Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2402/23.5T8ALM-A.L1-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO
CONCLUSÕES
CHEQUE
PRESCRIÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
QUIRÓGRAFO
JUROS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: da responsabilidade do Relator
I- Como se colhe do AUJ 12/2023 de 14/11, publicado no DR 220/2023 série I de 14/11/2023, o recorrente não está onerado com a indicação da decisão alternativa nas conclusões das alegações de recurso, mas está seguramente onerado com a indicação nas conclusões das alegações de recurso dos concretos pontos de facto da decisão recorrida que no seu entender estão incorrectamente julgados e terá de o fazer nas conclusões das alegações de recurso que não apenas no corpo das alegações sabido que é que nas conclusões de recuso o recorrente pode restringir o objecto do recurso indicado no corpo não sendo de atender a indicação feita no corpo das alegações sem reflexo nas conclusões, como é jurisprudência do Supremo que se crê unânime
II- Tendo o exequente cumprido o seu ónus da alegação da relação jurídica causal à emissão dos cheques prescritos com expressão na matéria de facto dada como provada, não logrando o executado provar a inexistência dessa relação causal goza o exequente da presunção do art.º 458 do CCiv, e constitui título de crédito exequível nos termos do art.º 703, 729/a.
III- O cheque (de 20.000€), não apresentado a pagamento, que está a servir de título executivo como quirógrafo, não consubstanciava a promessa de pagamento do montante nele escrito em data certa, o exequente não demonstrou a interpelação para o pagamento dessa quantia, logo não há título quanto a juros vencidos, não podendo a execução prosseguir quanto a juros, excepto quanto àqueles que se venceram depois da citação da executada para a execução, que vale como interpelação (art.º 805/1 do CCiv).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: RELATÓRIO
APELANTE/ EXECUTADA: A …
/EXEQUENTE: B …
Com os sinais dos autos.
Valor dos embargos: 55.148,97 euros (despacho saneador de 20/11/2023)
I.1. Inconformada com a sentença de 13/12/2023 que, julgando os embargos à execução parcialmente procedentes e extinta a execução quanto aos valores de 5.220 euros e 1.500 euros, e dos juros de mora vencidos sobre estes valores, prosseguindo a execução quanto ao restante, com custas na proporção do decaimento dela apelou a executada em cujas alegações conclui em suma:
1.º As declarações do exequente, gravadas na audiência de julgamento minutos 45,46,51,52, 1 hora e 8 minutos e 1 hora e 12 minutos permitem considerar como provado que o exequente tinha plena consciência que em virtude de a executada ser viúva, e de ser titular de uma conta conjunta na Caixa Geral de depósitos, que os cheques que tinha na sua posse, nunca poderiam ser descontados em virtude de serem cheques irregulares.
2.º O exequente não provou em qualquer momento ser proprietário de um recheio do restaurante “O Convite “, nunca exibiu documentos que comprovem a compra, nem existe uma relação descrita do mesmo.
3.º O exequente refere na gravação da audiência de julgamento, minutos 44/45, que em vez do pagamento de uma renda mensal no valor de 800,00€ acordou com a executada o pagamento de uma renda no valor de 500,00€, se a mesma adquirisse o recheio do restaurante, confirmando que foi esse o acordo estabelecido.
4- Então se o acordo estabelecido para a compra do recheio foi no valor de 20.000,00€, em que incluía o pagamento de uma renda mensal de 500,00€, qual a justificação para exigir o pagamento de duas rendas no valor de 800,00€ cada, conforme documento que juntou nos autos.
5.º Mais, o exequente não provou em Tribunal, que a executada foi notificada para proceder ao pagamento de qualquer divida, reconhecendo até que a mesma mudou de residência, pelo que não lhe poderão ser exigidos juros de mora.
6.º Certamente, que a matéria que consta nos autos poderia ser apreciada num foro de outra natureza, que o exequente não abriu mão, preferindo avançar para um método pouco convincente.
Nestes termos e nos melhores de Direito ao caso aplicáveis que os/as Srs./as. Juízes Desembargadores
dessa Relação adequadamente suprirão, deve ser concedido integral provimento ao presente recurso de apelação, revogando a decisão proferida pelo Juiz 3- Juízo de Execução de Almada do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa
I.2. Em contra-alegações a exequente conclui, que não padece assim de qualquer vício a douta decisão, devendo a mesma ser mantida nos seus precisos termos prosseguindo a execução,
I.3. Nada obsta ao conhecimento do recurso.
I.4. Questões a resolver em razão das conclusões de recurso
a) Saber se “As declarações do exequente, gravadas na audiência de julgamento minutos 45,46,51,52, 1 hora e 8 minutos e 1 hora e 12 minutos permitem considerar como provado que o exequente tinha plena consciência que em virtude de a executada ser viúva, e de ser titular de uma conta conjunta na Caixa Geral de depósitos, que os cheques que tinha na sua posse, nunca poderiam ser descontados em virtude de serem cheques irregulares; o exequente não provou em qualquer momento ser proprietário de um recheio do restaurante “O Convite”; o exequente refere na gravação da audiência de julgamento, minutos 44/45, que em vez do pagamento de uma renda mensal no valor de 800,00€ acordou com a executada o pagamento de uma renda no valor de 500,00€, se a mesma adquirisse o recheio do restaurante, confirmando que foi esse o acordo estabelecido”;
b) Saber se, tendo o acordo sido estabelecido para a compra do recheio no valor de 20.000,00€, em que incluía o pagamento de uma renda mensal de 500,00€, qual a justificação para exigir o pagamento de duas rendas no valor de 800,00€ cada, não tendo o exequente provado em Tribunal, que a executada foi notificada para proceder ao pagamento de qualquer divida, reconhecendo até que a mesma mudou de residência, pelo que não lhe poderão ser exigidos juros de mora.

II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.1. O Tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos que a apelante não impugna nos termos da lei de processo:
1. A embargante assinou e entregou ao embargado três “cheques” da CGD, onde constam, na parte superior, o nome de “C …”, as datas de “03-12- 2008”, “à ordem de B …”, e, em cada um deles, os valores respectivos de “20.000 euros”, de “1.500 euros” e de “5.220 euros”, cujo originais estão juntos aos autos de execução e se dão por reproduzidos.
2. O cheque de 20.000 euros destinou-se ao pagamento do preço de equipamento de restaurante vendido pelo embargado à embargante.
3. Os cheques não foram apresentados a pagamento.
4. À data de 03 de Dezembro de 2008 (data da emissão dos cheques), C … já tinha morrido e, em vida, com a embargante, co-titulavam conta da CGD com que se relacionavam aqueles cheques.
II.2 Deu como não provados os seguintes factos:
Os cheques de 1.500 e de 5.220 euros destinaram-se ao pagamento do preço de equipamento de restaurante vendido pelo embargado à embargante.
II.2. Esta ainda documentado nos autos com interesse o seguinte:
- O exequente apresentou requerimento executivo contra a executada para pagamento de quantia certa onde alega que no âmbito de relações comerciais entre o exequente e a executada, a mesma entregou 3 (três) cheques em 03/12/2008 respetivamente cheque n.º … no valor de 20.000,00 euros (vinte mil euros), cheque n.º … no valor de 1.500,00 euros (mil e quinhentos euros), e cheque n.º … no valor de 5.220,00 euros (cinco mil e duzentos e vinte euros). Os referidos cheques destinavam-se a pagamento de equipamento de restauração referente ao restaurante "Restaurante Convite" do qual o exequente era proprietário, e a executada explorava no âmbito da sua atividade comercial. Como prova da quantia titulada nos cheques a executada fez acompanhar declaração que justificava e emissão dos referidos cheques. Até ao momento, não obstante, a executada ter sido interpelada para o pagamento da quantia titulada nos cheques, a mesma não pagou qualquer valor. Vem assim, o exequente requerer o pagamento da quantia titulada nos referidos cheques, acrescida de juros à taxa legal comercial desde 03/12/2008 até integral pagamento.
- Nos embargos a executada pugna pela prescrição do título cambiário e por inexistir relação jurídica subjacente ao mesmo ou caso assim se não entenda a improcedência do requerimento executivo por falta de prova ser considerar a não execução contra si e ainda a condenação do exequente pro abuso de direito na indemnização de 2.500,00 euros em suma alegando que Entre setembro de 2008 e princípio de 2009, a executada, juntamente com o seu filho C …, explorou o restaurante “O Convite”, em Casal …, no concelho de Seixal. Durante esse período, a executada, desempenhou a função de cozinheira, procedendo diariamente à compra dos bens essenciais para o funcionamento do restaurante a mesma, já antes lá trabalhava, como cozinheira, durante a anterior exploração do restaurante quando iniciou a gestão do restaurante, o mesmo encontra-se desprovido praticamente de todo o recheio, mantendo apenas alguns equipamentos e umas parcas 8 a 10 mesas com cadeiras. O valor da renda a pagar ao intitulado dono do restaurante, de nome B …, era mensalmente de 500 Euros. A executada, quando terminou o contrato de arrendamento comercial, que nunca foi redigido a escrito, não  tinha rendas em atraso, e deixou todo o recheio do restaurante que recepcionou aquando do início do seu contrato nunca foi interpelada quer por escrito para proceder ao pagamento de qualquer quantia solicitada por B … a única relação comercial existente a executada e a exequente foi o pagamento da renda mensal, que a mesma sempre liquidou a tempo, apesar de ter assinado um documento, em que declarou que o cheque n.º …, era dado como garantia e para pagamento do equipamento da restauração existente no interior do restaurante “ O Convite “, a executada acabou por não adquirir qualquer parte do recheio ou equipamento, em virtude de ter cessado a exploração, logo no inicio de 2009, a exequente junta em anexo, cópia de um cheque, com o número …, o qual não corresponde ao que está identificado na declaração em anexo, com o número …, a executada sempre fez as compras para o restaurante, quando cessou a exploração do restaurante “ O Convite “, não retirou qualquer equipamento afeto ao restaurante, porque nunca o adquiriu. Vem dolosamente e com má-fé o exequente solicitar o pagamento de tais verbas, passados 15 anos, sem nunca ter interpelado a executada para o fazer, nem a mesma tem conhecimento de qualquer tentativa de desconto dos cheques na Caixa Geral de Depósitos o portador do cheque não é o portador legítimo, pois adquiriu-os de má fé. O portador do cheque nunca instruiu o Banco sacado a pagar-lhe o cheque, pois sabia que não podia, nem os cheques foram devolvidos pela Câmara de compensação do Banco de Portugal, nem os cheques constantes no requerimento executivo, serviram de pagamento de quaisquer bens ou rendas, não existe nenhuma relação subjacente à relação cartular incorporada no cheque. Todas as importâncias mutuadas foram pagas ao exequente, pelo que este devia ter devolvidos os cheques à executada. Nem a executada é a  titular do cheque, pois como consta dos autos, o titular original dos cheques era o falecido marido da executada, C … a sucede que o marido da executada já tinha falecido sensivelmente há 4 anos antes da data da emissão dos três cheques pelo que os cheques passaram a assumir carácter ilegal, não podendo vincular o sacador, sendo a sua colocação em circulação, sem conhecimento do sacador, ilícita, também o exequente ultrapassou o prazo previsto no artigo 29.º da Lei Uniforme dos cheques, para a sua utilização como título cambiário, e também, o próprio prazo de validade do cheque; o exequente não alega no requerimento executivo, em obediência ao estatuído na alínea c) do art.º 703.º do CPC “os factos essenciais, constitutivos da relação causal subjacente à emissão do título. O exequente ao reclamar o pagamento de tais cheques, está a actuar de má-fé, com pelo menos negligência grave, sabendo que as quantias nele tituladas não são devidas.
- Em resposta em suma diz a exequente que a Opoente/Executada aceita no articulado 2 da sua Oposição, que juntamente com o seu filho C …, explorou o restaurante “O Convite”, e no Casal do Marco, e que durante esse período desempenhou as funções de cozinheira, procedendo à compra de bens essenciais para o funcionamento do restaurante e que já antes trabalhava como cozinheira durante a anterior exploração, o Contestante/Embargado era à data dos factos dono e legítimo proprietário do imóvel a que corresponde a Loja onde estava a funcionar o Restaurante “O Convite”, que se encontrava arrendado pelo valor mensal de 875,00€ (oitocentos e setenta e cinco euros) e estavam a explorar o estabelecimento a D. D … e o marido estando incluído neste valor o arrendamento e o equipamento, os anteriores exploradores do restaurante “O Convite” deixaram de pagar as rendas no valor já acima indicado, o agora Opoente/Embargante para resolver a situação, chegou a acordo com o referido casal que acordou em entregar o estabelecimento desde que fosse pago o valor do recheio, designadamente dos móveis e equipamentos que compunham o restaurante no valor de 5.000,00 (cinco mil euros). O Contestante/Embargado porque já conhecia a Embargante, que já trabalhava na anterior exploração e considerava-a uma boa profissional, acordou com a mesma de continuar no restaurante como cozinheira com duas condições: a) mediante o pagamento mensal de 500,00€ (quinhentos euros), nos primeiros seis meses passando a oitocentos euros se o contrato fosse renovado decorrido aquele prazo, sendo posteriormente atualizada de acordo com os coeficientes legais que vigorassem para os arrendamentos comerciais b) pagamento do valor da compra do equipamento do restaurante no valor de 20.000,00€ (vinte mil euros) ficar responsável pelo pagamento de 5.000,00€ (cinco mil euros) do recheio aos anteriores exploradores, contra a entrega imediata das chaves pelos últimos. E, ao contrário do invocado pela Embargante/Opoente, foi outorgado Contrato de Arrendamento, entre o Embargado/Contestante, o filho da Embargante C …, e a Embargante/Opoente, em 1 de setembro de 2008, conforme doc., que junta e se dá por reproduzido com as condições previamente acordadas conforme o vertido no articulado anterior, em que ficou considerado expressamente que última assumiu expressamente a sua condição de fiadora e principal pagadora das rendas referentes ao restaurante “O Convite”. O Embargado para ajudar a Embargante ia com a mesma fazer compras para o restaurante, adiantando o valor de 5.220,00€ (cinco mil duzentos e vinte euros) que a mesma nunca liquidou, tendo para o efeito reconhecido tal dívida com a respetiva declaração e entrega do cheque no valor de 5.220,00€ (cinco mil duzentos e vinte euros) porque nunca tinha disponibilidade financeira para adquirir os bens e mercadorias para o expediente diário. A Embargante alegava ter dificuldades económicas e ia adiando o pagamento do valor do recheio e equipamento e das rendas mensais, com promessas que tinha uma conta conjunta com o falecido marido, e que por óbito do mesmo, a conta se encontrava bloqueada, mas que garantia o pagamento dos valores acordado pelos cheques que tinha em seu poder da referida conta conjunto com o seu falecido marido. O Embargado dado que já tinha entregue o estabelecimento à Embargante e a mesma já se encontrava à frente do mesmo, e era fiadora no referido contrato, acabou por aceitar a entrega dos cheques com a correspondente declaração de dívida para que a Embargante cumprisse com a sua palavra. Foi enviada carta para o seu filho C … em 1 de setembro de 2009 comunicando a anulação do contrato por falta de pagamento de rendas, e solicitando a entrega das chaves até 26/09/2009, conforme doc. que se junta e se dá por reproduzido. Conforme se pode constatar da leitura do contrato o mesmo constava como arrendatário, tendo a Embargante perfeito conhecimento de tal comunicação e tendo o seu filho outorgado procuração a favor da última para tratar de todos os assuntos referentes ao estabelecimento comercial que explorava conforme doc. que se junta e se dá por reproduzido. A Embargante encontrava-se à frente do estabelecimento e tinha ficado responsável pelo valor de 5.000,00€ (cinco mil euros) referente ao mobiliário e equipamento cujo valor não pagou ao Embargado que acabou por assumir tal dívida por processo que correu os seus trâmites no Tribunal do Seixal, movida pelo anterior casal que explorava o estabelecimento. Não cumprindo assim nem com tal pagamento nem com o pagamento das rendas que se vinham acumulando. Em 27/3/2009 é assinado pela Embargante o reconhecimento dos valores em dívida àquela data, designadamente das dívidas da mesma com a relação dos cheques entregues, no valor de 27.220,00€ (vinte sete mil e duzentos e vinte euros) conforme documento que se junta e se dá por reproduzido para todos os efeitos legais, constando da referida dívida os cheques agora dados à execução e devidamente acompanhados com a declaração de dívida assinada pela Embargante, que reconheceu expressamente os valores em dívida. Relativamente ao articulado 14 da Oposição, o embargado não teve qualquer intenção de juntar uma declaração com o n.º de cheque que não coincide na totalidade com o n.º de cheque junto na referida declaração, certamente por lapso de escrita. Quanto à questão da devolução dos cheques pelo banco o Embargado não os colocou a pedido da Embargante que conforme já foi enunciado nesta peça referiu que estava à espera de desbloquear a conta que tinha com o seu falecido marido para proceder ao pagamento. De acordo com o art.º 703.º, do CPC, n. 1, alínea c), são títulos de crédito ainda que meros quirógrafos desde que neste caso os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento, ou seja, o alegado no título executivo. O Exequente moveu a presente execução com base em documentos que provam a relação comercial com a executada, os cheques mostram-se assinados e preenchidos pela mesma, bem como as declarações de dívida juntas com os referidos cheques. Ao contrário da Executada que refere que não existia Contrato de Arrendamento nem adquiriu equipamento, nem mercadorias, o Embargado juntou os respetivos documentos. Não juntando qualquer comprovativo de pagamento de qualquer uma delas, é assim a Executada que litiga com má-fé, devendo a mesma ser condenada nos termos do art.º 542.º do CPC numa multa não inferior a 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros), pois violou o referido art.º, seu n.º 2, alíneas b) e c).
- Foi proferido despacho saneador aos 20/11/2023 onde, entre o mais, se decidiu: “... Falta de título executivo e alteração da causa de pedir. 1. Não existe falta de título executivo porque os cheques juntos ao requerimento executivo, apresentados a pagamento além do prazo de oito dias e proposta a acção cambiária além do prazo de seis meses do termo do prazo de apresentação a pagamento, e, como tal, prescritos enquanto títulos de créditos – arts. 29.º e 52.º da LUCH, valem como “meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo” – art.º 703., n.º 1, al. c), do CPC – e, no requerimento executivo, a exequente cumpriu este ónus, ao alegar “Os referidos cheques destinavam-se a pagamento de equipamento de restauração referente ao restaurante "Restaurante Convite" do qual o exequente era proprietário, e a executada explorava no âmbito da sua atividade comercial”, estando sucintamente desenhada uma compra e venda de equipamento de restauração entre o exequente e a executada, exercendo na acção o direito ao pagamento do preço, cujo prazo de prescrição é de 20 anos (ainda não decorrido) – art.º 309.º do CC. Não obstante, existe alteração da causa de pedir inadmissível – a embargante não autorizou tal alteração, cf. art.º 265.º, n.º 1, do CC – quando, na contestação, o embargado vem confessar que, afinal, os três cheques (quirógrafos) não visavam garantir todos eles o pagamento de equipamento de restauração, pois o cheque com o valor de 5.220 euros pretendia garantir o pagamento de “bens e mercadorias para o expediente diário”, tal como resulta da declaração que lhe está anexa – art.º 10.º da contestação, e, embora não o diga expressamente, seguindo o mesmo percurso, também implicitamente o cheque com o valor de 1.500 euros pretendia garantir o pagamento de rendas. Para que fique claro: os autos avançam para julgamento a fim de apurar se os três cheques-quirógrafos visavam o pagamento de equipamento de restauração acordado comprar e não também de dívidas de bens ou mercadorias e de rendas (causa de pedir alterada não admitida).” Foi definido o objecto do litígio como sendo “Compra e venda do equipamento de restauração acordada entre o exequente e a executada e falta de pagamento do respectivo preço, correspondente à quantia exequenda.” Como temas de prova foram eleitos os seguintes: “- Acordo de compra e venda do equipamento de restauração entre as partes; - Pagamento do preço titulado pelos “cheques” juntos ao requerimento executivo; - Apresentação dos cheques a pagamento e interpelação da executada para pagar o preço do equipamento; - Titular original dos cheques e morte do mesmo.

III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.1. Conforme resulta do disposto nos art.ºs 608, n.º 2, 635, n.º 4, 639, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539.
III.2. Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto tal como enunciadas em I.
III.3.1. Saber se “As declarações do exequente, gravadas na audiência de julgamento minutos 45,46,51,52, 1 hora e 8 minutos e 1 hora e 12 minutos permitem considerar como provado que o exequente tinha plena consciência que em virtude de a executada ser viúva, e de ser titular de uma conta conjunta na Caixa Geral de depósitos, que os cheques que tinha na sua posse, nunca poderiam ser descontados em virtude de serem cheques irregulares; o exequente não provou em qualquer momento ser proprietário de um recheio do restaurante “O Convite”; o exequente refere na gravação da audiência de julgamento, minutos 44/45, que em vez do pagamento de uma renda mensal no valor de 800,00€ acordou com a executada o pagamento de uma renda no valor de 500,00€, se a mesma adquirisse o recheio do restaurante, confirmando que foi esse o acordo estabelecido”;
III.3.2. Estatui o art.º 640 n.º 1: “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente, obrigatoriamente, especificar, sob pena de rejeição: a) os concretos pontos de facto que considerar incorrectamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. O n.º 2 do art.º, por seu turno estatui que quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar, com exactidão as passagens de gravação em que se funda o recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (alínea a); independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes (alínea b)”.
III.3.2. Dispunha o n.º 1, do art.º 685-B: “Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados (alínea a)],e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (alínea b)]”
E o n.º 2: “No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 522-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à sua transcrição.”
III.3.3. Os ónus são basicamente os mesmos, vincou-se na alínea c), do n.º 1, do art.º 640 (o que não estava suficientemente claro, mas a doutrina pressupunha), o ónus de especificar a decisão que no entender do recorrente deveria ser proferida sobre a matéria de facto, manteve-se, também, o ónus (com redacção ligeiramente diferente) de identificar com exactidão (nova redacção), ou identificar precisa e separadamente (anterior redacção) as passagens da gravação em que se funda (comum).
III.3.4. Pode dizer-se que continua válido o entendimento anterior da doutrina nessa matéria. A este propósito referia António Santos Abrantes Geraldes que o recorrente deve especificar sempre nas conclusões os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; para além disso, deve especificar os concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (documentos, relatórios periciais, registo escrito), deve indicar as passagens da gravação em que se funda quando tenha sido correctamente executada pela secretaria a identificação precisa e separada dos depoimentos, deve igualmente apresentar a transcrição dos depoimentos oralmente produzidos e constantes de gravação quando esta tenha sido feita através de mecanismo que não permita a identificação precisa e separada dos mesmos, deve especificar os concretos meios probatórios oralmente produzidos e constantes da gravação, quando esta foi feita por equipamento que permitia a indicação precisa e separada e não tenha sido cumprida essa exigência pela secretaria e por último a apresentação de conclusões deficientes obscuras ou complexas a tal ponto que a sua análise não permita concluir que se encontram preenchidos os requisitos mínimos para que possa afirmar-se a exigência da especificação na conclusão dos concretos pontos de facto impugnados ou da localização imediata dos concretos meios probatórios. Tudo isto sob pena de rejeição imediata sem convite ao aperfeiçoamento[2].
III.3.3. Como as conclusões delimitam o objecto do recurso é nestas que o recorrente deve especificar os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados.
III.3.4. Quanto à consciência por parte do exequente de que os cheques que tinha na sua posse, nunca poderiam ser descontados em virtude de serem cheques irregulares há que ver: esta questão da irregularidade dos cheques o seu valor como quirógrafo e como título executivo foi já apreciada aquando do saneador por decisão transitada em julgado em que entre o mais se decidiu que “1. Não existe falta de título executivo porque os cheques juntos ao requerimento executivo, apresentados a pagamento além do prazo de oito dias e proposta a acção cambiária além do prazo de seis meses do termo do prazo de apresentação a pagamento, e, como tal, prescritos enquanto títulos de créditos – art.ºs 29.º e 52.º da LUCH, valem como “meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo” – art.º 703., n.º 1, al. c), do CPC – e, no requerimento executivo, a exequente cumpriu este ónus, ao alegar “Os referidos cheques destinavam-se a pagamento de equipamento de restauração referente ao restaurante "Restaurante Convite" do qual o exequente era proprietário, e a executada explorava no âmbito da sua atividade comercial estando sucintamente desenhada uma compra e venda de equipamento de restauração entre o exequente e a executada, exercendo na acção o direito ao pagamento do preço, cujo prazo de prescrição é de 20 anos (ainda não decorrido) – art.º 309.º do CC. Não obstante, existe alteração da causa de pedir inadmissível – a embargante não autorizou tal alteração, cf. art.º 265.º, n.º 1, do CC – quando, na contestação, o embargado vem confessar que, afinal, os três cheques (quirógrafos) não visavam garantir todos eles o pagamento de equipamento de restauração, pois o cheque com o valor de 5.220 euros pretendia garantir o pagamento de “bens e mercadorias para o expediente diário”, tal como resulta da declaração que lhe está anexa – art.º 10.º da contestação, e, embora não o diga expressamente, seguindo o mesmo percurso, também implicitamente o cheque com o valor de 1.500 euros pretendia garantir o   pagamento de rendas. Para que fique claro: os autos avançam para julgamento a fim de apurar se os três cheques-quirógrafos visavam o pagamento de equipamento de restauração acordado comprar e não também de dívidas de bens ou mercadorias e de rendas (causa de pedir alterada não admitida).” Irreleva assim a consciência do exequente de que os cheques que tinha na sua posse não podiam ser descontados- que comprovadamente não foram e têm nesta acção executiva o valor fixado na decisão.
III.3.5. Mais conclui o recorrente que “o exequente não provou em qualquer momento ser proprietário de um recheio do restaurante “O Convite”; o exequente refere na gravação da audiência de julgamento, minutos 44/45, que, em vez do pagamento de uma renda mensal no valor de 800,00 € acordou com a executada o pagamento de uma renda no valor de 500,00€, se a mesma adquirisse o recheio do restaurante, confirmando que foi esse o acordo estabelecido”; O que é que se decidiu a este propósito na decisão de facto sob recurso?
III.3.6. Consta provado na decisão sob recurso que “2. O cheque de 20.000 euros destinou-se ao pagamento do preço de equipamento de restaurante vendido pelo embargado à embargante. 3. Os cheques não foram apresentados a pagamento. 4. À data de 03 de Dezembro de 2008 (data da emissão dos cheques), C … já tinha morrido e, em vida, com a embargante, co-titulavam conta da CGD com que se relacionavam aqueles cheques.
III.3.7. Nenhuma referência na decisão de facto à questão da propriedade do restaurante com aquela designação e ao conteúdo de um eventual contrato de compra e venda do restaurante apenas a referência quanto ao destino do valor constante do cheque de 20 mil euros e que se destinou à compra do equipamento existente mesmo. Como se colhe do AUJ 12/2023 de 14/11, publicado no DR 220/2023 série I de 14/11/2023, o recorrente não está onerado com a indicação da decisão alternativa nas conclusões das alegações de recurso, mas está seguramente onerado com a indicação, nas conclusões das alegações de recurso, dos concretos pontos de facto da decisão recorrida que no seu entender estão incorrectamente julgados e terá de o fazer nas conclusões das alegações de recurso que não apenas no corpo das alegações, sabido que é que nas conclusões de recurso o recorrente pode restringir o objecto do recurso indicado no corpo não sendo de atender a indicação feita no corpo das alegações sem reflexo nas conclusões, como é jurisprudência do Supremo que se crê unânime. [3] Por isso não se conhecerá da enviesada impugnação da decisão de facto.
III.4. Saber se tendo o acordo sido estabelecido para a compra do recheio  que foi no valor de 20.000,00€, em que incluía o pagamento de uma renda mensal de 500,00€, qual a justificação para exigir o pagamento de duas rendas no valor de 800,00€ cada, não tendo o exequente provado em Tribunal, que a executada foi notificada para proceder ao pagamento de qualquer divida, reconhecendo até que a mesma mudou de residência, pelo que não lhe poderão ser exigidos juros de mora.
III.4.1. Por forma a atingir a intenção do recorrente apreciou-se com cuidado o alegado no corpo das alegações. Aí se diz, entre o mais, que:
- É entendimento de “Lopes Rego “, que o cheque não traduz reconhecimento da dívida, quando refere: em certos atos (v.g. no cheque) a constituição da obrigação cambiária não é atribuível à autonomia da vontade dos interessados (o cheque incorpora uma ordem de pagamento e não o reconhecimento de um débito), radicando, apenas na lei que cria para o emitente do título, posto em circulação, uma obrigação legal de garantir o respectivo pagamento ao legítimo portador.
- Nem se pode aplicar neste caso, o artigo 458.º do CCiv “negócios unilaterais“ (promessa de cumprimento, reconhecimento de divida), pois o exequente alega que vendeu o recheio, contrato de compra e venda de coisas móveis.
- Assim, sendo o cheque irregular, o mesmo não consubstancia neste caso a veste de quirógrafo, enquanto reconhecimento unilateral de divida e promessa de pagamento.
- Como refere o Ac. da Relação de Lisboa de 20/06/2002 “a obrigação de pagamento do montante nele inscrito apenas emerge do cheque, por si só considerado, quando é encarado e usado como título de crédito
- Como mero documento particular despido da natureza e força que lhe são conferidas pela LUCH(..), não pode ser reconduzido à previsão do art.º 458 n.º 1, na medida em que não incorpora por si só, qualquer reconhecimento de divida.
- Neste caso em apreço, o exequente não demonstrou, cabalmente, a relação do cheque, com a venda dos equipamentos, o Exequente junta uma declaração assinada pela executada, em que a numeração do cheque descrito não é a mesma do que tem na sua posse, nem apresenta qualquer documento comprovativo de que é proprietário do recheio do restaurante.
- Por isso nos negócios abstratos, a emissão de um cheque não pode valer como declaração tácita de reconhecimento de dívida porque, de modo algum, essa emissão constitui facto que, com toda a probabilidade revele uma tal manifestação de vontade (art.º 217 do Código Civil)
- O Sr.º Juiz de Direito “ a quo “, julgou não considerar o solicitado pela Executada, nomeadamente que a mesma nunca foi notificada para proceder ao pagamento de qualquer quantia ao exequente Sr.º B …, pelo que prosseguindo a execução quanto ao valor de 20.000,00euros, não lhe poderão ser imputados quaisquer juros de mora, pois o exequente não provou que notificou a executada, reconhecendo que a mesma mudou de residência.
III.4.2. Entendeu-se, em suma, na decisão recorrida que:
- Ainda que tenham deixado de valer como títulos de crédito, e nesta qualidade, como títulos executivos – art.º 703.º, n.º 1, al. c), primeira parte, do CPC, os cheques não deixaram de valer como quirógrafos, ou seja, como documentos particulares, assinados pela devedora, e, conquanto os factos constitutivos desta relação subjacente que titulam deles constem, ou, não constando, sejam alegados no requerimento executivo, valem, como títulos executivos – art.º 703,º, n.º 1, al. c), segunda parte, do CPC.
- Neste contexto, como o exequente alegou no requerimento executivo que os cheques-quirógrafos titulavam uma compra e venda de equipamento industrial, assumiu-se, na decisão de 20 de Novembro de 2023, que não ocorria a falta de títulos executivos.
- Resta acrescentar, agora, que não retira executoriedade aos aludidos “cheques” a circunstância de terem sido subscritos pela embargante à ordem do embargado em impressos encimados com o nome do, à data da emissão, falecido marido da embargante (co-titular, com a embargante, de conta conjunta), porque, repise-se, valendo como quirógrafos e não como títulos de crédito, tal particularidade não convoca mais a disciplina contida na LUCH, e, mesmo que, mesmo assim não fosse, este compêndio normativo parece comportar solução analógica favorável à tutela do embargado – cf. art.º 11.º da LUCH. 
- O ónus de o exequente alegar os factos constitutivos da relação subjacente aos cheques-quirógrafos, uma vez cumprido, faz presumir esta concreta relação subjacente – art.º 458.º, n.º 1, do CC
- Diante de tal presunção legal, é à executada, nas vestes de embargante, que competia o ónus de provar inexistir tal concreta relação subjacente – art.º 350.º, n.ºs. 1 e 2, do CC.
- Ora, “1 - Pretendendo-se basear a execução num cheque prescrito ao abrigo da alínea c), do nº 1, do art.º 703º, do CPC, tem o exequente o ónus de alegar os factos essenciais constitutivos da relação subjacente no requerimento executivo, se eles não constarem do próprio documento, de modo a beneficiar da dispensa de prova dos mesmos que resulta da presunção da existência de tal relação fundamental (art.º 458º, CC). 2. O ónus de provar a inexistência de tal causa pertence ao executado. 3. (…) 4. Caso de tal prova resulte demonstrada a inexistência desta relação, não há lugar à aplicação daquela regra e devem os embargos proceder e ser julgada extinta a execução por falta de título executivo – Acórdão da Relação de Guimarães de 21-11-2019, processo n.º 1418/17.5T8VNF-A.G1, in www.dgsi.pt.
III.4.3. Prende-se a questão com o ónus de alegação e prova dos factos relativos à relação subjacente à emissão dos cheques que, comprovadamente, estão prescritos. Não foi alterada a decisão de facto como se disse.
III.4.4. No que toca à questão de saber se o portador de um “cheque” que já não pode lançar mão da acção cambiária pelo decurso do prazo de 6 meses previsto no art.º 52 da LUCH ou que não possua os requisitos de título de crédito da LUCH, pode ainda lançar mão da acção executiva com base no mesmo cheque com o valor de confissão de dívida nos termos do art.º 46/1/c (actual art.º 703/1/c), a solução não tem sido pacífica a nível do Supremo Tribunal de Justiça conforme se colhe dos Acórdãos disponíveis on line no sítio www.dgsi.pt e que a seguir se sumariam.
III.4.7. No sentido de que o cheque nessas condições pode constituir reconhecimento unilateral de dívida e servir de suporte à acção executiva desde que o portador alegue os factos da relação causal à emissão de cheque, ainda que verificado o pressuposto de o negócio causal não ser formal entre outros, para além do de 11/03/1999, relatado pelo Ex.mo Conselheiro Lemos Triunfante, publicado na C.ªJ.ª STJ, Ano VII, tomo II, págs. 88/92, veja-se os Acórdãos STJ Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19/1/2004 no Processo: 03A3881 relatado por Nuno Cameira, o de 16/12/2004 no  Processo: 04B3004  relatado por Neves Ribeiro o de 20/5/2004 no processo 04B1457, relatado por Luís Fonseca, o de 19/12/2006 no processo 06B3791relatado por Oliveira Barros; em sentido contrário entre outros para além dos arestos de 04/05/1999 e de 29/02/2000, publicados na CªJªSTJ, Ano VII, tomo II, pág. 82 e ss e Ano VIII, tomo I, pág. 124, vejam-se os seguintes do mesmo Alto Tribunal, o de 20/11/2002 no procesos 02B2163, relatado por Duarte Soares, o de 5/7/2002 no processo 01A2102 relatado por Lemos Triunfante.
III.4.8. Temos por bom o entendimento de que embora prescrito (ou prescrito e irregular) o cheque valendo como quirógrafo, desde que os factos da relação subjacente sejam alegados no requerimento executivo, como manifestamente o foram, constitui título executivo (de resto com cobertura na letra da lei da alínea c) do n.º 1 do art.º 703). Tal como decorre daqueles preceitos legais (art.º 458 do CCiv) é essencial que a pessoa que emite a declaração unilateral de reconhecimento de dívida e o credor nessa declaração sejam o devedor e credor originários na relação fundamental ou causal o que ocorre.
III.4.9. Secundando a posição do Tribunal recorrido e da jurisprudência indicada tendo o exequente cumprido o seu ónus da alegação da relação jurídica causal à emissão dos cheques com expressão na matéria de facto dada como provada, não logrando o executado provar a inexistência dessa relação causal goza o exequente da presunção do art.º 458 do CCiv, e constitui título de crédito exequível nos termos do art.º 703, 729/a.
III.4.10. Quanto à questão dos juros de mora. O exequente alega a interpelação, nos embargos, a executada levantou a questão da inexistência de título executivo e da falta de interpelação para o pagamento fosse do que fosse. O cheque (de 20.000€), não apresentado a pagamento, que está a servir de título executivo como quirógrafo, não consubstanciava a promessa de pagamento do montante nele escrito em data certa, como se disse e o exequente não demonstrou a interpelação para o pagamento dessa quantia. Logo não há título quanto a juros vencidos, não podendo a execução prosseguir quanto a juros, excepto quanto àqueles que se venceram depois da citação da executada para a execução que vale como interpelação (art.º 805/1 do CCiv).
IV- DECISÃO
Tudo visto acordam os juízes na 2.ª secção desta Relação, em, pelas expostas razões:
a) julgar parcialmente procedente a apelação e com base no que antecede concluir que inexiste título executivo quanto aos juros de mora vencidos, excepto quanto aos que se venceram depois da citação da executada para a execução.
b) Confirmar no mais a decisão recorrida
As custas são da responsabilidade na proporção de decaimento, por embargante e embargado. (art.º 527/1 e 2)

Lxa., 23-05-2024
Vaz Gomes
Higina Castelo
Pedro Martins
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[1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013 de 26/6, entrado em vigor a 1/9/2013,  atento o disposto no art.º 6/1 da referida Lei, considerando a data da entrada da oposição seja 21/12/2017 e a data da decisão que é 7/9/2021; ao Código referido, na redacção dada pela referida Lei, pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem.
[2] Recursos em Processo Civil, Novo Regime, Almedina, 2008, págs.
[3] Também no Ac STJ de 17/11/2021 proferido na revista com o n.º 8344/17.6t8stg.e1.s1 relatado por Tibério Nunes da Silva se entendeu a nosso ver bem que se não for possível identificar os pontos de facto concretos que no entender do recorrente estejam incorrectamente julgado se não se conhecerá, nessa parte, do recurso.