Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
99/24.4PFVFX-AL1-9
Relator: MARIA DE FÁTIMA BESSA
Descritores: MEDIDAS DE COAÇÃO
REBUS SIC SANTIBUS
OBRIGAÇÃO DE PERMANÊNCIA NA HABITAÇÃO
AUSÊNCIA
ACTIVIDADE PROFISSIONAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/03/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: I- Quer se atente nas situações elencadas no art.º 212 do CPP (revogação, alteração e extinção das medidas) quer nas prevenidas no art.º 213.º, do CPP (reexame dos pressupostos da prisão preventiva e da obrigação de permanência na habitação) a lei pressupõe sempre que algo mudou entre a primeira decisão e a segunda ou subsequentes decisões de reexame dos pressupostos de facto e de direito das medidas de coacção, máxime das privativas de liberdade (prisão preventiva e Obrigação de permanência na habitação com ou sem vigilância electrónica).
II- As medidas de coacção estão sujeitas à clausula rebus sic stantibus, pelo que o Tribunal que aplicou a medida só a pode substituir ou revogar quando tenha ocorrido uma alteração dos pressupostos de facto ou de direito, isto é quando ocorrer uma atenuação das exigências cautelares que tiverem determinado a sua aplicação.
III- Na medida de coação obrigação de permanência na habitação, com ou sem vigilância electrónica, (art.º 201.º, do CPP) a possibilidade de exercer uma actividade profissional e a necessidade de o fazer para assegurar as necessidades básicas não constitui circunstância susceptível de alterar os pressupostos de facto e de direito que determinaram a sua aplicação e, consequentemente, fundamentar uma medida menos gravosa.
IV- A OPHVE sendo uma verdadeira medida privativa da liberdade impõe ao arguido entre outras, a obrigação de não se ausentar ou não se ausentar sem autorização da habitação própria ou de outra em que no momento resida, sendo o período de permanência na habitação, tal como na prisão preventiva, descontado por inteiro no cumprimento da pena de prisão que porventura venha a ser aplicada ao arguido (art.º 80.º, n.º1, do CP).
V- A autorização para sair/ausentar-se da habitação prevista no art.º 201.º, do CPP constitui uma excepção, e só pode ser autorizada judicialmente se justificada por razões/motivos também eles excepcionais, ponderosos, de muita importância ou gravidade, pontuais, justificados e apreciados caso a caso, tais como, para consultas ou tratamentos médicos que não justifiquem a obrigação de permanência do arguido numa instituição de saúde, ou o cumprimento de relevantes obrigações sócio-familiares, tais como a visita a cônjuge, ascendente ou descendente gravemente doentes ou a comparência em velório ou funeral de um daqueles.
VI- Uma regular ausência quer para estudar fora de casa quer para desempenhar uma actividade profissional, implicaria regulares e continuadas deslocações desde a habitação para o local de trabalho ou estabelecimento escolar e vice-versa, redundaria num regime de semi-detenção, que não se enquadram naquelas justificações pontuais, excepcionais e ponderosas, porquanto enfraqueceria o carácter cautelar desta medida de coacção, esvaziando grande parte do seu conteúdo e desvirtuando parte da sua natureza detentiva cautelar, e o seu deferimento colocaria em causa, de forma flagrante, as exigências cautelares que estiveram na base da sua aplicação e que subsistem sem atenuação.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores na 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:

I Relatório
1.
No âmbito do processo 99/24.4PFVFX, foi proferido, em 18/12/2024, o seguinte despacho:
Em face do exposto, ao abrigo do art.º 213º, n.º 1 do Código de Processo Penal, indefiro a requerida substituição e decido que AA aguardará os subsequentes termos do processo em OPHVE.
Indeferindo a pretensão do arguido de alteração da medida de coação OPHVE para medida menos gravosa que permitisse o exercício da sua actividade profissional ou, a manter-se, que fosse autorizada a saída do arguido da sua residência para exercício da actividade profissional, mantendo, assim, o estatuto coactivo do arguido AA, a quem, havia sido aplicada a medida de coacção obrigação de permanência na habitação com sujeição de Vigilância Electrónica, prevista no artigo 201.º, números 1 e 3 do CPP, por haver fortes indícios da prática pelo arguido, em autoria material, de um crime de violência doméstica, agravado, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea a) do Código Penal, por em concreto, se verificarem os pressupostos específicos mencionados no art.º 201.º do Código de Processo penal e os perigos de perturbação do inquérito e de continuação da actividade criminosa a que se referem as alíneas b) e c) do n.º1 do artigo 204º do Código de Processo Penal.
*
2.
O arguido, por não se conformar com esse despacho, vem interpor o presente recurso, extraindo da motivação as seguintes CONCLUSÕES: (transcrição)
1.º Com o devido respeito, e quanto à manutenção da medida de coação, entende o Recorrente que devia o Tribunal a quo ter optado pela aplicação de uma medida de coação menos gravosa ou, em alternativa, ter-lhe autorizado a deslocação para prática laboral.
2.º Desde logo, por inexistência do requisito da alínea a) do 204.º CPP: o arguido possui residência fixa, vive com o pai e não existem elementos que indiquem qualquer intenção de se furtar à ação da justiça.
3.º De igual modo, por inexistência do requisito da alínea b) do art.º 204.º CPP, na medida em que, desde a imposição da medida, o arguido não praticou qualquer ato que indicasse tentativa de interferência nos meios de prova.
4.º Por fim, por inexistência do requisito da alínea c) do art.º 204.º CPP uma vez que, o arguido pretende retomar uma atividade laboral regular, em ambiente supervisionado e distante da ofendida, demonstrando vontade de reintegração e afastamento de qualquer conduta criminosa.
5.º O arguido pretende exercer atividade laboral em local fixo, devidamente identificado e distante da residência da ofendida, em horário comercial regular, o que permite monitoramento eficaz pelas autoridades, caso necessário.
6.º A recusa em permitir que o arguido trabalhe, mesmo sob condições rigorosas, acentua as dificuldades econômicas que enfrenta, comprometendo não apenas sua subsistência, mas também o cumprimento de obrigações familiares no que respeita aos filhos menores.
7.º O que evidencia uma clara violação dos princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito, os quais não foram tidos na devida consideração na fundamentação do despacho recorrido.
Nestes termos e nos demais de direito, deve o presente recurso ser admitido, e em consequência, ser o douto despacho recorrido revogado e substituído por outro que, ordene a alteração da medida de coação de OPHVE por outra menos gravosa; ou em alternativa, a autorização para que o arguido possa ausentar-se da residência, estritamente para o exercício da atividade laboral na empresa indicada, sob as condições que V. Exa. entender adequadas, fazendo-se assim a costumada Justiça!
3.
O requerimento de recurso foi admitido por despacho cujo teor se transcreve:
Ref.ª 16107462:
Admito o recurso interposto pelo arguido, porque tempestivo e requerido por quem tem legitimidade, o qual sobe imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo –cf. art.º 399º, 401º nº1 al. b), 406º, 407ºnº2 al. c) e 408º à contrário, do CPP.
Notifique – cf. artº 411º nº6 do CPP-.
Dê cumprimento ao disposto no artº 414º nº5 do CPP.
Organize apenso de recurso, com as peças habituais e certidão integral dos autos ao interrogatório subsequente de arguido (ref.ª 162456347), requerimento ref.ª 16003291, promoção ref.ª 163280536, despacho recorrido ref.ª 163323517, requerimento de interposição de recurso e do presente despacho.
4.
O Ministério Público veio responder ao recurso, extraindo da resposta as seguintes conclusões:
1. Proferida uma decisão que determine o agravamento do estatuto coativo de um arguido, e consolidada a mesma na ordem jurídica, o caso julgado formado pela mesma assume uma natureza, que poderemos chamar de provisória ou precária.
2. Esse caso julgado formal produzirá os seus efeitos, apenas enquanto se mantiver inalterado o enquadramento factual e jurídico em que assentou, podendo a decisão em causa ser revertida ou substituída, quando se verifique uma alteração significativo no plano desses pressupostos.
3. Em sentido, a inalteração dos pressupostos de base da decisão de agravamento do estatuto coativo comportará a plenitude do respetivo caso julgado formal, e consequente insusceptibilidade de reversão ou substituição sem que ocorra violação desse caso julgado.
4. Percorrida a argumentação expendida a este propósito, verifica-se que não são indicados quaisquer novos factos que apontem para uma alteração dos pressupostos do estatuto coativo do arguido, mas antes uma reinterpretação dos factos já conhecidos nos autos, e devidamente apreciados em sede de prolação do despacho que determinou a sujeição arguido à medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica.
5. Com efeito, e principiando pelas condições pessoais, sociais, familiares e económicas do arguido, é de notar, que estas já se verificavam aquando da prática do ilícito pelo qual o arguido se encontra indiciado.
6. Por conseguinte, e dado que não se registou a menor alteração relevante nessas condições, não se vislumbra como as mesmas possam agora impedir a renovação da prática delituosa por parte do arguido, quando não o fizeram anteriormente.
7. Há fortes indícios da prática pelo arguido, em autoria material, de um crime de violência doméstica, agravado, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea a) do Código Penal.
8. O arguido, pese embora sujeito a primeiro interrogatório judicial e tendo-lhe sido aplicadas as medidas de coação de obrigação de não permanecer na residência e nas imediações da residência da ofendida e em qualquer outro local por esta frequentado e obrigação de não contactar por qualquer forma com a ofendida, não se coibiu de violar as medidas de coação impostas, o que legitimou o agravamento da medida de coação.
9. Há um claro perigo de continuação da atividade criminosa, demonstrada pela própria conduta do arguido, pelo que deverá o mesmo permanecer sujeito à medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica, na medida em que as outras medidas de coação legalmente previstas não se mostram adequadas e suficientes para responder às exigências cautelares da conduta do arguido.
10. No mais, quanto ao indeferimento do pedido do arguido para se ausentar da sua habitação, a fim de exercer uma atividade profissional, cumpre ter presente que os prejuízos ou incómodos decorrentes da circunstância de o recorrente não poder trabalhar são consequência inerentes à execução de qualquer medida coativa privativa da liberdade.
11. Entender de outro modo, subverteria a natureza da medida, frustrando os fins que a mesma visa alcançar.
12. A medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica pressupõe que o arguido permaneça na habitação à qual está confinado, só podendo daí ausentar-se em circunstâncias excecionais e justificadas por razões ponderosas, nas quais não se inclui a saída diária para trabalhar.
13. Considera-se que a situação dos autos, com especial enfoque na natureza dos factos indiciariamente imputados ao recorrente, subsumíveis à prática do crime de violência doméstica, não se compadecem com a autorização de saídas diárias do mesmo para trabalhar, encontrando-se assim justificada a decisão recorrida, na medida em que, face aos perigos indicados na decisão de aplicação da medida de coação, se mostra ser adequada, proporcional e necessária às circunstâncias do caso.
14. Por todo o exposto, a decisão recorrida acolheu o único sentido decisório legalmente admissível e compatível com o caso julgado formal pelo despacho que agravou a medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica, razão pela qual não deverá ser dado provimento ao recurso interposto pela defesa do arguido.
Nestes termos, não deverá merecer provimento o recurso interposto pelo arguido, confirmando-se integralmente a decisão recorrido, por mesma ter acolhido a única solução jurídica atendível.
5.
Remetidos os autos a este Tribunal da Relação de Lisboa, a Exma. Procuradora-Geral do Ministério Público formulou parecer nos seguintes termos (transcrição)
Visto do Ministério Público art.º 416.º, n.º 1, do Código de Processo Penal
I. Recurso próprio e tempestivo, interposto por quem tem de parar tanto a necessária legitimidade, sendo correto o efeito e regime de subida que lhe está atribuído.
II. Vem o presente recurso interposto do despacho judicial que indeferiu o requerimento efetuado pelo arguido AA, sobre a alteração do seu estatuto coativo, com substituição do mesmo por outra medida de coação menos gravosa, para poder reiniciar a sua atividade laboral, ou em alternativa, que seja autorizado a ausentar-se da sua habitação, estritamente com destino ao local de trabalho por si indicado.
III. A Digna Magistrada do Ministério Público junto da 1.ª Instância respondeu à motivação do recurso interposto nos termos constantes nos autos, sustentando a improcedência do recurso interposto pelo Arguido AA
III. Posição do Ministério Público no TRL
Analisados os elementos de prova certificados, o despacho recorrido e os fundamentos do recurso, aderimos inteiramente à resposta da Exmª Senhora Procuradora da República na 1ª instância por se apresentar fundamentada, crítica, clara e adequada, não nos merecendo o despacho recorrido nenhum reparo ou censura.
Sempre se dirá que:
Os factos que se encontram fortemente indiciados, a sua natureza e gravidade não permitem concluir por uma mitigação das exigências cautelares quanto ao arguido.
Decorre com forte suficiência, e, até ao momento de aplicação da medida de coação privativa da liberdade ao arguido, que o mesmo adotou comportamentos gravemente lesivos da integridade física e psicológica da vítima BB.
Os factos de o arguido ter procedido da forma descrita, com extrema violência, com frieza de ânimo revelam que o arguido não demonstra insight quanto à gravidade dos seus comportamentos e revela-se incapaz de percecionar o potencial impacto causado na ofendida pela prática dos mesmos, o que aumenta o risco de probabilidade de comportamentos abusivos no futuro, sendo tais factos e circunstâncias e modo como foram executados suscetíveis de provocar grande intranquilidade e perturbação na ordem pública.
A conduta do arguido é merecedora da mais acentuada censurabilidade pelo cidadão comum, atentos os bens jurídicos afetados. Por outro lado, estamos perante crimes que pelo especial bem jurídico protegido, levam o cidadão comum a um descrédito nas instâncias formais de controlo, caso estas não respondam eficaz e convenientemente, possibilitando, na ausência de tal resposta, reações emotivas e de choque.
O que permite afirmar que os pressupostos, de facto e de direito, que fundamentaram a aplicação ao arguido da medida de coação de Obrigação de Permanência na Habitação com fiscalização eletrónica e a de proibição de contactos por qualquer meio com a ofendida continuam a apresentar-se como sendo a única medida de coação adequada e proporcional às exigências cautelares que os presentes autos requerem, capaz de obviar aos perigos que se encontram fortemente indiciados nos autos, mostrando-se a mesma adequada e proporcional à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente virão a ser aplicadas ao arguido, revelando-se todas as outras inadequadas e insuficientes, sendo certo que os prejuízos ou incómodos decorrentes da circunstância de o recorrente não poder trabalhar são consequências inerentes à execução de qualquer medida coativa privativa da liberdade . Entender-se de outro modo subverteria a natureza da medida de coação, frustrando os fins que a mesma visa alcançar
Termos em que deve o recurso interposto ser julgado improcedente, por não ter sido violado qualquer normativo legal, mantendo-se o douto despacho recorrido.
Mas a final, não obstante, melhor se dirá.
Colhidos os vistos legais e realizada a conferência a que alude o artigo 419º do Código de Processo Penal, cumpre decidir.
II- Questões a decidir no recurso:
Constitui jurisprudência assente que o objecto do recurso, que circunscreve os poderes de cognição do tribunal de recurso, delimita-se pelas conclusões da motivação dos recorrentes (artigos 402.º, 403.º, 412.º e 417º do CPP), sem prejuízo dos poderes de conhecimento oficioso do tribunal ad quem quanto a vícios da decisão recorrida, a que se refere o artigo 410.º, n.º 2, do CPP, os quais devem resultar directamente do texto desta, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, a nulidades não sanadas (n.º 3 do mesmo preceito), ou quanto a nulidades da sentença (artigo 379.º, n.º 2, do CPP).(cfr. artigos 410º, nº 3 e 119º, nº 1, do Código de Processo Penal; a este propósito v.g. ainda o Acórdão de Fixação de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça nº 7/95, de 19.10.1995, publicado no D.R. I-A Série, de 28.12.1995 e, entre muitos outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 25.06.1998, in B.M.J. nº 478, pág. 242, de 03.02.1999, in B.M.J. nº 484, pág. 271 e de 12.09.2007, proferido no processo nº 07P2583, acessível em www.dgsi.pt)
Na Doutrina, por todos, Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, Volume II, 5.ª Edição atualizada, pág. 590, “As conclusões do recorrente delimitam o âmbito do poder de cognição do tribunal de recurso. Nelas o recorrente condensa os motivos da sua discordância com a decisão recorrida e com elas o recorrente fixa o objecto da discussão no tribunal de recurso… A delimitação do âmbito do recurso pelo recorrente não prejudica o dever de o tribunal conhecer oficiosamente das nulidades insanáveis que afetem o recorrente… não prejudica o dever de o tribunal conhecer oficiosamente dos vícios do artigo 410.º, n.º2 que afetem o recorrente…” e bem assim Simas Santos e Leal-Henriques, em “Recursos em Processo Penal”, Rei dos Livros, 7ª edição, pág. 71 a 82).
Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir são as seguintes:
1.ª-Se a medida de coacção aplicada ao arguido/recorrente – OPHVE - deveria ter sido no, despacho recorrido, substituída por outra menos gravosa por atenuação das exigências cautelares e por inexistência dos requisitos previstos nas alíneas a), b) e c) do art.º 204.º, do CPP.
2.ª Da autorização de saída da residência pelo arguido a fim de exercer actividade laboral.
***
III – Factos relevantes para a apreciação do recurso:
III.1- Na sequência da remessa dos autos pelo Ministério Público ao Juízo de Instrução Criminal do arguido/recorrente detido AA, ao abrigo do disposto nos artigos 141.º e 268.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal, para validação da detenção e a sujeição a primeiro interrogatório judicial do arguido detido (detido às 08:40 do dia 20/05/2024 – fls. 111), e realizado o interrogatório do arguido perante o JIC foi proferido em 20/05/2024 despacho com o seguinte teor:
Indiciam fortemente os autos, que o arguido praticou os factos e qualificação jurídica descritos no despacho de apresentação antecedente, que se dá por reproduzida. Fundamentam tal indiciação, o exame crítico dos elementos de prova já carreados para os autos, nomeadamente, o teor do auto de denúncia de fls. 15 a 22 e aditamentos de fls. 53-55; 78; no teor das avaliações de risco de fls. 36 e ss, e 79 e ss.; no depoimento prestado pela ofendida BB a fls. 27 e 87 dos autos; no teor da ficha de sinalização da ... – fls. 44; Assentos de nascimento de fls. 56 e 104; informação hospitalar de fls. 93 a 94 e no teor do CRC do arguido de fls. 58 a 65 dos autos.
A ofendida relatou as diversas vezes em que foi agredida fisicamente pelo arguido, uma das quais, recebeu tratamento hospitalar, como se extrai da informação clinica de fls. 93, 94, apresentando traumatismo craniano, também descreveu os nomes de cariz ofensivo e as ameaças que o arguido lhe dirigiu, entre as quais, que lhe cortava a garganta, tendo chegado a apontar-lhe facas. Foi o receio que sentiu pelo arguido que a levou a refugiar-se com o filho, no dia...passado, numa casa abrigo.
O arguido prestou declarações, tendo admitido que agrediu a ofendida no dia ...-...-2023, mas apenas lhe desferiu uma chapada causando-lhe um golpe na cabeça.
Mais admitiu lhe ter dirigido a frase constante do ponto 6. da apresentação.
Disse mostrar-se arrependido, mas quando confrontado com as diversas vezes em que terá agredido fisicamente a ofendida nos termos descritos no despacho de apresentação, o arguido não quis continuar a prestar declarações.
As declarações do arguido, da forma como foram prestadas faz prever que o arguido não tem qualquer ressonância critica do desvalor da sua conduta nem capacita de autocensura, atendendo ao facto de ter escamoteado a agressão que admitiu ter feito na ofendida e de ter explicado que é normal os casais terem discussões.
Decorre também do teor do seu CRS que pese embora o arguido já tenha sido condenado em pena de prisão efetiva pela prática do mesmo crime de que vem agora fortemente indiciado, não o demoveu de continuar a delinquir.
Atendendo ao número de vezes em que o arguido agrediu fisicamente a ofendida, sua companheira com quem o arguido tem um filho em comum, nos termos descritos no despacho de apresentação antecedente, e as expressões de cariz ofensivo e a ameaçador que lhe dirigiu, verifica-se um concreto e efectivo perigo de continuação da actividade criminosa, sendo patente a elevada energia criminosa do arguido, a qual resulta não só dos factos de que vem indiciado, mas também do teor do seu CRC.
Existindo sérias razões para crer o arguido facilmente continuará a atentar contra a integridade física e psíquica da ofendida. Acresce que este tipo de criminalidade causa grande alarme social no local onde os factos ocorreram, não só pelas consequências sociais que provoca, face ao lamentável e hediondo número de vítimas mortais, mas também pelo aumento crescente deste tipo de criminalidade na área desta Comarca.
Existe perigo de perturbação do inquérito, na medida em que o arguido, valendo-se do ascendente que tem sobre a ofendida, poderá facilmente influenciar a ofendida para que não preste depoimento nos autos, influenciando o desfecho do presente processo.
Encontram-se assim reunidos os pressupostos que legitimam a aplicação ao arguido de uma medida de coacção, para além do TIR, conforme resulta no disposto no artigo 204º al. b) e c) do Código de Processo Penal. Assim, nos termos do disposto nos artigos 191.º a 193.º, 196.º e 204.º, al. B) e C), todos do Cód. Proc. Penal, considerando a gravidade dos factos imputados ao arguido, entende-se ainda assim, por ora que é suscetível de acautelar as necessidades cautelares acima descritas, a aplicação ao arguido das seguintes medidas de coação:
- Obrigação de se apresentar semanalmente, no Posto policial da área da sua residência, nos termos do disposto no art. 198º do CPP.
Comunique ao OPC territorialmente competente, a presente medida de coacção, devendo informar de imediato o Tribunal de eventuais incumprimentos por parte do arguido.
- Obrigação de não permanecer na residência e nas imediações da residência da ofendida e em qualquer outro local por esta frequentado, nos termos do disposto nos artigos 200.º, n.º 1, alíneas a) do Cód. Proc. Penal e 31.º, n.º 1, alínea c) da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro;
- Obrigação de não contactar por qualquer forma com a ofendida, nos termos do disposto nos artigos 200.º, n.º 1, alíneas d) do Cód. Proc. Penal e 31.º, n.º 1, alínea d) da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro;
sendo a execução destas medidas de coacção controlada por vigilância electrónica fixando-se o perímetro de exclusão em 800 (oitocentos) metros, quer quanto à zona de protecção fixa (residência da ofendida), quer quanto à zona de protecção dinâmica, considerando-se que o consentimento do arguido para o efeito não releva, porquanto, por tudo o que se disse, a utilização de meios técnicos de controlo à distância se mostra imprescindível para a protecção dos direitos da ofendida, de acordo com o disposto no artigo 36.º, n.º 7, da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro.
- De conhecimento à ofendida da referida proibição de contactos;
No seguimento das medidas de coação referida deverá o arguido no prazo máximo de 5 dias, caso não o possa fazer de momento indicar a respetiva morada, com a cominação de não o fazendo as notificações continuarem a ser dirigidas à morada constante do TIR, considerando-se o arguido devidamente notificado para os devidos efeitos legais.
- Determino que como promovido se de cumprimento ao disposto no art.º 200.º n.º 6 do CPP.
- Comunique ao TEP a existência do presente processo.
- Restitua o arguido à liberdade.”
III.2 No dia o Ministério Público requereu novamente a apresentação do arguido a interrogatório judicial de arguido detido através do seguinte despacho:
Em face do teor douto Despacho da Mma. Juiz de Instrução (cf. Ref.ª Citius 162032854), proferido a 06-09-2024, e uma vez que o arguido AA continua a residir com a vítima BB, tendo-lhe sido aplicada a medida de coação de obrigação de não permanecer na residência e nas imediações da residência onde os factos ocorreram, e obrigação de não contactar por qualquer forma com a ofendida, havendo perigo de continuação da atividade criminosa e que o arguido venha a atentar contra a integridade física e/ou contra a vida da ofendida, o Ministério Público procedeu à emissão de mandados de detenção fora de flagrante delito, a fim de ser o arguido sujeito a interrogatório e eventual agravamento das medidas de coação já determinadas. (…).
Remeta os autos ao Tribunal de Instrução Criminal para que, com urgência, sejam os mesmos, tal como o detido, apresentados ao Mmo. Juiz de Instrução Criminal, a quem se requer:
1. A sujeição a interrogatório judicial do arguido AA detido às 16h15 do dia ...-...-2024.
2. A validação da detenção do arguido;
3. O agravamento das medidas de coação já aplicadas ao arguido.(…).
*
III.3No dia .../.../2024 foi realizado interrogatório judicial de arguido detido, sendo lavrado o seguinte:
AUTO DE INTERROGATÓRIO DE ARGUIDO DETIDO
Data: ...-...-2024
Juiz de Direito: Dra. CC
Procuradora da República: Dra. DD
Escrivã Auxiliar: EE
Ilustre Defensora Substabelecida do Arguido: Dra. FF – Cédula: ...
*
Quando eram 15 horas e 41 minutos, pela Mm. ª Juiz foi declarada aberta a diligência, tendo de seguida, nos termos 141.º, n.º 3 do Cód. Proc. Penal, advertiu o arguido de que a falta de respostas às perguntas que lhe vão ser feitas sobre a sua identidade, ou a falsidade das mesmas, o pode fazer incorrer em responsabilidade penal, tendo-se o mesmo identificado da seguinte forma:
ARGUIDO
Nome: AA
Data de Nascimento: ...-...-1992
Estado Civil: Divorciado
Profissão: ...
Filiação: GG e deHH
Naturalidade: ...
Domicílio: ...
*
Seguidamente, a Mm. ª Juiz de Direito, nos termos do disposto no art.º 141.º, n.º 4, al. a), do Cód. Proc. Penal, informou o arguido dos direitos referidos no n.º 1 do art.º 61.º do mesmo diploma legal.
*
Em seguida, a Mm.ª Juiz advertiu o arguido de que sobre os factos que lhe são imputados e que motivaram a sua detenção, não é obrigado a prestar declarações, sendo que o seu silêncio não o pode prejudicar, mais o advertindo, nos termos do disposto no art.º 141.º, n.º 4, al. b), do Cód. Proc. Penal de que não exercendo o direito ao silêncio, as declarações que prestar poderão ser utilizadas no processo, mesmo que seja julgado na ausência, ou não preste declarações em audiência de julgamento, estando sujeitas à livre apreciação da prova.
*
Informou ainda, nos termos das alíneas c), d) e e), do n.º 4 do citado art.º 141.º do Cód. Proc. Penal, dos motivos da detenção, dos factos que lhes são concretamente imputados e dos elementos do processo que indiciam os factos imputados, que se passam a transcrever e que pelo arguido, pela Ilustre Mandatária e pela Digna Magistrada do Ministério Público foi dito prescindirem da leitura dos mesmos (tendo sido previamente facultada cópia à defesa e ao arguido), a saber:
1. Entre ... e ..., em datas não concretamente apuradas, BB e AA iniciaram uma relação de namoro e terminaram essa relação de namoro.
2. Dessa relação nasceu, no dia ... de ... de 2018, II.
3. Em ..., em data não concretamente apurada, BB e AA retomaram a relação de namoro, passando a residir na morada sita no ..., partilhando casa, cama e mesa.
4. No dia ... de ... de 2023, à noite, no interior da residência do casal, quando BB confrontou AA pelo facto deste andar a conversar com outras mulheres.
5. Nessa ocasião, AA dirigiu-se a BB e desferiu um número não concretamente apurado de socos, que a atingiu na zona da face e da cabeça, e desferiu um pontapé que atingiu aquela na zona do braço esquerdo.
6. Nessas circunstâncias, AA apelidou BB de “cabra de merda, puta, vai para a puta que te pariu, filha da puta”.
7. Como consequência BB ficou com um corte na cabeça.
8. Em ..., em data não concretamente apurada, no interior da residência do casal, durante uma discussão do casal por motivos não concretamente apurados, AA dirigiu-se a BB com uma faca na mão.
9. Nessa ocasião, AA puxou o cabelo de BB e desferiu-lhe uma chapada que a atingiu na zona da face.
10. No dia ... de ... de 2024, em hora não concretamente apurada, mas quando BB e AA se encontravam no interior do veículo automóvel desta, durante uma discussão por motivos não concretamente apurados, AA apertou com os duas mãos o pescoço de BB, ao mesmo tempo que a apelidou de “cabra de merda, puta, vai para a puta que te pariu filha da puta”.
11. Como consequência, BB ficou com hematomas na zona do pescoço.
12. Nesse dia BB pernoitou em casa de uma amiga.
13. No dia seguinte, BB, acompanhada de AA, dirigiu-se à residência do casal para retirar os seus bens.
14. Nessa ocasião, AA desferiu um número não concretamente apurado de chapadas na zona da face de BB, tendo-lhe puxado o cabelo.
15. Nessas circunstâncias, AA apelidou BB de “cabra de merda, puta, vai para a puta que te pariu filha da puta”.
16. Como consequência, BB ficou com um hematoma no olho esquerdo.
17. No dia ... de ... de 2024, por volta das 13 horas e 30 minutos, quando BB saía de uma entrevista de trabalho, AA ligou-lhe com o intuito de saber onde estava.
18. Após BB informar AA que “estava na zona”, AA dirigiu-se aquela dizendo “diz-me onde estás, não me tires do sério, o dia não me está a correr bem, parto-te as pernas e os braços, corto-te a garganta”.
19. Nessa ocasião, AA apelidou BB de “cabra de merda, puta, vai para a puta que te pariu filha da puta”.
20. AA atuou da forma supra descrita com o propósito concretizado de maltratar física e psicologicamente BB, ciente de que, com tal comportamento persistente e reiterado, a humilhava e aterrorizava e que a atingia na sua dignidade de pessoa humana, na sua integridade física e psico-emocional, nas suas liberdades de decisão e de atuação, no seu sentimento de segurança e nas suas honra e consideração, levando-a a temer pela sua vida e pela sua integridade física, o que fez apesar de saber que lhe devia particular respeito por se tratar da sua companheira e mãe do seu filho, resultado que previu, que quis, com o qual se conformou e que alcançou.
21. AA previu, quis e logrou agir da forma descrita, bem sabendo que, ao maltratar a ofendida no interior da sua residência, agravava a sua humilhação.
22. AA conhecia os factos e quis praticá-los, bem sabendo que desse modo a lesava na sua saúde física, mental e a liberdade pessoal de BB.
23. AA agiu sempre de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei e tendo capacidade para se determinar de acordo com esse conhecimento.
24. No dia 20-05-2024, em sede de 1.º interrogatório judicial de arguido detido a que foi sujeito AA, foram aplicadas as seguintes medidas de coação:
a. Obrigação de se apresentar semanalmente no Posto Policial da área da sua residência;
Obrigação de não permanecer na residência e nas imediações da residência onde os factos ocorreram, nos termos do disposto nos artigos 200.º, n.º 1, alíneas a) do Código de Processo Penal e 31.º, n.º 1, alínea c) da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro;
c. Obrigação de não contactar por qualquer forma com a ofendida, nos termos do disposto nos artigos 200.º, n.º 1, alíneas d) do Código de Processo Penal e 31.º, n.º 1, alínea d) da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro;
d. Obrigação de prestar novo TIR.
25. O arguido continua a residir no local da ocorrência.
26. No dia ...-...-2024, a vítima entrou em contacto com a ...» e informou que voltou a ser agredida pelo arguido e que é frequentemente ameaçada pelo mesmo, tendo receio de chamar a Polícia por temer represálias.
C. O arguido voltou a residir com a vítima, pelo menos, desde ....
D. No dia ...-...-2024, a vítima entrou em contacto com a ...» e informou que voltou a ser agredida pelo arguido e que é frequentemente ameaçada pelo mesmo, tendo receio de chamar a Polícia por temer represálias.
Seguidamente, a Mm. ª Juiz perguntou ao arguido se pretendia prestar declarações sobre os factos, tendo o arguido respondido que não queria prestar declarações sobre os factos e condições pessoais (identificação, advertências, leitura, e respostas gravadas através do sistema integrado de gravação digital, consignando-se que o seu início ocorreu pelas 15h41m33s e o seu termo pelas 15h44m40s).(…)
SEGUIDAMENTE FOI DADA A PALAVRA À DIGNA MAGISTRADA DO MINISTÉRIO PÚBLICO que promoveu, em síntese o seguinte:
TIPOS DE CRIME:
- Um crime de violência doméstica, previsto e punido, pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, punido com pena de prisão de um a cinco anos; e, ainda, com as penas acessórias constantes do artigo 152.º, n.ºs 4 e 5 do Código Penal;
PERIGOS:
I. Perigo de continuação da atividade criminosa;
II. Perigo de perturbação do decurso do inquérito na vertente de aquisição e conservação da prova.
MEDIDAS DE COAÇÃO:
Ao abrigo do disposto nos artigos 191.º a 193.º, 196.º, 202.º nº1 al. a), 203º nº1 e nº2 e 204.º, al. b) e c), todos do Código de Processo Penal. E art.º 35 e 36 nº7 lei 112/2009.
III. Termo de Identidade e Residência, a prestar, com indicação de morada actualizada;
IV. Prisão Preventiva;
V. Obrigação de não contactar por qualquer forma ou meio com a vítima (contacto telefónico, sms, redes sociais ou interposta pessoa) nos termos do art.º 200 nº1 al. d) do C.P.P e art.º 31 nº1 al d) da lei 112/2009 de 16-09.(…).
Dada a palavra à Ilustre Defensora do Arguido, (…) não concordando com os fundamentos do Ministério Público, requerendo a obrigação de permanência em casa com a medida de coação de vigilância eletrónica.
SEGUIDAMENTE PELA MM. ª JUIZ FOI PROFERIDO DESPACHO:
Cotejada a prova documental indicada no requerimento de apresentação do arguido a interrogatório judicial, do que se destacam os aditamentos 14, 15 e 17 (fls. 243, 245 e 252), e ainda o teor do auto de primeiro interrogatório judicial, realizado a 20.05.2024, indicia-se fortemente que:
A. No dia 20-05-2024, em sede de 1.º interrogatório judicial de arguido detido a que foi sujeito AA, na sequência da verificação de fortes indícios da prática de factos susceptíveis de integrar um crime de violência doméstica (p. e p. pelo art.º 152º, nº 1 al. b) e n.º 2 al. a), 4, 5 e 6 do Código Penal), foram aplicadas as seguintes medidas de coação:
Obrigação de se apresentar semanalmente no Posto Policial da área da sua residência;
Obrigação de não permanecer na residência e nas imediações da residência onde os factos ocorreram, nos termos do disposto nos artigos 200.º, n.º 1, alíneas a) do Código de Processo Penal e 31.º, n.º 1, alínea c) da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro;
Obrigação de não contactar por qualquer forma com a ofendida, nos termos do disposto nos artigos 200.º, n.º 1, alíneas d) do Código de Processo Penal e 31.º, n.º 1, alínea d) da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro;
A execução de tal medida deverá ser controlada por vigilância electrónica, fixando-se o perímetro de exclusão em 800 (oitocentos) metros, dispensando-se a prestação de consentimento pelo arguido para este efeito, porquanto, em face de todo o circunstancialismo indiciado, a utilização de meios técnicos de controlo à distância mostrava-se imprescindível para a protecção dos direitos da ofendida, cf. artigo 36º, nº 7, da Lei nº 112/2009, de 16 de Setembro.
Obrigação de prestar novo TIR.
B. A vítima comunicou à DGRSP recusar a instalação dos meios técnicos de vigilância eletrónica a ........2024
C. O arguido voltou a residir com a vítima, pelo menos, desde ....
D. No dia ...-...-2024, a vítima entrou em contacto com a ...» e informou que voltou a ser agredida pelo arguido e que é frequentemente ameaçada pelo mesmo, tendo receio de chamar a Polícia por temer represálias.
*
O arguido instado a prestar declarações decidiu remeter-se ao silêncio no exercício de um direito de que é titular, mas subtraindo ao Tribunal o conhecimento da sua versão dos acontecimentos.
Todavia, a prova documental acima elencada, conjugada com as informações de fls. 157, permitem concluir com segurança a existência de fortes indícios de que decidiu voluntariamente voltar a partilhar habitação e regressar ao contacto com a vítima, já que nada nos autos indica que não se tratou de uma decisão voluntaria e esclarecida do arguido, ciente das proibições que lhe foram impostas em Maio.
Mas mais, considerando que a vítima, já depois da aplicação de medidas de coacção, manifestou nos autos desejo de alteração das medidas de coacção impostas, alegando tratar-se de um acto isolado e que o casal estaria a tentar uma reconciliação (cf. fls. 153), e recusou a instalação dos meios de VE (fls. 157), viu-se na contingência de cerca de um mês depois, necessitar de pedir ajuda a associação de apoio a vitimas de VD, relatando ter sido novamente agredida e ser frequentemente ameaçada (fls. 245).
Face a esta sequência de acontecimentos e à postura da vítima perante as medidas de coacção aplicadas, evidencia o senso comum que o seu relato, dando conta de ter sido agredida e ser constantemente ameaçada, tem fortes probabilidades de ser verdadeiro.
*
Determina o artigo 203º, nº 1, do Cód. Proc. Penal que, “Em caso de violação das obrigações impostas por aplicação de uma medida de coacção, o juiz, tendo em conta a gravidade do crime imputado e os motivos da violação, pode impor outra ou outras medidas de coacção previstas neste Código e admissíveis no caso.”
Por seu turno, determina o nº 2 do mesmo artigo que: “Sem prejuízo do disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 193.º, o juiz pode impor a prisão preventiva, desde que ao crime caiba pena de prisão de máximo superior a 3 anos: a) Nos casos previstos no número anterior; ou b) Quando houver fortes indícios de que, após a aplicação de medida de coacção, o arguido cometeu crime doloso da mesma natureza, punível com pena de prisão de máximo superior a 3 anos.”.
Para efeitos e agravamento de uma medida de coacção decretada “(…) o juiz deverá, após a apreciação dos “motivos” da violação, conjugados com a gravidade do crime imputado, ponderar, à luz dos princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade, se existe uma maior exigência cautelar e consequentemente necessidade de “reforço” das medidas de coação, impondo outra ou outras medidas de coação que sejam admissíveis no caso. A violação deverá ser sempre culposa” (sublinhado nosso, in Código de Processo Penal, Comentado, Almedina, 2ª edição, 2016, págs. 820 e 821).
Do exposto, resulta, em síntese, que para a alteração da medida de coacção decidida aplicar, no sentido do seu agravamento, não bastará todo e qualquer incumprimento do arguido, posto que só um incumprimento culposo poderá justificar tal agravamento.
Por outro lado, é necessário que a medida resultante do agravamento se mostre necessária, adequada e proporcional face às novas exigências cautelares que se suscitem no caso, em conformidade com os princípios consagrados no artigo 193º, nº 1, do Cód. Proc. Penal.
Ponderando-se o agravamento para medida privativa de liberdade é também necessário que ao crime caiba pena de prisão superior a 3 (três) anos, como é o caso, e que quaisquer outras medidas de coacção menos restritivas dos direitos e liberdades do arguido sejam inadequadas e insuficientes, devendo sempre ser dada preferência à obrigação de permanência na habitação sempre que ela se revele suficiente para satisfazer as exigências cautelares.
Compulsados os autos verifica-se, ante os factos indiciados em primeiro interrogatório judicial e o comportamento subsequente do arguido, indiciados pelos meios de prova acima elencados, que este não acatou a decisão judicial que o proibiu de residir, contactar e/ou de se aproximar da vítima, e, no contexto de convívio habitacional subsequente às proibições impostas, repetiu comportamentos semelhantes àqueles que levaram à sua detenção em ....
Temos, pois, como inequívoco o incumprimento das medidas de coacção, culposo e grave.
Tal como decorre do disposto nos artigos 191º a 193º do CPP, que só podem ser aplicadas medida de coacção ou de garantia patrimonial prevista na lei e para os fins de natureza cautelar nela previstos (principio da tipicidade), as medidas a aplicar devem ser as menos gravosas em vista do fim visado (princípio da necessidade), adequadas às exigências cautelares que o caso requerer e proporcionais à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas ao arguido (princípios da adequação e da proporcionalidade), consagrando o n.º 2 do art.º 193º o principio da subsidiariedade da prisão preventiva e da obrigação de permanência na habitação - só possam ser decretadas quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coacção.
Por último, a lei processual penal fornece-nos o quadro das exigências cautelares que justificam a aplicação de medidas de coacção, que não o termo de identidade e residência, sob a designação de requisitos gerais da aplicação das medidas de coacção (quanto aquela medida – termo de identidade e residência - deve ser sempre aplicada independentemente da existência ou não das exigências cautelares que a seguir se referem) – cf. artigo 204º, do Código de Processo Penal.
Preceitua o artigo 204º, do Código de Processo Penal que “Nenhuma medida de coacção à excepção da prevista no artigo 196º, pode ser aplicada se em concreto se não verificar, no momento da aplicação da medida:
a) Fuga ou perigo de fuga;
b) Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; ou
c) Perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a actividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e a tranquilidade públicas.”.
Ou seja, relativamente a medidas privativas da liberdade, as referidas exigências cautelares terão de ser de tal modo intensas que se possa concluir que não podem ser devidamente acauteladas com a aplicação de qualquer outra medida de coacção não privativa da liberdade, isolada ou cumulativamente, nos casos em que a cumulação é permitida.
Assim, à luz dos princípios enunciados, importará apurar se na presente situação as medidas de coacção impostas ao arguido aquando do seu primeiro interrogatório judicial continuam conformes às exigências prescritas nos mencionados artigos do Código de Processo Penal e 27º e 28º, da Constituição da República Portuguesa, ou se tais medidas de coacção, porque incumpridas pelo arguido, devem ser substituídas por inadequação.
Sendo sabido que as medidas de coacção estão sujeitas à condição rebus sic stantibus no sentido que a sua validade e eficácia permanecem inalteradas enquanto inalterados se mantiverem os pressupostos em que o seu decretamento assentou, não é menos certo que as medidas de coacção podem ser modificadas ou substituídas quando se verificar uma violação das obrigações por elas impostas, ou um agravamento das exigências cautelares ou, ao invés, um desagravamento dessas mesmas exigências.
Quer se atente nas situações elencadas no artigo 212º ou nas prevenidas no artigo 213º, ambos do Código de Processo Penal, a lei pressupõe sempre que algo mudou entre a primeira decisão e a segunda ou subsequentes decisões de reexame dos pressupostos de facto e de direito das medidas de coacção, maxime das privativas de liberdade.
Ora, no caso em apreço, como acima se referiu, dúvidas inexistem que o arguido incumpriu de forma culposa e grave as medidas de coacção impostas – seja porque regressou à coabitação com a vítima, seja porque, indiciariamente, repetiu a prática de actos susceptíveis de integrar crime de violência doméstica.
Ora, tal vale por dizer que, em face do seu comportamento subsequente, as medidas de coacção impostas se revelam inadequadas a evitar a concretização dos perigos identificados aquando da realização de primeiro interrogatório judicial, mormente o perigo de continuação da actividade criminosa.
Agora, cotejado o elenco das medidas de coacção abstractamente aplicáveis (em face dos perigos identificados e do crime indiciado), conclui-se que apenas uma medida privativa de liberdade satisfaz as exigências cautelares.
Com efeito, ao arguido foram aplicadas medidas de coacção não privativas de liberdade, que se afiguravam, em abstracto, aptas a evitar a continuação da actividade criminosa e a perturbação do inquérito, sendo que tais medidas, se vieram a revelar insuficientes.
Assim, tudo ponderado, e sendo que, a manterem-se os elementos que agora se possuem nos autos, considero provável a aplicação ao arguido, em sede de julgamento, de uma pena privativa de liberdade, entende-se que a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação será suficiente para acautelar os perigos de continuação da actividade criminosa e perturbação do inquérito.
Tal medida só será todavia, exequível, se se mostrarem preenchidos os requisitos de que depende – a concordância das pessoas que vivam com o arguido, compatibilidade da situação familiar e social do arguido com a medida e aptidão da residência à instalação de meios electrónicos de vigilância, razão pela qual, desde já se ordena à DGRS a elaboração de relatórios donde constem tais elementos (artigo 8º, número 2, da Lei número 33/2010, de 2 de Setembro), e posteriormente se decidirá acerca da exequibilidade da medida.
Concluindo, e ao abrigo do disposto no artigo 16º, número 1, da Lei número 33/2010, de 2 de Setembro, decido sujeitar o arguido a prisão preventiva até ao início da execução da medida de obrigação de permanência na habitação, a qual, nos termos do referido preceito, ocorrerá assim que instalados os meios electrónicos de vigilância (o que deverá ocorrer, igualmente, no prazo máximo de 48 horas após a comunicação da decisão que determinar a execução da medida à DGRS – artigo 8º, número 1, do mesmo diploma).
Decisão:
Face ao exposto, determino que o arguido aguarde os ulteriores termos do processo mediante sujeição a:
a) TIR, previsto no artigo 196º, do Código de Processo Penal, já prestado;
b) Obrigação de Permanência na Habitação (tendo-se esta como a que indicou no TIR a prestar) com sujeição a Vigilância Electrónica, prevista no artigo 201º números 1 e 3, do mesmo diploma, caso esta venha a ser considerada exequível, por se verificarem os pressupostos de que depende a sua aplicação (concordância das pessoas que vivem com os mesmos, compatibilidade da situação familiar e social do arguido com a medida e aptidão da residência à instalação de meios electrónicos de vigilância); e,
c) Prisão preventiva, prevista no artigo 202º do supra aludido diploma, a vigorar no período que mediar até ao início da execução da medida de Obrigação de Permanência na Habitação com sujeição a Vigilância Electrónica (artigo 16º, número 1, da Lei número 33/2010, de 2 de Setembro), ou até nova ponderação, caso esta venha a ser considerada não exequível.
Passe os competentes mandados de condução do arguido ao Estabelecimento Prisional.
Cumpra o disposto no artigo 194º, número 8, do Código de Processo Penal.
Solicite à DGRS que, com carácter de urgência - e no prazo máximo de 48 horas -, remeta a este tribunal a informação a que alude o artigo 8º, número 2, da Lei número 33/2010, de 2 de setembro.” (…).(destaques nossos).
III.4 A 20.11.2024 foi iniciado o cumprimento da OPHVE.
III.5 O arguido veio requerer em 03/12/2024 (Ref.ª Citius 16003291)o seguinte (transcrição):
1. Foi o arguido sujeito à medida de coação de obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica.
2. Acontece que, o arguido encontra-se atualmente sem meios de subsistência para prover uma vida condigna para si, carecendo assim da ajuda e boa vontade do seu pai, com quem se encontra atualmente a residir.
3. Por outro lado, o arguido está impossibilitado de comparticipar nas despesas de alimentação, escolares e saúde dos seus filhos, que se encontram a residir com a progenitora.
4. Tendo consciência que a sua situação financeira não é viável, o aqui arguido conseguiu uma vaga na área da serralharia na empresa ..., NIPC ....
5. As funções seriam exercidas na sede da empresa, sita na ...
6. no horário das 08h às 18h.
7. Porém, o arguido ainda não aceitou a proposta de emprego, nem assinou respetivo contrato de trabalho atendendo à suasituaçãoatual.
8. Pelo que, vem o ora arguido requerer a alteração da medida e coação por outra menos gravosa, para poder reiniciar a sua atividade laboral,
9. ou em alternativa, que tal lhe seja autorizado a ausentar-se da sua habitação, estritamente com destino ao local de trabalho supra indicado.
III.6 O Ministério Público em 15-12-2024 promoveu quanto a esse requerimento o seguinte:
Nos termos do disposto no artigo 212.º, n.º 3 do Código de Processo Penal, as medidas de coação podem ser substituídas por outras menos graves e/ou por formas menos gravosas de execução, quando se verificar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a sua aplicação.
Ora, desde a aplicação ao arguido AA (doravante AA) da medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com sujeição a vigilância eletrónica, prevista no artigo 201.º, n.ºs 1 e 3 do Código de Processo Penal, ocorrida a ...-...-2024, não sobreveio qualquer facto que permita concluir pela atenuação das exigências cautelares que a fundamentaram, de forma a que a mesma se revele desnecessária, desadequada e/ou desproporcional, por um lado, nem se afigura que a aplicação de uma medida de coação menos gravosa se mostre suficiente para acautelar os perigos que se fazem sentir, por outro.
Acresce que, os factos que fundamentam o requerimento que antecede circunscrevem-se às necessidades do arguido e do seu agregado familiar, o que não tem qualquer relevância para a eventual atenuação dos perigos que alicerçaram a aplicação do aludido estatuto coativo, sem se descurar que tais condições pessoais já eram conhecidas à data do seu decretamento.
Pelo que, por se mostrarem inalterados os pressupostos quer de facto, quer de direito, que fundamentaram a aplicação ao arguido AA da medida de coação de obrigação de permanência na habitação, o Ministério Público promove que se indefira o requerido, por falta de fundamento legal.
*
Por sua vez, vem também o arguido requerer que lhe seja concedida autorização para ausentar-se da sua habitação, com destino a local de trabalho por si indicado.
Decorre do artigo 201.º, n.º 1 do Código de Processo Penal que o arguido sujeito à medida de coação de obrigação de permanência na habitação pode ausentar-se da sua residência se para tal for autorizado pelo juiz.
Ora, uma vez que esta medida, privativa da liberdade, implica que o visado se restrinja ao espaço físico da sua habitação, a autorização para dela se ausentar tem de ser pontual e sustentada em motivos excecionais e preponderantes.
Importa considerar que (i) na génese da aplicação da medida de coação em causa estão, além do mais, o perigo de continuação da atividade criminosa e o perigo de perturbação do inquérito; (ii) que o pretendido pelo arguido é a autorização para regularmente se ausentar da sua residência para desempenhar uma atividade profissional; e (iii) a gravidade dos factos que lhe são indiciariamente imputados – subsumíveis à pratica do crime de violência doméstica.
Neste sentido, vide, a título exemplificativo o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 20/04/2023 (Paula Penha), proc. n.º 424/22.2PBCSC-A.L2-9, in dgsi.pt, que refere que uma regular ausência do arguido quer para estudar fora de casa e/ou quer para desempenhar uma atividade profissional fora de casa não se enquadram naquelas justificações pontuais, de curta duração, excecionais, anormais, ponderosas e de muita importância ou gravidade. A natureza e a forma de execução da OPHVE não se compaginam com as pretendidas saídas ou ausências do arguido que enfraqueceriam o carácter cautelar desta medida de coação, esvaziariam grande parte do seu conteúdo e finalidades, desvirtuando parte da sua essência detetiva cautelar.
Termos em que se promove que seja indeferido o requerido, não se autorizando quaisquer saídas com vista à execução de atividade profissional.
III.7 O Juiz de Instrução decidiu em 18/12/2024 quanto a esse requerimento pelo despacho recorrido que na sua totalidade se transcreve:
Ref.ª 16003291 (alteração da medida de coacção):
Por despacho proferido em 1º interrogatório judicial, de 20.05.2024, foram aplicadas a AA as seguintes medidas de coacção:
Obrigação de se apresentar semanalmente, no Posto policial da área da sua residência, nos termos do disposto no art. 198º do CPP.
Obrigação de não permanecer na residência e nas imediações da residência da ofendida e em qualquer outro local por esta frequentado, nos termos do disposto nos artigos 200.º, n.º 1, alíneas a) do Cód. Proc. Penal e 31.º, n.º 1, alínea c) da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro;
Obrigação de não contactar por qualquer forma com a ofendida, nos termos do disposto nos artigos 200.º, n.º 1, alíneas d) do Cód. Proc. Penal e 31.º, n.º 1, alínea d) da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro;
sendo a execução destas medidas de coacção controlada por vigilância electrónica fixando-se o perímetro de exclusão em 800 (oitocentos) metros, por fortes indícios da prática de crime de violência domestica e perigo sustentado de continuação da actividade criminosa e de perturbação do inquérito.
Por despacho proferido em interrogatório judicial subsequente, de ........2024, as medidas de coacção foram agravadas, por incumprimento das obrigações impostas, sujeitando-se o arguido a Obrigação de Permanência na Habitação (tendo-se esta como a que indicou no TIR a prestar) com sujeição a Vigilância Electrónica, prevista no artigo 201º números 1 e 3, do mesmo diploma, caso esta venha a ser considerada exequível, por se verificarem os pressupostos de que depende a sua aplicação (concordância das pessoas que vivem com os mesmos, compatibilidade da situação familiar e social do arguido com a medida e aptidão da residência à instalação de meios electrónicos de vigilância); e, Prisão preventiva, prevista no artigo 202º do supra aludido diploma, a vigorar no período que mediar até ao início da execução da medida de Obrigação de Permanência na Habitação com sujeição a Vigilância Electrónica (artigo 16º, número 1, da Lei número 33/2010, de 2 de Setembro), ou até nova ponderação, caso esta venha a ser considerada
não exequível.
A 20.11.2024 foi iniciado o cumprimento da OPHVE.
Por requerimento de 03.12.2024, veio o arguido requerer a substituição da medida de coacção por outra não privativa de liberdade, a fim de lhe permitir exercer actividade profissional, ou em alternativa autorização para se ausentar diariamente para trabalhar.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido da manutenção da medida de coacção imposta, alegando que as exigências cautelares indiciadas aquando da sua aplicação se mantém inalteradas, sendo esta a única medida de coacção adequada a satisfaze-las.
Conforme referido na D. promoção que antecede, resulta do disposto no art.º 212.º, n.º 3 do CPP que as medidas de coacção são alteradas quando se verificar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a sua aplicação, podendo ser substituídas por outra menos grave ou determinada uma forma menos gravosa da sua execução.
Compulsados os autos deles não consta, sequer do requerimento do arguido, menção a quaisquer factos que indiciem atenuação das exigências cautelares que sustentaram a aplicação da prisão preventiva.
Com efeito, mantêm-se os fortes indícios da prática dos factos, da sua autoria, bem como as circunstâncias atinentes à situação pessoal/familiar e profissional do arguido, já ponderadas aquando da aplicação da medida (estado civil e exercício de actividade profissional).
Na verdade, o propósito do arguido com a alteração pretendida - manter exercício de actividade profissional -, colide directamente com as exigências cautelares detectadas, porquanto, como concluído em interrogatório judicial e mantendo-se inalterado, apenas a privação de liberdade constitui de medida de coacção adequada a impedir o perigo de continuação da actividade criminosa.
Decisão:
Em face do exposto, ao abrigo do art.º 213º, n.º 1 do Código de Processo Penal, indefiro a requerida substituição e decido que AA aguardará os subsequentes termos do processo em OPHVE.
Notifique.
III.8 Na sequência de requerimento da vítima com Ref.ª Citius 163282203, de 13-12-2024, o Ministério Público promoveu que:
Atenta a factualidade constante dos autos, é entendimento do Ministério Público que se mostra justificada a necessidade de proteção por teleassistência da vítima BB.
Desta forma, e nos termos do artigo 20.º, n.º 4 da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, na versão introduzida pela Lei n.º 129/2015, de 03 de setembro e da Portaria n.º 2204/2010, de 16 de abril, determina-se a aplicação do mecanismo de proteção por teleassistência da vítima BB., por três meses, a prorrogar, caso se justifique.
Assim, com cópia do presente despacho e do consentimento da vítima constante do preenchimento do Modelo 2 — Ficha de Adesão ao Modelo de Teleassistência, oficie de imediato à Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género solicitando que iniciem as diligências tendentes à inserção da vítima no Programa.
III.9 O Ministério Público em 06/01/2025 promoveu o seguinte aquando do reexame trimestral dos pressupostos da medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica:
Na sequência de 1.º interrogatório judicial de arguido detido, ocorrido no dia ...-...-2024, foi aplicada ao arguido AA para além do Termo de Identidade e Residência, a medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com sujeição a Vigilância Eletrónica, por despacho datado de ...-...-2024 (cf. Ref.ª Citius 162456347, de ...-...-2024).
A realização do reexame obrigatório das medidas de coação, atento o disposto no artigo 213.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Penal, terá de ocorrer até ao dia 09-01-2025, data em que se completam três meses da data em que foi revista a medida de coação de obrigação de permanência na habitação, o que se passa a promover.
Para esse efeito, releva considerar o tipo de crime sob investigação, vicissitudes processuais contendoras com o cômputo de duração máxima da medida de coação e a manutenção ou não dos perigos que justificaram a sua aplicação.
Nos presentes autos investiga-se a prática do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea a) e n.ºs 4 e 4 do Código Penal, o que implica um prazo máximo de duração da medida de coação de seis (6) meses [cf. artigo 215.º, n.º 2 do Código de Processo Penal], prazo esse que não se encontra atingido.
Não havendo assim obstáculo legal à manutenção, por ora, da medida de coação aplicada, compete agora averiguar se os fundamentos em que assentou a sua aplicação se alteraram ou permaneceram imutados.
A este respeito entendemos não existir qualquer alteração dos pressupostos de facto e de direito em que assentou a aplicação daquela medida e que permita alterá-la por outra menos gravosa.
De facto, da análise dos elementos carreados para os autos, resulta que se mantêm inalterados os pressupostos de facto e de direito que determinaram a aplicação da medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica, ao arguido, subsistindo os perigos de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova, e os perigos de perturbação grave da ordem e a tranquilidade públicas e de continuidade da atividade criminosa, que basearam a decisão, não resultando do inquérito qualquer facto (novo) que pudesse abalar os fundamentos do despacho de aplicação da mesma, nem se verificando nenhuma das circunstâncias previstas no artigo 212.º do Código de Processo Penal, que pudesse ditar a sua revogação.
A intensidade destes perigos mantem-se em grau superlativo, continuando a mostrar-se manifestamente insuficientes quaisquer outras medidas de coação que não a prisão preventiva.
Perante o exposto, promovo que:
a. Se proceda à revisão da medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica, aplicada ao arguido AA, nos termos do disposto no artigo 213.º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo Penal;
b. Se determine a manutenção da referida medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com vigilância eletrónica, por continuarem inalterados os pressupostos e fundamentos em que assentou a sua aplicação, e atento o disposto nos artigos 191.º, 192.º, 193.º, 202.º, 213.º e 215.º, todos do Código de Processo Penal.
III.10 O Juiz de Instrução decidiu em 08/01/2025 quanto à Revisão do estatuto coactivo do arguido:
Na sequência de interrogatório subsequente de arguido detido, realizado no dia ........2024, AA ficou sujeito a Obrigação de Permanência na Habitação com sujeição a Vigilância Electrónica, caso viesse a ser considerada exequível, por se verificarem os pressupostos de que depende a sua aplicação e prisão preventiva, a vigorar no período que mediar até ao início da execução da medida de Obrigação de Permanência na Habitação com sujeição a Vigilância Electrónica ou até nova ponderação, caso esta venha a ser considerada não exequível, por fortes indícios da prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º nº 1 al. b) e n.º 2 al. a), 4, 5 e 6 do Código Penal e existência de perigo de continuação da atividade criminosa, perigo de perturbação do inquérito na vertente da aquisição e conservação da prova.
Por despacho de 20.11.2024 foi determinado o início da execução da OPHVE, na sequência da reunião das informações pertinentes e confirmação da sua exequibilidade.
Por despacho de 18.12.2024, na sequencia de requerimento do arguido, as medidas de coacção foram revistas e mantidas.
Atento o disposto no art.º 213º, n.º 1, alínea a) do CPP, impõe-se proceder à reapreciação dos pressupostos que fundamentaram a sua aplicação, dispensando-se a audição do arguido, por desnecessidade, por nenhum facto, com relevância para a revisão do estatuto coactivo ter sobrevindo aos autos.
Desde a data da aplicação da medida de coação em vigor e subsequente revisão, nenhuma prova indiciária foi produzida suscetível de alterar os pressupostos de facto e de direito que determinaram a sua aplicação, designadamente as exigências cautelares identificadas em interrogatório judicial, ou o ilícito indiciado.
Termos em que, determino que AA aguarde os subsequentes termos do processo em OPHVE, nos termos dos artºs 191º, 192º, 193º, 196º, 201º e 204 al. c), todos do Código de Processo Penal.
Notifique e DN.
***
IV. Fundamentos do recurso e respectiva apreciação:
IV.1 Se a medida de coacção aplicada ao arguido/recorrente – OPHVE - deveria ter sido no, despacho recorrido, substituída por outra menos gravosa por atenuação das exigências cautelares e por inexistência dos requisitos previstos nas alíneas a), b) e c) do art.º 204.º, do CPP.
Alega o arguido que devia o Tribunal a quo ter optado pela aplicação de uma medida de coação menos gravosa ou, em alternativa, ter-lhe autorizado a deslocação para prática laboral.
Mais alega que inexiste o requisito da alínea a) do 204.º CPP: o arguido possui residência fixa, vive com o pai e não existem elementos que indiquem qualquer intenção de se furtar à ação da justiça. De igual modo, inexiste o requisito da alínea b) do art.º 204.º CPP, na medida em que, desde a imposição da medida, o arguido não praticou qualquer ato que indicasse tentativa de interferência nos meios de prova. Por fim, inexiste do requisito da alínea c) do art.º 204.º CPP uma vez que, o arguido pretende retomar uma atividade laboral regular, em ambiente supervisionado e distante da ofendida, demonstrando vontade de reintegração e afastamento de qualquer conduta criminosa.
Vistos os autos, e analisados os factos em termos de sequência cronológica, vemos que:
Por existirem indícios da prática pelo arguido do crime de violência doméstica, previsto e punido pelo art.º 152.º, n.º1, al. b) e n.º2 al. a), 4, 5 e 6 do CP e por existirem os perigos aludidos no art.º 204.º, al.s b) e c) (perigo de perturbação do inquérito e de continuação da actividade criminosa) foram após, 1º interrogatório judicial, de 20.05.2024, aplicadas ao arguido recorrente as seguintes medidas de coacção:
• Obrigação de se apresentar semanalmente, no Posto policial da área da sua residência, nos termos do disposto no art. 198º do CPP.
• Obrigação de não permanecer na residência e nas imediações da residência da ofendida e em qualquer outro local por esta frequentado, nos termos do disposto nos artigos 200.º, n.º 1, alíneas a) do Cód. Proc. Penal e 31.º, n.º 1, alínea c) da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro;
• Obrigação de não contactar por qualquer forma com a ofendida, nos termos do disposto nos artigos 200.º, n.º 1, alíneas d) do Cód. Proc. Penal e 31.º, n.º 1, alínea d) da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro;
A execução destas medidas de coacção seria controlada por vigilância electrónica fixando-se o perímetro de exclusão em 800 (oitocentos) metros, por fortes indícios da prática de crime de violência domestica e perigo sustentado de continuação da actividade criminosa e de perturbação do inquérito.
Porém, o arguido incumpriu tais medidas de coacção, pelo que, por despacho proferido em novo interrogatório judicial do arguido detido para o efeito, de ........2024, (de que o arguido não recorreu), as medidas de coacção foram agravadas, por incumprimento das obrigações impostas, por o mesmo ter regressado à coabitação com a vítima e ter repetido a prática de actos susceptíveis de integrarem o crime de violência doméstica.
Ficou então o arguido sujeito a Obrigação de Permanência na Habitação com sujeição a Vigilância Electrónica, prevista no artigo 201º números 1 e 3, do mesmo diploma, por se verificarem os pressupostos de que depende a sua aplicação, atento o crime que se encontra indiciado e se tratar de medida necessária e suficiente para acautelar os perigos de continuação da actividade criminosa e perturbação do inquérito.
Quando a medida de coação aplicada se encontrava em execução, veio o arguido requerer em 03/12/2024 alteração para medida menos gravosa, ou autorização para saída da residência para exercer actividade profissional.
Porém, foi tal pretensão indeferida, através do despacho recorrido de 18/12/2024, por ter entendido o JIC que:
Compulsados os autos deles não consta, sequer do requerimento do arguido, menção a quaisquer factos que indiciem atenuação das exigências cautelares que sustentaram a aplicação da prisão preventiva.
Com efeito, mantêm-se os fortes indícios da prática dos factos, da sua autoria, bem como as circunstâncias atinentes à situação pessoal/familiar e profissional do arguido, já ponderadas aquando da aplicação da medida (estado civil e exercício de actividade profissional).
Na verdade, o propósito do arguido com a alteração pretendida - manter exercício de actividade profissional -, colide directamente com as exigências cautelares detectadas, porquanto, como concluído em interrogatório judicial e mantendo-se inalterado, apenas a privação de liberdade constitui de medida de coacção adequada a impedir o perigo de continuação da actividade criminosa.
Decisão:
Em face do exposto, ao abrigo do art.º 213º, n.º 1 do Código de Processo Penal, indefiro a requerida substituição e decido que AA aguardará os subsequentes termos do processo em OPHVE.”
Encontra-se assim o arguido sujeito à medida de coacção obrigação de permanência na habitação.
Dispõe o art.º 201.º, do CPP (Obrigação de permanência na habitação) que:
1 - Se considerar inadequadas ou insuficientes, no caso, as medidas referidas nos artigos anteriores, o juiz pode impor ao arguido a obrigação de não se ausentar, ou de não se ausentar sem autorização, da habitação própria ou de outra em que de momento resida ou, nomeadamente, quando tal se justifique, em instituição adequada a prestar-lhe apoio social e de saúde, se houver fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a 3 anos.
2 - A obrigação de permanência na habitação é cumulável com a obrigação de não contactar, por qualquer meio, com determinadas pessoas.
3 - Para fiscalização do cumprimento das obrigações referidas nos números anteriores podem ser utilizados meios técnicos de controlo à distância, nos termos previstos na lei.
O que está agora em causa é saber se, após o interrogatório judicial do arguido em que lhe foi aplicada tal medida, surgiu algum facto ou circunstância que implique a insubsistência ou a diminuição das exigências cautelares.
Dispõe o artigo 212.º do CPP (Revogação e substituição das medidas) que:
1 - As medidas de coacção são imediatamente revogadas, por despacho do juiz, sempre que se verificar:
a) Terem sido aplicadas fora das hipóteses ou das condições previstas na lei; ou

c. Terem deixado de subsistir as circunstâncias que justificaram a sua aplicação
2 - As medidas revogadas podem de novo ser aplicadas, sem prejuízo da unidade dos prazos que a lei estabelecer, se sobrevierem motivos que legalmente justifiquem a sua aplicação.
3 - Quando se verificar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação de uma medida de coacção, o juiz substitui-a por outra menos grave ou determina uma forma menos gravosa da sua execução.
4 - A revogação e a substituição previstas neste artigo têm lugar oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do arguido, devendo estes ser ouvidos, salvo nos casos de impossibilidade devidamente fundamentada, e devendo ser ainda ouvida a vítima, sempre que necessário, mesmo que não se tenha constituído assistente
.
Mais estatui o art.º 213.º do CPP ( Reexame dos pressupostos da prisão preventiva e da obrigação de permanência na habitação) que:
1 - O juiz procede oficiosamente ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva ou da obrigação de permanência na habitação, decidindo se elas são de manter ou devem ser substituídas ou revogadas:
a) No prazo máximo de três meses, a contar da data da sua aplicação ou do último reexame; e
b) Quando no processo forem proferidos despacho de acusação ou de pronúncia ou decisão que conheça, a final, do objecto do processo e não determine a extinção da medida aplicada.
2 - Na decisão a que se refere o número anterior, ou sempre que necessário, o juiz verifica os fundamentos da elevação dos prazos da prisão preventiva ou da obrigação de permanência na habitação, nos termos e para os efeitos do disposto nos n.ºs 2, 3 e 5 do artigo 215.º, e no n.º 3 do artigo 218.º
3 – Sempre que necessário, o juiz ouve o Ministério Público e o arguido.
4 - A fim de fundamentar as decisões sobre a manutenção, substituição ou revogação da prisão preventiva ou da obrigação de permanência na habitação, o juiz, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do arguido, pode solicitar a elaboração de perícia sobre a personalidade e de relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social, desde que o arguido consinta na sua realização.
5 - A decisão que mantenha a prisão preventiva ou a obrigação de permanência na habitação é susceptível de recurso nos termos gerais, mas não determina a inutilidade superveniente de recurso interposto de decisão prévia que haja aplicado ou mantido a medida em causa.

No caso da prisão preventiva e da obrigação de permanência na habitação é a própria lei que, no artigo 213.º, determina que o juiz proceda oficiosamente, pelo menos de três em três meses, ao reexame da subsistência dos seus pressupostos, e bem assim sempre que no processo forem proferidos despacho de acusação ou de pronúncia ou decisão que conheça, a final, do objecto do processo e não determine a extinção da medida aplicada.
O artigo 212.º regula os casos de revogação e de substituição da medida de coacção.
No que se refere à substituição por medida menos gravosa, esta ocorrerá quando se verificar uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação de uma medida de coação, caso em que o juiz substitui-a por outra menos grave ou determina uma forma menos gravosa da sua execução (nº3 do citado artigo 212º), podendo ter lugar oficiosamente ou a requerimento do arguido ou do Ministério Público.
Quer se atente nas situações elencadas no artigo 212º ou nas prevenidas no artigo 213º, ambos do Código de Processo Penal, a lei pressupõe sempre que algo mudou entre a primeira decisão e a segunda ou subsequentes decisões de reexame dos pressupostos de facto e de direito das medidas de coacção, maxime das privativas de liberdade.
Em caso algum pode o juiz, sem alteração dos dados de facto ou de direito, “reconsiderar” o despacho anterior ou, simplesmente, revogar a anterior decisão na medida em que, também aqui, proferida a decisão, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto ao seu objecto.
As medidas de coacção estão, portanto, sujeitas à cláusula rebus sic stantibus, isto é, o tribunal que aplicou a medida só a pode substituir ou revogar quando tenha ocorrido uma alteração dos pressupostos de facto ou de direito. (neste sentido, entre outros, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 20/04/2023, processo: 424/22.2PBCSC-A.L2-9 Relatora: PAULA PENHA em www.dgsi.pt.).
Assim, enquanto não ocorrerem alterações fundamentais na situação existente à data em que foi aplicada a medida de coação, não pode o tribunal reformar essa decisão.
É certo que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, no artigo III (3º) proclama a validade universal do direito à liberdade individual. Proclama ainda no artigo IX (9º) que ninguém pode ser arbitrariamente detido ou preso.
A Convenção Europeia dos Direitos do Homem/CEDH, no art.º 5º reconhece que “toda a pessoa tem direito à liberdade”. Ninguém podendo ser privado da liberdade, salvo se for preso em cumprimento de condenação, decretada por tribunal competente, de acordo com o procedimento legal.
Assim, determina desde logo o art.º 27.º, da CRP, que “ninguém pode ser total ou parcialmente privado da liberdade, a não ser em consequência de sentença penal condenatória”, salvo nos casos definidos nas várias alíneas do seu n.º 3, em que se admite a privação da liberdade, “pelo tempo e nas condições que a lei determinar”, discriminando cada uma das situações em que tal é possível, entre elas constando a “detenção em flagrante delito” e ainda a “detenção ou prisão preventiva por fortes indícios da prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos” (als. a) e b)).
A prisão preventiva e a Obrigação de permanência na habitação, constituem, sem dúvida, uma das mais graves restrições à liberdade, razão pela qual o legislador (constitucional e ordinário) teve o especial cuidado de proceder a uma definição rigorosa e clara dos respectivos pressupostos.
Preceitua o art.º 191.º, do CPP que “1. A liberdade das pessoas só pode ser limitada, total ou parcialmente, em função de exigências processuais de natureza cautelar, pelas medidas de coação e de garantia patrimonial previstas na lei”.
Concretizando tal, definiu o legislador ordinário, nos arts. 191.º e seguintes do CPP, as condições de aplicação das várias medidas de coacção legalmente admissíveis, bem como os respectivos pressupostos, sujeitando-as aos princípios da legalidade (art.º 191.º) - só podem ser impostas as medidas de coacção previstas na lei -, da adequação, da necessidade e da proporcionalidade (art.º 193.º do CPP).
Ademais, a aplicação de qualquer medida de coacção, exceptuado o termo de identidade e residência, depende da verificação, em concreto, no momento da sua aplicação, de algum dos perigos enunciados no art.º 204.º, do CPP, como já referido, tais como, perigo de fuga, de perturbação do inquérito ou da instrução do processo, para aquisição ou conservação da prova, de continuação da actividade criminosa ou de perturbação da ordem e tranquilidade públicas, estando ainda sujeita aos pressupostos gerais enunciados nos arts. 191 a 195.º, para além dos respectivos requisitos específicos, sendo que os referentes à obrigação de permanência na habitação estão previstos no art.º 201.º, do CPP.
Ora, o despacho recorrido encontra-se devidamente fundamentado, justificando devidamente a razão do indeferimento da requerida alteração da medida de coação OPHVE, nomeadamente os previstos nos art.ºs 213.º, 193.º, 201.º e 204.º, do CPP.
Além disso, no caso em análise, tendo por referência o curto período que mediou entre a data do primeiro interrogatório judicial e a formulação do requerimento em que o arguido requereu a alteração da medida (cerca de dois meses), não se vislumbra que tenham surgido alterações, quer quanto à forte indiciação do ilícito praticado no circunstancialismo descrito nos autos, quer quanto à personalidade do arguido revelada nos mesmos, que justifiquem qualquer juízo de abrandamento das exigências cautelares, mantendo-se, pois, os perigos que foram apontados aquando da aplicação da medida, em especial, o perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime e da personalidade do recorrente, de que continue a atividade criminosa.
Note-se que foi já o incumprimento culposo e grave das medidas de coacção não privativas da liberdade impostas no despacho de 20/05/2024, que vieram a revelar-se insuficientes, que determinou o agravamento de tais medidas por despacho de .../.../2024, e constitui circunstância que indicia que o arguido pode voltar praticar a mesma actividade criminosa, sendo as medidas de coacção menos gravosas inadequadas a evitar a concretização dos perigos identificados aquando da realização de primeiro interrogatório judicial, mormente o perigo de continuação da actividade criminosa.
Assim, a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação é adequada e necessária às exigências cautelares e proporcional à gravidade do crime indiciado e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas.
De resto, nem sequer do requerimento do arguido resulta menção a quaisquer factos que indiciem atenuação das exigências cautelares que sustentaram a aplicação da prisão preventiva, mantendo-se os fortes indícios da prática dos factos, da sua autoria, bem como as circunstâncias atinentes à situação pessoal, familiar e profissional do arguido, já ponderadas aquando da aplicação da medida.
A possibilidade de exercer uma actividade profissional e a necessidade de o fazer para assegurar as necessidades básicas, não constitui circunstância susceptível de alterar os pressupostos de facto e de direito que determinaram a aplicação da medida de coação em apreço e, consequentemente, fundamentar uma medida de coação menos gravosa.
A OPHVE, na fase processual em que o processo de inquérito se encontra, é ainda a única medida adequada às exigências cautelares que no caso se fazem sentir e proporcional à sanção que previsivelmente poderá ser aplicada, em caso de condenação.
Não merece, pois censura o despacho recorrido ao manter a medida de coacção OPHVE, falecendo a pretensão do recorrente de aplicação de medida menos gravosa.
IV.2 Da autorização de saída da habitação para exercício da actividade profissional.
Como decorre do art.º 201.º, do CPP a obrigação de permanência na habitação impõe ao arguido entre outras, a obrigação de não se ausentar ou não se ausentar sem autorização da habitação própria ou de outra em que de momento resida.
Decorre daí que o arguido poderá ausentar-se da habitação, mas mediante autorização.
Porém, implicando a medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com ou sem meios técnicos de controlo à distância, que o visado se confine ao espaço físico da habitação, a sua ausência só pode ser autorizada, pontualmente, por motivos justificados e apreciados caso a caso.
Esta medida de coacção (OPHVE) é a segunda mais gravosa no conjunto das medidas de coacção taxativamente previstas pela nossa legislação penal – sendo a mais gravosa a prisão preventiva (art. 202º do CPP); seguida da obrigação de permanência na habitação com ou sem vigilância electrónica e que pode ser cumulada com a obrigação de não contactar com certas pessoas por qualquer meio (art. 201º do CPP); e todas as demais sendo menos gravosas por não implicarem tal privação da liberdade), apenas proibição e/ou imposição de certas condutas (art.º 200º do CPP), suspensão do exercício de profissão, função, actividade e/ou direitos (art.º 199º do CPP), obrigação de apresentação periódica (art.º 198º do CPP), prestação de caução (art.º 197º do CPP), sendo a prestação de termo de identidade e residência cumulada, sempre, com qualquer uma daquelas porque, obrigatoriamente, inerente à constituição de qualquer pessoa como arguido (art.º 196º do CPP).
A OPHVE é uma verdadeira medida privativa da liberdade que só pode ceder, pontualmente, em situações devidamente justificadas, sob autorização judicial.
Afigura-se-nos pois que a autorização prevista no artigo 201º do C.P.P. para que o arguido se ausente da habitação, deve ser meramente pontual, não cabendo aí a ideia de autorização de saída para o trabalho regular.
Esta possibilidade de autorização para sair/ausentar-se da habitação constitui uma excepção, aquando da sua execução e, como tal, só justificada por razões/motivos (também eles) excepcionais, ponderosos e pontuais – tais como, para consultas ou tratamentos médicos (que não justifiquem a obrigação de permanência do arguido numa instituição de saúde), a visita a cônjuge, ascendente ou descendente em risco de morrer ou a comparência em velório ou funeral de um daqueles.
Diga-se, ademais, que o legislador pretendeu realçar o cariz privativo da liberdade pessoal e deambulatória inerente a esta medida de coacção a tal ponto que consignou, expressamente, que o período de permanência na habitação é (tal como o período de prisão preventiva) descontado por inteiro no cumprimento da pena de prisão que porventura venha a ser aplicada ao arguido (art.º 80º, nº 1, do CP).
Por isso, uma regular ausência quer para estudar fora de casa e/ou quer para desempenhar uma actividade profissional fora de casa não se enquadram naquelas justificações pontuais, excepcionais e ponderosas.
A medida de coação não se coaduna com o exercício de uma actividade laboral que redunda num regime de semi-detenção que sai dos princípios definidos pela obrigação de permanência na habitação, considerando as finalidades que lhe são inerentes, porquanto enfraqueceria o carácter cautelar desta medida de coacção esvaziando grande parte do seu conteúdo e finalidades e desvirtuando parte da sua natureza detentiva cautelar.
Neste sentido, na doutrina entre outros, Paulo Pinto de Albuquerque “(…) não é admissível a aplicação da medida de obrigação de permanência na habitação conjugada com a faculdade do arguido se deslocar diariamente para o seu local de trabalho, por esvaziar e subverter as necessidades cautelares agravadas inerentes a esta medida de coação” in Comentário do Código de Processo penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, Vol I, 5.ª Edição actualizada, pá,. 913.
Na jurisprudência veja-se os seguintes arestos, todos disponíveis em www.dgsi.pt cujo sumário se transcreve:
-Acórdão do TRP de 17/04/2024 proc. 3976/26.3JAPRT-A.P1, relatora LILIANA DE PÁRIS DIAS:
I – A medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com ou sem meios técnicos de controlo à distância, implica que o visado se confine ao espaço físico da habitação, só podendo ser autorizada a sua ausência, pontualmente, por motivos justificados e apreciados caso a caso.
II – O exercício de uma atividade laboral não se compagina com o conteúdo da medida de coação de obrigação de permanência na habitação – uma verdadeira medida privativa da liberdade que só pode ceder, pontualmente, em situações devidamente justificadas, sob autorização judicial - o seu deferimento colocaria em causa, de forma flagrante, as exigências cautelares que estiveram na base da sua aplicação e que subsistem, sem atenuação.
-Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra 17/12/2020, proc. 90/19.8JAVRL-A.C1 relator VASQUES OSÓRIO:
I. A autorização judicial a conceder a arguido sujeito à medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, de se ausentar desta, pode ter por objecto necessidades pontuais, designadamente, necessidades de tratamento médico, suas ou de familiares consigo conviventes e que necessitem de acompanhamento para esse efeito, ou o cumprimento de relevantes obrigações sócio-familiares, tais como, visitas a ascendente ou descendente gravemente doente ou a comparência em cerimónias fúnebres, pelo decesso dos mesmos.
II. Tal autorização não pode, em circunstância alguma, pôr em causa os fins cautelares visados com o decretamento da medida de coacção de obrigação de permanência na habitação.
III. In casu, tendo sido aplicada ao arguido e ora recorrente, a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, com fundamento, além do mais, na existência de perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova, por a transcrição das intercepções de conversações telefónicas revelarem as suas tentativas de interferência, pressionando as testemunhas a produzirem depoimentos favoráveis, a concessão de autorização para frequentar aulas teóricas e, depois, práticas, numa escola de condução, quando se aproxima a fase do julgamento, agravaria esse perigo, proporcionando ao arguido oportunidades várias para novas abordagens a testemunhas, assim frustrando os fins visados pela dita medida de coacção quando foi decretada.
Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Agosto de 2020 Processo 84/20.5GAMCD.G1, Ralatora CÂNDIDA MARTINHO:
1. A medida de coação de obrigação de permanência na habitação, com ou sem meios técnicos de controlo à distância, implica que o visado se confine ao espaço físico da habitação, só podendo ser autorizada a sua ausência, pontualmente, por motivos justificados e apreciados caso a caso.
2. Tal medida de coação não se compagina com o exercício de uma actividade laboral que redunda num regime de semi-detenção que sai dos parâmetros definidos pela obrigação de permanência na habitação, desde logo pelas finalidades que lhe são intrínsecas.
3. A autorização prevista no artigo 201º do C.P.P. para que o arguido se ausente da habitação onde cumpre a obrigação de permanência, deve ser meramente pontual, não cabendo ai a ideia de autorização de saída para o trabalho regular.
-Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-04-20 Processo: 424/22.2PBCSC-A.L2-9 Relatora: PAULA PENHA
I – A medida de coação de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica (abreviadamente designada como de OPHVE) é a segunda mais gravosa no leque das medidas de coacção taxativamente previstas pela nossa legislação penal e cuja constitucionalidade deriva do facto de ser um “minus” relativamente à prisão preventiva (a mais restritiva do direito fundamental à liberdade ambulatória e consentida, expressamente, nos art.ºs 27º, nº 3, al. b), e 28º da Constituição da República Portuguesa).
II – Aliás, o legislador pretendeu realçar o cariz privativo da liberdade pessoal e deambulatória inerente à OPHVE a tal ponto que consignou, expressamente, que o período de permanência na habitação é (tal como o período de prisão preventiva) descontado por inteiro no cumprimento da pena de prisão que porventura venha a ser aplicada ao arguido (art.º 80º, nº 1, do CP).
III – Pois, a OPHVE (também vulgarmente designada “prisão domiciliar”) pressupõe que o arguido fique obrigado a permanecer na habitação (que pode ser a sua residência ou a residência de outrem ou uma instituição adequada a prestar-lhe apoio social ou de saúde) e só mediante, prévia, autorização judicial é que o arguido poderá ausentar-se da mesma (do respectivo espaço físico a que está confinado). Esta possibilidade de autorização para sair/ausentar-se da habitação constitui uma excepção, aquando da sua execução e, como tal, só justificada por razões/motivos (também eles) excepcionais, ponderosos e pontuais – tais como, para consultas ou tratamentos médicos (que não justifiquem a obrigação de permanência do arguido numa instituição de saúde), a visita a cônjuge, ascendente ou descendente em risco de morrer ou a comparência em velório ou funeral de um daqueles. IV – Por isso, uma regular ausência do arguido quer para estudar fora de casa e/ou quer para desempenhar uma actividade profissional fora de casa não se enquadram naquelas justificações pontuais, de curta duração, excepcionais, anormais, ponderosas e de muita importância ou gravidade. A natureza e a forma de execução da OPHVE não se compaginam com as pretendidas saídas ou ausências do arguido que enfraqueceriam o carácter cautelar desta medida de coacção, esvaziariam grande parte do seu conteúdo e finalidades, desvirtuando parte da sua essência detentiva cautelar.
V - Por último e não menos importante, as medidas de coacção estão sujeitas à condição/cláusula/princípio “rebus sic standibus”, isto é, a sua alteração apenas se justifica quando ocorrer uma atenuação das exigências cautelares que tiverem determinado a sua aplicação. Caso contrário, enquanto as coisas estiverem ou permanecerem como estão, não haverá alteração da decisão cautelar. Não tendo o arguido/requerente cumprido o ónus de alegar e provar que sequer ocorrera uma atenuação das exigências cautelares do caso em apreço e em que medida tal sucedera, nomeadamente através de elementos factuais novos.
Voltando ao caso em apreço, o arguido pretende que lhe seja concedida autorização para se ausentar da habitação estritamente com ao local de trabalho e durante o respectivo tempo, indicando o horário (de 08 às 18h) e o local (...), sem, contudo ter ainda celebrado por escrito qualquer contrato escrito que confirme nomeadamente a identidade da entidade patronal, a aceitação desta , tipo de trabalho, local e horário.
Mas, independentemente disso, tal sempre implicaria regulares e continuadas deslocações desde a habitação para o local de trabalho que o mesmo refere e vice-versa.
Ora, na esteira da doutrina e da jurisprudência supra citadas, não se conforma com os supramencionados requisitos da excepcionalidade ou anormalidade, da gravidade ou muita importância e da curta duração ou carácter pontual impostos para a concessão de autorização de ausência da habitação no âmbito da medida de coacção (OPHVE) a que s encontra sujeito.
Não devendo olvidar-se que o arguido está indiciado como autor (material, na forma consumada) de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea a) do Código Penal, com os inerentes perigos que determinaram a sua aplicação, em especial o de continuação da actividade criminosa que estão indiciados nos autos (nos termos do art.º 204º, als. a) e c), do CPP). Tal perigo não ficaria acautelado pela flexibilização da medida de OPHVE que permitisse a possibilidade de ausentar-se da residência para exercer uma actividade profissional, possibilidade essa que atenta a personalidade do arguido já evidenciada nos autos, o levaria certamente a continuar a sua actividade criminosa, o que, diga-se já ocorreu e que determinou a agravação das medidas de coacção que lhe haviam sido impostas, por sua culpa.
De resto, tal pedido impunha que este tivesse cumprido, em concreto, o ónus legal previsto no art.º 212º, nº 3, do CPP, porém, o arguido não carreou para os autos quaisquer elementos factuais novos e/ou elementos jurídicos novos que comprovassem uma atenuação das exigências cautelares do caso em apreço e que haviam justificado a aplicação da medida de coacção de obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica e a sua manutenção no despacho recorrido.
Nos termos e pelos fundamentos expostos, indemonstrada a alteração superveniente das circunstâncias que fundamentaram a aplicação da obrigação de permanência na habitação com vigilância electrónica e não cabendo no conteúdo de tal medida a autorização pretendida pelo arguido, a qual goraria as exigências cautelares que estiveram na base da sua aplicação, há que julgar improcedente o recurso interposto pelo recorrente, mantendo-se a decisão recorrida nos seus exatos termos, a qual não viola qualquer das disposições legais invocadas pelo recorrente e não merece reparo ou censura.

V - DISPOSITIVO
Pelo exposto, acordam os Juízes Desembargadores que integram a 9ª secção deste Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA confirmando a decisão recorrida.
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Mais se condena o arguido/recorrente nas custas do recurso, fixando-se em 3 Ucs a taxa de justiça devida– artigos 513º e 514º, ambos do Código de Processo Penal e tabela III do Regulamento das Custas Processuais aprovado pelo Decreto-Lei nº 34/2008, de 26 de fevereiro.
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Notifique e dê conhecimento imediato ao Tribunal recorrido.

Lisboa, 03.04.2025
(Texto elaborado pela relatora e revisto, integralmente, pelos signatários)
Maria de Fátima R. Marques Bessa
Diogo Coelho de Sousa Leitão
Paula Cristina Bizarro