Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
731/17.6PEOER.L1-5
Relator: ANABELA CARDOSO
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/09/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: - O tribunal de segunda jurisdição vai à procura, não de uma nova convicção, mas de saber se a convicção expressa pelo tribunal a quo tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova (com os demais elementos existentes nos autos) pode exibir perante si.
- É inquestionável que há que compensar o dano estético sofrido pelo demandante, como componente mais relevante do dano moral, tanto mais que as cicatrizes que afectam o rosto são visíveis.
- É adequado o valor fixado na decisão recorrida que condenou o recorrente no pagamento ao demandante da quantia de 4.200,00 euros, a título de danos não patrimoniais, nestes se incluindo o ressarcimento do dano estético, avaliado em 3.500,00 euros, valor por que está orçamentada e provada nos autos a reparação deste dano [para eliminação das cicatrizes que foram produzidas por esta acção do arguido, o assistente necessitará de se submeter a intervenção cirúrgica que consistirá na excisão das cicatrizes com plastia por retalhos locais, seguida de duas sessões e dermoabrasão, tendo este tratamento um custo previsto de 3.500,00 euros].
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. No Processo Comum, com julgamento com Tribunal Singular, nº 731/17.6PEOER, do Tribunal da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo Local Criminal de Oeiras - Juiz 1, foi, pelo Digno Magistrado do Ministério Público, deduzida acusação contra o arguido:
- D. ;
Pela prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art° 143.° nº 1 do Código Penal.
F. , que se constituiu assistente, deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 6.100,00 a título de danos patrimoniais e não patrimoniais.
O Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental E.P.E. deduziu, também, pedido de indemnização civil contra o arguido, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 112,07 (cento e doze euros e sete cêntimos), acrescida dos juros de mora, calculados à taxa legal, até à data do seu efectivo e integral pagamento.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, em 28 de Fevereiro de 2019, onde foi decidido o seguinte:
“Pelo exposto, julgo a acusação procedente, por provada e, consequentemente:
A) Condeno o arguido, D. , peia prática, em autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punível pelo artigo 143°, n° 1 do Código Penal, na pena de 190 (cento e noventa) dias de multa, à taxa diária de € 9,00 (nove euros), num total de € 1710,00 (mil, setecentos e dez euros).
B) Julgo parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante F.  e, em consequência, condeno o arguido, D. :
- a título de danos não patrimoniais, a pagar-lhe a quantia de € 4200,00 (quatro mil e duzentos euros). A esta quantia acrescerão os juros de mora legais, vincendos, contabilizados desde a presente data, até efetivo e integral pagamento, à taxa de 4%, ao abrigo dos artigos 805°, 806° e 556° do Código Civil e da Portaria 291/2003, de 8 de Abril.
- a título de danos patrimoniais, no pagamento de € 100,00 (cem euros), a que acrescerão os juros, calculados à mesma taxa de 4%, vencidos desde a data da citação, bem como os vincendos, tudo até efetivo e integral pagamento.
E absolvo o demandado do demais peticionado.
C) Julgo procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelo Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental E.P.E e, em consequência, condeno o arguido D. , no pagamento a esta entidade, do montante de € 112,07 (cento e doze euros e sete cêntimos), acrescido dos juros de mora legais, vencidos desde a data da citação e dos vincendos até efetivo e integral pagamento, à taxa de 4%.
D) Condeno o arguido no pagamento das custas (criminais) do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC's- cfr. artigos 513° e 514° do CPP, 8º e 16° do RCP e tabela III a ele anexa.
E) Condeno o arguido e o demandante F.  no pagamento das custas cíveis, na proporção dos respetivos decaimentos (cf. artigo 377.°, n.° 3, do Código de Processo Penal e artigo 527.°, n.° s 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 523.° do Código Penal).”
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2. Não se conformando com esta decisão, o arguido dela interpôs recurso, o qual foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo.
As conclusões da motivação de recurso são as seguintes:
“1. A douta decisão em crise, pese embora constitua uma peça jurídica que encerra inegável labor, ainda assim parece, salvo melhor, não ser totalmente conforme à lei e ao direito e por isso merecedora de objetiva censura, por encerrar manifesto erro na apreciação da prova produzida.
2. Com efeito, a matéria que o Tribunal deu por assente no Ponto 2, não tem suporte algum na prova testemunhal produzida.
3. Infere-se do depoimento das testemunhas FC e CG que nenhum deles viu o Arguido agredir o Assistente, como se sufraga na Decisão em crise.
4. Depoimentos que são totalmente antagónicos e contrários à versão apresentada pelo Assistente, que afirmou que estava a falar com o FC , quando o Arguido o agrediu e seguiu em direção à porta do fundo.
5. Quando aquela testemunha afirmou que não estava a falar com ele, se encontrava na esplanada e foi separá-los quando ouviu barulho.
6. Versão igualmente confirmada pela testemunha CG , que estava atrás do balcão e quando ouviu o barulho de um copo a partir, se virou e viu o Assistente e o Arguido agarrados um ao outro.
7. Assim, não encontrando o Ponto 2 respaldo na prova testemunhal que foi produzida, deve ser dado como não provado.
8. E em consequência ser o Arguido absolvido da prática do crime de ofensas corporais e dos inerentes pedidos de indemnização cível.
9. Uma vez que, ao abrigo do citado entendimento jurisprudencial, o apelo às regras da experiência comum não se sobrepõe ao princípio constitucional do "in dubeo pro reo".
10. Que deveria sempre prevalecer perante a incongruência, falta de credibilidade e necessário comprometimento e interesse do depoimento do Assistente,
11. Que não teve pejo em afirmar que tinha vergonha de sair à rua, mas que no dia seguinte telefonou à testemunha JB a contar o que se tinha passado e dias depois continuou a frequentar o café como se nada tivesse passado.
12. De qualquer modo e ainda que assim se não entenda, jamais o Arguido poderia ter sido condenado a pagar 3.500,00€ ao Assistente para realizar uma intervenção cirúrgica.
13. Dado que, como decorre do ponto 12 dos Factos, essa intervenção ainda não teve lugar, pelo que se imporia que a condenação fosse relegada para o momento em que o Assistente a realizasse e até ao limite do valor de 3.500,00€.
14. Assim, ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida é merecedora de objetiva censura, por ter infringido o disposto no artigo 143°, n° 1, do Cód. Penal e no artigo 564° do Cód. Civil, devendo por isso ser revogada e substituída por outra que dando provimento ao presente recurso, absolva o Arguido da prática do crime de ofensas corporais ou, quando assim não se entenda, que apenas seja condenado a pagar o custo da intervenção cirúrgica depois do Assistente a efetuar e até ao limite do valor de 3.500€, doutra forma não se fará rigorosa aplicação da lei e haverá fundado motivo para se afirmar não ter sido feita justiça.”
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3. O Digno Magistrado do Ministério Público respondeu a este recurso, sustentando que se deverá negar provimento ao mesmo e se confirmar inteiramente a douta sentença.
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4. Neste Tribunal da Relação de Lisboa, o Exmº. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser julgado improcedente o recurso interposto pelo arguido e mantida a decisão recorrida.
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5. Foram colhidos os vistos e realizada a competente conferência.
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6. O objecto do recurso tal como ressalta das conclusões da motivação versa a apreciação das seguintes questões:
- Da impugnação da matéria de facto, na modalidade de erro de julgamento;
- Da violação do princípio” in dubio pro reo”;
- Da condenação no pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente (dano estético).
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7. Observemos o que consta da decisão recorrida, quanto à factualidade provada e não provada e sua fundamentação:
“Discutida a causa resultaram provados os seguintes factos:
1. No dia 5 de agosto de 2017, aproximadamente entre a 01h30m e a 01h45m, o arguido D.  e o assistente F. , quando se encontravam no estabelecimento de restauração “C.”, sito na Rua … Carnaxide, área do município de Oeiras, iniciaram uma discussão por questões não concretamente apuradas.
2. Após troca de palavras e, em ato contínuo, o arguido agarrou num copo de vidro e desferiu, com ele, pelo menos uma pancada na face direita do assistente F. .
3. Como consequência direta de tal ato, F. sofreu feridas na face, com hemorragia, que necessitaram de ser suturadas, no Hospital de São Francisco Xavier onde foi assistido nesse dia, pelas 2h48m.
4. De tais ferimentos resultou, necessariamente, cicatriz nacarada na região lateral externa do globo ocular direita com 1 cm de diâmetro, 2 cicatrizes nacaradas na região zigimática com 5 cms de comprimento e 2 cms de comprimento e cicatriz com colóide na região inframandibular direita com 20 cms de comprimento.
5. Como consequência da atuação do arguido, o assistente apresenta, ainda, sequelas a nível de alterações da cor, textura da pele e proeminência da pele, em particular um afundamento da superfície da região da ferida malar, o que configura um dano permanente estético.
6. O arguido, ao atuar da forma descrita, agiu com intenção de molestar fisicamente e da forma acima mencionada o assistente, o que logrou, bem sabendo que provocaria lesões no corpo deste.
7. O arguido atuou de forma livre, delibera e consciente, não ignorando que a sua conduta era proibida e penalmente perseguida.
8. O assistente foi assistido, naquele dia, em episódio de urgência, no Hospital São Francisco Xavier, onde lhe foram prestados os cuidados médicos descriminados na fatura n° 18010343, constante de fls. 97 verso, que se considera reproduzida, no valor de € 112,07.
9. O assistente tem recebido tratamento estético na Clínica da Face.
10. Como consequência direta e necessária do golpe que lhe foi desferido pelo arguido, o assistente ficou com os óculos partidos e com uma camisa inutilizada, objetos de valor não concretamente determinado.
11. Para eliminação das cicatrizes que foram, assim, produzidas por esta ação do arguido, o assistente necessitará de se submeter a intervenção cirúrgica que consistirá na excisão das cicatrizes com plastia por retalhos locais, seguida de duas sessões e dermoabrasão.
12. Este tratamento tem previsto um custo de € 3500,00.
13. O assistente sofreu por causa dos ferimentos, dores e mal estar durante um período de 25 dias.
14. O assistente passou a evitar ir à rua, nos dias que se seguiram a este episódio, por vergonha de aparecer marcado junto do seu círculo de amigos.
15. O arguido e o assistente, tinham, naquelas circunstâncias de tempo e de lugar descritas em 1., consumido algumas bebidas alcoólicas.
16. Na manhã seguinte ao episódio descrito em 1. e 2., o arguido acordou com contusões na boca e no sobrolho e com uma lesão num dos seus pés.
17. Deparando-se com a lente dos seus óculos riscada.
18. Recorrendo, no dia 7 de Agosto de 2017, ao serviço de urgências do Hospital de São Francisco Xavier para observar o pé.
19. O arguido é tido por pessoa respeitadora, no seu meio social.
20. O arguido está reformado, mas não recebe qualquer pensão.
21. Vive do património que o pai lhe deixou em herança, de valor não concretamente apurado.
22. O arguido vive com a sua esposa e com dois filhos maiores, um deles estudante e a seu cargo.
23. A sua esposa está reformada e aufere uma pensão de reforma como empregada bancária, de valor não concretamente apurado.
24. O arguido tem o 1 Io ano de escolaridade.
25. O arguido não tem qualquer condenação averbada no seu registo criminal.
Factos não provados, alegados, com relevância para a causa:
- que o arguido tenha desferido, com o copo, vários golpes na face do assistente.
- que como consequência direta e necessária do golpe que sofreu do arguido, o relógio do assistente se tenha partido.
- que esse relógio, em conjunto com a camisa e com os óculos, valessem € 1100,00.
- que o assistente passasse a deixar de sair à rua, por ter medo de ser, de novo, atacado.
- que fosse usual existirem discussões e desentendimentos no aludido estabelecimento comercial, entre arguido e assistente, sempre que este ficava embriagado.
- que este seja, nestas situações de prévio consumo de álcool, por norma, insultuoso e ofensivo.
- que a ação descrita em 2. se devesse à necessidade de repelir algum ato ou conduta do assistente.
- que as lesões apresentadas pelo arguido fossem obra do assistente.
Motivação de facto:
A convicção do Tribunal, quanto à dinâmica da agressão e suas consequências, assenta no confronto das declarações do arguido, com as declarações do assistente, com os depoimentos de CG, FC, MA, JR e JB, com o auto de Exame Direto de fls. 46 e 47 e com o auto de Exame Sanidade a fls. 65 e 66 e com os documentos juntos aos autos, muito particularmente, com a Ficha de Episódio de Urgência n.° 17091022, de fls. 41 a 43, com o relatório clínico emitido pela Clínica da Face, a fls. 62, com a fatura hospitalar de fls. 97v e com a avaliação clínica de fls. 116, que contempla orçamento de intervenção cirúrgica estética.
Apreciaram-se ainda criticamente os depoimentos das testemunhas de defesa, JM e MB bem como os documentos juntos pelo arguido, a fls. 121 a 123.
Ora, o arguido não nega os factos, declarando que não guarda memória do concretamente ocorrido no estabelecimento onde confirma ter estado, efetivamente, no dia identificado em 1..
E corrobora que se envolveu, naquele estabelecimento, em discussão com o assistente e após terem, ambos, ingerido bebidas alcoólicas.
O arguido, sempre em declarações despidas de espontaneidade e parcas em pormenores e que revelam uma memória estranhamente seletiva, acaba por afirmar que guarda lembrança de, naquele estabelecimento, estar de pé ao balcão e de ser insultado pelo assistente com expressões como “és um merda, és um lixo”.
Questionado, afirma que não se recorda qual era o motivo da discussão.
Declara que o assistente estava à sua frente e a crescer para si, tendo apenas a ideia de ter colocado os braços à frente para conseguir sair dali. Sempre de uma forma pouco impressiva, explica que já não podia ouvir o seu interlocutor e que queria ir embora dali.
O próprio arguido confirma que estavam, nesse momento, no estabelecimento, para além dele e do assistente, o CG e o FC .
Tendo-lhe sido perguntado, respondeu que chegou a casa às 4 horas, estimando que o episódio tenha ocorrido pelas três horas e tal.
Ora, confrontado com a hora aposta na ficha de atendimento de urgência de fls. 42, que comprova que o assistente foi assistido no Hospital de São Francisco Xavier às 2 h 48m, o arguido acaba por corrigir, admitindo que podia ser mais cedo.
O arguido declara que, quando acordou, no dia seguinte, tinha um golpe na cara e tinha dores no pé, dirigindo-se, depois ao Hospital de São Francisco Xavier, onde lhe foi diagnosticada uma rutura de ligamentos.
Ainda que pareça insinuar que estas lesões se devessem à ação do assistente, o certo é que o arguido não consegue apresentar uma explicação plausível para a sua ocorrência, nem consegue explicar por onde andou até às 4 horas da madrugada, quando o incidente no interior do bar teria de ser, necessariamente, muito anterior.
Assim, esta declarações do arguido, produzidas desta forma desorganizada, pouco peso probatório acabam por ter e não têm qualquer virtualidade para infirmar a versão do assistente, mais clara e credível e assente nos depoimentos das duas únicas testemunhas presentes no lugar e coerente com a documentação clínica e relatórios periciais juntos aos autos.
O assistente, F. , acaba por descrever os factos tal como ora se dão por assentes.
Este declarante explica que estava, por volta da hora descrita em 1., naquele estabelecimento ali identificado.
O assistente conta que estava a ter uma conversa com o arguido, sobre uma pessoa que ambos conheciam, relacionada com os bombeiros e desentenderam-se sobre o conceito que ambos tinham dela. Concordaram, então, em não falar mais um com o outro.
Nesse momento, estavam um próximo do outro, mas o assistente estava encostado ao balcão e o arguido perto da esplanada.
No momento em que o assistente já estava em conversa com a testemunha FC , o arguido passa por si, pega num copo de balão de whiskey e atinge- o com força na cara.
Por força da pancada e de o copo se ter estilhaçado na sua cara, sentiu dor intensa e imediata e que tinha um ferimento muito extenso na cara. O assistente explica, impressivamente, que sentia a pele rasgada e até pendurada.
Questionado pela hora a que este episódio ocorreu, o declarante esclarece que pode ter demorado bem mais de uma hora até chegar ao hospital, já que foi levado a casa e ainda demorou algum tempo a sair, passando, em primeiro lugar, pela Esquadra de Polícia.
Assim, a hora para que aponta surge em coerência lógica com a que foi vertida na douta acusação.
Quando perguntado se proferiu aquelas expressões que lhe são atribuídas pelo arguido, o assistente admite que as pode ter dito após ter sido golpeado pelo arguido, mas nunca antes.
O assistente refere que para além dos ferimentos que vieram a causar a cicatriz que ainda hoje é visível, esta atuação do arguido partiu-lhe os óculos, bem como um relógio de marga “Omega” que era do seu pai.
As explicações do assistente sobre a forma como o relógio se partiu são pouco lógicas e muito hesitantes.
O assistente declara que apenas se apercebeu, posteriormente, que o relógio estava partido, pois que este caiu quando chegava a casa.
Repare-se que a descrição da ação do arguido não encaixa na plausibilidade de um dano no relógio, já que os relatórios periciais, as fotografias e a documentação clínica permitem concluir que foi a parte direita da cara que foi atingida.
O assistente descreve, de forma coerente com o depoimento das duas testemunhas presenciais, o seu posicionamento em relação ao arguido, afirmando que este o ataca inesperada e lateralmente. Ou seja, ataca-o detrás, pelo lado encostado ao balcão.
Ou seja, o assistente não teve qualquer capacidade de reflexo, sendo que mesmo que ensaiasse um movimento de defesa seria quase impossível que o fizesse, em tempo, com o braço esquerdo, o oposto ao lado que sofreu o ataque (o direito).
Já quanto aos óculos, a sua quebra pode, facilmente, explicar-se como resultado da projeção do copo na cara do assistente.
O assistente revela, ainda, que na sequência destas lesões sofreu uma depressão muito profunda, procurando refugiar-se em causa.
No entanto, admite que voltou ao café após os factos.
O declarante confirma que tem sido assistido na Clínica da Face, como o relatório de fls. 62 inequivocamente demonstra, permitindo comprovar o facto assente em 9..
E afirma que tem projetada uma operação cirúrgica para reconstituição do estado do rosto, como a avaliação clínica de fls. 116 e o depoimento do seu sobrinho, JR permitem comprovar, o que justifica o facto assente em 11.
 O valor da intervenção, com algum melindre, resulta do orçamento inserido naquela avaliação clínica, julgando-se adequado, atentos os valores médios do mercado e os esclarecimentos produzidos pela testemunha JR, enfermeiro do profissão.
CG tem um depoimento muito evasivo, tornando-se manifesto que procura não se comprometer.
Essa caraterística do seu depoimento é notória logo no momento da identificação da exploração do bar, que atribui à sua esposa.
No entanto, não coloca em causa que estivesse naquele estabelecimento, a preparar-se para fazer o fecho da caixa, estando de costas para os clientes.
O depoente revela que pouco passaria da meia noite e que a sua atenção não foi despertada pela discussão, pois que era habitual ver aqueles dois clientes num despique amigável e em brincadeiras que são habituais em bares.
Guarda a ideia, no entanto, que eles discutiam sobre os bombeiros e apercebeu-se que, em determinado momento, um copo se partiu.
Quando se vira, depara-se com o arguido e assistente agarrados um ao outro, com as mãos para cima e para baixo.
O assistente ostentava um ferimento na cara e o arguido tinha um ferimento numa das mãos.
Ao se aperceber daquilo, fez o arguido sair do estabelecimento e foi buscar a caixa de socorros para assistir o assistente.
Este relato, em confronto com as declarações do assistente e com o depoimento de FC , que também confirma que estava presente, permite alicerçar a convicção segura de que os factos ocorreram tal como descrito em 1, e 2., tornando-se manifesto que esta ação teve por consequência necessária os ferimentos apresentados por F..
A testemunha corrobora que o arguido tinha estado a jantar no estabelecimento, ingerindo vinho e que, depois, bebeu um ou dois whiskeys, à semelhança do que aconteceu com o demandante.
De todo o modo, ainda que a sua perspetiva, como a pessoa que lhes serviu as bebidas alcoólicas, não seja absolutamente isenta, o depoente não ficou com a perceção de que qualquer deles estivesse profundamente embriagado.
O depoente revela que o arguido deixou, então, de frequentar o estabelecimento, mas que o assistente ainda lá voltou, nomeadamente no dia seguinte.
FNC confirma que estava no estabelecimento mas afirma que pediu um copo de vinho e foi fumar para o exterior do estabelecimento.
Também este depoimento parece ser algo evasivo, denotando, no entanto, absoluta equidistâncía em relação aos dois contendores.
A testemunha estava, assim, na esplanada, quando se apercebeu, em determinada altura, que arguido e assistente estavam agarrados. Nesse momento, lança-se no auxílio de ambos, procurando separá-los.
O depoente declara inicialmente não ter reparado se havia copos partidos, mas recorda-se do assistente logo ali lhe ter explicado que o arguido o atingira com um copo.
A testemunha revela que, depois, acompanhou o assistente à porta da casa deste, procurando convencê-lo a ir ao hospital pois que viu que este sangrava profusamente.
Ou seja, da conjugação destes depoimentos com as certezas que resultam das declarações do assistente e com a prova das lesões assentes em 3 e 4 e que se ancora nos relatórios periciais de medicina legal e na documentação clínica já nomeada, nenhuma dúvida existe de que os factos ocorreram tal como se deu por assente em 1. e 2.
Os depoimentos reproduzem fragmentos da verdade que encaixam racionalmente entre si, sendo que os ferimentos terão sido inevitavelmente produzidos por um instrumento de caraterísticas corto-contundentes ou atuando como tal. E esse copo, como CG acaba por, a custo, reconhecer, estava partido junto ao local onde as testemunhas viram o arguido e o assistente agarrados.
Este mútuo agarrar ocorreu, alcança-se, apenas após a projeção do copo ao rosto do assistente e deveu-se ao comportamento reativo deste, que bem se compreende.
MA, a esposa do assistente, transmite, de forma também impressiva, o aparato dos ferimentos do marido, que estava assustado e com dores.
A testemunha confirma que levou o seu marido ao hospital, mas não sem antes passarem pela Esquadra de Polícia.
O cunhado da depoente é médico e aconselhou, em função daquelas lesões, a recorrer à Clínica da Face.
O seu marido andou em tratamentos um ou dois meses na clínica, sempre com dores, pelo que este depoimento permite alicerçar a convicção do facto que se deu por assem em 13., que também repousa nas declarações do assistente.
A depoente revela, ainda, que o seu marido tinha dificuldade em dormir, não tendo dúvidas que aquela situação agravou o estado de depressão em que este já se encontrava.
De forma coerente, segura e fundamentada, a testemunha confirma o que se deu por assente em 14., que se estriba, ainda, no depoimento da testemunha JR e nas declarações do próprio assistente.
 A testemunha corrobora que os óculos do marido estavam paridos e que a camisa ficou toda ensanguentada, ficando inutilizada, o que já resultava do depoimento de FC .
Assim, esta depoente é, ainda, em conjugação com a demais prova ora referida, determinante para comprovar o facto assente em 10.
Ainda que a testemunha confirme que o marido tinha, igualmente, o relógio partido, pelo que ficou dito, não se permite comprovar que tal eventual dano, a existir, tenha sido diretamente causado pelo arguido.
JR, enfermeiro, sobrinho do demandante, refere que a sua tia chamou-o para que visse o assistente e lhe fizesse o primeiro penso.
O depoente constatou que o seu tio tinha feridas incisas no rosto e uma sutura na região infra mandibular.
A única ferida que não estava tapada era a da zona peri orbitária.
Também este depoente revela que o seu tio entrou em depressão e passou a condicionar a sua vida, evitando sair, nomeadamente para ir a casa dos familiares a Beja.
JB, amigo do assistente, revela ter ficado muito impressionado ao visitar o amigo e ao constatar que este tinha a cara cortada.
Este depoente, pelo contacto que tinha com o assistente, corrobora, de forma credível, que o seu amigo tinha vergonha de sair.
Esta explicação é razoável, se se tiver em conta que a testemunha acrescenta que, na zona, os boatos sobre o que se passou eram frequentes, o que agravava esse sentimento de vergonha e o melindre o assistente perante a curiosidade das pessoas.
Esta testemunha assevera que o assistente lhe tem desabafado frequentemente, que quer eliminar as cicatrizes, o que poderá ser feito através da intervenção cirúrgica descrita a fls. 116.
JM, amigo do arguido, afirma que não o revê neste comportamento, tendo um depoimento muito abonatório daquele.
Por outro lado, a testemunha revela que o assistente é uma pessoa impositiva a defender as suas posições, mas não consegue convencer o Tribunal de que este é violento e, muito particularmente, que tenha, naquele lugar e hora descritos em 1. sido agressivo, de qualquer forma, para o arguido, até porque tal perspetiva não foi acompanhada pelas testemunhas presenciais.
MB, a esposa do arguido, confirma que, no dia seguinte, o arguido ostentava os ferimentos que se observam nas fotografias de fls. 121, tendo ido ao Hospital, a atendimento de urgência, tal como o documento que segue documenta.
A depoente não tem qualquer conhecimento direto dos factos que permita infirmar a convicção do tribunal quanto aos factos que se deram por assentes.
 Ainda que o arguido invoque falta de lembrança dos factos e que estaria intoxicado pelo álcool, não se apurou qual a concentração de álcool no sangue. Não se apurou, nem se indiciou que esse estado fosse idóneo para lhe afastar o seu livre arbítrio.
Resulta manifestamente dos factos que ora se deram por assentes, a vontade do arguido projetada no exterior.
As regras de experiência comum e a atitude que o arguido teve no momento que se seguiu aos factos, testemunhada pelo assistente e pelas testemunhas presenciais, permite confirmar, sem margens para dúvidas, que o arguido atuou livre, deliberada e conscientemente, bem querendo adotar aquela conduta apesar de saber que a mesma era proibida e vedada por lei penal.
As condições económicas, familiares e sócias resultam das declarações do próprio arguido, não infirmadas, a este propósito por qualquer meio de prova.
A prova da falta de antecedentes criminais resulta da análise do Certificado de Registo Criminal junto aos autos a fis 114 e ss.
Os factos não provados resultam do que ficou dito e da falta de qualquer meio de prova que os confirme.
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III  - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Do crime de ofensa à integridade física.
Face à factualidade supra provada importa averiguar se o arguido cometeu o crime que lhe é imputado, crime de ofensa à integridade simples, previsto e punível pelo artigo 143°, n° 1 do Código Penal.
(…)
Ora, realizando a subsunção dos factos provados à norma incriminadora resulta da matéria provada que o arguido atacou com um copo o assistente, desferindo-lhe uma pancada na face, do lado direito. Por força dessa pancada e do copo se ter partido com a pancada, na face do assistente, este sofreu vários ferimentos na face, com as características descritas em 4, que aqui se dão por reproduzidas. Essas lesões produziram dor. Como consequência dos ferimentos, permaneceram as cicatrizes descritas em 5.
Desta pancada resultaram, assim, estas lesões.
Mais se tem por assente que esta acção voluntária do arguido produziu dores no demandante.
Assim, está apurado que esta ação do arguido ofendeu a integridade física do assistente, sendo causa necessária de lesão corporal.
Por esta razão, mostram-se preenchidos os elementos objetivos do tipo de crime de ofensas à integridade física simples por parte do arguido.
E não se colocam dúvidas de que aquele resultado foi obra do arguido, estando reunidos os pressupostos de imputabilidade objetiva prevista no artigo 10° do Código Penal, nenhum problema se colocando ao nível da causalidade.
Assim, o arguido praticou uma ação voluntária que diretamente produziu um resultado típico - lesões e dores provocadas no assistente.
Estes danos corporais, até pelo prolongado estado de doença e sequelas, assumem significância considerável.
Bem sabia o arguido que tal conduta não lhe era permitida, mas ainda assim, quis agir do modo descrito, actuando com dolo directo, previsto no art° 14°, n° 1 do C.P. que prevê que “Age com dolo quem, representando um facto que preenche um tipo de crime, actuar com intenção de o realizar.
O arguido representou que o evento danoso verificado era um resultado necessário da sua conduta e atuou com vontade de o realizar.
Da conduta apurada ao arguido está excluída a possibilidade de subsunção a qualquer causa de exclusão da ilicitude ou da culpa.
Deste modo, conclui-se que o arguido cometeu o crime de ofensa à integridade física simples que lhe era imputado, sendo, por ele, condenado.
*
IV   - DETERMINAÇÃO E MEDIDA DA PENA.
(…)
V.           Dos pedidos de indemnização civil
1. Do pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente F. .
F.  deduziu, como se viu, pedido de indemnização civil contra o arguido, pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 6.100,00 a título de danos patrimoniais e não patrimoniais e ainda em custas ou procuradoria condignas.
A indemnização a fixar no âmbito do processo penal assume, atento o disposto nos art°s. 129° do C. Penal e 71° e ss. do CPP, a natureza de indemnização civil de perdas e danos. Por conseguinte, o apuramento quantitativo e os respectivos pressupostos, ancoram-se no estatuído na lei civil.
Ora, conforme resulta do disposto no art. 337°, n° 1 do Código de Processo Penal, “a sentença ainda que absolutória, condena o arguido em indemnização civil, sempre que o pedido respectivo vier a revelar-se fundado”. Articulando o disposto nos arts. 483° do Código Civil e 128° do Código Penal a obrigação de indemnizar pressupõe a prática pelo lesante de um facto ilícito e culposo.
Nos termos do art. 128° do Cód. Penal, a indemnização de perdas e danos emergentes de um crime é regulada pela lei civil, ou seja, é nas disposições do Código Civil - art°s 483°, e ss. e 562° e ss. - que se vai buscar não só os pressupostos da responsabilidade civil como também as regras de determinação dos danos a indemnizar (cf. Ac. STJ de 26.10.1989, AJ, n°2, pág. 4).
Nos moldes previstos pelo artigo 483° do Código Civil, aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. Como refere ANTUNES VARELA, “Das obrigações em geral”, vol. I, Coimbra, 1991, pág. 516, os pressupostos da responsabilidade por factos ilícitos são: a)- facto voluntário do lesante, b) ilicitude, <j) imputação do facto ao lesante, d) o dano, e) nexo de causalidade entre o facto e o dano.
O pedido de indemnização civil deduzido em processo penal tem sempre de ser fundamentado na prática de um crime.
E foi provada a prática do crime de ofensa à integridade física simples pelo arguido.
Assim, o arguido é ora condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, que teve como vítima o assistente/demandante.
Este deduziu, como se disse, pedido de indemnização civil pelos factos constantes da acusação, que foram demonstrados.
Da matéria de facto provada e da apreciação que dela foi feita no tocante à responsabilidade criminal, resultam provados todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual - facto ilícito, culposo, verificando-se ainda a existência de nexo causal entre a prática dos factos e as lesões e dores causadas, bem como com o dano estético permanente, a humilhação, a dor e os incómodos sentidos, pelo que face ao disposto nos artigos 483°, n° 1, 487°, 562° e 563°, todos do Código Civil, deverá constituir-se o arguido - ora demandado - na obrigação de indemnizar o demandante.
Com efeito, desde logo, é evidente o carácter ilícito do comportamento do demandado, dado que praticou o crime referido, ofendendo a integridade física, um dos bens pessoais mais preciosos tutelados pelo nosso ordenamento jurídico.
O demandante sofreu lesões que necessitaram de assistência e que deixaram sequelas permanentes, ainda que estas possam ser removidas através de uma intervenção cirúrgica cujo valor reclama.
A conduta do arguido causou-lhe dores e incómodos relevantes, ampliados pela atuação em público.
O demandante sentiu vexação ao sofrer este “ataque”.
E sofre, ainda, sequelas físicas em virtude da ação sofrida.
Podemos definir “dano” como “perda in natura que o lesado sofre, em consequência de certo facto, nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito violado ou a norma infringida visa tutelar ”.
Há dano não patrimonial “sempre que é ofendido, objectivamente, um bem imaterial, como a integridade física ou a vida, ainda que essa ofensa não seja acompanhada, subjectivamente, de sofrimento, "(cfr. “Direito das Sucessões”, Galvão Telles, 5a ed., pág. 78).
Estão, pois, verificados, no caso em apreço, os referidos pressupostos da responsabilidade civil.
Os sentimentos de dor, abalo psicológico e humilhação descritos consubstanciam danos com suficiente gravidade para merecerem a tutela do Direito (artigo 496° n° 1 do Código Civil).
Constituiu-se, assim, o demandado na obrigação de indemnizar o demandante.
A indemnização por danos não patrimoniais não visa reconstituir a situação que existia caso não se tivesse verificado o evento, mas sim compensar de algum modo o lesado pelos danos (...)morais sofridos- cfr. Ac. Do STA de 20 de Junho de 1996, BMJ, 458, pág. 139.
O Artigo 562° Código Civil Português aponta o Princípio geral da responsabilidade civil, estabelecendo que “Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não tivesse verificado o evento que obriga à reparação”.
No caso “sub judice”, não sendo possível a reconstituição natural quanto à dor e da humilhação sofridos, princípio básico do dever de indemnizar, o montante indemnizatório devido pelos danos efectivamente apurados como causados pela conduta do arguido, será fixado equitativamente (artigo 496°, n°3 do Código Civil), devendo o julgador fazer uso de critérios de razoabilidade e proporcionalidade.
Nestes termos, e tendo em conta a situação económica do arguido, moderadamente favorável, bem como a presumida do demandante, a extensão dos danos corporais, o susto que este sofreu, os dias de doença e a relativa proximidade temporal, entendo adequado e proporcional fixar o “quantum” indemnizatório em € 700,00 (setecentos euros), tal como peticionado.
Como se viu, a conduta do arguido causou, ainda, necessariamente, um dano estético permanente ao demandante, que se traduz nas cicatrizes por este ostentadas.
O dano estético corresponde, assim, à repercussão das sequelas, numa perspetiva estática e dinâmica, envolvendo uma avaliação personalizada da afetação da imagem da vítima, quer em relação a si própria, quer perante aos outros.
Na avaliação do dano estético, há que ter em conta o desgosto da vítima, a que não é indiferente a idade, o sexo, ou o estatuto civil.
Vale, no entanto, como se viu, o princípio geral da reparação integral dos danos, demonstrou-se que a reparação deste dano estético é possível.
E a reconstituição natural está orçamentada em € 3500,00, pelo que tal pretensão indemnizatória não poder deixar de ser atendida, somando-se ao valor já fixado para os demais danos não patrimoniais.
A quantia arbitrada, acrescerão os juros de mora legais, vincendos, contabilizados desde a presente data, até efetivo e integral pagamento, à taxa de 4%, ao abrigo dos artigos 805°, 806° e 556° do Código Civil e da Portaria 291/2003, de 8 de Abril
Quanto aos danos patrimoniais invocados, constata-se que o demandante não demonstrou o valor da camisa, nem dos óculos, não se tendo apurado que o eventual dano no relógio fosse “obra” do arguido.
Ora, à falta de critérios objetiváveis para a respetiva fixação do prejuízo, é possível fazer uso de um critério de equidade.
Na verdade, a quantia não pode ser determinada sem de execução de sentença.
É para estes casos em que o autor não está em condições de arriscar uma quantia exata, que não está dependente de uma operação de simples liquidação, que está previsto o recurso à equidade, no n° 3 do artigo 566° do Código Civil
Nos danos patrimoniais, a equidade funciona como elemento corretor e quando não é possível averiguar o seu valor exato.
Sendo que, no caso dos autos, é manifesto que o demandante teve que despender determinada quantia nos óculos e viu-se privado do uso da camisa.
Desta forma, fazendo uso das regras de equidade, julgo ser de fixar em€ 100,00 o valor de ressarcimento dos óculos partidos e da camisa estragada.
A este valor acrescerão os juros de mora legais, contabilizados desde a citação, à taxa de 4% (Portaria n° 263/99, de 12/04), tudo até integral pagamento.
(…).”
                                                                       *
                                                                       *
8. Apreciando, agora, as questões objecto do recurso em causa:
- Da impugnação da matéria de facto, na modalidade de erro de julgamento:
Veio o recorrente impugnar a matéria de facto, questionando a suficiência da prova produzida, pretendendo que este Tribunal considere como não provado o ponto 2 dos dados como provados, por, invocadamente, não ter suporte algum na prova testemunhal produzida.

Cumpre apreciar:
A decisão recorrida sustentou a fundamentação do ponto 2, considerado como provado, na conjugação dos seguintes meios de prova (sublinhados nossos):
A convicção do Tribunal, quanto à dinâmica da agressão e suas consequências, assenta no confronto das declarações do arguido, com as declarações do assistente, com os depoimentos de CG, FC, MA, JR e JB , com o auto de Exame Direto de fls. 46 e 47 e com o auto de Exame Sanidade a fls. 65 e 66 e com os documentos juntos aos autos, muito particularmente, com a Ficha de Episódio de Urgência n.° 17091022, de fls. 41 a 43, com o relatório clínico emitido pela Clínica da Face, a fls. 62, com a fatura hospitalar de fls. 97v e com a avaliação clínica de fls. 116, que contempla orçamento de intervenção cirúrgica estética.
Apreciaram-se ainda criticamente os depoimentos das testemunhas de defesa, JM e MB, bem como os documentos juntos pelo arguido, a fls. 121 a 123.
Ora, o arguido não nega os factos, declarando que não guarda memória do concretamente ocorrido no estabelecimento onde confirma ter estado, efetivamente, no dia identificado em 1..
E corrobora que se envolveu, naquele estabelecimento, em discussão com o assistente e após terem, ambos, ingerido bebidas alcoólicas.
O arguido, sempre em declarações despidas de espontaneidade e parcas em pormenores e que revelam uma memória estranhamente seletiva, acaba por afirmar que guarda lembrança de, naquele estabelecimento, estar de pé ao balcão e de ser insultado pelo assistente com expressões como “és um merda, és um lixo”.
Questionado, afirma que não se recorda qual era o motivo da discussão.
Declara que o assistente estava à sua frente e a crescer para si, tendo apenas a ideia de ter colocado os braços à frente para conseguir sair dali. Sempre de uma forma pouco impressiva, explica que já não podia ouvir o seu interlocutor e que queria ir embora dali.
O próprio arguido confirma que estavam, nesse momento, no estabelecimento, para além dele e do assistente, o CG e o FC .
Tendo-lhe sido perguntado, respondeu que chegou a casa às 4 horas, estimando que o episódio tenha ocorrido pelas três horas e tal.
Ora, confrontado com a hora aposta na ficha de atendimento de urgência de fls. 42, que comprova que o assistente foi assistido no Hospital de São Francisco Xavier às 2 h 48m, o arguido acaba por corrigir, admitindo que podia ser mais cedo.
O arguido declara que, quando acordou, no dia seguinte, tinha um golpe na cara e tinha dores no pé, dirigindo-se, depois ao Hospital de São Francisco Xavier, onde lhe foi diagnosticada uma rutura de ligamentos.
Ainda que pareça insinuar que estas lesões se devessem à ação do assistente, o certo é que o arguido não consegue apresentar uma explicação plausível para a sua ocorrência, nem consegue explicar por onde andou até às 4 horas da madrugada, quando o incidente no interior do bar teria de ser, necessariamente, muito anterior.
Assim, esta declarações do arguido, produzidas desta forma desorganizada, pouco peso probatório acabam por ter e não têm qualquer virtualidade para infirmar a versão do assistente, mais clara e credível e assente nos depoimentos das duas únicas testemunhas presentes no lugar e coerente com a documentação clínica e relatórios periciais juntos aos autos.
O assistente, F. , acaba por descrever os factos tal como ora se dão por assentes.
Este declarante explica que estava, por volta da hora descrita em 1., naquele estabelecimento ali identificado.
O assistente conta que estava a ter uma conversa com o arguido, sobre uma pessoa que ambos conheciam, relacionada com os bombeiros e desentenderam-se sobre o conceito que ambos tinham dela. Concordaram, então, em não falar mais um com o outro.
Nesse momento, estavam um próximo do outro, mas o assistente estava encostado ao balcão e o arguido perto da esplanada.
No momento em que o assistente já estava em conversa com a testemunha FC , o arguido passa por si, pega num copo de balão de whiskey e atinge- o com força na cara.
Por força da pancada e de o copo se ter estilhaçado na sua cara, sentiu dor intensa e imediata e que tinha um ferimento muito extenso na cara. O assistente explica, impressivamente, que sentia a pele rasgada e até pendurada.
Questionado pela hora a que este episódio ocorreu, o declarante esclarece que pode ter demorado bem mais de uma hora até chegar ao hospital, já que foi levado a casa e ainda demorou algum tempo a sair, passando, em primeiro lugar, pela Esquadra de Polícia.
Assim, a hora para que aponta surge em coerência lógica com a que foi vertida na douta acusação.
Quando perguntado se proferiu aquelas expressões que lhe são atribuídas pelo arguido, o assistente admite que as pode ter dito após ter sido golpeado pelo arguido, mas nunca antes.
O assistente refere que para além dos ferimentos que vieram a causar a cicatriz que ainda hoje é visível, esta atuação do arguido partiu-lhe os óculos, bem como um relógio de marga “Omega” que era do seu pai.
As explicações do assistente sobre a forma como o relógio se partiu são pouco lógicas e muito hesitantes.
O assistente declara que apenas se apercebeu, posteriormente, que o relógio estava partido, pois que este caiu quando chegava a casa.
Repare-se que a descrição da ação do arguido não encaixa na plausibilidade de um dano no relógio, já que os relatórios periciais, as fotografias e a documentação clínica permitem concluir que foi a parte direita da cara que foi atingida.
O assistente descreve, de forma coerente com o depoimento das duas testemunhas presenciais, o seu posicionamento em relação ao arguido, afirmando que este o ataca inesperada e lateralmente. Ou seja, ataca-o detrás, pelo lado encostado ao balcão.
Ou seja, o assistente não teve qualquer capacidade de reflexo, sendo que mesmo que ensaiasse um movimento de defesa seria quase impossível que o fizesse, em tempo, com o braço esquerdo, o oposto ao lado que sofreu o ataque (o direito).
Já quanto aos óculos, a sua quebra pode, facilmente, explicar-se como resultado da projeção do copo na cara do assistente.
O assistente revela, ainda, que na sequência destas lesões sofreu uma depressão muito profunda, procurando refugiar-se em causa.
No entanto, admite que voltou ao café após os factos.
O declarante confirma que tem sido assistido na Clínica da Face, como o relatório de fls. 62 inequivocamente demonstra, permitindo comprovar o facto assente em 9..
E afirma que tem projetada uma operação cirúrgica para reconstituição do estado do rosto, como a avaliação clínica de fls. 116 e o depoimento do seu sobrinho, JR permiem comprovar, o que justifica o facto assente em 11.
 O valor da intervenção, com algum melindre, resulta do orçamento inserido naquela avaliação clínica, julgando-se adequado, atentos os valores médios do mercado e os esclarecimentos produzidos pela testemunha JR, enfermeiro do profissão.
CG  tem um depoimento muito evasivo, tornando-se manifesto que procura não se comprometer.
Essa caraterística do seu depoimento é notória logo no momento da identificação da exploração do bar, que atribui à sua esposa.
No entanto, não coloca em causa que estivesse naquele estabelecimento, a preparar-se para fazer o fecho da caixa, estando de costas para os clientes.
O depoente revela que pouco passaria da meia noite e que a sua atenção não foi despertada pela discussão, pois que era habitual ver aqueles dois clientes num despique amigável e em brincadeiras que são habituais em bares.
Guarda a ideia, no entanto, que eles discutiam sobre os bombeiros e apercebeu-se que, em determinado momento, um copo se partiu.
Quando se vira, depara-se com o arguido e assistente agarrados um ao outro, com as mãos para cima e para baixo.
O assistente ostentava um ferimento na cara e o arguido tinha um ferimento numa das mãos.
Ao se aperceber daquilo, fez o arguido sair do estabelecimento e foi buscar a caixa de socorros para assistir o assistente.
Este relato, em confronto com as declarações do assistente e com o depoimento de FC , que também confirma que estava presente, permite alicerçar a convicção segura de que os factos ocorreram tal como descrito em 1, e 2., tornando-se manifesto que esta ação teve por consequência necessária os ferimentos apresentados por F.
A testemunha corrobora que o arguido tinha estado a jantar no estabelecimento, ingerindo vinho e que, depois, bebeu um ou dois whiskeys, à semelhança do que aconteceu com o demandante.
De todo o modo, ainda que a sua perspetiva, como a pessoa que lhes serviu as bebidas alcoólicas, não seja absolutamente isenta, o depoente não ficou com a perceção de que qualquer deles estivesse profundamente embriagado.
O depoente revela que o arguido deixou, então, de frequentar o estabelecimento, mas que o assistente ainda lá voltou, nomeadamente no dia seguinte.
FNC confirma que estava no estabelecimento mas afirma que pediu um copo de vinho e foi fumar para o exterior do estabelecimento.
Também este depoimento parece ser algo evasivo, denotando, no entanto, absoluta equidistâncía em relação aos dois contendores.
A testemunha estava, assim, na esplanada, quando se apercebeu, em determinada altura, que arguido e assistente estavam agarrados. Nesse momento, lança-se no auxílio de ambos, procurando separá-los.
O depoente declara inicialmente não ter reparado se havia copos partidos, mas recorda-se do assistente logo ali lhe ter explicado que o arguido o atingira com um copo.
A testemunha revela que, depois, acompanhou o assistente à porta da casa deste, procurando convencê-lo a ir ao hospital pois que viu que este sangrava profusamente.
Ou seja, da conjugação destes depoimentos com as certezas que resultam das declarações do assistente e com a prova das lesões assentes em 3 e 4 e que se ancora nos relatórios periciais de medicina legal e na documentação clínica já nomeada, nenhuma dúvida existe de que os factos ocorreram tal como se deu por assente em 1. e 2.
Os depoimentos reproduzem fragmentos da verdade que encaixam racionalmente entre si, sendo que os ferimentos terão sido inevitavelmente produzidos por um instrumento de caraterísticas corto-contundentes ou atuando como tal. E esse copo, como CG acaba por, a custo, reconhecer, estava partido junto ao local onde as testemunhas viram o arguido e o assistente agarrados.
Este mútuo agarrar ocorreu, alcança-se, apenas após a projeção do copo ao rosto do assistente e deveu-se ao comportamento reativo deste, que bem se compreende.
MA, a esposa do assistente, transmite, de forma também impressiva, o aparato dos ferimentos do marido, que estava assustado e com dores.
A testemunha confirma que levou o seu marido ao hospital, mas não sem antes passarem pela Esquadra de Polícia.
O cunhado da depoente é médico e aconselhou, em função daquelas lesões, a recorrer à Clínica da Face.
(…)
As regras de experiência comum e a atitude que o arguido teve no momento que se seguiu aos factos, testemunhada pelo assistente e pelas testemunhas presenciais, permite confirmar, sem margens para dúvidas, que o arguido atuou livre, deliberada e conscientemente, bem querendo adotar aquela conduta apesar de saber que a mesma era proibida e vedada por lei penal.”
Ouvida a gravação da prova feita em audiência de discussão e julgamento e observada a prova existente nos autos, nenhuma censura nos merece a fundamentação da decisão recorrida. Do confronto da mesma com o invocado na motivação de recurso, com vista à impugnação da matéria de facto, mormente do ponto 2, dado como provado, o que observamos é que a divergência do recorrente se funda, essencialmente, na apreciação da prova, efectuada pelo tribunal recorrido, nos termos da livre apreciação daquela, regida pelas regras da experiência comum, conforme preceituado no art.º 127º do CPP.
Com efeito, no nosso sistema processual vigora o princípio da livre apreciação da prova, por contraposição ao sistema da prova legal. Em conformidade com o referido princípio, o juiz tem total liberdade, de acordo com a sua íntima convicção, de proceder à valoração dos meios de prova obtidos.
Assim, regra geral (e ressalvadas as excepções previstas na lei), na apreciação da prova e partindo das regras de experiência, o tribunal é livre de formar a sua convicção. Normalmente o que sucede é que, face à globalidade da prova produzida, o tribunal se apoie num certo conjunto de provas, em detrimento de outras, nada obstando a que esse convencimento parta de um registo mínimo, mas credível, de prova, em detrimento de vastas referências probatórias, que, contudo, não têm qualquer suporte de credibilidade.
Também não se pode esquecer que o julgador pode recorrer a presunções naturais no processo de formação da sua convicção, uma vez que se trata de um meio de prova admitido na lei (cf. artigo 125º do Código de Processo Penal), sendo que, de acordo com o disposto no artigo 349° Código Civil, presunções são as ilações que a lei ou julgador extrai de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido. Consistem, pois, em raciocínios lógico-dedutivos, ou demonstrativos, que o julgador elabora, a partir da prova indiciária, para alcançar a verificação dos "factos juridicamente relevantes”.
As presunções naturais são, afinal, o produto das regras de experiência; o juiz, valendo-se de um certo facto e das regras da experiência, conclui que esse facto denuncia a existência de outro facto. "Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede então mediante uma presunção ou regra da experiência, ou de uma prova de primeira aparência” (cf. Vaz Serra, "Direito Probatório Material", BMJ, n° 112 página 190, e acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-01-2004, disponível em www.dgsi.pt).
Para avaliar da racionalidade e da não arbitrariedade da convicção sobre os factos, há que apreciar, de um lado, a fundamentação da decisão quanto à matéria de facto (os fundamentos da convicção), e de outro, a natureza das provas produzidas e dos meios, modos ou processos intelectuais, utilizados e inferidos das regras da experiência comum para a obtenção de determinada conclusão.
O duplo grau de jurisdição na apreciação da decisão da matéria de facto não tem, portanto, a virtualidade de abalar o princípio da livre apreciação da prova, que está conferido ao julgador de primeira instância.
É que se afigura indubitável que há casos em que, face à prova produzida, as regras da experiência comum permitem, ou não colidem, com mais do que uma solução. Se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis segundo as regras da experiência, ela será inatacável, já que foi proferida em obediência à lei que impõe que ele julgue de acordo com a sua livre convicção.
Veja-se, que o legislador, consciente das limitações que o recurso da matéria de facto necessariamente tem de envolver, teve o cuidado de dizer que as provas a atender pelo Tribunal ad quem são aquelas que "impõem" e não as que "permitiriam" decisão diversa (cf. artigo 412º, nº 3, alínea b), do Código de Processo Penal).
No caso, na motivação do recurso interposto pelo arguido procedeu-se à transcrição de segmentos das declarações do assistente e de duas das testemunhas ouvidas em sede de audiência de discussão e julgamento (FC e CG ), mas a verdade, porém, é que tais excertos e sínteses apostas, interpretadas pelo seu subscritor, de acordo com critérios defensivos e no interesse do próprio, não são suficientes para refutar o que foi dado como provado.
Na verdade, o que o recorrente pretende atacar é apenas e tão só a valoração que o tribunal recorrido fez relativamente às provas feitas, insurgindo-se contra a leitura feita pelo mesmo de todas as provas e do valor que as mesmas mereceram, pretendendo, agora, que este Tribunal de recurso as reaprecie, de acordo com a sua leitura, mas sem razão, pois o tribunal recorrido, examinando crítica e exaustivamente a prova produzida e tendo interligado todo o material probatório recolhido, convenceu-se da participação do arguido e da sua responsabilização nos factos ocorridos, nos termos dados como provados / não provados, e explicou exaustivamente porquê.
Com efeito, na sentença recorrida é feita, de forma pormenorizada, a descrição das declarações do arguido, assim como dos depoimentos prestados, em sede de audiência de discussão e julgamento, pelo assistente e pelas testemunhas arroladas, tendo-se procedido, depois, em conjugação com a prova pericial e documental junta aos autos, à análise crítica de toda a prova, socorrendo-se das regras da experiência comum e da livre convicção.
Em audiência surgiram, com muitas vezes acontece, duas versões absolutamente contraditórias quanto ao essencial, a do ofendido imputando ao arguido os factos impugnados e a deste, negando-os. Mas esta até nem é a situação destes autos, na medida em que o arguido não nega os factos, declarando antes que não guarda memória do concretamente ocorrido no estabelecimento, onde confirma ter estado, efectivamente, no momento em que ocorreram os factos, admitindo que se envolveu, naquele estabelecimento, em discussão com o assistente, após terem ambos ingerido bebidas alcoólicas, mais confirmando a presença no local das testemunhas CF e FC .
De forma fundamentada, que não nos merece qualquer censura, o tribunal recorrido explica o motivo de ter considerado as declarações do arguido prestadas de forma desorganizada, despidas de espontaneidade e parcas em pormenores, com revelação de uma memória estranhamento selectiva, e, assim, com pouco peso probatório e sem qualquer virtualidade para infirmar a versão do assistente, julgada mais clara e credível e assente nos depoimentos das duas únicas testemunhas presentes no local e coerente com a documentação clínica e relatórios periciais juntos aos autos.
Efectivamente, o ofendido apresentava as lesões dadas como provadas – comprovadas pela documentação clínica junta aos autos – e que são compatíveis com a forma como o mesmo descreveu o desenrolar dos factos.
Quanto à questão de como surgiram aquelas lesões, o Tribunal a quo deu credibilidade ao que afirmou o ofendido, o qual descreveu, de forma considerada convincente, toda a situação, esclarecendo as circunstâncias de modo, tempo e local em que os factos ocorreram, nomeadamente a forma como o arguido o agrediu, bem como as lesões que sofreu, que implicaram tratamento médico, manifestando coerência e rigor no seu depoimento, como resulta claramente da audição da gravação da prova e assim foi entendido pelo tribunal recorrido.
Acresce que a corroborar as declarações do ofendido temos, também, como referido na decisão recorrida, a restante prova, designadamente a prova pericial e documental, mais concretamente a já mencionada documentação clínica, quanto às lesões pelo mesmo sofridas, compatíveis com a forma como descreveu a ocorrência dos factos, corroboradas, de igual forma, pelo depoimento das testemunhas que se encontravam no local, que, não obstante não terem assistido ao momento da agressão propriamente dita, aperceberam-se da discussão entre o arguido e o assistente, após o que se deparam com os dois agarrados, ostentando o assistente um ferimento na cara e o arguido um ferimento na mão [esclarecendo, ainda, a testemunha CG que, momento antes de os ver envolvidos fisicamente, ouvira o barulho de um copo a partir, acabando por reconhecer que o veio a encontrar um copo partido, junto do local onde viu arguido e assistente envolvidos fisicamente – sendo inquestionável, pelos relatórios periciais de medicina legal e pela documentação clinica junta aos autos, que os ferimentos causados ao assistente foram produzidos por um instrumento de características corto-contundentes ou actuando como tal], para além da apreciada descrição lógica e postura revelada em audiência por estas testemunhas, que criou no espírito do julgador uma significativa impressão de credibilidade, termos em que a convicção formada pelo tribunal recorrido tem pleno suporte na prova produzida.
Temos, pois, que a conjugação de todos os elementos probatórios recolhidos permite inferências suficientemente seguras no sentido da matéria dada como provada, não se vislumbrando qualquer contra-argumento suficientemente seguro que justifique solução diferente daquela a que chegou o tribunal recorrido, cumprindo, mais uma vez, salientar que a crítica à convicção a que este chegou, sustentada na livre apreciação da prova e nas regras da experiência comum, não pode ter sucesso se alicerçar apenas na diferente convicção do recorrente sobre a prova produzida.
Tal como se decidiu no Ac. da Relação de Coimbra de 6 de Março de 2002, in CJ, ano XXVII, tomo 2, p. 44: “Quando a atribuição de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear em opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção é inadmissível face às regras da experiência comum”. 
Assim, “ao tribunal superior cumpre verificar a existência da prova e controlar a legalidade da respectiva produção, nomeadamente no que respeita à observância dos princípios da igualdade, oralidade, imediação, contraditório (…) verificando, outrossim, a adequação lógica da decisão relativamente às provas existentes. Assim, só em caso de existência de provas, para se decidir em determinado sentido, ou de violação das normas de direito probatório (nelas incluindo as regras da experiência comum ou da lógica) cometida na respectiva valoração feita na decisão de primeira instância, esta pode ser modificada, nos termos do art.º 431º do CPP”, cf. Ac. desta 5ª Secção do TR de Lisboa, sendo relator, o hoje Conselheiro, Vasques Dinis, de 22 de Novembro de 2005, no processo nº 3717/05.5.
Como se decidiu, também, no Ac. do STJ de 31 de Maio de 2007, disponível in www.dgsi.pt, “…quando a opção do julgador se centra em elementos directamente interligados com o princípio do imediação, o tribunal de recurso só tem a possibilidade de sindicar a aplicação concreta de tal princípio e de controlar a convicção do julgador da primeira instância quando se mostre ser contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos. A atribuição de credibilidade, ou não, a uma fonte de prova testemunhal por declarações, assenta numa opção do julgador na base da imediação e da oralidade, que o tribunal de recurso só poderá criticar demonstrando que é inadmissível face às regras da experiência comum.”
Por outro lado, e conforme há muito entendido pela jurisprudência dos tribunais superiores, o recurso em matéria de facto previsto no nosso sistema processual não se destina à obtenção de um segundo julgamento sobre tal matéria, mas antes está concebido, tão só, como um remédio jurídico destinado a corrigir eventual ilegalidade cometida, e, no caso concreto ora em apreciação, do exame de todas as provas disponíveis não se verifica, nem se vislumbra que o tribunal recorrido haja violado as regras de experiência comum ou da lógica, em que se funda a livre apreciação da prova, nem que haja violado qualquer das normas do direito probatório, tendo o recorrente limitado a sua impugnação da matéria assente na sua pessoalíssima e diversa interpretação da prova, fundada na negação dos factos fixados na decisão recorrida, que lhe são imputados, pelo que a interpretação da prova efectuada pelo recorrente, nos termos expostos, não tem sequer a virtualidade de abalar o julgamento da matéria de facto indiciária efectuado em primeira instância, pois, tal como declarado pelo Tribunal Constitucional, no processo nº 198/04, publicado in DR II Série, de 2 de Junho de 2004, “a impugnação da decisão em matéria de facto terá de assentar na violação dos factos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na convicção ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma seria a inversão dos personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela de quem espera a decisão”.
A este propósito, de forma pertinente, diz-se no acórdão da Relação de Coimbra, de 3 de Outubro de 2000, publicado in Col.ª Jur.ª Tomo 4º, pág. 28, que “a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação da prova que está deferido à 1ª instância, sendo que na formação da convicção do julgador entram necessariamente elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova, por mais fiel que ela seja”, referindo o mesmo aresto que o que o tribunal de segunda jurisdição vai à procura não é de uma nova convicção, mas de saber se a convicção expressa pelo tribunal a quo tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova (com os demais elementos existentes nos autos) pode exibir perante si.
Não nos podemos esquecer que o tribunal recorrido teve contacto vivo e imediato com o arguido, com o assistente e com as testemunhas, de onde extraiu um sem número de impressões, que apenas foram por ele percepcionadas e que transpôs para a motivação da convicção do Tribunal, onde não só se elencaram as provas reputadas relevantes, como, também, se procedeu ao seu exame crítico, explicitando-se, ainda, o processo de formação da convicção, tecendo considerações sobre a credibilidade a conferir aos vários depoimentos e às declarações do arguido, não se limitando a decisão recorrida a mostrar os meios de prova, através do seu elenco, pois demonstrou e exteriorizou por que razão se convenceu que o arguido recorrente cometeu os factos de que vinha acusado, integradores da tipicidade objectiva e subjectiva do crime por que foi condenado.
Em suma, perscrutando a decisão recorrida, facilmente se observa não ser possível surpreender nela qualquer insuficiência da matéria de facto provada, qualquer falta de fundamentação, contradição de fundamentação ou entre esta e a decisão ou, ainda, qualquer asserção contrária às regras da experiência comum ou qualquer juízo ilógico, arbitrário ou contraditório, pelo que é manifesta a inexistência de qualquer violação das regras de experiência comum que regem o princípio da livre apreciação da prova ou a violação de qualquer princípio constitucional.
Temos, assim, que analisada a prova produzida em audiência, os juízos dados como assentes apresentam-se plenamente legítimos, face ao conteúdo do princípio da livre apreciação da prova, sendo a versão dada como provada plenamente plausível face às provas em análise, não revelando ter havido qualquer arbítrio, ou discricionariedade na sua apreciação, nem atentado contra a lógica ou as regras da experiência comum, não merecendo, pois, a decisão relativa à matéria de facto qualquer censura, termos em que, nesta parte, improcederá o recurso. 
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- Da violação do princípio in dubio pro reo:
Alega, ainda, o recorrente a falta de certeza da prova produzida em julgamento, não existindo prova testemunhal que corrobore a versão da acusação, sustentando que a sua condenação só pode ter resultado de uma apreciação da prova efectuada em violação do princípio “in dubio pro reo”, que deveria sempre prevalecer perante a incongruência, falta de credibilidade e necessário comprometimento e interesse do depoimento do assistente.

Vejamos:
Não havendo nos termos da fundamentação da decisão recorrida qualquer margem de dúvida quanto à prática dos factos provados, pelo recorrente, nada permite a formulação de qualquer juízo de dúvida que pudesse ser solucionada com recurso ao princípio in dubio pro reo.
Com efeito, não restaram dúvidas ao tribunal a quo em dar como provados os factos referidos no ponto 2).
Dessa forma, não houve qualquer necessidade por parte do Tribunal a quo se socorrer do princípio in dubio pro reo, uma vez que nem se colocou qualquer dúvida ou hesitação quanto à não inocência do recorrente relativamente à prática dos factos de que vinha acusado.
De acordo com a jurisprudência uniforme dos tribunais superiores, verbi gratia, o Ac. do TRL de 29 de Junho de 2006, proferido no processo nº 3759/06 da 9ª Secção, disponível em www.pgdlisboa.pt “o princípio in dubio pro reo só se aplica no domínio da prova quando o tribunal tenha ficado numa situação de non liquet, ou seja, com sérias dúvidas relativamente aos factos, que em tal situação teria de ser resolvida a favor do arguido”, ou, ainda, nas palavras do Ac. do TRL de 2 de Novembro de 2006, também disponível em www.pgdlisboa.pt: “O tribunal só lança mão do princípio in dubio pro reo – corolário do princípio constitucional da presunção da inocência (artº 32º nº 2 da CRP) – se a prova produzida, depois de avaliada segundo as regras da experiência e da liberdade de apreciação (artº 127º CPP), tivesse conduzido à subsistência, no espírito do julgador, de uma dúvida positiva invencível sobre a verificação ou inexistência de um facto relevante para a descoberta da verdade”.
Ora, perscrutada, mais uma vez, a decisão recorrida dela não resulta ter havido qualquer dúvida quanto à culpabilidade do arguido, assim como quanto ao preenchimento da plenitude dos elementos constitutivos do ilícito criminal pelo qual foi o mesmo, muito justamente, condenado, pelo que improcede, também, nesta parte, o recurso, por não ter existido qualquer violação de princípios constitucionais, mormente do princípio “in dubio pro reo”.
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Em face da factualidade dada como provada, que não nos merece qualquer reparo ou censura, não sofre qualquer dúvida que o recorrente se vê incurso na prática do crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo art. 143º nº 1 do Código Penal, nos precisos termos em que foi condenado, não se verificando qualquer incorrecta aplicação deste preceito legal, improcedendo, também, nesta parte, o recurso quanto à pretendida absolvição do arguido da prática de tal crime.
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- Do pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente:
Por último, alega o recorrente que jamais poderia ter sido condenado a pagar 3.500,00€ ao assistente, para realizar uma intervenção cirúrgica, dado que, como decorre do ponto 12 dos factos considerados provados, essa intervenção ainda não teve lugar, pelo que se imporia que a condenação fosse relegada para o momento em que o assistente a realizasse e até ao limite do valor de 3.500,00€.
Assim não o entendendo, a decisão recorrida infringiu, no seu entendimento, o disposto no artigo 564° do Cód. Civil.

Apreciando:
No pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante havia sido peticionada a condenação do arguido / demandado no pagamento de indemnização, a título de danos patrimoniais, entre outros, num custo mínimo e aproximado de 3.500,00 euros, por, na sequência da agressão de que foi vítima por parte do arguido, ter ficado com várias cicatrizes e lacerações na face, pelo que vai necessitar de efectuar cirurgia e outros tratamentos médicos à face para restaurar os danos sofridos, tratamentos médicos que importam um custo mínimo e aproximado de 3.500,00 euros.
Não existe qualquer dúvida que se verificam, no caso, os pressupostos do dever de indemnizar, no contexto da responsabilidade civil extracontratual, a saber: facto voluntário, ilicitude, culpa, dano, nexo de causalidade entre o facto e o dano.
A obrigação de indemnizar, a cargo do causador do dano, deve reconstituir a situação que existiria “se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação” – art. 562º do Código Civil.
Como refere, Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, pág.591, 7ª edição: “Dano é a perda in natura que o lesado sofreu em consequência de certo facto nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar”, e, segundo o mesmo autor, ao lado do dano assim definido, há “o dano patrimonial – que é o reflexo do dano real sobre a situação patrimonial do lesado”.
 Este dano abrange não só o dano emergente ou perda patrimonial, como o lucro cessante ou lucro frustrado.
O lucro cessante abrange os benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto ilícito mas a que ainda não tinha direito à data da lesão” - Antunes Varela, obra citada, pág. 593.
 A par da ressarcibilidade dos danos patrimoniais, a lei contempla, também, a “compensação” pelos danos não patrimoniais, ou seja, aqueles que só indirectamente podem ser compensados – art. 496º, n.º 1, do Código Civil – por atingirem bens do patrimonial moral intangível, direitos de personalidade de carácter absoluto como a incolumidade física.
O art. 566º do citado Código consagra o princípio da reconstituição natural do dano, mandando o art. 562º reconstituir a situação hipotética que existiria se não fosse o facto gerador da responsabilidade.
 Não sendo possível a reconstituição natural, não reparando ela integralmente os danos, ou sendo excessivamente onerosa para o devedor, deve a indemnização ser fixada em dinheiro – nº1 do art. 566º do Código Civil.
A indemnização pecuniária deve manifestamente medir-se pela diferença entre a situação (real) em que o facto deixou o lesado e a situação (hipotética) em que ele se encontraria sem o dano sofrido” – Antunes Varela, obra citada, pág. 906.
A lei consagra a teoria da diferença, tomando como referencial “a data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que nessa data teria se não existissem danos” – art. 566º nº2 do Código Civil.
 E o art. 564º nº2 do Código Civil manda atender aos danos futuros, desde que previsíveis, fórmula que contempla a possibilidade de aplicação aos danos emergentes plausíveis.
O n.º3 do art. 566º do Código Civil confere ao tribunal a faculdade de recorrer à equidade quando não for possível, face, mormente, à imprecisão dos elementos de cálculo a atender, fixar o valor exacto dos danos.
 Reportando-nos, agora, ao caso em apreço, observamos que a conduta do arguido causou, entre outros, um dano estético permanente ao demandante, que se traduz nas cicatrizes por este ostentadas, na face, que, naturalmente, afectam a sua imagem, quer em relação a si próprio, quer perante os outros.
Na expressão de Sofia Maia Frazão, Avaliação Médico-Legal do “Dano Futuro”. Que Critérios?, Porto, 2008, o dano estético, “constitui um dano não patrimonial que corresponde à repercussão das sequelas, numa perspetiva estática e dinâmica, envolvendo uma avaliação personalizada da imagem em relação a si próprio e perante os outros, que resulta de deterioração da sua imagem (…). Mas, também é verdade que poderá pontualmente ser considerado um dano patrimonial, nos casos em que a vítima exerça profissão que exija um bom estatuto estético (…). Pode ser um dano estático (ex.: cicatriz) ou dinâmico (ex.: claudicação da marcha), devendo ser tido em conta o seu grau de notoriedade ou visibilidade, o desgosto revelado pela vítima (considerada a sua idade, sexo, estado civil e estatuto socioprofissional) e a possibilidade de recuperação, designadamente cirúrgica (…)»
A jurisprudência vem, também, autonomizando o dano estético.
A respeito deste dano, refere-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.7.2009, Fonseca Ramos, 704/09, que «O dano estético é uma lesão permanente, um dano moral, tanto mais grave quanto são patentes e deformantes as lesões, sendo de valorar especialmente quando são visíveis e irreversíveis.
O problema da reparação do dano estético tem importância em dois planos: o ontológico, pois “ser e aparência coincidem” e qualquer lesão que a pessoa sofra em sua forma externa acarreta um abalo, um desequilíbrio na personalidade, dando origem a grandes sofrimentos; o outro plano é o sociológico, pois, exatamente por causa de uma lesão estética, pode a pessoa não ter a mesma aceitação no meio social, o que também vai ser fonte de grandes desgostos (in “Dano Estético-Responsabilidade Civil – da jurista brasileira Teresa Lopez – 3ª edição atualizada com o Código Civil de 2002 – pág. 19.
Em outras palavras, no dano à pessoa há vários bens jurídicos ofendidos, apesar de a causa ter sido a mesma, e é por isso que a reparação deve ser a mais completa e justa possível, ressarcindo e possibilitando cumulação de indemnizações referentes a cada um deles”.
O dano estético, na definição da também jurista brasileira, Maria Helena Diniz (1), in “Curso de Direito Civil Brasileiro-Responsabilidade Civil”, 22ª edição, São Paulo: Saraiva, 2008, p.80, v.7 – é “Toda alteração morfológica do indivíduo que, além do aleijão, abrange as deformidades ou deformações, marcas e defeitos, ainda que mínimos, e que impliquem sob qualquer aspeto um afeiamento da vítima, consistindo numa simples lesão desgostante ou num permanente motivo de exposição ao ridículo ou de complexo de inferioridade, exercendo ou não influência sobre sua capacidade laborativa”.
Lê-se, ainda, no mencionado acórdão do STJ, no que tange ao ressarcimento de tal dano «Não se destinando a atribuição pecuniária pelo dano moral a pagar qualquer preço pela dor – “pretium doloris”, que é de todo inavaliável, mas antes a proporcionar à vítima uma quantia que possa constituir lenitivo para a dor moral, os sofrimentos físicos, a perda de consideração social e os sentimentos de inferioridade (inibição, frustração e menor autoestima), a quantia a arbitrar é fixada com recurso à equidade devendo ser ponderada, no caso, a gravidade objetiva do dano, mormente a sua localização, extensão e irreversibilidade [as lesões na face são psicologicamente mais traumáticas que noutra parte do corpo] e as circunstâncias particulares do lesado – a idade, o sexo e a profissão (…)».
A propósito desta matéria, veja-se, igualmente, o Ac. do STJ de 18.06.2009, processo nº 1632/01.5SILSB.S1, disponível in www.dgsi.pt, “O dano não patrimonial não se reconduz a uma única figura, tendo vários componentes e assumindo variados modos de expressão, abrangendo o chamado quantum doloris, que sintetiza as dores físicas e morais sofridas; o “dano estético”, que simboliza, nos casos de ofensa à integridade física, o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões; o “prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes (familiar, profissional, sexual, afetiva, recreativa, cultural, cívica); o prejuízo da “saúde geral e da longevidade”, em que avultam o dano da dor e o défice de bem-estar e que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem-estar da vítima; o pretium juventutis, que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a chamada primavera da vida”.
No acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa de 12.12.2017, Relatora Ana Isabel Pessoa, disponível in www.dgsi.pt, refere-se que “O dano estético é uma lesão permanente, um dano que sendo predominantemente não patrimonial, se torna tanto mais grave quanto são patentes e deformantes as lesões, devendo estas ser especialmente valoradas quando são visíveis e irreversíveis.”
No caso, ao contrário do que pretende o recorrente, é inquestionável que há que compensar o dano estético sofrido pelo demandante, como componente mais relevante do dano moral, tanto mais que se as cicatrizes afectam o rosto são visíveis.
Perante todo o exposto, nenhuma censura nos merece a decisão recorrida quando condenou o recorrente no pagamento ao demandante da quantia de 4.200,00 euros, a título de danos não patrimoniais, nestes se incluindo o ressarcimento do dano estético, avaliado em 3.500,00 euros, valor por que está orçamentada e provada nos autos a reparação deste dano [para eliminação das cicatrizes que foram produzidas por esta acção do arguido, o assistente necessitará de se submeter a intervenção cirúrgica que consistirá na excisão das cicatrizes com plastia por retalhos locais, seguida de duas sessões e dermoabrasão, tendo este tratamento um custo previsto de 3.500,00 euros], também, nesta parte, improcedendo o recurso.
                                                           ***
- Decisão:
Em conformidade com o exposto, acordam os Juízes Desembargadores, neste Tribunal da Relação de Lisboa, em negar provimento ao recurso, interposto pelo arguido, confirmando-se a decisão recorrida.
Condena-se o recorrente em 5 (cinco) Ucs de taxa de justiça.

(Elaborado em suporte informático e integralmente revisto)
Lisboa, 9 de Julho de 2019            

Relatora: Anabela Simões Cardoso
           
Adjunto: Cid Geraldo