Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3655/06.9TVLSB.L1-1
Relator: TERESA DE JESUS S. HENRIQUES
Descritores: MATÉRIA DE FACTO
EXCESSO
CONTRADIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/29/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1) As respostas a artigos da base instrutória não têm de ser meramente afirmativas ou negativas, podendo ser restritivas ou explicativas, desde que se contenham dentro da matéria articulada, sendo que o excesso deve ser  considerado como não escrito ;
A contradição entre pontos de facto pode ser superada por diversas formas, designadamente :a prevalência  a que seja dada a certo elemento constante do processo dotado de força probatória plena ,por via da conjugação com outras respostas ou com matéria assente e até da reponderação dos meios de prova que se encontrem disponíveis e nos quais o tribunal se tenha baseado.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: I
A. PP-P, S.A.(PPP)
RR. V &M T- .... (V&M);
      XL- IC L... (XL).
                                                        
I. Relatório

I.A. Antecedentes processuais

A A intentou  acção declarativa condonatário contra as RR pedindo:
i) A condenação da V&M no pagamento da quantia de €5.824.787,99,acrescida de juros desde a citação e até integral pagamento;
ii) A condenação da XL no pagamento da quantia de €5.824.787,99,acrescida de juros desde a citação e até integral pagamento, no caso de existência de apólice de seguro cobrindo a situação que se descreverá infra ;
iii) A condenação da XL até limite do capital seguro seguro, e a V&M no remanescente.
Fundamentou a sua pretensão no seguinte:
i) Dedica-se: a) à exploração ,refinação, transporte e comercialização de  petróleo bruto e seus derivados; b)à exploração ,refinação, transporte e comercialização de gás natural; c) a outras actividades industriais, comerciais, de investigação ou prestação de serviços,  conexas com as anteriores, sendo proprietária da refinaria ….
ii) A R V&M dedica-se ao fabrico e comercialização de tubos de aço para utilização industrial.
iii) A cada 4 anos, a A procede a uma intervenção de manutenção generalizada em todas as unidades produtivas da refinaria, que sofre uma paragem geral de 30 a 40 dias.
iv) A fim de minimizar o tempo de paragem a a prepara a intervenção da manutenção com um mínimo de 18 meses de antecedência.
v) Para efeitos da intervenção de manutenção de 2000, a A celebrou um contrato de aprovisionamento com a sociedade FW F--- (FWF), mediante o qual esta se comprometeu a negociar, com vista à conclusão pela primeira, a contratação de todas as matérias primas e serviços necessários.
vi) Após negociação da FWF a A celebrou, com a  R V&M, um contrato de compra e venda  de um lote de 429 tubos de aço com as seguintes características e especificações :i)aço carbono ASTM A106 GRB ;ii) aço ligado ASTM A335 P11 e; iii) aço ligado ASTM A335P9.
vii) Devido às relações comerciais de longa data existentes entre a A  a R V&M  ,e porque o contrato de compra e venda foi previamente negociado pela FWF, quando nas  condições gerais do mesmo se lê FWF ,deve ler-se PPP.
viii) A  V&M transferiu para XL a responsabilidade civil emergente do contrato de compra e venda referido em vi).
ix) Os tubos de aço encomendados foram adquiridos com vista à substituição dos tubos das câmaras de convecção de duas peças fundamentais do processo de refinação ,os dois fornos de destilação atmosférica,CC-H1A e CC-H1B,e foram entregues em respectivamente :18/12;18/01 e;18/02.
x) Os trabalhos de manutenção iniciaram-se em 10/03/200 e foram concluídos em 10/04/2000.
xi) Os tubos das câmaras de convecção de ambos os fornos  foram substituídos  pelos tubos comprados à V&M ,designadamente os de tipo ASTM. A335 P9
xii) No dia 27/06/2002 a refinaria parou por motivos de greve laboral.
xiii) No dia 29/06/2002, procedeu-se ao re-arranque da Unidade de Destilação Atmosférica(UDA)
xiv) Quando o operador dos fornos fazia a ronda de inspecção prévia detectou crude no fundo do forno H1A,junto às zonas de combustão, pelo que o arranque foi de imediato abortado e, ordenada uma inspecção ao mesmo.
xv) Para não comprometer a totalidade da actividade da UDA, foram criadas condições para o arranque isolado o forno H1B.
xvi) No dia 30/06/2002,ainda na fase de arranque do dito forno ocorreu uma falha idêntica à ocorrida no forno H1A ,pelo que o arranque do mesmo foi de imediato abortado, com a consequente paragem de toda a UDA da refinaria de .....
xvii) Na inspecção levada a cabo pela A, constatou-se que os tubos de algumas das serpentinas de ambos os fornos apresentavam fissuras passantes, de grande extensão.
xviii) Solicitou a análise da situação, e emissão de parecer técnico ao Instituto da Soldadura e Qualidade(ISQ) e à FWF.
xix) A paragem da UDA implica, a curto prazo a paragem de toda a refinaria por inexistência de matéria-prima a processar nas restantes unidades.
xx) Para evitar o acumular de prejuízos a A procedeu à reparação dos fornos e substituição dos tubos danificados.
xxi) A substituição dos tubos fissurados foi concluída no forno H1A em 10/07/202, e no forno H1B em 17/07/2002.
xxii) O re-arranque do  forno H1A foi iniciado às 00.00h do dia 11/07/2002, e do forno H1B às 14.00 h do dia 17/07/2002
xxiii) E encontrava-se finalizado pelas 16.00 h do dia  18/07/2002,começando os fornos a laborar.
xxiv) O ISQ  enviou um relatório preliminar em 17/07/2002 e, um relatório final em 02/08/2002.
xxv) Em ambos concluiu que a fissuração tinha ocorrido por falta de submissão dos  tubos a tratamento técnico de revenido adequado.
xxvi) A FWF no relatório que remeteu em 19/07/2002 concluiu que as fissuras ocorreram devido a  defeito de tratamento térmico.
xxvii) Os tubos cederam  e fissuraram porque  não foram submetidos a tratamento térmico adequado.
xxviii) Em fax datado de 26/07/2002, a  A denunciou os defeitos à V&M, que respondeu por fax de 29/0/2002,pedindo informações sobre o ocorrido ,designadamente os relatórios do ISQ.
xxix) Após troca de correspondência e reuniões ,a V&M respondeu em fax de 11/10/2002,declinando  a responsabilidade pelo ocorrido argumentando que o sinistro ocorreu por  sobreaquecimento dos fornos, concluindo pela impossibilidade te de ter fornecido os tubos defeituosos.
xxx) Após mais troca de correspondência, e reuniões, durante o ano de 2003, a V&M enviou à A  uma carta, datada de 06/01/2004, contendo cópia do relatório fina levado a cabo pelos seu serviços e que concluía que os “ testes de alinhamento não provaram que a V&M não pudesse ter fornecido tubos T9 com estrutura martensitica.”
xxxi) A A, congratulando-se com o teor deste relatório, reclama da V&M a indemnização de €5.400.000,00,por prejuízos sofridos, que esta não contestou
xxxii) E concordou com a marcação de uma reunião para o dia 26/06/2004, para discussão de valores.
xxxiii) Na reunião estiveram presentes representante da V& M e, também, da XL, que já tinha sido informada do sinistro, sendo que a A descreveu  de novo o sinistro..
xxxiv) A V&M solicita informação detalhada sobre os prejuízos em 20/09/2004 ,tendo a A respondido em 13/10/2004,retendo o solicitado.
xxxv) Posteriormente a A V&M remeteu-se ao silêncio e quando confrontada com insistências da A foi pedindo informação sobre os danos ,que já havia sido remetida.
xxxvi) E, em 29/0672005,envia uma carta à A declinado o pagamento de qualquer indemnização por ter sido informada pela XL que o direito de acção havia caducado.
xxxvii) A A sofreu prejuízos num total de € 5.824.787.,99, sendo   € 433.460,03 por despesas de  reparação e substituição dos tubos defeituosos , e €5.452.340,68  a título de proveitos que deixou de auferir.
xxxviii) O contrato celebrado entre as partes é um contrato de compra e venda ,sendo que a V&M garantiu contratualmente (cl.ª II.2 e art.19º)o bom funcionamento dos materiais vendidos.
xxxix) No termos desta garantia, de 24 meses a contar da montagem industrial da fábrica (pronta para funcionamento inicial) e num máximo de 36 meses após o término da montagem), a V&M responde pelos defeitos verificados nos materiais vendidos independentemente de culpa ou erro, devendo substituir o material defeituoso.
xl) O prazo de garantia suspende-se quando a mercadoria se tornar indisponível ou inutilizável devido a incidentes da responsabilidade do fornecedor, o que equivale a dizer que a garantia se encontra suspensa atenta a falta de substituição dos tubos defeituosos e, consequentemente, os prazos de caducidade associados à mesma.
xli) A denúncia dos defeitos foi efectuada em 26/07/2002,após o conhecimento dos mesmos no relatório do ISQ de 12/07/2002 ,pelo que foi cumprido o prazo legal do art.921º do C Civ.
xlii) . A V&M é assim responsável contratual e legalmente  pelos prejuízos que causou à A.
xliii) A Xl é responsável nos termos do contrato de seguro que celebrou com a V&M.
As RR contestaram dizendo em síntese o seguinte:
i) A garantia contratual  de 24 meses começa a correr quando tem início a laboração ,acrescendo à mesma, mas antecedendo-lhe,  uma garantia de armazém com a duração máxima d 36 meses, que se inicia com a entrega do equipamento no local e termina no seu prazo, ou quando o equipamento inicia a sua laboração.
ii) Aceitando como correcta a data de início de laboração indicada pela A ,10/04/2000,a garantia expirou  em 10/04/2002, pelo que os incidentes relatados não estão cobertos pela mesma.
iii) Acresce que a A exigiu da V&M uma garantia bancária on first demand ,para vigorar pelo período de tempo correspondente ao da garantia do fornecimento.
iv) A V&M apresentou uma garantia com data de 06/01/2000 ,e data limite de validade até ao dia 06/04/2002 ,pelo que à data dos sinistros ,29 e 30 de Junho de 2002,já saquela tinha expirado, assim como a garantia contratual  a que estava  associada.
v) Os tubos defeituosos não foram produzidos pela V&M , pois a amostra que a A enviou a esta R, depois de analisada, revelou  uma composição diferente face à composição química dos tubos da sua fundição.
vi) Os tubos  fornecidos à A , ASTM A-335P9,form produzidos de acordo com as regras de produção específicas e sujeitos  tratamento adequado estando isentos d qualquer defeito.
vii) Cabe à A a culpa na produção do sinistro por incorrecta utilização e manuseamento do material.
viii) Os fornos desde o início de laboração, em Abril de 2000, até ao sinistro sofreram pelo menos 10 paragens decorrentes de greves laborais, todas de curta duração excepcionando a de 27 e 28 de Junho.
ix) O procedimento correcto de paragem consiste em diminuir progressivamente a temperatura nos tubos de 430º até atingir 120º, com um desnível de máximo de 30º por hora, devendo estabilizar nos 120º por 24 horas, e depois arrefecer ,com a mesma cadência , até à temperatura ambiente.
x) Aquando da paragem dos fornos em Junho de 2002, a temperatura desceu abruptamente até 120º , e depois até 50º, desrespeitando as regras de arrefecimento supra referidas e originando um choque térmico que  alterou a estrutura martensítica dos tubos ,provocando a sua cedência /fissuração aquando do reinício da laboração dos fornos.
xi) Acresce que na análise efectuada na amostra que recebeu da A, a V&M constatou que os tubos foram submetidos a uma temperatura superior a 730º,susceptível de alterar a estrutura cristalina dos aços.
xii) Este sobreaquecimento conjugado com o choque térmico derivado do arrefecimento abrupto constituem a causa directa da alteração da estrutura dos tubos.
xiii) Os prejuízos alegados são exagerados.
xiv) A montagem do equipamento foi efectuada por terceiros, desconhecendo as RR se foram cumpridos todos os procedimentos adequados.
xv) O direito de acção da A  caducou, porque a mesma limitou-se a relatar os  incidentes e nunca interpelou a V& para cumprir ,sem lhe fixar prazo para o efeito, o que anão configura denúncia.
xvi) Os incidentes ocorreram depois de expirado o prazo de garantia quer convencional, quer legal(art.916º CCiv).
xvii) Acresce que a compra e venda dos autos é uma compra e venda comercial , cujo prazo de denúncia de defeito é de 8 dias a contar da recepção da mercadoria, pelo que, também por esta via, e  atendendo às datas de entrega dos tubos e comunicação dos incidentes, o direito de acção da A caducou.
xviii) Por outro lado sempre a propositura da acção teria de ser considerada intempestiva, pois ultrapassou o prazo de seis meses a contar da denúncia dos defeitos(art.917º C Civ) .
xix) A R XL é parte ilegítima nos autos porquanto não sendo o contrato de seguro obrigatório ,a responsabilidade das RR não é solidária.
A A replicou rebatendo as excepções invocadas pela RR.
Os autos prosseguiram com selecção da matéria de facto e julgamento após o que foi proferida sentença cujo dispositivo é o seguinte :”Pelo exposto ,sem mais considerações por desnecessárias, julgo a presente acção declarativa de condenação ,que PP-Pl S.A., intentou contra V & M T-V&M e XL-IC Li… ,parcialmente provada  , m consequência, decido:
a) Condenar a XL-IC L… a pagar à autora a quantia de €2.982.143,00(dois milhões novecentos e oitenta e dois mil cento e quarenta e três euros),acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.
b) Condenar a XL- IC L.. a pagar à autora  quantia a liquidar em execução de sentença relativa aos trabalhos de reparação e substituição, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da liquidação e até integral pagamento.
Custas …”

I.B.Conclusões

I.B.1.a.Apelantes XL- IC L... e V & M T-V&M ....
(…)

I.B.1.b.Apelada- PP-P, S.A.

Pugna pela improcedência do recurso

I.B.2.a.Apelante -PP -P, S.A.

(…)

I.B.2..b.Apeladas- XL- IC L... e V & M T-V&M ....

A. (…)

I.C.Objecto dos recursos

Autora. Erro de julgamento nas respostas dadas aos art.74º a 95º,109º a 121º,122º a 135º,150º.

Rés.
i) Nulidade da resposta ao art.65º da base instrutória;
ii) Erro de julgamento nas respostas dadas aos art.32º,65º,87º,95º,108º,121º,135º,149º e 150º;
iii) Aplicação do regime da compra e venda mercantil ,art.463ºe seg do C Com, ao caso do saltos;
iv) Caducidade do direito da  A nos termos do disposto no art.471º do C com;
v) Inaplicabilidade do disposto no art.918ºdo C Civ à situação do saltos;
vi) Aplicabilidade do regime do art. 913º e seguintes do C Civ ao cumprimento defeituoso de entrega de coisa  genérica e , consequentemente, à situação  dos autos;
vii) Inconstitucionalidade da interpretação do art.918º,formulada na sentença;
viii) Caducidade do direito de acção da A nos termos dos art. 913º e seg do C Civ e, art.471º e seg do C Com;
ix) Incumprimento legal e contratual da A ;
x)  Exercício do direito de acção da A ao arrepio dos ditames da boa-fé ;
xi) Ausência de garantia no momento do sinistro;
xii) Culpa da A no agravamento dos danos;
xiii) Condenação das RR em juros de mora somente no momento em que a obrigação se torne líquida;
xiv) Condenação das partes em custas na proporção  do decaimento.

II.Fundamentação

II.A.Facto
(…)

II.B.Direito

Nulidade da resposta dada ao art.65º da base instrutória
Alegam as RR que a resposta dada ao art.65º extravasa o âmbito do perguntado, pelo que deve ser considerada como não escrita.
Perguntava-se neste artigo o seguinte :
A A , em posse dos relatórios técnicos, referidos em 59º e 63º,que lhe permitiram aferir da existência de defeitos em parte dos tubos ASTM A-335 P9 adquiridos à 1ª R ,comunicou de imediato o defeito(data referida em V)
A resposta dada, ponto n.º61 da sentença, é a seguinte: Os tubos referidos em 38° e 45° fissuraram por fractura frágil devido a baixa tenacidade do aço, provocada pelos procedimentos de fabrico.
A Mmª Juiz fundamentou a sua resposta dizendo o seguinte: “assentou no teor do relatório pericial de fls. 1672 a 1684 e esclarecimentos de fls. 1735 a 1738, designadamente a fls. 1681, reputando-se a resposta dos peritos como merecedora de credibilidade, atenta a sua natureza colegial e a unanimidade dos peritos quanto ao que motivou as fissuras dos tubos, conjugado com o teor do relatório do ISQ (junto a fls. 334 a 384) e depoimentos das testemunhas FL, que se deslocou ao local após a ocorrência, inspeccionou a câmara de convecção e visualizou os tubos ainda no local, tendo realizado no local testes (réplicas) e extraiu as amostras que foram submetidas a testes em laboratório, e CA, que reviu e validou o relatório elaborado pela testemunha anterior, ambos engenheiros de materiais do ISQ, e que foram peremptórias em concluir pela existência de falha no tratamento térmico de revenido dos tubos que fissuraram, tratamento térmico que referiram ser de fabrico, e cujo depoimento se afigurou merecedor de credibilidade atenta a sua competência e independência técnica, conclusões estas que não são postas em crise pelo documento junto a fls. 798 a 814 (relatório da MR - MF), pois que neste conclui-se, a fls. 806, que "o material dos tubos nos dois fornos rachou (fissurou) devido a elevada dureza da mantensite [conclusão idêntica ao relatório do ISQ] em combinação com elevada tensão provocada por elevados gradientes de temperatura (intervalos de variação de temperatura) durante o arrefecimento e reaquecimento", sendo que, neste particular, as respostas unânimes dos peritos afastam que a possibilidade de as fissuras terem resultado das condições de operação da refinaria.”
Como se constata da fundamentação , a preocupação foi no sentido de se precisar a causa das fissuras , inexistindo uma única linha relativa à comunicação do defeito à R V&M.
Considerando  o teor do artigo, que respeita a uma comunicação de defeito,  e o teor da resposta, que respeita à causa do defeito, é inegável que um nada tem a ver com o outro. A resposta não é explicativa e exorbita claramente o perguntado.
As respostas aos artigos da base instrutória não têm de ser meramente afirmativas ou negativas, podendo ser restritivas ou explicativas, desde que se contenham dentro da matéria articulada, sendo que o excesso deve ser  considerado como não escrito[1].
Assim , e sem necessidade de mais considerandos, considera-se a resposta não escrita.
E agora cabe dizer o seguinte
A A alicerça o seu pedido nos prejuízos causados  defeitos existentes no material adquirido à R V&M.
Ora com a eliminação da resposta dada ao art. 65º da base instrutória, e consequente eliminação do ponto n.º61 da sentença ,não existe qualquer facto provado que permita concluir pela existência de defeito no material adquirido pela A .
Explicando
Na sentença  , e relativamente à matéria de facto assente, estão especificadas, de forma algo desordenada  os seguinte pontos :1) a natureza de cada sociedade[a), b) e c)];2) ,a intervenção de manutenção [b)1];3)a negociação e a celebração do contrato[d)];4) parte da garantia decorrente deste[d)1];5)as datas em que ocorreram as rupturas nos tubos[s)];6) a denúncia dos defeitos e subsequente troca de correspondência entre as partes[e) a q) ,v) e,y)a  bb-3];7)a data de entrega dos tubos [d)];8)o comportamento da R V&M [x];9)a propositura da acção [w)];10)o contrato de seguro com a R XL[cc)];10)a garantia bancária[dd) e ee)];11) as datas de algumas greves ocorridas na unidade fabril[ff)];12) autoria da montagem do equipamento[gg)].
E ,relativamente à base instrutória, provaram-se os seguinte pontos[ número de ordem na sentença e correspondência ao artigo da base instrutória :1) a composição da unidade fabril e respectiva manutenção [n.º1 e 2- art. 3º e 4º da BI]; 2)o contrato[ n.º3 a 5- art.5º a 8º da BI]; 3) a entrega dos tubos[ n.º6-art.9º da BI]; 4) o funcionamento dos fornos em que são utlizados os tubos  em questão[ n.º7 a 25,152- art.10º a 29º,181ºda BI]; 5) os trabalhos de manutenção [ n.º26 a 29-art.26º a 29º da BI]; 6) a paragem por greve [ n.º30,151,153- art.33º,168º,169,182º BI]; 7)o retomar da laboração, a  detecção de crude no fundo dos fornos e a paragem total da unidade de Destilação Atmosférica,  a detecção dos tubos fissurados [n.º 31 a 42-art.34º a 45º da BI]; 8) a necessidade de substituição dos tubos fissurados, os respectivos trabalhos e custo [ n.º44 a 54º, 64 a 67,154- art. 47º a 57º,68º a 71º,183º da BI];9) o teor dos relatórios de duas entidades que apontam para defeito de fabrico nos tubos[ n.º43,55 a 61(o último eliminado como referido supra )- art.46º,59º a 64º da BI ]; 10)correspondência trocada entre a A e a R V&M [n.º62e 63 – art.66º e 67º da BI ];11) os prejuízos sofridos ,com base na capacidade produtiva e, no que deixou de produzir[ n.º68 a 141- art72º a 150º da BI];12) descrição dos tubos [ n.º142,143,143.1,145,147,148,149,150- art.153º,154º,155º,157º,160º a 163º,164º,165º,166º da BI da BI];13) Garantia [n.º144 e 146- art.156º e 157º];14) garantia bancária[ n.º155-rt.189º BI]
Ora está assente que : 22. O aço ligado com este tipo de especificações é especialmente indicado para utilização em fomos e caldeiras industriais. (25°)
23. Os tubos de especificação ASTM A335 P9 caracterizam-se por terem uma dureza na ordem dos 24IRE. (26°)
24. No processo de fabrico dos tubos ASTM A-335 P9 os tubos são submetidos a um tratamento térmico de revenido, destinado a conferir-lhes uma maior ductibilidade e diminuição de dureza, por forma a terem um valor de dureza na ordem dos 24IRB, correspondentes à sua especificação. (27°)
147. A 1 ª Ré nos certificados de material menciona ter procedido aos seguintes tratamentos térmicos: "10 minutos a 940 graus em ar; 60 minutos a 790 graus em ar; tempera e revenido". (160° a 163°)
148. De acordo com os certificados de material os tubos P9 devem apresentar uma micro estrutura mantensítica. (164°)
149. A dureza pretendida com o tratamento térmico de revenido é na ordem de 240HVI0. (165°)
Como se constata, com relativa facilidade, não existem factos relativos aos defeitos alegados.
É certo que nos pontos n.55º a 60º da sentença se menciona que os tubos padeciam de defeito de fabrico, devido a falta de tratamento térmico adequado.
Mas tal resulta de dois  relatórios periciais que, mais não são do que  meios de prova tendentes a demonstrar um facto(cfr.art.341º,388º e 389º C Civ).
Os pontos 55º a 60º são pois insuficientes  na medida em que  não são factos mas conclusões constantes nos relatórios  elaborados pelo Instituto da Soldadura e Qualidade(ISQ).
E dai que se tivesse dado ao art.65ºda base instrutória a resposta que se julgou não escrita pois, como já se disse, o tribunal não está vinculado às alegações das artes no tocante às regras de direito, mas não pode servir-se de factos que não tenham sido alegados(cfr.art.664º CPC ).
Importa pois averiguar o defeito de que padeciam os tubos.
As RR, nas suas alegações ( Crf. C)Recurso de direito 1.Em decorrência da procedência da nulidade da respostas conferida ao ponto n.º61 da matéria de facto provada a sentença ), afirma que com a eliminação da resposta dada ao art.65º, e consequente eliminação do facto n.º61 da sentença, inexiste causa de pedir ,e concluem que não tendo a A alegados quaisquer factos relativos ao defeito de fabrico pelo que a acção deve improceder tout court!
Mas não tem razão. Com efeito não foram levados à base instrutória todos os factos relevantes, e constantes dos articulados.
Assim ,no art. 47º da petição  “ Em suma, foi possível aferir que , ao contrário o que define a sua especificação técnico, alguns dos tubos com a especificação técnica ASTMA-335 P9,não foram sujeitos ao tratamento térmico de revenido adequado e próprio da sua especificação “
E no art.80º da réplica “ ..Cederam os tubos que padeciam de defeito de fabrico, por a R V&M Tubes os não ter submetido ao tratamento térmico de revenido próprio  da sua especificação “.
A factualidade omitida e constante dos artigos constantes da petição inicial e da réplica é pois relevante para se averiguar da causa da fissuração dos tubos.
Estipula o art.712º ,n.º 4 do CPC vigente  à data, no que ao caso interessa, que” Se não constarem do processo do todos os elementos probatórios que, nos termos da al.ª a) do n.º1,permitam a reapreciação da matéria de facto ,pode a Relação anular ,mesmo oficiosamente, a decisão proferida na primeira instância, quando repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre determinados pontos da matéria de facto ou quando considere indispensável a ampliação desta;..”
Importa pois ampliar a matéria de facto com a adição de dois novos artigos à base institória com o seguinte teor
Art.193º
Alguns dos tubos com a especificação técnica ASTMA-335 P9,não foram sujeitos ao tratamento térmico de revenido da sua especificação ?
Art.194º
E cederam ?
Acresce que os factos constantes dos pontos al.ªR) e ponto n.º 6, são contraditórios.
No primeiro está  assente que” Os tubos em causa foram fornecidos à A em Janeiro de 2000, mas o prazo contratual limite para entrega era em 18/02/2000.”
No segundo deu-se como provado que “Os tubos de especificação ASTM A335P9 ,encomendados à A pela R ,foram expedidos para a refinaria de .... em 03/03/2000.”
O ponto 6 constitui a resposta ao art.9º da base instrutória que perguntava o seguinte :
“Os tubos de aço encomendados ,foram entregues pela 1ª R à A respectivamente :(i) em 18 de Dezembro os tubos da especificação ASTM A106 Grb,(ii) em18 de Janeiro os tubos de especificação ASTM A335 P11 e (iii) em 18 de Fevereiro os tubos de especificação ASTM A335 P9 ?”
Este artigo reproduz ao art 22º da petição inicial.
A al.ªR da matéria de facto assente foi retirada  dos art.31º e 48º da contestação.
Parece evidente que se os tubos foram expedidos em Março, nunca poderiam ter sido fornecidos à A em Janeiro.
A resposta dada ao art 9º foi fundamentada da seguinte forma: ·”  art. 9°: assentou, quanto ao segmento provado, no teor dos documentos juntos a fls. 720 a 724 (tradução) e de fls. 748 a 757 - certificado de materiais, inspecção e entrega, anexos ao relatório elaborado pela FWF (empresa que fez o "procurement" para os materiais em causa e negociou a respectiva aquisição em nome da A.), e que respeitam aos tubos P9 em causa, já que o nO de encomenda neles referido corresponde ao n.º da nota de encomenda referida na aI. D. (1 CD0180.N01), o destino dos tubos é a refinaria de…, e tratam-se de tubos fabricados em M… tal como asseverou a testemunha JV (atenta a sua dimensão, só o laminador de M… estava apto a produzi-los, segundo referiu), documentos estes nos quais consta que os tubos foram expedidos para o local de destino em 03.03.2000, o que vai de encontro ao depoimento da testemunha Fernando Mártires Machado, responsável pela área de inspecção, que, em resposta ao art. 32°, referiu de forma espontânea e de memória que os tubos P9 tinham chegado à refinaria pouco tempo antes dos trabalhos de substituição dos tubos dos fornos (que como decorre do art. 29°da Base Instrutória tiveram o início em Março de 2000), logrando convencer o tribunal da sua verificação. Refira-se, ainda, que pese embora o que consta da alínea R. quanto à data de entrega destes tubos, o certo é que inexiste caso julgado formal quanto aos factos assentes da condensação, os quais não comprometem "a sua modificação posterior tendente a restabelecer a correspondência entre a verdade histórica e a emergente do julgamento" ou seja "o considerar determinado facto como provado ou não provado traduz-se numa constatação apropriada à fase de elaboração da condensação, mas que também pode e deve ser feita ou corrigida em qualquer momento posterior", designadamente através de resposta emergente do julgamento, "a não ser que a incongruência já esteja sob a protecção de decisão final sobre a matéria de facto" (Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, II, p. 227), o que não sucede no caso em apreço.
Quanto ao segmento não provado, nenhuma testemunha foi assertiva quanto à data de entrega dos tubos P11 e GrB, sendo inequívoco que as datas referidas neste artigo são as datas de entrega previstas no contrato, como decorre do documento juntos a fls. 265 a 303 - tradução a fls. 602 a 641 (nota de encomenda) . “
Ora,como é reconhecido na fundamentação, verifica-se uma contradição na alínea e na resposta ao artigo da base instrutória.
No entanto, esta contradição pode ser superada por diversas formas, designadamente :a prevalência  a que seja dada a certo elemento constante do processo dotado de força probatória plena ,por via da conjugação com outras respostas ou com matéria assente e até da reponderação dos meios de prova que se encontrem disponíveis e nos quais o tribunal se tenha baseado.[2]
A reposta ao artigo em questão é explicativa, na medida em que precisa a data de entrega dos tubos pelo que, atento o disposto no art.712º,n.º4, do CPC vigente à data, elimina-se a al-ª R da matéria de facto assente.
Em síntese diz-se o seguinte:
1) As respostas a artigos da base instrutória não têm de ser meramente afirmativas ou negativas, podendo ser restritivas ou explicativas, desde que se contenham dentro da matéria articulada, sendo que o excesso deve ser  considerado como não escrito ;
2) A contradição entre pontos de facto pode ser superada por diversas formas, designadamente :a prevalência  a que seja dada a certo elemento constante do processo dotado de força probatória plena ,por via da conjugação com outras respostas ou com matéria assente e até da reponderação dos meios de prova que se encontrem disponíveis e nos quais o tribunal se tenha baseado.
III.Decisão

Considerando o que se acaba de expor anula-se a sentença impugnada e :
i) Elimina-se a al.ª R da matéria de facto assente;
ii) Determina-se a ampliação da matéria de facto como referido supra, devendo os autos  baixar à primeira instância,e  prosseguir nos termos do art.712º,n.º.

Custas a final.


Lisboa, 29.04.14

Teresa Jesus Ribeiro de Sousa Henriques

Isabel Maria Brás da Fonseca

Maria Adelaide Domingos

[1] Vide art.664º2ª parte,646º,n.º4,do CPC, Alberto dos Reis, CPC Anot, Coimbra, Reimp, IV/500 e 547 ,e , de entre vários, os acórdãos do STJ de 03/12/1974,proc n.º 64713(Abel de Campos) ,de 11/03/1992,proc. n.º081555(Fernando Fabião),de 31/03/1998,proc n.º 97A931(Martins Costa);de 11.12.2008,proc n.º08B3602(Alberto Sobrinho) e ;30/11/2010,proc n.º 581/1999.P1.S1(Alves Velho) , todos disponíveis in www.dgsi.pt
[2] Abrantes Geraldes ,Recursos em Processo Civil ;Almedina,2008/282