Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
375/19.8GALNH.L1-3
Relator: MARIA PERQUILHAS
Descritores: PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
ROUBO
SEQUESTRO
VIOLAÇÃO
CO-AUTORIA
PENA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/04/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: De acordo com o princípio da livre apreciação da prova que domina o nosso sistema, por oposição ao regime da prova legal, não existem normas que determinam o valor ou a eficácia probatória a atribuir a cada meio de prova, com exceção das perícias, cujo valor, no caso, não foi infirmado pelos arguidos.
Nessa medida a atribuição de maior força a um meio de prova depende apenas da convicção do julgador, desde que se mostre de acordo com a experiência comum.
O Tribunal a quo é sempre o que se encontra mais apto para apreciar a prova, pois é este que ouve e vê as testemunhas, as suas reações, as suas pausas, os seus gestos.
O local e o momento onde por excelência se aferem e podem ser apreciadas valorativamente e criticamente as provas, é a audiência e julgamento em que o julgador dispõe de melhores condições para apreciar de perto a prova que se vai produzindo (princípio da imediação da prova), ou a falta dessa prova.
Estamos pois em sede de um certo poder discricionário do Juiz, que “só pode ser atacado em função de vícios típicos endógenos da sentença ou erros de direito, ou claros erros de julgamento”, os quais no caso presente não existem.
Existe coautoria quando se verifica a existência de um acordo e plano prévio engendrado pelos arguidos para obterem a satisfação do que inicialmente pretendiam, independentemente do que fosse necessário fazer, até mesmo tirar a vida aos ofendidos
Significa, assim, que não é de cúmplice a atuação do arguido, mas sim de co-autor, tendo ambos praticado os factos de comum acordo, pese embora um praticasse uns factos e o outro praticasse outros.
Na determinação da medida da pena  de acordo com a medida da culpa, a prevenção geral tem de se traduzir em prevenção positiva, de integração, ressocializadora e de reforço da consciência jurídica comunitária, do seu sentimento de segurança e força da lei face à sua violação, e a prevenção especial, enquanto relacionada com o agente do crime, materializa-se e há de ser adequada a exercer a sua função (re)socializadora.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO
1 – R________ e BMPC________ foram julgados e condenados, tendo-se decidido, por acórdão de 10 de julho:
Pelo exposto, acordam as Juízes que compõem este Tribunal Colectivo em julgar parcialmente procedente, por parcialmente provada a acusação e, em consequência, decidem:
1 - Absolver o arguido R________ das agravantes previstas nas alíneas a) e b) do n.° 2 do art. 210°, por remissão para a alínea
f) do n.° 2, do art. 204°, ambos do Código Penal, no que respeita ao crime de roubo cometido em 30-07-2019.
2 - Absolver os arguidos BMPC________ e R________ das agravantes previstas nas alíneas a) e b) do n.° 2 do art. 210°, por remissão para a alínea f) do n.° 2, do art. 204°, ambos do Código Penal, no que respeita ao crime de roubo cometido em 13-08-2019.
3 - Absolver os arguidos BMPC________ e R________ da agravante prevista na alínea b) do n.° 2 do art. 158° do Código Penal, no que respeita ao crime de sequestro cometido em 13-08-2019.
4 - Absolver os arguidos BMPC________ e R________ da qualificativa prevista na alínea h) do n.° 2 do art. 132° do Código Penal.
5 - Absolver os arguidos BMPC________ e R________ da prática, em co-autoria material, de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo art. 86°, n.° 1, al. c) do NRJAM.
6 - Absolver os arguidos BMPC________ e R________ da prática, em co-autoria material, de dois crimes de omissão de auxílio, previstos e puníveis pelo art. 200°, n°s. 1 e 2 do Código Penal.
7 - Condenar o arguido BMPC________ pela prática, em co-autoria material, e em concurso efectivo de:
a) - um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal, cometido em 13-08-2019, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão.
b) - um crime de sequestro, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n.° 1 do Código Penal, cometido em 13-08-2019, na pena de 6 (seis) meses de prisão.
c) - um crime de roubo agravado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 210°, n°s. 1 e 2, als. a) e b), com referência ao art. 204°, n°s. 1, als. e) e f) e 2, al. f) , ambos do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 5 (cinco) anos de prisão.
d) - um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal (desagravado em razão do valor diminuto), cometido em 25-082019, na pena de 3 (três) anos de prisão.
e) - um crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n°s. 1 e 2, als. b) e e) do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 3 (três) anos de prisão.
f) - um crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n°s. 1 e 2, al. b) do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 3 (três) anos de prisão.
g) - um crime de homicídio qualificado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 131° e 132°, n°s. 1 e 2, als. c) e g), ambos do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 22 (vinte e dois) anos de prisão.
h) - um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelos arts. 131°, 132°, n°s. 1 e 2, al. g), 22° e 23°, todos do Código Penal, com a agravação prevista no art. 86°, n.° 3 do Novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.° 5/2006, de 23-02, na redacção da Lei n.° 17/2009, de 06-05, cometido em 25-08-2019, na pena de 15 (quinze) anos e 6 (seis) meses de prisão.
i) - um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art. 86°, n.° 1, al. c) do Novo Regime Jurídico das Armas e Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.° 5/2006, de 23-02, com as alterações introduzidas pelas Leis n.° 59/2007, de 0409, n.° 17/2009, de 06-05, n.° 26/2010, de 30-08, n.° 12/2011, de 27-04, e n.° 50/2013, de 24-07, na redacção vigente à data dos factos, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão.
8 - Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas ao arguido, condenar o arguido BMPC________, na pena única de 25 (vinte e cinco) anos de prisão.
9 - Condenar o arguido R________ pela prática, em concurso efectivo de:
a) - em autoria material, um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal (desagravado em razão do valor diminuto), cometido em 30-07-2019, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.
b) - em co-autoria material, um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal, cometido em 13-08-2019, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão.
c) - em co-autoria material, um crime de sequestro, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n.° 1 do Código Penal, cometido em 13-08-2019, na pena de 6 (seis) meses de prisão.
d) - em co-autoria material, um crime de roubo agravado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 210°, n°s. 1 e 2, als. a) e b), com referência ao art. 204°, n°s. 1, als. e) e f) e 2, al. f), ambos do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 5 (cinco) anos de prisão.
e) - em co-autoria material, um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal (desagravado em razão do valor diminuto), cometido em 25-08-2019, na pena de 3 (três) anos de prisão.
f) - em autoria material, um crime de violação, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 164°, n.° 1, al. a) do Código Penal, na redacção vigente à data dos factos, cometido em 25-08-2019, na pena de 5 (cinco) anos de prisão.
g) - em co-autoria material, um crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n°s. 1 e 2, als. b) e e) do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 3 (três) anos de prisão.
h) - em co-autoria material, um crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n°s. 1 e 2, al. b) do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 3 (três) anos de prisão.
i) - em co-autoria material, um crime de homicídio qualificado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 131° e 132°, n°s. 1 e 2, als. c) e g), ambos do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 22 (vinte e dois) anos de prisão.
j) - em co-autoria material, um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelos arts. 131°, 132°, n°s. 1 e 2, al. g), 22° e 23°, todos do Código Penal, com a agravação prevista no art. 86°, n.° 3 do Novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.° 5/2006, de 23-02, na redacção da Lei n.° 17/2009, de 06-05, cometido em 25-08-2019, na pena de 15 (quinze) anos e 6 (seis) meses de prisão.
l) - em co-autoria material, um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art. 86°, n.° 1, al. c) do Novo Regime Jurídico das Armas e Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.° 5/2006, de 23-02, com as alterações introduzidas pelas Leis n.° 59/2007, de 04-09, n.° 17/2009, de 06-05, n.° 26/2010, de 30-08, n.° 12/2011, de 27-04, e n.° 50/2013, de 24-07, na redacção vigente à data dos factos, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão.
10 - Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas ao arguido, condenar o arguido R________  , na pena única de 25 (vinte e cinco) anos de prisão.
11 - Julgar parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização civil deduzido pela assistente/demandante IB____; e, em consequência, condenar os arguidos/demandados BMPC________ e R________, solidariamente, a pagar à assistente/demandante, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos, a quantia de € 100.000,00 (cem mil euros), acrescida de juros desde a data da presente decisão, à taxa legal de 4%, ou à taxa legal que vier a vigorar até integral pagamento, e a quantia de € 50.659,98 (cinquenta mil seiscentos e cinquenta e nove euros e noventa e oito cêntimos) a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos pela assistente/demandante, acrescida de juros a contar da data em que se considera efectuada a notificação dos arguidos/demandados para contestar o pedido de indemnização civil, à taxa legal de 4 %, ou à taxa legal que vigorar até integral pagamento.
12 - Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central, E.P.E.; e, em consequência, condenar os arguidos / demandados BMPC________ e R________   , solidariamente, a pagar ao demandante a quantia de € 50.580,99 (cinquenta mil quinhentos e oitenta euros e noventa e nove cêntimos), acrescida de juros a contar da data em que se considera efectuada a notificação dos arguidos/demandados para contestar o pedido de indemnização civil, à taxa legal de 4%, ou à taxa legal que vigorar até integral pagamento.
13 - Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, E.P.E.; e, em consequência, condenar os arguidos / demandados BMPC________ e R________   , solidariamente, a pagar ao demandante a quantia de € 8.442,58 (oito mil quatrocentos e quarenta e dois euros e cinquenta e oito cêntimos), acrescida de juros a contar da data em que se considera efectuada a notificação dos arguidos/demandados para contestar o pedido de indemnização civil, à taxa legal de 4%, ou à taxa legal que vigorar até integral pagamento.
14 - Julgar procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante Centro Hospitalar do Oeste, E.P.E.; e, em consequência, condenar o arguido / demandado BMPC________, a pagar ao demandante a quantia de € 7.387,18 (sete mil trezentos e oitenta e sete euros e dezoito cêntimos), acrescida de juros a contar da data em que se considera efectuada a notificação do arguido/demandado para contestar o pedido de indemnização civil, à taxa legal de 4%, ou à taxa legal que vigorar até integral pagamento.
15 - Condenar os arguidos em 4 Ucs de taxa de justiça, e nas custas, incluindo as custas dos pedidos de indemnização civil, sendo os honorários à Ilustre Defensora nomeada em conformidade com a Tabela em vigor.
16 - Ao abrigo do disposto no art. 109° do Código Penal, declarar perdidos a favor do Estado as abraçadeiras, arma de fogo, reprodução de arma de fogo e faca de cozinha apreendidas, determinando a sua oportuna destruição após trânsito em julgado da presente decisão.
17 - Após trânsito em julgado da presente decisão determinar o cumprimento do disposto no art. 8°, n.° 2 da Lei n.° 5/2008, de 12-02.
Inconformados com a decisão vieram os mesmos interpor o recurso, apresentando as seguintes transcritas conclusões:
O arguido R________  :
I - O presente recurso vem do douto acórdão proferido nos autos supra mencionados, o qual condenou o arguido pela prática, em concurso efectivo de:
a) Em autoria material, um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1 do CP, cometido em 30.07.2019, a 1 ano e 6 meses de prisão;
b) Em co-autoria material, um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1 do CP, cometido em 13.08.2019, a 1 ano e 8 meses de prisão
c) Em co-autoria material, um crime de sequestro, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 158.º, n.º 1 do CP, cometido em 13.08.2019, a 6 meses de prisão
d) Em co-autoria material, um crime de roubo agravado, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1 e 2, als. a) e b), com referência ao artigo 204.º, n.ºs 1, als. e) e f) e n.º 2, al. f) do CP, cometido em 25.08.2019, a 5 anos de prisão
e) Em co-autoria material, um crime de roubo, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1 do CP, cometido em 25.08.2019, a 3 anos de prisão
f) Em co-autoria material, um crime de violação, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 164.º, n.º 1, al. a) do CP, na redação vigente à data dos factos, cometido em 25.08.2019, a 5 anos de prisão
g) Em co-autoria material, um crime de sequestro agravado, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 158.º, n.ºs 1 e 2, als. b) e e) do CP, cometido em 25.08.2019, a 3 anos de prisão
h) Em co-autoria material, um crime de sequestro agravado, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 158.º, n.ºs 1 e 2, als. b) e e) do CP, cometido em 25.08.2019, a 3 anos de prisão;
i) Em co-autoria material, um crime de homicídio qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, als. c) e g), do CP, cometido em 25.08.2019, a 22 anos de prisão:
j) Em co-autoria material, um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, als. g), 22.º e 23.º do CP, com a agravação prevista no artigo 86.º, n.º 3 do Novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.º 5/2006 de 23 de fevereiro com as alterações introduzidas pelas Leis n.º 59/2007 de 4 de setembro, n.º 17/2009 de 6 de maio, n.º 26/2010 de 30 de agosto, n,º 12/2011 de 27 de abril e n.º 50/2013 de 24 de julho na redação vigente à data dos factos, na pena de 2 anos e 3 meses de prisão;
k) Em co-autoria material, um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, al. c) do Novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.º 5/2006 de 23 de fevereiro na redação da Lei n.º 17/2009 de 06 de maio, cometido em 25.08.2019, a 15 anos e 6 meses de prisão
Em cúmulo jurídico foi o arguido condenado na pena única de 25 anos de prisão.
Foi ainda condenado, de forma solidária com o outro co-arguido, nos pedidos de indemnização cíveis formulados, nomeadamente:
d) Pela assistente, IB____, na quantia de € 100.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos; e a quantia de € 50.659,98 a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos;
e) Pelo centro Hospitalar Lisboa Central, EPE, na quantia de € 50.580,99; f) Pelo centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE, na quantia de € 8.442,58
II – O Recorrente desde já requer a V. Exas, que procedam à reapreciação de toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, nos termos do disposto no artigo 412.º, n.º 6 do CPP, a que corresponde a prova testemunhal aí recolhida e que se encontra gravada através de sistema integrado disponível na aplicação informática em uso no tribunal a quo, concretamente nas sessões de julgamento dos dias 16.06.2020, 23.06.2020 e 30.06.2020, uma vez que tal é justificável para que se possa comprovar que, relativamente aos factos de que vem acusado, o sentido da prova produzida vai em sentido contrário ao da decisão proferida. A prova produzida em sede de audiência de julgamento é manifestamente insuficiente para suportar a decisão proferida pelo tribunal “a quo”, ao que acresce o douto acórdão se encontrar ferido de ilegalidade enfermando do vício decisório de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, previsto no artigo 410.º, n.º 2 a) do CPP, bem como do vício de erro notório na apreciação da prova, estatuído pela alínea c) do mesmo preceito legal, violando assim o princípio “in dúbio pro reo”, princípio basilar do processo penal e uma decorrência do princípio da presunção de inocência, enquanto regra probatória, e tem como consequência o facto de caber à acusação carrear para o processo o material probatório, desonerando assim o arguido do ónus da prova da sua inocência. Em sede de audiência de julgamento, a acusação deve apresentar de uma forma concreta e precisa os fundamentos que criem no espírito do julgador a convicção de que as provas têm valor irrefutável, o que não aconteceu no caso vertente, quanto à prova que foi produzida.
III. O princípio da presunção de inocência do arguido e o seu corolário in dúbio pro reo demandavam uma decisão diversa da ora posta em crise. Não havendo, pois, prova sobre os factos descritos na douta acusação publica, impunha-se a avaliação dos elementos da prova indiciária existente à luz dos critérios legais e dos ensinamentos da Doutrina e da Jurisprudência, com a isenção e imparcialidade que as instâncias nos têm acostumado, sendo o seu objectivo a descoberta da verdade.
IV. A livre apreciação da prova comporta duas vertentes: Por um lado, o juiz decide segundo a sua íntima convicção, em face do rol de provas apresentadas no processo, em especial na audiência de julgamento, quer arroladas pela acusação, quer pela defesa, quer as que o tribunal decide oficiosamente conhecer; Por outro lado, essa convicção deve ser objectivamente formada com apoio em regras técnicas e de experiência, sem sujeição a cânones pré-estabelecidos. O princípio da livre apreciação da prova significa, quer a ausência de critérios legais predeterminantes do valor a atribuir às provas, quer a análise da prova produzida e examinada em audiência com base exclusivamente na livre valoração da sua convicção pessoal, reconduzível a critérios objectivos, susceptíveis de motivação e controlo.
V. Diversos aspectos de facto foram incorrectamente julgados e levam a que se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, e da violação do artigo 127.º do CPP com a consequente extração de conclusões que plasmou na matéria de facto provada que não têm assento razoável, nem lógico, na prova efectivamente produzida, verificando-se assim Erro de Julgamento. Iremos ainda suscitar matéria de direito, nomeadamente no que concerne aos conceitos de co-autoria e cumplicidade, a sua distinção, a sua aplicação, a excessividade da medida da pena.
VI. O tribunal a quo deu, designadamente, como provado que:
“18. Face a este conhecimento, em data não concretamente apurada mas anterior ao dia 25 de agosto de 2019, o arguido BMPC________ decidiu, em conjunto com o arguido R________ – amigo do arguido BMPC________, que se encontrava a pernoitar em sua casa desde data não concretamente apurada mas há alguns dias – delinear um plano para se introduzirem naquela habitação com o intuito de se apoderar de bens que aí encontrassem e que lhes interessassem, assumindo que exerceriam ameaça/violência física sobre os ofendidos caso necessário.”
“20. Assim, na execução do plano que previamente delinearam, na madrugada de dia 25 de agosto de 2019, em hora não concretamente apurada mas seguramente entre as 01h00 e as 05h00 da manhã, os dois arguidos abeiraram-se da casa dos ofendidos e o arguido BMPC________ começou a gritar “a minha mãe está a morrer, precisa de ajuda, precisa de água”
“23. Nesse momento, os dois arguidos entraram de rompante no interior da residência, sendo que o arguido R________ empunhava a aludida réplica de arma de fogo.”
“24. De imediato, começaram a perguntar pelo dinheiro e pelo ouro e, de seguida começaram a agredir ofendido, primeiro com murros e pontapés pelo corpo, e depois, designadamente, desferindo fortes pancadas com o punho da reprodução da arma na cabeça”
“29. Também nesse momento, perguntaram ao ofendido FO______ se tinha cofre e ele disse que sim, sendo que um dos arguidos o acompanhou ao cofre, constrangendo-o a abri-lo, sob ameaça da réplica da arma de fogo, e daí retirou moedas de ouro e, pelo menos, cerca de € 4.000,00 em notas de € 20,00.”
“30. Depois, ainda perguntaram ao ofendido se tinha alguma arma e como este respondeu positivamente, foram busca-la e apropriaram-se dela, sendo que, a partir desse momento, o arguido BMPC________passou a empunhar essa pistola, de marca Tanfoglio, modelo GT 27, calibre 25 (6.35mm Browning), com o número de série rasurado e devidamente municiada”
“35. Acto contínuo, despiu-se da barriga para baixo, rasgou as cuecas e o soutien da ofendida, deitou-se em cima dela e penetrou-a com o pénis erecto na vagina, não se tendo apurado se ejaculou no seu interior.”
“37. De seguida, o arguido R________ vestiu-se e levou a ofendida novamente para a sala, onde estavam o arguido BMPC________ e o ofendido FO______ que sangrava abundantemente.”
“39. Decidiram ainda que teriam de pôr fim à vida dos ofendidos, para evitar que estes viessem a denunciar os crimes por si praticados”
“41. Dirigiram-se então naquele veículo a uma zona isolada de eucaliptal, em São Bartolomeu dos Galegos, tiraram os ofendidos do carro e:
- ordenaram ao ofendido FO______ que se ajoelhasse – desconhecendo-se se voltaram a agredi-lo – e ali o abandonaram, perfeitamente conscientes das violentas agressões que lhe tinham infligido em todo o corpo e sobretudo na cabeça, que haviam provocado ferimentos com abundante sangramento e crentes que, face à parte do corpo envolvida e ainda à idade avançada da vítima, tais ferimentos eram idóneos a provocar-lhe a morte;
- a alguns metros de distância, ordenaram à ofendida que se ajoelhasse, e o arguido BMPC________, empunhando a pistola de marca Tanfoglio, modelo GT 27, calibre 25 (6.35 mm Browning), com o número de série rasurado e devidamente municiada – efectuou um disparo – que a atingiu na cabeça concretamente na zona parietal direita, causando-lhe de imediato perda de sentidos, bem sabendo que um disparo de arma de fogo na cabeça é idóneo a provocar o resultado morte;”
“43. Em consequência da conduta dos arguidos sofreu a ofendida IB____, além de fortes dores e mal estar, diversos hematomas e escoriações em todo o corpo, sobretudo nos membros inferiores e uma ferida incisa parietal do lado direito – provocada pelo disparo da arma de fogo e que implicou que fosse submetida a cirurgia urgente para retirar o projéctil que se encontrava alojado na cabeça (craniectomia parietal direita), apresentando igualmente à data da entrada (25.08.2019) no Hospital de Santa Maria em Lisboa, as seguintes lesões no corpo e saúde:
- Cefaleia intensa e défice visual; ⎯Desorientação;
- Hemianopsia hománima esquerda e lentificação motora no hemicarpo esquerdo;
- Ferida inciso-contusa, infracentimétrica, occipital direita; - Erosões em ambos os punhos, circulares;
- Membros inferiores com múltiplas escoriações lineares nos pés, tornozelos e região pré-tibial;
- Projéctil metálico de arma de fogo, com um trajecto descendente desde a zona parietal direita(porta de entrada), passando pela transição temporo occipital, através da tenda do cerebelo, até ao hemisfério cerebeloso direito;
- Humor depressivo de tonalidade ansiosa”
“44. Tais lesões, demandaram-lhe 145 dias de doença, sendo os primeiros 40 com afectação da capacidade de trabalho, geral e profissional.”
“45. Ainda em consequência da conduta do arguido R________ descrita em 33 a 36, sofreu a ofendida IB______ uma lesão traumática na zona genital – área escoriativa no vestíbulo da vulva na zona comissura posterior, lesão que demandou 3 dias para a cura”
“49. Por via deste quadro clínico, irrecuperável independentemente dos tratamentos médicos a que foi submetido, com as lesões melhor descritas e sequelas irreversíveis, determinaram que o ofendido FO______ tivesse permanecido em estado vegetativo até à data da sua morte, em 12 de dezembro de 2019, no Hospital Distrital de Torres Vedras.”
“50. Tais lesões e sequelas, designadamente o traumatismo craneo-encefálico que sofreu por via da actuação supra descrita nos pontos 24 a 42, por banda dos arguidos, foi causa directa e necessária da morte que lhe sobreveio no dia 12 de dezembro de 2019.”
“59. Já no interior da residência, ao agredir brutalmente o ofendido e ao empunhar e apontar aos ofendidos FO______ e IB______ – num primeiro momento e num segundo momento, uma réplica de arma de fogo e uma arma de fogo, tiveram sempre intenção de os constranger a entregarem-lhes dinheiro, ouro, telemóveis, cartões multibanco e uma arma de fogo, dos quais queriam e conseguiram apropriar-se.”
“63. Por fim, os arguidos agiram com o propósito claro de matar os ofendidos, o que efectivamente lograram conseguir quanto à pessoa de  FO______ bem sabendo que as suas condutas, atentos os instrumentos usados e as zonas visadas pelos golpes e efectivamente atingidas, eram aptas a produzir tal resultado, o que quiseram, tudo com o intuito de encobrirem os outros crimes e de facilitar a sua fuga, não se abstendo, no caso da ofendida IB____, de utilizar para o efeito uma arma de fogo”
“70. Em consequência da conduta dos arguidos/demandados, a assistente/demandante sofreu fortes dores e mal estar, diversos hematomas e escoriações em todo o corpo, sobretudo nos membros inferiores e uma ferida incisa parietal do lado direito – provocada pelo disparo da arma de fogo e que implicou que fosse submetida a cirurgia urgente para retirar o projéctil que se encontrava alojado na cabeça (craniectomia parietal direita), apresentando igualmente à data da entrada (25.08.2019) no Hospital de Santa Maria em Lisboa, as seguintes lesões no corpo e saúde:
- Cefaleia intensa e défice visual;
- Desorientação;
- Hemianopsia hománima esquerda e lentificação motora no hemicarpo esquerdo;
- Ferida inciso-contusa, infracentimétrica, occipital direita;
- Erosões em ambos os punhos, circulares;
- Membros inferiores com múltiplas escoriações lineares nos pés, tornozelos e região pré-tibial;
- Projéctil metálico de arma de fogo, com um trajecto descendente desde a zona parietal direita(porta de entrada), passando pela transição temporo occipital, através da tenda do cerebelo, até ao hemisfério cerebeloso direito;
- Humor depressivo de tonalidade ansiosa”
“72. Em consequência da conduta do arguido/demandado R________ supra descrita em 33 a 36, a assistente/demandante sofreu uma lesão traumática na zona genital – área escoriativa no vestíbulo da vulva na zona comissura posterior, lesão que demandou 3 (três) dias para a cura”
“73. A assistente/demandante encontra-se livre de perigo de viuda, porém continua a sofrer de hemianopsia esquerda à confrontação, cefaleias na calote craniana, humor depressivo de tonalidade ansiosa, insónia, ataxia na marcha, perturbação de stress pós traumático, défice visual de novo 8visão turva), diminuição da acuidade visual no campo visual esquerdo, sendo ainda desconhecida a total extensão das lesões sofridas e as eventuais sequelas que poderão subsistir, sendo para já previsível que a mesma fique gravemente afectada, pelo menos, na visão periférica.”
“75. A assistente/demandante irá necessitar de acompanhamento médico e de recorrer de forma regular a tratamentos de fisioterapia, de oftalmologia e das especialidades de psiquiatria e psicologia.”
“80. Em consequência da actuação dos arguidos/demandados a assistente/demandante viveu momentos de grande terror, incerteza e pânico, tendo a prévia noção que iria ser executada com um tiro na cabeça e que iria morrer, e sofreu fortes dores, que ainda persistem.”
“107. Em julho de 2019, o arguido convidara o co-arguido R________ que conhecera recentemente, para habitar no seu agregado familiar, uma vez que este se encontraria numa condição de alegada vulnerabilidade na sequência de uma recente separação afectiva. O arguido tinha por hábito, ainda que contra a vontade da progenitora, permitir a residência temporária de pessoas em situação de vulnerabilidade social num espaço anexo à habitação familiar, por alegadamente se sentir bem a apoiar pessoas com problemáticas pessoais e sociais.”
“136. O arguido mantinha uma relação de amizade e proximidade com o co-arguido, nutrindo por este um sentimento de gratidão pelo facto de o mesmo lhe ter dado abrigo em sua casa aquando da ruptura da relação afectiva com a sua última companheira, tendo iniciado a sua relação de amizade nessa altura.”
“141. De acordo com o relatório social “ao nível das relações interpessoais que estabelece, o arguido revela imaturidade e tendência para ser permeável a grupos de pares, evidenciando ser um indivíduo facilmente influenciável.”
“142. Do certificado de registo criminal do arguido R________ nada consta.”
VII. Assim, o arguido ora recorrente e a assistente prestaram as suas declarações nos dias 16.06.2020 e 11.10.2019 (estas no âmbito de declarações para memória futura):
VIII. A prova produzida correspondente às declarações da ofendida/assistente encontram-se transcritas nos autos e foram ouvidas em sede de audiência de discussão e julgamento.
XIX. Das declarações do arguido e do depoimento da ofendida/assistente não se retira qualquer indício do facto dado como provado em 18.
X. Da mesma forma, não poderia ter sido dado como provado o facto descrito em 20 quando refere “(…) do plano que previamente delinearam(…)”
XI. O facto dado como provado em 23, com o devido respeito que é muito, só pode ter sido fruto de imaginação já que a ofendida/assistente, é peremptória em afirmar que não se apercebeu quem levava o quê na mão. De facto, na transcrição das declarações para memória futura, página 28:
“Juiz de Direito: - Tem a ver com o tiro. Não faz mal. Era um revólver. Quem é que o tinha na mão?
IB____: - Eu isso não sei, não posso precisar porque um tinha o revólver, o outro tinha uma faca. Percebeu? Uma faca com um bico, uma faca enorme, com um bico. Ele de vez em quando fazia assim. Percebeu? A tentar. Umas vezes era um que tinha a faca, outras vezes era o outro que tinha a pistola.”
O arguido negou que empunhasse a réplica da arma de fogo quando entraram em casa.
Não foi feita mais prova que levasse a concluir pelo facto provado em 23.
XII. Em 24, o acórdão recorrido refere que “(…) começaram a agredir o ofendido(…)”. A ofendida/assistente repetiu mais do que uma vez nas declarações para memória futura que o arguido ora recorrente nunca tocou, nunca agrediu o ofendido FrenandoFO______ pelo que, o facto dado como provado em 24 não podia estar escrito no plural pois que não há qualquer prova de que o arguido ora recorrente tenha agredido o ofendido  FO____.
Na transcrição das declarações para memória futura, página 28 e 29:
“Juiz de Direito: - O seu tio caiu logo?
IB____: - Exatamente. O meu tio foi ali, foi as grandes pancadas que o meu tio levou. Foi ali das primeiras grandes pancadas que o meu tio levou, ali.
Juiz de Direito: - Mas a senhora não viu quem as deu? IB______  - Não, não vi.”
Na transcrição das declarações para memória futura, página 30 e 31:
“Juiz de Direito: - Ou levantou-te? Conseguiu levantar-se?
IB______  Não, não. Não porque o R________ era líder. Praticamente não fez nada.
Percebeu? As mãos dele nada e só mandava o Pipocas fazer. O Pipocas era tudo aos murros, inicialmente. Inicialmente não tinha nada. Inicialmente era tudo aos murros à cabeça do meu tio, à testa do meu tio. O meu tio era só sangue. Percebeu?
Juiz de Direito: - E a senhora viu, viu isso? Viu o Pipocas a dar murros na cabeça do seu tio?
IB______  - Vi, vi.”
Na transcrição das declarações para memória futura, página 34 e 35:
“Juiz de Direito: - Lá no hall de entrada? IB______  - Sim.
Juiz de Direito: - Quando o seu tio abriu a porta? IB______  - Sim.
IB______  - E o Pipoca só dizia assim “seu cabrão, seu cabrão, toma, cabrão. Só me pagaste a seis euros à hora das batatas. Cabrão, cabrão, cabrão”.
Juiz de Direito: - Então não foi só o R________ que bateu no seu tio? IB______  - Não. Foi o Pipoca.
Juiz de Direito: - Desculpe. Foi o Pipoca? IB______  - Sim, sim.
Juiz de Direito: - Foi o Pipoca que bateu no seu tio? IB______  - Sim.”
(…)
“Juiz de Direito: - Obrigou-a a ajoelhar-se, a sentar-se no chão e depois amarrou-lhe as mãos?
IB______  - Exatamente, exatamente. Depois, depois foi sempre o Pipoca. Depois ele foi ter com o meu tio com a arma em punho, com a arma em punho. Foi ter com o meu tio e diz assim “fita-cola, tens fita-cola, tens fita-cola? Onde é que tu tens fita-cola, onde é que tu tens fita-cola?”. O meu tio levantou-se, ainda se conseguiu levantar, levou-o para a cozinha.”
Na transcrição das declarações para memória futura, página 45 e 46: “Juiz de Direito: - O Pipoca bateu no seu tio com as moedas?
IB______  - Sim. Juiz de Direito: - Entre os dedos?
IB______  - Sim. Juiz de Direito: - E em que local do corpo do seu tio?
IB______  - Em tudo. Na cabeça especialmente, aqui. Juiz de Direito: - No peito, está a apontar para o peito. IB______  - No peito, tudo.
Juiz de Direito: - E o que é que ele dizia enquanto fazia isso?
IB______  - “Cabrão, seu cabrão, cabrão, cabrão. Só me pagaste a seis euros, só me pagaste a seis euros à horas, as batatas. Noutro dia passei por ti, passei por ti, pedi-te cinco euros e tu fizeste conta que não era nada contigo. Cabrão, cabrão, cabrão”. Juiz de Direito: - E bateu-lhe?
IB______  - Aquilo era uma violência doida.”
Na transcrição das declarações para memória futura, página 61 e 62:
“Juiz de Direito: - Portanto a senhora quando regressou à sala depois da violação, o seu tio estava deitado no chão, a sangrar profundamente, olhou para si e chorou? IB______  - Sim.”
Na transcrição das declarações para memória futura, página 86:
“IB______  (…)E quando o Pipocas batia no meu tio, chamava o meu tio de cabrão, cabrão, que aquilo era raiva que ele tinha. Eu nunca tinha visto uns olhos com ódio. Eu vi aquilo numa pessoa com ódio. Foi uma coisa horrível. Eu vi aquilo por causa do meu tio ter dinheiro. Era isso.”
Na transcrição das declarações para memória futura, página 91:
“IB______  (…)Só que aquilo estava mais ou menos planeado. Deixar-nos os dois perto do hospital de Torres. Depois, de repente, de repente, um dizia assim “não”, dizia não sei o quê, qualquer coisa, e o outro, e o Pipocas fazia aquilo que queria. Percebeu?”
Na transcrição das declarações para memória futura, página 93:
“Procuradora: - Mas nas agressões ao senhor FO____, se o R________ esteve ou não, que eu acabei por não perceber bem, se teve ou não intervenção direta, física, nessas agressões. Se foi só o Pipoca e o R________ mandava.
IB______  - Isso eu não sei dizer propriamente isso.
Procuradora: - Mas das que a senhora viu?
IB______  - Daquelas que eu vi, daquelas que eu vi, tanto um como o outro estavam armados, mas quem bateu fisicamente, fisicamente, foi o Pipocas.”
XIII. Relativamente ao facto dado como provado em 29, não foram os arguidos que perguntaram ao ofendido pelos cofres e pelo dinheiro. Ficou claro, das declarações para memória futura da assistente que quem sempre perguntou por cofres, por dinheiro, por valores, por armas, foi o co-arguido BMPC________. Tal como no facto descrito em 30 e dado como provado. Mais uma vez não perguntaram, nem foram busca-la ou apropriaram-se. Não no plural! O co-arguido BMPC________ perguntou, foi busca-la, apropriou-se e passou a empunha-la a partir do momento em que a foi buscar. Até as declarações do co-arguido corroboram a versão da assistente.
XIV. Quanto ao facto dado como provado em 35, concretamente “penetrou-a com o pénis erecto”, a assistente foi peremptória em dizer que o arguido ora recorrente, tinha pouco apetite sexual. Na página 56 da transcrição das declarações para memória futura, a assistente declara:
“IB______  - Ele tentou penetrar, mas como ele não tinha grande apetite
 Juiz de Direito: - Não estava com o pénis suficientemente ereto para conseguir?
IB______  - Exatamente. Entrou, ele entrou. Mas ele não criou grandes lesões. Percebeu? É isso é que foi. Ele não criou grandes lesões. Pelo menos eu não me lembro. Eu não tenho a precisão porque eu quando cheguei ao Santa Maria, eu disse que tinha sido violada. Isto foi tudo, acho, para o instituto de medicina legal. Eles podem verificar se têm lá lesões ou não. Mas eu não me lembro. Só se eu desmaiei nessa altura, possivelmente.”
Tal relato não é compatível com o relatório de perícia de natureza sexual de fls 746 a 748 que refere a lesão encontrada, provocada por traumatismo de natureza contundente, podendo ser devida a agressão sexual com um pénis em erecção.
XV. Não há qualquer testemunho, qualquer declaração, qualquer depoimento que comprove a factualidade dada como provada em 39. Não há qualquer prova de que tenham decidido por termo à vida dos ofendidos.
 XVI. A factualidade dada como provada em 41, no que concerne ao ofendido FO______ é mera especulação. Não há qualquer fundamento para que o acórdão recorrido tenha chega do à conclusão e dando como provado que qualquer dos arguidos tenha mandado o ofendido FO_______ ajoelhar-se. O plural “ordenaram”, “abandonaram”. A assistente não sabe quem largou o ofendido. As declarações dos co-arguidos são contraditórias, mas, curiosamente o co-arguido BMPC________ afirmou que o ofendido FO______ estava a cerca de 7 metros da ofendida IB_______ sendo que era de noite, as luzes do carro estavam apagadas e só poderia saber a localização do ofendido caso tivesse sido ele próprio a deixá-lo lá.
No que concerne à factualidade descrita e dada como provada em 41 relativamente à ofendida IB_______ mais uma vez, o acórdão recorrido socorre-se do plural: “ordenaram”. Aqui, a assistente também foi coerente nas suas declarações dizendo que que foi o co-arguido BMPC________ a dar-lhe ordens.
Na página 108 da transcrição das declarações para memória futura, a assistente refere-se assim:
“IB______  - Sim, era o Pipocas que me dava ordens “para trás, para trás, para trás, para trás”.
Juiz de Direito: - E o R________ nessa altura não lhe dizia nada?
IB______  - Não. Porque é assim, como eu tinha, como eu estava, eu tinha uma manta à minha volta, tinha uma manta à minha volta, tinha dessas braçadeiras em plástico que me estava a furar”
Ainda na página 111 da mesma transcrição, a assistente refere:
“IB______  - Era o Pipocas. Desde o momento em que eles me tiraram do carro e me puseram em pé, que eu sei que me pus em pé. Acho que não foram eles, fui eu. Pelo menos é aquilo que me parece que me pus em pé. Era o Pipocas que me dava ordens. O outro nunca me deu ordens.”
É excessivo condenar o arguido, ora recorrente em co-autoria material pelo homicídio qualificado na forma tentada na pessoa de IB_______  A arma foi encontrada no decorrer do roubo em casa do ofendido, pelo que, não podiam os arguidos ter planeado em momento anterior matar com um tiro de arma qualquer dos ofendidos. Por outro lado, o arguido ora recorrente não sabia nem tinha como saber que o co-arguido BMPC________ iria disparar um tiro na cabeça da ofendida, pelo que também não tinha como o evitar.
Este entendimento leva-nos à questão da co-autoria e da cumplicidade, que explanaremos mais à frente.
Antes de mais, socorrendo-nos de alguma jurisprudência, o TRC de 20.06.2012 refere que: “O crime tentado não se basta com a negligência, exigindo a verificação do dolo, em qualquer das suas modalidades”
Não podendo prever o arguido ora recorrente que o co-arguido iria disparar um tiro na cabeça da ofendida, não poderemos afirmar que quanto ao recorrente existe dolo, pelo que, não existindo, também não existe o crime na forma tentada.
XVII. O facto 45, dado como provado, não o deveria ter sido. A assistente referiu expressamente:
“IB______  - Ele tentou penetrar, mas como ele não tinha grande apetite Juiz de Direito: - Não estava com o pénis suficientemente ereto para conseguir?
IB______  - Exatamente. Entrou, ele entrou. Mas ele não criou grandes lesões. Percebeu? É isso é que foi. Ele não criou grandes lesões. Pelo menos eu não me lembro. Eu não tenho a precisão porque eu quando cheguei ao Santa Maria, eu disse que tinha sido violada. Isto foi tudo, acho, para o instituto de medicina legal. Eles podem verificar se têm lá lesões ou não. Mas eu não me lembro. Só se eu desmaiei nessa altura, possivelmente.”
Mais, a perícia médico legal, embora tenha referido a existência de uma lesão traumática na zona genital – área escoriativa no vestíbulo da vulva na zona de comissura posterior, também refere que encontrou um hímen desfeito em retalhos, próprio e adequado à idade e actividade sexual normal de uma mulher de 53 anos. Assim, pese embora o crime de violação seja um crime hediondo, que aliás, o arguido confessou logo em sede de 1.º interrogatório, não há prova nem indícios de que a lesão encontrada tenha sido provocada pelo acto praticado pelo arguido recorrente.
XVIII. Relativamente aos factos dados como provados em 49 e 50, muito haverá a dizer. Não colocamos em causa que as lesões e sequelas determinaram que o ofendido FO______ tivesse permanecido em estado vegetativo até à data da sua morte. O que colocamos em causa é que o traumatismo crânio-encefálico que sofreu, foi causa directa e necessária da morte que lhe sobreveio no dia 12 de dezembro de 2019.
A verdade é que não foi realizada autópsia. O certificado de óbito de fls 1084, foi assinado pela Dra. Maria Almeida que, em sede de audiência de discussão e julgamento prestou depoimento na qualidade de testemunha no dia 30.06.2020, dizendo que não conhecia o doente, nunca o tivera acompanhado, a sua especialidade até é cirurgia, mas como estava de serviço e, apoiando-se no historial clínico, considerou que a causa da morte era o traumatismo crânio-encefálico.
Baseado neste certificado de óbito, foi realizada a perícia médico legal de fls 1313 e seguintes. Desta perícia ressaltam aspectos importantes, nomeadamente:
“Não foi realizada autópsia médico-legal que melhor poderia esclarecer e determinar a causa da morte.”
“No entanto, diante das graves lesões documentadas, que condicionam a vítima a um estado vegetativo, é frequente que quando estas não apresentam uma causa imediata e directa de morte pelas lesões traumáticas, a vítima acaba por morrer das complicações clínicas que inexoravelmente estão associadas a estas condições, como as pneumonias resultantes pelo quadro respiratório instalado ou agravado pelas lesões traumáticas”
XIX. O juízo pericial tem que constituir sempre uma afirmação categórica, isenta de dúvidas não integrando tal categoria, os juízos de probabilidade. Quando é referido que uma autópsia poderia esclarecer e determinar a causa da morte, estamos no campo das probabilidades. Quando é referido que “é frequente” estamos no campo da probabilidade, já que frequente não é uma afirmação categoria inequívoca do resultado morte.
XX. O nexo de causalidade que atribui à morte tem que ser uma afirmação categórica, isenta de dúvidas. Quando um perito, em vez de emitir um juízo técnico-cientifico claro e afirmativo, emite uma probabilidade, ou manifesta um estado de dúvida e aqui, o tribunal, ao decidir de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, deverá ter em consideração o principio basilar do indubio pro reo. Neste sentido Acórdão STJ de 05.11.1998, Acórdão TRP de 27.04.2011 e ainda Acórdão do TRP de 27.01.2010.
XXI. O risco de condenar alguém por homicídio sem a certificação da causa da morte por autópsia coloca na 1.ª linha a hipótese se erro judiciário. Há erro notório quando é dado como provado um facto quando a conclusão deveria ter sido contrária. A violação do princípio in dúbio pro reo, dizendo respeito a matéria de facto e sendo princípio fundamental em matéria de apreciação e valoração de prova com expressão constitucional ao nível dos direitos fundamentais, tem que ser considerado erro notório.
XXII. O facto dado como provado em 63 refere que os arguidos agiram com o propósito claro de matar os ofendidos. Fundamentado em quê? Os arguidos não tinham qualquer arma de fogo antes de entrarem na casa dos ofendidos. A intenção do arguido ora recorrente nunca foi matar.
XXIII. Os factos dados como provados em 70, são consequência directa do disparo do tiro de arma de fogo. Facto cometido pelo co-arguido BMPC________ e confessado pelo mesmo.
XXIV. Tal com as sequelas de que a ofendida ainda padece e que foram dadas como provadas em 73 e os tratamentos de fisioterapia e oftalmologia de que irá necessitar e que forma dados como provados em 75.
XXV. Relativamente ao facto dado como provado em 80, nomeadamente de que a ofendida teve perfeita noção de que iria ser executada, não há nem foi feita qualquer prova neste sentido.
XXVI. Em 107, foi dado como provado e bem, que o co-arguido BMPC________ gostava de convidar pessoas que se encontravam em situações vulneráveis para residirem em sua casa provisoriamente. Foi o que aconteceu ao convidar o arguido ora recorrente que estava de facto fragilizado e bastante vulnerável, sem ter um tecto onde dormir. Foi também provado que o ora recorrente nutria pelo co-arguido BMPC________ um profundo sentimento de gratidão por aquele lhe ter dado abrigo.
XXVII. Ficou ainda provado em 141 que o ora recorrente revela imaturidade e tendência para ser permeável a grupos de pares, evidenciando ser um individuo facilmente influenciável.
XXVIII. O tribunal a quo, quando o arguido admitiu que manteve relações sexuais com a ofendida contra a vontade desta mas que “não quis entrar em pormenores”, entendeu falta de ressonância afectiva e falta de qualquer sentimento de arrependimento. Falso! O arguido limitou-se apenas a gozar do direito de se remeter ao silêncio, sem que as sua “não declarações” possam ser entendidas ou usadas contra si. Esteve mal o tribunal a quo que utilizou este silêncio em prejuízo do arguido.
XXIX. O depoimento do arguido ora recorrente, bem como as declarações da ofendida foram coincidentes quando afirmaram que o co-arguido BMPC________ os iria levar ao hospital. Mas tal não aconteceu. Quem conduzia o veículo era o co-arguido BMPC________, a ofendida também não ouviu qualquer mudança de planos ou ordem para alteração de planos, pelo que a alteração do trajecto para o eucaliptal foi decisão unilateral do co-arguido BMPC________, o mesmo que sempre se preocupou com os vestígios e em limpar os vestígios.
XXX. A arma de fogo utilizada para disparar sobre a ofendida não tem qualquer impressão digital do arguido ora recorrente pois não lhe tocou, nem para a municiar nem para coisa nenhuma.
XXXI. Nas declarações para memória futura da assistente, há em nosso entender dois aspectos que sobressaíram à defesa do arguido ora recorrente. A primeira é que na descrição da cronologia referiu sempre que quem agrediu o ofendido FO______ foi sempre o co-arguido BMPC________. Que este, quando o agredia gritava “Cabrão, cabrão, só me pagaste a 5€ à hora”. Referiu ainda que viu ódio nos olhos de BMPC________. Se este relato parece coerente, já não o é quando refere que o arguido, ora recorrente é que era o líder. Disse a palavra líder 7 vezes, referindo-se ao arguido ora recorrente mas nunca concretizou. A única ordem que menciona que o arguido ora recorrente deu ao co-arguido BMPC________ nem foi espontânea, foi sim induzida pela Juiz de Instrução Criminal que perguntou: “E o que ele dizia? Dá-lhe? Bate-lhe mais?” Limitando-se a ofendida a dizer: “Sim, isso!”
XXXII. Antes de mais, as declarações para memória futura devem ser um relato cronológico dos acontecimentos, o mais aproximado possível, espontâneo, coerente, credível. O discurso não deve nem pode ser orientado, induzido. O papel do Juiz de Instrução Criminal não pode passar por substituir-se à declarante, colocando palavras na sua boca! Tendo o feito, não pode o tribunal valorar esta prova.
XXXIII. O nosso entendimento foi referido em sede de alegações finais. A assistente foi vítima, por parte do arguido, ora recorrente, do crime de violação. Possivelmente o crime mais humilhante que uma mulher pode ser vítima. Uma violação do seu corpo, da sua autodeterminação sexual, da sua dignidade, da sua honra. Por isso é também evidente para a defesa do arguido que a assistente direccione a sua raiva, a sua sede de justiça contra o ora recorrente. É natural, é compreensível, mas de facto o discurso da assistente não é coerente, quando adjectiva o arguido ora recorrente de líder sem conseguir enumerar uma situação sequer em que isso seja notório.
XXXIV. O tribunal a quo conclui erradamente quando refere: “Quanto à violência física exercida sobre o ofendido FO______ e à intenção de pôr termos à vida de ambos os ofendidos, das declarações da assistente resulta que tal violência foi praticada por ambos os arguidos” Com o devido respeito que é muito, das declarações da assistente não resulta esta conclusão. Não resulta que ambos tinham intenção de pôr termos à vida dos ofendidos. Não resulta que a violência física exercida sobre o ofendido tenha sido praticada por ambos os arguidos. A assistente foi peremptória em afirmar que só o BMPC________ agrediu o ofendido.
XXXV. O tribunal a quo fundamenta a necessidade de BMPC________matar a assistente com as declarações do próprio, quando este refere que foi o ora recorrente que levou o ofendido para dentro do eucaliptal e que quando regressou lhe disse: “Agora é a tua vez!”, todavia este facto não aconteceu desta forma. A própria assistente que descreve cronologicamente os factos não faz referência a este episódio, não relatando quem efectivamente leva o ofendido FO______ para dentro do eucaliptal. O co-arguido quer com isto dizer que foi o ora recorrente que levou e matou o ofendido para dentro do eucaliptal, escuro, sem nada se ver, mas sabendo bem que este ficou a 7 metros de distância, por que tem muita experiência da agricultura. Ora, este co-arguido sabia que o ofendido estava a 7 metros porque foi ele que lá o colocou, e foi também ele que disparou o tiro na ofendida.
XXXVI. O tribunal a quo baseou-se nestes depoimentos e sustentados nos elementos periciais e documentais para firmar a sua convicção quanto à co-autoria.
XXXVII. Assim, tendo por referência as passagens da prova produzida em julgamento, concretamente as que se indicaram supra, bem como a tríade encontrada entre todas que, em nosso entender foi mal construída na fundamentação do douto acórdão, concluímos que, pelo menos os pontos dos factos dados como provados nos pontos 18, 20, 23, 35, 39, 41, 45, 63, 72 e 80 no acórdão recorrido devem ser alterados devendo os mesmos serem considerados como factos não provados e, os factos dados como provados nos pontos 24, 29, 30, 41, 59, 70 e 73 deverão ser alterados e não deverão ser imputados ao arguido ora recorrente.
XXXVIII. Quanto à co-autoria e cumplicidade é importante proceder à sus distinção. A essência da co-autoria consiste em que cada comparticipante quer causar o resultado como próprio, mas com base numa decisão conjunta e com forças conjugadas. A cumplicidade diferencia-se da co-autoria pela ausência do domínio do facto. A cumplicidade traduz-se num mero auxílio, não sendo determinante da vontade dos autores nem participa na execução do crime, mas é sempre auxílio à prática do crime e nessa medida contribui para a prática do crime, é uma concausa da prática do crime.
XXXIX. Os elementos da comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria são os seguintes:
a) o objectivo, que consiste na intervenção directa na fase de execução do crime (execução conjunta do facto);
b) o subjectivo, isto é, o acordo para a realização conjunta do facto; acordo que não pressupõe a participação de todos na elaboração do plano comum de execução do facto; que não tem de ser expresso, podendo manifestar-se através de qualquer comportamento concludente; e que não tem de ser prévio ao início da prestação do contributo do respectivo co-autor;
c) O domínio funcional do facto, no sentido de “de ter e exercer o domínio positivo do facto típico” ou seja, o domínio da sua função, do seu contributo, na realização do tipo, de tal forma que, numa perspectiva ex ante, a omissão do seu contributo impediria a realização   do        facto    típico   na        forma  planeada.
XL. A essência da co-autoria consiste em que cada comparticipante quer causar o resultado como próprio, mas com base numa decisão conjunta e com forças conjugadas. A cumplicidade diferencia-se da co-autoria pela ausência do domínio do facto; o cúmplice limita-se a facilitar o facto principal, através do auxílio físico (material) ou psíquico (moral), situando-se esta prestação de auxílio em toda a contribuição que tenha possibilitado o facto principal ou fortalecido a lesão do bem jurídico cometida pelo autor.
XLI. Daqui resulta que a cumplicidade se traduz num mero auxílio, não sendo determinante da vontade dos autores nem participa na execução do crime, mas é sempre auxílio à prática do crime e nessa medida contribui para a prática do crime, é uma concausa da        prática            do        crime.
XLII. Assim, enquanto o co-autor tem um papel de primeiro plano, dominando a acção, já que esta é concebida e executada, com o seu acordo, inicial subsequente, expresso ou tácito, o cúmplice é um interveniente secundário ou acidental, isto é, só intervém se o crime for executado ou tiver início de execução e, além disso, mesmo que não interviesse, aquele sempre teria lugar, porventura em circunstâncias algo distintas. A sua intervenção embora seja concausa do crime praticado não é causal da existência da acção.
XLIII. O crime de homicídio qualificado na pessoa do ofendido FO______ não poderá ser imputado ao ora recorrente em co-autoria. Em primeira mão, deverá ser absolvido deste crime, pois não existindo autópsia não poderá haver prova irrefutável do nexo de causalidade entre as agressões de 25.08.2019 e o resultado morte em dezembro de 2019.
XLIV. Da mesma forma, o crime de homicídio qualificado na forma tentada na pessoa da ofendida IB______ não poderá ser imputado ao ora recorrente em co-autoria. Em primeira mão, deverá ser absolvido deste crime por não ter sido cometido por si. Em última análise poderia aceitar-se a cumplicidade.
XLV. O tribunal a quo aplicou ao arguido ora recorrente, no caso dos crimes de homicídio qualificado e homicídio qualificado na forma tentada as penas de 22 anos e de 16 anos de prisão.
No caso dos autos, o arguido tinha acabado de fazer 21 anos à data dos factos, não há antecedentes de qualquer tipo de crime, pelo que somos da opinião de que a atenuação especial da pena só poderá facilitar o propósito da ressocialização.
XLVI. Não foi tido em conta, a favor do arguido a ausência de antecedentes bem como o apoio familiar que é constante mesmo em contexto prisional, sendo o arguido frequentemente visitado pela mãe e pelo padrasto.
XLVII. Como se expôs supra, não há qualquer testemunho, depoimento, confissão ou qualquer outra prova que dissipe a dúvida de que o arguido cometeu todos os crimes de que vem acusado, em co-autoria. Toda a prova carreada para o processo e especialmente a que foi produzida em sede de audiência de julgamento, apontam em sentido contrário.
XLVIII. O arguido esteve presente durante as agressões do co-arguido ao ofendido FO______ bem como esteve presente quando o co-arguido efectuou o disparo na cabeça da assistente, mas não foi co-autor daquele.
XLIX. O douto acórdão recorrido violou assim os artigos 40.º, 70.º e 71.º do Código Penal
Nestes termos e nos demais, e com o mui douto suprimento de V. Ex.as, deve o presente recurso ser julgado procedente, fazendo-se assim, a acostumada e necessária justiça.
*
O arguido BMPC________
a) O Recorrente BMPC________     vem condenado pela prática de:
a) - um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210º, n.º 1 do Código Penal, cometido em 13-08-2019, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão.
b) - um crime de sequestro, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158º, n.º 1 do Código Penal, cometido em 13-08-2019, na pena de 6 (seis) meses de prisão.
c) - um crime de roubo agravado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 210º, nºs. 1 e 2, als. a) e b), com referência ao art. 204º, nºs. 1, als. e) e f) e 2, al. f), ambos do Código Penal,cometido em 25-08-2019, na pena de 5 (cinco) anos de prisão.
d) - um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210º, n.º 1 do Código Penal (desagravado em razão do valor diminuto), cometido em 25-08- 2019, na pena de 3 (três) anos de prisão.
e) - um crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158º, nºs. 1 e 2, als. b) e e) do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 3 (três) anos de prisão.
f) - um crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158º, nºs. 1 e 2, al. b) do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 3 (três) anos de prisão.
g) - um crime de homicídio qualificado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 131º e 132º, nºs. 1 e 2, als. c) e g), ambos do Código Penal, cometido em 25-08-2019, na pena de 22 (vinte e dois) anos de prisão.
h) - um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelos arts. 131º, 132º, nºs. 1 e 2, al. g), 22º e 23º, todos do Código Penal, com a agravação prevista no art. 86º, n.º 3 do Novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23-02, na redacção da Lei n.º 17/2009, de 06-05, cometido em 25-08-2019, na pena de 15 (quinze) anos e 6 (seis) meses de prisão.
i) - um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art. 86º, n.º 1, al. c) do Novo Regime Jurídico das Armas e Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23-02, com as alterações introduzidas pelas Leis n.º 59/2007, de 04- 09, n.º 17/2009, de 06-05, n.º 26/2010, de 30-08, n.º 12/2011, de 27-04, e n.º 50/2013, de 24-07, na redacção vigente à data dos factos, na pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão.
b) Operando o cúmulo jurídico das penas parcelares BMPC________, foi condenado na pena única de 25 (vinte e cinco) anos de prisão.
c) O ora Recorrente não se pode conformar com a qualificação do crime indicado em g) e consequentemente na pena aplicada.
d) No que respeita ao Ofendido FO______ o Tribunal a quo dá como provado, no que ao âmbito do recurso respeita, que:
“(…)
16 - O ofendido FO______ contava com 76 anos de idade e tinha diagnosticado um carcinoma (tumor maligno) na próstata, e a sua sobrinha e ofendida IB________ conta com 54 anos de idade, e residiam ambos na Rua Principal, n.º 28, Sobral da Lourinhã.
17 - O arguido BMPC_______ trabalhou já por conta do ofendido FO______ na realização de trabalhos agrícolas, conhecendo-o por isso e bem sabendo da existência de dinheiro e objectos de valor naquela residência. 18 - Face a este conhecimento, em data não concretamente apurada mas anterior ao dia 25 de Agosto de 2019, o arguido BMPC________ decidiu, em conjunto com o arguido R________ – amigo do arguido BMPC________, que se encontrava a pernoitar em sua casa desde data não concretamente apurada mas há alguns dias – delinear um plano para se introduzirem naquela habitação com o intuito de se apoderar de bens que aí se encontrassem e que lhes interessassem, assumindo que exerceriam ameaça/violência física sobre os ofendidos caso necessário. 19 - Para tanto, decidiram utilizar a réplica de arma de fogo do arguido R________ , a já referida “Denix”, com o n.º C78267, e de abraçadeiras de plástico, próprias para electricidade, estas com o intuito de amarrar os ofendidos se necessário. 20 - Assim, na execução do plano que previamente delinearam, na madrugada do dia 25 de Agosto de 2019, em hora não concretamente apurada mas seguramente entre as 01H00 e as 05H00 da manhã, os dois arguidos abeiraram-se da casa dos ofendidos e o arguido BMPC________ começou a gritar “a minha mãe está a morrer, precisa de ajuda, precisa de água”. 21 - O ofendido FO______ – que estava no seu quarto – reconheceu a voz do arguido BMPC________ e foi buscar um copo de água, dirigindo-se logo de seguida à porta da casa, abrindo-a.
(…)
23 - Nesse momento, os dois arguidos entraram de rompante no interior da residência, sendo que o arguido R________ empunhava a aludida réplica de arma de fogo. 24 - De imediato, começaram a perguntar pelo dinheiro e pelo ouro e, de seguida, começaram a agredir o ofendido, primeiro com murros e pontapés pelo corpo, e depois, designadamente, desferindo fortes pancadas com o punho da reprodução da arma na cabeça.
25 - De seguida, levaram os dois ofendidos para a sala e sentaram cada um deles num dos sofás, amarrando-lhes as mãos, à frente do tronco, com as abraçadeiras que tinham trazido consigo.
26 - De seguida, perguntaram ao ofendido FO______ se tinha fita adesiva e ele disse que estava na cozinha, altura em que o arguido R________  , sempre com a réplica de arma de fogo apontada à cabeça do ofendido, o conduziu à cozinha, para que aquele fosse buscar a fita. 27 - Na posse da fita adesiva, os arguidos reforçaram as amarrações dos punhos dos dois ofendidos.
28 - Entretanto, ordenaram ao ofendido FO______ que lhes entregasse os cartões Multibanco e lhes dissesse os respectivos códigos, sendo que aquele lhos entregou, apontando os códigos num papel, com receio pela sua integridade física.
29 - Também nesse momento, perguntaram ao ofendido FO______ se tinha cofre e ele disse que sim, sendo que um dos arguidos o acompanhou ao cofre, constrangendo-o a abri-lo, sob a ameaça da réplica da arma de fogo, e daí retirou moedas em ouro e, pelo menos, cerca de € 4.000,00 (quatro mil euros) em notas de € 20,00 (vinte euros).
30 - Depois, ainda perguntaram ao ofendido se tinha alguma arma e como este respondeu positivamente, foram buscá-la e apropriaram-se dela, sendo que, a partir desse momento, o arguido BMPC________ passou a empunhar essa pistola, de marca Tanfoglio, modelo GT 27, calibre .25 (6.35mm Browning), com o número de série rasurado e devidamente municiada.
31 - Também neste período de tempo, os arguidos constrangeram os ofendidos, sob ameaça, e empunhando a arma de fogo e a réplica de arma de fogo, a entregarem lhes os seus telemóveis e respectivos códigos.
32 - Os arguidos continuaram a exigir ao ofendido mais dinheiro, mediante ameaças e agressões, e ele ainda foi com o arguido R________ ao primeiro andar da habitação.
(…)
37 - De seguida, o arguido R________ vestiu-se e levou a ofendida novamente para a sala, onde estavam o arguido BMPC________ e o ofendido FO_____, que sangrava abundantemente.
38 - Nesse momento, os arguidos decidiram dirigir-se à garagem e apropriaram-se de um dos veículos do ofendido, de marca Peugeot, modelo 206, com a matrícula YY-YY-YY – cujo valor não foi possível apurar – e utilizaram-no para fugir do local.
39 - Decidiram ainda que teriam de pôr fim à vida dos ofendidos, para evitar que estes viessem a denunciar os crimes por si praticados.
40 - Na execução desse plano, decidiram amordaçar, e atar também os pés dos dois ofendidos e levá-los consigo no interior do veículo – o ofendido FO______ no interior do porta-bagagens e a ofendida IB______ no banco traseiro.
41 - Dirigiram-se então naquele veículo a uma zona isolada de eucaliptal, em São Bartolomeu de Galegos, tiraram os ofendidos do carro e: - ordenaram ao ofendido FO______ que se ajoelhasse – desconhecendo-se se voltaram a agredi-lo – e ali o abandonaram, perfeitamente conscientes das violentas agressões que lhe tinham infligido em todo o corpo e sobretudo na cabeça, que haviam provocado ferimentos com abundante sangramento e crentes que, face à parte do corpo envolvida e ainda à idade avançada da vítima, tais ferimentos eram idóneos a provocar-lhe a morte;(…)”.
e) A motivação do Tribunal a quo: “(…)
Quanto aos factos ocorridos no dia 25-08-2019, de que foram vítimas FO______ e IB____, admitiu parcialmente a comparticipação nos mesmos, sem demonstrar igualmente qualquer arrependimento sincero, limitando-se a verbalizar, sem ressonância afectiva, que «desejava pedir desculpa à família das vítimas»
(…)
Quanto ao pretexto encontrado para que o ofendido abrisse a porta e entrassem na residência, admitiu a factualidade imputada nos pontos 21 a 23 da acusação, referindo que apercebeu-se primeiro que não obstante a hora tardia existia iluminação no interior da casa, na sala e na cozinha. Referiu que o co-arguido R________ foi o primeiro a entrar na residência, tendo entrado logo de seguida, e que a ofendida gritava por socorro, tendo-lhe dito para ter calma, tendo a mesma ficado no hall de entrada. Confrontado com a factualidade imputada no ponto 24 da acusação, negou ter agredido o ofendido FO______ mencionando que o co-arguido R________ «deu uma chapada no ofendido, e disse-lhe para dizer a verdade, para dizer onde estava o dinheiro». Admitiu que amarrou os ofendidos no hall de entrada, e que depois o declarante e o co-arguido levaram os ofendidos para a sala, amarrados de pés e mãos; que o ofendido FO______ estava sentado no chão, junto ao sofá, dizendo que «ia morrer», tendo-lhe feito um curativo, referindo que quando amarrou o ofendido este tinha dois golpes na cabeça, deduzindo posteriormente que tinham sido feitos com o punho da arma, mencionando quando confrontado com as fotografias de fls. 663 que o co-arguido R________ ficou com o ofendido FO______ no local onde está a planta, não tendo o declarante visibilidade para essa zona estando no hall de entrada; que o co-arguido R________ agarrou os ofendidos para ajudar o declarante a amarrar e transportar os mesmos para a sala, mencionando expressamente numa demonstração da total ausência de ressonância afectiva e de indiferença pela dignidade da vida humana e pelo sofrimento alheios que «sentaram ambos confortavelmente no sofá». Referiu que o co-arguido deslocou-se à cozinha com o ofendido FO______ para ir buscar a fita adesiva, tendo ambos tapado a boca dos ofendidos com a fita-cola. Confrontado com os factos imputados no ponto 27 da acusação, admitiu a comparticipação nos mesmos, mencionando que «talvez tenha forçado um bocado», admitindo igualmente a comparticipação nos factos imputados nos pontos 28 e 29 da acusação, referindo que foi com o ofendido FO______ até ao cofre, tendo-lhe soltado os pés, levando a faca de cozinha apreendida no veículo, tendo aberto o cofre, onde se encontrava a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros), e a chave do outro cofre onde estava a arma de fogo, passando a partir dessa altura a utilizar a arma.
(…)
Assim, referiu que a ideia de levarem os ofendidos para o eucaliptal partiu do co-arguido R________  ; e que, quando ambos tiraram o ofendido FO______ da bagageira do veículo, onde este tinha ido deitado em cima de um cobertor, o ofendido tinha dois golpes na cabeça, não sangrava, estava consciente, com os olhos abertos, e andava pelo próprio pé.
(…)
Ficou com a ofendida IB______ junto ao veículo, mantendo as luzes da viatura ligadas; que passados cerca de seis/sete minutos chegou o co-arguido R________ , tendo-lhe perguntado onde se encontrava o ofendido, tendo aquele dito que «estava amarrado a uma árvore»; e que, «agora é a tua vez», tendo interpretado tal expressão como tendo que tirar a vida à ofendida IB_______ pensando que o ofendido FO______ já estava morto.(…)”.
f) Das declarações da Assistente e conforme consta da motivação do Douto Acórdão:
“(…)
Assim, a assistente começou por descrever as circunstâncias relacionadas com a entrada dos arguidos na residência, referindo que ouviu o seu tio, o ofendido FO_____, dizer que estava ali o «Pipoca», reportando-se ao arguido BMPC________, e que o mesmo estava a bater à porta e o ofendido ia buscar água, apercebendo-se de seguida da entrada de ambos os arguidos em casa, «um com uma pistola grande», «prateada, com umas coisas que até brilhava», mencionando que o tio caiu no hall de entrada, «foi as grandes pancadas que o meu tio levou», tendo o ofendido gritado, dizendo «levem tudo mas não nos façam mal», dirigindo-se nessa altura para a porta. A respeito das agressões de que o ofendido foi vítima referiu que «O Pipocas era tudo aos murros, inicialmente, inicialmente não tinha nada. Inicialmente era tudo aos murros à cabeça do meu tio, à testa do meu tio. O meu tio era só sangue». Descreveu posteriormente o modo como ficaram privados de liberdade, amarrados nas mãos e nos pés com as abraçadeiras, tendo sido ainda amarrados com fita-cola, que se encontrava na cozinha. Referiu que de seguida, já na sala, o arguido R________ queimou os telemóveis; que perguntaram ao ofendido se tinha cofres e valores, tendo o ofendido ido buscar os cofres, tendo o arguido R________ surgido com moedas de colecção, dizendo para o arguido BMPC________ entalar as moedas entre os dedos, tendo este agredido o ofendido, especialmente na zona da cabeça, mencionando expressamente que ambos os arguidos bateram no tio e que «aquilo era uma violência doida», tendo o ofendido começado a sangrar na zona da cabeça, «Na cabeça. Aquilo era tudo sangue por tudo o que era lado», e que, enquanto o ofendido escorria sangue «por tudo o que era lado», o arguido BMPC________ estava preocupado por causa dos vestígios, dizendo que tinha de limpar os vestígios. (…)
De seguida a assistente descreveu a dinâmica dos acontecimentos relacionada com o roubo do veículo e o transporte de ambos no mesmo quando os arguidos saíram de casa, referindo que inicialmente o arguido BMPC________ tinha um plano de os deixar perto do hospital, tendo os arguidos mudado de planos, mencionando que os arguidos ainda perguntaram ao ofendido pela existência de armas, associando a entrega da arma de fogo pelo ofendido à mudança de planos, referindo expressamente a tal respeito «Deve ter dado ao Pipocas. Eu praticamente não vi a arma, que a mão dele ocupava aquilo assim. Ao Pipocas. Imediatamente mudaram de planos, todos», descrevendo a forma como foram transportados no interior do veículo, referindo que quando chegaram ao eucaliptal «O meu tio foi o primeiro», «o meu tio dizia ai, ai, ai», tendo ouvido os arguidos dizer «calha mesmo bem, um fica à direita, outro fica à esquerda», sentindo ambos os arguidos atrás de si, ouvindo um disparo, referindo que foi o último facto de que se lembrava, porque a seguir desmaiou.(…)”
f) Salvo o devido respeito, que é muito, da prova produzida em sede de discussão e julgamento conjugada com as declarações da Assistente não resultou provado que o Recorrente BMPC________ agisse, no que respeito exclusivamente ao Ofendido FO_____, com o propósito e intenção de causar a morte.
g) Conforme resulta da prova e decorrendo quer das declarações do Recorrente, quer das declarações da Assistente, a intenção do Recorrente era de levar o Ofendido não para o eucaliptal, mas sim para o deixar num hospital.
h) A Assistente, em sede de declarações para memoria futura refere que:
“(…) Viemos todos para baixo. Naquela altura, o Pipocas tinha qualquer coisa em mente, que eu percebi. Tinha um plano qualquer. O plano dele passava…eu não sei bem o que era, mas o plano dele passava por algo equivalente a isto. Deixar-nos os dois, roubar-nos o carro. É verdade que me roubaram o carro, um dos carros. E deixar-nos os dois perto do hospital de Torres Vedras. Porque o Pipocas achava que eu estava a sangrar por baixo, e não estava.(…)” (pág.. 69)
i) Continuando, refere a Assistente que:
“(…) ele tinha um plano e o plano dele era esse memso. Era roubar o carro, como roubaram, colocar-nos os dois no carro e deixar-nos perto do hospital de Torres Vedras, para que nós puséssemos ser socorridos.
Juiz de Direito:
Isso o Pipoca a pensar? IB______  Exatamente.
Juiz de Direito:
Aquilo que a senhora imagina, daquilo que ele lhe disse, que tenha sido a intenção do Pipoca?
IB______  Sim, sim. (…)” (pág. 70)
j) Das declarações da Assistente resulta conforme consta de pagina 72 que: “(…) o Pipocas põe o meu tio a andar à frente dele assim. (…)
Juiz de Direito:
E o sue tio pelo seu pé? IB______
Pelo pé.(…)”
k) Resulta das declarações da Assistente que o Recorrente pretendia deixar os Ofendidos perto do Hospital de Torres Vedras.
l) Se tivesse efectivamente intenção de dar a morte ao Ofendido FO______ não teria o Recorrente gizado tal plano
m) A dado trecho, e sem se ter apurado os motivos, o Recorrente e o co-arguido R________ mudaram de plano, tendo levado o Ofendido FO______ e a Assistente para um eucaliptal.
n) Conforme também resulta do Douto Acórdão, a Assistente referiu que o Ofendido FO______ dizia “(…) ai, ai, ai porque o meu tio dizia muitas vezes “ai, ai, ai, ai, ai”(…)” (pág.. 75 das declarações para memoria futura).
o) Quando o Ofendido FO______ é deixado no eucaliptal este ainda está vivo, não se representando o Recorrente a morte como consequência da sua actuação.
p) Ora, não podemos tirar do circunstancialismo dado como provado que o Recorrente quisesse ou tivesse intenção, ou mesmo projectado como finalidade, provocar a morte ao Ofendido  FO____,
q) Mediou muitas horas entre o momento em que o Ofendido foi abandonado e o momento em que é socorrido, tendo sido encontrado ainda com vida.
r) O Tribunal a quo fez uma qualificação jurídica errada do crime perpetrado pelo Recorrente BMPC________, sendo que este deveria ter sido condenado pela pratica de um crime de ofensas à integridade física agravado pela morte e não pelo crime de homicídio qualificado, como veio a sê-lo.
s) A página 106 das declarações para memoria futura refere a Assistente que:
“(…)Aquilo que eu ouvi, eles tinham um plano qualquer, inicialmente. Depois alteram ali nos moinhos. Ali nos moinhos alteram tudo. Depois eu ouvi. Aquilo que eu ouvi foi o Pipocas a dizer “eh pá, não sei bem onde é que isso fica. Acho que é aqui. Vamos ver se é aqui, se é para ali.
Juiz de Direito: O Pipoca? IB______
Exatamente. Era ele que ia a conduzir, Eu acho que eles alteraram n altura o plano que tinham e o Pipoca, por solicitação do R________ sempre, o Pipoca não sabia o caminho. Acho que é aqui, acho, acho.”
t) Segundo o Douto Acórdão, o Recorrente terá violentamente agredido o Ofendido FO______ com moedas que o co-arguido R________ lhe terá colocado nas mãos, no entanto as moedas foram encontradas no veículo automóvel conduzido pelo Recorrente sem quaisquer vestígios de sangue ou qualquer impressão lofoscópica deste.
u) Da factualiddae dada como provada não resulta que o Recorrente tenha representado como possível que da actuação ocorrida em casa do Ofendido (violências) e de colocar o Ofendido FO______ no eucaliptal, ainda vivo, pudesse resultar a morte deste, o que pode configurar uma situação de dolo eventual.
v) Assim, e com o devido respeito, entende o Recorrente tratar-se de um crime de ofensa à integridade física grave agravado pelo resultado (morte).
w) Em consequência resulta do texto do Acórdão recorrido, erro na apreciação da matéria de facto provada, a que se refere o n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal.
aa) No que respeita ao Ofendido FO______ considera o Recorrente que a pena concreta aplicada peca por excesso.
bb) O artigo 40.º n.º 1 do Código Penal traça as finalidades das penas e das medidas de segurança, as quais visam a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade; no n.º 2 do mesmo preceito contempla-se um afloramento do princípio geral e fundamental de que o direito criminal é estruturado com base na culpa do agente, e a explicitação de que a medida da culpa condiciona a própria medida da pena, sendo assim um limite inultrapassável desta.
cc) Decorre do artigo 70.º do Código Penal, que a escolha da pena – entre a pena privativa e pena não privativa –, se faz em função das finalidades da punição, ou seja, da prevenção geral e especial: significa o que se deixa dito que a escolha entre prisão e multa, depende unicamente de considerações de prevenção geral e especial.
dd) A determinação da medida da pena obedece ao critério geral que consta do artigo 71.º n.º 1 do Código Penal.
ee) A verdadeira função da culpa no sistema punitivo reside numa incondicional proibição de excesso.
ff) A culpa não é fundamento da pena mas constitui o seu limite inultrapassável, limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações ou exigências preventivas.
gg) Na determinação da medida concreta da pena ter-se-á ainda em conta o disposto no artigo 71.º n.º 2 do Código Penal, ou seja, o Tribunal deve atender a todas as circunstâncias que deponham a favor ou contra o agente, abstendo-se, no entanto, de considerar aquelas que já fazem parte do tipo de crime cometido.
hh) Na pena a aplicar, há que ponderar as exigências de prevenção geral que constituirão o limiar da punição, sob pena de ser posta em risco a função tutelar do direito e as expectativas comunitárias na validade da norma violada.
ii)Ainda há que atender às exigências de culpa do agente, limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas, por respeito ao princípio da necessidade da pena e ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (artigos 1.º e 18.º n.º 2 do Constituição da República Portuguesa).
jj)Finalmente, cumpre considerar as exigências de prevenção especial de socialização, sendo elas que irão determinar, em último termo, e dentro dos limites referidos, a medida concreta da pena.
kk)O Recorrente adoptou em sede de discussão e julgamento uma postura de colaboração, tendo prestado declarações e confessando parcialmente a sua comparticipação nos factos, nomeadamente no que ao Ofendido FO______ respeita.
ll) O Recorrente em sede de audiência e discussão e julgamento não só reconheceu serem as suas condutas reprováveis perante os valores da sociedade, colaborando, na medida das suas possibilidades, quer confessando parcialmente, quer esclarecendo a forma como procedeu.
mm)Ora, tendo em conta os critérios da sua determinação, a pena deve ser aferida em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo ainda, numa segunda fase, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, rodearam o mesmo, antes ou depois do seu cometimento, quer resultem a favor ou contra o agente.
nn)Para a determinação da medida concreta da pena há que fazer apelo aos critérios definidos pelos artigos 71º e 40º ambos do Código Penal, nos termos dos quais, tal medida será encontrada dentro da moldura penal abstractamente aplicável, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo ainda a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente.
oo) Na verdade, o Recorrente considera que o Tribunal a quo ao aplicar-lhe a pena de 22 anos que aplicou a ao crime de homicídio qualificado perpetrado na pessoa do Ofendido  FO____.
pp) Ao requalificar o crime de homicídio qualificado, por um crime de ofensas à integridade física agravado pelo resultado, entende o Recorrente dever lhe ser aplicada uma pena não superior a 15 anos, devendo opera-se o cúmulo jurídico, do qual deverá resultar uma pena única de 20 anos de prisão;
qq) Deverá ser considerado a actuação do Recorrente na prática do ilícito por confronto com as declarações para memoria futura prestadas pela Assistente que por diversas vezes referiu que o Recorrente agia a mando do co-arguido R________ .
rr) Assim do texto do Acórdão recorrido resulta erro na apreciação da matéria de facto provada, a que se refere o n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, por errónea qualificação jurídica no que concerne aos facto relativos ao Ofendido FO______ tendo em consequência violado os comandos contidos nos artigos 1.º e 18.º n.º 2 do Constituição da República Portuguesa e nos artigos 71º e 40º ambos do Código Penal.
ss) E por todo o exposto deverão V. Exas conceder provimento ao presente recurso sendo, por efeito do mesmo, substituído o Douto Acórdão recorrido por um outro nos termos da antecedente motivação, nos termos do qual seja:
O Recorrente absolvido do crime de homicídio qualificado (no que ao Ofendido FO______ respeita) e condenado por um crime de ofensas à integridade física agravado pelo resultado (morte), numa pena de 15 anos de prisão e operando cúmulo jurídico das outras penas parcelares aplicadas em 20 anos de prisão.
Assim, e sem prescindir do Douto Suprimento de V. Ex.as deve ser concedido provimento ao presente recurso, devendo em consequência ser reformulado o Douto Acórdão por outro que acolha as conclusões ora formuladas.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Ex.as Venerandos Juízes Desembargadores doutamente suprirão, far-se-á a costumada JUSTIÇA.
*
Por despacho de 12 de agosto de 2020 foi recebido o recurso.
*
O M.P. na primeira instância respondeu ao recurso interposto propugnando pela sua improcedência apresentando para o efeito as seguintes conclusões:
Ao recurso do arguido R________  :
1° Não assiste no entender do Ministério Público, razão alguma ao arguido.
2° O recorrente entende que parte da matéria de facto constante do acórdão e que foi dada como provada deveria ter sido dada como não provada.
3° No entanto, de uma leitura atenta das doutas alegações, é entendimento do Ministério Público que o recorrente não cumpre o ónus de especificação imposto pelo artigo 412°, n° 3 e 4 do Código de Processo Penai, já que não indica de forma clara e especificada quais as provas em concreto que impunham decisão relativamente a cada um dos factos que considera mal julgado, não relacionando assim o conteúdo específico do meio de prova que impõe decisão diversa com o facto individualizado que considera incorrectamente julgado.
4° Pelo que, o presente douto recurso não poderá ser apreciado.
5° Se assim se não entender, sempre se dirá que não se verifica quahquer erro notório na apreciação da prova
6° Quanto aos factos dados como provados e a sua subsunção aos dispositivos legais aplicados, nenhum reparo nos merece a sentença ora em crise.
7° Salvo melhor opinião, não há qualquer insuficiência para a matéria de facto provada.
8° Em relação ao vicio de erro notório na apreciação da prova, da leitura dos factos dados como provados na sentença ora recorrida não parece ressaltar qualquer erro judiciário e muito menos um erro tão crasso que salte aos olhos, sem necessidade de qualquer exercício mental.
9° O erro notório tem de resultar da análise da matéria de facto.
10° Logo, os motivos de facto que fundamentaram a decisão não se confundem com os factos provados nem com os meios de prova.
11° O tribunal a quo fundamentou de forma assaz exaustiva, quanto à sua convicção dos testemunhos.
12° A decisão de direito, em matéria criminal, baseia-se apenas nos factos previamente dados como provados em sede de audiência de discussão e julgamento.
13° Tendo isto como ponto assente e analisados os factos que o Tribunal a quo deu como provados na decisão recorrida constata- se que a condenação do arguido, ora recorrente, resultou da convicção que o Tribunal a quo formou com base na prova, frisa-se, em toda a prova produzida e examinada em sede de audiência de discussão e julgamento.
14° Recordando a audiência de discussão e julgamento enfatizamos que:
(pontos 18 e 20)
- Que os arguidos confessaram que se dirigiram os dois à casa de FO______ onde o arguido BMPC________ que já conhecia a vitima , bateu à janela gritando por um copo de água para a mãe que se estava a sentir mal, como forma de acederem ao interior da casa, o que conseguiram;
- Que conheciam a casa porque a ex-namorada do arguido R________ morava naquela rua e o arguido BMPC________tinha trabalhado para o Sr. FO____;
- Confessando ainda os dois que levaram abraçadeiras para manietar as vitimas;
- Por outro lado, a réplica de arma pertencia ao arguido R________ (Recorrente);
- Por fim, o Recorrente e o co-arguido confessaram
inequivocamente os dois que delinearam tal plano para entrar na casa das vitimas e levar dinheiro que ali existisse.
15° Esclareceu ainda a assistente que (transcrição fls. 85):
"- Ah! Outra coisa que eu também quero dizer, outra coisa que eu também quero dizer. Possivelmente, possivelmente, aquele cartão de multibanco, alguém devia ter dado com a língua nos dentes que o meu tio tinha dinheiro. O meu tio tinha dinheiro. Eu não sei propriamente a quantidade de dinheiro que ele tinha, o dinheiro era dele. Não era meu. Mas ele às vezes dizia-me. Eu às vezes dizia assim para ele "ó tio ”, há uma coisa que a gente aprendeu é que os ovos não se põem todos na mesma cesta, ele dizia assim "vou gastar agora no mês de Setembro, vou gastar muito dinheiro. Setembro ou Outubro, vou gastar muito dinheiro. Por isso não vou fazer transferências, nem nada, porque eu vou gastar muito dinheiro”.
16° Pontos 23 e 24:
- O arguido BMPC________declarou que foi o arguido R________ (recorrente) que empunhava a arma, até porque era o arguido BMPC________que estava a chamar o senhor FO____ e por isso não podia exibir a arma, mais declarando que o arguido BMPC________que foi o arguido R________ logo no Hall de entrada, que desferiu as coronhadas no sr.FO______ até porque o arguido BMPC________foi agarrar a assistente;
17° As declarações da assistente, neste ponto, têm de ser conjugadas com as declarações do arguido BMPC____ , pois a mesma não assistiu ao momento em que entraram na casa, só se apercebendo dos mesmos já dentro de casa e com o arguido BMPC________a agarrá-la.
18° As transcrições realizadas no ponto XII da motivação, estão selecionadas, cortadas e enviesadas e respeitam à factualidade dada como provada no ponto 32 e transcrevendo as declarações da assistente esta declarou:
-” Empurraram o meu tio para um dos sofás, que há lá vários sofás.
Empurraram o meu tio para um dos sofás. O R________ começou a abrir as moedas, as tais moedas de coleção, e vira-se para o Pipoca e diz assim "fecha a mão”.
(...)
Sim. E ele faz isto. Percebeu? Ele tira as moedas das coleções, das moedas, e entala aqui.
Juiz de Direito:
- Entre os dedos?
IB______
- Exatamente.
Juiz de Direito:
- Então o Pipoca fechou a sua mão como se fosse dar um punho, com a mão fechada?
IB______
- Exatamente.
Juiz de Direito:
- E o R________ colocou-lhe as moedas entre os dedos?
IB______
- Sim, entre os dedos. E foi com essas moedas que possivelmente o meu tio ainda não acordou.
Juiz de Direito:
 - Eles bateram no seu tio?
IB______
- Sim” (pág 45 da transcrição).
19° Quanto à assistente IB______ e das discrepâncias alegadas pelo Recorrente:
A assistente, que presenciou e vivenciou todos os factos descritos, esclareceu que:
- A princípio a ideia do arguido BMPC________ era levar a assistente e o Sr. FO____ para o Hospital,
- Mas que a certa altura ainda em casa das vitimas, o arguido BMPC________ perguntou ao falecido FO______ se este não tinha uma arma e obrigou o mesmo a entregar-lhe a arma;
- A testemunha foi peremptória em afirmar que já na posse de arma, os arguidos mudaram drasticamente o seu plano, decidindo abandonar as duas vitimas num eucaliptal, longe de qualquer povoação;
-Ali chegados ao eucaliptal, foi o arguido Recorrente que levou o corpo de FO______ arrastado para o eucaliptal, ali o abandonando já inconsciente no meio do mato, após o que entregou a arma ao arguido BMPC________ e lhe disse "agora é a tua vez”, após o que o arguido BMPC________efectuou um disparo contra a mesma, que a atingiu na cabeça, na zona parietal direita, e que só não foi fatal atenta a trajetória que a bala seguiu;
- Ora quem abandona um ser humano inconsciente no meio de um eucaliptal e determina outro a realizar um disparo contra a outra pessoa, assumiu parte importante na resolução criminosa e na obtenção do resultado morte relativamente às vitimas.
20° Toda a dinâmica da actuação do arguido R________ enquadrada pelas regras de experiência comum, não podem levar a outra conclusão senão a de que o Recorrente pretendeu a morte dos ofendidos e participou activamente nos factos que culminaram na morte de FO______ e na tentativa de homicídio de IB_______
21° O Recorrente pretende discutir o seu grau de participação nos factos.
22° Analisando o depoimento da assistente, parece inequívoco concluir-se que o arguido R________(recorrente) detinha claro ascendente sobre o arguido BMPC________senão recordemos as declarações para memória futura (Página 31):
- "Juiz de Direito:
- E o que é que aconteceu de seguida? O seu tio onde é que estava?
Continuava deitado no hall de entrada?
IB______
- Estava.
Juiz de Direito:
- Ou levantou-te? Conseguiu levantar-se?
IB______
-Não, não. Não, porque o R________ era líder. Praticamente não fez nada.
Percebeu? As mãos dele nada e só mandava o Pipocas fazer. O Pipocas era tudo aos murros, inicialmente. Inicialmente não tinha nada. Inicialmente era tudo aos murros à cabeça do meu tio, à testa do meu tio. O meu tio era só sangue. Percebeu?
(...)
- Eles amarraram-na nessa altura, ou não?
IB______  
- Amarraram. Amarraram sim, senhora. Amarraram a mim e ao meu tio com essas braçadeiras em plástico. Eu ainda estava no Santa Maria, ainda me doía. Uma que estava assim aqui, ainda me doía.
(...)
Juiz de Direito:
- Mas então o seu tio não saiu do hall de entrada?
IB______
- Não. Não porque eles não deixaram”
23° Noutra passagem a mesma declara (Página 45):
-" Sentou-se. Empurraram o meu tio para um dos sofás, que há lá vários sofás.
Empurraram o meu tio para um dos sofás. O R________ começou a abrir as moedas, as tais moedas de coleção, e vira-se para o Pipoca e diz assim "fecha a mão".
Juiz de Direito:
- Fecha a mão?
IB______
- Sim. E ele faz isto. Percebeu? Ele tira as moedas das coleções, das moedas, e entala aqui.
Juiz de Direito:
- Entre os dedos?
IB______
- Exatamente.
Juiz de Direito:
- Então o Pipoca fechou a sua mão como se fosse dar um punho, com a mão fechada?
IB______
- Exatamente.
Juiz de Direito:
- E o R________ colocou-lhe as moedas entre os dedos?
IB______
- Sim, entre os dedos. E foi com essas moedas que possivelmente o meu tio ainda não acordou.
Juiz de Direito:
- Eles bateram no seu tio?
IB______
- Sim.
Juiz de Direito: (...)
Eu estava muito quietinha. O R________ de vez em quando olhava para mim, fazia-me assim umas festinhas assim de lado. Assim.
Juiz de Direito:
- Na cara?
IB______
- Na cara, que até me metia nojo aquilo. E dizia assim
"tens sorte. Eu não bato em mulheres".
Juiz de Direito:
- O R________ é que dizia isso?
IB______
- "Eu não bato em mulheres". Eu muito quietinha, a olhar para a televisão, sempre a olhar para a telenovela. Não sei o que estava a dar. Sei que era uma telenovela, mas a estória não faço a mínima ideia do que é que se passa.
(...)
- Exatamente, exato. Que eu quando vi a minha família, quando eu tive algum onde é que eu estava, eu olhei para a cara deles e tal, eu disse logo "o tio ", eu disse assim "não tem estes ossos aqui todos partidos, aqui?". Porque eu lembrava-me que eles batiam muito era aqui, aqui.”
24° E mais declarou que:
- "Acha que eu podia verbalizar alguma coisa? Deus me livre. Ali era logo uma mulher morta, não é?
Juiz de Direito:
- A senhora não tinha dúvidas que face à violência do ataque, que se resistisse de alguma forma, que eles a matariam a si e ao seu tio?
IB______
- Se eu fosse à procura de ajuda, se alguém me ajudasse, eu não sei quem, nem como, mas aquilo era mais que crimes. Eles eram uns assassinos.
Pessoas que o meu tio ajudou, não é?”
25° E quanto á parte dos factos relativos ao encaminhamento das vitimas, já no final, a assistente esclareceu:
"- Ok. Aquilo que eu ouvia, era aquilo que eles diziam. Eles não falavam diretamente, diziam assim umas palavras. Eu deduzia as coisas assim, deduzia as coisas assim. Só que aquilo estava mais ou menos planeado. Deixar-nos os dois perto do hospital de Torres.
 Depois, de repente, de repente, um dizia assim "não”, dizia não sei o quê, qualquer coisa, e o outro, e o Pipocas fazia aquilo que ele queria. Percebeu? Quem mandava, quem mandava sistematicamente não era o Pipocas porque o Pipocas, Deus me perdoe, desculpem lá os termos, era um palhacinho autêntico. Percebe? Era um palhacinho autêntico. Quem mandava era o outro, o outro é que era líder.”.
26° Pelo que também nesta parte, não assiste razão ao Recorrente, salvo melhor opinião.
27° Sem necessidade de tecer outros considerandos, cumpre afirmar que na decisão recorrida não existe qualquer erro judiciário e muito menos um erro tão crasso que salte aos olhos, sem necessidade de qualquer exercício mental.
28° Quanto à violação, o arguido recorrente confessou, que penetrou a vitima, contra a sua vontade, após ter cortado a roupa interior da mesma com uma faca.
 29° A vitima esclareceu que foi uma coisa rápida porque o arguido aparentemente” não tinha muito apetite”.
30° O arguido confessou tal facto - ter forçado IB______ a manter relações sexuais contra a vontade daquela, inequivocamente!
31° Muito espanto causa ao Ministério Público que o recorrente venha agora, despudoradamente colocar em causa tal matéria de facto dada como provada com base na sua confissão!
32° Só o arguido/ Recorrente não se quer conformar com os factos, optando pelo discurso de que "não fez nada...”, com o que não se pode concordar.
33° As declarações de IB______ e as leis da física completam um puzzle perfeito, explicado com rigor pelos inspectores da Policia Judiciária que se deslocaram ao local, os quais fizeram a reportagem fotográfica, avaliações, entre outras avaliações forenses, que só mais uma vez os arguidos teimam em negar.
 34° Nestes termos, da matéria de facto dada como assente, resulta de um modo inequívoco e indubitável que o arguido praticou os tipos legais de crimes pelos quais está condenado em sede de primeira instância, não oferecendo dúvidas o preenchimento do respectivo tipo legal, quer ao nível dos elementos objectivo, quer subjectivo.
35° Logo salvo melhor opinião, nesta questão não assiste razão ao recorrente.
36° Assim, e ao contrário do que pretende fazer crer o Recorrente, o Tribunal a quo socorreu-se de uma apreciação ponderada e conjugada de toda a prova produzida, a qual permitiu ao mesmo Tribunal concluir pela condenação do arguido.
37° Afigura-se-nos que, no essencial, o Recorrente se prevalece do direito de discordar da apreciação efectuada pelo Tribunal a quo relativamente à apreciação da matéria de facto e enquadramento da mesma em sede de direito.
38° E, pese embora o facto do Recorrente poder discordar da posição assumida na decisão recorrida quanto à valoração da matéria de facto por não se conformar com o valor concedido pelo julgador ao depoimento prestado por uma testemunha em detrimento de outra ou outras, de sentido divergente, a verdade, porém, é que tal divergência de opinião não constitui fundamento legal de reexame da matéria de facto que, enquanto tal, é insindicável.
39° É que não pode deixar de ter-se presente que, no ordenamento jurídico onde nos movemos vigora um princípio fundamental: o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127°do Código de Processo Penal.
40° Não se verificando, como não se verificam, quaisquer das situações excepcionais, há que acatar a posição assumida pelo Mm° Juiz no exercício do poder jurisdicional que lhe foi conferido e ao abrigo da liberdade de apreciação da prova que lhe assiste (vide, por todos, o Acórdão do STJ, de 13.02.91, AJ n° 15/16, 7 "(...) se o Recorrente alega vícios da decisão recorrida a que se refere o n°2 do art.” 4100 do Código de Processo Penal, mas fora das condições previstas neste normativo, afinal impugna a convicção adquirida pelo Tribunal a quo sobre determinados factos, em contraposição com a que, sobre os mesmos, ele adquiriu em julgamento, esquecido da regra da livre apreciação da prova inserta no art. 127.º.
41° Por todo o exposto, e considerando o que acima ficou dito quanto à prova produzida em audiência de julgamento, afigura-se que não tem razão o Recorrente quanto às questões afloradas na sua motivação, uma vez que, tendo em atenção a factualidade dada como provada, outra não poderia ser a conclusão a retirar pelo Tribunal a quo.
42° Da falta de realização de autópsia médico-Legal
Parece-nos salvo melhor opinião, que existe perícia médico-legal a determinar que a sua morte ocorreu na sequência das graves lesões sofridas por FO______ no dia dos factos a que se reportam os autos.
43° Aliás quer o perito Médico, que prestou declarações em audiência, quer a Médica que assinou o certificado de óbito comprovando que a morte de FO______ se deveu a graves lesões crânio-encefálicas, ocorridas no dia 25.08.2019, foram unanimes e peremptórios em afirmar que a morte sobreveio devido lesões.
44° Sendo tais as conclusões a retirar das perícias, dos factos e das declarações do perito médico, também nesta parte não colhem os argumentos aduzidos pelo Recorrente.
45° Da aplicação do Regime previsto peio DL 401/82. de 23-09
O regime penal especial para jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, instituído pelo DL 401/82, de 23-09, surge em regulação do imperativo decorrente do art. 9.° do CP (aprovado pelo DL 400/82, da mesma data), que entrou em vigor simultaneamente com o CP, com o qual foi articulado.
46° Dispõe o Artigo 1.° (Âmbito de aplicação)
1 - O presente diploma aplica-se a jovens que tenham cometido um facto qualificado como crime.
2 - É considerado jovem para efeitos deste diploma o agente que, à data da prática do crime, tiver completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos.
3 - O disposto no presente diploma não é aplicável a jovens penalmente inimputáveis em virtude de anomalia psíquica.
47° O arguido nasceu em 17.02.1998.
48° Os factos ocorreram em 25.08.2019.
49° Ou seja, á data dos factos o arguido já tinha completado 21 anos, pelo que o regime não lhe é aplicável.
50° Pelo exposto, afigura-se-nos que bem andou o acórdão ao não aplicar tal regime.
51° Da medida da pena
Conforme refere JESCHECK (Tratado de Derecho Penal, Parte Geral, II, 1194), :
-"o pomo de partida da determinação judicial das penas é a determinação dos seus fins, pois só partindo dos fins das penas claramente definidos se pode julgar que factos são importantes e como se devem valorar no caso concreto para afixação da pena".
52° Nos termos do artigo 40° do Código Penal, a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
53° A prevenção geral positiva ou de integração é a finalidade primordial a prosseguir, enquanto objectivo de estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade da norma violada (FIGUEIREDO DIAS, Sobre os Fundamentos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, pp.106), mas nunca pode pôr em causa a própria dignidade humana do agente, que o princípio da culpa justamente salvaguarda (artigo 40°, n.° 2 do Código Penal).
54° Da prevenção especial
Atentos os factos dados como provados nos autos, não se nos afigura a existência de quaisquer atenuantes de relevo que deponham a favor do arguido, mormente porque os factos dados como provados nos autos nos permitem concluir que os mesmos foram levados a cabo com dolo intenso, no que tange aos crimes de homicídio qualificado na forma tentada e na forma consumada.
55° Se tomarmos em linha de conta que o objectivo final do comportamento violento é submeter o outro mediante o uso da força e que toda a violência, assenta em relações de dominação e de força, concluímos que é necessário que a sociedade se ocupe também da pessoa violenta, a fim de a recuperar e a reeducar para o direito, prevenindo a prática de comportamentos idênticos, fazendo- o sentir a seriedade e a ilegalidade da sua conduta.
56° Assim, ponderadas estas considerações somos do entendimento que existe a necessidade de se alterar o padrão de comportamento do arguido e atenta a personalidade demonstrada pelo arguido e a sua conduta posterior, que nos fazem crer que a pena a que o mesmo foi condenado é claramente adequada, pois só assim as finalidades de prevenção especial serão atingidas pela pena.
57° Da culpa
As qualidades da personalidade do arguido, manifestadas nos factos relevam por via da culpa, agravando-a, na medida em que constituem índices de uma elevada desconformidade da personalidade do arguido face ao direito.
58° É certo que também, quer o comportamento anterior do arguido, quer o seu comportamento posterior, quer o seu comportamento durante o desenrolar do processo, não revelaram quaisquer circunstâncias que devam ser valoradas a favor do recorrente.
59° Como é sabido, no artigo 71° do Código Penal encontram- se elencados os factores que devem nortear o julgador na determinação do quantum concreto da pena a aplicar ao arguido.
60° Ora, transpondo tais critérios para o caso dos autos, constata-se que os mesmos foram tidos em consideração pelo Tribunal na fixação da pena aplicada ao arguido.
61° Revertendo para o caso concreto, concordamos com a medida da pena aplicada ao arguido, desde logo atenta a fundamentação da medida da pena efectuada na sentença, na qual o Meritíssimo colectivo de Juízes "a quo” considerou que:
-a actuação do arguido revestiu-se de muita gravidade;
-o arguido agiu na modalidade mais intensa do dolo - dolo directo e com intensidade elevada, quanto aos crime de homicídio qualificado, quer consumado, quer na forma tentada e praticados com elevados índices de violência quer física, quer psicológica sobre as vitimas;
-se revelava particularmente censurável o modo de execução dos factos e as motivações para a prática dos mesmos.
62° Face a várias motivações, com as quais o Ministério Público concordou, o acórdão em concreto, entendeu que deveria ser aplicada uma pena privativa da liberdade e na medida concreta aplicada.
63° Atentas as consequências dos factos e o modo de execução dos mesmos, entende o Ministério Público que o grau de ilicitude das suas condutas é elevado.
64° As necessidades de prevenção especial, são muito elevadas, considerando a gravidade, a extensão, a intensidade do dolo do Recorrente. dúvidas não restam de que não há qualquer fundamento susceptível de alicerçar uma diminuição da medida da pena.
65° Atento o artigo 71°, n.° 2, aI. a), do Código Penal, facilmente se conclui que o grau de ilicitude do facto é elevado, avaliado em função das circunstâncias em que o arguido agiu.
66° E, atento o facto de que o arguido não demonstrou arrependimento algum, tendo inclusive, adoptando no decorrer do julgamento uma postura de falta de arrependimento e de falta de autocrítica face às situações^em causa nos autos, negando a prática dos mesmos, nomeadamente quanto à vitima FO______ numa tentativa de confundir o tribunal e sempre procurando criar a dúvida de forma a refugiar-se na alegação de "in dúbio pro reo", mas de tal forma mal orquestrada tal encenação que não convenceu qualquer um dos presentes.
67° O depoimento sofrido de IB______ permitiu descortinar o terror vivido naquela noite pela própria e por FO______ às mãos de BMPC________ e de R________ , na qual foram torturados física e psicologicamente.
68° Assim, entendemos não merecer qualquer reparo a medida concreta da pena que foi aplicada ao arguido nos presentes autos.
Vossas Excelências, no entanto, e decidindo, farão a costumada justiça.
*
Ao recurso do arguido BMPC________:
1° Não assiste no entender do Ministério Público, razão alguma ao arguido.
2° O tribunal a quo fundamentou de forma assaz exaustiva, quanto à sua convicção dos testemunhos.
3° A decisão de direito, em matéria criminal, baseia-se apenas nos factos previamente dados como provados em sede de audiência de discussão e julgamento.
4° Tendo isto como ponto assente e analisados os factos que o Tribunal a quo deu como provados na decisão recorrida constata- se que a condenação do arguido, ora recorrente, resultou da convicção que o Tribunal a quo formou com base na prova, frisa-se, em toda a prova produzida e examinada em sede de audiência de discussão e julgamento.
7° Recordando a audiência de discussão e julgamento enfatizamos as declarações da assistente IB_______
8° A assistente, que presenciou e vivenciou todos os factos descritos e que sobreviveu ao tiro que o Recorrente disparou contra si na zona da cabeça, esclareceu que:
- A princípio a ideia do arguido BMPC________ era levar a assistente e o Sr. FO____ para o Hospital,
- Mas que a certa altura ainda em casa das vitimas, o arguido BMPC________ perguntou ao falecido FO______ se este não tinha uma arma e obrigou o mesmo a entregar-lhe a arma;
- A testemunha foi peremptória em afirmar que já na posse de arma, os arguidos mudaram drasticamente o seu plano, decidindo abandonar as duas vitimas num eucaliptal, longe de qualquer povoação;
- Ali chegados ao eucaliptal, abandonaram FO______ já inconsciente no meio do mato e o arguido BMPC________ efectuou um disparo contra a mesma, que a atingiu na cabeça, na zona parietal direita, e que só não foi fatal atenta a trajetória que a bala seguiu;
- Ora quem abandona um ser humano inconsciente no meio de um eucaliptal e realiza um disparo contra a outra pessoa, pensando que a matara - e por isso impossibilitada de socorrer quem quer que fosse, não pretendeu somente ofender a integridade física de  FO____- ante pelo contrário conformou-se com o resultado morte relativamente ao mesmo.
9° Toda a dinâmica da actuação do arguido enquadrada pelas regras de experiência comum, não podem levar a outra conclusão senão a de que o Recorrente pretendeu a morte do ofendido.
10° Os inspectores da Policia Judiciária que se deslocaram ao local, constataram que FO______ - não obstante ainda estar vivo, estava de tal forma maltratado que tinha livores cadavéricos fixados.
11° O Inspector VP____ referiu que nunca tinha visto um ser humano ainda vivo com livores cadavéricos já fixados, facto que nos impressionou, mais se correlacionada tal descrição com as fotografias juntas aos autos de  FO____.
12° Fotografias essas que o Recorrente se recusou a visualizar.
13° Quanto à invocada inexistência de moedas com vestígios hemáticos há a referir que só foram apreendidos os objectos que os arguidos tinham na sua posse, desconhecendo-se em absoluto o destino que os mesmos deram a tais moedas.
14° Só os arguidos poderão esclarecer qual foi o destino final de tais moedas.
15° Só o arguido/ Recorrente não se quer conformar com os factos, optando pelo discurso de que "não queria matar o Senhor FO____...”, chegando mesmo a afirmar que nunca lhe tocara, com o que não se pode concordar.
16° As declarações de IB______ e as leis da física completam um puzzle perfeito, explicado com rigor pelos inspectores da Policia Judiciária que se deslocaram ao local, os quais fizeram a reportagem fotográfica, avaliações, entre outras avaliações forenses, que só mais uma vez os arguidos teimam em negar.
17° Nestes termos, da matéria de facto dada como assente, resulta de um modo inequívoco e indubitável que o arguido praticou os tipos legais de crimes pelos quais está condenado em sede de primeira instância, não oferecendo dúvidas o preenchimento do respectivo tipo legal, quer ao nível dos elementos objectivo, quer subjectivo.
18° Logo salvo melhor opinião, nesta questão não assiste razão ao recorrente.
19° Assim, e ao contrário do que pretende fazer crer o Recorrente, o Tribunal a quo socorreu-se de uma apreciação ponderada e conjugada de toda a prova produzida, a qual permitiu ao mesmo Tribunal concluir pela condenação do arguido.
20° Afigura-se-nos que, no essencial, o Recorrente se prevalece do direito de discordar da apreciação efectuada pelo Tribunal a quo relativamente à apreciação da matéria de facto e enquadramento da mesma em sede de direito.
21° E, pese embora o facto do Recorrente poder discordar da posição assumida na decisão recorrida quanto à valoração da matéria de facto por não se conformar com o valor concedido pelo julgador ao depoimento prestado por uma testemunha em detrimento de outra ou outras, de sentido divergente, a verdade, porém, é que tal divergência de opinião não constitui fundamento legal de reexame da matéria de facto que, enquanto tal, é insindicável.
22° É que não pode deixar de ter-se presente que, no ordenamento jurídico onde nos movemos vigora um princípio fundamental: o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127°do Código de Processo Penal.
23° Não se verificando, como não se verificam, quaisquer das situações excepcionais, há que acatar a posição assumida pelo Mm° Juiz no exercício do poder jurisdicional que lhe foi conferido e ao abrigo da liberdade de apreciação da prova que lhe assiste (vide, por todos, o Acórdão do STJ, de 13.02.91, AJ n° 15/16, 7 "(...) se o Recorrente alega vícios da decisão recorrida a que se refere o n°2 do art.” 4100 do Código de Processo Penal, mas fora das condições previstas neste normativo, afinal impugna a convicção adquirida pelo Tribunal a quo sobre determinados factos, em contraposição com a que, sobre os mesmos, ele adquiriu em julgamento, esquecido da regra da livre apreciação da prova inserta no art. 127° (...)”).
24° Por todo o exposto, e considerando o que acima ficou dito quanto à prova produzida em audiência de julgamento, afigura-se que não tem razão o Recorrente quanto às questões afloradas na sua motivação, uma vez que, tendo em atenção a factualidade dada como provada, outra não poderia ser a conclusão a retirar pelo Tribunal a quo.
25° Sendo tais as conclusões a retirar dos factos, o enquadramento legal dos mesmos também foi correctamente efectuado, pois se o arguido/ recorrente pretendeu tirar a vida a FO______ o que conseguiu, o crime que praticou foi o crime de homicídio na forma consumada e não qualquer crime de ofensas à integridade física qualificadas como pretende.
26° Da medida da pena
Conforme refere JESCHECK (Tratado de Derecho Penal, Parte Geral, II, 1194), :
-"o pomo de partida da determinação judicial das penas é a determinação dos seus fins, pois só partindo dos fins das penas claramente definidos se pode julgar que factos são importantes e como se devem valorar no caso concreto para afixação da pena".
27° Nos termos do artigo 40° do Código Penal, a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.
28° A prevenção geral positiva ou de integração é a finalidade primordial a prosseguir, enquanto objectivo de estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade da norma violada (FIGUEIREDO DIAS, Sobre os Fundamentos da Doutrina Penal, Coimbra Editora, 2001, pp.106), mas nunca pode pôr em causa a própria dignidade humana do agente, que o princípio da culpa justamente salvaguarda (artigo 40°, n.° 2 do Código Penal).
29° Da prevenção especial
Atentos os factos dados como provados nos autos, não se nos afigura a existência de quaisquer atenuantes de relevo que deponham a favor do arguido, mormente porque os factos dados como provados nos autos nos permitem concluir que os mesmos foram levados a cabo com dolo intenso, no que tange aos crimes de homicídio qualificado na forma tentada e na forma consumada.
30° Se tomarmos em linha de conta que o objectivo final do comportamento violento é submeter o outro mediante o uso da força e que toda a violência, assenta em relações de dominação e de força, concluímos que é necessário que a sociedade se ocupe também da pessoa violenta, a fim de a recuperar e a reeducar para o direito, prevenindo a prática de comportamentos idênticos, fazendo- o sentir a seriedade e a ilegalidade da sua conduta.
31° Assim, ponderadas estas considerações somos do entendimento que existe a necessidade de se alterar o padrão de comportamento do arguido e atenta a personalidade demonstrada pelo arguido e a sua conduta posterior, que nos fazem crer que a pena a que o mesmo foi condenado é claramente adequada, pois só assim as finalidades de prevenção especial serão atingidas pela pena.
32° Da culpa
As qualidades da personalidade do arguido, manifestadas nos factos relevam por via da culpa, agravando-a, na medida em que constituem índices de uma elevada desconformidade da personalidade do arguido face ao direito.
33° É certo que também, quer o comportamento anterior do arguido, quer o seu comportamento posterior, quer o seu comportamento durante o desenrolar do processo, não revelaram quaisquer circunstâncias que devam ser valoradas a favor do recorrente.
34° Como é sabido, no artigo 71° do Código Penal encontram- se elencados os factores que devem nortear o julgador na determinação do quantum concreto da pena a aplicar ao arguido.
35° Ora, transpondo tais critérios para o caso dos autos, constata-se que os mesmos foram tidos em consideração pelo Tribunal na fixação da pena aplicada ao arguido.
36° Revertendo para o caso concreto, concordamos com a medida da pena aplicada ao arguido, desde logo atenta a fundamentação da medida da pena efectuada na sentença, na qual o Meritíssimo colectivo de Juízes "a quo” considerou que:
-a actuação do arguido revestiu-se de muita gravidade;
-o arguido agiu na modalidade mais intensa do dolo - dolo directo e com intensidade elevada, quanto aos crime de homicídio qualificado, quer consumado, quer na forma tentada e praticados com elevados índices de violência quer física, quer psicológica sobre as vitimas;
-se revelava particularmente censurável o modo de execução dos factos e as motivações para a prática dos mesmos.
37° Face a várias motivações, com as quais o Ministério Público concordou, o acórdão em concreto, entendeu que deveria ser aplicada uma pena privativa da liberdade e na medida concreta aplicada.
38° Atentas as consequências dos factos e o modo de execução dos mesmos, entende o Ministério Público que o grau de ilicitude das suas condutas é elevado.
39° As necessidades de prevenção especial, são muito elevadas. considerando a gravidade, a extensão, a intensidade do dolo do Recorrente. dúvidas não restam de que não há qualquer fundamento susceptível de alicerçar uma diminuição da medida da pena.
40° Atento o artigo 71°, n.° 2, aI. a), do Código Penal, facilmente se conclui que o grau de ilicitude do facto é elevado, avaliado em função das circunstâncias em que o arguido agiu.
 41° E, atento o facto de que o arguido não demonstrou arrependimento algum, tendo inclusive, adoptando no decorrer do julgamento uma postura de falta de arrependimento e de falta de autocrítica face às situações em causa nos autos, negando a prática dos mesmos, nomeadamente quanto á vitima  FO____.
42° Só o depoimento sofrido de IB______ permitiu descortinar o terror vivido naquela noite pela própria e por FO______ às mãos de BMPC________ e de R________ .
Assim, entendemos não merecer qualquer reparo a medida concreta da pena que foi aplicada ao arguido nos presentes autos.
Vossas Excelências, no entanto, e decidindo, farão a costumada justiça.
*
O Sr. PGA junto desta Relação aderiu à resposta do MP na primeira instância.
*
Foi cumprido o disposto no art.º 417º, nº 2 do CPP, nada tendo sido dito.
*
Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, foi o processo à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.
*
II - O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente. Só estas o tribunal ad quem deve apreciar art.ºs 403º e 412º nº 1 CPP[1] sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – art.º 410º nº 2 CPP.
*
Questões a Decidir:
(i) Se se verifica erro de julgamento, previsto no art.º 412.º do CPP;
(ii) Se se verificam os vícios previstos no art.º 410.º, nº 2 do CPP;
(iii) Se se verificam os pressupostos da co-autoria;
(iv) Qualificação jurídica dos factos – se os factos apenas preenchem o crime de ofensas à integridade física agravadas pelo resultado;
(v) Aplicação do regime penal especial para jovens delinquentes;
(vi) Se as penas são excessivas e por isso violadoras do disposto nos art.ºs 40.º e 71.º do CP
*
III.
É do seguinte teor da decisão de facto impugnada por via do presente recurso:
II - FUNDAMENTAÇÃO FACTOS PROVADOS:
Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos com relevância para a presente decisão:
Da acusação:
I. Vítima Ivo Miguel Ramos Augusto
1 - No dia 30 de Julho de 2019, cerca das 10H00, o arguido R________ deslocou-se à residência sita no n.° 8 da Rua Principal, no Sobral da Lourinhã para falar com Ivo Miguel Ramos Augusto.
2 - Aí chegado, após uma breve discussão com IA______ , o
arguido R________ apontou-lhe uma faca, de características não concretamente apuradas, que posteriormente deixou num canteiro, na sequência do que, o ofendido franqueou a entrada da casa ao arguido, acedendo este ao interior daquela residência.
3 - Já no seu interior, o arguido R________ exibiu a IA______  a réplica de arma de fogo - pistola “Denix”, com o n.° C78267 - dizendo-lhe «se for preciso eu uso», e, nessa sequência colectou, para levar consigo, os seguintes objectos:
- uma (1) Televisão Samsung, modelo UE46C5100QW, com o n.° de série Z6Q03SQZA00331B;
- um computador portátil Lenovo, com a inscrição K9 Brosky;
- uma consola Sony, modelo PS4, com o n.° de série 02-274525742420490
4 - Após, o arguido R________ abandonou a casa com os supra descritos objectos.
5 - O arguido R________ , através de ameaça com uma faca e com a réplica de arma de fogo, agiu com o intuito de subtrair os aludidos objectos, o que logrou conseguir, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que actuava contra a vontade dos seus donos.
*
II.        Vítima J...
6 - Posteriormente, no dia 13 de Agosto de 2019, cerca da 01H00, o arguido R________ e o arguido BMPC________, que seguiam numa viatura de cor branca, pertencente à mãe do arguido BMPC________, em local não concretamente determinado do Sobral da Lourinhã, reduziram a marcha da mesma e abordaram J..., que tinha saído da sua residência após uma discussão com o enteado Bernardo Oliveira, conhecido dos arguidos, perguntando-lhe se queria boleia para a Lourinhã.
7 - J... com receio do que pudesse acontecer caso recusasse, acedeu, entrando na aludida viatura, e, já no seu interior, ao invés de seguirem para a Lourinhã, os arguidos dirigiram-se para um local isolado, perto de umas torres eólicas, em local não concretamente determinado da Lourinhã, onde pararam a viatura.
8 - Sequentemente, os arguidos ordenaram que J... saísse da viatura e mandaram-no ajoelhar-se no solo.
9 - Após, o arguido R________ , com recurso à réplica de arma de fogo - pistola “Denix”, com o n.° C78267 -, que apontou à cabeça de J..., proferiu as seguintes expressões:
- “Agora vais contar tudo o que se passou lá em casa.... ”; e,
- “Só não te dou um tiro nos cornos, porque gosto muito da Bianca...”,
referindo-se à enteada do ofendido.
10 - Concomitantemente, os dois arguidos lograram retirar a carteira de J..., retirando do interior daquela os documentos que aí se encontravam; tiraram fotografias aos mesmos, e, voltaram a guardá-los na carteira, com excepção de um cartão de cidadão caducado.
11 - Depois, os arguidos solicitaram-lhe dinheiro,
12 - Tendo J... dito aos arguidos que não tinha dinheiro consigo.
13 - Após, os arguidos ordenaram a J... que entrasse de novo na viatura, sempre com a réplica de arma de fogo apontada àquele pelo arguido R________ , e seguiram viagem para a Lourinhã, onde o deixaram, cerca das 02H30, junto ao Terminal Rodoviário.
14 - Os arguidos actuaram com o propósito de fazerem suas as quantias monetárias que J... pudesse transportar consigo, o que não lograram conseguir por motivos alheios às suas vontades, e, com o propósito de se apoderarem do cartão de cidadão caducado daquele, o que lograram conseguir.
15 - Mais agiram os arguidos, bem sabendo que, ao transportarem o J... para um local isolado, obrigando-o aí a permanecer contra a sua vontade, com recurso a ameaças com a réplica de arma de fogo supra descrita, o privavam da sua liberdade de locomoção e autodeterminação, o que conseguiram.
*
III.       Vítimas FO______ e IB____
16        - O ofendido FO______ contava com 76 anos de idade e tinha diagnosticado um carcinoma (tumor maligno) na próstata, e a sua sobrinha e ofendida IB________ conta com 54 anos de idade, e residiam ambos na Rua Principal, n.° 28, Sobral da Lourinhã.
17 - O arguido BMPC________  Castrim trabalhou já por conta do ofendido FO______ na realização de trabalhos agrícolas, conhecendo-o por isso e bem sabendo da existência de dinheiro e objectos de valor naquela residência.
18 - Face a este conhecimento, em data não concretamente apurada mas anterior ao dia 25 de Agosto de 2019, o arguido BMPC________ decidiu, em conjunto com o arguido R________ - amigo do arguido BMPC________, que se encontrava a pernoitar em sua casa desde data não concretamente apurada mas há alguns dias - delinear um plano para se introduzirem naquela habitação com o intuito de se apoderar de bens que aí se encontrassem e que lhes interessassem, assumindo que exerceriam ameaça/violência física sobre os ofendidos caso necessário.
19 - Para tanto, decidiram utilizar a réplica de arma de fogo do arguido R________ , a já referida “Denix”, com o n.° C78267, e de abraçadeiras de plástico, próprias para electricidade, estas com o intuito de amarrar os ofendidos se necessário.
20 - Assim, na execução do plano que previamente delinearam, na madrugada do dia 25 de Agosto de 2019, em hora não concretamente apurada mas seguramente entre as 01H00 e as 05H00 da manhã, os dois arguidos abeiraram-se da casa dos ofendidos e o arguido BMPC________ começou a gritar “a minha mãe está a morrer, precisa de ajuda, precisa de água ”.
21 - O ofendido FO______ - que estava no seu quarto - reconheceu a voz do arguido BMPC________ e foi buscar um copo de água, dirigindo-se logo de seguida à porta da casa, abrindo-a.
22  - Entretanto a ofendida IB________ - que estava a dormir na sala apenas com t-shirt, soutien e cuecas - tinha ouvido barulho e levantou-se, abeirando-se também da entrada.
23 - Nesse momento, os dois arguidos entraram de rompante no interior da residência, sendo que o arguido R________ empunhava a aludida réplica de arma de fogo.
24 - De imediato, começaram a perguntar pelo dinheiro e pelo ouro e, de seguida, começaram a agredir o ofendido, primeiro com murros e pontapés pelo corpo, e depois, designadamente, desferindo fortes pancadas com o punho da reprodução da arma na cabeça.
25 - De seguida, levaram os dois ofendidos para a sala e sentaram cada um deles num dos sofás, amarrando-lhes as mãos, à frente do tronco, com as abraçadeiras que tinham trazido consigo.
26 - De seguida, perguntaram ao ofendido FO______ se tinha fita adesiva e ele disse que estava na cozinha, altura em que o arguido R________ , sempre com a réplica de arma de fogo apontada à cabeça do ofendido, o conduziu à cozinha, para que aquele fosse buscar a fita.
27 - Na posse da fita adesiva, os arguidos reforçaram as amarrações dos punhos dos dois ofendidos.
28 - Entretanto, ordenaram ao ofendido FO______ que lhes entregasse os cartões Multibanco e lhes dissesse os respectivos códigos, sendo que aquele lhos entregou, apontando os códigos num papel, com receio pela sua integridade física.
29 - Também nesse momento, perguntaram ao ofendido FO______ se tinha cofre e ele disse que sim, sendo que um dos arguidos o acompanhou ao cofre, constrangendo-o a abri-lo, sob a ameaça da réplica da arma de fogo, e daí retirou moedas em ouro e, pelo menos, cerca de € 4.000,00 (quatro mil euros) em notas de € 20,00 (vinte euros).
30 - Depois, ainda perguntaram ao ofendido se tinha alguma arma e como este respondeu positivamente, foram buscá-la e apropriaram-se dela, sendo que, a partir desse momento, o arguido BMPC________ passou a empunhar essa pistola, de marca Tanfoglio, modelo GT 27, calibre .25 (6.35mm Browning), com o número de série rasurado e devidamente municiada.
31 - Também neste período de tempo, os arguidos constrangeram os ofendidos, sob ameaça, e empunhando a arma de fogo e a réplica de arma de fogo, a entregarem- lhes os seus telemóveis e respectivos códigos.
32 - Os arguidos continuaram a exigir ao ofendido mais dinheiro, mediante ameaças e agressões, e ele ainda foi com o arguido R________ ao primeiro andar da habitação.
33 - De regresso ao rés-do-chão, o arguido R________ formulou o propósito de ter relações sexuais com a ofendida IB____.
34 - Para tal, constrangeu a ofendida, sob ameaça, a acompanhá-lo ao quarto do ofendido FO______ e, já no interior dessa divisão, atirou-a para cima da cama, afastou-lhe as pernas com força e amarrou-a pelos tornozelos aos pés da cama.
35 - Acto contínuo, despiu-se da barriga para baixo, rasgou as cuecas e o soutien da ofendida, deitou-se em cima dela e penetrou-a com o pénis erecto na vagina, não se tendo apurado se ejaculou no seu interior.
36 - No final, deixou-a despida, entregando-lhe um cobertor para se tapar.
37 - De seguida, o arguido R________ vestiu-se e levou a ofendida novamente para a sala, onde estavam o arguido BMPC________ e o ofendido FO______ que sangrava abundantemente.
38 - Nesse momento, os arguidos decidiram dirigir-se à garagem e apropriaram- se de um dos veículos do ofendido, de marca Peugeot, modelo 206, com a matrícula YY-YY-YY - cujo valor não foi possível apurar - e utilizaram-no para fugir do local.
39 - Decidiram ainda que teriam de pôr fim à vida dos ofendidos, para evitar que estes viessem a denunciar os crimes por si praticados.
40 - Na execução desse plano, decidiram amordaçar, e atar também os pés dos dois ofendidos e levá-los consigo no interior do veículo - o ofendido FO______ no interior do porta-bagagens e a ofendida IB______ no banco traseiro.
41 - Dirigiram-se então naquele veículo a uma zona isolada de eucaliptal, em São Bartolomeu de Galegos, tiraram os ofendidos do carro e:
- ordenaram ao ofendido FO______ que se ajoelhasse - desconhecendo- se se voltaram a agredi-lo - e ali o abandonaram, perfeitamente conscientes das violentas agressões que lhe tinham infligido em todo o corpo e sobretudo na cabeça, que haviam provocado ferimentos com abundante sangramento e crentes que, face à parte do corpo envolvida e ainda à idade avançada da vítima, tais ferimentos eram idóneos a provocar-lhe a morte;
- a alguns metros de distância, ordenaram à ofendida que se ajoelhasse, e o arguido BMPC________, empunhando a pistola de marca Tanfoglio, modelo GT 27, calibre .25 (6.35mm Browning), com o número de série rasurado e devidamente municiada - efectuou um disparo - que a atingiu na cabeça, concretamente na zona parietal direita, causando-lhe de imediato perda de sentidos, bem sabendo que um disparo de arma de fogo na cabeça é idóneo a provocar o resultado morte;
42 - Acto contínuo, os arguidos abandonaram o local, convencidos de que os ofendidos, estavam já mortos, estando ambos amarrados de pés e mãos, encontrando-se a ofendida nua, apenas enrolada num cobertor, e com um disparo na cabeça, e o ofendido, de idade avançada, a sangrar profusamente da cabeça.
43 - Em consequência da conduta dos arguidos sofreu a ofendida IB____, além de fortes dores e mal-estar, diversos hematomas e escoriações em todo o corpo, sobretudo nos membros inferiores e uma ferida incisa parietal do lado direito - provocada pelo disparo da arma de fogo e que implicou que fosse submetida a cirurgia urgente para retirar o projéctil que se encontrava alojado na cabeça (craniectomia parietal direita), apresentando igualmente á data da entrada (25.08.2019) no Hospital de Santa Maria em Lisboa, as seguintes lesões no corpo e saúde:
- cefaleia intensa e défice visual;
- desorientação;
- hemianopsia hománima esquerda e lentificação motora no hemicarpo esquerdo;
- ferida inciso-contusa, infracentimétrica, occipital direita;
- erosões em ambos os punhos, circulares;
- membros inferiores com múltiplas escoriações lineares nos pés, tornozelos e região pré-tibial;
- projéctil metálico de arma de fogo, com um trajecto descendente desde a zona parietal direita (porta de entrada), passando pela transição temporo-occipital, através da tenda do cerebelo, até ao hemisfério cerebeloso direito;
- Humor depressivo de tonalidade ansiosa.
44 - Tais lesões, demandaram-lhe 145 dias de doença, sendo os primeiros 40 com afectação da capacidade de trabalho, geral e profissional.
45 - Ainda em consequência da conduta do arguido R________ descrita em 33 a 36, sofreu a ofendida IB______ uma lesão traumática na zona genital - área escoriativa no vestíbulo da vulva na zona de comissura posterior, lesão que demandou 3 dias para cura.
46 - A ofendida está livre de perigo de vida, porém, continua a sofrer de hemianopsia esquerda à confrontação, cefaleias na calote craniana, humor depressivo de tonalidade ansiosa, insónia, ataxia na marcha, perturbação de stress pós- traumático, défice visual de novo (visão turva), diminuição da acuidade visual no campo visual esquerdo, desconhece-se ainda a total extensão das lesões sofridas e as eventuais sequelas que poderão subsistir, sendo para já previsível que a mesma fique gravemente afectada, pelo menos, na visão periférica.
47 - Por sua vez, em consequência da conduta dos arguidos sofreu o ofendido  FO______ além de fortes dores e mal-estar, as seguintes lesões (na data da admissão hospitalar do mesmo em 25 de Agosto de 2019, no Hospital de São José em Lisboa):
- Politraumatismos;
- Hemorragia subaracnoídea;
- Múltiplos focos de contusão hemorrágica;
- Pneumotórax hipertensivo;
- contusão pulmonar;
- Fractura dos arcos costais (4° e 5° arcos costais à direita e da vertente
posterior da 1acostela):
- Fractura da sexta vertebra dorsal;
- Rabdomiólise, sem lesão renal aguda;
- Bacteriemia com CVC a Klebsiellapneumoniae;
- Estado de coma (score Glasgow 5).
48 - Tais lesões, demandaram desde a data do seu internamento, a total dependência para todas as actividades da vida diária, alimentação por sonda gástrica, foi submetido a traqueostomia com necessidades regulares de aspiração brônquica, sem reacção a qualquer estímulo (estado de coma).
49 - Por via deste quadro clínico, irrecuperável independentemente dos tratamentos médicos a que foi submetido, com as lesões melhor descritas e sequelas irreversíveis, determinaram que o ofendido FO______ tivesse permanecido em estado vegetativo até à data da sua morte, em 12 de Dezembro de 2019, no Hospital Distrital de Torres Vedras.
50 - Tais lesões e sequelas, designadamente, o traumatismo craneo- encefálico que sofreu por via da actuação supra descrita nos pontos 24 a 42, por banda dos arguidos, foi causa directa e necessária da morte que lhe sobreveio no dia 12 de Dezembro de 2019.
51 - Esclareça-se que:
52 - Após terem abandonado o local onde tinham deixado os ofendidos FO______ e IB____, os arguidos seguiram na viatura roubada, de matrícula YY-YY-YY, em direcção a Cascais.
53 - Depois, nesse mesmo dia, os arguidos seguiram ao volante da aludida viatura até à cidade do Porto, onde abandonaram a mesma.
54 - A viatura de matrícula YY-YY-YY veio a ser encontrada, estacionada na Rua  Bandeira, no Porto, ainda se encontrando no seu interior, os objectos descritos no auto de apreensão de fls. 625 a 640 (cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido), nomeadamente:
- três (3)a braçadeiras, uma tendo a referência “106 Hellermann”, e duas a referência “123 Hellermann”;
- uma (1) televisão Samsung, modelo UE46C5100QW, n.° de série Z6Q03SQZA00331B;
- um (1) computador portátil, Lenovo, com a inscrição K9 Brosky;
- uma (1) consola Sony, modelo PS4, com o n.° de série 02-274525742420490;
- duas (2) embalagens de cor verde com a inscrição “Escudo - Última Colecção de Moedas Correntes, Série Anual de 2001, contendo 7 moedas de colecção, cada uma;
- uma (1) carteira de cor azul contendo 14 moedas de colecção;
- uma (1) carteira de pele de cor castanha, contendo vários documentos de IB________ e de   FO____;
- um (1) telemóvel Samsung, modelo GT-E12001, com IMEI 357262065841228;
- um (1) telemóvel Huawei, modelo Y360, com IMEI's 860795031033032 e 860795031033040;
- um (1) cartão de cidadão, caducado, de J...;
- uma (1) pistola Tanfoglio, calibre .25, com n.° de série rasurado, com uma munição por deflagrar na câmara, com carregador com cinco munições por deflagrar;
- um objecto com a configuração de (1) pistola DENIX - made in Spain, com o n.° C78267, com carregador sem munições, de calibre 9mm;
- uma (1) faca de cozinha, com lâmina de 20 cm, cabo em madeira com a inscrição “Schinken-Messer”.
55 - Aí, nas imediações da Rotunda da Boavista, os arguidos contrataram um serviço de táxi para a cidade de Vila Real e daí, seguiram para a cidade da Guarda, onde ficaram alojados.
56 - Entretanto, os arguidos abandonaram a cidade da Guarda e rumaram a Espanha, onde foram detidos na cidade de Leon, mercê dos mandados de detenção europeus emitidos nos autos, e, entregues às autoridades portuguesas.
57 - Ao actuarem da forma descrita, os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, na execução de um plano que previamente delinearam e que foram adaptando, sempre de comum acordo.
58 - Agiram desde logo com o propósito alcançado de se introduzirem na habitação dos ofendidos contra sua vontade, durante a madrugada, que sabem ser um período de descanso em que é mais difícil que terceiros se apercebam do que se está a passar, o que fizeram, num primeiro momento através de engano que astuciosamente criaram no ofendido FO______ e, num segundo momento, através de ameaça com arma de fogo, tendo o intuito de dali subtrair bens que aí se encontrassem e lhes interessassem.
59 - Já no interior da residência, ao agredir brutalmente o ofendido e ao empunhar e apontar aos ofendidos FO______ e IB______ - num primeiro momento e num segundo momento, uma réplica de arma de fogo e uma arma de fogo, tiveram sempre intenção de os constranger a entregarem-lhes dinheiro, ouro, telemóveis, cartões multibanco e uma arma de fogo, dos quais queriam e conseguiram apropriar-se.
60 - Num segundo momento, e sempre por meio desta ameaça contra a vida dos ofendidos, quiseram ainda subtrair-lhes o veículo de matrícula YY-YY-YY, o que igualmente conseguiram.
61 - Mais sabiam que, ao não deixar os ofendidos sair da habitação, obrigando- os a ali permanecer contra a vontade daqueles, e ao transportá-los contra a sua vontade no veículo, por intermédio de ameaças e violência, e amarrando-os, os privavam da sua liberdade de locomoção e de autodeterminação, o que conseguiram.
62 - O arguido R________ , ao actuar da forma descrita em 33 a 36, sabia que actuava contra a vontade da ofendida e que a compelia a sofrer, no seu corpo, actos que lesavam a sua liberdade sexual e, no entanto, quis praticar tais factos, agindo com o propósito de satisfazer os seus instintos libidinosos, para cuja concretização, usou da sua força e superioridade física, colocando-a na impossibilidade de obstar a tais propósitos, o que conseguiu e quis, agindo ainda com o intuito de a humilhar e de demonstrar poder.
63 - Por fim, os arguidos agiram com o propósito claro de matar os ofendidos, o que efectivamente lograram conseguir quanto à pessoa de  FO______ bem sabendo que as suas condutas, atentos os instrumentos usados e as zonas visadas pelos golpes e efectivamente atingidas, eram aptas a produzir tal resultado, o que quiseram, tudo com o intuito de encobrirem os outros crimes e de facilitar a sua fuga, não se abstendo, no caso da ofendida IB____, de utilizar para o efeito uma arma de fogo.
64 - Agiram sempre, com total desprezo pela vida humana e com recurso a violência extrema e desproporcionada, face à quase nula resistência dos ofendidos, não se coibindo de utilizar uma arma de fogo e uma réplica de arma de fogo; imobilizando as vítimas com abraçadeiras e fita-cola; desferindo pancadas, designadamente com a réplica da arma de fogo ou com a arma de fogo na cabeça do falecido FO______ bem como, desferindo pancadas brutais no seu corpo, abandonando-os em local isolado.
65 - Apenas não lograram matar a ofendida IB_______ por motivos externos à sua vontade, atenta a trajectória percorrida pelo projéctil.
66 - Sabiam ainda de antemão, o que vale para todas as condutas, que o ofendido era pessoa particularmente indefesa, em razão da idade.
67 - Ao actuarem da forma descrita, os arguidos agiram de forma livre, voluntária e consciente, na execução de um plano que previamente delinearam e que foram adaptando, sempre de comum acordo.
68 - Ao empunhar e utilizar a arma de fogo e a réplica de arma de fogo, supra descritas, sabiam igualmente não serem titulares de licença de uso e porte de arma, que é obrigatória e, não obstante quiseram detê-las e utilizá-las.
69  - Sabiam ainda que todas estas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.
*
Do pedido de indemnização civil deduzido pela assistente/demandante IB____:
70 - Em consequência da actuação dos arguidos/demandados, a assistente/demandante sofreu fortes dores e mal-estar, diversos hematomas e escoriações em todo o corpo, sobretudo nos membros inferiores e uma ferida incisa parietal do lado direito, provocada pelo disparo da arma de fogo e que implicou que fosse submetida a cirurgia parietal direita, apresentando à data de entrada em 25-082019 no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, as seguintes lesões:
- cefaleia intensa e défice visual.
- desorientação.
- hemianopsia homânima esquerda e lentificação motora no hemicarpo
esquerdo.
- ferida inciso-contusa, infracentrimétrica, occipital direita.
- erosões em ambos os punhos, circulares.
- membros inferiores com múltiplas escoriações lineares nos pés, tornozelos e região pré-tibial.
- projéctil metálico de arma de fogo, com um trajecto descendente desde a zona parietal direita (porta de entrada), passando pela transição temporo/occipital, através da tenda do cerebelo, até ao hemisfério cerebeloso direito.
- humor depressivo de tonalidade ansiosa.
71 - As referidas lesões demandaram na assistente/demandante 145 (cento e quarenta e cinco) dias de doença, sendo os primeiros 40 (quarenta) com afectação da capacidade de trabalho, geral e profissional.
72 - Em consequência da conduta do arguido/demandado R________   , supra descrita em 33 a 36, a assistente/demandante sofreu uma lesão traumática na zona genital - área escoriativa no vestíbulo da vulva na zona de comissura posterior, lesão que demandou 3 (três) dias para a cura.
73 - A assistente/demandante encontra-se livre de perigo de vida, porém, continua a sofrer de hemianopsia esquerda à confrontação, cefaleias na calote craniana, humor depressivo de tonalidade ansiosa, insónia, ataxia na marcha, perturbação de stress pós-traumático, défice visual de novo (visão turva), diminuição da acuidade visual no campo visual esquerdo, sendo ainda desconhecida a total extensão das lesões sofridas e as eventuais sequelas que poderão subsistir, sendo para já previsível que a mesma fique gravemente afectada, pelo menos, na visão periférica.
74 - Determinando tais sequelas um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica da assistente/demandante, repercutindo-se de forma significativa no seu desempenho físico e psíquico.
75 - A assistente/demandante irá necessitar de acompanhamento médico e de recorrer de forma regular a tratamentos de fisioterapia, de oftalmologia e das especialidades de psiquiatria e de psicologia.
76 - Depois de ter sido dada alta hospitalar, a assistente/demandante regressou ao seu domicílio mas, face às sequelas descritas em 73, necessitou que lhe fosse prestado apoio domiciliário para acompanhamento e apoio nas tarefas do dia-a-dia, nos cuidados de higiene, conforto pessoal, apoio na alimentação, apoio na mobilidade e limpeza da habitação.
77 - Por tal apoio domiciliário a assistente/demandante pagou ao Centro de Dia da Bufarda a quantia de € 525,00 (quinhentos e vinte e cinco euros).
78 - Pelos mesmos motivos a assistente/demandante teve de despender as quantias de € 94,05 (noventa e quatro euros e cinco cêntimos) em medicamentos, € 17,95 (dezassete euros e noventa e cinco cêntimos) em análises clínicas, e € 23,00 (vinte e três euros) em consultas médicas.
79 - Tudo no total de € 659,98 (seiscentos e cinquenta e nove euros e noventa e oito cêntimos).
80 - Em consequência da actuação dos arguidos/demandados a assistente/demandante viveu momentos de grande terror, incerteza e pânico, tendo a prévia noção que iria ser executada com um tiro na cabeça e que iria morrer, e sofreu fortes dores, que ainda persistem.
81 - Após as condutas dos arguidos/demandados de que foi vítima, a assistente/demandante passou a ter receio de sair de casa sozinha, de passear em espaços abertos sem a companhia de alguém, ou de estar sozinha em algum local isolado, sentindo-se ansiosa e com medo que pudesse ser novamente atacada por alguém.
82 - Passando a ter de ser acompanhada continuamente pelos seus irmãos JCB____ e  JNB____, e a ter necessidade de se socorrer dos serviços de apoio domiciliário.
83 - As sequelas supra descritas causam e continuarão a causar na assistente/demandante grande sofrimento físico e psicológico.
 84 - A assistente/demandante em consequência directa do trauma experienciado passou a viver, diariamente, aterrorizada, constrangida, nervosa, perturbada e em permanente sobressalto, restringindo na maior parte as suas saídas a situações estritamente necessárias.
85 - A assistente/demandante tem episódios recorrentes de recordação dos acontecimentos, sobretudo durante a noite, que a fazem ter pensamentos e sonhos perturbadores e a impedem de dormir com normalidade.
86 - A assistente/demandante sempre foi tida como pessoa educada, calma, apaziguadora, trabalhadora, respeitadora, sociável e com uma conduta irrepreensível,
perfeitamente inserida na comunidade em que vive.
*
Do pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central, E.P.E.:
87 - Em consequência das lesões sofridas pelo ofendido  FO______ o demandante prestou-lhe assistência hospitalar, importando o custo respectivo em € 50.580,99 (cinquenta mil quinhentos e oitenta euros e noventa e nove
cêntimos), quantia não paga até à presente data.
*
Do pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, E.P.E.
88 - O demandante é uma pessoa colectiva de direito público integrada no Serviço Nacional de Saúde.
89 - Como consequência directa e necessária da conduta dos arguidos/demandados, no dia 25-08-2019 IB________ sofreu traumatismo crânio-encefálico, fractura afundada com ferida cerebromeningea parietal direita com projéctil na fossa posterior à direita, apresentando hematoma no trajecto, cefaleia intensa e défice visual, humor depressivo de tonalidade ansiosa e perturbação de stress pós-traumático, necessitando de tratamento médico que incluiu a realização de intervenção cirúrgica.
90 - Em resultado de tais lesões, o demandante prestou a seguinte assistência hospitalar a IB____:
a) - Cuidados de saúde em episódio de internamento (GDH 20 - Craniotomia por traumatismo - grau de severidade 2), no Serviço de Neurocirurgia, de 25-08-2019 a 03-09-2019, importando o custo respectivo em € 8.115,41 (oito mil cento e quinze euros e quarenta e um cêntimos).
b) - Cuidados de saúde em Consulta Externa de Psiquiatria - Ligação Psicológica, no dia 27-09-2019, e Consulta Externa de Neurocirurgia, no dia 30-092019, importando o custo respectivo em € 50,10 (cinquenta euros e dez cêntimos).
c) - Cuidados de saúde em Consulta de Urgência, no dia 17-10-2019, importando o custo respectivo em € 112,07 (cento e doze euros e sete cêntimos).
d) - Cuidados de saúde em Consulta Externa de Neurocirurgia, no dia 17-022020, e meios complementares de diagnóstico e terapêutica (TC do crânio), nos dias 17-01-2020 e 19-02-2020, importando o custo respectivo em € 165,00 (cento e sessenta e cinco euros).
91 - A ofendida IB________ ainda não cessou os tratamentos decorrentes dos factos de que foi vítima em 25-08-2019, estando marcada, para já, nova consulta de neurocirurgia no dia 12-02-2021.
92 - O custo total da assistência médica e hospitalar prestada pelo demandante à ofendida IB______ importou até 20-03-2020, a quantia global de € 8.442,58 (oito mil quatrocentos e quarenta e dois euros e cinquenta e oito cêntimos), montante que não foi pago até à data.
*
Do pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante Centro Hospitalar do Oeste, E.P.E.:
93 - O demandante encontra-se integrado no Sistema Nacional de Saúde, tendo por objecto a prestação de cuidados de saúde em assistência hospitalar.
94 - O demandante em consequência das lesões sofridas por IB____, prestou à ofendida cuidados de saúde hospitalares, importando o custo respectivo em € 1.398,43 (mil trezentos e noventa e oito euros e quarenta e três cêntimos), quantia que não foi paga até à presente data.
95 - O demandante em consequência das lesões sofridas por  FO______ prestou ao ofendido cuidados de saúde hospitalares, importando o custo respectivo em € 5.988,75 (cinco mil novecentos e oitenta e oito euros e setenta e cinco cêntimos), quantia que não foi paga até à presente data.
*
Mais se provou:
96 - O arguido BMPC________ admitiu parcialmente a autoria dos factos, sem demonstrar arrependimento sincero.
97 - O percurso psicossocial do arguido decorreu nas Caldas da Rainha, integrado no agregado familiar de origem, composto pelos progenitores, uma irmã e um irmão mais velhos. A dinâmica familiar é referenciada como tendo sido funcional e gratificante, embora com pouco acompanhamento parental durante a infância, desenvolvendo os progenitores esforços para suprimir a carência de tipo económico, uma vez que, apesar de os progenitores serem proprietários de um circo, o agregado apresentava uma situação carenciada, dado que subsistia apenas da verba resultante dos espectáculos itinerantes e sazonais que realizavam.
98- O arguido iniciou a escola em idade regulamentar, estudando até ao 8° ano de escolaridade, registando quatro reprovações no 4° ano do ensino básico, devido a dificuldades de regulação emocional e perturbações do comportamento, nomeadamente mau comportamento e conflitos com colegas. Aos 11 anos de idade, e após o agregado familiar ter alterado a sua residência para Lisboa pelo período de cerca de um ano, no regresso às Caldas da Rainha realizou várias tentativas de fuga, por dificuldades de adaptação, tentando evitar voltar à vivência num meio rural.
99- Desde cedo o arguido envolveu-se num grupo de pares com problemáticas associadas a comportamentos desviantes, sendo nesse contexto que começou a consumir álcool aos dezasseis anos de idade e haxixe aos vinte e dois anos de idade, definindo os mesmos como consumos recreativos e sem consequências para a sua vida.
100 - Após a conclusão do 8° ano de escolaridade, aos dezasseis anos de idade, iniciou o seu percurso laboral em campanhas sazonais de apanha de fruta a par com o trabalho na área da construção civil como servente de pedreiro, onde se manteve durante dez anos.
101 - Aos vinte e seis anos de idade iniciou funções laborais de ajudante de cozinha num estabelecimento de restauração em Lisboa, onde permaneceu durante três anos, tendo sido despedido pelo facto de ter cometido infracções rodoviárias e ter ficado sem carta de condução, o que inviabilizou as suas deslocações para o local de trabalho.
102 - Assim, aos trinta anos de idade iniciou funções laborais na agricultura, dedicando-se à realização de tarefas agrícolas indiferenciadas, fixando-se na sua área de residência - Lourinhã, onde trabalhou durante cinco anos a tempo inteiro, nos terrenos agrícolas de um dos ofendidos.
103 - Com o óbito do progenitor, com quem mantinha uma ligação de proximidade afectiva importante, o arguido ter-se-á desorganizado do ponto de vista pessoal, com consequências no seu quotidiano, que passaram por um maior isolamento social, intensificação do consumo de álcool e haxixe e instabilidade laboral. Terá sido também neste período que iniciou os consumos de cocaína, ainda que pontualmente, assumindo que tinha tais consumos controlados.
104 - Em termos laborais aos trinta e cinco anos deu continuidade a actividades agrícolas indiferenciadas, embora através de uma colaboração mais pontual, quer para o ofendido, quer para outros proprietários rurais.
105 - Do ponto de vista afectivo, o arguido iniciou aos trinta e cinco anos de idade, e através do facebook, uma relação com uma cidadã estrangeira, tendo sido gratificante do ponto de vista emocional, relacionamento que teve a duração de quatro anos, regressando a sua ex-companheira à Argentina de onde é natural.
106 - À data dos factos o arguido residia na aldeia do Sobral, Lourinhã, com a progenitora, reformada e com problemáticas de saúde que lhe provocam dificuldades de locomoção, numa habitação propriedade desta.
107 - Em Julho de 2019, o arguido convidara o co-arguido R________ , que conhecera recentemente, para habitar no seu agregado familiar, uma vez que este se encontraria numa condição de alegada vulnerabilidade na sequência de uma recente separação afectiva. O arguido tinha por hábito, ainda que contra a vontade da progenitora, permitir a residência temporária de pessoas em situação de vulnerabilidade social num espaço anexo à habitação familiar, por alegadamente se sentir bem a apoiar pessoas com problemáticas pessoais e sociais.
108 - Encontrando-se desempregado, o arguido trabalhava de forma pontual e sempre que era chamado para vários proprietários rurais, auferindo um vencimento mensal de cerca de € 800,00, ao qual acrescia o valor da reforma da progenitora que é beneficiária da reforma mínima, sendo com tais montantes que asseguravam o sustento do agregado familiar, de condição económica modesta, mas capaz de fazer face às despesas do agregado.
109 - Em termos pessoais o arguido é referido como uma pessoa reservada e de rotinas solitárias, não lhe sendo conhecida vida social, nem relações de amizade significativas na zona da Lourinhã, ainda que mantivesse uma relação de amizade recente, mas próxima, com o co-arguido R________ .
110 - No Estabelecimento Prisional o arguido tem mantido uma postura relativamente adequada, colaborante, mas reservada, quer com os outros reclusos, quer com os serviços de vigilância e técnicos, tendo sido alvo de uma sanção disciplinar, na forma de repreensão escrita, por ter entrado em conflito com outros reclusos.
111 - Pese embora o tenha solicitado, ainda não se encontra actualmente integrado em qualquer actividade escolar, formativa ou laboral.
112 - Tem beneficiado apenas de visitas pontuais da progenitora, prestando- lhe o apoio que é possível, já que com os irmãos não mantém qualquer tipo de relação desde que foi preso.
113 - De acordo com o relatório social, em termos de características pessoais, o arguido «revela tendência para se manter reservado e defensivo, evitando falar de questões pessoais que sente como difíceis de abordar, apresentando um discurso autocentrado e manipulador. No que diz respeito às interacções pessoais apresenta algum isolamento social, fraca ressonância afectiva, necessidade de se sentir aceite e reconhecido pelos outros, bem como dificuldades ao nível do auto controlo e da impulsividade, quando se sente confrontado/posto em causa.
(...)
Relativamente à actual situação jurídico-penal, ainda que centre o seu discurso no impacto que a reclusão tem tido para si e apresente um discurso vitimizante, demonstrativo de alguma frieza e de fraca ressonância afectiva, parece revelar consciência do bem jurídico em causa e do dano, ainda que em abstracto. No entanto, no seu discurso sobressaem mecanismos de tentativa de racionalização das circunstâncias que deram origem ao processo judicial em causa, desculpabilizando- se, fazendo uma atribuição causal externa e escudando-se nas dificuldades económicas, no consumo de cocaína e em alegados conflitos que tinha com um dos ofendidos. No discurso que apresenta surgem ainda indícios de dificuldades ao nível da capacidade de empatia, do pensamento consequencial e da capacidade de resolução de problemas.».
114 - Do certificado de registo criminal do arguido BMPC________ nada consta.
*
115 - O arguido R________ admitiu parcialmente a autoria dos factos, não manifestando arrependimento sincero.
116- O processo de socialização do arguido decorreu no agregado familiar de origem, composto pelo próprio e pelos progenitores, de forma normativa até à adolescência.
117 - O arguido iniciou o percurso escolar em idade apropriada, sendo o seu acompanhamento educacional feito essencialmente pela progenitora, existindo por parte do progenitor alguma permissividade educativa que tentava compensar com bens materiais.
118 - Aos onze/doze anos de idade do arguido, o agregado numa tentativa de melhorar as condições de vida emigrou para os EUA. Neste país o arguido reiniciou o percurso escolar, tendo concluído o ensino secundário com dezasseis anos de idade, sem nunca ter reprovado.
119 - O arguido adaptou-se e integrou-se com facilidade neste novo país, estabelecendo com facilidade novas amizades, descrevendo esse período da sua vida como gratificante.
120 - Quando o arguido tinha quinze/dezasseis anos de idade, o início do consumo excessivo de bebidas alcoólicas por parte do progenitor e a consequente violência psicológica e física exercida sobre a mãe e sobre o arguido, por este enfrentar o pai nessas situações de conflito, aliado ao facto de o progenitor não ter hábitos de trabalho, despoletou a partida, em 2015/2016, do arguido com a progenitora para o Reino Unido.
121 - No Reino Unido o arguido iniciou um percurso de especialização profissional, concluindo um curso de personal trainer com a duração de dois anos, tendo também frequentado um curso sobre gestão de empresas, com a duração de dois anos, do qual concluiu apenas um ano, desistindo do curso por profissionalmente não o achar interessante. Em simultâneo iniciou o percurso laboral trabalhando em regime de part-time numa loja de artigos de desporto e no período nocturno como empregado de balcão e como gerente em dois restaurantes.
122 - Em 2016 o progenitor também emigrou e juntou-se ao agregado, na sequência do que o ambiente familiar degradou-se, sendo que num período em que os avós maternos do arguido foram visitar a filha ao Reino Unido, o pai terá sido expulso de casa.
123 - Com cerca de dezassete anos o arguido iniciou um relacionamento afectivo com uma companheira de nacionalidade portuguesa, nascendo dessa relação o único filho do arguido. Numa fase inicial o casal residiu num quarto e posteriormente residiram na habitação do agregado do arguido, tendo a relação terminado por alegada conflitualidade inter familiar.
124 - Na sequência de uma nova relação afectiva da progenitora, no início de 2018, o arguido e a mãe regressaram a Portugal, passando a residir inicialmente com o padrasto em Tavira, e posteriormente na região de Mafra. O arguido não aceitou este novo relacionamento da sua mãe, não tendo aceitado as regras e as normas familiares impostas pelo padrasto, levando-o a sair mais uma vez do agregado familiar.
125 - Como corolário dessa situação, o arguido abandonou o seu agregado familiar deixando de se relacionar com a sua mãe e padrasto e foi morar para casa de uns amigos no centro de Cascais, tendo posteriormente ido residir para um apartamento no Bairro da Torre, em Cascais, partilhando o mesmo com um amigo.
126 - À data o arguido trabalhava no período nocturno como bartender num bar da zona, auferindo cerca de € 90.00 por noite, exercendo também pontualmente a profissão de relações públicas em bares, auferindo cerca de € 100,00/€120,00 por noite.
127 - Paralelemente compunha e cantava música rap, sendo o seu nome artístico King Brosky 17, às sextas-feiras e fins-de-semana, protagonizando miniconcertos em diversos bares situados em praias em Santa Cruz e na Lourinhã, auferindo cerca de € 300,00/€ 400,00 por actuação.
128 - Em Março/Abril de 2019 iniciou novo relacionamento com uma companheira, passando a residir na casa desta no Sobral, Lourinhã, onde residia o progenitor da mesma. Esta relação terminou devido a acusações de infidelidade por parte da companheira, saindo a mesma de casa, passando a residir com a mãe no estrangeiro. Posteriormente o pai da companheira expulsou o arguido de casa porque este se relacionava com pares com comportamentos pró-criminais.
129 - Em termos dos relacionamentos afectivos que foi estabelecendo, o arguido descreve os mesmos como tendo sido sempre gratificantes, no que diz respeito à vivência da sexualidade, verbalizando mesmo ter bastante sucesso com o sexo oposto, descrevendo-se a este nível como um playboy, no sentido de que não teria dificuldade em obter esse tipo de relacionamentos sempre que pretendesse.
130  - Entre os dezassete e os dezanove anos de idade consumiu haxixe em contexto de pares, aos fins-de-semana, frequentando bares e discotecas, tendo alegadamente cessado o consumo a partir dos dezanove anos de idade, sem que tenha recorrido a ajuda especializada.
131 - Em termos de ocupação de tempos livres o arguido praticou futebol americano nos EUA e futebol no Reino Unido, tendo sido também praticante de surf. Para além disso frequentava o ginásio e saía à noite, para bares e discotecas com os amigos. O arguido terá frequentado o casino durante um mês, jogando póquer, alegadamente para obter proveitos económicos com que adquiriu diversos bens, nomeadamente equipamento musical, não avaliando esta forma de obtenção de proveitos económicos como problemática enquanto estilo de vida.
132 - À data dos factos o arguido residia no Sobral, em casa do co-arguido, há cerca de três/quatro semanas, onde residia também a mãe deste, que já lhe tinha pedido para abandonar a habitação por considerar que este não era boa companhia para o filho.
133 - O arguido desenvolvia ocupação laboral em trabalho agrícola sazonal, auferindo € 7,50 hora, o que perfazia cerca de € 200,00/€ 300,00 semanais, sendo a sua situação económica suficiente para fazer face às suas despesas pessoais.
134 - Tinha deixado de compor música rap porque não tinha alegadamente condições logísticas para o fazer, nomeadamente um estúdio, deixando assim de fazer espectáculos com a consequente diminuição de rendimentos.
135 - Em termos relacionais, no período anterior à sua prisão o arguido não mantinha qualquer contacto com os progenitores, não mantendo qualquer contacto com o seu filho menor, actualmente com três anos de idade, visionando apenas as suas fotografias nas redes sociais.
136 - O arguido mantinha uma relação de amizade e de proximidade com o co- arguido, nutrindo por este um sentimento de gratidão pelo facto de o mesmo lhe ter dado abrigo em sua casa aquando da ruptura da relação afectiva com a sua última companheira, tendo iniciado a sua relação de amizade nessa altura.
137 - Dois meses antes da sua actual prisão o arguido começou a consumir cocaína, fazendo-o em companhia do co-arguido.
138 - Nos tempos livres saía à noite com o co-arguido, consumindo também bebidas alcoólicas, social e moderadamente, e em casa jogava playstation.
139 - No Estabelecimento Prisional o arguido tem visitas assíduas da progenitora e pontuais do padrasto, tendo reatado a relação com este, mantém-se abstinente relativamente ao consumo de cocaína, sendo acompanhado pelos serviços clínicos e em consultas de psicologia.
140 - Tem mantido um comportamento adequado, isento de medidas disciplinares, mostrando receptividade à intervenção técnica, não se encontrando ocupado do ponto de vista laboral ou formativo, e apenas frequenta o pátio e na camarata onde se encontra, joga às cartas e visiona alguns programas televisivos.
141 - De acordo com o relatório social «ao nível das relações interpessoais que estabelece, o arguido revela imaturidade e tendência para ser permeável a grupos de pares, evidenciando ser um indivíduo facilmente influenciável.
(...)
... revela fraco sentido crítico no que concerne às circunstâncias que deram origem à sua prisão, minimizando e relativizando as mesmas, denotando também lacunas ao nível do pensamento consequencial e da resolução de problemas.».
142 - Do certificado de registo criminal do arguido R________ nada consta.
*
FACTOS NÃO PROVADOS:
Com relevância para a presente decisão não resultaram provados quaisquer outros factos. Designadamente, não se provou:
1 - Que os arguidos soubessem que o ofendido FO______ padecia de um carcinoma na próstata.
2 - Que aquando do referido em 32 da factualidade provada, o ofendido FO______ tenha entregado quantia em dinheiro em montante não concretamente apurado.
3 - Que aquando do referido em 40 dos factos provados, os arguidos tenham vendado os ofendidos.
4 - Que aquando do referido em 42 dos factos provados os arguidos estivessem convencidos que os ofendidos estavam vivos e que viriam a falecer rapidamente, por não lhes ser prestado qualquer auxílio na quele local.
*
MOTIVAÇÃO:
A convicção do Tribunal quanto ao apuramento dos factos provados, fundamentou-se na análise conjugada e crítica:
1 - das declarações do arguido R________   .
Relativamente aos factos ocorridos no dia 30 de Julho de 2019, o arguido negou a autoria dos mesmos, não obstante admitir que se deslocou ao local e que entrou na residência, de onde levou consigo os bens descritos no ponto 3 da acusação, tendo as declarações do arguido sido infirmadas pelo depoimento coerente, consistente e objectivo de IA_____, nos termos infra mencionados.
Assim o arguido começou por referir que conhecia IA  por ser irmão da sua ex-namorada, de nome B, com quem viveu na morada indicada no ponto 1 da acusação, referindo que a mesma tinha viajado, dizendo-lhe para continuar a residir no local, tendo o pai da sua ex-namorada, dois dias antes, colocado os seus pertences à porta de casa, passando a viver em casa do arguido BMPC________ desde o dia 28-072019.
No dia 30-07-2019 deslocou-se à residência depois de ter combinado encontrar- se com IA______ , negando que tenha levado uma faca, mencionando que tinha na referida habitação a réplica de arma de fogo, com a configuração de uma pistola, que tinha comprado há cinco meses, em Santa Cruz, por € 80,00.
Não obstante ter a chave de casa não entrou, tendo entregado a chave a IA______ , conversando com este a respeito do dinheiro que lhe era devido pelo facto de ter efectuado a pintura da casa, no montante de € 650,00, e sobre a forma como tinha sido expulso de casa pelo pai de IA______ , que nesse dia estava nas traseiras da residência, numa oficina de automóveis, não tendo conversado com o mesmo.
Referiu que IA______  deixou-o entrar na residência, ficando na sala enquanto o declarante foi ao quarto buscar a réplica da arma de fogo que colocou à cintura, e a sua roupa.
Naquele dia levou consigo o computador e a PS4, mencionando que depois de ter levado o computador enviou uma mensagem à sua ex-namorada, que lhe disse que podia levar consigo o computador; e que a consola, modelo PS4 foi comprada pelo declarante e pela sua ex-namorada, não obstante encontrar-se no nome desta, tendo pago duas prestações, depositando para o efeito na conta bancária daquela as quantias respectivamente de € 100,00 e de € 90,00.
No dia seguinte voltou a falar com IA______ , que lhe pagou o dinheiro da dívida da pintura, abrindo-lhe novamente a porta da residência, tendo levado consigo a televisão Samsung, pertença da sua ex-namorada, admitindo que a retirou sem autorização da mesma, não obstante mencionar que telefonou-lhe posteriormente, tendo aquela ficado aborrecida, dizendo-lhe contudo que podia ficar na posse da televisão até ao seu regresso a Portugal, mencionando ainda que era a única televisão que existia na sala, e que levou aquela por ser a mais barata e não ser utilizada.
Quanto aos factos ocorridos no dia 13 de Agosto de 2019, o arguido não pretendeu prestar declarações.
No que concerne aos factos ocorridos no dia 25-08-2019, de que foram vítimas FO______ e IB_______  o arguido admitiu parcialmente a autoria dos mesmos, sem contudo demonstrar qualquer arrependimento sincero, limitando-se a verbalizar, sem ressonância afectiva, que está arrependido.
Assim, admitiu que na data em questão deslocou-se ao local com o co-arguido  BMPC________, e que foi o primeiro a entrar na residência, levando na sua posse a réplica de arma de fogo, nas calças, mencionando que agarrou no ofendido FO______ pelos braços; que tropeçaram, caíram nas escadas, e o copo partiu-se causando um ferimento na cabeça do ofendido.
Admitiu igualmente que manteve relações sexuais com a ofendida IB_______ contra a vontade desta, tendo-a encaminhado para o quarto do ofendido FO______ levando a ofendida apenas com as mãos amarradas, mencionando que quanto a tal factualidade «não queria falar de pormenores».
Referiu que quando regressou do quarto com a ofendida, o ofendido FO______ sangrava da cabeça, negando que o tenha agredido, referindo que também não viu o arguido BMPC________ agredir o ofendido, sem apresentar qualquer justificação plausível para os ferimentos profundos que o ofendido tinha, designadamente na zona da cabeça, admitindo todavia que deslocou-se com o ofendido à cozinha para ir buscar a fita adesiva isoladora, referindo que foi o arguido BMPC________ quem se dirigiu ao cofre, admitindo que o objectivo de ambos era dividir pelos dois o dinheiro que retirassem ao ofendido.
Confrontado com a factualidade imputada no ponto 31 da acusação negou a autoria da mesma, referindo que um dos telemóveis encontrados no interior do veículo pertencia ao co-arguido BMPC________, desconhecendo o proprietário do outro telemóvel.
Quanto à deslocação dos ofendidos até à zona do eucaliptal, admitiu a subtracção do veículo marca Peugeot, referindo que foi o co-arguido BMPC________ quem conduziu a viatura, tendo este dito inicialmente que iam levar os ofendidos para o hospital, mudando posteriormente de planos, dirigindo-se para a zona do eucaliptal, e que nesse local, tiraram primeiro o ofendido FO______ do veículo, tendo sido o co-arguido BMPC________ que levou o ofendido para o meio do mato, ficando o declarante junto à viatura, sem conseguir ver nada; e que, depois ajudou a levar a ofendida IB______ para o meio do mato, para o lado esquerdo relativamente ao local onde ficou o ofendido FO______ tendo virado costas, começando a andar na direcção da viatura, ouvindo o barulho de um tiro.
Findas tais declarações, o arguido referiu expressamente que não pretendia continuar a prestar declarações quanto aos factos imputados na acusação.
2  - das declarações do arguido BMPC________.
Relativamente aos factos ocorridos no dia 13 de Agosto de 2019, negou a autoria dos mesmos, limitando-se a referir que nesse dia apenas deram boleia a J... até à Lourinhã, no veículo Opel pertença da sua mãe, que o declarante conduzia, regressando posteriormente os arguidos a casa, tendo as declarações do arguido sido infirmadas pelo depoimento coerente, consistente e objectivo da testemunha J..., nos termos infra mencionados.
A este respeito referiu que conhecia o co-arguido R________ desde que o mesmo foi residir para o Sobral, tendo-o acolhido em sua casa, trabalhando ambos na agricultura, conhecendo de vista a enteada de J..., de nome Bianca, tendo a percepção que o co-arguido R________ tinha um relacionamento com aquela.
Quanto aos factos ocorridos no dia 25-08-2019, de que foram vítimas FO______ e IB______, admitiu parcialmente a comparticipação nos mesmos, sem demonstrar igualmente qualquer arrependimento sincero, limitando- se a verbalizar, sem ressonância afectiva, que «desejava pedir desculpa à família das vítimas».
Em termos globais começou por referir que conhecia os ofendidos há cerca de vinte anos, tendo trabalhado na agricultura para o ofendido FO______ durante oito anos, até 2019, desconhecendo que o mesmo estava doente.
Referiu que desde há dois anos a ofendida IB_______ sobrinha do ofendido FO______ começou a interferir no trabalho do tio, sabendo que na residência do ofendido existia um cofre, uma vez que tinha ouvido o ofendido dizer que tinha de ir ao cofre buscar o dinheiro para fazer os pagamentos.
Mencionou que o ofendido FO______ ficou a dever-lhe a quantia de € 1.500,00; que uma semana antes tinha ido sozinho falar com o ofendido, que lhe disse que não pagava porque não tinha mais dinheiro; e que no dia anterior tinha voltado a falar com o ofendido que continuou a dizer que não pagava, tendo nessa noite consumido cocaína e bebido álcool, dizendo ao co-arguido R________ que o ofendido lhe devia dinheiro, e que «ou pagava a bem ou a mal», tendo o co-arguido R________ dito que o acompanhava, desconhecendo que o mesmo levava a réplica de arma de fogo, tendo levado as abraçadeiras porque «caso corresse mal atava os ofendidos à escada».
Quanto ao pretexto encontrado para que o ofendido abrisse a porta e entrassem na residência, admitiu a factualidade imputada nos pontos 21 a 23 da acusação, referindo que apercebeu-se primeiro que não obstante a hora tardia existia iluminação no interior da casa, na sala e na cozinha.
Referiu que o co-arguido R________ foi o primeiro a entrar na residência, tendo entrado logo de seguida, e que a ofendida gritava por socorro, tendo-lhe dito para ter calma, tendo a mesma ficado no hall de entrada.
Confrontado com a factualidade imputada no ponto 24 da acusação, negou ter agredido o ofendido FO______ mencionando que o co-arguido R________
«deu uma chapada no ofendido, e disse-lhe para dizer a verdade, para dizer onde estava o dinheiro».
Admitiu que amarrou os ofendidos no hall de entrada, e que depois o declarante e o co-arguido levaram os ofendidos para a sala, amarrados de pés e mãos; que o ofendido FO______ estava sentado no chão, junto ao sofá, dizendo que «ia morrer», tendo-lhe feito um curativo, referindo que quando amarrou o ofendido este tinha dois golpes na cabeça, deduzindo posteriormente que tinham sido feitos com o punho da arma, mencionando quando confrontado com as fotografias de fls. 663 que o co-arguido R________ ficou com o ofendido FO______ no local onde está a planta, não tendo o declarante visibilidade para essa zona estando no hall de entrada; que o co-arguido R________ agarrou os ofendidos para ajudar o declarante a amarrar e transportar os mesmos para a sala, mencionando expressamente numa demonstração da total ausência de ressonância afectiva e de indiferença pela dignidade da vida humana e pelo sofrimento alheios que «sentaram ambos confortavelmente no sofá».
Referiu que o co-arguido deslocou-se à cozinha com o ofendido FO______ para ir buscar a fita adesiva, tendo ambos tapado a boca dos ofendidos com a fita-cola.
Confrontado com os factos imputados no ponto 27 da acusação, admitiu a comparticipação nos mesmos, mencionando que «talvez tenha forçado um bocado», admitindo igualmente a comparticipação nos factos imputados nos pontos 28 e 29 da acusação, referindo que foi com o ofendido FO______ até ao cofre, tendo-lhe soltado os pés, levando a faca de cozinha apreendida no veículo, tendo aberto o cofre, onde se encontrava a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros), e a chave do outro cofre onde estava a arma de fogo, passando a partir dessa altura a utilizar a arma.
Quanto à factualidade imputada no ponto 31 da acusação negou a autoria da mesma, admitindo tal como imputado no ponto 32 que o co-arguido R________ foi sozinho com o ofendido FO______ tendo o declarante ficado com a ofendida IB_______
Referiu que disse ao co-arguido R________ para ficar com a ofendida IB_______ quando se deslocou com o ofendido FO______ ao local onde estava o cofre; e que, quando regressou a ofendida IB______ vinha embrulhada num cobertor.
Admitiu ainda que efectuou o disparo que atingiu a ofendida IB______ na cabeça; que levaram os ofendidos para o eucaliptal, transportando-os no veículo, o ofendido FO______ na bagageira e a ofendida IB______ no banco traseiro; e que o ofendido FO______ já tinha parado de sangrar.
Não obstante inicialmente não ter pretendido continuar a prestar declarações, depois de confrontado com as declarações prestadas pelo co-arguido R________ em audiência de julgamento, manifestou intenção de continuar a prestar declarações face à versão apresentada por aquele.
Assim, referiu que a ideia de levarem os ofendidos para o eucaliptal partiu do co-arguido R________ ; e que, quando ambos tiraram o ofendido FO______ da bagageira do veículo, onde este tinha ido deitado em cima de um cobertor, o ofendido tinha dois golpes na cabeça, não sangrava, estava consciente, com os olhos abertos, e andava pelo próprio pé.
Ficou com a ofendida IB______ junto ao veículo, mantendo as luzes da viatura ligadas; que passados cerca de seis/sete minutos chegou o co-arguido R________ , tendo-lhe perguntado onde se encontrava o ofendido, tendo aquele dito que «estava amarrado a uma árvore»; e que, «agora é a tua vez», tendo interpretado tal expressão como tendo que tirar a vida à ofendida IB_______ pensando que o ofendido FO______ já estava morto.
Nessa altura os dois tiraram a ofendida do interior do veículo, levando-a ambos para o interior do mato, a cerca de sete metros de distância do local onde estava o ofendido FO______ tendo o co-arguido R________ ficado junto do declarante.
Mencionou que a ofendida IB______ caiu, ficou ajoelhada e começou a rezar, tendo apontado a arma à cabeça da ofendida, tendo sido o co-arguido R________ a municiar a arma no local, tendo o declarante efectuado um único disparo que atingiu a ofendida na cabeça, saindo ambos do local, pensando que os ofendidos estavam mortos.
Referiu que a ideia de abandonarem o veículo no Porto foi de ambos, depois de terem visto na internet que estavam a ser procurados, tendo ido inicialmente a Cascais porque o co-arguido R________ tinha aí amigos, e que do Porto deslocaram-se para Braga de táxi, tendo ido posteriormente para Espanha, onde contaram o dinheiro, que iam dividir pelos dois.
Por último referiu que é conhecido por «Pipoca»; que a ideia inicial era deixar os ofendidos à porta do hospital porque a ofendida IB______ disse-lhe «que foi violada»; e que, as chaves do veículo de que se apropriaram encontravam-se em cima de uma mesa.
3 - do depoimento da testemunha IA____, que de forma coerente, consistente e objectiva, descreveu a cronologia e dinâmica dos acontecimentos de que foi vítima no dia 30 de Julho de 2019.
No essencial mencionou que conhece o arguido R________ por ter sido namorado da sua irmã desde Março/Abril de 2019 até ao início de Julho de 2019, tendo o relacionamento terminado depois de a sua irmã ter ido trabalhar para o estrangeiro, tendo o arguido continuado a viver na residência onde habitara com a sua irmã, durante cerca de uma semana.
Referiu que numa segunda-feira o pai do depoente colocou os pertences do arguido R________ na rua, e porque ambos estavam «chateados», foi mediar a situação, para abrir a porta da residência, de modo a que o arguido R________ tirasse os seus pertences, tendo na noite anterior o arguido passado a noite a bater nos estores, tendo visto as marcas nos estores.
No dia 30 de Julho de 2019 o arguido R________ apareceu no local acompanhado do arguido BMPC________, levando uma faca na mão que apontou ao depoente, estando exaltado, tendo procurado acalmá-lo, dizendo-lhe para levar os seus pertences.
O arguido R________ colocou a faca num canteiro, e o depoente abriu-lhe a porta, dizendo-lhe para levar o que era dele.
Nessa altura o arguido R________ dirigiu-se ao quarto, continuando bastante exaltado e com uma postura agressiva, dizendo-lhe que batia no pai e que não iria fazer mal ao filho do depoente que estava para nascer.
Mencionou que abriu a porta ao arguido R________ sob ameaça da faca e porque achou que ele tinha direito a levar os seus pertences.
Deixou o arguido R________ levar a televisão sob ameaça, porque queria que o arguido «os deixasse em paz», mencionando que a televisão que se encontrava na sala pertence ao actual marido da sua mãe, e que o computador e a playstation eram pertença da sua irmã, tendo falado com a irmã que lhe disse que não tinha dado autorização ao arguido para levar os referidos bens.
Nesse dia foi com o arguido R________ ao multibando e levantou € 315,00 para dar ao arguido que lhe disse que era uma quantia que estava em dívida, referindo que deu-lhe aquele montante para que o arguido os deixasse em paz, e que só queriam que o mesmo saísse daquela casa; e que nesse dia, mais tarde, o arguido voltou para ir buscar o comando da televisão, que deixou no muro.
Mencionou que o arguido de vez em quando gabava-se de ter uma pistola; e que, nesse dia, no meio do vai e vem de levar coisas em sacos, quando o depoente estava sentado à espera, o arguido destapou o casaco e exibiu-lhe a pistola no hall de passagem, dizendo-lhe «se for preciso eu uso», tendo ficado sem reacção, dizendo ao arguido que não havia necessidade de o ameaçar com a arma, continuando o arguido a entrar e a sair levando sacos, tendo toda a situação que descreveu ocorrido durante cerca de 45 minutos.
Por último referiu que o arguido tinha as chaves da residência; e que na noite anterior tentou entrar sem conseguir porque o pai colocou a chave por dentro, tendo no dia a seguir mudado a fechadura.
4 - do depoimento da testemunha J..., ofendido nos autos, que de forma coerente, consistente e objectiva, descreveu a cronologia e a dinâmica dos acontecimentos de que foi vítima ocorridos em 13 de Agosto de 2019.
No essencial mencionou que conhece os arguidos do Sobral, convivendo pouco com os mesmos porque tinha sido ameaçado por estes; e que no mês de Agosto de 2019 passou quinze dias na referida localidade.
Na noite de 12 para 13 de Agosto de 2019 a sua mulher completou 42 anos, estando em casa a comemorar, e o seu enteado Bernardo Oliveira cismou que queria ovos e batatas cozidas para levar para o trabalho no dia seguinte, tendo começado a injuriar a sua mulher, o que desagradou ao depoente, tendo iniciado uma discussão com este, saindo de casa porque não se sentia bem.
Quando caminhava na estrada surgiram os arguidos apeados, os quais conheciam o seu enteado, tendo-lhe dito que o levavam à Rodoviária, o que o depoente recusou, dizendo-lhes que ia a pé.
Referiu que pegou nos sacos e continuou a andar, e que, passado um bocado passou uma carrinha branca com o «pipoca» a conduzir, tendo-se escondido porque tinha medo dos arguidos.
Mais tarde os arguidos passaram novamente, disseram-lhe que o levavam à Rodoviária, levaram-no na parte de trás da carrinha que só tinha dois lugares, tendo aceitado com receio; e, ao invés de o levarem à Rodoviária, os arguidos levaram-no para um descampado, junto a umas torres eólicas, tendo colocado o depoente fora da carrinha, apontando-lhe um objecto com a configuração de uma pistola à cabeça.
Mencionou que foi o arguido R________ que lhe apontou a réplica da arma de fogo, proferindo as expressões mencionadas nos pontos 9 e 12 da acusação, tendo-lhe tirado a carteira.
Quando lhe apontaram a pistola mandaram-no ajoelhar e pôr as mãos atrás da cabeça, tendo os arguidos tirado a carteira do bolso de trás das calças do depoente, tirando fotografias a todos os cartões, ficando com o cartão de cidadão do depoente, dizendo-lhes que não tinha dinheiro, não obstante ter cerca de € 13,00.
Confrontado com a fotografia de fls. 1044 identificou a réplica de arma de fogo como sendo a pistola que lhe apontaram.
Referiu que a seguir os arguidos mandaram-no entrar na carrinha, e levaram-no até à entrada da Lourinhã, onde o deixaram, tendo sido ameaçado pelo «pipoca» que lhe disse «não ponhas mais os pés no Sobral senão fodo-te», tendo o arguido BMPC________ dito ainda ao arguido R________ «tu ficas com a filha e eu fico com a mãe».
Por último mencionou que perante a actuação dos arguidos sentiu uma forte ameaça, tendo telefonado para a GNR da Lourinhã, que foram ter com o depoente à Rodoviária, tendo ficado escondido toda a noite, tendo tido medo de regressar ao Sobral até Outubro de 2019.
5 - das declarações para memória futura da assistente IB____, transcritas a fls. 1753 a 1867, a cuja audição se procedeu em audiência de julgamento.
No essencial, num relato consistente, espontâneo e coerente, descreveu a cronologia e a dinâmica dos acontecimentos de que foi vítima, ocorridos em 25-082019, não tendo a consistência na descrição fáctica efectuada pela assistente sido abalada pelo discurso denotador de ansiedade e reactividade próprias de uma situação depressiva e de stress pós-traumático, tanto mais que, na sua essencialidade, as declarações da assistente são convergentes com as declarações prestadas pelos arguidos.
Assim, a assistente começou por descrever as circunstâncias relacionadas com a entrada dos arguidos na residência, referindo que ouviu o seu tio, o ofendido FO______ dizer que estava ali o «Pipoca», reportando-se ao arguido BMPC________, e que o mesmo estava a bater à porta e o ofendido ia buscar água, apercebendo-se de seguida da entrada de ambos os arguidos em casa, «um com uma pistola grande», «prateada, com umas coisas que até brilhava», mencionando que o tio caiu no hall de entrada, «foi as grandes pancadas que o meu tio levou», tendo o ofendido gritado, dizendo «levem tudo mas não nos façam mal», dirigindo-se nessa altura para a porta.
A respeito das agressões de que o ofendido foi vítima referiu que «O Pipocas era tudo aos murros, inicialmente, inicialmente não tinha nada. Inicialmente era tudo aos murros à cabeça do meu tio, à testa do meu tio. O meu tio era só sangue».
Descreveu posteriormente o modo como ficaram privados de liberdade, amarrados nas mãos e nos pés com as abraçadeiras, tendo sido ainda amarrados com fita-cola, que se encontrava na cozinha.
Referiu que de seguida, já na sala, o arguido R________ queimou os telemóveis; que perguntaram ao ofendido se tinha cofres e valores, tendo o ofendido ido buscar os cofres, tendo o arguido R________ surgido com moedas de colecção, dizendo para o arguido BMPC________ entalar as moedas entre os dedos, tendo este agredido o ofendido, especialmente na zona da cabeça, mencionando expressamente que ambos os arguidos bateram no tio e que «aquilo era uma violência doida», tendo o ofendido começado a sangrar na zona da cabeça, «Na cabeça. Aquilo era tudo sangue por tudo o que era lado», e que, enquanto o ofendido escorria sangue «por tudo o que era lado», o arguido BMPC________ estava preocupado por causa dos vestígios, dizendo que tinha de limpar os vestígios.
Num relato consternado, a assistente descreveu o contexto em que ocorreu o crime de violação de que foi vítima, referindo que o arguido R________ com uma faca disse-lhe para se despir, «Tu és uma pita de vinte e oito anos. Anda comigo. Agarrou-me pelo braço», «Eu fui violada pelo R________», referindo que tudo ocorreu no quarto do ofendido, tendo amarrado as pernas à cama, «Alargou-me as pernas», «Tirou-me, cortou o soutien com a faca», «E as cuecas também», referindo que o arguido apontou-lhe a faca e fez o gesto de lhe cortar o pescoço se resistisse, tendo posteriormente ficado nua, dizendo-lhe o arguido «vais vestir isto», referindo-se a uma manta que estava no quarto.
Mencionou que quando regressou à sala o ofendido estava no chão a chorar, que continuaram a perguntar por mais valores, ameaçando ambos com a arma; que o ofendido abriu o cofre pequeno, tendo os arguidos «ficado cegos» quando viram o dinheiro, todo em notas de € 20,00, tendo ainda ido ao piso de cima com o ofendido à procura de mais valores.
De seguida a assistente descreveu a dinâmica dos acontecimentos relacionada com o roubo do veículo e o transporte de ambos no mesmo quando os arguidos saíram de casa, referindo que inicialmente o arguido BMPC________ tinha um plano de os deixar perto do hospital, tendo os arguidos mudado de planos, mencionando que os arguidos ainda perguntaram ao ofendido pela existência de armas, associando a entrega da arma de fogo pelo ofendido à mudança de planos, referindo expressamente a tal respeito «Deve ter dado ao Pipocas. Eu praticamente não vi a arma, que a mão dele ocupava aquilo assim. Ao Pipocas. Imediatamente mudaram de planos, todos», descrevendo a forma como foram transportados no interior do veículo, referindo que quando chegaram ao eucaliptal «O meu tio foi o primeiro», «o meu tio dizia ai, ai, ai», tendo ouvido os arguidos dizer «calha mesmo bem, um fica à direita, outro fica à esquerda», sentindo ambos os arguidos atrás de si, ouvindo um disparo, referindo que foi o último facto de que se lembrava, porque a seguir desmaiou.
Descreveu de seguida após ter recuperado os sentidos o modo como conseguiu pedir auxílio e sair do eucaliptal, e as sequelas resultantes da actuação de que foi vítima «Ainda hoje eu vejo a noite ... por isso é que tenho uma pessoa lá em casa.».
6 - do depoimento da testemunha AM____, motorista de táxi.
No essencial mencionou que estava na Praça de táxis em frente à Rodoviária, em Vila Real, tendo chegado dois indivíduos do sexo masculino, cerca das 23 horas, que lhe pediram para os transportar até à Guarda, tendo ficado desconfiado, pedindo ao seu filho para o acompanhar, tendo aqueles efectuado o pagamento do transporte em numerário, entregando ainda € 40,00 para o combustível.
7 - do depoimento da testemunha VP____, Inspector da Polícia Judiciária, em exercício de funções na Directoria de Lisboa, Brigada de assaltos à mão armada, que referiu as diligências que efectuou no âmbito da investigação.
No essencial mencionou que a ofendida apareceu na zona da Lourinhã dizendo que tinha sido violada, tendo sido transportada ao hospital, tendo no hospital informado que o ofendido tinha desaparecido, tendo o mesmo sido posteriormente localizado na zona do eucaliptal.
Referiu que quando localizaram o ofendido FO______ devido ao estado em que o mesmo se encontrava pensou que estava morto, referindo que da sua experiência profissional já tinha observado cadáveres com menos livores cadavéricos que os existentes no corpo do ofendido, designadamente nas pernas, que indicou na segunda fotografia de fls. 35 e na segunda fotografia de fls. 36.
Efectuou a inspecção judiciária à residência do ofendido, tendo observado vestígios de sangue gravitacional junto ao corrimão, e vestígios de ter sido lavada a zona da entrada, mencionando quando confrontado com as fotografias de fls. 673 que as manchas indiciavam vomitado numa zona que foi lavada, e que a escuridão do sangue demonstrava terem ocorrido hemorragias internas, tratando-se de sangue pulmonado.
Confrontado com as fotografias de fls. 676 e 677 referiu que os vestígios hemáticos de vários pingos gravitacionais, sem movimento, indiciavam que a vítima tinha estado a pingar sangue naquele local.
No que respeita à fotografia de fls. 679 mencionou que não encontraram vidros do copo partido.
Confrontado com a fotografia n.° 9 de fls. 632 referiu que os cartões queimados deixaram de funcionar às 02h30m, hora a que deixaram de accionar antenas nas operadoras de telecomunicações.
Por último mencionou que os vestígios hemáticos e as lesões existentes no ofendido FO______ indiciavam que o mesmo tinha estado muito tempo a ser agredido.
8 - do depoimento da testemunha RF____, funcionária administrativa do Hospital das Caldas da Rainha.
No essencial mencionou que as facturas referentes ao custo da assistência hospitalar prestada pelo demandante aos ofendidos, foi reflectido nas facturas emitidas apenas em nome do arguido BMPC________, dado o sistema informático não permitir indicar mais do que uma pessoa no local destinado ao nome dos destinatários das facturas.
9 - do depoimento da testemunha RJN____, primo da assistente IB____.
 No essencial descreveu as mudanças que notou quer a nível físico quer a nível psíquico na pessoa da assistente, após a mesma ter tido alta hospitalar, referindo que a mesma queixava-se que não se sentia bem; que não consegue andar sozinha na rua; que teve apoio do Centro de Dia da Bufarda; que até há cerca de três meses a assistente estava acompanhada por duas pessoas, de dia e de noite; que a mesma era autónoma, alegre e extrovertida, sentindo-se muito nervosa, estando actualmente internada no Hospital de Santa Maria, no serviço de Psiquiatria; e que a mesma «era pessoa de boas contas».
10 - dos depoimentos das testemunhas JCB____ e  JNB____, irmãos da assistente.
No essencial mencionaram que a assistente esteve uns meses a viver em casa do tio, o ofendido FO______ para tomar conta deste.
Depois da alta hospitalar a assistente ficou na primeira noite em casa do depoente JCB____, tendo até há cerca de dois/três meses sido necessário contratar duas pessoas que de dia e de noite ficavam com a irmã dos depoentes, tendo a mesma tido apoio domiciliário do Centro de Dia da Bufarda, no que respeita à alimentação e limpeza da casa.
Referiram que a assistente tem medo de estar sozinha em casa, estando sempre a telefonar; que desde o dia em que foi notificada da data do julgamento o seu comportamento alterou-se, estando internada no serviço de Psiquiatria do Hospital de Santa Maria com uma depressão.
Mencionaram que a assistente queixa-se de dores de cabeça, parece que está sempre mal disposta, desconfia de toda a gente, sofre de insónias, nas primeiras noites gritava muito, não comia, trocava os comprimidos, não tinha força no braço direito, tem dificuldades de equilíbrio.
A assistente é acompanhada em consultas externas no Hospital das Caldas da Rainha, designadamente em acompanhamento psiquiátrico mensal, tendo ainda sessões de fisioterapia, e consultas de oftalmologia.
Antes dos factos de que foi vítima, a assistente era calma, totalmente autónoma, simpática para todos, estimada, nunca tendo ouvido queixas de dívidas para com trabalhadores agrícolas, não conseguindo actualmente gerir a sua propriedade, estando sempre chorosa e muito nervosa, referindo várias vezes que «parece que estou a sonhar e que eles vêm acabar o serviço que começaram».
Referiram ainda que a assistente não tem visão binocular, tendo que virar a cabeça para acompanhar o campo visual; que continua com dores de cabeça, descoordenação motora e ansiedade, queixando-se de solidão e manifestando medo em sair sozinha.
11 - do depoimento da testemunha CF____, contabilista da assistente desde 2017, que conhece desde 1999, e que mencionou no essencial as alterações comportamentais que notou na mesma após os factos de que foi vítima, referindo que actualmente a mesma só se consegue deslocar ao seu escritório acompanhada de um dos irmãos, tendo perdido a alegria e a autonomia, sentindo-a parada e fechada.
12 - do depoimento da testemunha JJ____, amigo da assistente desde a infância, que descreveu as alterações comportamentais que notou na mesma após os factos de que foi vítima, referindo que a assistente era dinâmica, activa e empreendedora, sentindo-a actualmente sem resistência física, muti parada, abatida, sem objectivos, muito afectada psicologicamente, verbalizando que sente medo, que não dorme bem, mencionando expressamente que às vezes a assistente «parece um cadáver ambulante».
13 - dos esclarecimentos do Perito médico, CD____, que no essencial mencionou que não tem dúvidas do nexo causal entre as lesões traumáticas cranioencefálicas mencionadas nos relatórios clínicos e no certificado de óbito e a morte do ofendido FO.
14  - do depoimento da testemunha MA____, Chefe de Serviço de Cirurgia Geral do Hospital de Torres Vedras, que no essencial mencionou que assinou o certificado de óbito do ofendido  FO______ sendo a causa da morte indicada com base na informação clínica, não tendo sido efectuada a autópsia uma vez que o diagnóstico do Hospital de São José manteve-se inalterado, sendo as lesões cranioencefálicas do ofendido irreversíveis, estando apenas o mesmo a receber cuidados de conforto.
15 - dos depoimentos das testemunhas VS____, padrasto do arguido R________ , e SR____ , mãe do arguido R________ , apenas relativamente às condições sociais e características de personalidade do mesmo.
16   - da reportagem fotográfica de fls. 30 a 38, designadamente da vista aérea do local onde foi encontrado o ofendido FO______ (fls. 31), cerca das 15 horas do dia 25-08-2019, num local ermo, do estado em que o mesmo se encontrava, em posição de decúbito dorsal, com as mãos amarradas com abraçadeiras e fita adesiva na boca e na cabeça (fls. 32 e 33), sendo visíveis nas fotografias de fls. 34 a 38 as lesões externas sofridas pela vítima, nomeadamente várias equimoses e hematomas nos joelhos (fls. 34), escoriações, hematomas e equimoses nos membros superiores e inferiores e na região dorsal (fls. 35), ferimentos profundos e extensos na cabeça (fls. 37 e 38), sendo ainda visíveis na fotografia de fls. 36 as marcas da pressão das abraçadeiras nos pulsos e tornozelos do ofendido.
17  - do auto de apreensão dos objectos localizados no interior da residência do ofendido  FO______ e no local onde o mesmo foi encontrado, de fls. 42.
18 - do auto de apreensão dos objectos pertencentes ao ofendido  FO______ recolhidos no Hospital de São José, e dos objectos recolhidos junto da ofendida IB____, no Hospital de Santa Maria, designadamente um projéctil deformado calibre 6,35 mm, extraído cirurgicamente, de fls. 43.
19 - do auto de busca na residência do arguido BMPC________, e apreensão na sala onde dormia o arguido R________   , de um saco plástico transparente, contendo no seu interior 680 abraçadeiras de cor cinzenta, da marca HELLERMANN, de fls. 45; auto de exame directo de fls. 46 a 48, e fotografias de fls. 49 e 50.
20  - do print da ficha de registo automóvel do veículo Peugeot 206, matrícula XX-XX-XX, encontrando-se a propriedade do mesmo registada em nome do ofendido  FO______ de fls. 91.
21 - do auto de notícia de fls. 129-130 e 148-149 (original) e fotografias de fls. 131 e 132, e do aditamento ao auto de notícia de fls. 125-126 e 158 a 160 (original), no que respeita à data, hora e local a que foi encontrado o ofendido FO______ (15h03m do dia 25-08-2019, num local ermo, entre eucaliptais), e fotografias de fls. 127 e 128 e 162 a 169.
22 - da fotografia de fls. 151 comprovativa do estado da ofendida IB________ quando foi localizada, envolta numa manta, sendo visíveis pedaços de fita adesiva em volta do tornozelo direito, em redor do pescoço, e na manta.
23 - dos autos de diligência relativos ao percurso efectuado pelos arguidos durante a fuga, e fotogramas respectivos extraídos das câmaras de vigilância das bombas de abastecimento de combustível, de fls. 217 a 220, 360 a 373, 398 a 400, 550 a 552, e 606 a 612; dos registos de entrada pela Via Verde e saída pela Via Manual do veículo matrícula YY-YY-YY, na A8, de fls. 295 a 299; dos fotogramas das câmaras de vigilância do Parque de estacionamento da Empark, em Cascais, captadas entre as 06h30m e as 08h50m do dia 25-08-2019, de fls. 598 a 604; e, dos fotogramas das câmaras de vigilância do Hotel Vanguarda, captadas entre as 00 horas do dia 25-082019 e as 14 horas do dia 26-08-2019, de fls. 541 a 548.
24 - do auto de apreensão do veículo automóvel marca Peugeot, modelo 206, matrícula YY-YY-YY, que se encontrava estacionado na Rua  Bandeira, Porto, e da pistola marca Tanfoglio, com uma munição por deflagrar na câmara, contendo um carregador com cinco munições por deflagrar, e da reprodução de arma de fogo marca DENIX, contendo vestígios hemáticos, que se encontravam no porta-luvas da viatura; e de uma faca de cozinha, com cerca de 20 cm de lâmina, que se encontrava por debaixo do banco frontal direito, de fls. 619 e fls. 862 (original), e fotografias de fls. 839 a 851.
25 - do auto de apreensão de objectos e vestígios com relevância forense, que se encontravam no interior do veículo matrícula YY-YY-YY, de fls. 625 a 629, entre os quais, uma televisão Samsung, um computador portátil, uma consola de marca Sony, modelo PS4, moedas de colecção, carteira em pele de cor castanha, contendo vários documentos em nome da ofendida IB____, dois cartões SIM queimados, um telemóvel marca Huawei, um telemóvel marca Samsung, uma carteira em pele de cor castanha, contendo vários documentos em nome do ofendido  FO______ uma mala em pele de cor castanha, e uma carteira em cortiça, contendo diversos documentos em nome da ofendida IB____, e fotografias respectivas de fls. 630 a 638, e do termo de entrega de fls. 986.
26 - do relatório do exame pericial de observações e recolha de vestígios com interesse forense, realizado em 25-08-2019, no n.° 28 da Rua Principal, e fotografias respectivas, de fls. 643 a 699, sendo visíveis nas fotografias de fls. 659 e 660 os cofres pertença do ofendido  FO______ a fls. 666, um rolo de fita-cola cinzenta recolhido em cima da mesa da cozinha, a fls. 668, 669, 672 e 678, um conjunto de abraçadeiras de cor cinzenta com as inscrições Hellermann, com vestígios hemáticos, recolhidas no chão da sala, em cima da mesa da sala, no chão do corredor junto à sala, e no chão do hall da entrada principal, a fls. 676 e 677, vestígios hemáticos recolhidos no chão do hall da entrada principal, a fls. 679 vestígios hemáticos recolhidos num copo de vidro partido que se encontrava no chão do hall da entrada principal, a fls. 681 e 682, umas cuecas de cor branca e cinzenta rasgadas, e um soutien de cor creme, com uma alça rasgada, pertencentes à ofendida IB____, que se encontravam no quarto do ofendido  FO______ a fls. 687 e 688 um vestígio lofoscópico recolhido num cofre de cor verde, que se encontrava em cima de uma mesa de apoio na sala, a fls. 689 uma t-shirt branca com vestígios hemáticos, uns boxers de cor cinzenta com vestígios hemáticos, e um pedaço de fita-cola de cor cinzenta com vestígios hemáticos, recolhido ao ofendido FO______ no local onde foi encontrado, e a fls. 690, um projéctil deformado, calibre 6,35 mm, extraído cirurgicamente da cabeça da ofendida IB____, e diversos pedaços de fita-cola cinzenta com vestígios hemáticos e cabelos, abraçadeiras e um pedaço de uma manta em tons de verde, na qual a ofendida estava embrulhada quando foi localizada.
27 - do relatório do exame pericial de fls. 710 a 715, constando da respectiva conclusão que «O vestígio digital, aproximadamente no tamanho natural, assinalado com a letra A na FOTO 2 revelado e recolhido no “cofre de cor verde que se encontrava em cima de uma mesa de apoio na sala”, ..., identifica-se com a impressão digital correspondente ao dedo polegar da mão direita do indivíduo identificado nesta Polícia, como R________   ... ».
28 - do relatório pericial de fls. 852 a 857, constando da respectiva conclusão que o vestígio digital na reprodução de arma de fogo marca DENIX, foi produzido pelo dedo polegar direito do arguido BMPC________.
29 - do relatório do exame pericial a seis vestígios lofoscópicos recolhidos na face frontal de uma TV LED Samsung, de fls. 895 a 901, constando da respectiva conclusão que «O vestígio palmar, aproximadamente no tamanho natural, assinalado com a letra A na FOTO 1, revelado e recolhido “na face frontal de uma TV LED Samsung, modelo UE46C5100QW, n° de série Z6Q03SQZA00331B..., que se encontrava sobre os bancos traseiros da viatura” ... , identifica-se com a impressão palmar correspondente à região tenar da palma da mão esquerda do indivíduo identificado nesta Polícia como R________ ...».
30 - do relatório do exame pericial efectuado ao veículo Peugeot, matrícula 94- 72-TM, para recolha de vestígios com relevância forense, de fls. 919 a 956.
31 - do auto de apreensão do cartão de cidadão em nome de J..., encontrado no interior do veículo matrícula YY-YY-YY, de fls. 976.
32 - do relatório do exame pericial a um projéctil de tipo ogival, significativamente deformado na sua zona ogival, não sugerindo perda significativa de massa, com sulco não serrilhado e blindagem niquelada; uma arma de fogo de tipo pistola, com o número de série rasurado, exibindo as inscrições “ARMI TANFOGLIO GIUSEPPE - MADE IN ITALY” na face esquerda da corrediça e “MOD. GT 27 CAL. 25 - PATENTED” na face direita da corrediça, encontrando-se munida de carregador; seis munições, exibindo as gravações “6.35” e “GECO” na base; e, um objecto com a configuração de uma pistola, com o número de série C7826 Z, apresentando as inscrições “MOD. 92 F CAL. 9 Parabellum” na face esquerda e direita da corrediça e “DENIX MADE IN SPAIN” na face esquerda do corpo, de fls. 1040 a 1049, constando das respectivas conclusões, no que releva:
«A arma enviada e examinada, descrita em 2, constitui-se como uma arma de fogo, de tipo pistola semiautomática, de calibre 6,35 mm Browning (.25 ACP ou .25 AUTO na designação anglo-americana) de marca TANFOGLIO, de modelo GT 27, apresentando o número de série rasurado, de origem italiana.
A arma de fogo enviada, descrita em 2, encontra-se em boas condições de funcionamento.
O objecto enviado e examinado, descrito em 4, com a configuração de uma pistola, constitui-se como uma reprodução de arma de fogo, de marca DENIX, de modelo 92 F, com o número de série C 7826 Z, de origem espanhola.
O objecto enviado, descrito em 4, encontra-se em boas condições de utilização.
As seis (6) munições enviadas, examinadas e testadas, de calibre 6,35 mm Browning (.25 ACP ou .25 AUTO na descrição anglo-americana), descritas em 3, encontravam-se em boas condições de utilização.
O projéctil enviado e examinado, descrito em 1, constitui-se como um elemento de calibre 6,35 mm Browning (.25 ACP ou .25 AUTO na designação anglo- americana. (...)».
33  - do relatório do exame pericial aos meios de identificação da pistola TANFOGLIO GIUSEPPE GT27, com o objectivo de visualizar o número de série no corpo da arma, de fls. 1070 a 1071.
34 - do relatório do exame pericial de fls. 1906 a 1911, tendo por objecto a apreciação técnica dos vestígios lofoscópicos eventualmente revelados num pedaço de fita-cola de cor cinzenta com vestígios hemáticos, recolhido no hospital nos pertences da vítima FO______ - vestígio A; num pedaço de fita-cola de cor cinzenta com vestígios hemáticos, recolhida à vítima FO______ no local onde foi encontrado - vestígio A1; e, em diversos pedaços de fita-cola de cor cinzenta com vestígios hemáticos, cabelos e abraçadeiras, e um pedaço de manta em tons de verde, referenciados como vestígio C, resultando nos pedaços de fita-cola referenciados como vestígio C, um vestígio lofoscópico correspondente ao dedo polegar da mão direita do arguido R________   .
35 - do relatório do exame pericial de fls. 1051 a 1054 para pesquisa de vestígios biológicos recolhidos, análise de ADN e estudo comparativo.
36 - do relatório do exame pericial às abraçadeiras apreendidas na residência do ofendido, no hospital e no veículo automóvel, apresentando características idênticas às abraçadeiras apreendidas na residência do arguido BMPC________, de fls. 1058 a 1068.
37 - do assento de nascimento da ofendida IB____, comprovativo da idade da mesma (nascida em 21 de Novembro de 1965), de fls. 268269.
38 - do assento de nascimento do ofendido  FO______ comprovativo da idade do mesmo (nascido em 23 de Julho de 1943), de fls. 270-271, e do assento de fls. 1163 onde consta averbado o óbito do ofendido, ocorrido em 12 de Dezembro de 2019.
39 - da documentação clínica do ofendido  FO______ de fls. 438 a 440, 502 a 504, 1086 a 1094, 1181 a 1183, 1187 a 1195, 1201 a 1206, resultando:
a) - do boletim clínico do Hospital de S. José - Serviço de Neurocirurgia, onde o ofendido foi internado em 25 -08-2019, no que releva:
«MOTIVO DE INTERNAMENTO Politraumatizado
LISTA DE DIAGNÓSTICOS
Politraumatizado
- Hemorragia subaracnoídea
- Múltiplos focos de contusão hemorrágica
- Pneumotórax hipertensivo
- Contusão pulmonar
- # arcos costais (4° e 5° arcos costais à direita e da vértebra posterior da 1ª costela
- # D6, submetida a instrumentação
- Rabdomiólese, sem lesão renal aguda
- Bacteriemia a CVC a kiebsieliapneumoniae.
(...)
Antecedentes Pessoais: ADC próstata moderadamente diferenciado Gleason 6 (3+3) T2aNxMO, operado em Junho 2018 na CUF Descobertas, HTA, dislipidemia. (...)».
b)  - do relatório de cirurgia de fls. 1181, no que releva:
«... sofreu agressão no dia 25 de Agosto de 2019 de que resultou politraumatismo grave.
Desenvolveu múltiplos focos de contusão hemorrágica intra cerebral, hemorragia subaracnoídea, fractura de vértebras dorsais, fractura de arcos costais e pneumotórax hipertensivo. Esteve internado em Unidade de Cuidados intensivos no Hospital de S. José durante 3 semanas. Permaneceu conectado a prótese ventilatória havendo necessidade de efectuar traqueostomia para desmame que manterá indefinidamente. Foi transferido para o Hospital de Torres Vedras posteriormente e aqui permanece.
Mantém-se acamado, em coma com score Glasgow 5, totalmente dependente nas actividades de vida diária.
É alimentado por sonda nasogástrica. Necessita de manutenção de traqueostomia e de cuidados regulares de aspiração brônquica.
O seu prognóstico funcional e vital é muito reservado. Não comunica, não se mobiliza, não reage a qualquer estímulo. Estará sempre na completa dependência de terceiros. Esta incapacidade é definitiva e o quadro clínico é irrecuperável independentemente de qualquer tratamento que possa efectuar. (...)».
 40 - do relatório da perícia médico-legal na pessoa do ofendido  FO______ de fls. 1313 a 1315, constando no campo destinado à Discussão e Conclusões:
«DISCUSSÃO
- Após observação do processo clínico disponibilizado é possível observar a presença de graves lesões traumáticas interessando a cabeça (contusão hemorrágica intracerebral com hemorragia subaracnoídea) e o tórax (fractura de arcos costais com pneumotórax hipertensivo e fractura de D6) da vítima;
- Destas, resultaram lesões e sequelas irreversíveis, condicionando a vítima a um permanente “estado de dependência de terceiros ”, “totalmente dependente ”, “não reagindo a qualquer estímulo”, ou seja, um estado vegetativo!
- Não foi realizada a autópsia médico-legal que melhor poderia esclarecer e determinar a causa da morte;
- No entanto, diante das graves lesões documentadas, que condicionam a vítima a um estado vegetativo, é frequente que quando estas não apresentam uma causa imediata e directa de morte pelas lesões traumáticas, a vítima acaba por morrer das complicações clínicas que inexoravelmente estão associadas a estas condições, como as pneumonias resultantes pelo quadro respiratório instalado por agravado pelas lesões traumáticas.
- O Certificado de Óbito n° 1007018930 é claro e descreve como causa da morte “traumatismo craneoencefálico”.
- Os registos médicos documentam a existência inequívoca de graves lesões crânio-encefálicas resultantes da agressão elencada nos autos, logo, é clara e inequívoca a existência de nexo de causalidade entre as lesões traumáticas descritas e a morte;
 - Estas lesões traumáticas foram produzidas por acção contundente ou outro
instrumento ou agente que agiu com semelhante natureza ou acção         
- Da documentação clínica disponibilizada, não foi possível identificar lesão produzida por projéctil de arma de fogo;
CONCLUSÕES
Após observação da informação clínica disponibilizada e descrita acima, é possível afirmar a existência de nexo de causalidade entre as lesões e as sequelas apresentadas e a morte de   FO____.».
41  - do certificado de óbito do ofendido  FO______ ocorrido em 12-12-2019, constando no campo destinado à causa da morte «traumatismo craneoencefálico», indicada com base em elementos de ordem clínica, de fls. 1084 e 1168.
42  - das fotografias da ofendida IB____, tiradas no Hospital de Santa Maria, de fls. 226 a 238, após a intervenção cirúrgica para extracção do projéctil de arma de fogo, sendo visível na fotografia de fls. 228 a porta de entrada do projéctil na zona parietal direita.
43  - da documentação clínica da ofendida IB____, de fls. 152 a 156, 430 a 434, 984 a 1019, 1095 a 1100, 1210 verso a 1213, 1215 a 1216, 1217 a 1222, 1266 a 1311, 1317, 1328, 1332, 1353 a 1354, 1592 a 1594, 1606 a 1612, e 1689 a 1695.
44 - do relatório da perícia de avaliação do dano corporal na pessoa da ofendida IB____, de fls. 1239 a 1242 e documentação anexa, de fls. 1243 a 1245 (Conclusões Provisórias), relativamente às lesões sofridas pela mesma em consequência da actuação dos arguidos, e às sequelas daí resultantes.
45  - do relatório da perícia de natureza sexual efectuado na pessoa da ofendida IB____, em 25-08-2019, datado de 26-08-2019, de fls. 746 a 748, constando das respectivas conclusões, no que releva:
2 - À data do exame a examinanda era portadora de um hímen reduzido a retalhos (“carúnculas mirtiformes”), o que é compatível com vida sexual activa anterior.
3- A data do presente foi encontrada lesão traumática na região genital - área escoriativa no vestíbulo da vulva na zona de comissura posterior, que resultou de traumatismo de natureza contundente, podendo ter sido devida a agressão sexual com um pénis em erecção.
4 - Tal lesão terão determinado um período de doença fixável em 3 dias, sem afectação da capacidade para o trabalho geral e sem afectação da capacidade para o trabalho habitual.
5 - A data da cura médico-legal desta lesão é fixável em 28-08-2019. (...)».
46 - do relatório da perícia de natureza sexual efectuado na pessoa de IB____, de fls. 1345 a 1348, que converte em “definitivas” as conclusões médico-legais “preliminares” constantes no auto de exame directo (preliminar, datado de 26-08-2019).
47 - da factura de fls. 1598 comprovativa do custo da assistência hospitalar prestada pelo demandante Centro Universitário Lisboa Central, E.P.E., ao ofendido   FO____.
48 - das facturas de fls. 1453 a 1456 comprovativas do custo da assistência hospitalar prestada pelo demandante Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, E.P.E., à ofendida IB____.
49 - das facturas de fls. 1464 e 1568, comprovativas do custo da assistência hospitalar prestada pelo demandante Centro Hospitalar do Oeste, E.P.P., respectivamente aos ofendidos IB________ e   FO____.
50 - dos documentos comprovativos dos custos despendidos pela assistente/demandante IB____, relativamente a despesas médicas e medicamentosas, e com assistência domiciliária, de fls. 1467 a 1472, 1488 a 1493, e 1555 a 1560.
51 - dos relatórios sociais de fls. 1915 a 1919 e 1924 a 1927, relativamente às condições sociais e características de personalidade do arguido.
52 - dos certificados de registo criminal de fls. 1884 e 1885.
*
Relativamente aos factos ocorridos nos dias 30-07-2019 e 13-08-2019, a análise conjugada e crítica da prova produzida, designadamente os depoimentos dos ofendidos IA______  e J..., que de forma coerente, convicta, consistente e objectiva, descreveram a cronologia e dinâmica dos acontecimentos de que foram vítimas respectivamente em 30-07-2019 e 13-08-2019, contrariando a versão apresentada pelo arguido R________ quanto aos factos ocorridos em 30-07-2019, não obstante admitir a sua deslocação ao local, e que do mesmo levou, bens pertencentes à sua ex-namorada, referindo que inicialmente a mesma não tinha conhecimento da situação, e a versão apresentada pelo arguido BMPC________, quanto aos factos ocorridos em 13-08-2019, não obstante admitir que o ofendido foi transportado por ambos no veículo automóvel que conduzia, aliadas às regras da experiência comum, permitiram ao Tribunal a fundamentação da convicção quanto à autoria pelo arguido R________ do crime de roubo, cometido em 30-07-2019, e pela comparticipação dos arguidos BMPC________ e R________ nos factos integradores dos crimes de roubo e de sequestro cometidos em 13-08-2019, nos termos que resultaram provados.
Quanto aos factos ocorridos em 25-08-2019, de que foram vítimas FO______ e IB____, da análise conjugada e crítica da prova produzida, resulta que, não obstante a diferente versão apresentada pelos arguidos BMPC________ e R________ , no que respeita às agressões de que foi vítima o ofendido FO______ verifica-se uma convergência nas declarações dos mesmos na sua essencialidade, no que respeita à deslocação de ambos, de madrugada, à residência onde habitavam os ofendidos, à motivação inicial subjacente, a apropriação de bens e valores que aí se encontrassem, à forma como tal ocorreria, com recurso à ameaça e violência física se necessário fosse, só assim se justificando à luz das regras da experiência comum que os arguidos fossem munidos de abraçadeiras, utilizassem fita adesiva, e levassem a reprodução de arma de fogo, com características semelhantes a uma pistola, convergência que se verificou igualmente no que respeita ao circunstancialismo fáctico relacionado com a privação de liberdade dos ofendidos, o modo como ocorreu a subtracção do dinheiro, outros objectos de valor, a arma de fogo pertença do ofendido, e o veículo automóvel, e a forma como os ofendidos foram transportados nesse veículo até ao eucaliptal em São Bartolomeu de Galegos, local onde os arguidos os deixaram, depois de, para o efeito, os retirarem do veículo e levarem para o interior do eucaliptal, onde ficaram a curta distância um do outro, e depois de a ofendida ter sido atingida com um disparo de arma de fogo na zona da cabeça.
De tais declarações resulta que a actuação dos arguidos foi decorrente de um plano inicial, que pressupôs o aproveitamento da circunstância de o ofendido FO______ conhecer o arguido BMPC________, tendo este trabalhado para aquele, plano que mereceu a concordância de ambos, que o executaram conjuntamente, sendo cada um dos actos praticados pelos arguidos parte desse plano, e essenciais para o propósito comum que pretenderam concretizar.
Quanto à violência física exercida sobre o ofendido FO______ e à intenção de pôr termo à vida de ambos os ofendidos, das declarações da assistente resulta que tal violência foi praticada por ambos os arguidos, sendo reflexo da violência extrema com que o ofendido foi atingido, as lesões visíveis na zona da cabeça, compatíveis também com agressão com o punho da reprodução da arma de fogo, declarações que, conjugadas com o depoimento da testemunha VP____, nos termos supra mencionados, Inspector da Polícia Judiciária, a respeito dos vestígios hemáticos existentes na residência dos ofendidos, aquando da inspecção judiciária efectuada ao local, designadamente no que concerne ao facto de logo na entrada, existirem manchas hemáticas que revelavam que o ofendido tinha estado nesse local a sangrar com abundância, e a coloração escura do sangue, denotadora de que resultava já de lesões também internas, sendo o mesmo inequívoco quanto ao facto de o ofendido ter sido agredido de forma muito violenta e durante muito tempo, referindo inclusivamente que face às lesões externas apresentadas e aos livores cadavéricos no corpo do ofendido, pensava que o mesmo já se encontrava morto quando foi localizado, sendo igualmente determinantes para aferir da gravidade de tais lesões, decorrentes da violência física exercida, a documentação clínica do ofendido, de onde resulta que o mesmo desde o dia 25-08-2019 até à data do óbito em 12-12-2019, permaneceu sempre em estado de coma profundo, vegetativo, numa situação irreversível, permitindo tais elementos a conclusão do nexo de causalidade entre as graves lesões traumáticas cranioencefálicas e a morte do ofendido  FO____.
De igual modo, no que respeita à prática dos actos idóneos a provocar a morte da ofendida, mediante um disparo de arma de fogo, na zona da cabeça, no eucaliptal, disparo que foi assumido pelo arguido BMPC________, da conjugação da prova produzida resulta igualmente que tal actuação foi a concretização de um plano comum, com o objectivo de encobrir a prática dos outros ilícitos criminais cometidos pelos arguidos, e facilitar a fuga, que ocorreu, sendo a única justificação lógica à luz das regras da experiência comum para tal objectivo e execução conjunta, a circunstância de ambos os arguidos terem transportado a ofendida para o interior do eucaliptal, resultando das declarações da mesma que antes de desmaiar, sentiu os dois atrás de si, declarando o arguido BMPC________ que, depois de terem deixado o ofendido FO______ o arguido R________ lhe disse «agora é a tua vez», querendo com isto significar que teriam igualmente de pôr fim à vida da ofendida, o que apenas não aconteceu por motivos alheios à vontade dos arguidos, dada a trajectória do projéctil, não obstante resultar das suas declarações que quando abandonaram os ofendidos no eucaliptal, pensavam que os mesmos estavam mortos.
Tais declarações e depoimentos, sustentados nos elementos periciais e documentais supra mencionados, no que respeita aos vestígios biológicos e hemáticos existentes na residência dos ofendidos, no interior do veículo, nas roupas e pertences dos mesmos, e aos relatórios de avaliação do dano corporal e informação clínica dos ofendidos, relativamente às lesões sofridas por estes, e às sequelas que perduraram na ofendida, aliados às regras da experiência comum, permitiram ao Tribunal a fundamentação da convicção quanto à co-autoria dos arguidos BMPC________ e R________ nos factos integradores dos crimes de roubo, sequestro, homicídio consumado e homicídio tentado, nos termos que resultaram provados, bem como pela factualidade provada no que respeita à comparticipação dos mesmos na detenção da arma de fogo e na reprodução de arma de fogo, que utilizaram nos termos supra descritos na factualidade provada.
Relativamente ao crime de violação, as declarações confessórias do arguido R________ , que se limitou nesta parte a admitir que manteve relações sexuais com a ofendida IB_______ contra a vontade desta, sem contudo esclarecer o contexto e o modo como ocorreu a sua actuação ilícita criminal, conjugadas com as declarações da assistente, que descreveu a violência exercida pelo mesmo, física e psicológica, aquando do cometimento do referido ilícito criminal, permitiram ao Tribunal a fundamentação da convicção quanto à autoria pelo arguido R________ do crime de violação, de que foi vítima a ofendida IB____, nos termos que resultaram provados.
*
Relativamente à factualidade não provada referida em 1 a 3, o Tribunal formou a sua convicção com base na ausência de prova concludente produzida em audiência de julgamento; e, no que respeita à factualidade não provada referida em 4, na circunstância da prova produzida em audiência ter sido em sentido diverso, nos termos que resultaram provados em 42 da factualidade provada.
*
Analisando e decidindo:
Como se verifica da análise dos recursos interpostos os arguidos atacam o acórdão de primeira instância invocando o arguido R________ erro de julgamento requerendo a reapreciação de toda a prova produzida e sede de audiência de julgamento, nos termos do disposto no artigo 412.º, n.º 6 do CPP a que corresponde a prova testemunhal aí recolhida e que se encontra gravada através de sistema integrado disponível na aplicação informática em uso no tribunal a quo, concretamente nas sessões de julgamento dos dias 16.06.2020, 23.06.2020 e 30.06.2020, uma vez que tal é justificável para que se possa comprovar que, relativamente aos factos de que vem acusado, o sentido da prova produzida vai em sentido contrário ao da decisão proferida (conclusão II), e vício decisório de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, previsto no artigo 410.º, n.º 2 a) do CPP (Conclusão II) e ambos os arguidos invocam a nulidade do acórdão consistente em erro notório na apreciação da prova, previsto no art.º 410.º, n.º 2 al. c) do CPP[2].
*
Antes de iniciarmos a análise e decisão, cumpre exarar o que ressalta de forma inequívoca da mera leitura dos recursos interpostos, os arguidos atacam apenas a decisão no que respeita aos crimes de homicídio, homicídio na forma tentada e violação, quer quanto aos factos considerados provados quer relativamente à subsunção dos factos ao direito respeitantes a tais crimes, e ainda às penalidades aplicadas. Os arguidos não se pronunciam, não atacando a decisão, sobre os crimes de roubo nem sobre as indemnizações arbitradas.
*
(i) Do erro de julgamento previsto no art.º 412.º, n.ºs 3 e 4 do CPP:
Cumpre antes mais referir que o recurso da matéria de facto não está previsto na lei como um direito ilimitado tendente à reapreciação do julgamento ou repetição do julgamento na segunda instância. Este recurso foi concebido e deve ser usado como remédio jurídico quando o julgamento realizado seja manifestamente erróneo. Deste modo, o tribunal de recurso apenas intervém de forma a corrigir erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, devendo proceder à sua correção se for caso disso. Não se trata, pois, de um novo julgamento da matéria de facto, antes sendo a forma de sanar os vícios de julgamento em primeira instância, como sejam, erro manifesto no julgamento no caso em que se dê como provado facto com base em depoimento de testemunha que não o afirmou, ou com base em depoimento de testemunha que declarar algo que apenas lhe foi relatado por terceiro, ou ainda com base em valoração de prova proibida, etc. Sobre o erro de julgamento, conceito e limites, o Ac. da Relação de Lisboa de 04-02-2016, Proc. n.º 23/14.2PCOER.L1-9, Relator Antero Luís[3], disponível in www.dgsi.pt.
O recurso da matéria de facto não se destina, assim, a afastar o princípio da livre apreciação da prova, com consagração expressa no artigo 127º do C. Processo Penal.
A livre apreciação da prova pressupõe e está intimamente ligada à oralidade e imediação com que decorre o julgamento em primeira instância, tendo por limites as regras da experiência comum e a obediência à lógica, sendo que, se face à prova produzida, for possível mais do que uma conclusão, a decisão do Tribunal a quo, devidamente fundamentada, se se basear numa das possíveis, é válida.
Ora, o erro de julgamento lato sensu pode suscitar dois tipos de recurso, embora com alcances diferentes e não confundíveis[4]:
- um com fundamento no próprio texto da decisão, por ocorrência dos vícios a que alude o artº 410º/2 do C.P.P (impugnação em sentido estrito);
- e outro que visa a reapreciação da prova produzida, ao abrigo do artº 412º/3 do C.P.P (impugnação em sentido lato).
O recorrente R________ lança mão dos dois, invocando o arguido BMPC________ apenas o primeiro, que a existir enferma de nulidade do acórdão da primeira instância.
Dispõe o nº 3 do artigo 412º, do Código de Processo Penal, relativo à impugnação em sentido lato “Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar:
a) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida;
c) as provas que devem ser renovadas.
Da análise deste preceito legal resulta que o recorrente, quando impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto nos termos do art.º 412º do C.P.P, tem que especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, bem como indicar as provas que, no seu entendimento, impunham decisão diversa da recorrida e aquelas que devem ser renovadas.
No presente caso, o arguido R________ recorrente fez referência aos concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, indica como devem ser julgados, e indica as suas declarações e as declarações para memória futura da ofendida/assistente IB______ como fundamento para o erro que entende existir.
No entanto, como se verifica das motivações não indica o arguido os minutos exatos das gravações como legalmente exigido pelo art.º 412.º, n.º 4 do CPP.
Na verdade, determina a norma indicada 4 - Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens[5] em que se funda a impugnação.
Por sua vez, determina o 364.º, n.º 3 - Quando houver lugar a registo áudio ou audiovisual devem ser consignados na ata o início e o termo de cada um dos atos enunciados no número anterior.
Ora, o arguido limita-se a indicar, no início do seu recurso que a prova se encontra gravada, e ao longo do seu recurso escolhe as partes do depoimento da ofendida que em seu entender suporta a avaliação que realizou da prova produzida e que conduz ao resultado que pretende. No entanto, estas partes que indica e transcreve não se encontram indicadas em conformidade com o exigido pelo transcrito art.º 412.º, n.ºs 3 e 4 do CPP, já que faz referência à transcrição das declarações para memória futura prestadas pela ofendida/assistente IB_______  Ora, consultado o sistema citius verificamos que as ditas declarações para memória futura se encontram gravadas, tendo esta gravação o tempo total de 2h.34m.17s.
E nem se diga que a transcrição substitui a gravação. O legislador não introduziu a gravação por ser rápida em termos de tempo de duração da audiência. Fê-lo porque, apesar de tudo, consegue perceber-se o tom de voz, as pausas, as hesitações, muitas vezes essenciais para a formação da convicção do tribunal, especial e concretamente para a formação da convicção do tribunal de primeira instância já que ao tribunal de recurso falta sempre o contacto visual e a imediação tão importantes, diríamos mesmo essenciais para função de julgar.
Dito isto, facilmente se conclui que o arguido R________ não cumpriu com o ónus da indicação especificada do meio de prova testemunhal por referência aos minutos da gravação onde se encontram as declarações que em seu entender deveriam ter sido valoradas de forma diversa pelo tribunal a quo e por conseguinte não provados os factos que indicou, quer na totalidade quer relativamente a si, quando defende que não existe co-autoria.
Assim, não se mostram preenchidos os pressupostos de que depende o recurso de impugnação ao abrigo do disposto no art.º 412.º, n.º 3 e 4 do CPP.
O que o arguido acaba por colocar em causa é a formação da convicção do tribunal como se verifica das suas motivações e conclusões interpretando e valorando o teor do depoimento e as suas próprias declarações de forma diversa da realizada pelo tribunal de primeira instância. Sendo para nós evidente que própria transcrição das declarações da assistente IB______ realizada por si, não resulta o que defende!
Ora, como se disse e agora se impõe concluir, o recurso de impugnação da matéria de facto para que possa ser aceite tem que observar os pressupostos expressamente definidos nas normas referidas, sendo que, uma vez preenchidos tais pressupostos, só deve verificar-se alteração da matéria de facto considerada provada pela primeira instância se nos encontrarmos perante um erro de julgamento nos termos expostos[6].
No caso presente, uma vez que o recorrente não observou os pressupostos de que depende a reapreciação da prova produzida, testemunhal, está este tribunal de recurso impedido de o fazer e de verificar da existência do erro; mas tendo em conta as suas próprias motivações, em que transcreve as declarações para memória futura prestadas pela ofendida/assistente IB______ e onde se baseia, e as suas próprias declarações (não depoimento como erradamente refere – conclusão XXIX e XXXVI, pois os arguidos não prestam juramento e por conseguinte não prestam depoimento) é patente apenas estamos perante divergência do arguido relativamente à valoração da prova realizada pelo tribunal a quo e não perante um verdadeiro erro de julgamento nos termos explanados, desde logo porque o tribunal não se baseou apenas nos meios de prova por si indicados.
*
Improcedendo a impugnação da matéria de facto, pode ainda este Tribunal de Relação proceder à modificação da decisão proferida em sede de matéria de facto se se verificarem os vícios a que alude o nº 2 do artº 410º do C. P. Penal.
Da análise do texto do acórdão, resulta já claro que igualmente não se verificam os vícios invocados pelos arguidos nem qualquer outro.
Analisemos os ditos vícios desde logo porque os mesmos são de conhecimento oficioso e, como se disse o arguido R________ invoca os previstos nas al.s a) e c) do n.º 2 do art.º 410.º e o arguido BMPC________ igualmente o previsto na al. c), do CPP.
Resulta da letra do artigo referido que qualquer dos vícios a que alude o seu nº 2 tem de dimanar da própria decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, sem recurso, portanto, a quaisquer elementos externos à decisão, designadamente declarações ou depoimentos exarados no processo durante o inquérito ou a instrução, ou até mesmo o julgamento, sendo que, por regras da experiência comum deverá entender-se as máximas da experiência que todo o homem de formação média conhece.
É unânime a jurisprudência no sentido de que só existe insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos do artigo 410º, n. 2, alínea a) Código de Processo Penal quando os factos declarados provados forem insuficientes para a decisão fixada; ou, dito de outro modo, quando do acervo de factos vertido na sentença se constata faltarem elementos que, podendo e devendo ser indagados e julgados (provados ou não provados), são necessários para se formular um juízo seguro de condenação ou absolvição; ou, ainda, noutra formulação, quando a matéria de facto provada é insuficiente para a decisão de direito, o que se verifica porque o tribunal recorrido deixou de apurar matéria de facto que lhe cabia apurar dentro do objeto do processo, tal como este está configurado pela acusação e pela defesa.
Ora, tal como resulta claramente do texto da decisão recorrida foram apurados todos os factos objetivos e subjetivos necessários para o preenchimento dos tipos legais de crime por cuja prática os arguidos foram condenados, tendo o tribunal averiguado todos os factos nos termos sobreditos.
Como também vem sendo orientação dos tribunais superiores, a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada não se confunde como uma suposta insuficiência dos meios de prova para a decisão de facto tomada e a demonstração de tal insuficiência não pode emergir da mera discordância em relação à forma como o tribunal recorrido terá apreciado a prova produzida.        
Porém como se vê das conclusões do recurso do arguido R________ , o que este arguido recorrente manifesta é, exclusivamente, a discordância em relação à valoração que o Tribunal a quo fez dos diversos elementos de prova para neles alicerçar a decisão sobre os factos provados e não provados.
Ora, a invocação deste vício nos termos em que é feita pelo arguido, quando não se aponta em concreto qualquer omissão da matéria de facto que pudesse impedir a decisão jurídica tal como ela foi proferida, uma vez que ficaram demonstrados todos os factos objetivos e subjetivos que integram os tipos de ilícitos em causa, conforme o descrito na matéria de facto provada do Acórdão recorrido, não tem qualquer sentido.
Relativamente á nulidade prevista na al. b) do n.º 2 do 410.º, “Como se decidiu no Ac. do STJ de 18/03/2004, Proc. nº 03P3566, citado por Vinício Ribeiro, Código de Processo Penal, Notas e Comentários, Coimbra Editora, 2008, págs. 914/915, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, apenas se verificará quando, analisada a matéria de facto, se chegue a conclusões irredutíveis entre si e que não possam ser ultrapassadas ainda que com recurso ao contexto da decisão no seu todo ou às regras da experiência comum” (Ac. Relação de Lisboa, de 30-10-2018, Proc. 672/17.7IDLSB.L1-5, Relator Artur Vargues, disponível in http://www.dgsi.pt).
Analisada a decisão verifica-se que não existe qualquer contradição na matéria de facto nem entre esta e a sua motivação. A decisão de facto e respetiva motivação são perfeitamente sequenciais e lógicas, assentando num exame crítico da prova vertido num discurso claro e lógico.
Aliás, nenhuma contradição é apontada pelos recorrentes.
Relativamente á nulidade prevista no artº 410º, n.º 2, al. c) do C.P.P. de erro notório na apreciação da prova, invocada por ambos os arguidos cumpre analisá-la com maior acuidade, dado os argumentos invocados.
Tal vício, configura-se quando se retira de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, arbitrária ou visivelmente violadora do sentido da decisão e/ou das regras de experiência comum. E tem, pois, que resultar impreterivelmente do próprio teor da sentença; existindo este erro, quando considerado o texto da decisão recorrida por si só ou conjugado com as regras de experiência comum se evidencia um erro de tal modo patente que não escapa à observação do cidadão comum ou do jurista com preparação normal.
Ocorre este vício quando se dão por provados factos que face às regras de experiência comum e à lógica normal, traduzem uma apreciação manifestamente ilógica, arbitrária, de todo insustentável e por isso incorreta, quando resulta do próprio texto da motivação da aquisição probatória que foram violadas as regras do “in dúbio” (cfr Ac. do S.T.J de 24.3.2004 proferido no processo nº 03P4043 em www.dgsi.pt, Ac. do S.T.J 3.3.1999 in proc 98P930 e Ac. da Rel. Guimarães de 27.4.2006 in proc. 625/06) ou quando se violam as regras sobre prova vinculada ou de “leges artis” (cfr Ac. da Rel.Porto de 2.2.2005 no proc.0413844 e da Rel.Guimarães de 27.6.2005 no proc. 895/05-1ª).
Da leitura atenta do texto da sentença recorrida em especial da matéria de facto provada e não provada que aí é descrita, bem como da parte relativa à respetiva fundamentação, o que se pode constatar com clareza e desde já, é que a análise crítica da prova e a decisão de facto constante da decisão e a sua motivação/justificação está bem assente nas regras da experiência comum e da lógica.
Não houve da parte do Tribunal a quo qualquer falha ou desrespeito das regras legais e dos princípios gerais de direito na valoração da prova, não padecendo, por isso, a decisão de qualquer erro na apreciação da prova.
Os factos resultaram provados porque o Tribunal, analisando a prova produzida de harmonia com a lei se convenceu que eles assim ocorreram.
Deste modo, a convicção do Tribunal a quo afigura-se-nos ter sido uma convicção racional, que foi formada de acordo com os critérios lógicos e objectivos, com respeito pelo princípio da livre apreciação da prova consagrado no artº 127º do C.P.P – ao abrigo do qual toda a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.
Dito de outro modo, o Tribunal ao valorar como valorou a prova produzida em audiência, mais concretamente as declarações dos arguidos e depoimentos das testemunhas e esclarecimentos dos peritos em conjugação com o resultado das perícias realizadas e documentos expressamente indicados na motivação de facto, não violou qualquer regra da experiência ou da lógica. Valorou livremente as declarações e depoimentos, revelando que uns lhe mereceram maior credibilidade que outros. Ou seja, mereceu-lhe credibilidade o relatado pela ofendida/assistente IB_______ e bem. Todas as hesitações e aparentes contradições que os arguidos, em especial o arguido R________ , apontam facilmente se compreendem bastando para tanto ter presente que a testemunha em causa foi violada, baleada na cabeça e deixada num eucaliptal, tendo, antes destes factos, assistido aos factos que os arguidos, em especial o arguido R________, mas sempre com a concordância e apoio do arguido BMPC____ , praticaram sobre a pessoa do seu tio. Anormal seria que a testemunha tendo vivido como viveu os factos praticados pelos arguidos naquela noite, os relatasse sem hesitações, sem emoção ou com discurso totalmente linear. Aliás, o próprio arguido R________ transcreve na conclusão XIV e que aqui relembramos:
IB______  - Exatamente. Entrou, ele entrou. Mas ele não criou grandes lesões. Percebeu? É isso é que foi. Ele não criou grandes lesões. Pelo menos eu não me lembro. Eu não tenho a precisão porque eu quando cheguei ao Santa Maria, eu disse que tinha sido violada. Isto foi tudo, acho, para o instituto de medicina legal. Eles podem verificar se têm lá lesões ou não. Mas eu não me lembro. Só se eu desmaiei nessa altura, possivelmente.”[7]
A testemunha sofreu às mãos dos arguidos de forma inqualificável. Temeu pela vida. Normal é que não se lembre de parte dos factos. Normal é que sofra de stress pós-traumático e a sua memória apresente lacunas e descreva os factos de forma menos lienar.
O que não é normal, diga-se em abono da verdade, ultrapassando o direito à defesa, é que o arguido afirme, como bem refere o MP de forma “despudorada”, que Tal relato não é compatível com o relatório de perícia de natureza sexual de fls 746 a 748 que refere a lesão encontrada, provocada por traumatismo de natureza contundente, podendo ser devida a agressão sexual com um pénis em erecção quando o arguido confessou o acto, como até reconhece na conclusão XXVIII!
Ora, e no que a este acto diz respeito, como é óbvio, tendo o arguido reconhecido a violação é óbvio que as regras da experiência e da biologia impõem que se conclua que a violação só pode verificar-se com pénis ereto! Tanto mais que o relatório de exame da ofendida é efetivamente claro no que respeita à existência de lesões, lesões que o arguido de forma desrespeitosa confunde com o estado do hímen!
O mesmo se diga no que respeita ao que o arguido R________ invoca na conclusão XV no que respeita à decisão de por termo à vida dos ofendidos e o arguido BMPC________na conclusão g), p), q), r) e que remata na conclusão pp).
Esquece o arguido BMPC________as suas próprias declarações quando refere que o arguido R________ depois de ter deixado o malogrado FO______ tio da ofendida IB____, no eucaliptal amarrado a uma árvore, lhe disse agora é a tua vez, tendo interpretado essas palavras no sentido de balear a ofendida IB______ o que fez na cabeça.
É preciso mais prova para que se conclua pela intenção de matar? Olvidam os arguidos, neste caso quem os representa na sua defesa, que o dolo não tem que resultar provado de forma direta (a não ser em casos de confissão). Ele pode resultar, e resulta na maioria das situações, do modo como é executado o crime. E no caso, um tiro na cabeça não tem outra interpretação possível. Tal como o não têm a circunstância, demonstrada, de se abandonar uma pessoa com a idade do malogrado FO______ depois das lesões que lhe infligiram (bem demonstradas nos vestígios de sangue que foram bem demonstrados e analisados nos autos e valorados na decisão), num eucaliptal ermo. Certamente que não foi para que o mesmo fosse socorrido, pois aí não tinham abandonado a ideia inicial de o transportar ao hospital. Repare-se que o FO______ não foi deixado junto a uma estrada ou a algum local de passagem que permitisse ser visto e socorrido. Sendo certo que os podiam ter deixado em casa, pois apesar de lhes terem queimado os telemóveis sempre poderiam ter chamado ajuda. Os arguidos se bem que possam não ter planeado todos os passos da sua atuação previamente à entrada na habitação de FO______ a verdade é que, como o próprio arguido BMPC________declarou muniram-se logo, antes de lá se deslocarem, de abraçadeiras para o caso de algo correr mal e de ter que amarrar os ofendidos à escada,; Por outro lado, o modo como os factos se desenrolaram demonstram sem qualquer margem para dúvidas que os arguidos, entre o momento em que destruíram os telemóveis dos ofendidos e obtiveram a arma do malogrado  decidiram tirar a vida a ambos, tio e sobrinha, FO______ e IB_______  Como bem nota o MP na sua resposta ao recurso apresentado pelo arguido R________ a testemunha IB____ afirmou que os arguidos mudaram de planos decidindo abandoná-los num eucaliptal, longe de qualquer povoação. Na motivação do acórdão o tribunal funda-se nas declarações da testemunha, a ofendida IB____, atribuindo-lhe afirmações que não foram colocadas em causa pelos arguidos. Não sendo igualmente de ignorar, e o tribunal a quo não o fez, o declarado pelo arguido BMPC____ . Aliás, tendo em conta o recorte das declarações da ofendida/assistente realizada pelos arguidos e o teor da súmula do seu depoimento constante do texto do acórdão recorrido, não colocada em causa por qualquer dos arguidos, verifica-se que, como igualmente bem salienta o MP, os arguidos transcrevem partes das mesmas, descontextualizando-as de modo a sustentar o que escrevem, esquecendo que esse não foi o único meio de prova prestado e valorado.
Acresce que, e ao contrário do defendido pelo arguido R________, impugnando os factos que em seu entender foram praticados apenas pelo arguido BMPC____ , para daí retirar a inexistência de co-autoria, a verdade é que os arguidos combinaram, antes de se dirigirem a casa de FO______ desde logo parte dos factos que iam praticar, tanto que se muniram das abraçadeiras com que vieram a imobilizar quer o malogrado  quer a sobrevivente IB____, precavendo-se antes de se deslocarem a casa do FO______ com os meios necessários para o caso de algo correr mal, como aliás, repita-se, o co-arguido BMPC________ declarou. Tudo o mais que praticaram, de uma violência extrema e sem qualquer respeito pela vida e sofrimento das vítimas, demonstrando frieza e falta de empatia, bem descrita na matéria de facto provada para onde remetemos, foi sendo o desenvolvimento do acordo inicial não se vendo em momento algum a existência de qualquer facto ou circunstância que permita concluir que um ou outro arguido não aderisse ou não concordasse ao praticado pelo outro, que aliás estava conforme com o resultado final por ambos querido – tirar a vida às referidas pessoas. Este acordo está bem patente no desenrolar dos acontecimentos e foi relatado de forma expressa pela ofendida/assistente IB____.
Não deixa de ser curioso que o arguido R________ acaba por referir, tendo-se prestado a tal empreitada, que a ofendida IB____ referiu 7 vezes que ele era o líder, explicando que este dava ordens e o BMPC________as executava, relatando como se desenrolaram os factos, transmitindo-nos uma amostra da violência praticada pelos arguidos sobre ela e seu tio, e ainda que pese embora o BMPC________conduzisse o veículo automóvel quem decidia o que fazer era o arguido R________, descrevendo a assistente o BMPC________como um palhacinho autêntico que fazia aquilo que ele queria, tendo qualquer fundamento o que invoca e pretende, nomeadamente, na conclusão XXXII.
Relativamente ao nexo causal entre as lesões que os arguidos provocaram a FO______ e a sua morte, vem o arguido R________ invocar que porque não foi realizada autópsia não é possível concluir-se pela relação causal que tem que resultar provada para que seja imputável a sua morte à atuação dos arguidos. Invoca o depoimento da Dra MA____, Chefe de Serviço de Cirurgia Geraldo Hospital de Torres Vedras, que assinou o certificado de óbito de FO______ prestado no dia 30.06.2020, mas não indica os minutos onde se encontra o que lhe atribui, sendo certo que não afirma que o tribunal atribui a esta testemunha algo que ela não tenha proferido. Na verdade, da motivação de facto consta a referência expressa ao que esta testemunha afirmou, indicada sob o ponto 14 da motivação, como sendo a causa da morte, e que o estado do malogrado se manteve inalterado desde a sua hospitalização na sequência das agressões que lhe provocaram, lesões cranioencefálicas irreversíveis estando apenas, até à sua morte, a receber cuidados de conforto. Não se vislumbra do recurso de qualquer dos arguidos, especialmente do R________ , que insiste na inexistência de autópsia, qualquer referência à falsidade ou desconformidade entre o afirmado pela testemunha e o que tribunal coletivo na motivação lhe atribui. Apenas se agarra a partes do que a testemunha terá dito e que em seu entender inviabiliza o nexo causal considerado provado pelo tribunal a quo, sem que indique os minutos da gravação como se lhe impunha. De todo o modo e ainda que tivesse cumprido com tal ónus, a verdade é que o que ressalta do seu recurso é apenas uma discordância relativamente à valoração da prova e não a existência de um verdadeiro erro de julgamento.
De todo o modo ainda se nos apraz dizer que o arguido mais uma vez esquece que esta audiência e estes autos contêm diversos documentos e foram ouvidas várias testemunhas, tendo olvidado nomeadamente os esclarecimentos do perito médico CD____, que transmitiu que não tem dúvidas do nexo causal entre as lesões traumáticas cranieoencefálicas e a morte de FO______ o que em conjugação com o relatório da perícia médico legal realizada e junta a fls. 1313 de que o mesmo transcreveu o que lhe interessou na conclusão XVIII, esquecendo o seu restante conteúdo, e a demais prova que foi produzida sobre este nexo causal, justificam que se considere provado o facto em causa.
Invoca ainda o arguido R________ na sua conclusão XXVIII O tribunal a quo, quando o arguido admitiu que manteve relações sexuais com a ofendida contra a vontade desta mas que “não quis entrar em pormenores”, entendeu falta de ressonância afectiva e falta de qualquer sentimento de arrependimento. Falso! O arguido limitou-se apenas a gozar do direito de se remeter ao silêncio, sem que as sua “não declarações” possam ser entendidas ou usadas contra si. Esteve mal o tribunal a quo que utilizou este silêncio em prejuízo do arguido. Mas esta afirmação não é correta! O tribunal não considerou que provado falta de ressonância afectiva e falta de qualquer sentimento de arrependimento pelo facto de o arguido não ter querido entrar em pormenores. O direito ao silêncio em nada pode prejudicar o arguido e não o prejudicou. O tribunal alicerçou-se no modo como o arguido prestou declarações e no modo de execução do crime e não no e por causa do exercício de um dos direitos fundamentais que lhe assiste. Aliás se dúvidas existissem sobre a falta de ressonância afectiva e falta de qualquer sentimento de arrependimento, que não existiam nem existem, elas ficariam dissipadas com o teor do seu recurso.
Como bem nota o MP, e relativamente ao facto das moedas que foram encontradas no veículo não terem vestígios de hemáticos, apenas foram apreendidos os objetos que os arguidos tinham na sua posse desconhecendo-se o destino das moedas utilizadas pelos mesmos durante as agressões a  FO____.
Não temos dúvidas pois, que os factos se encontram bem valorados e têm apoio na prova produzida, tudo conforme com o princípio da livre convicção do julgador consagrado no art.º 127.º do CPP, uma vez que o valor da prova não depende da sua natureza mas sobretudo da credibilidade que se confere às mesmas, credibilidade que, no caso, está conforme com a prova objetiva dos autos – a existência das lesões no malogrado , lesões que apresentada no momento em que após ter sido descoberto no eucaliptal foi transportado ao hospital, as lesões apresentadas pela ofendida IB____, que pese embora tenha sido baleada referiu desde logo que tinha sido violada, daqui se podendo verificar o trauma que sofreu com esse crime; os exames à casa onde se encontravam, os indícios aí recolhidos, os meios utilizados, as abraçadeiras, as fitas colas, o carro, as moedas, ou seja, tudo o que se encontra bem descrito nos relatórios das perícias e exames juntos aos autos e bem assim as apreensões realizadas, em conjugação com as fotografias de ambos, FO______ e IB_______ bem elucidativas do estado em que os arguidos os deixaram e das lesões que lhes infligiram, e demais abundante prova recolhida nos autos, não só suportam como impõem a decisão de facto tomada pelo tribunal a quo.
Como se disse já, resulta claramente da leitura das motivações do recurso dos arguidos e das suas conclusões, o que estes no fundo, tal como já acima se disse, discordam é da convicção do Tribunal a quo e pretendem fazer vingar a sua visão sobre a prova produzida e os factos que se devem dar como provados e como não provados de modo contrário até ás próprias declarações!
De acordo com o princípio da livre apreciação da prova que domina o nosso sistema (por oposição ao regime da prova legal) não existem normas que determinam o valor ou a eficácia probatória a atribuir a cada meio de prova, com exceção das perícias, cujo valor, no caso, não foi infirmado pelos arguidos.
Nessa medida a atribuição de maior força a um meio de prova depende apenas da convicção do julgador, desde que se mostre de acordo com a experiência comum.
O Tribunal a quo é sempre o que se encontra mais apto para apreciar a prova, pois é este que ouve e vê as testemunhas, as suas reações, as suas pausas, os seus gestos.
O local e o momento onde por excelência se aferem e podem ser apreciadas valorativamente e criticamente as provas, é a audiência e julgamento em que o julgador dispõe de melhores condições para apreciar de perto a prova que se vai produzindo (princípio da imediação da prova), ou a falta dessa prova.
No caso em apreço, dissemos já, porque assim consideramos, a decisão recorrida, encontra-se bem fundamentada, oferecendo um raciocínio linear, lógico e percetível, não se vislumbrando qualquer incorreta apreciação da prova, nomeadamente quanto à medida e extensão da credibilidade que lhe mereceram as declarações e depoimentos prestados em conjugação com a análise das demais provas e regras da experiência comum.
Como é do conhecimento geral e já acima ficou dito, a prova é apreciada de acordo com o princípio da livre apreciação da prova consignado no artº 127º do C.P.P onde claramente se pode ler “…a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”.
Estamos pois em sede de um certo poder discricionário do Juiz, que “só pode ser atacado em função de vícios típicos endógenos da sentença ou erros de direito, ou claros erros de julgamento”, os quais no caso presente não existem.
Nada, pois, a apontar ao processo de valoração da prova feita pelo Tribunal a quo, já que o mesmo não se baseou em provas proibidas ou a métodos proibidos de prova, violando qualquer das regras que disciplinam esta matéria nos artigos 124º a 139º do C.P.P e conduzindo por essa via a uma prova ilegal.
Não padece, pois, a decisão recorrida do vício previsto na alínea c) do nº 2 do artº 410º do C. P. Penal (erro notório na apreciação da prova).
*
Da co-autoria
Defende o arguido R________ que não nos encontramos perante qualquer situação de co-autoria mas sim de cumplicidade.
Como bem se explica no Ac. do STJ de 14/12/2017, Proc. 470/16.5JACBR.S1, Relator Francisco Caetano, disponível in https://jurisprudencia.csm.org.pt/ I - A co-autoria prevista no art. 26.º do CP, como tal referida na tipologia das formas de autoria (3.ª alternativa) configura uma forma de participação em que o domínio do facto é exercido com outro ou outros, tratando-se de um domínio, agora “colectivo”, ou de um condomínio de facto. A actuação de cada autor é essencial na execução do plano comum, ela sendo a tarefa com vista à realização desse plano. O acordo ou a decisão conjunta representa a componente subjectiva da co-autoria e é esse elemento que permite justificar que o agente que levou a cabo apenas uma parte da execução típica responda, afinal, pela totalidade do crime.
II - A co-autoria apresenta como elementos integrantes: um acordo, expresso ou tácito para a realização conjunta de uma acção criminosa; a) intervenção directa na fase executiva do crime; b) repartição de tarefas ou papeis entre cada comparticipante; c) domínio funcional do facto, traduzido na possibilidade de exercer o domínio positivo do facto típico e de impedir ou abortar esse resultado.
III - A cumplicidade (art. 37.º do CP) consiste no auxílio material ou moral à prática por outrém de um facto doloso típico e ilícito, podendo este consistir, v.g. num conselho ou influência do agente uma vez já previamente decidido à pratica do facto e, aquele, v.g. na entrega de meios ou instrumentos ao autor que favoreçam a realização do facto, favorecimento esse valorado segundo um juízo de prognose póstuma. O cúmplice favorece ou auxilia na execução do crime, ficando fora do acto típico, mas se ultrapassar o mero auxilio e praticar parte necessária da execução do plano criminoso torna-se, então, co-autor.
Ora, como se verifica da matéria de facto apurada, que não merece qualquer reparo, no caso, estamos perante um acordo e plano prévio engendrado pelos arguidos para obterem a satisfação do que inicialmente pretendiam, obter a entrega de dinheiro e valores por parte do FO______ independentemente do que fosse necessário fazer, tendo planeado como o levariam a abrir a porta, munindo-se de abraçadeiras para o caso de algo correr mal. Aí chegados e não obstante terem conseguido entrar em casa e desde logo o FO______ lhes ter dito para levarem o que quisessem mas que não lhes fizessem mal, como se verifica do relatado pela ofendida/assistente IB_______ a verdade é que o agrediram de forma desnecessária, muito para além do necessário para obterem o acesso ao dinheiro e aos valores, ou seja, o dolo que inicialmente se poderia equacionar como sendo necessário veio a revelar-se, pela prática dos actos, a direto, ofenderam a IB______ na sua integridade sexual, física e emocional, e praticaram actos de onde resulta de forma inequívoca a intenção, tomada em conjunto, de colocar termo à vida de ambos. Note-se ainda que a assistente é clara em afirmar que o arguido R________, pese embora o não tivesse visto a agredir o tio, incentivava o arguido BMPC________a fazê-lo, sendo que este, quando prestou declarações, atribui também ao R________ actos de agressão no corpo do FO____; por outro lado e como se verifica das declarações do arguido BMPC________igualmente a decisão de tirar a vida dos ofendidos foi tomada por ambos e cada um tirava a vida a um dos ofendidos. Significa, assim, que não é de cúmplice a atuação do arguido, mas sim de co-autor, tendo ambos praticado os factos de comum acordo, pese embora um praticasse uns factos e o outro praticasse outros.
*
Da qualificação jurídica dos factos praticados sobre a pessoa de  FO :
É ainda defendido que os factos não permitem concluir pela intenção de matar e, por conseguinte, não se verifica o crime de homicídio na pessoa do FO______ mas apenas o crime de ofensas agravadas pelo resultado – crime preterintencional.
Quem matar outra pessoa comete o crime de homicídio (art.º 131.º do CP). Este crime pode ser praticado de forma dolosa, em qualquer das modalidades de dolo, ou de forma negligente, prevendo o legislador situações suscetíveis de agravar a culpa ou a ilicitude (art.º 132.º), homicídio qualificado, e ao contrário circunstâncias suscetíveis de diminuir sensivelmente a sua culpa, homicídio privilegiado (art.º 133.º CP) e ainda homicídio a pedido da vítima (art.º 134.º do CP).
Por sua vez determina o art.º 143.º do CP que quem ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa comete o crime de ofensas à integridade física. Este ilícito para além do tipo simples previsto no citado 143.º pode ser cometido de forma agravado (144.º CP), de forma privilegiada (146.º CP), ou consubstanciar o crime de ofensas à integridade física qualificada (145.º CP), para além de outros que agora não têm aplicação[8]. Por fim o legislador prevê e tipifica a agravação dos crimes previstos no art.º 143.º a 146 tendo em conta o resultado provocado com a acção típica ilícita.
Pretende o legislador que não fiquem de fora dos tipos anteriores, em que o dolo tem que abranger a ação e o seu resultado típico, as situações em que o resultado da ação do agente excede o dolo, prevendo-se no art.º 147.º do CP que se das ofensas previstas nos artigos 143.º a 146.º resultar a morte da vítima, o agente é punido com a pena aplicável ao crime respectivo agravada de um terço nos seus limites mínimo e máximo.
O tribunal a quo entendeu estarmos perante a prática de um crime de homicídio consumado relativamente a FO______ estabelecendo um nexo causal entre as lesões provocadas pela ação dos arguidos e a morte do mesmo, o que fez no seguintes termos:
C) - Do crime de homicídio qualificado, na forma consumada e do crime de homicídio qualificado, na forma tentada, imputados aos arguidos:
Aos arguidos BMPC________ e R________ foi ainda imputada a prática, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 131° e 132°, n°s. 1 e 2, als. c), g) e h), ambos do Código Penal, e de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelos arts. 131°, 132°, n°s. 1 e 2, als.
c) , g) e h), 22° e 23°, todos do Código Penal.
Dispõe o art. 131° do Código Penal «Quem matar outra pessoa é punido com pena de prisão de 8 a 16 anos.».
Por seu turno estipula o art. 132°, n°s. 1 e 2:
«1 - Se a morte for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, o agente é punido com pena de prisão de 12 a 25 anos.
2 - É susceptível de revelar a especial censurabilidade ou perversidade a que se refere o número anterior, entre outras, a circunstância do agente:
(...)
c) Praticar o facto contra pessoa particularmente indefesa, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez;
(...)
g) Ter em vista preparar, facilitar, executar ou encobrir um outro crime, facilitar a fuga ou assegurar a impunidade do agente de um crime;
h) Praticar o facto juntamente com, pelo menos, mais duas pessoas ou utilizar meio particularmente perigoso ou que se traduza na prática de crime de perigo comum (…)».
A incriminação do homicídio, tipo legal fundamental dos crimes contra a vida, é um corolário do princípio constitucional da inviolabilidade da vida humana, decorrendo a qualificação prevista no art. 132° do Código Penal, da verificação de um tipo de culpa agravado, definido pela orientação de um critério generalizador enunciado no n.° 1 do mencionado art. 132°, «assente numa cláusula geral extensiva e descrito com recurso a conceitos indeterminados: a “especial censurabilidade ou perversidade” do agente referida no n.° 1; verificação indiciada por circunstâncias ou elementos uns relativos ao facto, outros ao autor, exemplarmente elencados no n.° 2.» (v. Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, pág. 25 e segs.).
Salienta a este respeito o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2106-2006 (http://www.dgsi.pt) “O critério generalizador está traduzido na cláusula geral com a utilização de conceitos indeterminados - a especial censurabilidade ou perversidade do agente; as circunstâncias relativas ao modo de execução do facto ou ao agente são susceptíveis de indiciar a especial censurabilidade ou perversidade e, assim, por esta mediação de referência, preencher e reduzir a indeterminação dos conceitos da cláusula geral.
Sendo elementos constitutivos do tipo de culpa, a verificação de alguma das circunstâncias que definem os exemplos-padrão não significa, por imediata consequência, a realização do tipo especial de culpa e a directa qualificação do crime, como, também por isso mesmo, a não verificação de qualquer dos modelos definidos do tipo de culpa não impede que existam outros elementos e situações que devam ser considerados no mesmo plano de valoração que está pressuposto no crime qualificado e na densificação dos conceitos bem marcados que a lei utiliza.
Mas, seja mediada pelas circunstâncias referidas nos exemplos padrão, ou por outros elementos de idêntica dimensão quanto ao desvalor da conduta do agente, o que releva e está pressuposto na qualificação é sempre a manifestação de um especial e acentuado «desvalor de atitude», que traduz e que se traduz na especial censurabilidade ou perversidade, e que conforma o especial tipo de culpa no homicídio qualificado. ”.
Quanto às disposições aplicáveis à tentativa, estipula o art. 22° do Código Penal:
«1 - Há tentativa quando o agente praticar actos de execução de um crime que decidiu cometer, sem que este chegue a consumar-se.
2 - São actos de execução:
a) Os que preencherem um elemento constitutivo de um tipo de crime;
b) Os que forem idóneos a produzir o resultado típico; ou
c) Os que, segundo a experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, forem de natureza a fazer esperar que se lhes sigam actos das espécies indicadas nas alíneas anteriores.».
O crime de homicídio qualificado na forma tentada pressupõe assim que se verifique que o agente resolveu matar outrem em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade; que a morte da vítima não se tenha consumado por circunstâncias alheias à vontade do agente; e que o agente tenha praticado actos de execução do crime, na acepção das citadas alíneas do n.° 2 do art. 22° do Código Penal.
Do confronto com os factos provados resulta que os arguidos formularam uma resolução criminosa autónoma, de pôr fim à vida dos ofendidos, para evitar que estes denunciassem os crimes por si praticados, e facilitar a sua fuga, agindo para o efeito de forma deliberada, livre e consciente, em execução de um plano que foram adaptando e que mereceu a concordância de ambos, logrando conseguir o seu propósito relativamente ao ofendido  FO______ que agrediram reiterada e brutalmente, designadamente com murros e com pancadas desferidas com o punho da réplica da arma de fogo na zona da cabeça, que lhe causaram golpes profundos nessa zona e sangramento abundante, abandonando-o num local ermo, conscientes das lesões que lhe tinham infligido descritas em 47 da factualidade provada, e que, sem qualquer quebra do nexo causal, provocaram traumatismo cranioencefálico, em consequência do qual o ofendido esteve em estado permanente e irreversível de coma e vegetativo, causando tais lesões traumáticas cranioencefálicas a morte do ofendido ocorrida em 12 de Dezembro de 2019.
A valoração global dos factos, designadamente quanto ao modo de execução do crime, de forma fria e determinada, utilizando os arguidos também as próprias mãos como instrumento do crime, revelam uma especial censurabilidade e perversidade, denotando uma firmeza e energia criminosa reveladoras de uma forte intensidade de vontade criminosa por parte dos arguidos, que demonstrando com a sua actuação um acentuado desprezo pelo valor da vida humana, concretizaram o firme propósito de tirar a vida a  FO______ de 76 anos de idade, do modo supra descrito, agindo com total frieza e indiferença perante a dor e o sofrimento psicológico causados ao ofendido, reflectindo as circunstâncias em que ocorreu a morte da vítima, ao nível da culpa, a especial censurabilidade e perversidade exigidas para a qualificação da actuação dos arguidos.
Concluindo-se da valoração global da factualidade provada, por uma actuação especialmente desvaliosa em termos de especial censurabilidade e perversidade, e pelo preenchimento dos exemplos-padrão previstos nas als. c) e g) do n.° 2 do art. 132° do Código Penal, a actuação dos arguidos BMPC________ e R________ reconduz-se assim à prática, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 131° e 132°, n°s. 1 e 2, als. c) e g) do Código Penal, cometido em 25-08-2019, de que foi vítima   FO____.
Ao contrário, os arguidos vieram defender nos respetivos recursos que nos encontramos perante um crime de ofensas à integridade física agravadas pelo resultado. E bem se compreende que assim defendam já que as penalidades aplicáveis são, como se conclui da mera leitura dos preceitos legais conjugados para este julgamento, muito mais suaves.
Mas, salvo o devido respeito, esta tese não tem qualquer fundamento e muito menos suporte na matéria de facto apurada. As declarações do co-arguido BMPC________são mais do que elucidativas no sentido de que ele próprio entendeu que o arguido R________ havia tirado a vida a FO______ e de seguida ele cumpriria a sua parte relativamente á ofendida IB______ baleando-a na cabeça, referindo ainda que foi o R________ quem manuseou e lhe entregou a arma. Como o próprio BMPC________refere, o R________ afirmou que deixou o FO______ amarrado a uma árvore e que quando o retiraram da bagageira, bem demonstrativo da falta de respeito mínimo pela vida e pelo ser humano, o FO______ estava vivo e consciente, não sangrava. Se não pretendiam que ele morresse porque entendeu o BMPC________que, perante o que o R________ lhe disse “agora é a tua vez”, decidiu balear a IB______ na Cabeça? É evidente que os arguidos queriam tirar a vida a ambos, revelando que, até pelo cuidado que tiveram em deixar os ofendidos num eucaliptal longe de qualquer povoação e que por isso não iriam ter assistência, tinham consciência que as lesões decorrentes das agressões que perpetraram no corpo do FO______ lhe causaria a morte, a qual seria bem mais dolorosa se ocorresse no local onde o deixaram, uma vez que durante o internamento apenas recebeu cuidados de conforto.
Não há dúvida que estamos perante dolo de morte, revelado pelo modo de agir dos arguidos, e não um resultado que excede o dolo, como seria se estivéssemos perante o crime de ofensas corporais agravadas pelo resultado, e que por isso integra a categoria dos crimes preterintencionais.
Deste modo, sem necessidade de maiores considerandos cai por terra esta parte do recurso.
*
Da aplicação do regime especial para jovens:
Defende o arguido R________ a aplicação da atenuação especial prevista no art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de setembro, que aprovou o regime penal aplicável a jovens delinquentes, nos seguintes termos:
O tribunal a quo aplicou ao arguido ora recorrente, no caso dos crimes de homicídio qualificado e homicídio qualificado na forma tentada as penas de 22 anos e de 16 anos de prisão.
No caso dos autos, o arguido tinha acabado de fazer 21 anos à data dos factos, não há antecedentes de qualquer tipo de crime, pelo que somos da opinião de que a atenuação especial da pena só poderá facilitar o propósito da ressocialização (conclusão XLV).
Na sua resposta o MP pronunciou-se sobre esta pretensão nos seguintes termos 45° Da aplicação do Regime previsto pelo DL 401/82. de 23-09
O regime penal especial para jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, instituído pelo DL 401/82, de 23-09, surge em regulação do imperativo decorrente do art. 9.° do CP (aprovado pelo DL 400/82, da mesma data), que entrou em vigor simultaneamente com o CP, com o qual foi articulado.
46° Dispõe o Artigo 1.° (Âmbito de aplicação)
1 - O presente diploma aplica-se a jovens que tenham cometido um facto qualificado como crime.
2 - É considerado jovem para efeitos deste diploma o agente que, à data da prática do crime, tiver completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos.
3 - O disposto no presente diploma não é aplicável a jovens penalmente inimputáveis em virtude de anomalia psíquica.
47° O arguido nasceu em 17.02.1998.
48° Os factos ocorreram em 25.08.2019.
49° Ou seja, á data dos factos o arguido já tinha completado 21 anos, pelo que o regime não lhe é aplicável.
E bem quanto a nós. Como reconhece o arguido, à data da prática dos factos já tinha completado há seis meses os 21 anos de idade. Assim, não se mostra preenchida a condição de que depende a aplicação de tal diploma legal.
Termos em que improcede a sua pretensão.
*
Das penalidades aplicadas aos arguidos:
O tribunal a quo fundamentou do seguinte modo a determinação das penalidades concretas que decidiu aplicar aos arguidos:
Determinação da medida da pena:
A determinação da moldura penal abstracta resultante da subsunção dos factos praticados pelo arguido aos tipos de ilícitos em causa, é a seguinte:
- crime de roubo, na forma consumada, (quer simples, quer desagravado em razão do valor diminuto), previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal: prisão de 1 (um) ano a 8 (oito) anos.
- crime de roubo agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n°s. 1 e 2, als. a) e b), com referência às als. e) e f) do n.° 1 e à al. f) do n.° 2 do art. 204°, ambos do Código Penal: prisão de 3 (três) anos a 15 (quinze) anos.
- crime de sequestro, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n.° 1 do Código Penal: prisão de 1 (um) mês a 3 (três) anos ou multa de 10 a 360 dias (cf. arts. 41°, n.° 1 e 47°, n.° 1, ambos do Código Penal).
- crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n°s. 1 e 2, als. b) e e) do Código Penal: prisão de 2 (dois) anos a 10 (dez) anos.
- crime de violação, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 164°, n.° 1, al. a) do Código Penal, na redacção vigente à data dos factos: prisão de 3 (três) anos a 10 (dez) anos.
- crime de homicídio qualificado, na forma consumada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 131° e 132°, n°s. 1 e 2, als. c) e g), ambos do Código Penal: prisão de 12 (doze) anos a 25 (vinte e cinco) anos.
- crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 131°, 132°, n°s. 1 e 2, al. g), 22° e 23°, todos do Código Penal, com a agravação prevista no art. 86°, n.° 3 do NRJAM: prisão de 3 (três) anos 2 (dois) meses e 12 dias a 25 (vinte e cinco) anos.
- crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art. 86°, n.° 1, al. c) do Novo Regime Jurídico das Armas e Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.° 5/2006, de 23-02, com as alterações introduzidas pelas Leis n.° 59/2007, de 04-09, n.° 17/2009, de 06-05, n.° 26/2010, de 30-08, n.° 12/2011, de 27-04, e n.° 50/2013, de 24-07, na redacção vigente à data dos factos; prisão de 1 (um) ano a 5 (cinco) anos ou multa de 10 a 600 dias (cf. arts. 41°, n.° 1 e 47°, n.° 1, ambos do Código Penal).
Não obstante as molduras penais abstractas aplicáveis ao crime de sequestro na forma simples e ao crime de detenção de arma proibida preverem, em alternativa, pena de prisão ou pena de multa, as exigências irremediáveis de tutela do ordenamento jurídico e as acentuadas necessidades de prevenção especial, excluem a opção por pena não detentiva.
Quanto à determinação da medida concreta da pena, de acordo com o disposto no n.° 1 do art. 71° do Código Penal, far-se-á em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, quer geral positiva ou de reintegração, relacionadas com a necessidade de tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto e com a estabilização das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma infringida, quer de prevenção especial de sociabilização.
Com relevância quer para a culpa quer para a prevenção, surgem as circunstâncias enunciadas no n.° 2 do art. 71° do Código Penal que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele, nomeadamente, o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências; a intensidade do dolo; as condições pessoais do agente e a sua situação económica e, a conduta anterior ao facto e a posterior a este.
Aplicando as considerações anteriormente formuladas ao caso em apreço, considerando nomeadamente:
- as elevadas necessidades de prevenção geral, sendo os crimes praticados pelos arguidos geradores de grande insegurança e alarme social e objecto de elevada reprovação social, tendo em particular os crimes de violação, sequestro e homicídio consequências extremas nas vítimas.
- o grau de ilicitude dos factos praticados pelo arguido R________ no que respeita ao crime de violação, que se considera extremamente elevado, tendo em conta, nomeadamente, a intensidade da violência física e psicológica utilizada no modo de cometimento do crime, de que são reflexo as lesões sofridas pela ofendida, ilicitude agravada pelo facto de os actos ilícitos criminais terem sido praticados pelo arguido na residência da ofendida, reduto de privacidade e segurança da mesma, onde entrou de forma ilegítima, denotando o modo de execução do crime um total desprezo pela dignidade humana alheia, infligindo um sofrimento físico e uma violência psicológica extremas na ofendida, manietando-a de modo a anular qualquer reacção por parte da mesma, revelando uma total insensibilidade pelos valores ético-jurídicos protegidos pela norma incriminadora, um total desrespeito pela liberdade sexual, integridade física e psicológica alheias, e indiferença pelas consequências físicas e psicológicas causadas na ofendida com a sua actuação, de que é reflexo o comportamento posterior do mesmo, deixando a ofendida nua, apenas coberta por uma manta.
- o grau de ilicitude dos factos praticados pelo arguido R________ em 3007-2019, no que respeita ao crime de roubo, e pelos arguidos BMPC________ e R________ em 13-08-2019, no que respeita ao crime de roubo e ao crime de sequestro, que se considera elevado, tendo em conta o modo de cometimento dos crimes.
- o grau de ilicitude dos factos praticados pelos arguidos em co-autoria material em 25-08-2019, que se considera extremamente elevado quanto aos crimes de roubo, sequestro agravado, homicídio qualificado, na forma consumada, e homicídio qualificado, na forma tentada, revelador de uma energia criminosa intensa, denotando o modo de actuação dos arguidos um total desprezo pela vida, integridade física e psíquica e dignidade humana alheias, infligindo um sofrimento físico e uma violência psicológica extrema nos ofendidos, aproveitando-se os arguidos do facto de o ofendido conhecer o arguido BMPC________, que tinha trabalhado para aquele, tendo a entrada ilegítima na habitação ocorrido mediante o ardil criado pelos arguidos, sob pretexto de uma situação de necessidade de auxílio, levando dessa forma o ofendido a abrir a porta, de madrugada, disposto a ajudar, a intensidade da violência física utilizada no modo de cometimento dos crimes, de que são reflexo as graves lesões sofridas pelo ofendido, denotadoras de uma violência extrema no modo como o mesmo foi agredido, em particular na zona da cabeça, que se encontrava desfigurada, com golpes profundos, o modo como os ofendidos estiveram manietados durante todo o tempo em que estiveram privados de liberdade, a frieza reflectida no modo de execução do crime de homicídio qualificado, na forma tentada, revelando os arguidos um profundo desprezo e indiferença pela vida humana, perante o interesse prevalecente de facilitarem a fuga e encobrirem os crimes praticados pelos mesmos, sendo as suas condutas reveladoras de uma audácia e energia criminosa intensa, que não sofreu qualquer abrandamento, culminando na fuga dos arguidos.
- o grau de ilicitude dos factos praticados pelos arguidos no que respeita ao crime de detenção de arma proibida, que se considera elevado, tendo em conta as circunstâncias em que os arguidos entraram na posse da arma de fogo, a qual não se limitaram a deter, utilizando-a pela forma supra descrita.
- a intensidade dolosa, tendo todos os crimes sido cometidos na modalidade de dolo directo.
- as consequências físicas e psicológicas que resultaram para os ofendidos FO______ e IB______ em consequência da actuação dos arguidos, de que são reflexo as lesões sofridas pelos mesmos, o intenso sofrimento físico, moral e psíquico a que estiveram sujeitos, temendo pela própria vida, deixando na ofendida profundas sequelas pós-traumáticas que ainda perduram.
- as consequências patrimoniais em consequência da actuação dos arguidos, tendo em conta os objectos e quantia monetária subtraídas, não tendo esta sido recuperada.
- não obstante a admissão parcial dos factos, a ausência de demonstração sincera de arrependimento e interiorização do desvalor das respectivas condutas por parte dos arguidos, limitando-se os mesmos a verbalizar arrependimento, sem qualquer ressonância afectiva.
- não obstante a ausência de antecedentes criminais, as características de personalidade dos arguidos, nomeadamente a frieza, ausência de ressonância afectiva, e dificuldades ao nível das capacidades de pensamento crítico e consequencial, reclamando maiores exigências ao nível da prevenção especial.
- as condições sociais dos arguidos.
Afiguram-se assim adequadas a aplicação aos arguidos das seguintes penas:
1 - Ao arguido BMPC________:
 - pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal, cometido em 1308-2019, a pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de sequestro, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n.° 1 do Código Penal, cometido em 1308-2019, a pena de 6 (seis) meses de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo agravado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 210°, n°s. 1 e 2, als. a) e b), com referência ao art. 204°, n°s. 1, als. e) e f) e 2, al. f), ambos do Código Penal, cometido em 25-082019 (em que é ofendido   FO____), a pena de 5 (cinco) anos de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal (desagravado em razão do valor diminuto), cometido em 25-08-2019 (em que é ofendida IB____), a pena de 3 (três) anos de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n°s. 1 e 2, als. b) e e) do Código Penal, cometido em 25-08-2019 (em que é ofendido   FO____), a pena de 3 (três) anos de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n°s. 1 e 2, al. b) do Código Penal, cometido em 25-08-2019 (em que é ofendida IB____), a pena de 3 (três) anos de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 131° e 132°, n°s. 1 e 2, als. c) e g), ambos do Código Penal, cometido em 25-08-2019 (em que é ofendido   FO____), a pena de 22 (vinte e dois) anos de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelos arts. 131°, 132°, n°s. 1 e 2, al. g), 22° e 23°, todos do Código Penal, com a agravação prevista no art. 86°, n.° 3 do Novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.° 5/2006, de 2302, na redacção da Lei n.° 17/2009, de 06-05, cometido em 25-08-2019 (em que é ofendida IB____), a pena de 15 (quinze) anos e 6 (seis) meses de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art. 86°, n.° 1, al. c) do Novo Regime Jurídico das Armas e Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.° 5/2006, de 23-02, com as alterações introduzidas pelas Leis n.° 59/2007, de 04-09, n.° 17/2009, de 06-05, n.° 26/2010, de 30-08, n.° 12/2011, de 27-04, e n.° 50/2013, de 24-07, na redacção vigente à data dos factos, a pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão.
Operando o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido, de acordo com os critérios consagrados no art. 77° do Código Penal, tendo como limite mínimo a pena mais elevada das penas concretamente aplicadas (22 anos de prisão) e como limite máximo a pena de 25 anos de prisão, uma vez que a soma das penas concretamente aplicadas (55 anos e 11 meses) ultrapassa tal limite, tendo em conta a valoração global dos factos (revelando a imagem global dos factos uma actuação acentuadamente desvaliosa, fria e especialmente censurável) conjuntamente com a personalidade do arguido nos termos mencionados, considera-se adequada a aplicação ao arguido BMPC________ da pena única de 25 (vinte e cinco) anos de prisão.
*
2 - Ao arguido R________   :
- pela prática, em autoria material, de um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal (desagravado em razão do valor diminuto), cometido em 30-07-2019, a pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal, cometido em 1308-2019, a pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de sequestro, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n.° 1 do Código Penal, cometido em 1308-2019, a pena de 6 (seis) meses de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo agravado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 210°, n°s. 1 e 2, als. a) e b), com referência ao art. 204°, n°s. 1, als. e) e f) e 2, al. f), ambos do Código Penal, cometido em 25-082019 (em que é ofendido   FO____), a pena de 5 (cinco) anos de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 210°, n.° 1 do Código Penal (desagravado em razão do valor diminuto), cometido em 25-08-2019 (em que é ofendida IB____), a pena de 3 (três) anos de prisão.
- pela prática, em autoria material, de um crime de violação, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 164°, n.° 1, al. a) do Código Penal, na redacção vigente à data dos factos, cometido em 25-08-2019, a pena de 5 (cinco) anos de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n°s. 1 e 2, als. b) e e) do Código Penal, cometido em 25-08-2019 (em que é ofendido   FO____), a pena de 3 (três) anos de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de sequestro agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 158°, n°s. 1 e 2, al. b) do Código Penal, cometido em 25-08-2019 (em que é ofendida IB____), a pena de 3 (três) anos de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado, na forma consumada, previsto e punido pelos arts. 131° e 132°, n°s. 1 e 2, als. c) e g), ambos do Código Penal, cometido em 25-08-2019 (em que é ofendido   FO____), a pena de 22 (vinte e dois) anos de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelos arts. 131°, 132°, n°s. 1 e 2, al. g), 22° e 23°, todos do Código Penal, com a agravação prevista no art. 86°, n.° 3 do Novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.° 5/2006, de 2302, na redacção da Lei n.° 17/2009, de 06-05, cometido em 25-08-2019 (em que é ofendida IB____), a pena de 15 (quinze) anos e 6 (seis) meses de prisão.
- pela prática, em co-autoria material, de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art. 86°, n.° 1, al. c) do Novo Regime Jurídico das Armas e Munições (NRJAM), aprovado pela Lei n.° 5/2006, de 23-02, com as alterações introduzidas pelas Leis n.° 59/2007, de 04-09, n.° 17/2009, de 06-05, n.° 26/2010, de 30-08, n.° 12/2011, de 27-04, e n.° 50/2013, de 24-07, na redacção vigente à data dos factos, a pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão.
Operando o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido, de acordo com os critérios consagrados no art. 77° do Código Penal, tendo como limite mínimo a pena mais elevada das penas concretamente aplicadas (22 anos de prisão) e como limite máximo a pena de 25 anos de prisão, uma vez que a soma das penas concretamente aplicadas (62 anos e 8 meses) ultrapassa tal limite, tendo em conta a valoração global dos factos (revelando a imagem global dos factos uma actuação acentuadamente desvaliosa, fria e especialmente censurável) conjuntamente com a personalidade d arguido nos termos mencionados, considera-se adequada a aplicação ao arguido R________ da pena única de 25 (vinte e cinco) anos de prisão.
Serão as penas aplicadas demasiado severas tendo em conta as circunstâncias relativas à execução dos crimes e as relativas às pessoas dos arguidos e suas particularidades familiares, sociais e culturais?
É sabido que o Direito Penal protege os bens jurídicos mais importantes na sociedade, punindo os comportamentos desconformes com o dever ser jurídico com maior ou menor severidade consoante a relevância ou importância do bem jurídico protegido pela norma e violado pelo comportamento ilícito, típico e culposo. Deste modo, as penas previstas para os diversos comportamentos típicos criminais visam proteger os bens jurídicos que se encontram na base da norma incriminadora, sem que, no entanto, o agente seja esquecido porquanto a culpa constitui sempre o limite da pena. Pretende a lei que a pena alcance estes dois objetivos: proteja a sociedade, através da proteção dos bens jurídicos essenciais, e (re)socialize o agente do crime (art.º 40.º do CP).
“A partir de 1 de Outubro de 1995 foram alterados os dados do problema, passando a pena a servir finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial, assumindo a culpa um papel meramente limitador da pena.
A terceira alteração ao Código Penal operada pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, entrado em vigor em 1 de Outubro seguinte, proclamou a necessidade, proporcionalidade e adequação como princípios orientadores que devem presidir à determinação da pena aplicável à violação de um bem jurídico fundamental, introduzindo a inovação, com feição pragmática e utilitária, constante do artigo 40.º, ao consagrar que a finalidade a prosseguir com as penas e medidas de segurança é «a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade», ou seja, a reinserção social do agente do crime, o seu retorno ao tecido social lesado.
Com esta reformulação do Código Penal, como se explica no preâmbulo do diploma, não prescindiu o legislador de oferecer aos tribunais critérios seguros e objectivos de individualização da pena, quer na escolha, quer na dosimetria, sempre no pressuposto irrenunciável, de matriz constitucional, de que em caso algum a pena pode ultrapassar a culpa, dispondo o n.º 2 que «Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa».
Em consonância com estes princípios dispõe o artigo 71.º, n.º 1, que “a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”; o n.º 2 elenca, a título exemplificativo, algumas das circunstâncias, agravantes e atenuantes, a atender na determinação concreta da pena, dispondo o n.º 3, que na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena, injunção com concretização adjectiva no artigo 375.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, ao prescrever que a sentença condenatória especifica os fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada. (Em sede de processo decisório, a regulamentação respeitante à determinação da pena tem tratamento autónomo relativamente à questão da determinação da culpabilidade, sendo esta tratada no artigo 368.º, e aquela prevista no artigo 369.º, com eventual apelo aos artigos 370.º e 371.º do CPP).
(..) Jorge Figueiredo Dias, em Temas Básicos da Doutrina Penal, ... Editora, 2001, no tema Fundamento, Sentido e Finalidades da Pena Criminal, págs. 65 a 111, diz que o legislador de 1995 assumiu, precipitando no artigo 40.º do Código Penal, os princípios ínsitos no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa (princípios da necessidade da pena e da proporcionalidade ou da proibição do excesso) e o percurso doutrinário, resumindo assim a teoria penal defendida:
1) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial.
2) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa.
3) Dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico.
4) Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais.
No dizer de Fernanda Palma, in “As Alterações Reformadoras da Parte Geral do Código Penal na Revisão de 1995: Desmantelamento, Reforço e Paralisia da Sociedade Punitiva”, nas “Jornadas sobre a Revisão do Código Penal”, edição de 1998, da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa – AAFDL –, pág. 25, «a protecção de bens jurídicos implica a utilização da pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos (prevenção geral negativa), incentivar a convicção de que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte dos cidadãos (prevenção geral positiva). A protecção de bens jurídicos significa ainda prevenção especial como dissuasão do próprio delinquente potencial».
Américo A. Taipa de Carvalho, em Prevenção, Culpa e Pena, no Liber Discipulorum para Jorge Figueiredo Dias, ... Editora, 2003, pág. 322, afirma resultar do actual artigo 40.º que o fundamento legitimador da aplicação de uma pena é a prevenção, geral e especial, e que a culpa do infractor apenas desempenha o (importante) papel de pressuposto (conditio sine qua non) e de limite máximo da pena a aplicar por maiores que sejam as exigências sociais de prevenção.
Está subjacente ao artigo 40.º uma concepção preventivo-ética da pena. Preventiva, na medida em que o fim legitimador da pena é a prevenção; ética, uma vez que tal fim preventivo está condicionado e limitado pela exigência da culpa” (Raul Borges, Ac. do STJ de 12-07-2018, Proc. n.º 116/15.9JACBR.C1.S1, disponível em www.dgsi.pt)
Significa assim que a prevenção geral tem de se traduzir em prevenção positiva, de integração, ressocializadora e de reforço da consciência jurídica comunitária, do seu sentimento de segurança e força da lei face à sua violação, e a prevenção especial, enquanto relacionada com o agente do crime, materializa-se e há-de ser adequada a exercer a sua função (re)socializadora.
No caso concreto, o tribunal a quo ponderou e observou, na determinação da pena a aplicar aos arguidos e relativamente a cada um dos crimes por eles cometidos, o disposto no art.º 71.º do Cód. Penal, não se verificando, ao contrário do defendido pelos arguidos, que as penas aplicadas sejam excessivas. Os crimes praticados, especialmente o modo como os arguidos os praticaram e os sentimentos revelados nessa execução, impõem a conclusão, quer em termos de ilicitude quer especialmente de culpa, limitadora da pena, nos exatos termos retirada pela primeira instância e por conseguinte a aplicação quer das penas parcelares quer da pena única como o foram.
Nestes termos improcede igualmente esta parte do recurso.
*
IV - Decisão:
Pelo exposto, acorda-se nesta Relação de Lisboa, em:
Julgar NÃO PROVIDO o recurso interposto por R________ e BMPC________   , mantendo-se na íntegra a decisão recorrida.
- Custas pelos arguidos recorrentes, fixando-se em 5 UC’s a taxa de justiça.

Lisboa, 4 de novembro de 2020
Processado e revisto pela relatora (art.º 94º, nº 2 do CPP).
Maria Gomes Bernardo Perquilhas
Cristina Almeida e Sousa
_______________________________________________________
[1] Acs. do STJ de 16.11.95, de 31.01.96 e de 24.03.99, respectivamente, nos BMJ 451° - 279 e 453° - 338, e  na Col Acs. do STJ, Ano VII, Tomo 1, pág. 247 o Ac do STJ de 3/2/99 (in BMJ nº 484, pág. 271);  o Ac do STJ de 25/6/98 (in BMJ nº 478, pág. 242); o Ac do STJ de 13/5/98 (in BMJ nº 477, pág. 263);
SIMAS SANTOS/LEAL HENRIQUES, in Recursos em Processo Penal, p. 48; SILVA, GERMANO MARQUES DA 2ª edição, 2000 Curso de Processo Penal”, vol. III, p. 335;
RODRIGUES, JOSÉ NARCISO DA CUNHA, (1988), p. 387 “Recursos”, Jornadas de Direito Processual Penal/O Novo Código de  Processo Penal”, p. 387 DOS REIS, ALBERTO, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pp. 362-363. 
[2] O arguido R________ na pág. 4 da sua peça recursiva e na conclusão II, e o arguido BMPC________ na pág. 15 da sua peça de recurso e nas conclusões w), rr).
[3] O erro de julgamento capaz de conduzir à modificação da matéria de facto pelo Tribunal de recurso, nos termos dos artigos 412º, nº 3 e 431º, alínea b), ambos do Código de Processo Penal, reporta-se, normalmente, às seguintes situações:
- o Tribunal a quo dar como provado um facto com base no depoimento de uma testemunha e a mesma nada declarou sobre o facto;
- ausência de qualquer prova sobre o facto dado por provado;
- prova de um facto com base em depoimento de testemunha sem razão de ciência da mesma que permita a prova do mesmo;
- prova de um facto com base em provas insuficientes ou não bastantes para prova desse mesmo facto, nomeadamente com violação das regras de prova;
- e todas as demais situações em que do texto da decisão e da prova concretamente elencada na mesma e questionada especificadamente no recurso e resulta da audição do registo áudio, se permite concluir, fora do contexto da livre convicção, que o tribunal errou, de forma flagrante, no julgamento da matéria de facto em função das provas produzidas.
II. A diferente valoração da prova não se confunde com o erro de julgamento ou com qualquer dos vícios do artigo 410º, nº 2 do Código de Processo Penal.
[4] Como se esclareceu no Ac. STJ de 15/09/2010, proc. n.º 173/05.6GBSTC.E1.S1, Relator  Fróis: O erro de julgamento da matéria de facto existe quando o tribunal dá como provado certo facto relativamente ao qual não foi feita prova bastante e que, por isso, deveria ser considerado não provado, ou então, o inverso e tem a ver com a apreciação da prova produzida em audiência em conexão com o princípio da livre apreciação da prova, constante do art. 127.º do CPP.
XII - Os vícios do nº 2 do art. 410.º do CPP são de lógica jurídica ao nível da matéria de facto, que tornam impossível uma decisão logicamente correcta e conforme à lei. Os vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP, nomeadamente o erro notório na apreciação da prova, não podem ser confundidos com a insuficiência de prova para a decisão de facto proferida ou com a divergência entre a convicção pessoal do recorrente sobre a prova produzida em audiência e a convicção que o tribunal firme sobre os factos, questões do âmbito da livre apreciação da prova, princípio inscrito no citado normativo – art. 127.º do CPP.
XIII - Não incidindo o recurso sobre prova documentada nem se estando perante prova legal ou tarifada, não se pode sindicar a boa ou má valoração daquela, e querer discutir, nessas condições, a valoração da prova produzida é afinal querer impugnar a convicção do tribunal, esquecendo a citada regra. Neste aspecto, o que releva, necessariamente, é a convicção formada pelo tribunal, sendo irrelevante, no âmbito da ponderação exigida pela função de controlo ínsita na identificação dos vícios do art. 410.º, n.º 2, do CPP, a convicção pessoalmente alcançada pelo recorrente sobre os factos.
XIV - O erro-vício não se confunde com errada apreciação e valoração das provas. Embora em ambos se esteja no domínio da sindicância da matéria de facto, são muito diferentes na sua estrutura, alcance e consequências. Aquele examina-se, indaga-se, através da análise do texto; esta, porque se reconduz a erro de julgamento da matéria de facto, verifica-se em momento anterior à elaboração do texto, na ponderação conjugada e exame crítico das provas produzidas do que resulta a formulação de um juízo, que conduz à fixação de uma determinada verdade histórica que é vertida no texto; daí que a exigência de notoriedade do vício não se estenda ao processo cognoscitivo/valorativo, cujo resultado vem a ser inscrito no texto.
[5] Sublinhado nosso.
[6] Ac. STJ de 15/09/2010, proc. n.º 173/05.6GBSTC.E1.S1, Relator  Fróis.
[7] Negrito nosso.
[8] Mutilação genital feminina (144.º-A CP), tráfico de órgãos humanos (144.º-B CP).