Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
100435/23.4YIPRT.L1-6
Relator: VERA ANTUNES
Descritores: MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
ÓNUS DA PROVA
REMUNERAÇÃO
EXCLUSIVIDADE
DESISTÊNCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/22/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I - É à A., sociedade imobiliária, a quem no caso compete o ónus de provar a celebração do contrato e o acordo de que se pretende prevalecer para exigir a quantia peticionada aos RR.
II – A A. não logrou provar qualquer acordo de pagamento da remuneração (parte desta) na celebração do contrato promessa.
III – O negócio não se chegou a concretizar porque o promitente comprador veio a desistir do negócio.
IV - Pese embora celebrado em regime de exclusividade, não sendo de imputar nenhuma responsabilidade pela não concretização do negócio aos RR. e não se tendo chegado a celebrado o contrato de compra e venda, pelo que não chegou a haver concretização do negócio, decorre que a remuneração não é devida à A.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório:
Valor 360º - Mediação Imobiliária, Lda. propôs a presente acção especial de cumprimento de obrigações pecuniárias contra AA, BB, CC, DD, EE e FF, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia global de 6.938,38 €, acrescida de juros legais até integral e efectivo pagamento.
Para tanto alegou, em síntese, que no âmbito do exercício da sua actividade comercial prestou, a solicitação dos Requeridos, serviços de Consultadoria e Mediação Imobiliária, conforme resulta do Contrato de Mediação Imobiliária n-º 1793/22, assinado em 22/06/2022, relativo à promoção e venda do imóvel sito na Rua ..., n.º 17 e 19, em Almargem do Bispo; na sequência dessa angariação, em 20/01/2023 os RR. outorgaram o Contrato Promessa de Compra e Venda, do qual resultou o pagamento de um sinal no valor de 32.000,00 €, efectivamente recebido; resulta da Cláusula 5ª, n.º 3 do Contrato de Mediação Imobiliária que os três comproprietários são equitativamente devedores à A. de 30% da Comissão de vida pela celebração do Contrato Promessa de Compra e Venda realizado no passado dia 20/1/2023, ou seja, cada 1 dos 3 comproprietários é devedor de 10% da Comissão, no valor total de 1.968,00 € cada um; interpelados para proceder ao pagamento daquela quantia no dia 16/06/2023, não o fizeram.
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Os RR. deduziram oposição alegando, em resumo, que nenhuma das opções constantes do artigo 5.º, n.º 3 do contrato de mediação dos autos se encontra assinalada, pelo que não pode a autora vir invocar que devem àquela 30% da remuneração aquando da realização do CPCV; o facto de não terem sido previstas as condições de remuneração, consubstancia uma nulidade do contrato, nos termos do disposto no artigo 16.º, n.º 5 da Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro; acresce que não vislumbram quais os cálculos e fundamentos que consubstanciam o valor peticionado no montante global de € 5.904,00, considerando que a conclusão do negócio visado não foi concretizada, por desistência por parte dos compradores, pelo que a autora não tem direito a receber qualquer remuneração; caso assim não se entenda, sempre se dirá que a autora a ter direito ao pagamento de qualquer remuneração, deverá a mesma ser calculada tendo por base o valor do sinal efectivamente recebido de € 32.000,00.
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A A. respondeu referindo que o modelo “em branco” do Contrato de Mediação Imobiliária (modelo devidamente depositado pela Autora no IMPIC), foi apresentado aos Réus e após discussão, veio a ser devidamente preenchido pelas partes. Assim, os réus tinham conhecimento que a comissão acordada implicaria o pagamento de 30% do total da Comissão devida, ou seja, 30% de 5% sobre o preço de venda aquando da celebração do contrato promessa e, posteriormente, o remanescente do valor devido, 70% do total da Comissão devida, na data da celebração da escritura ou conclusão do negócio, conforme Cláusula 5.ª do Contrato de Mediação Imobiliária n.º 1793/22, o qual encontra-se assinado e rubricado pelos Réus. Aliás, a inserção de “30%” e de “70%”, em letra mecanográfica, não foi por acaso. Por fim, requer a condenação dos réus como litigantes de má fé.
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Tendo-se procedido à realização de audiência de julgamento, a final foi proferida Sentença onde se julgou a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em conformidade, condenou-se os réus a pagar à autora a quantia de 5.904,00 € de capital, acrescida dos juros de mora, contados desde a sua citação e até integral e efectivo pagamento, absolvendo-se aqueles quanto ao demais.
Absolveu-se os réus do pedido de condenação como litigantes de má fé.
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Inconformados com aquela Sentença, vieram os RR. interpor recurso, formulando as seguintes Conclusões:
“1. Os recorrentes consideram que a douta sentença proferida pelo tribunal a quo faz uma errada avaliação da prova constante dos autos e produzida em audiência de julgamento.
2. Os recorrentes procurarão demonstrar que o Contrato de Mediação Imobiliária n-º 1793/22, assinado no passado dia 22/06/2022, relativa à promoção e venda do imóvel sito na Rua ..., n.º 17 e 19, em Almargem do Bispo, foi assinado sem que tenha sido acordado a forma de pagamento da comissão, nos termos da cláusula 5.º, n.º 3 do respetivo contrato, tendo por tal motivo, a mesma ficado em branco, sem ter sido escolhida nenhuma das opções ali mencionadas.
3. É consensual entre as partes a celebração do contrato de mediação imobiliária e, que o contrato celebrado foi o que a A. juntou aos autos em 27.05.2024 e que constitui o doc. 1.
4. Esse contrato foi redigido segundo um modelo em que as partes, escreviam no contrato os elementos pretendidos – como sejam, a identificação das partes, o valor da comissão – mas também segundo o modelo americano, em que existem várias hipóteses e, as que vinculam as partes, são as que se encontram assinaladas com um X.
5. Ao transcrever o teor da clausula 5ª do contrato de mediação imobiliária para o teor do facto provado número 5, o tribunal não teve em conta que, não consta desse documento, assinalado com um X, nenhuma das opções ali referidas, como era obrigatório e vinculativo para as partes.
6. Pelo contrário, o douto tribunal dá como provado no número 5: «O pagamento da remuneração apenas será efectuado nas seguintes condições: (…) 30% após a celebração do contrato promessa e o remanescente de 70% na celebração da escritura ou conclusão do negócio» (cláusula 5.ª, n.º 3)”.
7. O tribunal não pode dar como provado um facto que não resultou provado ser acordado entre as partes, dando como provado tão só partes do mesmo, quando resulta claro da forma de redação do documento que não foi assinalada nenhuma das opções, sendo esse o seu teor integral, o que foi aceite pelas partes.
8. Nessa sequência, deveria pois, o tribunal “a quo” ter dado como provado o acima referido, de forma que o teor do facto provado número 5 passasse a ser a seguinte redação: “O pagamento da remuneração será efectuado nas seguintes condições: Não foi assinalada nenhuma das opções ali mencionadas, não obstante terem sido apostos os números 30% e 70%, pela A. (sublinhado nosso).
9. A questão da remuneração encontra-se referida na cláusula 5.ª do referido contrato e subdivide-se em três segmentos essenciais, os quais respeitam à concretização do negócio, ao valor da remuneração e à forma de pagamento da mesma.
10. Quanto à concretização do negócio, diz-nos o n.º 1 da cláusula 5.ª: “que a remuneração só será devida se a Mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado no contrato, nos termos e com a excepções previstas no artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro.”
11. A este respeito, leia-se o acórdão da Relação do Porto de 27.01.2022, no proc. 14716/20.1T8PRT.P1, bem como o acórdão da Relação de Évora de 22.10.2022, no proc. 760/19.5T8FAR.E1.
12. Quanto ao valor da remuneração, resulta no n.º 2, da cláusula 5.ª: “O Segundo Contratante obriga-se a pagar à Mediadora a título de remuneração a quantia de 5% calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efectivamente concretizado acrescido de IVA à taxa legal em vigor.”. Opção validamente assinalada e acordada pelas partes.
13. Quanto à forma de pagamento da remuneração, a mesma é escolhida entre as opções do n.º 3, da cláusula 5.ª. Contudo quanto a esta temática, nenhuma das opções foi assinalada como sendo a opção acordada entre as partes.
14. Os réus sempre disseram à A. que pagariam a remuneração aquando da conclusão do negócio, ou seja, na data da assinatura da escritura de compra e venda.
15. Por parte da A. o pretendido era o adiantamento do pagamento da comissão, sendo uma parte adiantada na data do contrato de compra e venda e outra parte a final na conclusão do negócio.
16. Foi apresentado aos réus o contrato dos autos, sendo que desconheciam os mesmos, quais são os campos pré-preenchidos ou não.
17. Após receberem o contrato e verificando que não estava a assinalada com X nenhuma das opções constantes no n.º 3 da cláusula 5.ª, os réus concluíram que não se encontravam vinculados a nenhuma daquelas opções, porquanto nenhuma estava assinalada, logo não foi um entrave à assinatura de tal contrato.
18. No seu depoimento de parte, quer o AA, quer o FF, referiram expressamente que quanto ao n.º 3 da cláusula 5.ª, não foi escolhida nenhuma das opções ali apresentadas, porquanto o que havia sido acordado com a A., na pessoa do sr. GG, era de que o pagamento da comissão seria feito na sua totalidade com a celebração da escritura.
19. Conforme consta no depoimento de parte de AA registado em suporte digital gravado na sessão de dia 07.10.2024, aos minutos16:05 a Meritíssima Juiz questiona – “Para não haver equívocos pergunto eu porque é que deixaram lá ficar esses 30%, se era possível tirar?” Ao que a parte AA responde – “Na minha interpretação deste contrato não tendo lá o pisco aquilo para mim era como não tendo qualquer significado. Eu não pus em causa exatamente por isso. Não era preciso tirar porque não estava lá nada.”
20. Mais referiu aos 17:20 minutos questionado pela Meritíssima Juiz – “Portanto na sua ótica, na ótica do sr. AA para si o facto de não ter cruzinha era como se não existisse?” ao que respondeu o AA – “Exatamente”.
21. Conforme consta no depoimento de parte de FF registado em suporte digital gravado na sessão de dia 07.10.2024 aos minutos 11:09 quando questionado pela Meritíssima Juiz – “Então porque é que na cláusula n.º 3, nessa mesma onde também tem um espacinho e depois percentagem, um espacinho percentagem e tem lá 30% e 70%” Responde o FF – “Então porque era isso que estava preenchido”; Juiz – “Pois, mas é um espaço em branco em que alguém lá pôs isso eu pergunto”. FF – “Desculpe, mas eu nunca vi um contrato antes de assinar este eu nunca vi se o contrato”; Juiz – “Então para si não lhe fez moça nenhuma?”. FF – “Não me fez mossa nenhuma porque nunca se pôs em causa o pagamento de qualquer comissão, não é, o que foi dito sempre pela imobiliária e face (interrompido)”
22. E continuou aos minutos 11:50 quando questionado pela Meritíssima Juiz – “Sabe tão bem como eu, toda a gente sabe isto que quando é para assinar temos que ter cautelas certo, daí eu lhe estar a perguntar se isso lhe fez confusão ou não?”. FF –“Não fez confusão porque aquilo que foi combinado entre as partes foi que a comissão seria paga após a realização da escritura e como tal ficou em aberto, não achei nada estranho porque estava de acordo”; Juiz – “Então se lhe disseram exatamente isso que o sr. disse, não achou estranho estarem a por ali 30% e 70%, falou sobre isso, o sr. passou por essa cláusula? FF –“Nem pus isso em causa, para mim aquilo já vem pré-preenchido assim, sei lá nunca vi, não se falou nisso, se tivéssemos falado, não eu não falei porque a comissão era paga no final da escritura, foi dito pelo sr. GG”; Juiz – “Como já tivemos aqui outras pessoas a dizerem que viram aquilo, mas”. FF – “Eu também vi, não é, se me suscitou dúvidas, não suscitou, porque ia ao encontro daquilo que nós pretendíamos”
23. Quanto à forma de pagamento da comissão, este facto vem a ser corroborado com o envio da mensagem pelo sr. GG, ao réu AA, no dia 2 de março de 2023, em que confirma que a totalidade da comissão será paga no ato da escritura.
24. A testemunha GG, por seu lado, referiu quanto a esta temática o seguinte do seu depoimento registado em suporte digital gravado na sessão de dia 07.10.2024, aos minutos 13:55, quando questionado pela Mandatária R. – “Se estava tudo acordado com as partes consoante o que o contrato foi elaborado disse, porque é que aquela cláusula 5, n.º 3”
25. GG – “Porque é que não está lá a cruzinha é isso?”
26. Mandatária R. – “Porque é que não está escolhida a opção, se olharmos para a 5, ponto 2 vimos lá um X na opção escolhida, olhamos para a 5, ponto 3”
27. GG – “Isso foi um problema de edição, como a folha é editável e o computador não assumiu o espaço naquele quadradinho”
28. Quando existem várias hipóteses, como no caso deste n.º 3 da cláusula 5.ª do contrato de mediação imobiliária, para que seja vinculativo a ambas as partes, tem que ser devidamente assinalada uma das opções, para que não restem dúvidas.
29. Por um lado, a A. não escolhe a opção pretendida e não marca a quadricula respetiva, justificando que se tratou de um erro de edição, mas logrou inserir os valores 30 e 70 nos respetivos espaços, referindo que só porque inseriu aqueles valores foi a opção acordada.
30. Por outro lado, os réus, todos referiram nos seus depoimentos que o contrato, mormente a cláusula 5.ª, n.º 3, não se lhes suscitou dúvidas, porquanto não estando assinalada nenhuma das opções e o que tinham acordado com o sr. GG, foi o pagamento da comissão no final, aquando da escritura de compra e venda, tal correspondia ao acordado, porquanto nenhuma das opções estava assinalada, logo não eram vinculativas.
31. Quanto ao facto de estar lá inscrito os valores de 30% e 70%, todos foram unanimes em referir que para eles não tinha qualquer valor, pois essa quadricula não estava assinalada, tendo inclusive o réu FF reforçado que nunca tinha visto um contrato deste tipo e que desconhecia quais os campos que já vinham pré-preenchidos ou não. Como tal, o facto de estar lá aqueles valores não suscitou dúvida, pois essa opção não estava assinalada, o que ia ao encontro do pretendido e acordado pelas partes.
32. A testemunha GG, acaba por entrar em algumas contradições, quer quanto ao conhecer a ré BB, primeiro hesita em dizer que conhece, depois afinal o contrato assinado foi enviado por email e afinal não a viu. Mas a verdade é que a conhece e esteve com a mesma na assinatura do contrato de promessa de compra e venda celebrado.
33. A testemunha GG primeiro refere que foi a casa dos réus CC e EE para lhes explicar e assinarem o contrato, mas depois quando questionado sobre quem não após as rubricas no contrato de mediação imobiliária, já não sabe responder.
34. Em que ficamos, explicou o contrato aos réus CC, DD e EE e FF e verificou as assinaturas e rúbricas dos mesmos ou não?
35. O que temos é um contrato com 4 rúbricas e 6 assinaturas.
36. Ou seja, a própria testemunha entrou em contradição com os factos, à medida que ia sendo questionada pelos intervenientes.
37. Como pode o Tribunal dar total credibilidade a este testemunho em detrimento do depoimento das partes, mormente do depoimento do AA, quando este foi coerente e só não foi mais, pelas diversas interrupções da Meritíssima Juiz referindo que a parte tinha dito anteriormente o que não tinha dito., levando-o sistematicamente a tentar explicar as coisas novamente, e claro não exatamente com as mesmas palavras.
38. Contudo, tal depoimento foi sempre coerente com a verdade e o modo temporal como aconteceram os factos.
39. Não se vislumbrando as considerações tecidas na douta sentença.
40. Ao dar como provado o facto 5 «O pagamento da remuneração apenas será efectuado nas seguintes condições: (…) 30% após a celebração do contrato promessa e o remanescente de 70% na celebração da escritura ou conclusão do negócio» (cláusula 5.ª, n.º 3), tinha o dever em face da prova produzida de ir mais longe aditando um segmento de factos provados, no sentido de concretizar que nenhuma das opções tinha sido assinalada, como sendo a opção acordada entre as partes, não obstante a A., ter aposto os valores de 30% e 70% na segunda opção apresentada no n.º 3, da cláusula 5.ª, sentido de resposta que se alcança da prova oferecida pelos réus, em sentido positivo e das A. em sentido negativo, dadas as imensas contradições em que todas elas, incorreram.
41. Não conseguiu a A. fazer a contraprova de forma clara que aquela opção foi efetivamente o acordado entre as partes, mesmo porque tal entra em contradição com a própria mensagem enviada pela própria testemunha sr. GG, de dia 2 de março de 2023.
42. Deveria ter sido dado como provado a mensagem de dia 2 de março de 2023, devendo ser aditado o seguinte facto: “Olá AA já falei com a Valor 360 e com a Remax e foi acordado o pagamento da comissão no ato da escritura.” – atenta a mensagem que se encontra junta aos autos, bem como reproduzida em sede audiência de discussão e julgamento.
43. Resultou provado que o acordado pelas partes foi que a comissão seria paga na sua totalidade após a escritura de compra e venda. Se dúvidas existissem no contrato de mediação imobiliário, que a nosso ver não existiam, pois, a forma de pagamento não foi devidamente esclarecida no mesmo, assinalando-se devidamente a opção pretendida, em 2 de março de 2023, deixaram de existir dúvidas quanto à forma de pagamento da comissão, que seria no ato da escritura.
44. No contrato de mediação imobiliária, em princípio a remuneração do mediador só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado (artigo 19.º/1 da Lei n.º 15/2013).
45. Excepcionalmente a remuneração é devida, apesar de o negócio visado não se ter concretizado, se as partes tiverem acordado a exclusividade e o negócio visado no contrato de mediação não se concretizar por causa imputável ao cliente, desde que o cliente seja o proprietário ou o arrendatário trespassante (artigo 19.º/2 da Lei n.º 15/2013).
46. Deste modo, e no caso dos autos, porque o negócio não se concretizou, por desistência do comprador, e não havendo qualquer fundamento para entender que a remuneração era devida, não têm os réus que pagar qualquer comissão.
47. Resulta meridianamente que o ajuizamento da causa padece de erro em sede de matéria de facto, como se explicitou, e como corolário lógico a douta sentença ora recorrida faz uma errada interpretação na aplicação do direito.
48. Em consequência dos factos dados como provados bem como daqueles que agora se advoga devem ser aditados, achava-se o tribunal habilitado a dar como improcedente o pedido deduzido pela autora no sentido de não se ter concretizado o negócio, logo não haver lugar ao pagamento de qualquer comissão.
49. Dos elementos probatórios recolhidos que legitimam respostas dadas e que devem ser aditadas resulta claramente que não ficou acordada qualquer forma de pagamento, sendo que a 2 de Março, com o envio da mensagem por parte do sr. GG ao réu AA, ficou esclarecido que o pagamento da totalidade da comissão seria paga com a outorga da escritura de compra e venda.
50. A este propósito tem de reconhecer-se que a verdade é só uma, o pagamento da comissão seria pago com a outorga da escritura de compra e venda.
51. Por outro lado não pode perder-se de vista que nenhuma razão objectiva alegada ou provada pela A., quanto à falta da escolha da opção da forma de pagamento se ter devido a uma falha de edição, não pode proceder, pois só neste ponto em concreto é que ocorreu falha de edição. O que é estranho!
52. Só pode entender-se que, como os réus não aceitavam essa condição, a A. propositadamente não assinala nenhuma das opções, mas insere os valores nos campos subsequentes. Qual o objetivo deste subterfúgio?
53. Levar ora recorrentes a acharem que nenhuma opção era válida, para depois virem advogar, como vieram, que os campos foram preenchidos?
54. Para os ora recorrentes o facto de não se encontrar assinalada nenhuma das opções, foi sinónimo de não ter ficado acordada a forma de pagamento.
55. Pois como resultou do depoimento das partes, que desconheciam o modelo do contrato e quais os campos que são pré-preenchidos, o facto de não estar assinalada nenhuma das opções, não os vinculava a nenhuma das mesmas.
56. Sendo que o que tinham acordado, desde o início, era que o pagamento da comissão seria feita aquando da escritura de compra e venda.
57. Que necessidade haviam os réus de mentir sobre este facto? Para eles o facto de não estar assinalada não era vinculativa.
58. Num contrato de mediação imobiliária, a remuneração do mediador está dependente duma condição essencial, que alguns apelidam de condição suspensiva, que se traduz na realização do negócio objecto do contrato de mediação» - cfr. Ac. TRP de 10.02.2015, P. 1216/11.0YIPRT.P1, HH.”
59. Dispõe o artigo 19.º da Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro, sob a epígrafe “Remuneração da empresa”, “1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra. 2 - É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel. 3 - Quando o cliente for um potencial comprador ou arrendatário, a empresa, desde que tal resulte expressamente do respectivo contrato de mediação imobiliária, pode cobrar quantias a título de adiantamento por conta da remuneração acordada, devendo as mesmas ser devolvidas ao cliente caso o negócio não se concretize. 4 - O direito da empresa à remuneração cujo pagamento caiba ao cliente proprietário de imóvel objecto de contrato de mediação não é afastado pelo exercício de direito legal de preferência sobre o dito imóvel. 5 - O disposto nos números anteriores aplica-se apenas a contratos sujeitos à lei portuguesa.”.
60. A remuneração é devida aquando da conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou aquando da outorga do contrato-promessa, mas, neste caso, apenas se no contrato de mediação estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase. O que significa, que para haver lugar à remuneração, não basta à mediadora a “procura, (...) de destinatários para a realização de negócios” – cfr. artigo 2.º, n.º 1, do RJAMI – nem sequer que o contrato visado seja, de facto, levado a efeito, é preciso que o negócio (concluído) esteja perfeito, ou por outras palavras, eficaz e não ferido de invalidade absoluta ou pendente de condição suspensiva ou em que se venha a verificar a condição resolutiva de que estava dependente.
61. As partes sabem que só pagam a “comissão” se a mediadora angariar interessado no negócio e este se concretize de forma perfeita (eficaz).
62. As partes não acordaram uma comissão a pagar com a celebração do contrato de promessa de compra e venda e outra com a concretização do negócio.
63. No âmbito da actual Lei 15/2013, sequer já é permitido, como acontecia no artigo 18.º do DL 224/2004, fixar o pagamento da totalidade da remuneração com o contrato-promessa, na medida em que o artigo 19.º da lei vigente estabelece claramente que a remuneração é devida apenas com a concretização do negócio.
64. Caso tivesse sido acordado a forma de pagamento da remuneração, ao ter sido assinalada a segunda opção do n.º 3, da cláusula 5.ª, o que não sucedeu no caso, ainda assim tal pagamento teria de ser visto sempre como uma antecipação do cumprimento, prevista no artigo 440.º do Código Civil.
65. Se a final tal cumprimento não é devido porque não se concretizou o negócio visado, nada os ora recorrentes têm que pagar à recorrida a título de comissão, porquanto o negócio não se concretizou.
66. O contrato de mediação imobiliária em causa foi celebrado em regime de exclusividade, contudo também aqui é afastada a exceção prevista no n.º 2, do art.º 19.º, da Lei 15/2013, de 8 de Fevereiro, porquanto o negócio só não se concretizou por culpa exclusiva do promitente comprador, que desistiu do negócio e não por culpa dos ora recorrentes, como aliás ficou provado no ponto 10 da douta sentença.
67. Com efeito, o contrato celebrado entre as partes estipulou na cláusula 5º, ponto I, que “a remuneração só será devida se a Mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato”. E como se pode constatar na matéria de facto disponível o negócio a que o contrato se referia não chegou a concretizar-se. Pelo que não é devida qualquer comissão à ora recorrida.
68. Será que o tribunal precisa de mais elementos e sinais do que o dos autos para ver o que é nítido, ou seja, que não foi acordada entre as partes a forma de pagamento e que após o pedido de esclarecimento a este ponto recebeu o ora recorrente AA a mensagem de 2 de março de 2023, a confirmar que a totalidade da comissão seria paga aquando da escritura de compra e venda.
69. Razão porque não é devida qualquer comissão, porquanto o negócio visado não se concretizou nos termos do contrato de mediação imobiliária, nos termos da cláusula 5.ª, n.º1 e o artigo 19.º da Lei 15/2023, de 8 de Fevereiro.
70. Deve em consequência revogar-se a douta sentença recorrida e por este Tribunal superior ser prolatado Acórdão que julgue improcedente por não provada a acção, absolvendo os réus do pedido.”
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Contra-alegou a A., Concluindo:
“a) Por douta sentença, os Réus, foram condenados a pagar à autora “Valor 360º - Mediação Imobiliária, Lda.”, a quantia de 5.904,00 € de capital, acrescida dos juros de mora, contados desde a sua citação e até integral e efectivo pagamento, absolvendo-se aqueles quanto ao demais.
b) Os réus foram absolvidos do pedido de condenação como litigantes de má-fé.
c) As custas são por conta da autora e dos réus, na proporção de 15% e de 85%, respectivamente.
d) Decisão que se alicerçou com base na prova documental e na prova Testemunhal produzida em sede de Audiência de Julgamento.
e) Provaram-se os seguintes factos, com relevo para a decisão da causa:
f) “1. Em 20 de Janeiro de 2023, no âmbito da sua actividade comercial, a autora assinou com os réus um escrito denominado «contrato de mediação imobiliária», através do qual a primeira se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra do imóvel sito na Rua ..., n.º 17 e 19, em Almargem do Bispo, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob a ficha n.º 6105 e 6214,propriedade destes últimos, em regime de exclusividade, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido em razão da sua extensão.
g) 2. Acordaram assim que a «a mediadora obriga-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra (…) pelo preço de 350.000 €, desenvolvendo, para o efeito, acções de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e característicos dos respectivos imóveis» (cláusula 2.ª, n.º 1).
h) 3. «A remuneração só será devida se a Mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com a excepções previstas no artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro» (cláusula 5.ª, n.º 1).
i) 4. «O segundo contratante obriga-se a pagar à Mediadora a título de remuneração a quantia de 5 % calculada sobre o montante pelo qual o negócio é efectivamente concretizado acrescido de IVA à taxa legal em vigor» (cláusula 5.ª, n.º 2).
j) 5. «O pagamento da remuneração apenas será efectuado nas seguintes condições: (…) 30% após a celebração do contrato promessa e o remanescente de 70% na celebração da escritura ou conclusão do negócio» (cláusula 5.ª, n.º 3).
k) 6. Por escrito datado de 20 de Janeiro de 2023, sob a epígrafe «contrato-promessa de compra e venda», os réus declararam prometer vender, e o senhor II declarou prometer comprar, pelo preço de 320.000 €, o prédio referido em 1.
l) 7. Mais declararam que a escritura de compra e venda seria outorgada no prazo de 60 dias a contar da data da celebração do aludido contrato promessa.
m) 8. Nesse mesmo dia, e a título de sinal e de princípio de pagamento, os réus receberam daquele senhor a quantia de 32.000,00 €.
n) 9. Estavam, então, convencidos de que a escritura de compra e venda iria realizar-se.
o) 10. Porém, o senhor II veio a desistir do negócio.
p) Por outro lado, entendeu o douto Tribunal a quo, ao proferir a sua douta sentença, que, não resultaram provados, com interesse para a boa decisão da causa:
q) A. Não foi acordado entre as partes a forma de pagamento da remuneração devida à autora.
r) B. A autora emitiu as facturas n.º 12300/000102, no montante de € 1.968,00, n.º 1 2300/000103, no montante de € 1.968,00 e n.º 1 2300/000104, no montante de € 1.968,00, todas datadas, emitidas e com vencimento em 29.05.2023.
s) C. A autora interpelou os réus, por diversas vezes, para o pagamento das facturas referidas em B., nomeadamente através de carta registada com A/R, datada de 16.06.2023.
t) D. A autora despendeu a quantia de 750,00€ (setecentos e cinquenta euros), com a cobrança do crédito que aqui reclama.
u) O douto Tribunal a quo, fundamentou a sua “Motivação da decisão de facto”, na resposta à matéria de facto oportunamente alegada pelas partes resultou da análise crítica do teor dos documentos juntos aos autos, conjugada com o resultado da prova pessoal produzida em audiência, em função das regras da experiência comum e da lógica, pelo modo que se passa a expor.
v) Os factos provados em 1. a 4 e 6. a 10. resultaram da posição assumida pelas partes nos seus articulados, certo que inexiste controvérsia a seu respeito, apenas complementada pela leitura dos respectivos escritos.
w) O facto provado em 5., e concomitantemente o não provado na alínea A), resultou, desde logo, pela análise do próprio contrato de mediação imobiliária em causa nos presentes autos, pois é patente que, no seu artigo 5.º, n.º 3, não está colocada a cruz assinalando quais das opções havia sido seleccionada e acordada pelas partes. Porém, parece que os réus se esquecem, ou pelo menos tentaram fazer crer que fizeram tábua rasa ao facto de que tal opção necessitar de ser preenchida pela mão humana, pois ali foram apostas as respectivas percentagens! Acresce que, em momento algum os réus fizeram qualquer observação aos valores ali apostos, ou sequer questionaram o porquê dos mesmos ali constarem.
x) Aliás, em declarações de parte, os réus AA, CC e FF quando questionados quanto a tal factualidade tentaram fazer crer que o facto de ali não estar aposta qualquer cruz tal significaria que aquele ponto não teria qualquer significado.
y) Porém, a versão destes não logrou convencer este Tribunal, pois na senda de tentarem credibilizar a sua versão dos factos, acabaram estes por apresentar um discurso pouco coerente e verosímil. Aliás, o réu AA foi confrontado por este Tribunal com a hipótese de estar aposta a quantia de € 100.000,00 na cláusula 6º, n.º 2, al. a) do contrato dos autos, sem estar colocada a cruz no respectivo quadriculo, se mesmo assim assinaria tal documento, ao que o mesmo respondeu afirmativamente!
z) Cumpre ainda salientar que o réu AA se, num primeiro momento, referiu que não ligou às percentagens que ali se mostravam apostas, pois o que ficou acordado teria sido o pagamento da comissão aquando da celebração da escritura de compra e venda, o certo é que, no final das suas declarações, acabou por admitir que teria sido falado com a Testemunha GG, dando-lhe conta que não concordava com o pagamento dos 30%.
aa) E se o exposto ainda não fosse o suficiente, temos o teor do SMS remetido ao réu AA pela autora, dando conta que havia sido acordado o pagamento integral da comissão no acto da escritura.
Ora, se de acordo com a versão avançada pelos réus, não existia qualquer questão quanto ao momento de pagamento da comissão à autora, porque motivo iria ser enviado um SMS, no dia 02.03.2023, a dar conta do que supostamente estava previamente acordado?
bb) Tal não faria sentido, a não ser exactamente no caso de estar previsto o constante do artigo 5.º, n.º 3 do contrato de mediação imobiliária, e alguma das partes quisesse alterar o timing acordado.
cc) Ora, foi exactamente isso que aconteceu nos autos, pois a Testemunha GG, de forma peremptória e assertiva, referiu que tal mensagem foi enviada, pois o réu AA lhe pediu, em momento anterior, para efectuar o pagamento da comissão, na sua totalidade, na data da outorga da escritura pública de compra e venda, uma vez que tinham de ser feitos outros pagamentos, ao que a autora anuiu! Aliás, tal justifica o facto de a autora ter emitido facturas nesse mesmo momento e, posteriormente, as ter anulado conforme explicitado pela aludida Testemunha GG.
dd) A ser assim, obviamente que a versão dos réus não poderá ter acolhimento, pois como é óbvio estamos a tratar exactamente das cláusulas que não são estanques, prevendo-se aí as quantias e as percentagens negociadas entre as partes, pelo que obviamente o facto de ali não constar a cruz trata-se de mero lapso, conforme afirmado pela Testemunha GG.
ee) Esta Testemunha GG, não obstante, ser funcionário da autora, adoptou uma postura totalmente isenta, apresentando um discurso coerente e fluido, logrando convencer este Tribunal da veracidade do que transmitiu. Aliás, questionada esta última quanto é que teria dado por conta de tal lapso, a mesma, de forma sincera, admitiu que apenas teve tal noção após ter sido tal alegado circunstancialismo pelos réus no âmbito dos presentes autos.
ff) No que diz respeito aos factos não provados constante da alínea B), constata-se que não foram juntas aos autos as respectivas facturas, sendo certo que as mesmas existem, pois foram feitas alusão às mesmas pela Testemunha GG inquirida e pelos réus, mas desconhece este Tribunal o seu teor.
gg) No entanto, e quanto a tal circunstancialismo, há ainda que ter em Conta a “ Fundamentação de Direito”, na qual, o douto Tribunal a quo, foi do entendimento que face à matéria provada, é manifesto que entre as partes foi celebrado um Contrato de Mediação Imobiliária, com exclusividade, através do qual a autora se vinculou perante os réus a diligenciar no sentido de conseguir um interessado na compra do imóvel, aplicando-se o regime jurídico instituído pela Lei n.º 15/2013 de 8 de Fevereiro.
hh) Em regra, a remuneração só é devida pelo cliente à empresa de mediação imobiliária com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da actividade de mediação (artigo 19.º, n.º 1do citado diploma legal).
ii) No contrato de mediação com cláusula de exclusividade (como é a situação dos autos) a remuneração do mediador depende quase unicamente do cumprimento da sua obrigação e do sucesso desta, não dependendo do evento futuro e incerto constituído pela celebração do contrato visado, quando este evento não se concretize por causa imputável ao cliente.
jj) Ora, resulta da factualidade dada como provada que os réus se obrigaram a pagar à autora, a título de remuneração, a quantia de 5% calculados sobre o montante pelo qual o negócio é efectivamente concretizado acrescido de IVA à taxa legal em vigor.
kk) Mais se apurou que, o pagamento de tal remuneração seria efectuado do seguinte modo: 30% após a celebração do contrato promessa e o remanescente de 70% na celebração da escritura ou conclusão do negócio.
ll) Assim o contrato em causa nos autos previu que o direito de remuneração por parte da autora era por esta adquirido, na proporção de 30%, com a celebração do contrato promessa.
mm) Por escrito datado de 20 de Janeiro de 2023, sob a epigrafe “contrato-promessa de compra e venda”, os réus declararam prometer vender e o senhor II declarou prometer comprar, pelo preço de € 320.000,00, o prédio pertencente aos primeiros. Nessa mesma data, foi entregue por este último aos vendedores (ora réus), a quantia de € 32.000,00, a título de sinal, adquirindo a autora direito a 30% da remuneração.
nn) Facilmente se constacta, que, a douta sentença proferida interpretou e aplicou de forma correcta, ponderada e justa, a factualidade e a prova transmitida nos autos.
oo) os Recorrentes, em sede do seu recurso, apenas e tão somente tentam, por diversos meios, “mandar o barro à parede”, como diz o povo, pois, desesperadamente, tentam desmontar de forma incoerente e até infantil, toda a embrulhada que o Réu AA arranjou…
pp) em ordem a exonerarem-se das suas responsabilidades, os Réus AA, BB e EE, em desespero de causa, invocaram a eventual nulidade do contrato promessa de compra e venda (uma vez mais, tentando “mandar o barro à parede”).
qq) o douto Tribunal a quo, atento e doutamente analisando a prova carreada para os autos e a produção de prova Testemunha GG, concluiu que “É certo que os réus AA, BB e EE vieram invocar a nulidade do contrato de mediação imobiliária, alegando que o mesmo viola o disposto no artigo 16.º, n.º 2 da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro, por nada ter sido acordado quanto à forma do pagamento.
rr) Porém, analisada a factualidade dada como provada, verifica-se que o contrato dos autos não padece de qualquer vício, uma vez que se encontra prevista a remuneração da autora, bem como as respectivas condições de pagamento, pelo que, sem necessidade de maiores considerações, porque desnecessárias, não assiste razão aos réus.
ss) Mas mesmo que assim não se entendesse, sempre se dirá que, do eventual reconhecimento da nulidade do contrato de mediação imobiliária sub judice poderia não decorrer, ainda assim, o efeito pretendido pelos réus quanto à dispensa do pagamento à autora da remuneração peticionada.
tt) De facto, a declaração de nulidade tem efeito retroactivo, acarretando a obrigação de restituir tudo o que houver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente (cfr. art.º 289, nº 1, do C.C.). Desta forma, uma vez julgado nulo um contrato tudo funciona como se o mesmo nunca tivesse existido, obrigando-se os intervenientes a repor o que tenham recebido.
uu) Daqui decorre que a nulidade do contrato não desonera necessariamente o cliente de qualquer obrigação perante a mediadora e antes desencadeia a produção de efeitos em relação aos contraentes, até porque não nos podemos esquecer que os réus, devido à actuação da autora, receberam a quantia de € 32.000,00, a título de sinal, fazendo-a sua.
vv) Este contrato nunca poderia ser nulo, pois, respeita a forma e a matéria específica deste tipo de contrato, como, douta e ponderadamente o tribunal a quo entendeu.
ww) os Réus vieram recorrer da douta sentença proferida nos presentes autos, por discordarem da mesma, porém, sem apresentarem qualquer argumento válido ou coerente!
xx) Até parece, que, os Réus estiveram presentes em outro julgamento, que não aquele!
yy) Esquecem os réus, as diversas contradições e “mudanças de direcção”, que o Réu AA teve ao longo do seu fastidioso depoimento, onde, fugia sempre que podia às questões suscitadas pelo douto Tribunal a quo.
zz) as alegações e conclusões da Recorrente estão totalmente desprovidas de fundamento legal, desnorteadas pela sua vã tentativa de mandar o barro à parede, sendo as mesmas e as suas conclusões manifestamente improcedentes, em nada pondo em causa a douta decisão recorrida, tal como irá resultar demonstrado adiante.
aaa) Desde logo, a fundamentação de facto constante na referida decisão é manifestamente necessária e suficiente para a conclusão da procedência da acção e consequente condenação a que chegou, traduz a culpa/ganância dos Réus e a postura correcta da Autora!
bbb) em virtude da mediação imobiliária da Autora, os Réus conseguiram um interessado, com o qual, formalizaram um contrato promessa de compra e venda, com pagamento efectivo de sinal (o qual entrou e permaneceu nas suas contas bancárias, mesmo após o promitente comprador ter desistido do negócio), o contrato de mediação imobiliária que foi negociado pelo Réu AA durante meses, tinha clausula que previa o pagamento de 30% da comissão, com assinatura de CPCV.
ccc) O réu AA e os demais Réus, porquanto estarem condicionados à sua vontade de familiar mais velho, atenta a sua ganância, apoderou-se da comissão devida à Autora e, após informar a Autora que podia ser assinado o contrato de mediação imobiliária, vem, agora, dizer que o mesmo é nulo e recusa-se a pagar o valor devido e acordado entre as partes.
ddd) O depoimento do Réu, foi por demais revelador, das suas reais intenções ao longo desta angariação, bem como, as suas contradições comprovam como deturpou os factos, a verdade, ao douto Tribunal.
eee) Atenta a sua falta de dinheiro que o próprio confessa perante o douto Tribunal e quando percebeu que o sinal entregue pelo promitente-comprador não teria de ser devolvido pela quebra do negócio, a ganância deste réu falou mais alto e recusou cumprir com o acordado.
fff) Em contraponto, a testemunha da Autora, soube com clareza e isenção, explicar ao douto Tribunal todas as vicissitudes e desconstruir a “realidade” apresentada pelo réu, AA.
ggg) Atento o exposto, muito bem esteve o douto Tribunal ao julgar e ponderar a decisão que tomou.
hhh) Com o devido respeito, a tese apresentada pelos réus, apenas vem confirmar que a douta sentença foi muito bem ponderada e proferida, não apresentando nenhuma das “falências” apresentadas pelas, aliás, doutas alegações dos réus, as quais, somente, refletem a sua falta de razoabilidade!
iii) Os réus, bem sabem, mas desejam esquecer, que assinaram um contrato de mediação imobiliária, com a Autora, o qual foi duplamente escrutinado por estes e pela advogada que os aconselhou à data, as clausula foram todas minuciosamente negociadas e, conforme mensagem do réu AA, foi dada a anuência de todos os réus…
jjj) “No contrato de mediação imobiliária com regime de exclusividade, o mediador tem o direito de ser o único a promover o contrato desejado e, por isso, pode ter direito à remuneração independentemente da conclusão deste contrato se o contrato visado não se concretizar por causa imputável ao cliente, ou mesmo que não tenha contribuído para a sua celebração, como no caso do interessado/destinatário ter sido encontrado com o recurso a outro mediador. (…)” – vide, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 18.02.2020, disponível em www.dgsi.pt.
kkk) “O contrato prometido não chegou a ser outorgado porque o promitente comprador desistiu do negócio (não havendo, aqui, uma não concretização por causa imputável à A.) sendo indiferente que o contrato prometido não se viesse a concretizar para a aquisição do direito à remuneração em 50% por parte da R.” vide, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 07.07.2022, disponível em www.dgsi.pt.”
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O Recurso foi devidamente admitido com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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Questões a decidir:
Como resulta do disposto pelos artigos 5º; 635º, n.º 3 e 639º n.º 1 e n.º 3, todos do Código de Processo Civil (e é jurisprudência consolidada nos Tribunais Superiores) para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, o objeto do recurso é delimitado em função das conclusões formuladas pelo recorrente.
Desta forma, observadas as Conclusões formuladas pelos Recorrentes, são as seguintes as questões a apreciar:
- Da reapreciação da matéria de facto;
- Se da mesma resulta inexistir fundamento para a condenação dos RR., nomeadamente por não se ter provado o acordo invocado pela A. quanto ao pagamento da comissão.
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Fundamentação de Facto:
Na 1ª instância proferiu-se a seguinte Decisão sobre a Matéria de Facto:
Factos Provados:
1. Em 20 de Janeiro de 2023, no âmbito da sua actividade comercial, a autora assinou com os réus um escrito denominado «contrato de mediação imobiliária», através do qual a primeira se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra do imóvel sito na Rua ..., n.º 17 e 19, em Almargem do Bispo, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob a ficha n.º 6105 e 6214, propriedade destes últimos, em regime de exclusividade, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido em razão da sua extensão.
2. Acordaram assim que a «a mediadora obriga-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra (…) pelo preço de 350.000 €, desenvolvendo, para o efeito, acções de promoção e recolha de informações sobre os negócios pretendidos e característicos dos respectivos imóveis» (cláusula 2.ª, n.º 1),
3. «A remuneração só será devida se a Mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com a excepções previstas no artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro» (cláusula 5.ª, n.º 1),
4. «O segundo contratante obriga-se a pagar à Mediadora a título de remuneração a quantia de 5 % calculada sobre o montante pelo qual o negócio é efectivamente concretizado acrescido de IVA à taxa legal em vigor» (cláusula 5.ª, n.º 2),
5. «O pagamento da remuneração apenas será efectuado nas seguintes condições: (…) 30% após a celebração do contrato promessa e o remanescente de 70% na celebração da escritura ou conclusão do negócio» (cláusula 5.ª, n.º 3),
6. Por escrito datado de 20 de Janeiro de 2023, sob a epígrafe «contrato-promessa de compra e venda», os réus declararam prometer vender, e o senhor II declarou prometer comprar, pelo preço de 320.000 €, o prédio referido em 1.
7. Mais declararam que a escritura de compra e venda seria outorgada no prazo de 60 dias a contar da data da celebração do aludido contrato promessa.
8. Nesse mesmo dia, e a título de sinal e de princípio de pagamento, os réus receberam daquele senhor a quantia de 32.000,00 €.
9. Estavam, então, convencidos de que a escritura de compra e venda iria realizar-se.
10. Porém, o senhor II veio a desistir do negócio.
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Factos Não Provados:
A. Não foi acordado entre as partes a forma de pagamento da remuneração devida à autora.
B. A autora emitiu as facturas n.º 1 2300/000102, no montante de € 1.968,00, n.º 1 2300/000103, no montante de € 1.968,00 e n.º 1 2300/000104, no montante de € 1.968,00, todas datadas, emitidas e com vencimento em 29.05.2023.
C. A autora interpelou os réus, por diversas vezes, para o pagamento das facturas referidas em B., nomeadamente através de carta registada com A/R, datada de 16.06.2023.
D. A autora despendeu a quantia de 750,00€ (setecentos e cinquenta euros), com a cobrança do crédito que aqui reclama.
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IV. Da Reapreciação da Matéria de Facto.
No recurso interposto os RR. vêm impugnar a matéria de facto constante da sentença, entendendo que não se pode dar como Assente o que consta em 5.: «O pagamento da remuneração apenas será efectuado nas seguintes condições: (…) 30% após a celebração do contrato promessa e o remanescente de 70% na celebração da escritura ou conclusão do negócio» (cláusula 5.ª, n.º 3)”.
Para tanto sustentam os recorrentes que o contrato foi assinado sem que tenha ficado acordado entre as partes que a forma de pagamento da comissão seria efectuada nos termos da cláusula 5.º, n.º 3 do respetivo contrato, tendo por tal motivo, a mesma ficado em branco, sem ter sido escolhida nenhuma das opções ali mencionadas.
Fundamentam esta alegação desde logo no teor do próprio contrato, resultando patente do mesmo que não consta desse documento que se tenha assinalado com um X, nenhuma das opções ali referidas, como era obrigatório e vinculativo para as partes.
Mais invocam as declarações prestadas pelos RR. AA e FF e o depoimento da testemunha GG, nas partes que concretizam; referem ainda o print da mensagem enviada por GG, ao R. AA, no dia 2 de março de 2023, em que confirma que a totalidade da comissão será paga no acto da escritura.
Pretendem assim os RR. que o teor do facto provado número 5 passe a ser a seguinte redação: “O pagamento da remuneração será efectuado nas seguintes condições: Não foi assinalada nenhuma das opções ali mencionadas, não obstante terem sido apostos os números 30% e 70%, pela A.”;
Mais entendem que deveria ter sido dado como provado a mensagem de dia 2 de março de 2023, devendo ser aditado o seguinte facto: “Olá AA já falei com a Valor 360 e com a Remax e foi acordado o pagamento da comissão no ato da escritura.”
Vejamos.
O actual Código de Processo Civil introduziu um duplo grau de jurisdição quanto à matéria de facto, sujeitando a sua admissão aos requisitos previstos pelo art.º 640º do Código de Processo Civil.
Embora tal reapreciação tenha alcançado contornos mais abrangentes, não pretendeu o Legislador que se procedesse, no Tribunal Superior, a um novo Julgamento, com a repetição da prova já produzida nem com o mesmo limitar de alguma forma o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção, face ao qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção firmada acerca de cada facto controvertido.
No caso dos autos, verificados os pressupostos exigidos pelo art.º 640º do Código de Processo Civil para que este Tribunal se possa pronunciar sobre a reapreciação da matéria de facto, cabe entrar na apreciação da mesma.
Antes de mais, impõe-se no presente Recurso relembrar as regras sobre ónus de prova constantes do Código Civil, nomeadamente a pedra angular que sustenta a apreciação da prova e que está prevista no art.º 342.º:
“1. Àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.
2. A prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita.
3. Em caso de dúvida, os factos devem ser considerados como constitutivos do direito.”
Fazendo a aplicação deste normativo, resulta evidente que é à A. que no caso compete o ónus de provar a celebração do contrato e o acordo de que se pretende prevalecer para exigir a quantia peticionada aos RR.
Não foi posto em causa que o contrato celebrado entre as partes é um contrato de mediação imobiliária.
Acresce assim à referida exigência geral do ónus de prova que as condições contratadas entre as partes constem obrigatoriamente de um documento escrito - conf. art.º 16º, n.º 1 da Lei n.º 15/2013 de 8 de fevereiro (“O contrato de mediação imobiliária é obrigatoriamente reduzido a escrito”) e devendo deste obrigatoriamente constar, nos termos do n.º 2, c) “As condições de remuneração da empresa, em termos fixos ou percentuais, bem como a forma de pagamento, com indicação da taxa de IVA aplicável”; com as alterações introduzidas pelo Dec.-Lei 102/2017 de 23/8 foi acrescentada a exigência prevista pelo n.º 4: “Os modelos de contratos com cláusulas contratuais gerais de mediação imobiliária só podem ser utilizados pela empresa após aprovação prévia dos respetivos projetos pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P. (IMPIC, I. P.)”, prosseguindo o desiderato do legislador, constante no preâmbulo daquele Dec.-Lei: “Também a defesa dos direitos dos consumidores constitui um desiderato do Programa do Governo, traduzindo-se a prestação de uma melhor informação aos consumidores numa melhoria da qualidade de vida dos cidadãos.
Nesse sentido, o Governo procedeu ao levantamento e análise das obrigações de informação ao consumidor que têm de estar afixadas nos estabelecimentos comerciais de venda de bens e/ou prestação de serviços, nos termos da legislação em vigor, com o intuito de analisar as possibilidades de simplificação e harmonização das mesmas.
Ponderadas as hipóteses de simplificação e de sistematização do complexo informativo, tendo em vista alcançar o propósito de uma maior estabilidade e segurança do quadro das relações jurídicas a estabelecer entre empresas e consumidores, através da dupla vertente da redução dos custos de contexto das empresas e da melhoria e da facilidade do acesso dos consumidores à informação, algumas das obrigações são alteradas deixando de ser obrigatória a sua afixação, e outras são eliminadas.”
Feito este enquadramento, entremos na análise da prova efectuada.
Olhando para o contrato em causa resulta desde logo evidente que nenhuma das alíneas da cláusula 5ª, n.º 3 está devidamente assinalada com um X nas quadriculas que antecedem as mesmas.
Analisado o restante documento, não decorre deste que nas restantes cláusulas onde se verifica a necessidade de apor um X assinalando a escolha da menção que se pretende ou se adeque ao caso tenha ocorrido tal olvido/lapso.
É certo que se mostra aposta a menção “30%” e “70%” mas resulta da falta de sinalização de uma das opções que fica pelo menos uma dúvida razoável, atendendo apenas ao teor do contrato, que se tenha acordado relativamente ao pagamento da comissão nos termos pretendidos pela A.
Logo, resulta evidente que da análise do contrato a A. não logra demonstrar, como lhe competia, o acordo em causa.
Vejamos se das declarações e depoimento prestados em julgamento se pode retirar a existência de tal acordo.
Ouvida a prova produzida em audiência na íntegra, resulta evidente que não.
Das declarações prestadas pelos RR. decorre que negam a existência de um tal acordo; ou seja, não houve da parte destes qualquer declaração confessória que viesse assim dar cumprimento ao ónus de prova que sobre a A. impendia.
O R. AA, que foi quem negociou directamente com a A. afirmou e reafirmou que a comissão apenas era devida após a conclusão do negócio; que por não estar aposta qualquer cruz (“pisco”, nas suas declarações) nas alíneas do n.º 3 da Cláusula 5ª entendeu (como aliás seria normal para qualquer destinatário mediano e normal colocado naquela mesma posição) que não estava assinalada qualquer uma das alíneas em causa (logo, em consonância com a afirmada falta de acordo sobre esta cláusula).
Quanto ao facto de estar lá aposto 30% e 70%, referiu que esta hipótese foi falada mas não foi aceite por ele ou pelos outros RR.; uma vez que no contrato não se mostrava tal alínea assinalada, atribuiu a esta circunstância o sentido de não estar efectivamente acordada entre as partes, afirmando e reafirmando que o que ficou assente foi o pagamento da comissão de 5% sobre o preço na totalidade na conclusão do negócio.
Quanto à mensagem SMS, para ele foi a confirmação do que efectivamente ficou acordado: o pagamento era efectuado com a conclusão do negócio.
Não houve qualquer contradição nestas declarações.
Quanto aos RR. CC e FF, não participaram nas negociações do contrato e vieram declarar que nunca lhes foi falado no referido pagamento; quanto à cláusula quinta, não estando assinalada não lhe atribuíram importância. Para estes, o essencial estava no contrato e ficou acordado: o preço, a percentagem da comissão, o pagamento desta na conclusão do negócio.
Não se pode assim concluir pela existência de tal acordo, como se referiu.
E, repete-se, a quem incumbia provar o acordo era à A.
Analisemos então o depoimento da única testemunha indicada pelo A., GG, angariador imobiliário que trabalha para a A. e que interveio neste negócio.
Como seria expectável, a testemunha veio dizer que ficou acordado entre as partes o pagamento de 30% da comissão com a celebração do contrato promessa, afinal a pretensão da A.
No entanto, o seu depoimento não se revestiu da necessária segurança por forma a criar a convicção de que assim foi.
A testemunha veio referir que as negociações entre as partes foram demoradas e que os RR., representados pelo R. AA, com quem a testemunha manteve contactos durante essas negociações, pretendiam elaborar um contrato através da sua advogada, o que foi recusado pela A. uma vez que o modelo do contrato tinha de ser aprovado pelo IMPIC.
O contrato foi feito pelo apoio documental da A. e é uma folha editável posteriormente preenchida com os dados dos imóveis e dos clientes vendedores, etc… O apoio documental é que introduziu os dados - dados da caderneta e dos cartões de cidadão, moradas…os valores foram introduzidos de acordo com uma avaliação prévia que efectuaram.
Refere a testemunha que o contrato “teve dois meses para ser mastigado…”.
Após a testemunha foi a casa de cada um dos agregados familiares dos RR. para que fosse assinado.
As comissões foram apenas discutidas com o R. AA e o contrato foi previamente enviado a este, visto pela sua advogada, não foram levantadas objecções e voltou assinado.
Desde logo esta parte do seu depoimento levanta diversas dúvidas.
Em primeiro lugar, o modo de pagamento das comissões aqui em causa não foi discutido com outros RR. que não o R. AA.
Como vimos, este nega que tivesse acordado com o pagamento de 30% após a celebração de um contrato promessa e que para ele, não estando assinalada com uma cruz essa opção, isso significa precisamente que não houve acordo.
Quanto ao prazo de dois meses de negociações, se é válido para os RR. que esse lapso de tempo era suficiente para analisar o contrato com cuidado, mais ainda se exigia à A. - que é uma empresa imobiliária, agindo na área do seu negócio, que impôs o seu modelo de contrato e estando nas negociações a testemunha, profissional da área - que o contrato fosse visto com cuidado e rigor e estivesse devidamente e corretamente preenchido.
A justificação dada pela testemunha da falta de aposição do X na alínea pretendida (e sobre a qual, alegadamente, houve acordo) de que se tratou de um lapso, “uma falha de impressão”, não merece qualquer acolhimento.
Mais ainda quando a testemunha vem dizer que “não foi alertado para esse lapso antes…”. Mas afinal são os particulares que contratam com a A. que tem de verificar se a A. lhes apresenta um contrato com lapsos ou gralhas? Não faz qualquer sentido. E afinal se os RR. nada disseram é legitimo presumir que não referiram que tal alínea não estava assinalada porquanto não tinham acordado na mesma.
Mas vejamos ainda o que a testemunha invoca para que – no pressuposto de estar acordada a condição invocada pela A. e celebrado o contrato promessa - afinal não emite a A. nessa sequência as faturas correspondentes (nem essas, nem outras, uma vez que nem ficou provada a emissão de faturas nem, veja-se, a interpelação para pagamento).
Diz a testemunha que, solicitado o pagamento da comissão de 30% (do que não há prova de qualquer registo) são afinal os RR. que vêm pedir para que a comissão seja paga integralmente no acto da escritura.
De tais conversações e solicitações, nada consta nos autos, para além do SMS de 2/3/2023 que afinal apenas refere: “Boa tarde AA Já falei com o Grupo Valor e com a Remax. Foi acordado o pagamento integral da comissão no ato da escritura”.
Ora, não resulta deste SMS que tenha havido qualquer alteração ao que o R. sempre afirmou: que o pagamento da comissão era efectuado na totalidade na conclusão do negócio, tal como estipulado no contrato e ficou assente em:
“3. «A remuneração só será devida se a Mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com a excepções previstas no artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro» (cláusula 5.ª, n.º 1)” e
“4. «O segundo contratante obriga-se a pagar à Mediadora a título de remuneração a quantia de 5 % calculada sobre o montante pelo qual o negócio é efectivamente concretizado acrescido de IVA à taxa legal em vigor» (cláusula 5.ª, n.º 2)”;
Sendo que com aquele SMS se veio concretizar a data em que tal deveria suceder, uma vez que tal não estava expresso no contrato: tal pagamento, nos termos acordados nas cláusulas que se transcreveram, devia ocorrer no dia e hora designados para a celebração da escritura.
Não resulta desta mensagem que tenha havido conversações, pedidos, alterações, cedências por parte da A. relativamente ao pagamento da comissão.
E, tal como a advogada dos RR. bem suscitou durante este depoimento, como se explica que a A., uma vez que havia esta alteração, não a tenha feito constar por escrito ou feito um aditamento ao contrato.
O que efectivamente sucedeu foi que na verdade o negócio não se chegou a concretizar uma vez que os compradores não conseguiram obter as verbas para pagar o restante preço e o negócio veio a gorar-se - “só quando souberam que o negócio foi abortado é que emitem as faturas…”; faturas que, reitera-se, nem sequer estão nos autos.
Foi aí então que a A. se lembra de pedir o dinheiro está aqui em causa e “…a reacção do sr. AA não foi a melhor…”; o que mais reforça a convicção que tal pagamento não ficou acordado anteriormente.
Finalmente, a testemunha veio afinal retificar o que havia afirmado anteriormente: no caso do R. AA, o contrato veio digitalizado, enviado por email, assinado por ele e pela esposa; apenas foi a casa dos RR. CC e EE, com os quais não falou da comissão; confrontado com o facto de se verificarem seis assinaturas no anexo mas só quatro rubricas no contrato, a testemunha não soube explicar e não sabe dizer a quem correspondem as assinaturas, do que fica evidente a falta de cuidado por parte da A. relativamente a este contrato.
Em suma, do que se tem vindo a expor resulta dever proceder a reapreciação da matéria de facto, nos seguintes termos (ao abrigo ainda do art.º 662º, n.º 1 do Código de Processo Civil):
O Facto Assente 5 deve passar a Não Provado.
Adita-se um Facto Assente 11 com o seguinte teor:
“No dia 2/3/2022 foi acordado entre as partes que o pagamento da comissão devida seria efectuado no ato da escritura.”
O Facto Não Provado A. é eliminado.
***
V. Do Direito.
Procedente nos termos supra decididos a reapreciação da matéria de facto, vejamos se pode manter-se a condenação dos RR. tal como decidida pela 1º Instância.
Resultou assente nos autos e não foi posto em causa no presente Recurso que entre A. e RR. foi celebrado um contrato de mediação imobiliária, em 20 de Janeiro de 2023, através do qual a primeira se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra do imóvel sito na Rua ..., n.º 17 e 19, em Almargem do Bispo, descrito na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob a ficha n.º 6105 e 6214, propriedade destes últimos, em regime de exclusividade.
A este contrato aplica-se a Lei 15/2013, de 8 de fevereiro, que estabelece o regime jurídico a que fica sujeita a atividade de mediação imobiliária, conformando-o com a disciplina constante do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno, com as alterações do Decreto-Lei n.º 102/2017, de 23 de agosto.
Nos termos do art.º 2º da Lei 15/2013:
“1 - A atividade de mediação imobiliária consiste na procura, por parte das empresas, em nome dos seus clientes, de destinatários para a realização de negócios que visem a constituição ou aquisição de direitos reais sobre bens imóveis, bem como a permuta, o trespasse ou o arrendamento dos mesmos ou a cessão de posições em contratos que tenham por objeto bens imóveis.
2 - A atividade de mediação imobiliária consubstancia-se também no desenvolvimento das seguintes ações:
a) Prospeção e recolha de informações que visem encontrar os bens imóveis pretendidos pelos clientes;
b) Promoção dos bens imóveis sobre os quais os clientes pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da sua divulgação ou publicitação, ou da realização de leilões.
3 - Considera-se empresa de mediação imobiliária a pessoa singular ou coletiva cujo domicílio ou sede se situe em qualquer Estado do Espaço Económico Europeu e, sendo pessoa coletiva, tenha sido constituída ao abrigo da lei de qualquer desses Estados e se dedique à atividade de mediação imobiliária, referida nos números anteriores.
4 - As empresas de mediação imobiliária podem ainda prestar serviços que não estejam legalmente atribuídos em exclusivo a outras profissões, de obtenção de documentação e de informação necessários à concretização dos negócios objeto dos contratos de mediação imobiliária que celebrem.
5 - Considera-se destinatário do serviço, para efeitos do número anterior, a pessoa ou entidade que celebra com o cliente da empresa de mediação imobiliária qualquer negócio por esta mediado.
6 - É designada por cliente a pessoa ou entidade que celebra com uma empresa habilitada nos termos da presente lei um contrato visando a prestação de serviços de mediação imobiliária.”
Quanto à forma prevista para o contrato estipula o art.º 16º da Lei 15/2013, já supra referido.
Ao celebrar um contrato de mediação imobiliária, impõe a Lei à Mediadora os seguintes Deveres para com os clientes e destinatários, conforme resulta do art.º 17º:
“1 - A empresa de mediação é obrigada a:
a) Certificar-se, no momento da celebração do contrato de mediação, que os seus clientes têm capacidade e legitimidade para contratar nos negócios que irá promover;
b) Certificar-se da correspondência entre as características do imóvel objeto do contrato de mediação e as fornecidas pelos clientes;
c) Propor aos destinatários os negócios de que for encarregada, fazendo uso da maior exatidão e clareza quanto às características, preço e condições de pagamento do imóvel em causa, de modo a não os induzir em erro;
d) Comunicar imediatamente aos destinatários qualquer facto que possa pôr em causa a concretização do negócio visado.
2 - Está expressamente vedado à empresa de mediação:
a) Receber remuneração de clientes e destinatários no mesmo negócio;
b) Intervir como parte interessada em qualquer negócio que incida sobre imóvel compreendido no contrato de mediação de que seja parte;
c) Celebrar contratos de mediação imobiliária quando as circunstâncias do caso permitirem, razoavelmente, duvidar da licitude do negócio cuja promoção lhe for proposta;
d) Proceder à avaliação imobiliária dos imóveis objeto da mediação, bem como de todos os imóveis integrados nas carteiras das mediadoras imobiliárias com as quais mantenha qualquer relação de domínio ou de grupo ou daquelas que se apresentem no mercado sob a mesma marca comercial.
3 - A proibição contida na alínea b) do número anterior aplica-se igualmente no caso de o interessado no negócio ser sócio ou representante legal da empresa de mediação, ou ser cônjuge, ascendente ou descendente no 1.º grau de qualquer daqueles.
4 - O disposto nos números anteriores aplica-se apenas a contratos sujeitos à lei portuguesa.”
Finalmente e para o que aqui interessa, quanto à remuneração da empresa estabelece o art.º 19º:
“1 - A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
2 - É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.
3 - Quando o cliente for um potencial comprador ou arrendatário, a empresa, desde que tal resulte expressamente do respetivo contrato de mediação imobiliária, pode cobrar quantias a título de adiantamento por conta da remuneração acordada, devendo as mesmas ser devolvidas ao cliente caso o negócio não se concretize.
4 - O direito da empresa à remuneração cujo pagamento caiba ao cliente proprietário de imóvel objeto de contrato de mediação não é afastado pelo exercício de direito legal de preferência sobre o dito imóvel.
5 - O disposto nos números anteriores aplica-se apenas a contratos sujeitos à lei portuguesa.”
Ora, decorre dos preceitos supra referidos;
- que a mediação, em sentido técnico ou estrito, é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a conseguir interessado para um dos negócios mencionados na Lei incidente sobre bens imóveis e a aproximar esse interessado da outra parte;
- que a função do mediador (mero intermediário que desenvolve uma actividade somente material e preparatória) consiste em aproximar duas ou mais partes que desejam realizar um negócio, actuando em nome próprio (e não em representação daquelas), facilitando-lhes a conclusão do negócio pretendido;
- que o mediador, devido ao risco/álea inerente à actividade comercial da mediação, apenas tem direito a ser remunerado quando a sua actuação determine a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, o que significa que tem que existir um nexo de causalidade adequada entre a sua actividade e a realização do negócio pretendido, de modo a que possa afirmar-se que a concretização deste foi o corolário ou a consequência daquela actuação (cfr., quanto ao que se deixou dito, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3/4/2008, processo n.º 07B4498, disponível em www.dgsi.pt e, ainda, Pedro Pais de Vasconcelos, in Direito Comercial, Volume I, 2011, Parte Geral, Contratos Mercantis, Almedina, pág. 197, Menezes Cordeiro, in Do Contrato de Mediação, O Direito, ano 139, III, págs. 516 e segs.).
Deste modo, tem sido entendimento que se trata de um contrato de prestação de serviços, pelo que, para que o mediador cumpra a sua prestação contratual, não é suficiente que desenvolva determinada actividade, mas que através dela proporcione à outra parte um determinado resultado - art.º 1154.º do Código Civil (cfr., entre outros, os acórdãos da Relação do Porto de 2/6/2011, processo n.º 141/09.9TBMAI.P1 e de 8/9/2011, processo n.º 340957/10.2YIPRT.P1 disponíveis em www.dgsi.pt).
A Lei prevê uma excepção a este entendimento; no caso do contrato seja celebrado em regime de exclusividade é igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário do bem imóvel. Ainda assim, para além da celebração do negócio em regime de exclusividade e do estabelecimento de um nexo de causalidade entre a conduta do próprio vendedor e o facto de o negócio visado não ter sido celebrado, continua a exigir-se “(…) que a mediadora cumpra a sua prestação contratual e pratique actos de mediação e promoção adequados e suficientes à conclusão do negócio” – conf. Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 14/6/2012, Proc. n.º 4620/05.9YXLSB.L1-6.
No caso dos autos o contrato celebrado entre A. e RR. foi sujeito ao regime de exclusividade.
Mais ficou assente que a remuneração só será devida se a Mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com a excepções previstas no artigo 19.º da Lei n.º 15/2013, de 8 de Fevereiro (cláusula 5.ª, n.º 1), fixando-se esta em 5 % calculada sobre o montante pelo qual o negócio é efectivamente concretizado acrescido de IVA à taxa legal em vigor (cláusula 5.ª, n.º 2).
Finalmente, concretizaram a data do pagamento dessa remuneração – no momento da celebração da escritura.
Ficou afastado na reapreciação da matéria de facto efectuada, qualquer acordo de pagamento da remuneração (parte desta) na celebração do contrato promessa.
No entanto, como resultou provado, o negócio não se veio a concretizar porque o promitente comprador veio a desistir do negócio.
Ora, não sendo de imputar nenhuma responsabilidade pela não concretização do negócio aos RR. e não se tendo chegado a celebrado o contrato de compra e venda, pelo que não chegou a haver concretização do negócio, decorre que a remuneração não é devida à A.
Pelo exposto, procede o recurso interposto, devendo revogar-se a Sentença proferida, indo os RR. absolvidos do pedido que contra ele foi formulado pela A.
*
VI. Das Custas.
Vencida no recurso e na causa é a Recorrida a responsável pelo pagamento das custas devidas, nos termos do art.º 527, n.º 1 e n.º 2 do Código de Processo Civil.
***
DECISÃO:
Por todo o exposto, acorda-se em julgar procedente o Recurso interposto, revogando-se a Sentença Recorrida e indo os RR. absolvidos do pedido.
Custas do recurso e da acção pela A. Recorrida.
Registe e notifique.

Lisboa, 22/5/2025
Vera Antunes
Gabriela de Fátima Marques
António Santos