos para entrega à R e que, por esse facto, as partes admitiam analisar a possibilidade, a viabilidade, de atribuição de uma remuneração;

- A A, ora Recorrida, não só não cumpriu o prazo acordado, como também não realizou o levantamento acordado, uma vez que, por correio electrónico de 16.06.2011, indicou à R ora Recorrente um valor que, para além de incluir cheques que nada tinham a ver com processos judiciais, correspondia aos valores totais penhorados à ordem dos processos, neles incluindo valores que já tinham sido entregues à R, e relativamente aos quais a A já tinha recebido oportunamente a correspondente retribuição, bem como valores retidos, quer por se encontrar a decorrer o respectivo processo de execução, quer por se destinarem ao pagamento de custas e honorários dos agentes de execução;

- A R não aceitou os valores indicados pela A., pelo que as partes não chegaram sequer a analisar "a viabilidade" da sua remuneração;

- Também a acta da reunião realizada entre as partes (a fls. 45) permite concluir, de acordo com as regras de interpretação do artigo 236º do Código Civil e os elementos de interpretação atendíveis, nomeadamente o elemento literal, a prática seguida pelas partes e os fins pretendidos com o levantamento a realizar (apurar eventuais valores prestes a ser entregues à R), que a R não assumiu qualquer compromisso ou obrigação de pagamento de remuneração variável por quaisquer importâncias que não lhe viessem a ser entregues até à data da cessação e efeitos do contrato, pelo que, ao decidir de modo diverso, o Tribunal "a quo" violou o disposto no artigo 236º do Código Civil;                                                                                                                                               

- Deste modo, quer por não resultar do contrato quer por não resultar de qualquer acordo firmado entre as partes, a A. não tem direito a qualquer quantia a título de remuneração por montantes em poder dos tribunais e dos agentes de execução e não entregues à R., ora Recorrente, até à data da cessação e efeitos do contrato, pelo que, ao julgar parcialmente procedente este pedido, o Tribunal " a quo" violou o disposto nos artigos 405º e 406º do Código Civil.

- Ainda que assim não se entenda, no que não se concede e só por mera hipótese absurda de raciocínio se coloca, deverão, para esse efeito, ser considerados apenas os montantes que, na data da cessação de efeitos do contrato, em 9.05.2011, estivessem efectivamente disponíveis para ser entregues à R., por se verificarem os respectivos pressupostos legais, deduzidos de todas as importâncias a restituir aos executados, quer na sequência de incidentes, oposições ou penhoras excessivas, bem como dos montantes devidos a título de honorários dos agentes de execução e custas judiciais, tal como resulta da redacção a dar à alínea FFF) dos Factos Provados, uma vez que, como já se alegou, eram apenas estas as importâncias que as partes tinham em vista na reunião realizada em 24/03/2011.

- Ainda nesta hipótese absurda, a redução de 2% sobre os critérios de remuneração variáveis previstos no contrato, decidida pelo tribunal, revela-se insuficiente em face das circunstâncias do caso concreto, pelo que a admitir, por mero absurdo, mas sem conceder, o direito da Autora a qualquer remuneração, a mesma não poderá deixar de corresponder a um montante meramente simbólico e não mais.

 Também a Autora recorreu, concluindo que:

-  Em A) e B) do pedido, a A peticionou a condenação do R. em juros de mora à taxa legal contados, respectivamente, desde 23/09/2011 e desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, nada dizendo a sentença a este respeito, nem no relatório, nem na fundamentação de facto ou direito, nem na decisão (dispositivo).

-  Sendo esta uma questão relevante e que deve ser apreciada na sentença, a sua falta constitui nulidade por omissão de pronúncia, nos termos da al. d), do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, que - nº 4 do citado artigo - deverá ser arguida neste e cujo conhecimento, nos termos do artigo 617º do mesmo diploma, se requer.

- O tribunal a quo incorreu em manifesto erro na apreciação da prova ao não dar por integralmente provado o "quesito" 14º-I, isto é que "pelo menos 30% do trabalho que a Autora efectua havia sido realizado à data da denúncia" substituindo a expressão "pelo menos 30%" por "parte", posto que, face ao teor dos depoimentos produzidos a este respeito, a A. produziu prova suficiente de que pelo menos 30% do trabalho estava realizado nos processos devolvidos à data da denúncia.                                                                                                                   

- A testemunha A... (minuto 13:00 a minuto 16:55 do depoimento) declara que: "Eu acho que 30% é pouco! Acho que estava muito mais que 30% feito. Eu apontaria para 70-80%, sem querer ser exagerada. Acho que estava muito mais de 30% do trabalho feito."

Por seu lado A... (1h24:00 a 1h33:40 do depoimento) depõe que: "Eu penso que estava até mais do que 30% do trabalho realizado" e após descrever as tarefas normais que se realizavam nos processos "Aqui não estão 30% do trabalho feito, nestes processos estão 70-80-90%" e conclui "e, por isso, dizemos que pelo menos 30%, mas mais, estava, portanto, feito."

-  Por último, M... (minuto 24:15 a minuto 26:00 do depoimento) diz que: "(...), porque com rigor e alguma objectividade, sem pretender dizer que está feito 80% do trabalho, se calhar não está, mas creio que metade do trabalho estará feito, de certeza absoluta mais, ou mais de metade do trabalho estará feito."

- As testemunhas em causa, sobretudo as primeiras duas, conheciam detalhadamente os processos por trabalharem neles diariamente, referiram o conjunto das tarefas que a levar a cabo até ao momento em que os processos eram julgados findos, afirmando de forma clara e segura que a percentagem de tarefas já executadas à data da denúncia era de 70-80% (as duas primeiras) e 50% (a terceira).

- Considerando que nenhum outro meio de prova foi produzido que infirmasse os depoimentos transcritos, a conclusão inevitável que se retira da conjugação daqueles é que mais de metade do trabalho naqueles processos já estava feito, e por maioria de razão que "pelo menos 30% do trabalho que a Autora efectua já havia sido realizado à data da denúncia.", facto este que se impunha ao tribunal dar por provado.

- Ao decidir em sentido contrário ultrapassou a Meritíssima Juiz a quo os limites do princípio da livre apreciação da prova, sobretudo a racionalidade e razoabilidade que deve nortear a convicção formada pelo julgador ao dar resposta a um quesito, no sentido em que tal resposta deve fundar-se num juízo subjectivo e de acordo com a experiência do julgador, mas sempre seguindo um critério lógico, racional, na valoração da prova acerca dele produzida.

- No que respeita à terceira questão em apreciação, ao julgar a alínea c), do artigo 1172.º do Código Civil somente aplicável à revogação mas já não à denúncia para o fim do prazo em curso, como é o caso dos autos, concomitantemente não sendo devida qualquer indemnização pela cessação do mandato, a Meritíssima Juiz a quo errou na interpretação quanto ao sentido, alcance e aplicação da norma, com a consequente violação do artigo 1172º, c) do Código Civil.

-  Na realidade, tanto a revogação unilateral como a denúncia consubstanciam o mesmo modo de cessação do contrato, ou seja, consistem numa extinção do contrato por manifestação voluntária de uma das partes de proceder à cessação do contrato - neste sentido vd. Prof. Antunes Varela in Das Obrigações em Geral, vol. II - 4ª Ed.  

- Também a Jurisprudência considera que a indemnização prevista nesta norma se dirige à revogação unilateral, esclarecendo que esta é, num sentido mais rigoroso e preciso, a denúncia do mandato, cfr. Acórdãos do STJ de 30-06-2009, de 13-11-1997  e de 02-12-2013, todos in www.dgsi.pt.

-  A Lei não pretende, assim, reger a revogação unilateral como forma distinta da denúncia, aliás não tratada em nenhum outro artigo do regime do mandato, mas antes estabelecer o regime e consequências da manifestação voluntária de uma das partes de proceder à cessação do contrato, estatuindo a respectiva consequência.

- Assim, a manifestação de vontade unilateral de cessação do contrato pelo mandante sem invocação de qualquer causa num mandato oneroso conferido por certo tempo ou para determinado assunto, ou em que o mandante o revogue sem a antecedência conveniente, constitui a parte que a efectua na obrigação de indemnizar a outra parte pelos prejuízos que lhe causar, nos termos do artigo 1172º do Código Civil.

- Ora, sabendo-se que a principal parcela de remuneração pelo mandato que o R. pagava à A, era a retribuição variável que, só ocorria com a recuperação do crédito.

-  E também que quando cessou o mandato existiam inúmeros processos a correr termos e ainda não concluídos, nos quais já haviam sido realizadas pela A, inúmeras diligências (telefonemas, contactos, requerimentos iniciais e processuais, contestações de embargos e demais peças pertinentes) tendentes ao seu termo.

-  E que só com a cobrança do crédito, a A viria a ser remunerada por todo o trabalho que entretanto já realizou ao longo dos anos do exercício deste mandato.

- É forçoso concluir que com a cessação do mandato, encontrando-se em curso inúmeros processos em que ainda não havia sido recuperado qualquer crédito nem havendo sido esgotadas as diligências tendentes a esse fim, a A nenhuma remuneração iria receber pelo trabalho neles desenvolvido ao longo de anos, pois que a remuneração variável apenas era devida sobre as importâncias já cobradas, decorrendo daquela cessação inquestionável prejuízo para a A

-  Portanto, ao decidir absolver o R. do pedido indemnizatório com fundamento na inaplicabilidade do artigo 1172.º do Código Civil a Meritíssima  Juiz a quo  errou na interpretação quanto ao sentido, alcance e aplicação da norma jurídica aplicada, com a consequente violação do artigo 1172º, c) do Código Civil. Mais

- Tendo-se presente que o mandato dos autos se iniciou em 2000 celebrado pelo prazo de um ano, e fruto de sucessivas renovações, em 2011 já ultrapassava 10 anos.

- E que na sua esmagadora maioria, os créditos só eram recuperados após alguns meses ou anos de exercício do mandato, posto que resultavam de acordo judicial ou extrajudicial em prestações ou da penhora de rendimentos mensais.

-  E também que a A. no exercício do seu mandato, não obstante não lograr a recuperação dos respectivos créditos, instaurou e impulsionou muitas execuções até ao seu termo ao fim de vários anos de pendência, isto é, até à constatação judicial da incobrabilidade da dívida, nomeadamente nas execuções anteriores à reforma executiva.

- Concluir-se-á que o mandato dos autos consubstancia um contrato de prestações duradouras, para cobrar os créditos emergentes do incumprimento dos contratos por parte dos clientes do R. em que a A. recebia mensalmente aqueles para diligenciar pela recuperação extrajudicial e judicial da dívida e que só estariam concluídos com a cobrança do crédito ou com a declaração judicial de incobrabilidade.

-  Pelo que, no caso dos autos, o mandante, ao estipular no contrato o prazo de um ano, automaticamente renovável por iguais períodos, não conferiu o mandato "por certo tempo", mas ao invés, conferiu-o expressamente para a recuperação dos créditos emergentes do exercício da sua actividade, isto é, para determinados assuntos cuja solução/termo bem sabia só ocorrerem no prazo de anos.

- Note-se que nos contratos como o do mandato do autos a estipulação do prazo de um ano automaticamente renovável não se destina a definir o tempo pelo qual é conferido o mandato, mas antes visa garantir a vigência/cumprimento do contrato pelo período estipulado em que as partes obrigam a cumprir as respectivas contraprestações.

-  Também por isto a Meritíssima Juiz a quo errou na qualificação da matéria de facto, com a consequente violação do artigo 1172º, c) do Código Civil.

-  Ficou provado que o R. a 20/01/2011 enviou 18 novos contratos à A para que esta diligenciasse pela respectiva recuperação e que a 24/01/2011, por iniciativa do R., foi aquele contrato alterado no termos do aditamento que entrou em vigor a 01/02/2011.

- Tal comportamento é incompatível com a vontade do R. em cessar o mandato, tendo naturalmente sido interpretado como indicativo da renovação do contrato nem sendo exigível outra interpretação por parte da A, à luz dos princípios da hermenêutica consagrados nos arts.236º e segs. do Código Civil, mormente a doutrina da impressão do destinatário.

-  Pelo que, sendo certo que o resultado do exercício do mandato - recuperação do crédito - só seria alcançável decorridos anos, só então recebendo a A a respectiva remuneração, facilmente se conclui que, a denúncia não foi feita com a antecedência conveniente.

-  Devendo em consequência a A ser indemnizada nos termos do citado normativo, pelo que não decidindo assim, incorreu o tribunal em erro de aplicação do artigo 1172.º à matéria provada.

Por último

-  No cálculo da indemnização, a A considerou os seguintes factores: percentagem de trabalho realizado pela A nos 1318 processos activos devolvidos ao R., montante total dos créditos não recuperados desses processos, valor médio de recuperação da A e remuneração variável média paga à A.

- Assim, aplicando ao valor por recuperar (9.046.992,75 €) a média de recuperação previsível caso os processos fossem concluídos pela A (36%) e, sobre o montante assim obtido, calculando-se a percentagem decorrente do trabalho já realizado (30%) e, finalmente, a este resultado aplicando-se o factor de remuneração variável médio de 8,2%, ou seja, 9.046.992,75 € X 36% X 30% X 8,2% = 80.120,17 €.

NESTES TERMOS, NOS MELHORES DE DIREITO E COM O DOUTO SUPRIMENTO DE V.EXAS., DEVERÁ SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, E POR VIA DISSO:

- DECLARAR-SE, NOS TERMOS DO ARTIGO 615.º, N.º 1, D), DO CPC, A NULIDADE PARCIAL DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA QUANTO AOS JUROS DE MORA PETICIONADOS PELA A, SEGUINDO-SE O PRESCRITO NO ARTIGO 617.º DO CPC.

- REVOGAR-SE PARCIALMENTE A SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUINDO-A POR OUTRA, QUE: JULGUE PROVADO EM SUBSTITUIÇÃO DO ACTUAL 00) UM FACTO COM O SEGUINTE TEOR "PELO MENOS 30% DO TRABALHO QUE A AUTORA EFECTUA JÁ HAVIA SIDO REALIZADO À DATA DA DENÚNCIA.";

- JULGUE QUE O REGIME DO ARTIGO 1172.º AL.C) DO CÓDIGO CIVIL SE APLICA À REVOGAÇÃO UNILATERAL DO MANDATO POR PARTE DO MANDANTE, MAIS PRECISAMENTE, A DENÚNCIA DO CONTRATO, PELO QUE, NOS TERMOS DESTA NORMA A DENÚNCIA DOS PRESENTES AUTOS CONSTITUIU O RÉU NA OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR A A PELOS PREJUÍZOS SOFRIDOS; E

- CONSEQUENTEMENTE CONDENE O BANCO RÉU NO PAGAMENTO DA INDEMNIZAÇÃO DE 80.120,17 €;

Após a rectificação operada pelo Mº juiz a quo (fls. 794), a Autora veio apresentar alegações complementares das já apresentadas, concluindo que:   

-  Salvo o devido respeito, que é muito, o tribunal a quo incorreu em manifesto erro na apreciação da prova ao dar por provado quanto ao "quesito" 5º, na parte que aqui interessa que "Do moroso trabalho desenvolvido pela A., (. . .) o valor global de € 67.613,89C,,)" decidindo em conformidade em "A) Condena-se o Réu a pagar à Autora a quantia que resultar da aplicação dos critérios de remuneração variável contratualizados  em 24 de Janeiro de 2011, reduzidos em 2%, sobre o valor de  € 67.613,89 ( ... )"

-  Antes de mais note-se que na presente acção, a ora recorrente pediu a condenação do Banco no pagamento da remuneração variável dos  créditos cobrados até 9 de maio de 2011 sem qualquer limitação quanto à respectiva origem ou âmbito de recuperação (judicial ou extrajudicial), apenas indicando o valor já apurado de 245.851.67 €.

-  Nenhuma das partes alguma vez questionou pois se tratava de ponto assente entre ambas e resulta do conteúdo da acta de fls. 45 a 47 dos autos (alínea Q) da matéria provada), que tal reunião se destinou a tratar da remuneração dos créditos cobrados pela PCMS até 9 de maio de 2011. uns já entregues e outros já cobrados e ainda não entregues ao Banco por razões maioritariamente burocráticas ou processuais, nunca se distinguindo se resultavam de acção judicial ou não, ou seja, o acordo em questão visou a remuneração do trabalho desenvolvido na recuperação de créditos e não apenas de créditos recuperados judicialmente.

-  E, como não havia dúvidas quanto aos valores cobrados directamente pela A. extrajudicialmente e só quanto aos créditos na posse de terceiros (tribunais e agentes de execução) se justificava uma estipulação concreta, no texto do acordo apenas se previu aquele que levantava maiores dificuldades e demora, definindo-se mesmo um prazo ideal para o efeito.

-  Após esse apuramento, a recorrente dirigiu à recorrida a mensagem que constitui o doc.7 junto pela recorrente (alínea T) da matéria provada) e que contém todos e cada um dos valores indicados pelos agentes de execução que já haviam respondido e ainda um Mapa contendo a soma dos valores que em cada processo se encontravam na posse dos tribunais  e os valores que a PCMS sabia estarem recuperados extrajudicialmente. por cheques já entregues ao Banco ora recorrido até 9 de maio de 2011 em contratos que para o efeito lhe haviam sido remetidos pelo Banco, num total de 120.339.11 €. juntando todos os documentos comprovativos destes de que dispunha e se encontram juntos aos autos.

-  O montante total de tais créditos ascendia aos aludidos 245.851,67 € e mereceu do Banco a resposta que consta do doc.8 junto aos autos (alínea U) da matéria provada), comunicando que "Perante os esclarecimentos prestados e atentas as evidências documentais enviadas relativamente aos processos abaixo elencados, considera o BSCP que deverá ser aplicado um factor de ponderação para remuneração do escritório pelo trabalho desenvolvido, do qual resulta um valor final de honorários de 3.000,00 €."

- Nessa data, o Banco tomou logo exacto conhecimento de estarem a ser considerados também os questionados cheques e não apresentou qualquer reclamação ou fez qualquer reparo  quanto a isso, pelo contrário, aceitou-os nos termos expostos e propôs mesmo remunerar o trabalho desenvolvido com a sua cobrança pelos indicados honorários de 3.000,00 €.

- A R.. ao longo de toda a acção, nunca questionou, seja em sede de contestação ou outra. que a remuneração em questão apenas incidiria sobre cobranças judiciais (na posse dos tribunais ou dos agentes de execução), ou ter-se-ia defendido expressamente nesse sentido excluindo os cheques do objecto do levantamento a efectuar pela A. nos termos do acordo. Contudo, a R. não impugnou nos articulados os valores dos cheques de fls.49 por não resultarem de  cobrança judicial e como tal nunca seriam contemplados pelo factor de remuneração a ponderar.

- Por outro lado, resulta da inquirição das próprias testemunhas da R. que a discussão em torno dos cheques se centrou não na questão de os mesmos emergirem de processos judiciais, mas sim na questão de haver ou não intervenção da A. na sua cobrança de que depende a possibilidade de os mesmos serem considerados para efeitos remuneratórios, ficando provado que o objecto do levantamento a efectuar pela A. não estava limitado às quantias cobradas no âmbito dos processos judiciais.

- Neste sentido, o depoimento da testemunha D... (inquirição dia 16/01/2014 das 16:47:21 às 17:25:30), resulta que os cheques em questão foram analisados detalhadamente somente para determinar se a A. teve ou não intervenção na sua cobrança. se levantando a questão se tais cheques não faziam parte do levantamento de que havia sido incumbida a A. (vd. depoimento de min. 09:10 a min. 38:08).

- Por sua vez a testemunha S... (inquirição dia 16/01/2014 das 14:29:02 às 16:46:19), admite que os cheques extra judiciais, como os de fls.49 se ficasse demonstrada a intervenção da A. eram remunerados da mesma forma que as cobranças judiciais: (vd. depoimento do min. 36:35 a min. 36:45; do min. 37:50 a min. 38:00; do min. 02:09:21 a min. 02:15:37 e do min. 02:15:22 a min. 02:15:30)

-  Entende a apelante que foi produzida nos autos prova de que aquele cheque de 32.013.20 € teve intervenção da ora recorrente, quer a que resulta do documento 46 última folha junto pela A. aos autos do qual consta "2011/02/02 (...) Advogados informaram ter contactado o cliente que pensa ter a situação com a seguradora resolvida no decorrer deste mês de Fevereiro no máximo", quer do depoimento da testemunha da R. Dina Fialho.

- Pelo que não deve este cheque ser deduzido, como os cheques de 17.753,00 €, 1.459,02 € e 1.500,00 €, do valor de 120.339,11 € do Mapa de valores apresentado ao banco relativo a valores já recuperados até 9 de Maio de 2011, devendo, em consequência, constar da alínea EE) dos factos provados e no segmento que constitui a alínea A) da decisão o valor de 98.168,07 € e não o de 67.613,89 €.

Autora e Ré contra-alegaram.

Cumpre apreciar.

Os recursos de Autora e Ré envolvem impugnação da decisão factual.

No caso da Ré, e para lá de esta se insurgir contra o facto de o tribunal ter admitido a deporem como testemunhas os Drs. A... e M..., sócios da sociedade autora, entende-se que a resposta dada ao quesito 5º – e consequente alínea EE) da matéria assente - deveria ser mais restritiva. Pretende igualmente a alteração do teor da alínea CCC) da matéria assente e que se dêm como provados os artigos 26º e 27º da base instrutória.

Quanto à Autora pretende que seja dado como integralmente provado o quesito 14º – I.

No aditamento às alegações, face ao despacho de rectificação do Mº juiz a quo, , pretende a recorrente que o montante de € 67.613,89 constante da alínea EE) da factualidade assente, seja alterado para € 98.168,07.

Começando pela impugnação fáctica do Banco Réu, o quesito 5º tinha a seguinte redacção:

“Do imenso trabalho desenvolvido pela Autora, que encontrou inúmeros obstáculos e demoras, resultou que, pelo menos, já se encontrava efectivamente cobrado pela mesma o valor global de € 245.851,67, que inclui cheque pré datado e entregue à Ré, bem como cheques já emitidos por seguradoras e relativos s indemnizações referentes a veículos da Ré e portanto devidas a esta?”

A resposta dada pelo tribunal a quo foi a seguinte:

“Do moroso trabalho desenvolvido pela Autora, que encontrou inúmeros obstáculos e demoras, resultou que, pelo menos, já se encontrava efectivamente retirado da esfera jurídica dos devedores no âmbito de processos judiciais e aí penhorados, o valor global de € 67.613,89, assim como já estavam, mercê de penhoras, em poder dos solicitadores da execução J... (€ 38.700,73 e € 35.479,80), M... (€ 10.993,70), B... (€ 10.993,77), C... (€ 905,86), H... (€ 14.026,67), R... (€ 461,30), C... (€ 4261,40), P... (€ 1539,72), J... (€ 12.233,86) e I... (€ 6.909,45), como quantias penhoradas e entregues aos agentes da execução”.

Inicialmente, a resposta dada pelo tribunal mencionava um valor global de € 98.168,07, mas, considerando ter existido um erro de cálculo – invocado pelo Réu – tal valor seria rectificado para € 67.613,89.

Há que notar que na resposta dada o tribunal teve o cuidado de se referir a verbas retiradas da esfera jurídica dos devedores (mediante penhoras) e não a verbas que iriam ser entregues ao Banco Réu. Isto porque sempre haveria que levar em conta o pagamento das custas e os honorários dos solicitadores da execução, já não mencionando a possibilidades de incidentes, oposições ou habilitações.                                                                                                                                                       

A razão de ser da rectificação prende-se com o montante de 4 cheques, no valor global de € 52.725,22, relativamente aos quais o tribunal não considerou provado que tivessem resultado de processos judiciais, pelo que tal valor foi subtraído ao valor de € 120.339,11 indicado pela Autora à Ré, no mail enviado por A... a S... em 28/06/2011.

Neste mail A... (advogada sócia da Autora) esclarece que esta verba corresponde aos “valores elencados nos Mapas enviados e a considerar para efeitos de remuneração do trabalho realizado pela PCMS na carteira em questão” tratando-se exclusivamente “das importâncias penhoradas até ao passado dia 9 de Maio de 2011” - ver fls.48 e 49.

A esta verba acrescem as quantias em poder dos solicitadores da execução, e ainda não entregues ao Banco Réu.

Quanto à matéria dos cheques, é verdade que no seu depoimento, a Dra. S... que liderava o contencioso do Réu e teve intervenção directa como interlocutora da Autora desde 2005, esclareceu que esses cheques resultavam de acordos extra-judiciais nos quais a Autora não teve intervenção.

A questão não é, no âmbito da apreciação da matéria de facto, se as verbas indicadas pela sociedade de advogados tinham de se reportar necessariamente a processos judiciais em que tivesse tido intervenção levando à cobrança judicial de créditos do Réu. Ao invés, aborda-se aqui qualquer tipo de actividade desenvolvida pela mesma Autora e de que resultasse a recuperação de créditos do Réu, incluindo pois as negociações pré-judiciais ou extra-judiciais. Se estas seriam ou não devidas fruto do contrato celebrado entre as partes e da acta da reunião que teve lugar a propósito da cessação do contrato por denúncia da Ré, é questão a discutir juridicamente.

Ora, relativamente aos cheques, nomeadamente aquele que aqui está em causa, no montante de € 32.013,20, fica a certeza de que o respectivo montante só seria considerado caso a Autora demonstrasse ter desenvolvido actividade (judicial ou extra-judicial) resultando na sua obtenção.

E em nosso entender tal não aconteceu.

A testemunha S... referiu que a propósito desse cheque – proveniente de seguradora, num caso de furto de veículo do Réu – que o assunto com a Seguradora foi tratado a nível interno do Banco incluindo os contactos com a seguradora. A funcionária do Réu, D..., referiu ter sido ela a enviar o recibo à Seguradora para que esta enviasse o cheque.

A Autora apenas logrou fornecer como prova da sua intervenção no caso, o fax de 02/02/2011, no qual D... comunica que “os advogados informaram ter contactado o cliente que pensa ter a situação com a Seguradora resolvida no decorrer deste mês de Fevereiro no máximo” - fls. 282.

Não nos parece que esta simples comunicação interna demonstre qualquer actividade da Autora, causal no sentido da obtenção do crédito em causa.

A Autora era remunerada – na parte da remuineração variável – em função dos resultados obtidos, na recuperação do crédito, e em função da actividade a tal conducente.

Nos processos judiciais tal actividade é, por razões óbvias, evidente. Mas tratando-se, como aqui acontece, de uma actividade extra-judicial, a Autora teria de provar, não só que o cheque foi recebido pelo Banco como tal aconteceu em função do trabalho por si realizado. Ou seja, não basta ter tido intervenção no caso, mas é necessário que essa intervenção fosse causal, no sentido de obter o pagamento da Seguradora ao Banco, mediante entrega de cheque.

E, face aos mencionados depoimentos de S... e D..., o fax referido não permite, só por si, demonstrar tal actividade conducente ao mencionado resultado. Trata-se de uma mera informação colhida junto do cliente.

Entendemos pois que foi acertada a decisão do tribunal a quo de não considerar o valor de € 32.013,20.

O mesmo se dirá dos cheques no valor de € 17.753,00 e de € 1.500,00, não se tendo provado a intervenção da Autora na sua obtenção (obtenção que no caso do primeiro nunca chegou a ocorrer, conforme depoimento de S...).

Já diferente é o caso do cheque no valor de € 1.459,02, sobre o qual S... reconheceu expressamente que o mesmo havia sido enviado ao Banco do escritório da Autora, o que indicia claramente que foi esta a realizar as diligências tendentes à sua obtenção.

Assim, e à verba global de € 120.339,11 haverá que deduzir € 51.266,20, o que perfaz a verba de € 069.072,91 devendo ser este, pois, o montante final apurado, corrigindo-se neste ponto a rectificação operada pelo tribunal a quo.

Voltando ao recurso do Banco Réu, pretende este que a resposta ao quesito 5º seja restritiva, nos seguintes termos:

“Do trabalho desenvolvido pela Autora resultou que, pelo menos, já se encontrava retirado da esfera jurídica dos devedores no âmbito dos processos judiciais e aí penhorado um valor não concretamente apurado, assim como já estavam, mercê de penhoras, em poder dos solicitadores da execução J..., M..., B..., C..., H..., R..., C..., P... e J..., importâncias não concretamente apuradas, como quantias penhoradas e entregues aos agentes da execução”.

Discordamos do recorrente.

Primeiro entende este que o que estava em causa era apurar valores que estivessem na eminência de ser entregues ao Banco nos dias seguintes à cessação dos efeitos do contrato.

Este entendimento foi expresso pela testemunha S..., que liderava o contencioso, e que participou na reunião com a Autora e da qual resultou a acta de fls. 45 e seguintes.                                                                                                                                                  

Saber aquilo que foi acordado em tal reunião é uma questão de interpretação do texto da acta, sendo que as partes divergem sobre o respectivo sentido.

Contudo, não é isso que está em causa no quesito 5º. O que se pretendia apurar é se, em resultado do trabalho desenvolvido pela Autora, já estava efectivamente cobrado por esta um dado valor correspondente a créditos do Réu.

E, a nosso ver, a resposta dada pelo tribunal foi a mais correcta.

Nomeadamente porque teve o cuidado de mencionar a verba global de € 67.613,89 – agora corrigida para 69.072,91 – não a título de créditos recuperados pelo Banco mas de verbas retiradas da esfera jurídica dos devedores – mediante penhoras, por exemplo. O mesmo relativamente aos montantes na posse dos solicitadores da execução.

Não se refere que esse montante global haja sido efectivamente recebido pelo Réu. Posteriormente à penhora podem ocorrer oposições e ocorrências incidentais, havendo ainda que ter em conta o valor das custas e da remuneração dos agentes da execução. Diz-se apenas que se trata de verbas retiradas da esfera jurídica dos devedores – à ordem do tribunal ou na posse de agentes da execução.

Quanto às verbas que se menciona estarem em poder dos solicitadores da execução, a formulação da resposta é exactamente a mesma, referindo verbas retiradas da esfera jurídica dos devedores.

Tais verbas, mencionadas na comunicação da Autora à Dra. S..., e junta a fls. 48 e 49, assentam nas listagens de fls. 215 a 223 e 230 a 276. Foram confirmadas pela testemunha Dra. A..., advogada sócia da Autora que elaborou tais listagens, e pelos solicitadores da execução J..., H... no tocante a fls. 219, P... no tocante a fls. 371 a 376 e com esclarecimento das anotações incorporadas na rubrica “valores penhorados”, incluindo um grande número de processos em que não foi efectuada penhora por inexistência de bens, B... no tocante a fls. 217 esclarecendo que aqui se trata de verbas transferidas para o Réu à data da cessação do contrato entre Autora e Réu. M... confirmou o mapa de fls. 216 mas aqui, nas suas palavras, trata-se de valores totais não incluindo ainda custas e honorários.

Assim e retirando-se alguma adjectivação, inútil no âmbito da matéria de facto, passa a ser a seguinte a redacção de EE) da decisão factual:

Do trabalho desenvolvido pela Autora, que encontrou obstáculos e demoras, resultou que, pelo menos, já se encontrava retirado da esfera jurídica dos devedores no âmbito dos processos judiciais e aí penhorado, o valor de  € 69.072,91, assim como já estavam, mercê de penhoras, em poder dos solicitadores da execução J.. (€ 30.700,73), M... (€ 35.479,80), B... (€ 10.993,77), C... (€ 905,86), H... (€ 14.026,67), R... (€ 461,30), C... (€ 4.261,40), P... (€ 1.539,72), J... (€ 12.233,86) e I... (€ 6.909,45), como quantias penhoradas e entregues aos agentes da execução”.    

Quanto à redacção proposta pelo recorrente para a alínea FF) da matéria de facto, entendemos que a mesma não se justifica, tendo em conta a redacção da alínea EE). De resto, na sentença proferida, não só não se liquida a verba em poder dos agentes da execução (mesmo que parcialmente) como se alude expressamente à necessidade de deduzir os honorários de tais agentes.

O Banco Réu, na lógica da sentença recorrida, está obrigado a pagar à Autora a remuneração variável calculada com base nos créditos que efectivamente lhe forem entregues. Esta, contudo, é uma questão de direito, que não terá razão de ser no âmbito da alínea FF), que assim se mantém nos seus precisos termos.

Quanto ao quesito 27º, não entendemos que o mesmo esteja provado. Só S... aludiu à existência de grande número de processos parados por falta de impulso processual da Autora, tendo tal facto sido claramente negado por Ana Pité (advogada da Autora, na altura estagiária e que se ocupou de quase todos os processos em análise.

Quanto ao quesito 26º a resposta pretendida, assente no depoimento de S..., carece de explicação. O número de processos sem penhora efectuada ou pagamentos, tem a ver geralmente, como esclareceram A..., A... e, de certo modo, a própria S..., com a inexistência de bens dos executados e não com incúria da Autora.

Acresce que o que está em causa, a nosso ver, não é o montante dos créditos não cobrados ou recebidos pelo banco mas sim o montante dos que efectivamente recebeu. Não estamos aqui a discutir, nem o quesito pode conduzir a tal entendimento, se a Autora foi ou não diligente no exercício das suas funções ao abrigo do mandato.

Nesta perspectiva, o quesito 26º pode ser dado como provado mas em termos restritos:

Em vários processos dos mencionados em Y) não existia qualquer penhora ou pagamento, nos termos do documento junto a fls. 475 a 498”.

Alega ainda o Banco recorrente que as testemunhas da Autora A... e M... se encontravam impedidas para depor, já que são sócios da sociedade de advogados Autora, e como tal, atento o disposto no art. 6º do Código do IRC, lhes será imputada qualquer vantagem patrimonial atribuída à sociedade, nomeadamente em virtude da eventual procedência da presente acção.

Nos termos do art. 496º do Novo CPC, “estão impedidos de depor como testemunhas os que na causa possam depor como partes”.

E, no art. 453º nº 2 do mesmo diploma, pode ler-se:

“Pode requerer-se o depoimento (...) de representantes de incapazes, pessoas colectivas ou sociedades; porém, o depoimento só tem valor de confissão nos precisos termos em que aqueles possam obrigar-se e estes possam obrigar os seus representados”.

Como sublinha Lebre de Freitas – Código de Processo Civil Anotado, 2º, p. 533 - “fonte de prova pessoal representativa, a testemunha é um terceiro em face da relação jurídica processual, ainda que não perante a relação jurídica material ou os interesses que no processo se discutem, estando pois excluída como tal, a parte e o seu representante legal (...)” - sublinhado nosso.

Visando o depoimento de parte, em primeira linha, a confissão, enquanto admissão de factos  prejudiciais à parte depoente e que beneficiam a parte contrária, é evidente que só pode depor nesta qualidade quem é parte no processo ou, no caso de pessoas colectivas, quem por lei represente a sua vontade.

No caso das sociedades de advogados, estas são representadas pelos respectivos administradores, art. 28º do Estatuto da Ordem dos Advogados.

As testemunhas referidas, A... e M..., embora sejam sócios da sociedade Autora não têm a qualidade de administradores da mesma.

Contrariamente ao pretendido pelo recorrente ao referir o disposto nos artigos 514º e 513º nº 2 do NCPC, a inabilidade para depor como testemunha não tem a ver com os benefícios que esta possa recolher com o êxito da acção, mas com a susceptibilidade de ser parte, seja por si, seja enquanto representante legal da Autora ou da Ré.

Voltando a Lebre de Freitas – op. cit. pág. 572 – entende este autor, na esteira de Alberto dos Reis, que a influência das respostas positivas da testemunha às perguntas sobre o parentesco, a amizade ou inimizade e a dependência relativa a uma das partes, bem como sobre o seu interesse, directo ou indirecto, na causa, “sendo livre a valoração da prova, mais não se trata do que de elementos susceptíveis de, juntamente com todos os outros colhidos no interrogatório principal da testemunha, ter influência nessa valoração”.

O art. 6º nº 1 do Código do IRC, limita-se a imputar aos sócios (no caso, das sociedades de profissionais), no seu rendimento tributável para efeitos de IRS ou IRC, a matéria colectável de tais sociedades, ainda que não tenha havido distribuição de lucros.

Isto não implica a transformação dos sócios em legais representantes da sociedade. Significa apenas que terão interesse na procedência da acção em que a sociedade que integram seja autora. Trata-se de um factor a considerar pelo tribunal na livre apreciação do depoimento de tais testemunhas, mas não mais do que, por exemplo, a subordinação jurídica a que a testemunha S... está sujeita, relativamente ao Banco Réu.

E diga-se, reapreciada a prova produzida, não vemos motivo algum para, num plano global, considerar tendenciosos e inverídicos os depoimentos seja de A...  ou M... ou de S..., embora na abordagem concreta de vários detalhes desses depoimentos possam, aqui e ali, revelar-se menos convincentes, o que  de resto é perfeitamente natural, mais a mais em depoimentos tão extensos e complexos.

Assim, nada obstava a que as referidas pessoas fossem ouvidas como testemunhas, improcedendo nesta parte o recurso da Ré.

Passando agora à parte do recurso da Autora que incide sobre a matéria de facto, pretende aquela que seja dado como provado o quesito 14º-I.

Não se vê razão para que o teor do quesito não tenha sido dado como provado, atentos os depoimentos de A... (que lidava directamente com os processos em causa), A... e M... e que nem sequer são infirmados pelas testemunhas da Ré S... e D...

Assim, aceita-se considerar como provado o quesito 14º-I com a seguinte redacção:

“Pelo menos 30% do trabalho que a Autora efectua já havia sido realizado à data da denúncia”.

Note-se que A... referiu 70% a 80% e M... “mais de 50%”.

Cabe ainda dizer que o quesito, em nosso entender, terá pouca relevância, desde logo porque nada refere sobre os resultados desse trabalho da Autora, no sentido de recuperação dos créditos do Réu.

Quanto às questões de direito.

As partes celebraram um contrato denominado de “prestação de serviços”, mediante o qual a Autora prestaria ao Réu serviços de advocacia mediante uma retribuição fixa e uma variável.

Para o caso dos autos, o que nos interessa é a retribuição variável, a qual ficou contratualmente delimitada nos seguintes termos:

“Cláusula 8ª 2:

“Adicionalmente à Remuneração Fixa, estipulada na cláusula anterior, será paga ao segundo outorgante uma quantia a título de remuneração variável de acordo com a natureza e “timings” dos créditos efectivamente cobrados em fase de procedimento judicial, tudo de acordo com as condições constantes das alíneas a) e b) do anexo I.

“Porém, e no caso de a cobrança se efectuar por motivo alheio ao accionamento judicial, tal quantia só será paga se o segundo outorgante demonstrar a sua intervenção”.

O contrato foi celebrado pelo prazo de um ano, sendo renovado automaticamente por iguais períodos, podendo ser denunciado a todo o tempo por qualquer das partes, produzindo a denúncia efeitos na data da recepção da comunicação, que deverá ser expedida com 30 dias de antecedência.

Os critérios constantes do Anexo I do contrato celebrado em 08/05/2009, foram alterados pelo aditamento celebrado em 24/01/2011, nos termos constantes de fls. 37 e 38.

O Banco Réu alega nada ter a pagar, a título de remuneração variável, após a data da cessação do contrato por denúncia. A sua perspectiva é a de que tal remuneração incidia sobre créditos efectivamente recuperados e entregues ao Banco à data da cessação contratual.

Foi essa a perspectiva defendida pela testemunha S.... Contudo esta admitiu que, a título excepcional, o Banco aceitou compensar a Autora por créditos recebidos pelo Banco no período imediatamente seguinte à produção dos efeitos da denúncia do contrato, embora não se tenha obtido uma clara delimitação de tal período.

Para o caso, é essencial a acta da reunião havida entre as partes, a 24/03/2011 (fls.45 a 47), na qual participaram, além de outros, A... e M.., da Autora, e S..., da Ré.

A acta define cada um dos pontos da agenda, ou seja, aquilo que vai ser debatido entre as partes, seguindo-se, em cada caso, o acordo obtido.

No ponto 3, discutia-se a seguinte questão:

“Deverá apurar-se todo o valor que se encontra já cobrado nos processos judiciais em curso quer junto dos solicitadores de execução, quer no próprio Tribunal e que resulta do evidente trabalho desenvolvido pela PCMS no âmbito do contrato ora rescindido, o qual será comunicado ao BSCP e por este pago à PCMS de acordo com as condições remuneratórias contratualizadas”.

Tendo sido acordado que:

“Ficou acordado que a PCMS irá proceder, num prazo ideal fixado até 30 de Abril de 2011, ao levantamento do valor que se encontra já cobrado nos processos judiciais, quer junto dos solicitadores de execução quer junto do tribunal.

“Após este levantamento, será analisada por ambas as partes a viabilidade de aplicação de um factor de ponderação, para efeitos de remuneração do escritório  pelo trabalho desenvolvido”.

O Réu alega que nunca aceitou que iria remunerar a Autora pelos valores cobrados nos processos judiciais à data da cessação do contrato, mas sim que iria considerar a viabilidade de atribuir um factor de ponderação para efeitos remuneratórios. Ou seja, poderia decidir pagar ou não, poderia estabelecer um critério remuneratório, ou não.

Esta interpretação do acordo não é, em nosso entender, aceitável. Surpreende, é certo, que um acordo celebrado por ilustres advogados situados em posições antagónicas, tenha um teor tão elíptico, indefinido.

Mas, tal como de resto se sublinha na sentença recorrida, não faz sentido que uma das partes se dê ao trabalho de compilar todos os valores já cobrados nos processos, em poder do tribunal ou dos solicitadores de execução, para que depois o Banco pudesse decidir pagar ou não.

Exige-se um critério de razoabilidade na interpretação das cláusulas de um acordo: quando uma das partes se compromete a efectuar uma certa actividade para apurar um dado valor não faz sentido que a outra parte fique, em termos totalmente arbitrários, com a faculdade de pagar ou não tal valor ou mesmo de  se recusar a encontrar um critério diverso do que vigorava para a remuneração variável.

As testemunhas da Autora, A... e M..., presentes na reunião ficaram convictas que o acordo visava, além do mais, o apuramento das verbas recuperadas pela Autora e ainda não entregues ao Banco Réu, para depois as partes encontrarem um critério tendo em vista a respectiva remuneração da Autora.

Por outro lado, S..., embora negue que o Banco se tenha comprometido a pagar, não deixou de admitir que, no caso da Autora, o Banco aceitou, excepcionalmente, remunerar o trabalho prestado pela Autora relativamente a processos com créditos recuperados, mesmo que estes apenas entrassem na esfera judídica do Banco após a cessação do contrato de prestação de serviços.

É nosso entendimento que a aludida cláusula do acordo estabelece um compromisso que se desenrola em duas fases: primeiro, a Autora apura o total dos créditos recuperados em processos judiciais mas ainda não entregues ao Banco – recuperação resultante, obviamente, da actividade da mesma Autora – segundo, as partes procuravam encontrar um critério diferente do que vigorava no contrato de prestação de serviços para a remuneração variável e, a partir do mesmo, o valor calculado seria pago à Autora.

Na reunião de 24/03/2011 foi fixado um prazo para a Autora proceder ao levantamento dos valores já cobrados quer nos processos, quer junto dos solicitares de execução quer junto do tribunal, prazo esse que ia até 30/04/2011.

É certo que a Autora não cumpriu tal prazo, mas também não deixe de ser patente que as partes fixaram essa data a título de mera referência (chamando-lhe “prazo ideal”) e não num sentido peremptório.

Daí que em 24/06/2011, S..., embora mencionando o facto de o prazo ter sido já largamente ultrapassado, continue a insistir junto da Autora para juntar os comprovativos – carta dos solicitadores de execução ou certidão do tribunal – relativos ao levantamento efectuado pela mesma Autora, o que significa que o Banco continuava a entender que o acordo de 24/03/2011 continuava a vigorar, apesar de o prazo ter sido ultrapassado.

Finalmente, em 03/08/2011, S... – sempre em representação do Banco Réu – comunica à Autora que:

Perante os esclarecimentos prestados e atentas as evidências documentais enviadas relativamente aos processos abaixo elencados, considera o BSCP que deverá ser aplicado um valor de ponderação para a remuneração do escritório pelo trabalho desenvolvido, do qual resulta um valor final de honorários de € 3.000,00”. 

Discutiu-se amplamente se esta comunicação representava uma aceitação pelo Banco das listagens enviadas pela Autora e dos valores globais por esta encontrados.

A... e M... afirmaram em julgamento ter sido essa a sua convicção. Contudo S..., autora da comunicação, explicou e de uma forma que se nos afigura bastante credível, que não existiu qualquer aceitação dessas listagens e valores. O que pretendeu dizer, foi simplesmente que, constatando os esclarecimentos e evidências – fossem estes bons ou maus, aceitáveis ou não – que a Autora enviara o Banco estava disposto a pagar € 3.000,00. S... esclareceu igualmente que o Banco não aplicou qualquer critério de ponderação, nem tomou em consideração o total das verbas indicadas pela Autora, limitando-se a “oferecer” uma verba (quase que simbólica) para acabar de vez com o litígio. 

Afigura-se-nos assim adequada a interpretação feita pelo tribunal a quo no sentido de não considerar provado que a comunicação de 03/08/2011 represente uma aceitação pelo Banco dos valores indicados pela Autora.

Isto não significa contudo que possamos aderir à tese do Banco recorrente de que nada tem a pagar à Autora. Alega o Banco que os valores indicados pela Autora se reportam a quantias em poder dos tribunais e dos agentes de execução, mas não entregues à Ré até 09/05/2011, data da cessação do contrato de prestação de serviços. Ora, insiste o Banco, nos termos de tal contrato nunca assistiu qualquer direito à Autora a receber remuneração variável por valores que ainda não tivessem sido entregues ao Banco.

Contudo e contrariamente a esta posição, o que está em causa não é o regime do contrato de prestação de serviços mas o acordo estabelecido entre as partes na reunião de 24/03/2011 e que prevê exactamente o pagamento de uma remuneração, atinente “ao valor que se encontra já cobrado nos processos judiciais, quer junto dos solicitadores de execução quer junto do Tribunal”.

Portanto, o Banco aceitou compensar a Autora pelo trabalho por esta realizado e conducente a valores cobrados nos processos judiciais, no tocante a verbas que, à data da cessação do contrato de prestação de serviços, ainda não tinham entrado na esfera jurídica do mesmo Banco.

Note-se, como já dissemos, que a própria chefe do contencioso do Banco, a já muito referenciada S..., não hesitou em confirmar que, embora não fosse prática habitual do Banco, no caso da Autora aceitavam pagar uma compensação relativa aos créditos pr esta recuperados judicialmente mas que só entrariam em poder do Banco após a cessação do contrato.

É, no fundo, este acordo celebrado entre as partes em 24/03/2011 que constitui a fonte do direito da Autora e da obrigação do Banco no tocante às mencionadas verbas.

Por outro lado e qualquer que seja o factor de ponderação a considerar, este terá de se reportar às verbas efectivamente recebidas pelo Banco e não às verbas retiradas da esfera jurídica dos devedores e em poder dos solicitadores de execução ou do Tribunal. Isto porque tais verbas serão deduzidas de custas, de honorários aos solicitadores de execução, além de outras circunstâncias que poderão ocorrer como o caso de ter havido penhora em excesso havendo que restituir uma parte da verba ao executado.

Assim, a obrigação do Banco recai sobre os montantes que efectivamente recebeu e não sobre os € 069.072,91 referidos em EE) da matéria de facto (já com a correcção operada no presente acórdão), que poderão funcionar como uma referência relativamente a valores cobrados nos processos mas não necessariamente a valores recebidos pelo Banco Réu.

Passando a abordar o recurso da Autora, deixaremos para o fim a questão dos juros de mora.

Quanto ao mais – e tendo já sido abordada a questão relativa à matéria de facto – pretende a Autora que lhe assiste um direito a indemnização pela cessação do contrato, por denúncia do Réu.

Nos termos do contrato de prestação de serviços celebrado entre as partes em 06/05/2009, cláusula 10ª nº 1, o contrato tinha a validade de um ano, sendo renovável automaticamente por períodos de igual duração, podendo ser denunciado a todo o tempo por qualquer das partes, produzindo essa denúncia os seus efeitos na data da recepção da comunicação, expedida com trinta dias de antecedência.

Tendo-se o contrato renovado automaticamente em 06/05/2010, por um novo período de um ano, veio o Réu, em 28/02/2011, denunciá-lo nos termos de fls. 42, com efeitos a partir de 02/04/2011.

Alertado pela Autora que tal denúncia, por não respeitar o prazo de um ano (que só terminaria em 09/05/2011) constituía uma verdadeira revogação unilateral, e tendo a mesma Autora solicitado que fosse esclarecida tal situação (fls. 43), o Banco respondeu em 17/03/2011, dizendo que denunciava o contrato em apreço com efeitos a partir do dia 09/05/2011 (ver fls. 44).

Perante isto, há que concluir que o Banco Réu denunciou o contrato para o termo do prazo, respeitando a aludida cláusula contratual.

Mesmo assim, pretende a Autora que lhe é devida indemnização nos termos do art. 1172º c) do Código Civil.

Entendemos que não lhe assiste razão.

O art. 1172º c) dispõe que:

“A parte que revogar o contrato deve indemnizar a outra do prejuízo que esta sofrer (...) se a revogação proceder do mandante e versar sobre mandato oneroso, sempre que o mandato tenha sido conferido por certo tempo ou para determinado assunto, ou que o mandante o revogue sem a antecedência conveniente”.                                                                                                                                          

Ora, o que esta alínea prevê não é o direito a indemnização por denúncia atempada do contrato celebrado com termo, mas sim a indemnização resultante da resolução contratual pelo mandante sem respeitar o mencionado termo.

É óbvio que, sendo celebrado em 1 de Janeiro um contrato com termo em 31 de Dezembro do mesmo ano, a denúncia feita pelo mandante, digamos que para produzir efeitos em Julho, equivale a uma resolução dado que não respeita o prazo acordado para a duração do contrato. E aqui sim, justifica-se a indemnização do mandatário que organizou os seus serviços, o seu trabalho, para um contrato com duração de um ano e vê subitamente, a meio do mesmo, a cessação contratual resolvida unilateralmente e sem causa justificada pelo mandante.

Mas quando as partes acordam em celebrar um contrato com duração certa, passível de ser denunciado por qualquer delas no termo de tal prazo, mediante comunicação efectuada com antecedência de um mês, não se vislumbra a que título deveria uma delas ter de indemnizar a outra por denunciar o contrato nos termos contratados, impedindo licitamente a sua renovação.

Como observa Manuel Januário Gomes - “Em tema de revogação do mandato civil” pág. 272 - “considera-se o mandato celebrado por certo tempo quando o mandatário se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos num determinado período temporal (...) Quando o mandato se integra numa destas espécies, o mandatário detém uma forte expectativa na permanência da relação contratual até final e na obtenção de uma determinada retribuição global. É, assim, de toda a justiça que o mandante que põe cobro às expectativas de permanência do vínculo, indemnize o mandatário pelos prejuízos sofridos.”

Quando num contrato se prevê a possibilidade de denúncia de contrato celebrado por determinado período, no termo deste, não pode haver qualquer frustração de expectativas legítimas, já que ambos os contraentes estão perfeitamente cientes da possibilidade de um deles não pretender renovar o contrato findo o prazo.

O facto de meses antes do termo do contrato terem sido ajustadas pelas partes modificações no cálculo da remuneração, sobretudo a variável, não pode significar que o Banco Réu se tenha comportado de modo a criar na Autora a convicção de que não iria denunciar o contrato. Significa apenas que, enquanto o contrato durasse, passaria a haver um diferente factor de ponderação. Não existem quaisquer elementos de prova nos autos que indiciem que o Réu actuou de modo a gerar a convicção da Autora de que o contrato seria renovado por mais um ano. No fundo, a denúncia de um contrato com termo é um direito potestativo que pode ser usado por qualquer das partes, desde que respeitada a antecedência da comunicação e a data em que o prazo termina.

A seguirmos a perspectiva da Autora, o contrato apesar de querido pelas partes com um termo certo, teria de se eternizar sob pena de uma delas, ao denunciá-lo ter de indemnizar a outra.

Quando as partes, mesmo no âmbito de um contrato de mandato, acordam estabelecer um prazo certo para o mesmo, podendo qualquer delas denunciá-lo com efeitos para o aludido termo, tal significa que foi seu objectivo que denunciado atempadamente o contrato este cessa no termo fixado, deixando de produzir quaisquer efeitos, sem que qualquer das partes esteja obrigada a indemnizar a outra em função de tal cessação.

A não ser assim, não faria qualquer sentido que os contraentes tenham estabelecido um prazo certo para a duração contratual. As partes não podiam ignorar que, denunciado o contrato no seu termo, haveria sempre processos pendentes, os quais iriam incorporar trabalho prestado pela Autora. Naturalmente que este trabalho deverá ser remunerado até à data da cessação contratual, mas nada no contrato prevê que a Autora deva ser remunerada, na componente variável, por créditos que venham a ser recuperados e efectivamente recebidos pelo Banco após a cessação da prestação de serviços.

E que assim é, mostra-se pelas negociações havidas entre as partes com vista à remuneração da Autora, pela Ré, com referência aos valores cobrados nos processos à data da cessação do contrato, mesmo que ainda não recebidos pelo Banco Réu – cláusula 3ª da acta de fls. 45 e seguintes.

É este acordo, e não o próprio contrato de prestação de serviços, que cria as bases jurídicas do direito da Autora a ser compensada nos termos descritos. Se as partes entendessem que tal direito decorria necessaria e directamente do contrato de mandato não faria sentido a realização da reunião de 24/03/2011 e as negociações que culminam no acordo final expresso nessa acta.

Sublinhe-se ainda que em tal acordo nunca se menciona qualquer indemnização decorrente da denúncia contratual nem a Autora invoca prejuízos sofridos em função de tal denúncia.

Não é igualmente aceitável falar-se de enriquecimento sem causa como fundamento da indemnização pela denúncia do contrato, na medida em que esta denúncia foi licitamente efectuada respeitando os termos contratuais. De resto, um dos pressupostos do enriquecimento sem causa é o de que uma das partes aumente o seu património à custa do empobrecimento da outra – ver acórdão do STJ de 23/04/1998, BMJ nº 476, pág. 371 e seguintes. E não se vislumbra qual o empobrecimento da Autora, a não ser que este se reporte ao facto de ter deixado de receber as remunerações decorrentes do contrato. Mas, se assim, for, existe uma causa justificativa, que é a denúncia do contrato no seu termo, levada a cabo pelo Réu com respeito pelos termos do próprio contrato, o que exclui a aplicação do art. 473º do Código Civil.  

Assim, concordamos com a sentença recorrida ao considerar indevida a indemnização peticionada ao abrigo do art. 1172º c) do Código Civil.

No tocante à verba devida à Autora, resultante do acordo de 24/03/2011 e já mencionado, referimos que a verba já apurada de € 069.072,91 não corresponde necessariamente à verba que foi ou irá ser efectivamente recebida pelo Banco Réu.

Na sentença recorrida, optou-se pelo recurso à equidade, ao abrigo do art. 1158º nº 2 do Código Civil. Com efeito, não se sabendo qual o valor que o Banco recebeu ou irá receber do montante global de € 069.072,91 (e muito menos dos valores em poder dos solicitadores de execução), decidiu o Mº juiz a quo aplicar um factor de redução de 2% sobre tais valores.

É preciso ter em conta que as partes, apesar de terem acordado que seria encontrado um factor de ponderação, para efeitos de determinação da retribuição variável, nunca determinaram tal factor, em grande medida porque o Banco Réu, recebida a listagem dos processos enviada pela Autora se limitou a oferecer uma compensação de € 3.000,00 sem referência a qualquer critério de ponderação – como o afirmou claramente a testemunha S...

Assim, a sentença recorrida remete para os critérios de remuneração variável contratualizados em 24/01/2011, reduzidos – por via da equidade – em 2%.

Afigura-se-nos adequado tal factor de redução. A grande maioria dos processos em apreço são execuções, sendo os créditos integrantes da verba de € 069.072,91 em grande parte resultantes de penhoras. A percentagem de 2% cobre a nosso ver a possibilidade de ocorrência de oposições – que não significam necessariamente que o Banco não venha a recuperar o crédito penhorado, já que nem todas as oposições são procedentes – outros incidentes e custas que também só ficarão a cargo do Banco exequente em determinados casos.

Note-se que o que está aqui em causa não é exactamente a medida da remuneração nos termos previstos no art. 1158º nº 2 do CC: a medida da remuneração é aqui calculada com base nos critérios de apuramento da remuneração variável que as partes haviam acordado no aditamento ao contrato de 24/01/2011. A redução de 2% é aplicada sobre o montante remuneratório calculado, tendo em atenção que, como dissemos, a verba global de € 069.072,91 não será necessariamente a recebida pelo Banco, face às possibilidades que acabámos de mencionar (oposições, incidentes, custas) ou, no caso de verbas em poder dos solicitadores de execução, os honorários destes.

Note-se ainda que só são levados em conta os processos em que houve recuperação de créditos (no todo ou em parte) e não naqueles em que nada foi obtido, não sendo sequer realizada pemhora face à inexistência de bens do executado: neste último caso, apesar do trabalho desenvolvido pela Autora esta não tem a haver qualquer remuneração variável.

Quanto à questão dos juros.

É patente que a sentença da 1ª instância condenou o Réu num montante ilíquido a liquidar em execução de sentença.

Tal iliquidez não tem apenas a ver com a verba a delimitar com referência ao montante de € 069.072,91 (ao qual serão aplicados os critérios de determinação da remuneração variável vigente contratualmente à data da cessação e em seguida operar-se-á o factor de redução de 2%) mas também com as verbas em poder dos solicitadores de execução, de montante não definido, ignorando-se igualmente o respectivo montante de honorários.

Não se pode dizer, para efeitos do art. 805º nº 3 (1ª parte) do CC, que a iliquidez seja imputável ao devedor. Era à Autora que incumbia o apuramento dos montantes recuperados aos executados, existentes em tribunal ou em poder dos solicitadores de execução. É certo que alguns destes dificultaram tal trabalho da Autora, impedindo que se atingisse um montante concreto. Mas o Banco Réu é estranho a tais factos.

Assim, os juros de mora, ao abrigo do art. 805º nº 3, só serão devidos a partir do momento em que os créditos da Autora se tornem líquidos, através de liquidação em execução de sentença.

Conclui-se assim que:

- Os sócios de uma sociedade de advogados que não desempenham quaisquer funções de administração da sociedade, podem depor como testemunhas em sede de julgamento.

- O facto de poderem ter interesse no desfecho da causa não os torna partes no processo; com efeito as partes definem-se não pelo interesse pessoal que detenham no resultado do pleito, mas pela possibilidade de representarem a pessoa colectiva, de expressarem por si a vontade desta.

- O benefício que o sócio possa vir a obter de uma procedência da causa é apenas um dos factores que deverão ser ponderados na avaliação do seu depoimento, a par de outros tais como o parentesco, a subordinação económica ou a subordinação jurídica.

- Num contrato de mandato celebrado com prazo de um ano, com a expressa possibilidade de qualquer das partes o denunciar no seu termo, a comunicação tempestivamente efectuado pelo mandante expressando a intenção de denunciar o contrato no seu termo não gera o direito a qualquer indemnização ao mandatário, nos termos do art. 1172º c) do Código Civil. 

Diga-se, a findar, que não vemos motivo algum para qualificar a conduta processual de qualquer das partes como eivada de má fé. A complexidade do processo, o muito elevado número de elementos fácticos a ponderar, o próprio debate jurídico sobre as questões de fundo, proporcionam as mais díspares reacções dos litigantes, sem que se possa afirmar que foram ultrapassados os limites da lisura.

As partes podem formular pretensões que poderão ou não ser sustentadas pela prova, que poderão ou não ser viáveis juridicamente, sem que isso signifique que deduziram pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não podiam ignorar, que alteraram a verdade dos factos ou omitiram outros, enfim que tenham efectuado um uso reprovável dos meios processuais ao seu dispor.

Improcede assim a peticionada condenação por litigância de má fé.

Face ao exposto, improcedem ambos os recursos condenando-se o Réu Banco ... a pagar à sociedade Autora a quantia que resultar da aplicação dos critérios de remuneração variável contratualizados em 24/01/2011, reduzida em 2%, sobre o valor de € 69.072,91 e sobre os valores em poder dos solicitadores de execução deduzidos dos respectivos honorários.

Custas por ambos os recorrentes em partes iguais.

LISBOA, 27/11/2014

António Valente

Ilídio Sacarrão Martins

Teresa Prazeres Pais