Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7/24.2YHLSB.L1-PICRS
Relator: BERNARDINO TAVARES
Descritores: MARCA
IMITAÇÃO
INDICAÇÃO GEOGRÁFICA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/19/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: - O direito das marcas constitui elemento essencial do sistema de concorrência não falseado;
- A marca, enquanto sinal distintivo do comércio, funciona, de um lado, como identificação de um produto ou serviço proposto ao consumidor e permite, por outro, distingui-lo e diferenciá-lo de outros ou afins. 
- A proveniência geográfica, desde que acompanhada de outras indicações, é suscetível de integrar o sinal de uma marca;
- A referida proveniência geográfica não pode, por regra, ser considerada de uso exclusivo.  
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção da Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:
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I - Relatório

Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela  intentou recurso, ao abrigo do disposto nos artigos 38.º e seguintes do Código da Propriedade Industrial, do despacho do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), de 10 de novembro de 2023, que deferiu o pedido de registo de marca nacional n.º 706500 “CABAZ SERRA DA ESTRELA”, a favor de (…) pedindo que fosse revogado o despacho recorrido e indeferido o mencionado registo.
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Cumprido o disposto no artigo 42.º do Código da Propriedade Industrial, o INPI remeteu o processo administrativo.
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O Tribunal da Propriedade Intelectual proferiu a seguinte decisão:
“Termos em que, vistos os princípios jurídicos e as normas indicadas, se indefere o recurso apresentado, mantendo-se o despacho recorrido que concedeu o registo da marca nacional n.º 706500 com o sinal:”

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Inconformada com tal decisão, veio a Recorrente interpor recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões:
“1) Vem o presente recurso interposto da, aliás, douta sentença judicial proferida, com a referência eletrónica Citius nº 569376, notificada em 11-04-2024, que julgou improcedente o recurso interposto da decisão do INPI proferido em 10-11-2023, e publicado em 15-11-2023, que concedeu o registo de marca nacional nº 706500, ao aqui recorrido (…).
2) A douta sentença recorrida, com o devido respeito, enferma de erro de julgamento, quanto à matéria de direito e revela contradição entre a fundamentação decisória e o decidido pois não obstante reconhecer que as marcas do recorrente são prioritárias e que “a marca registanda encontra-se vocacionada para assinalar produtos afins das marcas prioritárias do recorrente, acabou por julgar que a identidade nominativa é apenas parcial e que numa impressão global distinta não se verifica o risco de confusão ou associação com a marca prioritária.
3) A, aliás, douta sentença judicial do tribunal “a quo” incorre num erro de julgamento porquanto a marca registanda não revela um sinal com força distintiva dotado de idoneidade que permita o necessário distanciamento perante o consumidor médio de forma a afastar um juízo associativo ou relacional face ao sinal prioritário que é a denominação “Serra da Estrela”.
4) Ao invés, é a denominação “Serra da Estrela”, marca prioritária, que tem mais força distintiva e à qual qualquer consumidor médio dá maior relevância – pois a expressão “cabaz” inserta na marca registanda em nada comporta um elemento diferenciador – e que fica na perceção e memória do consumidor à qual associa um conjunto vasto e rico de produtos regionais bem como um património territorial e ambiental em estado puro pelo que o risco de confusão ou associação é evidente entre as marcas prioritárias do recorrente, com grau de notoriedade pública, e a marca registanda.
5) A marca registanda apropria-se de uma denominação geográfica territorial “Serra da Estrela” que aos olhos do público a associa a um conjunto de produtos (v.g. queijo da Serra da Estrela, águas de nascente….etc) e serviços de proveniência geográfica (v.g. parapente, instâncias de ski, provas de ciclismo de montanha…etc) pelo que não tem caracter distintivo. Cfr artigos 208º e 209º do CPI.
6) A douta sentença judicial incorreu em erro na aplicação da lei e do direito aplicável ao caso concreto tendo violado, por deficiente interpretação os artigos 208º, 209º nº alínea c), 231º e 232º do CPI.”
Tendo concluído que:
“Nestes termos e no mais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente e por via disso revogar-se a sentença da 1ª instância por outra que julgue de acordo com o direito e a lei.”
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            (…), citado regularmente, não respondeu ao recurso.
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Os autos foram à conferência.
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II - Questões a decidir
O objeto do recurso é balizado pelas conclusões do apelante, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito, conforme resulta dos artigos 5.º, n.º 3, 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1, e 608.º, todos do CPC.
Assim, importa, no caso, apreciar e decidir:
- se deve ser rejeitado o registo da marca n.º 706500 (por se apropriar de denominação geográfica territorial e por existir risco de confusão ou associação relativamente ao sinal prioritário).
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II – Fundamentação
A – Factos provados
A decisão recorrida declarou como provados os seguintes factos:
1. Em 31/05/2023, o Recorrido pediu o registo da marca mista nacional nº 706500

 (cf. processo INPI)
2. O pedido destinava-se a abranger os seguintes produtos/serviços da classe 35 da Classificação Internacional de Nice: serviços de venda a retalho relacionados com alimentos; serviços retalhistas relacionados com bebidas alcoólicas; serviços retalhistas relacionados com bebidas não alcoólicas. (cf. processo INPI)
3. O INPI concedeu o registo da marca referida em 1.º, por despacho do Diretor do Instituto, de 10.11.2023. (cf. processo INPI)
4. A recorrente Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela é titular das seguintes marcas nacionais:
MARCA Nº 638095, requerida em 11.2.2020 e concedida em 31.7.2020, na classe 35º da Classificação Internacional de Nice, para desenvolvimento de campanhas promocionais; organização e realização de eventos de marketing; organização e realização de eventos promocionais; serviços de estratégia da marca; serviços de promoção; serviços de publicidade e marketing; serviços de publicidade e promoção;

MARCA Nº 638084 – bem-haja, requerida em 11.2.2020 e concedido em 3.6.2020, na classe 35º da Classificação Internacional de Nice, para desenvolvimento de campanhas promocionais; organização e realização de eventos de marketing; organização e realização de eventos promocionais; serviços de estratégia da marca; serviços de promoção; serviços de publicidade e marketing; serviços de publicidade e promoção;
https://servicosonline.inpi.justica.gov.pt/portal_resources/proc_images/7316589_01.jpg


MARCA Nº 638092, requerida em 11.2.2020 e concedida em 15.6.2020, na classe 35º da Classificação Internacional de Nice, para desenvolvimento de campanhas promocionais; organização e realização de eventos de marketing; organização e realização de eventos promocionais; serviços de estratégia da marca; serviços de promoção; serviços de publicidade e marketing; serviços de publicidade e promoção.
https://servicosonline.inpi.justica.gov.pt/portal_resources/proc_images/7316626_01.jpg

5. O Recorrido foi titular da marca nacional nº 499125, com data de apresentação de 02.05.2012, e concessão em 29.11.2012 com o sinal:
https://servicosonline.inpi.justica.gov.pt/portal_resources/proc_images/3896853_01.jpg


6. A marca referida em 4.º foi objeto de despacho que declarou a sua caducidade em 07.06.2023.
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B - Factos não apurados
A decisão recorrida não os declarou.
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III - Do mérito do recurso
Como referido supra, os presentes autos reportam-se a um pedido de registo de marca nacional, no caso, o n.º 706500 (Cabaz Serra Da Estrela), cujo regime legal se mostra previsto no Código de Propriedade Industrial (CPI). 
Vejamos a questão suscitada.
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Da concessão do registo da marca n.º 706500 (se o sinal se apropria de denominação geográfica territorial e se o mesmo é suscetível de criar risco de confusão ou associação relativamente ao sinal prioritário).
A Recorrente, nas suas alegações de recurso, considera que a “… sentença recorrida, com o devido respeito, enferma de erro de julgamento, quanto à matéria de direito e revela contradição entre a fundamentação decisória e o decidido pois não obstante reconhecer que as marcas do recorrente são prioritárias e que “a marca registanda encontra-se vocacionada para assinalar produtos afins das marcas prioritárias do recorrente, acabou por julgar que a identidade nominativa é apenas parcial e que numa impressão global distinta não se verifica o risco de confusão ou associação com a marca prioritária.
Mais considera que “… a marca registanda não revela um sinal com força distintiva dotado de idoneidade que permita o necessário distanciamento perante o consumidor médio de forma a afastar um juízo associativo ou relacional face ao sinal prioritário que é a denominação “Serra da Estrela”.
Considera ainda que “… é a denominação “Serra da Estrela”, marca prioritária, que tem mais força distintiva e à qual qualquer consumidor médio dá maior relevância – pois a expressão “cabaz” inserta na marca registanda em nada comporta um elemento diferenciador – e que fica na perceção e memória do consumidor à qual associa um conjunto vasto e rico de produtos regionais bem como um património territorial e ambiental em estado puro pelo que o risco de confusão ou associação é evidente entre as marcas prioritárias do recorrente, com grau de notoriedade pública, e a marca registanda.”
Finalmente, considera que “A marca registanda apropria-se de uma denominação geográfica territorial “Serra da Estrela” que aos olhos do público a associa a um conjunto de produtos (v.g. queijo da Serra da Estrela, águas de nascente….etc) e serviços de proveniência geográfica (v.g. parapente, instâncias de ski, provas de ciclismo de montanha…etc) pelo que não tem caracter distintivo. Cfr artigos 208º e 209º do CPI.
A sentença proferida pelo tribunal, em resumo, qualifica as marcas como mistas; declara como prioritárias as marcas da titularidade da Recorrente; atesta que os produtos incluídos nas marcas são afins (complementares); reconhece a identidade parcial ao nível nominativo, uma vez que ambas utilizam a denominação “Serra da Estrela”; assevera que a referida denominação destina-se a descrever a proveniência geográfica dos produtos, não tendo, por isso, carácter distintivo; mas salienta, do ponto de vista nominativo, a circunstância da marca registanda utilizar a expressão conjugada “Cabaz da Serra Da Estrela” e não apenas a proveniência geográfica; assim como ressalta as diferenças existentes ao nível da componente figurativa dos sinais, quer em termos gráficos, quer em termos de cor; e destaca a impressão global distinta; conclui pela inexistência de risco de confusão ou associação da marca registanda com a marca prioritária e ainda dos requisitos legais para a possibilidade de prática de atos de concorrência desleal.
Vejamos.
Dispõe o artigo 1º do Código da Propriedade Industrial, sob a epígrafe “Função da propriedade industrial”, que:
“A propriedade industrial desempenha a função de garantir a lealdade da concorrência, pela atribuição de direitos privativos sobre os diversos processos técnicos de produção e desenvolvimento da riqueza.”(o destaque é nosso).
Por sua vez, dispõe o artigo 208.º do CPI, sob a epígrafe “Constituição de marca”, que:
“A marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, cor, a forma do produto ou da respetiva embalagem, ou por um sinal ou conjunto de sinais que possam ser representados de forma que permita determinar, de modo claro e preciso, o objeto da proteção conferida ao seu titular, desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.”(o destaque é nosso).
Estabelece o artigo 209.º do CPI, sob a epígrafe “Exceções”, que:
1. Não satisfazem as condições do artigo anterior:
a) As marcas desprovidas de qualquer caráter distintivo;

c) Os sinais constituídos, exclusivamente, por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica, a época ou meio de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos;

2. Os elementos genéricos referidos nas alíneas a), c) e d) do número anterior que entrem na composição de uma marca não serão considerados de uso exclusivo do requerente, exceto quando, na prática comercial, os sinais tiverem adquirido eficácia distintiva.
…”.(o destaque é nosso).
Dispõe o artigo 231.º do CPI, sob a epígrafe “Fundamentos de recusa do registo”, que:
“1. Para além do que se dispõe no artigo 23.º, o registo de uma marca é recusado quando esta:

b) Seja constituída por sinais desprovidos de qualquer carácter distintivo;
c) Seja constituída, exclusivamente, por sinais ou indicações referidos nas alíneas b) a d) do n.º 1 do artigo 209.º;
d) Contrarie o disposto nos artigos 208.º, 211.º e 224.º. 
…”. (o destaque é nosso).
Estabelece o artigo 232.º do CPI, sob a epígrafe “Outros fundamentos de recusa”, que:
1 - Constitui ainda fundamento de recusa do registo de marca:

b) A reprodução de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços afins ou a imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada;

4 - Para efeitos do disposto no presente artigo e nos artigos seguintes, por marca anteriormente registada entende-se qualquer registo de marca nacional, da União Europeia ou internacional que produza efeitos em Portugal.
5 - O disposto nas alíneas a) a d) do n.º 1 abrange os pedidos dos registos aí mencionados, sob reserva do seu registo posterior.” (o destaque é nosso).
Finalmente, estabelece o artigo 238.º do mesmo diploma legal, sob a epígrafe “Conceito de imitação ou de usurpação”, que:
“1 - A marca registada considera-se imitada ou usurpada por outra, no todo ou em parte, quando, cumulativamente:
a) A marca registada tiver prioridade;
b) Sejam ambas destinadas a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins;
c) Tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada, de forma que o consumidor não as possa distinguir senão depois de exame atento ou confronto.
2 - Para os efeitos da alínea b) do número anterior:
a) Produtos e serviços que estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem não ser considerados afins;
b) Produtos e serviços que não estejam inseridos na mesma classe da classificação de Nice podem ser considerados afins.
3 - Considera-se imitação ou usurpação parcial de marca o uso de certa denominação de fantasia que faça parte de marca alheia anteriormente registada.” (o destaque é nosso).
Resulta, assim, da conjugação dos preceitos legais em análise que:
- não são suscetíveis de constituir uma marca os sinais que não sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa de outras empresas e os constituídos - exclusivamente - por indicações que possam servir no comércio para designar a proveniência geográfica;
- que os elementos genéricos que entrem na composição de uma marca não serão considerados de uso exclusivo do requerente, exceto quando, na prática comercial, os sinais tiverem adquirido eficácia distintiva;
- que o registo de uma marca é recusado quando esta seja constituída, exclusivamente, por sinais ou indicações referidos nas alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 209.º, ou seja, para o que aqui releva, para designar a proveniência geográfica;
- que constitui fundamento de recusa do registo de marca a reprodução, ou imitação, no todo ou em parte, de marca anteriormente registada por outrem, se ambas se destinarem a assinalar produtos ou serviços idênticos ou afins, quando ambas tenham tal semelhança gráfica, figurativa, fonética ou outra que induza facilmente o consumidor em erro ou confusão, ou que compreenda um risco de associação com marca anteriormente registada.
Vejamos então.
Importa ter presente que, como refere o STJ, “a marca é o primeiro e mais importante dos sinais distintivos do comércio, funcionando, de um lado, como identificação de um produto ou serviço proposto ao consumidor e permitindo, por outro, distingui-lo e diferenciá-lo de outros idênticos ou afins.” (Ac. de 12 de julho de 2018, proc. N.º 346/15.3YHLSB.L1.S1). 
Por sua vez, a respeito das marcas mistas, o Tribunal Geral da União Europeia no Acórdão de 14.07.2005 (SELENIUM – ACE, T-312/03, parágrafos 37 a 40 ECLI:EU:T:2005:289) entendeu que quando o sinal é composto de elementos nominativos e figurativos, o componente nominativo tem, em princípio, um impacto mais forte no consumidor do que a componente figurativa, pois o público não tem tendência a analisar sinais e fará mais facilmente referência ao sinal em causa citando o seu elemento nominativo do que descrevendo os seus elementos figurativos. 
No mesmo sentido, entre outros, é possível ler nos acórdãos do TRL, de 8 de janeiro de 2024, proferido no âmbito do processo n.º 179/23.3YHLSB.L1, que “Sendo o conjunto composto por letras e imagens, os diversos elementos dos signos mistos contribuem, ainda que com distintos relevos, para a formação da impressão global, concretizada de forma ligeira, no acto de compra, pelos destinatários dos produtos, sendo que o que consumidor mais e melhor recorda são as palavras que constituem as marcas em comparação” e no de 23 de outubro de 2023, proferido no âmbito do processo 218/22.5YHLSB.L1, que “A comparação das marcas que define a semelhança verifica-se entre um sinal e a memória que se possa ter de outro. Quando o sinal é composto de elementos nominativos e figurativos, a componente nominativa tem, em princípio, um impacto mais forte no consumidor, pois o público não tem tendência a analisar sinais e fará mais facilmente referência ao sinal em causa, referindo o seu elemento nominativo do que descrevendo os elementos figurativos.”
Refere Pedro Sousa e Silva que “A abordagem correcta no exame da confundibilidade das marcas é aquela que - no respeito do princípio da interdependência - coloca, num dos “pratos da balança” os factores de semelhança dos sinais, ao nível fonético, visual e conceptual e, no outro “prato”, os factores de diferenciação desses sinais, podendo a grande semelhança no contexto de um desses níveis ser compensada pela elevada dissemelhança no contexto dos demais.” (in Direito Industrial, 2.ª Ed., pág. 286).
Como referido supra, desde logo porque não foi posto em causa, temos por assente que as marcas tituladas pela Recorrente, são prioritárias e que as marcas em análise se destinam a assinalar produtos ou serviços afins (complementares).    
Importa, como bem refere a decisão em crise, referir que estamos perante sinais mistos.
Dito isto, reportando-nos aos sinais sub judice, passemos então a considerar os elementos assinalados.
O Tribunal a quo, a respeito da imitação da marca, começa por efetuar uma análise teórica dos conceitos, nomeadamente com recurso a jurisprudência, com a qual concordamos, para depois concluir pela sua não verificação.
Argumentou para o efeito que “No caso sub iudice, em ambos os sinais há uma identidade parcial a nível nominativo, uma vez que ambas utilizam a denominação “SERRA DA ESTRELA”.
Todavia, os vocábulos “SERRA DA ESTRELA”, destinam-se a descrever a proveniência geográfica dos produtos, não tendo, nesta parte, carácter distintivo. Refira-se que, conforme decorre do disposto no art.º 209.º, nº 2, do Código da Propriedade Industrial, as designações genéricas e descritivas não são suscetíveis de apropriação por um único agente económico (“os elementos genéricos referidos nas alíneas a), c) e d) do número anterior que entrem na composição de uma marca [ou seja, os sinais constituídos, exclusivamente, por indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica, a época ou meio de produção do produto ou da prestação do serviço, ou outras características dos mesmos] não serão considerados de uso exclusivo do requerente (…)”).  Assim sendo, a incorporação da proveniência geográfica “serra da estrela” em ambos os sinais não é relevante para este efeito.
A isto acresce que a marca registanda utiliza a expressão conjugada “cabaz da serra da Estrela” e não apenas a proveniência geográfica “Serra da Estrela”, pelo que, do ponto de vista nominativo, o sinal registando também acrescenta um elemento de diferenciação.
Por outro lado, a componente figurativa dos sinais é bastante distinta, quer em termos gráficos, quer em termos de cor (sendo a marca registanda monocromática, contrariamente ao que sucede com as marcas prioritárias).
Do ponto de vista da impressão de conjunto, os sinais são sensivelmente diferentes.
Em face de tudo o exposto – i) utilização, no sinal registando, da expressão “cabaz da Serra da Estrela”, ii) existência de elementos figurativos distintos e iii) impressão global distinta, – consideramos que, in casu, não se verifica risco de confusão ou associação da marca registanda com a marca prioritária.”
A subsunção efetuada pelo tribunal a quo, por se mostrar conforme ao regime legal citado, merece a nossa concordância.
Efetivamente, no que diz respeito à alegada apropriação da denominação geográfica territorial, não podemos deixar de referir que as citadas normas legais apenas afastam a possibilidade do seu uso quando não acompanhadas de outros elementos, o que, como resulta da matéria de facto provada, não se verifica no caso que nos ocupa.
Aliás, as marcas da Recorrente são a prova de que tal uso, quando acompanhado de outros elementos, é suscetível de integrar o respetivo sinal.
Por sua vez, o respetivo uso exclusivo, sendo uma exceção, só pode ter lugar quando, na prática comercial, os sinais tiverem adquirido eficácia distintiva, o que, atenta a factualidade apurada, manifestamente não se mostra demonstrado. 
Por último, também não podemos deixar de assinalar que as marcas da Recorrente “conviveram” com uma marca do Recorrido, a que consta do facto 5, até 7 de junho de 2023, data em que operou a caducidade, sendo esta semelhante à que estamos agora a analisar.
No mais, ou seja, no que diz respeito à “imitação da marca”, são efetivamente diversos os elementos figurativos e nominativos; no caso do primeiro elemento a diferença é exponencial, quer ao nível dos gráficos/figura quer das cores, assim como no segundo elemento com o acréscimo da expressão “cabaz”, que precede a expressão “Serra da Estrela”, comum aos diversos sinais.
Acresce referir que “cabaz” significa “cesto de juncos de diferentes formas, geralmente com tampa e asas; caixa de verga ou de cana, forrada com lata para transporte de comida” (cfr. Dicionário da Língua Portuguesa Universal, Texto Editora, pág. 252), o que, aliado à expressão comum direciona o respetivo sentido para produtos alimentares da região, enquanto que os sinais prioritários se mostram incomparavelmente mais amplos, desde logo porque não acrescentam qualquer referência a determinados produtos, seja em termos de vocábulo seja de imagem.
Dito isto, temos de concordar que as semelhanças existentes, ou seja, a expressão “Serra da Estrela”, são exponencialmente eclipsadas por aquelas diferenças, no caso, a imagem, a fonética e mesmo a conceptual.
Entendemos ainda que estes elementos, tendo em consideração o consumidor tipo a que se destinam, assumem maior preponderância que as semelhanças assinaladas, desde logo por serem mais facilmente retidos na memória do consumidor médio de produtos assinalados pelas marcas aqui em análise, porquanto apreendidos pela visão e audição.
 Mais relevante, como disso também deu conta a sentença, temos a diversa impressão de conjunto, pois no seu todo, aos olhos daquele consumidor, medianamente informado, manifestamente estamos perante sinais diversos que excluem a existência de risco de confusão ou mesmo de associação.
Aliás, a respeito da impressão de conjunto, o TJUE (C-251/95, SABEL, C-39/97, CANON) decidiu que “a comparação entre sinais deve fazer-se, essencialmente, através de uma impressão de conjunto, sem dissecação de pormenores, pois o consumidor médio apreende normalmente uma marca como um todo, não procedendo a uma análise das suas diferentes particularidades ou detalhes.” (Ac RL de 20-12-2017, Proc. Nº 271/17.3YHLSB.L1-7, www.dgsi.pt e Pedro Sousa e Silva, Direito Industrial, p. 253).
Acresce ainda a circunstância de habitualmente o consumidor não ser confrontado em simultâneo com as duas marcas para as poder comparar, pelo que, quando se vê confrontado com uma das marcas, tendo reminiscências na memória da outra marca, importa aquilatar se conseguirá, no imediato, distingui-las. 
Nessa medida, também se verifica a imitação de uma marca quando “tendo-se à vista apenas a marca a constituir, se deva concluir que ela é susceptível de ser tomada por outra de que se tenha conhecimento.” (cfr. Ac. RL de 24 de junho de 2014, proc. N.º 1021/08.0TYLSB.L1-7, in www.dgsi.pt).
Entendemos, pois, que apesar das semelhanças assinaladas às marcas em confronto, existem elementos diversos de maior impacto ao nível da “audição” e mesmo da “visão” que, em termos globais, originam um afastamento entre elas, suscetíveis de transmitir uma impressão diversa que, mesmo um consumidor médio normalmente distraído em relação aos pormenores, impossibilita a associação da marca da Recorrente com a marca do Recorrido.
Efetivamente, aquelas diferenças, analisadas no conjunto do sinal, afastam o risco de o consumidor ser induzido em confusão com os produtos da Apelante, mesmo que, como pode ocorrer, se esteja perante produtos idênticos/afins.
Dito de outra forma, os sinais das marcas em análise são suficientemente diversos, em termos de apreciação de conjunto, que possibilitam ao consumidor médio a que se destinam os produtos, mesmo quando na presença de apenas um deles, distingui-los, não existindo, pois, o risco de associação destas.
Finalmente, entendemos que o dito consumidor, perante qualquer uma das marcas em análise, mesmo com a expressão comum, retenha uma mancha diversa (azul com o símbolo da neve Vs cinzento/castanho com a imagem de um cesto com uma estrela e montanhas) e, assim, não associe os produtos de uma à outra.
Por último, perante a alusão efetuada pela Recorrente à figura da marca notória, ainda que o tenha feito de forma pouco direcionada, não podemos deixar de recordar que não se mostra provada qualquer factualidade suscetível de fazer intervir o regime legal previsto no artigo 234.º do CPI, ou seja, a respetiva notoriedade da marca/ sinal.
Na verdade, nenhuma alusão ali é feita ao nível quantitativo do respetivo conhecimento, de modo a considerar aquela como notória, sendo certo que não podemos confundir o conhecimento generalizado da «Serra da Estrela», enquanto região do nosso país, sobejamente conhecida pelos seus 1993 metros de altitude, com o conhecimento da marca em análise.    
Por todo o exposto, ao abrigo do artigo 208.º do CPI, entendemos que deve ser concedido o mencionado registo da marca n.º 706500
                        ,
mantendo-se assim as decisões do INPI e do Tribunal a quo.
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IV - Decisão
            Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente (artigo 527.º do CPC).
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Lisboa, 19 de junho de 2024
           
Bernardino Tavares
Armando Manuel da Luz Cordeiro
Carlos M. G. de Melo Marinho