Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CARLOS CASTELO BRANCO | ||
Descritores: | CUSTAS DE PARTE RECLAMAÇÃO DEPÓSITO | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/08/2020 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I) Se os recorrentes deduziram reclamação da apresentação pela contraparte da nota justificativa e discriminativa de custas de parte e nela suscitam, para além da questão da tempestividade da apresentação de tal nota, outras questões com vista a por em causa os valores constantes de tal nota, a condição de depósito integral do valor da nota, a que se reporta o n.º 2 do artigo 26.º-A do RCP deve verificar-se e condiciona a apreciação do julgador. II) Não ocorre nulidade por omissão de pronúncia (artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC) se a decisão recorrida aprecia da causa que determina o não conhecimento da reclamação e dela não conhece, em razão de não se encontrar satisfeito o depósito a que se reporta o mencionado artigo 26.º-A, n.º 2, do RCP. III) Constituindo o depósito do valor da nota de custas de parte uma condição a que a reclamação - que dela seja deduzida - se encontra sujeita, nos termos do n.º 2 do artigo 26.º-A do RCP, que deve ocorrer em momento prévio à apreciação da reclamação, sem que a lei preveja que possa ocorrer em momento ulterior ou na sequência dessa apreciação, não se mostra incumprido o dever de gestão processual – artigo 6.º do CPC – se o juiz não convida a parte a proceder ao depósito do valor da nota de custas em falta para apreciar a reclamação. IV) O artigo 26.º-A, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais, na parte em que determina o depósito do valor da nota de custas de parte que seja objeto de reclamação, não viola o disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, nem restringe o campo de atuação judicial, que é sempre chamado a apreciar se se encontram, ou não, reunidos os requisitos legais para aquela apreciação, não sendo, pois, inconstitucional. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: 1. Relatório: LF… intentou incidente de liquidação de sentença contra EA… e os seus dois filhos, AG… e PF…, peticionando a condenação destes a pagar-lhe a quantia de € 280.000,00, a título de danos patrimoniais. Alegou que, por sentença proferida e já transitada em julgado, AE… (respectivamente, marido e pai dos requeridos) foi condenado a pagar-lhe uma indemnização, em quantia que se viesse a liquidar, pelos danos patrimoniais por si sofridos, decorrentes do comportamento por aquele desenvolvido. * Em 27-11-2018, foi proferida sentença, em 1.ª instância, que julgou parcialmente procedente a pretensão e liquidou em € 20.000,00, a quantia que a AE… foi condenado a pagar ao Autor a título de indemnização por danos patrimoniais. * Após interposição de recursos dessa decisão, o Tribunal da Relação de Lisboa (6.ª Secção), por acórdão de 07-11-2019, julgando improcedentes os referidos recursos, manteve a decisão recorrida. * Por requerimento de 26-12-2019, o autor apresentou nota discriminativa e justificativa de custas de parte, nos termos e para os efeitos dos referidos artigos 25º e 26º do Regulamentos das Custas Judiciais, invocando designadamente o seguinte: “Na sequência do acórdão proferido nos autos referidos em epígrafe e de que o m/ Constituinte se considera notificado em 11 de Novembro de 2019, venho, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 25.º e 26.º do Regulamento das Custas Processuais, requerer o pagamento das custas de parte devido, no montante global de €1.224,00 (mil, duzentos e vinte e quatro Euros), abaixo discriminadas: NOTA DISCRIMINATIVA E JUSTIFICATIVA DE CUSTAS DE PARTE Proc. 93/13.0TCFUN – 93/13.0TCFUN.1 Juízo Central Cível - Juiz … Tribunal Judicial da Comarca da Madeira Funchal Autor: LF… Réus: EA…; AG…; PF…
Nesta conformidade e atenta a relação das custas de parte acima discriminada, da v/ responsabilidade, V. Exa. pode, nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 31º e seguintes do Regulamento de Custas Processuais, reclamar, querendo, ou proceder ao seu pagamento, no prazo de dez dias, por transferência bancária, através do IBAN (…). Decorridos os prazos legais, sem que se mostre liquidada a quantia devida, a título de custas de parte, darei entrada, de imediato e sem mais aviso, à competente ação executiva, visando a cobrança de tal quantia, com todas as consequências e encargos daí decorrentes. Crendo que tal não se venha a mostrar necessário, subscrevo-me,(…)”. * Baixando os autos à 1.ª instância, em 13-01-2020 foi proferido o seguinte despacho: “Tomei conhecimento do acórdão que antecede. Analisada a matéria alegada e considerada como controvertida, a questão de direito que cumpria nos autos analisar e o número de sessões de julgamento que neles ocorreu, considero que, pese embora o valor da causa e a ponderação factual e de direito que aquela exigiu, a presente acção não revelou ser de uma especial complexidade, distinta das demais acções aqui pendentes, que justifique o pagamento do remanescente da taxa de justiça. Assim sendo, determino a dispensa de tal pagamento (cfr. artigo 6º, n.º7, do Regulamento das Custas Processuais). Oportunamente, à conta.”. * Em 13-01-2020, os réus, notificados da nota discriminativa e justificativa de custas de parte, apresentaram requerimento de reclamação da mesma, nos termos do artigo 26.º-A, n.º 1, do Regulamento de Custas Processuais, nos termos seguintes: “Notificado do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, com a ref.ª 15084974, o Autor veio apresentar a nota discriminativa e justificativa de custas de parte somente a 26 de dezembro de 2019. A lei determina que os mandatários são notificados por via eletrónica, presumindo-se esta feita no terceiro dia posterior ao do seu envio, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja – cfr. n.º 1 do artigo 248.º do CPC. In casu, a notificação do acórdão de 07 de novembro de 2019 considerou-se feita a 11 de novembro de 2019. Antes de mais, coloca-se a questão da recorribilidade do presente acórdão, para efeitos de fixação da data do trânsito em julgado. O Requerente peticionou a liquidação da sentença em € 280.000,00 (duzentos e oitenta mil euros). No despacho saneador, proferido a 22 de janeiro de 2018, a Mm.ª Juiz de Direito fixou o valor da ação em € 280.000,00 (duzentos e oitenta mil euros) e decidiu que a eventual condenação dos Requeridos nunca poderia exceder o valor de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), por ter sido este o valor peticionado na ação principal, com “custas, nesta parte, pelo Autor”. O despacho saneador transitou em julgado, havendo, desde logo, um decaimento de 82% para o Autor. Posteriormente, a sentença condenou os Réus a pagar a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros) ao Autor, pelo que houve novo decaimento para o Autor, desta feita de 40%. O presente acórdão é irrecorrível por preterição dos requisitos previstos no artigo 629.º, n.º 1, do CPC, e ainda nos termos do artigo 671.º, n.º 3 do mesmo Código, tendo a decisão transitado em julgado a 21 de novembro de 2019. De acordo com o n.º 1 do artigo 25.º do Regulamento de Custas Processuais, as partes que tenham direito a custas de parte remetem a respetiva nota discriminativa e justificativa para o tribunal, para a parte vencida até 10 dias após o trânsito em julgado. Neste sentido, a nota discriminativa e justificativa apenas poderia ter sido apresentada até 02 de dezembro de 2019, pelo que é intempestiva e deve ser desentranhada, com as demais consequências. Ainda que assim não se entenda, sempre se dirá o seguinte: Por mera hipótese de raciocínio poderá admitir-se que o Autor, numa tentativa rebuscada de aproveitar o prazo de recurso de revista excecional, previsto no artigo 672.º do CPC, veio emitir a nota somente em 26 de dezembro de 2019. Na verdade, o presente incidente de liquidação constitui apenso ao processo principal instaurado no Tribunal Judicial da Comarca da Madeira a 14 de fevereiro de 2013, ao abrigo do Código de Processo Civil de 1961 (CPC1961), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de dezembro. Dispõe o artigo 6.º, n.º 4 da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, que “O disposto no Código de Processo Civil, aprovado em anexo à presente lei, relativamente aos procedimentos e incidentes de natureza declarativa apenas se aplica aos que sejam deduzidos a partir da data de entrada em vigor da presente lei.” Contudo, o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 05 de maio de 2014, processo nº 1869/09.9TBVRL-F.P1, deliberou que «Quando no artigo 6.º, nº 4 da Lei 41/2013 de 26/6 (Lei que aprovou o NCPCivil) se faz referência a que o disposto no Código de Processo Civil relativamente aos procedimentos cautelares e incidentes de natureza declarativa (onde também se inserem os embargos de terceiro) apenas se aplica aos que sejam deduzidos a partir da data de entrada em vigor da presente lei, apenas tem em vista as normas específicas reguladoras desses incidentes e já não as normas referentes aos recursos dessas decisões». [sublinhado nosso] Determinava o artigo 721.º, n.º 3, do CPC1961 que não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e ainda que por diferente fundamento, a decisão proferida na 1ª instância, salvo nos casos previstos no número 4 do mesmo artigo e que não se aplicam ao caso concreto. Conclui-se, assim, que, não sendo admitida revista, o Autor não poderia aproveitar o prazo de 30 dias previsto para efeitos de determinação do prazo de trânsito em julgado. Desta forma, não sendo esta decisão recorrível, reitera-se tudo quanto foi anteriormente exposto: o trânsito em julgado ocorreu em 21 de novembro de 2019 e a nota discriminativa e justificativa de custas de parte apenas poderia ter sido apresentada até 02 de dezembro de 2019, pelo que é intempestiva e deve ser desentranhada com as demais consequências. Não obstante, E por mero dever de patrocínio, sempre se dirá que a nota discriminativa e justificativa das custas de parte padece de diversos vícios que são agora objeto de reclamação. Estabelecem os n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do CPC que “a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes condena em custas a parte que a elas houver dado causa,” sendo que dá a causa ao processo a parte vencida, na proporção em que for. A decisão proferida a 07 de novembro de 2019 condenou em custas o Autor/Recorrente quanto ao recurso principal e os Réus/Recorridos quanto ao recurso subordinado, por força do decaimento. Com efeito, a nota discriminativa e justificativa de custas de parte apenas poderia incidir sobre os valores relativos às taxas de justiça pagas em sede de liquidação de sentença, conforme dispõe o artigo 533.º, n.ºs 1 e 2, do CPC. Relativamente às taxas de justiça pagas pelo Autor na ação principal, os Réus desconhecem a proveniência o valor peticionado de € 816,00 (oitocentos e dezasseis euros), identificado no DUC …. Não existe nenhuma sentença (ou peça processual) datada de 24/10/2016; quanto muito, o Autor refere-se à taxa de justiça da ação principal, sendo certo que a sentença dessa ação foi proferida a 27 de junho de 2013 e já está, há muito, transitada em julgado! Ademais, as custas relativas à ação principal são devidas no âmbito dessa mesma ação – e não em sede de qualquer outro incidente. Aliás, o Autor chegou a executar a parte líquida dessa sentença e a obter pagamento integral da mesma, precisamente porque a mesma transitou em julgado! Pelo exposto deverá, à nota apresentada, ser reduzido o montante de € 816,00 (oitocentos e dezasseis euros). Estão em causa, assim, as seguintes quantias: I) Quantia paga pelo Autor neste incidente: - Taxa de justiça paga pela apresentação do incidente de liquidação, cfr. DUC com a referência …, no valor de € 51,00; - Taxa de justiça paga pela apresentação das alegações de recuso, cfr. DUC …, no valor de € 357,00; Total: € 408,00 II) Quantia paga pelos Réu, neste incidente: - Taxa de justiça paga pela apresentação dos Embargos de Executado, cfr. DUC com a referência …, no valor de € 51,00; - Taxa de justiça paga pela apresentação das alegações de recuso, cfr. DUC …, no valor de € 357,00; Total: € 408,00. II) Compensação pelas despesas com honorários dos Mandatários (50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora): - De acordo com o supra exposto, 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, nos termos da alínea d) do número 2 do artigo 25º e da alínea c) do número 3 do artigo 26º do RCP, corresponde a € 408,00 III) Responsabilidade do Autor pelo pagamento em função do decaimento de 07,00%: - São da responsabilidade dos Réus, em função do decaimento, o montante de €57,12. €408,00 + €408,00 = €816,00 €816,00 x 7% = €57,12 Pelo que se conclui que, em última instância, o montante devido a título de custas ao Autor, parte vencida em 93% no presente incidente, será de € 57,12 (cinquenta e sete euros e doze cêntimos) e não de € 1.734,00 (mil, setecentos e trinta e quatro euros), conforme por si alegado.”. * Sobre esta pretensão, em 11-02-2020 foi proferido o seguinte despacho: “Pretendem os Réus, com o presente Requerimento, apresentar reclamação à nota de custas de parte apresentada pelo Autor. Estabelece o artigo 26º-A, do Regulamento das Custas Processuais, na parte que aqui importa considerar que “a reclamação da nota justificativa é apresentada no prazo de 10 dias, após notificação à contraparte, devendo ser decidida pelo juiz em igual prazo e notificada às partes” e, bem assim, que “a reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota”. A obrigatoriedade de pagamento da nota de custas resulta, agora, do texto do próprio Regulamento das Custas Judiciais, aprovado pela Assembleia da República através da Lei n.º 27/2019, de 28/03 (em vigor desde 28 de Abril de 2019), assim se tendo sanado a constatada violação de reserva de lei parlamentar que determinara a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do n.º 2 do artigo 33º, da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de Abril. Tendo já havido decisões do Tribunal Constitucional no sentido de inexistir qualquer inconstitucionalidade material na obrigatoriedade do pagamento da nota, concluímos, em face de tudo quanto se deixa exposto, que a reclamação de custas deve ser acompanhada do pagamento da respectiva nota, sob pena de não ser conhecida. Em face do exposto, configurando o referido depósito uma condição a que a reclamação se encontra sujeita e não estando tal depósito comprovado nos autos, por inadmissível, não conheço da reclamação apresentada. Notifique e demais D.N.”. * Não se conformando com esta decisão, dela apelam os réus, formulando as seguintes conclusões: “I. O presente recurso tem por objecto o despacho que decidiu não conhecer a reclamação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte, por falta de depósito da totalidade do valor da nota, entendendo que o depósito é uma condição a que a reclamação se encontra sujeita. II. O referido despacho escuda-se nas “decisões” do Tribunal Constitucional no sentido de inexistir inconstitucionalidade material na obrigatoriedade do pagamento nota. III. Contudo, dentre toda a jurisprudência recente do Tribunal Constitucional nesta matéria, apenas no Acórdão n.º 678/2014 foi decidido não julgar materialmente inconstitucional a norma constante do n.º 2 do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, na redacção conferida pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de Março, de acordo com a qual «a reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota» (em tudo semelhante à redacção actual do n.º 2 do artigo 26.º-A do Regulamento das Custas Processuais). IV. Neste acórdão, o Tribunal Constitucional entendeu, e bem, que das três rubricas que devem constar da nota discriminativa e justificativa das de custas de parte, segundo o artigo 25.º, n.º 2 do RCP - taxa de justiça, encargos e honorários e despesas de mandatário ou agente de execução -, o valor de duas delas é, desde logo, indicado pela secretaria do tribunal e o valor da terceira encontra-se perfeitamente balizado. V. Contudo, no caso sub judice, a secretaria do Tribunal não remeteu às partes nota descritiva com indicação dos valores pagos a título de taxa de justiça e/ou encargos. VI. Mais, a própria nota discriminativa e justificativa das custas de parte tem de ser remetida não apenas à parte vencida, mas também ao próprio tribunal, sendo certo que esta exigência legal apenas se compreende se o Tribunal puder mandar reformar oficiosamente a nota, se esta não estiver de harmonia com as disposições legais, VII. O que, de resto, resulta igualmente da aplicação subsidiária à reclamação da nota justificativa do disposto no artigo 31.º do Regulamento das Custas Processuais relativo à reclamação da conta (ex vi do disposto no artigo 26.º-A, n.º 4 do mesmo diploma legal). VIII. Em suma, o Tribunal Constitucional não julgou materialmente inconstitucional a norma que, à época, obrigava ao depósito da totalidade do valor da nota (em tudo semelhante à norma actual) por entender que os valores das taxas de justiça e dos encargos são enviados numa nota descritiva emitida pela secretaria do Tribunal, os honorários do mandatário e do agente de execução correspondem a 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, e que o envio da nota discriminativa ao tribunal abre a possibilidade de reforma oficiosa da nota apresentada. IX. Ora, nada disto ocorreu no presente caso. X. Sendo certo que o Tribunal a quo não conheceu sequer a excepção peremptória de caducidade, atenta a preclusão do prazo para apresentação da nota discriminativa de custas de parte, a qual é de conhecimento oficioso, nos termos do disposto no artigo 579.º do Código de Processo Civil. XI. No mínimo, devia o Tribunal a quo, ao abrigo do dever de gestão processual, convidar os Réus a depositar o valor – o qual nem sequer é claro, porquanto surgem valores diferentes em diferentes momentos (!) XII. Os Réus pugnam, assim, pela revogação do despacho recorrido, e pela sua substituição por outro que verifique a caducidade e não admita a nota discriminativa e justificativa de custas de parte apresentada pelo Autor, determinando o seu desentranhamento dos autos. XIII. Caso assim não se entenda, sempre deve o Tribunal, oficiosamente e ao abrigo do dever de gestão processual, mandar notificar os Réus para proceder ao depósito do valor da nota, para efeitos de conhecimento da reclamação apresentada. XIV. Os Réus entendem que, tendo sido invocada a intempestividade da apresentação da nota de custas de parte, não estavam obrigados a depositar o valor total da nota, sob pena de tal conduzir a soluções manifestamente iníquas, desde logo por se impor um ónus demasiado severo para se invocar a excepção peremptória. XV. A decisão proferida deixou de se pronunciar sobre questões que devia apreciar (extemporaneidade da apresentação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte pelo Autor), pelo que enferma de nulidade (artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil). XVI. Ademais, existirá enriquecimento sem causa se o Autor passar a dispor de título executivo para cobrança de valores que não lhe são devidos, o que ocorrerá, caso esta decisão seja mantida. XVII. É inconstitucional a norma constante do n.º 2 do artigo 26.º do Regulamento das Custas Processuais, na parte em que obriga ao depósito da totalidade do valor da nota reclamada, por violação do disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, não apenas por obstaculizar o direito dos particulares de acesso ao Direito, mas também por restringir indevidamente o espaço da necessária intervenção do juiz. XVIII. A matéria respeitante à reclamação da nota justificativa das custas de parte possui uma natureza restritiva de um direito fundamental – o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efectiva – sendo certo que a doutrina e a jurisprudência do Tribunal Constitucional têm considerado este direito como análogo a um direito, liberdade e garantia. XIX. Os Recorrentes pugnam pela atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso, pois a verdade é que a atribuição, numa situação como a presente, do efeito meramente devolutivo, tornará inútil o recurso, porquanto passará o Autor a dispor de título executivo para cobrança coerciva de montante que não lhe é devido. XX. Os Recorrentes oferecem-se a prestar caução, no prazo e montante que vier a ser fixado pelo Tribunal”. * Não foram apresentadas contra-alegações. * Em 03-07-2020 foi proferido o seguinte despacho sobre a pretensão de reforma da decisão, exposta no requerimento de interposição de recurso: “Requerem os Réus a reforma do despacho proferido sob a Ref.ª Citius 48231792, alegando que a mesma não se pronunciou sobre excepção peremptória de conhecimento oficioso, ao não ter apreciado da alegada extemporaneidade da nota discriminativa de custas. Entendem, assim, existir omissão, causadora de nulidade, nos termos definidos pelo artigo 615º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil. Apreciando e decidindo. Da análise dos autos resulta que a nota discriminativa de custas relativamente à qual os Réus pretendem apresentar reclamação foi apresentada a 26/12/2019. Significa o que vem de dizer-se, por força do preceituado pelo artigo 11º, da Lei 27/2019, de 28/03, que a nota em causa foi apresentada aos autos em plena vigência do preceituado pelo artigo 26º-A, do Regulamento das Custas Processuais. Assim, quando os Réus dão início ao incidente de reclamação de tal nota, mostra-se em vigor a norma que impõe e regula a sua tramitação, no que respeita a prazo e condição para o seu exercício. É certo que a Lei 27/2019 não tem uma norma transitória sobre a aplicação do artigo 26.º-A, do Regulamento das Custas Processuais em relação a todos ou determinados processos. Também o é, contudo, que uma norma como aquela sobre que nos debruçamos – exigência de pagamento de um valor para que um incidente processual possa ser apreciado – é de aplicação imediata, tendo aplicação aos autos pendentes. Na verdade, ainda que o princípio da aplicação imediata das regras processuais não se encontre plasmada no Código de Processo Civil, a verdade é que a doutrina estabelecida, em termos genéricos, pelo artigo 12º, do Código Civil não pode deixar de se estender a este domínio. Assim, na área do processo, a ideia de que a lei dispõe para futuro significa que a lei se aplica às acções futuras e também aos actos futuros praticados nas acções pendentes. – Neste sentido, vide, Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio de Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2.ª Edição, página 49 e Acórdão do STJ, de 07/03/2014, com o número de processo 11119/02.3TVPRT.P1.S1, disponível in www.dgsi.pt. Em face do exposto, temos que o artigo 26º-A, do Regulamento das Custas Processuais (verdadeira alteração legislativa, na medida em que aditou ao Regulamento das Custas Processuais norma validamente legislada, a impor o pagamento que anteriormente era exigido por norma de uma Portaria, julgada organicamente inconstitucional) se aplica a todos os incidentes que se iniciem após a sua entrada em vigor, sejam eles praticados em processos instaurados antes ou depois dessa data de entrada em vigor. Tudo ponderado, resulta dos autos que, no momento em que os Réus apresentam a reclamação da nota discriminativa apresentada pelo Autor, estava já em vigor o artigo 26º-A, do Regulamento das Custas Processuais, o que significa que os Réus, para reclamarem da nota discriminativa, tinham que pagar a quantia correspondente à nota de que reclamam (o que os Réus não fizeram). Não tendo sido efectuado tal pagamento, não pode a reclamação ser apreciada em qualquer um dos seus aspectos, sendo que, consubstanciando o pagamento em causa uma condição de apreciação do requerido, não pode o Tribunal proceder a conhecimento oficioso de qualquer questão com essa reclamação relacionada. Apenas quando existe reclamação validamente deduzida é que a nota discriminativa passa a valer como pretensão da parte, susceptível de análise pelo Tribunal. Num caso em que a reclamação não pode sequer ser analisada por falta de cumprimento de uma condição, os valores que foram indicados pela parte mantêm-se numa esfera extrajudicial, não podendo o tribunal oficiosamente avaliar a situação. Não sendo admitida a reclamação, não se pode analisar qualquer dos seus fundamentos, sejam eles respeitantes aos valores que são peticionados, sejam reportados à tempestividade da apresentação da nota ou interpelação da contraparte para pagamento desses valores. Não compete ao tribunal analisar só parte da reclamação, arrumando num lado o que se reporta a valores e noutro o que se reporta a outras questões e analisar somente estas. Não se deve permitir que a reclamação tenha qualquer alcance sem o depósito do valor que se vem referindo; trata-se de uma pretensão global da reclamante que, querendo que seja apreciada, tem de cumprir aquele ónus de depósito; cumprido, o tribunal então tem de apreciar todas as questões que sejam suscitadas e sejam necessárias para uma correcta decisão. - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 09/01/2020, com o número de processo 9323/14.0T8PRT-A.P1, disponível in www.dgsi.pt. Em face do exposto, concluímos inexistir qualquer omissão de pronúncia no despacho sob reclamação de nulidade, na medida em que não tendo sido efectuado o pagamento devido, sempre se mostraria vedado a este Tribunal tomar conhecimento de qualquer um dos argumentos aduzidos pelo reclamante (…). Suscitam os Réus a sua notificação para proceder ao pagamento da nota devida. Não nos parece, s.m.o., que tal convite se justifique no caso dos autos. Primeiro que tudo, porque tal situação não se mostra prevista na lei; em segundo lugar porque não nos deparamos com uma situação de necessidade de aperfeiçoamento de uma peça processual ou da falta de um documento essencial ao conhecimento de uma excepção dilatória ou do mérito ( cfr. artigo 590º, n.º 2, n.º 3 e n.º 4, do Código de Processo Civil), mas sim de um ónus processual prévio à apreciação à apreciação do que se pretende e que a lei não prevê que possa ser ultrapassado de forma posterior ( na medida em que em nenhum momento a lei prevê a possibilidade de, no caso do depósito do valor da nota discriminativa não ter sido feito, a parte poder ver ser-lhe concedida uma nova oportunidade de pagamento. Concluímos, assim, pela falta de fundamento legal para a peticionada notificação para efectuar o depósito em causa. Em face de tudo quanto supra se deixa exposto, cotejado com o preceituado pelo artigo 615º, pelo artigo 613º, n.º 3 e pelo artigo 617º, todos do Código de Processo Civil, entendemos não se vislumbrar no despacho proferido qualquer erro material ou nulidade que mereça ser corrigido ou sanada. A mera discordância da valoração que se efectuou no que respeita aos normativos aplicáveis aos autos não integra nenhuma das causas taxativamente fixadas como consubstanciando a nulidade da sentença. Entendemos, assim, que nenhuma nulidade se verifica, mantendo-se, na íntegra, a decisão proferida (…)”. O recurso foi admitido liminarmente com efeito devolutivo. * Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. * 2. Questões a decidir: Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC - sem prejuízo das questões de que o tribunal deva conhecer oficiosamente e apenas estando adstrito a conhecer das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso - , as únicas questões a decidir são as seguintes: A) Saber se a decisão recorrida, ao não se pronunciar sobre a questão da extemporaneidade da apresentação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte pelo Autor, enferma de nulidade, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil? B) Saber se ocorre causa para revogação da decisão, por não atuação do dever de gestão processual? C) Saber se é materialmente inconstitucional a norma constante do n.º 2 do artigo 26.º-A do Regulamento das Custas Processuais, na parte em que obriga ao depósito da totalidade do valor da nota reclamada, por violação do disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, por obstaculizar o direito dos particulares de acesso ao Direito e por restringir indevidamente o espaço da necessária intervenção do juiz? * 3. Enquadramento fáctico: São elementos processuais relevantes para a apreciação do recurso os elencados no relatório. * 4. Enquadramento jurídico: * A) Saber se a decisão recorrida, ao não se pronunciar sobre a questão da extemporaneidade da apresentação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte pelo Autor, enferma de nulidade, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil? Alegam os apelantes que, “tendo sido invocada a intempestividade da apresentação da nota de custas de parte, não estavam obrigados a depositar o valor total da nota, sob pena de tal conduzir a soluções manifestamente iníquas, desde logo por se impor um ónus demasiado severo para se invocar a excepção peremptória. A decisão proferida deixou de se pronunciar sobre questões que devia apreciar (extemporaneidade da apresentação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte pelo Autor), pelo que enferma de nulidade (artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil)”. Cumpre apreciar: A questão que vem colocada implica saber se o Tribunal recorrido deveria conhecer oficiosamente da invocada caducidade da apresentação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte, ou se, ao invés, tal não sucedia. Vejamos, como se configura o regime legal da apresentação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte e como se insere esta componente das custas no regime jurídico legal vigente. Dispõe o artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (abreviadamente, CPC) que: “A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.” As custas assumem a natureza de contrapartida ou taxa paga pelo utilizador do aparelho judiciário, reduzindo os custos do seu funcionamento no âmbito do Orçamento Geral do Estado (assim, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª edição, pág. 418; Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República de 19-04-2012). As custas em sentido amplo abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte - cf. art. 529º, n.º 1 do CPC. A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa (cf. n.º 2 do art. 529º), ou seja, nos termos do Regulamento das Custas Processuais (abreviadamente, RCP), conforme o disposto nos seus artigos 5.º a 7.º, 11.º, 13.º a 15.º e das tabelas I e II anexas. Daqui se retira que o impulso processual do interessado o elemento que implica o pagamento da taxa de justiça e corresponde à prática do acto de processo que dá origem a “núcleos relevantes de dinâmicas processuais” como a acção, a execução, o incidente, o procedimento cautelar e o recurso (assim, Salvador da Costa, As Custas Processuais - Análise e Comentário, 7ª edição, pág. 15). Nos termos do artigo 529.º, n.º 3, do CPC, os encargos são as despesas resultantes da condução do processo correspondentes às diligências requeridas pelas partes ou ordenadas pelo juiz, cujo regime consta essencialmente dos artigos 16.º a 20.º, 23.º e 24.º do RCP. De acordo com o disposto no art.º 529.º, n.º 4 do CPC, as custas de parte compreendem ao que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária nos termos do Regulamento – cfr. artigos 25.º, 26.º e 30.º a 33.º do RCP e Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de Abril. Envolvem, por exemplo, as quantias que a parte vencedora, na respectiva proporção, despendeu a título de encargos, de taxa de justiça e de patrocínio a advogados. A taxa de justiça deve ser paga no momento do respectivo impulso processual, em uma ou duas prestações (cf. art.ºs 13º e 14º do RCP), por meio de autoliquidação da parte, para o que esta deverá socorrer-se das tabelas anexas ao diploma e, no caso de processo cuja taxa seja variável, a parte liquidará a taxa pelo seu valor mínimo, pagando o excedente, se o houver, a final (cf. art.º 6º, n.º 6 do RCP). A conjugação do disposto no art.º 527.º, n.ºs 1 e 2 com o n.º 6 do art.º 607.º e no n.º 2 do artigo 663.º do CPC permite concluir que a responsabilidade pelo pagamento dos encargos e das custas de parte assenta no critério do vencimento ou decaimento na causa, ou, não havendo vencimento, no critério do proveito, mas tal não sucede quanto à taxa de justiça. Na verdade, em conformidade com o acima referido, a responsabilidade pelo pagamento da taxa de justiça decorre automaticamente do respectivo impulso processual, por via, por exemplo, de petição inicial, contestação, requerimento de interposição de recurso, contra-alegação, requerimento de incidente ou de oposição, portanto, independentemente do decaimento ou do vencimento na causa. Assim, nos termos do n.º 1 do art.º 530.º do CPC, a taxa de justiça só é devida, incluindo a remanescente, em função do impulso processual da parte que demande na qualidade de autor ou de réu, de exequente ou de executado, de requerente ou requerido, de recorrente ou recorrido. Sobre as custas de parte estabelece o artigo 533.º do CPC o seguinte: “1 - Sem prejuízo do disposto no n.º 4, as custas da parte vencedora são suportadas pela parte vencida, na proporção do seu decaimento e nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais. 2 - Compreendem-se nas custas de parte, designadamente, as seguintes despesas: a) As taxas de justiça pagas; b) Os encargos efetivamente suportados pela parte; c) As remunerações pagas ao agente de execução e as despesas por este efetuadas; d) Os honorários do mandatário e as despesas por este efetuadas. 3 - As quantias referidas no número anterior são objeto de nota discriminativa e justificativa, na qual devem constar também todos os elementos essenciais relativos ao processo e às partes. 4 - O autor que, podendo recorrer a estruturas de resolução alternativa de litígios, opte pelo recurso ao processo judicial, suporta as suas custas de parte independentemente do resultado da ação, salvo quando a parte contrária tenha inviabilizado a utilização desse meio de resolução alternativa do litígio. 5 - As estruturas de resolução alternativa de litígios referidos no número anterior constam de portaria do membro do Governo responsável pela área da justiça.”. E, relativamente à exigibilidade do seu valor, estatui o art.º 25.º do RCP, na redacção vigente decorrente do D.L. n.º 86/2018, de 26 de outubro, o seguinte: “1 - Até 10 dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respetiva nota discriminativa e justificativa, sem prejuízo de esta poder vir a ser retificada para todos os efeitos legais até 10 dias após a notificação da conta de custas. 2 - Devem constar da nota justificativa os seguintes elementos: a) Indicação da parte, do processo e do mandatário ou agente de execução; b) Indicação, em rubrica autónoma, das quantias efectivamente pagas pela parte a título de taxa de justiça; c) Indicação, em rubrica autónoma, das quantias efectivamente pagas pela parte a título de encargos ou despesas previamente suportadas pelo agente de execução; d) Indicação, em rubrica autónoma, das quantias pagas a título de honorários de mandatário ou de agente de execução, salvo, quanto às referentes aos honorários de mandatário, quando as quantias em causa sejam superiores ao valor indicado na alínea c) do n.º 3 do artigo 26.º; e) Indicação do valor a receber, nos termos do presente Regulamento. 3 - O patrocínio de entidades públicas por licenciado em direito ou em solicitadoria com funções de apoio jurídico equivale à constituição de mandatário judicial, para efeitos de compensação da parte vencedora a título de custas de parte. 4 - Na acção executiva, a liquidação da responsabilidade do executado compreende as quantias indicadas na nota discriminativa, nos termos do número anterior”. Antes desta redação a parte inicial do n.º 1 referia 5 dias em vez dos atuais 10. As custas de parte não se incluem na conta de custas, devendo a parte que tenha direito a custas de parte enviar para o tribunal e para a parte vencida a respectiva nota discriminativa e justificativa, “nos termos e prazos previstos no art.º 25º do RCP” - arts. 30.º e 31.º da Portaria 419-A/2009, de 17 de abril. A sentença transitada em julgado, a nota de custas de parte e a interpelação para o pagamento à parte vencida, determina a possibilidade de execução pelo valor das custas de parte, nos termos do artigo 626.º do CPC, como decorre do artigo 35.º, n.º 5, do RCP. Como refere José António Coelho Carreira (Regulamento das Custas Processuais, anotado, Almedina, 2.ª ed., 2018, p. 335), “a remessa da nota ao tribunal apenas pode ser justificada pelo facto do juiz poder, oficiosamente, ordenar a sua reforma, quando não tenha sido elaborada de harmonia com as disposições legais, aplicando-se analogamente o disposto no artigo 31.º nº 2, do Regulamento”. Segundo referia Salvador da Costa, a respeito da pretérita redação do preceito (As Custas Processuais, Almedina, 7.ª edição, p. 224), a “omissão pela parte vencedora da remessa da nota de custas de parte à parte vencida no quinquídio posterior [sendo que, era de 5 dias o prazo previsto no artigo 25.º, n.º 1, do RCP, na redação anterior à do mencionado D.L. n.º 86/2018] ao trânsito em julgado da decisão final, implica a extinção por caducidade do direito de crédito da primeira, sem prejuízo de a última lho reconhecer ou optar por não excepcionar a sua extinção”. A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ou de reclamação por força do artigo 628.º do CPC. Assim, terminadas que estejam as possibilidades de interposição de recurso ordinário ou findo o prazo de 10 dias – cfr. artigo 149.º do CPC - para a arguição de nulidades ou para o pedido de reforma do acórdão, nos termos do nº 4, do artigo 615.º do CPC e do n.º 1, do artigo 616.º do mesmo Código (aplicáveis aos acórdãos da Relação por via do disposto no art. 666.º do CPC), verifica-se a previsão do n.º 1 do artigo 25.º do RCP. Contudo, a interpretação do preceito não tem sido isenta de dificuldades, existindo decisões jurisprudenciais de sentido diverso, designadamente, no âmbito da redação do preceito anterior à conferida pelo DL n.º 86/2018, de 29 de outubro. Assim, no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 10-09-2015 (Pº 1100/11.7TBABT-A.E1, rel. ASSUNÇÃO RAIMUNDO) concluiu-se que “o «dies a quo» da contagem do prazo de apresentação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte é o correspondente ao do trânsito em julgado da decisão final”. Por seu turno, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14-06-2017 (Pº 462/06.2TBLSD-C.P1, rel. ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA) considerou-se que, “a ultrapassagem do prazo do n.º 1 do art. 25.º do RCP para a apresentação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte não gera nem a caducidade do direito a reclamar as custas de parte nem a prescrição do correspondente direito de crédito, mas apenas a preclusão do acto processual de apresentação da nota no próprio processo a que respeitam as custas de parte para efeitos de o pagamento se processar nos termos do incidente previsto no RCP. Essa preclusão não impede o credor das custas de parte de reclamar o seu pagamento nos termos gerais da lei de processo, designadamente através de uma acção executiva. O título executivo dessa execução será composto, em conjunto, pela sentença condenatória nas custas e pela nota discriminativa e justificativa das custas de parte, a qual deve por isso ser elaborada, nos termos previsto no RCP, independentemente de estar esgotado prazo do n. 1 do art. 25º”. No Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 07-12-2017 (Pº 1359/06.1TBFAF-B.G1, rel. JOÃO DIOGO RODRIGUES) concluiu-se, por seu turno, que “o prazo para a apresentação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte, previsto no artigo 25.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais, é um prazo processual. Por isso mesmo, esgotado esse prazo, que está sujeito ao regime previsto no artigo 138.º, n.ºs 1 a 3, do Código de Processo Civil, a parte vencedora perde o direito de operar a liquidação das suas custas de parte nos termos regulamentados, mas não perde o seu crédito por essas custas, que continua a pode fazer valer em sede executiva”. Por sua vez, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07-12-2018 (Pº 5696/13.0YYPRT-C.P1, rel. JOSÉ IGREJA MATOS) entendeu-se que: “I - Nos termos do artigo 25.º, nº 1 do Regulamento das Custas Processuais, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida, a respectiva nota discriminativa e justificativa até cinco dias após o trânsito em julgado da sentença condenatória. II - Tal prazo assume natureza imperativa sem prejuízo de uma vez apresentada a nota a mesma poder alvo de aditamentos caso as circunstâncias do caso concreto assim o determinem. III - Caso a nota seja apresentada após o decurso do referido prazo o credor das custas de parte poderá reclamar o seu pagamento através de uma acção executiva”. Por seu turno, no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05-11-2018 (Pº 375/11.6TYVNG-D.P1, rel. FÁTIMA ANDRADE) concluiu-se que: “I - A lei fixa o termo final do prazo para a apresentação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte com referência ao trânsito em julgado da decisão. II - O “dies a quo” ficou por definir. III - Contudo tem vindo a entender-se que nada impede a apresentação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte uma vez que seja proferida a decisão. Pelo que a apresentação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte a que alude o art.º 25.º do RCP após a prolação da decisão que absolveu a parte da instância, mas antes do respectivo trânsito, tem-se por tempestiva”. Por sua vez, no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 28-03-2019 (Pº 2524/13.0TBVCT.G2-A, rel. MARIA PURIFICAÇÃO CARVALHO) entendeu-se o seguinte: “1. As custas de parte que são integradas pelas despesas que as partes se vêm compelidas a suportar com vista a haverem o benefício do impulso processual necessário ao natural desenvolvimento da lide e ao proferimento, no respetivo seu âmbito, da ou das decisões que à mesma caibam. Pois bem, estes dispêndios das partes litigantes haverão de, no final do pleito, ser restituídos: pela parte que tenha decaído à parte que tenha tido ganho de causa e que, para a ter, se tenha visto na necessidade de os suportar. 2. A compensação dos encargos abrangidos pelas custas de parte fica dependente de intervenção da parte vencedora desse mesmo reembolso, que tem de apresentar à parte devedora a “nota justificativa” prevista no artigo 25.º do RCP. 3. É no exato momento em que a sentença que condene uma das partes (ou ambas) em custas é proferida que efetivamente nasce o direito ao reembolso das custas de parte a favor de quem tenha ganho de causa, e a inerente obrigação de pagamento das custas de parte à parte vencedora, obrigação esta a cargo, naturalmente, da parte que tenha decaído. 4. O decurso do prazo de 5 dias previsto no artº 25 do RCP sem a apresentação da nota preclude a possibilidade de praticar esse ato processual, isto é, apenas, de desencadear, no âmbito do próprio processo a que respeitam as custas, tal incidente, mas não preclude a possibilidade de o direito de crédito correspondente ser exercido nos termos gerais da legislação processual, isto é, pela via executiva. Por seu turno, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-10-2019 (Pº 32063/15.9T8LSB-A.L1, rel. VAZ GOMES) referenciou-se que “o termo a quo é o de 10 dias e, naturalmente, só pode ser contado a partir do trânsito em julgado da decisão, pois é esse o sentido da preposição após que, estando em causa o tempo, é sinónimo de “depois do tempo necessário para o trânsito em julgado da decisão”, só a partir de então a decisão obtém a necessária segurança jurídica que justifica a interpelação da parte vencedora à parte vencida para pagar as despesas que suportou em razão da lide, sendo o termo ad quem definido pela preposição até, seja o 10.º dia após o trânsito, é esse o sentido que decorre linearmente de uma interpretação literal que nenhum outra o preceito parece viabilizar”. Nesse Acórdão foi lavrado voto de vencido (des. PEDRO MARTINS), onde se explanou o seguinte: “O art. 25/1 do RCP fala na remessa da nota discriminativa e justificativa até 10 dias após o trânsito. Trata-se de um termo final. Nada se diz desde quando é que a nota pode ser enviada: a parte ‘após o trânsito’ não é um termo inicial mas a referência para o termo final. Assim sendo, o envio antes do trânsito pode eventualmente prejudicar a parte que envia a nota, se não a corrigir, depois, atempadamente, mas em nada prejudica a parte contrária (o prazo para a eventual reclamação contra o seu conteúdo, começará a contar, naturalmente, do termo final referido acima). Não se pode, pois, considerar que a nota é extemporânea, pelo que se devia manter nos autos. Neste sentido, por exemplo, o ac. do TRC de 08/03/2016, proc. 224/09.5TBCBR-B.C1, o qual ainda acrescenta: “ainda que se considerasse que o art. 26/1 do RCP, contém, não só, o termo final, mas, também, o momento inicial do prazo para apresentação da nota discriminativa, a lei atribui efeitos perentórios, em princípio, apenas ao excesso e não à antecipação do prazo, como vem sendo assumido na jurisprudência. Do art. 139/3 do CPC (anterior art. 145/3), que determina que o decurso do prazo perentório extingue o direito de praticar o acto – impedindo a sua prática uma vez ele decorrido –, não se pode retirar que o acto não possa ser praticado antes de tal prazo se iniciar (independentemente da apreciação do mesmo por parte do tribunal ter de aguardar, nalguns casos, pelo decurso de tal prazo [no mesmo sentido o ac. do TRC invoca os acs. do TRL de 13/10/2005, proc. 7210/2005-6, e de 02/07/1992, proc. 0063502]. A decisão singular recorrida invoca ainda outro acórdão a favor da admissibilidade da nota: ac. do TRP de 05/11/2018, proc. 375/11.6TYVNG-D.P1. O acórdão que fez vencimento não rebate a posição de nenhum destes dois acórdãos, apesar de referidos pela decisão recorrida, e invoca dois que iriam no sentido que fez vencimento. Mas não é assim, porque nenhum dos dois acórdãos invocados trata da questão da nota ter sido apresentada antes do tempo (a entender-se que o foi…). No caso do ac. do TRL de 16/3/2017 proc. 587/08.0TVLSB.L2-2, a nota foi apresentada depois do trânsito; e no caso do ac. do TRL de 09/05/2013, 5734/09.1TVLSB-A.L1-6, a nota foi apresentada muito depois.”. Finalmente, importa reter, sobre os termos da reclamação sobre a nota discriminativa e justificativa de custas de parte, o disposto no artigo 26.º-A do RCP. Este preceito legal - que reproduz o artigo 33.º da Portaria nº 419-A/2009, de 17 de abril - foi aditado pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março e visou ultrapassar os problemas de inconstitucionalidade orgânica do nº 2 deste artigo, declarada, com força obrigatória geral, pelo Ac. do TC nº 280/2017, de 06-06-2017. A referida Lei n.º 27/2019, de 28 de março entrou em vigor em 27-04-2019 (cfr. artigo 11.º), sendo aplicável ao caso dos autos, em que o acto de contagem e a emissão de nota de custas de parte são ulteriores à referida entrada em vigor (cfr., neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 27-02-2020, Pº 502/14.1T8PTG-A.E1, rel. MÁRIO SILVA). No citado artigo 26.º-A do RCP dispõe-se que: “1 - A reclamação da nota justificativa é apresentada no prazo de 10 dias, após notificação à contraparte, devendo ser decidida pelo juiz em igual prazo e notificada às partes. 2 - A reclamação da nota justificativa está sujeita ao depósito da totalidade do valor da nota. 3 - Da decisão proferida cabe recurso em um grau se o valor da nota exceder 50 UC. 4 - Para efeitos de reclamação da nota justificativa são aplicáveis subsidiariamente, com as devidas adaptações, as disposições relativas à reclamação da conta constantes do artigo 31.º”. Assim, a reclamação da nota de custas de parte está sujeita ao depósito da totalidade do seu valor. O legislador, repensando a problemática atinente, optou por manter a regra do regime pretérito (do referido n.º 2, do artigo 33.º da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril), facto que não merece, em si mesmo, censura, claro está, sem prejuízo da oportuna aferição da questão de inconstitucionalidade suscitada pelos recorrentes. Tecidas estas considerações, cumpre aferir se o Tribunal recorrido ao não conhecer da questão da tempestividade da apresentação da nota de custas de parte, incorreu em nulidade, nos termos da al. d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC. Nos termos do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, relativo às causas de nulidade da sentença (sendo aplicável aos autos de oposição iniciados em 2011, o CPC de 1961, atento o disposto no artigo 6.º, n.º 4, da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, enquanto que, às normas que regem a tramitação do presente recurso, inclusive no tocante ao conhecimento de nulidades da decisão, se aplica o CPC na redacção conferida pela mencionada Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, atenta a data em que foi proferida a sentença recorrida – cfr. neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05-05-2014, proferido no processo 1869/09.9TBVRL-F.P1, relator MANUEL DOMINGOS FERNANDES), uma sentença é nula quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. Vejamos se, no caso, o juiz deixou de se pronunciar sobre questões de que devesse conhecer ou se se pronunciou indevidamente sobre uma questão de que não podia tomar conhecimento, sabendo-se que, é «frequente a enunciação nas alegações de recurso de nulidades da sentença, numa tendência que se instalou e que a racionalidade não consegue explicar, desviando-se do verdadeiro objecto do recurso que deve ser centrado nos aspectos de ordem substancial. Com não menos frequência a arguição de nulidades da sentença acaba por ser indeferida, e com toda a justeza, dado que é corrente confundir-se o inconformismo quanto ao teor da sentença com algum dos vícios que determinam tais nulidades», (assim, Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, pág. 132). Apenas existirá nulidade da sentença por pronúncia indevida ou por omissão de pronúncia com referência às questões objecto do processo, não com atinência a todo e qualquer argumento esgrimido pela parte. A nulidade por omissão de pronúncia supõe o silenciar, em absoluto, por parte do tribunal sobre qualquer questão de cognição obrigatória, isto é, que a questão tenha passado despercebida ao tribunal, já não preenchendo esta concreta nulidade a decisão sintética e escassamente fundamentada a propósito dessa questão (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01-03-2007, Processo 07A091, relator SEBASTIÃO PÓVOAS). Caso o tribunal se pronuncie quanto às questões que lhe foram submetidas, isto é, sobre todos os pedidos, causas de pedir e exceções que foram suscitadas, ainda que o faça genericamente, não ocorre o vício da nulidade da sentença, por omissão de pronúncia. Poderá, todavia, existir mero erro de julgamento, atacável em via de recurso, onde caso assista razão ao recorrente, se impõe alterar o decidido, tornando-o conforme ao direito aplicável. A nulidade da sentença (por omissão ou excesso de pronuncia) há de, assim, resultar da violação do dever prescrito no n.º 2 do referido artigo 608º do Código de Processo Civil do qual resulta que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. A questão a decidir pelo julgador está diretamente ligada ao pedido e à respetiva causa de pedir, não estando o juiz obrigado a apreciar e a rebater cada um dos argumentos de facto ou de direito que as partes invocam com vista a obter a procedência da sua pretensão, ou a pronunciar-se sobre todas as considerações tecidas para esse efeito. O que o juiz deve fazer é pronunciar-se sobre a questão que se suscita apreciando-a e decidindo-a segundo a solução de direito que julga correta. De acordo com o nº 2 do art. 608º do CPC,“o juiz resolve todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”, pelo que, não se verifica omissão de pronúncia quando o não conhecimento de questões fique prejudicado pela solução dada a outras, sendo certo que, o dever de pronúncia obrigatória é delimitado pelo pedido e causa de pedir e pela matéria de exceção. “O dever imposto no nº 2, do artigo 608º diz respeito ao conhecimento, na sentença, de todas as questões de fundo ou de mérito que a apreciação do pedido e da causa de pedir apresentadas pelo autor (ou, eventualmente, pelo réu reconvinte) suscitam. Só estas questões é que são essenciais à solução do pleito e já não os argumentos, razões, juízos de valor ou interpretação e aplicação da lei aos factos. Para que este dever seja cumprido, é preciso que haja identidade entre a causa petendi e a causa judicandi, entre a questão posta pelas partes e identificada pelos sujeitos, pedido e causa de pedir e a questão resolvida pelo juiz” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 15-03-2018, Processo nº 1453/17.3T8BRG.G1, relatora EUGÉNIA CUNHA). Assim, “importa distinguir entre os casos em que o tribunal deixa de pronunciar-se efetivamente sobre questão que devia apreciar e aqueles em que esse tribunal invoca razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção, sendo coisas diferentes deixar de conhecer a questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte, por não ter o tribunal de esgotar a análise da argumentação das partes, mas apenas que apreciar todas as questões que devam ser conhecidas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 25-03-2019, Processo 226/16.5T8MAI-E.P1, relator NELSON FERNANDES). Na realidade, como se referiu no Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 28-09-2011 (P.º n.º 480/09.9JALRA.C1, relator ORLANDO GONÇALVES): “1.- A nulidade de sentença por omissão de pronúncia refere-se a questões e não a razões ou argumentos invocados pela parte ou pelo sujeito processual em defesa do seu ponto de vista. 2.- O que importa é que o tribunal decida a questão colocada e não que tenha que apreciar todos os fundamentos ou razões que foram invocados para suporte dessa pretensão”. Se a decisão não faz referência a todos os argumentos invocados pela parte tal não determina a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, sendo certo que a decisão tomada quanto à resolução da questão poderá muitas vezes tornar inútil o conhecimento dos argumentos ou considerações expendidas, designadamente por opostos, irrelevantes ou prejudicados em face da solução adotada. No caso em apreço, no despacho de 11-02-2020, o Tribunal recorrido referiu que “configurando o referido depósito [do valor da nota de custas de parte] uma condição a que a reclamação se encontra sujeita e não estando tal depósito comprovado nos autos, por inadmissível, não conheço da reclamação apresentada”. Assume-se, pois, o não conhecimento da reclamação na decorrência da ausência de depósito do valor correspondente à nota reclamada. Ora, conforme explanou o Tribunal recorrido, no despacho de 03-07-2020, não se afigura que tenha sido omitida pronúncia sobre questão que devesse ser objeto de decisão: “(…) resulta dos autos que, no momento em que os Réus apresentam a reclamação da nota discriminativa apresentada pelo Autor, estava já em vigor o artigo 26º-A, do Regulamento das Custas Processuais, o que significa que os Réus, para reclamarem da nota discriminativa, tinham que pagar a quantia correspondente à nota de que reclamam (o que os Réus não fizeram). Não tendo sido efectuado tal pagamento, não pode a reclamação ser apreciada em qualquer um dos seus aspectos, sendo que, consubstanciando o pagamento em causa uma condição de apreciação do requerido, não pode o Tribunal proceder a conhecimento oficioso de qualquer questão com essa reclamação relacionada. Apenas quando existe reclamação validamente deduzida é que a nota discriminativa passa a valer como pretensão da parte, susceptível de análise pelo Tribunal. Num caso em que a reclamação não pode sequer ser analisada por falta de cumprimento de uma condição, os valores que foram indicados pela parte mantêm-se numa esfera extrajudicial, não podendo o tribunal oficiosamente avaliar a situação. Não sendo admitida a reclamação, não se pode analisar qualquer dos seus fundamentos, sejam eles respeitantes aos valores que são peticionados, sejam reportados à tempestividade da apresentação da nota ou interpelação da contraparte para pagamento desses valores. Não compete ao tribunal analisar só parte da reclamação, arrumando num lado o que se reporta a valores e noutro o que se reporta a outras questões e analisar somente estas. Não se deve permitir que a reclamação tenha qualquer alcance sem o depósito do valor que se vem referindo; trata-se de uma pretensão global da reclamante que, querendo que seja apreciada, tem de cumprir aquele ónus de depósito; cumprido, o tribunal então tem de apreciar todas as questões que sejam suscitadas e sejam necessárias para uma correcta decisão. - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 09/01/2020, com o número de processo 9323/14.0T8PRT-A.P1, disponível in www.dgsi.pt. Em face do exposto, concluímos inexistir qualquer omissão de pronúncia no despacho sob reclamação de nulidade, na medida em que não tendo sido efectuado o pagamento devido, sempre se mostraria vedado a este Tribunal tomar conhecimento de qualquer um dos argumentos aduzidos pelo reclamante. Suscitam os Réus a sua notificação para proceder ao pagamento da nota devida. Não nos parece, s.m.o., que tal convite se justifique no caso dos autos. Primeiro que tudo, porque tal situação não se mostra prevista na lei; em segundo lugar porque não nos deparamos com uma situação de necessidade de aperfeiçoamento de uma peça processual ou da falta de um documento essencial ao conhecimento de uma excepção dilatória ou do mérito ( cfr. artigo 590º, n.º 2, n.º 3 e n.º 4, do Código de Processo Civil), mas sim de um ónus processual prévio à apreciação à apreciação do que se pretende e que a lei não prevê que possa ser ultrapassado de forma posterior ( na medida em que em nenhum momento a lei prevê a possibilidade de, no caso do depósito do valor da nota discriminativa não ter sido feito, a parte poder ver ser-lhe concedida uma nova oportunidade de pagamento. Concluímos, assim, pela falta de fundamento legal para a peticionada notificação para efectuar o depósito em causa. Em face de tudo quanto supra se deixa exposto, cotejado com o preceituado pelo artigo 615º, pelo artigo 613º, n.º 3 e pelo artigo 617º, todos do Código de Processo Civil, entendemos não se vislumbrar no despacho proferido qualquer erro material ou nulidade que mereça ser corrigido ou sanada. A mera discordância da valoração que se efectuou no que respeita aos normativos aplicáveis aos autos não integra nenhuma das causas taxativamente fixadas como consubstanciando a nulidade da sentença (…).”. E, pode entender-se, como se fez no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-09-2020 (Pº 249/19.2T8FNC.L1-7, rel. CRISTINA COELHO) que “o incidente de reclamação da nota discriminativa e justificativa das custas de parte só se inicia com a apresentação da reclamação à nota de custas, que impõe a apreciação pelo juiz. Não havendo reclamação, ao tribunal não compete pronunciar-se sobre a nota discriminativa e justificativa de custas de parte, seja quanto ao seu conteúdo, seja quanto à sua tempestividade”. A questão da nulidade suscitada foi analisada em tal aresto nos seguintes termos: “1. Começam os apelantes por sustentar que o despacho recorrido é nulo, por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, al. d) do CPC, por o tribunal recorrido não ter apreciado da tempestividade da nota discriminativa e justificativa das custas de parte, exceção perentória de conhecimento oficioso, e uma vez que, tendo “no incidente de liquidação de custas de parte, o Tribunal a quo se limitado a não admitir a reclamação da nota discriminativa apresentada pelos recorrentes, está inevitavelmente a admitir a nota discriminativa e justificativa de custas de parte apresentada pela recorrida, quando esta é intempestiva” (…). No caso sub judice e como resulta do relatório, a R. apresentou nota discriminativa e justificativa de custas de parte, da qual os AA. reclamaram, não tendo o tribunal recorrido admitido a reclamação por falta do depósito da totalidade do valor da nota. Sustentam os AA./apelantes que ao decidir como decidiu, o tribunal recorrido está, inevitavelmente, a admitir a nota discriminativa e justificativa apresentada pela R./apelada, sem que apreciasse da sua tempestividade, como estava obrigado a fazer, não conhecendo de exceção perentória de conhecimento oficioso. Para que se verifique a nulidade apontada ao despacho recorrido, é necessário que se conclua que o tribunal recorrido omitiu pronúncia sobre matéria de conhecimento oficioso. Não sufragamos tal entendimento, por entendermos que ao juiz só compete pronunciar-se sobre a nota discriminativa e justificativa de custas de parte se for apresentada reclamação da mesma. É certo que o nº 4 do art. 26º-A do RCP (…) manda aplicar, subsidiariamente, com as devidas adaptações, para efeitos de reclamação da nota justificativa, as disposições relativas à reclamação da conta constantes do artigo 31º, o qual estatui, no nº 2, que “oficiosamente, a requerimento do Ministério Público ou dos interessados, o juiz mandará reformar a conta se esta não estiver de harmonia com as disposições legais”. Já em anotação ao nº 4 do art. 33º da Portaria nº 419-A/2009, de 17.04, escrevia Salvador da Costa, em As Custas Processuais, Análise e Comentário, 6ª ed., pág. 323, que “há quem interprete este normativo no sentido da aplicação à reclamação da nota de custas de parte, subsidiariamente, o disposto no nº 4 do artigo 31º do RCP, concernente à reclamação da conta. Na realidade, tendo em conta a estrutura da reclamação da conta e a da nota justificativa das custas de parte, não se vislumbra a possibilidade de aplicação, subsidiária de algumas das normas do artigo 31º do RCP, salvo a da primeira parte da alínea a) do nº 3”. E após a publicação da Lei nº 27/2019, de 28.3, pronunciou-se o referido autor, em artigo intitulado ALTERAÇÃO DO REGIME DAS CUSTAS PELA LEI Nº 27/2019, DE 28 DE MARÇO, consultável no blog do IPPC, no sentido referido, acrescentando que “…, não tem apoio legal o entendimento, com base no normativo ora em análise, no sentido de que a nota de custas de parte é suscetível de correção ou de reforma oficiosa, além do mais, porque aquele normativo remissivo não se reporta ao da reforma oficiosa da conta que consta do nº 2 do artigo 31º deste diploma”. Por outro lado, o fundamento da remessa da nota discriminativa e justificativa das custas de parte também ao tribunal, prende-se, apenas, com o estabelecido nos arts. 540º do CPC e 29º, nº 2 da Portaria 419º-A/2009, de 17.4 (…). Neste sentido, em anotação ao art. 31º da mencionada Portaria (…), escreve Salvador da Costa, na ob. cit., pág. 319, que “Dele resulta que a parte vencedora deve enviar, para o tribunal e para a parte vencida, a referida nota discriminativa e justificativa. Aparentemente visa regular o disposto no artigo 25º, nº 1, mas dele reproduz algumas normas. A remessa para o tribunal, pela parte vencedora, da aludida nota, visa prevenir, ao que parece, a hipótese de a primeira requerer naquela nota que as suas custas de parte sejam pagas por via do remanescente a devolver à parte vencida, ou de os seus mandatários judiciais ou técnicos requererem o pagamento dos honorários, despesas ou adiantamentos por via do crédito de custas de parte dela no confronto com a parte vencida (arts. 29º, nºs 2 e 3; e 540º do CPC)”. Nesta perspetiva, o incidente em causa só se inicia com a apresentação da reclamação à nota de custas, que impõe a apreciação pelo juiz. Não havendo reclamação, ao tribunal não compete pronunciar-se sobre a nota discriminativa e justificativa de custas de parte, seja quanto ao seu conteúdo, seja quanto à sua tempestividade (com interesse sobre esta matéria, cfr. o Ac. da RP de 9.1.2020, P. 9323/14.0T8PRT-A.P1 (João Venande), em www.dgsi.pt). Não estava, pois, o tribunal, obrigado a apreciar, oficiosamente, da tempestividade da nota discriminativa e justificativa de custas de parte apresentada pela R., e perante a rejeição da reclamação apresentada, pelo que se conclui não padecer o despacho recorrido da nulidade invocada”. Poderia argumentar-se, no caso dos autos, que a situação é diversa da do acórdão ora citado, por a reclamante ter efetivamente apresentado reclamação e que esta, nesta perspetiva, justificaria a apreciação da questão da tempestividade pelo Tribunal. Não procede, contudo, tal argumentação. É que, parece-nos claro que o caso em que seja apresentado requerimento no qual se invoque a intempestividade da apresentação da nota de custas de parte é diametralmente diverso do caso em que tal questão não é suscitada nos autos. Mas, no primeiro caso – em que foi apresentado requerimento para apreciação da questão da tempestividade da nota de custas de parte, haverá que distinguir duas situações: Se a questão da tempestividade da apresentação da nota de custas de parte é a única questão a decidir, pode admitir-se que o prévio depósito integral do valor da nota pode constituir um ónus desadequado à apreciação dessa única questão, que seria de oficioso conhecimento, em conformidade com o disposto no artigo 608.º, n.º 2, do CPC (foi este o entendimento expresso no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 09-02-2017, Pº 473/10.3TBVRL-B.G1, rel. MARIA CRISTINA CERDEIRA, onde se concluiu que “tendo a Autora, na sua reclamação, invocado apenas a intempestividade da apresentação da nota discriminativa de custas de parte, não estava obrigada a depositar o valor total da nota, sob pena de tal conduzir a soluções manifestamente iníquas, desde logo por se impor um ónus demasiado severo para se invocar a excepção peremptória.); contudo, já se a questão da tempestividade é uma entre outras questões que a reclamante suscita na apreciação complexa da reclamação apresentada, a condição de depósito integral do valor da nota, a que se reporta o n.º 2 do artigo 26.º-A do RCP deve verificar-se e condiciona a apreciação do julgador (cfr. o mencionado Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 09-02-2017, concluindo que “o depósito da totalidade da nota discriminativa e justificativa de custas de parte apenas se impõe quando, cumulativamente, tal nota é tempestiva e a contraparte apresenta reclamação que versa concretamente sobre os valores peticionados, nos termos do artº. 33º, nº. 2 da Portaria nº. 419-A/2009 de 17/4, na redacção introduzida pela Portaria nº. 82/2012 de 29/03.”). No caso, os reclamantes arguiram a intempestividade da nota de custas de parte, mas invocaram igualmente diversos vícios na referida nota visando promover a intervenção judicial para apreciação dos mesmos. Dado que, para tal, não lograram os recorrentes verificar a condição de depósito acima referenciada, o conhecimento da questão da tempestividade (inserido na reclamação) pelo julgador ficou prejudicado, sem que mereça censura a decisão recorrida. Ou seja: Conforme se afirmou no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-09-2020 (Pº 249/19.2T8FNC.L1-7, rel. CRISTINA COELHO), “tendo em conta que o tribunal só aprecia as questões suscitadas se a reclamação for admissível por satisfizer os requisitos legais, nomeadamente o pagamento exigido no nº 2 do art. 26º-A do RCP, não se mostrando este cumprido, não incumbia ao tribunal apreciar os fundamentos invocados na reclamação”. Nestes termos, não ocorre nulidade por omissão de pronúncia (artigo 615.º, n.º 1, al. d) do CPC) se a decisão recorrida aprecia da causa que determina o não conhecimento da reclamação e dela não conhece, em razão de não se encontrar satisfeito o depósito a que se reporta o mencionado artigo 26.º-A, n.º 2, do RCP. * B) Saber se ocorre causa para revogação da decisão, por não atuação do dever de gestão processual? Alegaram ainda os recorrentes que, “no mínimo, devia o Tribunal a quo, ao abrigo do dever de gestão processual, convidar os Réus, Reclamantes, a depositar o valor constante da nota – o qual, refira-se e sublinhe-se, nem sequer é claro, porquanto surge, num primeiro momento, como € 1.224,00 e, num segundo, como € 1.734,00 (!)”. No que se reporta à questão da atuação do dever de gestão processual e, de nesse âmbito, o Tribunal ter – ou não - o dever convidar os Réus a depositar o valor constante da nota, importa caracterizar se o aludido dever de gestão importava para o juiz a vinculação ao convite no sentido do depósito, ou se, ao invés, tal não sucedia. Vejamos: A gestão do processo é a atuação do julgador destinada a conseguir, em tempo razoável, a justa composição do litígio. Esta actuação tem o círculo de sub-deveres insertos no artigo 6.º do CPC: - Direção ativa do processo; - Providenciar pelo andamento célere dos autos; - Suprimento da falta de pressupostos sanáveis; - Promoção oficiosa das diligências necessárias ao normal prosseguimento da causa; - Adotar, após audição das partes, mecanismos de simplificação e agilização processual. “O dever de gestão processual procura ajudar a solucionar a “equação processual”: uma decisão justa do processo com os menores custos, a maior celeridade e a menor complexidade que forem possíveis no caso concreto” (assim, Miguel Teixeira de Sousa; “Apontamentos sobre o princípio da gestão do processual no novo Código de Processo Civil”, in Cadernos de Direito Privado, n.º 43, 2013). O artigo 6.º do CPC, embora integrado no Título do CPC atinente aos princípios fundamentais do processo civil é configurado como um “dever” do juiz, o que inculca uma especial responsabilidade de actuação deste na procura da boa gestão processual. A gestão processual consiste na direcção ativa e dinâmica do processo, tendo em vista a rápida e justa resolução do litígio e a melhor organização do trabalho do tribunal (assim, Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro; Primeiras Notas ao CPC, Vol. I, 2013, p. 30). Estas duas perspetivas são fundamentais e acompanham qualquer reflexão sobre a gestão processual: A justa composição do litígio do caso concreto (visão micro) e a melhor organização do trabalho do tribunal (visão macro). Sem prejuízo do «ónus de impulso» processual das partes – dispositivo – o juiz deve: a) Dirigir ativamente o processo (trata-se de uma expressão inovadora face ao 265.º, n.º 1, do CPC revogado); b) Providenciar pelo seu andamento célere; c) Promover as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação; d) Recusar o que for impertinente ou meramente dilatório; e) Adotar, ouvidas as partes, mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam, em prazo razoável, a justa composição do litígio (trata-se de uma expressão inovadora face ao 265.º, n.º 1, do CPC revogado); f) Providenciar oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais sanáveis, com duas condutas: - Determinando os atos necessários para a regularização da instância; ou, - Quando a sanação dependa de ato das partes, convidando estas a praticá-lo. A gestão processual visa diminuir os custos, o tempo e a complexidade de tramitação do procedimento. A adequação pode comportar a substituição da tramitação legal (v.g. tramitação autónoma e prévia de uma questão incidental, para que a decisão dessa questão não torne inúteis todos os demais actos praticados na acção) ou a adaptação ou modificação da tramitação legal (testemunha ouvida antes de outras, julgamento sem aguardar a prova pericial, autorização de cumulação de pedidos). Nas acções de valor não superior a metade da alçada da relação – cfr. art. 597º do CPC - a adequação traduz-se na escolha de uma ou várias alternativas de entre as opções concedidas ao juiz: Pode haver audiência prévia, despacho a programar a audiência final, designar dia para julgamento mediante prévio acordo de datas com os mandatários. A adequação formal exige a prévia audição das partes e, se esta não tiver lugar ocorre uma nulidade processual (cfr. art. 195.º, n.º 1, do CPC). Os limites da adequação determinam o respeito pelos princípios da igualdade e contraditório, o não afastamento de regras imperativas, a garantia de que a tramitação deve continuar a observar um processo equitativo, deve haver um standard mínimo de tramitação respeitado em qualquer processo, a adequação não pode contender com a aquisição processual de factos, nem com a admissibilidade de meios probatórios (cfr. artigo 630.º, n.º 2, do CPC). Em síntese: “A gestão processual visa diminuir os custos, o tempo e a complexidade do procedimento, e pressupõe um juiz empenhado na resolução célere e justa da causa. · A gestão processual comporta: - um aspeto substancial, que se expressa no dever de condução do processo que recai sobre o juiz, dever que é justificado pela necessidade de este providenciar pelo andamento célere do processo, devendo, para a obtenção desse fim, promover as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação e recusar o que for impertinente ou meramente dilatório (art. 6.º, n.º 1, do C.P.C.); pode, neste caso, pode falar-se de um poder de “direção do processo” e de um poder de “correção do processo”; - um aspeto instrumental ou adequação formal, no âmbito do qual o dever de gestão processual procura ajudar a solucionar a “equação processual”, ou seja, uma decisão justa do processo com os menores custos, a maior celeridade e a menor complexidade que forem possíveis do caso concreto (art. 547.º, do C.P.C.)” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 05-07-2018, Pº 4508/10.1TBOER-B.L1-7, rel. JOSÉ CAPACETE). Ora, no caso, não se afigura que, para observar um tal dever de gestão, o Tribunal estivesse vinculado a emitir um despacho de convite dos réus a satisfazer o depósito que omitiram. Na realidade, a situação em apreço não envolve a atuação de qualquer dos subdeveres consignados na lei a respeito do dever de gestão processual que implicassem composição do litígio diversa e mais justa. Conforme se referiu no despacho do Tribunal recorrido de 03-07-2020, cujas considerações são de acolher plenamente, “não nos parece, s.m.o., que tal convite se justifique no caso dos autos. Primeiro que tudo, porque tal situação não se mostra prevista na lei; em segundo lugar porque não nos deparamos com uma situação de necessidade de aperfeiçoamento de uma peça processual ou da falta de um documento essencial ao conhecimento de uma excepção dilatória ou do mérito ( cfr. artigo 590º, n.º 2, n.º 3 e n.º 4, do Código de Processo Civil), mas sim de um ónus processual prévio à apreciação à apreciação do que se pretende e que a lei não prevê que possa ser ultrapassado de forma posterior (na medida em que em nenhum momento a lei prevê a possibilidade de, no caso do depósito do valor da nota discriminativa não ter sido feito, a parte poder ver ser-lhe concedida uma nova oportunidade de pagamento”. De facto, o depósito a que alude o n.º 2 do artigo 26.º-A do RCP é condição de sujeição da reclamação, que, para ser apreciada judicialmente teria que se verificar quando o julgador afere da existência dos respetivos pressupostos. Não se mostra prevista na lei qualquer possibilidade de sanação ulterior da omissão verificada, designadamente por via da notificação pretendida pelos recorrentes. Pode concluir-se que, constituindo o depósito do valor da nota de custas de parte uma condição a que a reclamação que dela seja deduzida se encontra sujeita, nos termos do n.º 2 do artigo 26.º-A do RCP, que deve ocorrer em momento prévio à apreciação da reclamação, sem que a lei preveja que possa ocorrer em momento ulterior ou na sequência dessa apreciação, não se mostra incumprido o dever de gestão processual – artigo 6.º do CPC – se o juiz não convida a parte a proceder ao depósito do valor da nota de custas em falta para apreciar a reclamação. E, assim, não procedem, neste conspecto, as conclusões dos apelantes. * C) Saber se é materialmente inconstitucional a norma constante do n.º 2 do artigo 26.º-A do Regulamento das Custas Processuais, na parte em que obriga ao depósito da totalidade do valor da nota reclamada, por violação do disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, por obstaculizar o direito dos particulares de acesso ao Direito e por restringir indevidamente o espaço da necessária intervenção do juiz? Finalmente, invocaram os recorrentes a inconstitucionalidade do artigo 26.º, n.º 2, do RCP, nos termos seguintes: “É inconstitucional a norma constante do n.º 2 do artigo 26.º do Regulamento das Custas Processuais, na parte em que obriga ao depósito da totalidade do valor da nota reclamada, por violação do disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, não apenas por obstaculizar o direito dos particulares de acesso ao Direito, mas também por restringir indevidamente o espaço da necessária intervenção do juiz. A matéria respeitante à reclamação da nota justificativa das custas de parte possui uma natureza restritiva de um direito fundamental – o direito de acesso à justiça e à tutela jurisdicional efectiva – importando notar que tanto a doutrina (cf., por todos, JORGE MIRANDA/RUI MEDEIROS, Constituição Portuguesa Anotada, vol. I, 2.ª ed., Wolters Kluwer, Coimbra Editora, 2010, p. 304) como a jurisprudência do Tribunal Constitucional têm considerado este direito como análogo a um direito, liberdade e garantia.”. A invocação feita pelos recorrentes reconduz-se não ao artigo 26.º, n.º 2, do RCP, mas sim, ao artigo 26.º-A, n.º 2, do referido Regulamento, considerando que é nesta norma que se encontra prevista a necessidade de depósito da totalidade do valor da nota para a possibilidade de reclamação da nota justificativa. No que concerne à questão de apreciação da inconstitucionalidade material da referida disposição legal, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 27-02-2020 (Pº 502/14.1T8PTG-A.E1, rel. MÁRIO SILVA), cujas considerações são plenamente de acolher, teve já ocasião de se pronunciar. Foi considerado nesse aresto o seguinte: “O artigo 20º, nº 1, da CRP estabelece que a justiça não ser denegada por insuficiência de meios económicos. “A interpretação que deste art.º 20º vem sendo feita pelo Tribunal Constitucional pode condensar-se na seguinte doutrina: não há uma imperatividade constitucional de se assegurar a gratuitidade da justiça e ao direito subjetivo de acesso aos tribunais corresponde um dever correlativo do Estado de garantir condições para assegurar a efetividade da tutela jurisdicional. Daqui decorre que a liberdade do legislador, na disciplina do regime das custas, goza de uma relativa margem, sendo limitada, porém pela demonstração de que os custos por ele fixados para a utilização da máquina judiciária não sejam de tal modo onerosos ou excessivos que funcionem como um travão ou inibição, por parte do cidadão comum, no acesso ao tribunal. Só quando tal demonstração for feita é que se pode afirmar que o regime fixado pelo legislador é desproporcional e quebra o “equilíbrio interno ao sistema” que é reclamado pelo citado princípio constitucional de tutela jurisdicional efetiva. O que é determinante é saber se, em concreto, o montante que o reclamante tinha que depositar, a titulo de custas de parte, se pode considerar excessivamente oneroso, ou arbitrário e absolutamente injustificado, por forma a que se possa concluir que nesses termos haveria uma denegação do acesso à justiça, nomeadamente por insuficiência de meios económicos.” Ora, perante os elementos de facto, não cremos que tal juízo se possa formular. Na verdade, considerando o valor em concreto a liquidar constante da nota, (…), que não pode ser qualificado de arbitrário não cremos que se possa afirmar estar violado o direito constitucional de acesso aos tribunais para defesa do direito de reclamar da nota de custas de parte. O Acórdão 678/2014 do Tribunal Constitucional, pronunciou-se no sentido da constitucionalidade material do artigo 33º-A, nº 4, do CCJ da seguinte forma: “Face às finalidades prosseguidas pelo n.º 4 do artigo 33º-A do CCJ, se não torna desproporcionada a exigência, que nele se faz, de depósito prévio da quantia fixada na nota de custas, como condição da admissão da reclamação ou recurso. No caso sub iudicio, é igualmente aplicável esta doutrina sobre os limites do equilíbrio interno do regime de custas. Com efeito, na linha da jurisprudência contida no Acórdão n.º 347/2009(…), importa garantir que a solução legal quanto à elaboração da nota discriminativa e justificativa das custas de parte, prosseguindo um fim legítimo, permite à instância judicial controlar minimamente o equilíbrio entre o montante peticionado a título de custas de parte e as circunstâncias concretas, relativas à lide e à complexidade da respetiva tramitação, e à própria parte, prevenindo hipóteses de, por lapsos inadvertidos mas grosseiros ou manipulações malévolas, impor custos indevidos e imprevisíveis à parte vencida. Consequentemente, atentos os valores coenvolvidos em tal regime, mormente o da moderação e racionalização das reclamações, a sujeição em causa prevista no artigo 33.º, n.º 2, da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, na redação dada pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de março, não pode ser considerada excessiva, pelo que a mesma sujeição não viola o princípio da proporcionalidade.” O que acabou de se transcrever sobre a conformidade constitucional do nº 2 do art.º 33º, da Portaria 419-A/2009 aplica-se ao artigo 26º-A, nº 2, do RCP que tem redação idêntica. O fim da norma em causa, o citado 26º-A, nº 2, do RCP (e antes os artigos 33º, nº 2, da Portaria 419-A/2009 e 33º-A, nº 4, do CCJ) é perfeitamente legítimo. Esse fim, é o de fazer depender a admissibilidade da reclamação [da nota discriminativa e justificativa das custas de parte] do depósito prévio do montante nela fixado, o que se explica “pela necessidade, especialmente refletida pelo legislador ordinário, não só de garantir o pagamento das custas, mas ainda de moderar e razoabilizar, quanto a elas, o regime processual de reclamações e recursos, de forma a evitar o seu uso dilatório”.(…)] Assim sendo, é de acompanhar a conclusão extraída no citado aresto 347/2009, ou seja, “que, face às finalidades prosseguidas pelo nº 4 do artigo 33-A do CCJ, se não torna desproporcionada a exigência, que nele se faz, de depósito prévio da quantia fixada na nota de custas, como condição da admissão da reclamação ou recurso” é aplicável ao caso dos autos, “não havendo, pois, qualquer violação do princípio da proporcionalidade”. Não há, assim, no caso concreto violação do alegado princípio constitucional aludido no art.º 20º da CRP. Improcede, pelos motivos expostos, a apelação”. E, concluiu-se em tal aresto que: “Não há violação do princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva ao fazer-se depender a admissão da respetiva reclamação do depósito prévio do montante do valor das custas de parte, tal como exige o artigo 26º-A, nº 2, do RCP”. A problemática em apreço foi novamente objeto de apreciação no recente Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15-09-2020 (Pº 249/19.2T8FNC.L1-7, rel. CRISTINA COELHO), onde foi expendido o seguinte: “No que respeita à invocada inconstitucionalidade material do nº 2 do art. 26º-A do RCP, por violação do princípio fundamental ao acesso ao direito, do princípio da proporcionalidade e adequação, do princípio da equidade e lealdade processual, bem como do princípio do contraditório, sufragamos o entendimento expendido nos Acs. da RP de 15.1.2013, P. 511/09.2TVPRT.P2 (António Martins), da RE de 8.10.2015, P. 681/14.8T8PTM-D.E1 (Conceição Ferreira), da RP de 26.1.2016, P. 8043/06.4TBVNG.P1 (Rui Moreira), e da RE de 27.2.2020, P. 502/14.1T8PTG-A.E1 (Mário Silva), todos em www.dgsi.pt (…), remetendo-se para a argumentação aí amplamente expendida, a que aderimos. O tribunal Constitucional já se pronunciou sobre a matéria, nomeadamente no Ac. do TC nº 678/2014, de 15.10.2014 (Pedro Machete), em www.dgsi.pt, no sentido de a norma contida no artigo 33º, nº 2, da Portaria nº 419-A/2009, de 17.04, na redação dada pela Portaria nº 82/2012, de 29.03, não sofrer da inconstitucionalidade invocada, em termos abstratos, afigurando-se-nos que os argumentos se transpõem para o atual art. 26º-A do RCP. O artigo 20º, nº 1, da CRP estabelece que a justiça não pode ser negada por insuficiência de meios económicos. Como se escreveu no referido Ac. da RE de 8.10.2015, “A interpretação que deste art. 20º vem sendo feita pelo Tribunal Constitucional pode condensar-se na seguinte doutrina: não há uma imperatividade constitucional de se assegurar a gratuitidade da justiça e ao direito subjetivo de acesso aos tribunais corresponde um dever correlativo do Estado de garantir condições para assegurar a efetividade da tutela jurisdicional. Daqui decorre que a liberdade do legislador, na disciplina do regime das custas, goza de uma relativa margem, sendo limitada, porém pela demonstração de que os custos por ele fixados para a utilização da máquina judiciária não sejam de tal modo onerosos ou excessivos que funcionem como um travão ou inibição, por parte do cidadão comum, no acesso ao tribunal. Só quando tal demonstração for feita é que se pode afirmar que o regime fixado pelo legislador é desproporcional e quebra o “equilíbrio interno ao sistema” que é reclamado pelo citado princípio constitucional de tutela jurisdicional efetiva. O que é determinante é saber se, em concreto, o montante que o reclamante tinha que depositar, a título de custas de parte, se pode considerar excessivamente oneroso, ou arbitrário e absolutamente injustificado, por forma a que se possa concluir que nesses termos haveria uma denegação do acesso à justiça, nomeadamente por insuficiência de meios económicos.”. Ora, dos elementos constantes dos autos não é possível formular tal juízo, considerando o valor atribuído à ação pelos AA./apelantes (€230.000,00), que não invocaram em concreto dificuldades económicas ou insuficiência de meios para depositar o valor da nota discriminativa de custas de parte e, ainda, o valor em concreto desta (€7.600,50), que não pode ser qualificado de arbitrário (…)”. As considerações expostas e produzidas nos aludidos arestos são inteiramente aplicáveis ao caso em apreço, não se vislumbrando que da exigência de depósito das quantias constantes da nota discriminativa e justificativa de custas de parte – que se encontram, na realidade, devidamente discriminadas e elencadas, percebendo o destinatário da mesma, em que assenta a pretensão da sua exigibilidade – em concreto, taxas de Justiça pagas pelo autor (na ação e no incidente de liquidação) e honorários dos mandatários (com referência ao valor apurado) – e cujo valor – resultando da soma das parcelas elencadas – se acha devidamente apurado. Assim, a exigência legal do depósito do respetivo valor - € 1.734,00 – não se mostra compressora do acesso ao Direito dos réus (cuja pretensão assumia um valor na ordem das centenas de milhares de euros), cuja configuração constitucional não é, como se viu, irrestrita, ou não sujeita a quaisquer limites, nem ocorre alguma indevida restrição sobre a intervenção do juiz, antes, o qual apenas terá de apreciar – de mérito - reclamações em que se mostrem reunidos os requisitos legais prescritos para o efeito, constituindo o depósito prévio do valor da nota, um pressuposto processual para a apreciação, de fundo, de tal reclamação. Na realidade, o direito à tutela jurisdicional efetiva é um direito fundamental, com assento constitucional nos artigos 20.º e 268.º da Constituição da República Portuguesa, respeitando a todos os cidadãos (carácter de universalidade), respondendo a uma exigência social constante (permanência) e referente às necessidades básicas da pessoa que o Estado se compromete solenemente a atender (fundamentalidade) (cfr. José de Melo Alexandrino; Direitos Fundamentais, Introdução Geral, Principia, 2007, p. 20 e ss.). A garantia do acesso ao direito e aos tribunais não admite a consagração, no plano legal, de exigências que consubstanciem condicionantes processuais desprovidas de fundamento racional e sem conteúdo útil ou excessivas, não sendo admissível o estabelecimento de ónus desinseridos da teleologia própria da tramitação processual e cuja consagração não prossiga quaisquer interesses dignos de tutela – cfr. acórdão do TC n.º 384/98 (rel. FERNANDA PALMA). Contudo, como evidenciam Jorge Miranda e Rui Medeiros (Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª ed., Coimbra Editora, 2010, p. 439) “o princípio pro actione, assim afirmado, não impede, naturalmente, a existência de requisitos ou de pressupostos processuais” a observar, onde se inserem as condições legais predispostas, e em termos gerais e abstratos, para o exercício de direitos, resultando, consequentemente, intocado o aludido princípio, decorrente da garantia constitucional de acesso ao direito e aos Tribunais. O artigo 26.º-A, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais, na parte em que determina o depósito do valor da nota de custas de parte que seja objeto de reclamação, não viola o disposto no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, nem restringe o campo de atuação judicial, que é sempre chamado a apreciar se se encontram, ou não, reunidos os requisitos legais para aquela apreciação, não sendo, pois, inconstitucional. Este juízo foi, aliás, reconhecido pelo Tribunal Constitucional, quer à luz do artigo 33.º, n.º 2, da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril, na redação dada pela Portaria n.º 82/2012, de 29 de março (cfr. Acórdão do TC n.º 678/2014), quer a respeito da redação vigente do n.º 2 do artigo 26.º-A do Regulamento das Custas Processuais, aditada pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março (cfr. Acórdão do TC n.º 370/2020). A apelação deduzida deverá, em consequência, ser julgada improcedente. A responsabilidade tributária inerente, nesta instância, incidirá sobre os apelantes, atento o seu integral decaimento, em conformidade com o regime resultante do artigo 527.º, n.ºs. 1 e 2, do CPC. * 5. Decisão: Pelo exposto, acordam os Juízes desta 2.ª Secção Cível, em julgar improcedente a apelação e, em consequência, em manter a decisão recorrida, proferida em 11-02-2020, nos seus precisos termos. Custas pelos recorrentes. Notifique e registe. * Lisboa, 8 de outubro de 2020. Carlos Castelo Branco Lúcia Celeste da Fonseca Sousa Magda Espinho Geraldes |