Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | CELINA NÓBREGA | ||
Descritores: | DESPEDIMENTO ILÍCITO INDEMNIZAÇÃO PERDA DE CHANCE | ||
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Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/25/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I- O artigo 389.º n.º 1, al. a), do Código do Trabalho, abrange os danos patrimoniais não incluídos no artigo 390.º n.º 1 do Código do Trabalho e os danos não patrimoniais. II- O dano da perda de chance, que se inclui no artigo 389.º n.º 1, al. a). do CT, configura um dano patrimonial em que se perde a oportunidade de obter uma vantagem ou de evitar uma desvantagem em consequência do facto ilícito. | ||
Decisão Texto Parcial: | ![]() | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório AA, intentou contra Sociedade BB, S.A., procedimento cautelar de suspensão do despedimento individual, pedindo que seja decretada a suspensão do seu despedimento e reintegração no posto de trabalho, bem como se proceda a acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento e que se ordene à Requerida que pague ao Requerente as retribuições que se vierem a vencer, uma vez decretada a suspensão do despedimento. Invocou para tanto, em resumo, que: foi admitido ao serviço da Ré através de contrato de trabalho sem termo, com inicio em 19 de Fevereiro de 2001, para desempenhar as funções de Technical Support Vice President, inerentes à categoria profissional de Director, sendo que, do início de 2019 até à presente data, exerceu as funções de Customer Sucess Manager (CSM), o que sempre lhe foi reconhecido; como contrapartida directa da prestação do trabalho auferia7.393€ a título de remuneração-base mensal ilíquida, a que acresciam subsidio de férias e subsidio de Natal, 500€ ilíquidos, a título de Complemento Vencimento, 7.63€/dia útil de trabalho, a título de subsídio de alimentação, telemóvel com plafond ilimitado para comunicações pessoais, seguro de saúde, seguro de vida, atribuição de um veículo automóvel, com despesas de manutenção e de seguro a cargo da entidade empregadora, para uso em serviço e para seu uso particular, que resulta num rendimento em espécie taxável de 4123,25€, correspondente a uma viatura de 45811€ e bónus anual de 65000€ para 100% dos objetivos; no dia 5/05/2021, o Requerente foi notificado da decisão da Requerida de o despedir com fundamento na extinção do posto de trabalho de Partnership Governance Director (PGD), função que desempenhou desde meados de 2016 até final de 2018, após o que, no seguimento de uma reestruturação da organização da empresa passou a desempenhar a função de CSM até à data da comunicação da extinção do posto de trabalho; todo o procedimento de despedimento do Requerente está inquinado uma vez que o posto de trabalho extinto não corresponde ao posto de trabalho que o Requerente exerce, o que acarreta a ilicitude do despedimento, por improcedência do motivo justificativo; os motivos invocados para o despedimento são falsos e não têm respaldo na legislação portuguesa, tendo o despedimento do Requerente resultado de um princípio de negócio da X associado a empresas de hiper crescimento e que se consubstancia na “Rule of 40” (Regra dos 40), segundo a qual é necessário que a % de crescimento anual somado à taxa de aumento de rentabilidade (EBITDA), seja igual ou superior a 40%, e não a motivos estruturais económicos financeiros como invocado pela Requerida; e, no caso, não se verificou a impossibilidade de subsistência da relação laboral por inexistência de outro posto de trabalho compatível, o que acarreta a ilicitude do despedimento. Realizou-se a audiência de partes sem que fosse conseguido o seu acordo, após o que foi determinado o cumprimento do disposto na al.b) do artigo 36.º-A do CPT, extraindo-se certidão da acta, do requerimento e autuando-se como acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento. A Ré apresentou articulado motivador do despedimento invocando, em síntese, que o despedimento está devidamente fundamentado, sendo as razões invocadas procedentes, que a decisão de despedimento contém todas as indicações legalmente exigidas e foram cumpridas todas as formalidades legais, bem como foram pagas ao Autor as quantias que lhe eram devidas, pelo que, o despedimento é lícito. Mais alegou que o Autor, actualmente, exercia as funções de Partnership Governance Director, respondendo ao Executive Vice President (EVP) da região RoW (Rest of the World) e que, internamente, está ainda qualificado como Customer Success Manager (CSM), mas apenas para efeitos de recebimento de comissões, não desempenhando qualquer tarefa inerente a essa função, nem tendo um único cliente direto, que o posto de trabalho do Autor será necessariamente extinto por esvaziamento de funções, que não dispõe de posto de trabalho vago em que o Autor possa ser colocado como Director e que a regra dos 40 é um legítimo objectivo de gestão mas não determina por si só a extinção de qualquer posto de trabalho. A Ré ainda deduziu oposição à reintegração do Autor. Finalizou pedindo que se considere o despedimento do Autor lícito e regular com a absolvição da Ré do pedido e que, caso assim não se entenda e seja declarada a ilicitude do despedimento do Autor, seja excluída a sua reintegração com a atribuição de uma indemnização correspondente ao mínimo legal. O Autor contestou reafirmando ter sido nomeado CSM pelo CEO da companhia, a ilegalidade do motivo da extinção do posto de trabalho e a ilicitude do despedimento, bem como invocou não existir qualquer impedimento à sua reintegração. Deduziu reconvenção e finalizou com os pedidos seguintes: A- Ser o despedimento declarado ilícito e improcedentes os fundamentos do mesmo e, em consequência, ser a Ré condenada a reintegrar o Autor, sem prejuízo da sua antiguidade e categoria profissional ou, em alternativa, condenada numa indemnização de antiguidade, caso o Autor por ela venha a optar. B- Ser a Ré condenada a pagar ao Autor as retribuições que o mesmo deixou de auferir desde o despedimento, até trânsito em julgado da sentença. C- Ser a Ré condenada a pagar a título de bónus/Prémio ao Autor a quantia que se vier a apurar resultante da auditoria em curso pela Ré, sobre os resultados finais atingidos em 2020 pelo grupo ROW, em consonância com o disposto na alínea c) do nº1 do art. 556º do C.P.C. D- ser a Ré condenada a pagar ao Autor a título de indemnização pelo dano decorrente da perda de oportunidade no tocante ao Prémio/bónus de 2021, que quantifica no montante de € 36.328,77 (Trinta e seis mil trezentos e vinte e oito euros e setenta e sete cêntimos). E- Ser a Ré condenada a pagar a quantia de €10.000,00 (DEZ mil euros), a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos. F- Quantias acrescidas dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento. G- Ser a Ré condenada nas custas e procuradoria condigna. A Ré respondeu pugnando pela improcedência dos pedidos reconvencionais e pedindo a absolvição dos mesmos e finalizou como no articulado de motivação do despedimento. O Autor ainda apresentou requerimento a responder, tendo a Ré pedido o desentranhamento do requerimento, por inadmissível, com excepção do alegado nos artigos 1 a 9. O Autor requereu a condenação da Ré como litigante de má fé, ao que respondeu a Ré pedindo o seu indeferimento. Foi dispensada a convocação da audiência prévia, admitidos os pedidos reconvencionais e considerou-se não escrita a matéria dos artigos 1 a 29 e 35 a 53 da resposta à contestação e a matéria vertida nos artigos 12 e 14 a 47 do articulado do trabalhador de 23.09.2021. Foi proferido despacho saneador, identificado o objecto do litígio, enunciados os temas da prova e determinada a realização de uma perícia singular. Foi elaborado o relatório pericial que sofreu reclamação por parte da Ré. Procedeu-se a julgamento, tendo as partes alegado por escrito. Foi proferida a sentença que finalizou com o seguinte dispositivo: “A.- Julgar ilícito o despedimento do Trabalhador AA pelo Empregador SOCIEDADE BB, S.A. e, em consequência: a.- Condenar o Empregador SOCIEDADE BB, S.A. a reintegrar o Trabalhador AA, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; b.- Condenar o Empregador SOCIEDADE BB, S.A. a pagar ao Trabalhador AA as retribuições (incluindo retribuições e subsídios de férias e subsídio de Natal) que este deixou de auferir desde o despedimento até trânsito em julgado da presente decisão – à razão mensal liquidada de 7.893,00€ (sete mil oitocentos e noventa e três euros) e ilíquida referente aos seguros de saúde e de vida e à utilização de viatura automóvel para finalidades pessoais – deduzida das quantias referentes ao subsídio de desemprego, o que neste momento se cifra em 176.197,71€ (cento e setenta e seis mil, cento e noventa e sete euros e setenta e um cêntimos), acrescido de juros moratórios, à taxa legal, até integral pagamento. c.- Condenar o Empregador SOCIEDADE BB, S.A. no pagamento ao Trabalhador AA da quantia de 16.250,00€ (dezasseis mil, duzentos e cinquenta euros), a título de indemnização pelo dano de perda de chance, acrescido de juros moratórios, à taxa legal, até integral pagamento; d.- Condenar o Empregador SOCIEDADE BB, S.A. no pagamento ao Trabalhador AA da quantia de 10.000,00€ (dez mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescido de juros moratórios, à taxa legal, até integral pagamento; B.- Condenar o Empregador SOCIEDADE BB, S.A. no pagamento ao Trabalhador AA do bónus de desempenho de 2020, a quantia já liquidada de 29.656,25€ (vinte e nove mil, seiscentos e cinquenta e seis euros e vinte e cinco cêntimos), pela parcela de bónus correspondente ao objectivo de receita, acrescida de quantia a ser liquidada ulteriormente, pela parcela correspondente ao objectivo de contribuição para a margem, acrescido de juros moratórios, à taxa legal, até integral pagamento; C.- Condenar o Estado Português, através do Instituto da Segurança Social, I.P a pagar ao Trabalhador AA, além da quantia de 4.411,43€ (relativamente a 17 dias do mês de Setembro de 2022), a quantia de 7.893,00€ por cada mês até 30 dias após o trânsito em julgado da presente sentença, que actualmente se cifra em 41.540,97€ (quarenta e um mil, quinhentos e quarenta euros e noventa e sete cêntimos), deduzida dos montantes pagos a título de subsídio de desemprego; D.- Absolver o Empregador SOCIEDADE BB, S.A. do pedido de condenação por litigância de má-fé; E.- Determinar, pela especial complexidade da acção, a aplicação dos valores de taxa de justiça constantes da tabela i-C anexa ao Regulamento das Custas Processuais; F.- Condenar Trabalhador e Empregador em custas, na proporção de 95% e 5%; G.- Fixar o valor da causa em 232.103,96€ (duzentos e trinta e dois mil, cento e três euros e noventa e seis cêntimos); Registe e notifique. Comunique ao ISS, I.P. (arts. 75.º, n.º 2, e 98.º-N, n.º 2, do Código de Processo do Trabalho).” O Autor requereu a rectificação do ponto F) do dispositivo da sentença e recorreu, sintetizando as alegações nas seguinte conclusões: “1ª-A douta sentença proferida pelo tribunal a quo, na sequência do despedimento ilícito, concluiu afirmativamente pela existência de uma perda de oportunidade, consistente e séria, de o Autor vir a auferir bónus pelo desempenho no ano de 2021. 2ª- Inclusivamente reconheceu que a possibilidade do Autor atingir os seus objectivos em 2021 seriam maiores que nos anos de 2019 e 2020, dada a integração da Ré no grupo X, conforme se transcreve: "Importa não olvidar que não estaria em causa um bónus subordinado a uma avaliação qualitativa, mas a resultados quantitativos concretos (ao contrário do que sucede no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 26-05-2015, Proc. n.º 373/10.7TTPRT.P1.S1), cuja probabilidade de recebimento se acentuou com a integração na estrutura empresarial do Grupo X de escala superior e com um contexto de crescimento continuado, durante 7 anos, das respectivas receitas (sublinhado nosso), não podendo, de resto, o Trabalhador ser prejudicado por, não tendo sido integrado em qualquer segmento da organização de tal estrutura empresarial, desconhecer quais as métricas de objectivos que lhe seriam aplicáveis ou os resultados obtidos por uma qualquer unidade daquela estrutura” 3ª- Ora o tribunal a quo refere o recurso a equidade e apresenta, como critérios, a constância da elegibilidade para bónus e o desempenho dos anos anteriores, em conjunção com a possibilidade perdida do Autor de obter essa vantagem, que qualifica como possível ainda que incerta. 4ª-Todavia, ao quantificar o valor a indemnizar ao Autor por perda de chance, o tribunal afasta-se dos fundamentos previamente invocados para quantificar a existência dessa perda de chance, apenas aplicando uma formula aritmética pela qual multiplica o valor do bónus para 100% de atingimento por parte do autor, pelo valor de 1/4, ou seja 25% do valor do bónus, critério para o qual não apresenta qualquer justificação e que, com o devido respeito, não encontra respaldo em qualquer critério de equidade, razão pela qual dele se discorda. 5ª- Em face da adopção do critério de equidade para definir o "quantum" a indemnizar por perda de chance, seria expectável que o tribunal procedesse a três operações: Avaliar primeiro qual o valor económico do dano a ressarcir, de seguida avaliar a probabilidade do Autor em atingir o valor do bónus, não fora a ocorrência do acto ilícito, para que com base nestas premissas e cruzando o valor do dano com a sua probabilidade, se pudesse finalmente obter o valor pecuniário da "perda de chance". Neste sentido o acórdão do STJ 296/16.6T8GRD.C1.S2. 6ª-Seguindo esta orientação jurisprudencial teremos que determinar qual o valor económico da expectativa e a percentagem a aplicar pela probabilidade de atingimento. 7ª- Ora a fixação do montante da expectativa não pode ser outro que não seja o valor do bónus para 100% dos objectivos, logo 65.000,00€ (conforme factos provados escritos nos ponto 59 supra), que corresponde ao valor de referência face aos objectivos anuais que são determinados ao Autor e por este aceites. Este valor está alinhado com as legitimas expectativas da empresa, no sentido de obter os resultados que definiu como sendo os objectivos do Autor, e está alinhado com as legitimas expectativas do Autor, na medida em que será remunerado nesse montante, caso atinja os objectivos que aceitou. 8ª- Quanto à probabilidade de atingimento, considerando que o Autor recebeu bónus relativos ao seu desempenho nos anos de 2019 e 2020 (conforme factos provados escrito no ponto 86 e no ponto B do dispositivo) e que a probabilidade de o receber em 2021 se acentuou, conforme menciona a sentença e acima se transcreveu, a determinação do seu valor terá necessariamente que tomar em consideração os valores pagos sobre 2019 e 2020. 9ª-Assim, o valor da perda de chance deverá ser avaliado por verosimilhança com o histórico, sendo que neste caso teríamos uma média conjugando os 60.52% do valor do bónus em 2019 (conforme ponto 86 dos factos provados na sentença), com o bónus de 2020, este ainda parcialmente por liquidar, mas que sabemos desde já que se situará entre 45.6% (correspondente à componente de receita já liquidada)e 95.6% (Correspondente à componente de receita liquidada acrescida da componente de margem operacional, caso esta seja determinada em liquidação de sentença pelo valor de 100%) do valor referência do bónus em 2020. 10ª- Do que resulta uma média a determinar em sede de liquidação de sentença, mas que será fixada - Termos em que o quantum indemnizatório para 2021 a fixar em sede de liquidação de sentença, deverá ser determinado no intervalo entre 34.489,00€ (65.000,00€*53.06%) e 50.739,00€ (65.000,00€*78.06%). 11ª- Deste modo e com o devido respeito, o tribunal a quo errou ao fixar a medida do ressarcimento do dano de perda de chance ao determinar a multiplicação de 65.000,00€ apenas pelo valor de 1/4 (25%), o que resultou num quantum de 16.250,00€. 12ª- Nestes termos, visto o artigo 566, nº3 do CC, deve a sentença neste segmento ser revogada e o valor de indemnização por perda de chance relativamente ao ano de 2021, a fixar em sede de liquidação de sentença, ser substituído pelo valor que resulte da multiplicação de 65.000,00€ pela média da percentagem de atingimento do Autor nos anos de 2019 (60.52%) e 2020 (a liquidar). 13ª- Discorda ainda o Autor do facto de ter o tribunal a quo reconhecido o dano de perda de chance apenas no ano de 2021, desconsiderando os períodos subsequentes até à data de reintegração, seja 2022 na íntegra, seja, até à data, 2023 parcialmente. 14ª-Ora ao momento da apresentação da contestação/reconvenção, em 19/08/2021, o Autor quantificou o dano de perda de chance em 36.328,77 (Trinta e seis mil trezentos e vinte e oito euros e setenta e sete cêntimos), valor que resultava precisamente do proporcional à data do despedimento, do valor do bónus a 100%, tomando em consideração os 204 dias que tinham ocorrido desde o inicio do ano, até ao dia 23 de Julho de 2021, data do despedimento (65000€/365*204 dias = 36.328,77€). 15ª- Tendo sido o despedimento declarado ilícito e tendo o tribunal a quo reconhecido a efectiva perda de chance do autor em receber o bónus em 2021, por maioria de razão esta perda de chance deve igualmente ser considerada para o ano de 2022, e até ao momento da sua reintegração, pois tendo estado o Autor afastado da empresa durante todo esse período, repete-se por motivos ilícitos e imputáveis à Ré, todos os critérios subjacentes à atribuição de uma indemnização por perda de chance relativos ao ano de 2021, se devem aplicar necessariamente ao ano de 2022 e até ao momento da sua reintegração. 16ª- Só assim se cumpre verdadeiramente uma justiça material. 17ª- Para além de que o Autor no seu pedido requereu a reposição de todas as retribuições a que tinha direito, conforme se transcreve: • B) Ser a ré condenada a pagar ao A. as retribuições que o mesmo deixou de auferir desde o despedimento, até trânsito em julgado da sentença. 18ª- Ora o Autor não se conforma em o tribunal ter circunscrito a indemnização pela perda de chance ao ano de 2021. 19ª- É indubitável que a retribuição do Autor tem uma componente variável, correspondente a 65.000,00€ para 100% dos objectivos (conforme factos provados escritos nos pontos 58 e 59 supra) . Assim como é indubitável que o plano de bónus se encontra expressamente previsto pela Ré, conforme ponto 60 dos factos escritos dados como provados. 20ª- O que nos permite concluir pelo seu carácter regular e permanente e que era legítimo ao autor contar recebê-lo no futuro (na sequência, aliás, do que sucedeu em 2019 e 2020, por via da qual a retribuição por si auferida se não circunscrevia à retribuição-base (certa)). 21ª- O facto de que características do prémio do Autor “representam atribuições patrimoniais com que os trabalhadores podem legitimamente contar, quer pela sua previsão no contrato e nas normas que o regem quer pela regularidade e permanência com que são prestadas, conferindo-lhes justas expectativas ao seu percebimento,”(conforme acórdão do TRP de 11-05-2015, proc. 883/08.6TTMTS.P1, in www.dgsi.pt) encontra-se, aliás, respaldado nos pontos 58 e 59 dos factos escritos dados como provados, onde se menciona respectivamente que "58. A atribuição do prémio anual faz parte das condições contratuais incluídas na carta de admissão;" e que "59. À data do despedimento, o Trabalhador auferia, como contrapartida directa da sua prestação de trabalho, bónus anual de 65.000,00€ para o atingimento de 100% dos objectivos;". 22ª- Neste seguimento, e ao contrário do que foi entendido na sentença recorrida, entendemos, para os efeitos do presente recurso, que o bónus integra a retribuição do autor na sua componente variável (art.º 261º, nº1 do Código do Trabalho). 23ª- Considerando que o prémio integra a remuneração variável do Autor, assiste-lhe o direito de receber essa retribuição no desenvolvimento dessa relação laboral, a qual tem uma natureza de trato sucessivo, sendo o pagamento do prémio exigível no desenvolvimento da relação contratual laboral, competindo à Ré cumprir essa sua obrigação à luz dos artigos 11º, 258º nº1, do Código do trabalho e artigo 762º do código Civil. 24ª- Por todo o exposto nos pontos 2.1 e 2.2 entende o Autor que lhe deve ser reconhecida a indemnização pelo dano de perda de chance também sobre o ano de 2022 e posteriormente até à data da reintegração, nos mesmos termos em que lhe foi reconhecido pelo tribunal a perda de chance relativamente a 2021, devendo o "quantum" a indemnizar para 2022 e posteriormente até à data da reintegração, ser fixado com recurso aos mesmos critérios da perda de chance de 2021, os quais se pugnam no ponto 1 do presente recurso, devendo a este acrescer. 25ª- Termos em que o quantum indemnizatório para 2022 a fixar em sede de liquidação de sentença, deverá ser determinado no intervalo entre 34.489,00€ (65.000,00€*53.06%) e 50.739,00€ (65.000,00€*78.06%). 26ª- Termos em que o quantum indemnizatório para 2023 a fixar em sede de liquidação de sentença, deverá ser determinado no intervalo entre 8.598,63€ (65.000,00€*53.06%/365*91) e 12.650,00€ (65.000,00€*78.06%/365*91), assumindo que a data de reintegração do Autor seja 1/04/2023. Em síntese, nos melhores termos de direito e sempre com o douto suprimento de Vossas Excelências deve ser julgada procedente a presente Apelação, alterando a decisão recorrida, condenando a Ré a pagar ao Autor a uma indemnização pelo dano de perda de chance, relativamente aos anos de 2021, 2022 e 2023 parcialmente, num total a fixar em sede de liquidação de sentença, entre o valor mínimo de 77.576,63€ (34.489,00€+ 34.489,00+ 8.598,63€) e o valor máximo de €114.128,00 (50.739,00€+ 50.739,00€+12.650,00€).” A Ré contra-alegou e formulou a seguinte conclusão: “O recurso apresentado pelo Autor não merece qualquer provimento, pelo que o mesmo deve ser julgado totalmente improcedente.” A Ré interpôs recurso subordinado que finalizou com as conclusões seguintes: “(a) Em face dos artigos 389º n.º 1 al. a) e 390º do Código do Trabalho, à indemnização por danos patrimoniais que respeite a retribuições e outras prestações pecuniárias decorrentes da vigência e execução do contrato, como se o trabalhador não tivesse sido despedido, aplica-se apenas o artigo 390º do Código do Trabalho (b) Quando a lei se refere a danos patrimoniais no artigo 389º n.º 1 al. a) do Código do Trabalho está-se a referir a danos que não a prestações pecuniárias que o trabalhador poderia receber ou seriam devidas durante a vigência e execução normal do contrato de trabalho, tais como juros de mora e outras despesas com empréstimos que o trabalhador deixou de conseguir suportar, ou despesas com medicamentos e tratamentos para recuperar do desgosto do despedimento. (c) Consequentemente, em relação ao eventual bónus de 2021, o Autor apenas poderia ter direito ao mesmo na sequência da declaração de ilicitude do seu despedimento, se esse bónus tivesse natureza retributiva, o que não é o caso, conforme é referido na própria sentença. (d) Por outro lado, também não se encontram preenchidos os requisitos para a atribuição de uma indemnização do dano de perda de chance, porque pois não se poderá afirmar que relativamente a 2019 o Autor recebeu bónus anual, o plano de bónus de 2020 tinha vigência limitada a 2020, não houve comunicação individual da Ré ao Autor sobre o bónus para 2021, e o Autor nem sequer alegou que qualquer factualidade quanto a resultados de receita ou de contribuições para a margem referentes a 2021 que tivesse atingido. (e) Em face dessa factualidade, não se poderá considerar a existência de uma probabilidade séria ou real de pagamento de bónus referente a 2021, mas antes que o Autor não tinha mais do que uma mera expetativa, um mero desejo, de receber bónus referente ao desempenho de 2021. (f) Consequentemente, a sentença deveria ter considerado totalmente improcedente o pedido de indemnização por dano de perda de chance, pelo que ao decidir como decidiu, a sentença violou o disposto, nomeadamente, nos artigos 389º n.º 1 al. a) e 391º n.º 1 do Código do Trabalho. (g) Nestes termos, a sentença recorrida deverá ser revogada, sendo substituída por decisão que absolva a Ré da indemnização da perda de chance de recebimento do bónus de 2021. Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, deve ser revogada a sentença recorrida, nos termos supra expostos, só assim se fazendo o que é de Lei e de JUSTIÇA.” O Autor contra-alegou e formulou as conclusões seguintes: “1º- Vem a Ré Sociedade BB, S.A fundamentar o seu recurso subordinado, na sua asserção de que os danos patrimoniais a serem indemnizáveis por força do artigo 389, nº 1 a) do Código do Trabalho não contemplam prestações pecuniárias decorrentes da vigência e execução do contrato, pelo que em relação ao bónus de 2021 o Autor apenas poderia ter direito ao mesmo na sequência da declaração de ilicitude do seu despedimento se esse bónus tivesse natureza retributiva o que não é o caso. 2º- A Ré está confundida, porque não está em causa, nem nunca foi reclamado pelo autor, o pagamento do Prémio/bónus referente ao ano de 2021. 3º- O que Autor reclamou foi o dano de “perda de chance” ou de oportunidade relativamente a esse prémio. 4º- Com efeito, com o afastamento do Autor da execução do contrato de trabalho, ficou afastada a possibilidade de este poder preencher os condicionalismos de que dependia a atribuição do Prémio/bónus. Pelo que nesta situação existiria um dano, dano este que foi alegado pelo Autor. 5º- Com a comunicação inicial referente ao procedimento de extinção do posto do trabalho do Autor em 18.03.2021 e a sua dispensa de funções a partir dessa mesma data e o subsequente despedimento do Autor, que veio a ser declarado ilícito, inviabilizou o cumprimento das condições da atribuição do prémio em causa, o que provocou uma situação de dano que o autor configurou como o chamado dano de perda de chance. 6º- Ora, nesta sequência, o que o Autor requereu foi a ressarcibilidade desse dano no âmbito do artigo 389, nº 1, alínea a) do Código do Trabalho. 7º- A sentença de 1ª instância responde claramente à dúvida que parece atormentar a Ré, quando diz o seguinte: Nestes termos, e não se tratando de retribuição, estaremos diante de uma indemnização, prevista no art. 389.º, n.º 1, al. a), do Código do Trabalho, que determina que, sendo o despedimento declarado ilícito, o Empregador é condenado a indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais. Atenta a abrangência do âmbito do dever de indemnizar que impende sobre o empregador, na sequência de despedimento ilícito, é, sem dúvida, de asseverar que a perda de oportunidade de vir a auferir bónus pelo desempenho no ano de 2021 deve ser indemnizável, a título de perda de chance” (negrito nosso)” 8º- Tratando-se esta perda de chance de um dano autónomo e indemnizável no âmbito do artigo 389, nº1 al. a) do Código do trabalho, pelo que bem andou a sentença sob recurso ao entender que: “a perda de oportunidade de vir a auferir bónus pelo desempenho no ano de 2021 deve ser indemnizável, a título de perda de chance”. 9º- Não corresponde à verdade o alegado pela ré para fundamentar o seu recurso de que não se pode afirmar que relativamente a 2019 o autor recebeu bónus anual, e que o plano de bónus de 2020 tinha vigência limitada a 2020, não tendo qualquer factualidade provada que lhe possa servir de âncora ao por si afirmado, basta atentar-se nos factos provados sob os números 58, 59 e 86. 10º- Para além de que, a Ré SOCIEDADE BB, S.A., foi condenada: A pagar ao Autor relativamente ao bónus de desempenho de 2020, a quantia já liquidada de 29.656,25€ (vinte e nove mil, seiscentos e cinquenta e seis euros e vinte e cinco cêntimos), pela parcela de bónus correspondente ao objectivo de receita, acrescida de quantia a ser liquidada ulteriormente, pela parcela correspondente ao objectivo de contribuição para a margem, acrescido de juros moratórios, à taxa legal, até integral pagamento; 11º- Ora o Tribunal de 1ª Instância apurou a suficiente probabilidade da consistência e seriedade da concreta “chance” de o autor receber o prémio referente ao ano de 2021 e que se perdeu com o seu despedimento, conforme se transcreve: No que respeita à existência de uma chance real de receber o bónus relativo ao ano de 2021, mostra-se notório que, atento o historial conhecido, referente aos últimos dois anos (2019 e 2020, em que o Trabalhador recebeu bónus), assim como o facto de que, no ano imediatamente antecedente, havia atingido 105% da quota de objectivos de venda, ultrapassado em 39% o ano anterior e que as receitas da região RoW (entretanto extinta) haviam sido de 91,25% do objectivo traçado, havia uma séria possibilidade de, fossem quais fossem as condições de atribuição de bónus no ano de 2021, o Trabalhador pudesse legitimamente esperar ser um candidato em boas circunstâncias de percepcionar o incentivo em causa. 12º- Afigura-se que o tribunal de 1ª Instância na análise da responsabilização da ré pelo dano de perda de chance fê-lo com o respeito pela segurança jurídica, rodeado dos necessários cuidados, tendo concluído pela seriedade da concreta chance do autor e pela suficiente probabilidade de obtenção do prémio, pelo que partindo destes dois pressuposto não poderá passar incólume a perda de chance do autor em receber o prémio/bónus do ano de 2021 por força da ilicitude do despedimento. A qual configura um dano patrimonial ressarcível. 13º- Pelo que bem andou o Tribunal de 1ª Instância ao considerar provada a probabilidade suficiente da existência dum dano de chance indemnizável. Pelo que não poderá proceder o recurso subordinado interposto pela Ré, assim se fazendo a costumada e boa Justiça.” Foi proferido despacho que admitiu os recursos. Rectificou-se a sentença determinando-se que a secção do dispositivo onde constava «F. Condenar Trabalhador e Empregador em custas, na proporção de 95% e 5%», passasse a ter a seguinte redacção: «F. Condenar Empregador e Trabalhador nas custas, na proporção de 95% e 5%» Recebidos os autos neste Tribunal, o Ministério Público apôs “Visto”. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir. Objecto do recurso O âmbito do recurso é delimitado pelas questões suscitadas pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (arts. 635º nº 4 e 639º do CPC, ex vi do nº 1 do artigo 87.º do CPT), sem prejuízo da apreciação das questões que são de conhecimento oficioso (art.608.º nº 2 do CPC). Nos presentes autos foram submetidos à apreciação deste Tribunal da Relação dois recursos: o do Autor e o da Ré. * Por uma questão de precedência lógico-jurídica, as questões serão apreciadas pela seguinte ordem: 1-Se não se mostram preenchidos os requisitos para a atribuição da indemnização pelo dano da perda de chance de receber o bónus relativo ao ano de 2021 (recurso da Ré). 2-Se o Tribunal a quoerrou na fixação do quantum indemnizatório do dano da perda de chance de receber o bónus do ano de 2021 (recurso do Autor). 3-Se o Tribunal a quo deveria ter considerado o dano de perda de chance relativamente aos anos subsequentes a 2021 e até à data da reintegração do Autor, com a consequente condenação da Ré no seu pagamento (recuso do Autor). * Fundamentação de facto (…) * Fundamentação de direito Comecemos, então, por apreciar se, como sustenta a Ré /Recorrente, não se mostram preenchidos os requisitos para a atribuição da indemnização pelo dano da perda de chance de receber o bónus relativo ao ano de 2021. Sobre a atribuição da indemnização pelo dano da perda de chance de receber o bónus relativo ao ano de 2021, pronunciou-se a sentença recorrida nos termos seguintes: “O Trabalhador pretende ainda ser indemnizado pelo dano da perda de chance de receber o prémio (bónus) respeitante ao ano de 2021. Antes de adentrar no tratamento da questão, cumpre qualificar juridicamente o bónus, tomando posição relativamente à questão de se tratar de retribuição. Resultando do disposto no art. 260.º, n.º 1, als. c) e d) e 3, al. b) do Código do Trabalho que o prémio pelo desempenho ou mérito, desde que de carácter estável, constitui retribuição, sendo, pelo contrário, excluído da retribuição o prémio que não esteja antecipadamente garantido, é de constatar que, atento o retrato traçado na secção antecedente, o bónus estará excluído da retribuição, porquanto se acha subordinado à efectiva concretização dos objectivos definidos pelo Empregador. Nestes termos, e não se tratando de retribuição, estaremos diante de uma indemnização, prevista no art. 389.º, n.º 1, al. a), do Código do Trabalho, que determina que, sendo o despedimento declarado ilícito, o Empregador é condenado a indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais. Atenta a abrangência do âmbito do dever de indemnizar que impende sobre o empregador, na sequência de despedimento ilícito, é, sem dúvida, de asseverar que a a perda de oportunidade de vir a auferir bónus pelo desempenho no ano de 2021 deve ser indemnizável, a título de perda de chance. O instituto da perda de chance visa ressarcir o lesado pela destruição da probabilidade de obter uma vantagem, com o desaparecimento de uma posição favorável que integrava a sua esfera jurídica. A ideia em apreço permite ultrapassar o paradigma binário do tudo ou nada da responsabilidade civil, através de uma solução equitativa para o caso concreto, em que se reconheça que, não fora o comportamento ilícito e culposo do lesante, o lesado teria uma real possibilidade de obter uma vantagem ou um proveito ou de evitar um prejuízo. (cf. JÚLIO GOMES, Sobre o dano da perda de chance, in Direito e Justiça, Vol. XIX, Tomo II) A perda de chance apresenta-se, a nosso ver e na esteira de NUNO SANTOS ROCHA como um verdadeiro dano autónomo, por ofensa a um bem jurídico intangível e infungível, que será a oportunidade, assumindo-se o nexo causal entre o acto ilícito e as oportunidades perdidas. (NUNO SANTOS ROCHA, A Perda de Chance como Nova Espécie de Dano, pp. 38-42) Sob uma perspectiva semelhante, MANUEL CARNEIRO DA FRADA define esta figura da perda de chance ou de oportunidade como «um dano em si, como que antecipando o prejuízo relevante em relação ao dano final (apenas hipotético) para cuja ocorrência se não pode asseverar um nexo causal» (cf. MANUEL CARNEIRO DA FRADA, Direito Civil Responsabilidade Civil (O Método do Caso), p. 104) A jurisprudência mais recente dos nossos Tribunais Superiores vem entendendo que aquilo «que se perde é a oportunidade de obter um determinado resultado ou de evitar uma determinada desvantagem, nada garantindo que qualquer um desses desideratos se venha a verificar, não obstante ter de se concluir, previamente ao seu reconhecimento, pela existência de uma séria e real probabilidade de tal vir a suceder E a indemnização a fixar nestes termos deve apenas abranger o dano que representa o não ter podido tentar, o não ter sido possível lutar por, sempre difícil de calcular, é certo, mas, de qualquer modo, digno de contemplação legal, tal como tem vindo a ser decidido, e com alcance cada vez mais abrangente.» (cf. Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-11-2022, Proc. n.º 460/19.6T9SXL.L1-9) Malgrado a especialidade desta figura, continuamos a movimentar-nos no campo da responsabilidade civil (in casu, contratual), que depende sempre de um facto ilícito e culposo que já temos por verificado, não tendo o Empregador ilidido a presunção emergente do art. 799.º, n.º 1, do Código Civil e do nexo causal entre facto e dano. Neste âmbito, é de considerar que o dano de perda de chance apenas será indemnizável numa hipótese que seja de qualificar como uma probabilidade séria e real de alcançar um determinado resultado (neste caso, positivo), ainda que de verificação incerta, e que, por motivos atinentes à conduta do lesante, se converteu numa impossibilidade. (cf. Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 03-12-2015, Proc. n.º 2080/13.0TBVCD.P1; Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 07-12-2021, Proc. n.º 23391/18.2T8LSB.L1-7) O facto de não estar em causa retribuição, como vimos supra, acarreta dois corolários: por um lado, não é garantido que o pagamento de bónus ocorra, nem está o bónus sujeito ao princípio da irredutibilidade da retribuição (arts. 129.º, n.º 1, al. d) e 258.º, n.º 4 do Código do Trabalho), sem prejuízo da regra da imodificabilidade unilateral dos contratos; por outro lado, consubstanciando a retribuição, por definição, a contrapartida do trabalhador pelo seu trabalho (art. 258.º, n.º 1, do Código do Trabalho), é inteiramente irrelevante a circunstância de o Trabalhador não ter desempenhado funções ao longo de todo o ano de 2021. As questões que, para efeitos de decidir, relevam são as de saber se o Trabalhador teria a expectativa de vir a poder vir a ser elegível para efeitos de bónus e, em segundo lugar, se existiria uma chance real de receber o bónus em causa. A resposta ao primeiro tópico tem de ser, inequivocamente, em sentido positivo: o Trabalhador beneficiava de acesso ao plano de bónus desde a admissão, em 2001, havia recebido bónus em 2019, tem direito a receber (como se justificou supra) bónus em 2020, sendo que resultou provado que, em 05-01-2021, foi anunciado que os Recursos Humanos da X iriam comunicar com cada trabalhador a fim de os inteirar quanto aos planos de benefícios e outras questões relacionadas com remuneração, pelo que não será, efectivamente, de alijar a continuação da elegibilidade do Trabalhador para o plano de bónus. No que respeita à existência de uma chance real de receber o bónus relativo ao ano de 2021, mostra-se notório que, atento o historial conhecido, referente aos últimos dois anos (2019 e 2020, em que o Trabalhador recebeu bónus), assim como o facto de que, no ano imediatamente antecedente, havia atingido 105% da quota de objectivos de venda, ultrapassado em 39% o ano anterior e que as receitas da região RoW (entretanto extinta) haviam sido de 91,25% do objectivo traçado, havia uma séria possibilidade de, fossem quais fossem as condições de atribuição de bónus no ano de 2021, o Trabalhador pudesse legitimamente esperar ser um candidato em boas circunstâncias de percepcionar o incentivo em causa. Importa não olvidar que não estaria em causa um bónus subordinado a uma avaliação qualitativa, mas a resultados quantitativos concretos (ao contrário do que sucede no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 26-05-2015, Proc. n.º 373/10.7TTPRT.P1.S1), cuja probabilidade de recebimento se acentuou com a integração na estrutura empresarial do Grupo X, de escala superior e com um contexto de crescimento continuado, durante 7 anos, das respectivas receitas, não podendo, de resto, o Trabalhador ser prejudicado por, não tendo sido integrado em qualquer segmento da organização de tal estrutura empresarial, desconhecer quais as métricas de objectivos que lhe seriam aplicáveis ou os resultados obtidos por uma qualquer unidade daquela estrutura. Tomando em consideração o intento abrangente com que o legislador formulou o art. 389.º, n.º 1, al. a) do Código do Trabalho (mesmo que não o tivesse feito, sempre vigorariam os termos gerais da responsabilidade civil) e ainda o espírito de, perante a ilicitude do despedimento, se acautelar que, do ponto de vista económico, nem o Trabalhador fica prejudicado, nem o Empregador beneficiado, temos de considerar como impreterível que, conquanto recorrendo à equidade, seja o Trabalhador ressarcido do dano autónomo de ter perdido a oportunidade de se empenhar no sentido de receber bónus em 2021 e de, eventualmente, o lograr receber. O recurso à equidade, porquanto está em causa um dano infungível e insusceptível de se calcular com exactidão visto que o valor conhecido da vantagem de 2020 seria sempre matizado pela incerteza que distingue a oportunidade do real prejuízo e muito menos de ser objecto de reconstituição natural, é legitimado à luz do art. 4.º, al. a) e 566.º, n.º 3, do Código Nesta senda, o princípio rector do raciocínio do julgador não deve tanto ser de ordem disjuntiva (ou sim, ou não), mas de adequação, atribuindo uma reparação apropriada diante da inviabilização culposa de o Trabalhador envidar todos os esforços necessários ao recebimento de uma quantia que correspondia e não apenas pela constância da respectiva elegibilidade, nem pelo desempenho verificado nos anos antecedentes ao incentivo consistente na oportunidade de obter uma vantagem, hipótese com que o mesmo podia e devia contar como possível, ainda que incerta. Tendo sido provado que, à data do despedimento, o Trabalhador poderia beneficiar de um bónus até 65.000, é de fixar o quantum indemnizatório, por recurso à equidade, em ¼: 16.250,00€.” A Recorrente discorda deste entendimento argumentando, numa primeira linha, o seguinte: - Embora o bónus em causa não integre a retribuição do Autor, ainda assim, é uma prestação pecuniária que poderá ser devida anualmente ao trabalhador, conforme as normas e políticas internas da Ré; - Seria incoerente e até contraditório, no artigo 390 n.º 1 do CT o legislador “reduzir” a obrigação de reconstituição dos rendimentos do trabalho, em termos amplos, às prestações pecuniárias que têm a natureza de retribuição e depois resultar de outro artigo que a obrigação de reconstituição dos rendimentos de trabalho também abrange prestações não retributivas; e -Quando o artigo 389.º, n.º 1 al.a) do CT se refere a danos patrimoniais causados por despedimento ilícito está-se a referir a outros danos que não a prestações pecuniárias que o trabalhador poderia receber ou seriam devidas durante a vigência e execução normal do contrato de trabalho dado que em relação a estas se aplica o regime específico previsto no artigo 390.º do Código do Trabalho, pelo que, não seria devida a peticionada indemnização. Vejamos: Sob o título “Efeitos da ilicitude do despedimento” estatui o artigo 389.º do Código do Trabalho, norma que corresponde ao anterior artigo 436.º do Código do Trabalho de 2003: “1- Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado: a)A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais b) Na reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, salvo nos casos previstos nos artigos 391.º e 392.º. (…).” Por seu turno, dispõe o n.º 1 do artigo 390.º do Código do Trabalho: “1 - Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento.” Ou seja, no caso de o despedimento ser declarado ilícito, o empregador é condenado em duas prestações distintas: 1-a indemnizar o trabalhador de todos os danos causados, sejam patrimoniais, sejam não patrimoniais; 2-a pagar as retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, incluindo-se nestas, nomeadamente as férias, os subsídios de férias e de Natal, a isenção de horário de trabalho. Como escreve Pedro Furtado Martins na obra “Cessação do Contrato de Trabalho”, 4.ª Edição, revista e atualizada, Principia, pags 482 e 483, “Da indemnização dos danos patrimoniais distingue-se o direito do trabalhador «a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento (art.390.º n.º 1). O texto da norma transmite a ideia de que o empregador é condenado a executar a obrigação retributiva que não cumpriu atempadamente devido ao despedimento ilícito por si promovido e não tanto no pagamento de uma indemnização de valor equivalente ao das retribuições vencidas. (…) Temos sustentado que a obrigação de pagamento dos salários intercalares se explica pela conjugação do regime geral da invalidade com as regras sobre o incumprimento das obrigações. Declarada a invalidade e uma vez que essa declaração tem eficácia retroativa, tudo se passa como se o vínculo existente entre as partes sempre tivesse produzido os seus efeitos, máxime a constituição do empregador no dever de pagar a remuneração e do trabalhador na obrigação de prestar a atividade prometida.” E na página 484 escreve o mesmo autor: “ o pagamento dos salários intercalares corresponde, portanto ao cumprimento da obrigação retributiva. (…) Por que está em causa o cumprimento da obrigação retributiva a condenação do empregador nos termos do artigo 390.º n.º 1 abarca a generalidade das prestações que integram a retribuição, em sentido laboral, que o trabalhador foi impedido de auferir e não apenas o correspondente à retribuição base. (…). Em regra o dever de pagar as retribuições vencidas abarcará a generalidade das prestações com natureza de retribuição que seria suposto o trabalhador auferir no período em análise, incluindo a retribuição base e os complementos retributivos de atribuição certa e valor fixo a que o mesmo teria direito se o trabalho tivesse sido executado.” Regressando ao caso, verifica-se que a sentença, ao abrigo do disposto no artigo 260.º, n.º 1, als. c) e d) e 3, al. b) do Código do Trabalho, excluiu o bónus como componente da retribuição do Autor, por entender que este se acha “subordinado à efectiva concretização dos objectivos definidos pelo empregador”. E nessa medida não o incluiu no cômputo das retribuições intercalares. Considerou, contudo, que a perda de chance de auferir o bónus do ano de 2021, que entendeu estar verificada, constitui um dano patrimonial autónomo, a ser ressarcido de acordo com o artigo 389.º n.º 1 al.a) do Código do Trabalho, conforme defendeu o Autor. Nessa sequência, a Recorrente foi condenada a pagar, ao abrigo do disposto no artigo 389.º n.º 1 al. a) do Código do Trabalho, uma indemnização decorrente da perda de chance do Autor receber o bónus de 2021, e não a pagar uma prestação retributiva de acordo com o artigo 390.º n.º 1 do mesmo Código (que seria devida desde o despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento). Ora, como contra-alega o Autor, nesta sede, não está em causa, nem nunca foi reclamado pelo Autor, o pagamento do prémio/bónus referente ao ano de 2021 (o Autor apenas pediu o pagamento do bónus de 2020) mas, tão só, o pedido de indemnização pelo dano da perda de chance ou de oportunidade relativamente a esse direito. Como se sabe, a indemnização a que alude o artigo 389.º n.º 1, al.a) do Código do Trabalho apenas exclui do direito de indemnização as prestações de natureza pecuniária que integram a retribuição do trabalhador, mas não exclui o ressarcimento de outros danos de natureza patrimonial. É que, se assim não fosse, naturalmente que teria incluído no seu âmbito de aplicação apenas o ressarcimento dos danos não patrimoniais e o artigo 390.º n.º 1 do CT abarcaria todas as prestações pecuniárias auferidas pelo trabalhador ou todos os danos patrimoniais. Mas, salvo o devido respeito, não é isso que a norma refere: o seu âmbito de aplicação abrange os danos patrimoniais (não incluídos no artigo 390.º n.º 1 do CT) e os danos não patrimoniais. Como escreve Pedro Romano Martinez, no “Código do Trabalho Anotado”, 8.ª Edição, Revisto pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, Almedina, pag.1004, em anotação ao artigo 390.º do CT e a propósito das alterações introduzidas pelo artigo 390.º ao regime anterior: “Em primeiro lugar, ficou esclarecido que o pagamento dos salários intercalares não obsta ao dever de indemnizar por outros prejuízos sofridos pelo trabalhador, a que alude o artigo 389.º n.º 1 al.a), do CT2009. Ou seja, o direito de o trabalhador receber as retribuições que deixou de auferir não afecta o direito a ser indemnizado por outros danos patrimoniais e não patrimoniais.” E cremos ser pacífico que o dano de perda de chance corresponde a um dano de natureza patrimonial. E tendo o Autor pedido a condenação da Ré no pagamento de uma indemnização pelo dano da perda de chance resultante da circunstância de não ter podido auferir do bónus de 2021, o que está em causa é, pois, o ressarcimento daquele dano e não a condenação da Ré no pagamento ao Autor de uma prestação retributiva, que nem foi qualificada como tal pela sentença recorrida. Consequentemente, não merece censura o entendimento do Tribunal a quo no sentido de que o dano de perda de chance de receber o bónus de 2021 enquadra-se na previsão do artigo 389.º n.º 1 al.a) do Código do Trabalho. Questão diversa é a de saber se, no caso, não estão verificados os pressupostos de atribuição de tal indemnização. Nesta sede invoca a Recorrente que, no caso, não havia uma probabilidade séria nem real de pagamento de bónus referente a 2021, isto porque: i) não consta da factualidade provada que, relativamente a 2019, o Autor recebeu bónus anual, mas apenas que em 2020 recebeu prémios (no plural), sem qualquer indicação do que se tratavam (ponto 86), nem o Autor também nunca alegou que recebeu, em 2020, o bónus anual de 2019; ii) na sequência da reunião de 5 de Janeiro de 2021, não houve qualquer comunicação da Ré ao Autor sobre os planos de benefícios X e outras questões relacionadas com a remuneração (ponto 155); iii) os planos de bónus tinham vigência anual, com objetivos definidos anualmente, sem garantia de continuidade nos anos seguintes (ponto 60); iv) nem sequer o Autor alegou que a Ré manteve planos de bónus em 2021 que lhe fossem aplicáveis, como também não alegou qualquer factualidade quanto a resultados de receita ou de contribuições para a margem referentes a 2021 que tivesse atingido, de que pudesse resultar, para ele, mais do que uma mera expetativa de receber bónus referente ao desempenho de 2021; v) em relação ao bónus de 2021 estão em causa meras suposições ou desejos, que não podem configurar uma verdadeira perda de chance, que supõe algo altamente provável, tal como vem sendo configurado, nomeadamente, na jurisprudência. Adiantamos, desde já, que não lhe assiste razão. Senão vejamos: A sentença caracteriza pormenorizadamente e de modo acertado a figura da perda de chance, citando doutrina e jurisprudência pertinentes. A nível da jurisprudência, realça-se ainda o que se afirma no sumário do Acórdão do STJ de 19.10.2021, proc. n.º 5174/18.1T8GMR.G1.S, in www.dgsi.pt “I- Condição da indemnização em sede de perda de chance é que se mostre que o lesado detinha na sua esfera jurídica a oportunidade de (com grande probabilidade, pois tudo gira ao redor de situações eivadas de um certo grau de aleatoriedade, de incerteza) alcançar certo efeito que lhe seria vantajoso, mas que acaba por não ser alcançado devido a facto do autor da lesão.” E o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 2/2022, publicado no DR, Série I, de 26.01.2022, Proc.34545/15.3T8LSB.S2-A, fixou jurisprudência no sentido de que “O dano da perda de chance processual, fundamento da obrigação de indemnizar, tem de ser consistente e sério, cabendo ao lesado o ónus da prova de tal consistência e seriedade.” Assim, cabe questionar se, face à factualidade provada, podemos afirmar que, efectivamente, o Autor detinha na sua esfera jurídica uma séria e real probabilidade de alcançar o bónus de 2021. Ou seja, não fora o despedimento, teria o Autor a probabilidade séria e real de auferir do mencionado bónus? Atente-se na seguinte matéria de facto provada com interesse para a decisão: O Trabalhador teve, como quota e atingimento de vendas, em 2020:i) Quota individual: 608.000,00€; ii)Atingimento Individual: 635.000,00€; iii) Crescimento versus 2019: +39%; (facto provado 38);A atribuição do prémio anual faz parte das condições contratuais incluídas na carta de admissão (facto provado 58); À data do despedimento, o Trabalhador auferia, como contrapartida directa da sua prestação de trabalho, bónus anual de 65.000,00€ para o atingimento de 100% dos objectivos (facto provado 59); Do BB Plano de Bónus Anual 2020 consta além do mais, “2. O Plano Anual de Bónus BB 2020 será vigente entre 1 de Janeiro de 2020 e até 31 de Dezembro de 2020 e prevalece sobre qualquer outro plano de bónus, seja oral ou reduzido a escrito”, 4. Elegibilidade. Os participantes do presente Plano devem ser funcionários da BB serem seleccionados pelos seus superiores hierárquicos, sujeitos à aprovação do seu Director/EVP, com relatório directo ao Director Executivo (doravante, CEO), a quem cabe a aprovação final. Adicionalmente, para serem elegíveis, os trabalhadores devem :Ter um contrato activo com a BB (constar da folha de pagamentos), na data do pagamento efectivo nos termos do presente Plano. Ter contribuído para os objectivos da empresa/organização com pelo menos nove (9) meses de serviço activo1 durante o ano de desempenho. Ter parte da sua remuneração identificada como variável. Não estarem sujeitos aos planos de Comissões (Plano de Incentivo à Venda e/ou Plano de Aquisição de Valor) ou qualquer outra comissão ou programa que sirva um propósito similar ao deste Plano.” 6. Princípios de Compensação. O Plano baseia-se no pressuposto de que os participantes deste Plano de Bónus têm um Salário Base Anual (fixo) e um Objectivo de Bónus (salário variável). O objectivo do bónus é expresso ou como uma percentagem do Salário Base Anual ou como um montante específico. O objectivo do Bónus é ganho quando um participante cumpre 100% dos objectivos atribuídos. Nem todos os empregados em BB precisam de ter uma remuneração variável, esta deve ser baseada na decisão de gestão da BB. 10. Cálculos. Para o ano de 2020, os cálculos são simplificados. Para as Receitas, é necessário um desempenho mínimo de 90% do objectivo, o que significa que abaixo do mínimo de 90%, o desempenho será multiplicado por zero. Para rendimentos de desempenho igual ou superior ao mínimo de 90%, o cálculo será aplicado proporcionalmente de forma linear. Para a Contribuição para a margem Regional e EBIT, será definida uma tabela que será comunicada em tempo útil aos respectivos EVP e Directores. Cálculos relativos à dupla contagem em Regiões, como os números provenientes das Contas Globais de apoio (tais como Teleperformance e Allianz) será sujeito à aprovação prévia do CEO, num cenário de caso a caso. Tal como nos últimos anos, os funcionários identificados, de acordo com o processo de carreiras internas, estarão sujeitos a um EBIT positivo de 6ME, para além das condições aqui definidas, para recebem o seu bónus anual. (facto provado 60); O objectivo de receitas, para a Região RoW, no ano de 2020, era de 5.269.000,00€ (facto provado 61); O valor mínimo definido para atribuição de bónus sobre Contribuição para a margem é de 2.638.218€, a que corresponde um bónus de 41,58%, calculando-se o valor para maiores atingimentos, nos seguintes termos: (facto provado 62); No ano de 2020, na região RoW, a receita obtida, excluindo provisões constituídas e notas de crédito emitidas, foi de 4.783.000,00€ (facto provado 63); Em 2019, o valor de cálculo para bónus foi apenas considerado para efeitos de cálculo da rúbrica contribuição para a margem e não foi considerado na rúbrica de receitas (facto provado 75);O Empregador nunca referiu em qualquer documentação que, em 2020, haveria uma mudança nas regras de medição do reconhecimento de receitas para efeitos de bónus, nem emitiu qualquer regra aprovando ou oficializando esta alteração (facto provado 77); Os CSM receberam, relativamente a 2020, as suas comissões tomando como base de cálculo o desempenho individual, sem que lhes fossem deduzidos quaisquer valores por provisões (facto provado 78); O Trabalhador, no ano de 2020, recebeu a título de prémios, a importância ilíquida de 39.336,52€ (facto provado 86); À semelhança de todos os CSM, o Trabalhador tinha objectivos anuais de venda (quota) e ultrapassou esses objectivos em 5%, tendo sido o 6.º melhor desempenho em termos percentuais de atingimento, com um crescimento de 39% face a 2019 (facto provado 121); Em 30 de dezembro de 2020 a sociedade X Systems Limited adquiriu a totalidade do capital social do Empregador (facto provado 147); Após a aquisição da BB, os trabalhadores desta passaram a prestar o seu trabalho sob as ordens da X, designadamente sob a direcção da unidade de negócio SPALAT, a qual tem como Director-Geral CM....., prestando as suas funções não apenas à sociedade BB (com quem tinham um vínculo laboral) mas para a X Systems, de forma indiscriminada e regular (facto provado 150);No dia 5 de Janeiro de 2021, teve lugar uma primeira reunião, na qual foram anunciados os princípios de negócio da X e ainda que, nos 30 dias seguintes: «-Vincent M..... & CM..... irão liderar os planos de integração - Diversas reuniões entre empregados e a Equipa X no sentido de planear o futuro - Integração estará completa no fim de Janeiro - Os Recursos Humanos irão comunicar com cada um em Janeiro no que diz respeito aos planos de benefícios X e outras questões relacionadas com remuneração - Reuniões de apresentação com clientes e parceiros - Formação e sessões de orientação irão começar no início de Fevereiro» (facto provado 155); Em 2020, a X apresentou vendas no montante de 500.000.000,00 dólares canadianos (quinhentos milhões de dólares canadianos), tendo um crescimento médio de receitas anuais de 15% nos sete anos antecedentes e de rentabilidade (EBITDA) de 28% (facto provado 183); A X procedeu à distribuição de dividendos aos seus accionistas em 2020, no montante de 27 milhões de dólares canadianos e investiu 43,9 milhões de dólares canadianos na compra de empresas (facto provado 184); e durante o ano de 2021, não foram atribuídas funções ao Trabalhador pelo Empregador, apesar das insistências do Trabalhador reclamando o direito à ocupação (facto provado 203). Ora, face à factualidade provada (facto 86), contrariamente ao que afirma a Recorrente, podemos concluir que o Autor recebeu o bónus anual relativo ao seu desempenho profissional em 2019, pois conforme estatui o ponto 11 (Aprovações e pagamentos) do BB Plano Anual de Bónus, “Os pagamentos serão efectuados em ou antes de 30 de Abril, após o termo do Plano”. Por conseguinte, os prémios a que alude o facto provado 86 só podem respeitar ao bónus de 2019, tanto mais que não está provado que o Autor auferia de outros prémios para além do mencionado bónus anual. E o bónus relativo ao ano de 2019 situou-se no valor ilíquido de €39.336,52. Quanto ao bónus do ano de 2020, o Autor reclamou o seu pagamento nestes autos, a fixar em quantia que se apurasse na sequência de auditoria em curso na Ré sobre os resultados atingidos em 2020 pelo grupo RoW, num máximo de 65.000,00€, correspondente em 50% aos objectivos de receitas e em 50% aos objectivos de contribuição para a margem. Conforme é dito na sentença recorrida, a Ré admitiu, na resposta à reconvenção, ainda não ter concluído a auditoria, mas em 26-05-2022, juntou aos autos dois documentos alegando que o objectivo de receitas fora de 89,91%, enquanto que o objectivo de contribuição para a margem só fora atingido em 75,46%, números que foram impugnados pelo Autor. Após pormenorizada e fundamentada dissertação, o Tribunal a quo concluiu ser devido ao Autor o bónus de 2020 e condenou a Ré a pagar-lhe, a esse título, a quantia já liquidada de €29.656,25, pela parcela de bónus correspondente ao objectivo de receita, acrescida de quantia a ser liquidada ulteriormente, pelo bónus correspondente ao objectivo de contribuição para a margem. Donde, é devido ao Autor o bónus correspondente ao ano de 2020. E tal matéria não foi objecto do recurso da Recorrente tendo, pois, transitado em julgado. Assim, como refere o Tribunal a quo o Autor recebeu bónus em 2019 e tem direito a recebê-lo relativamente ao ano de 2020. Por isso, a conclusão a retirar é a mesma que retirou a sentença, isto é, o Autor tem histórico de recebimento de bónus. Por outro lado, é certo que o BB Plano de Bónus para o ano de 2020 era anual (facto provado 60). E também é certo que não ficaram provados os termos do Plano de Bónus para 2021. Mas por outro lado, está assente que a atribuição do prémio anual faz parte das condições contratuais incluídas na carta de admissão (facto provado 58) e que à data do despedimento, o Autor auferia, como contrapartida directa da sua prestação de trabalho, bónus anual de 65.000,00€ para o atingimento de 100% dos objectivos (facto provado 59). Mais, não resulta provado que até ao despedimento do Autor tivesse ocorrido qualquer alteração do seu contrato de trabalho no que respeita à política de atribuição do bónus anual, pelo que é indubitável que o Autor mantinha-se na qualidade de trabalhador elegível àquele bónus. Sabemos ainda que, na reunião de 5 de Janeiro de 2021, “Os Recursos Humanos irão comunicar com cada um em Janeiro no que diz respeito aos planos de benefícios X e outras questões relacionadas com remuneração”,o que sucederia nos trinta dias seguintes. Não ficou provado que, na sequência da mencionada reunião houve qualquer comunicação da Ré ao Autor sobre os planos de benefícios X e outras questões relacionadas com a remuneração conforme anunciado no facto provado 155. Mas tal facto não é imputável ao Autor, nem significa que não tivesse existido um Plano de Bónus para 2021 e, muito menos, que tivesse deixado de ser elegível como sempre fora desde 2001, o que sempre seria contrariado pela circunstância de as condições contratuais não terem sido alteradas, como já dissemos. Como refere a sentença recorrida, não pode o “Trabalhador ser prejudicado por, não tendo sido integrado em qualquer segmento da organização de tal estrutura empresarial, desconhecer quais as métricas de objectivos que lhe seriam aplicáveis ou os resultados obtidos por uma qualquer unidade daquela estrutura.” Por fim, é certo que o Autor não alegou (nem podia), relativamente ao ano de 2021, factualidade quanto a resultados de receitas ou de contribuições para a margem que tivesse atingido. Mas a razão para tal omissão sobressai do facto provado 203 onde se fez consignar: “durante o ano de 2021, não foram atribuídas funções ao Trabalhador pelo Empregador, apesar das insistências do Trabalhador reclamando o direito à ocupação (facto provado 203).E se não lhe foram atribuídas funções em 2021, tal facto apenas é imputável à Ré e consequentemente, se não contribuiu para os resultados de receitas ou de contribuições para a margem referentes àquele ano, tal facto também não lhe é imputável, tanto mais que, em Julho de 2021, o Autor foi despedido. Rectas contas, entendemos não ser de acompanhar a Recorrente quando defende que, em relação ao bónus de 2021 estão em causa meras suposições ou desejos que não podem configurar uma verdadeira perda de chance. Pelo contrário, mantendo-se o direito do Autor a candidatar-se ao bónus anual, como se mantinha em virtude de não ter sido alterado o seu contrato de trabalho e sendo certo que em 2020 (ano da pandemia) ultrapassou os objectivos em 5% e revelou um crescimento de 39% face ao ano de 2019, era esperado e de grande probabilidade que em 2021, pelo menos, mantivesse esses resultados. E se tais resultados lhe conferiram o direito ao bónus de 2020, naturalmente que, relativamente ao ano de 2021, havia uma séria probabilidade e era altamente provável que o Autor viesse a auferir bónus anual. E perdeu essa oportunidade em virtude do despedimento ilícito de que foi alvo. Por conseguinte, não merece reparo a decisão do Tribunal a quo ao concluir que o Autor tem direito à indemnização pela perda de chance de receber o bónus do ano de 2021. Improcede, pois, o recurso da Ré. * Debrucemo-nos agora sobre o recurso do Autor e analisemos a primeira questão que nele se suscita e que consiste em saber se o Tribunal a quo errou na fixação do quantum indemnizatório do dano da perda de chance de receber o bónus do ano de 2021. O Tribunal a quo apelou à equidade e considerando que, à data do despedimento, o Autor poderia beneficiar de um bónus até 65.000€, fixou o quantum indemnizatório em ¼, daquele valor, isto é, em 16.250,00€. Sustenta o Autor/Recorrente que para apurar o quantum indemnizatório, o Tribunal a quo deveria ter procedido às seguintes operações: avaliar primeiro qual o valor económico do dano a ressarcir; avaliar a probabilidade do Autor atingir o valor do bónus não fora a ocorrência do acto ilícito; e com base nas duas primeiras premissas cruzar o valor do dano com a sua probabilidade e assim obter o valor pecuniário da “perda” de chance. Acrescenta que, no caso, a fixação do montante da expectativa não pode ser outro que não seja o valor do bónus para 100% dos objectivos, logo 65.000,00€ e que a probabilidade de atingimento, considerando que o Autor recebeu bónus relativos ao seu desempenho nos anos de 2019 e 2020 e que a probabilidade de o receber em 2021 se acentuou, conforme menciona a sentença, a determinação do seu valor terá necessariamente que tomar em consideração os valores pagos sobre 2019 e 2020 e, assim, o valor da perda de chance deverá ser avaliado por verosimilhança com o histórico, sendo que neste caso teríamos uma média conjugando os 60.52% do valor do bónus em 2019 (conforme ponto 86 dos factos provados na sentença), com o bónus de 2020, este ainda parcialmente por liquidar, mas que se situará entre 45.6% (correspondente à componente de receita já liquidada) e 95.6% (correspondente à componente de receita liquidada acrescida da componente de margem operacional, caso esta seja determinada em liquidação de sentença pelo valor de 100%) do valor referência do bónus em 2020, do que resulta uma média a determinar em sede de liquidação de sentença, mas que será fixada no intervalo entre 53.06% ((60.52%+45.6%)/2) e 78.06% ((60.52%+96.5.6%)/2). Conclui que o quantum indemnizatório para 2021, a fixar em sede de liquidação de sentença, deverá ser determinado no intervalo entre 34.489,00€ (65.000,00€*53.06%) e 50.739,00€ (65.000,00€*78.06%). Apreciando: Nos termos do artigo 566.º n.º 3 do CPC “ Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.” Em relação à quantificação do dano da perda de chance, escreve-se no sumário do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 18.02.2020, consultável em www.dgsi.pt, “(…)2.- A quantificação do dano da perda de chance deve ser avaliada em termos de verosimilhança, considerando as probabilidades de o lesado obter o benefício, sendo, no entanto, distinto do “dano final”, devendo, para tanto, convocar-se o juízo de equidade.” No corpo do citado aresto cita-se o Acórdão do STJ de 01.07.2014 (proc. nº 824/06), em www dgsi, onde se afirma, além do mais, que “No caso de perda de chance não se visa indemnizar a perda do resultado querido mas antes a da oportunidade perdida, como um direito em si mesmo violado por uma conduta que pode ser omissiva ou comissiva; não se trata de indemnizar lucros cessantes ao abrigo da teoria da diferença, não se atendendo à vantagem final esperada.” Bem como se escreve: “A quantificação do dano da perda de chance deve ser avaliada em termos de verosimilhança, considerando as probabilidades de o lesado obter o benefício. Mas este dano é distinto do “dano final”, logo a reparação da perda de uma chance deve ser medida em relação à chance perdida e não pode ser igual à vantagem que se procurava, o que implica não poder ser nem superior nem igual à quantia que seria atribuída ao lesado caso se verificasse o nexo causal entre o facto e o dano final, devendo, para tanto, convocar-se o juízo de equidade (cf., por ex., Ac STJ de 5/2/2013, proc. nº 488/09; Ac STJ de 14/3/2013, proc. nº 78/09, disponíveis em www dgsi.pt ). Ora, entendemos que os valores alcançados pelo Autor seriam de admitir se se tratasse de fixar o valor final do bónus de 2021, que o Autor não pediu. Como o próprio Autor reconhece, não formulou esse pedido. Do que se trata é de arbitrar uma indemnização que, como tal, visa compensar o dano resultante da perda de oportunidade de auferir o bónus e, por isso, não pode ter o mesmo valor da vantagem que o Autor almejava. Os autos não fornecem elementos que permitam fixar, com precisão, a probabilidade da chance, pelo que há que recorrer a critérios de equidade, como fez a sentença recorrida (art.566.º n.º 3 do Código Civil). Na verdade, como elucida o Acórdão do STJ de 10.12.2019, Proc. 1087/14.4T8CHV.G1.S1, consultável em www.dgsi.pt “I- A equidade traduz, no nosso sistema jurídico, um método facultativo que o julgador tem ao seu dispor para que possa decidir sem aplicação de regras formais, ainda que essa decisão tenha de ser tomada “à luz de diretrizes jurídicas dimanadas pelas normas positivas estritas”. II- A necessidade de fazermos apelo aos critérios da equidade, nos termos do n.º 3 do artigo 566.º da lei civil, segundo a qual, “se não puder ser averiguado o valor exato dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”, surge quando se encontre esgotada a possibilidade de recurso aos elementos com base nos quais se determinaria com precisão o montante dos danos.” Assim, recorrendo a citérios de equidade e ponderando, por um lado, que o Autor reunia condições para se candidatar ao bónus de 2021, que era séria a probabilidade de auferir de um bónus que se situaria entre os valores auferidos em 2019 (€39.336,52) e o valor já liquidado relativo à parcela de bónus correspondente ao objectivo de receita de 2020 (€29.656,25€), entendemos adequado e proporcionado fixar o quantum da indemnização por perda da chance no valor de 30.000,00 €. Por conseguinte procede parcialmente esta pretensão do Autor. * Analisemos, por último, se o Tribunal a quo deveria ter considerado o dano de perda de chance relativamente aos anos subsequentes a 2021 e até à data da reintegração do Autor, com a consequente condenação da Ré no seu pagamento. A este propósito invoca o Recorrente que a sua retribuição tem uma componente variável, correspondente a 65.000,00€ para 100% dos objectivos, o plano de bónus encontra-se expressamente previsto pela Ré, o que permite concluir pelo seu carácter regular e permanente, era legítimo recebê-lo no futuro, face à matéria provada nos pontos 58 e 59, ao contrário do que foi entendido na sentença recorrida e para efeitos do recurso, o bónus integra a retribuição do autor na sua componente variável (art.º 261º, nº1 do CT). Mais acrescenta que, considerando que o prémio integra a remuneração variável do Autor, assiste-lhe o direito de receber essa retribuição no desenvolvimento dessa relação laboral, a qual tem uma natureza de trato sucessivo, sendo o pagamento do prémio exigível no desenvolvimento da relação contratual laboral, competindo à Ré cumprir essa sua obrigação à luz dos artigos 11º, 258º nº1, do Código do Trabalho e artigo 762º do Código Civil, devendo ser reconhecida ao Autor a indemnização pelo dano da perda de chance também sobre o ano de 2022 e posteriormente até à data da reintegração, nos mesmos termos em que lhe foi reconhecido pelo tribunal a perda de chance relativamente a 2021. Conclui que o quantum indemnizatório para 2022 a fixar em sede de liquidação de sentença, deverá ser determinado no intervalo entre 34.489,00€ (65.000,00€*53.06%) e 50.739,00€ (65.000,00€*78.06%) e o quantum indemnizatório para 2023 a fixar em sede de liquidação de sentença, deverá ser determinado no intervalo entre 8.598,63€ (65.000,00€*53.06%/365*91) e 12.650,00€ (65.000,00€*78.06%/365*91), assumindo que a data de reintegração do Autor seja 1/04/2023. Vejamos: No artigo 384.º da contestação ao articulado motivador do despedimento, o Recorrente invocou ter ainda direito ao pagamento pela Ré de um prémio anual de €65.000,00 para 100% dos objectivos, de acordo com o plano de bónus aprovado pela Ré. Nos artigos 385.º e 387.º do mesmo articulado invocou que a atribuição do prémio anual faz parte das condições contratuais, incluídas na carta de admissão e foi condição determinante para que este fosse trabalhar para a Ré, que no ano de 2020 recebeu, a título de prémio, a importância ilíquida de € 39.336,52 e que o prémio tem de ser pago até 30 de Abril do ano seguinte. E nos artigos 390.º e 391.º declarou ser credor de um bónus que estima no montante de cerca de €50.000,00 e que consultada a Ré em Junho de 2021 esta informou o Autor que está a decorrer uma auditoria para apuramento dos resultados finais para efeitos da atribuição do bónus do ano 2020. E nos artigos 392.º a 396.º invocou o Autor: 392.º No que respeita ao prémio sobre o desempenho de 2021, o autor trabalhou neste ano 204 dias sobre os 365 dias anuais. Durante este período não lhe foram atribuídas funções pela ré, apesar das insistências do autor reclamando o direito à ocupação – cfr doc nº 27 que ora se junta. 393.º Por força deste afastamento forçado do autor da execução do seu contrato de trabalho, ficou afastada a possibilidade de este poder preencher os condicionalismos de que dependia a atribuição do prémio a que tem direito contratualmente. 394.º Do que decorre um dano pela perda da oportunidade ou perda de chance de que deve ser ressarcido no âmbito do artigo 389º, nº1 do CT/2009. 395.ºConsidera o A. que este dano se quantifica pelo rateio da parte anual em que o autor esteve ao serviço da Ré, aplicando para isso a fórmula de €65.000,00/ 365 dias (ano) x 204 dias) 1 de Janeiro a 23 de Julho) = €36.328,77. Correspondendo, assim, o seu dano pela perda de chance a ganhar € 36.328,77.” O Autor formulou os seguintes pedidos: “A) Ser o despedimento declarado ilícito e improcedentes os fundamentos do mesmo e em consequência ser a R. condenada a reintegrar o A., sem prejuízo da sua antiguidade e categoria profissional ou, em alternativa, condenada numa indemnização de antiguidade, caso o Autor por ela venha a optar. B) Ser a ré condenada a pagar ao A. as retribuições que o mesmo deixou de auferir desde o despedimento, até trânsito em julgado da sentença. C) Ser a R. condenada a pagar a título de bónus/Premio ao A. a quantia que se vier a apurar resultante da auditoria em curso pela R., sobre os resultados finais atingidos em 2020 pelo grupo ROW, em consonância com o disposto na alínea c) do nº1 do art. 556º do C.P.C. D) ser a R. condenada a pagar ao autor a título de indemnização pelo dano decorrente da perda de oportunidade no tocante ao Prémio/bónus de 2021, que se quantifica no montante de € 36.328,77 (Trinta e seis mil trezentos e vinte e oito euros e setenta e sete cêntimos). E) Ser a R. condenada a pagar a quantia de €10.000,00 (DEZ mil euros), a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos. F) Quantias acrescidas dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento. G) Ser a Ré condenada ainda nas custas e procuradoria condigna” Do exposto resulta, com clareza, que o Recorrente não formulou pedido de condenação da Ré no pagamento da indemnização do dano da perda de chance relativo aos anos subsequentes a 2021 e até à sua reintegração. E não tendo formulado esse pedido, não podia o Tribunal a quo, à partida, dele conhecer sob pena de a sentença enfermar do vício de nulidade com fundamento na al.e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC que estatui que é nula a sentença quando “ o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso.” Tal vício decorre da inobservância ao disposto no artigo 609.º n.º 1 do CPC. Mas como é sabido, nos termos do artigo 74.º do Código de Processo do Trabalho, “o juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso dele quando isso resulte da aplicação à matéria de facto provada, ou aos factos de que possa servir-se, nos termos do artigo 514.º do Código Civil, de preceitos inderrogáveis de leis ou de ou instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.” E como também se sabe, tem sido entendido que o facto de a questão da condenação para além do pedido não ter sido apreciada pelo tribunal a quo, nem mesmo ter sido alegada nas alegações de recurso, não obsta a que sobre ela se pronuncie a instância de recurso, desde que cumprido o contraditório. Neste sentido, veja-se o “Código de Processo do Trabalho Anotado”, de Abílio Neto, 5.ª Edição actualizada e ampliada Janeiro de 2011, Ediforum, Edições Jurídicas, Lda, pag.194. Sobre o artigo 74.º escreve-se na pag.193 da citada norma: “9.«O artigo 74 do CPT actualmente em vigor (como sucedia com o art.69.º do CPT/81), possibilita a condenação “extra vel ultra petitum”, ao impor ao juiz o dever de condenar em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso dele quando isso resulte de aplicação à matéria provada ou aos factos de que possa servir-se de preceitos inderrogáveis, como decorrência natural do princípio da irrenunciabilidade de determinados direitos subjectivos do trabalhador, assim estabelecendo uma das mais significativas limitações ao princípio do dispositivo.” Mais se escreve “ Com efeito, têm a doutrina e a jurisprudência feito a distinção básica entre os direitos de existência necessária, mas que não são de exercício necessário como é o caso do direito ao salário após a cessação o contrato de trabalho, e os direitos cuja existência e exercício são necessários, aí situando justamente o caso dos direitos a reparação de acidentes de trabalho- que nos termos do disposto no art.35.º da LAT são de natureza irrenunciável – e, também, do direito ao salário na vigência do contrato. É pacífico que a condenação “extra vel ultra petitum” só se justifica neste segundo tipo de direitos, que têm subjacentes interesses de ordem pública, cabendo ao juiz o suprimento dos direitos de exercício necessário imperfeitamente exercidos pelo seu titular (representante).” Ora, tendo o contrato de trabalho do Recorrente cessado por despedimento, podia o trabalhador renunciar aos créditos laborais. Com efeito, é pacífico que o despedimento ilícito faz cessar o contrato de trabalho, pelo que podia o Autor dispor daqueles créditos. Neste sentido veja-se, entre outros, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 29.03.2001, citado na mencionada obra, em cujo sumário se escreve: “I- Os princípios da indisponibilidade e da irrenunciabilidade do direito ao salário vigoram apenas enquanto dura o contrato de trabalho, deixando o seu fundamento de ter razão de ser quando cessa o vínculo laboral, ainda que por acto ilícito da empregadora. (…).” Por conseguinte, uma vez que o direito à indemnização do dano de perda de chance relativa aos anos subsequentes a 2021 não tem natureza retributiva, não está incluído nos direitos de existência necessária, seja de exercício necessário, seja de exercício facultativo sendo, consequentemente, disponível, ao qual o Autor renunciou ao não formular o correspondente pedido, não podia a sentença condenar a Ré para além do pedido, nem pode fazê-lo este Tribunal da Relação uma vez que não está abrangido pelo âmbito do artigo 74.º do CPT. E ainda que se entendesse que aquele direito tem natureza retributiva, o mesmo sempre seria de exercício facultativo por ter cessado o contrato de trabalho. Salienta-se, ainda, que apesar de o Recorrente parecer sustentar o contrário (cfr. conclusão 14.ª), nada impedia que tivesse formulado o pedido relativamente aos anos subsequentes a 2021. Sustenta ainda o Recorrente que a indemnização pela perda de chance de receber o bónus dos anos subsequentes a 2021 até à reintegração foi peticionada na al. B) do petitório (retribuições intercalares) posto que, para efeitos de recurso, o bónus integra a retribuição do Autor. Pelas razões que constam da sentença recorrida, que acompanhamos, e que excluem o bónus da retribuição do Recorrente e tendo ainda em conta que o pedido de indemnização pela perda de chance se enquadra no disposto no artigo 389.º n.º 1 al.a) do CT e que é o próprio Recorrente que no petitório distingue o pedido relativo às retribuições intercalares (al.B) do pedido relativo à indemnização pela perda de chance (al.D), reconhecendo que esta não assume natureza retributiva, não vislumbramos como acompanhar o entendimento do Recorrente. Em consequência, improcede esta pretensão do Recorrente, termos em que apenas parcialmente procede o seu recurso. Considerando o disposto no artigo 527.º n.ºs 1 e 2 d CPC, as custas do recurso da Ré são da sua responsabilidade e as custas do recurso do Autor são da responsabilidade de ambas as partes na proporção do decaimento. Decisão Face ao exposto, acordam os Juízes deste Tribunal e Secção em: - Jugar parcialmente procedente o recurso interposto pelo Autor e, em consequência, alterar a alínea A.c) do dispositivo da sentença nos seguintes termos: “c.- Condenar o Empregador SOCIEDADE BB, S.A. no pagamento ao Trabalhador AA da quantia de 30.000,00 € (trinta mil euros) a título de indemnização pelo dano de perda de chance, acrescido de juros moratórios, à taxa legal, até integral pagamento.” - Manter, no mais, a sentença recorrida. Custas do recurso do Autor pelas partes na proporção do respectivo decaimento. Custas do recurso da Ré pela Ré. Registe e notifique. Lisboa, 25 de Outubro de 2023 Maria Celina de Jesus de Nóbrega Francisca da Mata Mendes Alda Martins |